Fundamentos da Graça: Longa Linha de Vultos Piedosos

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“O Dr. Steven Lawson é um dos mais comprometidos e capazes expositores bíblicos desta geração. A veemência e a clareza do seu compromisso com a pregação bíblica – com a verdadeira exposição bíblica – constituem a marca distintiva do seu ministério. Além disso, ele entende que o texto da Bíblia apresenta um consistente e coeso testemunho da soberania de Deus e a manifestação panorâmica da glória divina. Isto fica bem evidente em seu ministério oral e escrito de exposição da Palavra. Dr. Lawson é um homem extraordinário, movido por uma paixão extraordinária.” – Dr. R. ALBERT MOHLER, JR., Presidente The Southern Baptist Theological Seminary, Lousville, KY.

“Em Fundamentos da Graça, o fiel pastor Steven Lawson percorre o rico e variado terreno da Bíblia e apresenta a você o Deus verdadeiro e seu amor salvífico, baseado em toda a Escritura, e o faz de um modo que talvez você nunca tenha apreciado antes. As doutrinas da graça e da soberania de Deus são verdades que alegram, transformam a vida, exaltam Cristo, glorificam Deus, motivam as missões, incentivam a evangelização e promovem o discipulado. Se você pensa que o ensino sobre a soberania de Deus na salvação dos pecadores é ideia fabricada pelo homem, vai tornar a pensar sobre isso depois de andar através da Bíblia com o Dr. Lawson. Mas, cuidado! Esta verdade, quando entendida e abraçada, transforma a alma, anima o coração e altera a vida. O próprio Dr. Lawson é um homem que foi transformado por ela. Dr. Lawson a tem proclamado ousada, brava e alegremente, ao custo de alto preço pessoal, fazendo muito para a glória de Deus, para o bem da igreja e júbilo dos pecadores que foram encontrados pela maravilhosa graça de Deus. Prepare-se para se deleitar com a afetuosa bondade do Senhor, que dura para sempre!” – DR. J. LIGON DUNCAN III, Ministro Sênior Primeira Igreja Presbiteriana de Jackson, Mississipi.


“Vivemos numa época em que a igreja se fez outra vez objeto da aguda crítica feita por Martinho Lutero a Erasmo, seu contemporâneo: ‘O seu Deus é por demais parecido com o homem.... Que Deus seja Deus!’ Cativo na mente e no coração pelas verdades gêmeas da soberania absoluta de Deus e sua graça maravilhosa, Steven Lawson rastreia persuasivamente esses temas do começo ao fim da Escritura. Não há melhor meio que esse de estudar e aprender teologia, e não há outro meio de manter a verdade da Escritura com o equilíbrio da Escritura e no espírito da Escritura. A obra Fundamentos da Graça mostra, numa multidão de meios e modos, que a Escritura é ‘útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça’. Espero que este livro ajude a igreja contemporânea a redescobrir aquele quadrivium divino!” – DR. SINCLAIR B. FERGUSON, Pastor Sênior Primeira Igreja Presbiteriana de Columbia, Carolina do Sul.

“Steven Lawson lança, clara e compreensivamente, o alicerce bíblico para as doutrinas da graça.” – DR. JOHN MACARTHUR, Pastor-Mestre Grace Community Church, Sun Valley, Califórnia.

“Como o conhecimento que o Dr. Steven Lawson tem deste assunto mostra claramente, a soberania de Deus se faz manifesta em toda a Escritura Sagrada.... Quando você terminar de ler este livro, pergunto-me e me preocupo sobre se você vai persistir em negar a plena medida da soberania de Deus em nossa salvação. O Dr. Lawson mostrou tão clara e conclusivamente que a salvação pertence ao Senhor e à sua graça soberana, que varreu de vez o pó do lugar que os oponentes desta doutrina uma vez ocuparam. Quanto a mim, sou grato por esta obra realizada com amor, e pela elucidação e esperança que aqueles que a lerem vão ter em seu coração.” – DR. R. C. SPROUL, Ministro de Pregação e de Ensino Saint Andrew’s Chapel, Stanford, Flórida.


S T E V E N J . L AW S O N

F u ndda aGmr aeçna t o S 1 4 0 0 A .C

1 0 0 D . C

volume um

L O N G A L I N H A de V U LT O S P I E D O S O S Tr a d u ç ã o g r a c i o s a d e

ODAY R OLI V E T T I para a Ed itora Fiel, em homenagem ao Pr. R ichard Denham , c r iador e mantenedor d a Ed itora Fiel e d a C onferência Fiel. Á g u a s d a P r a t a , p r i m e i r o d e n o v e m b r o d e 2 010


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Lawson, Steven J. Fundamentos da graça : 1.400 A.C. - 100 D.C : longa linha de vultos piedosos : volume 1 / Steven J. Lawson ; tradução Odayr Olivetti. -- São José dos Campos, SP : Editora Fiel, 2012. Título original: Foundations of grace. ISBN 978-85-8132-029-8 1. Graça (Teologia) - Ensino bíblico 2. Vida espiritual I. Título. 12-10846

CDD-234.1

Índices para catálogo sistemático: 1. Graça : Teologia dogmática cristã 234.1

Fundamentos da Graça Traduzido do original em inglês Foundations of Grace por Steven Lawson

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por Editora Fiel da Missão Evangélica Literária

Copyright © 2006 by Steven Lawson

meios, sem a permissão escrita dos editores,

Proibida a reprodução deste livro por quaisquer salvo em breves citações, com indicação da fonte.

Publicado originalmente em inglês por Reformation Trust, uma divisão de Ligonier Ministries 400 Technology Park, Lake Mary, FL 32746 Copyright © 2011 Editora Fiel Primeira Edição em Português: 2012

Presidente: James Richard Denham III Presidente Emérito: James Richard Denham Jr. Editor: Tiago J. Santos Filho Tradução: Odayr Olivetti Revisão: Márcia Gomes Diagramação: Rubner Durais Capa: Rubner Durais ISBN: 978-85-8132-029-8

Caixa Postal 1601 CEP: 12230-971 São José dos Campos, SP PABX: (12) 3919-9999 www.editorafiel.com.br


Em memória do

Dr. S. Lewis Johnson – distinguido professor, teólogo eminente, expositor preciso – que chocou meu mundo com as doutrinas da graça.

Durante os anos da minha formação, o Dr. Johnson pregava fielmente a Palavra de Deus – e, especificamente, as doutrinas da graça – na Capela do Crente (Believer’s Chapel), em Dallas, Texas. Embora inicialmente eu resistisse a essas verdades, o Senhor, em sua graça, prevaleceu e abriu meus olhos para a sua gloriosa soberania na salvação dos pecadores perdidos. Domingo após domingo, o Dr. Johnson fazia magistral exposição das Escrituras com precisão teológica. Minha ideia a respeito de tudo foi mudada dramaticamente, e eu nunca mais fui o mesmo. Sempre serei grato ao Dr. Johnson por sua clara e convincente pregação sobre o nosso soberano Deus.

“Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém.” (Rm 11.36).



ÍNDICE PRÓLOGO, DE JOHN MacARTHUR.................................................... 11 A IMUTABILIDADE DIVINA E AS DOUTRINAS DA GRAÇA PREFÁCIO DO AUTOR....................................................................... 29 A VERTENTE CONTINENTAL DA TEOLOGIA RECONHECIMENTOS......................................................................... 35 1. LONGA LINHA DE VULTOS PIEDOSOS.............................................. 39 SERVOS DA GRAÇA SOBERANA: DE MOISÉS AO PRESENTE 2. ONDE A LONGA LINHA COMEÇA.................................................... 63 O LEGISLADOR MOISÉS: GÊNESIS 3. A GRAÇA SOBERANA NO DESERTO................................................103 O LEGISLADOR MOISÉS: ÊXODO A DEUTERONÔMIO 4. HOMENS FORTES COM UMA FORTE MENSAGEM............................145 PRIMEIROS LÍDERES: JOSUÉ A JÓ


5. MONARCAS INCLINAM-SE DIANTE DO SOBERANO........................187 OS REIS DAVI E SALOMÃO: SALMOS, PROVÉRBIOS E ECLESIASTES 6. PORTA-VOZES DA GRAÇA SOBERANA............................................231 OS PROFETAS MAIORES: ISAÍAS 7. ARAUTOS DA REGENERAÇÃO DIVINA............................................263 OS PROFETAS MAIORES: JEREMIAS, EZEQUIEL E DANIEL 8. TEOLOGIA MAIOR DOS PROFETAS MENORES.................................305 OS PROFETAS MENORES: OSEIAS A MALAQUIAS 9. O MAIOR EXPOSITOR DA GRAÇA..................................................339 O SENHOR JESUS CRISTO: MATEUS, MARCOS E LUCAS 10. O MONTE EVEREST DA TEOLOGIA................................................383 O SENHOR JESUS CRISTO: O EVANGELHO DE JOÃO 11. QUÃO FIRME FUNDAMENTO!......................................................437 O APÓSTOLO PEDRO: ATOS E 1 e 2 PEDRO 12. POR SUA GRAÇA E PARA SUA GLÓRIA..........................................487 O APÓSTOLO PAULO: ROMANOS


13. PREGADOR DAS DOUTRINAS DA GRAÇA.....................................545 O APÓSTOLO PAULO: 1 e 2 CORÍNTIOS E GÁLATAS 14. ANTES DA FUNDAÇÃO DO MUNDO..............................................585 O APÓSTOLO PAULO: EFÉSIOS A 2 Tessalonicenses 15. COLUNA E BALUARTE DA VERDADE.............................................633 O APÓSTOLO PAULO: 1 e 2 TIMÓTEO E TITO 16. A EVANGELIZAÇÃO E A SOBERANIA DIVINA.................................665 O MÉDICO LUCAS E O AUTOR DE HEBREUS: ATOS E HEBREUS 17. REGENERAÇÃO SOBERANA..........................................................709 TIAGO, O APÓSTOLO JOÃO, E JUDAS: TIAGO, 1,2,3 JOÃO, E JUDAS 18. POR TODOS OS SÉCULOS VINDOUROS..........................................757 O APÓSTOLO JOÃO: O EVANGELHO DE JOÃO E APOCALIPSE EPÍLOGO, DE R. C. SPROUL................................................................803



Prólogo

A IMUTABILIDADE DIVINA E AS DOUTRINAS DA GRAÇA

A

Bíblia, repetidamente e sem ser apologética, salienta o fato que Deus não muda. Na verdade, ele não pode mudar porque não pode melhorar em sua perfeição absoluta, nem sofrer declínio em sua natureza eternamente fixa. Sua pessoa não muda: “Porque eu, o SENHOR, não mudo” (Ml 3.6). Seus planos não mudam: “O conselho do SENHOR dura para sempre; os desígnios do seu coração, por todas as gerações” (Sl 33.11). Seu propósito não muda: “Querendo mostrar de forma bem clara a natureza imutável do seu propósito... Deus o confirmou com juramento” (Hb 6.17, NVI). Deus não muda de opinião: “A Glória de Israel não mente, nem se arrepende, porquanto não é homem, para que se arrependa” (1Sm 15.29); ou suas palavras: “O Santo de Israel... não retira as suas palavras” (Is 31.1,2); ou o seu chamado: “Os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis” (Rm 11.29; cf. Hb 13.8; Tg 1.17). Absolutamente, não há mudanças em Deus, nem variações, nem surpresas (cf. Sl 102.27).


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Deus não aumenta nem diminui. Não melhora nem sofre declínio. Ele não muda por terem sido alteradas algumas circunstâncias – não há emergências imprevistas para aquele que é eternamente onisciente. Seus propósitos eternos duram para sempre porque ele dura para sempre (Sl 33.11). Ele não reage, somente age – e o faz conforme lhe agrada (Sl 115.3). Claro está que, segundo a perspectiva humana, parece que Deus muda seus planos ou suas ações baseado no que as pessoas fazem. Mas não é assim segundo o ponto de vista de Deus. Visto que conhece e sempre conheceu perfeitamente o futuro, tendo-o planejado de acordo com o seu decreto inalterável, ele sempre age do modo como planejou desde a eternidade passada. Enquanto que os homens não sabem como Deus vai agir, e às vezes se espantam quando veem revelados os planos divinos, Deus nunca é pego de surpresa. Ele continua trabalhando como sempre fez, de acordo com o seu propósito eterno e o seu beneplácito (cf. Sl 33.10-12; Is 48.14; Dn 4.35; Cl 1.19-20). Com relação à humanidade, Deus predeterminou a redenção de um povo para sua glória. Nada pode frustrar esse plano (Jo 10.29; Rm 8.38,39). Conhecimento perfeito, perfeita liberdade influenciada, e poder perfeito e ilimitado para realizar tudo quanto ele quis e quer – santidade absoluta e perfeição moral movendo-o a ser plenamente verdadeiro e fiel à sua Palavra – significam que o que Deus começou a fazer antes do princípio do tempo, está fazendo e completará depois que findar o tempo. Esta arrebatadora e gloriosa intenção de Deus foi revelada na Bíblia e foi entendida claramente através da história dos redimidos. A Palavra de Deus a descerrou inequivocamente e, desde quando se completou o cânon da Escritura, todos os firmes intérpretes da Bíblia têm crido e proclamado a gloriosa doutrina do soberano e imutável propósito de Deus. Esta verdade, muitas vezes chamada “doutrinas da graça”, teve início na determinação soberana de Deus na eternidade passada. Deus não pode mudar, sua Palavra não pode mudar, e seu propósito não pode mudar. Sua verdade é a mesma porque ele é a Verdade (cf. Sl 119.160; Jo


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17.17; Tt 1.2; Hb 6.18). Em contraste com a chamada teologia do teísmo aberto, que alega que Deus não conhece o futuro e, portanto, cabe-lhe adaptar-se às circunstâncias à medida que se desenvolvem, a Bíblia apresenta Deus como o Soberano que conhece todos os eventos, passados, presentes e futuros. Nas palavras de Isaías 46.9b,10 (NVI): Eu sou Deus, e não ha nenhum outro; eu sou Deus, e não há nenhum como eu. Desde o início faço conhecido o fim, desde tempos remotos, o que ainda virá. Digo: Meu propósito permanecerá em pé, e farei tudo o que me agrada.

A JUSTIÇA DIVINA E A DOUTRINA DA ELEIÇÃO Apesar da clareza que a Escritura fala sobre este tópico, atualmente muitos cristãos professos estão em conflito com a aceitação da soberania de Deus – principalmente quando se trata da obra eletiva de Deus na salvação. Naturalmente, seu protesto mais comum é que a doutrina da eleição é injusta, não é equânime. Mas essa objeção vem de uma ideia humana de justiça, e não do entendimento divino, objetivo, da verdadeira justiça. Para que possamos tratar apropriadamente do tema da eleição, devemos pôr de lado todas as considerações humanas e focalizar a natureza de Deus e seu justo e alto padrão. A justiça divina – é onde a discussão deve começar. Que é a justiça divina? Exposta simplesmente, a justiça é um atributo essencial de Deus pelo qual ele faz infinita, perfeita e independentemente, e com exatidão, o que ele quer fazer, quando e como o quer fazer. Uma vez que é o padrão da justiça, pela própria definição, seja o que for que faça, isso será inerentemente justo. Como William Perkins disse há muito tempo, “Não devemos pensar que Deus faz algo porque é bom e reto, mas antes que algo é bom e reto porque Deus o deseja e faz”. Portanto, Deus define a justiça para nós porque ele é, por natureza, justo e reto, e o que ele faz reflete essa natureza. Sua vontade livre – e nada


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mais – está por trás da sua justiça. Significa que: o que ele quer é justo; e é justo, não devido a algum padrão externo de justiça, mas simplesmente porque ele o quer. Visto que a justiça de Deus é algo que flui do seu caráter, não está sujeita às suposições que o homem caído faz do que a justiça deve ser. O Criador não deve nada à criatura, nem mesmo aquilo que, em sua graça, deseja dar a ela. Deus não age por obrigação e compulsão, mas por sua prerrogativa independente. É isso que significa ser Deus. E porque ele é Deus, os seus atos livremente determinados são intrinsecamente retos e perfeitos. Dizer que a eleição é injusta, não somente é inexato, como também é deixar de reconhecer a essência da verdadeira equidade. O que é equânime, reto e justo é o que Deus quer fazer. Dessa forma, se Deus quer escolher aqueles que deseja salvar, fazer isso é inerentemente justo. Não podemos impor nossas ideias de equidade e justiça ao nosso entendimento das operações de Deus. Em vez disso, devemos ir às Escrituras para ver como Deus, em sua retidão perfeita, decide agir. EM QUE CONSISTE A DOUTRINA DA ELEIÇÃO? A ideia de que Deus faz o que quer, e justamente porque é ele que o faz, torna o que ele faz verdadeiro e reto, e isso é fundamental para o nosso entendimento de tudo o que há na Escritura, a doutrina da eleição inclusive. No sentido amplo, a eleição se refere ao fato de que Deus escolhe (ou elege) fazer tudo o que faz por qualquer meio ou de qualquer modo que lhe pareça próprio. Quando ele age, o faz somente porque, voluntária e independentemente, escolhe agir. Em conformidade com sua natureza, com seu plano determinado e com seu beneplácito, Deus decide o que deseja, sem pressão ou coação de nenhuma influência externa. A Bíblia defende este ponto repetidamente. No ato da Criação, Deus fez precisamente o que queria criar e da maneira como queria (cf. Gn 1.31). E desde a Criação ele tem prescrito ou permitido soberanamente tudo o que faz parte


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da história humana, a fim de realizar o plano de redenção que tinha designado previamente (cf. Is 25.1; 46.10; 55.11; Rm 9.17; Ef 3.8-11). No Antigo Testamento Deus escolheu uma nação para si. De todas as nações do mundo, selecionou Israel (Dt 7.6; 14.2; Sl 105.43; 135.4). Escolheu os israelitas, não porque fossem melhores ou mais desejáveis do que qualquer outro povo, mas simplesmente porque decidiu escolhê-los. Nas palavras de Richard Wolf: “Que coisa estranha Deus escolher os judeus!” Pode não ter soado bem, mas igualmente estranho seria Deus ter escolhido qualquer outro povo. Quem quer que Deus escolha, faz essa opção por razões que pertencem totalmente a ele. Não foi somente a nação de Israel que, na Escritura, foi objeto da escolha eletiva de Deus. No Novo Testamento Jesus Cristo é chamado “o meu eleito” (Lc 9.35, ARA). Também se faz referência aos santos anjos como “anjos eleitos” (1Tm 5.21). E os crentes do Novo Testamento são chamados “eleitos” ou “escolhidos de Deus” (Cl 3.12; cf. 1Co 1.27; 2Ts 2.13; 2Tm 2.10; Tt 1.1; 1Pe 1.1; 2.9; 5.13; Ap 17.14), significando que a igreja é a comunidade dos que foram eleitos ou escolhidos (Ef 1.4). Quando Jesus disse a seus discípulos, “Vocês não me escolheram, mas eu os escolhi” (Jo 15.16), estava salientando essa verdade. E o Novo Testamento a reitera passagem após passagem. Atos 13.48b descreve a salvação com estas palavras: “creram todos os que haviam sido designados para a vida eterna”. Efésios 1.4-6 registra que Deus nos escolheu nele [em Cristo] antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença. Em amor nos predestinou para sermos adotados como filhos, por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade, para louvor da sua gloriosa graça, a qual nos deu gratuitamente no Amado. Em suas cartas aos tessalonicenses, Paulo lembra a seus leitores que sabia que Deus os escolhera (1Ts 1.4), e lhes declara que estava agradecido a Deus por eles, porque Deus os escolheu como seus primeiros frutos, para serem salvos (2Ts 2.13, NVI). A Palavra de Deus é clara: os crentes são os que Deus escolheu para a salvação desde antes do princípio.


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O pré-conhecimento a que Pedro se refere (1Pe 1.2) não deve ser confundido com simples previsão. Alguns ensinam essa ideia, afirmando que, na eternidade passada, Deus se inclinou e olhou para os saguões da história para ver quem responderia positivamente a seu chamado, e então elegeu os redimidos com base na resposta deles. Essa explicação torna a decisão de Deus sujeita à decisão do homem, e dá a este um nível de soberania que só pertence a Deus. Faz de Deus alguém que é passivamente escolhido, e não alguém que escolhe ativamente. E essa explicação entende erroneamente o modo como Pedro emprega o termo pré-conhecimento. Em 1Pe 1.20, o apóstolo emprega a forma verbal daquela palavra, prognosis no grego, para referir-se a Cristo. Nesse caso, o conceito de “pré-conhecimento” certamente inclui a ideia de escolha deliberada. É, pois, razoável concluir que a mesma verdade prevalece quando Pedro aplica prognosis a crentes noutros lugares (cf. 1Pe 1.2). O capítulo nove de Romanos também reitera os propósitos eletivos de Deus. Ali essa prerrogativa é exposta claramente com referência a seu amor salvífico por Jacó (e pelos descendentes de Jacó) em oposição a Esaú (e à linhagem de Esaú). Deus escolheu Jacó, e não Esaú, não com base em qualquer coisa que eles tivessem feito, mas de acordo com o seu propósito soberano, livre e não influenciado. A quem acaso protestasse dizendo: “Isso é injusto!”, Paulo simplesmente perguntava: “Quem é você, ó homem, para questionar a Deus?” (versículo 20). Muitas outras passagens da Escritura poderiam ser acrescentadas a este estudo. Contudo, honesta como a Palavra de Deus é, muitos continuamente acham difícil aceitar a doutrina da eleição. A razão, repito, é que eles deixam que as suas noções preconcebidas sobre como Deus deveria agir (baseadas numa definição humana de justiça) se sobreponham à verdade da sua soberania nos termos firmados nas Escrituras. Francamente, a única razão que há para crermos na eleição é que essa doutrina se acha explicitamente na Palavra de Deus. Ela não foi originada por nenhum homem, nem por nenhuma comissão de homens. É como a doutrina das penas eternas, no sentido de que é conflitante com os ditames da mente carnal.


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Ela causa repulsa aos sentimentos do coração não regenerado. Como acontece com as doutrinas da Trindade santa e bendita e do nascimento miraculoso do nosso Salvador, a verdade da eleição, visto que foi revelada por Deus, deve ser abraçada com fé singela e não questionadora. Se você tem uma Bíblia e crê nela, você não tem outra opção senão a de aceitar o que ela ensina. A Palavra de Deus o apresenta como o ser que controla todas as criaturas e delas dispõe (Dn 4.35; Is 45.7; Lm 3.38), como o Altíssimo (Sl 47.2; 83.18), como o governador do céu e da terra (Gn 14.19; Is 37.16) e como aquele contra quem ninguém pode resistir (2Cr 20.6; Jo 41.10; Is 43.13). Ele é o Todo-Poderoso que faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade (Ef 1.11; cf. Is 14.27; Ap 19.6), e como o Oleiro celeste que modela os homens em conformidade com o seu beneplácito (Rm 9.18-22). Em resumo, Deus é o ser que decide e determina o destino de todos os homens e controla todos os detalhes da vida de cada indivíduo (Pv 16.9; 19.21; 21.1; cf. Êx 3.21,22; 14.8; Ed 1.1; Dn 1.9; Tg 4.15) – o que é realmente outro modo de dizer: “Ele é Deus”. POR QUE DEUS SE DETERMINOU A ELEGER OS REDIMIDOS? Embora, num sentido geral, a doutrina da eleição se aplique a tudo o que Deus faz, mais frequentemente se refere, no sentido específico presente no Novo Testamento, à eleição de pecadores para se tornarem santos redimidos dentro da igreja. Neste aspecto particular, a eleição divina fala da escolha independente e predeterminada feita por Deus dos que seriam salvos e colocados no corpo orgânico de Cristo. Deus não salvou certos pecadores porque estes o escolheram, mas porque ele os escolheu. Mas, por que Deus fez isso? Por que, desde a eternidade passada, ele se determinou soberanamente a salvar um segmento da humanidade caída que comporia a comunidade dos redimidos? Para que possamos responder a essa pergunta sem injetar erroneamente nossas próprias noções preconcebidas, devemos ir à Palavra de Deus, pois foi ali que Deus nos revelou sua mente. Claro está que, como seres humanos caídos, nunca poderemos compreender plenamente a sabedoria infinita


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de Deus quanto a este aspecto (cf. Rm 11.33-36). Não obstante, as Escrituras nos propiciam diversos vislumbres da motivação divina que há por trás da eleição. Por que, então, Deus decidiu salvar pecadores? A ELEIÇÃO DIVINA E A PROMESSA DE DEUS A resposta começa com a promessa de Deus. Em Tito 1.1,2 lemos: “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo para levar os eleitos de Deus à fé e ao conhecimento da verdade que conduz à piedade; fé e conhecimento que se fundamentam na esperança da vida eterna, a qual o Deus que não mente prometeu, antes dos tempos eternos”. Nesses versículos o apóstolo Paulo define sucintamente a plenitude da salvação e a liga diretamente à promessa eterna de Deus. A salvação, em sua plenitude, consiste de três partes – justificação (a salvação, no momento da conversão, da penalidade do pecado por meio do sacrifício substitutivo de Cristo); santificação (salvação do pecador, contínua, do poder do pecado, nesta vida); e glorificação (a salvação final e completa do pecador, da presença do pecado na vida por vir). Como ministro do Evangelho, Paulo dava ênfase a cada um desses aspectos em seu ministério. Visto que Paulo entendia a justificação, ele pregava o Evangelho “para levar os eleitos de Deus à fé”, compreendendo que, pela pregação da verdade, Deus justificaria aqueles que tinha escolhido salvar (cf. Rm 10.14,15). Visto que entendia a santificação progressiva, Paulo procurava fortalecer aqueles que já tinham abraçado a verdade, edificando-os pelo “conhecimento da verdade que conduz à piedade”. E visto que ele entendia a glorificação, lembrava apaixonadamente aos que estavam sob seus cuidados a verdade relacionada com “a esperança da vida eterna” – a apoteótica consumação da sua salvação em Cristo. Paulo pregava o Evangelho de Cristo com grande clareza para que os eleitos pudessem ouvir e crer. Quando eles criam, ele lhes ensinava a verdade para que pudessem tornar-se piedosos; e também apresentava a eles a esperança da vida eterna, o que lhes dava o incentivo e a motivação que necessitavam para viver como crentes fiéis.


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Tendo sumariado a salvação com três breves frases, Paulo termina o versículo 2 com estas palavras: “a qual o Deus que não mente prometeu antes dos tempos eternos”. A tese do apóstolo é que todo o milagre de revelação da salvação, que culmina na vida eterna, baseia-se na promessa absoluta do nosso Deus, que é absolutamente fidedigno. O fato de que Deus não pode mentir é evidente em si e por si, como também é atestado escrituristicamente (cf. Nm 23.19; 1Sm 15.29; Jo 14.6, 17; 15.26). Na realidade, uma vez que Deus é a fonte e a medida de toda verdade, por definição “é impossível que Deus minta” (Hb 6.18). Assim como o Diabo, quando fala mentira, “fala a sua própria língua, pois é mentiroso e pai da mentira” (Jo 8.44), também sucede que toda vez que Deus fala, fala a verdade decorrente da sua própria natureza, porque Ele é o Pai da verdade. Este Deus da verdade, que é o único Deus verdadeiro, prometeu há muitas eras que aqueles escolhidos para justificação nesta vida, certa e seguramente serão glorificados na vida por vir. A frase inglesa “before the ages began” (“antes dos tempos eternos” Tt 1.2) não se refere simplesmente à história humana antiga. Traduz-se literalmente “antes do tempo ter inicio”, e significa exatamente isso. O certo é que Deus reiterou seu plano de salvação e da vida eterna a homens piedosos como Abraão, Moisés, Davi e os profetas, mas a promessa original foi feita e ratificada na eternidade passada (cf. Ef 1.4,5; Hb 13.20). Foi antes de haver se iniciado o tempo que ele escolheu aqueles que abraçariam a fé (Tt 1.1) e prometeu salvá-los por toda a eternidade (1.2). Mas, a quem Deus fez essa promessa? Se a fez antes do princípio do tempo, não pode tê-la feito a nenhum ser humano, nem a nenhum outro ser criado. Antes da criação do tempo, nada existia fora o próprio Deus. A quem, então, ele fez tal promessa? A ELEIÇÃO DIVINA E O AMOR DO PAI Temos a resposta em 2Timóteo 1.9. Falando sobre Deus, o versículo declara que ele “nos salvou e nos chamou com uma santa vocação, não em virtude das nossas obras, mas por causa da sua própria determinação e graça. Esta graça


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nos foi dada em Cristo Jesus desde os tempos eternos”. A frase “desde os tempos eternos” é a tradução da mesma frase grega traduzida praticamente com as mesmas palavras em Tt 1.2. Aqui também significa literalmente “antes de ter se iniciado o tempo”. Na eternidade passada, antes do alvorecer da história, Deus tomou irrevogavelmente a decisão de conceder a salvação aos redimidos. Essa é a promessa que se vê em Tt 1.2, e é a promessa que Deus fez em conformidade com o seu propósito e graça independente. Dito com simplicidade, foi uma promessa que Deus fez a si próprio. Mais especificamente, como veremos, a eleição divina envolveu uma promessa do Pai ao Filho. O plano de Deus, desde a eternidade passada, foi de redimir um segmento da humanidade caída por intermédio da obra do Filho e para a glória do Filho (cf. 2Tm 4.18). Houve um momento na eternidade passada (se é que podemos falar debilmente da eternidade em termos temporais) em que o Pai desejou expressar o seu perfeito e incompreensível amor pelo Filho. Para isso, escolheu dar ao Filho uma humanidade redimida como um presente de amor – uma agremiação de homens e mulheres cujo propósito seria, através de todos os éons da eternidade, louvar e glorificar o Filho e servi-lo perfeitamente. Só os anjos não seriam suficientes neste sentido, porquanto há características do Filho com vistas aos quais os anjos não podem louvá-lo propriamente, visto que nunca terão experimentado a redenção. Mas a humanidade redimida, formada por receptáculos diretos do seu favor imerecido, permaneceria para sempre como um testamento eterno da grandeza infinita da sua misericórdia e graça. Portanto, o Pai determinou-se a dar ao Filho uma humanidade redimida como uma expressão visível do seu infinito amor. Ao fazê-lo, selecionou todos os que comporiam aquela humanidade redimida e escreveu seus nomes no livro da vida antes do princípio do mundo (Ap 13.8; 17.8). Sua dádiva ao Filho compõe-se daqueles cujos nomes estão naquele livro – uma jubilosa congregação de santos não merecedores que vão louvar e servir o Filho para sempre. O Evangelho de João fala desta realidade maravilhosa com a maior clareza. Em João 6, por exemplo, Jesus afirma claramente que os crentes são uma dádiva do


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Pai. Ele diz a seus ouvintes: “Todo aquele que o Pai me der virá a mim, e quem vier a mim eu jamais rejeitarei”. E depois: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, não o atrair” (versículos 37 e 44). Noutras palavras, o Pai atrai pecadores para presenteá-los amorosamente ao Filho. Todos os que são atraídos vêm. A todos os que vêm, o Filho recebe e abraça. Eles nunca serão mandados embora porque o Filho jamais recusaria os que lhe são dados de presente pelo Pai. Sucede, pois, que a salvação não vem aos pecadores porque são inerentemente desejáveis, mas sim porque o Filho é inerentemente digno da dádiva do Pai. Afinal de contas, o propósito da redenção é que o Filho seja eternamente exaltado pelos redimidos – a redenção não é para a honra do pecador, mas para a honra do Filho de Deus. E, em resposta ao amor do Pai, o Filho aceita ardorosamente os que são atraídos, única e totalmente porque eles são uma dádiva do Pai, a quem ele ama. É sua gratidão perfeita que abre seus braços para que ele abrace aos perdidos. Em João 6.39, Jesus declara que o que foi prometido pelo Pai é protegido pelo Filho: “Esta é a vontade daquele que me enviou: que eu não perca nenhum dos que ele me deu, mas os ressuscite no último dia”. Quando o Filho recebe aqueles que são atraídos pelo Pai, ele os mantém seguros, garantindo que um dia serão ressuscitados para a vida eterna (cf. Jo 5.29). Quando o Filho ressuscitar aqueles que vão servi-lo eternamente, cumprirá o propósito do plano que Deus fizera na eternidade passada. Como Jesus diz no versículo 38: “Desci dos céus, não para fazer a minha vontade [não para cumprir algum plano que eu mesmo tenha feito], mas para fazer a vontade daquele que me enviou”. Jesus explica no versículo 39 que este plano abrange a ressurreição futura de todos aqueles que o Pai lhe deu. Sem contestação, a doutrina da segurança eterna é inerente a essa discussão porque é construída dentro do plano. Cristo protege os que foram escolhidos pelo Pai. Ele jamais perderá algum deles, porque eles são presentes de amor que o Pai lhe deu. Eles são preciosos, não devido à sua agradabilidade inerente, mas por causa da agradabilidade de Deus, que os deu. Por isso o Filho os mantém seguros, razão pela qual “nem morte, nem vida, nem anjos nem demônios, nem


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o presente nem o futuro, nem quaisquer poderes, nem altura nem profundidade, nem qualquer outra coisa na criação será capaz de nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8.38,39). Essa verdade profunda é reiterada em João 17. Tendo a cruz somente algumas poucas horas de distância, Jesus sabia que ia experimentar um período de separação do Pai (cf. Mt 27.46), no qual ia ter sobre si a ira de Deus pelo pecado (cf. Is 53.10; 2Co 5.21). Reconhecendo que não poderia proteger os seus naquele momento, confiou essa salvaguarda ao próprio Pai que lhos tinha dado. Nos versículos 9 a 15, Jesus implora a seu Pai com estas palavras: Eu rogo por eles. Não estou rogando pelo mundo, mas por aqueles que me deste, pois são teus. Tudo o que tenho é teu, e tudo o que tens é meu. E eu tenho sido glorificado por meio deles. Não ficarei mais no mundo, mas eles ainda estão no mundo, e eu vou para ti. Pai santo, protege-os em teu nome, o nome que me deste, para que sejam um, assim como somos um. Enquanto estava com eles, eu os protegi e os guardei no nome que me deste. Nenhum deles se perdeu, a não ser aquele que estava destinado à perdição, para que se cumprisse a Escritura. Agora vou para ti, mas digo estas coisas enquanto ainda estou no mundo, para que eles tenham a plenitude da minha alegria. Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, pois eles não são do mundo, como eu também não sou. Não rogo que os tires do mundo, mas que os protejas do Maligno.

No contexto, Jesus ora pelos seus que estão no mundo. Ele reconhece que os redimidos são aqueles que o Pai lhe deu, e reitera que ele foi fiel na proteção e preservação deles. Mas agora, como vem à cruz, pede ao Pai que os proteja no momento em que não poderá fazê-lo. Na única ocasião, em toda a história da redenção, em que haveria, em potencial, oportunidade para o maligno interromper o plano divino, o Filho confia os redimidos ao cuidado vigilante e amoroso de seu Pai. Como Jesus, falando sobre suas ovelhas, tinha


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declarado anteriormente: “Meu Pai, que as deu para mim, é maior do que todos; ninguém as pode arrancar da mão de meu Pai” (Jo 10.29). O Filho estava confiante que os seus estariam seguros na impenetrável e forte mão do Pai. Em João 17.24, Jesus continua orando e pede: “Pai, quero que os que me deste estejam comigo onde eu estou e vejam a minha glória, a glória que me deste porque me amaste antes da criação do mundo”. Aqui o objetivo glorioso do presente de amor do Pai ao Filho é inequívoco – que a magnificente glória do Filho seja enaltecida e exaltada pelos redimidos. A motivação do Pai para dar tal presente também é clara – evidenciar o amor que tinha pelo Filho antes do mundo ser criado. Evidentemente, há um agudo sentido em que a doutrina da eleição está muito além da nossa capacidade finita de compreender. Somos apanhados por insondáveis e inexprimíveis expressões intra-trinitárias de amor. E, quando nos são dados diminutos vislumbres do propósito divino subjacente à eleição, somos repetidamente levados a lembrar que a salvação diz respeito a algo muito maior do que a nossa felicidade pessoal. Em Romanos 8.29,30 nos é dada outra janela inspirada que se abre para esta realidade imensurável. Paulo escreve: “Pois aqueles que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, também chamou; aos que chamou, também justificou; aos que justificou, também glorificou”. Embora se possa dizer muita coisa sobre esses versículos, dois pontos são de primordial importância quanto à doutrina da eleição. Primeiro, quando Deus nos predestinou por seu propósito eletivo, não o fez meramente para o início da nossa salvação, mas também para o fim dela. Não fomos escolhidos só para sermos justificados. Fomos escolhidos para sermos glorificados. A fraseologia de Paulo não poderia ser mais simples e direta. O que Deus começou na eleição, continua através da vocação e da justificação, e, inevitavelmente, redundará na glorificação. O processo, que é efetuado por Deus, é imune à prova, porque é ele quem está por trás. Segundo, o propósito não é só Deus salvar uma humanidade escolhida e redimida, a qual glorificará e servirá o Filho para sempre; Ele está tornando os


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eleitos semelhantes ao Filho. Os redimidos em Cristo vão sendo conformados à sua imagem, o que não se realizará plena e finalmente enquanto não se der a glorificação deles (1Jo 3.2; Fp 3.20,21). Tem-se dito acertadamente que a imitação é a mais alta forma de louvor, pois esta será o supremo tributo dado ao Filho – Ele será o Primeiro e o Principal entre muitos que terão sido feitos semelhantes a ele. Os eleitos refletirão a sua bondade, porque serão semelhantes a ele, e proclamarão a sua grandeza quando o servirem incessantemente, por toda a eternidade. A ELEIÇÃO DIVINA E O PAPEL DO FILHO Em 1Coríntios 15.25-28, vemos uma notável conclusão de toda essa discussão. Ali Paulo diz: Pois é necessário que ele [Cristo] reine até que todos os seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte. Porque ele “tudo sujeitou debaixo de seus pés”. Ora, quando se diz que “tudo” lhe foi sujeito, fica claro que isso não inclui o próprio Deus, que tudo submeteu a Cristo. Quando, porém, tudo lhe estiver sujeito, então o próprio Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, a fim de que Deus seja tudo em todos. Referindo-se ao fim dos séculos, esta passagem nos revela que virá o dia em que Cristo, o Rei dos reis, assumirá seu legítimo trono e reclamará o universo, que lhe pertence. Nesse tempo, tudo será posto em sujeição a ele, a morte inclusive, e todos os redimidos serão reunidos na glória, alegrando-se na plenitude da adoração eterna. Quando tudo isso for feito, “então o próprio Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou [referindo-se ao Pai], a fim de que Deus seja tudo em todos”. Noutras palavras, quando o presente de amor completo, de uma humanidade redimida, tiver sido dado a Jesus Cristo, ele tomará essa humanidade redimida e, incluindo-se neste presente, dará tudo de volta ao Pai, como uma expressão recíproca do amor infinito do Pai. Naquele momento, os propósitos redentores de Deus serão concretizados plenamente. Segue-se, pois, que a doutrina da eleição está no verdadeiro coração da história da redenção. Não se trata de alguma doutrina insignificante, esotérica, que


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poderia ser trivializada ou relegada a debates nas salas de aulas dos seminários. Antes, ela é o centro pelo qual podemos entender a salvação e a igreja. A doutrina da eleição informa, instrui, modela a nossa evangelização, a nossa pregação e a nossa identidade como corpo de Cristo. Também nos ajuda a entender por que Cristo leva tão a sério a sua noiva, a igreja – esta é o presente de amor que o Pai lhe deu. A igreja é tão preciosa para Cristo, que ele se dispôs a suportar grandes tribulações e finalmente a sofrer a morte para receber o presente. “[O Filho] sendo rico, se fez pobre por amor de vocês, para que por meio de sua pobreza, vocês se tornassem ricos” (2Co 8.9; cf. Fp 2.5-11). Ele deixou de lado infinitas riquezas espirituais para que os seus eleitos herdassem essas mesmas riquezas (cf. Rm 8.17). Ele acatou a mais profunda pobreza possível, despindo-se de tudo o que lhe propiciava perfeito bem-estar e do uso independente dos seus atributos divinos, escolhendo abraçar a penalidade do pecado mediante seu sacrifício na cruz. Como Paulo explica: “Deus [o Pai] tornou pecado por nós aquele [o Filho] que não tinha pecado, para que nele nos tornássemos justiça de Deus” (2Co 5.21). Jesus não era culpado de coisa alguma. Contudo, na cruz, o Pai o tratou como se ele tivesse cometido pessoalmente todos os pecados cometidos por todos os indivíduos que creram ou que viriam a crer. Apesar de isento de culpa, enfrentou a fúria total da ira de Deus, sofrendo a penalidade do pecado em favor daqueles que veio salvar. Desse modo, o Filho de Deus, sem pecado, tornou-se o substituto perfeito dos filhos dos homens, pecadores. Como resultado do sacrifício de Cristo, os eleitos se tornaram a justiça de Deus nele. Do mesmo modo como o Pai tratou o Filho como pecador, mesmo sendo ele sem pecado, o Pai agora trata os crentes, mesmo pecadores, como justos. Jesus trocou sua vida pelos pecadores a fim de cumprir o plano eletivo de Deus. E o fez para que, no fim, pudesse dar de volta ao Pai o presente de amor que o Pai lhe deu. Meditando nestas verdades, nós nos vemos atirados nas imensuráveis profundezas dos planos e dos propósitos de Deus. Como Paulo exclamou em Romanos 11.33-36:


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Ó profundidade da riqueza da sabedoria e do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos e inescrutáveis os seus caminhos! “Quem conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi seu conselheiro?” “Quem primeiro lhe deu, para que ele o recompense?” Pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre. Amém. Tomados de temor e maravilhados, aqueles que amam a Deus só podem reagir com profundo desejo de adoração e humilde submissão. Eles sentem necessidade de louvá-lo por sua misericórdia, graça e glorioso propósito, que planejou isso tudo desde o início do tempo. E sentem necessidade de submeter-se à sua soberania, não somente no universo em geral, mas também nos mínimos pormenores de suas vidas diárias. Esse é o papel que eles desempenham como parte do presente de amor dado pelo Pai ao Filho. Que o adorem e o sirvam é o propósito estabelecido para eles desde a eternidade passada. E é isso que eles continuarão a fazer perfeitamente, no inefável gozo da glória eterna. A realidade é, pois, que os crentes são simplesmente uma diminuta parte de um plano divino muito maior. O Pai, por causa do seu amor pelo Filho, determinou-se, antes do princípio do tempo, a escolher uma comunidade redimida que louvaria o Filho por toda a eternidade. E o Filho, devido a seu amor pelo Pai, aceitou este presente de amor do Pai, considerando-o precioso a ponto de entregar sua vida por ele. O Filho protege aqueles que o Pai escolheu para lhe dar, e promete levá-los para a glória, em conformidade com o predeterminado plano de Deus. A LONGA LINHA DE VULTOS PIEDOSOS A história é o desdobramento deste plano de Deus – pois aqueles que ele escolheu são chamados, justificados e glorificados por meio da pessoa e obra do Filho. A história começou quando Deus criou o tempo e o espaço de acordo com o seu plano redentor eterno. E terminará quando todos os seus propósitos para a sua criação forem concretizados de acordo com esse mesmo plano eterno. Não surpreendentemente, os servos de Deus, através de toda a história, têm entendido e abraçado essa realidade. Desde Moisés até o presente, tem havi-


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do, verdadeiramente, uma longa linha de vultos piedosos que demonstram essa certeza tanto com suas palavras como com suas vidas. Tais servos de Deus são os nossos heróis da fé. Mas não é sua grandeza inerente que aplaudimos. Antes, é a grandeza e a glória do seu soberano Deus, refletidas em suas vidas e em seu ensino, que somos constrangidos a aplaudir. O tema destes volumes é, então, o caráter e a fidelidade de Deus nas doutrinas da graça. No Volume 1, Steven Lawson, clara e compreensivamente, lança o alicerce escriturístico para as doutrinas da graça. Este volume nos dá a base bíblica de tudo o que se segue. Os Volumes 2 a 5 erguem-se como colunas sobre aquele firme fundamento – registrando os ecos da revelação divina através da história da igreja. No transcurso da obra, logo se torna patente que os escritores da Escritura, e os intérpretes que se lhes seguiram, sustentaram e ensinaram os mesmos dogmas imutáveis que constituem a salvação divina e soberana. Quando você ler os relatos sobre esses homens piedosos, ficará maravilhado, não pelo talento e pela habilidade deles, nem pelas circunstâncias singulares em que se achavam, mas por sua coerência em praticar e proclamar a mesma divina verdade das doutrinas da graça. Por conseguinte, a obra Longa Linha de Vultos Piedosos não é primariamente sobre homens, mas sim sobre o Deus de quem esses homens testificam. Enquanto que os homens piedosos vêm e passam, como qualquer exame da história mostra claramente, o Deus que falou através deles nunca muda, e tampouco muda a sua mensagem. É isso que torna a obra produzida por Lawson tão rica e edificante. O Deus de Moisés, o Deus de Pedro, o Deus de Crisóstomo, o Deus de Lutero, o Deus de Edwards, o Deus de Spurgeon, e o Deus a quem servimos atualmente, manda-nos proclamar as verdades imutáveis firmadas no passado. A imutabilidade de Deus e a eternidade das suas verdades, particularmente da doutrina da eleição soberana, formam a pedra angular dessa história. John MacArthur Los Angeles, 2006



Prefácio

A VERTENTE CONTINENTAL DA TEOLOGIA

A

través das regiões ocidentais da América do Norte, corre uma linha geográfica imaginária que determina o fluxo das correntes para os oceanos. Essa linha é conhecida pelo nome de Vertente Continental. Em última instância, a precipitação que cai no lado oriental desta grande vertente flui para o Oceano Atlântico. De igual modo, a água que cai nos declives que ficam a oeste, avoluma-se na direção oposta até esvaziar-se finalmente no Oceano Pacífico. É desnecessário dizer que um vasto continente separa essas imensas massas de água. Parece um tanto forçado ponderar que uma gota de chuva que cai no topo de uma montanha no Colorado fluirá para o Pacífico, ao passo que outra gota, caindo a uma diminuta distância da primeira, fluirá para o Atlântico. Não obstante, uma vez que a água se derrame num lado particular desta grande vertente, seu trajeto está determinado e sua direção é imutável.


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A geografia não é o único lugar em que encontramos uma grande vertente. Há, também, um elevado terreno que corre através da história da igreja – uma Vertente Continental da teologia. Esta grande vertente separa duas correntes distintamente diferentes de pensamento que fluem em direções opostas. Para ser específico, este elevado terreno determinativo é a teologia que se adota sobre Deus, o homem e a salvação. Este é o mais alto de todos os pensamentos, e divide toda a doutrina em duas escolas. Historicamente, os dois modos de pensamento acerca de Deus e de sua graça soberana têm recebido vários nomes. Alguns os identificam como agostinianismo e pelagianismo. Outros os têm denominado calvinismo e arminianismo. Ainda outros os definem como reformados e católicos, enquanto outros têm empregado os termos predestinação e livre-arbítrio. Mas, seja qual for o nome, estas correntes são determinadas pela Vertente Continental da teologia. Esta vertente metafórica difere da Vertente Continental geográfica em um aspecto-chave. Ao passo que as correntes que fluem para oeste e para leste, vindas das Montanhas Rochosas, descem gradativamente às planícies e às terras baixas onde encontram os oceanos, o terreno nos dois lados da vertente doutrinária é muito diferente. Em um lado, encontramos as sólidas terras altas da verdade. No outro estão os declives íngremes e escarpados das meias verdades e do erro total. Através dos séculos, os períodos de reforma e de avivamento da igreja surgem quando a graça soberana de Deus é proclamada abertamente e ensinada claramente. Quando um alto conceito de Deus era infundido nos corações e nas mentes do povo de Deus, a igreja se assentava nos elevados planaltos da verdade transcendental. Essa alta base é o calvinismo – a alta base para a igreja. As excelsas verdades que fluem da soberania de Deus propiciam a maior e mais grandiosa visão de Deus. As doutrinas da graça se prestam para elevar a vida da igreja em todos os seus aspectos. O grande teólogo de Princeton, Benjamin Breckenridge Warfield, escrevendo há mais de um século, observou perceptivamente: “O mundo deve compreender com maior clareza que o mo-


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vimento realmente evangélico permanece ou cai no calvinismo”.1 À primeira vista, essa declaração surpreendente pode parecer um exagero, ou até uma hipérbole. Mas, quanto mais o interessado ponderar sobre ela, mais perceberá que o legítimo movimento evangélico – essa parte do corpo de Cristo que corretamente adere à inerrância da Escritura, com plena aceitação das doutrinas da depravação total do homem e da soberania de Deus em todos os aspectos da vida – sempre tem necessidade das doutrinas ligadas à soberania de Deus para poder ancorar em base firme e elevada. Pois, sem os ensinos da verdade reformada concernente à soberania de Deus na salvação do homem, a igreja se enfraquece e se torna vulnerável, para logo começar o inevitável declínio, descambando para crenças inferiores, quer se dê conta disso quer não. Sempre que a igreja se torna crescentemente centralizada no homem, começa a deslizar ladeira abaixo, muitas vezes sem recuperação, e sempre em seu detrimento. Assim que a igreja desiste da elevada base do calvinismo, uma igreja absorta em si mesma põe todo o seu peso na escorregadia encosta do arminianismo, resultando na perda da sua estabilidade fundamental. Tragicamente, porém, é raro a descida parar ali. Historicamente, a doutrina centrada no homem só tem servido como um catalisador que conduz a uma queda ainda maior. Com a arriscada descida pelos escorregadios declives do arminianismo, logo se vê a igreja afundar cada vez mais num tenebroso atoleiro de ideias heréticas. Inevitavelmente, essa descida abre caminho para o liberalismo, com sua completa rejeição da autoridade absoluta da Escritura. Do liberalismo – dando-se tempo suficiente – a igreja sempre mergulha mais fundo, indo parar no ecumenismo, essa filosofia mortal que abraça todas as religiões considerando-as como tendo alguma parte da verdade. Continuando essa espiral descendente, a igreja cai no universalismo, a condenável crença em que finalmente todos os homens serão salvos. Pior ainda, o universalismo abre caminho para o agnosticismo, a degenerada ideia segundo a qual não se pode nem saber se existe um Deus. Por 1  B. B. Warfield, citado em The Sovereignty of God (A soberania de Deus), de Arthur C. Custance (Phillipsburg, NJ: Presbyterian & Reformed, 1979), 83-84.


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último, a igreja cai no abismo mais profundo – nas chamas infernais do ateísmo, a crença em que não existe Deus. A apresentação das sublimes verdades do calvinismo neste livro é uma tentativa de restabelecer o firme alicerce da igreja no excelso fundamento que outrora ela mantinha e defendia. Os capítulos que se seguem foram projetados estrategicamente para manterem firmes os pés da igreja no ápice de toda a verdade centrada em Deus: as doutrinas da graça. Em cada porção da Escritura, examinaremos o que historicamente tem sido identificado como os cinco pontos do calvinismo: depravação total, eleição incondicional, expiação limitada, graça irresistível, e perseverança dos santos. Examinaremos virtualmente todos os textos que ensinam cada uma dessas doutrinas principais e, ao fazê-lo, fortaleceremos as nossas convicções e consideraremos o seu poder de transformar a vida do crente. Sopesaremos cuidadosamente o modo como elas elevam drasticamente os ministérios, expandem as missões, e, subsequentemente, alteram o curso da história. Nunca foi maior a necessidade de que as verdades relacionadas com a graça soberana sejam estabelecidas firmemente na igreja. O pensamento da igreja acerca de Deus necessita desesperadamente fluir na direção certa. Os adoradores pensam como a igreja pensa; e como a igreja adora, assim ela vive, serve e evangeliza. O correto conceito da igreja sobre Deus e sobre a operação da sua graça modela tudo o que é vital e importante. A igreja precisa recapturar a sua elevada visão de Deus e, com isso, ancorar na sólida rocha da absoluta supremacia divina em todas as coisas. Só então ela terá uma orientação teocêntrica em todas as questões do ministério. Esta, creio eu, é a desesperada necessidade da presente hora. Embarquemos agora nessa busca que visa exaltar Deus e honrar Cristo. Em última análise, o nosso conceito de Deus está em jogo. O conceito que dele temos afeta tudo. Elevemos o nosso Deus em nossos corações ao lugar mais alto, o qual pertence exclusivamente a ele. Somente a Deus seja a glória para todo o sempre. Amém. Steven Lawson Mobile, 2006




reconhecimentos Quero expressar a minha mais profunda gratidão ao Dr. John MacArthur. Durante vinte e cinco anos, o Dr. MacArthur tem aguçado a minha mente e alimentado a minha alma por meio da sua exposição teocêntrica das Escrituras. Seu prólogo para este volume, “A Imutabilidade Divina e as Doutrinas da Graça”, é, creio eu, inestimável. Também quero agradecer as palavras do Dr. R. C. Sproul, cuja influência pessoal sobre a minha vida tem sido profunda. Durante os anos dos meus estudos para o doutorado, sentei-me para ouvi-lo, e cada uma de suas aulas ficou vividamente gravada em minha mente. Que ele tenha contribuído com o epílogo deste volume me torna humildemente e grato. Um grupo especial de pessoas ajudou a tornar realidade a obra Fundamentos da Graça. Primeiro, devo mencionar os homens da Igreja Batista Comunidade de Cristo (Christ Fellowship Baptist Church), que se reuniam comigo todas as sextas-feiras de manhã por um ano inteiro de estudo das verdades destes capítulos. O compromisso deles com as doutrinas da graça me animaram grandemente. Greg Bailey, editor-chefe da Editora Ligonier’s Reformation Trust, emprestou seus atentos olhos e sua habilidosa mão aos originais, melhorando a acurácia e tornando a leitura mais agradável. Chris Larson, o criativo diretor do ministério “Ligonier”, é responsável pelos chamativos gráficos e pela atraente apresentação deste livro.


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Meu filho James Lawson fez considerável pesquisa no interesse deste livro. Keith Phillips, Chuck Finster, Chris Barksdale e Rick Holland, e seus alunos no Seminário do Mestre (The Master’s Seminary), fizeram, todos eles, úteis contribuições. Kay Allen, minha assistente executiva, desempenhou um papel especialmente significativo digitando todo o manuscrito e coordenando tudo, do começo ao fim. Muito importante: Quero prestar meus agradecimentos à minha esposa, Anne, e aos nossos quatro filhos, Andrew, James, Grace Anne e John, por seu imorredouro amor, aguentando-me em minha pregação destas verdades que exaltam o soberano Deus. Soli Deo Gloria.



Não é uma novidade, então, que eu estou pregando; não é nenhuma nova doutrina. Gosto de proclamar essas velhas e fortes doutrinas, que levam o apelido de CALVINISMO, mas que são, certa e verdadeiramente, a verdade revelada de Deus como se vê em Cristo Jesus. Por meio desta verdade, eu faço uma peregrinação no passado, e, conforme vou caminhando, vejo, pai após pai, confessante após confessante, mártir após mártir, se levantarem para apertar minhas mãos.... Assumindo estas coisas como o padrão da minha fé, vejo a terra dos antigos cheia de irmãos meus: contemplo multidões que confessam as mesmas coisas que eu confesso, e reconheço que esta é a religião da igreja de Deus.1 Charles H. Spurgeon

1  Charles H. Spurgeon, citado por David Steele e Curtis Thomas em The Five Points of Calvinism (Phillipsburg, NJ: Presbyterian & Reformed, 1963), 8.


Capítulo 1

LONGA LINHA DE VULTOS PIEDOSOS SERVOS DA GRAÇA SOBERANA: DE MOISÉS AO PRESENTE

C

omeçando com o antigo profeta Moisés e cruzando os trinta e cinco séculos passados até a presente hora, compareceu ao palco da história humana uma longa linha de homens piedosos, que mantiveram erguida a bandeira real das doutrinas da graça em suas respectivas gerações. Esses defensores modelares da soberania da graça de Deus compõem uma nobre procissão que se tem mantido inquebrável e ininterrupta durante milênios. Eles se levantam como um só – como um na verdade, na fé, nas doutrinas da graça. Embora tendo divergências em áreas secundárias do entendimento bíblico, não obstante falam com uma só voz sobre os temas principais de interesse doutrinário, a saber, sobre a suprema soberania pela qual Deus designou a graça salvadora para pecadores não merecedores e, contudo, escolhidos. E, o que é mais marcante, cada homem apareceu na história precisamente no tempo determinado por Deus, e cada um deles testificou a soberania divina na salvação do homem.


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Quem são esses grandes homens da história? Eles foram os pregadores mais fascinados por Deus do seu tempo, os mestres mais saturados pela Palavra da sua época, os homens que, na maior parte, marcaram os seus tempos em sua ênfase na glória de Deus. Eles foram os heróis da fé, as colunas mais sólidas da igreja, homens que impactaram nações e influenciaram continentes por e para Cristo, homens que fizeram eclodir reformas e que acenderam despertamentos espirituais. Eles foram os valentes guerreiros do reino de Deus, que traduziram as Escrituras para as línguas maternas dos seus respectivos povos – e que foram presos a estacas e queimados por realizarem esse trabalho. Foram homens que fundaram denominações baseadas na Bíblia e lançaram missões para a propagação do Evangelho – homens que legaram um impacto eterno sobre a vida da igreja. Eles estão entre os mais estimados pastores, os mais distinguidos teólogos e os mais prolíficos escritores das suas respectivas gerações. Eles foram os evangelistas mais apaixonados, eruditos professores e veneráveis presidentes de colégios e seminários bíblicos – homens que defenderam o padrão das sãs palavras. São os homens que foram os verdadeiros campeões das doutrinas da graça. Nós testificamos sua marcha para o palco da história, sendo o mundo o seu teatro e a Escritura as suas linhas repassadas. Incontáveis números desses homens apareceram nos momentos mais prementes do registro divino, nos dias em que a igreja estava mais fraca. Foi em tais períodos que esta longa linha de vultos piedosos se afinou mais. Contudo, no meio dos tenebrosos dias de erro doutrinário, eles permaneceram fiéis à Palavra de Deus e à sua mensagem, ousando até marchar fora do passo, destoando da cadência dos tempos. Estes resistentes mensageiros da verdade foram, deste ou daquele modo, os pequenos gonzos sobre os quais as grandes portas da historia da redenção giraram, levando a igreja inevitavelmente de volta ao sol nascente de uma brilhante manhã. Similarmente, nos períodos das maiores reformas e dos maiores avivamentos da igreja, eles se puseram resolutamente à testa como verdadeiros arautos, proclamando a veracidade da soberania de Deus na salvação dos homens para que todos ouvissem. Século após século, a inquebrável sucessão de valentes espiri-


Longa Linha de Vultos Piedosos

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tuais foi aumentando suas fileiras até se tornar uma grandiosa e imensa parada – uma longa linha de vultos piedosos, ininterrupta e intacta. UM ALTO CONCEITO DA SOBERANIA DE DEUS Qual é esse distante retumbar de tambores pelo qual estes homens marcham? O que os compele a mover-se para diante mais e mais, por Deus e por suas gerações? Que é que os impulsiona a capturar suas horas para Cristo? Que é que incendeia suas almas fazendo-as arder de paixão por ele e fazendo delas fulgentes tochas da verdade nas suas respectivas épocas? A resposta é clara e impositiva. Eles foram totalmente dominados por um alto conceito da soberania de Deus. Com uma transcendental e triunfante visão de Deus governando supremamente todas as coisas, compreenderam um exército de expositores e mestres, trombeteando o reinado sem rival de Deus sobre céu e terra. É isto que os torna extraordinariamente grandes. É que eles pregam um Deus infinitamente grande, grande em santidade e grande em soberania. A grandeza destes homens não se acha neles, mas no ser supremo que os chamou para o seu glorioso emprego. Esses homens creem que Deus é Deus, não meramente no nome, mas também numa viva realidade. São eles os fiéis mensageiros que se agarram à verdade central de que Deus fala, e o que ele diz certamente se torna realidade. Eles proclamam que o que Deus se propõe realizar, acontece. Eles declaram que Deus chama, e é atendido. Eles marcham como arautos, anunciando que Deus planeja e cumpre o que planejou. Não há força que possa resistir ao soberano Deus, nem no céu, nem na terra, nem debaixo da terra. Ele pronuncia o fim desde o princípio. Seu propósito será estabelecido infalivelmente. A mensagem destes homens funda-se no testemunho inequivocamente claro da Escritura de que Deus é soberano sobre todas as coisas. Com esse fim os salmistas escrevem: “O Senhor desfaz os planos das nações e frustra os propósitos dos povos. Mas os planos do Senhor permanecem para sempre, os propósitos do seu coração, por todas as gerações” (Sl 33.10,11); “O Senhor reina! Vestiu-se de majestade; de majestade vestiu-se o Senhor e armou-se de poder! O mundo está


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firme e não se abalará. O teu trono está firme desde a antiguidade; tu existes desde a eternidade” (Sl 93.1,2); “O Senhor estabeleceu o seu trono nos céus, e como rei domina sobre tudo o que existe” (Sl 103.19); “O nosso Deus está nos céus, e pode fazer tudo o que lhe agrada” (Sl 115.3); e “O Senhor faz tudo o que lhe agrada, nos céus e na terra, nos mares e em todas as suas profundezas” (Sl 135.6). Pode alguma coisa ser mais clara? O que quer que Deus queira, ele faz. A sabedoria de Salomão faz ressoar este mesmo domínio inescrutável de Deus. Salomão escreve: “Muitos são os planos no coração do homem, mas o que prevalece é o propósito do Senhor” (Pv 19.21); “Os passos do homem são dirigidos pelo Senhor. Como poderia alguém discernir o seu próprio caminho?” (Pv 20.24); “O coração do rei é como um rio controlado pelo Senhor; ele o dirige para onde quer” (Pv 21.1); e “Não há sabedoria alguma, nem discernimento algum, nem plano algum que possa opor-se ao Senhor. Prepara-se o cavalo para o dia da batalha, mas o Senhor é que dá a vitória” (Pv 21.30,31). O profeta Isaías proclamou a soberania incondicional de Deus sobre todos os acontecimentos, sobre todas as circunstâncias e sobre todos os povos. Deus pessoalmente, por intermédio de Isaías, diz: “Desde os dias mais antigos eu o sou. Não há quem possa livrar alguém de minha mão. Agindo eu, quem o pode desfazer?” (Is 43.13). “Eu sou Deus, e não há nenhum outro; eu sou Deus, e não há nenhum como eu. Desde o início faço conhecido o fim, desde tempos remotos, o que ainda virá. Digo: Meu propósito permanecerá em pé, e farei tudo o que me agrada... o que eu disse, isso eu farei acontecer; o que planejei, isso farei” (Is 46.911); e “Por amor de mim mesmo, por amor de mim mesmo, eu faço isso... Não darei a minha glória a nenhum outro” (Is 48.11). Não há como entender mal esses versículos: Deus fará tudo o que planeja e todo o seu propósito será cumprido. O profeta Daniel e os mais poderosos governantes do seu antigo tempo afirmavam essa mesma altaneira soberania de Deus. Daniel registrou as palavras de Nabucodonosor, rei da Babilônia: “O Altíssimo domina sobre os reinos dos homens e os dá a quem quer, e põe no poder o mais simples dos homens” (Dn 4.17). Nabucodonosor confessou humildemente: “O seu domínio é um domínio


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eterno; o seu reino dura de geração em geração. Todos os povos da terra são como nada diante dele. Ele age como lhe agrada com os exércitos dos céus e com os habitantes da terra. Ninguém é capaz de resistir à sua mão ou dizer-lhe: ‘O que fizeste?’” (Dn 4.34,35). Dario, rei dos medos e dos persas, exaltou Deus proclamando: “Pois ele é o Deus vivo e permanece para sempre; o seu reino não será destruído, o seu domínio jamais acabará. Ele livra e salva; faz sinais e maravilhas nos céus e na terra” (Daniel 6.26,27). Com grandeza de tirar o fôlego e com esplendor de quebrar o queixo, esse é o grande e temível Deus que esses grandes homens proclamavam. Eles tonitruavam acerca de um Deus tão gloriosamente soberano que nada ou ninguém lhe pode fazer resistência com sucesso, nem o céu, nem o inferno, nem Satanás e os anjos caídos, nem o homem e os anjos eleitos. Eles registraram seus testemunhos sobre um Deus que é Criador, Controlador, Sustentador e Determinador de tudo quanto há. Em resumo, eles proclamavam um Deus altíssimo em supremacia, um Deus que governa a história e ordena o fim desde o princípio. Esse é o Deus que eles defendiam diante dos olhos atentos do mundo inteiro. Eles procuravam cumprir fielmente os termos do urgente apelo do salmista: “Digam entre as nações: ‘O Senhor reina!’” (Sl 96.10). Alguém ainda se espanta ou duvida que Deus abençoou e abençoa os seus esforços? A SOBERANIA DE DEUS NA SALVAÇÃO As doutrinas da graça compõem um sistema coeso de teologia no qual a soberania é claramente demonstrada na salvação dos pecadores eleitos. Não só se reconhece que Deus reina sobre toda a história humana, micro e macro, mas também que ele é soberano na dispensação da sua graça salvadora. De Gênesis a Apocalipse, Deus é apresentado na Escritura como absolutamente determinativo em outorgar a sua misericórdia. Ele é exposto como tendo escolhido desde antes da fundação do mundo aqueles que quer salvar, e depois, dentro da história, fazendo isso acontecer. O apóstolo Paulo anunciou claramente a graça soberana de Deus na salvação do homem. Ele escreveu que, desde a eternidade, Deus escolheu,


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quis, decidiu e planejou salvar alguns pecadores. Eleger é escolher, e Deus escolheu os que seriam salvos. Paulo escreveu: “Pois ele diz a Moisés: ‘Terei misericórdia de quem eu quiser ter misericórdia e terei compaixão de quem eu quiser ter compaixão’. Portanto, não depende do desejo ou do esforço humano, mas da misericórdia de Deus.” (Rm 9.15-16). Isso equivale a dizer que Deus decide quem vai salvar a fim de manifestar sua glória: “Deus nos escolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença. Em amor nos predestinou para sermos adotados como filhos, por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade” (Ef 1.4,5); “Sabemos, irmãos, amados de Deus, que ele os escolheu” (1Ts 1.4); “Deus os escolheu como seus primeiros frutos para serem salvos mediante a obra santificadora do Espírito e a fé na verdade” (2Ts 2.13); Deus “nos salvou e nos chamou com uma santa vocação, não em virtude das nossas obras, mas por causa da sua própria determinação e graça. Esta graça nos foi dada em Cristo Jesus desde os tempos eternos” (2Tm 1.9); e “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo, para levar os eleitos de Deus à fé” (Tt 1.1). Os apóstolos Pedro e João ensinavam precisamente a mesma autoridade suprema de Deus na salvação dos eleitos. Pedro escreveu: “Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos de Deus, peregrinos dispersos no Ponto, na Galácia, na Capadócia, na província da Ásia e na Bitínia” (1Pe 1.1); e: “Portanto, irmãos, empenhem-se ainda mais para consolidar o chamado e a eleição de vocês” (2Pe 1.10). O apóstolo João escreveu: “A besta que você viu, era e já não é. Ela está para subir do Abismo e caminha para a perdição. Os habitantes da terra, cujos nomes não foram escritos no livro da vida desde a criação do mundo, ficarão admirados quando virem a besta, porque ela era, agora não é, e entretanto virá” (Ap 17.8). A GLÓRIA DE DEUS É PRIMORDIAL Neste sistema de teologia, a glória de Deus é central. Assim como todos os planetas giram em torno do fulgurante sol, todas as verdades da graça soberana fazem sua rotação ao redor de um único ponto fixo – a glória de Deus. A


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preeminência de Deus, sem rival, permanece firme no ponto focal do universo teológico. Que Deus deve ser reconhecido como o principal objeto de louvor na manifestação da sua graça é o que energiza esse sistema solar da verdade. Assim como a bússola sempre aponta para o norte, assim também as doutrinas da graça apontam constantemente para cima, para as excelsas altitudes da glória de Deus. Que é a glória de Deus? A Bíblia fala da glória de Deus em dois aspectos primaciais. Primeiro fala da glória intrínseca de Deus, que é a soma total de todos os atributos e perfeições divinas. Essa glória intrínseca é quem Deus é – sua grandeza infinitamente vasta. Glória, no Antigo Testamento (kabod), originariamente significava “peso”, “importância”, ou “significação”. Passou depois a representar a maravilhosa magnificência de certos objetos, tais como o esplendoroso sol e a régia majestade ostentada pelos reis. Daí, o termo glória veio a ser empregado para descrever o magnífico esplendor e o formidável fulgor de Deus revelados ao homem. No Novo Testamento a palavra para “glória” é doxa, que significa “uma opinião” ou “uma estimativa” sobre algo. Quando empregada com referência à reputação de alguém, significa “importância”, “grandeza”, “renome”, ou “significação”. A glória intrínseca de Deus é a revelação da grandiosidade dos seus atributos às suas criaturas. Envolve a grandeza e a magnificência de Deus manifestada aos pecadores, especialmente na salvação do homem do jugo do pecado. Ninguém pode acrescentar coisa alguma à glória intrínseca de Deus. Deus é quem ele é, nunca diminuindo, nunca aumentando, sendo sempre o mesmo, o soberano Governador que conhece tudo, Todo-Poderoso, presente em toda arte, absolutamente verdadeiro, sábio, amoroso, dadivoso em conceder sua graça, misericordioso, justo e irado. É essa glória intrínseca que a Deus apraz dar a conhecer às suas criaturas. Segundo, a Bíblia fala também da glória atribuída a Deus, ou seja, a glória que se lhe dá. Doxa também se relaciona com o ato de expressar louvor a Deus baseado na revelação da sua majestade suprema. A única resposta correta à manifestação das perfeições de Deus consiste, necessariamente, em dar glória a Deus.


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O homem deve apresentar-lhe o louvor devido a seu nome. Deve prestar-lhe o culto que pertence exclusivamente a ele. A manifestação da glória intrínseca de Deus move o homem a atribuir glória a Deus. Quanto mais o homem contempla a glória intrínseca de Deus na salvação, mais o homem atribui glória a Deus. Esta é, pois, a peça central do propósito salvífico de Deus no universo – a revelação e o engrandecimento da sua glória. É isto que está no centro do ser de Deus – o apaixonado empenho em demonstrar o seu esplendor para a sua própria glória. É isto que deve estar no centro de toda a vida humana – a promoção da glória de Deus, isto é, a contemplação e a adoração da sua glória. Isto é primário na salvação de todo pecador perdido – a revelação da glória de Deus para que os pecadores se regozijem nela. Não admira que o apóstolo Paulo tenha escrito: “Pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre! Amém” (Rm 11.36). É MANIFESTA NAS DOUTRINAS DA GRAÇA Essa resplendente glória intrínseca de Deus, formidável e magnífica, manifesta-se mais plenamente nas doutrinas da graça. E nesta ordem da verdade, a glória atribuída é mais livre e plenamente dada a Deus. Aqui todos os três membros da Divindade – Deus o Pai, Deus o Filho e Deus o Espírito Santo – trabalham juntos como um só salvador, indivisivelmente unidos na obra de resgatar pecadores corruptos. Conforme ensina a Bíblia, antes do princípio do tempo, Deus o Pai escolheu um povo, para ser um povo de adoradores da sua glória por se tornarem objetos da sua graça. Como uma expressão do infinito amor por seu Filho, o Pai deu os eleitos a Cristo como um presente de amor, um povo que o louvaria para todo o sempre. Depois o Pai comissionou seu Filho para vir a este mundo a fim de redimir homens e mulheres por meio de sua morte sacrificial. O Pai, juntamente com o Filho, enviou também o Espírito a este mundo para aplicar a obra salvadora do Filho a esse mesmo grupo de pecadores eleitos. Esse imenso número de santos redimidos – eleitos por Deus, adquiridos por Cristo e chamados pelo Espírito – jamais cairão da graça. Todos


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eles serão transportados em segurança para o céu e serão glorificados para sempre. Esta é a vitória da graça soberana que dá honra a Deus. Falando biblicamente, essas verdades foram expostas em cinco principais títulos que, juntos, manifestam a glória de Deus na salvação do homem. Cada uma dessas verdades está profundamente enraizada e solidamente fundada no rico solo da Palavra de Deus. Quando a Bíblia é bem interpretada, graças a uma séria exegese, e é exposta cuidadosamente e explicada adequadamente, ela ensina claramente essas verdades. Elas são identificadas pelas seguintes expressões: depravação total, eleição incondicional, expiação limitada, graça irresistível, e perseverança dos santos. Essas expressões foram originariamente cunhadas no Sínodo de Dort (1618-1619), na Holanda do século dezessete. Conhecidas como os cinco pontos do calvinismo, constituíram uma resposta aos “remonstrantes” (1610), os seguidores de Jacob Armínius (Armínio), que formularam um resumo de doutrinas atualmente conhecido como os cinco pontos do arminianismo. Estas formulações do pensamento arminiano, completa antítese do calvinismo bíblico, têm os títulos: depravação parcial, eleição condicional, expiação universal, graça resistível e a possibilidade de queda definitiva dos santos. Nunca dois sistemas de pensamento foram tão polarizados. O primeiro sistema mencionado, o calvinismo, é teocêntrico e constitui um modo de ver a salvação que exalta Cristo. Unicamente Deus é o Salvador e, por conseguinte, unicamente Deus é objeto de louvor. O outro sistema, o arminianismo, apresenta uma perspectiva completamente oposta. O arminianismo, também historicamente conhecido como semipelagianismo e como wesleyanismo, divide a glória entre Deus e o homem na salvação da raça humana. Em consequência, ele diminui a glória dada a Deus. No primeiro sistema, que salienta as doutrinas da graça, a salvação é obra que pertence completamente ao Senhor. Somente Deus supre o pecador de tudo o que é necessário, ou seja, a graça e a fé. Mas, no segundo esquema, a salvação em parte pertence a Deus e em parte ao homem. Nesse caso, Deus fornece a graça e o homem fornece a fé. Segundo esse sistema, o homem é cossalvador. No primeiro sistema, toda a glória é


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dirigida unicamente a Deus. Mas no segundo, o louvor é compartilhado por Deus e pelo homem. Um problema que logo sobressai é que Deus não divide sua glória com ninguém. A DEPRAVAÇÃO DO HOMEM E A SOBERANIA DE DEUS Das principais doutrinas da graça, a primeira é intitulada depravação total ou radical. Esta é a doutrina da ruína do homem causada pelo pecado, e serve de fundo, como um veludo negro, sobre o qual é exposta a graça salvadora de Deus. Toda a humanidade nasce espiritualmente morta em transgressões e pecados. O homem caído é totalmente depravado. O pecado afetou radicalmente o homem total. Quer dizer, cada parte do homem – sua mente, suas emoções, e sua vontade – está contaminada pelo pecado. Sua mente está obscurecida, o que o torna incapaz de ver a verdade acerca de Deus, de Cristo e de si próprio. Seu coração está contaminado, e não deseja Deus, mas, em vez disso, ama o seu pecado. Sua vontade está morta e é incapaz de escolher o que é certo. Praguejados por essa incapacidade total, os pecadores se acham sujeitos ao pecado como seus escravos, incapazes de mudarem e se tornarem realmente bons. Estando espiritualmente morto em seu pecado, o homem nem sequer consegue buscar o que é certo e justo. Em resumo, o homem não regenerado é totalmente incapaz de praticar qualquer bem espiritual, nada pode fazer para remover o seu pecado, e não pode dar nenhuma contribuição em prol da sua salvação. Pior ainda: Deixado entregue a si mesmo, o homem caído jamais procura Deus ou sua graça. A segunda importante doutrina é a eleição incondicional, ou eleição soberana. Porque nenhum homem pode escolher Deus, é preciso que Deus escolha o homem. A Bíblia ensina que, antes da fundação do mundo, Deus escolheu certos indivíduos para serem objetos de sua graça salvadora. Dos filhos caídos da raça de Adão, Deus selecionou os eleitos, aqueles que iria salvar. Sua escolha não se baseou em nenhuma obra boa ou fé prevista. Antes, a eleição divina foi feita exclusivamente pela escolha de Deus, por sua graça. Tendo escolhido os seus eleitos, então os entregou ao Filho como uma expressão do seu amor, e comissionou o Filho para


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adentrar o mundo e adquirir a salvação deles. Além disso, o Pai, juntamente com o Filho, encarregou o Espírito Santo de regenerar os escolhidos. Antes do princípio do tempo, essa obra foi preordenada e predestinada pela vontade soberana de Deus. Essa é a graça salvadora de Deus o Pai na eternidade pretérita. A REDENÇÃO REALIZADA E APLICADA O terceiro título das principais doutrinas mencionadas é expiação limitada, ou expiação definida. Tendo recebido os nomes dos eleitos pelo Pai na eternidade passada, Jesus Cristo veio a este mundo para adquirir a salvação deles. Na cruz, Jesus não tornou o mundo inteiro algo potencialmente salvável. Antes, ele de fato salvou. Jesus assegurou realmente a vida eterna para suas ovelhas. Morrendo por todos os que lhe tinham sido confiados pelo Pai, propiciou a ira de Deus. Todos aqueles pelos quais Jesus morreu foram verdadeiramente salvos por meio de sua morte. Nenhum deles perecerá. Essa é a graça salvadora de Deus o Filho, há dois mil anos. A quarta verdade é graça irresistível ou vocação irresistível. O Pai e o Filho enviaram o Espírito Santo ao mundo para convencer do pecado, chamar e regenerar todos os eleitos. À medida que o Evangelho é proclamado no mundo, o Espírito faz um chamado interior especial aos que foram escolhidos pelo Pai. O Espírito gera de novo as almas espiritualmente mortas. Ele ressuscita o pecador morto do túmulo espiritual. Ele outorga arrependimento e fé. O Espírito abre os olhos espiritualmente cegos para que vejam a verdade. Abre os ouvidos surdos para que ouçam a verdade. Abre os corações fechados para que aceitem a verdade. Ativa as verdades mortas para que creiam na verdade. Aplica a morte salvadora de Cristo aos corações dos eleitos. Essa é a graça salvadora de Deus o Espírito Santo dentro do tempo. SALVOS E SEGUROS PARA SEMPRE A quinta verdade é a perseverança dos santos, ou graça preservadora. A Bíblia ensina que todos os eleitos são guardados pelo poder do Pai. Nenhum dos esco-


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lhidos do Pai se perderá. Nenhum daqueles pelos quais o Filho morreu perecerá. Nenhum dos que foram ou forem regenerados pelo Espírito cairá da graça. Todos quantos receberam ou receberem a graça salvadora de Deus serão conduzidos para a glória, protegidos e preservados para sempre. A ampla abrangência da salvação já está completa. Indo desde a eternidade passada e até a eternidade futura, a salvação é acertadamente vista como uma única obra da graça. Aqueles que Deus escolheu antes do princípio do tempo são aqueles que salvará para sempre quando não existir mais o tempo. Todos os eleitos perseverarão porque o próprio Deus persevera dentro deles – e os habilita a apresentarem-se inculpáveis diante do seu trono. Esse ensino bíblico sobre a salvação revela claramente que a salvação é, toda ela, pela graça. Do princípio ao fim cada aspecto da graça salvadora é dádiva gratuita de Deus, outorgada soberanamente a pecadores que não a merecem. Cada membro da Divindade age em perfeita unidade e harmonia nesse empreendimento. Primeiro, Deus o Pai escolheu os eleitos, por si e para si, na eternidade passada. Segundo, Deus o Filho redimiu todos esses escolhidos pelo Pai confiados a ele. Terceiro, Deus o Espírito Santo regenera esses escolhidos e redimidos. Juntas, as três pessoas – o Pai e o Filho e o Espírito Santo – salvam pecadores. Os cinco pontos da salvação bíblica se fundem para formar este único ponto dominante – Deus salva pecadores por sua graça e para sua glória. O que o pecador caído não pode fazer por si mesmo, Deus faz. O que os pecadores humanos nem sequer procuram, Deus procura e realiza. O nosso trino Deus ativa, realiza e aplica a graça salvadora a seus eleitos. Neste esquema, vê-se que a salvação é “dele, por ele e para ele” (Rm 11.36). Quando se vê a salvação sob essa luz, só então, pode-se dizer: “A ele seja a glória para sempre! Amém”. A LONGA LINHA COMEÇA AQUI É este realmente o ensino da Escritura? O certo é que estas verdades teocêntricas foram registradas nas páginas da Palavra por homens santos, começando com os rudes profetas e com os reis de Israel ungidos por Deus. Moisés escreveu


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os cinco primeiros livros da Bíblia, o Pentateuco, ensinando com muita clareza as doutrinas da graça divina. Essas mesmas verdades foram redigidas pelos escritores dos livros históricos e de sabedoria do Antigo Testamento – Josué, Samuel, Esdras, Neemias, Davi, os outros salmistas, e Salomão. Todos os profetas falam a uma só voz a respeito delas – Isaías, Jeremias, Ezequiel, Daniel, Oseias, Amós, Jonas, Miqueias, Naum, Ageu, Zacarias e Malaquias. Cada um deles fez significativa contribuição para o registro inspirado das doutrinas da graça. Depois, no Novo Testamento, a longa linha continuou com o ensino de Jesus nos quatro evangelhos, como também com os de Pedro, Paulo, Lucas, o autor de Hebreus, Tiago, Judas e João. A doutrina da graça soberana estende-se literalmente de capa a capa na Bíblia. Estas doutrinas que exaltam Deus também constituíram a posição bem estudada e firmemente adotada por um imenso exército de homens fortes através dos séculos. Os que abraçam essas verdades atualmente podem estar em minoria, mas as doutrinas da graça eram a convicção daqueles que dirigiam a Igreja Primitiva. Em seguida aos autores bíblicos, vieram os pais primitivos da igreja – homens como Clemente de Roma, Justino Mártir, Irineu, Atanásio, Agostinho e Jerônimo. Eles as ensinavam crendo que elas estão escritas na Escritura. Depois destes homens, muitas luzes brilharam na Idade das Trevas – fiéis servos de Deus como Gallo, Gostschalk, Pedro Waldo, Anselmo e Thomas de Bradwardine. A seguir, antes da aurora da Reforma, houve notáveis precursores, como João Wycliffe, João Hus, Savonarola e William Tyndale. Todos esses homens proclamaram alto e bom som as doutrinas da graça soberana. OS REFORMADORES CERRAM FILEIRAS Nos tempos sem precedentes da Reforma, na Europa do século dezesseis, houve gigantes espirituais que percorriam o Continente, homens destros nas Escrituras e instruídos pelo Espírito Santo – reformadores como Martinho Lutero, Martin Bucer, Ulrich Zwínglio, João Calvino, Beza, Francisco Turrretino, e aqueles que se encontraram na reunião do Sínodo de Dort, na Holanda.


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Para um homem, eles eram fortes predestinacionistas. Sem vacilar, estavam firmemente comprometidos com as doutrinas da graça soberana. Somente uma mensagem tão catalítica poderia ter feito a Europa virar de cabeça para baixo. Seguindo o despertamento deles, surgiram os reformadores escoceses e ingleses – João Knox,1 John Foxe, John Rogers, Nicholas Ridley, Hugo Latimer, e outros semelhantes – homens que mantiveram fulgentemente acesa a tocha da verdade nas Ilhas Britânicas. Os testemunhos de muitos deles foram selados com sangue, simplesmente porque lutavam na fileira da frente, criam na graça soberana de Deus. Depois deles vieram os puritanos, valentes como Thomas Goodwin, Richard Sibbes, Jeremias Burroughs, John Owen, Thomas Watson e Matthew Henry. Estes escoceses e ingleses proclamavam um Deus que dispensa livremente sua misericórdia salvadora a quem quer. Ao mesmo tempo, foram levantados por Deus os Batistas Particulares, que também fizeram ressoar a nota da graça soberana – João Bunyan, Benjamin Keach e John Gil. A LONGA LINHA CRUZA O ATLÂNTICO Na providência de Deus, as verdades das doutrinas da graça logo foram transportadas através do Atlântico por homens que buscavam liberdade religiosa. Os Peregrinos eram distintamente calvinistas, pois trouxeram com eles as suas Bíblias de Genebra e pregavam baseados nelas. Os primeiros líderes coloniais eram reformados sólidos e leais. Os que fundaram os primeiros estados – homens como John Winthrop, Thomas Hooker, Roger Williams, Increase Mather e Cotton Mather – eram calvinistas, todos eles. Os primeiros colleges americanos – Harvard e Yale, eram calvinistas, e foram estabelecidos com a finalidade de treinar ministros reformados que deveriam pregar doutrina reformada. Quando as colônias se tornaram mais firmemente estabelecidas, as chamas do avivamento arderam brilhantemente na Nova Inglaterra. Na liderança desse movimento, conhecido como o Grande Despertamento, estavam pastores, evan1  Em casos mais conhecidos, adapto os nomes, como João Knox, João Calvino, etc. Também adapto outras formas simples, como Hugh – Hugo. Nota do tradutor.


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gelistas e educadores calvinistas. Wiliam Tennent, e seus filhos Gilbert e William Tennent, foram os importantes líderes presbiterianos que estabeleceram o Log Cabin College para instruir e capacitar pastores para pregarem a Bíblia. Jonathan Edwards, de Northampton, Massachusetts, foi o mais importante pastor da época, e um calvinista estrito da mais elevada ordem. George Whitefield, de Bristol, Inglaterra, foi, inquestionavelmente, o mais distinguido evangelista daquele tempo, talvez de qualquer tempo, e seu cerne era reformado. Quando Harvard e Yale sucumbiram na escorregadia encosta do arminianismo, a escola de Princeton foi levantada para tornar-se o novo bastião do calvinismo. Foram estabelecidos outros colleges distintamente reformados – Rutgers, Dartmouth, e Brown. As ricas verdades da graça soberana saturaram o solo das primeiras colônias americanas. O calvinismo era a cosmovisão dominante naquela época. Com a vinda da Guerra Revolucionária, os pensadores reformados continuaram a liderar. A forma representativa de governo delineada na Constituição simplesmente era a verdade reformada sobre o governo por anciãos ou presbíteros, expandida e aplicada à nação. Muitos dos pais fundadores da nação eram calvinistas, John Witherspoon inclusive, o único pastor que assinou a Declaração de Independência. Depois da Guerra Revolucionária, o Segundo Grande Avivamento fulgiu através da Nova Inglaterra, com homens chaves como Timothy Dwight, presidente de Yale, e Asahel Nettleton, ambos fortes calvinistas, entre os líderes da corrente calvinista. A TRIUNFANTE MARCHA NA AMÉRICA Quando a jovem nação emergiu, o Seminário de Princeton foi logo fundado no campus da universidade. Por mais de cem anos, ele seria a influência dominante em prol da verdade evangélica na América. O corpo docente de Princeton era um virtual exército de eruditos bíblicos, cada homem um calvinista estrito. Esta linha começou com o seu fundador, Archibald Alexander, e se estendeu até sua derradeira voz forte, J. Gresham Machen. Entre o primeiro e o último, houve gigantes teológicos como Charles Hodge, que, em seguida a Jona-


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than Edwards, foi o mais importante teólogo da América; J. W. Alexander; J. A. Alexander, A. A. Hodge, e o lúcido Benjamin B. Warfield, o arquidefensor da fé e um teólogo reformado de altíssimo nível. Em meados do século dezenove foi fundada a Convenção Batista do Sul. Este grupo evangélico, atento às missões e formado em Charleston, Carolina do Sul, estava destinado a se tornar a maior denominação protestante do mundo. Era um corpo de crentes na Bíblia fundado por homens inabalavelmente comprometidos com as doutrinas da graça. Em seus primeiros cinquenta anos, todos os seus presidentes eram calvinistas – William B. Johnson, R. B. C. Howell, Richard Fuller, Patrick Mell, e outros. Os fundadores do Seminário Teológico Batista do Sul, o primeiro seminário da denominação, criam e ensinavam abertamente as doutrinas da graça. Entre eles estavam James P. Boyce e John Broadus, que atendiam Princeton, e, mais tarde, Edwin Dargan. O Sumário de Princípios (Abstract of Principles) era – e continua sendo até hoje – o padrão doutrinário do Sul, e é um documento declaradamente calvinista. O fundador do Seminário Teológico Batista do Sul, B. H. Carroll, é outro homem que expunha a eleição incondicional de Deus. O próprio alicerce dessa grande associação de igrejas batistas foi lançado sobre a sólida rocha da graça soberana. Durante o mesmo século dezenove, os presbiterianos estavam conseguindo um forte e estratégico pé de apoio no Sul. Distinguidos teólogos e pastores, como William S. Plumer, Daniel Baker, Robert L. Dabney, James Henley Thornwell, Benjamin Palmer, e John L. Girardeau, deixaram sua marca em suas igrejas e em seus alunos com as verdades da graça soberana. Por terem adotado a Confissão de Fé de Westminster, não havia disputas sobre onde pastores e igrejas se posicionavam teologicamente. No Norte, William G. T. Shedd, vigoroso teólogo da dogmática reformada, escreveu substantivos tomos de teologia e serviu de âncora das verdades reformadas durante anos. A LONGA LINHA ABARCA O GLOBO O movimento de maior alcance da história do mundo, o movimento das missões modernas, viu missionários enviados a todos os cantos e recantos da


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terra no século dezenove. Homens vigorosos que eram grandemente calvinistas. William Carey, que tem sido chamado pai desse movimento, foi um que abraçou a graça soberana. Ele acreditava que havia eleitos de Deus em todas as tribos e nações ao redor do mundo, e que os servos de Cristo deveriam ir alcançá-los com o Evangelho. Outros homens de persuasão reformada também foram figuras importantes deste movimento histórico. Missionários como Luther Rice, Adoniram Judson, David Livingstone, Henry Martyn, Robert Moffat, e John Paton se lhes seguiriam, todos crentes na graça soberana. Retornando ao outro lado do Atlântico, à Escócia e à Inglaterra, a igreja do século dezenove tinha um aroma fortemente calvinista, principalmente entre os líderes. Na Escócia, alguns dos mais fiéis pastores, teólogos, evangelistas e missionários que a igreja conheceu foram homens levantados por Deus. Homens briosos como Andrew Bonar, Thomas Boston, Robert Murray McCheyne, e Robert Candlish pastorearam igrejas. Robert Haldane e James Haldane ajudaram a providenciar que o Evangelho fosse propagado fora do país. Thomas Chalmers e James Buchanan foram brilhantes teólogos escoceses, impregnados da doutrina reformada, e também serviram como pastores. A astuta mente dos escoceses, combinada com seu zelo evangelístico e missionário, fizeram deles homens realmente notáveis. Nessa mesma época, dificilmente se poderá exagerar sobre o poder do púlpito dos pregadores calvinistas na Inglaterra. O mais proeminente de todos foi Charles H. Spurgeon, “o Príncipe dos Pregadores”, um declarado e ávido calvinista. A influência reformada deste homem sobre a igreja foi considerável, e continua forte mesmo na presente hora através dos seus escritos. Em torno dele, noutras igrejas inglesas, havia expositores como Alexander Maclaren, John C. Ryle e Charles Simeon, e o notável protetor dos órfãos, George Mueller. Todos eles estavam comprometidos com a soberania da graça. Na Holanda, onde se reuniu o Sínodo de Dort, a proclamação da soberania de Deus na salvação do homem continuou sendo forte, passando pelo século dezenove e adentrando o século vinte. Abraão Kuyper, que veio a ser o primeiro


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ministro da Holanda, foi uma importante voz em favor das doutrinas da graça. Teólogos holandeses notáveis como Herman Bavinck, G. C. Berkouwer e Louis Berkhof deixaram sua marca nas mentes evangélicas por meio da página impressa. William Hendriksen e Simon Kistemaker, ambos de antecedentes holandeses, também nos legaram uma obra e tanto em sua série intitulada New Testament Commentary (Comentário do Novo Testamento). A GRANDE PARADA ESTENDE-SE ATÉ O PRESENTE Tudo o que foi dito nos traz àqueles homens piedosos levantados mais recentemente por Deus, os quais têm sustentado fielmente as verdades bíblicas relacionadas com a graça soberana. Na primeira metade do século vinte, a prolífica pena de A. W. Pink foi um instrumento excepcional para a propagação destas altas doutrinas. John Murray, presidente do Seminário Teológico Westminster, ajudou a preparar várias gerações de pastores, escritores e missionários calvinistas. Donald Grey Barnhouse, pastor da Décima Igreja Presbiteriana de Filadélfia, calvinista firmemente convicto, tornou-se o expositor americano mais popular da década de 50. D. Martyn Lloyd-Jones, pastor da Westminster Chapel, de Londres, veio a ser o expositor inglês mais popular do século vinte. James Montgomery Boice, sucessor de Barnhouse na Décima Igreja Presbiteriana, foi o mais importante pastor e defensor do calvinismo do século vinte. Até o dia de hoje, esses escrupulosos ministros, deixaram uma indelével marca sobre o pensamento teocêntrico de incontáveis legiões de pastores e líderes eclesiásticos dos tempos modernos. Esta presente hora não está sem campeões da graça soberana. Entre eles há valentes guerreiros que pugnam pela verdade como R. C. Sproul, fundador dos ministérios Ligonier, e D. James Kennedy, fundador da Evangelização Explosiva (Evangelism Explosion). A influência mundial do púlpito expositivo de John MacArthur, pastor da Grace Community Church, Los Angeles, é incomparavelmente imensa enquanto ele expõe essas verdades para que todos a ouçam. O apaixonado zelo de John Piper, pastor da Bethlehem Baptist Church, Minneapolis, está


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influenciando atualmente toda uma geração utilizando a sua pena e a sua voz para proclamar a supremacia de Deus na salvação do homem. R. Albert Mohler, presidente do Semináro Teológico Batista do Sul, assoma como uma fonte de influência de altíssimo nível sobre a próxima geração de pastores, contagiando-os com uma alta visão de Deus. Estes são apenas alguns dos atuais homens notáveis que são calvinistas na doutrina e fortes na influência que exercem. DEUS LEVANTA OS SEUS HOMENS Como foi que cada um destes homens veio para o cenário da história humana? Não tenhamos dúvida, é o próprio Deus, o soberano Senhor da história, que levanta cada geração de líderes espirituais para se juntarem a esta longa linha de homens piedosos. Deus, o determinador da história, prepara o homem para a hora e a hora para o homem. Como o único edificador da sua igreja, o Senhor Jesus Cristo designa o tempo quando e o lugar onde cada homem se verá no grande palco da história. Com gênio infinito e propósito perfeito, Cristo escolhe soberanamente os seus homens (Jo 15.16), chamando-os desde o ventre de suas mães (Jr 1.5; Lc 1.15; Gl 1.15,16) para realizarem a obra específica que lhes caberá fazer (Ef 2.10). Até o próprio sucesso que eles gozarão é predeterminado por Cristo, sendo que somente ele é quem produz o crescimento (1Co 3.6,7). Jesus fez esta solene promessa: “Edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não poderão vencê-la” (Mt 16.18). Por meio dessa promessa irrevogável, Cristo está empenhado em construir soberanamente a sua igreja, e nem a morte poderá impedir o seu progresso. Quer dizer que, quando uma geração sai da cena, Cristo fielmente levanta a próxima onda de homens para continuarem a sua obra. Sempre que um Lutero ou um Calvino parte deste mundo, Deus tem a nova onda de trabalhadores em suas asas, prontos e preparados para levar avante a obra. Em parte alguma se vê mais claramente esta verdade do que no continuado suprimento que Deus faz de pregadores das Doutrinas da Graça.


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Boice escreve: Essas doutrinas não foram inventadas por Calvino, nem tampouco foram características só do seu pensamento durante o período da Reforma. São verdades bíblicas ensinadas por Jesus e confirmadas por Paulo, Pedro e todos os demais escritores do Antigo e do Novo Testamento. Agostinho as defendeu contra as negações de Pelágio. Lutero cria nelas. Assim também Zwínglio. Isto é, eles criam o que Calvino cria e que posteriormente sistematizou em sua influente obra intitulada Institutes of the Christian Religion (as Institutas). Os puritanos eram calvinistas; foi por meio deles e do seu ensino que tanto a Inglaterra como a Escócia experimentaram os maiores e mais completos avivamentos nacionais que o mundo já viu. Nesse número estavam os herdeiros de João Knox: Thomas Cartwright, Richard Sibbes, Richard Baxter, Matthew Henry, John Owen e outros. Na América outros foram influenciados por homens como Jonathan Edwards, Cotton Mather e, mais tarde, George Whitefield. Em tempos mais recentes, o movimento missionário moderno recebeu quase todo o seu ímpeto e a sua direção iniciais daqueles servos de Deus pertencentes à tradição calvinista. A lista inclui William Carey, John Ryland, Henry Martyn, Robert Moffat, David Livingstone, John G. Paton, John R. Mott e outros. Pois todas estas doutrinas da graça não eram um apêndice acrescentado ao pensamento cristão, mas eram, antes, centrais, abrasando e formando os seus esforços na pregação e na obra missionária.2

2  James Montgomery Boice, Foundations of the Christian Faith: A Comprehensive & Readable Theology (Downers Grove, IL: InterVarsity, 1986), 519.


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FUNDAMENTOS DA GRAÇA: A SÓLIDA ROCHA DA PALAVRA O foco destas páginas e destes capítulos visa autores bíblicos que lançaram o forte alicerce das doutrinas da graça na Escritura Sagrada. Qual era o ensino deles? O que a Escritura expõe a respeito da soberania de Deus na salvação? Tudo o que cremos e consideramos precioso acerca da supremacia de Deus na redenção dos homens caídos deve ser, necessariamente, a verdade da Palavra de Deus. O que estiver fora disso deve ser rejeitado. Então, o que diz a Escritura? Começando com os escritos do profeta Moisés e concluindo com o Apocalipse do apóstolo João, vamos traçar sistematicamente o desenvolvimento das doutrinas da graça através das páginas da Escritura divina. Nos capítulos que vêm a seguir, assinalaremos a revelação progressiva da graça soberana através do Antigo Testamento, partindo de Moisés e passando a Josué, Samuel, Esdras, Neemias, Jó, Davi, Salomão, Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel, percorrendo também todo o caminho dos profetas menores, de Oseias a Malaquias. No Novo Testamento traremos à luz e documentaremos as doutrinas nos termos em que são ensinadas pessoalmente pelo Senhor Jesus Cristo nos quatro evangelhos – Mateus, Marcos, Lucas e João. Cristo foi o maior pregador da graça soberana que já viveu na terra. Detalharemos, igualmente, o ensino sobre a soberania de Deus na graça salvadora nos termos das instruções dadas por Pedro, Paulo, Lucas, o autor de Hebreus, Tiago, Judas e, finalmente, João. Este exame de capa a capa da Bíblia lançará um alicerce inabalável para a graça soberana de Deus. Cada volume futuro desta série edificará sobre a rocha viva e proverá um passeio pela história da igreja, retratando os nobres homens que pregavam e ensinavam as doutrinas da graça. Mas, primeiro, observemos a lista de chamada destes servos de Deus que escreveram as Escrituras e registraram a soberania da graça de Deus. Começando com Moisés e indo até aos apóstolos, temos aqui um breve exame do início da longa linha de homens piedosos.


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FUNDAMENTOS DA GRAÇA

caPÍTULo UM PErGUnTaS Para ESTUDo 1. Que verdade central une a longa linha de homens piedosos através dos séculos? Por que essa verdade faz isso? 2. Que efeito positivo a doutrina da soberania de Deus tem sobre os que a abraçam? 3. Que é primordial na soberania de Deus na salvação do homem? Por quê? 4. Descreva a diferença entre a glória intrínseca de Deus e sua glória atribuída. Qual influi na outra? Explique por quê. 5. Como as doutrinas da graça manifestam singularmente a glória de Deus? Compare esta manifestação com a das principais doutrinas do arminianismo. Qual sistema dá maior glória a Deus? 6. Faça um breve sumário dos cinco importantes títulos das doutrinas da graça. Como eles se desenvolvem, na continuidade do pensamento, de um ao outro? 7. Como sucede que o equívoco sobre qualquer das cinco doutrinas da graça compromete as outras quatro? Explique por que acontece isso. 8. Você pode propiciar uma breve vista da história da igreja, destacando os homens mais expressivos que sustentaram as doutrinas da graça?



Calvinista é o homem que vê Deus, e que, tendo visto Deus em sua glória, fica com uma das mãos cheia do sentimento da sua indignidade pessoal de estar na presença de Deus como criatura, e muito mais como pecador, e fica com a outra mão cheia de reverente encantamento porque, não obstante, este Deus é um Deus que aceita pecadores.1 Benjamin B. Warfield

1  B.B. Warfield, Calvin as a Theologian and Calvinism Today, citado em A.N. Martin, The Practical Implications of Calvinism (Edinburgh, Scotland: The Banner of Truth Trust, 1979), 4.


Capítulo 2

ONDE A LONGA LINHA COMEÇA O LEGISLADOR MOISÉS: GÊNESIS

B

em à frente dessa longa linha de homens piedosos, que ensinavam fielmente as doutrinas da graça, ergue-se o primeiro escritor da Escritura, o primeiro grande líder e legislador de Israel – Moisés. Este, que por um tempo foi príncipe do Egito, tornou-se o primeiro profeta de Israel, e, com isso, tornou-se o primeiro porta-estandarte da verdade da graça soberana de Deus. É certo que a mensagem da soberana graça de Deus não teve sua origem em Moisés. Tão sublime e encantadora teologia jamais teria surgido de dentro das profundezas do homem pecador. Tampouco uma cosmovisão tão transcendental emergiu da decadente cultura do Egito, na qual Moisés foi criado. Ao contrário, foi preciso que a suprema verdade da inigualável supremacia de Deus lhe fosse revelada sobrenaturalmente do alto. Uma mensagem que exalta tanto a Deus só pode ter vindo do próprio Deus. Este deu a conhecer ao primeiro profeta de Israel as verdades da sua majestosa soberania, principalmente nas questões relacionadas com a graça divina.


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Na qualidade de primeiro escritor da Escritura, Moisés lançou as primeiras pedras do alicerce bíblico da graça soberana. Com o passar do tempo, outras pedras fundamentais da soberania divina, registradas de Gênesis a Deuteronômio, seriam edificadas pelo resto do Antigo Testamento, nos livros de Josué e seguintes, até Malaquias, e depois, pelo Novo Testamento, de Mateus ao Livro de Apocalipse. Pelo ensino dos reis e profetas de Israel, depois, pelos ensinamentos do próprio Senhor Jesus Cristo, e, indo ao clímax, pelo ensino dos apóstolos, guiados pelo Espírito, as verdades doutrinárias da graça salvadora de Deus seriam desenvolvidas mais completamente. Mas estas verdades foram ensinadas em sua forma mais básica nas páginas iniciais do Pentateuco escrito por Moisés, o legislador de Israel. Este desdobramento gradativo da verdade bíblica é denominado revelação progressiva, um conceito que reconhece o deliberado desenvolvimento e exposição das verdades ensinadas logo no início das Escrituras. Certamente, esse contínuo desvelar da verdade atuou no caso das doutrinas da graça. O que Moisés ensinou nos cinco primeiros livros da Bíblia, também conhecidos como a Lei, simplesmente lançou o alicerce que seria ampliado pelos autores bíblicos que se seguiriam. Que firme fundamento Deus lançou no início da Escritura por intermédio de Moisés! A intenção deste capítulo é examinar as verdades doutrinárias da soberania de Deus na salvação do homem nos termos em que estão registradas em Gênesis. A longa linha de homens piedosos, o desfile dos porta-estandartes em prol da graça soberana, começa aqui com Moisés, o primeiro mensageiro destas mensagens preciosas. Aqui vamos considerar Moisés e o primeiro livro da Escritura que ele escreveu.

O LEGISLADOR MOISÉS “MESTRE DA SOBERANIA DE DEUS” Moisés (1525-1405 a. C.), posta-se na primeira fileira desta sacra parada como o primeiro escritor da Escritura. Jesus afirmou pessoalmente que Moisés


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escreveu os cinco primeiros livros da Bíblia (Mt 19.8; Mc 12.26; Jo 5.46,47; 7.19), e assim também fez o apóstolo Paulo (Rm 10.5). Como Moisés escreveu de Gênesis a Deuteronômio, ele foi o primeiro a registrar as doutrinas da graça. Ele foi educado “em toda a sabedoria dos egípcios” (At 7.22), tendo recebido essa educação no seio da família do faraó. Não obstante, Moisés não escreveu partindo de um ponto de vista pagão. Antes, ele registrou a sabedoria divina de tal maneira que esta só poderia ter vindo do alto, possibilitando uma percepção da realidade propiciada por Deus e que não era deste mundo. Ele escreveu palavras inspiradas por Deus, que puseram a descoberto uma perspectiva eterna. Moisés foi o grande libertador de Israel, quando do êxodo, designado por Deus; foi o líder da nação dos hebreus nas peregrinações pelo deserto durante quarenta anos; foi o recebedor da Lei no Monte Sinai; e foi o autor do Pentateuco. Como era de esperar, é evidente que ele escreveu sobre a soberania de Deus e sobre a depravação do homem.

O LIVRO DE GÊNESIS “DEUS O CRIADOR SOBERANO” O primeiro livro inspirado escrito por Moisés é Gênesis, o “Livro das Origens”. A narrativa da Criação e do princípio da história da humanidade traça inequivocamente o supremo governo de Deus sobre todas as obras da suas mãos. A soberania de Deus na Criação, na eleição, na regeneração e na salvação é abertamente exposta em Gênesis. O livro registra que Deus faz o que quer, como quer e quando quer, e não somente na esfera física, mas também em seu reino espiritual. Em todas as esferas da criação, unicamente Deus é soberano. Mais especificamente, Deus é revelado como sendo absolutamente supremo ao outorgar a sua graça salvadora a um povo escolhido. Por que Deus criou? Certamente não por que tivesse necessidade de alguém para amar. Em toda a eternidade, Deus gozou perfeito amor e íntima comunhão dentro do seu próprio ser. As três pessoas da Divindade – Pai, Filho e Espírito


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– fruíam relações perfeitas e se bastavam completamente uns aos outros. Assim, Deus não era interiormente solitário, nem pessoalmente vazio. Ele era um ser inteiramente satisfeito, contente e contido em si mesmo. Portanto, Deus não criou por causa de alguma limitação em seu ser interior. Ao invés disso, ele criou tudo do nada a fim de expor a sua glória para o prazer dos seres por ele criados, e para proclamar a sua grandeza. Albert Barnes está certo quando diz: A razão ou a finalidade para a qual todas as coisas foram formadas... foi promover sua honra e glória.... Não foi promover a sua felicidade, pois ele foi e é eternamente feliz; nem acrescentar algo a ele, pois ele é infinito. Mas para que agisse como Deus e recebesse a honra e o louvor que lhe são devidos.1 O Livro de Gênesis registra extraordinária demonstração da soberania: Deus chamou a Criação à existência – e predisse sua redenção.

DOUTRINA EM FOCO A SOBERANIA DIVINA Em Gênesis, Moisés registrou primeiro a estupenda demonstração da soberania de Deus na criação. Deus não olhou para baixo, pelo túnel do tempo, para ver o universo evoluir do nada. Ele não previu uma grande explosão (um “big bang”), para depois adotar os caóticos resultados como seu plano eterno. Em vez disso, Deus falou intencionalmente, produzindo tudo do nada, com sua palavra. Ele não estava sob nenhuma coerção para criar. Não havia nenhuma pressão externa sobre ele. Antes, seu ato de criação exibiu magnificamente a sua soberania imperial. Nenhuma restrição externa pode ser imposta à suprema autoridade de Deus, nem por Satanás e seus anjos caídos, e, certamente, por nenhum mero homem. A. W. Pink escreve com impressionante encantamento sobre a extraordinária soberania de Deus anterior à Criação: 1  Albert Barnes, Notes on the New Testament, Vol. 10: Acts and Romans, ed. Robert Frew (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1983, 1884,1885), 260-61.


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Na grandiosa expansão da eternidade, que se estende para trás de Gênesis 1.1, o universo não fora criado e a criação só existia na mente do grande Criador. Em sua soberana majestade, Deus permanecia totalmente só. Referimo-nos àquele remotíssimo período anterior à criação dos céus e da terra. Nesse longo período não havia anjos para entoarem os louvores de Deus, nem criaturas para ocuparem a sua atenção, nem rebeldes para serem trazidos à sua sujeição. O grande Deus estava totalmente só no meio do pavoroso silêncio do seu vasto universo. Mas, mesmo nesse tempo, se é que se lhe pode chamar tempo, Deus era soberano. Ele poderia criar ou não criar, a seu bel-prazer. Poderia criar desta ou daquela maneira; poderia criar um mundo ou um milhão de mundos, e quem havia para resistir à sua vontade? Ele poderia chamar à existência um milhão de criaturas diferentes e colocá-las em condições de absoluta igualdade, dotando-as das mesmas faculdades e colocando-as no mesmo ambiente; ou, poderia criar um milhão de criaturas, cada uma diferente das outras, e nada tendo elas em comum, exceto a sua condição de criaturas, e quem estava lá para desafiar o seu direito? Se lhe aprouvesse, poderia chamar à existência um mundo tão imenso que as suas dimensões estariam completamente fora de toda possibilidade de computação finita; e, se quisesse, poderia criar um organismo tão pequeno que nada senão o mais poderoso microscópio poderia revelar sua existência a olhos humanos. Ele teve o direito de criar, de um lado, os exaltados serafins para refulgirem em torno do seu trono, e, de outro lado, o minúsculo inseto que morre na mesma hora em que nasce. Se o poderoso Deus preferiu ter uma imensa graduação em seu universo, do mais elevado ser angélico ao rastejante réptil, de mundos em revolução aos átomos flutuantes, do macrocosmo ao microcosmo, em vez de fazer tudo uniforme, quem estava lá para questionar o seu soberano arbítrio?2 2  A. W. Pink, The Sovereignty of God (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1997, 1930), 28.

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A deslumbrante demonstração da soberania de Deus na Criação foi uma cartilha sobre o seu direito de governar nas questões da salvação. Deus, que mandou a luz aparecer no primeiro dia da Criação, logo mandaria o Evangelho acender para iluminar os corações entenebrecidos dos pecadores incapazes de ver. Deus, que separou as águas no segundo dia, produziria um abismo infinito para separar-se dos pecadores. Deus, que juntou a águas no terceiro dia, reuniria pecadores para si. Deus, que criou o sol, a lua e as estrelas no quarto dia, onipotentemente criaria a fé salvadora. Deus, que começou a criar o reino animal no quinto dia, por sua graça enviaria seu Filho para ser o Cordeiro de Deus e eliminar o pecado. Deus, que criou Adão e Eva no sexto dia, logo recriaria pecadores à sua imagem. Sua livre graça realizaria o segundo Gênesis na salvação de homens e mulheres perdidos. 1. Dia Primeiro: “Haja Luz”. No primeiro dia da Criação, Deus, pelo puro exercício da sua vontade, disse à luz que existisse, e esta extinguiu as trevas. Foi uma extraordinária manifestação da soberania divina: No princípio Deus criou os céus e a terra. Era a terra sem forma e vazia; trevas cobriam a face do abismo, e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas. Disse Deus: “Haja luz”, e houve luz. – Gênesis 1.1-3

Tudo era escuridão, até que Deus ordenou à luz que aparecesse do nada – e assim foi. Essa luz “mais claramente revela e mais estreitamente aproxima a glória de Deus (cf. Dn 2.22; 1Tm 6.16; Tg 1.17; 1Jo 1.5)”.3 Como o próprio Deus, a luz ilumina e dá a conhecer todas as outras coisas. Sem luz, toda a criação seria fria e escura. A criação da luz, pelo ato de Deus, foi um leve ato da sua soberania. Não poderia haver impedimento algum nem resistência. Esta mesma onipotência é demonstrada nos atos divinos de salvação. No dia do seu poder salvífico, 3  John MacArthur, The MacArthur Bible Commentary (Nashville, TN: Nelson Reference & Electronic, 2005), 8.


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Deus ordena que a luz espiritual apareça e ilumine sobrenaturalmente a mente obscurecida do homem (2Co 4.4). A respeito deste primeiro ato da graça, J. C. Ryle escreve: Um sentimento de pecado, culpa e pobreza de alma é a primeira pedra lançada pelo Espírito Santo, quando edifica o templo espiritual. Ele convence de pecado. A luz foi a primeira coisa chamada à existência na criação material (Gn 1.3). A luz, com relação ao nosso estado, é a primeira obra da nova criação.4

A vontade soberana de Deus faz que aqueles que são seus vejam a verdade do Evangelho e se tornem uma nova criação em Cristo (2Co 5.17). 2. Dia Dois: “Haja um Firmamento”. No segundo dia da Criação, Deus de novo exerceu sua soberania divina, separando as águas pela criação do firmamento: Depois disse Deus: “Haja entre as águas um firmamento que separe águas de águas. Então Deus fez o firmamento e separou as águas que ficaram abaixo do firmamento das que ficaram por cima. E assim foi. – Gênesis 1.6-7

Deus mandou as águas se separarem, colocando um grande firmamento entre as que ficaram na terra e as que ficaram acima do firmamento.5 Não pôde haver nenhuma resistência à sua ordem soberana. A irresistível voz de Deus chamou à existência o que antes não existia, e depois ordenou e colocou no lugar o que tinha criado. Assim é na salvação dos eleitos. A vocação eficaz 4  J. C. Ryle, Holiness: The Nature, Hindrances, Difficulties, & Roots (Moscow, ID: Charles Nolan Publishers, 2001, 1877, 1879), 316. 5  MacArthur, The MacArthur Bible Commentary, 9.


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de Deus é igualmente irrevogável e igualmente invencível. Como na obra de Criação, Deus age na esfera espiritual na salvação de pecadores perdidos. Ele fala e chama, e acontece. No devido tempo, ele separa os escolhidos do mundo, convocando-os para si. No tempo designado, eles vêm, em resposta ao seu chamado irresistível. 3. Dia Três: “Cubra-se a Terra de Vegetação”. O terceiro dia da Criação trouxe ainda outra manifestação da soberania divina, quando Deus mandou surgir a vida vegetal: E disse Deus: “Ajuntem-se num só lugar as águas que estão debaixo do céu, e apareça a parte seca”. E assim foi.... Então disse Deus: “Cubra-se a terra de vegetação: plantas que deem sementes e árvores cujos frutos produzam sementes de acordo com as suas espécies”. E assim foi. – Gênesis 1.9-11

Deus determinou que as águas da atmosfera se juntassem. Além disso, Ele causou um levantamento cataclísmico da superfície da terra, dirigindo as águas para encherem os lugares baixos, formando mares, rios e lagos. Os continentes, os montes e as ilhas tomaram forma. A vegetação, já com sua semente, começou a crescer. O princípio da reprodução foi estabelecido, cada qual produzindo seu semelhante. Cada semente começou a produzir vida segundo a sua espécie, tudo pela determinação divina. A mesma manifestação da soberania divina vê-se na regeneração dos pecadores. O exercício da suprema vontade de Deus cria vida espiritual em corações espiritualmente mortos. Este é o milagre do novo nascimento. Quando a semente da Palavra de Deus é plantada no solo dos corações dos homens, Deus a faz germinar para a vida eterna. Somente Deus pode criar vida do nada, quer física quer espiritual. 4. Dia Quatro: “Haja luminares”. No quarto dia, Deus criou livremente o sol, a luz e as estrelas, colocando os corpos celestes nos seus respectivos lugares.


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Disse Deus: “Haja luminares no firmamento do céu para separar o dia da noite. Sirvam eles de sinais para marcar estações, dias e anos, e sirvam de luminares no firmamento do céu para iluminar a terra”. E assim foi. – Gênesis 1.14,15

A criação dos corpos celestes não foi um esforço conjunto de Deus com alguém ou alguma coisa mais. Deus não dependeu da cooperação de anjos e de homens para que a sua obra tivesse êxito. De fato, não existia nenhum homem nessa ocasião. Deus por si e para si meramente falou, e assim foi. Este ato autônomo de Deus mostrou que a sua vontade independente e o seu poder infinito são irresistíveis. Este mesmo poder soberano é exposto na causação divina do novo nascimento, obra do Espírito Santo, sem ajuda do esforço ou da cooperação humana. Conhecida pelo nome de monergismo, essa verdade diz que o Espírito Santo é o único agente que efetua a regeneração dos eleitos. A graça regeneradora de Deus opera independentemente da cooperação do homem, fazendo que o pecador morto espiritualmente creia. 5. Dia Cinco: “Haja Animais”. No quinto dia, Deus novamente demonstrou autoridade suprema começando a criar o reino animal em sua grande variedade, equilíbrio e beleza: Disse também Deus: “Encham-se as águas de seres vivos, e voem as aves sobre a terra, sob o firmamento do céu”. Assim Deus criou os grandes animais aquáticos e os demais seres vivos que povoam as águas, de acordo com as suas espécies; e todas as aves, de acordo com as suas espécies. E Deus viu que ficou bom. – Gênesis 1.20,21

Este ato criativo foi realizado pelo irrestrito exercício da soberana vontade de Deus. Ele criou os animais marinhos e as aves precisamente como quis, cada qual com projeto e propósito únicos. Vê-se a mesma soberania na obra di-


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vina de salvação dos pecadores. Nos tempos por ele designados no transcorrer da história, Deus cria onipotentemente o arrependimento e a fé salvadora nos corações de todos aqueles que escolheu salvar. Como na criação do mundo, existe grande diversidade entre os seus escolhidos, os quais são redimidos de toda tribo, língua, povo e nação (Ap 5.9), e de todos os aspectos da sociedade (1Co 1.26-29). Mas há um propósito específico para cada um dos escolhidos. Nenhum ato de regeneração é incidental. Cada novo nascimento é intencional no reino de Deus. 6. Dia Seis: “Façamos o Homem”. No sexto dia, Deus completou a criação dos animais, e então fez o homem singularmente à sua imagem, como o ápice da ordem criada: Então disse Deus: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança. Domine ele sobre os peixes do mar. sobre as aves do céu, sobre os grandes animais de toda a terra e sobre todos os pequenos animais que se movem rente ao chão”. Criou Deus o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. – Gênesis 1.26,27

Deus formou o corpo físico do primeiro homem, Adão, do pó da terra, e depois soprou nele o sopro da vida – e ele se tornou um ser vivo. Certamente Adão não formou o seu próprio corpo. Tampouco foi ele a causa que o trouxe à vida. Somente Deus poderia ter feito isso. Com um projeto específico, Deus fez o homem de uma ordem superior à do resto da criação, com o nobre propósito de que o homem o conhecesse e amasse. Assim, Adão foi criado singularmente à imagem de Deus, sendo dotado de razão ou mente, emoção e vontade. Deus realiza uma obra vivificadora semelhante na regeneração de pecadores perdidos. Ele sopra vida espiritual naqueles que salva, cada um em sua hora marcada. Aqueles sobre quem ele age bondosamente por sua graça, imediatamente tornam-se vivos no novo nascimento. Nenhum pecador, espiritualmente morto, pode causar sua vivificação. Unicamente Deus pode realizar a obra da graça regeneradora.


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7. Uma Ordem: “Não Coma”. As primeiras palavras de Deus a Adão revelaram, ademais, sua autoridade para definir o bem e o mal, e para ordenar à sua criação que recusasse o mal. E o SENHOR Deus ordenou ao homem: “Coma livremente de qualquer árvore do jardim, mas não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal, porque no dia em que dela comer, certamente você morrerá”. – Gênesis 2.16,17

Somente Deus tem autoridade para dar ordens e exercer controle sobre sua criação. Colocado no jardim do Éden, Adão respirava o ar de Deus, comia alimento de Deus, gozava o paraíso de Deus. Como tal, vivia em direta obrigação de prestar contras a Deus, que lhe proibiu comer de uma única árvore, a árvore do conhecimento do bem e do mal. A desobediência, Deus disse, resultaria em imediata morte espiritual. Esta ordem e advertência divina revelaram o direito absoluto de Deus de governar sua criação em todos os aspectos. Como Criador soberano, Deus tinha o direito de estabelecer a ordem moral do universo e de fazer desta uma exigência a Adão. João Calvino nos propicia o discernimento do motivo que está por trás dessa ordem quando escreve: Moisés agora ensina que o homem era o governador do mundo, muito embora ainda sujeito a Deus. A lei lhe fora imposta como sinal dessa sujeição, pois para Deus não faria diferença alguma se ele comesse indiscriminadamente de qualquer fruto que quisesse. Portanto, a proibição de uma árvore foi uma prova de obediência. E dessa forma Deus designou que toda a raça humana se acostumasse, desde o princípio, a reverenciar a sua divindade.6 6  John Calvino, The Crossway Classic Commentaries: Genesis (Wheaton, IL, e Nottingham, Inglaterra: Crossway Books, 2001), 36


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8. Controle Mantenedor: “Deus o tornou em bem”. Tudo quanto Deus criou permanece sob seu controle direto e soberano, e ele está governando para sua glória e para o bem de seu povo: Vocês planejaram o mal contra mim, mas Deus o tornou em bem, para que hoje fosse preservada a vida de muitos”. – Gênesis 50.20

Tendo feito tudo do nada em seis dias consecutivos, Deus continua a governar as obras de suas mãos. Deus não criou o mundo e abandou o que fez. Em vez disso, preside todas as atividades da providência com sabedoria perfeita e poder soberano. Deus controla continuadamente tudo o que fez, dirigindo todas as coisas para determinado fim, em conformidade com seu plano. Mesmo as más ações dos pecadores são dominadas por Deus e utilizadas para realizar os seus propósitos. Apesar da presença de Satanás e de pecadores no mundo, Deus continua sendo absolutamente soberano sobre todas as atividades dos homens. Vê-se isso na vida de José, cujos irmãos procuraram prejudicar. Thomas Schreiner e Bruce Ware explicam: Enquanto Deus regula e rege tudo o que acontece na história, incluindo as escolhas e as ações dos seres humanos, todos os seres humanos usam sua volição para escolher o que eles plenamente tencionam realizar. Eles têm suas intenções. Eles escolhem. Eles agem. Contudo, em tudo isso e por meio disso tudo, a vontade de Deus é feita, não frustrada. Como José afirma tão claramente em Gênesis 50.20 com referência às ações responsáveis de seus irmãos: ‘Vocês planejaram o mal contra mim, mas Deus o tornou em bem’. Deus é soberano nas ações livres e por meio destas ações que praticamos, e pelas quais temos responsabilidade. Em toda parte a Bíblia afirma isso, e nisso nós cremos.7

Deus é soberano sobre tudo e sobre todos! 7  Thomas R. Schreiner e Bruce A. Ware, Still Sovereign (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1995, 2000), 11.


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A DOUTRINA EM FOCO DEPRAVAÇÃO TOTAL Imediatamente em seguida à manifestação da soberania divina nos capítulos iniciais de Gênesis, Moisés apresenta a depravação total – o primeiro título importante do calvinismo bíblico. Temos aí o registro inspirado da entrada do pecado, da morte espiritual e a resultante corrupção de toda a humanidade. Esta depravação propagou-se por toda a raça humana, afetando a mente, as emoções e a vontade – cada parte de cada homem sofre a ruína causada pelo pecado. A devastação da raça humana tem sua origem no pecado do primeiro casal no Jardim do Éden. Tragicamente, Adão e Eva transgrediram a ordem que Deus tinha dado que não comessem o fruto proibido. Deus lhes tinha prometido a morte no dia em que o comessem, e foi esse precisamente o resultado da sua desobediência. 1. A Sedução Satânica. Pouco depois que a lei de Deus tinha sido pronunciada – a ordem para que não comessem o fruto proibido – Adão desobedeceu: Ora, a serpente era o animal mais astuto de todos os animais selvagens que o SENHOR Deus tinha feito. E ela perguntou à mulher: “Foi isto mesmo que Deus disse: ‘Não comam de nenhum fruto das árvores do jardim?’” Respondeu a mulher à serpente: “Podemos comer do fruto das árvores do jardim, mas Deus disse: ‘Não comam do fruto da árvore que está no meio do jardim, nem toquem nele, do contrário vocês morrerão’”. Disse a serpente à mulher: “Certamente não morrerão! Deus sabe que, no dia em que dela comerem, seus olhos se abrirão, e vocês, como Deus, serão conhecedores do bem e do mal” – Gênesis 3.1-5

Lúcifer, que ocupava a posição mais alta do exército angélico, anteriormente se rebelara no céu (Is 14.12-17; Ez 28.12-19) e instigara um terço dos anjos a se revoltarem contra Deus (Ap 12.4). Satanás foi expulso do céu e lançado à terra. Em Gênesis 3 o anjo sumamente exaltado veio abaixo para o palco


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da história humana e continuou a fazer sua solicitação a outros para que pecassem, tentando Eva a induzir Adão a entrar na rebelião contra Deus. Martinho Lutero escreve: Mas esta tentação – quando Satanás ataca a Palavra e as obras de Deus – é muito mais grave e mais perigosa, e é peculiar à igreja e aos santos. Segue-se, pois, que, aqui, Satanás ataca Adão e Eva dessa maneira para privá-los da Palavra e para fazê-los acreditar em sua mentira depois que perderam a Palavra e sua confiança em Deus.8

A sedução sofrida pelo primeiro casal foi sutilmente diabólica, levando-o a desobedecer provocativa e temerariamente à única proibição feita por Deus. 2. Desobediência Temerária. Preferindo desconsiderar o mandamento de Deus, Adão pecou – atrevida, intencional, deliberada e egoisticamente. Mergulhou de cabeça num provocativo e temerário ato de desobediência, com os olhos bem abertos: Quando a mulher viu que a árvore parecia agradável ao paladar, era atraente aos olhos e, além disso, desejável para dela se obter discernimento, tomou do seu fruto, comeu-o e o deu a seu marido, que comeu também. – Gênesis 3.6

Adão escolheu desafiar e desobedecer a Deus. O pecado foi concebido no ventre do seu coração e depois deu nascimento à insubordinação. Apesar de ter sido colocado num Paraíso, cercado de abundantes bênçãos de Deus, o homem escolheu resistir ao direito de Deus de governar sobre ele. Sobre esta rebelião cósmica, R. Kent Hughes observa: 8  Martin Luther, Luther’s Works, Vol. I: Lectures on Genesis Chapters 1-5, ed. Jaroslav Pelikan (St. Louis, MO: Concordia Publishing House, 1958), 147.


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Adão pecou voluntariamente, com os olhos bem abertos, sem hesitação. Seu pecado estava carregado de interesse próprio. Ele tinha observado Eva tomar o fruto, e viu que nada lhe aconteceu. Ele pecou voluntariamente, supondo que não lhe viriam consequências de nenhuma espécie. Tudo estava de pernas para o ar: Eva seguiu a serpente, Adão seguiu Eva, e ninguém seguiu Deus.9

Ficou claro que o homem não quis submeter-se à soberania de Deus. 3. Conhecimento Carnal. Tendo pecado temerariamente contra Deus, Adão e Eva imediatamente perderam toda a inocência e entraram num estado de culpa interior: Os olhos dos dois se abriram, e perceberam que estavam nus; então juntaram folhas de figueira para cobrir-se. – Gênesis 3.7

Na mesma hora a vergonha entenebreceu as almas do primeiro casal e o moveu a querer esconder-se de Deus. O sentimento de contaminação perturbou suas consciências. Hugues explica: A palavra “culpa” expressa a relação que o pecado tem com a justiça, ou, como os teólogos mais antigos a explicavam, com a penalidade da lei. O pecador está em relação penal com a lei. ... A culpa do pecado de Adão, cometido por ele como chefe ou cabeça federal da raça humana, é imputado a todos os seus descendentes. Isso é evidente pelo fato que, como a Bíblia ensina, a morte como punição do pecado, passa de Adão a todos os seus descendentes.10 9  R. Kent Hugues, Genesis: Beginning and Blessing (Wheaton, Illinois: Crossway Books, 2004), 71. 10  Ibid., 245,246.


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Seus olhos foram abertos para um entendimento experimental do pecado. Seus corações estavam dominados pela consciência da corrupção. Tal foi a devastação feita pelo pecado. Descrevendo este novo sentimento de culpa interior, Barnes escreve: Tão logo a transgressão é consumada, o senso de malignidade do ato precipita-se na mente. O desprazer do grande ser cuja ordem tinha sido desobedecida, a irremediável perda que decorre do pecado, a vergonha de este ser visto pelos que estão por perto como algo que envolve culpa, juntam-se no panorama à vista. Toda a natureza, cada criatura, parece agora uma testemunha da sua culpa e vergonha, um juiz que condena, um agente da vingança divina. Esse é o conhecimento do bem e do mal que eles adquiriram com sua queda da obediência – essa é a abertura dos olhos que o seu mau proceder requeria. ... Eles agora notam que as suas pessoas culpadas estão expostas a olhos alheios, e eles recuam, afastando-se do alcance, ainda que de relance, de todo olhar condenatório.11

4. Morte Espiritual. No momento em que Adão e Eva pecaram, morreram espiritualmente. Sua relação pessoal com Deus cessou. Sua desobediência separou-os do criador: Ouvindo o homem e sua mulher os passos do Senhor Deus que andava pelo jardim quando soprava a brisa do dia, esconderam-se da presença do Senhor Deus entre as árvores do jardim. Mas o Senhor Deus chamou o homem, perguntando: “Onde está você?” – Gênesis 3.8-9

A íntima comunhão que o homem e a mulher tinham desfrutado com Deus no jardim foi rompida. Ocorrera a morte espiritual de suas almas. Agora 11  Albert Barnes, A Commentary on the Book of Genesis (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1996, 1873), 114-115.


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havia um corte e uma separação em sua comunhão com Deus – o Deus santo foi alienado do homem pecador. Em consequência, Adão escondeu-se de Deus. Estes versículos revelam a profunda queda do homem no salário do pecado, que é a morte. Lutero comenta: “Oh, que grave e funda queda, mergulhar do mais alto senso de segurança, da confiança e prazer em Deus, para um tão pavoroso terror, que o homem recua e se afasta da vista de Deus mais do que da vista e da presença do Diabo”.12 Adão deixou de buscar Deus, mas, ao contrário, passou a fugir dele – esquema que infeccionou toda a raça humana. 5. Natureza Pecaminosa. As naturezas de Adão e de Eva tornaram-se radicalmente pecaminosas. Todo o ser interior deles subitamente se tornou fortemente inclinado para o pecado: E ele respondeu: “Ouvi teus passos no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi”. – Gênesis 3.10

O pecado de Adão e Eva levou, no mesmo instante, cada um deles a sujeitar-se a uma natureza pecaminosa, que se tornou a força diretora em suas vidas. Por causa da natureza pecaminosa permanente deles, o pecado dominou suas vidas. De repente o temor encheu o coração de Adão. A paz abriu caminho para o tumulto interior. O contentamento foi substituído pela inimizade. John MacArthur explica: É significativo que, pela própria admissão de Adão, a razão de seu temor estava nele mesmo, não em Deus. Note-se que Deus veio ao jardim como sempre fazia antes – não com fúria ardente, mas gentilmente, com bondade, passeando na hora fresca do dia, desejoso de partilhar sua bondade com suas criaturas e de gozar comunhão com elas”.13 12  Lutero, Luther’s Works, Vol. I: Lectures on Genesis Chapters 1-5, 171. 13  John MacArthur, The Battle for the Beginning, The Bible on Creation and the Fall of Adam (Nashville, TN: W Publishing


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Em vez de fruir a presença de Deus, agora o homem estava cheio de medo. Deus era a última pessoa que Adão queria ver. O resultado desses acontecimentos foi que Adão e Eva fugiram da santa presença de Deus, modelo que subsequentemente seria seguido por toda a raça humana. Lutero, de novo, observa: Aprendamos, pois, que esta é a natureza do pecado; a menos que Deus proveja imediatamente uma cura e chame de volta o pecador, ele foge interminavelmente de Deus e, escusando-se com mentiras, acumula pecado sobre pecado até chegar à blasfêmia e ao desespero. Assim o pecado, por sua gravitação, sempre traz consigo outro pecado e leva à destruição eterna, até que, finalmente, a pessoa pecadora preferirá acusar Deus a reconhecer o seu próprio pecado.14

Desse ponto em diante, nenhum pecador jamais procuraria o Deus santo por sua própria iniciativa. 6. Negação Pecaminosa. Quando foram confrontados com o seu pecado, o primeiro casal evitou confessá-lo ou mesmo reconhecê-lo: Deus perguntou: “Quem lhe disse que você estava nu? Você comeu do fruto da árvore da qual lhe proibi comer?” Disse o homem: “Foi a mulher que me deste por companheira que me deu do fruto da árvore, e eu comi”. O Senhor Deus perguntou então à mulher: “Que foi que você fez?” Respondeu a mulher: “A serpente me enganou, e eu comi”. – Gênesis 3.11-13

Começou a mascarada. Escusas foram apresentadas. Tanto o homem como a mulher entraram a fazer uso da negação. Adão resistiu a assumir a Group, 1984), 214, 215. 14  Lutero, Luther’s Works, Vol. I: Lectures on Genesis Chapters 1-5, 175.


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sua transgressão, preferindo empurrar a culpa para sua esposa. Ele até tentou apontar um dedo acusador a Deus por lhe haver dado tal mulher. Eva, igualmente, tentou passar a culpa para Satanás. A natureza do pecado dentro deles fez que desconsiderassem completamente qualquer responsabilidade pessoal por seu pecado. Evitaram a todo custo confessá-lo. Nessa recusa a reconhecer o seu pecado, vemos o rumo que todos os homens seguem. Lutero anota perceptivamente essa negação pecaminosa quando escreve: Veja-se quão soberbamente a viciosa natureza do pecado é retratada aqui. De modo nenhum Adão pode ser forçado a uma confissão do seu pecado, mas o que ele faz é negar o seu pecado ou escusá-lo enquanto vê que há alguma esperança ou mais algum tipo de escusa. Não é espantoso que, no princípio, ele esperava ser capaz de acobertar o seu pecado e que acusou Deus, em vez de reconhecer que tinha errado. Mas isto é espantoso: ele ainda persistiu em sua escusa depois que a sua consciência o tinha convencido e que ele tinha ouvido o seu pecado apontado por Deus.... É da natureza do pecado não permitir que a alma fuja de volta para Deus, mas, antes, forçá-la a fugir para longe de Deus.15 7. Morte Física. Deus tinha dito enfaticamente a Adão e Eva que a desobediência à única proibição traria a morte. Ele não modificou essa penalidade: Com o suor do teu rosto você comerá o seu pão, até que volte à terra, visto que dela foi tirado; porque você é pó, e ao pó voltará. – Gênesis 3.19

Quando Adão pecou, não morreu de imediato fisicamente. Contudo, o seu corpo começou a morrer. Sujeito à mortalidade, seu corpo começou a envelhecer, a deteriorar-se, a decair. Em vez de durar para sempre, o corpo de Adão expiraria depois de 930 anos de vida. É a corrupção do pecado que há dentro de todos os membros da raça de Adão que os leva a morrer fisica15  Ibid, 177.


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mente. Sobre este fato, Louis Berkhof escreve: “A posição da igreja sempre foi que a morte, no pleno sentido da palavra, incluindo a morte física, não é somente consequência, mas, também, penalidade do pecado. O salário do pecado é a morte”.16 Assim, embora o corpo não morra imediatamente, morre inevitavelmente. 8. Depravação Transmitida. Quando Eva teve filhos de Adão, eles foram concebidos à semelhança dele, com naturezas pecaminosas: Aos 130 anos, Adão gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem; e deu-lhe o nome de Sete”. – Gênesis 5.3.

Quando nasceram filhos do primeiro casal, a depravação radical das suas naturezas propagou-se à sua prole, e, subsequentemente, a toda a raça humana, na hora da concepção de cada um (Sl 51.5; 58.3). Esta depravação interior está em marcante contrate com o estado de incontaminada inocência original de Adão. Adão foi criado à imagem de Deus (Gn 1.27), mas a semelhança dele com Deus foi corrompida pelo pecado. Dessa forma o homem começou a perpetuar o pecado. Esta é uma das verdades básicas da teologia – a depravação da natureza pecaminosa dos primeiros pais transmitida para a raça humana. Calvino explica: Ao dizer que Adão teve um filho à sua semelhança, Moisés se referiu à origem da nossa natureza. Mas, ao mesmo tempo, aludiu à corrupção e à poluição dessa natureza, o que, devido ao pecado de Adão e à Queda, seguiu adiante passando a toda a sua posteridade. Portanto, segundo a carne Sete nasceu pecador.17 16  Louis Berkhof, Systematic Theology (Carlisle, PA, e Edimburgo, Escócia: The Banner of Truth Trust, 1958), 260 [citação feita apud Teologia Sistemática, tradução feita por Odayr Olivetti, 1ª. ed. 1990, página 262.] 17  Calvino, Genesis, 64.


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A natureza da alma de todos os homens agora estaria, como está, praguejada pelo pecado. 9. Depravação Total. Cada filho nascido de mulher é dado à luz à semelhança de Adão, com natureza radicalmente corrupta. Moisés descreve como era a natureza humana pouco antes do Dilúvio como segue: O Senhor viu que a perversidade do homem tinha aumentado na terra e que toda a inclinação dos pensamentos do seu coração era sempre e somente para o mal. – Gênesis 6.5

A depravação do primeiro casal passou para cada geração sucessiva, de cada pai à sua prole. Perto do tempo do Dilúvio, a depravação do coração humano estava correndo desenfreadamente para formas grosseiras de pecado irrestrito. Perversos e pervertidos, os homens permaneciam em torpe iniquidade. Essa corrupção penetrou até o cerne dos seus seres, pois “toda a inclinação dos pensamentos do seu coração era sempre e somente para o mal”. A última palavra deste versículo, na Versão King James, “continuamente”, descreve até que distância a natureza pecaminosa do homem vomita o seu veneno. Sobre esta depravação, James Montgomery Boice anota: “Uma pessoa cujo coração só pode inclinar-se para o mal, certamente não procura nem pode procurar Deus”.18 Este é o fim a que chega a depravação do homem, se não recebe a restrição da graça de Deus. O coração humano persegue o mal sem descanso. Sobre este fato, MacArthur escreve: “Esta é uma das mais fortes e mais claras declarações acerca da natureza pecaminosa do homem. O pecado começa no pensamento. O povo do tempo de Noé era excessivamente iníquo, de dentro para fora”.19 Astutamente, Ryle anota: 18  James Montgomery Boice e Philip Graham Ryken, The Doctrines of Grace: Rediscovering the Evangelical Gospel (Wheaton, IL: Crossway Books, 2002), 70. 19 John MacArthur, The MacArthur Study Bible (Nashville, Londres, Vancouver, Melbourne: Word Bibles, 1997), 24.


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Há poucos erros e falsas doutrinas das quais o inicio não pode ser encontrado nas inseguras e fracas ideias sobre a corrupção da natureza humana. Ideias errôneas sobre a doença sempre trazem com elas ideias erradas sobre o remédio; ideias errôneas sobre a corrupção da natureza humana sempre trazem com elas ideias erradas sobre o grande antídoto e cura daquela corrupção.20

Calvino acrescenta: A iniquidade deles invadiu a terra inteira. Quer dizer que o tempo para a punição tinha chegado de vez. A iniquidade reinava sobre toda a terra e a cobriu. Desse fato se vê que o mundo não foi engolfado por uma total enchente de águas enquanto não tinha sido primeiro imerso na corrupção da iniquidade.21

10. Depravação Inalterável. A natureza humana caída continuou inalterada depois do Dilúvio. A raça humana não ficou diferente, depois do Dilúvio, do que era antes dele (cf. Gn 6.5): “... pois o seu coração [do homem] é inteiramente inclinado para o mal desde a infância”. – Gênesis 8.21c

Uma família de pecadores entrou na arca – Noé, sua esposa, seus três filhos e suas esposas – e uma família de pecadores saiu da arca para repopularizar a terra. A depravação permaneceu inalterada. Apesar de viver num novo mundo, a raça humana continuava sendo iníqua e pecaminosa. O fato é que a depravação do 20  J. C. Ryle, conforme citado por Duane Edward Spencer em TULIP, The Five Points of Calvinism in the Light of Scripture, 2ª. ed. (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1979), 31. 21  Calvino, Genesis, 69.


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coração humano continua sendo a mesma até o dia de hoje. Sua natureza não está evoluindo para níveis mais altos, como muitos erroneamente supõem. Sua disposição interior é tão exatamente iníqua como era no princípio. A respeito desta depravação imutável Calvino escreve: Portanto, que os homens reconheçam que, visto que nascem de Adão, são criaturas depravadas, e por isso somente podem conceber pensamentos pecaminosos, enquanto não forem transformados pela obra redentora de Cristo e não forem refeitos por seu Espírito para uma nova vida. Não se deve duvidar de que o Senhor declara que a própria mente do homem é depravada e está infectada pelo pecado, de maneira que todos os pensamentos que procedem de sua mente são maus. Se a fonte mesma tem esse defeito, segue-se que todos os afetos e sentimentos do homem são maus, e que os seus feitos estão cobertos da mesma corrupção... Pois, já que sua mente está corrompida com desrespeito a Deus, orgulho, amor próprio, e hipocrisia ambiciosa, todos os seus pensamentos estão contaminados com os mesmos vícios.... Os próprios afetos e sentimentos, que em si mesmo são louváveis, estão viciados pelo pecado original... os homens nascem maus. Isto mostra que, tão logo chegam a uma idade em que são capazes de pensar, eles já têm mentes radicalmente corruptas... a depravação penetra os nossos sentidos. ...Ninguém deve culpar Deus por isso. A origem desta doença brota da deserção do primeiro homem, por causa de quem a ordem da criação foi subvertida. ...Conquanto todos corram para praticar maus atos, ninguém é forçado a isso, a não ser pela direta inclinação dos seus próprios corações. Quando pecam, fazem isso porque querem pecar.22 22  Ibid., 85,86.


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A DOUTRINA EM FOCO ELEIÇÃO INCONDICIONAL Em meio a esse registro de tão vergonhoso pecado, Moisés também ensinou o segundo maior título das doutrinas da graça – a eleição incondicional de Deus. Esta doutrina ensina que Deus escolheu para si pecadores individuais caídos que quis salvar. Tendo mostrado que Deus se propusera criar o universo, a raça humana inclusive, Moisés vai adiante e expõe a soberania de Deus em sua generosa escolha de, por sua graça, resgatar um povo da massa da humanidade caída para vir a ser a sua peculiar propriedade redimida. Vê-se inequivocamente a graça soberana na escolha incondicional que Deus fez de salvar Adão, Eva, Abel, Enoque e Noé com sua família. Após a dispersão, por ocasião da Torre de Babel, Deus deu a conhecer sua soberana escolha de Abraão para ser o pai da nação escolhida, Israel. De dentro da nação de Israel, Deus salvou um remanescente que tinha escolhido, começando com Abraão. Deus fez esta escolha misericordiosa daqueles que, por sua misericordiosa graça, tinha trazido para si antes da fundação do mundo. 1. Escolha Divina. No meio da massa da humanidade, Deus selecionou soberanamente Abraão e o tirou do paganismo de Ur dos Caldeus para ser objeto de sua graça salvadora: Então o Senhor disse a Abraão: “Saia da sua terra, do meio dos seus parentes e da casa de seu pai, e vá para a terra que eu lhe mostrarei. Farei de você um grande povo, e o abençoarei. Tornarei famoso o seu nome, e você será uma bênção. Abençoarei os que o abençoarem e amaldiçoarei os que o amaldiçoarem; e por meio de você todos os povos da terra serão abençoados”. – Gênesis 12.1-3

A escolha divina, com absoluta certeza, não se baseou em alguma fé prevista da parte de Abraão. Abraão nem sabia o nome de Jeová quando vivia em Ur.


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A escolha de Abraão da manchada massa da humanidade pecadora originou-se dentro de Deus, por razões que só Deus sabe. Deus exerceu e exercerá esta mesma soberania absoluta na escolha de um remanescente salvo em todas as gerações dentro de Israel e dentre todas as famílias da terra. A verdade sobre a eleição de Abraão feita por Deus é a verdade a respeito da eleição de toda pessoa escolhida para a vida eterna. S. Lewis Johnson escreve: Para se entender o sentido da vida e do ministério de Abraão, é fundamental entender sua eleição, tanto para a salvação como para o ministério designado para ele.... O chamado de Abraão, que chegou a um homem que estava no fundo do poço da idolatria e da incredulidade, foi resultado da soberana determinação de Deus de elegê-lo para a salvação e para o serviço na causa de Deus. Ele e os seus jaziam no paganismo, servindo a outros deuses (cf. Js 24.2), quando o Deus da glória lhe apareceu em busca da realização de seu propósito de abençoá-lo e de extrair dele a semente na qual todas as famílias da terra seriam abençoadas. Por que o escolhido foi Abraão, e não Bilduk, o meshita, permanece dentro do inescrutável propósito de Deus, pois ele tem misericórdia de quem ele quer ter misericórdia.23

2. Escolha Distintiva. Na geração que se seguiu, Abrão – cujo nome Deus depois mudou para Abraão – teve dois filhos, Ismael e Isaque, entre outros filhos. Deus escolheu Isaque para si: Então Deus respondeu: “Na verdade, Sara, sua mulher, lhe dará um filho, e você lhe chamará Isaque. Com ele estabelecerei a minha aliança, que 23  S. Lewis Johnson, Expository Sermons on Genesis, “The Call of Abram, or Election, Effectual Calling, and Final Perseverance” (sermão inédito, Believer’s Chapel, Dallas, TX), 4.


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será uma aliança eterna para os seus futuros descendentes. E no caso de Ismael, levarei em conta o seu pedido. Também o abençoarei; eu o farei prolífero e multiplicarei muito a sua descendência. Ele será pai de doze príncipes e dele farei um grande povo. Mas a minha aliança, eu a estabelecerei com Isaque, filho que Sara lhe dará no ano que vem, por esta época”. – Gênesis 17.19-21

Apesar de Ismael ter nascido primeiro, Deus, não obstante, escolheu especificamente Isaque para ser o herdeiro da promessa. Deus escolheu Isaque e deixou de lado Ismael num ato de prerrogativa soberana. Esta escolha distintiva foi designada para mostrar que a salvação não seria consequência de um nascimento ou de uma linhagem natural. A salvação seria, antes, pela escolha da soberana graça de Deus. O nascimento milagroso de Isaque serviria como uma excelente figura da escolha soberana de Deus na salvação e em sua obra sobrenatural no novo nascimento. Concernente a este exercício da soberania divina na salvação, Calvino escreve: Aqui fica evidente que Deus escolheu entre os dois filhos de Abraão. A um prometeu riqueza, posição social e outras coisas pertencentes a esta presente vida. Desse modo demonstrou que Ismael era um filho do ponto de vista humano. Mas Deus fez uma aliança especial com Isaque, aliança que se estendeu para além do mundo e desta frágil vida. Deus fez isso, não para cortar Ismael da esperança de vida eterna, mas para ensinar-lhe que a salvação deve ser procurada no povo de Isaque, onde ela realmente está.24

3. Escolha Determinada. Inseparavelmente ligada à doutrina da eleição soberana está o fato de que Deus escolheu amorosamente Abraão para ser objeto de sua graça salvadora. A eleição tem suas raízes no amor divino: 24  Calvino, The Crossway Classic Commentaries: Genesis, 170.


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“...Pois eu o escolhi, para que ordene aos seus filhos e aos seus descendentes que se conservem no caminho do Senhor, fazendo o que é justo e direito, para que o Senhor faça vir a Abraão o que lhe prometeu”. – Gênesis 18.19

A palavra hebraica que Moisés emprega neste texto para “escolhi” (yadah) significa “escolhi em amor”. Berkhof explica este ponto quando escreve: A palavra yadah pode significar simplesmente “conhecer” ou “tomar conhecimento” de alguém ou de alguma coisa, mas também pode ser empregada no sentido mais denso de “tomar conhecimento de alguém com amoroso cuidado”, ou “fazer de alguém objeto de amoroso cuidado ou de amor eletivo”. Nesse sentido se presta para expressar a ideia de eleição, Gn 18.19.25

Deus escolheu soberanamente colocar seu coração sobre Abraão com amor distintivo e redentor, resultando em sua salvação. Por razões que só Deus conhece, ele escolheu ter compaixão de Abraão. Dentro da humanidade corrupta de Abrão, não havia nada que atraísse Deus para amá-lo. Em vez disso, a origem de tal amor estava dentro da soberana vontade de Deus. Deus amou Abraão simplesmente porque escolheu amá-lo. Esta escolha determinativa de amar indivíduos pecadores está por trás de cada salvação. Deus escolheu amar os seus eleitos com amor imerecido. 4. Escolha Diferente. A escolha de Deus na eleição frequentemente é incomum, imensamente diferente da escolha que o homem faria. A escolha de Jacó e não de Esaú é um exemplo; só pode ser explicada por eleição soberana: Disse-lhe o Senhor: “Duas nações estão em seu ventre, já desde as suas entranhas dois povos se separarão; um deles será mais forte que o outro, mas o mais velho servirá ao mais novo”. – Gênesis 25.23 25  Berkhof, Systematic Theology, 111,112. [Apud Teologia Sistemática, tradução de Odayr Olivetti, p. 113.]


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A escolha divina de Jacó não pode ser explicada pela ordem de nascimento ou por direitos naturais. Deus escolheu livremente Jacó, o mais novo, e não Esaú, o mais velho. Esta escolha foi o inverso do que era costumeiro. Calvino vê a escolha incomum de Jacó como a de um representante da seleção soberana de pecadores: “Que poderia ele [Deus] prever, senão esta massa corrupta de Adão, que outro fruto não produz senão maldição... Elimine-se a eleição, que restará? Como temos declarado, estaremos completamente perdidos e amaldiçoados”.26 Temos aí demonstrada graficamente a prerrogativa autônoma da soberania divina no ato de eleição (Rm 9.9-13, 18-23).

A DOUTRINA EM FOCO EXPIAÇÃO LIMITADA Moisés não ensina somente a verdade sobre a eleição soberana; ele escreveu também acerca do terceiro maior título das doutrinas da graça – expiação limitada. Esta é a verdade divina segundo a qual Cristo morreria pelos pecados de todos os escolhidos por Deus. Quer dizer, Cristo daria sua vida especificamente pelo remanescente crente, tomando seu lugar na cruz e derramando seu sangue para cobrir as suas iniquidades. Sua morte redentora seria por aqueles que seriam introduzidos na família de Deus. Isso foi profetizado imediatamente após o pecado de Adão, prefigurado no animal que Deus imolou no jardim e previsto no sacrifício oferecido por Abel. 1. Morte Específica. Depois que Adão pecou no jardim, Deus pronunciou suas maldições sobre todos os participantes. Começou com a serpente, mas essa maldição continha uma clara alusão a uma expiação definida: “...Porei inimizade entre você e a mulher, entre a sua descendência e o descendente dela; este lhe ferira a cabeça, e você lhe ferirá o calcanhar.” – Gênesis 3.15 26  João Calvino, Sermons on Election and Reprobation (Audubon, NJ: Old Paths, 1996), 30.


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No meio de uma série de juízos devastadores, há um refulgente diamante da graça divina. Os teólogos o denominam protoevangelium, que é a palavra grega para “a primeira menção do Evangelho”. Ali, no Jardim do Éden, Deus revelou perpétua inimizade entre a semente de Satanás – isto é, todos os incrédulos descendentes de Satanás (Jo 8.44; Ef 2.2) – e a semente da mulher, a saber, aqueles que estariam na família de Deus. Mas Deus também profetizou a cruz, dizendo, metaforicamente, que Satanás feriria o calcanhar de Cristo, fazendo-o sofrer – mas que não seria derrotado. Mediante sua morte, Cristo esmagaria o Diabo, dando-lhe um devastador golpe e lhe causando a derrota. Portanto, nesta primeira menção que a Bíblia faz da morte de Cristo, há o ensino de uma redenção definida em favor da semente crente da mulher. O Messias ferido morreria especificamente por aqueles que pertenceriam a seu reino – isto é, por todos os crentes. Concernente à primeira promessa de um Redentor, MacArthur escreve: A maior bênção que está ligada à maldição é a promessa de Cristo, o Redentor, a Semente da mulher – Aquele que esmagaria a cabeça da serpente.... Primeiro, ele seria a Semente da mulher. Essa linguagem é significativa porque, normalmente, a prole é descrita como a semente de seus pais. Essa expressão parece uma sutil referência ao nascimento virginal de Cristo. Ele nasceu de mulher num sentido particular, mas Deus foi seu único Pai (Lc 1.34,35).... Segundo, haveria inimizade entre ele e a serpente.... Significa o continuado conflito entre Satanás e Cristo. Satanás, o destruidor das almas dos homens, opõe-se a Cristo, o salvador do mundo. O Maligno odeia o Santo e, por isso, coloca-se, e também a “sua semente” – todos os que pertencem a seu reino (demônios e seres humanos) – contra a semente da mulher. Terceiro, a semente da mulher sofreria. Satanás feriria o seu calcanhar. Isto fala do sofrimento de Cristo na cruz.... Quarto, o Salvador triunfaria. Poria fim à inimizade para sempre


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esmagando a cabeça da serpente. Satanás, a serpente, fez o que pôde para destruir Cristo, mas no fim só deixou um ferimento que seria curado. Cristo ressuscitou triunfalmente dos mortos, obtendo redenção... esmagando a cabeça da serpente, como fora prometido”.27

Por meio de sua morte, Cristo salvaria todos os que creem. 2. Substituição Específica. No jardim, Deus também ofereceu um quadro simbólico da futura morte de Cristo por seus escolhidos. Por iniciativa soberana, ele fez coberturas para a nudez do primeiro casal. O Senhor Deus fez roupas de pele e com elas vestiu Adão e sua mulher. – Gênesis 3.21

O Senhor, pessoalmente, matou um animal inocente e fez coberturas para a nudez e para a culpa de Adão e Eva. Foi a primeira morte no mundo recentemente criado por Deus – um sacrifício imolado. O animal foi morto nas mãos de Deus, que providenciou pele, de graça, para o primeiro casal como uma expressão de sua graça salvadora. Suas roupas de pele representavam a provisão de Deus para a restauração da relação de Adão e Eva com ele. Este sacrifício cruento representou a vinda de Cristo ao mundo para redimir seu povo. O Filho de Deus seria o Cordeiro de Deus, que tiraria o pecado de seu povo (Jo 1.29, 36). Unicamente o seu sacrifício proveria uma cobertura para a nudez exposta da culpa de Adão e Eva. Explicando a morte substitutiva, Boice assinala que ela simbolizou o sangue derramado e a justiça perfeita de Cristo. Boice escreve: Para fazer roupas de pele, Deus teve de matar animais. Foi a primeira morte que Adão e Eva testemunharam, quanto pode27  MacArthur, The Battle for the Beginning, The Bible on Creation and the Fall of Adam, 218, 219.


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mos saber. Deve ter-lhes parecido horrível e causado impressão indelével. “Então a morte é isso; é isso que o pecado causa!”, eles devem ter exclamado. Mas, ainda mais importante, a morte dos animais deve ter-lhes ensinado o princípio da substituição, o inocente morrendo pelo culpado, exatamente como o inocente Filho de Deus morreria um dia pelos pecados daqueles que Deus lhe deu. Quando Deus vestiu os nossos primeiros pais com peles de animais, Adão e Eva devem ter tido ao menos um tênue vislumbre da doutrina da justiça imputada.... Deus salvou Adão e Eva dos seus pecados vestindo-os com a justiça celestial de Jesus Cristo, que ele simbolizou vestindo-os com peles de animais.28

3. Sacrifício Específico. Adão e Eva conceberam e tiveram dois filhos, Caim e Abel (Gn 4.1,2). Quando chegou a hora de eles fazerem oferendas ao Senhor, nunca dois sacrifícios foram mais opostos um ao outro. Deus rejeitou o sacrifício de Caim, mas aceitou o de Abel. Abel, por sua vez, trouxe as partes gordas das primeiras crias do seu rebanho. O Senhor aceitou com agrado Abel e sua oferta. – Gênesis 4.4

Caim trouxe uma oferta do seu campo, uma oferta não cruenta, uma oferta não aceitável para Deus. Mas Abel trouxe as primícias do seu rebanho, um sacrifício cruento, que foi aceitável para Deus. Esta oferta foi uma previsão do sacrifício definido de Cristo, pelo qual o seu sangue seria derramado por muitos crentes. Esta narrativa mostra que os pecadores só podem aproximar-se de Deus mediante um sacrifício aceitável – aprovado por ele mesmo. Deus estipulou desde o princípio que o sacrifício seria – um sacrifício substitutivo, com derramamento de sangue – razão 28  James Montgomery Boice, The Glory of God’s Grace, The Meaning of God’s Grace – and How It Can Change Your Life (Grand Rapids, MI: Kregel Publications, 1993), 14,15.


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pela qual Cristo Jesus teve de sofrer morte sanguinária e substitutiva. Matthew Henry escreve: “Abel trouxe um sacrifício de expiação, cujo sangue foi derramado para remissão, com isso assumindo que era pecador, suplicando misericórdia pela a ira de Deus e implorando o seu favor com um Mediador”.29 Este sacrifício cruento era exclusivo para o que crê.

A DOUTRINA EM FOCO GRAÇA IRRESISTÍVEL Além disso, Moisés ensinou um quarto ponto importante das doutrinas da graça – o irresistível chamado de Deus. Deus inicia o chamado dos pecadores eleitos por ele e assegura a desejada resposta deles. A verdade é que os não regenerados não podem nem querem buscar Deus enquanto ele próprio não os chamar eficazmente. Este é o irresistível chamado de Deus, que sempre assegura o resultado visado por Deus. Quando regenera e chama uma pessoa, Deus revela o pecado que há na vida dela, induzindo-a a confessar e a abandonar o seu pecado. Foi o que aconteceu quando chamou Adão e Eva no jardim: Fez um chamado soberano ao primeiro casal - chamado que os impeliu à salvação. 1. Chamado Iniciado por Deus. Deus é o grande procurador de pecadores perdidos. O homem perdido, pecador, contaminado pela culpa, escolhe esconder-se de Deus, não o busca. Por isso, na salvação, sempre é necessário que Deus tome a iniciativa: Ouvindo o homem e a mulher os passos do Senhor Deus... esconderam-se da presença do Senhor Deus entre as árvores do jardim. Mas o Senhor Deus chamou o homem, perguntando: “Onde está você?” – Gênesis 3.8,9 29  Matthew Henry, Matthew Henry’s Commentary on the Whole Bible (Peabody, MA: Hendrickson Publishers, Inc.,1998), 17.


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Se Deus não procurasse e não salvasse o perdido, ninguém poderia ser salvo. Mas Deus procura e salva pecadores perdidos, e, quando os encontra, chama-os para si. A parte do homem é fugir de Deus, e a parte de Deus é perseguir o homem e trazê-lo para si. Esta é a graça de Deus, sua graça irresistível. O chamado de Deus a Adão e Eva figura, então, a salvação de cada um dos eleitos de Deus. Escrevendo sobre a verdade da graça irresistível de que falam estes versículos, Boice declara: Note-se que, quando Deus chamou Adão, Adão respondeu! Quando Deus citou Adão e Eva, eles compareceram ao banco dos réus! Pode ser que não tenham querido fazer isso. Tinham se escondido, e preferiam ficar escondidos. Mas Deus os chamou. A vontade de Deus era que eles viessem à frente. E porque essa era a vontade soberana, poderosa e eficaz de Deus, Adão e Eva responderam e atenderam ao chamado, justamente como todos os homens e mulheres responderão e atenderão quando convocados pelo toque da trombeta de Deus.30

Se pecadores hão de ser salvos, é necessário que Deus os persiga e chame. 2. Chamado que Expõe o Pecado. O chamado eficaz de Deus é sempre um chamado que expõe o pecado, revelando a iniquidade que separa dele o pecador. E Deus perguntou: “Quem lhe disse que você estava nu? Você comeu do fruto da árvore da qual lhe proibi comer?” Disse o homem: “Foi a mulher que me deste por companheira que me deu do fruto da árvore, e eu comi”. O Senhor Deus perguntou então à mulher: “Que foi que você fez?” – Gênesis 3.11-13 a

Este interrogatório divino foi feito com a intenção de revelar o pecado de Adão e Eva. Foi designado para fazê-los ver a si mesmos como Deus os via – quem 30  James Montgomery Boice, Genesis, An Expositional Commentary, Vol. 1, Gênesis 1-11 (Grand Rapids, MI: Baker Books, 2002), 193.


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eles eram verdadeiramente. Depois de receber de Adão uma desculpa defensiva, o Senhor voltou-se para questionar a mulher. Ele pressionou a indagação sondando o coração de Eva, com a intenção de trazer à superfície o pecado que ela estava reprimindo. Boice escreve: Por que Deus fez essas perguntas? Não foi para obter informação, como tampouco o era quando perguntou a Adão: “Onde está você?” Foi para levar Adão e Eva ao ponto de confessarem o mal que tinham feito. Não era que Deus precisasse ser informado, mas sim que Adão e Eva precisavam ser humilhados.31

Esta exposição do pecado sempre acompanha o chamado que Deus dirige aos eleitos.

A DOUTRINA EM FOCO PERSEVERANÇA DOS SANTOS Finalmente, Moisés ensinou, no Livro de Gênesis, o quinto ponto das doutrinas da graça – a graça preservadora. Todos os que Deus escolhe e chama soberanamente para si na salvação, ele mantém em segurança eterna. Também conhecida como perseverança dos santos, esta doutrina ensina a verdade segundo a qual Deus mesmo persevera com os santos e neles, mantendo-os seguros em sua graça. Também se pode rotular esse ponto como graça perseverante, expressão que enfatiza que a obra redentora de Deus tem continuidade e que ele preserva para sempre todos aqueles que salva. Dos que são salvos pela graça de Deus, ninguém jamais perderá a sua salvação. Ele guardará todos os redimidos e os manterá salvos e seguros por todos os séculos por vir. Nenhum deles perecerá. A salvação é para sempre. 31  Ibid., 194.


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1. Seguros no Céu. Vê-se a graça preservadora no traslado de Enoque para o céu como um verdadeiro crente no Senhor. Ele foi levado para Deus como alguém que estava salvo eternamente (Hb 11.5): Enoque andou com Deus; e já não foi encontrado, pois Deus o havia arrebatado. – Gênesis 5.24

Moisés fez uso do verbo andar para falar da relação pessoal de Enoque com Deus e de sua íntima comunhão com ele. Enoque gozava comunhão com Deus, e o Senhor o tomou para si. Enoque foi diretamente para o céu, sem morrer. Semelhantemente, todos os crentes serão levados para o céu, quer quando morrerem quer por ocasião da volta de Cristo. Neste versículo vemos que o ato de Deus de arrebatar Enoque e o levar para o céu foi real, e que a fé salvadora é para sempre. Lutero escreve: Esta é uma joia especial que Moisés quer que seja proeminente neste capítulo: que o Deus Todo-Poderoso leva para si, não gansos ou néscios, nem vacas, nem pedaços de madeira, nem pedras, e não os mortos, mas Enoque em pessoa, a fim de mostrar que foi preparada e separada para os homens outra vida, e melhor do que a presente vida, que é cheia de tantos infortúnios e males.32

Devido a esta graça preservadora, todos os crentes têm a garantia de que estarão seguros no céu. 2. Salvos Eternamente. A graça preservadora também é retratada na posição de Noé na arca no dia da grande enchente: Naquele mesmo dia, Noé e seus filhos, Sem, Cam e Jafé, com sua mulher e com as mulheres de seus três filhos, entraram na arca. As águas preva32  Lutero, Luther’s Works, Vol. 1: Lectures on Genesis Chapters 1-5, 346.


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leceram, aumentando muito sobe a terra, e a arca flutuava na superfície das águas”. – Gênesis 7.13,18

Assim como Noé e sua família foram libertados através das águas do Dilúvio do juízo de Deus, assim também eles, com todos os verdadeiros crentes, serão preservados por meio da ira divina do último dia, pela graça de Deus. Não importa quão tempestuoso foi o Dilúvio, Noé não pôde nem poderia cair da arca. Deus fechou a porta, selando todos os que estavam dentro. De igual modo, nenhum crente cairá jamais da graça, jamais perderá a sua salvação. Boice escreve: Quando o Senhor fechou Noé e sua família na arca, eles ficaram totalmente seguros, e este fato veio a ser uma ilustração para nós da perfeita segurança do crente em Jesus Cristo. Vieram as chuvas. As águas se enfureceram. Mas nada pôde tocar nestes que foram selados na arca por Jeová. É interessante que Deus não disse: “Noé, é hora de fechar a porta. Chame seus filhos para que o ajudem a fazê-la correr e para porem as trancas”. O Senhor não coloca a segurança de seu povo em mãos alheias. Ele próprio põe as trancas. A respeito dele foi dito: “O que ele abre ninguém pode fechar, e o que ele fecha ninguém pode abrir” (Ap 3.7). O fechamento de Noé dentro da arca equivale ao fato de sermos selados com o Espírito Santo (Ef 4.30). À semelhança dele, não estamos somente salvos; também estamos seguros.33

Nenhum dos eleitos de Deus perecerá.

DE VOLTA AO PRINCÍPIO As verdades bíblicas sobre a supremacia de Deus na salvação estão arraigadas e fundadas no rico solo do livro inicial da Escritura, o Livro de Gênesis. 33  Boice, Genesis, An Expositional Commentary. Vol. 1: Genesis 1-11, 344-45.


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A igreja atual precisa desesperadamente recuperar este sólido ensino. Quando pregadas, estas verdades rendem muito mais fruto nos crentes e uma grande colheita de almas dentre as que estão perecendo. Se um grande avivamento vier, será precedido pela pregação da plenitude da graça soberana de Deus. Os que proclamam estas verdades sobre a soberania de Deus serão os precursores de um verdadeiro despertamento espiritual nestes dias. Onde estão os homens que, como Moisés, estão ensinando as grandiosas verdades? Onde estão, entre nós, os que pregam a pureza da graça divina? É preciso que entre em cena, na presente hora, uma nova geração de líderes espirituais, homens que insistam em apregoar, alto e bom som, as doutrinas da graça. Nunca foi maior a necessidade de que homens fortes proclamem a forte mensagem sobre a soberania de Deus. A hora clama por pregadores bíblicos que altamente ocupem os púlpitos e proclamem as doutrinas da graça. A igreja necessita desesperadamente de homens que sejam proclamadores de todo o conselho da Escritura. Qualquer fiel exposição da Bíblia inevitavelmente apontará para a transcendental verdade sobre o direito que Deus tem de governar todas as obras de suas mãos. Se forem encontrados homens assim fiéis a Deus, eles se preocuparão em declarar as antigas doutrinas sobre a graça eterna de Deus. Onde estão esses homens atualmente?


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caPÍTULo 2 PErGUnTaS Para ESTUDo 1. Descreva a relação de Moisés com o Pentateuco, os cinco primeiros livros da Bíblia. Em que estágio da vida estava Moisés quando escreveu estes livros? Onde ele estava? 2. Explique a soberania de Deus em Gênesis 1. Quais aspectos específicos da autoridade divina foram manifestados em cada dia da Criação? 3. Desenvolva uma resposta sobre o primeiro pecado de Adão e Eva. Como esse pecado os afetou? Como afetou a raça humana? 4. Discuta a doutrina da eleição em sua relação às vidas de Abraão, Jacó e Esaú. Que efeito ela teve sobre a salvação deles? 5. Que é o protoevangelium? Explique a profecia e a prefiguração da expiação no juízo de Deus sobre Adão e Eva no Jardim do Éden. Faça a mesma coisa quanto à história de Caim e Abel. 6. Foi Deus ou Adão que verdadeiramente procurou o outro no jardim? Daí para cá mudou alguma coisa? 7. Como Enoque e Noé representam a verdade da graça preservadora de Deus? 8. Cite algumas das bênçãos que decorrem do entendimento e da fé na verdade da segurança eterna dos crentes. Como essa verdade impacta ou deveria impactar as nossas vidas?



Não sujeito a ninguém, não influenciado por nada, absolutamente independente; Deus age como lhe apraz, somente como lhe apraz, sempre como lhe apraz. Ninguém consegue frustrá-lo nem impedi-lo.1 A. W. Pink

1  A. W. Pink, The Attributes of God (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1975, 1979), 34 [Apud a versão portuguesa deste tradutor, Os Atributos de Deus, publicada por Publicações Evangélicas Selecionadas (PES), 1985, pp. 31, 32.]




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