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A mulher que criou asas

Débora Porto

Acordou às cinco da manhã, como sempre fazia. Se não fizesse isso, como poderia arrumar a cama, preparar a merenda do filho, o almoço do marido, estender no varal as roupas que lavara na noite anterior e ainda se arrumar para o trabalho?

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Às sete, pegou o ônibus lotado como sempre. Sem lugar para se sentar, colocou a bolsa pesada no chão entre as pernas.

Desceu do ônibus, caminhou até o trabalho. Limpou o escritório de sua patroa, serviu café para os clientes, levou o lixo para a rua, tirou pó, aspirou, passou pano, limpou os vidros.

Saiu do trabalho depois do horário, repassando a lista de tudo o que faltou fazer no dia. Os ombros não aguentavam o peso de sua sacola. Até que lhe ocorreu de fazer como no ônibus: colocala no chão entre as pernas.

Parou na calçada a duas quadras da parada. Um minuto de descanso, viu seu ônibus dobrando a esquina. Correu com passos maiores que seus pés.

De repente, sentiu seu corpo mais leve. A bolsa resbalou de seu ombro e caiu no chão. Mesmo assim, não quis parar de seguir em frente.

Seus pés foram ganhando asas. Estava voando mais rápida que o tempo. Talvez assim conseguisse dar conta de tudo que ainda precisava fazer hoje.

Um teto todo nosso: narrativas curtas

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