Vestibular Unicamp – 30 anos
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universidade estadual de campinas Reitor José Tadeu Jorge Coordenador Geral da Universidade Alvaro Penteado Crósta
Conselho Editorial Presidente Eduardo Guimarães Elinton Adami Chaim – Esdras Rodrigues Silva Guita Grin Debert – Julio Cesar Hadler Neto Luiz Francisco Dias – Marco Aurélio Cremasco Ricardo Antunes – Sedi Hirano Unicamp Ano 50 Comissão Editorial Itala M. Loffredo D’Ottaviano Eduardo Guimarães
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Organização
Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp – Comvest
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Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990. Em vigor no Brasil a partir de 2009.
ficha catalográfica elaborada pelo sistema de bibliotecas da unicamp diretoria de tratamento da informação Bibliotecária: Helena Joana Flipsen – crb-8a / 5283
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Vestibular Unicamp: 30 anos / organização: Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp – Campinas, sp: Editora da Unicamp, 2016. 1. Universidade Estadual de Campinas – Vestibular. 2. Universidades e faculdades – Vestibular. I. Universidade Estadual de Campinas. Pró-Reitoria de Graduação. Comissão Permanente para os Vestibulares.
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Índices para catálogo sistemático: 1. Universidade Estadual de Campinas – Vestibular 2. Universidades e faculdades – Vestibular
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Sumário
Apresentação.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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CAPÍTULO 1 – Um vestibular para uma universidade na vanguarda.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A criação da Comvest.. ............................................................................. Da ideia ao novo vestibular..................................................................... Definindo um perfil de aluno................................................................... Viabilizando o Vestibular.........................................................................
11 22 30 38 44
CAPÍTULO 2 – A arquitetura de um novo vestibular. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 A interação com o Ensino Médio.............................................................. Um exame baseado no raciocínio. . .......................................................... Redação................................................................................................... Língua Portuguesa................................................................................... Literaturas de Língua Portuguesa............................................................ Ciências Biológicas.. ................................................................................. História.................................................................................................... Física........................................................................................................ Geografia................................................................................................. Química.. .................................................................................................. Matemática. . ............................................................................................ Língua Estrangeira – Inglês e Francês......................................................
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Questões interdisciplinares...................................................................... 97 As provas de habilidades específicas....................................................... 99
CAPÍTULO 3 – Expansão permanente e novos horizontes. . . . . . . . . . . . 105 Qualidade x elitização............................................................................. 113 Um Vestibular para todo o país.. .............................................................. 120 As adequações às novas demandas. . ....................................................... 125 As provas. . ................................................................................................ 126 A correção das provas.............................................................................. 132
CAPÍTULO 4 – A inclusão como prioridade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139 Alternativas para incluir.. ......................................................................... 143 Os efeitos do PAAIS.. .................................................................................. 153 As reformas do PAAIS................................................................................ 164
CAPÍTULO 5 – Números de hoje projetam o futuro.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171 Delineando tendências............................................................................ 175
Referências bibliográficas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 179 Artigos, editoriais e matérias jornalísticas............................................... 180 Documentos oficiais da Unicamp............................................................ 182 Outros documentos oficiais..................................................................... 183 Entrevistas.. .............................................................................................. 183
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Apresentação
É com grande satisfação que entregamos à comunidade acadêmica da Unicamp e à sociedade, de maneira geral, o livro Vestibular Unicamp – 30 anos. A publicação é fruto de um extenso trabalho de pes quisa, coleta de dados e depoimentos, que levou meses para ser cons truída. A história do desenvolvimento de um processo seletivo próprio e diferenciado, que deu origem à criação do que hoje é a Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (Comvest) e ao Vestibular Unicamp, é contada em detalhes nas próximas páginas. Desde a motivação para que a Universidade tivesse um processo próprio e diferenciado para selecionar seus futuros estudantes de acordo com o perfil de aluno que desejava, passando pelas mudanças e ade quações promovidas no Vestibular ao longo dos anos, e chegando às perspectivas para o futuro, alinhadas com a preocupação da Unicamp em promover a inclusão social, este livro aborda todos os aspectos de cada fase. Com o passar do tempo, a Unicamp conseguiu construir um Ves tibular único e de sucesso, respeitado e reconhecido em todo o país como um dos melhores processos de seleção de estudantes no nível de Educação Superior. Ao longo desses anos, o vestibular da Unicamp cresceu muito em números: de 1.380 vagas em 1987, passou-se a 3.320 vagas em 2016; a procura pelos cursos subiu de 13.260 inscritos em 1987 para 77.768 candidatos em 2016. Nos últimos sete anos consecutivos, a Comvest vem registrando aumento no número de inscritos para o Vestibular Unicamp. Trata-se de uma história concretizada por muitas pessoas, que estão representadas neste livro: os professores que idealizaram, na década 9
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de 1980, o projeto inicial de um vestibular próprio, os reitores de cada uma das três décadas, os pró-reitores de graduação – setor ao qual pertence a Comvest –, os professores que integraram a Comvest ao longo dos anos nas diferentes coordenações, todos os coordenadores-executivos que ocuparam o cargo diretivo ao longo dos últimos 30 anos, os integrantes das bancas elaboradoras e corretoras, e obviamente todos os funcionários da Comvest e as equipes de colaboradores na aplicação e correção das provas. Foram todas essas pessoas que tornaram possível que o Vestibular Unicamp mantivesse sua marca de inovação, credibilidade e respeitabilidade em trinta anos de existência. O presente livro é, portanto, um importante e fundamental registro da memória da nossa Unicamp, o qual servirá de referência para as futuras gerações. Nós, da Comvest, esperamos que a leitura seja agradável e relevante! Edmundo Capelas de Oliveira Coordenador-executivo da Comvest (2013-2017)
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Capítulo 1
Um vestibular para uma universidade na vanguarda
Em 2016, a Unicamp atingiu uma marca histórica: 47,6% dos ingressantes cursaram o Ensino Médio em escolas públicas, proporção nunca antes obtida na Universidade. Dos 3.243 estudantes matriculados, 1.543 eram egressos do sistema público de ensino. Além disso, considerando este último universo, a quantidade de alunos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas matriculados neste ano dobrou em relação ao ano anterior, 16,1% (523 matriculados). Esse resultado representa a materialização de um dos principais objetivos que começou a ser perseguido 30 anos atrás, em meados da década de 1980, quando a Unicamp decidiu criar seu próprio vestibular: a promoção da inclusão social. Naquela época, o Vestibular Unicamp era realizado pela Fundação Universitária para o Vestibular (Fuvest), que adotava um modelo de seleção baseado em provas com questões de múltipla escolha, formuladas a partir do conteúdo curricular das disciplinas do Ensino Médio1. Esse tipo de vestibular, predominante no Brasil desde a década de 1960, estava sendo questionado e debatido por professores da Unicamp. A percepção era a de que ele exercia uma influência negativa sobre as etapas anteriores à Educação Superior, além de enfatizar aspectos não fundamentais para o perfil de aluno desejado pela Unicamp2. 1 A Unicamp foi incluída no vestibular da Fuvest a partir do processo seletivo de 1977, conforme Ofício GR 735-76, de 28/6/1976. 2 O Primeiro e o Segundo Graus correspondem, respectivamente, ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBN) em vigor desde 1996. Ao longo deste livro, será adotada a terminologia atual nas referências a esses níveis de ensino, exceto nos documentos transcritos.
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Nesse contexto, em 15 de outubro de 1985, o professor Rubem Alves, assessor especial para Assuntos de Ensino da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), enviou um ofício ao reitor José Aristodemo Pinotti solicitando a criação de uma comissão para estudar alternativas ao processo seletivo de alunos para a Universidade: Os exames vestibulares, longe de serem simples exames de entrada, são fatores que têm determinado, em grande medida, as linhas de desenvolvimento da nossa educação, nos 1ºs e 2ºs graus, cristalizando e institucionalizando uma série de deformações que vão desde o estreitamento do interesse dos jovens e o desperdício da inteligência até a injusta seleção preliminar que elimina as classes menos favorecidas. Considerando que é inevitável que haja um processo de seleção daqueles que vão ingressar em nossas universidades, é necessário não nos esquecermos de que há muitas alternativas ainda não exploradas de se fazer isto, e que po deriam ser investigadas e sugeridas pela Unicamp. Assim sendo, vai um pedido a V. Magnificência no sentido de nomear uma comissão que se dedique a fazer estudos e apresentar sugestões e alternativas aos atuais exames vestibulares3.
Cerca de um mês depois da solicitação do assessor especial, no dia 18 de novembro de 1985, foi criada a Comissão Especial para o Estudo de Alternativas aos Exames Vestibulares na Unicamp4. Composta pelos professores Carlos Alfredo Arguello (Instituto de Física Gleb Wathagin – IFGW), Anésio dos Santos Junior (Faculdade de Engenharia Elétrica e Computação – FEEC), Elza Cotrim Soares (Faculdade de Ciências Médicas – FCM), Newton Cesar Balzan (Faculdade de Educação – FE), Raul Thomas de Oliveira do Valle (Instituto de Artes – IA) e Niuvenius Junqueira Paolli (Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – IFCH), além do próprio Rubem Alves, o grupo teria 90 dias de prazo para estudar alternativas para o processo seletivo de ingressantes na Unicamp5.
3 Oficio 29/85 da Assessoria Especial para Assuntos de Ensino (AEAE), 15/10/1985. 4 Portaria GR 291/1985, 18/11/1985. 5 Idem.
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Os primeiros vestibulares A Unicamp realizou seu primeiro vestibular em 1961, quando ofertava um único curso, o de Medicina, que funcionava provisoriamente nas dependências da Maternidade de Campinas. Na época, 1.654 candidatos disputaram as 50 vagas. Ao longo da década, com a implantação de novos cursos, passaram a ser realizados vestibulares específicos para cada um ou para um grupo deles. Na primeira metade da década de 1970, os vestibulares para a Unicamp eram realizados pela Fundação Carlos Chagas, que mantinha o Cescem (seleção para medicina e ciências biológicas); Mapofei (seleção para a área de exatas) e Cescea (seleção para a área de humanas), conforme normas aprovadas pelo Conselho Diretor da Universidade. Essas instituições tinham o encargo de realizar o exame de seleção de candidatos até a matrícula, o que abrangia a inscrição de candidatos, elaboração das provas, realização dos exames, apuração dos resultados e seleção final. O exame era composto por provas escritas das seguintes disciplinas: Matemática, Física, Química, Biologia, Português e Inglês. Nenhuma prova era eliminatória. Em 1976, foi firmado convênio entre a Unicamp e a recém-criada Fuvest, que assumiu os vestibulares das universidades estaduais do estado de São Paulo a partir de 19776.
6 Gomes, 2007, p. 36.
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Reprodução de portaria que designou grupo para estudar alternativas ao vestibular.
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Eram duas as críticas principais aos vestibulares que circulavam na comunidade acadêmica da Unicamp na década de 1980. De um lado, como já sinalizado, seu impacto negativo sobre o currículo da Educação Básica, ou seja, “os efeitos deformadores sobre toda a educação de primeiro e segundo graus”7, traduzida nos seguintes termos por Rubem Alves: Em termos práticos, os professores anônimos, preparadores dos exames vestibulares, passaram a ser aqueles que ditam os conteúdos curriculares das nossas escolas, porque tudo se orienta no sentido de se tem a ver com o vestibular ou não. A ideia de se educar pelo prazer de se educar, a alegria da descoberta, o cultivo da curiosidade livre, tudo isso se destrói quando a única coisa que importa é passar no vestibular8.
De outro lado, esses exames eram considerados socialmente injustos: devido à acirrada concorrência, os vestibulares haviam se tornado com plexos e difíceis, exigindo dos alunos a memorização de uma grande quantidade de informações e conteúdos relacionados às disciplinas avaliadas em provas com questões de múltipla escolha. Esse tipo de prova predominava desde os anos 1960, por influência da legislação e também por causa da disputa pelas vagas9. Essas características exigiam dos candidatos uma extensa e detalhada preparação para os exames, muitas vezes inacessível aos estudantes mais pobres e que frequentavam as escolas públicas. Por isso, entendia-se que estes eram prejudicados frente aos alunos dos colégios privados e dos cursinhos preparatórios para o vestibular. Nesse sentido, apontava Rubem Alves, “em termos práticos, a verdadeira Primeira Fase era decidida por motivos econômicos”10:
7 Ofício Circular AEAE 1/1986, 6/1/1986. 8 Idem. 9 Vianna, 1986. 10 Ofício Circular AEAE 1/1986, 6/1/1986.
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Candidatos de famílias de recursos econômicos reduzidos estavam, de início, reprovados. Não tinham nem os recursos para frequentar as melhores escolas particulares, nem o tempo livre para se dedicar ao estudo, e nem o dinheiro para pagar os cursinhos [...]11.
O debate na Unicamp não se dava de maneira isolada dentro do contexto do ensino superior brasileiro; alinhava-se com certos segmentos do meio educacional que tinham um posicionamento contrário ao caráter excessivamente seletivo dos vestibulares, num contexto em que a demanda por vagas era significativamente maior do que a oferta12. Paralelamente, circulava um discurso de defesa de uma reforma dos currículos e das metodologias adotadas nas escolas primárias e secundárias, as quais estariam excessivamente voltadas para o vestibular, moldando o currículo e as práticas pedagógicas ao objetivo de formar estudantes capazes de ultrapassar a barreira do ingresso no ensino superior.
Candidatos fazem prova – Vestibular 1987.
11 Idem. 12 Franco, 1985.
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As políticas para a Educação Superior Desde a década de 1960, o descompasso entre a demanda e a oferta de vagas na Educação Superior colocava-se como um desafio para as políticas educacionais. Na época, a forte pressão por Educação Superior, num contexto de crescimento da população jovem brasileira, deu origem aos chamados “excedentes” – ou seja, candidatos que passavam no vestibular, mas que não conseguiam se matricular, pois o número de aprovados ultrapassava o de vagas13. Esse cenário foi o mote para políticas governamentais, tais como a Reforma Universitária de 1968 (lei n. 5.540/1968), que estabeleceu uma série de normas de organização e funcionamento da Educação Superior no Brasil, entre elas a definição do vestibular como o meio de admissão na Educação Superior. Além disso, a Reforma instituiu o vestibular unificado e classificatório: ou seja, a realização de provas com conteúdo idêntico para todos os cursos ou áreas de conhecimentos afins – seguindo o modelo que vigorava em São Paulo desde 1965 para seleção de candidatos para a área de Biomédicas, Cescem, ligado à Fundação Carlos Chagas. No contexto da Reforma, surgiram o Cescea e o Mapofei, entre outros exames unificados. Também segundo a nova legislação, os vestibulares deveriam respeitar o tipo de conhecimento e o grau de complexidade do ensino secundário. Em meados dos anos 1970, o vestibular unificado começou a se esvaziar e foi flexibilizado, abrindo espaço para que as instituições de ensino superior adotassem modelos próprios de seleção. Paralelamente, a Redação tornou-se obrigatória no vestibular e a legislação passou a admitir a possibilidade da realização de provas dissertativas14.
13 Braghini, 2014. 14 Vianna, 1986.
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Um marco nesse movimento foi o Seminário Nacional sobre Ves tibular, realizado pelo Ministério da Educação (MEC) no mês de novembro de 1985, em Brasília. A ideia inicial do governo era discutir um novo formato para os vestibulares, mas não houve consenso entre os participantes do evento, o que abriu campo para as instituições de ensino superior realizarem experiências e desenvolverem processos seletivos próprios, capazes de aprimorar os mecanismos de ingresso no ensino superior. Naquele momento, em que a Unicamp já começava a se mobilizar para mudar seu vestibular, as discussões em nível nacional favoreceram o processo interno da Universidade, fortalecendo o argumento da necessidade de um novo vestibular e, mais do que isso, da relevância de se buscar alternativas ao vestibular tradicional. Paralelamente ao questionamento sobre o formato de vestibular pre dominante nos anos 1980, a proposta de criação de um vestibular inde pendente para a Unicamp também estava associada a um debate interno da Universidade: o perfil de aluno que a instituição desejava receber. Nesse sentido, o debate traduzia uma inquietação de parcelas do corpo docente da Universidade, que percebia a necessidade de atrair um aluno diferente daquele que estava sendo selecionado por meio do processo seletivo realizado pela Fuvest. Esse debate remontava ao começo da década de 1980, motivando análises e discussões sobre a temática no âmbito da Câmara Curricular da Unicamp. No ano de 1980, chegou a ser constituída uma comissão para estudar a possibilidade de a Universidade se desligar da Fundação, realizando seu próprio vestibular, mais condizente com o que cada “unidade dessa Universidade espera dos alunos ingressantes”15. Em março do ano seguinte, o Conselho Diretor da Unicamp aprovou a criação de grupos 15 A decisão consta da ata da 210ª reunião da Câmara Curricular, realizada em 10 de abril de 1980: “Em paralelo, foi constituída uma comissão composta pelos professores Eduardo Sebastiani Ferreira, José Merzel, Paulo Friedrich Buhrnheim, Newton Cesar Balzan, que iniciará estudos visando a possibilidade da Universidade se desligar da Fuvest e efetuar seu próprio Concurso Vestibular, objetivando realizar as provas de acordo com cada Área, a fim de tornar o exame mais condizente com que cada Unidade dessa Universidade espera dos alunos ingressantes [...]”.
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de trabalho nas unidades de ensino, com participação de alunos, para analisar a possibilidade de a Universidade realizar seu próprio processo seletivo16. “Existia uma vontade de criar um vestibular próprio da Unicamp porque havia uma insatisfação generalizada em relação à maneira como os alunos que chegavam à Universidade estavam lidando com o conhe cimento”17, conta Maria Bernadete Abaurre, que era professora do Ins tituto de Estudos da Linguagem na época e acompanhou as discussões sobre a criação do Vestibular Unicamp. Posteriormente, ela assumiria a Coordenadoria Acadêmica do Vestibular Unicamp (1986 a 1996) e a Coordenação Executiva da Comissão Permanente para os Vestibulares (Comvest), entre 1998 e 2002. Maria Bernadete relata que, inicialmente, as discussões se concentravam num grupo de professores e que, a partir da criação da Comissão Especial para o Estudo de Alternativas aos Exames Vestibulares, a ideia ganhou força e passou a ser amplamente debatida. O depoimento do professor Marco Antonio Fiori Scarparo, que na época pertencia ao quadro de docentes do Instituto de Física e posteriormente assumiria a Coordenação de Logística da Comvest, entre 1986 e 1994, reforça a percepção de que o debate sobre o vestibular se relacionava com a necessidade de a Unicamp atrair um determinado perfil de aluno. “A ideia partiu de um grupo de professores, em função do fato de que o vestibular não estava agradando, pois não selecionava os can didatos da maneira como gostaríamos”18, diz Scarparo. Segundo ele, havia uma percepção de que faltava criatividade aos estudantes, caracte rística importante para uma universidade como a Unicamp, cujo dife rencial, desde sua fundação, sempre foi a excelência na pesquisa. Desse modo, entendia-se que o vestibular, enquanto mecanismo de seleção dos ingressantes na graduação podia desempenhar um papel relevante no sentido de atrair estudantes mais afinados com a Universidade. 16 Informação SG-I 337/1981, 23/4/1981. 17 Entrevista com Maria Bernadete Marques Abaurre, 2015. 18 Entrevista com Marco Antonio Fiori Scarparo, 2015.
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“O pesquisador é um profissional e para isso é preciso desde logo desenvolver no aluno de graduação o interesse e a vocação para as carreiras voltadas para a pesquisa no mundo acadêmico ou fora dele. Portanto, era preciso atrair um determinado tipo de aluno e criar um cenário em que o vestibular fosse tratado como parte integrante do processo de ensino e de pesquisa. É isso que se fez”19, analisa o então professor do Instituto de Estudos da Linguagem Carlos Vogt, vice-rei tor da Unicamp entre 1986 e 1990 e, depois, reitor no período 1990-1994. Apesar da percepção quanto à necessidade de a Unicamp criar seu processo seletivo, a decisão de levar a proposta adiante amadureceu a partir de 1985, conforme o debate interno na Universidade se aprofundou. Nesse processo, o educador Rubem Alves teve um papel fun damental, especialmente durante seu período à frente da Assessoria Especial de Assuntos de Ensino, difundindo a proposta e o debate por meio de um informativo chamado “Sabor Saber”, bem como de reu niões informais e oficiais com professores e representantes dos cursos de graduação. Depois de uma série de encontros informais, em fevereiro de 1986, ocorreu uma reunião decisiva com os coordenadores de graduação, promovida pela Assessoria e coordenada pelos professores Carlos Alfredo Arguello (IFGW) e Elza Cotrim Soares (FCM). Eram dois os ob jetivos dos encontros, como se lê em documento da Assessoria: Primeiro: Estabelecer aquilo que gostaríamos que fosse fundamental, no processo seletivo dos estudantes. Que é que desejamos avaliar? Quantidade de informações acumuladas? Capacidade de resolver problemas-padrão? (O melhor seria dizer: resolver exercícios, porque um problema real é algo para que ainda não há resposta padronizada.) Em resumo: desta reunião teríamos de tirar uma filosofia para os vestibulares. [...] Segundo: Estabelecer os caminhos práticos para a viabilização de tal filosofia, numa articulação com pessoas com experiência na área de exames de seleção de tal envergadura, e em contatos com outras instituições de ensino20.
19 Entrevista com Carlos Vogt, 2015. 20 Ofício Circular AEAE 1/1986, 6/1/1986.
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