José Jorge Letria & José Santos
Sou uma orelha e você, o leitor, que acaba de abrir este livro. Apresento meus dois amigos, dois Josés, que se encontraram para brincar de geografia. Juntos riscaram rios, ruas, cidades, caminhos com pedrinhas brilhantes, só para ver a poesia passar. Eles emprestaram olhos de criança, aqueles que veem tudo com o encanto da primeira vez, para contar sobre Brasil e Portugal.
Se este livro tivesse braços (orelhas sei que tem), as mãos de dois Josés, um de cada lado do oceano, estariam dadas. Mas este livro não tem braços, tem asas.
Apresento também a Yara, a sereia brasileira que desenhou este livro. Ela nadou pelo rio, pelo mar e foi parar em Portugal, onde foi morar. Eu, a orelha deste livro, agora dou lugar para a língua, a língua portuguesa, que irá agora cochichar belas poesias nos seus ouvidos.
Obra apoiada pelo Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas / Portugal
Selma Maria, escritora e arte-educadora.
José Jorge Letria José Santos Ilustrações Yara Kono
José Jorge Letria (JJL) José Santos (JS) Ilustrações Yara Kono
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Esta vida é uma viagem, nem sempre de ida e volta, metemos pés ao caminho, deixamos o sonho à solta. Nasce um livro a duas vozes, português e brasileiro, ganha asas, junta mapas e abraça o mundo inteiro. Leva meninos a bordo, acenando lá à proa; tão depressa estão no Rio como aterram em Lisboa. É o livro de dois Josés, brasileiro e português, no vaivém desta língua, na cadência dos porquês. JJL
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Na cadência dos porquês muitas são minhas perguntas; qual meninas curiosas, de mãos dadas, andam juntas. Mas coloco o grupo em fila, aguardando a sua vez de saber como é a casa e a fala de vocês. De saber como é que vive toda a gente portuguesa, nesse país tão amigo, cheio de história e beleza. Eu começo indagando sobre as suas brincadeiras, sejam na casa ou na rua, divertindo a turma inteira. JS
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Jogos herdamos muitos de um tempo sem televisão, desde o dos cinco cantinhos aos campeonatos de pião. Resta ainda o da apanhada e o da barra do lenço, se calhar bem mais esquecidos do que aquilo que eu penso. Brincamos às escondidas à amarelinha e ao tesouro, em que o prêmio da alegria valia mais do que ouro. Já que falamos de jogos, outro te quero propor: o das terras de mesmo nome abaixo do Equador. JJL
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Meu amigo português, foi boa sua lembrança. Das terras com mesmo nome nós temos Braga e Bragança. Queluz, Resende e Pombal, é longa a lista, José! Ainda preciso contar de Alcobaça e Nazaré. Faro, Crato, Vila Flor, Mafra, Portel, Santarém, Trancoso, Borba, Belmonte, Sagres, Viseu e Ourém. Mas eu paro por aqui, pois preciso perguntar: quais são as aves e peixes que frequentam o seu mar? JS
◊◊◊ Cuidando da sua saúde 24 horas por dia ◊◊◊ 10
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Das terras já fico a saber, porque deixam geminada a amizade que nos liga e tem brilho de alvorada. Das aves a mais comum, por ser companheira do mar, é a gaivota universal perto de terra a voar. Melro, rouxinol e pardal, faisão, rola e perdiz, pombo, corvo e galinhola voam nos céus deste país. No mar imperam a sardinha, o carapau, o peixe-espada; e a floresta brasileira, que riqueza tem guardada? JJL
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José Jorge Letria nasceu em Cascais, Portugal, perto do mar, em 1951, filho único
de um casal feliz. Foi bom aluno e teve a ilusão de que o curso de Direito seria o caminho certo para o futuro, mas acabou por se tornar jornalista, profissão que exerceu durante 25 anos. Estreou-se em livro em 1973, há quarenta anos, como poeta, e nunca mais deixou de o ser. Publicou até a data cerca de duzentos títulos, a maioria para os mais novos. Está traduzido em mais de uma dezena de línguas e foi premiado em vários países. É presidente da Sociedade Portuguesa de Autores e integra vários organismos internacionais, o que o obriga a viajar bastante, mas as viagens que mais gosta de fazer é por dentro dos livros. Ainda assim, faz questão de nunca deixar de ter tempo para escrever, pois essa é uma forma insubstituível de respirar e de viver. O primeiro encontro com José Santos aconteceu em Lisboa. Começaram a delinear projetos, de que este trabalho a quatro mãos e duas vozes é um bom exemplo, e têm outros em vias de concretização, que a imaginação e a energia felizmente nunca esmorecem.
José Santos é brasileiro e nasceu outro dia mesmo (1959) em Minas Gerais. Atual-
mente vive em São Paulo. Antes de ser escritor, foi balconista de livraria, assistente de produção, cinegrafista e ajudou a criar um museu, o Museu da Pessoa. Desde que nasceram seus filhos, não parou mais de fazer livros para crianças e jovens. Como seus parentes são de Portugal, em 2009 passou uma gostosa temporada lá, viajando, estudando e lendo muito. Daí surgiu material para vários livros, como o Viagem às terras de Portugal, selecionado para a 50ª Feira do Livro Infantil de Bolonha e publicado pela Peirópolis. Nessa mesma viagem, conheceu pessoalmente o seu xará português, com quem simpatizou de imediato. Desde então estão a ter ideias, a inventar moda. O José de cá organizou a antologia do José de lá, chamada O livro extravagante, publicada em 2011 pela Peirópolis. Deu tão certo que se animaram a fazer este livro, nascido de uma conversa pela internet. No meio dela surgiu a Yara, que tão bem transita entre esses dois mundos e traduziu em traço e cor as nossas rimas.
Yara Kono tem um pé cá e outro lá... Nasceu cá em 1972.
Começou os seus primeiros rabiscos na parede da saleta. A mãe, que de início não ficou nada satisfeita, acabou por ceder aos “dotes artísticos” da filha. Da parede para o papel, do papel para o computador... assim passaram os anos. Mudou-se para lá em 2001 e desde 2004 faz parte da equipe do Planeta Tangerina. Em 2008, Ovelhinha dá-me lã, de Isabel Minhós Martins e Yara Kono, recebeu uma Menção Honrosa no I Prémio Internacional Compostela para Álbuns Ilustrados. Em 2010 venceu o Prémio Nacional de Ilustração (Portugal), com O papão no desvão, de Ana Saldanha. Em 2013, A Ilha, de João Gomes de Abreu e Yara Kono, ganhou uma Menção do Júri na categoria Opera Prima nos Bologna Ragazzi Awards. Notas:
Nas página 34 e 36, há ilustrações inspiradas na obra “Os galgos” de Amadeo de Souza-Cardoso (1911).
Na página ao lado, a ilustração é inspirada num dos painéis de azulejos brasilienses de autoria de Athos Bulcão.