Utopias comuns em mĂşltiplas fronteiras
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Aníbal Francisco Alves Bragança
Renata Flavia da Silva (organizadora)
Utopias comuns em mĂşltiplas fronteiras: Ensaios sobre literaturas africanas de lĂngua portuguesa
Copyright © 2016 Renata Flavia da Silva Copyright © 2017 Eduff – Editora da Universidade Federal Fluminense Série Pesquisas, 7
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Sumário
Apresentação 7 Fronteiras e identidades no plural: das demarcações políticas aos comunitarismos supranacionais 11 Benjamin Abdala Júnior Redes afetivas, teias de cooperação: política e literatura nos contextos de língua portuguesa 27 Alexandre Montaury Baptista Coutinho Do silêncio à construção de uma memória feminina das guerras em África 41 Laura Cavalcante Padilha Em busca de uma memória (des)colonial: escritoras africanas na zona de contato 55 Simone Pereira Schmidt Trocas narrativas, ou utopias pós-coloniais 69 Maria Geralda de Miranda Algumas masculinidades nas literaturas africanas de língua portuguesa 83 Mário César Lugarinho Uanhenga Xitu e o “feitiço” de narrar 99 Carmen Lucia Tindó Ribeiro Secco No improviso da diáspora: o jazz como exemplo de afirmação 111 Otávio Henrique Rodrigues Meloni
“Tudo arrasta consigo, como uma sombra, o seu contrário”: sobre o O olho de Hertzog, de João Paulo Borges Coelho 127 Silvio Renato Jorge A ausência enquanto silêncio ou a invisível transformação: reflexões sobre Campo de trânsito, de João Paulo Borges Coelho 141 Roberta Guimarães Franco Um anel na areia: a leveza de/em uma estória de amor 155 Renata Flavia da Silva Convicções utópicas e reconfigurações heterotópicas (o caso da literatura angolana) 171 Inocência Mata Notas biográficas 185
Apresentação
Olharam-se ambos. O olhar dizia as mesmas palavras do amigo que ensinava a ler, que ensinava a não ter medo. [...] Palavras que faziam de todos os portos do mundo, portos de todo o mundo. Luandino Vieira1 Luandino Vieira, no último conto do livro A cidade e a infância, intitulado “Companheiros”, nos dá uma imagem exemplar, tradutora de uma das mais caras utopias igualitárias: a possibilidade de diferentes olhares serem capazes de dizer as mesmas palavras, e essas mesmas palavras capazes de fazer de todo o mundo um só mundo, onde todos fossem iguais. Esperança num mundo outro, mais solidário, menos adverso. As utopias estiveram presentes na produção literária africana em língua portuguesa ao longo de várias décadas, antecipando, na literatura, a desejada libertação. Quarenta anos após as independências das ex-colônias portuguesas na África, as imagens utópicas de outrora ainda se fazem presentes, porém, com novas roupagens e em novas articulações. A esse permanente anseio por transformação e emancipação respondem antigas e novas obras literárias, lidas ou (re)lidas, aqui, por pesquisadores brasileiros e estrangeiros dedicados aos estudos das literaturas africanas. Utopias comuns em múltiplas fronteiras: ensaios sobre literaturas africanas de língua portuguesa reúne 12 artigos acerca de obras de grandes nomes das literaturas de Angola, Cabo Verde, 1
VIEIRA, Luandino. A cidade e a infância. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 98.
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uiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe, relacionanG do-as às condições culturais e políticas contingenciadoras de suas produções. Os textos articulam a análise das estratégias discursivas utilizadas à criação de um espaço comum de partilha e afirmação das identidades, unindo os deslocamentos do eixo utópico da luta anticolonial ao estudo das fronteiras espaciais e discursivas. Abrindo esta série de ensaios, os textos “Fronteiras e identidades no plural: das demarcações políticas aos comunitarismos supranacionais”, de Benjamin Abdala Júnior, e “Redes afetivas, teias de cooperação: política e literatura nos contextos de língua portuguesa”, de Alexandre Montaury Baptista Coutinho, exploram as redes de sociabilidade e solidariedade tecidas, ou ainda por tecer, no macrossistema da língua portuguesa ao longo dos processos históricos de colonização e descolonização, sem com isso perder de vista as múltiplas fronteiras internas desta zona de contato e os traços identitários que a compõem. Partilhando histórias de luta e resistência contra a dominação colonial, dois textos articulam múltiplos espaços dessa comunidade em língua portuguesa, privilegiando a figura feminina por tanto tempo subalternizada. Os textos “Do silêncio à construção de uma memória feminina das guerras em África”, de Laura Cavalcante Padilha, e “Em busca de uma memória (des) colonial: escritoras africanas na zona de contato”, de Simone Pereira Schmidt, debruçam-se sobre a produção de obras que extrapolam a ordem do literário, articulando lembranças de utopias e guerras passadas a desejos sempre presentes de libertação e de afirmação. Analisando discursos históricos e os recortes empreendidos por escritores de diferentes países, os textos “Trocas narrativas, ou utopias pós-coloniais”, de Maria Geralda de Miranda, e “Algumas masculinidades nas literaturas africanas de língua portuguesa”, de Mário César Lugarinho, dialogam sobre a necessidade de (re)formulação das identidades culturais e históricas a partir de novas bases de interpretação, de novos paradigmas e horizontes discursivos, capazes de desestabilizar fronteiras como as de nacionalidade ou de gênero. A multiplicidade de estratégias discursivas utilizadas para afirmação de posicionamentos políticos e identitários é 8
tema de textos como “Uanhenga Xitu e o ‘feitiço’ de narrar...”, de Carmen Tindó Ribeiro Secco, e “No improviso da diáspora: o jazz como exemplo de afirmação”, de Otávio Henrique Rodrigues Meloni, ambos destacando o esgarçamento das fronteiras, externas ou internas às nações, na construção de um discurso próprio e reivindicativo. Dois artigos se dedicam à análise da obra do moçambicano João Paulo Borges Coelho, “‘Tudo arrasta consigo, como uma sombra, o seu contrário’: sobre o O olho de Hertzog, de João Paulo Borges Coelho”, de Silvio Renato Jorge, e “A ausência enquanto silêncio ou a invisível transformação: reflexões sobre Campo de trânsito, de João Paulo Borges Coelho”, de Roberta Guimarães Franco, trazendo olhares críticos sobre os silenciamentos e sobre a tentativa de coletivização a que o ideário utópico do passado levou a nação moçambicana. Ainda explorando as impossibilidades e contingências históricas, o texto “Um anel na areia: a leveza de/em uma estória de amor”, de Renata Flavia da Silva, aborda a necessidade do deslocamento de perspectivas, de uma reconfiguração espacial que possibilite a harmonização dos campos de força da tradição e da modernidade na contemporaneidade angolana. Por fim, o ensaio “Convicções utópicas e reconfigurações heterotópicas”, de Inocência Mata, recupera a natureza da imaginação utópica, na literatura angolana, ao longo das várias décadas que antecederam e sucederam a independência, sintetizando a construção de uma utopia libertária no espaço colonial de língua portuguesa e sua consequente reformulação nos dias atuais, em busca da verdadeira revolução, da libertação de todos os povos e da construção de um espaço verdadeiramente comum e solidário. Este livro pretende ser um convite à leitura de obras que testemunham a transformação de antigas utopias e o permanente desejo de ultrapassar as fronteiras. Um dia virá... Renata Flavia da Silva
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