Edição 160 • Dezembro 2013
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Justiรงa & Cidadania | Dezembro 2013
S umário Foto: SCS/TJMS
Capa – A favor de uma justiça
8 rápida e eficiente 6
Editorial – Desfaçatez contra o Poder Judiciário
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Dom Quixote – Defensores ecológicos. Alunos e professores unidos pela vida
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Estado e Governo – A função corrosiva do Fator Previdenciário
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O (des)equilíbrio entre Poderes: as medidas provisórias e a PEC no 70/2011
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TJRJ empossa mais um Desembargador
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O Supremo Tribunal Federal e os planos econômicos
De outubro de 1988 a junho de 2013: o legado e o desafio
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Vinho e embriaguez tributária
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Responsabilidade civil das empresas de ônibus por assalto a empregado
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Não residência fiscal – momento da caracterização
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A prisão e algumas reflexões sobre a reforma do Código Penal
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Os tributos e a unidade nacional
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Em Foco – Cada voto vale o Brasil inteiro
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A comunicação e o Estado Democrático de Direito
Foto: Antônio Carreta/TJSP
Foto: Divulgação
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Cafeicultura: revisitando suas
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Considerações sobre a eficácia probatória
2013 Dezembro | Justiça & Cidadania 3 relevâncias econômica e social do protesto
Edição 160 • Dezembro de 2013 • Capa: SCS/TJMS
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E ditorial
Desfaçatez contra o Poder Judiciário
É
“O heroísmo do passado não encobre os crimes do presente.” Ministra Rosa Weber, do STF
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comum e corriqueiro o inconformismo dos condenados contra as acusações que a sociedade lhes impõem após a demanda processual e o uso dos direitos que a lei lhes faculta, sendo raro não se sentirem injustiçados, acusando o Poder Judiciário de não ter-lhes concedido o direito a que se julgam detentores. O dito acima refere-se e se aplica aos condenados do Mensalão que, ao término do rumoroso processo, no qual lhes foram concedidas a defesa e a garantia dos direitos e do controverso, produzidos pelos mais famosos e custosos criminalistas do País, vêm agora com atitudes e atos descabidos, com insolência e atrevimento, bradar contra a Justiça alegando inocência e abuso dos magistrados e tribunais que os condenaram. O julgamento foi conduzido às claras e, inclusive, divulgado e transmitido pela televisão. Nele, foram efe tivamente comprovadas as fraudes e as trapaças pro duzidas com o fim específico da locupletação criminosa política e financeira de centenas de milhões de reais surrupiados dos cofres da Nação, em detrimento de sua aplicação na melhoria do atendimento nos hospitais, na educação, no saneamento básico e na assistência social, com prejuízo e desamparo às populações carentes que pervagam por este imenso País – doentes, abandonados à própria sorte e entregues à total falta da assistência que a Constituição republicana lhes garante.
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Foto: Sandra Fado
A imprudência com que vêm se manifestando publicamente os apenados do Mensalão, já incluídos no rol dos condenados, increpando inaceitavelmente contra a lei e a magistratura, fazendo-o pelo atrevimento das injúrias pronunciadas, em atitudes acintosas e provocativas de punhos erguidos e ameaçadores contra a sociedade, deixa-os despidos da comiseração e da piedade a que haviam granjeado pela atuação que tiveram no passado, quando lutaram contra a ditadura militar. À triste e lamentável desdita por que passam os condenados se aplica bem o dito pela magnífica Ministra Rosa Weber, pronunciado no julgamento no Supremo Tribunal Federal: “O heroísmo do passado não encobre os crimes cometidos no presente”, o que se coaduna bem com o resultado condenatório, que encontrou plena e geral concordância, aceitação e aplausos gerais da população do País. Os condenados do Mensalão, além dos acintosos atos de insolência com os quais têm se manifestado contra a ordem pública, ainda recebem um tratamento carcerário com favorecimento, enquanto existem centenas de milhares de presos, mais de 500 mil!, em situação miserável em prisões abarrotadas, despidos de um mínimo de desvelo público e assistência médica devida, tratados desumanamente, provocando uma situação crítica, o que gera um clima de protestos e intolerância diante da desigualdade que o fato provoca.
A desfaçatez e o aviltamento que praticam contra o Poder Judiciário são ainda maiores diante das regalias carcerárias que estão recebendo, comparadas às de seus colegas também condenados que penam em prisões infectas e nauseabundas espalhadas pelo Brasil afora, desassistidos e abandonados, sem o mínimo direito e imunes de qualquer tratamento humanitário, vivendo na pior condição humana, enquanto os criminosos do Mensalão, seus similares de cárcere, pelo fato de serem apadrinhados de políticos e poderosos, recebem um tratamento prisional diferenciado e ainda têm a petulância de publicamente desmoralizar a lei, as instituições e a sociedade. A Constituição Federal, em seu artigo 5o, reza: “Todos são iguais perante a lei”. Infelizmente, não é bem assim: os presos comuns não estão sendo tratados como os condenados do Mensalão, que ainda têm a petulância de aviltar, desmoralizar e esculachar publicamente o Poder Judiciário.
Orpheu Santos Salles Editor
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C apa, Carlos Alberto Luppi
A favor de uma justiça rápida e eficiente
U
m tribunal de vanguarda, focado na modernidade, a favor de uma justiça rápida e eficiente, e sempre antenado às demandas do cidadão, onde quer que ele esteja. Assim pode ser definida a atuação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul sob a presidência do Desembargador Joenildo de Sousa Chaves que adotou um sistema de administração compartilhada onde ao compromisso profissional e social dos servidores e magistrados se somam a união e a integração de esforços dos poderes públicos, legisladores, membros do Ministério Público, integrantes da Defensoria Pública e da Ordem dos Advogados do Brasil. Tudo em nome da produtividade. A isso se somam, também, a tecnologia e a sensibilidade como elementos essenciais para produzir resultados, minimizar gastos, aumentar a capacitação e reduzir custos, gerando máxima satisfação à população. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul vem se tornando um tribunal de excelência e de eficiência, utilizando um sistema tecnológico e eletrônico de ponta para agilização de processos, treinar servidores, ampliar a produção dos cartórios, possibilitar maior rapidez nas decisões dos juízes e, ainda, adotando soluções de rara oportunidade para atender ao cidadão em todo o Estado, mesmo em regiões remotas. São muitas as iniciativas tomadas e inúmeros os programas e projetos implantados pelo Tribunal que se 8
refletem na qualificação da justiça e na construção de uma imagem significativamente positiva do TJMS junto à população. Algumas delas se tornaram modelo nacional e exemplo para outros Tribunais. Entre eles, podem ser citados a Política Verde, a Justiça Itinerante, o Programa Descarte Sustentável, o Programa Qualidade de Vida para Servidores e Magistrados, o Projeto Padrinho, o Programa Dar à Luz, a Justiça sobre Águas, o Projeto Justiça Terapêutica, e, mais recentemente, o Projeto da Central de Processamento Eletrônico – a CP-e Projetos e programas que revitalizaram a atuação do Tribunal estimulam e incentivam servidores, magistrados e componentes da Justica. E, principalmente, promovem resultados sociais de grande significado e largo alcance junto a importantes segmentos da população, garantindo, através da ação ousada da justiça, a inclusão social de milhares de crianças, jovens, mulheres, cidadãos em situação de risco social, população ribeirinha, bairros e cidades distantes, pessoas necessitadas, cidadãos com necessidades especiais, crianças e jovens infratores, mulheres vítimas de violência doméstica. A ousadia da atuação do Tribunal sob a presidência do Desembargador Joenildo de Sousa Chaves, muito além da eficiência comprovada em expressivos números, este ano foi marcada com a implantação, desde maio, da Central de Processamento Eletrônico (CP-e), uma iniciativa que ampliou em até três vezes a sua eficiência. Hoje, o TJMS
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Foto: SCS/TJMS
Desembargador Joenildo de Sousa Chaves, presidente do TJMS
tem 75% de seus processos em formato eletrônico e 100% das varas com programas que suportam processos digitais. Até 2018 todo o sistema judiciário do Estado, mesmo nas regiões remotas, estará funcionando de forma eletrônica e isto significa ampliar em mais de cinco vezes a produtividade, reduzir custos e minimizar gastos. O modelo da CP-e segue os sistemas dos “call centers” das empresas privadas, com adaptações às particularidades e diferenças inerentes ao serviço prestado pelo Poder Judiciário. Ele acelera os procedimentos da Justica, a eficiência dos cartórios, diminui o tempo de tramitação dos processos, facilita a rapidez da atuação dos juízes, reduz o grau de demandas pela ampliação do número de acordos em processos menos complexos. O sistema tem outras vantagens ao diminuir o número de servidores, promover economia de custos, ampliar a capacitação de servidores, reduzindo os níveis de estresse dos componentes da Justiça e, melhorando, sensivelmente, o atendimento à população. Na verdade, a atuação do TJMS compreende inovações tão significativas, que seu presidente, o Desembargador Joenildo de Sousa Chaves, ao ser solicitado pela Revista Justiça & Cidadania, a resumir em uma frase todas as suas mudanças, procedimentos e iniciativas, foi claro e incisivo: “O TJMS é o Tribunal da Vanguarda, por uma justiça célere e eficaz” O desembargador, em entrevista exclusiva à Revista Justiça & Cidadania, explica em detalhes porque o TJMS
está conquistando esta imagem de ser um dos tribunais mais modernos e vanguardistas do país. Segue a entrevista na íntegra: Revista Justiça & Cidadania – De onde veio a inspiração para a criação da CP-e? Joenildo de Sousa Chaves – Na verdade a iniciativa privada já criou há tempos esta solução, como forma de minimizar gastos, aumentar a produtividade e reduzir custos. Associando-se a ideia dos “call centers” com as peculiaridades do serviço prestado pelo Poder Público é que nasceu a ideia para a Central de Processamento Eletrônico. Ela constitui a adaptação da solução privada com a mescla da manutenção dos cartórios para atendimento ao público. RJC – Quando a CP-e foi criada e implantada? JSC – A implantação do projeto piloto iniciou-se em março deste ano (2013) e o embrião foi formatado pelo Provimento 300. RJC – Como a CP-e contribui para evitar os gargalos e o acúmulo de processos? JSC – Na CP-e os atos cartoriais de expedição de documentos, publicações, expedições de mandados entre outros são cumpridos pela Central, por equipes especializadas. Esta equipe não atende ao público externo
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Foto: SCS/TJMS
Desembargador Joenildo de Sousa Chaves, presidente do TJMS
(cidadãos, promotores, advogados, defensores, etc) e nem ao público interno. O ambiente de trabalho é mais tranquilo e mais eficiente. Assim, a produtividade se eleva consideravelmente.
RJC – Essa inovação será estendida para a Segunda Instância? Imediatamente ou dentro de alguns meses? JSC – A segunda instância já funciona com uma única secretaria para todos os Desembargadores.
RJC – A CP-e afinal evita o acúmulo de processos no cartório da vara e acaba jogando este acúmulo no gabinete do juiz? JSC – Hoje, o gargalo maior é mesmo o cumprimento de atos por parte da serventia, mas efetivamente há mesmo um aumento de demanda, que, todavia, será reforçado com a implantação de assessores no interior. Há, também, um estudo para reforço dos gabinetes.
RJC – Gostaríamos de saber um pouco mais sobre a CP-e. Como ela funciona na prática? Como o cidadão pode se beneficiar dela? Para os juízes é uma vantagem de fato? Como funciona todo o processo? Gostaríamos de explicar, de forma resumida, como ela funciona na prática no dia-a-dia da justiça. JSC – Atualmente, o TJMS tem 75% dos seus processos em formato eletrônico e 100% das varas com programa que suporta processos digitais. Além disso, atualmente, o ingresso de qualquer ação é feito unicamente pela via eletrônica. Com isso, na verdade, os dados (os processos) estão armazenados no Datacenter do TJMS. Ora, se todos os processos estão em um único local (ou a maioria deles), não se justifica mais manter em cada comarca uma estrutura com vários servidores para fazer o cumprimento de atos judiciais. Além disso, o treinamento desses servidores é algo custoso e nem sempre efetivo. Várias vezes o servidor é
RJC – Como os juízes de MS estão lidando com essa inovação? JSC – Os juízes que já estão trabalhando com o projeto o aprovam sem restrição. RJC – Existe alguma previsão de tempo para que 100% das varas utilizem a CP-e? JSC – Estima-se que em cinco ou seis anos todos os feitos já estejam funcionando com o projeto. 10
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treinado em alguma tarefa e, ao chegar em uma comarca do interior, é colocado para trabalhar em outra área que o Juiz entende mais carente. Verificou-se que os servidores de entrância especial são, em geral, mais rápidos e mais seguros, justamente porque na Capital, por exemplo, a maioria trabalha em varas especializadas. Ao se especializar em determinado assunto (vara de execução penal, vara de fazenda pública, recuperação judicial, família, etc..), o servidor trabalha com mais segurança e mais efetividade. O servidor da comarca do interior é mais lento, até porque um único servidor, por vezes, é encarregado de expedir todos os atos de todas essas especialidades. Tome-se, por exemplo, a realização de cálculo de cumprimento de pena em execução. No interior é comum o servidor levar dias para fazer um único cálculo. Um servidor especializado faz em poucos minutos (às vezes segundos). Então o projeto redistribui os servidores de forma a manter os serviços de atendimento no cartório de cada comarca ou vara e o restante é direcionado à CP-e, que é um grande cartório dividido por especialidades. Sem o atendimento ao público e com um grande treinamento o servidor produz mais. O Poder Público economiza, a população terá o processo acelerado, os juízes contarão, desde a primeira entrância, com servidores especializados e os servidores terão maior tranquilidade para exercer suas funções. RJC – Com ele a gestão dos cartórios é unificada? Há de fato economia na justiça e economia no tempo do processo? É possível quantificar isso? JSC – Como dito acima, o cartório não é extinto, apenas reduzido. Veja-se que a produtividade está maior do que o dobro. Se retiramos metade dos servidores do cartório, os que ficam podem efetuar tranquilamente o atendimento ao público e ao juiz com relação a feitos de urgência, e os que são redistribuídos à CP-e produzem mais. Produzindo mais, a necessidade de maior número de servidores diminui, o que causa economia. A produ tividade maior reduz o tempo de tramitação no processo. No piloto, a produtividade foi, em média, quase três vezes maior do que a ordinária. A mensuração é feita pelo número de expedição de atos praticados por servidor (o sistema eletrônico adotado pelo TJMS permite esse monitoramento). RJC – No Brasil quais as chances da CP-e ser implantado em todo o território nacional? JSC – Isso depende do grau de maturidade de cada Tribunal em termos de processo eletrônico (esse sistema por óbvio não funciona com o processo físico) e o grau de capacidade da tecnologia.
“Desde que assumi o cargo de Presidente, tenho feito uma administração compartilhada, pois não se administra a justiça sozinho. Estamos administrando com um olhar mais amplo, com o propósito voltado para a eficiência no atendimento ao jurisdicionado.”
RJC – Quais são os projetos sociais em curso no tribunal de MS em sua gestão? JSC – O TJMS tem política verde (de economia de energia, água, reaproveitamento de papéis, vidros, entre outros). São inúmeros os projetos sociais já implantados e outros que estão em vias de implantação em nosso Estado. Dentre os principais que já funcionam estão a Justiça Itinerante, que oferece atendimento in loco à população menos favorecida dos bairros da Capital; o projeto de Descarte Sustentável, que consiste na eliminação de processos por meio de fragmentação e depois reciclagem, com o valor obtido doado a um instituto que cuida de crianças com paralisia cerebral; e o Programa Qualidade de Vida no Trabalho, com o foco em proporcionar melhorias da qualidade de vida de servidores, magistrados e colaboradores do Poder Judiciário Estadual. Temos ainda projetos de vanguarda no país, que serviram de modelo para outras unidades da federação, tais como: o Projeto Padrinho, com diferentes modalidades de apadrinhamento de crianças em situação de acolhimento; o projeto de destinação de recursos arrecadados com as penas pecuniárias a grandes obras de instituições sociais; e o projeto Dar à Luz, que visa oferecer um serviço de acolhimento, apoio e orientação às mulheres que desejam entregar seus filhos em adoção. Dentre os projetos que pretendo implantar ainda em minha gestão, está o projeto Justiça sobre as Águas, que irá beneficiar as populações ribeirinhas do Pantanal da Comarca de Corumbá com a disponibilização de um barco com prestação jurisdicional e serviços de cunho social para humanizar, ampliar e fortalecer o atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar, estando presente a Justiça Itinerante.
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E, ainda, o projeto Justiça Terapêutica, com a implan tação do Centro de Reabilitação Cognitiva e Social em Mato Grosso do Sul. Este projeto possibilitará o tratamento de infratores de menor potencial ofensivo, na condição de usuários e dependentes de drogas, com tratamento dessas pessoas no Centro de Reabilitação Cognitiva e Social, que pretendemos viabilizar no próximo ano. RJC – Como qualifica sua gestão? JSC – Desde que assumi o cargo de Presidente, tenho feito uma administração compartilhada, pois não se administra a justiça sozinho. Estamos administrando com um olhar mais amplo, com o propósito voltado para a eficiência no atendimento ao jurisdicionado. Além de magistrados e servidores, precisamos do auxílio de todos os órgãos (Executivo, Legislativo, MP, Defensoria, OAB) para que prestemos o melhor atendimento possível à população, que será a maior beneficiada com essa união de esforços. Estamos na busca de soluções que realmente possam atender no sentido de melhorar a prestação jurisdicional, que tem que ser célere, com segurança e seriedade. RJC – Como está funcionando a justiça itinerante no tribunal de MS? JSC – A cargo do Conselho de Supervisão dos Juizados, hoje capitaneada pelo Des. Marco André Nogueira Hanson, a Justiça Itinerante em Mato Grosso do Sul está em funcionamento desde janeiro de 2001, em Campo Grande, e de lá para cá se tornou referência de atendimento do Judiciário nos bairros da capital do Estado. Com os resultados obtidos pelas duas unidades, implantamos no mês de setembro de 2013 a primeira unidade desta modalidade de justiça no interior de MS, na Comarca de Dourados, para atender aos oito Distritos que, devido à distância da sede da Comarca, são os mais carentes da atuação do Poder Judiciário. Em nosso Estado, a Justiça Itinerante é um serviço disponibilizado por meio de unidades móveis (ônibus adaptados), que atrai a população pela facilidade e rapidez no atendimento, além de não gerar nenhum custo ao cidadão. As unidades têm a competência de conciliar, processar e julgar causas cíveis de menor complexidade cujo valor não exceda 40 salários mínimos, bem como as causas relativas a Direito de Família. Somente no período de janeiro a outubro de 2013, a Justiça Itinerante da Comarca de Campo realizou 38.275 atendimentos e orientações jurídicas. Para se ter uma ideia da efetividade desse serviço, no ano de 2012 foram realizadas 9.855 audiências, das quais resultaram 9.509 acordos, ou 96,48% do total. No período de janeiro 12
a dezembro do ano passado foram realizados 38.647 atendimentos e orientações jurídicas e 10.135 ações tiveram início. RJC – O Processo Judicial Eletrônico (PJ-e) funciona junto com a Central de Processamento Eletrônico (CPe)? Uma coisa depende da outra? JSC – O PJ-e é um projeto do CNJ que se traduz em um programa que não tem ligação alguma com o CP-e. No Estado de Mato Grosso do Sul (assim como no Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e São Paulo) se utiliza o SAJ (Sistema de Automação da Justiça). RJC – Quais as principais questões julgadas pelo TJMS? JSC – Pelo fato do Mato Grosso do Sul ser um dos principais corredores do tráfico de drogas do país, com fronteira com dois países e diversos estados, o Tribunal de Justiça tem processos relacionados a tráfico de drogas e condutas afins como a predominante, com mais de 1.600 julgados somente em 2013. Além destes, destacam-se em quantidade os processos relacionados a bancos, sobre interpretação e revisão de contratos. Temos as apelações cíveis e agravos de instrumentos como as classes mais julgadas predominantemente. RJC – A atuação do TJMS poderia ser definida de que maneira em uma frase? JSC – Um Tribunal de vanguarda, com foco na moder nidade, para uma Justiça célere e eficaz.
Perfil Joenildo de Sousa Chaves é natural de Ourives (BA), pós-graduado em Direito Empresarial pela PUC – Minas Gerais. Ingressou na magistratura como Juiz de Direito da Comarca de Amambaí, Mato Grosso do Sul, em 1980. Teve, em sua carreira, atuação destacada na área da Infância e é Desembargador do TJMS desde 1995. Em 2003 e 2004 ocupou o cargo de vice-presi dente do TJMS, exercendo também, ao longo de sua carreira, os cargos de presidente do Colégio de Corregedores Eleitorais do Brasil, presidente e vicepresidente da Associação Brasileira dos Magistrados da Infância e Juventude. Atualmente, além de presidente do TJMS, é coordenador do Comitê de Comunicação Institucional do Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul.
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Cafeicultura: revisitando suas relevâncias econômica e social Fábio de Salles Meirelles
Membro do Conselho Editorial Presidente da Faesp e da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil
Foto: Divulgação
O
setor agrícola nacional e a cafeicultura em particular ainda não lograram o merecido e legítimo reconhecimento e não foram contemplados com decisões e políticas públicas adequadas, nas áreas econômica e social, em consonância com sua grandeza, conforme veremos. Na primeira metade do século XIX, o açúcar e o algodão perderam a capacidade de gerar desenvolvimento para o Brasil como consequência da retração do mercado internacional desses produtos, tanto em volume quanto em valor. O Brasil não conseguia obter empréstimos internacionais porque o país não tinha meios de arrecadar impostos em uma economia estagnada. Portanto, a economia brasileira precisava encontrar um novo dínamo de crescimento utilizando recursos próprios, tendo como fator de produção principal a terra, que era o recurso mais abundante. 14
Assim emergiu a economia cafeeira, que, na década de 1820, passou a responder por 18% das exportações brasileiras. Duas décadas mais tarde, o café já havia se tornado o principal produto de exportação do país, respondendo por mais de 40% das exportações. A consolidação da cafeicultura permitiu a reintegração do Brasil no comércio exterior, contribuiu para a formação de uma classe de dirigentes empresariais e criou uma nova estrutura de representação política. A história econômica elucida que o café foi o grande motor de crescimento da economia brasileira entre o último quarto do século XIX e o final da década de 1920. A capacidade da atividade de absorver mão de obra, gerar divisas e atrair investimentos internacionais, inclusive em infraestrutura, além de financiar a industrialização do país, fez do produto um dos mais importantes alicerces do desenvolvimento nacional. A meação do café e o colonato, iniciados na região de Franca por meus ancestrais, ocuparam a mão de obra disponível, iniciaram a formalização das relações de trabalho, instituindo direitos e responsabilidades, além de aprimorarem as relações sociais e econômicas. Mais do que isso, o café possibilitou ações precursoras de qualificação e integração social, como comprova o trabalho de alfabetização de adultos na Alta Mogiana, implantado pelo dr. Severino Tostes Meirelles e pela prof.a Georgina de Salles Meirelles. Sem embargo, muitos dos avanços na área social e a segurança jurídica alcançada no Estado de São Paulo, no que tange à legislação trabalhista aplicada ao meio rural, são oriundos de ações iniciadas no processo de implantação e consolidação da cafeicultura paulista. Entre 1925 e 1929, antes do craque da bolsa de Nova York, as exportações de café do Brasil representavam 71% das exportações totais do país e aproximadamente 10% do Produto Nacional Bruto (PNB).
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Com a crise de 1929, o setor cafeeiro sofreu acentuado impacto, pois os estoques excedentes formados com a política de defesa cafeeira começaram a desencorajar os seus financiadores, e as cotações do café reduziram-se 65%. Apesar de tudo, a política de proteção ao café serviu como um instrumento de manutenção do emprego e um estímulo ao crescimento da renda nacional na grande depressão. Aquele cenário impunha a necessidade de reestruturação do segmento cafeeiro. Foi criado o Conselho Nacional do Café e, mais tarde, o Departamento Nacional do Café, com o objetivo de restringir as exportações, administrar os estoques e queimar os excedentes de café. O desestímulo à produção, com baixos preços e a queima de 78 milhões de sacas de café entre 1931 e 1944, fez emergir uma nova dinâmica agropecuária, com maior diversificação da produção, por meio do algodão, da pecuária de leite e corte, dos grãos, entre outros. Com a produção de algodão, por exemplo, o Estado de São Paulo mostrou sua vanguarda tecnológica na medida em que, por intermédio da pesquisa aplicada, aprimorou a qualidade da fibra do algodão e permitiu o ressurgimento dessa importante atividade, chamada, à época, de “ouro branco”. O Estado de São Paulo, que já havia sido o polo dinâmico de crescimento com o café, passou a fomentar novas atividades e a transferir seu conhecimento para outros estados do Brasil. Paralelamente, emergiam as associações rurais que viriam, mais tarde, a compor os sindicatos rurais e o sólido e atual sistema patronal rural. A industrialização do Brasil viabilizou a integração da agricultura ao restante da economia nacional, iniciando assim uma nova dinâmica de modernização. Entre 1950 e 1960 emergiram os complexos agroindustriais, com destaque para o café solúvel em São Paulo, selando a integração entre a agricultura e a indústria – elos que se unem para formar a corrente que hoje chamamos de agronegócio. Na década de 1970, houve a criação da Embrapa, o lançamento do Proálcool, do qual fomos responsáveis pela execução no Estado de São Paulo, a abundância de crédito rural e a intensificação da produção de grãos e carnes, em um momento de grande expansão da agropecuária brasileira. De lá para cá, o processo de diversificação das atividades e integração com a indústria ganhou escala, resultando no complexo e pujante agronegócio existente, que é, sem dúvida, o maior negócio do Brasil. Produtos agrícolas como açúcar, algodão, borracha e cacau marcaram os ciclos de desenvolvimento da economia do país, mantendo nos dias atuais relativa importância econômica. Contudo, o café foi o produto que permitiu impulsionar o Brasil no século XX por meio de investimentos em infraestrutura e fomento à industrialização. Se por um lado alguns questionam o
modelo de desenvolvimento baseado em um produto agrícola, por outro é inquestionável sua contribuição para o país, pois era o produto que tínhamos e que nos permitiu chegar ao nível de desenvolvimento presente. Além do legado do desenvolvimento, o café apresenta uma relevância atual considerável, com valor bruto da produção de café beneficiado de R$ 25 bilhões e exportações de US$ 6,5 bilhões, em 2012, além de estrutura produtiva com 390 mil propriedades, 1,1 mil indústrias e 150 empresas exportadoras, em 1.900 municípios e 14 Unidades da Federação. Portanto, pelo passado ou pelo presente, e em nome de todos que dependem direta ou indiretamente da cadeia produtiva do café, é preciso direcionar políticas públicas adequadas para essa atividade a fim de evitar o risco de sua desestruturação. Os desafios da cafeicultura demandam e merecem ações semelhantes às recebidas no passado, mas com outro escopo. A preocupação com a produtividade, a redução de custos e a melhoria da qualidade, aliadas à produção em condições ambientalmente sustentáveis, são questões fundamentais. Mas não basta eficiência dentro da porteira; é necessário promover o consumo e garantir qualidade do cafeeiro à xícara do consumidor para que ele exerça o poder de escolha e valorize a diversidade e a qualidade do café brasileiro em sua plenitude. As reivindicações e as demandas da cafeicultura são mais que justas, sendo imperativo apoiar esse segmento, que atravessa momento de grande dificuldade e que tanto contribuiu para a edificação da economia nacional. Enquanto produtor e dirigente rural, acompanhei grande parte dos fatos mencionados, sendo testemunha da transformação que a agropecuária, ao longo dos anos, propiciou ao Brasil. Embora o setor não tenha ainda o respeito e o reconhecimento merecidos, é motivo de muito orgulho e realização participar dessa plataforma de crescimento chamada agronegócio, que, certamente, continuará pavimentando nossa trajetória de desenvolvimento sustentável. Os bandeirantes iniciaram o desbravamento do Estado de São Paulo a partir de 1570, com ordem real e necessi dade de expansão das fronteiras. Valiosas famílias de produtores e trabalhadores da cafeicultura são também merecedoras de reconhecimento desse desbravamento. Não há dúvidas de que a cafeicultura foi responsável pela expansão e pela consolidação do território brasileiro, sendo esse importantíssimo setor da agricultura um dos maiores responsáveis pela qualificação da mão de obra. Portanto, prestamos nossas homenagens às famílias que se mantiveram fiéis às suas áreas agrícolas, caminhando como verdadeiros soldados pelos territórios de vários estados do Brasil com o único desejo de cultivar essa perfumada e vigorosa semente de café.
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Estado e Governo
A função corrosiva do Fator Previdenciário
Aurélio Wander Bastos
H
Membro do Conselho Editorial Jurista, cientista político, professor titular da UniRio/UCAM
ans Kelsen, consagrado jurista austríaco, não chegou a desenvolver o conceito de Estado Democrático de Direito, mas, ao identificar a ordem jurídica com o Estado de Direito, entendeu, que, nas democracias, a legalidade obedece a uma rígida estrutura hierárquica entre as normas. Esta estrutura é permeada pela Norma Fundamental que não integra o ordenamento jurídico, mas é o referencial indicador de sua coerência, identificável, senão apenas através de específicos princípios também como a essência ontológica da Constituição, dos quais derivam e se inspiram as leis gerais e o conjunto normativo subsidiário da ordem jurídica. A leis gerais, no contexto desta concepção, são as normas básicas do Estado de Direito, que se fundamentam e derivam da Constituição, promulgada por uma Constituinte, na leitura, também de tantos pensadores que se lhe antecederam e sucederam, como E. J. Seiyès, criador da teoria constituinte. Por isto, estas leis gerais são funcionalmente reconhecidas como o corpo jurídico-legislativo do Estado democrático, que, pela sua força hierárquica, se sobrepõem às normas inferiores (regras e/ou normas subsidiárias) de governo, tais como portarias, resoluções, ordens de serviço, notas 16
técnicas, memorandos, pareceres editados por órgãos de administração para alcançar os fins de governo. Estas regras ou normas subsidiárias e intermediárias, mesmo os decretos regulamentares das leis gerais, não podem, entre si, divergirem material ou formalmente e, por isto mesmo, nem modificá-las ou derrogá-las. Ao se distanciarem da essência fundamental da ordem, estas normas subsidiárias desprendem-se da imprescindível conexão entre elas próprias e as leis superiores, evitando que prevaleça a absoluta preponderância da Constituição e das leis gerais. Modernamente têm sido frequentes os desencontros de inspiração entre as leis gerais e as normas subsidiárias, muitas vezes devido a emendas constitucionais, que, não exatamente, expressam as expectativas principiológicas da Constituição, com o objetivo de viabilizar políticas de governo. Estas práticas normativas que mais visam reverter resistências institucionais para corrigir situações financeiras, atuariais, tributárias e previdenciárias outras tantas vezes mesmo por normas ou portarias ministeriais, que, ancorando-se em decretos de natureza extensiva ou restritiva em relação à lei geral, ou mesmo inspirando-se em emendas diversionistas, dos princípios e da essência ontológica da Constituição, desviam-se da exata linha de coerência interna da ordem jurídica.
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Foto: Ana Wander Bastos
Nos governos de regime parlamentarista estas situações são presumíveis, mas bloqueadas devido à necessária sintonia entre as ações do Chefe de Estado (Presidente) e do Chefe de Governo (Primeiro Ministro), mas, inesperadas, no regime presidencialista, onde o Presidente funciona como Chefe de Estado e de Governo, condicionado, por conseguinte, ao absoluto cumprimento das leis gerais devido à indispensável coerência entre as normas e a hierarquia entre as leis, decretos, regras e normas subsidiárias. É injustificável, por conseguinte, no regime presidencialista, onde o Chefe do governo não é Chefe de governo parlamentarista, mas Chefe de Estado e de Governo, que políticas internas de governo questionem as leis gerais sancionadas pelo Presidente da República, não apenas como Chefe de governo, não importa em que época ou ocasião, exceto na edição de nova lei sobre o assunto, mas também como Chefe de Estado. Isto significa que a hierarquia de governo não pode evoluir além do conteúdo de leis gerais sancionadas pelo presidente como Chefe de Estado e de governo, respeitando, desta forma, as regras do Estado Democrático de Direito, cuja essência antológica e princípios estão constitucionalmente grafados. Neste quadro, apesar do fenômeno estar se manifes tando em outras áreas de governo, a sua incidência mais
aguda tem ocorrido no setor previdenciário, exatamente pelos seus altos índices orçamentários, por um lado, e, por outro, porque se beneficiam dos efeitos previdenciários (aposentadorias e pensões) um grande volume de servidores públicos, aposentados e pensionistas, cujos direitos estão classificados no Regime Único do Servidor Público, e os empregados de entidades privadas cujos direitos estão regulados diferentemente pelo Regime Geral da Previdência Social. Ocorre, todavia, que normas subsidiárias de governo, e mesmo leis ordinárias, passaram a indicar administrativamente uma leitura hermenêutica comparada entre o Regime Único do Servidor Público pelo Regime Geral da Previdência Social e suas normas subsidiárias, sistemas de origem e estruturação diferenciada. Os mais visíveis exemplos desta esdrúxula situação são a Emenda Constitucional no 41/2003, a Lei no 9.717/1998 e a Portaria no 479, de 14 de agosto de 2013, conhecida como uma das destoantes e diversionistas portarias ministeriais que produzem o Fator Previdenciário, seguidos de uma das portarias ministeriais subsidiárias de conteúdo diversionista. O Fator Previdenciário, no fundo, é uma construção técnica destinada a viabilizar a equiparação entre os direitos e benefícios do servidor público e os direitos
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“A fórmula do fator previdenciário têm uma especial aparência lógica de ‘alta matemática’, mas, na verdade, a sua essência é uma reversão ideológica que viola princípios jurídicos tradicionalmente consagrados em leis gerais e, até, na Constituição.”
dos empregados celetistas, através de arranjos ”lógicos” presumíveis. A sua contextura nos permite afirmar que é uma das mais controversas fórmulas que foram implementadas como efeito da Emenda no 41/2003, que viabilizou como princípio constitucional, por itens, perdulária leitura comparada de direitos e deveres do servidor público com direitos e deveres do empregado celetista, sobrepondo ainda flutuações nos cálculos de aposentadoria e pensão. A fórmula do resultado do fator previdenciário (f) ocorre devido a uma combinação igual à combinação de “tempo de contribuição do trabalhador (Tc); alíquota de contribuição (a); expectativa de sobrevida do trabalhador na data da aposentadoria (ES) e idade do trabalhador na data da aposentadoria”, com variantes aplicáveis a mulher e professores. O resultado dos cálculos é uma verdadeira tragédia: em primeiro lugar, servidores públicos, aposentados e pensionistas, titulares de direito adquirido, perdem o seu direito e funcionários públicos e servidores celetistas sofrem sucessivas reduções salariais no exato momento que envelhecem. Por outro lado, estas proposições mais se classificam como técnicas de políticas destinadas a alcançar o equilíbrio financeiro atuarial da previdência, comprimindo os direitos do servidor público, que norma tivamente são amparados com o esdrúxulo efeito do artigo 5o da Lei no 9.717/1998, e da Portaria no 479/2013, que em muitas circunstâncias, alcança o próprio empregado celetista. 18
No seu conjunto, os direitos do servidor foram constitucionalmente consagrados na fórmula originária da Constituição, mas os efeitos da leitura provocada por estas normas tem resultado em efetivo desrespeito ao princípio do direito adquirido, da preservação da integridade do caráter alimentar, da anterioridade e da garantia hierárquica das leis. A fórmula do fator previdenciário têm uma especial aparência lógica de “alta matemática”, mas, na verdade, a sua essência é uma reversão ideológica que viola princípios jurídicos tradicionalmente consagrados em leis gerais e, até, na Constituição. Assim, por exemplo, perdem o seu direito adquirido, ou são constrangidas em seus benefícios, com a simples aplicação da fórmula, aqueles que teriam (tem) direito à pensão vitalícia da pessoa designada (dependente maior de 60 anos) sucessiva à morte do servidor; menor sob guarda judicial do servidor; menor sob guarda ou tutela até 21 anos e outros. É injustificável, neste sentido, que atos ministeriais, que nem sempre traduzem políticas de governo, divergentes das leis gerais, muitas vezes fora do alcance administrativo dos próprios decretos presidenciais apoiados em leis dissonantes dos princípios fundamentais do Estado, em visível confronto com a hermenêutica jurídica, suspendam ou derroguem direitos adquiridos, muitas vezes levando servidores a situações parasitárias, suscetíveis aos efeitos das políticas de reequilíbrio financeiro impostos pela Emenda Constitucional no 41/2003, fonte das políticas de ajuste financeiro e atuarial. Esta Emenda estabelece (art. 40) que o regime de previdência tem um “caráter contributivo e solidário, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial” diferentemente do texto originário anterior que dispunha que “é assegurado o regime de previdência em caráter contributivo (não estando indicada a palavra solidário), observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial” e, na mais absoluta diferença do texto original da Constituição que nem ao menos faz qualquer referência e finalidade do recebimento previdenciário com vistas ao equilíbrio financeiro-atuarial. Efetivamente, houve uma profunda mudança na política previdenciária que evoluiu de seu caráter de proteção individual, incorporando ao texto o velado princípio da solidariedade, que, na verdade, não está exatamente sintonizado com o princípio da dignidade humana e o respeito às técnicas de interpretação tradicionais. A Constituição brasileira de 1988 está permeada, como na proposição da teoria Kelseniana, por uma lei fundamental ou, na sua inspiração, o que Kant denominava de imperativo categórico, está comprometida, politicamente, com a proteção do cidadão e com o
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princípio da dignidade humana e, do ponto de vista econômico, com o princípio da lei orçamentária geral, exatamente para se evitar que práticas de administração financeira e atuarial, regras impostergáveis de governo, transvistam-se em dimensão constitucional, com os seus sempre reconhecidos efeitos corrosivos do Estado. Neste sentido, permear os princípios políticos gerais por políticas de tratamento diferenciado entre cidadãos, servidores públicos e aposentados e pensionistas, é uma violação ao princípio da dignidade humana, explicitado pela imprescindível igualdade e, no caso, o princípio do orçamento geral impositivo, votado pelo Congresso que aplicados fora da itemização orçamentária podem desviar o “quantum” orçamentário de seu destino específico. Esta situação ganhou dimensão exponencial com a Emenda Constitucional nº 41/11. Todavia, nos Estados Democráticos, juridicamente organizados, as normas de governo, mesmo nos casos de reversão de finalidades políticas não podem derrogar ou corroer o conteúdo das leis gerais, através de iniciativas que fujam dos princípios constitutivos do Estado, de leis que divirjam dos princípios hermenêuticos ou de normas subsidiárias, editadas por escalões intermediários
do poder porque podem comprometer as hierarquias superiores do governo com modelos autocráticos (ou demagógicos) de administração, a fórmula apócrifa do Estado de “Direito” desprezada por Kelsen. Nestes casos, para se alcançar resultados modificativos ou confrontase subsidiariamente com o Direito constitucionalmente prescrito ou implementa-se (parlamentarmente) políticas de modificação da ordem e seus princípios fundamentais, o que poderia representar uma ruptura constitucional. Finalmente, esta linha de orientação tem predominado (liminarmente), inclusive, no Supremo Tribunal Federal – STF, como está em recente decisão proferida no Mandato de Segurança (Medida Cautelar) no 32.085, que assim entende em resumo: a Portaria no 479, de 14 de agosto de 2013 (DOU de 15.8.13) não poderia ser editada, pois o acórdão no 7.484/12 do TCU, que a fundamenta, já estava com sua eficácia suspensa pelo STF por decisão publicada em 19.6.13 (MS 32085). Nesta mesma decisão releva-se que entre o interesse da administração pública (traduzindo em norma de governo) e a necessidade social (no caso, o caráter alimentar, como norma de Estado) deve-se preservar os valores essenciais à própria subsistência, em situação de grave risco (MS no 32085 MC/DF).
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Foto: Rosane Naylor/ESP. JCOM/D.A PRESS
TJRJ empossa mais um Desembargador Titular do 1o Juizado Especial Criminal de São Gonçalo, Marcelo Castro Anátocles da Silva Ferreira, é empossado Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
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m concorrida solenidade realizada na sessão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça, foi empossado no dia 25/11 pela presidente, Desembargadora Leila Mariano, o magistrado Marcelo Castro Anátocles da Silva Ferreira, no cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça, para ocupar a vaga decorrente da aposentadoria da Desembargadora Célia Meliga Pessoa. Durante a solenidade de posse, o novo integrante da corte prestou juramento de bem e fielmente cumprir os deveres do cargo.
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Marcelo Castro afirmou que vai manter seu estilo de atuação e que chega ao Tribunal com a missão de somar, junto com seus colegas. “O desafio de todos os magistrados é contribuir para uma justiça mais célere e mais justa em seus julgamentos, principalmente em um tribunal como o do Rio de Janeiro, que tem uma participação efetiva e é exemplo de atuação no país”, afirmou o novo desembargador, que irá compor a 23a Câmara Cível do TJRJ, especializada em Direito do Consumidor. O magistrado é formado em direito pela Faculdade Brasileira de Ciências Jurídicas. Também atuou como defensor público de 1989 a 1993 e entrou para a magistratura em 1994, com passagem pelas comarcas de Volta Redonda e Rio Claro. Em 1998, assumiu o I Juizado Especial Criminal de São Gonçalo, onde coordenou a Central de Penas e Medidas Alternativas, o Centro de Mediação e a Central de Mandados. Ele compõe, ainda, o Conselho Estadual de Proteção a Vítimas e Testemunhas do Estado do Rio de Janeiro; o Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Estado do Rio de Janeiro; a Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo do Estado do Rio de Janeiro; o Comitê Estadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado do Rio de Janeiro e é suplente do Conselho Estadual de Direitos Humanos. A presidente do TJRJ, Desembargadora Leila Mariano, leu trechos do currículo do magistrado, a quem deu as boas-vindas, e ressaltou a destacada trajetória do magistrado, “que é pautada por um trabalho voltado à solução de conflitos e mediações”. “Com essa vivência humanística e voltada a questões sociais, Vossa Excelência é talhado para dar aquele passo a mais que as câmaras de consumo precisam”, destacou a presidente do TJ. Responsabilidade A presidente do TJRJ alertou que a alta demanda na área traz uma grande responsabilidade aos desembargadores que integrarão as novas câmaras, informando que atualmente são nove milhões de processos em atendimento, e, a cada ano, mais de 1,5 milhão de novos processos no Estado do Rio de Janeiro. A presidente Leila Mariano ressaltou o importante trabalho desenvolvido pelas câmaras de consumo criadas neste ano pelo Tribunal do Rio de Janeiro: “Elas foram criadas para dar certo e responder à demanda intensa da população, e os jurisdicionados sairão bem-satisfeitos, com tempo razoável e qualidade na resolução dos processos.” * Com informações da OAB/RJ 2013 Dezembro | Justiça & Cidadania 21
Considerações sobre a eficácia probatória do protesto
Sérgio Shimura
A
Desembargador do TJSP Professor nos programas de graduação e pós-graduação da PUC-SP e da Escola Paulista da Magistratura
1. Noções introdutórias jurisdição consiste na função estatal, exercida preponderantemente pelo Poder Judiciário, de declarar e realizar concretamente a vontade da lei diante de uma situação jurídica controvertida. De outro foco, a jurisdição é manifestação do poder estatal, pela qual o juiz ora conhece do litígio apresentado pela parte lesada, outorgando-lhe a solução prevista em lei (processo de conhecimento), ora dá concretude ao direito já acertado (processo de execução), ora, ainda, assegura preventivamente o direito das partes por meio do processo cautelar ou da antecipação de tutela. Em princípio, a jurisdição é exercício de atividade estatal sobre determinado caso concreto, diante de uma hipótese fática específica, por meio de um processo. Em outras palavras, o processo é instrumento de composição da lide, obtenível pelo exercício da jurisdição. Porém, essa atividade só se apresenta se e quando provocada pela parte interessada. Em regra, sem que a parte apresente expressamente o pedido de uma providência estatal, não se há cogitar de atividade jurisdicional de ofício. A expressão do chamado princípio da inércia. Na normalidade dos casos, o pedido deduzido em juízo deve ter por fundamento algum fato afirmado por aquele que postula a providência jurisdicional. E se o réu se opuser, negando o fato ou alegando outros, impeditivos, 22
modificativos ou extintivos do direito do autor, igualmente deve prová-los (art. 326, CPC). Por isso, na peça processual que instaura o processo, o autor deve indicar quais os fatos que envolvem o litígio, bem como o respectivo pedido (art. 282, CPC). Mas não basta alegar. Tem de provar. Na análise do pedido, é possível separar idealmente dois aspectos: o direito e o fato. Por hipótese, em um pedido de indenização, o fato pode consistir em um acidente de veículo, no protesto de um título de crédito, no defeito de um produto de consumo. E o direito provém da norma legal, abstratamente prevista (art. 927, CC).1 Nessa linha de raciocínio, quando o juiz, na sentença, decide sobre o pedido formulado pela parte, silogiza da seguinte forma: analisa a premissa maior (norma jurídica), constata a premissa menor (fatos) e chega à conclusão (sentença).2 Infere-se, pois, que a atividade probatória versa sobre a situação fática da relação jurídica. Apenas excepcionalmente há necessidade de se provar o direito (conteúdo e vigência, cf. art. 337, CPC; art. 14, LICC).3 No processo trabalhista, interessa lembrar as convenções coletivas de trabalho (arts. 154, 227, § 2o, 444, 462, 611 e ss., Consolidação das Leis do Trabalho) ou convenção internacional (art. 651, § 2o, Consolidação das Leis do Trabalho), que, embora não sejam “leis” no sentido estrito, ostentam verdadeiramente conteúdo de norma jurídica.
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Foto: Antônio Carreta/TJSP
Prova é todo elemento que pode levar o conhecimento de um fato a alguém. No processo, significa todo meio destinado a convencer o juízo a respeito da ocorrência de um fato. A sua finalidade é demonstrar uma situação fática dentro do processo, reunindo elementos para a convicção do órgão judiciário. Interessa ressaltar que a prova é feita para o processo e, assim, propiciar o convencimento do juízo sobre determinado fato. De conseguinte, ainda que o juiz (pessoa física) já esteja convencido sobre o fato, não pode lastrear a sua decisão em conhecimento próprio e impressão pessoal acerca dos fatos. Deve ensejar a produção da prova para que a mesma se perpetue no processo, inclusive para servir de suporte aos órgãos superiores na verificação do acerto ou do equívoco da sentença. Se o juiz ainda não está convicto sobre o direito afirmado pelo autor, é preciso que oportunize regular instrução probatória, sendo-lhe defeso julgar improcedente por ausência de provas. A exceção a essa regra fica por conta da chamada “máxima de experiência”, conforme dispõe o art. 335, CPC: Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.
2. Objeto da prova A prova envolve fatos, relevantes e controvertidos. Na investigação dos fatos, caberá ao juiz perquirir a respeito do que, quando, onde, quem e como foram os acontecimentos relevantes à causa. Bem por isso é que o art. 331, § 1º, CPC, determina que o juiz deve fixar os pontos controvertidos sobre os quais serão produzidas as provas. De igual modo, art. 852-D, CLT, dispõe que: O juiz dirigirá o processo com liberdade para determinar as provas a serem produzidas, considerado o ônus probatório de cada litigante, podendo limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias, bem como para apreciá-las e dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica.
Quanto ao fato ocorrido no exterior, o art. 13, Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, estabelece que “a prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar, quanto ao ônus e aos meios de produzir-se, não admitindo os tribunais brasileiros provas que a lei brasileira desconheça”. A questão sobre “fatos” e a “respectiva prova” ganha relevo quando se cogita do cabimento dos recursos extraordinários (especial, extraordinário e o de revista), situação que demanda a análise de dois aspectos.
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O primeiro refere-se à valoração da prova, à admissibilidade legal da prova. Diz respeito ao valor legal da prova, abstratamente considerado. Por hipótese, se a lei federal exige determinado meio de prova, abstratamente considerado, eventual decisão que considere o fato provado por outro meio ofende o Direito Federal, permitindo o recurso especial ao STJ (art. 105, III, CF) ou o de revista ao TST (art. 896, CLT). O segundo aspecto concerne à reapreciação da prova. Nesse particular, descabem recursos extraordinários para rediscutir o simples reexame de provas, na esteira das Súmulas 7-STJ (“A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”) e 270-STF (“Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”). Quer dizer, se a lei federal não dispuser sobre o valor probante, em abstrato, de certos meios de provas, não se pode asseverar que o julgado local, apreciando bem ou mal as provas, contraria ou ofende Direito federal. No reexame de provas, pode ocorrer ofensa ao direito subjetivo da parte, mas não contrariedade a Direito federal, abstratamente considerado. De conseguinte, nem o Superior Tribunal de Justiça nem o Tribunal Superior do Trabalho se prestam ao reexame de matéria fática ou reapreciação das provas, sob pena de a instância especial se convolar em ordinária, imiscuindo-se na livre convicção motivada do juiz. 3. Protesto e finalidade Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida (art. 1o da Lei no 9.492/97). Os serviços relativos ao protesto são de competência exclusiva ao Tabelião de Protesto de Títulos e têm por substrato garantir a autenticidade, publicidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos (arts. 2o e 3o da Lei nº 9.492/97). No âmbito do Estado de São Paulo, o protesto sujeitase ainda às Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, pareceres e provimentos de suas Corregedorias (Geral e Permanente), como o Parecer 076/06 (Proc. CG 864/06). Não se há confundir o protesto extrajudicial, objeto do presente artigo e regulado pela Lei no 9.492/97, com o protesto judicial, regrado pelo art. 867, Código de Processo Civil (“Todo aquele que desejar prevenir responsabilidade, prover a conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal, poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e requerer que do mesmo se intime a quem de direito”). Para a validade do protesto basta a entrega da notificação no estabelecimento do devedor e sua recepção por pessoa identificada (art. 14, Lei no 9.492/97; Súmula 52-TJSP). 24
4. Princípio da unitariedade Um dos princípios que regem a Lei no 9.492/97 é o da “unitariedade”, significando que há um único protesto – do título ou documento de dívida –, encerrando um único ato comprobatório da inadimplência daquele devedor originário constante no instrumento. Quer dizer, em sendo protestado o título por falta de pagamento, não se permite um “segundo” protesto, agora contra os coobrigados (endossantes, sacadores e avalistas), exceto se o primeiro contiver indicação errônea ou omissão de dados. 5. Protesto necessário e facultativo Em princípio, o protesto não é requisito para o ajuizamento de ação judicial, pois a sua finalidade é provar a impontualidade. Portanto, cabe execução independentemente do protesto do título executivo. Excepcionalmente, a lei exige o protesto (protesto necessário) como condição da ação ou como prova indispensável da mora. Nesses casos, o protesto é prova documental insubstituível, não valendo provas orais ou testemunhais. Por exemplo: para o pedido de falência (art. 94, § 3o, Lei no 11.101/2005), caso em que a notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a identificação da pessoa que a recebeu (Súmula 361-STJ). Porém, se tirado o protesto comum por falta de pagamento, não se exige um segundo protesto, específico para fins de falência. Quanto ao pedido de falência, no Tribunal de Justiça de São Paulo, editaram-se os seguintes enunciados: Súmula 41-TJSP: “O protesto comum dispensa o especial para o requerimento de falência”; Súmula 43-TJSP: “No pedido de falência fundado no inadimplemento de obrigação líquida materializada em título, basta a prova da impontualidade, feita mediante o protesto, não sendo exigível a demonstração da insolvência do devedor”; Súmula 50-TJSP: “No pedido de falência com fundamento na execução frustrada ou nos atos de falência não é necessário o protesto do título executivo”. Em relação à duplicata, mercantis ou de prestação de serviços, não se exige protesto para ser executada. Excepciona-se, todavia, a hipótese de duplicata “não aceita”, bem como a relativa ao direito de regresso. Quanto à duplicata não aceita, somente poderá ser protestada, mediante a apresentação de documento que demonstre a efetiva prestação do serviço ou a compra e venda mercantil, acompanhado do comprovante da entrega e recebimento da mercadoria que deu origem ao saque da duplicata. Neste caso, no que toca à duplicata mercantil, permitese que a apresentação dos documentos previstos neste
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item seja substituída por simples declaração escrita, do portador do título e apresentante, feita sob as penas da lei, assegurando que aqueles documentos originais, ou cópias devidamente autenticadas, que comprovem a causa do saque, a entrega e o recebimento da mercadoria correspondente, sejam mantidos em seu poder, com o compromisso de os exibir a qualquer momento, no lugar em que for determinado, especialmente no caso de sobrevir a sustação judicial do protesto. Nessa linha, comprovada a prestação dos serviços, mesmo que não aceita, mas protestada, a duplicata é título hábil para instruir pedido de falência (Súmula 248-STJ). Ainda quanto à duplicata, cabe lembrar a questão do direito de regresso. Se o portador não tirar o protesto da duplicata, em forma regular e dentro do prazo da 30 (trinta) dias, contado da data de seu vencimento, perderá o direito de regresso contra os endossantes e respectivos avalistas (art. 13, Lei no 5.474/68). E a execução da duplicata prescreve em um ano quando proposta contra endossante e seus avalistas, contado da data do protesto (art. 18, Lei no 5.474/68). Aqui importa destacar que, por vezes, o sacado não manteve qualquer relação negocial com a sacadora (que emitiu a duplicata e a endossou a terceiro de boa-fé); neste caso, é possível o protesto do “título”, omitindo-se a publicidade do nome do sacado da certidão de protesto. Diversamente, quanto à cédula de crédito bancário, dispensa-se o protesto para garantia do direito de regresso. O art. 44 da Lei nº 10.931/2004 expressa que se aplicam às cédulas de crédito bancário, no que não contrariar o disposto nesta Lei, a legislação cambial, dispensado o protesto para garantir o direito de cobrança contra endossantes, seus avalistas e terceiros garantidores. Também reclama protesto quando o título executivo for contrato de câmbio (art. 75 da Lei no 4.728/65). Nas vendas a crédito com reserva de domínio, a mora do comprador há de ser provada com o protesto do título (art. 1.071, Código de Processo Civil). De igual forma, no que concerne ao contrato de alienação fiduciária a comprovação da mora é imprescin dível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, nos termos da Súmula 72-STJ. A prova da mora pode ser feita mediante notificação pelo Oficial de Registro de Títulos e Documentos ou pelo protesto do título (art. 2o, § 2o, Decreto-lei no 911/69); a notificação destinada a comprovar a mora nas dívidas garantidas por alienação fiduciária dispensa a indicação do valor do débito (Súmula 245-STJ). No que tange ao cheque, para a execução, basta a apresentação, independentemente do protesto. Quer dizer, o portador pode executar o emitente e seu avalista, bem como os endossantes e seus avalistas, se o cheque
apresentado em tempo hábil e a recusa de pagamento for comprovada pelo protesto “ou” por declaração do sacado, escrita e datada sobre o cheque, com indicação do dia de apresentação, “ou, ainda”, por declaração escrita e datada por câmara de compensação (art. 47, Lei no 7.357/85). Extrai-se, dessa forma, que o seu protesto é facultativo. 6. Documentos protestáveis Podem ser levados a protesto os títulos e documentos de dívida. Em outras palavras, os documentos devem conter obrigação de pagar quantia líquida, certa e exigível. Dessa forma, são protestáveis os títulos executivos, judiciais ou extrajudiciais, previstos tanto no Código de Processo Civil (arts. 475-N e 585), como em legislação extravagante. Alguns exemplos: termo de ajustamento de conduta (art. 5o, § 6o, Lei no 7.347/85), contrato de aluguel de bem imóvel (art. 585, V, CPC), contrato de participação em grupo de consórcio (art. 10, § 6o, Lei no 11.795/08), duplicata mercantil e de prestação de serviços (art. 13, Lei no 5.474/68), contrato de honorários advocatícios (art. 24, Lei no 8.906/1994), encargos Condominiais (Lei estadual paulista no 13.260/2008), cédula de crédito bancário (art. 28 da Lei no 10.931/2004 e Súmula 14-TJSP), decisão do tribunal de contas de que resulte imputação de débito ou multa (art. 71, § 3o, Constituição Federal), certidão da dívida ativa (art. 585, VII, CPC). Em se tratando de sentença ou decisão judicial que contemple obrigação de pagar quantia líquida, certa e exigível, exige-se trânsito em julgado da decisão, comprovável mediante certidão do juízo. Quando a lei alude a “documentos de dívida”, abre-se a possibilidade de protesto, seja de título executivo, seja de outro documento representativo de dívida líquida, certa e exigível, sem eficácia executiva. Basta pensar em documento particular, assinado apenas pelo devedor, sem a presença de duas testemunhas; ou mesmo o título de crédito atingido prescrição da pretensão executória, como se depreende da Súmula 17TJSP (“A prescrição ou perda de eficácia executiva do título não impede sua remessa a protesto, enquanto disponível a cobrança por outros meios”). Prescrita a via executiva, sobeja ao credor o direito de buscar a satisfação de seu crédito pelas vias ordinárias, por meio de ação de conhecimento, sujeitando-se a partir daí ao prazo prescricional de 5 anos previsto na lei civil (art. 206, § 5o, I, Código Civil). O protesto pode se referir ao não pagamento da integralidade da dívida ou de apenas parte. Quanto ao título de crédito, é possível o protesto de parte da dívida, como sucede, por exemplo, quando há quitação ou
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remissão parcial da obrigação. Neste caso, cabe ao credor indicar qual o montante que pretende ver protestado. O protesto é causa interruptiva da prescrição (art. 202, Código Civil). Mas, ainda que prescrita a pretensão executiva, é possível o protesto do documento. E o tabelião não tem atribuição para investigar a ocorrência da prescrição ou caducidade (art. 9o, Lei no 9.492/97), podendo, quando muito, analisar eventual irregularidade formal (por ex.: rasuras, ilegibilidade do documento, incompletude do título etc.); por consequência, não se pode cogitar de responsabilização do tabelião se age no estrito cumprimento de suas atribuições. O título ou documento de dívida expressa em moeda estrangeira igualmente são protestáveis, desde que acompanhados de tradução efetuada por tradutor público juramentado (art. 10, Lei no 9.492/97). Pela Súmula 387-STF, a cambial emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes da cobrança ou do protesto. Se ajuizada execução do título de crédito sem estar devidamente preenchida, cumpre perquirir se, em sendo extinta por irregularidade do título executivo, poderia o credor, após preencher os claros, repropor a mesma execução. Temos que sim, uma vez que o “mérito” da execução não restou devidamente apreciado, nem julgado; isto é, não houve pronunciamento a respeito da extinção da obrigação pelo pagamento. Porém, já se decidiu que não pode o credor, após o preenchimento dos claros, ajuizar nova execução, restando-lhe tão somente a via ordinária.4 No que tange à duplicata virtual, emitida por meio magnético ou de geração eletrônica, também pode ser protestada, por indicação (art. 13, Lei no 9.492/97), não se exigindo, para o ajuizamento da execução judicial, a exibição do título. Logo, se o boleto bancário que serviu de indicativo para o protesto retratar fielmente os elementos da duplicata virtual, estiver acompanhado do comprovante de entrega das mercadorias ou da prestação dos serviços e não tiver seu aceite justificadamente recusado pelo sacado, poderá suprir a ausência física do título cambiário eletrônico e, em princípio, constituir título executivo extrajudicial. 5 7. Efeitos Além de se constituir prova do inadimplemento, o protesto ainda tem o efeito de interromper a prescrição (art. 202, III, Código Civil), além de fixar o termo inicial da incidência de juros, taxas e atualizações monetárias sobre o valor da obrigação, se não houver prazo assinado (art. 40, Lei no 9.492/97).
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Sendo solicitada, o cartório de protesto deve fornecer aos órgãos de proteção do crédito, representativas da indústria e do comércio (por ex.: Serasa Experian), certidão diária, em forma de relação, dos protestos tirados e dos cancelamentos efetuados, com a nota de se cuidar de informação reservada, da qual não se poderá dar publicidade pela imprensa, nem mesmo parcialmente (art. 29, Lei no 9.492/97). 8. Protesto indevido Sendo indevido o protesto, cabe ação indenizatória contra o responsável, como sucede, por exemplo, quando o título já está quitado, duplicata sem qualquer lastro, rescisão do negócio, falsidade de assinatura etc. Nessas hipóteses, o dano é presumido (in re ipsa), decorrente da própria coisa ou situação fática. 6 Se já há protesto legítimo anterior, discute-se se o segundo – indevido – ensejaria direito à indenização por dano moral. É certo que a Súmula 385-STJ estabelece que “d a anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”. Todavia, a discussão grassa tanto na doutrina como na jurisprudência, considerando que um único protesto legítimo tornaria todos os subsequentes (ilegítimos) imunes de responsabilização. Por vezes, é possível que a cambial seja levada a protesto por instituição financeira quando lhe é transferido um título de crédito. Aqui cabe distinguir a posição do banco. Se age como proprietário do título e do crédito, por força de endosso translatício, fica responsável pelo protesto indevido, sendo, pois, parte passiva legítima para figurar em eventual ação indenizatória. Por outro lado, quando detém o título de crédito apenas para cobrar a dívida – endosso mandato –, a mera situação de o banco ter recebido o título para cobrança não pode levá-lo à responsabilização por danos morais decorrentes do protesto indevido. No entanto, se houve abuso ou desídia por parte do banco, por exemplo, levando a protesto depois de avisado de que o título já se encontra quitado ou de que o negócio foi desfeito, incide na obrigação de indenizar.7 Igualmente, se o banco recebe o título de crédito como garantia de outra operação (endosso-caução), há de verificar a higidez da cambial e a sua causa; levando-o indevidamente a protesto, deve responder pelos danos. Assim, se a instituição financeira extrapola seus poderes de mandatária ou se descuida de seu dever de verificar a regularidade do título, passa a ser responsável pelo protesto ilegítimo. 8
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Notas Art. 927, Código Civil. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. 2 Art. 458, CPC. São requisitos essenciais da sentença: I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo; II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes Ihe submeterem. 3 Exemplo de prova da vigência do direito. Na adoção internacional (art. 51, § 2º, Estatuto da Criança e Adolescente), “A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá determinar a apresentação do texto pertinente à legislação estrangeira, acompanhado de prova da respectiva vigência”. 4 REsp. 870.704-SC, Rel. Min.Luis Felipe Salomão, j. 14/6/2011 5 REsp. 1.024.691-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 22/3/2011 6 “Dano moral – Protesto indevido – Duplicata - Protesto e inscrição do nome da autora nos cadastros restritivos de crédito que foram ilegítimos – Banco réu que deve ressarcir a autora dos danos morais por ela suportados - Pessoa jurídica - Protesto que afeta as suas relações com terceiros, sob o ponto de vista do bom nome e da confiabilidade que deve pautar as relações no meio comercial – Entendimento consolidado mediante a edição da Súmula 227 do STJ - Configurado o dano moral puro – Desnecessidade de sua prova – Indenização por danos morais devida. Dano moral – “Quantum” – Arbitrada na sentença, a título de indenização por danos morais, a importância de R$ 100.000,00 – Redução da indenização - Ressarcimento que há de ser fixado, levando-se em conta critério de prudência e razoabilidade – Justo o arbitramento da indenização em R$ 20.000,00, soma equivalente a, aproximadamente, cinqüenta vezes o valor do título protestado (R$ 403,00) - Apelo provido em parte” (TJSP, Ap. 9113757-38.2008.8.26.0000, rel. Des. JOSÉ MARCOS MARRONE, j. 23.11.2012). 7 Resp. 602.280-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 2/2/2010 8 “RESPONSABILIDADE CIVIL - Dano moral - Protesto regular - Hipótese, entretanto, em que houve demora injustificada em fornecer a carta de anuência, mesmo após o pagamento da dívida - Danos morais configurados - Indenização devida - Recurso nesta parte provido. RESPONSABILIDADE CIVIL Danos materiais - Inadmissibilidade - Hipótese em que a causa de pedir dos danos materiais é a mesma dos danos morais, qual seja, a restrição creditícia - Recurso nesta parte improvido” (TJSP, Ap. 0025170-75.2004.8.26.0602, Rel. Des. J. B. FRANCO DE GODOI, 23ª Câmara de Direito Privado, j. 11/04/2012). Mesmo sentido: “Os direitos ao bom nome, à imagem e à dignidade estão assegurados constitucionalmente, não havendo a menor dúvida que o indevido registro de protesto ou o cadastro negativo constituem violações a esses atributos da pessoa humana. Não se pode negar as conseqüências gravosas resultantes desses atos. Os efeitos maléficos à imagem e os embaraços que lhe causam nas relações diárias com o comércio e outras instituições financeiras são indiscutíveis” (TJSP, Ap. 0002630-93.2010.8.26.0223, Rel. Des. PAULO ROBERTO DE SANTANA). 1
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O Supremo Tribunal Federal e os planos econômicos Cid Heraclito de Queiroz
Advogado Ex-Procurador-Geral da Fazenda Nacional
Nota do Editor
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Vale acrescentar ao artigo do eminente econo mista e advogado Cid Heraclito de Queiroz o pronunciamento de um dos juristas mais citados pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em causas que vão da cobrança de tributos ao Mensalão. O jurista português José Joaquim Gomes Canotilho acredita que a Corte deveria dar efeito retroativo à eventual decisão envolvendo os planos econômicos, o que evitaria o pagamento de correções aos poupadores. “Esse caso é um dos que os tribunais constitucio nais não deveriam resolver”, afirmou Canotilho em entrevista à imprensa, declarando mais: “É o que se tem feito em casos sobre impostos. Os tribunais podem dizer que isso é inconstitucional, mas, em virtude do interesse público, das consequências, isso não tem retroação em relação ao passado e só se aplica a partir daquele momento. Os tribunais têm que encontrar soluções para atender ao interesse público.” O eminente e conceituado jurista declarou ainda: “Eu não sei como [os ministros do STF] vão votar, mas imagino o que alguns tribunais constitucionais fariam. Eles poderiam dizer que a Constituição permite [a correção das poupanças] em alguns casos, mas o tribunal pode restringir os efeitos do reconhecimento da inconstitucionalidade [dos planos]”, afirmou Canotilho, acrescentando: “Ao restringir esse efeitos, os ministros podem dizer que [a decisão] não tem efeito retroativo.”
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Supremo Tribunal Federal julgará, nos próximos dias, a questão (um milhão de ações) relativa à constitucionalidade dos chamados “Planos Econômicos” (Bresser, Verão e Collor), em face de pleito dos titulares de contas de poupança, que se consideraram prejudicados pelas regras de conversão de moeda antiga para moeda nova, no respeitante à correção monetária dos depósitos, pleiteando,
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por consequência, diferenças, no valor global de cerca de R$ 150 bilhões, por parte das instituições financeiras depositárias, sobretudo a Caixa Econômica Federal. No fundo, alegam inexistente direito constitucional a um determinado índice de correção dos depósitos. Ora, os índices – é bom lembrar – podem, inclusive, ser extintos a qualquer tempo. A decisão preocupa seriamente o governo federal, porquanto, se esse pleito for acolhido, poderá suceder até mesmo a quebra de algumas instituições bancárias. Afora isso, a Receita Federal teria de devolver parte do imposto de renda pago pelas instituições financeiras, os adquirentes de habitações financiadas teriam de pagar imensas diferenças, etc. Tudo isso acabaria por gerar uma crise econômico-financeira, com o recrudescimento da inflação, que afeta, sobretudo, as classes mais desfavorecidas. Todavia, a substância deve prevalecer sobre a forma, e o interesse social, sobre o interesse individual. As Constituições de numerosos países dispensam tratamento expresso ao sistema monetário: Estados Unidos, Alemanha, Suíça, Holanda, Áustria, Portugal, Suécia, Grécia, Argentina, México, etc. Nossa tradição constitucional não é diferente. A Constituição do Império preceituava que era atribuição da AssembleiaGeral determinar o peso, o valor, a inscrição, o tipo e a denominação das moedas. Essa norma foi reproduzida pela Carta Republicana de 1891. A Carta de 1934 atribuiu competência privativa à União para fixar o sistema monetário, cunhar e emitir moeda, e instituir banco de emissão. Na de 1937, foi conferido à União o poder de legislar sobre questões de moeda. A Carta Democrática de 1946 atribuiu competência à União para cunhar e emitir moeda, e instituir bancos de emissão. A de 1967 suprimiu a competência da União para cunhar, mas manteve a de emitir moeda, bem assim a de legislar sobre sistema monetário. A Emenda no 1, de 1969, manteve essas normas. Finalmente, a Constituição de 1988, de modo mais adequado, preceituou a competência executiva da União para emitir moeda e a competência legislativa para dispor, privativamente, sobre sistema monetário. Como se vê, desde o Império, sempre foi clara a competência constitucional da União não simplesmente para cunhar (fabricar) e emitir moeda (pôr moeda em circulação), mas, também e sobretudo, para legislar sobre sistema monetário, um “direito inerente à soberania”, na lição do clássico Maximiliano. Aliás, no final do século XIX, a Suprema Corte dos Estados Unidos já havia decidido, pelo voto do Justice Gray, que o “poder de emitir moeda, atribuir-lhe curso forçado e regular o respectivo padrão é inerente à soberania” (Juilliard X Greenman Case, 1884). Assim, quando a Constituição atribui competência à União para legislar sobre sistema monetário, confere-
lhe, implícita e necessariamente, poderes para criar e extinguir tal ou qual moeda, atribuir-lhe ou retirar-lhe o curso forçado, fixar-lhe o respectivo padrão e estabelecer regras de conversão da moeda antiga para a nova, seja ao par, seja em outra proporção, inclusive prescrevendo taxas diferenciadas, segundo a natureza dos valores representados na moeda antiga, e dispondo sobre o prazo e as condições, gerais ou diversificadas, para a conversão. E, ainda, para fixar normas sobre a conversão para a moeda de outros países. “A estabilidade da moeda deveria estar incluída – disse Ludwig Erhard – entre os direitos fundamentais do homem. E só uma política de estabilização da moeda – afirmava o pai do milagre alemão – torna possível que uma classe não enriqueça à custa das outras”. Destarte, “não pode o direito – ensina ainda Maximiliano – isolar-se do ambiente em que vigora, deixar de atender às outras manifestações da vida social e econômica. As mudanças econômicas e sociais constituem o fundo e a razão de ser de toda a evolução jurídica.” É oportuno lembrar que, por ocasião da fusão das duas Alemanhas, foi atribuído ao Banco Central da Alemanha Ocidental (Bundesbank) um plano pelo qual até dois mil marcos orientais, depositados em contas de poupança, seriam convertidos ao par em marcos ocidentais, e o restante, assim como o valor de salários e pensões, seria convertido na proporção de dois por um. No mercado livre, a taxa era de cinco marcos orientais por um ocidental. Todos os mandados de segurança deferidos contra normas dos planos foram suspensos pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça. É necessário considerar, outrossim, que mais de vinte anos são decorridos do advento desses planos econômicos e seus efeitos estão consolidados, inclusive pelo posterior e notável Plano Cruzado e pelas medidas dos sucessivos governos para combater a inflação. A par da questão constitucional, matéria publicada pela revista Veja, de 27/11/13, demonstra que, pelas regras dos planos econômicos, as contas de poupança teriam sido corrigidas abaixo da inflação no mês de implantação de cada plano, mas corrigidas acima da inflação no primeiro trimestre após cada plano. Os planos Bresser, na gestão Bresser Pereira, Verão, na gestão do Mailson da Nóbrega, e Collor, na gestão da Zélia Cardoso de Mello, foram concebidos e elaborados, sob a orientação desses ilustres brasileiros, por equipes de competentes e dedicados economistas e técnicos para eliminar ou reduzir não simplesmente a inflação, mas a própria hiperinflação que ameaçava a ordem social, a harmonia social, um dos fundamentos da sociedade brasileira, como preceitua, com rara felicidade, o preâmbulo da Constituição de 1988.
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Responsabilidade civil das empresas de ônibus por assalto a empregado
José Geraldo da Fonseca
N Introdução
Membro do Conselho Editorial Desembargador do TRT 1a Região
ão há consenso nos tribunais sobre a possibilidade de imputar responsabilidade civil às empresas de ônibus pela obrigação de indenizar empregado, por dano moral, nos casos de assalto aos coletivos na via pública. Parte da doutrina entende que as empresas de ônibus exercem, por delegação do poder público, atividade pública de transporte de passageiros e devem, tanto quanto o Estado, responder objetivamente pela lesão causada aos passageiros ou a seus próprios empregados em caso de assalto. Outra parte entende que o assalto a passageiros é caso fortuito externo, e a empresa de ônibus somente poderá responder por alguma indenização, inclusive por dano moral aos empregados, em caso de dolo ou culpa. Os tribunais do trabalho enfrentam essas questões diariamente, mas as soluções são díspares até mesmo entre as Turmas do Tribunal Superior do Trabalho, a quem cabe uniformizar a jurisprudência. Muita vez, as premissas em que a indenização se funda são eleitas equivocadamente: ou os juízes se arrimam em regras próprias dos contratos de transporte ou de seguro, que não se aplicam ao caso, ou em surrada ponderação de princípios que, decididamente, não tem nenhuma pertinência com a hipótese julgada. 30
Responsabilidade civil objetiva e subjetiva Não há indenização sem dano, mas nem todo dano é indenizável. Somente o dano ilícito o é. A obrigação de indenizar exige que o dano tenha sido causado por um ato ilícito do agressor. Ato ilícito é todo aquele que, praticado por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, viola direito e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral1. Também comete ato ilícito aquele que exerce um direito excedendo manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes2. Logo, a responsabilidade civil no direito brasileiro é, em regra, subjetiva, e fundase em um ato ilícito3. A responsabilidade civil objetiva é exceção que tem de estar expressa na lei ou decorrer do risco que a atividade normal do causador do dano criar para o direito de terceiros. Nas ações de indenização por ato ilícito fundadas na responsabilidade subjetiva do agressor, a vítima tem de provar a culpa do agente. Se não há prova da culpa, não há dever de indenizar. Mas o Código Civil também diz que pode haver responsabilidade sem culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem4.
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A regra, portanto, é esta: se a responsabilidade do causador do dano é subjetiva, exige-se da vítima a prova da culpa do agressor; se não houver prova dessa culpa, a indenização não será devida; se a responsabilidade do autor do dano já está prevista em lei como objetiva, ou se a atividade normalmente desenvolvida pelo causador do dano implicar, por si mesma, risco para os direitos de terceiros, a responsabilidade é objetiva e, portanto, presumida, e a vítima não precisa provar nenhuma culpa, cabendo ao causador do dano a prova de que não houve o dano, que ele decorreu de caso fortuito, força maior ou de culpa exclusiva da vítima, em qualquer de suas modalidades (negligência, imperícia, imprudência). Caso fortuito e força maior O art. 393, do Código Civil, diz que o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito, ou força maior, exceto se houver expressamente responsabilizado por eles. O caso fortuito, ou de força maior, retira do fato jurídico o “nexo de causalidade entre o inadimplemento e o dano, de modo que não haverá obrigação de indenizar”5. Como regra, portanto, o devedor de qualquer obrigação somente responderá pelo dano decorrente do caso fortuito ou da força maior se disser expressamente que o fará. Caso
fortuito, ou de força maior, é o fato necessário cujos efeitos não era possível evitar ou impedir6. Se os efeitos do fato não podiam ser evitados, ou impedidos, há caso fortuito, ou de força maior, e não é possível imputar a alguém a sua culpa nem pedir indenização. Um exemplo talvez explique melhor: se alguém, em condições normais de tráfego, dirige um carro em meio a uma tempestade, e esse veículo é atingido por um raio e, por causa disso, se desgoverna e atinge outro veículo, não há culpa nem indenização. O raio é um fato natural cuja ocorrência danosa era impossível evitar ou impedir. A jurisprudência e a questão dos assaltos Na questão dos assaltos, o STJ tem duas linhas de jurisprudência. Se o assalto ocorre dentro de uma agência bancária, por exemplo, a responsabilidade é do estabelecimento bancário, porque zelar pela integridade física dos clientes que ali comparecem por força das obrigações como correntistas é obrigação própria da atividade-fim dos bancos. A possibilidade de ocorrer um assalto no interior de uma agência bancária é um evento previsível e evitável. Embora se trate de caso fortuito, diz-se que é fortuito interno, isto é, inserese na atividade normal da empresa bancária. Mas, se o
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“É equívoco presumir a responsabilidade civil da empresa de ônibus no assalto pelo simples fato de transportar pessoas, porque essa atividade não é do tipo que cria risco potencial para o direito de outrem. A atividade normalmente desenvolvida pelas empresas de ônibus é o transporte de pessoas, e nisso não reside aquele perigo potencial de dano a outrem de que fala o parágrafo único do art. 927 do Código Civil.”
assalto ocorre dentro de um ônibus, por exemplo, é caso fortuito externo, isto é, não está no rol daqueles eventos previsíveis que a empresa de ônibus poderia evitar mesmo que tivesse tomado alguma providência. Responsabilidade das empresas de ônibus em relação aos empregados Ninguém duvida que assaltos possam deixar sequelas emocionais na vítima. Essa é uma ilação que decorre do senso comum, daquilo que ordinariamente acontece. Tratando-se, todavia, de assalto ocorrido no interior de coletivos, embora se admita, a priori, a possibilidade de existência do dano psicológico, não há base legal que permita estabelecer nexo de causalidade entre o fato criminoso e a atividade da sociedade empresária. Logo, nesses casos, empregados (motoristas, cobradores ou fiscais de tráfego, entre outros) não têm direito a nenhuma indenização por dano moral. É equívoco presumir a responsabilidade civil da empresa de ônibus no assalto pelo simples fato de transportar pessoas, porque essa atividade não é do tipo que cria risco potencial para o direito de outrem. A atividade normalmente desenvolvida pelas empresas de ônibus é o transporte de 32
pessoas, e nisso não reside aquele perigo potencial de dano a outrem de que fala o parágrafo único do art. 927 do Código Civil. Ora, se a responsabilidade objetiva das empresas de ônibus, no caso de assaltos, não está em nenhuma lei, nem o transporte de pessoas é daquele tipo de atividade que traga em si o risco para terceiros, não se trata, obviamente, de responsabilidade objetiva, e não se pode presumir culpa do empresário. Se trata-se de responsabilidade subjetiva, o fundamento da indenização é a culpa do causador do dano, como está nos arts. 186 e 187 do Código Civil, mas ambos falam em indenização por ato ilícito, isto é, ação contrária ao direito que exige prova cabal da culpa pela parte que reclama a indenização. Se o assalto é crime praticado por terceiros, não há fundamento algum em dizer que a empresa de ônibus praticou “ato ilícito” ou nele teve algum tipo de culpa. Parece-me claro que nenhuma indenização por dano moral é devida ao empregado que, circunstancialmente, estiver trabalhando no veículo assaltado. Como visto, trata-se de fortuito externo, e não é possível estabelecer, juridicamente, nexo de causalidade entre o evento danoso e a responsabilidade da empresa de ônibus. Alguns julgados do TST fiam-se na Súmula 187 do STF para legitimar a condenação das empresas de ônibus. O equívoco é manifesto. Segundo a súmula, a “responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”. Fala-se, aqui, em acidentes com passageiros em que a lesão é causada por terceiros. A hipótese é de interpretação do contrato de transporte. No contrato de transporte, quando o passageiro paga o bilhete, firma com o transportador um contrato tácito por meio do qual o transportador se obriga a transportá-lo são e salvo do local de embarque ao ponto de destino. Se, a meio caminho, um terceiro impede a realização desse contrato, o transportador responde pelo inadimplemento do contrato de transporte, indeniza o passageiro e vai buscar ressarcimento contra o causador do dano. Não é disso que estamos tratando. Assaltos são crimes. A responsabilidade civil é do Estado, a quem cabe garantir a incolumidade física das pessoas e de seu patrimônio.
Notas Código Civil, art. 186. Código Civil, art. 187. 3 Código Civil, art. 927. 4 Código Civil, art. 927, parágrafo único. 5 BDINE JR., Hamid Charaf. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Coordenação Ministro Cezar Peluso. São Paulo: Manole, 2007, p. 282. 6 Código Civil, art. 393, parágrafo único. 1 2
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Foto: João Andrade/Editora JC
A prisão e algumas reflexões sobre a reforma do Código Penal Fábio Uchôa Pinto de Miranda Montenegro
O
Juiz de Direito do 1º Tribunal do Júri da Comarca da Capital – RJ
legislador penal tem muita dificuldade de encontrar o meio-termo das coisas, seja para reprimir uma conduta, seja para abrandar o tratamento repressivo. E isso não é de hoje! Vejam, por exemplo, as inúmeras e indiscriminadas possibilidades de substituição da pena de prisão ou restritivas de direitos por pena pecuniária ou multa. Enquanto, por outro lado, tenta se criminalizar o bullying, entre outras condutas, como a produção de ruídos das mais diversas formas, parecendo um verdadeiro absurdo, tanto um quanto outro.
É preciso se chegar a um meio-termo! Penso que o que se apresenta com maior preocupação e urgência, no momento, é o efetivo cumprimento da pena efetivamente aplicada e conforme previsto no preceito primário, só se estabelecendo as substituições por pena pecuniária ou de multa em casos excepcionais de muita reduzida culpabilidade e lesividade, e, mesmo assim, quando não for possível a aplicação da pena restritiva de direitos. Esta sim, para casos de menor potencial, pequena lesividade e o réu sendo primário, podem ser uma reprimenda interessante.
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Hodierna e sistematicamente tem se criticado o sistema prisional como caótico, entre outros adjetivos de igual profundidade, sendo certo, entretanto, que nem sempre a crítica se justifica. No que se refere ao Rio de Janeiro, as carceragens da polícia civil (Grajaú, São João de Meriti, Neves, Araruama, Pavuna e Caxias) – onde os presos ficam durante todo o tempo trancados e normalmente na companhia de outros presos em ambiente não adequado – não têm por objeto o recolhimento dos condenados, já que elas se destinam apenas a PRESOS PROVISÓRIOS que se encontram em fase de transição para o ingresso no Sistema Penal, ainda que como presos provisórios. As unidades destinadas ao cumprimento das penas, as penitenciárias propriamente ditas, são completamente diferentes das unidades denominadas presídios ou cadeias públicas. Desse modo, pelo menos no que se refere ao nosso estado, cujo contingente carcerário é muito maior do que aquele que se encontra nas mencionadas carceragens da Polícia Civil, especialmente nas inúmeras unidades prisionais que estão afetas à Seap (Secretaria de Administração Penitenciária), e que acolhe a grande maioria dos presos do nosso estado, onde, na maior parte das unidades, os presos ficam soltos durante o dia (dentro da unidade) e somente são recolhidos à noite, e nem de longe essas unidades se parecem a unidades para presos provisórios. Realmente, quem não conhece o sistema se impressiona com o aglomerado de presos nas cadeias públicas e nos presídios, entretanto, esses locais apresentam uma situação que não é muito diferente da realidade dos presos que ali se encontram, quando estão livres nas comunidades e nas favelas onde moram. Evidentemente que não se pretende defender a qualidade do sistema prisional do Rio de Janeiro como um todo. Evidentemente existem carências e pouco caso do Poder Público com o tema, mas a situação geral não se apresenta da forma como frequentemente é afirmada por quem não conhece e que, não raras as vezes, faz uma análise de unidades não representativas da grande maioria dos cárceres do nosso estado. Abro um parêntese para voltar àquele velho e não adequadamente compreendido tema das condições carce rárias, especialmente por teóricos ou por aqueles que nunca entraram numa penitenciária – e, se o fizeram, já o foi há anos –, que, naturalmente, se louvam em relatórios e estatísticas tendenciosas ou falaciosas e que, assim, imaginam conhecer a realidade das prisões. Oportuno lembrar que a grande maioria das unidades prisionais é perfeitamente palatável para os condenados que ali se encontram, enquanto os locais que aviltam os direitos humanos são raros e facilmente podem 34
“Ocorre que se o cárcere não é o ideal, até o momento não se inventou um mecanismo punitivo que pudesse substituí-lo, já que as tentativas de substituição da pena de prisão têm se mostrado um verdadeiro fracasso aqui no Brasil e afastado por completo o necessário efeito intimidativo da pena.”
ser corrigidos, bastando constatar, sem hipocrisias, que normalmente as condições de vida das favelas de onde veio grande parte dos presos é bem pior do que o ambiente que encontram na prisão (grande parte dos presos, em suas casas, dormem em chão de terra batido e não se alimentam com regularidade), e aqueles direitos e condições carcerárias previstos na LEP, muitas vezes não correspondem às necessidades dos presos. Tanto isso é verdade que praticamente todos os presos que se encontram custodiados em presídios federais, com toda a infraestrutura e as garantias legais, preferem ficar recolhidos nas unidades estaduais superlotadas. Isso também confirma claramente que essas prisões não são tão degradantes como possa parecer aos desavisados. Em grande parte dos estabelecimentos penais, o cárcere atende aos comandos legais, evidentemente sem alguns exageros da LEP, como, por exemplo, o espaço individual de 6m2. Há muita fantasia sobre esse tema. Aliás, os presos preferem muito mais ficarem em suas “comarcas” (cama onde dormem), juntamente com outros presos numa mesma cela, do que ficarem sozinhos em um ambiente de mais espaço, como previsto na LEP. Isso para não falar que, grande parte dos presos, inclusive primários, quando entra no sistema encontram diversos
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colegas e amigos, ou da comunidade onde vivem ou mesmo comparsas da atividade criminosa que desempenhavam antes. Isso porque, quando da triagem no ingresso do sistema, os presos são alocados, preferencialmente, pela região onde moravam, especialmente em razão das facções que dominam as regiões mais pobres e também as próprias unidades prisionais. Isso é fato!!! O problema carcerário não está afeto ao Poder Judiciário e nem ao CNJ, e sim ao Poder Executivo, e muito menos deve interferir na reforma penal ou no sentimento do julgador. O que não pode é o juiz deixar de condenar à prisão marginais perigosos e nocivos à sociedade, em razão de excesso de presos em algumas unidades ou da baixa qualidade do ambiente carcerário, sob pena de se estabelecem a anarquia social e a volta da vendeta com indevidos justiçamentos pelo povo nas ruas, o que, aliás, parece que está começando a acontecer no país, com essas recentes manifestações populares e o quebra-quebra pelas cidades, além dos grupos de extermínios, do excessivo número de homicídios praticados por polícias nos famigerados Autos de Resistência, etc. O agente que merece ser condenado à prisão, deve efetivamente ir para o cárcere, sob pena de subversão do direito, e, o que é, ainda, pior, deixar a sociedade à mercê de uma marginalidade violenta e cada vez mais audaciosa, praticando toda sorte de crimes graves, muitos dos quais com requintes de selvageria. É preciso que a pena seja aplicada na forma de seu preceito primário, de modo a resgatar o necessário efeito intimidativo da pena e a afastar do pensamento de alguns estudiosos que o conhecido efeito retributivo da pena será alcançado com o pagamento de multas ou penas pecuniárias, eis que essas alternativas deveriam ser extirpadas da parte geral do Código Penal, na quase totalidade dos casos, eis que, via de regra, são absolutamente insuficientes ao juízo de reprovação. Tenho visto muitas mães chorarem ao verem seus filhos presos. Mas também tenho visto muitas mães chorarem quando chegam ao cemitério para visitar seus filhos mortos, vítimas de crimes. A ideia de que o criminoso é vítima do Estado e da sociedade já perdeu sua essência com a realidade diária do crime violento, desumano e cruel que estamos presenciando. Nos dias de hoje, assistimos impotentes ao crime praticado com absoluta superação dos limites da maldade. Outrora, o crime era cometido, muitas vezes, pela carência econômica do agente, pelas más influências, pelo momentâneo rompante criminoso, etc., casos que foram bem explicados por conhecidos criminólogos e sociólogos dos séculos passados; mas, com a modernização do Estado,
a motivação para o crime e a sua prática, passaram a ter outros referenciais. Aliás, quem seriam os “órfãos do Estado”? Os pobres, os negros, as prostitutas? Claro que não! Já que, em qualquer grupo que venham a ser rotulados dessa forma, haverá muitas e muitas outras pessoas que integrariam o grupo e nem por isso praticariam crimes. Por outro lado, vemos quadrilhas e mais quadrilhas organizadas que fazem do crime verdadeira forma de vida e profissão. Vejam as milícias, normalmente formadas por pessoas que nunca se enquadrariam nos citados órfãos, já que normalmente são integradas por policiais civis e militares, militares do Corpo de Bombeiros e, até, por políticos, e mesmo assim praticam toda sorte de crimes, muitas vezes com inominável violência e crueldade. O mesmo pode se dizer do tráfico de drogas, em que seus integrantes não se limitam a comercializar a droga, mas sempre praticam aquela conduta principal acompanhada de vários outros crimes de homicídio, corrupção, sonegação, lavagem, falsificação, etc. Lembre-se de que todos esses líderes do tráfico possuem muito dinheiro, mansões em locais privilegiados, carros de luxo, etc. E, quando presos, não são defendidos pela Defensoria Pública, mas por advogados caríssimos. Será que esses grupos se inserem naqueles “órfãos do Estado”? Os coitadinhos da sociedade? Será que os motivos que os levam à prática de tão nocivos crimes são famélicos? Por que o Estado não lhes deu assistência? Assim, pode-se observar que aquelas teorias de outrora que tentavam explicar o crime e o criminoso (e nunca explicaram!), principalmente agora, não têm nenhum sentido lógico, pedagógico ou útil. Evidentemente, daqui a 500 ou 1.000 anos, ou até menos, quando os futuros criminólogos forem estudar a história da pena, irão comentar assustados, que antiga mente (nos séculos XX e XXI) a pena era colocar os homens em jaulas como bichos.... Que absurdo!!! Da mesma forma que hoje nós achamos um disparate as penas que eram aplicadas em outros tempos (talião, fogueira, garrote vil, etc.) Ocorre que, se o cárcere não é o ideal, até o momento não se inventou um mecanismo punitivo que pudesse substituí-lo, já que as tentativas de substituição da pena de prisão têm se mostrado um verdadeiro fracasso aqui no Brasil e afastado por completo o necessário efeito intimidativo da pena. Problemas sociais e de justiça social não se resolvem com o afrouxamento da lei penal, e sim com políticas públicas, cujos resultados serão percebidos depois de anos. E, até lá, o único caminho existente é por meio do balizamento penal. Hoje, assistimos a crimes bárbaros, cruéis e não raras vezes com extrema maldade e que não guardam
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necessariamente qualquer relação com o nível social dos seus agentes. Trata-se de desmedida e gratuita violência. O sistema penal de qualquer país do mundo não cumpre esse papel filosófico e intangível da ressocialização, ocorrendo sempre a reincidência penal. Na Europa, na Escandinávia, nos EUA, ou nas repúblicas latinas, a ressocialização do apenado, quando acontece, é em escala bastante reduzida, mas o certo é que nenhuma nação cumpre essa ficção da ressocialização, muito embora nesse aspecto haja diferença estatística entre os países, ou seja, o índice percentual de retorno ao cárcere varia de país para país, uns mais outros menos, mas em todos, e sem exceção, ocorre a reincidência. Assim, a falta de ressocialização não guarda qualquer relação direta com as condições carcerárias, porém é um problema que depende, em grande parte das vezes, do desenvolvimento psicossociocultural de cada indivíduo, e, justamente por isso, alguns elementos presos em um mesmo ambiente carcerário se integraram ao contexto social sadio e outros não, voltando a delinquir! Por outro lado, não se podem tratar da mesma forma um indivíduo que delinque pela primeira vez num episódio ocasional e aquele que faz do crime profissão. Evidentemente, este último é muito mais nocivo à socie dade do que o criminoso eventual. Ademais, é oportuno salientar que a reclusão não visa apenas a fictícia ressocialização, mas também a punição e a retribuição pelo mal causado ao seio social. Se, por um lado, o indivíduo supostamente piora no interior do cárcere pelo contato com outros criminosos, por outro, deixá-lo em liberdade e sem punição após a prática 36
de um crime também o tornará pior já que progressiva mente irá se aprimorar, pois continuará praticando outros delitos sem qualquer freio que possa o inibir. Desse modo, é forçoso concluir que o criminoso preso ou solto sempre vai ficar pior, e, se assim é, melhor que ele, pelo menos, fique segregado e, consequentemente, afastado do meio social, a fim de não exercitar a sua cada vez maior periculosidade na prática de outros crimes, em prol da tão sonhada paz social. Destarte, a reincidência foi tratada adequadamente no projeto, não se concebendo que uma pessoa que volte ao crime tenha o mesmo tratamento penal (e processual) daquele criminoso eventual, episódico e primário, e em boa hora tratou da reincidência específica em crimes com violência e grave ameaça, dificultando a progressão de regime. Os maus antecedentes, que no Código Penal comportam diversas situações e interpretações, no atual projeto do Código Penal, diferentemente, até favorecem o réu, por definir o que deve ser considerado como maus antecedentes. Ou seja, tal circunstância somente ocorrerá nas hipóteses de condenação criminal que não gere reincidência, abrangendo, também, hipótese da prescrição da reincidência. Frequentemente nos deparamos com maus antecedentes pretéritos, muito antigos e remotíssimos, e nem por isso agravamos desnecessariamente a pena do réu. Esses maus antecedentes devem ser sopesados caso a caso e valorados dentro da razoabilidade e da proporcionalidade pelo juiz. E até aí não tem nenhuma novidade! Não somos máquinas e podemos, portanto, julgar, no melhor sentido da palavra; o que, aliás, fazemos diariamente. O juiz deve ser inteligente, criativo, competente e corajoso, e não um simples burocrata!
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“Para trazer apenas um exemplo, recentemente na Alemanha, um conhecido jogador de futebol incendiou a sua própria casa para tentar receber uma indenização do seguro e, em razão disso, o astro do futebol foi processado. Na audiência em que foi condenado à pena de 3 anos e 8 meses de prisão foi imediatamente recolhido ao cárcere. Isso ninguém fala!”
Basta lembrar que, num passado não muito distante, o STF entendia que anotações na FAC eram o bastante para revelar os maus antecedentes do réu. Depois mudou. No que tange ao afastamento do Livramento Condicional, o projeto poderia ter mantido o aludido instituto, talvez com requisitos e avaliações caso a caso, e não da forma objetiva e quase automática, como vem funcionando atualmente na prática, mesmo porque o referido instituto pode ser um valioso instrumento de estímulo ao condenado para melhorar, manter um bom comportamento, praticar atividades, ter desempenho e, consequentemente, sair do cárcere mais prematuramente. O projeto também não foi feliz quando deixou de prever a menoridade relativa como circunstância atenuante (embora isso tenha explicação no dia a dia dessa parcela de delinquentes), uma vez que as pessoas nessa faixa etária estão mais vulneráveis aos freios inibitórios, e, portanto, a idade pode perfeitamente ser vista como uma atenuante legal, até por política criminal legislativa. Por outro lado, o projeto destacou as agravantes previstas no atual art. 62 do CP, transformando-as em causas especiais de aumento de pena, isto porque, obviamente, aquelas hipóteses se apresentam com muito maior gravidade e lesividade à paz social do que as demais agravantes legais, quando na consecução de determinado crime. Finalmente se faz oportuno consignar que muitas ideias importadas de outros países por alguns estudiosos não estão de acordo com a realidade brasileira. É muito comum fazerem referências às doutrinas alemã e italiana, mas se esquecem de dizer que esses países não adotam lá o pensamento que tentam trazer para cá, mesmo porque
neles as penas de prisão ordinariamente são aplicadas com muito rigor, inclusive, com PRISÃO PERPÉTUA. Para trazer apenas um exemplo, recentemente na Alemanha, um conhecido jogador de futebol incendiou a sua própria casa para tentar receber uma indenização do seguro, e, em razão disso, o astro do futebol foi processado. Na audiência em que foi condenado à pena de 3 anos e 8 meses de prisão, foi imediatamente recolhido ao cárcere. Disso ninguém fala! É importante sublinhar que, em qualquer projeto, especialmente da envergadura de um Código Penal, há sempre boas e más ideias, mas no conjunto o projeto melhora a sociedade como um todo por trazer mais rigor para aquele que pratica crimes, mormente quando os dias de hoje vêm mostrando que o Brasil está vivendo uma descontrolada escalada da criminalidade por indivíduos de todas as classes sociais, demonstrando que o criminoso de hoje não é mais “aquela vítima da sociedade” supostamente de outrora, que talvez em algum lugar tenha existido. O projeto também manteve, em boa hora, a denominada Delação Premiada, que vem sendo usada no Brasil e em outros países com relativo sucesso, ou por facilitar e abreviar a completa elucidação da sociedade criminosa, ou por chegar a membros da quadrilha que nunca seriam alcançados pela investigação do Estado. Na Itália, por exemplo, onde os réus nessa situação são denominados de “colaboradores”, muitas vezes são alteradas as penas de prisão perpétua para outras modalidades de pena de prisão menos graves, e, em determinadas situações, o “colaborador” consegue desde logo sua liberdade.
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No entanto, a nossa lei, ao permitir o abrandamento da resposta penal, deixa a critério do juiz estabelecer a quantidade de redução, que deverá ser sopesada por ocasião da fixação da pena do delator, diante de determinadas circunstâncias. Ademais, nunca se deve perder de vista que em qualquer sistema em que se garanta ao Estado o poder de coerção e supressão de direitos, como ocorre em qualquer sistema de governo, inclusive nas democracias, haverá sempre críticas, pertinentes ou não, mas, em qualquer caso, isso evidentemente não pode servir de obstáculo ao aperfeiçoamento da legislação para atender aos anseios sociais e, especialmente, à paz social. O projeto também apresentou consideráveis avanços no que diz respeito ao crime culposo (art. 18, II), estabele cendo a conduta culposa como a ausência de dever de cuidado, e, diferentemente do código atual, acrescentou “exigíveis as circunstâncias”. Essa expressão, obviamente, abre lugar à previsibilidade do atuar do agente entre outras circunstâncias inerentes à culpabilidade. O código atual também não fez outras considerações do crime culposos, entre elas a previsibilidade do agente, e nem por isso a jurisprudência e a doutrina deixaram de explicar o crime culposo e a sua culpabilidade em todos os seus termos. Por outro lado, não se pode nunca perder de vista que o projeto, assim como qualquer obra humana, é passível de erros, os quais sempre estarão presentes, e é justamente por isso que se tem as regras de interpretação, a doutrina e a jurisprudência. Porém, no todo, o projeto traz consideráveis avanços, que ainda podem ser corrigidos, de modo a permitir um maior rigor no enfrentamento da atual e crescente criminalidade. Importa desde logo destacar que o projeto trouxe uma sensível e oportuna inovação, ao optar pela criminalização de forma autônoma, da “Culpa Gravíssima”, depois de aumentar a pena máxima cominada do homicídio culposo. A presença do homicídio culposo praticado com culpa gravíssima apresenta-se bastante adequada para apenar mais corretamente o agente que pratica o crime naquelas circunstâncias (dirige embriagado, em altíssima velocidade, fazendo “pegas”, etc.), isto porque – diante da pena hoje cominada para o homicídio culposo ser prati camente inexpressiva diante dos inúmeros benefícios –, o MP e alguns magistrados têm admitido, naquelas situações, que a denúncia seja oferecida por HOMICÍDIO DOLOSO (dolo eventual), com o agasalho, inclusive, pelo STF, o que parece um absurdo, já que dolo eventual e culpa consciente são figuras jurídicas bastante distintas e não se confundem, o que, na prática, tem gerado uma situação bastante injusta ao réu em ser acusado por dolo eventual por uma situação claramente culposa. No 38
entanto, com essa nova imputação trazida pelo projeto, será resgatada a justiça, tipificando com maior precisão os agentes que estejam nas condições estabelecidas (§ 5o), com a imposição de uma responsabilidade maior pela forma como a conduta culposa foi praticada. É evidente que todas as hipóteses previstas no referido parágrafo, induvidosamente, são de culpa consciente e obviamente devem ser apenadas com uma sanção mais grave. Atualmente, vemos com muita frequência um típico acidente de trânsito com o condutor embriagado, praticando “pegas” ou em velocidade exorbitantemente elevada, ser tratado como homicídio doloso (dolo eventual). Isso porque, nesses casos, a sanção penal cominada para o homicídio culposo mostra-se absurdamente desproporcional à ação culposa. Há que se saber distinguir culpa consciente de dolo eventual, e o projeto, nesse particular da culpa gravíssima, chega didaticamente a distinguir uma coisa da outra, como se os operadores do Direito não soubessem diferenciar tais condutas. Aliás, em diversas passagens o projeto normatiza conceitos jurídicos, às vezes de hermenêutica, como se os operadores do Direito fossem leigos. Essa forma de disposição legal, muito embora apareça como novidade no Direito pátrio, na legislação portuguesa é bastante comum. Parece que mais uma vez estão se importando particularidades da legislação transatlântica, só que desta vez o estilo legislativo. Por outro lado, a pena mínima do homicídio simples deveria ter sido majorada, pelo menos, para oito anos, não apenas em homenagem à proporcionalidade e à sistemática da proposta do Código, mas também porque, sendo a vida o maior bem jurídico a ser protegido, a pena de seis anos mostra-se demasiadamente pequena, se considerarmos outros crimes que são menos graves, e apresentam uma sanção penal mais rigorosa. Com relação à possibilidade do aumento de pena para os crimes de homicídio, observa-se uma impropriedade que se encontra disposta no § 7o do art. 121 do projeto, relativamente ao homicídio doloso (simples ou qualificado). Isso porque, se o réu matou ou tentou matar a vítima dolosamente, agindo com animus necandi, evidentemente que não tem o menor sentido que tenha agravada a sua pena por não ter socorrido a vítima ou não ter procurado diminuir as consequências do crime. Ora, essas circunstâncias são absolutamente incompatíveis com a vontade de matar, pois, obviamente, se a intenção do réu é a morte da vítima, evidentemente não vai socorrê-la ou minorar as consequências do seu agir, e a sua responsabilidade já se encontra prevista abstratamente no tipo correspondente. No entanto, o referido parágrafo tem total aplicação nas hipóteses do homicídio culposo simples ou com culpa consciente gravíssima, porque nestas hipóteses o réu em
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nenhum momento quis matar a vítima ou indiferentemente assumiu o risco de produzir o resultado morte. No que se refere à execução da pena no regime semiaberto, o projeto traz uma iniquidade flagrante, que parece não ter sido detectada por aqueles que se consideram minimalistas, abolicionistas e gostam de importar fantasiosas teses para afastar a incidência do Direito Penal e de suas penas. O art. 47, § 4o, do Projeto, estabelece que, se por causa do Poder Público não houver vaga para o réu condenado no regime semiaberto, ele terá direito à progressão diretamente para o regime aberto. Absurdo!!! Se a ideia é que o réu não fique recolhido, por falta de vagas no regime fechado, o qual não foi estabelecido na sentença, não precisa que ele vá diretamente para o regime mais brando: basta que o réu recentemente apenado ingresse no regime que lhe foi estabelecido (semiaberto) e, simultaneamente, outro réu que já esteja neste regime há mais tempo, mesmo que sem o requisito temporal (e tenha condições subjetivas), progrida para o regime aberto mais precocemente, a fim de abrir uma vaga para aquele réu que acabou de chegar ao sistema. Se assim não for, aquele que chega por último será desde logo beneficiado, enquanto que outro apenado que já está há mais tempo no regime semiaberto, e muitas vezes bem próximo de progredir, ficará preterido pelo novo preso que não cumpriu sequer um dia de pena e vai logo para casa (isto porque, via de regra, o regime aberto hoje é cumprido em casa, com o uso de pulseiras e tornozeleiras). Se for para beneficiar algum preso, que pelo menos seja aquele que já cumpriu mais tempo de pena e as condições subjetivas recomendem. O crime de quadrilha se encontra muito mal-colocado na redação do projeto, mostrando-se um pouco confuso, acabando por extrapolar seus objetivos e alcançando e beneficiando outras situações também perniciosas, como o tráfico internacional de drogas, com uma reprimenda com menor gravidade. O ideal seria que no projeto não houvesse uma tipificação do crime de quadrilha tão fechada no caput do artigo correspondente e ficasse mais ou menos como se encontra hoje no Código Penal e, que fossem criados parágrafos, tantos quantos fossem necessários, para abranger as diversas formas de organização criminosa, majorando as penas de acordo com a maior preciosidade do grupo, como o emprego de armas, a dominação territorial, determinadas espécies de crimes, etc., sem preocupação com a denominação de grupos, como o fez com as “milícias”. Talvez essa rotulação de determinada quadrilha seja uma má influência do Código italiano, que inicialmente definiu determinada organização criminosa com atuação na Sicília como “máfia”, e depois a legislação teve de progredir
para alcançar especificamente outros grupos, como aqueles conhecidos por “Cosa Nostra”, “Camorra”, “Sacra Corona Unita”, com atuações em regiões ou cidades como Sicília, Nápoles, Roma, Puglia, abrindo, finalmente, o tipo penal para chegar a outras quadrilhas de menos expressão. Assim, parece que, se adotada uma melhor e mais técnica redação para o crime de quadrilha, prevendo diversas hipóteses de acordo com a gravidade, poderse-ia prevenir confusões e conflitos doutrinários e jurisprudenciais, com o risco de total descaracterização da reforma e das incidências do referido ilícito penal. As contravenções têm como finalidade maior prevenir que aquela conduta contravencional, alcance maior gra vidade e venha a se tornar um crime, por comprometer mais incisivamente a paz social. Ocorre que, ao longo de mais de 70 anos, a contravenção penal do conhecido jogo do bicho, e mais recentemente com a sofisticada exploração de caça-níqueis (tipo de jogo de azar), perdeu o caráter preventivo e tornou-se uma atividade criminosa com grande potencial lesivo, já que, para a manutenção do jogo, seus integrantes, do mais proeminente ao mais simples apontador do jogo, encontram-se praticando toda a sorte de crimes, inclusive de homicídio qualificado e, muitas vezes, até mesmo com características de grupo de extermínio, havendo, de fato, grandes e organizadas quadrilhas, com influência inclusive em outras Unidades da Federação. Há notícias de homicídios praticados com o uso de explosivos, como frequentemente vemos em filmes, em países muçulmanos do Oriente Médio, cujo mecanismo de ação é bastante parecido com as atividades de organizações mafiosas ou grupos terroristas. Portanto, a criminalização dos jogos de azar e em especial do jogo do bicho, assim como a exploração dos caça-níqueis, é mais que oportuna, devida e necessária para o combate mais efetivo do Estado a essa nefasta atividade, que vem se agigantando progressivamente. Desse modo, parece que há uma unanimidade não apenas dos cultores do Direito, mas também de toda a sociedade, pelas alterações da legislação penal brasileira, seja para incluir novos tipos penais ou descriminalizar algumas condutas, seja para aumentar as penas de alguns crimes ou mesmo para diminuir a de outros. Mas em todos e quaisquer casos salta aos olhos a necessidade indeclinável das decisões judiciais serem efetivamente cumpridas e a execução penal ser desenvolvida com maior responsabilidade e rigor, extirpando alguns benefícios ou, pelo menos, dificultando a sua concessão, ao mesmo tempo em que a situação dos réus possa ser analisada caso a caso, com maior precisão e, se possível, de acordo com seus antecedentes sociais e criminais, sua personalidade e as circunstâncias do próprio crime que cometeu.
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E m foco, Carlos Alberto Luppi
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Ministro Marco Aurélio Mello assinando o termo de posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ao lado da ministra Cármen Lúcia, sua sucessora no cargo
Cada voto vale o Brasil inteiro
U 40
destacando que “a figura central de todo o processo eleitoral é o eleitor, e não o candidato”. No discurso de posse, ele se dirigiu aos cidadãos brasileiros como responsáveis diretos pelo futuro do país e foi claro ao pedir para que “acreditem individualmente no poder que detêm por meio do voto”. Incisivo, não poupou palavras para revelar que, em sua opinião, “é preciso avançar culturalmente, deixar de lado a apatia, a acomodação, pois a hora se aproxima e o eleitor, sim, é insubstituível no ato de votar, cabendolhe aprovar ou rejeitar a atuação do parlamentar e do administrador eleitos. Cabe ao eleitor sinalizar ao político o necessário agir com fidelidade de propósito. Cabe-lhe a decisão final quanto ao país que querem ter, pois o país está em jogo.”
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Foto: Nelson Jr./ASICS/TSE
m apelo veemente ao direito democrático, à importância do eleitor, a favor do futuro da nação e uma defesa emocionada na crença do poder do voto na luta da sociedade contra a corrupção e a impunidade. Foi assim que o Ministro Marco Aurélio tomou posse, pela terceira vez, como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em cerimônia presidida pela ministra Cármen Lúcia – que deixou o cargo na ocasião – realizada no dia 19 de novembro, em Brasília. Junto com ele assumiu, como vice-presidente do TSE, o ministro Dias Toffoli. Marco Aurélio ressaltou a importância essencial do voto individual e do eleitor como instru mentos de mudança do país, e foi duro com a classe política
“Que os eleitores entendam o quanto vale cada voto. O voto vale o Brasil inteiro” – declarou o ministro a todos os ocupantes do plenário do Tribunal, completamente lotado por importantes autoridades e personalidades dos meios jurídico, político, administrativo, intelectual e jornalístico, além dos componentes da mesa da sessão solene, entre os quais o vice-presidente da República, Michel Temer – que representava a presidente Dilma Rousseff –; o vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski; o Viceprocurador-geral Eleitoral Eugênio Aragão; os ministros titulares do TSE; os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros e Henrique Eduardo Alves; e a ministra Cármen Lúcia. O ministro Marco Aurélio Mello pautou seu discurso de posse em temas de grande relevância nacional, como a ética no exercício da função pública, o descontentamento da população com o comportamento dos políticos, a violência ocorrida nas manifestações de rua, a corrupção, o papel dos políticos, a importância do eleitor, a impunidade generalizada e o papel da Justiça Eleitoral, que “não se limita a viabilizar as eleições, mas principalmente zelar pela correção dos procedimentos anteriores à disputa eleitoral e afastar os que, mesmo tendo obtido o mandato, transgridem a ordem jurídica.”
“Cabe ao eleitor sinalizar ao político o necessário agir com fidelidade de propósito. Cabe-lhe a decisão final quanto ao país que querem ter, pois o país está em jogo.” Marco Aurélio Mello
A identificação digital do eleitor – o grande desafio O Ministro Marco Aurélio, desde junho de 1990, é ministro do Supremo Tribunal Federal, chegando a ocupar sua presidência no biênio 2001 a 2003. É um especialista e mestre em Direito Privado. Sua formação ocorreu em 1973 quando concluiu o curso de Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É natural do Rio de Janeiro, onde nasceu em 12 de julho de 1946. Foi membro do Ministério Público do Trabalho, juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 1a Região e ministro do Tribunal Superior do Trabalho de setembro de 1981 a junho de 1990. O chamado cadastramento biométrico do eleitor será o grande desafio do novo presidente do TSE. Em sua segunda gestão à frente do Tribunal (maio de 2006 a maio de 2008), o ministro deu a partida para a identificação dos eleitores por meio de suas digitais. A ministra Cármen Lúcia deu continuidade a esse processo, e agora Marco Aurélio toma para si o desafio de que, nas próximas eleições presidenciais e legislativas de 2014, o cadastramento, em curso pelo TSE, atinja 22 milhões de eleitores.
Em sua primeira gestão, em outubro de 1996, o ministro conduziu as primeiras eleições informatizadas do país. Na ocasião, 57 municípios brasileiros – as capitais e as cidades com mais de 200 mil habitantes – utilizaram urnas eletrônicas. Em 2006, o ministro esteve à frente do processo de totalização de votos para as eleições presidenciais, até então considerado o mais rápido da história do país. A apuração de 90% dos votos foi concluída cinco horas depois de encerrada a votação em todo o país. Nessa ocasião, ele abriu o TSE para a implantação de novas técnicas e equipamentos capazes de oferecer mais transparência e seguranca às eleições brasileiras. No período entre 2006 e 2008 – em sua segunda gestão como presidente do TSE –, foram lançadas diversas campanhas para ampliar a comunicação entre o Tribunal e a sociedade, promovendo uma maior conscientização dos eleitores no Brasil e no exterior, o incentivo ao voto do eleitor jovem e promovendo ainda a valorização dos mesários e também dos funcionários envolvidos no processo de votação.
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Foto: Eugênio Vovaes/OAB
Ministro Dias Toffoli e ministro Marco Aurélio Mello, empossados como, respectivamente, presidente e vice-presidente do TSE
O ministro convocou os eleitores do país a compa recerem às urnas nas eleições gerais de 2014 “e expressarem, através do voto, o que desejam para o futuro da nação, pois é preciso relembrar que a urna é o lugar de protesto social por excelência”, e deu grande ênfase à responsabilidade que a população tem em assumir atitudes que colaborem para a solução dos problemas nacionais. “Já passou da hora de amadurecer e abandonar a superada ideia de que os problemas brasileiros não são nossos e não dependem, para serem resolvidos, do povo, mas só do governo” – disse, acrescentando: “Urge sair do marasmo, participar com responsabilidade e assumir o papel reservado a cada um de nós.” Em seguida, fez duras críticas a quaisquer atos de protesto nas manifestações de rua que utilizem a violência, e, bem a seu estilo de não deixar de falar o que pensa e de se manifestar de forma clara e transparente, foi incisivo 42
ao dizer que “descabe apoiar bandalheiras, o quebraquebra dos encapuzados, o enfrentamento às autoridades”, declarando ainda que “mostram-se inviáveis a paralisação das atividades, o fechamento de vias públicas, o desatino, quando se tem, à disposição, o mais eficaz instrumento de modificação da realidade social e política, que é o voto, pois a vontade do povo é soberana, mas deve ser depositada nas urnas, e não incendiada nas lixeiras das ruas”. Para o novo presidente do TSE, a Justiça Eleitoral deve estar sempre atenta e vigilante, além de cumprir o seu papel de viabilizar as eleições, destacando que ela “se mantém atenta aos desvios de conduta do candidato do cargo público eletivo, trabalhando ininterruptamente, e não apenas no período das eleições.” “Cabe à Justiça Eleitoral zelar pela correção e, ao eleitor, exercer com ela a vigilância. O descaso com a coisa pública e o desvio de finalidade no exercício do cargo ainda são corriqueiros” – afirmou, acrescentando que “mesmo
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diante dos instrumentos jurídicos existentes no país, nada é mais efetivo no combate aos desvios do que a vigilância do eleitor.” Aplaudido diversas vezes no plenário do TSE, onde a solenidade se realizou, o ministro Marco Aurélio criticou o que chamou de “canto do lucro fácil no exercício do poder e do mandato”: “Este canto chega sem dificuldades aos ouvidos dos que creem na impunidade, e daí a importância de atuar vigilante impedindo a falcatrua ou interrompendo-a, a fim de afastar do exercício do cargo os que desonram o juramento feito no ato da posse. Os mal-intencionados acreditam na displicência e na omissão para instalarem os escritórios do crime dentro de órgãos públicos ou em empresas com as quais negociam” – prosseguiu. A crítica veemente do ministro Marco Aurélio tem respaldo em dezenas de casos em que políticos e adminis tradores públicos eleitos exorbitam de suas funções em um nível tão grande que leva a sociedade a deles desacreditar, gerando frustração e revolta. As estatísticas recentes oficiais do STF revelam que 834 políticos brasileiros estão
sendo processados por improbidade e outros crimes, como prática de homicídios, lavagem de dinheiro e, ainda, envolvimento em tráfico de drogas. “É inviável esperar que o poder público solucione todas as charadas” – disse, ressaltando que “a participação essencial do maior interessado, o cidadão do bem, ou seja, daquele que não compactua com o erro e pretende a correção de rumos, surge absolutamente indispensável.” Conforme enfatizou, ainda, “o bandido conta com a passagem do tempo, com o esquecimento, com a impunidade” e “poucos ousariam tanto se tivessem certeza da dura punição que os espera”. Para o ministro, “nesse ponto as instituições nacionais vêm mostrando força e destemor”, concluindo que “ainda que as curvas das normas de regência tornem mais longo o caminho, a retidão sempre acaba por triunfar.” “O Judiciário está comprometido com a aplicação eficaz da lei, anunciando aos quatro ventos, com as consequências próprias, que o meio justifica o fim, e não este, doa a quem doer – pouco importa, já que o processo não tem capa, mas tem, sobretudo, conteúdo” – finalizou.
Foto: Eugênio Vovaes/OAB
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Foto: Carlos Humberto/ASICS/TSE
Ministro Marco Aurélio Mello, presidente do TSE
Ministro Marco Aurélio Mello assume, pela terceira vez, o TSE Um dos momentos mais significativos da história jurídica recente do país A interpretação lírica da soprano Denise Tavares e da pianista Eliza Silveira, apresentando com rara delicadeza o hino nacional brasileiro e a ária das Bachianas brasileiras no 5, de Heitor Villa-Lobos, marcou as posses do Ministro Marco Aurélio Mello como presidente do Tribunal Superior Eleitoral e do Ministro Dias Toffoli como vice-presidente, no plenário do TSE, em Brasília, em 19 de novembro. A solenidade, pelo elevado número de personalidades presentes e, também, pelo tom dos discursos e do elevado grau de emoção, pode ser considerada como um dos momentos mais significativos da história jurídica recente do país. O compromisso regimental do novo presidente, a assi natura do termo de posse e o seu pronunciamento, pela oportunidade, pela propriedade e pela relevância dos temas abordados – considerando-se o atual momento do país, próximo a mais uma eleição presidencial e legislativa – ocorreram em meio a muitos aplausos e manifestações de apreço aos ministros empossados após a abertura oficial da solenidade com a execução do hino nacional na voz da soprano. Entre os presentes, além dos componentes da mesa da sessão oficial, presidida pela ministra Cármen Lúcia – que deixou o cargo na ocasião –, estavam muitos ministros em exercício e ministros aposentados do Supremo Tribunal Federal, como Ayres Britto e Francisco Rezek. E também os
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ex-presidentes da República Fernando Collor e José Sarney; o ex-vice-presidente Marco Maciel; além de ministros de Tribunais Superiores; o Ministro das Minas e Energia, Edison Lobão; o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz; membros do Ministério Público da União e dos Estados; ministros do Tribunal de Contas da União (TCU); representantes da Defensoria Pública Geral da União; parlamentares; integrantes do corpo diplomático; e muitas outras autoridades civis e religiosas. O Ministro Marco Aurélio recebeu cumprimentos por sua posse no foyer próximo ao plenário do Tribunal. Essa é a terceira vez que o Ministro Marco Aurélio Mello assume o cargo, um fato inédito na história do Tribunal. Ele já havia ocupado o cargo de junho de 1996 a julho de 1997, e de maio de 2006 a maio de 2008. Nesses dois períodos, ele coordenou as eleições municipais de 1996 e as eleições presidenciais de 2006. O ministro se tornou membro efetivo do TSE em 13 de maio de 2010, em seu primeiro biênio, quando já ocupava o cargo de ministro substituto do Tribunal. Atualmente, ele exerce seu segundo biênio como ministro efetivo do Tribunal. Transparência e honestidade O Ministro Marco Aurélio foi saudado pela corregedora-geral eleitoral, ministra Laurita Vaz, em nome dos ministros
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do TSE. Ela ressaltou “o papel de alta relevância do Tribunal ao trabalhar para proporcionar aos brasileiros uma eleição segura, honesta, transparente para consolidar a democracia conquistada.” Destacou, em seguida, as qualidades do novo presidente e do vice empossados, não sem antes enfatizar o brilhante trabalho da ministra Cármen Lúcia “como primeira mulher a ocupar a presidência da Corte”. “O compromisso deste mister pede um comando sereno, firme e equilibrado e, sobretudo, presente, típico do período eleitoral, características estas que são próprias do ministro Marco Aurélio, um magistrado talhado para o trabalho árduo que o espera” – disse ela antes de discorrer sobre as duas passagens anteriores do ministro pela Presidência do Tribunal. Destacou que, por ser um magistrado experiente, Marco Aurélio “está acostumado a coordenar eleições, assumir desafios e vencê-los”. Disse, ainda, que o ministro “esteve presente em momentos cruciais da trajetória do processo eleitoral, deixando sua marca indelével.” A ministra Laurita Vaz salientou, em seguida, o trabalho da ministra Cármen Lúcia, que deixava o cargo, seu espírito de luta e sua ação permanente nas demandas do TSE, citando importantes realizações de sua administração, como “a conscientização da sociedade sobre a importância do voto, o avanço do recadastramento biométrico e o início da implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJ-e).” Ao se dirigir ao novo vice-presidente do TSE, ministro Dias Toffoli, a corregedora lembrou de seu importante papel nas eleições presidenciais do próximo ano. A partir de maio, Dias Toffoli exercerá a função de presidente do TSE e terá a responsabilidade de comandar todo o período que envolve as eleições presidenciais de 2014. Coragem, firmeza e sensibilidade Durante a solenidade, o vice-procurador-geral eleitoral, Eugênio Aragão, em nome do Ministério Público, homenageou os empossados, destacando que o Ministro Marco Aurélio é um “magistrado experiente e reconhecidamente corajoso no mister de julgar. Não lhe falta firmeza, mas também tem qualidade e sensibilidade nos casos que lhe são submetidos à decisão.” Reforma política Um dos destaques dos discursos da solenidade foi o proferido pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, ressaltando que a “advocacia brasileira aplaude a postura do ministro Marco Aurélio de buscar sempre na Constituição a concretude de seus atos”.
Homenageou, ainda, o ministro Dias Toffoli, elogiando seu conhecimento de matéria eleitoral, e citou a ministra Cármen Lúcia, que, segundo ele, “se destacou em suas funções por seu compromisso com a pátria justa e fraterna”. O presidente da OAB pediu a realização de uma reforma política no Brasil “que efetive a promessa constitucional de realização de eleições livres”, afirmando, ainda, que a democracia é a matéria-prima da Justiça Eleitoral. “As pessoas podem cometer desvios, pelos quais serão responsabilizadas, mas as instituições devem ser preservadas como pressuposto de subsistência da estabilidade jurídica, política e social” – disse, sob aplausos. O ministro Marco Aurélio assume o posto cercado por grandes expectativas. Algumas importantes personalidades presentes manifestaram suas opiniões. O ministro aposentado do STF, Francisco Rezek, destacou que, “ao longo da história do Supremo, tem valido o grau de empenho com que servem uns e outros à Justiça Eleitoral. Marco Aurélio foi certamente o mais dedicado a esse ramo da Justiça, a essa tarefa que pode recair a um ministro do Supremo. Ele se entregou, repetidamente, ao serviço eleitoral. É a primeira vez que um ministro do Supremo se investe pela terceira vez no comando da Justiça Eleitoral, e isso num momento extremamente importante da vida política do país. O colégio eleitoral brasileiro, a maior democracia do mundo em matéria de votantes obrigatórios, é, sem dúvida, o maior beneficiário de toda essa carga de experiência e de talento que Marco Aurélio traz à Justiça Eleitoral nesta nova investidura.” O ministro aposentado do STF, Ayres Britto, afirmou: “A presidência está entregue a um ministro experimentado, de inteligência reconhecidamente fulgurante e que, a partir de um próprio discurso, atualizado, chega com esse empenho todo, esse entusiasmo, a dar sequência à tradição de nosso Tribunal Superior Eleitoral como tribunal da própria democracia representativa do Brasil.” O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Nelson Calandra, destacou: “Acompanho o trabalho do Ministro Marco Aurélio há décadas. A magistratura brasileira, que represento neste momento, fica extremamente honrada, engrandecida com a posse do ministro Marco Aurélio como presidente e a do ministro Dias Toffoli como vice-presidente.” O ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, declarou: “O Ministro Marco Aurélio é um juiz de grande talento intelectual, e o seu retorno ao TSE, assim como ocorreu com os demais presidentes, é a segurança de que o sistema eleitoral estará garantido para o bem da democracia.”
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D om Quixote, Carlos Alberto Luppi
Defensores ecológicos. Alunos e professores unidos pela vida
Fotos: Acervo da Prefeitura de Colatina
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ma das iniciativas mais importantes envolvendo educação socioambiental e sustentabilidade em realização no Espírito Santo e no Vale do Rio Doce está literalmente fazendo escola. A prefeitura de Colatina/ES – uma das principais cidades do Vale do Rio Doce – criou, em 2012, o projeto Defensores Ecológicos com o objetivo de capacitar comunidades, escolas e alunos das redes municipal, estadual e federal, nos âmbitos público e privado, abrangendo um universo de 15 mil estudantes, motivando-os a aprender como multiplicar ações em defesa da natureza e do meio ambiente junto às suas famílias e às comunidades das áreas onde vivem. O projeto é pioneiro e envolve dezenas de professores, coordenadores escolares e diretores de escolas, que são, também, capacitados a promoverem atividades relacionadas à preservação ambiental, ao convívio social e à sustentabilidade. Alunos e educadores estudam, debatem, atuam e promovem dezenas de atividades como defensores ecológicos. A ideia é simples e executada de forma envolvente. Todos são estimulados a adquirir conhecimentos e a desenvolver habilidades próprias que são multiplicadas, com a comunidade em geral, em busca de mudanças de posturas no dia a dia e em relação com o meio ambiente, promovendo, com isso, a construção de uma vida melhor e mais saudável. O projeto foi iniciado, experimentalmente, com a participação de 300 estudantes e cerca de 200 educadores pedagógicos, coordenadores escolares e professores com representatividade nas unidades escolares selecionadas. Foram envolvidos alunos das sétima e oitava séries do Ensino Fundamental e alunos do segundo e do terceiro anos do Ensino Médio.
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Em cada escola, a capacitação e a formação ambiental envolveram, inicialmente, uma dupla de alunos. Após essa capacitação, orientados por professores e educadores ligados ao projeto, os alunos lideraram em seu ambiente escolar uma série de atividades ligadas à preservação ambiental, como jogos coletivos, plantio de mudas, recuperação de áreas degradadas, exposições, concursos, mostras de produtos ambientais, criação artesanal com materiais naturais, exposições diversas, oficinas ecológicas e apresentações de peças teatrais que tivessem como tema a preservação ambiental. Dessa forma, e com essas atividades, atuaram como agentes multiplicadores, ampliando e repassando infor mações para todo o ambiente da escola em que atuam, atingindo com isso milhares de outros alunos que passaram a se tornar, assim, Defensores Ecológicos. Ao mesmo tempo, um trabalho paralelo foi realizado: os Defensores Ecológicos começaram a atuar – orientados por professores e educadores – também fora de seu ambiente escolar. Com isso, a ação se estendeu ao ambiente familiar e à toda a comunidade no entorno da escola, iniciativa que atingiu de forma positiva mais de 1.500 pessoas. Os Defensores Ecológicos realizaram diversas e múltiplas atividades, e uma das mais importantes e marcantes foi a visita que dezenas de seus integrantes, em grupos, fizeram
ao famoso Instituto Terra, localizado no município de Serra dos Aimorés – localizado a 80 quilômetros de Colatina – e liderado pelo ecologista e fotógrafo Sebastião Salgado e por sua mulher Lélia Salgado. Em ônibus especiais, os Defensores Ecológicos passaram um dia inteiro no Instituto Terra aprendendo noções de plantios de hortas e de mudas, e manejo da terra, e trocaram informações com os técnicos do Instituto e com o próprio Sebastião Salgado. Salgado explicou os objetivos do Instituto, sua paixão pela natureza e recebeu informações sobre o funcionamento dos Defensores Ecológicos, elogiando a iniciativa do prefeito de Colatina, Leonardo Deptulski, que revelou seu empenho “em fomentar em toda a rede escolar do município a preocupação com o meio ambiente, possibilitando ao mesmo tempo a alunos e professores e educadores escolares a aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de habilidades a serem multiplicadas com a comunidade em geral na construção de um ambiente sustentável.” Salgado recebeu alguns materiais do projeto Defen sores Ecológicos das mãos do prefeito e dos jovens estudantes, entre os quais a bolsa retornável utilizada em compras e as garrafas PET adaptadas e distribuídas entre as famílias e as comunidades atingidas pelo projeto para o recolhimento de óleo usado de cozinha, amenizando assim um dos principais problemas ecológicos da região, que é
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Fotos: Acervo da Prefeitura de Colatina
a poluição causada pelo despejo em pias, ralos e cursos d’água, de forma contínua e indiscriminada, desse óleo usado. Mais de 50 mil bolsas e garrafas PET adaptadas para o recolhimento de óleo já foram distribuídas. Os alunos visitaram todas as dependências do Instituto Terra, onde milhares de mudas estão sendo formadas para replantio nas margens do rio Doce, um dos locais mais degradados do país, em seu curso de 952 quilômetros pelos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo. Uma das iniciativas dos Defensores Ecológicos e da prefeitura de Colatina é aproveitar esse óleo como matéria-prima de uma fábrica de sabão, cujos resultados financeiros ajudarão na ampliação do projeto. Para o prefeito da cidade, o Defensores Ecológicos “é uma iniciativa pela qual nós temos o maior carinho. Fico muito feliz quando vejo que essa ação está dando excelentes resultados na prática, ampliando substancialmente a consciência ecológica de parte expressiva dos alunos da rede de ensino da cidade e da região.” A mesma empolgação com os resultados das atividades dos Defensores Ecológicos é manifestada pela coordenadora do projeto, a bacharel em ciências biológicas Melise Alves Bravo, que trabalha com uma equipe de sete educadores. Para ela “é uma felicidade total poder ver os alunos motivados – com brilho nos olhos – em defender a natureza e agir em favor do meio ambiente e da sustentabilidade. Eles se sentem muito orgulhosos de serem considerados como Defensores Ecológicos, e nós mais ainda por sentirmos que a iniciativa está dando certo 100%, atingindo centenas de alunos, pais, professores, educadores, cidadãos das comunidades em toda a nossa região. Todos juntos sentimos o prazer de poder defender a natureza e de contribuir com uma
causa que é de todos nós e que nos valoriza como seres humanos e como cidadãos.” O prefeito, agora, está empenhado em um projeto complementar que significa outra iniciativa inédita: montar a Rede de Defensores do Rio Doce, cujas estratégias, no mesmo rumo dos Defensores Ecológicos, objetivarão atingir toda a população de abrangência direta de Colatina – 140 mil pessoas em defesa da preservação de um dos mais importantes rios do país, o rio Doce. Um projeto exclusivo e inédito, cujo modelo ele pretende também levar aos prefeitos das cidades de todo o Vale do Rio Doce, onde, em 230 municípios, residem cerca de 4,5 milhões de pessoas e em que exercem suas atividades industriais mais de 50 empresas de grande porte, todas elas utilizando as águas do rio em escala crescente. Para o prefeito de Colatina, é preciso união para salvar o rio Doce, não o deixando, passivamente, caminhar para um amargo destino. Para que isso possa acontecer, o primeiro passo foi dado com os Defensores Ecológicos de Colatina, em que alunos e professores unidos atuam na prática com dezenas de ações e atividades pela vida.
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Legenda: xxxxxx
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Invista em Itaboraí
A capital dos bons negócios. Distante apenas 39km da capital do Rio de Janeiro, Itaboraí é hoje a grande oportunidade de excelentes negócios para empresas de diversos setores. Sede do Comperj - Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, e com uma Base Industrial e Tecnológica sendo implantada, o município terá em 10 anos, o seu PIB estimado em R$17 bilhões e sua população chegará a 1 milhão de habitantes nesse período. Esses empreendimentos estão atraindo empresas de diversos segmentos, pois hoje com a nova administração municipal, Itaboraí mostra um cenário de progresso e de modernização da cidade. Seu território faz divisa com Tanguá e Maricá, municípios que serão beneficiados pelo Arco Metropolitano do Rio de Janeiro, uma via de escoamento que integrará uma importante região do estado que compreende de Itaguaí à Itaboraí, promovendo o desenvolvimento integrado de toda essa região.
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Itaboraí
Conheça Itaboraí, a cidade que será a segunda capital do estado e o melhor lugar para sua empresa.
www.itaborai.rj.gov.br
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O (des)equilíbrio entre Poderes: as medidas provisórias e a PEC no 70/2011 Leonardo Picciani
Deputado Federal
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Foto: Valter de Gaudio
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instituto das medidas provisórias é repleto de controvérsias. Previsto no art. 62 da Constituição da República, as referidas medidas são adotadas em caso de relevância e urgência. Não se confundem, portanto, com as leis de iniciativa privativa do presidente da República, cujas hipóteses estão elencadas no art. 61, § 1o, da Lei Maior. Embora seja usual a comparação da medida provisória com o decreto-lei, tendo em vista o esteio no modelo italiano1, cuidam-se de instrumentos distintos. O acalorado debate ocorrido durante a constituinte revelou essa diferenciação. Era evidente o clamor para se extinguir o decreto-lei, sem, contudo, retirar do Poder Executivo um meio capaz de suprir eventual detença do Poder Legislativo para deliberar sobre determinadas matérias. Por essa razão, adotou-se a medida provisória como saída para garantir ao Poder Executivo um mecanismo legiferante, porém não autoritário. Dessa forma, editouse o art. 62 da Carta da República, que, com a alteração trazida pela Emenda Constitucional no 32/2001, dispõe que as medidas não convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogáveis por igual período, perdem sua eficácia, consoante o comando do § 3o do mencionado dispositivo. Não obstante, ressalte-se que a regra insculpida no § 6o do mesmo art. 62 determina a entrada da medida provisória em regime de urgência se não for apreciada em até quarenta e cinco dias, sobrestando-se todas as demais deliberações legislativas da Casa do Congresso Nacional respectiva.
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“A propositura de alterações ao art. 62 da Constituição da República decorre do sistema republicano vigente. A análise da proposta por comissão especial, regra regimental mandatória, permitirá uma conclusão detalhada e insculpida de segurança jurídica, garantindo-se o equilíbrio e a harmonia entre os Poderes Executivo e Legislativo.”
Tem-se, com efeito, um sistema que provoca verdadeira engessadura na pauta de votação do Parlamento brasileiro, medida que colide frontalmente com o Estado Democrático de Direito, revolvendo o (des)equilíbrio entre os Poderes Executivo e Legislativo. Com a finalidade de restabelecer parâmetros acerca da votação das medidas provisórias, editou-se proposta de emenda constitucional autuada sob o nº 70/2011, que altera substancialmente o art. 62 da Constituição da República. A proposta fixa prazo de 80 e 30 dias para votação pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, respectivamente. Nos referidos períodos, as comissões de constituição e justiça têm 10 dias para apreciar a constitucionalidade da medida provisória. Se a Câmara dos Deputados e o Senado Federal não se manifestarem em até 70 e 20 dias, respectivamente, a medida provisória entra em regime de urgência, sobrestando-se as demais deliberações legislativas, ressalvadas aquelas que possuem prazo constitucional determinado. Dessa forma, a proposta sob exame reproduz a regra contida no § 2º do art. 64 da Lei Maior, aplicável, por ora, aos projetos de lei de iniciativa do presidente da República. Com esteio no comando do § 2o do art. 202 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, criouse “Comissão Especial destinada a apreciar e proferir parecer à Proposta de Emenda à Constituição no 70-A, de 2011”, cujo objetivo é proceder à análise meticulosa de
seu mérito, pelo prazo de quarenta sessões, além de poder receber emendas nas primeiras dez sessões. Caberá à comissão especial lançar, sob a forma de parecer, os resultados obtidos com o exame do mérito da proposta. Nessa esteira, o aludido órgão colegiado convocará diversas audiências públicas para debater a matéria, com palestrantes convidados, ampliando-se o diálogo com especialistas e a sociedade civil, criando-se, com efeito, um canal democrático de reflexão. A propositura de alterações ao art. 62 da Constituição da República decorre do sistema republicano vigente. A análise da proposta por comissão especial, regra regimental mandatória, permitirá uma conclusão detalhada e insculpida de segurança jurídica, garantindose o equilíbrio e a harmonia entre os Poderes Executivo e Legislativo.
Nota 1 A Constituição italiana preceitua em seu art. 77: “O governo não pode, sem delegação das Câmaras, promulgar decretos que tenham valor de lei ordinária. Nos casos extraordinários de necessidade e de urgência, o governo poderá adotar, sob sua responsabilidade, providências provisórias com força de lei. Deve, contudo, apresentá-las no mesmo dia para apreciação das Câmaras que, mesmo dissolvidas, são convocadas e devem reunir-se dentro de cinco dias. Os decretos perdem o seu poder legal desde o início se não convertidos em lei no prazo de sessenta dias a partir da sua publicação. As Câmaras podem, contudo, regulamentar com lei as relações jurídicas surgidas na base dos decretos não convertidos em lei.”
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De outubro de 1988 a junho de 2013: o legado e o desafio
Julio Aurelio Vianna Lopes
Professor Titular em Ciências Sociais e Humanas da Fundação Casa de Rui Barbosa
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ma Constituição é uma dádiva entre gerações: a Carta de 1988 é um legado dos brasileiros que se opuseram ao regime militar enviando sua mensagem democrática às gerações seguintes. Como todo presente, importa se e o quanto ele foi recebido – no caso, pela sociedade brasileira. Nesse sentido, três aspectos ressaltam sua recepção ao longo de seus 25 anos: – nunca tivemos tantas liberdades em tanto tempo (1988 a 2013), mas apenas em curto período (1934 a 1936), ou menos liberdades em período maior (o coronelato de 1891 a 1930), sendo autoritários os demais períodos de nossa História; – essencialmente, a Constituição atual é a mesma de 1988: das 74 emendas feitas até agora, somente 14 delas contrariaram o sentido político do texto. Mesmo assim, apenas reduziram seu alcance, sem expurgar, inteiramente, alguma de suas novidades; – suas inovações vêm sendo progressivamente, apesar de lentamente, adotadas: as de cunho libertário (o fim da censura oficial, a licença-maternidade, o voto 54
“O regime de 1988 é uma democracia burocrática, na qual os órgãos públicos reguladores atuam com a participação das associações representativas dos interesses que regulam. Isso ocorre desde os conselhos municipais, estaduais e federais, que funcionam com os gestores públicos, até os projetos de lei cuja votação só acontece depois de audiências com as entidades representativas pertinentes.”
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Foto: Jane de Araújo
Senador Renan Calheiros e o professor Julio Aurelio
de analfabetos e adolescentes, os juizados especiais, a liberdade partidária, a garantia das manifestações coletivas) são mais efetivas, enquanto que as de cunho igualitário (reconhecimento de danos morais e de uniões conjugais ou a proteção aos consumidores e às mulheres, a fidelidade partidária e a defensoria pública) encontram maiores dificuldades. Porém, o regime de 1988 é uma democracia buro crática, na qual os órgãos públicos reguladores atuam com a participação das associações representativas dos interesses que regulam. Isso ocorre desde os conselhos municipais, estaduais e federais, que funcionam com os gestores públicos, até os projetos de lei cuja votação só acontece depois de audiências com as entidades representativas pertinentes. É um regime democrático nascido do encontro entre os dois segmentos que teceram nossa Constituição, por meio da maioria dos constituintes eleitos (51% deles provinha da gestão administrativa), e das 83 emendas populares assinadas por, no mínimo, quatro milhões de eleitores (encaminhadas por associa ções civis).
Portanto, as manifestações de junho de 2013 trazem o maior desafio histórico ao regime de outubro de 1988: seu fio comum é o anseio difuso – não de corporações organizadas – pela qualidade de vida em geral, traduzida na reivindicação pela qualidade dos serviços públicos de transporte, saúde e educação. Desafiam a ordem de 1988 para ir além do tema das verbas públicas e da eficiência contábil; exigem a humanização dos serviços prestados pelo Estado e não admitem sua corrupção cotidiana. Ao completar 25 anos de vigência, a ordem legada em 1988 foi retribuída, em junho de 2013, pelos brasileiros que se manifestaram contra o aumento das tarifas de transporte urbano, denunciando sua crônica falta de qualidade. Reanimando a democracia, suas manifestações coletivas abriram novas possibilidades de aprendizado democrático para todos – manifestantes e autoridades – evitarem excessos e arbitrariedades. Mas trouxeram, principalmente, a necessidade de reconhecer anseios da sociedade que não cabem nas formas tradicionais da política moderna.
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Vinho e embriaguez tributária
Carlos Henrique Gonçalves de Moura
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Servidor efetivo Assessor de Ministro do STJ
o filme O sétimo selo, obra-prima de 1957 do diretor Ingmar Bergman, um cavaleiro recémchegado das Cruzadas recebe a visita da Morte, personificada em uma figura pálida, sombria e cavilosa. Previsivelmente, ela anuncia a sua missão de leválo. Para retardar seu intento, o cavaleiro propõe-lhe uma partida de xadrez. Sagrado vencedor, permaneceria ele no mundo dos vivos por mais algum tempo; derrotado, iria, de imediato, integrar o escrete dos mortos. Confiante, porque exímio jogador, dá como certo o seu triunfo. Mas ele perde, e o curso natural das coisas é retomado. Essa alegoria, conduzida com primor pelo cineasta sueco, é um retrato perfeito e acabado do que se nos apresenta como inexorável ao longo da vida. A metáfora, nesta reflexão, é tomada de empréstimo para ilustrar um paralelo entre a relação quase sempre conflituosa, embora inevitável, do contribuinte com o fisco. A Constituição de 1988 foi generosa na outorga e na ampliação de direitos e garantias que blindam o contribuinte contra investidas ao seu patrimônio mediante a instituição de tributos. Ao mesmo tempo, todavia, o legislador constituinte adotou uma vasta gama de impostos, taxas e contribuições. Procedeu o constituinte originário de modo legítimo em um ambiente de discussões e momento histórico propícios. Afinal, na sabedoria sempre atual de Ruy Barbosa, “a feição característica de todo povo livre é o direito de tributar a si mesmo”. Para revelar o peso desse leque de tributos, usemos como pedra de toque o vinho, que, apesar do custo 56
relativamente alto, está cada vez mais presente na mesa do brasileiro. Na composição do preço de uma garrafa importada fora da área econômica do Mercosul, os tributos correspondem a asfixiantes 83,8% do valor pago pelo consumidor final. A título de comparação, o percentual é maior que o incidente sobre armas de fogo, que gira em torno de 65%. Recaem sobre a bebida de origem estrangeira II, IPI, ICMS, PIS, Cofins, IRPJ e tributos sobre salários. Tudo isso sem computar o frete internacional, que pode chegar aos 27%, além de taxas aduaneiras. Engana-se, por outro lado, quem pensa que a situação do vinho nacional é muito diferente. Sobre uma garrafa produzida em solo tupiniquim incide outro percentual de escandalizar Baco: 63,8%, ficando de fora apenas o imposto de importação. Os dados são do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário – IBPT (site da revista Exame, 4/2/11). Parte dessa pressão fiscal advém do fato de que, aqui, ao contrário da França, o vinho não é considerado alimento. A consequência dessa despesa é elitizar a bebida e desestimular o consumo de rótulos estrangeiros de qualidade superior. O vinho é apenas um recorte exemplificativo de um universo abrangente de bens e serviços sacrificados pela alta carga tributária em cascata. Alta em espécies e alíquotas. Similar calvário enfrentam produtos e serviços de primeira necessidade, como alguns alimentos, remédios, etc. Nenhum sistema comunitário, por mais rudimentar, sobrevive sem a contribuição dos seus membros, seja ela
Justiça & Cidadania | Dezembro 2013
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na forma de bens, serviços ou valores. A autossuficiência não faz parte da condição humana. Contudo, o ideal de justiça fiscal, expressão que já se tornou mantra, continuará sendo apenas um ideal até que o Congresso submeta as espécies tributárias a uma lipoaspiração. O sistema legal tributário brasileiro, já cunhado, com indiscutível acerto, de “manicômio tributário”, viu nascer, desde a promulgação da Constituição até 2012, 290.932 normas fiscais, o que resulta em uma média de 1,41 ato normativo por dia útil; foram criados oito tributos federais, além de terem sido majoradas praticamente todas as exações (IBPT). Não bastasse essa inflação legislativa, as normas editadas, não raro, trazem disciplina intrincada, por vezes em choque com o texto constitucional, criando ou agravando conflitos entre o fisco e os contribuintes. O legislador não apenas criou tributos em demasia, como também concebeu espécies labirínticas, a exemplo do ICMS, matéria-prima farta para os estudiosos. É triste constatar a existência de trabalhos doutrinários com mais de 700 laudas apenas sobre essa espécie tributária, evidenciando que o seu modelo é propenso ao conflito. Um sistema fiscal confuso e esclerosado não atende aos interesses de ninguém, nem mesmo do fisco. Se a intenção é dificultar para cobrar, o tiro sai pela culatra. Afinal, a administração tributária enfrentará a resistência dos contribuintes que acham que não devem, ou que devem menos. Isso sem falar que as dificuldades impostas pela legislação são convites à sonegação.
É sentida, ainda, a ausência do imposto sobre grandes fortunas como meio de efetivação do princípio da capacidade contributiva. Amargamos, também, a velhice do CTN e a falta da lei complementar para regular as situações que o constituinte deixou ao arbítrio do legislador ordinário. A Lei no 6.830/80, por sua vez, já conta 33 anos e reclama harmonização com a nova ordem constitucional e com a jurisprudência pacificada. Já não se justifica, ademais, a manutenção de certas benesses para a Fazenda, tais como o reexame necessário e os prazos processuais dilatados. Sabe-se que esta última regra era legitimada pela desestruturação dos quadros funcionais das procuradorias. O tempo, contudo, aliado ao interesse governamental, remediaram essa deficiência. O que se espera em matéria de cobrança fiscal é uma visão ontológica, pela qual o contribuinte seja tomado pelo léxico que o define: aquele que colabora, e não como um súdito pagador de tributos. O antagonismo Estado X cidadão é inelutável. Todavia, a postura maniqueísta é que precisa ser erradicada para melhor equacionar os interesses envolvidos. É temerário supor, ainda, que os interesses da coletividade equivalham aos interesses estatais, ou que eles sempre se achem representados pelo Estado. Racionalização, corte de excessos e simplificação são palavras de ordem para aprimorar a relação Fiscocontribuinte. Afinal, já se disse que na vida contamos apenas com duas certezas: uma, a de que vamos todos morrer; a outra, que iremos todos pagar impostos. Que assim seja, mas com menos percalços durante a disputa no tabuleiro.
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Não residência fiscal: momento da caracterização Marina Dias Barbosa Vianna
desenvolvimento das empresas aliado à globalização da economia estreitou as relações mundiais e diminuiu as distâncias existentes entre os países e, consequentemente, entre
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Advogada
as pessoas. A facilidade de mobilidade dentro de um grupo empresarial aliado à necessidade das multinacionais em uniformizar sua política empresarial, em promover rodízios de empregados, em repartir experiências, disseminar cultura e práticas, fez com que a mobilidade internacional de empregados dentro de um mesmo grupo econômico se tornasse algo cada vez mais comum e corriqueiro. Essa movimentação, também chamada de expatriação, vem ganhando cada vez mais espaço no cenário empresarial e passou a ser um ponto de atenção nas grandes corporações. O processo de expatriação, além de questões corporativas, também gera diversas consequências na vida do profissional, consequências essas: culturais, sociais, trabalhistas, previdenciárias, imigratórias, tributárias, dentre outras. A presente análise tem como foco as possíveis consequências tributárias advindas da expatriação de um residente fiscal brasileiro para o exterior, principalmente no que tange à entrega da Declaração de Saída Definitiva. Necessidade de planejamento de uma expatriação É importante que o processo de expatriação seja precedido de um planejamento, cuja principal finalidade é identificar as possíveis consequências tributárias decorrentes da expatriação, seja no Brasil, seja no país de destino. Como o expatriado irá, em regra, exercer suas atividades no país de destino, além de estudar as consequências 58
tributárias de sua expatriação no Brasil, a pessoa física deverá se preocupar também com as consequências tributárias no exterior. Por esse motivo, é imprescindível que a legislação tributária do país de destino seja estudada previamente, com o objetivo de delimitar as obrigações tributárias do expatriado no país onde será desenvolvida sua atividade.
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Tendo em vista que a legislação tributária de cada país possui suas peculiaridades, cada expatriação deve ser analisada de forma casuística. Ademais, a análise combinada das legislações tributárias brasileira e do país de destino permite que seja elaborado um planejamento com vistas a evitar que o expatriado seja surpreendido com incidências tributárias em duplicidade sobre o mesmo rendimento. Um dos principais critérios que influencia na tributação da renda da pessoa física é a sua caracterização (ou não) como residente fiscal. Tributação no Brasil – Distinção: não residente fiscal X residente fiscal No Brasil, a distinção entre pessoas residentes e não residentes no território nacional é de importância decisiva para definir a extensão das respectivas obrigações tributárias. Com efeito, enquanto os não residentes, sejam pessoas físicas ou jurídicas, estão apenas sujeitos ao imposto quanto aos rendimentos provenientes de fontes situadas no Brasil, estando, assim, sujeitos ao regime da tributação limitada (com base na territorialidade), os residentes são tributáveis em função de seu rendimento mundial, quer se trate de pessoas físicas ou jurídicas – regime da tributação ilimitada (com base na universalidade da renda – worldwide-income)1. De acordo com a legislação existente sobre o tema, os residentes fiscais devem fazer a sua Declaração de Imposto de Renda anualmente, sendo tributado de acordo com a tabela progressiva, cuja alíquota nominal máxima de tributação é de 27,5%, sendo admitidas deduções da base de cálculo do Imposto de Renda. Além disso, os residentes são tributados pelos seus rendimentos universais, ou seja, pela sua renda mundial, quer seja auferida no Brasil, quer seja auferida no exterior. Já os não residentes, são tributados apenas em relação à renda oriunda de fonte brasileira (fonte de pagamento), em regra geral2, a uma alíquota definitiva de 25%, sem possibilidade de qualquer dedução da base de cálculo. Em regra geral, a pessoa física residente e domiciliada no Brasil é considerada residente fiscal. A Lei autoriza outras formas de aquisição da residência fiscal no Brasil, como o ingresso em território nacional com o visto permanente2. Porém, a grande questão que se coloca é em relação ao tratamento dado a uma pessoa física brasileira até então residente e domiciliada no Brasil que se retire do país por um, dois, três, quatro, cinco anos. Ela será considerada residente ou não residente para fins fiscais brasileiros? Da entrega da Declaração de Saída Definitiva do País O art. 16 do Decreto no 3.000/99 (Regulamento do Im posto de Renda – RIR) é a norma que regula a caracterização da não residência fiscal para fins brasileiros e estabelece
duas regras: (i) os residentes ou domiciliados no Brasil que se retirem em caráter definitivo do território nacional no curso de um ano-calendário, além da declaração correspondente aos rendimentos do ano-calendário anterior, ficam sujeitos à apresentação imediata da Declaração de Saída Definitiva do País; e (ii) os residentes ou domiciliados no Brasil que se ausentarem do País sem requerer a Certidão Negativa para Saída Definitiva do País terão seus rendimentos tributados como residentes no Brasil, durante os primeiros doze meses de ausência, observado o disposto no §1o, e, a partir do décimo terceiro, na forma dos arts. 682 e 684 (ou seja, como não residente – tributação definitiva). A Instrução Normativa SRF no 208/2002, com as alterações da Instrução Normativa no 1.008/2010, regula menta a matéria e estabelece, no art. 3o combinado com o art. 2o, o conceito de não residente. Segundo essa Instrução Normativa, a perda da residência fiscal pode ocorrer, teoricamente, em dois momentos: (i) quando a pessoa física residente no Brasil sair em caráter permanente com a entrega da Comunicação de Saída Definitiva e, posteriormente, da Declaração de Saída Definitiva; e (ii) quando a pessoa física que se ausente do Brasil em caráter temporário, a partir do dia seguinte àquele em que complete doze meses consecutivos e completos de sua ausência. Em relação à saída em caráter permanente com as modificações advindas pela Instrução Normativa RFB no 1.008/2010, a saída permanente restará configurada, com a apresentação da Comunicação de Saída Definitiva até fevereiro do ano-calendário subsequente ao ano da saída permanente e com a apresentação da Declaração da Saída Definitiva até o último dia do mês de abril do anocalendário subsequente ao da saída definitiva. Já, caso a pessoa se retire do Brasil em caráter temporário e permaneça no exterior por um período superior a 12 meses consecutivos, a mesma deverá, segundo a norma, apresentar a Comunicação de Saída Definitiva a partir da data da caracterização da condição de não-residente e até o último dia do mês de fevereiro do ano-calendário subsequente e apresentar a Declaração de Saída Definitiva do País relativa ao período em que tenha permanecido na condição de residente no Brasil no ano-calendário da caracterização da condição de não residente, até o último dia útil do mês de abril do ano-calendário subsequente ao da caracterização. Com a leitura do disposto acima, pode-se chegar à conclusão de que a pessoa física que se ausente do Brasil em caráter temporário, após decorrido o prazo de 12 meses consecutivos e completos no exterior, será considerada não residente no Brasil sem que haja necessidade da entrega da Comunicação e da Declaração de Saída Definitiva, sendo assim, estará sujeita à tributação ordinária (alíquota 27,5 %
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sendo autorizadas deduções da base de cálculo, se cabíveis) nos primeiros 12 meses de ausência e, a partir do décimo terceiro mês, será tributada como não residente (alíquota de 25% sem direito à deduções da base de cálculo). Por outro lado, existe a possibilidade de a pessoa física não entregar a Comunicação e a Declaração de Saída Definitiva. Caso isso ocorra, de acordo com a Instrução Normativa RFB no 208/2002, artigo 13, será aplicada uma multa no valor de R$ 165,74 (cento e sessenta e cinco reais e setenta e quatro centavos) em não havendo imposto devido; caso haja imposto devido, a multa observará os limites mínimo de R$ 165,74 (cento e sessenta e cinco reais e setenta e quatro centavos) e máximo de vinte por cento do valor do imposto devido. Todavia, como relatamos anteriormente, o Brasil adota o princípio da universalidade para os residentes fiscais no País e o da territorialidade para os não residentes. Sendo assim, caso uma pessoa física seja residente fiscal no Brasil será aqui tributada pela sua renda mundial incluindo qualquer renda recebida no exterior, e caso seja um não residente, o Brasil só tem competência para tributar aquela renda oriunda de uma fonte de pagamento no Brasil. Assim, imaginemos que uma pessoa física seja expatriada por um período de 5 (cinco) anos, sem a entrega da Comunicação e da Declaração de Saída Definitiva após decorridos doze meses, e que a fonte de pagamento seja transferida para o exterior. Imaginemos, ainda, que essa pessoa física, que passou cinco anos no exterior e não entregou nem a Comunicação nem a Declaração de Saída Definitiva, apresentou anualmente a sua Declaração de Imposto de Renda, contemplando todos os valores por ela percebidos, e pagou o Imposto de Renda corretamente como residente no Brasil (renda universal). Qual seria o interesse das autoridades fiscais brasileiras em desconsiderarem a residência fiscal dessa pessoa física? Ao que parece nenhum. Isso porque, considerando a hipótese acima, a pessoa deverá pagar uma multa de R$ 165,74 (cento e sessenta e cinco reais e setenta e quatro centavos) em razão da não apresentação da Comunicação e da Declaração de Saída Definitiva, e em contrapartida a Receita Federal deverá restituir o Imposto de Renda pago por essa pessoa corrigido, a partir do segundo ano de ausência no Brasil. Logo, não há interesse das autoridades fiscais brasileiras em não permitir que uma pessoa física domiciliada e com seu centro de interesses vitais no exterior seja residente fiscal no Brasil. A primeira leitura da norma pode dar a impressão de que a entrega da Declaração de Saída Definitiva é facultativa e de que, não havendo essa entrega, a pessoa física passa à condição de não residente, automaticamente, passados os 12 meses de permanência ininterrupta no exterior, ficando sujeita nesse caso somente à multa que esse artigo estabelece em face do 60
“Todavia, para que seja adquirida a condição de não residente fiscal no Brasil, é necessário que o animus da pessoa física implemente essa condição, que só irá ocorrer efetivamente com a entrega da Comunicação e da Declaração de Saída Definitiva.”
não cumprimento de obrigações acessórias (não entrega da Comunicação e da Declaração de Saída Definitiva). Todavia, não desposamos desse entendimento, primeiro porque não há interesse das autoridades fiscais em desconsiderarem a residência fiscal brasileira da pessoa física que é regida pelo princípio da universalidade e segundo porque entendemos que a entrega da Comunicação e da Declaração de Saída Definitiva é o momento em que o contribuinte manifesta sua intenção (animus) de ser considerado não residente. Caso essa manifestação não ocorra, as autoridades fiscais não serão informadas dessa intenção, não podendo de ofício modificar o status da residência fiscal da pessoa física. Conclusão Sendo assim, caso a pessoa física se retire do Brasil sem a entrega da Declaração de Saída Definitiva do País, irá se sujeitar à tributação ordinária de seus rendimentos (auferidos no Brasil e exterior), nos primeiros doze meses, à alíquota nominal máxima de 27,5% (admitidas deduções da base de cálculo), como os demais residentes. A partir do 13o mês, somente com a entrega da Declaração e da Comunicação de Saída Definitiva, a pessoa física passa a ser tributada como não residente (tributação definitiva, cuja alíquota nominal e efetiva é, regra geral, de 25% incidente sobre os rendimentos auferidos no Brasil), não havendo tributação sobre os rendimentos auferidos no exterior. Todavia, para que seja adquirida a condição de não residente fiscal no Brasil, é necessário que o animus da pessoa física implemente essa condição, que só irá ocorrer efetivamente com a entrega da Comunicação e da Declaração de Saída Definitiva.
Nota XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 291. 2 Há alíquota diferenciada de 15% para ganho de capital e rendimento de aluguel auferidos por não residente fiscal. 1
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Os tributos e a unidade nacional
Eduardo Chuahy
O
Ex-deputado estadual no Rio de Janeiro
s brasileiros usuários dos meios de comunicação são permanentemente iludidos pelas informações distorcidas e equivocadas dos órgãos privados, que determinam a divulgação das notícias. Chega-se ao exagero. Fala-se em imposto (daí o nome de impostômetro), quando, na realidade, imposto é uma das parcelas dos tributos que uma sociedade paga. Quando se fala em carga tributária elevada, erroneamente se atribui ao Governo Federal a responsabilidade e a culpa. Os dois maiores tributos federais são os Imposto de Renda (IR) e o Imposto de Produtos Industrializados (IPI). Eles, também, são, indiretamente, impostos Estaduais e Municipais. Apesar de a União arcar com a responsabilidade de arrecadá-los e fiscalizá-los – manter permanente o quadro de fiscais e auditores –, transfere constitucionalmente para Estados e Municípios 47%, e fica somente com 53% do que recebe de IR; quanto ao IPI, repassa 42% e fica com 58%. Daí a resistência dos Estados e Municípios quando a União desonera ou diminui IPI de automóveis ou de produtos da chamada linha branca. Os deputados federais apresentaram um projeto de lei, em que a União sozinha deverá arcar com qualquer diminuição de tributo: os Estados e Municípios receberiam a transferência desses recursos, como se eles ainda existissem. 62
O Brasil é uma República que nasceu de um Império Unitário. O Brasil não nasceu de vários estados que se uniram para constituir uma nação. O que não se arrecada não se distribui. A brilhante Comissão de Tributos, Orçamento e Finanças da Constituinte de 1988 não parou aí. Ela eliminou dos tributos federais: os Fundos Rodoviários (construção e reparo de estradas) e os Fundos de eletrificação (construção de usinas hidrelétricas e linhas de transmissão). A má-conservação das estradas de rodagem e a construção de novas vias – nos governos Collor, Itamar, FHC, Lula e Dilma – deve-se, em grande parte, a esta transferência de recursos federais para Estados e Municípios. O Brasil permaneceu 20 anos sem investir na expansão das usinas hidrelétricas. Além da transferência dos recursos, vieram as privatizações e a liberdade estadual para fixar e elevar os novos impostos (ICMS) – utilizados, em grande parte, para despesas de custeio dos estados. Em 1998, o ICMS, no Estado do Rio de Janeiro, alcançou a incidência de 37% nas contas de luz e telefonia. A incidência de 37% de ICMS, por dentro, mais as tarifas que haviam sido alteradas para mais de 600% acima do preço de consumo vigente em 1985. Estes atos é que tornam alta a tributação e o custo de vida no Brasil. É bom lembrar que o ‘S’ do ICMS chega a alcançar a ordem de 50% da arrecadação estadual!
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A Comissão de Tributos da Constituinte de 1988 não parou por aí. Ela cessou os tributos federais sobre minérios, comunicações e transportes. Extinguiu a Taxa Rodoviária, que passou a ser o IPVA estadual, repassando a metade da arrecadação aos municípios. Insaciáveis, os Estados e Municípios, em sua maioria falidos, pressionam o Governo Federal para conseguir mais recursos. Foi aprovada, pelo ilustre Senador Aécio Neves, que qualquer produto que seja isento de tributo federal, a União deverá pagar, aos estados e municípios, o correspondente percentual do produto, como se ele fosse ainda tributado. Exemplo: a União isenta de IPI os fogões produzidos no país. Apesar de inexistir imposto, a União será, por lei, obrigada a transferir aos Estados e Municípios 43% do imposto que seria cobrado anteriormente. Isto beira a loucura. Mas é a realidade do ilustre senador. O projeto é de autoria do Aécio Neves. Se os impostos estão altos devemos agradecer à Comissão de Tributos, Orçamento e Finanças. Basta comparar a incidência quando era da União e agora quando é dos Estados e Municípios. Tomamos a liberdade de demonstrá-la dizendo que o S que se acrescentou ao ICMS, juntamente com privatizações, é pago até os dias de hoje pela população a título de tarifas e altos impostos.
Opinião internacional: oit-cintefor (Centro Interamericano para el Desarrollo del Conecimento en la Formarción Profesional) A constituição de 1988 No tocante à distribuição de recursos, a Constituição de 1988 favoreceu os Estados e Municípios, transferindo-lhes a maior parte deles sem, entretanto, a correspondente transferência de encargos e responsabilidade. Neste particular foi desastrosa. O Governo Federal continuou com os mesmos custos e com fontes de receitas bastante diminuídas. Metade do IR e do IPI – os principais da União – foram automaticamente distribuídos aos Estados e Municípios. Além disso, cinco outros tributos foram transferidos para a base de cálculo do ICMS. Ao mesmo tempo, os Constituintes ampliaram as funções do Governo Federal. É fácil concluir, pois, que a carta de 88 promoveu desequilíbrios graves no campo fiscal, que, obviamente, têm repercutido nos programas sociais, ao induzir a União a buscar receitas não partilháveis com os Estados e Municípios, contribuindo para o agravamento da ineficiência e da iniquidade do sistema tributário e do predomínio dos impostos indiretos e contribuições. O crescente recurso ao imposto sobre operações financeiras (IOF) e as contribuições de fins sociais (FINSOCIAL) e sobre o lucro.
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A Comissão de Tributos, Orçamento e Finanças era presidida pelo então Deputado Federal Francisco Dornelles e tinha como Relator o Deputado Federal José Serra. A Gestão dos Recursos dos Estados e os Municípios Uma emenda atípica e estranha foi apresentada e aprovada pelo então Relator da Comissão, o Deputado Federal José Serra. Ela isentou o Estado de São Paulo de pagar o ICMS nas compras de energia que fizesse no País (energia elétrica do Paraná e petróleo do Rio de Janeiro e Espírito Santo). Mas a emenda não beneficiou em nada a população paulista em relação ao pagamento dos impostos estaduais. Em contrapartida, há trinta anos aproximadamente, a União arca para compensar os Estados, transferindo royalties para alguns municípios e estados, atingidos por essa esdrúxula emenda. A utilização inadequada desses royalties auxiliou os beneficiários na contratação de novos funcionários, despesas inúteis e aumento das despesas de custeio. O Ex-Secretário Joaquim Levy declarou aos jornais que o rombo do Estado do Rio de Janeiro com tal emenda era de R$ 10 bilhões (bilhões de reais) anualmente. Imaginem o que seria se a União aplicasse durante os 30 anos passados – 30×10 bilhões – esses recursos em investimento a Petrobras. Vejamos como ficou a receita total disponível por esfera de Governo. Os dados abaixo estão disponíveis na Receita Federal-MF: Ano Federal Estadual Municipal
1980 49% 35% 16%
1985 46% 36% 18%
1990 (após a Constituição de 1988) 35% 42% 23%
Como vimos, em 1980 a União, da Receita Geral do Brasil, recebia 49% do arrecadado, os Estados 35% e os Municípios 16%. Após a Constituição de 1988, a União perdeu 14% e Estados e Municípios ganharam cada um 7%. Apesar das transferências feitas pela Comissão de Tributos e Orçamento da Constituição de 1988, com o propósito de enfraquecer a União, temos visto dezenas de projetos, emendas constitucionais, sendo votados no Congresso, aprovados ou não, com essa finalidade no Congresso. Estamos a voltar para antes de 1930, durante a República Velha. Os Estados e Municípios estão falidos. Há uma tentativa de desagregar esta imensa nação brasileira. Getúlio, na década de 30, contribuiu para Unidade Nacional. Acabou com os Exércitos Estaduais, mandou queimar as bandeiras estaduais, criou estatais, dignificou os trabalhadores etc. A Confederação Geral dos Municípios, que representa a união de todos municípios do Brasil, fala através do seu Presidente Paulo Ziulkoski o seguinte: “As propostas 64
“É fácil concluir, pois, que a carta de 88 promoveu desequilíbrios graves no campo fiscal, que, obviamente, têm repercutido nos programas sociais, ao induzir a União a buscar receitas não partilháveis com os Estados e Municípios, contribuindo para o agravamento da ineficiência e da iniquidade do sistema tributário e do predomínio dos impostos indiretos e contribuições.”
do Governo Federal são boas. Mas o que adianta? Os municípios não podem celebrar Convênios. Cerca de 3.585 estão no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito). Conforme levantamento recente da Confederação Geral dos Municípios, quase todos, 96,4% estão inadimplentes. A União continua a enviar recursos aos Municípios além das novas obrigações assumidas com as reformas de 1988, A nova Constituição facilitou as exigências para criar novos municípios. Foram criados 1.490, dos quais somente 28 estariam em condições de serem implantados. O Brasil passou a ter 5.507 municípios. A maioria deles, 83%, segundo a FIRJAN não teria condições de proporcionar o mínimo de receita que cobrisse 50% das despesas legais, para sua sobrevivência como autônomos. Os novos municípios, na sua implantação, criaram estruturas e até salários semelhantes às grandes capitais. Administram 5,5 milhões de funcionários efetivos e 500 mil terceirizados. Os terceirizados custam da ordem de R$ 1,6 bilhão mensais. Os Prefeitos são hoje os melhores cabos eleitorais disponíveis.
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Da ordem de 2.590 prefeitos possuem 1.640.422 hectares e aí não se incluem as propriedades dos deputados federais e estaduais, senadores e suplentes. Daí a dificuldade da reforma agrária, regulamentação das terras indígenas, quilombos e regulamentação ambiental. O Poder Legislativo não permite e consegue derrotar qualquer medida que pretenda corrigir ou modificar a estrutura nas propriedades agrícola. (O Partido da Terra – como os políticos conquistam o território brasileiro, Alceu Luís Castilho – Editora Contexto). Agências reguladoras Desde o início de 1945, quando Roosevelt morre e o Governo Americano é assumido por Truman, iniciase uma chamada “guerra fria”. O Brasil, neste contexto político-geográfico, se destaca como nação-filial dos EUA, devendo ser governado por pessoas com inteira fidelidade à nação do norte. O golpe militar contra Getúlio em 1945 e 1954, e o golpe contra Jango em 1964 têm a mesma orientação. Ninguém sintetizou melhor esta submissão nacional que o Ministro das Relações Exteriores, General Juraci Magalhães: “O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”. Finalmente, quando o PSDB assume o poder, em 1985, sonhando nele permanecer por 20 anos, FHC falou “a era de Vargas terminou” e iniciou a privatização e a entrega da economia do país aos interesses estrangeiros e seus associados. Nos EUA, as Agências Reguladoras foram criadas no início do século XX, tinham como objetivo defender os interesses dos consumidores dos serviços públicos da voracidade das empresas privadas que prestavam tais serviços. Sempre atuaram em defesa do consumidor. O Brasil possuir hoje sete agências federais e vinte e três estaduais, criadas a partir de 1955, permite esvaziar as funções Ministeriais e gerar empregos. Segundo o que disse o Professor Falheiros, pesquisador de pós-graduação de Política Social da Universidade de Brasília (UnB), entrevistando 19 ouvidores: “Quem utiliza serviços de empresas privadas deixa de ser sujeito com garantias e torna-se apenas um consumidor de serviço”. Marcos Pó, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) diz: “Não é incomum serem adotados critérios que acabam prejudicando o consumidor, pois privilegiam as necessidades financeiras das empresas”. Aristóteles dos Santos admite que “quando ela foi criada, a preocupação do marco regulatório era garantir a entrada de capital no país e o lucro das empresas”. Exemplo: O KWH na faixa de consumo aumentou R$ 0,02619 (jan 95) para R$ 0,167 (Dez 98), um aumento de 638%. O telefone fixo (raras pessoas tinham celular) aumentou de R$ 0,695 (Jan 95) para R$ 16,57 (jan 98) um aumento de 2.700%.
O imposto de renda O Brasil tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, mas é, também, um dos mais injustos na hora de cobrar impostos dos seus cidadãos. Os brasileiros são os mais onerados sobre o que consomem mais, do que sobre sua renda. A tributação sobre o Consumo no país é em torno de 18% do PIB e, sobre a Renda, é de 8% do PIB. Nos últimos anos, a arrecadação sobre o ICMS e o IPI responderam pela maior parte dos 53,7% da arrecadação do Brasil. O imposto de Renda ficou 24,97% do total recolhido. Dois atos da Comissão de Tributação e Finanças precisam ser lembrados: 47% da arrecadação do IR e 43% da arrecadação do IPI são constitucionalmente enviados pela União aos Estados e Municípios. Até 1988, as alíquotas de IR existentes iam de 0% ao limite de 50%. A partir de 1999, sua incidência e o número de alíquotas foi modificado para duas, somente: a menor para 15% e a mais elevada para 27,5%. Parabéns aos mais afortunados. Deixaram de pagar 50% para pagar 27,5%. Significa que pagaram menos 45% que no ano anterior (1988). Sabemos que tudo que defende o trabalhador urbano ou rural encontra uma grande resistência da classe dominante e de parcela da classe média. O CPMF (Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira), ideia do eminente médico Dr. Adib Jatene, movimentou todos os jornais e meios de comunicação difamando-a, conseguindo que o Congresso a anulasse. Outro privilégio que beneficia a classe dos mais afortunados é que um sócio de uma grande ou média empresa pode lançar no seu imposto de renda seu pro-labore. Poderá se isentar do IR, de sua parte em milhões de participação do lucro da empresa. O Sinprofaz (Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda), que pode ser acessado por qualquer cidadão no site www.sonegometro.com, revela que, até o final de 2013, a sonegação do Brasil poderá alcançar a quantia de R$ 415 bilhões de reais. O Brasil é o quarto país que envia ilegalmente dinheiro para o exterior (off-shore). Os estudos feitos pela Consultoria Especializada Mc Kinsey, pelo ex-chefe James Henry, sobre lavagem de dinheiro revela que os brasileiros concentram em bancos do exterior US$ 500 bilhões de dólares. Em 1935, quando os Estados Unidos sofriam com a grande crise de 1929, o Presidente Roosevelt criou uma lei de imposto progressivo – o “Revenue Act” – que taxou os ricos e muito ricos em 75%. Está na hora de mudar as leis tributárias no Brasil; fazer um levantamento dos depósitos no exterior e punir penalmente os sonegadores de impostos.
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A comunicação e o Estado Democrático de Direito Ruy Martins Altenfelder Silva
cipoal de leis que atravanca a estrutura jurídica do Brasil esconde áreas nebulosas, nas quais se acumulam normas arcaicas ou carentes de regulações que disciplinem novas atividades geradas pelos avanços da tecnologia, pela modernização da economia ou pelo próprio desenvolvimento da sociedade. Em maior ou menor grau, essa distorção traz efeitos negativos especialmente aos setores estratégicos em que agentes privados prestam serviços de utilidade pública, como transporte, petróleo, energia e telefonia. Entretanto, bem ou mal, atualizadas ou defasadas, essas atividades contam com marcos regulatórios para pautarem seu funcionamento – mesmo que de tempos em tempos sejam abaladas pelo descompasso entre a agilidade da iniciativa privada e a morosidade da administração pública – e, por último, embora não menos importante, para balizarem as políticas públicas setoriais. É esse o clima aquecido que atualmente cerca o debate recorrente sobre a criação do marco regulatório para a comunicação social. A legislação atual é obsoleta, dispersa e confusa, composta por várias leis que não dialogam umas com as outras, gerando insegurança e confusão. Muitas datam dos anos 60, como o Código Brasileiro de Radiodifusão, que rege a rádio e a TV. Esse cenário acaba beneficiando alguns, que se favorecem da concentração do setor, o que impede, muitas vezes, a circulação de ideias e, por conseguinte, o pleno exercício da democracia, da qual um dos pilares é exatamente a liberdade de expressão. A questão do marco regulatório para a comunicação social é tema dos mais delicados, pois pode representar a tentação de controle da mídia entre os espíritos de tendência, digamos, mais autoritários e avessos ao contraditório, quando não interessados em evitar um jornalismo mais atuante e crítico em relação a abusos e outros desmandos na esfera pública – tendência que, se prevalecer, pode facilmente desaguar em controle ou censura da imprensa. Entretanto, restringir a questão ao 66
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Presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas (APLJ) e do Conselho Diretor do CIEE Nacional
combate e à denúncia de tentativas de impor censura é tratar do problema pela metade. Lições vindas de países desenvolvidos e de longa tradição democrática demonstram que é viável a adoção de um conjunto de leis que configurem um marco regulatório como um instrumento para o mais amplo exercício da liberdade de expressão. No Brasil, a questão do marco regulatório para a comunicação social entra e sai da pauta de debates da sociedade sempre sem uma definição clara de sua prioridade ou da posição do governo. Isso apesar de a Constituição incluir dispositivos sobre liberdade de expressão (artigos 220 a 223) que aguardam regulamentação desde 1988. Não será fácil enfrentar a complexidade de montar um código da comunicação social compatibilizando interesses – e preservando direitos – díspares. Mas é cada vez mais urgente a tarefa de criar condições para que a comunicação se transforme em um efetivo instrumento de defesa da democracia, transferindo a questão da retórica dos belos discursos para o campo do direito, talvez mais árido, mas certamente mais eficaz para dar segurança ao setor e garantir o respeito aos direitos fundamentais da sociedade e do cidadão.
Justiça & Cidadania | Dezembro 2013
2013 Dezembro | Justiรงa & Cidadania 67
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