Queda que as mulheres têm para os tolos

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MACHADO DE ASSIS Queda que as mulheres tĂŞm para os tolos

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Universidade Estadual de Campinas Reitor José Tadeu Jorge Coordenador Geral da Universidade Fernando Ferreira Costa

Conselho Editorial Presidente Paulo Franchetti Alcir Pécora – Arley Ramos Moreno Eduardo Delgado Assad – José A. R. Gontijo José Roberto Zan – Marcelo Knobel Sedi Hirano – Yaro Burian Junior

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machado de assis Queda que as mulheres têm para os tolos

tradução de

De l’amour des femmes pour les sots de victor hénaux

estabelecimento do texto

Ana Cláudia Suriani da Silva

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ficha catalográfica elaborada pelo sistema de bibliotecas da unicamp diretoria de tratamento da informação Hénaux, Victor. Queda que as mulheres têm para os tolos / Victor Hénaux; tradução de Machado de Assis; estabelecimento do texto Ana Cláudia Suriani da Silva. – Campinas, sp: Editora da Unicamp, 2008.

H381q

Tradução de: De l’amour des femmes pour les sots. . Ficção francesa. 2. Ficção brasileira. 3. Feminismo. i. Assis, Machado de, 1839-1908. ii. Silva, Ana Cláudia Suriani da. iii. Título.

isbn 978-85-268-0699-3

cdd 843 b869.34 30.42

Índices para catálogo sistemático: . Ficção francesa . Ficção brasileira 3. Feminismo

843 b869.34 30.42

Copyright © by Ana Cláudia Suriani da Silva Copyright © 2008 by Editora da Unicamp

Nenhuma parte desta publicação pode ser gravada, armazenada em sistema eletrônico, fotocopiada, reproduzida por meios mecânicos ou outros quaisquer sem autorização prévia do editor.

Editora da Unicamp Rua Caio Graco Prado, 50 – Campus Unicamp Caixa Postal 6074 – Barão Geraldo cep 13083-892 – Campinas – sp – Brasil Tel./Fax: (19) 3521-7718/7728 www.editora.unicamp.br – vendas@editora.unicamp.br

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A Gabriel e Nicolas

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agradecimentos

A pesquisa que deu origem a esta edição iniciou-se em 2003, quando eu fazia visitas freqüentes à Biblioteca Britânica, em Londres, para consultar as fontes primárias do meu trabalho de doutoramento. Em uma daquelas ocasiões, em um momento em que a mente e a vista pediam descanso da leitura contínua, mas não podiam escapar para a Internet, nem se refugiar num jornal ou revista (porque na sala de leitura não há periódicos e o acesso à web é restrito), digitei no campo de busca do catálogo integrado da biblioteca os termos amour, femmes e sots. Para minha surpresa, havia, entre outras curiosidades, duas edições de De l’amour des femmes pour les sots e o Petit traité de l’amour des femmes pour les sots, de Champcenetz, mencionado em Queda que as mulheres têm para os tolos. Retirei-os e examinei-os superficialmente naquele mesmo dia, sem poder no entanto julgar qual dos três estaria mais próximo da tradução de Machado. Na minha visita seguinte à biblioteca, levei o texto de Queda comigo e pude constatar, como já o havia feito Jean-Michel Massa, que Queda é de fato uma tradução de De l’amour des femmes pour les sots. Por mais de dois anos a pesquisa ficou interrompida nesse ponto. Em 2005, por intermédio de um amigo comum, o Oséias Silas Ferraz, outro mineiro, editor e admirador da obra de Machado de Assis, eu e a Eliane Ferreira juntamos as nossas descobertas e unimo-nos em torno do objetivo comum de levar adiante o projeto da edição

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bilíngüe. Agradeço em primeiro lugar ao Oséias pelo apoio dado no início do projeto. Escrevemos em primeiro lugar o artigo “Queda que as mulheres têm para os tolos: Translation or text by Machado de Assis?”, publicado na revista Portuguese Studies, 23:1, do Departamento de Português de Kings College, Universidade de Londres. Esse artigo deu origem à introdução crítico-filológica deste livro. Agradeço desta forma ao parecerista anônimo pelas sugestões, e à Modern Humanities Research Association (Mhra) por autorizar a republicação do artigo, que sai agora em versão portuguesa e com algumas alterações. Quando a confecção do livro entrou em sua reta final, a Eliane Ferreira já não estava, infelizmente, entre nós. Foi com muito pesar que recebemos a notícia de seu falecimento, que se deu em agosto de 2007. A Eliane dedicou sua carreira universitária ao estudo da obra de Machado de Assis, sobretudo à fortuna crítica e à atividade do escritor enquanto tradutor. Na ausência da Eliane, pude contar com o apoio do João Batista na finalização do livro. Não posso deixar de agradecer à Lúcia Granja, à Ana Maria Formoso Cardoso e Silva e ao Roberto Ceolin, que leram e comentaram uma versão preliminar da introdução. A este também devo a ajuda com o latim. Agradeço também à Francine Ricieri por ter traduzido os poemas de Victor Hénaux, completando assim o trabalho de Machado, o que permitiu que este livro se tornasse uma edição verdadeiramente bilíngüe. Ana Cláudia Suriani da Silva Universidade de Birmingham

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“L’amour des femmes pour les sots a produit une fâcheuse impression, parce qu’on se dit involontairement après l’avoir lu: qui s’assemble se ressemble, et voilà notre sexe condamné.” Condessa Mathilde de Ellocnoll-Villanja Réponse à l’auteur de De l’amour des femmes pour les sots (1859)

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sumário

apresentação Élide Valarini Oliver

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introdução crítico-filológica Ana Cláudia Suriani da Silva Eliane Fernanda Cunha Ferreira

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de l’amour des femmes pour les sots Victor Hénaux

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queda que as mulheres têm para os tolos Tradução de Machado de Assis

bibliografia

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apresentação

Embora Jean Michel Massa tenha sugerido, em 1969, na sua tese La jeunesse de Machado de Assis (1839-1870), que Queda que as mulheres têm para os tolos fosse uma tradução de De l’amour des femmes pour les sots, de Victor Hénaux, essa hipótese não foi devidamente ponderada pela crítica machadiana. Em sua tese complementar, Machado de Assis, traducteur, o crítico francês foi além e comparou a tradução de Machado com a quarta edição de Hénaux. Massa, no entanto, não se deteve num exame detalhado dos dois textos e seu livro só foi recentemente traduzido para o português. Em conseqüência disso, persiste o erro, ainda hoje, tanto nas edições da obra de Machado quanto na crítica, de atribuir a Machado a autoria de um texto que não foi originariamente seu. Por outro lado, algumas raras edições indicam a possibilidade de tradução, criando contradições praticamente insolúveis. A insistente dúvida quanto a autoria ou tradução de Queda que as mulheres têm para os tolos por Machado de Assis, se tem origem no desconhecimento dos fatos, não se detém, entretanto, aí, mas se acresce de uma perspectiva cultural típica. Aquela que privilegia a originalidade sobre a imitação. Ainda mais no caso de nosso grande autor, a ansiedade de proteger o mito da originalidade, mito aliás recente na história da literatura, gerou e ainda gera uma crítica defen– 13 –

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siva, que, paradoxalmente, não teme a imprecisão e a parcialidade. Essa falsa oposição, entre originalidade e imitação, amplia-se e ganha momento no que diz respeito à tradução. Vista superficialmente como atividade inferior, a tradução literária apenas no século xx, no Brasil, atinge um status de respeito. Entretanto, literatura não se faz no vácuo, sem imitação ou tradução, e a lista de autores-tradutores é tão longa quanto a história da literatura. A tradução, para um escritor ou poeta, é parte integrante de sua atividade criadora. O presente livro não poderia se beneficiar de um melhor momento para ser publicado. Com o centenário da morte de Machado de Assis, e a conseqüente visibilidade trazida pela efeméride, nada mais importante para a crítica literária brasileira do que essa homenagem que Ana Cláudia Suriani da Silva e Eliane Fernanda Cunha Ferreira prestam ao autor. Não posso deixar de pensar que o excelente trabalho de edição aqui apresentado pelas autoras agradaria plenamente a Machado, que saberia como ninguém apreciar a precisão e a acuidade com que esta edição de sua tradução foi feita. Se ganha a crítica, com o estabelecimento definitivo do texto traduzido por Machado, ganha também o público em geral com esta edição cuidadosamente preparada. Como ressaltam as autoras, esperando que a controvérsia seja permanentemente resolvida, há muito ainda a escrever quanto ao domínio que Machado de Assis tinha do francês e ao papel da tradução na sua criação literária. Este último aspecto é sobretudo premente. Haveria uma intertextualidade entre Queda, Ressurreição e Dom Casmurro? Não se pode traduzir um texto, detendo-se palavra por palavra, sem que haja uma absorção, quase uma alquimia. Para um autor-tradutor, deter-se numa tradução é exercer uma forma peculiar de meditação estética. É a partir desse material que muitas obras originais vêm à tona. Élide Valarini Oliver Universidade da Califórnia, Santa Bárbara – 14 –

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introdução crítico -filológica 1

Ana Cláudia Suriani da Silva Eliane Fernanda Cunha Ferreira

Entre as várias traduções de Machado de Assis, Queda que as mulheres têm para os tolos é sem dúvida a mais controversa no que diz respeito à autoria. Nos cinco fascículos de sua publicação seriada (19, 23, 26, 30 de abril e 3 de maio de 1861) na revista carioca bissemanal A Marmota, não havia nenhuma indicação do autor da obra nem de que se tratava de uma tradução. Na verdade, esse tipo de omissão era prática muito comum nos periódicos ou revistas brasileiras, pelo menos na primeira metade do século xix. Segundo Jussara Quadros, “the original authors’ names were often lost among a plethora of anonymous writers and pseudonyms” (“os nomes dos autores originais perdiam-se freqüentemente entre uma pletora de escritores anônimos e pseudônimos”).2 Quadros menciona obras como A história da donzela Theodora, A história de João de Calais, Leocádia, ou a inocente vítima do crime e Confissão de marujo, pertencentes às coleções dos editores Villeneuve e Irmãos Laemmert do final da década de 1830 e cuja origem não era revelada. Quadros 1 Uma versão inglesa desta Introdução apareceu pela primeira vez em Portuguese Studies, 23: 1, 2007, pp. 88-99. 2 “The Book and the Format of the Novel”, Literary Cultures of Latin America: a Comparative History, ii, ed. por Djelal Kandir e Mario Valdés, 3 vols. New York, Oxford: Oxford University Press, 2004, pp. 147-55 (p. 151). Todas as traduções do inglês e do francês são de Ana Cláudia Suriani da Silva, exceto quando indicado o nome do tradutor.

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também menciona um conto do escritor alemão E. T. A. Hoffmann, Os assassinos misteriosos, ou a paixão dos diamantes (1839), publicado como se fosse de autoria de Justiano José da Rocha. Esses livros são, por conseguinte, produtos da incipiente literatura brasileira, entre plágios, adaptações e traduções não identificadas. O caso de Queda parece comprovar que a prática de se publicarem traduções ou adaptações sem a indicação do autor e do título originais entrou pela segunda metade do século xix. Porém, ao contrário do que ocorreu com os livros citados acima, quando Paula Brito imprimiu Queda no formato de livro, ainda em 1861, a folha de rosto trazia a indicação de que se tratava, de fato, de uma “Tradução do Sr. Machado de Assis”. O objetivo desta introdução é, em primeiro lugar, fazer um levantamento dos estudos críticos mais importantes sobre a autoria de Queda e, em segundo lugar, comparar a tradução de Machado de Assis com o texto original em francês de Victor Hénaux: De l’amour des femmes pour les sots. São tidas em conta tanto a edição de Queda em A Marmota como a edição em livro. Além disso, uma vez que tivemos acesso a duas edições de De l’amour, pela primeira vez na fortuna crítica de Queda, define-se aqui a edição de De l’amour que foi mais provavelmente usada por Machado para a composição de sua tradução. Finalmente, essa introdução comprova que as mudanças feitas no texto de A Marmota para o livro não foram meras correções tipográficas, mas de fato o tornam mais próximo do original francês.

1. A questão da autoria — Revisão da fortuna crítica A literatura existente sobre Queda apóia-se numa proposição incerta: de que Machado talvez seja o autor de Queda, apesar de, como escrito anteriormente, o escritor brasileiro aparecer, na folha de rosto – 16 –

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introdução crítico-filológica

da edição de 1861, como tradutor do ensaio satírico. Em Bibliografia de Machado de Assis (1955), Galante de Sousa argumenta que Queda é texto original de Machado, baseando-se nas opiniões de Lúcia Miguel Pereira e Afrânio Peixoto: Sobre ser obra original, e não tradução, já se pronunciaram D. Lúcia Miguel Pereira (em Machado de Assis, 3a ed., 1946, pp. 97-101) e Afrânio Peixoto (na nota explicativa que precede a transcrição da peça na Revista do Brasil, e na “Nota preliminar” escrita para a edição fac-similada de 1943). Argumentam ambos, com muita justeza, no sentido da tese que defendem. Realmente, a primeira publicação desse trabalho, em A Marmota, não traz indicação do autor nem do tradutor. Parece (deduz A. Peixoto) que, saindo n’A Marmota, houve louvores e a edição do libelo foi animada. Somente aí, repito, com a nota de “tradução do Sr. Machado de Assis”. Ora, não é hábito literário — e Machado e Paula Brito eram já profissionais da letra de fôrma — omitir o nome do autor e tornar patente o do tradutor. Tradução de que língua?3

No entanto, a pesquisa de Jean-Michel Massa (1969) sugeriu que Machado não é o autor de Queda. Na sua tese La jeunesse de Machado de Assis (1839-1870), Massa tentou investigar por que Queda foi considerada texto original do jovem Machado: Os críticos [Lúcia Miguel Pereira e Luís Viana Filho] observaram que a peça [Desencantos] retomava um tema já tratado nos treze capítulos de Queda que as mulheres têm para os tolos, texto em prosa cujo título indica sem dissimulação as clássicas intenções misóginas. Mas o raciocí3 Bibliografia de Machado de Assis. Rio de Janeiro: inl, 1955, pp. 340-2. Sousa cita Pereira a partir da terceira edição de Machado de Assis. Rio de Janeiro: José Olympio, 1946, e Peixoto a partir da “Nota preliminar”, em Machado de Assis, Queda que as mulheres têm para os tolos. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 1943, pp. v-xii (p. vi).

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nio dos críticos sobre as duas obras foi falseado por um erro. Queda foi publicado em abril-maio de 1861, nas oficinas de Paula Brito. Na página de rosto lê-se: “pequena obrinha, traduzida pelo Sr. Machado de Assis”. Apesar da evidência e num refinamento sutil, pretendeu-se ver na obra um trabalho original. Seria honroso para ele escrever, aos vinte anos, esta “sátira em prosa”, mas, por não acreditar em Machado de Assis, a crítica embarafustou por um caminho sem saída. Queda é sem a menor dúvida uma tradução, e Desencantos é uma adaptação dramática. A originalidade de Machado de Assis foi transpor a prosa satírica para a prosa cênica e, com alguns acréscimos, dela ter feito uma peça curta para o teatro.4

Na sua tese complementar, Machado de Assis, traducteur, Massa afirma que comparou a tradução com a quarta edição de De l’amour des femmes pour les sots, pertencente à Biblioteca Nacional de Paris. Ele não publicou, no entanto, um exame detalhado dos dois textos que sustentasse o seu argumento. Além disso, uma vez que apenas La jeunesse de Machado de Assis foi traduzida para o português, sua pesquisa permanece até hoje em dia pouco conhecida no Brasil.5

4 “La jeunesse de Machado de Assis (1839-1870): essai de bibliographie intellectuelle”. Tese de doutorado. Université de Poitiers, 1969. Citamos a partir da tradução para o português: A juventude de Machado de Assis (1839-1870): ensaio de biografia intelectual. Trad. Marco Aurélio de Moura Matos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971, pp. 319-20. Em “Machado de Assis traducteur” (tese complementar, 2 vols., Université de Poitiers, 1970), Massa apresenta os elementos que lhe permitem afirmar que Queda é uma tradução (vol. 1, p. 21). O livro de Lúcia Miguel Pereira é Machado de Assis. 5a ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1955, e de Vianna Filho em A vida de Machado de Assis. São Paulo: Martins, 1965. Em artigo publicado em 1979, Galante de Sousa reconhece que Queda não é texto original de Machado, baseando-se na pesquisa de Massa. Ver Galante de Sousa, “O primeiro livro de Machado de Assis”, em Machado de Assis e outros estudos. Rio de Janeiro: Livraria Editora Cátedra, 1979, pp. 21-4 (p. 24). Ver também Agrippino Grieco, Viagem em torno a Machado de Assis. São Paulo: Martins, 1969, pp. 91-2, que afirma ser difícil crer que o escritor “desse como tradução um original seu, invertendo uma tendência que é bastante brasileira”. 5 Em junho de 2008, a Editora Crisálida lançou Machado de Assis traducteur em português: Jean-Michel Massa, Machado de Assis tradutor, texto revisto e completado, tradução de Oséias Silas Ferraz, Belo Horizonte: Crisálida, 2008.

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introdução crítico-filológica

O resultado disso é que a controvérsia a respeito da autoria de Queda ainda persiste. E as edições mais tradicionais de obras de Machado de Assis vieram a fomentar ainda mais a polêmica. Por exemplo, a Obra completa da Nova Aguilar situa Queda no terceiro volume, na seção “Miscelânea”, sem nenhuma indicação de que seja uma tradução. Os editores justificam essa inclusão porque alguns trabalhos importantes de Machado de Assis não cabem facilmente nas categorias correntes: romance, conto, crônica, teatro e poesia. 6 Na edição da Jackson, Queda figura no volume Teatro desde 1938.7 Na edição da Garnier, Queda é classificada como tradução e também se encontra no volume Teatro, com advertência escrita por Mário de Alencar, que a classifica como peça teatral e não ensaio.8 Como podemos perceber, há também a informação equivocada sobre o gênero literário a que Queda pertence. Em listas mais recentes da produção literária do escritor, vemos repetido esse mesmo erro de classificação, provavelmente porque se baseiam em Mário de 6 “Abrangem esta seção [‘Miscelânea’] alguns trabalhos importantes de Machado de Assis, os quais não são facilmente classificáveis nas categorias correntes. Por esse ou aquele aspecto, ora misturando qualidades de vários gêneros, ora diferenciando-se das características tradicionalmente atribuídas a outros, esses trabalhos não se ajustam às definições comuns dos gêneros literários: artigos, ou crônicas-artigos, narrativas em versos, cartas-abertas, etc.” Obra Completa, iii. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992, p. 941. A primeira edição da obra de Machado publicada pela Aguilar saiu em 1959, e houve até o momento dez reimpressões. 7 Crônicas, xxii. Rio de Janeiro: Jackson, 1953, pp. 163-81. 8 Sobre o assunto ver Sousa 1955, pp. 341-2: “Mário de Alencar, na ‘Advertência’ ao volume Teatro (H. Garnier, 1910), por ele coligido, inclui essa [Queda...], entre as traduções de teatro perdidas, baseado, como ele próprio declara, em Sacramento Blake. A questão da autoria foi objeto de uma comunicação de Amadeu Amaral a Otávio Tarquínio de Sousa, por ocasião da transcrição na Revista do Brasil [...], alegando o primeiro que não se tratava de inédito, nem era de Machado de Assis, mas tradução. Como Otávio Tarquínio, diretor da revista, não levasse em consideração a advertência, fez Amadeu Amaral a mesma comunicação a Brício de Abreu, que, em tom repreensivo, publicou no Dom Casmurro (Rio, 19-11-1938) uma nota intitulada: ‘Um inédito de Machado de Assis que não é inédito e não é de Machado de Assis’, censurando a publicação da Revista do Brasil”.

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Alencar. São dignas de reparo a edição de Memórias póstumas de Brás Cubas (Autêntica, 1999) e a edição da Ática (2003) com trechos escolhidos de obras de Machado, nas quais Queda aparece sob “Teatro”.9 Nos livros O olhar judaico em Machado de Assis (1990), Machado de Assis, the Brazilian Pyrrhonian (1994) e Machado de Assis: memórias de um frasista (2002), Queda foi mais uma vez considerado texto original de Machado e o primeiro livro de sua carreira literária.10 Além disso, em O olhar judaico em Machado de Assis, alterou-se o título da tradução para Queda que as mulheres têm pelos tolos. Esse também é o título que figura na primeira edição da coleção de seis volumes de A literatura no Brasil, dirigida por Afrânio Coutinho (1955), na qual Barreto Filho classifica o ensaio como uma adaptação.11 Na mais recente biografia de Machado (2005), Daniel Pizza escreve que Queda é “provavelmente uma adaptação da obra do autor francês Victor Hénaux”.12 Finalmente, Ana Luiza de Andrade, em Machado de Assis: crônicas do bond (2001), Djalma Cavalcante, em Contos completos de Machado de Assis (2003), e Ubiratan Machado, em Machado de Assis: roteiro da consagração (2003), afirmam que Queda é uma tradução.13 O último deixa entretanto a palavra 9 Memórias póstumas de Brás Cubas, ed. por Letícia Malard. Belo Horizonte: Autêntica, 1999, p. 15; Machado de Assis para principiantes, ed. por Marcos Bagno. São Paulo: Ática, 2003, p. 181. 10 Anita Novinsky, O olhar judaico em Machado de Assis. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1990, p. 7; José Raimundo Maia Neto, The Brazilian Phyrronian. West Lafayette/in: Purdue University Press, 1994, p. 21; Ângela Canuto, Machado de Assis: memórias de um frasista. São Paulo: Lemos Editorial, 2002, p. 192. 11 A literatura no Brasil, iv. 6a ed. revista e atualizada. São Paulo: Global, p. 151. 12 Machado de Assis: um gênio brasileiro. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2005, p. 92. 13 Machado de Assis: crônicas de bond, ed. por Ana Luiza de Andrade. Chapecó: Argos, 2001, pp. 117-8: “1861 — [...]. Publica a tradução Queda que as mulheres têm para os tolos, primeiro na Marmota (abril-maio), mais tarde em volume, impresso também na oficina de Paula Brito”. Contos completos de Machado de Assis, ed. por Djalma Cavalcante. Juiz de Fora: Ed. da Ufjf, 2003, p. xxxii: “1861 — Publicação de Queda que as mulheres têm para os tolos, trad. de texto teatral”. Machado de Assis: roteiro

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