Revista Jovens Pesquisadores Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC Pr贸-Reitoria de Pesquisa e P贸s-Gradua莽茫o
EDITORA DA UNISC
Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 1-133, 2012
Comissão de avaliação
Reitor Vilmar Thomé Vice-Reitor Eltor Breunig Pró-Reitora de Graduação Carmen Lúcia de Lima Helfer Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Rogério Leandro Lima da Silveira Pró-Reitor de Administração Jaime Laufer Pró-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento Institucional João Pedro Schmidt Pró-Reitora de Extensão e Relações Comunitárias Ana Luisa Teixeira de Menezes EDITORA DA UNISC
Profª. Ana Zoe Schiling da Cunha Profª. Andrea Lúcia Gonçalves da Silva Prof. Andreas Köhler Prof. Eduardo Alexis Lobo Alcayaga Profª. Hildegard Pohl Profª. Lisianne Brittes Benites Profª. Fabiana Piccinin Profª. Heleniza Ávila Campos Profª. Mônia Clarissa Hennig Leal– Bolsista Produtividade CNPq Prof. Pedro Lúcio de Souza Prof. Carlos alberto Mello Moyano Prof. Janrie Rodriguez Reck Profª. Mônica Elisa Dias Pons Profª. Betina Hillesheim Profª. Rosângela Gabriel Prof. Jerto Cardoso da Silva Profª. Nize Maria Campos Pellanda Prof. Ênio Leandro Machado Profª. Rosa Maria Fillipozzi Martini Prof. Sérgio Schaefer Profª. Angela Radünz Lazzari Prof. Valeriano Antonio Corbelinni Prof. Jorge André Ribas Moraes Profª. Márcia e Jochmis Kniphoff da Cruz
Editora Helga Haas
Editores
Andreia Rosane de Moura Valim Fabiane Ramos Jungblut Rogério Leandro Lima da Silveira
R454
Revista jovens pesquisadores [recurso eletrônico] / Universidade de Santa Cruz do Sul, Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação. - n. 2 (2011) – Dados eletrônicos – Santa Cruz do Sul : EDUNISC, 2011. Dados eletrônicos. Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader Modo de acesso: World Wide Web:<http://www.unisc.br/edunisc> 1. Pesquisa – Periódicos. I. Universidade de Santa Cruz do Sul. Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação. CDD: 001.4
Bibliotecária : Bibliotecária Jorcenita Alves Vieira CRB – 10/1319
Avenida Independência, 2293 Fones: (51) 3717-7461 e 3717-7462 - Fax: (051) 3717-7402 96815-900 - Santa Cruz do Sul - RS E-mail: editora@unisc.br - www.unisc.br/edunisc
SUMÁRIO APRESENTAÇÃO Rogério Leandro Lima da Silveira, Andréia Rosane de Moura Valim, Fabiane Ramos Jungblut ........................................................................................................... 5 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 6 ÁREA DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE ANÁLISE DO PERFIL FITOQUÍMICO DE TRIPODANTHUS ACUTIFOLIUS (RUIZ & PAVÓN) TIEGHEM, LORANTHACEAE Juliana Maria Grüner (PUIC/UNISC), Thaís Klein de Souza (PUIC/UNISC), Lisianne Brittes Benitez, Chana de Medeiros da Silva ............................................................................. 9 AVALIAÇÃO DE DANO NO DNA EM PORTADORES DE DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA PELO ENSAIO COMETA Helen Tais da Rosa (PROBIC/FAPERGS), Andréa Lúcia Gonçalves da Silva, Martiele Bizarro, Eduarda Bender, Paulo Ricardo da Rosa, Anelise Araújo, Clara Forrer Charlier, Lia Possuelo, Dinara Jaqueline Moura, Andréia Rosane de Moura Valim, João Antonio Pegas Henriques ...................................................................................................................... 18 ANÁLISE GENOTÓXICA DE EFLUENTE DE LAVANDERIA HOSPITALAR: ENSAIO COMETA COM DAPHNIA MAGNA STRAUS, 1820 Fernanda Fleig Zenkner (PROBIC/FAPERGS), Camila Gonçalves Athanásio (PROBIC/FAPERGS), Joel Henrique Ellwanger, Daniel Prá, Alexandre Rieger, Eduardo Alexis Lobo Alcayaga ............................................................................................................... 29
ÁREA DE CIÊNCIAS EXATAS DA TERRA E ENGENHARIAS AVALIAÇÃO DE BLOCOS CERÂMICOS DE VEDAÇÃO SEGUNDO NBR 15.270 Marcus Daniel Friederich dos Santos, Elise De Conto, Cândida Angelim, Fernanda Herberts (PUIC/UNISC), Victória Pereira Freitas ...................................................................... 38 JOGO COMPUTACIONAL PARA APOIO A PESSOAS COM PARALISIA CEREBRAL Jorlei Luis Baierle (PIBITI/CNPq), Rejane Frozza, Beatriz Lux ................................................... 50
MÉTODOS PARA A REMOÇÃO DE SULFETO DE HIDROGÊNIO DE EFLUENTES GASOSOS APLICÁVEIS A REATORES ANAERÓBIOS Mateus da Silva Szarblewski (PIBIC/CNPq), Rosana de Cassia de Souza Schneide, Enio Leandro Machado ........................................................................................................... 62
ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS A ESCRAVIDÃO E OS FOCOS DE RESISTÊNCIA EM RIO PARDO Maximiliano Meyer (PUIC/UNISC), Roberto Radünz, Olgário Paulo Vogt .............................. 76 A LINGUAGEM ESCRITA E A APRENDIZAGEM NA ACADEMIA Angela Alenice Rothmund (PROBIC/FAPERGS), Felipe Gustsack, Simone Wilgen ................... 89 VÍNCULOS FAMILIARES E SOCIAIS NAS RELAÇÕES DOS IDOSOS Cíntia Kroth Araújo (PUIC/UNISC), Claudia Maria Corrêa Cardoso (PIBIC/CNPq), Etiane Pereira Moreira(PIBIC/CNPq),Evelin Wegner, Silvia Virginia Coutinho Areosa .................................... 97
ÁREA DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE VIRTUALIZAÇÃO DOS WEBSITES DOS GOVERNOS MUNICIPAIS DO VALE DO RIO PARDO Débora da Rocha Hoff (PROBIT/FAPERGS), Rosana Klafke, Douglas Wegner ....................... 109 MÍDIA E IDENTIDADE – O REGIONAL NO JORNAL NACIONAL Nairo Luiz Orlandi, Carolina Junqueira Lopes (PROBIC/FAPERGS),Ângela Cristina Trevisan Felippi, Fabiana Quatrin Piccinin ...................................................................................................... 122
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APRESENTAÇÃO A Universidade de Santa Cruz do Sul, através da Pró-Reitoria de Pesquisa e PósGraduação, lançou em 2011 a primeira edição da Revista Jovens Pesquisadores - uma modalidade de premiação que proporciona a divulgação e disseminação das atividades de pesquisa realizadas pelos nossos alunos de Graduação, sobre as diferentes áreas temáticas, abordagens teóricas e referenciais metodológicos envolvendo pesquisas variadas e atuais inerentes ao fazer científico e às demandas da sociedade. Com isso é com muita satisfação que apresentamos a segunda edição da Revista Jovens Pesquisadores, da Universidade de Santa Cruz do Sul, com o objetivo de valorizar e divulgar as atividades de pesquisa desenvolvidas pelos nossos alunos bolsistas de iniciação científica junto aos projetos de pesquisa coordenados pelos professores da Universidade, ofertando à comunidade acadêmica e ao público em geral, um conjunto de artigos que destacam o dedicado trabalho de nossos bolsistas de iniciação científica. Esse veículo de divulgação científica da UNISC, mais uma vez procura divulgar os trabalhos destaques anual do Seminário de Iniciação Científica da Universidade, onde se reconhece e valoriza os trabalhos de alunos das várias modalidades de bolsa de iniciação científica que participam anualmente do nosso evento. A publicação da Revista Jovens Pesquisadores reforça a importância e o reconhecimento do trabalho de iniciação científica realizada pelos nossos alunos de graduação. A Universidade tem o compromisso de proporcionar a inserção do aluno no meio científico, através da prática de pesquisa e da vivência entre atividades acadêmicas de graduação e de pós-graduação, possibilitando-lhe a capacidade de construir uma nova relação com os conteúdos/temas abordados durante sua formação acadêmica. A participação e o envolvimento dos alunos no cotidiano da pesquisa, a vivência na aplicação prática dos referenciais teóricos e metodológicos, a valorização do que já sabe, e as conexões entre os diversos saberes disciplinares, ampliam as possibilidades de qualificação da formação acadêmica na perspectiva da construção do conhecimento científico. O aluno de iniciação científica é estimulado a interagir com os pesquisadores e a participar de grupos de pesquisa e de atividades dos programas de pós-graduação stricto sensu, permitindo-lhe viver a experiência da formação científica e profissional, e oportunizando-lhe, assim, melhores condições para sua evolução como pesquisador e como cidadão. A presente Revista se insere assim nesse compromisso institucional da UNISC de valorização da iniciação científica, enquanto importante momento no desenvolvimento do pensamento científico dos estudantes dos cursos de graduação da Instituição, além de contribuir decisivamente na formação qualificada de recursos humanos para a pesquisa, preparando-os para o ingresso na pós-graduação. Rogério Leandro Lima da Silveira Pró-Reitor de Pesquisa e de Pós-Graduação Andréia Rosane de Moura Valim Coordenadora de Pesquisa Fabiane Ramos Jungblut Assessora de Pesquisa da PROPPG
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INTRODUÇÃO O presente número da revista Jovens Pesquisadores refere-se aos doze trabalhos de pesquisa de alunos de graduação agraciados com Prêmio Destaque do Ano na Iniciação Científica em 2011, e que foram apresentados durante o XVII SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, promovido pela Universidade de Santa Cruz do Sul entre os dias 24 e 28 de outubro de 2011. Tal evento teve por objetivo a integração dos pesquisadores docentes, estudantes de graduação e pós-graduação. Através desse evento foi divulgada a produção acadêmica, resultante das atividades de pesquisa desenvolvidas pelos alunos bolsistas que integram os Programas de Iniciação Científica da UNISC e de outras Instituições de Ensino Superior. Paralelo ao evento de divulgação das atividades desenvolvidas pelos bolsistas ocorreu a realização do prêmio Destaque do Ano na Iniciação Científica – UNISC valorizando os melhores trabalhos nas quatro grandes áreas do conhecimento, quais sejam Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Exatas da Terra e Engenharias e Ciências Biológicas e da Saúde, resultando nesta publicação dos artigos como instrumento de divulgação além dos muros da Universidade de forma equilibrada entre as áreas. O processo de avaliação e seleção dos trabalhos envolveu uma análise inicial realizada por uma Comissão Científica Avaliadora composta por docentes da Instituição com experiência em atividades de pesquisa e em orientação de Iniciação Científica, bem como docentes externos reconhecidos pelas suas atividades de pesquisa e com bolsa produtividade do CNPq. Os trabalhos foram selecionados em três etapas, a primeira delas relacionada à avaliação do resumo inscrito no XVII Seminário de Iniciação Científica, com base nos seguintes critérios: a) capacidade de síntese, clareza, correção e adequação à linguagem acadêmica; b) apresentação dos objetivos, da metodologia, dos resultados parciais ou finais; e c) apresentação de conclusões e/ou resultados adequados. A segunda etapa de avaliação se deu por ocasião da apresentação oral dos trabalhos, onde foram avaliados: a) capacidade de comunicação, clareza e adequação à linguagem acadêmica; b) apresentação dos objetivos, da metodologia e dos resultados parciais ou finais e de conclusões; c) domínio do conteúdo; e d) adequação ao tempo disponível. A terceira etapa de avaliação constitui-se da sistematização da pontuação atribuída nas etapas 1 e 2 e foi realizada por Comissão Interna da PROPPG. Como resultado das avaliações foram definidos os doze trabalhos agraciados com o Prêmio Destaque na Iniciação Científica UNISC entre 228 trabalhos selecionados para o evento. A divulgação dos trabalhos selecionados foi realizada no último dia do evento, sendo que os autores dos trabalhos selecionados foram surpreendidos por atores caracterizados como Albert Einsten, Monalisa, Charles Darwin, Karl Marx e em solenidade cultural no Centro de Convivências da UNISC. Na divulgação, os acadêmicos que se destacaram no evento, receberam menção Honrosa do Reitor da Universidade. Nesta ocasião foi comunicada a publicação da edição 01/2012 da Revista Jovens Pesquisadores divulgando os trabalhos selecionados. Os autores dos doze trabalhos selecionados foram convidados a construir um artigo sobre o tema de pesquisa apresentado no XVII Seminário de Iniciação Científica. A Comissão Científica Avaliadora analisou os artigos científicos, que retornaram aos autores para apreciação das sugestões e apresentação de versão final. Destaca-se que a publicação dos trabalhos selecionados no XVII Seminário de Iniciação Científica da UNISC no formato de artigo é uma forma importante de divulgação da produção científica produzida pelos acadêmicos e docentes que integram os Programas de Iniciação Científica da Universidade, possibilitando a socialização do que é produzido na instituição colaborando para o avanço da ciência bem como uma forma de reforçar o intercâmbio entre pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, no âmbito da UNISC e de outras Instituições de Ensino Superior do Estado do Rio Grande do Sul. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 1-133, 2012
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Ressalta-se o esforço institucional para a divulgação científica realizada pelos bolsistas, pesquisadores e grupos de pesquisas, bem como a participação efetiva dos membros da Comissão Científica Avaliadora. Agradecemos a participação de todos os orientadores e estudantes que participaram do XVII Seminário de Iniciação Científica, bem como o apoio que a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul – FAPERGS e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq. Esta publicação irá promover a divulgação da produção científica realizada na Universidade, e assim também possibilitar maiores e melhores condições para o desenvolvimento de novas ações de cooperação científica e tecnológica com outras instituições no país e no exterior. A seguir destaca-se por área do conhecimento, as principais modalidades dos trabalhos inscritos no XVII Seminário de Iniciação Científica. Destaca-se que entre os 228 trabalhos selecionados, 31% foram da área de ciências biológicas e da saúde, 29% da área de ciências exatas, da terra e engenharias, 22% da área de ciências humanas e 18% da área de ciências sociais aplicadas e dados apresentados na Figura 01. Figura 01 - Classificação dos trabalhos selecionados para o XVII Seminário de Iniciação Científica por área do conhecimento.
Fonte: Coordenação de Pesquisa, UNISC, outubro de 2011.
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ÁREA DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE Na área de Ciências Biológicas e da Saúde entre os 78 trabalhos apresentados no evento, 70 foram de alunos bolsistas de Iniciação Científica da Universidade e 08 trabalhos de alunos de Iniciação Científica vinculados a outras Instituições de Ensino do Estado do Rio Grande do Sul. A maioria dos trabalhos nesta área foi de bolsistas do Programa UNISC de Iniciação Científica – PUIC e de Programas de bolsas como o de verba externa para pagamentos de bolsas em projetos de pesquisa. Também foram apresentados trabalhos contemplados com bolsas de IC do CNPq e da FAPERGS. Importante destacar a participação de estudantes participantes dos Programas PIBIC-Ensino Médio do CNPq, PROBIC/FAPERGS e PUIC voluntário. Na Figura 02 é possível visualizar o número de trabalhos apresentados de acordo com a modalidade de bolsa de iniciação científica. Figura 02 – Modalidade de bolsas dos estudantes participantes do XVII Seminário de Iniciação Científica na Área de Ciências Biológicas e da Saúde.
Fonte: Coordenação de Pesquisa, UNISC, 2011.
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ANÁLISE DO PERFIL FITOQUÍMICO DE Tripodanthus acutifolius (RUIZ & PAVÓN) TIEGHEM, LORANTHACEAE Juliana Maria Grüner1 Thaís Klein de Souza1 Lisianne Brittes Benitez2 Chana de Medeiros da Silva3 RESUMO As plantas medicinais constituem uma das principais fontes de substâncias ativas com potencial terapêutico sendo utilizadas para uma variedade de patologias. No entanto, seu uso indiscriminado é preocupante, em função disto, tem sido alvo de inúmeros estudos científicos no intuito de investigar sua composição química, farmacológica e toxicológica. Tripodanthus acutifolius é uma planta hemiparasita pertencente à família Loranthaceae, conhecida popularmente como “erva-de-passarinho” e utilizada na medicina popular e amplamente distribuída na América do Sul. Este trabalho tem como objetivo analisar a composição fitoquímica a partir dos extratos aquoso e metanólico das folhas de T. acutifolius. As folhas foram coletadas no município de Santa Cruz do Sul, RS, sendo que, após identificação botânica, sofreram maceração, obtendo-se os extratos aquoso e metanólico brutos. Uma triagem fitoquímica foi realizada para caracterizar as principais classes de metabólitos secundários presentes nestes extratos, utilizando-se de reações cromogênicas de caracterização e da cromatografia em camada delgada. Após obtenção dos extratos, observou-se que o extrato aquoso obteve um rendimento de 30% e o extrato metanólico 20%. Na análise fitoquímica, foi possível evidenciar a presença de flavonóides, taninos e compostos antracênicos, sendo os dois primeiros já relatados na literatura científica. Palavras-chave: Erva-de-passarinho. Screening fitoquímico. Compostos polifenólicos. ABSTRACT The medicinal plants are the active substances major source with therapeutic potential, and are used often to treat a variety of pathologies. The plant widespread use is worrying; because of this has been the subject of numerous scientific studies that enable the identification of phytochemical composition, pharmacological activity, toxicity, as well as the different species identification. Tripodanthus acutifolius is a mistletoe plant included in the Loranthaceae family, known popularly as "herb-of-bird". It is widely distributed in South America, where grows on large amount of hosts. This work aims to analyze the phytochemical composition from the aqueous and methanolic extracts of leaves of T. acutifolius. The leaves were collected in the Santa Cruz doSul, RS. The extracts were made by maceration with water or methanol. A phytochemical screening was carrying out to identify 1
Acadêmicas do Curso de Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul. Bolsistas PUIC/UNISC.
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lisianne@unisc.br Doutora em Microbiologia Agrícola e do Ambiente – Laboratório de Microbiologia, Curso de Farmácia, Departamento de Biologia em Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul.
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csilva@unisc.br Mestre em Ciências Farmacêuticas – Laboratório de Farmacognosia, Curso de Farmácia, Departamento de Biologia em Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul.
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the secondary metabolites main classes present in this specie. The yield of the extracts calculated was 30% and 20%, to aqueous and methanol extracts, respectively. The phytochemical analyses showed that the both extracts have flavonoids, tannins and anthracene compounds. Keywords: Herb-of-bird. Phytochemical screening. Polyphenolic compounds. 1 INTRODUÇÃO Tripodanthus acutifolius (Ruiz & Pavón) Tieghem, cuja sinonímia é conhecida como Phrygilanthus acutifolius (Ruiz & Pavón) Eichler (Loranthaceae), é uma planta hemiparasita amplamente distribuída na América do Sul. É popularmente conhecida como “erva-depassarinho”, devido à dependência das aves para dispersão de suas sementes. A infestação nos mais variados tipos de hospedeiros ocorre através de pássaros que se utilizam dos frutos desta erva para alimentação e, após regurgitação ou defecação, as sementes liberadas aderem-se as plantas hospedeiras por possuírem uma camada de substância mucilaginosa aderente, chamada viscina. Estas germinam emitindo imediatamente uma radícula que se transforma em raízes especiais (haustórios), penetrando no caule e desenvolvendo uma união complexa com o tecido vascular deste (BARCIK et al., 2002; CAZETTA; GALETTI, 2003), modificando o crescimento de árvores ornamentais e influenciando na perda da produção de várias árvores frutíferas (HARRIS, 1992; TAINTER, 2002; LEAL et al., 2006; RICCO et al., 2008). Tradicionalmente, T. acutifolius é empregada no tratamento das mais diversas patologias. Soberón e colaboradores (2006) demonstraram que as tinturas vegetais obtidas por extração aquosa apresentam atividade antibacteriana. Já os extratos aquoso e etanólico das flores apresentaram efeitos anti-inflamatório, analgésico, antipirético (DAUD; HABIB; RIERA, 2006) e diurético (INTERSIMONE; THOENE; RIERA, 2005). Quanto a sua composição fitoquímica, alguns estudos já vêm sendo realizados, no intuito de identificar os principais compostos responsáveis pelas diversas propriedades farmacológicas relatadas para esta espécie através do conhecimento tradicional (SOBERÓN et al., 2010a). Dentre os metabólitos secundários já identificados, pode-se citar os compostos polifenólicos, que envolvem os flavonóides, taninos condensados, proantocianidinas e catequinas (DAUD; HABIB; RIERA, 2006; RICCO et al., 2008; SOBERÓN et al., 2010b). Considerando sua vasta infestação em árvores frutíferas e ornamentais, bem como sua ampla utilização na medicina popular, aliada ao fato de que pouco se conhece sobre as características físico-químicas dos compostos presentes nesta espécie, este trabalho tem como objetivo analisar a composição fitoquímica a partir dos extratos aquoso e metanólico das folhas de T. acutifolius. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A família Loranthaceae compreende cerca de 70 gêneros, onde se encontram distribuídas 950 espécies que ocorrem predominantemente nas regiões tropicais (RIBEIRO et al., 1999; AMICO; VIDAL-RUSSEL; NICKRENT, 2007). Está entre as maiores famílias que possuem hemiparasitas, atacando uma grande variedade de hospedeiros (HARRIS, 1992; TAINTER, 2002, LEAL, BUJOKAS, BIONDI, 2006). Os hemiparasitas ou semiparasitas são organismos que se utilizam da seiva bruta do hospedeiro para seu desenvolvimento e
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sobrevivência. Esta seiva fornece-lhes água e sais minerais, entretanto, não são completamente dependentes deste hospedeiro, pois possuem clorofila, realizam fotossíntese e produzem seus próprios compostos orgânicos, podendo mesmo em alguns casos viver sem ele (TATTAR, 1978; ROTTA, 2001; TAINTER, 2002). A distribuição destes hemiparasitas em seus hospedeiros pode ser determinada por uma série de fatores, sendo os mais frequentes a especificidade do mesmo, a distância entre hospedeiros, condições ambientais, luminosidade, arquitetura da planta hospedeira, comportamento alimentar e seleção do habitat pelo agente dispersor (NORTON; CARPENTER, 1998; ARRUDA; CARVALHO; DEL-CLARO, 2006). O gênero Tripodanthus é um dos 16 gêneros pertencentes à família Loranthaceae encontrado na América do Sul, do qual fazem parte três espécies: T. acutifolius (Ruiz & Pavón) Tieghem, T. flagellaris (Chamisso & Schlechtendal) Tieghem e T. belmirensis (Roldán & Kuijt), esta última recentemente descrita. Dentre estas, a espécie T. acutifolius possui uma distribuição maior, sendo encontrada na Venezuela, Equador, Argentina, Bolívia, Paraguai, Uruguai e Brasil, parasitando troncos, copas dos hospedeiros, mas também pode parasitar raízes (AMICO; VIDAL-RUSSEL; NICKRENT, 2007). A espécie arbórea mais parasitada por T. acutifolius é Ligustrum lucidum, demonstrando haver uma alta especificidade entre essas espécies (Figura 1) (LEAL; BUJOKAS; BIONDI, 2006). A maioria dos estudos realizados com a espécie T. acutifolius está baseado no conhecimento da medicina popular. Neste sentido, alguns ensaios têm sido feitos, bem como a identificação de constituintes químicos com potencial farmacológico para comprovar estas propriedades (SOBERÓN et al., 2010a). Figura 1 - Aspecto geral de Tripodanthus acutifolius
Legenda: infestação de Tripodanthus acutifolius sobre Ligustrum lucidum Fonte: Registro fotográfico das autoras.
Seus principais constituintes descritos até o presente momento são os compostos polifenólicos, que envolvem flavonóides (rutina, nicotiflorina, hiperosídeo e isoquercetrina), taninos condensados, proantocianidinas e catequinas (catequina, epicatequina e catequina4-β-ol) (FERNANDEZ et al., 1998; DAUD; HABIB; RIERA, 2006; RICCO et al., 2008; SOBERÓN et al., 2010b), além de um raro fenilbutanóide glicosilado chamado tripodantosídeo (SOBERÓN et al., 2010b) entre outros metabólitos, tais como taninos, lignanas e monoterpenos glicosilados, além de lectinas, viscotoxinas, proteínas, peptídeos, oligossacarídeos e
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alcalóides, que vem despertando a curiosidade de pesquisadores por investigações fitoquímicas devido a esta diversidade de compostos (PISSINATE, 2006). De maneira geral, estes compostos fenólicos, exercem diversas funções, como proteção contra incidência de raios ultravioleta e visível, proteção contra insetos, fungos, vírus, bactérias e agentes oxidantes, ação antifúngica e antibacteriana, além da atração de polinizadores (ZUANAZZI, 2002). Ensaios biológicos utilizando compostos isolados revelaram que os flavonóides são conhecidos pelas suas propriedades antimicrobiana, antiviral, antiulcerogênica, citotóxica, antineoplásica, mutagênica, antioxidante, anti-hepatotóxica, hipolipemiante, antihipertensiva, antiagregante plaquetária, antialérgica e anti-inflamatória (PELZER et al., 1998). 3 METODOLOGIA 3.1 Coleta e identificação do material vegetal As folhas de Tripodanthus acutifolius foram coletadas no município de Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, no mês de setembro de 2010, no período da manhã, tendo como seu hospedeiro o Ligustrum lucidum (Oleaceae). A espécie foi identificada e depositada no Herbário do Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande Sul (UFRGS), sob o número ICN 167796. 3.2 Preparo e rendimento dos extratos aquoso e metanólico As folhas frescas foram selecionadas, lavadas em água corrente e secas em uma estufa de ar circulante à temperatura de 40ºC por um período de 48 horas. Em seguida, moídas em moinho de facas para preparação dos extratos aquoso (EA) e metanólico (EB), obtidos através da técnica de maceração, por um período mínimo de 24 horas, sendo os solventes renovados por 5 dias consecutivos. Os líquidos extrativos foram filtrados e concentrados em evaporador rotatório e posteriormente liofilizados. A determinação do rendimento dos extratos obtidos foi realizada partindo-se da massa inicial da planta seca. 3.3 Caracterização fitoquímica dos extratos Foram realizadas reações de caracterização fitoquímica, em tubos de ensaio e por cromatografia em camada delgada (CCD) para identificação das principais classes de metabólitos secundários presentes nesta espécie. Os testes fitoquímicos foram realizados utilizando as metodologias descritas por Wagner e Bladt (1995), Costa (2001), Farias (2002) e Biavatti e Leite (2005). As reações de caracterização foram realizadas partindo-se da droga pulverizada (DP) e dos extratos brutos liofilizados, aquoso (EA) ou metanólico (EM), os quais foram ressuspendidos em água destilada ou metanol, sendo que para cada uma das reações, utilizou-se um determinado extrato, conforme sua descrição na literatura. Para a identificação de flavonóides foram realizadas as reações de Shinoda, Taubouk, com hidróxidos alcalinos e oxalo-bórica. Para taninos as reações com acetato de chumbo, gelatina e com sais de ferro. Já para a pesquisa de compostos antracênicos foram realizadas as reações de Bornträger Direta, Bornträger com extrato metanólico e com hidrólise ácida do extrato metanólico. A pesquisa de saponinas foi feita pelo método qualitativo por agitação; e a identificação de alcalóides, com os reativos de Mayer e Dragendorff.
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Na detecção dos compostos por CCD, os extratos foram aplicados à cromatoplaca de gel de sílica, utilizando rutina, quercetina, ácido gálico, ácido pirogálico, catequina e epicatequina como substâncias de referência. A fase móvel, utilizada foi acetato de etila:metanol:água (100:13,5:10). Após migração e secagem, a placa foi visualizada sob luz UV e em seguida, revelada com uma solução de anisaldeído sulfúrico e aquecida por 10 minutos em estufa a 100oC, para posterior visualização em luz visível e UV. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Rendimento dos extratos O rendimento dos extratos foi realizado partindo-se de 100 g de planta seca. Após liofilização, foram obtidos 30,016 g de extrato aquoso bruto (rendimento de 30%), e 20,021 g de extrato metanólico bruto (rendimento de 20%). A água, por ser um solvente de amplo espectro é capaz de extrair um maior número de compostos do que o metanol. Isto se evidencia nos rendimentos de ambos os extratos. 4.2 Análise fitoquímica Através da análise fitoquímica realizada a partir dos extratos aquoso e metanólico de T. acutifolius, foi possível detectar a presença de flavonóides, taninos e compostos antracênicos, não se evidenciando a presença de saponinas e alcalóides (Tabela 1). Tabela 1 - Resultado das análises fitoquímicas dos extratos de T. acutifolius Ensaio
Reação realizada Shinoda
Flavonóides
Taubouk Hidróxidos alcalinos Oxalo-bórica Acetato de chumbo
Taninos
Gelatina Sais de ferro (condensados)
Coloração, formação de ppt ou espuma Castanhoavermelhado Fluorescência amarelo-esverdeado Castanho-amarelado Fluorescência amarelo-esverdeado Formação de precipitado amarelo Formação de precipitado Castanho-esverdeado
EA
EM
+
+
+
+
+
+
+
+
+ +
DP
Dados na Literatura
Isoquercetrina, Rutina, Quercetina e Hiperosídeo (SOBERÓN et al., 2010)
Catequina, Epicatequina, Catequina-4-β-ol (RICCO et al., 2008)
+
Castanho+ avermelhado Antracênicos NE Bornträger Castanho-amarelado + Hidrólise ácida Avermelhado + Saponinas Agitação Formação de espuma NE Mayer/ Precipitado branco Alcalóides Dragendorff ou turvação NE Legenda: Resultado Positivo (++), Fracamente positivo (+), Negativo (-), Extrato aquoso (EA), Extrato metanólico (EM), Droga pulverizada (DP), Não encontrado (NE). Bornträger direta
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De acordo com os dados obtidos na triagem fitoquímica realizada, é possível afirmar que os mesmos estão em concordância com os descritos por Soberón e colaboradores (2010b), uma vez que estes já haviam caracterizado os flavonóides (rutina, isoquercetrina, nicotiflorina e hiperosídeo) como principais constituintes para a espécie. A partir do resultado da reação de Shinoda, que apresentou coloração castanho-avermelhado (Figura 2), conclui-se que há a presença de flavonóides do tipo flavonóis em T. acutifolius. Do ponto de vista farmacológico, estes são particularmente atraentes por exibirem uma ampla gama de efeitos sobre os sistemas biológicos, tais como: atividades antimicrobiana, antiviral, antiulcerogênica, citotóxica, antineoplásica, mutagênica, antioxidante, anti-hepatotoxica, hipolipemiante, anti-hipertensiva, antiagreganteplaquetária, antialérgica e anti-inflamatória (PELZER et al., 1998; ZUANAZZI, 2003). Figura 2 - Coloração da reação de Shinoda para caracterização de flavonóides nos extratos de T. acutifolius
Legenda: EA (Extrato Aquoso); EM (Extrato Metanólico)
Nos testes de caracterização de taninos, identificou-se a presença de taninos condensados, também designados de proantocianidinas, pelo desenvolvimento da coloração castanho-esverdeado via reação com sais de ferro e de precipitação com a gelatina (Figura 3). Tais resultados estão de acordo com Ricco e colaboradores (2008) que relataram a existência de proantocianidinas nas folhas de T. acutifolius. Figura 3 - Coloração das reações para caracterização de taninos no extrato aquoso de T. acutifolius
Legenda: A) Reações com sais de ferro; B) Reações de precipitação com gelatina
Os taninos além de serem usados tradicionalmente contra moléstias do tipo diarréia, hipertensão, reumatismo, hemorragia, também ajudam no processo de cura de feridas, queimaduras e em processos inflamatórios, por intermédio da formação de uma camada protetora (complexo tanino-proteína e/ou polissacarídeo) sobre a pele ou mucosa danificada. Possuem outras atividades comprovadas, tais como: bactericida, fungicida, antiviral, moluscida e antitumoral. Acredita-se que as atividades farmacológicas dos taninos Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 9-17, 2012
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são devidas a três características: complexação com íons metálicos, atividade antioxidante e seqüestradora de radicais livres e ainda a habilidade de complexação com outras moléculas incluindo macromoléculas tais como proteínas e polissacarídeos (MARTINS et al., 2003; PANSERA et al., 2003; SANTOS; MELLO, 2003). Estes resultados foram confirmados pela cromatografia em camada delgada (CCD), onde foi possível sugerir a presença de rutina (Rf=0,23), quercetina (Rf=0,78), catequina e epicatequina (Rf=0,63), no extrato metanólico e quercetina (Rf=0,78) no extrato aquoso, cujos valores de Rf ficaram muito semelhantes aos dos padrões aplicados (Figura 4). Figura 4 - Cromatoplaca dos extratos de T. acutifolius com seus rescpectivos padrões
Legenda: a) visualização sob luz UV, em comprimento de ondas de 366 nm; b) após revelação com anisaldeído sulfúrico. Eluente: Acetato de etila:metanol:água (100:13,5:10); EA (Extrato Aquoso); EM (Extrato Metanólico). Padrões: ÁcG (ácido gálico), ÁcP (ácido pirogálico), R (rutina), Q (quercetina), C (catequina) e Ep (epicatequina).
Quanto às reações de caracterização dos compostos antracênicos, evidenciou-se resultados positivos para T. acutifolius. Tanto a reação de hidrólise básica, conhecida por Reação de Bornträger, como a de hidrólise ácida, agem através de reações de oxi-redução, onde os derivados antracênicos se oxidam, adquirindo intensas colorações de púrpura a violeta (FALKENBERG, 2003). Este resultado indica a provável presença destes metabólitos secundários, entretanto, outros constituintes do extrato também podem estar reagindo e se oxidando, indicando um falso positivo. 5 CONCLUSÃO Pode-se concluir que os extratos das folhas de T. acutifolius apresentam em sua composição flavonóides, taninos e antracênicos de acordo com o que já havia sido descrito para esta espécie de planta. Embora os extratos tenham apresentado um perfil de compostos polifenólicos semelhantes, como neste trabalho são apresentados apenas dados qualitativos, há necessidade de quantificação destes metabólitos, o que provavelmente resulte em valores diferentes entre os extratos, justificando, dessa forma, atividades biológicas diferentes.
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AVALIAÇÃO DE DANO NO DNA EM PORTADORES DE DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA PELO ENSAIO COMETA Helen Tais da Rosa1 Andréa Lúcia Gonçalves da Silva2 Martiele Bizarro3 Eduarda Bender4 Paulo Ricardo da Rosa5 Anelise Araújo6 Clara Forrer Charlier7 Lia Possuelo8 Dinara Jaqueline Moura9 Andréia Rosane de Moura Valim10 João Antonio Pegas Henriques11
RESUMO A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica- DPOC é definida como uma doença respiratória inflamatória, causada principalmente pela exposição à fumaça de cigarro, caracterizada pela progressão e incompleta reversibilidade da obstrução das vias aéreas. O objetivo desta pesquisa foi quantificar o Índice de Dano ao DNA em portadores de DPOC e controles. Estudo do tipo caso-controle avaliou 43 portadores de DPOC e 50 controles emparelhados por gênero, 1
Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia e Farmácia, Bolsista (PROBIC/FAPERGS da Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/RS, Brasil. [htdarosa@gmail.com]
2
Departamento de Educação Física e Saúde, Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/ RS, Brasil. [andreag@unisc.br]
3
Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia e Farmácia, Bolsista PUIC da Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/RS, Brasil. [marty_bizarro@hotmail.com]
4
Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia e Farmácia, Bolsista PUIC da Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/RS, Brasil. [bender.ep@gmail.com]
5
Acadêmico do Curso de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia e Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/RS, Brasil. [paulorlee@hotmail..com]
6
Acadêmica do Curso de Farmácia, Departamento de Biologia e Farmácia, Bolsista PUIC da Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/RS, Brasil. [anelisearaújo24@yahoo.com.br]
7
Programa de Pós Graduação em Biologia Celular e Molecular da Universidade Federal do Rio Grande do SulUFRGS, Porto Alegre/ RS, Brasil. [clara.forrer.charlier@gmail.com]
8
Departamento de Biologia e Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/ RS, Brasil. [liapossuelo@unisc.br]
9
Departamento de Biologia e Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/ RS, Brasil e Departamento de Biofísica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul- UFRGS, Porto Alegre/ RS, Brasil. [dinaramoura@unisc.br].
10
Departamento de Biologia e Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul- UNISC, Santa Cruz do Sul/ RS, Brasil. [avalim@unisc.br]
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Departamento de Biofísica, Universidade Federal do Rio Grande do Sul- UFRGS, Porto Alegre/RS, Brasil. [pegas@cbiot.ufrgs.br]. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 18-28, 2012
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idade e índice de massa corporal (IMC). Foi utilizado sangue periférico para realizar o ensaio cometa nas versões alcalino (pH> 13) e neutro (pH ~ 8,5). Avaliação de danos no DNA usando o ensaio cometa na versão alcalina revelou um maior Índice de Dano ao DNA em portadores de DPOC quando comparados aos controles (ID 40,12+26,17 vs ID 26,28+28,12, p=0,03). Na versão Neutra do teste também é possível observar maior Índice de Dano nos casos do que em controles (ID 52,88+32,38 vs ID 38,12+38,17, p=0,018), indicando a presença de quebras duplas, devido a inflamação persistente. Dados preliminares mostram que os portadores de DPOC têm maior índice de dano no DNA do que controles, reforçando assim a necessidade de compreender melhor os mecanismos pelos quais isso acontece no processo da doença. Palavras-chave: DPOC. DNA. Ensaio Cometa. ABSTRACT Chronic Obstructive Pulmonary Disease (COPD) is defined as an inflammatory respiratory disease, mainly caused by exposure to cigarette smoke, characterized by the incomplete progression and reversibility of airway obstruction. The objective of this research was to quantify the DNA Damage Index in patients with COPD and controls. Study of case-control evaluated 43 patients with COPD and 50 controls matched by gender, age and body mass index (BMI). Peripheral blood was used to perform the comet assay versions alkaline (pH> 13) and neutral (pH ~ 8.5). Assessment of DNA damage using the comet assay in alkaline version showed a higher index of DNA damage in COPD patients compared to controls (ID 40.12 ID 26.28 +26.17 vs +28.12, p = 0 , 03). In the Neutral version of the test is also possible to observe higher Damage Index in cases than in controls (ID 52.88 ID 38.12 +32.38 vs +38.17, p = 0.018) indicating the presence of double breaks, due to persistent inflammation. Preliminary data show that patients with COPD have a higher rate of DNA damage than controls, thus reinforcing the need to better understand the mechanisms by which this happens in the disease process. Keywords: COPD, DNA, Comet Assay 1 INTRODUÇÃO A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) está associada com uma resposta inflamatória anormal dos pulmões a partículas nocivas ou gases. As alterações decorrentes desta inflamação são progressivas e irreversíveis, destruindo os alvéolos e diminuindo a capacidade respiratória, ocasionando colapso expiratório (GOLD, 2009; ROCHA, 2005). A origem das alterações na mecânica pulmonar é devido à obstrução brônquica, que leva a um deslocamento do ponto de igual pressão para as vias aéreas que não possuem cartilagens, favorecendo o aprisionamento de ar (OLIVEIRA et al., 2000, GOLD, 2011). A Organização Mundial de Saúde- OMS considera a DPOC uma epidemia, prevendo a sua eclosão no ano de 2020, quando poderá então se tornar a 3ª maior causa de mortalidade e a 5ª doença em prevalência (COSTA, RUFINO, LAPA E SILVA, 2009). O diagnóstico funcional da DPOC é confirmado através da relação do volume expiratório forçado no primeiro segundo com a capacidade vital forçada após a inalação de broncodilatadores (VEF1 /CVF <0.70). A limitação do fluxo aéreo deve ser mantida em curvas
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repetidas e o diagnóstico não depende da presença de sintomas (BITTENCOURT, 2010; GOLD, 2011). O processo inflamatório que há na DPOC tem como causa os elementos tóxicos da fumaça do cigarro. Esses gases desencadeiam alterações estruturais que predominam nas vias aéreas menores que 2 mm. A agressão dessas estruturas provoca um processo inflamatório que tem além da presença de macrófagos, linfócitos e neutrófilos, a participação de células estruturais (epiteliais musculares e fibroblastos). A interação entre macrófagos e linfócitos, especialmente CD8+, tem sido associada com a patogênese da DPOC. A liberação das células recrutadas e do estresse oxidativo leva a um desequilíbrio dos mecanismos de defesa pulmonar que inicialmente é temporário. Porém, a permanência desse desequilíbrio é uma das chaves para a fisiopatogenia da doença (COSTA, RUFINO, LAPA E SILVA, 2009). A principal causa para o desenvolvimento da DPOC é o tabagismo, porém não é a única. A poluição ambiental, a exposição a químicos, a fumaça inalada, o tabagismo passivo, as infecções virais e bacterianas, e problemas respiratórios na infância também são fatores de risco que devem ser considerados. Fatores individuais devem ser incluídos como a deficiência de alfa-1-antitripsina, a deficiência da glutationa transferase, a hiperresponsividade brônquica, a desnutrição e a prematuridade (YAKSIC et al., 2003). A fumaça do cigarro é uma mistura complexa com mais de 4700 componentes químicos, com radicais livres (RL) e outros oxidantes presentes em altas concentrações. Entretanto, estudos têm mostrado forte evidência de associação entre o tabaco e doenças respiratórias, principalmente câncer de pulmão (CEYLAN et al., 2006; BERWICK;VINEIS, 2005). Apesar de o tabagismo ser o maior fator de risco para o desenvolvimento da DPOC, um fato interessante é que nem todos os tabagistas desenvolvem a doença, sugerindo que fatores genéticos podem modificar o risco individual. Desta forma, é possível observar que fumantes passivos desenvolvem a doença enquanto fumantes pesados não (TORRES; GODOY, 2004). O estresse oxidativo tem participação muito importante na fisiopatogenia da DPOC. O excesso de oxidantes ou a capacidade antioxidante reduzida do organismo são os principais geradores do estresse (DAHL et al., 2008).
Estudos demonstram que as espécies reativas de oxigênio (ERO) estão envolvidas nas doenças pulmonares, dentre elas a DPOC (MATSUBARA; FERREIRA, 1997; FUCHS et al, 2010). As moléculas reativas do oxigênio podem atuar aumentando a secreção de muco e a permeabilidade da membrana capilar, levando a broncoconstrição, bem como o recrutamento neutrofílico (PETTERSEN et al, 2002). O estresse oxidativo é definido como um desequilíbrio de EROs e os antioxidantes presentes no organismo que funcionam como sistema de defesa (PAGLIUSO et al, 2006). Estes podem causar danos e até morte celular, estando envolvidas em processos de envelhecimento, câncer, lesões por radiação, danos celulares, fenômenos inflamatórios e, também, com o exercício físico (PEIXOTO, 1999; MARÇAL, 2001).
O desequilíbrio redox resulta em sérias consequências a diferentes componentes celulares, tais como peroxidação de lipídeos de membrana, oxidação de proteínas e danos no DNA, que quando não são corretamente reparados, podem iniciar e promover a carcinogênese. Além disso, tem sido demonstrado que a DPOC é um predisponente para o desenvolvimento de câncer de pulmão através de vários mecanismos incluindo estresse oxidativo e processos mediados por ele, como inflamação e alteração da integridade genômica (CEYLAN et al., 2006). Neste sentido, o objetivo deste trabalho foi avaliar e quantificar o Índice de Dano ao DNA de portadores de DPOC.
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2 MATERIAIS E MÉTODOS Este foi um estudo do tipo caso-controle, sendo o grupo caso composto por indivíduos portadores de DPOC e o grupo controle por indivíduos hígidos e com função pulmonar preservada. A amostragem do grupo caso foi de conveniência, caracterizada por sujeitos portadores de DPOC, da região de Santa Cruz do Sul, do programa de Reabilitação Cardiorrespiratória e Metabólica e suas Interfaces da UNISC, que ocorre periodicamente no Hospital Santa Cruz. Os controles foram selecionados a partir dos casos, entre familiares e conhecidos, bem como grupos de terceira idade que frequentam atividades de hidroginástica na UNISC, assim como integrantes da Associação de Aposentados de Santa Cruz do Sul (APOPESC), desde que atendidos os critérios de emparelhamento definidos como idade, gênero e índice de massa corporal (IMC). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade de Santa Cruz do Sul sob protocolo nº 2011/08. Todos os indivíduos responderam a um Questionário de Saúde Pessoal e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) antes da entrevista. A caracterização da Função Pulmonar foi realizada conforme a American Thoracic Society-ATS (1995). 2.1 Avaliação de danos ao DNA pelo ensaio cometa O ensaio cometa foi realizado nas versões alcalina e neutra como descrito por Singh e colaboradores (2000). Essa é uma técnica simples, rápida e sensível para medir quebra e reparo no DNA de células individualizadas, e tem sido usada para vários estudos para investigar o efeito de EROs no DNA (DUSINSKA; COLLINS, 2008). Uma suspensão de 100 µL de agarose de baixo ponto de fusão (0,7%) e 5 µL de sangue foi colocada em lâminas previamente pré cobertas com agarose (1,5%). Uma lamínula foi colocada na lâmina e acondicionada a 4°C por 10 minutos, para que a agarose solidificasse. Depois disso, a lamínula foi gentilmente retirada, e a lâmina colocada em solução de lise (NaCl 2,5 M, EDTA 100mM, 10 mM Tris, pH 10,2, para a qual 1% Triton X-100 e 10% DMSO). Depois de 24h em 4◦C, as lâminas foram gentilmente retiradas da solução de lise. Após a lise as lâminas foram submetidas a uma corrente elétrica em cubas de eletroforese com tampão alcalino e neutro de eletroforese gelado (NaOH 300mM, EDTA 1mM, pH> 13 e Acetato de Sódio 3M, Tris 1M, pH 8,5). As lâminas ficaram submersas no tampão por 20 minutos (alcalino) e 1hora (neutro), para que ocorresse o desenovelamento do DNA. Após deu-se início aos procedimentos de eletroforese. Sendo as condições 25V, 300mA-0.95V/cm por 15 minutos (alcalino) e 14V, 12 mA por 1 hora (neutro). Após a eletroforese, as lâminas foram delicadamente retiradas da cuba e colocadas em bandejas onde foi e adicionado o tampão de neutralização (0.4MTris, pH 7,5). Após secas as lâminas foram fixadas e coradas com nitrato de prata de acordo com Nadin e colaboradores (2001). Para avaliação de danos no DNA, 100 células por indivíduo foram analisadas ao microscópio óptico de ampliação em 200×. Os nucleóides foram classificados visualmente de acordo com a intensidade da cauda. 2.2 Análise Estatística Devido à exclusão da distribuição normal para alguns dados, as análises nãoparamétricas foram usadas para testar diferenças entre os grupos (Mann-Whitney test). As
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análises estatísticas foram realizadas utilizando o pacote estatístico SPSS 17.0 e p ≤ 0,05 foi considerado estatisticamente significante.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO No presente trabalho, 93 sujeitos participaram do estudo: 43 sujeitos portadores de DPOC, de ambos os sexos e 50 sujeitos controles. Os dados clínicos da amostragem revelaram o correto emparelhamento entre casos e controles, atendendo os critérios de inclusão, bem como os resultados destas variáveis vêm ao encontro da literatura (TORRES; GODOY, 2004; ALMEIDA, 2001; BRACKE et al., 2006). Nas tabelas 1 e 2 estão descritas as características clinicas e a função pulmonar dos grupos estudados. Tabela 1 - Características Clínicas e História Tabágica dos Sujeitos. Características Idade (anos)
Sexo (M/F) Cor da pele (branca/ não branca) IMC (kg/m2) Status Tabagismo# DuraçãoTabagismo(>30 anos) Cessação Tabagismo (anos) Tipo de Cigarro (com filtro/ sem filtro/ outros) Cigarros/ano (ex-fumantes)
DPOC (n=43) 65,79
Controles (n=50) 63,76±9,42
25,17 ± 5,95 10/6/27 34
26,87 ± 3,90 4/21/25 18
4 (1-29) 28/8/3
10(1-41) 29/0/0
7300 (2190-21900)
7300 (2190-14600)
26/17 38/5
27/23 49/1
Os dados são apresentados como média ± DP e mediana (mínimo-máximo); (Teste de Mann-Whitney), IMC-Índice de Massa Corporal; #Fumante Corrente/ Não fumante/Ex-fumante.
Embora a DPOC tenha sido considerada por muito tempo uma doença de homens caucasianos velhos, dados recentes mostram que nos EUA a mortalidade está subindo muito rapidamente entre as mulheres e os africano-americanos. Os caucasianos têm apresentado menor perda de função pulmonar, por maço fumado/ ano, sugerindo que as mulheres afroamericanas são realmente mais suscetíveis aos efeitos nocivos do fumo em comparação a outros grupos de homens e mulheres. Bakos e colaboradores (2009) sugeriram que a ascendência européia como a italiana e a alemã, como é o caso deste estudo, parece ser um fator de risco a doenças pulmonares e melanomas na população da região sul do Brasil. Embora qualquer paciente acima de 40 anos corra o risco de desenvolver esta doença, os pacientes com idade avançada têm maior risco de complicações e aumento da morbidade. Além disso, a DPOC em pessoas idosas está associada com o estado de saúde deficiente, que não pode ser previsto pelo teste de função pulmonar (CAZZOLAA; DONNERB; HANANIAC, 2008). A carga tabágica mostrou-se superior nos portadores de DPOC quando comparados aos controles. Diversos autores propõem a existência de uma relação entre o tempo de tabagismo e a função pulmonar, mesmo esta não sendo obrigatória (TACK, 2009). Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 18-28, 2012
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Tabela 2 - Função Pulmonar e Histórico Breve dos Portadores de DPOC e Controles. VEF1 (% predito) CVF (% predito) VEF1/CVF(% predito) DPOC Estadiamento# Duração da Doença (anos) Histórico Familiar (sim/não/ignorou) Doença Respiratória na Infância (sim/não) Comorbidades (sim/não) HAS Cardiopatias Diabetes
DPOC (n=43) 46,47±19,73 63,14±19,07 67,93±20,40 8/12/13/10 5,97 (1-43) 14/26/6
Controles (n=50) 85,98±11,78 90,35±12,54* 105,44±70,98* 10/33/7
10/33
10/40
29/14 23 9 7
37/13 27 2 1
Dados apresentados em media+desvio padrão e mediana (mínimo-máximo); VEF1, volume expiratório forçado no primeiro segundo; CVF, capacidade vital forçada; *p<0,05 (Mann- Whitney Test); # Leve/Moderado/ Severo/ Muito Severo (GOLD, 2009); HAS, hipertensão arterial sistêmica.
A função pulmonar dos casos mostrou-se reduzida quando comparada aos controles, conforme previsto, e caracterizando um quadro de obstrução pulmonar. De acordo com o GOLD (2011), o estadiamento para os portadores de DPOC deste estudo variou entre Estádio II e V (Índice de Tiffenau < 70%; VEF1 ≥ 50% < 80%) considerado doença moderada, severa e muito severa. Durante o segundo (II) estádio da DPOC, doença moderada, a limitação do fluxo aéreo piora, com falta de ar ao esforço, tosse e expectoração (GOLD, 2011). É nessa fase que a maioria dos doentes procura o médico, devido ao agravamento da doença e dos sintomas respiratórios crônicos. O Consenso Brasileiro sobre DPOC alerta que, nesta fase, a redução da capacidade física e a dispnéia são muito atribuídas ao envelhecimento ou ao hábito sedentário, dificultando o diagnóstico da doença precocemente (OLIVEIRA, 2000; GOLD, 2011). Ambos os grupos apresentaram comorbidades entre elas as mais prevalentes foram a hipertensão arterial sistêmica (HAS), as cardiopatias e diabetes. A doença cardiovascular (DCV) e a DPOC também co-existem, sendo que a DCV pode estar presente em até 69% dos pacientes com DPOC e bem associada com aumento mortalidade (TACK, 2009). A fibrilação atrial também é prevalente na DPOC sendo que o tratamento com Varfarina reduz a mortalidade. Dados de um estudo longitudinal mostram que a ligação entre DPOC e a doença cardiovascular pode ser devido à inflamação local e sistêmica. Outra morbidade comum em pacientes com DPOC é a HAS por isso é necessário garantir que os pacientes em risco sejam identificados precocemente e comecem sua profilaxia (TACK, 2009). Os resultados referentes ao EC Alcalino (Figura 1) revelaram que portadores de DPOC apresentam dano no DNA significativamente maior, quando comparados aos controles, e estes resultados estão de acordo com a literatura. No estudo realizado por Ceylan e colaboradores (2006), o Índice de Dano foi significativamente mais alto nos portadores de DPOC de origem tabágica, em relação ao encontrado nos sujeitos controles. Da mesma forma, o trabalho realizado por Maluf e colaboradores (2007), também encontrou um maior
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índice de dano em casos de DPOC quando comparados. Em nosso estudo, observamos valores de índice de dano diferente dos demais estudos, fato este que pode ocorrer devido às condições laboratoriais e sensibilidade do ensaio, pois é extremamente sensível. Referente ao grande desvio padrão no índice de dano no DNA dos nossos resultados, a heterogeneidade da amostragem, a faixa etária e as comorbidades presentes podem ter inferido sobre estes dados em ambos os grupos. Figura 1 – Ensaio Cometa Versão alcalina (pH 10,0). Resultados do índice de danos no DNA entre casos e controles, apresentados em mediana (mínimo – máximo). Análise estatística foi realizada por Mann-Whitney Teste.
A frequência de danos e as mutações no DNA podem ser relacionadas com o hábito de fumar, pois o cigarro contém componentes químicos que contribuem para a citotoxidade e a carcinogênese. Estudos realizados com células pulmonares fetais expostas à fumaça de cigarro mostram, pelo teste cometa, que quanto maior a concentração da fumaça de cigarro, maior o dano nas células (KIM et al., 2004). Há vários fatores que podem ser relacionados ao dano no DNA, como o metabolismo anormal de células. Cerca de 2% a 5% do oxigênio usado para a formação de ATP transforma-se em radicais livres (RL), que podem causar danos em biomoléculas (AUGUSTO, 2006). Diferentes componentes da fumaça de cigarro reagem e podem formar diretamente RL, enquanto as substâncias procarcinogênicas devem ser ativadas por um ou mais citocromos P450, produzindo quebras simples no DNA (REPINE et al., 1997). Modificações químicas ocorrem em todas as quatro bases do DNA, decorrentes da produção de oxiradicais, que podem quebrar o DNA e causar mutações e alterações carninogênicas (REPINE; BAST; LANKHORST, 1997). As quebras do tipo simples no DNA são os danos mais frequentes causados por EROs, que podem causar morte celular e a instabilidade genômica porém, o acúmulo de dano oxidativo e quebras do tipo simples no DNA podem ser a maior causa para a produção de quebras na dupla fita de DNA ( LAN et al., 2004). Também observamos um maior índice de dano do tipo lesões em quebras duplas (Figura 2), avaliada pelo ensaio cometa versão neutra, o que pode ser esperado na DPOC pela presença de inflamação persistente, conforme já descrito por Repine e colaboradores (2007).
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Figura 2 - Ensaio Cometa Versão Neutra (pH 8,5). Resultados do índice de danos no DNA entre casos e controles, apresentados em mediana (mínimo-máximo). Análise estatística foi realizada por Mann-Whitney Test.
A resposta das células a danos no DNA e sua capacidade de manutenção da estabilidade genômica de reparo de DNA são a chave molecular eventos de condução de iniciação e progressão do câncer de pulmão e outras doenças pulmonares, como a DPOC (TAKABATAKE et al., 2009). O estudo de Kiechle e Zhang (2002), realizado com portadores de câncer de pulmão, revelou que esta população tem uma elevada reparação no DNA o que diminui a morte celular por apoptose em células cancerosas. Esta relação entre reparo no DNA e apoptose mostrou que a eficiência elevada de reparo no DNA pode ser considerada um dos principais obstáculos da terapia anticâncer, com base na resistência do câncer a quimioterapia. É evidente que a variação individual na capacidade de limitar os danos de DNA de carcinógenos, exógenos e endógenos contribui para o risco de diversas doenças relacionadas ao estresse oxidativo (TAKABATAKE et al., 2009). Segundo Takabatake e colaboradores (2009), há evidências que distúrbio no balanço entre apoptose e regeneração de células estruturais pulmonares contribui para patogênese da DPOC. O incremento da apoptose em portadores de DPOC persiste mesmo após a cessação do tabagismo ocasionando um rápido declínio da função pulmonar, principalmente em pacientes mais velhos com DPOC em estágio avançado. Sendo assim, o potencial individual de suscetibilidade para o rápido declínio da função pulmonar em portadores de DPOC pode ser atribuído às variâncias genéticas que podem inferir na reparação do DNA. 4 CONCLUSÃO Os dados analisados até o momento revelam um incremento no índice de dano no DNA de portadores de DPOC, quando comparados a controles sem doença pulmonar, reforçando assim a necessidade de compreender os mecanismos pelos quais isso acontece no processo da doença. Este trabalho enfatiza a importancia do Ensaio Cometa para avaliação de danos no DNA de portadores de DPOC, bem como outras doenças relacionadas ao estresse oxidativo.
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Agradecimentos Os autores agradecem aos voluntários que participaram da Pesquisa. Este trabalho foi financiado pelas agências brasileiras Fundação de Amparo a Pesquisado Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC).
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ANÁLISE GENOTÓXICA DE EFLUENTE DE LAVANDERIA HOSPITALAR: ENSAIO COMETA COM Daphnia magna STRAUS, 1820 Fernanda Fleig Zenkner1 Camila Gonçalves Athanásio2 Joel Henrique Ellwanger3 Daniel Prá4 Alexandre Rieger5 Eduardo Alexis Lobo Alcayaga6 RESUMO Considerando que os efluentes hospitalares possuem carga poluidora potencialmente tóxica e genotóxica, o objetivo do presente trabalho foi desenvolver a metodologia do Ensaio Cometa com um organismo-teste amplamente utilizados em teste de toxicidade, Daphnia magna, a fim de avaliar a genotoxicidade de efluente provindo do setor de lavanderia de um hospital do Vale do Rio Pardo, RS. Foram realizadas coletas mensais do efluente entre os meses de maio e julho de 2011. Após a padronização do Ensaio Cometa, os organismos foram expostos a concentrações subletais do efluente (0,195; 0,39; 0,78; 1,56%) por um período de 48 h. O ensaio foi realizado com modificações. Os resultados mostraram diferenças significativas (p<0,01) entre o controle negativo e todas as concentrações de efluente testadas. Isso sugere que mesmo diluído a 0,195%, o efluente de lavanderia hospitalar em questão apresenta compostos com potencial de causar lesão na molécula de DNA. Assim, D. magna mostrou-se adequada para essa avaliação, bem como o Ensaio Cometa, que é essencial para complementar outros ensaios, já que apresenta maior sensibilidade, fornecendo resultados importantes para a completa avaliação de efluentes. Palavras-chave: Ensaio Cometa. Daphnia magna. Genotoxicidade. Efluente hospitalar. ABSTRACT Considering that hospital waste waters present potentially toxic and genotoxic pollutants, the aim of this study was developed and applied to Daphnia magna cells the Comet Assay, as it is an animal generally employed in toxicity tests. The experiment was designed to evaluate 1
Acadêmico do curso de Ciências Biológicas e bolsista do Laboratório de Genética e Biotecnologia da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), fzenkner@gmail.com. Bolsista (PROBIC/FAPERGS).
2
Acadêmico do curso de Ciências Biológicas e bolsista do Laboratório de Ecotoxicologia da UNISC, camilaathanasio@hotmail.com. Bolsista (PROBIC/FAPERGS).
3
Bacharel em Nutrição, acadêmico do curso de Ciências Biológicas e funcionário do Laboratório de Histologia e Patologia da UNISC, joelellwanger@unisc.br.
4
Doutor em Genética e Biologia Molecular pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e professor da UNISC, dpra@unisc.br.
5
Doutor em Genética e Biologia Molecular pela UFRGS, coordenador do Laboratório de Genética e Biotecnologia e professor da UNISC, rieger@unisc.br.
6
Pós-Doutor pelo National Institute For Resources and Environmental, coordenador do Laboratório de Limnologia e professor da UNISC, lobo@unisc.br. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 29-36, 2012
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the genotoxic potential of waste water from a hospital laundry, situated in the ‘Vale do Rio Pardo’ region, RS. The waste water was sampled in three different months. After the assay standardization, the organisms were exposed to sub lethal waste water concentrations (0.195; 0.39; 0.78; 1.56%) during a 48 hour period. The Comet Assay was adapted to D. magna cells. The results showed significative differences (p<0.01) between the negative control and all concentrations tested. It suggests that, even at 0.195% concentration the hospital waste water is able to cause damage to the DNA. In conclusion, this study demonstrated that Comet Assay with D. magna was very effective at detecting the genotoxicity potential of waste waters, which could be important in providing an accurate data about environmental hazards caused by hospital waste water. Keywords: Comet Assay. Daphnia magna. Genotoxicity. Hospital wastewater. 1 INTRODUÇÃO A detecção de danos no DNA tem sido amplamente estudada através de métodos laboratoriais a fim de entender os tipos de lesões geradas e suas consequências em níveis mais elevados da organização biológica. As genotoxinas podem não só diminuir a expectativa de vida dos organismos, como também afetar a biodiversidade intra e interespecífica. Assim, maior entendimento sobre o tema torna-se necessário. Enquanto as taxas de neoplasias em espécies de invertebrados são consideradas baixas quando comparadas com a incidência de tumores em peixes, isso não significa que os agentes genotóxicos não apresentam efeitos nesses organismos. Segundo Atienzar et al. (2001), em invertebrados o dano genético é manifestado como um conjunto de mudanças patológicas, a chamada “síndrome da doença genotóxica”. Nesse contexto, o efeito de genotoxinas no crescimento, fecundidade, e mortalidade dos indivíduos são particularmente relevantes. Testes de toxicidade aguda e/ou crônica normalmente utilizam o invertebrado aquático Daphnia magna Straus, 1820 (Crustacea, Cladocera), conhecido como pulga d’água, na avaliação de amostras aquosas. Esse é um organismo sensível e de fácil cultivo laboratorial, características que o torna adequando para o uso em estudos de monitoramento de efluentes. Efluentes, como os de origem hospitalar, podem integrar ampla gama de contaminantes que se associam no descarte, gerando um efluente final potencialmente tóxico e/ou genotóxico (FERK et al., 2009). Segundo Machado et al. (2007), os efluentes gerados na lavanderia correspondem a cerca de 40% do volume de água utilizado nos leitos de hospitais situados no Vale do Rio Pardo, RS. Assim, estudos sobre o impacto ambiental de efluentes hospitalares são comumente desenvolvidos avaliando parâmetros físico-químicos e ecotoxicológicos, porém, poucos trabalhos dão enfoque ao potencial genotóxico desses. A relevância da detecção dos riscos genotóxicos associados com a poluição da água foi primeiramente percebida no fim da década de 70, quando novos métodos foram desenvolvidos para monitorar a presença de produtos lesivos ao DNA no ambiente aquático. Esses métodos são baseados no potencial de lesões pré-mutagênicas que são passíveis de correção e não trazem maiores consequências ao organismo se forem reparadas de forma correta (FRENZILLI, NIGRO & LYONS, 2009). Entretanto, se isso não acontecer, as quebras
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dão chances para as aberrações cromossômicas, que podem acarretar morte celular e levar a condições fisiopatológicas severas (JHA, 2008). As alterações no DNA dos organismos podem ocasionar sérias consequências para o ecossistema, já que em nível individual lesam células e órgãos dos seres vivos, podendo afetar inclusive sua função reprodutiva, implicando danos para a população e a comunidade (BOLOGNESI & HAYASHI, 2011). Um dos testes mais utilizados atualmente para avaliar danos no DNA é o Ensaio Cometa, que apresenta sensibilidade na detecção de lesões mesmo em organismos expostos a baixas concentrações de toxinas, além de ser realizado em células individuais não proliferativas (PRÁ et al., 2005). Adicionalmente, apresenta bons resultados a partir de um pequeno número de células analisadas (DA SILVA, HEUSER & ANDRADE, 2003). Frenzilli, Nigro & Lyons (2009) apresentaram diversos estudos demonstrando que o Ensaio Cometa pode ser aplicado à ampla variedade de organismos aquáticos, proporcionando sensibilidade, rapidez e versatilidade na avaliação da genotoxicidade ambiental. Esse teste pode complementar outros ensaios como, por exemplo, os ecotoxicológicos, nos quais organismos aquáticos como D. magna são geralmente utilizados na avaliação de uma determinada amostra aquosa. Assim, o objetivo deste trabalho foi desenvolver a metodologia do Ensaio Cometa com esse organismo, a fim de avaliar a genotoxicidade de efluente proveniente da unidade de lavanderia de um hospital localizado na região do Vale do Rio Pardo, RS. 2 METODOLOGIA 2 .1 Cultivo do organismo teste Os neonatos de D. magna necessários para o estudo foram obtidos a partir de indivíduos adultos cultivados conforme a norma técnica brasileira 12713 (ABNT, 2004) no Laboratório de Ecotoxicologia da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). D. magna foram mantidas em recipientes de vidro contendo meio de cultivo M4 com foto-período de 16 horas luz e 8 horas escuro e temperatura controlada de 20ºC ± 2ºC. Foram alimentados diariamente com algas da espécie Desmodesmus subspicatus. Para realização dos ensaios foram utilizados filhotes com idade entre 2 e 26 horas. 2.2 Viabilidade celular A viabilidade celular foi medida utilizando o teste de exclusão com azul de tripan. Após o preparo da suspensão celular as células foram coradas com azul de tripan 0,4%. Com o auxílio de Câmara de Neubauer e microscópio óptico (aumento de 1000x) foram contadas as células coradas (não viáveis) e não coradas (viáveis). O teste foi realizado em triplicata, sendo utilizadas amostras com viabilidade superior a 90%. 2.3 Suspensão celular A suspensão celular foi obtida por pipetagem seriada (DAVID et al., 2011) em tampão fosfato salino (PBS; pH 7,4) suplementado com 20 mM de ácido etileno diamino tetraacético (EDTA) e 50 μL de dimetilsulfóxido (DMSO). As amostras foram então centrifugadas a
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2100 RPM por 10 minutos à 4ºC e parte do sobrenadante foi descartado, resultando em 100 μL de amostra. 2.4 Ensaio Cometa A metodologia do Ensaio Cometa foi desenvolvida a partir do trabalho de Park & Choi (2007), com modificações. Para cada lâmina foram adicionados 20 μL de suspensão celular e 80 μL de agarose de baixo ponto de fusão. Essas permaneceram em solução de lise (2,5 M NaCl, 100 mM EDTA, 10 mM Tris, 1% de Triton X-100, 10% de DMSO, pH 10,0) por 1 h. A eletroforese foi conduzida durante 15 minutos (0,7 V/cm e 300 mA) em tampão com pH±12. Após neutralização e fixação, a coloração foi realizada com solução a base de nitrato de prata. As lâminas foram analisadas em microscópio óptico convencional (aumento de 400x), sendo contadas 100 células por lâmina, em um total de 400 células por amostra. As células foram classificadas de acordo com Tice et al. (2000), sendo calculados Índice (ID) e Frequência de Dano (FD). Os dados foram avaliados pela análise de variância (ANOVA) com pós-teste de Bonferroni no programa estatístico GraphPad Prism 5.01. 2.5 Coleta e avaliação de efluente hospitalar Foram realizadas coletas mensais, entre os meses de maio e julho de 2011, de efluente proveniente do setor de lavanderia de um hospital localizado na região do Vale do Rio Pardo, RS. Alíquotas do efluente foram congeladas seguindo as normas vigentes na legislação para posterior realização dos testes de toxicidade aguda e genotoxicidade com D. magna. A concentração subletal do efluente foi determinada a partir do teste de toxicidade aguda realizado com o efluente bruto diluído cerca de dez vezes. Primeiramente o efluente foi avaliado na concentração de 1,56% (concentração subletal). Após, maiores diluições foram feitas, realizando-se os ensaios com as concentrações de 1,56; 0,78; 0,39 e 0,195%. Cada concentração foi avaliada em duplicada, sendo utilizados 20 indivíduos, os quais foram expostos por 48 horas. Acompanhando cada teste utilizou-se um controle negativo e um positivo. O controle positivo consistiu em indivíduos expostos a uma solução de sulfato de cobre (0,12 mg.L-1) pelo mesmo período utilizado para o efluente.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO O Ensaio Cometa com D. magna mostrou que o efluente proveniente do setor de lavanderia hospitalar sofre variação de genotoxicidade dependendo da demanda mensal do hospital. Os resultados podem ser visualizados na Tabela 1, onde estão organizados pelo mês de coleta.
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Tabela 1 - Resultados dos ensaios realizados com Daphnia magna expostas a diferentes diluições do efluente do setor de lavanderia de hospital do Vale do Rio Pardo, RS, coletado em três meses do ano de 2011.
Mês Maio
CN
1,56%
TRATAMENTOS 0,78% 0,39%
ID 23 ± 8,29 177,25 ± 25,33 FD 12,75 ± 4,57 58,25 ± 3,5
-
-
0,195% -
Junho ID 18,67 ± 7,57 177,25 ± 17,73 136,5 ± 21,67 127,25 ± 34,09 108,33 ± 13,05 FD 8,67 ± 3,51 54,25 ± 3,4 47,5 ± 4,8 44 ± 8,49 38,67 ± 3,06 Julho ID 18 ± 1,63 FD 11,5 ± 1,29
116 ± 4,36 40 ± 1
-
-
99,67 ± 25,15 33,67 ± 6,35
CN= Controle Negativo; ID= Índice de Dano; FD= Frequência de Dano;
Em todos os meses, os resultados mostraram diferenças significativas (p<0,05) entre o controle negativo e todas as concentrações de efluente testadas, tanto para ID como para FD. No mês de junho, quando foram testadas quatro diluições do efluente, somente as concentrações de 1,56% e 0,195% apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre si (Figura 1) devido ao efeito de diluição. Contudo, mesmo a menor concentração ainda apresenta genotoxicidade significativamente aumentada em relação ao controle negativo. Figura 1 - Índice de Dano encontrado em Daphnia magna expostas a diferentes diluições de efluente do setor de lavanderia hospitalar coletado no mês de junho de 2011. 250 200
ID
150 100 50
1, 56 %
0, 78 %
0, 39 %
0, 19 5%
C
N
0
CN= Controle Negativo; ID= Índice de Dano.
Assim, mesmo quando diluído a 0,195%, os resultados indicam que o efluente apresenta compostos com potencial de causar lesão na molécula de DNA. Pode-se observar na Figura 2 que à medida que o efluente é mais concentrado, diminuem as células sem dano (classe 0) e cada vez mais nucleóides com dano máximo (classe 4) são encontrados. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 29-36, 2012
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Figura 2 - Distribuição dos nucleóides nas 5 classes de dano segundo os dados do Ensaio Cometa.
Comparando os resultados encontrados nos três meses em que o efluente foi avaliado a 1,56%, percebe-se que no último mês esse não manteve o mesmo efeito genotóxico nas células de D. magna. Os Índices de Dano para essa concentração em maio e junho não diferiram estatisticamente entre si, já o encontrado no mês de julho foi significativamente menor (p<0,05), mostrando variação da toxicidade neste mês (Figura 3). Figura 3 - Comparação entre os Índices de Dano encontrados em Daphnia magna expostas ao efluente do setor de lavanderia hospitalar diluído a 1,56% coletado nos meses de maio, junho (*) e julho (**) de 2011. 250 200
ID
150 100 50
4
C uS O
1, 56 % **
C N **
* 1, 56 % *
C N
1, 56 %
C N
0
CN= Controle Negativo; ID= Índice de Dano; CuSO4= sulfato de cobre a 0,12 mg.L-1.
Como controle positivo de genotoxicidade foi utilizado sulfato de cobre (CuSO4) na concentração de 0,12 mg.L-1. Sabe-se que o cobre se liga a proteínas e ácidos nucléicos das células causando lesões, além de aumentar a formação de radicais livres, promovendo citotoxicidade e genotoxicidade (CHAIRI et al., 2010). O CuSO4 foi capaz de induzir danos ao Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 29-36, 2012
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DNA de D. magna, mostrando-se um bom controle positivo. Pode-se observar que o ID da amostra exposta ao CuSO4 apresentou-se estatisticamente diferente do controle negativo em todos os momentos. Além disso, quando comparado ao efluente hospitalar não foram encontradas diferenças entre os ID das amostras, mais uma vez sugerindo a genotoxicidade do efluente testado (Figura 3). Ferk et al. (2009) discutiram sobre a avaliação da genotoxicidade de efluentes hospitalares através da utilização de ensaios como o Teste de Ames e o Ensaio Cometa com células de mamíferos. No trabalho foi sugerido que o potencial genotóxico desses efluentes pode estar relacionado com diversas substâncias, como resíduos de drogas antineoplásicas e o glutaraldeído utilizado na desinfecção de materiais hospitalares. Porém, deve-se levar em consideração que os agentes genotóxicos variam conforme a ala da qual o efluente provém. No presente estudo essas substâncias estão em fase de investigação, o que possibilitará um melhor tratamento do efluente antes do seu descarte no meio. 3 CONCLUSÃO Os aspectos modificados na etapa de preparação das suspensões celulares mostraramse essenciais na obtenção de resultados confiáveis a partir do EC, sendo que possíveis danos mecânicos ao DNA durante o preparo foram evitados. Quanto ao efluente hospitalar, mesmo que no último mês esse tenha apresentado menor genotoxicidade a 1,56%, os organismos expostos à concentração de 0,195% continuaram com maior ID em relação ao controle negativo. Assim, seria interessante avaliar o efluente em diluições superiores às utilizadas neste trabalho para determinar a partir de qual concentração o mesmo não apresenta potencial genotóxico para D. magna. O Ensaio Cometa, em conjunto com análises físico-químicas e ecotoxicológicas, pode proporcionar a caracterização completa de efluentes antes e depois de serem tratados e descartados no ambiente. REFERÊNCIAS ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 12713: Ecotoxicologia Aquática – Toxicidade Aguda – Método de ensaio com Daphnia spp. (Cladocera, Crustacea). Rio de Janeiro, 2004. 21p. ATIENZAR, F. A.; CHEUNG, V. V.; JHA, A. N.; DEPLEDGE, M. H. Fitness parameters and DNA effects are sensitive indicators of copper-induced toxicity in Daphnia magna. Toxicological sciences, v. 59, p. 241-250, 2001. BOLOGNESI, C.; HAYASHI, M. Micronucleus assay in aquatic animals. Mutagenesis, v. 26, n. 1, p. 205-213, 2011. CHAIRI, H.; FERNÁNDEZ-DIAZ, C.; NAVAS, J. I.; MACHADO, M.; REBORDINOS, L.; BLASCO, J. In vivo genotoxicity and stress defences in three flatfish species exposed to CuSO4. Ecotoxicology and Environmental Safety, v. 73, p. 1279-1285, 2010.
Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 29-36, 2012
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DA SILVA, J., HEUSER, V., ANDRADE, V. Biomonitoramento Ambiental. In: DA SILVA, J., ERDTMANN, B.; HENRIQUES, J. A. P. (Org.). Genética Toxicológica. Porto Alegre: Alcance, p. 167-180, 2003. DAVID, R. M.; DAKIC, V.; WILLIAMS, T. D.; WINTER, M. J.; CHIPMAN, K. Transcriptional responses in neonate and adult Daphnia magna in relation to relative susceptibility to genotoxicants. Aquatic Toxicology, v. 104, p. 192-204, 2011. FERK, F.; MISIK, M.; GRUMMT, T.; MAJER, B.; FUERHACKER, M.; BUCHMANN, C.; VITAL, M.; UHL, M.; LENZ, K.; GRILLITSCH, B..; PARZEFALL, W.; NERSESYAN, A.; KNASMÜLLER, S. Genotoxic effects of wastewater from an oncological ward. Genetic and Environmental Mutagenesis, v. 672, p. 69-75, 2009. FRENZILLI, G.; NIGRO, M.; LYONS, B. P. The Comet assay for the evaluation of genotoxic impact in aquatic environments. Mutation Research, v. 681, p. 80-92, 2009. JHA, A. N. Ecotoxicological applications and significance of the comet assay. Mutagenesis, v. 23, n. 3, p. 207–221, 2008. MACHADO, E.L. ; KIST, L. T.; SCHMIDT, R.; HOELTZ, J. M.; DALBERTO, D.; ALCAYAGA, E. L. A. Secondary Hospital Wastewater Detoxification and Disinfection by Advanced Oxidation Processes. Environmental Technology, V. 28, p. 1135-1143, 2007. PARK, S. Y.; CHOI, J. Cytotoxicity, genotoxicity and ecotoxicity assay using human cell and environmental species for the screening of the risk from pollutant exposure. Environmental International, v. 33, p. 817-822, 2007. PARK, S. Y.; CHOI, J. Genotoxic Effects of Nonylphenol and Bisphenol A Exposure in Aquatic Biomonitoring Species: Freshwater Crustacean, Daphnia magna, and Aquatic Midge, Chironomus riparius. Bulletin of Environmental Contamination and Toxicology, v. 83, p. 463468, 2009. PRA, D., LAU, A. H., KNAKIEVICZ, T., CARNEIRO, F. R., ERDTMANN, B. Environmental genotoxicity assessment of an urban stream using freshwater planarians. Mutation Research. Genetic Toxicology and Environmental Mutagenesis, 585(1-2): 79-85, 2005. TICE, R; AGURELL, E.; ANDERSON, D.; BURLINSON, B.; HARTMANN, A.; KOBAYASHI, H.; MIYAMAE, Y.; ROJAS, E.; RYU, J. C.; SASAKI, Y. F. Single cell gel/comet assay: guidelines for in vitro and in vivo genetic toxicology testing. Environmental and Molecular Mutagenesis, v. 35, p. 206-221, 2000. Agradecimentos Os autores agradecem a Fundação de Apoio a Pesquisa do Rio Grande do Sul (FAPERGS) pela bolsa concedida à primeira autora, e à Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) pela infraestrutura fornecida.
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ÁREA DE CIÊNCIAS EXATAS, DA TERRA E ENGENHARIAS Na área de Ciências Exatas, da Terra e Engenharias entre os 63 trabalhos apresentados no evento, 95% foram de alunos bolsistas de Iniciação Científica da Universidade, sendo 03 trabalhos de alunos de Iniciação Científica vinculados a outras Instituições de Ensino Superior do Estado do Rio Grande do Sul. A maioria dos trabalhos nesta área foi de bolsistas do Programa UNISC de Iniciação Científica – PUIC, seguida dos Programas de bolsa de verba externa para pagamentos de bolsas em projetos de pesquisa e Programa PIBIC/CNPq, PIBITI/CNPq e PROBIC/FAPERGS. Nesta área também se observa a forte participação de estudantes participantes do Programa PUIC voluntário, conforme dados apresentados na Figura 03. Figura 03 – Modalidade de bolsas dos estudantes participantes do XVII Seminário de Iniciação Científica na Área de Ciências Exatas da Terra e Engenharias.
Fonte: Coordenação de Pesquisa, UNISC, 2011.
AVALIAÇÃO DE BLOCOS CERÂMICOS DE VEDAÇÃO SEGUNDO NBR 15.270 Marcus Daniel Friederich dos Santos1 Elise De Conto 2 Cândida Angelim 3 Fernanda Herberts 4 Victória Pereira Freitas 5 RESUMO O objetivo desta pesquisa é analisar o desempenho de diferentes geometrias de blocos de vedação comercializados na região de Santa Cruz do Sul, Venâncio Aires e Vera Cruz, com base na NBR 15.270. A justificativa para o desenvolvimento está baseada em trabalhos acadêmicos desenvolvidos nas disciplinas de Engenharia Civil e Arquitetura e Urbanismo, onde foram realizadas coletas em lojas de materiais de construção e, quando analisado o enquadramento nas normas brasileiras, verificou-se que grande parte das amostras não se enquadrou na especificação. É importante alertar que muitas obras são construídas utilizando este material como estrutura da edificação, desrespeitando também as normas de cálculo e de especificações. Na primeira etapa da pesquisa foi elaborado um questionário para aplicação em lojas de materiais de construção. Em cada loja foram coletadas 40 amostras. A partir daí, foram verificados se estas se enquadram nas normas, sendo realizados alguns ensaios. Após ensaios, foi observado que a maioria das amostras se enquadra no especificado em norma para ensaios de planeza e esquadro, porém no ensaio de resistência foi observada uma grande variação. Após a conclusão dos ensaios, será proposto seminário com a Associação dos Comerciantes de Materiais de Construção para informar os dados obtidos. Palavras-chave: Blocos cerâmicos de vedação. Avaliação de blocos. NBR 15.270.
1
Professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Santa Cruz do Sul e orientador deste Projeto de Pesquisa. E-mail: marcusds@unisc.br.
2
Graduanda do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Santa Cruz do Sul e bolsista voluntária nesta pesquisa. E-mail: elisedeconto@hotmail.com
3
Graduanda do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Santa Cruz do Sul e participante nesta pesquisa. E-mail: candidaangelin@hotmail.com.
4
Graduanda do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Santa Cruz do Sul e participante nesta pesquisa. E-mail: fernandaherberts@hotmail.com.
5
Graduanda do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Santa Cruz do Sul e participante nesta pesquisa. E-mail: vickyfreitas@hotmail.com. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 38-49, 2012
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ABSTRACT The objective of this research is to analyze the performance of different geometries blocks’ seal that are sold at Santa Cruz do Sul’s area, Venâncio Aires and Vera Cruz, with agreement in NBR 15.270, to assist the awareness of adequate use this product. The justification for the development is based on academics texts developments on Architecture and Urbanism Engineering civil’s discipline, where they were realized collections in building material’s stores and, when the verification of seal NBR 15270 was analyzed, verified that the most sample’s parts aren’t in agreement with specification in used seal. Is important to alarm that a lot of Works that are building using this material, as the edification structures, disrespecting too the seals and calculation and the specifications. At the first search’s stage was elaborated a questionnaire to application at building material’s stores. In each store were collected 40 samples. Then was verified this samples was in agreement with the used seal. Was realized some trials. After the trials, was observed that most of samples are in specified at seal to plan of face and square, but to compression’s resistance had a wide variation. After the conclusion of trials, will be proposed seminary with Merchants Association of Building Materials to inform the data obtained. Keywords: Ceramic seal blocks. Evaluation of blocks. NBR 15.270.
1 INTRODUÇÃO Os produtos cerâmicos se confundem com a história, pois na maioria dos registros das civilizações sempre existe alguma citação que se relaciona à cerâmica. Nos dias atuais, a cerâmica está dividida em dois grupos: cerâmica tradicional ou clássica e a cerâmica avançada. Esta divisão está relacionada com a pureza e distribuição granulométrica, forma das partículas e com o grau de beneficiamento das matérias-primas. A cerâmica avançada utiliza a mesma matéria-prima, porém com composição, morfologia e tamanho das partículas finamente controlado, além de um processo de fabricação de nível tecnológico mais elevado. A cerâmica tradicional pode ser subdividida em: cerâmica vermelha ou estrutural, cerâmica branca, refratários, isolantes térmicos, vidros, abrasivos, cimento portland e agregados leves. A cerâmica avançada compreende os seguintes segmentos: peças de motores, capacitores cerâmicos, osciladores elétricos, semicondutores e supercondutores. (TOFFOLI, 1997). No século XIX o tijolo se tornou muito importante, pois o processo de fabricação sofreu avanços tecnológicos consideráveis, assim os tamanhos das peças começaram a ser padronizados como por exemplo: “comprimento igual ao dobro da largura”. Iniciaram-se as modulações. O tijolo passou a ser considerado um elemento básico para todas as estruturas. O processo de industrialização dos produtos cerâmicos possibilitou à arquitetura criar estilos novos (ARGILÉS, 1993). No Brasil, os primeiros registros sobre cerâmica são datados por volta de 1541, com a identificação de uma olaria na tribo de índios Aruaques, na região do alto e médio Amazonas. Provavelmente esta cultura tenha influenciado no aprimoramento da técnica oleira dos moradores da ilha de Marajó, hoje reconhecidos como excelentes artesões. A indústria cerâmica está entre as mais antigas do mundo e em regiões mais desenvolvidas e em pólos cerâmicos as indústrias de médio e grande porte têm um Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 38-49, 2012
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considerável grau de automatização do processo produtivo. Por outro lado, em todo País existe um grande número de pequenas olarias produzindo artesanalmente e a comercialização desconhece parâmetros de norma para produção e comercialização. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A análise da conformidade realizada nas amostras de Bloco Cerâmico vai ao encontro do Procedimento Geral do Programa de Análise de Produtos do Inmetro quanto à seleção dos produtos, priorizando aqueles de consumo intensivo e extensivo pela sociedade e que estejam relacionados a questões que envolvam a segurança e a saúde dos consumidores e o meio ambiente. Utilizados pelo homem desde 4.000 AC os materiais cerâmicos destacam-se pela sua durabilidade e pela facilidade da sua fabricação, dada a abundância da matéria-prima que o origina, a argila. Os blocos cerâmicos, ou tijolos, como são popularmente conhecidos, são um dos componentes básicos de qualquer construção de alvenaria, seja ela de vedação ou estrutural. Os tijolos são produzidos a partir da argila, geralmente sob a forma de paralelepípedo, possuem coloração avermelhada e apresentam vazados/furos ao longo de seu comprimento. Os blocos de vedação são aqueles destinados à execução de paredes que suportarão o peso próprio e pequenas cargas de ocupação (armários, pias, lavatórios) e geralmente são utilizados com os vazados na posição horizontal. Os problemas enfrentados pelo setor cerâmico brasileiro e o seu reflexo na qualidade dos produtos disponíveis para o consumidor, principalmente em função da existência da não conformidade técnica intencional, foi um dos motivos que levou a desenvolver este trabalho. 3 METODOLOGIA 3.1 Elaboração e Aplicação do Questionário Primeiramente foi realizado o estudo das geometrias dos blocos principais fabricados e posteriormente aplicado um questionário em lojas de materiais de construção. O objetivo deste é verificar a forma de comercialização de blocos de vedação, o histórico de ensaios, o grau de informação em relação às normas brasileiras e como os clientes são informados em relação à utilização do produto.
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Figura 01 - Questionário aplicado nas lojas. QUESTIONÁRIO Código da loja:
Data da coleta:
1) Nome fantasia: ________________________________________________________________________ 2) Razão social:__________________________________________________________________________ 3) Endereço: ____________________________________________________________________________ 4) Telefone para contato: __________________________________________________________________ 5) E-mail para contato: ____________________________________________________________________ 6) Proprietário: __________________________________________________________________________ 7) Quais são as cerâmicas (fabricantes) comercializadas? _______________________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________________ 8) Quais são os tipos de blocos fornecidos por cada cerâmica? Dimensão do Bloco
Cerâmica
Valor (Milheiro)
Venda Mensal (Unid.)
9) A origem do produto é conhecida? ( ) Sim ( ) Não 10) As cerâmicas fornecem ensaios? Quais? ( ) Sim ( ) Não _______________________________________________________________________________________ 11) Os clientes são informados em relação à utilização do produto? Como? ( ) Sim ( ) Não _______________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________
3.2 Coleta de Amostras Após aplicar o questionário foi realizada a coleta de 40 blocos de cada tipo na loja de materiais de construção para a caracterização dos produtos cerâmicos. 3.2.1 Armazenamento nas lojas e seleção das unidades Todas as amostras foram coletadas nas lojas pela equipe de pesquisa, adotando-se um critério de escolha aleatória das unidades. Após receberam um código que identifica a cidade, a loja e a olaria e o fabricante e foram transportados e armazenados no Laboratório de Tecnologia da Construção (UNISC) para realizar dos ensaios. Das Figuras 02 a 06 podem ser visualizados os blocos coletados nas lojas de materiais de construção.
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Figura 02 – Bloco Modelo 1A
Figura 04 – Bloco Modelo 3A
Figura 03 – Bloco Modelo 2A
Figura 05 – Bloco Modelo 4A
Figura 06 – Bloco Modelo 5A
Foram verificados se estas se enquadram nas normas técnicas, sendo realizados os seguintes ensaios: 13 amostras para verificação dimensional, planeza das faces e esquadro, 6 para absorção e o 13 amostras para o teste de resistência à compressão. 3.3 Análise Segundo a NBR 15.270 - Ensaios Dimensionais Conforme especificado na NBR 15.270, da Associação Brasileira de Normas Técnicas, é realizado um ensaio para verificação das medidas reais de cada uma das amostras coletadas, diferenças em relação ao esquadro e planeza das faces bem como o desvio em relação ao esquadro medido pelo ângulo formado entre o plano de assentamento do bloco e sua face. As tolerâncias previstas na norma para as medidas individuais estão indicadas na Tabela 01, Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 38-49, 2012
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enquanto que as tolerâncias relacionadas à média estão indicadas na Tabela 02. A norma estabelece também que os septos e as paredes externas devem ter, respectivamente, 6mm e 7mm. Tabela 01 - Tolerâncias dimensionais individuais relacionadas às dimensões efetivas. Grandezas controladas
Tolerância individual mm
Largura (L) Altura (H)
±5
Comprimento (C)
Tabela 02 – Tolerâncias dimensionais relacionadas à medida das dimensões efetivas. Grandezas controladas
Tolerância individual mm
Largura (L) Altura (H)
±3
Comprimento (C)
3.4 Análise segundo a NBR 15.270 - Ensaios de Resistência à Compressão A NBR15.270 classifica a resistência média à compressão dos blocos de vedação conforme tabela a seguir: Tabela 03 – Resistência média mínima de blocos em relação aos vazados. Posição dos furos Para blocos usados com furos na horizontal Para blocos usados com furos na vertical
fb( MPa) ≥ 1,5 ≥ 3,0
O capeamento das unidades de blocos de vedação foi executado com argamassa de cimento e areia, para posterior ruptura à compressão. Esta ruptura deve ocorrer após o bloco ser submerso em água após um período de 24 horas. Figura 07 - Compressão axial nos blocos capeados em lados opostos.
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3.5 Execução dos Ensaios 3.5.1 Desvio em relação ao esquadro Conforme previsto na NBR 15.270 da Associação Brasileira de Normas Técnicas, foram realizados ensaios dimensionais em relação ao esquadro, conforme a Figura 08. A norma prevê que pode haver desvio de no máximo 3 mm. Figura 08 – Medição do desvio em relação ao esquadro com paquímetro digital.
3.5.2 Planeza das faces Os ensaios de planeza das faces também foram realizados conforme a NBR 15.270, como pode ser visto na Figura 09. Neste ensaio é verificado se há ou não presença de concavidades ou convexidades nas faces dos blocos. Figura 09 – Verificação da presença de concavidades ou convexidades nas faces dos blocos, com paquímetro digital.
3.5.3 Espessura das paredes externas e septos dos blocos A determinação da espessura das paredes externas e septos dos blocos é realizada na sequência, tendo sido feita esta conferência com paquímetro digital, como é previsto na NBR 15.270 e pode ser visualizado nas Figuras 10 e 11.
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Figura 10 e 11 – Medição nas paredes externas e internas do bloco com paquímetro digital.
3.5.4 Ensaios de Absorção Para realização deste ensaio, a Associação Brasileira de Normas Técnicas estabelece na NBR 15.270 que os blocos sejam mantidos na estufa a 100º C até estarem secos. Após ser feito isso devem ser pesados e deixados 24 horas na água, para novamente serem pesados e ser realizada a comparação entre os pesos e descobrir o quanto de água o bloco absorveu, como pode ser visto nas Figuras 12 e 13. Figura 12 e 13 – Blocos imersos em água para posterior secagem na estufa.
3.5.5 Ensaios de Resistência à Compressão Este ensaio é realizado a fim de obter a resistência média à compressão dos blocos para posterior averiguação se estes se enquadram na norma. A ABNT define, na NBR 15.270: Componentes Cerâmicos Parte 3: Blocos cerâmicos para alvenaria de vedação – Métodos de ensaio, que o capeamento dos blocos deve ser realizado com argamassa de cimento e areia, traço 1:1, ambos peneirados, em dois lados. Para se obter a planeza das faces capeadas, foi utilizado nível bolha e após colocados em água submersos por 24 horas.
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Figura 14 – Verificação do nível.
Figura 15 - Capeamento nas duas faces opostas.
Figura 16 – Blocos submersos por 24 horas.
O rompimento dos blocos é realizado em uma prensa hidráulica, da marca Solotest, como pode ser observado na Figura 17, e os resultados são registrados em planilhas para posterior elaboração de tabelas, gráficos, etc. Figura 17 – Ensaio de resistência à compressão em bloco disposto com furo na vertical, meia vez e uma vez.
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4 RESULTADOS OBTIDOS Conforme a NBR 15.270, a absorção deve variar entre 8 e 22%, sendo que os valores obtidos ficaram entre 19,1%, referente ao modelo 1A e 10,9% referente ao 4A. Assim, podemos perceber que todos os blocos analisados até então estão de acordo com a norma. Quanto aos septos externos, a norma estabelece que eles possuam, no mínimo, 7 mm de espessura. Sendo assim, todos estão se enquadrando neste quesito, tendo como menor valor 8,2 até 13,2 mm. Já os septos internos, devem ter, no mínimo, 6 mm de espessura. Todos os blocos estão de acordo com o estabelecido em norma porque ficaram entre 7,6 e 11,0 mm. Os blocos analisados possuem 9 cm de largura, 14 cm de altura e 19 cm de comprimento. A norma estabelece que a média das dimensões dos blocos analisados possa variar 3 mm para mais ou a menos, obtendo os seguintes valores: * na largura menor medida foi de 87 a 91,0 mm; * na altura menor medida foi de 135,5 a 142,4 mm; * no comprimento menor medida foi de 186,2 a 189,2 mm. Apenas dois blocos atingiram as todas as médias previstas pela NBR 15.270. Quanto ao esquadro apenas um bloco não atingiu as condições previstas na mesma. Já quanto ao ensaio de resistência à compressão, a norma estabelece que os blocos resistam a no mínimo 1,50 MPa quando deitados, porém apenas uma das marcas apresentou a resistência prevista, como mostra o Gráfico 01. Gráfico 01 – Resistência média obtida em cada um dos modelos quando dispostos deitados (uma vez), enfatizando o limite mínimo admitido pela norma.
Quando dispostos de “cutelo”, apenas os modelos 3A e 4A atingiram a resistência estabelecida, como pode ser visualizado no Gráfico 02. É importante destacar que 2 das 5 marcas apresentaram resistência equivalente a menos de 1/5 do valor que é estabelecido na NBR 15.270.
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Gráfico 02 – Resistência média obtida em cada um dos modelos quando dispostos de cutelo (meia vez), enfatizando o limite mínimo admitido pela norma.
A última análise de resistência acontece com os blocos dispostos na vertical, porém essa disposição não é utilizada em blocos de vedação (tijolo 6 furos) e sim em blocos cerâmicos estruturais. Neste teste é possível perceber que apenas dois modelos não atingiram a resistência mínima estabelecida, como pode ser visto no Gráfico 03, mas chegaram muito próximo dela. Gráfico 03 – Resistência média obtida em cada um dos modelos quando dispostos de pé (furos na vertical), enfatizando o limite mínimo admitido pela norma.
5 DISCUSSÕES E CONCLUSÕES Foi constatado nos ensaios dimensionais que todas as amostras se enquadraram no que é especificado em norma, valendo também esta afirmação para ensaios de planeza e esquadro. Em relação à absorção todos os tipos de blocos ficaram dentro da faixa de 8 a 22%. Quanto ao ensaio de resistência à compressão, foi observada uma grande variação de resultados, sendo que ao analisá-los é possível constatar que os modelos 1A e 5A não atingiram nenhuma das resistências previstas em norma e são, respectivamente, o segundo e o terceiro modelo de menor custo. O modelo de menor valor de venda é o 4A e apresentou resistência satisfatória em dois quesitos. Já o modelo de maior custo que é o 3A, entre os analisados, atingiu todos os itens estabelecidos em norma.
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A baixa resistência nos indica a falta de controle no processo de fabricação, provavelmente decorrente de matéria prima não uniforme ou falta de controle na secagem e queima dos produtos. Após a conclusão deste levantamento, em 2012, será de fundamental importância o seminário com os lojistas que comercializam estes materiais, buscando conscientizar da realidade de mercado, sendo que até a presente data apenas um de cinco produtores de blocos de vedação testados se enquadram nas normas brasileiras. REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Componentes Cerâmicos, Parte 1: Blocos cerâmicos para alvenaria de vedação – Terminologia e requisitos NBR-15270. Rio de Janeiro, 2005. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Componentes Cerâmicos, Parte 2: Blocos cerâmicos para alvenaria de vedação – Terminologia e requisitos NBR-15270. Rio de Janeiro, 2005. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Componentes Cerâmicos, Parte 3: Blocos cerâmicos para alvenaria de vedação – Métodos de ensaio NBR-15270. Rio de Janeiro, 2005. CAVALHEIRO, O. P.; SANTOS, M. D. F. dos. Desenvolvimento e desempenho de bloco cerâmico para alvenaria estrutural. In: Anais do XXVIII Jornada Sul-americanas de Engenharia Estrutural, São Carlos: EESC/USP, 1997. v.5. p.1995-2004. PRADO,S.H., Resistência à compressão de tijolos e blocos cerâmicos de diferentes formas e dimensões. Dissertação de Mestrado. Curso de Pós-graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, 1995. PARSEKIAN, Guilherme A. Alvenaria Estrutural em Blocos cerâmicos. São Paulo, 2010. TOFOLLI, M. S. Materiais Cerâmicos. Poli USP – São Paulo, SP. 1997. 43 p. ARGILÉS, J. M.A. Século XIX: tijolos, é lógico. Revista Téchene, São Paulo: Pini, n. 7, p. 20-23. nov./dez 1993.
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JOGO COMPUTACIONAL PARA APOIO A PESSOAS COM PARALISIA CEREBRAL Jorlei Luis Baierle1 Rejane Frozza2 Beatriz Lux3 RESUMO Este artigo apresenta um jogo computacional educacional desenvolvido para atuar como uma nova tática de ensino em um ambiente virtual de aprendizagem com agentes pedagógicos emocionais, que executam diferentes funções. O jogo computacional tem como objetivo desenvolver o raciocínio lógico oferecendo desafios aos estudantes em um ambiente 3D, incluindo personagens tais como macacos, abelhas, jacaré, morcegos e gorila no trajeto de um trem que carrega mantimentos. O cenário do jogo possui elementos diversificados, tais como pontes, túnel, lago, floresta, montanhas e aldeia de índios. Este projeto visa contribuir no processo de ensino-aprendizagem, oferecendo um ambiente dinâmico e de interação com os estudantes, respeitando e adaptando-se às suas características de aprendizagem. Pretende-se adaptar o jogo desenvolvido para trabalhar com pessoas com deficiência física motora, mas com capacidade de aprendizagem, a fim de auxiliar com a sua inclusão em nossa sociedade. Palavras-Chave: Jogo computacional. Ambiente educacional virtual. Inclusão. Paralisia cerebral. ABSTRACT This paper presents an educational computer game, developed to act as a new teaching tatic in a virtual environment with emotional pedagogical agents that perform different functions. The educational game aims to develop logical reasoning offering challenges to students, in a 3D environment, including characters such as monkeys, bees, alligator, bats and gorilla in the path of a train carrying provisions. The scenario of the game has several elements, such as bridges, tunnel, lake, forest, mountains and Indian village. This project contributes in teaching-learning process, which offers a dynamic environment of interaction with the students, respecting and adapting to their learning characteristics. It is intended to adapt the game developed to work with people with motor disabilities, but capable of learning, in order to assist their inclusion in our society. Keywords: Computer game. Virtual educational environment. Inclusion. cerebral paralysis. 1
Aluno do Curso de Ciência da Computação – Bolsista (PIBITI/CNPq) – UNISC. E-mail: jorleib@mx2.unisc.br
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Doutora em Ciência da Computação, professora do Departamento de Informática e do Programa de PósGraduação em Sistemas e Processos Industriais – UNISC
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Mestre em Desenvolvimento Regional, professora do Departamento de Informática – UNISC. E-mail: lux@unisc.br
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1 INTRODUÇÃO De acordo com (AZEVEDO; TAVARES, 2001), a aprendizagem é uma das atividades mais ricas desenvolvida pelo homem, devido à assimilação de novos conhecimentos. Geralmente, o local onde este aprendizado ocorre é na sala de aula, verificando, assim, a importância do papel do professor. Na visão de Silva e Heck (2008) experiências agradáveis, em relação à utilização de recursos tecnológicos nas atividades de ensino, têm sido relatadas por estudantes e professores. As pessoas com deficiências físicas motoras são aquelas que apresentam limitações de mobilidade, quando comparadas ao indivíduo que possui todas as habilidades físicas mentais e neurológicas. Pessoas com desabilidades possuem os mesmos direitos das demais, e é neste ponto que surge o conceito de inclusão social, que é a adaptação da sociedade para que os indivíduos com deficiências sejam incluídos em todas as esferas da sociedade. A acessibilidade em jogos de computador pode ser conceituada como a capacidade de participar plenamente do jogo apesar das limitações que apresentam os indivíduos com algum tipo de incapacidade. Deve-se levar em conta que jogos computacionais normalmente possuem interfaces complexas, que em geral são projetadas considerando pessoas com plenas habilidades, da mesma forma que os dispositivos desenvolvidos para a interação com estes jogos. Existem iniciativas que buscam conscientizar os desenvolvedores de jogos a levarem em conta alguns princípios de acessibilidade para tornar o acesso aos jogos mais universal. Tais iniciativas são, em sua maioria, não comerciais e têm divulgado trabalhos que propõem diferentes formas de interação entre pessoas com limitações de mobilidade e jogos eletrônicos, incluindo dispositivos especiais e ferramentas de software ou combinações de ambos, para proporcionar melhor acesso a estes indivíduos. O desenvolvimento de jogos computacionais educacionais pode proporcionar uma melhoria dos processos de ensino-aprendizagem, já que motiva o interesse de interação dos usuários com o sistema computacional. Neste sentido, um dos objetivos do projeto versa sobre a modelagem e o desenvolvimento de um jogo computacional educacional, que atenda às necessidades especiais do estudante em relação à paralisia cerebral, sem perda das suas capacidades cognitivas, a ser utilizado como estilo cognitivo no ambiente virtual de aprendizagem desenvolvido nesta pesquisa. O jogo computacional desenvolvido é em 3D e refere-se às habilidades de raciocínio lógico, apresentando conceitos básicos, desafios a serem cumpridos e problemas a resolver, durante a interação dos estudantes com o sistema. O artigo está organizado nas seguintes seções: os temas relativos à inclusão e deficiência; as características gerais do ambiente educacional virtual desenvolvido; os jogos computacionais na educação; as características do jogo educacional proposto e desenvolvido; e as conclusões. 2 A RELAÇÃO INCLUSÃO E DEFICIÊNCIA O artigo 1º da declaração universal dos direitos humanos diz “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.” (ONU, 2008). Este princípio deveria bastar para que todos os indivíduos fossem tratados de forma igualitária e para que a todos fossem dadas as mesmas condições de vida.
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No entanto, a maior parte do que é construído pela sociedade, é produzido a partir dos referenciais do chamado “homem-padrão”, que segundo (VITAL; QUEIROZ, 2008) é “possuidor de todas as habilidades físicas, mentais e neurológicas.”. Conforme o texto faz-se necessária uma visão que considera o acesso universal. Ainda que o autor estivesse se referindo ao espaço físico, este conceito pode ser extrapolado a todo o tipo de projeto, seja ele de um prédio, de uma máquina ou mesmo de um sistema de informação. Para se ter ideia das dificuldades que se deve ter em mente ao se projetar um ambiente acessível, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiências define no Artigo 1º que: Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física (motora), mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas. (ONU, 2008).
De acordo com IGDA (acrônimo de International Game Developers Association, 2011), as principais categorias de incapacidades encontradas na prática de jogos eletrônicos são limitações na visão, audição, mobilidade, ou problemas cognitivos. Considerando o fato de que este trabalho será focado em indivíduos com deficiências físicas motoras que mantêm suas capacidades cognitivas, esta categoria de incapacidades será tratada em maior detalhe. Conforme Diehl (2006), “pessoas com deficiências físicas (motoras) podem ser classificadas, de forma aproximada, como aquelas que possuem algum tipo de comprometimento para a realização dos padrões motores esperados”. As origens da deficiência física podem ser de ordem cerebral, medular, muscular, e ósseo-articular e os efeitos no indivíduo incluem as deficiências físicas como lentidão gestual e movimentos involuntários, paralisia parcial ou total, malformações e amputações. Segundo Sassaki (2005), a inclusão social é “o processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade”. Em sua visão, Kiehl (2010) afirma que “nos dias atuais, o paradigma da inclusão deve levar o indivíduo a ser caracterizado pelo respeito às diferenças, isto é, respeito às pessoas que apresentam deficiência, dando-lhes o direito de ser parte da sociedade”. Segundo Vital e Queiroz (2008), a Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência se “refere à acessibilidade como ferramenta para que as pessoas com deficiência atinjam sua autonomia em todos os aspectos da vida”. Dessa forma, pode-se considerar a acessibilidade como uma ferramenta para a inclusão social. Na visão de IGDA (2011), a acessibilidade em jogos pode ser definida como a habilidade de jogar um jogo mesmo quando operando sob condições limitantes. Condições limitantes podem ser limitações funcionais, ou desabilidades – tais como cegueira, surdez, ou limitações de mobilidade.
Devido ao fato dos resultados do Censo 2010 terem sua divulgação prevista para o primeiro trimestre de 2012 (IBGE, 2010), os números disponíveis são do Censo Demográfico 2000 realizado pelo IBGE. Conforme estes números, o Brasil possui 24.600.256 pessoas portadoras de deficiências. Este número representa aproximadamente 14,5 % do total da Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 50-61, 2012
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população registrada na época. Deste total de pessoas com incapacidades, 1.416.060 possuem algum tipo de deficiência física. Sendo assim, mesmo levando-se em conta estes números desatualizados, pode-se ter uma ideia da demanda existente para jogos computacionais acessíveis aos incapacitados, tanto para serem utilizados como entretenimento quanto para uso educacional ou em tratamentos de reabilitação. As primeiras iniciativas relacionadas à acessibilidade são tão antigas quanto os próprios jogos eletrônicos. No entanto, são trabalhos isolados, de pessoas envolvidas com portadores de deficiências que improvisavam dispositivos para proporcionar algum nível de usabilidade a estes indivíduos. Conforme IGDA (2011), as principais maneiras de melhorar a acessibilidade de um jogo, focando em dificuldades motoras são: permitir que todos os controles sejam remapeados, possibilitando que o jogador jogue da forma mais confortável possível; prover documentação em formato acessível, como html ou texto puro, por exemplo; e disponibilizar modos auxiliares, como mira automática e opções de treinamento, entre outros; disponibilizar uma ampla gama de níveis de dificuldade, para evitar que o jogador se frustre por não conseguir avançar no jogo; permitir o ajuste da velocidade do jogo conforme o tempo de reação do jogador, também para evitar sua insatisfação. Desta forma, tornar um jogo universalmente acessível é uma tarefa difícil, pois se deve lidar com uma grande variedade de dificuldades. Mesmo assim, um jogo computacional pode ser desenvolvido com estas habilidades, atendendo e contribuindo de forma lúdica aos indivíduos com incapacidades motoras. 3 AMBIENTE VIRTUAL EDUCACIONAL E AS TÁTICAS DE ENSINO O ambiente educacional virtual desenvolvido pelo grupo de pesquisa do projeto tem a atuação dos agentes pedagógicos emocionais Dóris (agente tutor) e Dimi (agente companheiro), baseado em estilos cognitivos para adaptação às características de aprendizagem dos usuários (estudantes e público em geral) (FROZZA et al, 2011). A Figura 1 apresenta uma das telas do ambiente, com o conteúdo instrucional do domínio da coleta seletiva e compostagem. Dimi.
Figura 1 - Tela do ambiente educacional virtual com os agentes pedagógicos Dóris e
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Neste ambiente, tem se o intuito de adicionar o jogo computacional desenvolvido. Os jogos computacionais podem também ser utilizados em ambientes educacionais virtuais como tática de ensino, contribuindo de forma eficiente para estimular as atividades dos usuários. 4 JOGOS COMPUTACIONAIS NA EDUCAÇÃO Estudos direcionados à utilização de jogos computacionais no aprendizado vêm sendo feitos por vários pesquisadores, tanto a nível nacional, quanto internacional. O atrativo dos jogos, em uma primeira avaliação, pode ser interpretado pelas suas características mais conhecidas: ludicidade, apresentação de desafios, competitividade. A possibilidade, porém, de desenvolver ambientes virtuais integrando várias mídias (animação, vídeo, áudio, texto), segundo (BATTAIOLA; ELIAS; DOMINGUES, 2002), “origina as apresentações multimodais e o efeito da atenção dividida”. Este efeito, segundo o autor, facilita o aprendizado porque a memória humana processa melhor as informações se forem apresentadas em dois modos diferentes, visual e auditivo. Outra característica importante é salientada por (GOSUEN, 2004) que analisa a importância do papel do inter-ator nos universos digitais interativos, dos quais depende a conclusão da narrativa. O aluno, pode se perceber como parte do ambiente em um processo de imersão interno, onde atuará como personagem principal, realizando uma “simulação subjetiva”, assim explicada pelo autor: Esta simulação subjetiva poderia estar relacionada não apenas ao nosso desejo de explorar conteúdos possíveis em nosso mundo real, mas nas novas possibilidades até então impensadas e evidenciadas pelo prazer de nos preservarmos através da ideia de recursividade oferecida pelo meio digital, ou seja, a possibilidade de podermos recomeçar novamente uma situação experimentada independente do seu resultado. (GOSUEN, 2004).
A autora (ROLAND, 2004) salienta a importância dos jogos em nossa vida desde a infância e o fato de facilitarem o aprendizado por serem motivadores e divertidos. Segundo a autora: Jogar é participar de um mundo de faz de conta, dispor-se às incertezas e enfrentar desafios em busca de entretenimento. Através do jogo se revelam a autonomia, criatividade, originalidade e a possibilidade de simular e experimentar situações perigosas e proibidas ao nosso cotidiano.
Também, o ensino utilizando meios lúdicos cria ambientes gratificantes e atraentes servindo como estímulo para o desenvolvimento integral. O autor coloca que um jogo educativo computadorizado é um ambiente de aprendizagem que une as características dos jogos com as de software, agregando memória (visual, auditiva, sinestésica); orientação temporal e espacial (em duas e três dimensões); coordenação motora viso manual (ampla e fina); percepção auditiva, percepção visual (tamanho, cor, detalhes, forma, posição, lateralidade, complementação), raciocínio lógico-matemático, expressão linguística (oral e escrita), planejamento e organização. Porém, nem todos os jogos possuem as qualidades necessárias para serem considerados atraentes e prenderem a atenção dos usuários. Buscou-se definir quais seriam as características importantes para tornar um jogo uma atividade interessante e prazerosa. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 50-61, 2012
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Segundo (HUIZINGA, 2004), são cinco as características, como descrito a seguir: • Liberdade: O jogo não deve ser uma atividade obrigatória, joga-se pelo prazer de jogar. • Absorção: O jogo conduz para uma esfera “faz de conta”, absorvendo completamente o jogador. • Isolamento: Possuir seus próprios limites de tempo e de espaço. Há, diretamente ligada à sua limitação no tempo, uma característica interessante no jogo, a de se fixar imediatamente como fenômeno cultural. Mesmo depois de o jogo ter chegado ao fim, ele permanece como uma criação nova do espírito, um tesouro a ser conservado pela memória. • Ordem: Para o autor “o jogo cria ordem e é ordem”, criando uma “perfeição temporária e limitada” na imperfeição do mundo real. • Agrupamento: O jogo facilita a formação de comunidades de jogadores, que compartilham segredos e possuem “a sensação de estar separadamente juntos”. A definição do jogo poderia ser, resumindo estas características citadas, como uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias e dotadas de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da vida quotidiana (HUIZINGA, 2004). 5 METODOLOGIA A metodologia aplicada refere-se a uma pesquisa de natureza descritiva, já que descreve o ambiente educacional virtual que integrará o jogo computacional como tática de ensino. Também uma pesquisa de natureza exploratória, pois é baseada em estudos teóricos sobre inclusão e deficiência e como os jogos computacionais podem ser desenvolvidos para melhoria do processo de ensino-aprendizagem para pessoas deficientes. Para o andamento da pesquisa, foram definidos objetivos para o desenvolvimento prático do jogo computacional, abordando a história do jogo, seus componentes, personagens e desafios. A fim de atingir os resultados esperados, foram realizados: • Estudos abrangendo novos conhecimentos em relação à inclusão de pessoas com deficiências físicas. • Estudos para a instalação de softwares necessários para o funcionamento do jogo computacional. • Estudos para realização da modelagem e desenvolvimento do jogo proposto. • Reuniões para avaliar o andamento da pesquisa e os resultados parciais.
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6 O JOGO COMPUTACIONAL EDUCACIONAL DESENVOLVIDO Dentre as pesquisas na área de jogos computacionais realizadas pelo Departamento de Informática da Universidade de Santa Cruz do Sul, destaca-se o trabalho envolvendo o desenvolvimento de um jogo computacional para raciocínio lógico (LUX et al, 2008). Este projeto envolveu ampla pesquisa para desenvolvimento de um roteiro que atendesse aos requisitos básicos de um jogo computacional motivador, onde o aprendizado fosse subjacente ao prazer de jogar e que permitisse ao usuário enfrentar desafios motivadores que implicassem no aperfeiçoamento do raciocínio lógico. O roteiro do jogo foi desenvolvido buscando apresentar desafios que possibilitem o desenvolvimento do raciocínio lógico, combinado com cálculos matemáticos, envolvendo as operações básicas. Desta forma, para atingir o desafio de entregar mantimentos em uma aldeia indígena distante e isolada pelas intempéries, o jogador necessita escolher o trajeto a ser seguido e as armas que poderão auxiliá-lo a atingir seu objetivo. Os desafios estão relacionados a animais presentes no trajeto, que roubam carga ou impedem a passagem do trem e também a condições climáticas adversas. O primeiro desafio se dá logo no início do percurso, quando a locomotiva encontra um trecho de trilhos que está danificado (a chuva fez rolar pela encosta). Na interface haverá como opção comunicar-se textualmente, solicitando o material necessário para o conserto. Após chegarem os vagões com o material, o usuário realizará o conserto descrevendo textualmente a sequência de operações necessárias para efetuá-lo. A seguir, a locomotiva chega a um depósito onde pode carregar vagões com mantimentos e carvão. Cada vagão terá um peso relativo à sua carga, que é visualmente mostrado, não podendo o total de carga superar determinado valor. O jogador deverá optar pela proporção de peso entre mantimentos e carvão. Na sequência, acontecem as situações envolvendo obstáculos, escolhas e raciocínio, onde o jogador precisará preocupar-se em ter carvão suficiente para chegar ao destino (o que representa a sua vida) e entregar um bom peso de mantimentos para atingir uma pontuação alta. O objetivo do jogo é auxiliar na abstração de conceitos relacionados ao raciocínio lógico, matemático e computacional, como variáveis e funções lógicas, comandos de seleção e de repetição. O jogo é em 3D e envolve um jogador. O seu gênero é educacional e estratégico. Os personagens do jogo são o protagonista, que é maquinista de uma locomotiva a vapor, e os antagonistas, que se referem ao ataque de animais e dificuldades advindas de condições climáticas. O objetivo é entregar a maior carga possível de mantimentos na aldeia dos índios e quanto maior for esta carga, maior será a pontuação final. O jogo apresenta ao usuário a missão de entregar mantimentos em uma aldeia indígena distante, isolada pelas consequências de um inverno rigoroso. A ideia do roteiro baseia-se em buscar uma analogia entre vagões do trem com espaço em memória para armazenagem de dados (variáveis); e o percurso do trem como o fluxo de execução em um algoritmo (conjunto de passos para resolução de problemas, envolvendo raciocínio lógico).
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Algumas regras foram definidas para o jogo: a locomotiva somente poderá andar nos trilhos; os deslocamentos permitidos são para frente, esquerda e direita (nos entroncamentos). As ações de defesa sempre envolverão um decréscimo de carga (mantimentos ou carvão). O jogador poderá visualizar a qualquer momento o total disponível de carga e mantimentos. Em relação ao ambiente, o jogo é em visualização em 3D, ambiente externo, representando planícies, montanhas, florestas; a atuação do usuário em primeira pessoa (ou avatar); a locomotiva é no estilo antigo, a vapor, puxando vagões de carga abertos. Além da visualização do cenário e atores em 3D, é disponibilizada uma representação em 2D, no painel de comandos onde o maquinista encontrará as opções para sua atuação no jogo. São elas: Teletipo – para solicitar recursos e escrever a sequência de passos para resolução de uma tarefa; Carregar – para colocar mantimentos e/ ou carvão nos vagões; Descarregar - para retirar mantimentos e/ ou carvão nos vagões; Lançar fumaça – defesa contra animais; Lançar vapor – defesa e derreter neve; Ligar o refletor de luz da locomotiva; Carga – informa total de mantimentos e combustível nos vagões. A Figura 2 apresenta quatro imagens do cenário do jogo, com uma visão geral, os trilhos, o trem e a aldeia dos índios. Figura 2 - Cenários do jogo computacional.
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O jogo teve completo desenvolvimento quanto à modelagem dos diversos elementos gráficos (cenário, vegetação, locomotiva, animais) e foi implementado utilizando a ferramenta Blender (http://www.blender.org). Com o mesmo método utilizado para identificar a malha dos trilhos e possibilitar o percurso do trem, foram desenvolvidas funções capazes de manter uma câmera acompanhando constantemente o trem. A Figura 3 apresenta quatro imagens da câmera posicionada junto ao trem, permitindo a visualização de alguns animais (abelhas e macacos). Figura 3 - Diferentes visões do trem.
7 CONCLUSÕES A utilização de ambientes educacionais como prática pedagógica para o desenvolvimento cognitivo vem proporcionando atividades desafiadoras que oferecem maior motivação e entusiasmo nos processos de ensino-aprendizagem. Esta pesquisa contribui no processo de ensino-aprendizagem, oferecendo um ambiente dinâmico de interação com os estudantes e motivando-os na realização de atividades propostas com o uso de agentes pedagógicos emocionais. Apesar dos esforços de alguns pesquisadores e de entidades voltadas ao apoio da inclusão de tecnologias apropriadas e facilitadoras ao ensino de pessoas com incapacidades físicas advindas de paralisia cerebral, ainda é pequeno o número de instituições de ensino que possuem hardware e software apropriado.
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Neste sentido, a presente pesquisa está em constante desenvolvimento da adaptação de um jogo educacional que, juntamente com as características intrínsecas de ludicidade que os jogos devem proporcionar, também permite um acréscimo no desenvolvimento de habilidades motoras adaptadas e cognitivas. O uso do jogo pedagógico computacional baseado em raciocínio, a ser utilizado como estilo cognitivo no ambiente virtual de aprendizagem, auxiliará os estudantes a compreender melhor o ensino com esta metodologia e auxiliará no tratamento de pessoas com paralisia cerebral. Como o jogo não está totalmente concluído, ainda não foi realizada uma validação. Como atividades futuras, serão realizadas: validação do ambiente com o jogo computacional desenvolvido com, pelo menos, uma pessoa com paralisia cerebral sem comprometimento mental; realização de ajustes e testes no ambiente; e escrita de outros artigos relacionados ao projeto. Ter participado desta pesquisa e ser agraciado com o prêmio Honra ao Mérito da Iniciação Científica da UNISC, além de aprofundar os conhecimentos no mundo dos jogos no âmbito acadêmico, fez-nos refletir sobre o contato das pessoas deficientes com esta vasta gama de jogos, inicialmente disponibilizados às pessoas ditas normais, e a possibilidade de oferecer alternativas de utilização de jogos computacionais às pessoas com incapacidades. Conforme Maiara Halmenschlager, aluna do curso de Jornalismo da Universidade de Santa Cruz do Sul, em entrevista com os integrantes desta pesquisa, após a apresentação no XVII Seminário de Iniciação Científica da UNISC em 2011, “Se você que está lendo este texto com facilidade, entendendo palavra por palavra do que está escrito, provavelmente também conseguiria acessar um jogo computacional na internet, fazer uso das ferramentas que ele oferece e atingir os objetivos propostos pela brincadeira, porém, nem sempre é assim. Para muitas pessoas que possuem alguma incapacidade, ler um texto ou manusear um mouse e as teclas de um teclado - para se divertir e aprender por meio de um jogo - é uma tarefa que muitas vezes exige esforço, tornando-se um desafio”. Após sua conclusão, o jogo computacional beneficiará pessoas com paralisia cerebral através da motivação, fazendo com que estas pessoas se sintam capazes de realizar atividades, mesmo sem algum tipo de movimento, já que possuem capacidade de raciocínio, ficando motivadas, além de exercer o raciocínio e estar aprendendo. REFERÊNCIAS AZEVEDO, B. F. T.; TAVARES, O. de L. Um Ambiente Inteligente para Aprendizagem Colaborativa. 2001. Workshop em Informática na Educação (SBIE) 2001 331 XII Simpósio Brasileiro de Informática na Educação - SBIE – UFES, 2001. p. 331-339. BATTAIOLA, A. L., ELIAS, N. C., Domingues, R. de G.. Um Software Para Ensino de Conceitos de Computação Gráfica. Revista Brasileira de Aprendizagem Aberta e a Distância, São Paulo, Agosto de 2002. p. 1-10. Disponível em <http://www.abed.org.br/revistacientifica/ Revista_PDF_Doc/2002_Software_Ensino_Andre_Battaiola_Chamel_Elias_Rodrigo_Domingu es.pdf>. Acesso em: 14 mai. 2010. BLENDER: ferramenta open source para desenvolvimento de aplicações gráficas. Disponível em <http://www.blender.org>.
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Agradecimentos Os autores expressam o seu reconhecimento ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e à UNISC (Universidade de Santa Cruz do Sul) pelo auxílio financeiro no desenvolvimento deste trabalho.
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MÉTODOS PARA A REMOÇÃO DE SULFETO DE HIDROGÊNIO DE EFLUENTES GASOSOS APLICÁVEIS A REATORES ANAERÓBIOS Mateus da Silva Szarblewski29 Rosana de Cassia de Souza Schneider30 Enio Leandro Machado31 RESUMO Neste trabalho de revisão foram avaliados os principais métodos utilizados para o tratamento de emissões atmosféricas contendo H2S, descrevendo suas vantagens e desvantagens. Buscou-se encontrar tecnologias mais adequadas para o tratamento do H2S emitido por reatores anaeróbios. Uma análise qualitativa dos vários métodos indicou que a utilização de absorção química com solução redox de ferro (III) reúne o maior conjunto de vantagens para o tratamento do H2S emitido por este tipo de reatores, como a possibilidade da reutilização da solução de ferro evitando gastos com reposição de reagentes e geração de um coproduto (enxofre elementar) que pode ser comercializado ou retornado ao meio ambiente em forma de insumos agrícolas. Palavras-chave: Sulfeto de hidrogênio. Tratamento de gases. Reatores anaeróbios. ABSTRACT In this review it was assessed the main methods used for the treatment of H2S in atmospheric emission, describing its advantages and disadvantages. It was attempted to find more appropriate technologies for the treatment of H2S emitted by anaerobic reactors. A qualitative analysis of the several methods stated that the use of chemical absorption with iron redox solution (III) gathers the largest number of advantages for the treatment of H2S issued by these kind reactor, as the possibility of reusing the iron solution avoiding spending on reagents replacement and also generating a byproduct (elemental sulfur) which can be sold or returned to the environment in shape of agricultural inputs. Keywords: Hydrogen sulfide. Gas emissions treatment. Anaerobic reactors.
1 INTRODUÇÃO A poluição atmosférica vem preocupando cada vez mais a sociedade, pois afeta diretamente a qualidade de vida de cada um. Os sistemas, de transporte e produção de energia, envolvidos na agricultura e processos industriais são grandes responsáveis pelas formas de poluição atmosférica que provêm do homem. 29
Acadêmico do Sétimo Semestre do Curso de Química Industrial pela Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). mateusilva91@hotmail.com. Bolsista (PIBIC/CNPQ).
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Doutora em Química Vinculada ao Departamento de Química e Física da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). rosana@unisc.br
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Doutor em Engenharia - Metalurgia Extrativa Vinculado ao Departamento de Química e Física da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). enio@unisc.br Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 62-74, 2012
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A alta gama de poluentes que são emitidos diariamente pode causar efeitos locais e imediatos, como maus odores, efeitos nocivos à saúde e também a formação de fumaça, ou problemas globais, como a destruição da camada de ozônio, a chuva ácida e o efeito estufa (TACLA, 2004). A poluição atmosférica é gerada toda vez que uma forma de matéria ou energia libere no ar substâncias tóxicas ou em concentrações elevadas, que modificam o aspecto estético, composição, ou a forma do meio físico e tornam o ar impróprio ou ofensivo à saúde humana, causando também danos materiais à fauna e flora (CAMPOS, 2009; SEINFELD, 1975). O impacto das substâncias poluentes na atmosfera depende da composição ou concentração das mesmas, bem como das condições climáticas na região de emissão (SCHIRMER, 2008). Entre os principais agentes contaminantes encontrados na atmosfera está o sulfeto de hidrogênio (H2S). Após sua liberação pela atividade microbiana natural ou por emissões antrópicas, esse gás é facilmente oxidado a dióxido de enxofre (SO2) o qual é posteriormente convertido a ácido sulfúrico (H2SO4), que retorna ao solo na forma de “chuva ácida” (ROCHA, 2007). Sabe-se que dentre os processos industriais e urbanos que podem produzir sulfeto de hidrogênio estão: (i) tratamento de águas residuais; (ii) processamento de alimentos; (iii) refino de petróleo e gás natural; (iv) indústrias petroquímicas; (v) curtumes; (vi) fabricação de celulose e papel; (vii) e os processos de compostagem (SHAREEFDEEN, 2009; AROCA, 2007). Segundo Aroca et al. (2007) emissões de sulfeto de hidrogênio por atividades industriais são a principal causa de corrosões e odores desagradáveis nos grandes centros urbanos. Entre as fontes de emissão de sulfeto de hidrogênio estão os reatores de fluxo ascendente do tipo UASB (do inglês Upflow Anaerobic Sludge Blanket), que estão sendo muito utilizados para o tratamento de efluentes de grandes centros urbanos e indústrias. De acordo com Glória (2009) o tratamento de esgotos é feito por micro-organismos anaeróbios que convertem a matéria orgânica do efluente em gases como metano (CH4) e dióxido de carbono (CO2) e os sulfatos em sulfeto de hidrogênio (H2S). Em condições, geralmente anaeróbicas, os micro-organismos decompõem o enxofre orgânico encontrado nas proteínas dos seres vivos (aminoácidos, cisteína e metionina), transformando em sulfeto de hidrogênio (GARCIA JR, 1989). Segundo Zaman e Chakma (1994), o sulfeto de hidrogênio é um recurso relativamente abundante, cujo potencial não vem sendo plenamente utilizado pela da indústria. É um gás, do qual dois produtos importantes, o hidrogênio e o enxofre, podem ser extraídos. Com esta revisão busca-se identificar qualitativamente um processo de tratamento de gases que atenda os requisitos relatados por Chernicharo et al (2010), para o gerenciamento de emissões odorantes de Estações de Tratamento de Efluentes (ETEs), mais especialmente dos reatores anaeróbios. Em países em desenvolvimento os pontos críticos destacados pelos autores são: (i) custos operacionais, (ii) de construção, (iv) sustentabilidade e (v) simplicidade.
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2 TOXICOLOGIA DO SULFETO DE HIDROGÊNIO De acordo com Mainier, Sandres e Tavares (2007) o gás sulfídrico é um gás incolor, solúvel em água e possui um cheiro característico de “ovo podre”. É altamente tóxico aos seres humanos, porque se combina com o ferro do citocromo e outros compostos essenciais que contêm ferro na célula (SILVA, 2008). Mills (1998) ressalta que o olfato humano pode detectar o gás sulfídrico em níveis de concentração de 0,13 ppm (0,18 mg m-3). Porém, se exposto a tempos prolongados, a sensibilidade oftálmica diminui tornando o olfato um detector imperfeito do H2S. A exposição máxima permitida por períodos prolongados é de 10 ppm, sendo que 30 minutos de exposição a concentrações superiores de 300 ppm torna-se fatal (MAAT et al, 2004). Os casos de intoxicação por H2S são mais acentuados principalmente no setor industrial. Segundo Gregorakos et al. (1995), as autópsias realizadas em funcionários que morreram em um acidente envolvendo vazamento de sulfeto de hidrogênio revelaram que os corpos possuíam edemas pulmonares, miocardite, hemorragia na mucosa gástrica, além do cérebro e da parte posterior do intestino apresentar a cor esverdeada e alguns casos de ataque cardíaco. 3 EMISSÕES DE SULFETO DE HIDROGÊNIO EM REATORES ANAERÓBIOS De acordo com Horikawa et al. (2004) processos anaeróbios tem sido utilizados com mais frequência para o tratamento de efluentes, pois provocam a eficiente degradação de compostos orgânicos na ausência de oxigênio molecular. Estes processos são basicamente biológicos e produzem como coproduto uma mistura de gases composta principalmente por metano (CH4), dióxido de carbono (CO2) e sulfeto de hidrogênio (H2S). Reatores UASB são os principais representantes da tecnologia de tratamento anaeróbio. São sistemas de tratamento baseados na rota natural de mineralização, e com o tempo, vão se tornar soluções de desenvolvimento sustentável, sendo que entre seus coprodutos, principalmente o metano possui grande potencial energético (CHERNICHARO et al., 2010). Os reatores UASB são unidades utilizadas para tratar efluentes que contenham na sua maioria matéria orgânica em suspensão ou dissolvida. De acordo com Souza (2010) o tratamento ocorre por via de sucessivas conversões bioquímicas após os processos de dispersão e difusão que ocorrem na massa de micro-organismos presentes no lodo é que se dá a remoção da matéria orgânica (DQO ou DBO, isto é, carboidratos, proteínas, lipídios ou seus metabólitos) A decomposição anaeróbia da fração proteica contida na matéria orgânica é a principal causa da geração de odores. Relatos de Silva (2007) citam que dentre os impactos negativos do tratamento de esgotos, encontram-se a proliferação de odores ofensivos, um dos principais motivos de reclamações das ETEs, pois causam grande desconforto para a população dos arredores destas instalações. Em um reator do tipo UASB o sulfeto de hidrogênio é formado pela redução do sulfato (sulfetogênese), na presença de matéria orgânica e condições específicas, segundo as equações de 1 a 3.
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SO4 2-(aq) + matéria orgânica (disolv./dispers.) → S2-(aq) + H2O(l) + CO2(g)
[1]
S2-(aq) + H+(aq) → HS-(aq) [2]
[2]
HS-(aq) + H+(aq) → H2S (aq) [3]
[3]
O sulfato, presente no efluente a ser tratado, é utilizado como aceptor final de elétrons para as reações bioquímicas. Agrawal et al. (1997) reportam em seu trabalho que as concentrações de H2S em reatores UASB pode ficar entre 0,11 e 0,39 %. De acordo com os estudos de Glória (2009) a concentração de sulfeto de hidrogênio nas proximidades de reatores UASB pode ser de 0,2 a 5 ppm. Souza (2010) descreve que os principais fatores de influência de emanações atmosféricos de H2S são: (i) o pH e a temperatura; (ii) a taxa de geração e concentração do H2S; (iv) da turbulência e das taxas de ventilação da superfície do efluente no interior do reator; e (v) da área superficial do líquido exposta à atmosfera. Estudos realizados por Souza (2010), em um reator UASB funcionando em condições específicas, revelaram que o balanço do enxofre estava distribuído nos seguintes percentuais: 75,1% do sulfeto estão solubilizados no efluente tratado; 16% estão retidos no lodo; e 1,3% são emitidos junto ao biogás, nas condições que ele relatou. 4 PROCESSOS DE TRATAMENTO DE SULFETO DE HIDROGÊNIO Em seu trabalho Zaman e Chakma (1995) se referem ao sulfeto de hidrogênio como uma potencial fonte para a geração de hidrogênio e enxofre elementar. O interesse na utilização de sulfeto de hidrogênio como fonte de hidrogênio e enxofre tem se intensificado nos últimos anos por causa das seguintes razões: (i) perspectiva global de energia de hidrogênio e minimização de resíduos; (ii) a inevitável produção de sulfeto de hidrogênio a partir de plantas de gás, refinarias, metalúrgicas e em processos industriais anaeróbios, que vão desde tratamento de resíduos até sistemas industriais como o de Kraft da celulose, para a produção de papel; e (iii) problemas ambientais e sociais causados pela emissão de sulfeto de hidrogênio à atmosfera. Existem várias medidas que podem ser tomadas para minimizar as emissões dos gases odorantes. Em um primeiro momento investigam-se mudanças no processo e equipamentos que possam refletir na redução de emissão do gás poluente. Nos casos onde não existem medidas para minimização dos efeitos dos gases odorantes, ou onde essas medidas não são eficientes, há a necessidade de se programar uma tecnologia de tratamento desses gases (SILVA, 2008; SCHIRMER, 2008). Chernicharo et al. (2010) constataram que os métodos para o controle de gases odorantes em estações de tratamento de esgoto podem ser caracterizados como de natureza física, química e bioquímica. Para eles os processos químicos e físicos já vêm sendo desenvolvidos a mais tempo do que os processos biológicos. Rocha (2007) sugere que os processos mais empregados para se reduzir a toxicidade e o odor proveniente de gases e vapores industriais são: adsorção, absorção (acompanhada ou não de reação química), combustão (incineração) e condensação.
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Para a seleção da tecnologia adequada devem-se levar em conta as condições de concentração, vazão e temperatura em que o gás residual é emitido, e a capacidade de tratamento requerida. Relacionando-se a questões financeiras o método deve ter baixo custo de instalação e operação (ROCHA et al. 2004). De acordo com Martin (2008) existem muitas tecnologias disponíveis para remoção de sulfeto de hidrogênio, no entanto, é difícil de encontrar uma forma barata e com suficiente eficácia na remoção. Na Tabela 1 estão representados os princípios e seus respectivos processos de tratamento do sulfeto de hidrogênio e emissões odoríferas. No processo de Adsorção as moléculas dos líquidos, gases ou vapores (adsorvato) são retidas por forças físicas (adsorção física ou fisiossorção) ou químicas (adsorção química, quimiossorção) na superfície de um sólido (adsorvente). Para a estruturação deste sistema é necessário a confecção de uma coluna de recheio, ou de pratos perfurados, recoberta com o material adsorvente. A adsorção física, se comparada com a química, possuí uma fraca interação entre adsorvato e o adsorvente, o que faz com que esse processo necessite condições de resfriamento. Já a adsorção química, de maior interação entre adsorvato e adsorvente requer temperaturas altas para a regeneração do adsorvente sólido. Tabela 1 - Princípios de tratamento de H2S e seus respectivos sistemas. Princípio Físico
Químico
Biológico
Tipos de plantas Adsorção: com o uso de adsorventes; Lavadores com água pura; Membranas seletivas; Separação criogênica. Absorção com substâncias químicas; Oxidação térmica; Oxidação Catalítica; Ozonização. Biofiltro; Biopercolador; Biolavador; Tratamento com lodo ativado.
Fonte: Adaptado de Silva, 2008.
A absorção refere-se à transferência de um componente sólido (absorbato) presente em fase gasosa (gás de arraste) para um líquido (absorvente). No controle de poluição do ar, a absorção envolve a remoção de um contaminante gasoso de uma corrente gasosa por sua dissolução em um líquido (podendo este ser uma solução redox). A absorção é um processo de transferência de massa que se dá devido a uma diferença de concentração entre os meios presentes. Esta transferência ocorre até que continue havendo diferença de concentração nos meios envolvidos. Na absorção química o efluente gasoso é transferido para uma fase líquida de baixa volatilidade. É um sistema estruturado em colunas de recheio, de pratos ou de nebulização, requerendo um espaço consideradamente pequeno. Para Gendel et al. (2009) o uso de soluções redox, compostas principalmente por Fe(III)/Fe(II), como forma de adsorção química de sulfeto de hidrogênio está se tornando uma técnica eficaz. Neste sistema utiliza-se uma solução oxidante de Fe(III) que é capaz de
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fazer a rápida oxidação do H2S a enxofre elementar. Depois disso, o enxofre pode ser removido por filtração ou gravidade. Na reação com o sulfeto de hidrogênio incorporado a fase aquosa (Equação 4), a solução de Fe(III) é reduzida a Fe(II) (Equação 5). O Fe(II) pode ser facilmente oxidado e regenerado no sistema (Equação 6). Essa oxidação pode ser realizada pelo contato direto da solução com o oxigênio atmosférico (FRARE et al. 2009), ou então, pela utilização de uma pilha eletrolítica, na qual pode ser obtido como coproduto o gás hidrogênio (MATTHÍASDÓTTIR, 2006). Transferência de massa gás/líquido: H2S(g) → H2S(aq)
[1]
Absorção: H2S(aq) + 2 FeCl3(aq) → 2 HCl(aq) + 2 FeCl2(aq) + S°(s)
[2]
Oxidação: O2(aq)+ 4 Fe2+ (aq) + 2 H2O(l) → 4 Fe3+ (aq) + 4 OH-(aq)
[3]
Os seguintes fatores podem se incluírem como vantagem da degradação do sulfeto de hidrogênio por cloreto férrico: (i) elevada eficiência de remoção de H2S; (ii) seletividade na remoção do H2S, evitando-se gasto desnecessário de reagentes; (iii) as condições ambientes são favoráveis ao processo; (iv) a solução utilizada é facilmente regenerada; (v) e a absorção química do H2S traz como produto final o enxofre elementar, produto estável, de fácil comercialização e que pode ser disposto em aterro industrial com menor potencial poluente (HORIKAWA et al., 2004; SOUZA, 2010). Os métodos microbiológicos de remoção de gases de efeito estufa baseiam-se na capacidade que certas espécies de bactérias, fungos ou leveduras apresentam de degradar Compostos Orgânicos Voláteis (VOCs) e os Compostos Inorgânicos Voláteis (VICs), (OTTENGRAF et al., 1986). Para o tratamento biológico de efluentes gasosos as três técnicas mais utilizadas são os biolavadores, biopercoladores e os biofiltros. Esses sistemas são compostos por espécies microbianas que degradam e incorporando poluentes orgânicos ou inorgânicos derivados das correntes gasosas, para formar produtos como água, dióxido de carbono e materiais necessários para a sua reprodução celular. As bactérias são inoculadas em materiais suportes e, com o seu crescimento, formam uma espécie de biofilme que preenche a coluna de filtragem de gases. (LEDUC et al., 1994). Estas bactérias utilizam a energia química obtida a partir da oxidação de compostos reduzidos de enxofre para o seu crescimento celular. Elas removem elétrons livres do enxofre inorgânico e os emprega para a redução do carbono inorgânico (CO2) (SYED et al., 2006). Assim, nos reatores biológicos são necessárias duas etapas responsáveis pela deterioração dos gases odoríferos. A primeira é a transferência dos gases para um meio líquido ou para um biofilme, e segunda os gases são degradados pelos micro-organismos presentes no biofilme. Quando na presença de oxigênio as bactérias oxidam as espécies iônicas a substâncias sulfurosas não odoríferas (CABRAL e BELLI, 2002).
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Na Tabela 2 estão resumidas algumas das principais tecnologias empregadas para o tratamento do sulfeto de hidrogênio, ressaltando alguns de seus aspectos. Método FUNDAMENTO
VANTAGENS ADSORÇÃO
DESVANTAGENS
REFERÊNCIAS
FUNDAMENTO
SEPARAÇÃO POR MEMBRANAS
VANTAGENS
DESVANTAGENS REFERÊNCIAS
FUNDAMENTO
ALCANOLAMINA
VANTAGENS DESVANTAGENS REFERÊNCIAS
Refere-se ao processo em que as moléculas de compostos orgânicos voláteis entram em contato com a superfície de um adsorvente sólido e se ligam via forças moleculares fracas (Van der Waals). Existem vários meios de adsorção para a remoção de H2S, incluindo carvão ativado, óxido de ferro, e sílica gel - Custos de capital moderados; - Mecanicamente simples; - Ocupam pequena área (devido à grande área de superfície dos adsorventes, e baixo tempo de retenção do gás); - Estável e de desempenho elevado e confiável; - Os poluentes são transferidos para uma nova fase ao invés de serem destruídos; - Custos operacionais muito elevados (substituição/regeneração do carvão ativado); - Gera corrente secundária de resíduo (carvão não regenerável); - Não é seletivo. FISCHER, 2010. KLINKENBIJL et al 1999 LI, 2008. Baseia-se na diferença do tamanho de partícula ou afinidade que certas moléculas possuem em relação a materiais poliméricos (permeação selectiva). A força motriz do presente processo é uma diferença de pressão entre os gases. A taxa de permeação é determinada pelo produto de um coeficiente de solubilidade e um coeficiente de difusão. Moléculas menores são altamente solúveis e permeam pela membrana mais rápido do que moléculas grandes - Baixo custo de manutenção (sem partes móveis) - Baixas exigências de energia; - Baixa implementação; - Simples para ampliação; -Tecnologia em desenvolvimento. - As membranas têm custo elevado; - Membranas podem ser facilmente contaminadas por suspensões presentes no gás a ser tratado; - Alguns solventes podem degradar a membrana; AMARAL, 2009 REIJENGA et al., 2008 É o processo comercial mais utilizado para a remoção de H2S e também CO2. Neste, vários tipos de aminas (de caráter básico) podem ser utilizadas: a monoetanolamina, dietanolamina, diglicolamina e metildietanolamina. Uma solução de amina em baixa temperatura e alta pressão (condições que favorecem a absorção dos componentes ácidos) é bombeada em contracorrente com o gás contaminado. O H2S é absorvido pela solução de amina formando um complexo instável ácido-base solúvel e libera calor. Na etapa de regeneração, são utilizadas condições de alta temperatura e baixa pressão para favorecer o sentido inverso da reação para liberar o H2S absorvido. Após este processo, o H2S é geralmente incinerado. 2R2NH(aq) + H2S(g) ↔ (R2NH)2S(aq)+ calor (R2NH2)2S(aq)+H2S(g)↔2(R2NH2)HS(aq)+calor - Alta eficiência na separação dos gases contaminantes; -Recirculação no sistema da solução filtrante; - Somente separa, e não trata os poluentes da corrente gasosa, sendo necessário ainda um destino adequado desses gases; - Elevado gastos energéticos com operações térmicas e de bombeamento; - Elevado custo de instalação; KOHL e RIESENFELD, 1985
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Continua...
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Continuação...
FUNDAMENTO
PROCESSO DE CLAUS
VANTAGENS
DESVANTAGENS
REFERÊNCIAS
FUNDAMENTO
ABSORÇÃO (LAVADORES)
VANTAGENS
DESVANTAGENS REFERÊNCIAS
FUNDAMENTO
ABSORÇÃO QUÍMICA POR FERRO (III)
VANTAGENS
DESVANTAGENS REFERÊNCIAS
OPRIME, 2001 ALIABAD e MIRZAEI, 2009 Tal processo consiste na combustão de parte da corrente rica em sulfeto de hidrogênio, liberada no processo “Alcanolamina”, com um terço da quantidade estequiométrica de ar necessária. O SO2 resultante dessa queima reage com o H2S restante, na presença de um catalisador de alumina, a fim de se produzir S°. 2 H2S(g) + SO2(g) → 3 So(s) + 2 H2O (l) - Obtenção de um produto (S°) com interesse de mercado; - Recuperação de enxofre de 93 a 95%; - Pequeno impacto ambiental quando acoplado com uma unidade de tratamento de gases residuais; -Baixo consumo de produtos químicos; - Este processo se torna viável em locais com quantidades de remoção acima de 50 ton./dia enxofre; - Alto custo de instalação; GUIMARÃES, 2006 LI, 2008 OPRIME, 2001 Processo físico baseado na transferência dos poluentes presentes no gás residual para uma fase líquida não-volátil. Trata-se de um dispositivo no qual se realiza a separação de um poluente gasoso por Intermédio da lavagem do mesmo com água que na maioria dos casos é nebulizada para formar pequenas gotículas. A fase líquida contaminada resultante é usualmente tratada biologicamente e recirculada para o lavador. - Custos de capital moderados; - Custos operacionais moderados; - Fácil operação; - Podem operar com a presença de material particulado na corrente gasosa; - Absorve H2S e CO2; - Ocupa pouco espaço; - Os poluentes são transferidos para uma nova fase ao invés de serem destruídos; - Somente aplicável para correntes gasosas moderadamente contaminadas; - Não remove a maioria dos compostos orgânicos voláteis; - Gasta uma quantidade significativa de água. REIJENGA et al., 2008 O gás é introduzido em pequenas bolhas na parte inferior de uma coluna de absorção recheada com uma solução redox de Fe (III). Nesta coluna o H2S será absorvido e oxidado a S°. O enxofre é separado por filtração/ decantação. Após uma oxidação com ar atmosférico a solução de ferro pode ser recirculada novamente no pelo sistema. 32 H2S(g)+2Fe3+(aq)→So(s)+2Fe2+(aq)+2H+(aq) 33 2Fe2+(aq)+2H+(aq)+1/2O2(g)→2Fe3+(aq)+H2O(l) - Obtenção de enxofre elementar como produto principal (S°); - Absorção regenerativa; - Sistema de simples operação; - Opera em temperatura ambiente; - Baixos custos de instalação e manutenção; - Seletivo para H2S; - Aplicado a baixas correntes gasosas; - Custo moderado com manutenções para remover depósitos de enxofre; GENDEL et al , 2009 HORIKAWA et al, 2004 MATTHÍASDÓTTIR, 2006
Continua... 32
Absorção química do H2S;
33
Oxidação do Fe(II) a Fe(III).
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Continuação... FUNDAMENTO
INCINERAÇÃO
VANTAGENS
DESVANTAGENS REFERÊNCIAS
FUNDAMENTO
SEPARAÇÃO CRIOGÊNICA
VANTAGENS
DESVANTAGENS
REFERÊNCIAS
FUNDAMENTO
PROCESSOS BIOLÓGICOS
VANTAGENS
DESVANTAGENS
REFERÊNCIAS
- Ocorre a combustão direta em tochas (“flare”). Se temperaturas suficientemente elevadas não forem alcançadas a combustão dos poluentes pode ser incompleta. - Custos de capital baixos; - Custos operacionais baixos; - Boa alternativa para a queima de biogás em pequenas estações de tratamento; - Possibilidade de aproveitamento da energia térmica gerada pela combustão. - A combustão incompleta pode resultar na geração de compostos sulfurados; - Perda de potencial de energia quando o calor não é recuperado; Técnica destrutiva; LAM et al, 2010 SCHIRMER, 2008 Os vapores são condensados e separados por resfriamento com temperaturas próximas a -170°C ou compressão em torno de 80bar. Baseia-se nos diferentes pontos de liquefação dos gases. Há nesse caso uma aproximação das moléculas ou a redução da energia cinética. - Custo de capital moderado; - Custos operacionais moderados; - Não é necessário o uso de produtos químicos neste processo; - Produto com elevada pureza; - Os poluentes são transferidos para uma nova fase ao invés de serem destruídos; - Elevado custo de manutenção por ser um processo composto por vários compressores e resfriadores; - Necessita de grande quantidade de água para as trocas térmicas. REIJENGA et al., 2008 CHERNICHARO et al, 2010 Eles são classificados de acordo com a mobilidade da fase aquosa e da biomassa no interior do reator biológico. Biofiltro: Consiste na passagem de compostos voláteis biodegradáveis em reatores contendo um meio suporte com micro-organismos imobilizados na forma de biofilme. Biopercolador: Se difere do biofiltro pela alimentação contínua de fase líquida no topo de uma coluna também preenchida com material de enchimento recoberto por um biofilme de micro-organismos. Biolavador: é composto por uma coluna de absorção, onde os poluentes são solubilizados em água. A fase líquida é transferida para um reator aerado contendo micro-organismos que degradam os poluentes. A água, uma vez regenerada é continuamente recirculada pelo topo da coluna. - Baixos custos de instalação; - Bom contato entre o gás e o biofiltro; - Contem boa área superficial; - Operação simples; - Redução satisfatória de odores. - Baixo custo de Operação; - Satisfatório para níveis moderados de contaminação; - Apropriados somente para o tratamento de baixas concentrações de odorantes; - Impossível controle do processo; - Problemas com formação de caminhos preferenciais no meio suporte; - Limitado controle de processo; -Necessitam de uma disponibilização final da biomassa. CHERNICHARO et al, 2010 OPRIME, 2001 PANTOJA FILHO, 2008
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Alguns dos métodos revisados para o tratamento de sulfeto de hidrogênio emitido por reatores anaeróbio, do tipo UASB, tornam-se sofisticados e, muitas vezes inapropriados para a devida aplicação. Exemplo disso são os processos da Alcanolamina, de Claus, que somente se tornam viáveis em locais onde o tratamento diário seja acima de 50 ton. dia-1 de enxofre recuperado. Entretanto as emissões de sulfeto de hidrogênio em reatores anaeróbios, usualmente, não chegam a níveis muito elevados (0,4% do biogás emitido pelo UASB). A incineração é uma forma eficiente de remoção de odores em gases residuais, no entanto, não é um fim definitivo e apropriado sendo que, a combustão do sulfeto de hidrogênio gera dióxido de enxofre (SO2), um gás fortemente poluente atmosférico associado a precipitações ácidas em regiões urbanas. As tecnologias de remediação de H2S baseadas na filtração por micro-organismos são simples e possuem boa aplicabilidade em baixas concentrações gasosas, no entanto, não conseguem recuperar o enxofre. As tecnologias baseadas na adsorção física demonstram desvantagem por não serem, na maioria das vezes, de fácil regeneração. Deste modo o resíduo é transferido para uma nova fase, e esta deve ser encaminhada para um fim adequado, como é o caso de tecnologias que utilizam carvão ativado. O processo de absorção química de H2S em soluções de Fe (III) oferece remoção seletiva e com alta eficiência do H2S presente na corrente, associada a um baixo consumo de produtos químicos. A solução de Fe (III) funciona como pseudo-catalisador que pode ser facilmente regenerado por oxidação. Outro fator importante é a conversão de sulfeto de hidrogênio em enxofre elementar (S°), um composto passível de comercialização. Considerando que o tratamento do efluente gasoso deve ser sustentável e simples a implantação de sistemas de tratamento de sulfeto de hidrogênio em emissões odoríferas, o sistema pode ser concebido a partir da oxidação do enxofre com soluções de Fe (III). REFERÊNCIAS AGRAWAL, L.K.; HARADA, H.; OKUI, H. Treatment of dilute wastewater in a UASB reactor at a moderate temperature: Performance Aspects. Journal Of Fermentation And Bioengineering, Niigata, v. 83, n. 2, p.179-184, 1997. ALIABAD, Z.H.; MIRZAEI, S. Removal of CO2 and H2S using aqueous alkanolamine solusions. World Academy Of Science, Engineering And Technology: Engineering and Technology, Shahroud, Iran, p.194-203, 2009. AMARAL, R. A. Remoção de CO2 e H2S do Gás Natural por Contactores com Membranas. 2009 .117f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Química)-UFRJ, Rio de Janeiro, 2009. AROCA, G et al. Comparison on the removal of hydrogen sulfide in biotrickling filters inoculated with Thiobacillus thioparus and Acidithiobacillus thiooxidans. Electronic Journal Of Biotechnology, Valparaíso, p.514-520, 18 Apr. 2007. CABRAL, F.A.S; BELLI, P. Tratamento de odores em digestor anaeróbio utilizando o processo de biofiltração. In: XXVIII CONGRESSO INTERAMERICANO DE INGENÍERIA SANITÁRIA Y AMBIENTAL, 2002, Cancun-México. Anais do XXVIII Congresso Interamericano de Ingeníaria
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ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS Na área de Ciências Sócias Humanas entre os 46 trabalhos apresentados no evento, 93% foram de alunos bolsistas de Iniciação Científica da Universidade e 7% de trabalhos de alunos de Iniciação Científica vinculados a outras Instituições de Ensino do Estado do Rio Grande do Sul. Nesta área não houve apresentação de trabalhos na modalidade PIBIC-Ensino Médio e PIBITI/CNPq, sendo que a maioria dos trabalhos nesta área foi de bolsistas do Programa UNISC de Iniciação Científica – PUIC, seguida dos Programas de bolsa de verba externa para pagamentos de bolsas em projetos de pesquisa e Programas PROBIC/FAPERGS, PIBIC/CNPq, conforme mostra a Figura 05. Figura 05 – Modalidade de bolsas dos estudantes participantes do XVII Seminário de Iniciação Científica na Área de Ciências Humanas.
Fonte: Coordenação de Pesquisa, UNISC, 2011.
A ESCRAVIDÃO E OS FOCOS DE RESISTÊNCIA EM RIO PARDO Maximiliano Meyer1 Roberto Radünz2 Olgário Paulo Vogt3 RESUMO Este artigo analisa três crimes encontrados no Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul, casos esses ocorridos no terceiro quartel do século XIX na região da cidade de Rio Pardo. O objetivo do texto é evidenciar e discutir, através desses processos crime, como operou a resistência escrava na região. Crimes como o de Jordão, um cativo que fazia parte de um esquema de roubo e venda de mercadorias; Nazário, menor de idade que matou com brutalidade sua senhora devido a castigos recebidos; e uma tentativa de insurreição para libertar escravos, liderada por Manoel Botelho, um desertor do exército imperial brasileiro. Este texto também procura abordar elementos referentes à escravidão no que tange ao preço de compra e de venda de cativos e sobre os crimes mais comuns e suas referentes penas no período mencionado. Palavras-chave: Escravidão, Rio Pardo, Resistência Escrava. ABSTRACT This paper analyzes three crimes found in the Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul, cases occurred in the third quarter of the nineteenth century in the region of the city of Rio Pardo. The objective of this paper is to highlight and discuss through these criminal proceedings, haw the slave resistance in the region operated. Crimes such as Jordan, a captive who was part of a scheme of theft and sale of goods; Nazario, a minor who brutally killed his mistress because of punishments received, and an attempt at insurrection to free slaves, led by Manoel Botelho, a Brazilian Imperial army deserter. This text also seeks to address aspects of the slavery in relation to the purchase price and sale of slaves and on the most common crimes and their related penalties in the period mentioned. Keywords: Slavery, Rio Pardo, slave resistance 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Rio Pardo, localizada no estado no Rio Grande do Sul, teve seu povoamento iniciado em meados do século XVIII. Desde então se tornou um dos principais sustentáculos dos limites portugueses no Brasil meridional. Conforme deixa claro Fábio Kühn (2006), a presença de cativos na província de São Pedro do Rio Grande do Sul se fez presente desde seu início. Segundo ele, desde as primeiras 1
Graduando em História, Bolsista (PUIC/UNISC) – maximilianomeyer@bol.com.br
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Doutor em História, professor do departamento de História e Geografia – UNISC e UCS – radunz@unisc.br
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Doutor em Desenvolvimento Regional, professor do departamento de História e Geografia – UNISC – olgario@unisc.br Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 76-88, 2012
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décadas do século XVIII, os cativos já eram empregados nos Campos de Viamão. Para Rio Pardo presume-se um quadro não muito diferente. Segundo o historiador Cláudio Moreira Bento (1976), o exército demarcador que veio à região para fazer cumprir os limites do Tratado de Madri contava com 1.633 homens estacionados em Rio Pardo, destes, 190 eram escravos. No séc. XIX, Rio Pardo se tornou um importante entreposto comercial, contando com um movimentado porto e um diversificado mercado público. O porto era de suma importância para o abastecimento do interior da Província e fonte de prosperidade e riqueza da cidade. Mercadorias vinham da Europa através dos portos de Rio Grande e de Porto Alegre e ali chegavam para ser distribuídas nas localidades onde não se podia acessar por rio. Linhas de carretas, aluguéis de carretilhas, venda de sal, açúcar, vinho, aguardente, fumo, ferramentas, velas, tecidos, louças inglesas, móveis, utensílios domésticos, entre outros, eram comercializados em Rio Pardo (VOGT; ROMERO, 2010, p. 34-35). Segundo Arsène Isabelle (1983, p.52), viajante francês que passou por Rio Pardo em 1833, “o comércio é próspero, porque este ponto é o armazém de abastecimento das cidades e vilas do norte e oeste; dali parte continuamente tropas de mulas e carretas para todas as povoações do interior”. Além disso, como centro importante do Brasil imperial, o tráfico de “carne humana” (ISABELLE, 1983, p.62) ali foi muito dinâmico. Situada em um império que já explorava o trabalho escravo há mais de 200 anos, no início do século XIX, Rio Pardo era uma cidade próspera onde o trabalho cativo fazia girar a roda da economia e da ordem social. Para Rio Pardo temos os seguintes números de escravos: TABELA 1 - Número de escravos em Rio Pardo entre 1780 e 1872 Ano Número de escravos Cidadãos totais4 % da população escrava 1780 619 2.374 26,1 1814 2.429 10.445 23,25 1858 2.174 7.023 31 1872 2.800 20.177 13,8 Tabela elaborada com base em: CARDOSO, 2003. p. 60-62 e FEE, 1981. p. 69 e Censo Provincial de 1872
Nota-se que o número de escravos foi muito representativo. Comparando os dados, observa-se que houve um declínio de população na metade do século XIX. Os números refletem a divisão política do território gaúcho e o surgimento de novos municípios, muitos dos quais se emanciparam direta ou indiretamente de Rio Pardo. Na época a cidade empregava seu contingente de escravos em variados serviços, como o cultivo de grãos, lidas do campo, preia do gado, atividades no porto, trabalhos domésticos, havendo também os escravos de ganho como sapateiros, ferreiros, alfaiates, entre outros. Em que pese a multiplicidade das atividades, o escravo sempre esteve na condição de cativo e, enquanto tal, lutou pela liberdade. Poucas fontes primárias nos sobraram destes tempos iniciais sobre a escravidão na região. Os processos crime se constituem em importantes fontes documentais para o estudo da resistência escrava. 4
Este dado inclui negros escravos, índios e brancos no ano de 1780 e ainda os cidadãos livres e os recém nascidos nas outras três datas.
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1.1 O conceito de resistência O termo resistência pode ser entendido de diferentes maneiras, variando devido à corrente seguida pelo autor que utiliza o conceito. Um dos primeiros autores a utilizar o termo resistência, nas análises sobre escravidão, foi Clóvis Moura ao rejeitar as teses freyrianas. Problematizando alguns conceitos como patriarcalismo, democracia racial e equilíbrio de antagonismos, Freyre reconhecia o papel do escravo, mas o tratava como agente passivo, conformado com sua condição degradante de vida. Para Gorender (1998), e também para Fontella e Farinati (2008), a resistência escrava se operou nas medidas extremadas, pois o escravo era sufocado continuamente por um sistema de extrema violência e rigidez. Conforme Gorender (1988) os escravos, sem margem alguma para qualquer tipo de organização e autonomia, recorriam à negação total do escravismo. Contudo, para os historiadores sociais como João José Reis e Sidney Chalhoub, o termo resistência pode ser bem mais amplo e englobar muito mais do que apenas o escravo assassino e revoltoso. A história social leva em conta as negociações cotidianas que o sistema criava, e considera isso como ato de resistir e não apenas de se adaptar ao escravismo. Como este artigo não se propõe a seguir ortodoxamente uma ou outra corrente de pensamento, o conceito de resistência empregado aqui é amplo. Serve tanto para analisar crimes envolvendo homicídios e insurreições, como para se entender relações que se estabeleceram entre escravos que procuravam tirar vantagens de determinadas situações. A título de ilustração, citamos o caso do escravo Nazário, acusado pelas próprias companheiras de ter matado sua ama. Em seu depoimento no processo, contou que as “criolas [...] já estão bem ensaiadas para fallarem contra elle”5. As relações pessoais entre o escravo e as negras companheiras de cativeiro que o acusaram podem ser claramente tomadas, pela ótica da história social, como uma forma de resistir à escravidão, pois através da delação, as negras poderiam obter vantagens na casa. Segundo Maria Helena Machado, citada por Santos (2004), o resistir esteve presente no interior do próprio sistema escravista. 2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A ESCRAVIDÃO Diferentes estudos historiográficos, particularmente a historiografia escravista brasileira, já mostrou que o escravo não era somente um objeto de trabalho, algo que era manipulado à vontade do senhorio, como por algum tempo se difundiu. Ele era agente da história – e um agente bastante ativo. No Rio Grande do Sul e em todo o Brasil, os escravos negociaram mais do que lutaram abertamente contra o sistema. Enfrentando doenças, maus tratos e separação de seu núcleo de amizades e familiares, poucos reagiram de forma mais violenta. A maioria resistia como podia, na malandragem, criatividade e sorte (GRAHAN apud REIS; SILVA, 2005). Gorender (1990, p.34-35), a respeito da resistência escrava afirma:
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A referência necessária a este processo se encontra adiante, no subcapítulo destinado apenas a este crime. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 76-88, 2012
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Conforme tem sido dito, a grande maioria dos escravos não participou de levantes, não cometeu atentados, nem fugiu. À exceção da geração que chegou à Abolição, a grande maioria viveu a escravidão até a morte [...] Isso não quer dizer que aceitaram a escravidão. Precisariam conduzir-se como todos os seres humanos em circunstâncias extremamente desfavoráveis: adaptar-se para tentar sobreviver. [...] Adaptação não é sinônimo de passividade. Para a esmagadora maioria, a resistência à escravidão se manifestava como resistência ao trabalho. O escravo precisava ser mau trabalhador para não ser bom escravo. Daí o relaxamento, a incúria, a subserviência fingida, o trato ruinoso dos animais e ferramentas, a sabotagem, etc.
As formas de resistência eram combatidas pelos senhores de muitas maneiras, dentre elas acenando com a venda do cativo para áreas onde o trabalho era mais cruel, como no sul charqueadista. Saint-Hillaire (2002, p.79) deixou exemplo de como era o pensamento da Corte sobre a província do Rio Grande do Sul na época: “os habitantes do Rio de Janeiro, desgostosos de seus escravos, vende-os para esta capitania e, quando querem intimidar um negro, ameaçam-no de enviá-lo para o Rio Grande”. Segundo Lima, essa prática era de fato comum, pois apenas 25% dos crioulos pesquisados por ele eram nascidos no Rio Grande do Sul (1997, p. 41). A ameaça não era para menos. Embora pintada por uma parcela da historiografia como uma escravidão benevolente – mito já superado –, existem inúmeros exemplos registrados dos mais abomináveis sobre os castigos praticados aqui. José Alípio Goulart, na obra “Da Palmatória ao Patíbulo”, descreve alguns desses crimes hediondos, como por exemplo, aquele que deu origem à lenda do Negrinho do Pastoreio, onde se pendurava ou amarrava um escravo coberto de melado sobre a boca de um formigueiro, deixando-o à mercê da miríade de insetos, que muitas vezes devorariam até a morte um escravo que podia estar ali por uma leve infração, apenas para o prazer de um senhor perverso (1971, p. 176 – 178). Com o objetivo de policiar os castigos públicos com vistas a amenizar as práticas brutais, o Império, através da lei de 20 de outubro de 1823, teria incumbido os presidentes das províncias de “cuidar em promover o bom tratamento dos escravos e propor arbítrios a sua lenta emancipação.” (GOULART, 1971, p.25). Apesar disso, Arsène Isabelle deixou um dos relatos mais cruéis que se tem, quando passou por esta província na década de 1830. Na ocasião ele descreve, horrorizado, um show de barbárie que pode presenciar: Cada dia, das sete às oito horas da manhã, pode-se assistir, em Porto Alegre, a um drama sangrento. Ponto de reunião – a praia, ao lado do Arsenal; de fronte de uma igreja, diante do instrumento de suplício de um divino legislador; vereis uma coluna erguida num maciço de alvenaria e ao pé...uma massa informe, alguma coisa certamente pertencente ao reino animal, mas que não podeis classificar entre bichanos e bípedes... é um negro!... Um negro condenado a duzentas, quinhentas, mil, seis mil fustigadas de relho! Passai, retirai-vos dessa cena de desolação; o infortunado tem apenas membros mutilados, que mal se reconhecem, sob os farrapos ensangüentados de sua pele murcha. (ISABELLE, 1983, p.69)
As sevícias físicas eram apenas um dos tipos de barbaridades praticadas pelos senhores de escravos. Além da pancada e da chicotada havia as ofensas, o rebaixamento Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 76-88, 2012
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moral à condição de bicho, a coisificação, a separação da noite para o dia de núcleos familiares e de amizades, a tortura a entes queridos, a fadiga, a péssima alimentação, o frio, etc. Todo o tipo de ofensas físicas e mentais alimentaram resistências e ações de rebeldia que são objeto de análise neste artigo. 2.1 Crimes, penas e valor da peça Há alguns anos o Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul – APERS – retomou a iniciativa de publicar em tomos temáticos, diversos documentos referentes à escravidão. Através destas obras pode-se montar um panorama da época no que se refere à venda e compra de escravos, preços e suas variações, crimes cometidos e sofridos por escravos e suas respectivas penas ou absolvições, entre outras abordagens. No que se refere a crimes em Rio Pardo, que foram levados à justiça, nos anos de1850 – 1871, tem- se o seguinte panorama:
Crimes
4%
Furto ou roubo - 11
20%
44%
Ferimentos e outras públicas - 8
32%
Homicídios - 5 Insurreição e roubo
Figura elaborada com base em PESSI; SILVA, 2010 p. 223-226 e 228-229
Nota-se que a medida mais extremada possível a um cativo, o homicídio, aparece poucas vezes se for considerado o período bastante abrangente de coleta de dados que é de 20 anos. São apenas 5 ocorrências das 23 registradas. Os crimes mais frequentes foram furtos e ferimentos leves, o que denota que a resistência foi muito mais implícita do que violenta. Quanto às sentenças resultantes dos processos, elaborou-se a próxima figura: 3%
Penas aplicadas
Forca - 1 Termo de bom comprometimento - 1 Absolvição - 10
23%
17%
3%
Prisão e/ou galés - 7
3%
14%
Desistência - 4 3%
Prescreveu - 1
34%
Açoites -5 Improcedente - 1 6 7
Figura elaborada com base em PESSI; SILVA, 2010 p. 223-226 e 228-229 6
No quesito Absolvição, o número é incerto, pois em um dos processos há a informação de que são vários os réus, mas não há a quantidade exata, e todos eles foram absolvidos. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 76-88, 2012
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Interessante observar que dos 5 casos de homicídio apenas 1 acaba em forca.8 A pena mais recorrente era prisão ou galés. Mais de uma dezena de processos acabou em absolvição ou desistência. Esses dados sugerem que no período houve uma preocupação cada vez maior em lidar de forma mais negociada com os cativos rebeldes, aplicando penas mais “leves”. É preciso lembrar que o fim do tráfico de escravos em 1850, através da Lei Eusébio de Queirós, tornou essa peça uma propriedade cada vez mais valiosa. Tais números devem sempre ser considerados tendo em mente que apenas uma pequena parte dos delitos era levada à justiça. A grande maioria se resolvia dentro da fazenda. Na lógica econômica da escravidão, o senhor não via necessidade de submeter um escravo que cometia um pequeno crime aos rigores da lei e, desta forma correr o risco de perder um cativo para sempre na forca ou na galés, ou mesmo ter de pagar as custas de sua prisão, alimentação, etc. (RADÜNZ; VOGT, 2010). Da mesma forma, mas em sentido oposto, Goulart relata que em suas pesquisas por vezes se deparou com “Chefes de polícia [que] asseveravam a preferência dos escravos por cumprirem aquela pena [a de galés] a permanecerem com seus senhores” (1971, p.31). Considerando que a pena de galés poderia ser uma forma do escravo sair da esfera de coação de seu senhor, o ministro da justiça, na década de 1830, passou a defender uma reforma penitenciária. Segundo ele, “a pena de galés não intimida” os escravos, “principalmente aos que estão sujeitos ao regímen duro dos estabelecimentos rurais”. (CHALHOUB, 1998, p. 178). Sobre os valores de vendas de escravos, no período de 1850 - 1871, não se percebe uma oscilação muito expressiva, mesmo com o fim do tráfico no início da década de 50. Em 1855, uma escrava de 26 anos, em ótimas condições físicas, de nome Ângela, foi vendida por Manoela da Silva Branca para Amâncio José da Cunha por 1:000$000. Em 1869, Maria, de 23 anos, em idênticas condições, fora vendida por sua senhora Guilhermina Maria Tavares ao sr. Joaquim Fernandes de Souza por 1:200$000 (SCHERER; ROCHA, 2010, p. 209), oscilação não muito expressiva tendo em vista a escassez de mão de obra cativa. Os números que são apresentados aqui vão ao encontro ao que Maestri aponta: Em 1831-32, no Rio Grande, o preço médio do cativo novo importado encontrava-se já em 350$000. Após o fim do tráfico, em 1850, o trabalhador escravizado valia um patrimônio! Em 1868, o anúncio de venda de uma charqueada em Santa Isabel oferecia cativo de 32 anos, de sexo masculino, por 1:200$000 mil-réis – o valor de quatrocentos cavalos ou seiscentas éguas ou 150 bois prontos – 3$000, 2$000 e 8$000 mil-réis, respectivamente. (2008, p.211)
Mesmo com a inflação do valor e da importância da peça devido à já citada Lei Eusébio de Queirós, e consequentemente uma leve melhoria no cuidado ao patrimônio humano pelos senhores, nada impediu que alguns destes escravos tratados como propriedade
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O número de sentenças é superior ao número de crimes devido a alguns processos terem mais de um envolvido e estes terem penas distintas, como o processo nº 4688, onde de dois envolvidos em uma briga, um deles foi absolvido e o outro condenado a 8 anos de galés.
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Para saber mais sobre o caso de Ricardo, ver: RADÜNZ, Roberto; VOGT, Olgário Paulo. “A mais severa e exemplar punição: O rito processual contra o preto Ricardo”. In. MÉTIS: história & cultura. Caxias do Sul: EDUCS, 2010.
Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 76-88, 2012
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reagissem contra a violência do sistema escravista. Os três casos a seguir são exemplos disso. 2.2 O escravo Jordão – uma rede de roubos Jordão era um escravo campeiro de aproximadamente 30 anos. Contra ele, no ano de 1867, há dois processos. Neles, é julgado pelos crimes de abigeato, uma invasão à propriedade para sanar uma dívida que tinham com ele e um furto com repasse de mercadorias para outro cativo vender. O primeiro crime9 pouco importa ao escopo da presente pesquisa; nele, Jordão foi acusado de carnear uma rés que fora roubada por seu contratante, José Ferreira da Costa. Como alegou desconhecer a procedência do animal, Jordão foi absolvido. Já no segundo processo pesam duas acusações sobre o escravo Jordão. Uma delas é que teria invadido a casa de José Ferreira da Costa e feito alguns furtos: calças e camisas, um rolo de fumo, saco de feijão, manta de charque, botija de gordura, munição, etc. que escondeu nas fendas da escada de sua senhora. 10 Quando interrogado, Jordão confessou todo o crime e disse ter feito isso para sanar uma dívida de 16 bolivianos que José Ferreira da Costa – o mesmo indiciado do processo anterior – tinha com ele, fruto de um transporte de 3 bois até a Encosta da Serra. Esses animais haviam sido roubados por José Ferreira, fato esse que Jordão desconhecia segundo o processo. No auto do corpo de delito feito na casa arrombada [...] examinando encontrarão duas portas arrombadas e uma quebrada, tres baus tão bem arrombadoz e que reconhecião ter sido feito tais arrombamentos com hum ferro de huma lança que foi encontrado dentro de caza.
No mesmo processo, em outro auto de perguntas, o delegado Abilio Alvares Castro perguntou para Jordão sobre outro episódio: o roubo da carga de uma carreta. Indagou se Jordão conhecia o proprietário da carreta, Francisco Lemes Guerra, e se era verdade que enquanto viajavam juntos ele também furtou o mesmo. Jordão não hesitou em confessar e contou que a carreta que transportava tombou, ocasião que ele aproveitou para roubar [...] umas poucas de peças de chita de quaes forão entregues ao seo Companheiro Feliz, preto escravo de João de Vargas que foi incumbido de as vender na referida Vila da Cruz Alta, para depois repartir com elle respondente o producto, por conta do qual trouxe logo elle respondente duas vacas que lhe deo o mesmo Feliz, de sua criação.
Estes crimes levaram Jordão a ser punido pelo Júri e condenado no art. 269 do Código Criminal de 183011 – furto. A pena foi de 4 anos e meio de galés mais o pagamento das 9
Processo: Apers: número 4737, maço 94, estante 50, 1867.
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Ao longo do texto se fará referência ao processo usando a grafia original. Processos: Apers: número 4737, maço 94, estante 50, 1867 e Apers: número 4738, maço 94, estante 50, 1867. Todas as disposições do Código Criminal citadas neste artigo podem ser encontradas em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-16-12-1830.htm e https://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/ leis /lim/LIM-4-1835.htm Acessos em 10 de novembro de 2011
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custas do processo e de 12,5% do valor do roubo. Chama atenção que o roubo das peças de chita não foi julgado em separado. Presume-se ter sido incluído como agravante no processo de arrombamento. Da mesma forma o comparsa de Jordão no delito, o escravo de nome Feliz, não foi indiciado neste processo. Feliz nem mesmo foi chamado a depor como informante, visto que negros não podiam ser testemunhas. 2.3 Escravo Nazário - Homicida Nazário, analfabeto, solteiro, brasileiro, nascido em Camaquã, Freguesia de São José, município de Encruzilhada, desconhecedor de sua própria idade, escravo de Feliciano Luiz Machado, respondeu por crime de homicídio contra sua senhora, Dona Rosa Alves. O crime, confessado e descrito por ele, se deu da seguinte forma:12 em 14 de abril de 1863, enquanto seu senhor havia ido pescar, o réu aproveitou o fato de que se encontrava sozinho na casa de Dona Rosa Alves matando-a brutalmente. Deu duas pauladas com uma mão de pilão com a qual socava canjica enquanto a vítima dormia. Caindo no chão, Rosa levou de Nazário mais dois talhos de uma espada pertencente a seu marido que se encontrava no mesmo quarto. O escravo que já estava com ferros nos pés, possivelmente por ter feito algo que desagradara seu senhor, usou a mesma mão de pilão com a qual atacara sua senhora para destruir a fechadura da despensa e achar meios para se livrar dos ferros e assim fugir. Foi preso enquanto tentava chegar à fazenda de seu antigo senhor, Rafael, em Camaquã, quando parou à noite para pedir comida, pois não aguentava mais. Capturado e enviado à residência do subdelegado em Rio Pardo, foi preso e iniciaram-se os inquéritos. Na oportunidade em que foi interrogado, o motivo que confessou para cometer tal crime foi o castigo que ele teria recebido injustamente por ordens de sua senhora. Segundo o cativo, as pancadas que levou foi fruto de alguém ter dito à sua senhora que ele andou falando mal de seu senhor, fato que negou convictamente em seus depoimentos. E, quando perguntado se tinha algo a alegar em sua defesa, disse que estaz criolas que jurou no processo [...] já estão bem ensaiadas para fallarem contra elle. Esse exemplo parece confirmar a tese de Nabuco: “a penalidade exagerada, em vez de reprimir os crimes, provoca-os.” (2010, p. 47). Quando o subdelegado Zeferino Silveira Gularte convocou os peritos Antonio Jozé Lopes de Carvalho, pesçoa entendida da matéria, e Antonio Maria da Crus, tãobem pesçoa entendida, sob juramento aos Santos Evangelhos e com algumas testemunhas presentes para efetuar o auto de corpo de delito, estes peritos concluíram que a morte de Dona Rosa foi feita em concequençia de dois grandes golpes na cabeça de dimenção de tres quartos de comprido e duas pollegadas de profundidade pellos quais aparecia os miollos e duas pauladas da mão de pilão. Durante a condução do processo, surgiu um momento de impasse. O réu parecia ser menor de idade. O juiz municipal e delegado Abílio Alvaro Martins e Castro, para terminar com a dúvida, mandou proceder um exame de verificação da idade do negro pelos doutores Antonio Augusto Malheiros e Antonio Ferreira de Andrave Neves, que chegaram à conclusão de que o cativo deveria ter dezecete annos de idade, para mais ou menos. Já sabendo a idade do indivíduo, tendo em mãos o corpo de delito e os inquéritos, chegou o momento do juiz Francisco Vieira da Costa levar o caso a julgamento. 12
Apers: número 58, maço 2, estante 50, 1863)
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O juiz apresentou aos jurados quatro quesitos para serem respondidos. O primeiro, se havia de fato o escravo Nazário assassinado a sua senhora Rosa Alves; o segundo, se havia prova além da confissão do réu; o terceiro, se os jurados achavam que ele era maior de quatorze anos e se ele era menor de dezessete. Todas as respostas dos doze jurados foram unânimes e positivas. Tendo todas as ferramentas para proceder a condenação, o juiz enquadrou o réu em diversos artigos, dentre eles o artigo 1º da lei de 10 junho de 1835, que dizia que Serão punidos com a pena de morte os escravos ou escravas, que matarem por qualquer maneira que seja, propinarem veneno, ferirem gravemente ou fizerem outra qualquer grave offensa physica a seu senhor, a sua mulher, a descendentes ou ascendentes, que em sua companhia morarem, a administrador, feitor, e ás suas mulheres, que com eles viverem. Se o ferimento ou offensa physica forem leves, a pena será de açoutes à proporção das circunstâncias mais ou menos agravantes.
Por ser menor de idade, o réu não foi condenado à morte. Teve sua pena comutada em 600 açoites. Além disso, deveria ser levado com ferros no pescoço por um período de dois anos e as custas do processo deveriam ser pagas por seu senhor. Galés também não poderiam ser aplicadas nesse caso visto que o Art. 45 do código criminal, do qual o juiz também fez uso, estipulava o seguinte: Art. 45. A pena de galés nunca será imposta: 2º Aos menores de vinte e um annos, e maiores de sessenta, aos quaes se substituirá esta pena pela de prisão com trabalho pelo mesmo tempo. [...]
Nazário só completaria seu calvário em 16 de janeiro de 1864, quando levaria seus últimos 50 açoites. Segundo Goulart (1971, p.110), a câmara de Porto Alegre aprovou uma postura em 10 de fevereiro de 1831 que determinava: “Ficam proibidos os castigos feitos, em lugares patentes e públicos, aos escravos, os quais serão castigados em parte inferior da cadeia, e por uma só vez. Outrossim não excederão os castigos a 40 açoites”. Essa determinação do Código de Postura de Porto Alegre não teria efeito prático em Rio Pardo. Nazário tomou 12 seções de espancamento de 50 açoites cada, embora muito provavelmente o castigador possa ter “errado” a conta e dado alguns a mais, isto quando não obrigava o ofendido a ter de contar em voz alta – quando sabia – os golpes que tomava. Todas as seções estão registradas nos autos do processo; elas iniciaram-se em 28 de setembro de 1863 e foram até 16 de Janeiro de 1864. Por mais de uma vez o escravo teve de sofrer o castigo por 2 dias seguidos. 2.4 Escravos levados à insurreição Este caso é mais um indício de que os escravos se posicionavam diante de determinadas situações. Em 1859, houve uma tentativa de insurreição que pretendia libertar escravos da vila de Encruzilhada, Capivary e Erval. Os revoltosos pretendiam tomarem rumo a Vila de Encruzilhada, onde lá roubariam casas, o armamento da polícia e dariam liberdade aos escravos. Manoel José Botelho seria apontado como o grande mentor deste episódio.
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Vários informantes, indicados no processo,13 alegam terem sido por ele convidados a participarem do levante que aconteceu no dia 27 de março de 1859. Manuel Jose Botelho tinha na época em torno de 18 anos e era agricultor. Nos seus intentos teve a ajuda do escravo Laurindo, de alcunha pescoço grosso e de Manoel Joaquim, vulgo menino diabo, famoso pirata da região. Nos autos percebe-se grande preocupação das forças locais em conter este que não era um acontecimento izolado. Presos alguns escravos para serem ouvidos como informantes, constata-se que o esquema para seduzir voluntários estava dividido em mais de uma pessoa. Segundo os cinco primeiros informantes ouvidos pela polícia, os escravos teriam sido convidados por João, escravo de Bartolomeu Luiz Barreto, que assumira o papel de recrutar e convidar os parceiros para fugir e roubar propriedades, entre elas as casas de Gomez de Oliveira dos Santos Lima, de Fortunati Luiz Barreto e de João de Deus. João Botelho e seus comparsas não tiveram sucesso no projeto do levante. O mais intrigante é que todos foram acusados por roubo e não por insurreição. Aliás, nenhum dos cativos envolvidos foi levado de fato a qualquer tipo de julgamento, todas as denúncias, exceto àquela de Botelho, foram consideradas improcedentes. Pelo código criminal de 1830, capítulo IV, parte dedicada a expor as penas coerentes ao crime de Insurreição, percebe-se porque o crime não foi julgado dessa forma: Art. 113. Julgar-se-ha commettido este crime, retinindo-se vinte ou mais escravos para haverem a liberdade por meio da força. Penas - Aos cabeças - de morte no gráo maximo; de galés perpetuas no médio; e por quinze annos no minimo; - aos mais - açoutes. Art. 114. Se os cabeças da insurreição forem pessoas livres, incorrerão nas mesmas penas impostas, no artigo antecedente, aos cabeças, quando são escravos.
A lei de 10 de junho de 1835, no seu artigo 2º determinava que em caso do delito de insurreição escrava, deveria ocorrer reunião extraordinária do júri do termo. Como o movimento foi restrito aquém dos 20 indivíduos necessários para caracterizar crime de insurreição, não se cogitou enquadrá-lo como levante e sim como crime de tentativa de roubo. Botelho teve seu nome incluso no rol dos culpados sem que tenha sido levado à prisão. Em 1881 Manoel Botelho se apresentou às autoridades, que consideraram prescrito o crime em que havia sido condenado. Julgando improcedente aos demais reos, os escravos e os outros libertos do movimento proto-insurrecional, foram considerados livres do crime de insurreição. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os cativos de Rio Pardo foram mais do que simples serviçais encaixados nos mais diferentes tipos de serviço. Eles reagiram de forma distinta à sua situação de explorado. Diversas foram as formas em que essa resistência se operou: assassinatos, furtos, roubos, insurreição, ferimentos leves, injúrias e outros tipos que não aparecem em processos crime, como as relações horizontais entre os escravos. Essas reações, 13
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considerando-se todo o debate historiográfico em torno do tema, evidenciam a subjetividade autônoma do escravo, reagindo a sua condição de cativo (GORENDER, 1990, p. 20). A pesquisa deparou-se com casos emblemáticos como o do jovem Nazário, que assassinou com brutalidade sua senhora devido a castigos que considerou injustos e indevidos. Também é representativa a tentativa de insurreição de Encruzilhada, onde Botelho, pretenso líder do movimento, foi condenado e, a acusação sobre os escravos, foi considerada improcedente. Não menos importante o caso do escravo Jordão que evidencia uma rede de trocas de objetos furtados no contexto escravista. Nazário exemplifica bem o escravo que vai absorvendo os castigos para, no momento oportuno, explodir em uma reação extremada e fatal. Embora menor de idade, o cativo não se afobou, aguardou o momento certo e com crueldade acertou as contas com sua senhora. O fato de ser menor de idade foi usado no seu julgamento como atenuante. A lei de 10 de junho de 1835, considerada uma lei de exceção previa que escravos que matassem ou ferissem seus senhores ou familiares próximos, feitores e capatazes seriam condenados com a pena capital. Nazário, diante da dúvida do juiz e do júri quanto a sua idade, teve sua pena comutada em “apenas” 600 açoites e no castigo de carregar ferro no pescoço pelo espaço de dois anos. No caso da tentativa de insurreição nas localidades de Herval, Capivari e Encruzilhada, há uma mobilização notável em prol da não condenação dos escravos. O caso - um homem livre tenta mobilizar quantas almas conseguir para com a ajuda de outras figuras darem o grito de liberdade aos cativos, roubar algumas propriedades, as armas da polícia e invadir a localidade de Encruzilhada. Delatado o movimento, os participantes foram enquadrados sob crime de furto, e não de insurreição. Botelho, homem livre, que dirigiu essa protoinsurreição, foi o único condenado, não por levante, e sim por roubo. O crime de insurreição tinha como penalidade a pena capital. Também nesse caso parece ter havido um entendimento de se descaracterizar o movimento enquadrando-o como tentativa de roubo. Chama a atenção de que as acusações sobre os escravos envolvidos foram consideradas improcedentes e, nesse caso, a acusação recaiu sobre um “homem livre”. Jordão foi um cativo bastante articulado. Escravo de ganho, engendrou um golpe bem planejado; aproveitou enquanto prestava um serviço para subtrair de seu contratante algumas mercadorias que seriam trocadas por alguns animais com seu cúmplice, também escravo chamado Feliz, que então se incumbiria de vender em outro povoado. Jordão recebeu a pena de 4 anos e meio de galés enquanto Feliz saiu ileso, nem ao menos se tem certeza de se foi expedido um mandato de prisão e se ele foi capturado. Crimes distintos com penas diferentes evidenciam a resistência escrava em Rio Pardo. REFERÊNCIAS ______. ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Civil e Crime, Rio Pardo, Estante n. 50, n. 58, ano 1863. Maço 2. ______. ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Civil e Crime, Rio Pardo, Estante n. 50, n. 4696, ano 1859. Maço 93. ______. ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Civil e Crime, Rio Pardo, Estante n. 50, n. 4737, ano 1867. Maço 94.
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A LINGUAGEM ESCRITA E A APRENDIZAGEM NA ACADEMIA Angela Alenice Rothmund1 Felipe Gustsack2 Simone Wilgen3 RESUMO Viemos, através deste artigo, trazer reflexões sobre um projeto do qual somos bolsistas e que visa investigar as dificuldades enfrentadas pelos professores quanto à linguagem escrita, tanto na produção de textos durante sua formação, quanto nas propostas que apresentam aos alunos como metodologia para práticas de escrita e textualização. O estudo envolveu alunas/os de Cursos de Pedagogia presencial, da UNISC, e a distância, da UFRGS, do Mestrado em Educação - UNISC, bem como seis crianças, pais e professores da Escola Municipal de Ensino Fundamental Elemar Guilherme Kroth de Vera Cruz – RS, discutindo as práticas pedagógicas para o trabalho com a escrita na vivência escolar. Estudamos a linguagem escrita de professores a partir de uma abordagem complexa, articulando princípios da pesquisa participante e da Análise do Discurso com ações de pesquisa-ação, pois a aprendizagem na educação está diretamente relacionada com a qualidade da comunicação que se estabelece entre os que vivenciam o processo educativo, e isto implica o uso adequado da linguagem, especialmente da escrita, quando trabalhamos com diversas tecnologias. Somos seres que habitamos na linguagem, portanto, partimos da ideia de que nós humanos nos estruturamos como sistemas autopoiéticos, desenvolvendo as características biológicas e o domínio de saberes e valores que nos permitem produzirmos a nós mesmos. Conclusões apontam a carência de práticas de escrita prazerosa na academia como causadora de insuficiências em nossas aprendizagens. Palavras-chave: Linguagens. Escrita. Professores. Autopoiese. Análise do discurso. ABSTRACT We came through this article, to bring reflections on a project which aimed at scholars and we are investigating the difficulties faced by teachers and written language, both in the production of texts during their training, and the proposals they presented to students as practice methodology for writing and textualization. The study involved students in Pedagogy Course education in attendance at UNISC, and distance education at UFRGS, the Master of Education - UNISC and six children, parents and teachers in the School Hall Elementary School William Elemar Kroth in the city of Vera 1
Discente de Psicologia. E-mail: aarothmund@unisc.br - PPGEDU/Mestrado em Educação – Bolsista Fapergs.
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Doutor em Educação. E-mail: fegus@unisc.br - PPGEDU/Mestrado em Educação – Professor e Coordenador.
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Discente de Psicologia. E-mail: simonewilgen@mx2.unisc.br - PPGEDU/Mestrado em Educação – Bolsista CNPq.
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Cruz - RS discussing the pedagogical practices for working with the writing on the school experience. We study the written language teachers from a complex approach, combining the principles of participatory research and discourse analysis shares with action research, because learning in education is directly related to the quality of communication that established between those who experience the educational process, and this implies the proper use of language, especially writing, when working with various technologies. We are beings who inhabit the language, therefore, we set the idea that us, humans we are beings structured as autopoietic systems, and developing the biological domain knowledge and values that enable us to produce ourselves. Conclusions point to the lack of writing practice in the gym enjoyable as the cause of shortcomings in our learning. Keywords: Languages. Writing Teachers. Autopoiesis. Discourse Analysis. 1 APRESENTAÇÃO As reflexões que apresentamos emergem das atividades que realizamos como bolsistas de iniciação científica junto ao Projeto de Pesquisa: Educação e Linguagens: a escrita e os professores, coordenado pelo Professor Felipe Gustsack. Com este projeto investigamos as práticas de escrita de professores em formação dos cursos de pedagogia da UNISC (presencial) e da UFRGS (ead). Do ponto de vista teórico trabalhamos com o conceito de autopoiese (MATURANA; VARELA, 1997). Ou seja, partimos do pressuposto de que somos seres que habitamos na linguagem, enfatizando a idéia de que nós humanos nos estruturamos como sistemas autopoiéticos, desenvolvendo as características biológicas e o domínio de saberes e valores que nos permitem produzirmos a nós mesmos. Além disso, defendemos a idéia de que a qualidade da educação está diretamente relacionada com a qualidade da comunicação que se estabelece entre aqueles que vivenciam o processo educativo, e que este, necessariamente implica um domínio adequado da linguagem, especialmente da escrita. Afinal, ainda que a comunicação não seja a única função da linguagem, mas sim uma das suas mais importantes possibilidades, a aprendizagem é um fenômeno biológico e comunicacional. Isso quer dizer que a sobrevivência é uma questão de acoplamento com a realidade e para isso a linguagem é um fator fundamental. Em outras palavras: “Na medida em que os seres humanos são sistemas autopoiéticos, todas as suas atividades como organismos sociais devem satisfazer sua autopoiesis.” (MATURANA; VARELA, 1980, p. XXVI). Os seres humanos se constroem na linguagem tanto na sua dimensão ontogênica como cognitiva. Portanto, o processo autopoiético (auto-construção) se dá através de um processo de linguajar – emocionar. O conhecer é mais do que somente uma função cognitiva, uma vez que os processos de aprendizagem social se apresentam nas interações comportamentais dos seres vivos, e são construídos nesse viés de atravessamentos históricos, sociais, culturais, econômicos, religiosos e ambientais. Assim, desacreditamos da ideia evolucionista em que na carga genética, através do processo de seleção evolutiva, simplesmente a espécie armazenou informações de sobrevivência. Essa falsa ideia de uma realidade pré-existente, conforme o conhecimento tradicional, não se aplica ao
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pensar o ser humano habitando na linguagem, pois conhecer não se resume à evolução biológica, ou internalizar algo previamente construído na sociedade. Ao contrário, o conhecer ocorre no ser. Assim, por exemplo, cada pessoa, dependendo de sua história, compreenderá de diferentes maneiras as modificações da maré, e essa compreensão, mesmo sendo passada adiante, se dará somente como concepção intelectual, informacional deste ser que a recebe, podendo tornar-se uma compreensão, uma aprendizagem, na medida em que também este possa observar a maré, confirmando os sentidos da informação anteriormente recebida. Daí que toda a aprendizagem tenha a ver com ‘experiência’, não se configurando apenas a partir de informações e/ou observações externas de um fenômeno. “Viver é conhecer – conhecer é viver” (MATURANA E VARELA, 1991, p. 116). Nesse sentido, viver é sempre ação efetiva que implica em construção de conhecimento-realidade-sujeito. Essa experiência sempre nos transforma, pois se dá em nível anatômico, fisiológico, cognitivo e emocional devido à plasticidade de nosso sistema nervoso e psíquico. Ainda conforme os autores, a dimensão rede do funcionamento dos vivos nos mostra o papel das conexões no desenvolvimento dos seres vivos. O modelo da vida é o modelo de redes presentes não somente no nível relacional com o mundo externo, mas também internamente com as redes de conexões orgânicas. Assim, criar conhecimento tem a ver com a peculiaridade de construir esse mundo e os seus sentidos, e isso significa que atuamos na linguagem, a qual “é nossa maneira particular de ser humano e estar no fazer humano” (MATURANA e VARELA, 2001 p. 32). Ao agir na linguagem, que é um fenômeno social, construído pelos homens, que dá suporte às coordenações de conduta em que nos modificamos para conservarmos nossa existência em determinado meio, estamos constituindo a nós mesmos enquanto construímos o mundo em um constante vir a ser. No centro dessa explicação, que é a Teoria da Biologia da Cognição, está o conceito de Autopoiesis de Maturana e Varela que, como todos os outros aspectos que estamos descrevendo aqui, também é complexo na medida em que expressa que os seres vivos são sistemas fechados à informação e, ao mesmo tempo, abertos à troca de energia. Sermos fechados para a informação significa que somos auto-produtores de nós mesmos, na medida em que o que vem de fora apenas perturba e dispara mobilizações internas, mas não determina o que nos acontece. Assim, uma informação pode continuar sendo apenas informação, ou transformar-se em conhecimento. Por outro lado, os seres vivos são sistemas abertos às trocas de energia com o que lhes é externo o que os mantém em reorganização constante e reversão de entropia. Sendo assim, podemos dizer que conhecer é um processo autopoiético, em que poien em grego, significa produzir, criar. Autopoiese significa autocriar ou auto produzir. Todo ser vivo caracteriza-se literalmente, por produzir continuamente a si próprio, como organismo vivo, que interage com todos os organismos vivos, e se constrói nesses atravessamentos, em que viver é modificar-se, movimentar-se, aprender, como um permanente devir. Partindo dessas compreensões, em oficinas com professoras em formação refletimos acerca das características da escrita não apenas como prática necessária à formação docente e constitutiva do processo avaliativo na academia, mas também a sua relevância para a formação humana, que se traduz como um modo específico de aprender a pensar. Ou seja, acreditamos que o que aprendemos, e como aprendemos
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nas práticas da escrita, só é possível através dessas mesmas práticas de escrita. Explicando melhor, ser um bom leitor não faz de alguém um bom escritor. É na experiência do escrever, em que dominar a escrita é uma aprendizagem ímpar de outras aprendizagens, que se dá em um constante aprimoramento de autoproduzir-se como escritor. De modo algum, pretendemos desmerecer as outras formas de linguagem, mas sim, apontar para o entendimento de que as diversas linguagens são modos diversos de nos colocarmos em nosso constante devir. Afinal, são múltiplas e ímpares, cada qual nos permitindo diferentes saberes e diferentes meios de construir nosso mundo. Em torno desse tema das diferenças, vale lembrar que, Richard Sennett (2009, p. 182) traz uma discussão sobre o trabalho cooperativo, fazendo um viés interpretativo sobre os dedos da mão e a cooperatividade. Pela falta de assimetria dos dedos da mão, que tem comprimentos e flexibilidades diferentes, as quais impedem a perfeita coordenação, inclusive nos polegares, e ainda as diferenças de ser a pessoa destra ou canhota, a cooperação só e possível porque ocorre uma série de compensações por parte de cada um dos dedos, o que nos leva a concluir acerca da cooperação entre diferentes, já que entre iguais ela não é tão necessária. As habilidades manuais são atingidas de modo elevado, contudo, essas desigualdades entre os dedos, são compensadas pelas próprias diferenças, em que polegares executam ações que outros dedos não são capazes. O que Sennett nós traz, possibilita uma interpretação menos abstrata das diferentes formas de se apropriar de diversos conhecimentos, da pluralidade das formas como nos conhecemos, das diversas linguagens que possibilitam construir e criar o mundo e os modos de ver este mundo. Ou seja, as diferentes linguagens possuem esse quê de compensatório e diversificado, afinal, cada linguagem, seja o escrever, o falar, o ler, o desenhar, o cantar, o ouvir, representa diversos meios de se habitar nesse mundo e cada um coopera com o outro. Atualmente nos envolvemos com a realização de análises de textos produzidos pelas professoras em processos avaliativos para as quais nos utilizamos da metodologia da análise do discurso segundo as contribuições de Michel Pêcheux (1999), Helena Brandão (2004) e Eni Orlandi (1996). Partimos do princípio da linguagem como fato social, ideia introduzida pelos estudos de Saussurre, que foram retomados por Brandão (1996) e que muitos outros teóricos se propuseram a estudar no desenvolvimento da sociedade, em que a existência da língua foi fundada a partir das necessidades de comunicação das pessoas. A visão da linguagem como interação social mostra que nem o ouvinte, ou o orador são sujeitos passivos na constituição dos significados de uma enunciação, demonstrando que há relações intrínsecas entre linguagens, contexto social e o outro. Este outro desempenha papel fundamental na construção dos significados, uma vez que elabora o conteúdo segundo suas condições e a orientação social. Isto é, busca se adaptar ao seu meio, no intuito de interagir nas relações sociais, que dão o formato para o comportamento da pessoa, através, e nas linguagens. Nas palavras de Brandão, é “o percurso que o individuo faz da elaboração mental do conteúdo, a ser expresso à objetivação externa” (1996, p. 10). Nessa perspectiva, pois, a linguística não dá conta do estudo intrínseco da linguagem, sendo isso que nos leva à análise do discurso. Pensamos ser necessário trazer para o cerne das discussões acerca das linguagens uma compreensão que “articule o linguístico e o social” (BRANDÃO, 1996, p. 10), pois, “a linguagem é um distanciamento entre a coisa representada e o signo
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que a representa. E é nessa distancia, no interstício entre a coisa e sua representação que reside o ideológico”. A partir deste pressuposto buscam-se as relações da ideologia na linguagem. A palavra como produto da interação social, é um signo ideológico, que pode retratar as diferentes formas de significar a realidade, e pela sua pluralidade, mostra-se como campo frutífero para as manifestações ideológicas. A linguagem perde seu caráter abstrato, aparecendo como o lugar “em que a ideologia se manifesta concretamente” (BRANDÃO, 1996, p. 11), pois, o signo ideológico não é somente uma manifestação, ou reflexo da realidade, mas sim um fragmento material. Sendo assim, a realidade do signo é objetiva, tornando-se objeto de estudo metodológico e objetivo. Mas, vale lembrar, ainda, que o caráter ideológico vai além do signo, sendo visível nas formas. Nas palavras de Bakhtin (1979), citado por Brandão (1996, p. 11), “no funcionamento significante da linguagem que é o lugar onde se dá a sua materialidade”. A partir de então, estudiosos passam a pesquisar uma compreensão que vai além do fenômeno da linguagem centrado na língua, ou como sistema neutro de ideologias. Pelo contrário, passam a compreender a linguagem como local onde se materializam as ideologias predominantes, e é nessa instância da linguagem que o discurso toma forma. Os estudos do discurso permitem operar as ligações necessárias entre o que é linguística e as condições extralinguísticas, em que as condições e atravessamentos sócio-históricos que compõem o texto têm papel principal e constitutivo de cada significação. Aí, na compreensão de Haroche (1971), referido por Brandão (1996), está o campo do discurso, que é o ponto de articulação entre os processos ideológicos e os fenômenos linguísticos sociais. A linguagem enquanto discurso não é somente uma forma de interação social, mas sim um modo de produção social dos sujeitos, não sendo neutra ou inocente, na medida em que está engajada em uma intencionalidade ideológica de algum sistema, e não é algo natural, que se possa dizer inato ao ser vivo, mas local em que a ideologia tem seu campo de expansão. Aparecendo, conforme Braga (1980), citado por Brandão (1996), como “sistema suporte das representações ideológicas (...) é o ‘médium’ social em que se articulam e defrontam agentes coletivos e se consubstanciam relações inter individuais”. A linguagem, assim, funciona também como elemento de interação social e introdução da pessoa na própria realidade, sendo um lugar de conflito, pois o confronto ideológico se dá na linguagem, e se torna inviável, estudar tais conflitos ou ideologias fora da sociedade sendo que os processos que a constituem são históricosociais. O estudo da análise do discurso não pode estar desvinculado das condições de produção sociais, e as ideologias predominantes. A análise do discurso está bastante marcada pela perspectiva teórica francesa, cuja vertente defendida por Michel Pêcheux (1997) propõe uma reflexão entre a linguística, o marxismo e a psicanálise. Por fim, vale lembrar que a análise do discurso nasce com base na interdisciplinaridade, pois ela vinha se mostrando como preocupação não somente para os linguistas, mas também a historiadores e alguns psicólogos. Napoleão incute ao termo ideologia uma carga semântica negativa. Marx e Engels também vão significar o termo ideologia com cargas negativas, em que condenavam a maneira abstrata dos filósofos alemães, que, absortos em suas ideologias, não faziam as ligações entre a filosofia e as realidades vividas na Alemanha. Eles identificavam ideologia no interstício entre os processos de como se produziam as
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ideias, e as reais condições sociais e históricas que efetivamente as produziam (BRANDÃO, 1996). Marx e Engels, citados por Brandão (1996), entendiam que a produção de ideias, concepções, e a construção da consciência partem diretamente do mundo material, e do comércio material dos homens, incluindo a força de trabalho. Contudo, segundo Marx e Engels, o que as ideologias faziam era colocar as coisas de cabeça para baixo, representando o desvio de percurso em que se parte primeiro das ideias para depois se chegar à realidade. Chaui (1995) destaca que a partir dessa leitura de ideologia de cabeça para baixo em Marx, se entende que ideologia para este autor é um: sistema ordenado das ideias ou representações e das normas e regras como algo separado e independente das condições materiais, visto que seus produtores – os teóricos, os ideólogos, os intelectuais – não estão diretamente vinculados à produção material das condições de existência. E, sem perceber, exprimem essa desvinculação ou separação através de suas ideias (p. 65).
Essa leitura separatista entre o trabalho intelectual e material, de certa forma atribuía uma autonomia ao trabalho intelectual, ou às ideias, que ao prevalecer sobre o trabalho material passam a ser a expressão do que pensa a classe dominante. Segundo Marx e Engels (1965), o pensamento dominante, que efetivamente é o da classe dominante, é como se fosse uma força espiritual que regula a vida em sociedade. Assim dominam e regulamentam a produção e a distribuição de ideias que são da classe dominante sobre aqueles menos favorecidos em termos de poder de expressão, de exercício de linguagens no contexto social. Chaui (1995) constata, a partir dessa linha de raciocínio, que a concepção marxista de ideologia, pode ser caracterizada como um instrumento de dominação de classe, em que a classe dominante faz com que suas ideias sejam ideias de todos. Para que seja possível criar na consciência dos sujeitos essa visão ilusória, construída pela classe dominante, foi criado um sistema lógico e coerente de representações, normas e regras, que direcionam, indicam e prescrevem como os membros da sociedade devem pensar, o que pensar e como pensar, o que deve ser valorizado, como se sentir, o que sentir. A partir das teorias do discurso fica mais fácil percebermos que como são propaladas, disseminadas; ou seja, através das narrativas históricas, dos discursos dominantes. Em Marx a concepção de ideologia, por vezes, pode parecer estar reduzida a “uma simples categoria filosófica de ilusão ou mascaramento da realidade social” (BRANDÃO, p. 21, 1996). Porém, isso emana do fato de Marx tomar como ponto de partida a crítica ao sistema capitalista, e uma ideia de desmascaramento dessa ideologia burguesa. Assim, podemos ver que de fato a ideologia especifica da classe dominante é aquela que é frequente e reiteradamente produzida e reproduzida pelas estruturas e sistemas de poder. O que a análise do discurso, além de muitos outros enfoques de outros autores, nos ajuda a compreender e a fazer é uma leitura que mais se aproxime dos meandros dessa dominação e, portanto, da realidade possível de ser compreendida. Ou seja, com a análise do discurso buscamos compreender e elucidar quais os atravessamentos e as reais ideias embutidas nas narrativas dominantes de forma, digamos camuflada, nos discursos estabelecidos em sociedade pela classe
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dominante. Afinal, é o discurso uma das instâncias em que é possível ver a materialidade ideológica. 2 CONSIDERAÇÕES FINAIS Dentre as reflexões que emergiram com nossas leituras e discussões, destacamos o fato de que não apenas a leitura, mas especificamente a prática da escrita é que potencializa a sua aprendizagem. Da mesma forma, vale destacar que a aprendizagem da escrita, assim como todas as outras, pressupõe o envolvimento da pessoa como um todo, com todos os sentidos. Nessa abordagem, portanto, procuramos não separar o viver do aprender (MATURANA, 2002), destacando a complexidade deste processo. Nessa mesma direção, podemos trazer, ainda, algumas questões ligadas à ideia de experiência. Segundo Larrosa (2011) a questão da experiência tem muitas possibilidades no campo educativo. O autor concebe experiência como: isso que me passa, ou seja, supõe um acontecimento, o passar de algo que não é a pessoa em si, algo que não depende dela, não sendo uma projeção de si mesma, resultado de suas palavras, representações, sentimentos e assim não depende do seu saber, nem de seu poder, nem de sua vontade. Para ele, então, não há experiência sem a aparição de alguém, ou de algo, ou de um isso, ou de um acontecimento exterior à pessoa, estranho e fora dela mesma, ainda que o lugar da experiência seja o individuo em si. É nas palavras, sentimentos, ideias, representações que se dá a experiência. O sujeito da experiência se exterioriza em relação ao acontecimento, com o qual se altera. Se a experiência é isso que nos passa, que nos acontece, podemos dizer que o sujeito da experiência é como um território da experiência, como uma experiência de sensibilidade em que algo passa e que isso que passa e ao passar deixa vestígio, marca, rastro ou ferida (LARROSA, 2011). Um exemplo, também utilizado pelo autor, seria a leitura de um texto, na qual duas pessoas podem ler o mesmo texto, mas a experiência que cada uma terá não será a mesma, pois a experiência é singular e mesmo que a mesma pessoa vá ler o mesmo texto por duas vezes, em cada uma delas a experiência será diferente. Assim, do ponto de vista da experiência, a leitura, e pensamos que também a escrita, pode ajudar a pessoa a dizer o que ainda não pode, ou não quer dizer. Em outras palavras, pode ajudar a formar ou a transformar a própria linguagem, transformando também a pessoa de maneira congruente. Ao destacarmos que o mesmo acontece com a escrita, com o que nos passa com essa escrita, entendemos que há uma relação direta entre a escrita e a própria subjetividade, pois não se pode desenvolver uma escrita como se fora um caminho só de ida, onde não haveria reflexão, transformação. A experiência do escrever não apenas transforma o escritor, mas também transforma a escrita. Ou seja, tendemos a compreender a escrita como experiência que ocorre, que passa com aquele que escreve e esta envolve, sempre, todos os processos de reflexões, assim depois de escrever algo, este escritor não será mais o mesmo. Nós enquanto lemos e praticamos a escrita estamos em constante aprendizagem e transformação, nos subjetivando e transformando nossa própria linguagem, assim como nós mesmos em congruência com o todo. A experiência soa a finitude. Isto é, há um tempo e a um espaço particular, limitado, contingente, finito. Soa também a corpo, isto é, a sensibilidade, a tato e a pele, a voz e a ouvido, a olhar, a sabor e a
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odor, a prazer e a sofrimento, a carícia e a ferida, a mortalidade. E soa, sobretudo, a vida, a uma vida que não é outra coisa que seu mesmo viver, a uma vida que não tem outra essência que a sua própria existência finita, corporal de carne e osso (LARROSA, 2011, p.25).
Conclusões parciais de nosso estudo apontam para uma espécie de crise da escrita enquanto exercício prazeroso para a maioria das pessoas, da qual as professoras em formação não estão isentas. Compreendemos isso considerando que as práticas de escrita mais valorizadas e potencializadas em nossa sociedade tem se restringido ao cumprimento de normas da convivência profissional e ou intelectual, e não da convivência humana. As escritas mais ligadas ao conviver consigo mesmo, com o corpo e com as pessoas de relações mais próximas, hoje, considerando especialmente as novas tecnologias são limitadas a poucas palavras que trocamos sem muito cuidado através da web e, por isso mesmo, na maioria das vezes não temos nem tempo nem condições de nos percebermos vivendo uma experiência de conhecer, de auto-conhecer-se e de transformar-se. Por fim, levando em consideração as nossas práticas de escrita e as reflexões que o estudo nos permitiu realizar, pensamos que o menosprezo às práticas de escrita prazerosa produz uma discrepância com relação às possibilidades de aprendizagem que temos como seres humanos. Isto se confirma pelo fato de que aquilo que aprendemos e como aprendemos com as práticas de escrita não é possível que se realize com e/ou nas práticas de outras linguagens. REFERÊNCIAS BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. 5. ed. Campinas: Ed. da UNICAMP, 1996. CHAUÍ, Marilena de Souza. O que é ideologia. 39. ed. São Paulo: Brasiliense, 1995. LARROSA, Jorge. Experiência e alteridade em Educação. Revista Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v.19, n. 2, jul./dez., 2011. MATURANA, Humberto R. Cognição, ciência e vida cotidiana. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, 2001. MATURANA, Humberto R.; VARELA, Francisco J. De máquinas e seres vivos: autopoiese: a organização do vivo. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. MATURANA, Humberto R.; GARCIA, Francisco Varela. A árvore do conhecimento: as bases biológicas do entendimento humano. Campinas: Editorial Psy, 1995. SENNETT, Richard. O Artífice. Rio de Janeiro: Record, 2009. PECHEUX, Michel. O discurso. Estrutura ou Acontecimento. Campinas: Pontes, 1997.
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VÍNCULOS FAMILIARES E SOCIAIS NAS RELAÇÕES DOS IDOSOS Cíntia Kroth Araújo1 Claudia Maria Corrêa Cardoso2 Etiane Pereira Moreira3 Evelin Wegner4 Silvia Virginia Coutinho Areosa5 RESUMO O estudo identificou e analisou a percepção dos idosos sobre suas relações de amizade no âmbito familiar, buscando a promoção do envelhecimento com qualidade de vida. A pesquisa do tipo descritiva utilizou uma metodologia qualitativa, com entrevistas estruturadas, gravadas e transcritas para posterior análise. A população estudada foi composta por homens e mulheres maiores de 60 anos que frequentam grupos e serviços ligados à Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). Foram analisadas as narrativas de 250 idosos com base na técnica de análise de conteúdo. As questões versavam sobre a forma de conciliar a vida familiar e a relação com os amigos, tendo sido constatados aspectos positivos e negativos acerca das relações estabelecidas entre os idosos e seus familiares. Os resultados em sua maioria apontam que os idosos conciliam a vida familiar e a relação com os amigos de forma satisfatória. Palavras-chave: Envelhecimento. Relações familiares. Relações de amizades. ABSTRAT The study identified and analyzed the perception of the elderly about their friendly relations in the family, to foster the development of aging and quality of life. The research used a descriptive-type qualitative methodology, with structured interviews that were taped and transcribed for later analysis. The study population was composed of men and women over 60 who attend groups and services related to University of Santa Cruz do Sul (UNISC). We analyzed the narratives of 250 elderly people based on the technique of content analysis. The questions were about how to reconcile family life and relationship with friends and was found positive and negative aspects of the relations established between the elderly and their families. The results show that mostly the elderly reconcile family life and relationship with friends satisfactorily. Keywords: Aging. Family relationships. Friendships relationships.
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Acadêmica de Psicologia pela UNISC. Bolsista (PUIC/UNISC). E-mail: cintia_araujo1@yahoo.com.br
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Acadêmica de Psicologia pela UNISC, Bolsista (PIBIC/CNPq). E-mail: claudia_cardoso2008@yahoo.com.br
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Acadêmica de Psicologia pela UNISC. Bolsista (PIBIC/FAPERGS). E-mail: eti.ane@hotmail.com
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Acadêmica de Farmácia pela UNISC. Bolsista (PIBIC/FAPERGS). E-mail: evelinwegner@hotmail.com
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Doutora em Serviço Social. Docente do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da UNISC. E-mail: sareosa@unisc.br
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1 INTRODUÇÃO O Brasil tem o desafio de enfrentar as transformações que estão ocorrendo em seu perfil etário: o número de pessoas idosas está crescendo rapidamente com o aumento da expectativa de vida, conhecido como longevidade. Diante desse panorama social, o país vem desenvolvendo programas que atendam às demandas desses idosos e que ofereçam condições para um envelhecer com qualidade de vida. Os censos demográficos têm demonstrado o aumento da população idosa, que já chega a quase 20 milhões de brasileiros com mais de 60 anos (IBGE, 2008). Esse crescimento da população idosa se deu de maneira bastante acentuada na última década: a faixa de 65 anos e mais cresceu 49,2% e a faixa de mais de 90 anos cresceu 65%. A gerontologia, que tem como objetivo estudar e tratar dos aspectos que envolvem o envelhecimento, sejam eles biológicos, sociais, psíquicos, entre outros, busca promover pesquisas que possam estabelecer os fatores envolvidos na questão do envelhecimento (PAPALÉO NETTO, 2006). O envelhecimento com qualidade tem sido, pois, preocupação dos estudiosos da área que buscam soluções para a inserção social do idoso, dentre as quais merecem destaque as atividades de lazer, educação, esporte que propiciam a convivência entre grupos da mesma faixa etária (COSTA, 2010). A velhice hoje é vista não como uma categoria natural, mas socialmente construída; portanto, “não permite um conceito absoluto, possibilitando que uma nova condição seja estabelecida. Logo, envelhecimento é um processo” e, dessa, forma não ocorre de um dia para o outro, mas se constrói ao longo da existência humana (BERNARDES, 2007, p.117). Assim, a forma como se dá a representação do envelhecimento na sociedade interfere diretamente sobre o ser que envelhece. Existem, no entanto, duas formas de oferecer suporte social aos idosos: as redes formais e as redes informais. A rede de apoio social formal consiste em hospitais, ambulatórios médicos entre outras áreas da saúde, casas geriátricas, casa de repouso, asilos, centros-dia, além dos profissionais da área da saúde. As redes de apoio informal são representadas pelos familiares, amigos e vizinhos que oferecem apoio em diferentes âmbitos da vida do idoso. A família é a primeira rede de apoio para o idoso, onde este encontra a assistência necessária para suas dificuldades e necessidades (ASSIS e AMARAL, 2010). O contexto familiar representa, pois, um elemento fundamental para o bem-estar dos idosos, que encontram nesse ambiente apoio e intimidade para as diferentes situações com que se deparam, relações que asseguram um espaço de pertencimento com os familiares. A família contemporânea vem sofrendo transformações em relação ao surgimento de novos papéis e a longevidade tem proporcionado a convivência intergeracional, encontrando-se até quatro gerações em uma mesma residência. Esse panorama demonstra que a família, apesar das mudanças frente a diversas situações, continua sendo um local de extrema importância para nutrir afetos e proteção aos idosos (ARAÚJO, 2010). Assim, os vínculos que os idosos estabelecem no decorrer da vida são formados pelo grupo familiar, e por amizades na comunidade onde moram. Essas relações propiciam uma sensação de pertencimento e, esse fator, tem sido reconhecido como aspecto fundamental para um envelhecimento com qualidade de vida. Essas redes de apoio ajudam os idosos durante seu processo de envelhecimento, assegurando maior autonomia, independência, bem-estar e saúde (TRIADÓ e VILLAR, 2007).
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As redes de apoio social são também muito importantes e necessárias para a manutenção da saúde emocional ao longo de todo o ciclo de vida. Entretanto, em seu decorrer, vão sofrendo transformações na sua estrutura, de acordo com as necessidades de cada indivíduo. Algumas das mais importantes funções dessas redes de apoio social, para aqueles que estão na terceira idade, são: criar novos contatos sociais; fornecer e receber apoio emocional; obter garantia de que são respeitados e valorizados; manter sentimento de pertencimento a uma rede de relações comuns e fornecer suporte para aqueles idosos que sofreram perdas físicas e sociais (NERI, 2008). Este estudo pretendeu conhecer as relações familiares e de amizade dos idosos de ambos os sexos, a partir dos 60 anos, que frequentam grupos de convivência para a Terceira Idade e serviços ligados à Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). Buscou identificar a importância para o idoso dos vínculos de amizade dentro e fora da família e o papel que esses vínculos desempenham para a manutenção de sua saúde. Analisar os aspectos positivos e negativos que essas relações acarretam é fundamental para propor ações que contribuam para a promoção de saúde e para a qualidade de vida dos idosos. 2 METODOLOGIA Esta pesquisa descritiva utilizou uma metodologia qualitativa, com entrevistas estruturadas. Teve sua aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC (Parecer CAAE – nº 0023.0.109.000-09). Foram feitas entrevistas individuais gravadas com 250 idosos no ambiente do seu grupo, tendo os mesmos assinado termo de consentimento livre e esclarecido. A análise das entrevistas foi feita através da técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2004). Este artigo aborda a questão “É fácil para você conciliar a vida familiar e a relação com seus amigos? Por quê?”. As entrevistas foram extensas e abordaram vários aspectos relacionados à vida, permitindo que o tema: “percepção dos idosos sobre suas relações” emergisse naturalmente durante diversos momentos e vários aspectos pudessem ser captados. Essas, aliás, é outra vantagem dos estudos qualitativos: os entrevistados têm oportunidades de “abrir” as questões fechadas, assim como de retomar ou rever posições assumidas em outro contexto ou sob motivação diferente. A amostra da pesquisa, após a finalização da coleta de dados e validação das entrevistas, ficou composta de 250 sujeitos idosos e os resultados encontrados serão apresentados a seguir. A população deste estudo foi composta por indivíduos de ambos os sexos, maiores de 60 anos: 78% (n=196) são mulheres e 22% (n=54) são homens. Pode-se perceber uma diferença significativa em relação à participação dos homens e das mulheres nos grupos de convivência e nas atividades ligadas à terceira idade. Dos sujeitos entrevistados: 44% (n=110) são casados; e 4% (n= 10) têm uma união estável; 39% (n=97) são viúvos; 13% (n= 33) estão entre os solteiros, divorciados e separados, respectivamente. Em relação às idades dos idosos entrevistados, essas variam entre 60 e 88 anos, sendo que 31% (n=78) estão na faixa etária de 60 – 65 anos; 28% (n=70) entre 66 – 70 anos; 22% (n=56) entre 71 – 75 anos; 16% (n=39) entre 76 – 80 anos; e apenas 3% (n=7) entre 81 – 88, anos que seriam os idosos longevos da quarta idade.
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3 DISCUSSÃO DE RESULTADOS A partir dos dados coletados em projetos desenvolvidos dentro da Universidade de Santa Cruz do Sul, como a hidroginástica, o dançar na terceira idade, a oficina do movimento, o grupo de hipertensos e diabéticos, e outros grupos fora da instituição em Santa Cruz do Sul e na região dos Vales do Rio Pardo e do Taquari, foi possível realizar a análise qualitativa dos 250 sujeitos entrevistados. Os resultados são aqui apresentados, destacando-se os aspectos positivos e negativos em relação à capacidade do idoso de conciliar as relações familiares com as relações de amizade, encontrados no conteúdo das falas dos idosos pesquisados. 3.1 Aspectos positivos Entre os resultados encontrados nas entrevistas destacam-se, através do discurso dos entrevistados, categorias que abordam aspectos positivos, ligados a situações da vida diária dos idosos e que trazem benefícios de forma indireta para sua saúde. Essas categorias, descritas a seguir apontam a importância dos vínculos familiares e sociais que os idosos estabelecem e que acabam sendo fundamentais na qualidade de vida. a) Facilidade de se relacionar Os idosos entrevistados destacam a facilidade de se relacionar tanto com os familiares, quanto com os amigos. Compreende-se que essa questão está relacionada com a autoestima do idoso que se percebe de forma positiva. Eles relatam serem pessoas fáceis de conviver, pois respeitam e compreendem o próximo. Procuram sempre fazer as coisas da melhor forma e se dar bem com todas as pessoas, como se pode observar na seguinte fala: “É fácil porque na família a gente já tem aquele relacionamento bom e com os amigos também temos relacionamento bom. A gente procura se dar bem, não maltratar ninguém, cada um tem uma opinião, tem que dar atenção para todo mundo” (Homem, 64 anos, Casado). A relação com o outro é para o idoso muito importante, sendo o isolamento social algo extremamente temido. Com o envelhecimento, as relações familiares, pessoais e sociais aparecem sendo de grande importância como fonte de alimentação, regulação e organização. (VOLICH, 2009). Tomando como pressuposto que a vida é intimamente fundamentada pelas relações sociais e que essas se realizam dentro de uma família, um clã, um grupo, uma tribo, uma comunidade, seja qual for a designação, é certo que a interação é um elemento básico para a sobrevivência. Em cada fase da vida, da infância à velhice, faz-se parte de um contexto que influencia as ações sociais dos outros sobre nós e de nós sobre os outros. Através das relações sociais aprende-se, troca-se afeto, informações, recebe-se e presta-se apoio, constrói-se e mantêm-se a identidade (GÜNTHER, 2009). A rede familiar e de amigos é constituída por relações primárias que se caracterizam em sua natureza íntima e emocional, que são duradouras e propiciam aos idosos uma diversidade de papéis. As relações secundárias são formais e servem para atingir determinados objetivos, estando muitas vezes ligadas ao trabalho. Com o passar dos anos há uma diminuição dessas relações secundárias e os idosos encontram apoio em suas relações familiares e de amizade (HERNANDIS e MARTÍNEZ, 2005).
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b) Apoio familiar Nessa categoria os idosos relatam como importante o apoio que recebem da família, para participar dos grupos, viajar, conviver com os amigos. A família incentiva os idosos a não ficarem sozinhos em casa, mas a procurar os amigos, visitá-los, ir às atividades de grupo. O fato de os amigos serem em comum ao casal ou à família, ou seja, terem amizades compartilhadas também facilita essa conciliação. É o que se pode observar na seguinte fala: “É muito fácil. Se eu quero viajar, ir pra praia com minhas amigas, meus filhos me ajudam, ligando todos os dias, vão me buscar, me esperam com jantar. Se eu quero viajar pra outro lugar sempre me ajudam, me oferecem dinheiro, incentivam que saia, a relação com meus amigos e minha família é muito boa” (Mulher, 71 anos, Viúva). Em qualquer fase da vida o sujeito necessita de algum apoio e para isso conta com a família e a comunidade, locais naturais de proteção e inserção social, dentro das redes informais. São esses lugares que possibilitam suporte para ampliar processos de inclusão social, vínculos relacionais e para criar projetos coletivos para o benefício da qualidade de vida. Portanto, o sujeito encontra na rede familiar, na convivência com os vizinhos, um suporte para o enfrentamento de dificuldades que encontra em seu cotidiano (LEMOS e MEDEIROS, 2006). Sujeitos que não possuem um suporte social, seja ele com familiares e/ou amigos, tendem a ter mais dificuldade para lidar com o estresse, comparados àqueles que têm o suporte social. A ausência de parentes mais próximos, tais como cônjuge e filhos, está associada com doenças e mortalidade na terceira idade. O suporte familiar produz efeitos positivos na saúde. Esse suporte tende a reduzir os efeitos negativos do estresse na saúde mental, possibilitando assim, uma influência positiva no bem-estar psicológico do idoso (ASSIS e AMARAL, 2010). A família desempenha, pois, um papel de cuidado ao longo de toda a vida do sujeito (apoio econômico, emocional). Esse cuidado que a família propicia oferece menos riscos de uma possível institucionalização. A família constitui-se, assim, em um recurso fundamental para o familiar idoso, pois presta atenção direta e auxílio para possíveis problemas graves de saúde que podem ocasionar a perda de autonomia dessa pessoa. Os idosos que mantêm contato com suas redes sociais informais, como os amigos e vizinhos, terão dessas pessoas considerável apoio e cuidado no caso de ausência da família (HERNANDIS e MARTÍNEZ, 2005). c) Apoio dos amigos Os idosos entrevistados nesta pesquisa referem que é fácil conciliar a vida familiar e a vida com os amigos, devido à importância que os amigos têm nas suas vidas, tanto para se divertir, como para conversar, brincar, trocar ideias, se distrair, participar dos grupos de convivência. Relatam ser muito saudável para eles ter uma relação de amizade, pois muitas vezes são os amigos que servem de companhia quando os familiares trabalham ou não moram mais em casa. E isso pode ser observado nesta fala:“Porque eu gosto de conversar, eu gosto das amizades, eu gosto de festinha, gosto de estar junto, a gente faz os nossos encontros, se reúne pra conversar, pra tomar um chimarrão com bolo, com qualquer uma coisa assim, às vezes uma janta junto, nós fizemos isso assim, hoje nós vamos jantar junto e é isso, se reunimos” (Mulher, 66 anos, Viúva).
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Segundo Triadó e Villar (2007), as amizades constituem um importante apoio social e são fundamentais também pela faixa etária comum, indicando experiências de vida parecidas, recordações, opiniões e valores similares. Essas amizades são relações livres, voluntárias, baseadas na reciprocidade e no afeto, diferenciando, assim, das relações familiares que são essenciais ao sujeito. Construir relações de amizade na velhice não é uma tarefa simples, devido à possível limitação do idoso ao convívio familiar e às perdas dos iguais. Quando transcendem a família, os relacionamentos se ampliam, enriquecendo e oportunizando formas diferentes de viver. “Compartilhar o momento presente, relembrar experiências passadas ou mesmo planejar encontros são algumas das possibilidades nos momentos em que os idosos estão juntos” (ARGIMON e VITOLA, 2009, p.29). d) Separar a família dos amigos Nessa categoria, os idosos referem que a maneira que encontraram para conciliar a vida familiar e a relação com os amigos é separando essas relações. Encontram facilidade por ter amigos pessoais, diferentes dos amigos dos filhos. Os entrevistados relatam que disponibilizam um tempo para os amigos e para a família dedicam outro espaço. E isso pode ser observado na seguinte fala: “Eu não envolvo muito a família e os amigos. A família, eu vejo em casa; e os amigos, nos grupos que eu vou” (Mulher, 73 anos, Viúva). O apoio que a família disponibiliza ao idoso tem o papel de proporcionar um bem-estar significativo. Aqueles idosos que são casados têm um fator a mais, que são as relações informais que mantém, pois com um companheiro há possibilidade de se vivenciar diversas experiências que são compartilhadas em conjunto, como a relação com os filhos e os netos, que acabam funcionando como uma proteção para a saúde, principalmente para os homens idosos (HERNANDIS e MARTÍNEZ, 2005). Os grupos de convivência têm sido uma alternativa estimulada em todo o Brasil, pois são uma forma de interação, inclusão social e principalmente uma maneira de resgatar a autonomia, de viver com dignidade. As redes de relações, de amizades e vizinhança são importantes fontes de suporte social e estão relacionadas ao sentimento de bem-estar. Do mesmo modo, a satisfação dos idosos na convivência com outras pessoas, além dos familiares, pode aumentar de intensidade ao longo da vida, melhorando inclusive a qualidade de vida. Nesses grupos de convivência, que fizeram parte do estudo, os idosos encontram indivíduos que apresentam as mesmas necessidades de convívio social. Nesses espaços surge a oportunidade para estabelecer novas amizades, ampliar os conhecimentos e, principalmente, afastar a solidão (SPOSITO et al., 2010). e) Disponibilidade de tempo Os idosos referem que ter tempo “de sobra” facilita a conciliação, pois assim podem organizar melhor seu tempo e suas atividades diárias. Dessa forma, conseguem tempo para família, para visitar os amigos, conversar, tomar chimarrão, ou seja, para conciliarem as diversas atividades e relações do seu dia a dia. Com essa programação relatam conseguir tempo para as duas relações, pois necessitam da família e também dos amigos para uma vida saudável e feliz. Alguns referem que a aposentadoria influencia de forma positiva para obtenção desse tempo disponível, como se observa na fala de uma idosa: “Trabalho pouco e
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estou aposentada, assim consigo conciliar por causa do tempo disponível” (Mulher, 63 anos, Casada). Neste estudo, o tempo disponível devido à aposentadoria é visto como algo positivo para os idosos. Estão conseguindo, assim, realizar novas descobertas e construir novos projetos de vida. Segundo Pacheco e Carlos (2006), com a chegada da aposentadoria o sujeito precisa buscar uma ampliação das suas redes sociais, através de clubes, associações, atividades religiosas, grupos de viagens, esportivos, culturais, de lazer, de voluntariado, entre outros, e não se restringir apenas às relações referentes ao trabalho/profissão que foram exercidas. A aposentadoria, no entanto, pode ter um sentido diferente quanto ao gênero. Geralmente as mulheres buscam se manter ativas encontrando outras atividades para realizar. Isso permite que desenvolvam um sentimento de utilidade, enquanto provedoras do seu ambiente, tanto doméstico como social. No caso dos homens, que não possuem uma supremacia com relação ao espaço doméstico, algo criado socialmente para o sexo feminino, esses buscam novas atividades para vivenciar neste momento em que estão liberados do trabalho (PACHECO e CARLOS, 2006). f) Liberdade Nessa categoria, muitos idosos referem ter uma grande liberdade para se relacionar com os amigos, devido ao fato de, geralmente, estarem morando sozinhos. Como os filhos já construíram suas famílias e não estão mais em casa, sobra-lhes mais tempo para as relações de amizade. Outros relatam que, mesmo morando com os familiares, têm liberdade e autonomia para sair com os amigos, relações que não interferem na relação familiar. Isso se pode observar na seguinte fala: “É fácil conciliar: eu saio quando eu quero, volto quando quero, eu tenho liberdade” (Mulher, 62 anos, Casada). A perda da liberdade é bastante temida pelo idoso, quando esse não tem mais condições de morar sozinho. Frente à doença ou à invalidez, necessita muito do apoio da família para manter a autonomia e a independência, mesmo que parcial. A solução das questões de dependência vai requerer aceitação das limitações do idoso e a capacidade de permitir-se ser dependente quando necessário. É indispensável também ao filho adulto a aceitação de seu papel filial, assumindo responsabilidade por aquilo que pode fazer pelos pais que estão envelhecendo, respeitando as limitações e a liberdade desses (VOLICH, 2009). Ajudar o idoso a manter uma vida autônoma, dando condições de gerir suas necessidades básicas, sua vida diária e a capacidade de viver independentemente, pode influenciar na manutenção das suas capacidades cognitivas (ARGIMON e VITOLA, 2009). Na velhice a dependência física é, com muita frequência, confundida com dependência para a tomada de decisões, o que dá origem a um paternalismo social que, por sua vez, gera consequências, como fazer tudo em lugar do idoso e negar sua liberdade, autonomia e capacidade de escolha (BALTES e SILVERBERG apud MAZO et al., 2009). Manter a autonomia e a independência são condições essenciais para a qualidade de vida do idoso, pois lhe permite realizar suas atividades cotidianas sem depender de outros, o que possibilita garantir sua capacidade de decisão. O grau de autonomia e independência de uma pessoa idosa é avaliado conforme desempenha suas tarefas no dia a dia, sempre considerando o contexto sociocultural em que vive. O contexto exerce influência nas oportunidades e possíveis restrições na autonomia e na independência do idoso (LEMOS e MEDEIROS, 2006).
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3.2 Aspectos negativos Nem todas as categorias encontradas nas entrevistas referem-se a aspectos positivos, tendo sido também relatados aspectos negativos. Esses apontam as dificuldades que surgem em relação à falta de tempo e a não aceitação pela família de suas relações de amizade e de sua participação nas diversas atividades que são propostas pelos grupos de convivência para a terceira idade. Esses aspectos negativos em muitos casos inviabilizam os idosos de realizarem atividades de seu interesse e podem resultar em prejuízos para a sua saúde. a) Falta de tempo Alguns idosos encontram dificuldades de ver os amigos pela falta de tempo, pois estão comprometidos nas atividades da vida diária. Muitos ainda possuem dependentes (cônjuges, filhos ou netos), pessoas que dependem de seus cuidados na rotina da casa; outros ainda trabalham apesar da idade e não conseguem tempo para conciliar tudo. Isso podemos observar nas falas de duas idosas: “É, às vezes os amigos ficam de lado, pois são muitas atividades pra fazer” (Mulher, 63 anos, Casada). “Considero média, pois às vezes falta tempo” (Mulher, 76 anos, Casada). A longevidade tem trazido um alargamento no tamanho das famílias, o que tem promovido a experiência de diferentes gerações conviverem entre si. Nessa nova configuração familiar, o idoso, muitas vezes, tem exercido a função de provedor da família, pois ajuda financeiramente os filhos e netos que, em muitas situações, continuam residindo na casa do idoso. Mesmo aposentados, ou seja, sem obrigações com o trabalho, os idosos muitas vezes são obrigados a realizar atividades diárias, sendo também responsáveis pelos cuidados e pela educação dos netos, o que acaba interferindo nesse tempo que poderia ser dedicado para suas atividades de lazer (TUR e OLIVARES, 2005). A maior renda, através das aposentadorias e pensões, e o fato de o idoso normalmente possuir casa própria, tem proporcionado a ele maior capacidade de suporte familiar. Os benefícios previdenciários têm aumentado ao longo do tempo para ambos os sexos, o que faz com que muitos filhos e netos se tornem dependentes financeiramente dos idosos. É importante observar que os idosos ocupam significativamente a posição de chefia nesses arranjos. O tipo de arranjo mais comum, 44,5% no conjunto do país, é aquele no qual o idoso mora com seus filhos, em sua casa própria. O idoso de hoje contribui com quase 50% da manutenção da família, sendo o principal provedor. Os idosos muitas vezes abdicam de usar seu salário para necessidades pessoais, e inclusive de saúde, para garantir o sustento de seus familiares (AREOSA, 2010). b) Não aceitação da família Em relação à não aceitação pela família dos vínculos de amizade, alguns idosos dizem que a família não aceita bem a relação com os amigos, o que dificulta seus relacionamentos de amizade. Em muitos casos os idosos, especialmente mulheres, que possuem um companheiro ou são casadas, enfrentam dificuldade com o seu cônjuge, pois esse não sabe algumas vezes lidar com as amizades da sua companheira. Acaba, assim, colocando empecilhos nas relações de amizade de seu cônjuge o que resulta no impedimento de realizar atividades do seu interesse e de manter suas redes de amizade. Em outras situações
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são os filhos que acabam dificultando as relações, como se pode observar nas seguintes falas: “Os filhos não gostam quando eles estão em casa e vêm nossos amigos; os filhos acham que o espaço é deles e não gostam; então, tu não traz muitas pessoas em casa” (Mulher, 67 anos, Casada). “Não é fácil, porque os familiares não aceitam certas coisas” (Mulher, 79 anos, Casada). Idosos que mantêm maior contato com amigos e familiares, provavelmente, vivam por mais tempo do que aqueles que se abstêm desses relacionamentos. É importante que a família proporcione ao idoso alternativas de interação social, ampliando os contatos sociais, visto que esses promovem sensação de conexão e bem-estar, auxiliando na adaptação à fase de envelhecimento. “Se, por um lado, os vínculos familiares são sentidos como importantes mantenedores de segurança emocional, por outro, relações fraternas, sem grau de parentesco, reforçam a interação social” (ARGIMON e VITOLA, 2009, p.29). As amizades possibilitam ao idoso apoio emocional, os amigos atuam como confidentes, conselheiros, auxiliam em momentos de necessidade, assim como em situações do dia a dia, proporcionando também companhia e aconchego. As amizades para os idosos são fontes significativas de satisfação e promovem sentimentos de bem-estar ao idoso (TRIADÓ e VILLAR, 2007). 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados deste estudo em sua maioria apontam que os idosos conciliam a vida familiar e a relação com os amigos de forma satisfatória, indicando uma avaliação positiva. O idoso, segundo a pesquisa, está mais participativo, principalmente a mulher idosa, mantendo e ampliando sua rede de relações na Terceira Idade. É importante que esses sujeitos não percam suas amizades, seus encontros familiares, suas atividades de lazer, sua participação em grupos. Este estudo demonstrou que isso faz com que o envelhecimento possa ser visto de maneira positiva e até como algo desejado, pois os idosos continuam fazendo parte da sociedade, sentindo-se integrados e satisfeitos. Para o idoso, a autonomia e a manutenção da independência são mais importantes do que seu estado de saúde e as perdas que teve no processo de envelhecer, pois essas fazem com que possa manter seus vínculos sociais e, com isso, sua qualidade de vida. REFERÊNCIAS ARAÚJO, Eliana Novaes Procópio. Intervenções Psicogerontológicas na Promoção de Envelhecimento Bem-Sucedido. In: MALAGUTTI, W; BERGO, A. M. A. (Org.). Abordagem Interdisciplinar do Idoso. Editora: Rubio, Rio de Janeiro, 2010, p. 67-76. AREOSA, S.V.C.; BULLA, L.C. Contexto social e relações familiares: o idoso provedor. In: AREOSA, Silvia (Org.). Terceira idade na UNISC: novos desafios de uma população que envelhece. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2010, p. 108-129. ARGIMON, I. I. de L; VITOLA, J. C. E a família, como vai? In: BULLA, L. C; ARGIMON, I. I. de L. (Org.). Convivendo com o familiar idoso. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2009, p. 25-31.
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ÁREA DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS Na área de Ciências Sócias Aplicadas entre os 43 trabalhos apresentados no evento, 95% foram de alunos bolsistas de Iniciação Científica da Universidade, nesta área 2 trabalhos foram de alunos de IC vinculados a outras Instituições de Ensino do Estado do Rio Grande do Sul. A maioria dos trabalhos nesta área foi de bolsistas do Programa UNISC de Iniciação Científica – PUIC, seguida dos Programas de bolsa PIBIC/CNPq, PROBIC/FAPERGS e PUIC voluntário, conforme apresentado na Figura 04. Figura 04 – Modalidade de bolsas dos estudantes participantes do XVII Seminário de Iniciação Científica na Área de Ciências Sociais Aplicadas.
Fonte: Coordenação de Pesquisa, UNISC, 2011.
AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE VIRTUALIZAÇÃO DOS WEBSITES DOS GOVERNOS MUNICIPAIS DO VALE DO RIO PARDO Débora da Rocha Hoff 1 Rosana Klafke 2 Douglas Wegner3 RESUMO Com o desenvolvimento da Tecnologia da Informação (TI) ganha força a ideia de que também os governos devem utilizá-la para ampliar a oferta de serviços e a interação com os cidadãos. Nesse sentido, o presente estudo teve como objetivo avaliar o nível de virtualização dos websites dos 23 governos municipais do Vale do Rio Pardo (RS), utilizando como base o modelo de Klering e Schröeder (2008), que permite classificar os websites em seis níveis. A coleta de dados ocorreu em agosto de 2011, através da análise das funcionalidades do website de cada prefeitura. Verificou-se que 16 prefeituras possuem website (70%) e, destes, somente 4 atendem o nível 1 e 2 e parcialmente os requisitos do nível 3 de virtualização, sendo estes os que atingem o maior nível dentre o conjunto de municípios analisados. Pode-se concluir que os governos municipais possuem websites com baixos níveis de virtualização e seu potencial de comunicação e interação é pouco explorado, seja como forma de divulgar o município ou para aproximar o cidadão das questões públicas. Palavras-chave: Governo eletrônico. Virtualização. Website. Municípios. Vale do Rio Pardo ABSTRACT World development of Information Technology (IT) resources reinforces the idea that it should be used by governments to expand services’ supply and the interaction with citizens. Therefore, the present study aimed to evaluate the virtualization level of websites from 23 municipal governments in the Vale do Rio Pardo (RS) region. To achieve this goal it was used the Klering and Schroeder (2008) model, which allows to classify websites into six different levels. Data collection occurred in August 2011, by analyzing the features of each municipality’s website. It was found that 16 governments have websites (70%), but only four of these meet levels 1 and 2 and partially level 3 of virtualization requirements. These are the websites that reach the highest level among the group of municipalities analyzed. It may be concluded that the municipal governments researched have websites with low levels of virtualization. Its potential for communication and interaction is little explored by local governments, either as a way to promote the municipality potentials or to approach citizens with public affairs. Keywords: E-government. Virtualization. Website. Municipalities. Vale do Rio Pardo.
1
Bolsista (PROBIT/FAPERGS). Acadêmica do curso de Administração da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). dederhoff@msn.com
2
Bolsista do projeto. Acadêmica do curso de Administração da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). ro_klafke@hotmail.com
3
Professor do Departamento de Ciências Administrativas da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). Doutor em Administração (PPGA/UFRGS). dwegner@unisc.br Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 109-121, 2012
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1 INTRODUÇÃO A segunda metade do século XX caracterizou-se pela transformação de uma sociedade industrial em uma sociedade da informação, em que a fonte de poder e riqueza se desloca de ativos físicos e bens materiais para ativos intelectuais e conhecimento (CASTELLS, 2002). Em grande medida, essa transformação foi potencializada pelo desenvolvimento de Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), caracterizadas como um conjunto de recursos, hardware e software, ferramentas de inteligência artificial, sistemas para escritórios, entre outros, que permitem ações de coleta, armazenamento, transferência e utilização de dados. Essas tecnologias rompem as noções tradicionais de tempo e espaço (HARVEY, 2001), permitindo a troca e combinação de conhecimentos entre indivíduos conectados, de uma forma que anteriormente não era possível. A intensidade das mudanças geradas pelos fluxos informacionais também repercutiu em governos e órgãos públicos, no que se refere à necessidade de criar novas formas de interação e comunicação com a sociedade. Em um contexto no qual uma parcela maior da população tem acesso a informações e pode utilizar as tecnologias disponíveis para se manifestar, é natural que seja exigido dos gestores públicos maior transparência e divulgação das ações públicas. Como consequência, ainda que em menor grau do que as empresas, o setor público passou a dedicar investimentos com o objetivo de utilizar as TICs para oferecer melhores serviços e comunicar-se com os cidadãos. Entre as diversas possibilidades de uso da tecnologia da informação pelos governos está o desenvolvimento de websites, que se caracterizam por páginas acessadas através da Internet e que possuem funções diversificadas, como apresentação de informações, instrumento de publicidade, prestação de serviços, comunicação de duas vias e venda de produtos, no caso de empresas com fins lucrativos. Os websites dos governos municipais podem aproximar o poder público e os cidadãos, através da disponibilização de serviços e informações municipais. Além disso, podem ser também um espaço onde as pessoas participem das decisões através de críticas e sugestões, interagindo com o governo. De maneira complementar, outro benefício do uso da TI e, especificamente, da melhoria das funcionalidades dos websites das prefeituras, é a possibilidade de poupar tempo e dinheiro público, otimizando o uso de recursos que, via de regra, são escassos. Com base nesse contexto, o presente artigo analisa as funcionalidades dos websites dos governos dos municípios do Vale do Rio Pardo (RS) e classifica-os de acordo com os 6 níveis de qualidade propostos no modelo desenvolvido por Klering e Schröeder (2008). O Vale do Rio Pardo está localizado na região central do Rio Grande do Sul e é composto por 23 municípios, com uma população total de 418.141 habitantes em 2010 (FEE, 2011). Entende-se que a identificação e análise das características de cada website é o primeiro passo para sugerir melhorias e possibilidades ao poder público, sendo esta a principal contribuição esperada com a presente pesquisa. Além desta introdução, o artigo está estruturado em 4 seções. A primeira seção apresenta uma revisão de literatura sobre o tema governo eletrônico, virtualização de websites governamentais e modelos de avaliação. A segunda seção descreve a metodologia de pesquisa utilizada, seguido dos resultados da pesquisa na terceira seção. A quarta e última seção consiste em considerações finais e sugestões para estudos futuros.
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2 GOVERNO ELETRÔNICO À medida que a Tecnologia da Informação torna-se cada vez mais relevante para a gestão das organizações, também os governos percebem o potencial dessas ferramentas para sua gestão e comunicação com os cidadãos. Em paralelo a esse esforço para alcançar maior eficiência, a sociedade contemporânea passa a exigir dos governos maior transparência e visibilidade em suas ações, como resultado de uma compreensão mais ampla do Estado como representante dos interesses públicos e que deve agir em benefício dessa mesma sociedade. Nesse contexto, surge o conceito de Governo Eletrônico ou electronic government (e-gov), a utilização de ferramentas baseadas em tecnologias da informação e comunicação que tem como objetivo aproximar os cidadãos do governo através da disponibilização de diversos tipos de serviços como, por exemplo, dados sobre o município, notícias e informações atualizadas, serviços on-line e até a interação entre os cidadãos através de chats, e-mails e fóruns virtuais. O governo eletrônico consiste em um conjunto de ações modernizadoras vinculadas à administração pública que começaram a ganhar visibilidade no final da década de 1990 (AGUNE e CARLOS, 2005), alinhadas com a transformação de uma sociedade industrial em uma sociedade da informação, e que assim buscam construir novos modelos de gestão pública (FERRER e SANTOS, 2004). Enquanto a sociedade industrial é caracterizada por Castells (2002) como uma sociedade em que a lógica de organização industrial permeia todas as esferas de atividade, alcançando até mesmo os objetos e hábitos da vida cotidiana, a sociedade da informação tem como uma de suas características principais a lógica de sua estrutura em redes interativas que realizam trocas de conhecimentos. Nessa transformação de uma sociedade em outra, a fonte de produtividade se desloca do trabalho da mão-deobra para o processamento de informações e a geração de conhecimentos. Além da diminuição das distâncias entre os cidadãos e o governo, a virtualização dos governos também tem como meta a automatização dos processos, aumentar a produtividade operacional e administrativa, diminuir filas e poupar tempo e dinheiro público. Do ponto de vista dos cidadãos, objetiva melhorar a qualidade da prestação de serviços, gerar economia de tempo na obtenção desses serviços e envolver os cidadãos com o poder público, de uma maneira em que as suas críticas e sugestões sejam ouvidas e atendidas (BHATNAGAR, 2004). Como benefícios adicionais, Gronlund (2002) acrescenta que o e-gov favorece a transparência e responsabilidade dos governos, melhorando a gestão das organizações públicas sem esquecer o cidadão. Sendo assim, pode-se dizer que a virtualização dos governos é um momento de mudança no poder público, que busca uma participação qualificada da população, visando a benefícios e melhorias para todos os envolvidos. Dentre o amplo leque de tecnologias que podem contribuir para a implementação de governos eletrônicos, os websites dos governos e órgãos da gestão pública caracterizam um dos aspectos mais visíveis e de contato imediato dos cidadãos com o poder público. Tornálos mais atrativos e acrescentar novas funcionalidades, utilizando as tecnologias disponíveis, passa a ser, então, um desafio e uma exigência para os governos. Para Ruediger (2002), o egov nunca será um produto acabado, mas deve ser percebido como um processo em constante desenvolvimento e que precisa ser trabalhado pelos governos. Em outras palavras, apesar das limitações de recursos financeiros, humanos e técnicos, os governos precisam reconhecer a importância de implementar estratégias de desenvolvimento
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gradativo do e-gov, como por exemplo websites que permitam aos cidadãos acessar um número cada vez mais amplo de serviços e interagir com o próprio governo. Apesar do reconhecimento de que o conceito de governo eletrônico abrange a utilização de diversas ferramentas e tecnologias, conforme apontado anteriormente, o presente estudo foca especificamente os websites dos governos municipais, por considerálos importante espaço de comunicação e interação do poder público com os cidadãos. Para tanto, a próxima seção do trabalho apresenta três modelos para avaliação do nível de virtualização de websites das prefeituras e seus respectivos critérios. 2.1 Modelos de Análise para avaliação dos websites Vários autores apresentam modelos para a avaliação de websites de prefeituras. Selvi et al. (2008), por exemplo, propõem um modelo que classifica os websites de acordo com seus serviços prestados, segundo uma escala de qualidade que varia em sete níveis (I a VII). O primeiro nível é caracterizado como uma simples brochura eletrônica, sendo esse o nível de qualidade mais comum. O sétimo nível consiste em um serviço completo de egovernment, este website permite ao usuário preencher seus dados on-line, efetuar pagamentos no site, saber que todos os outros departamentos tomaram conhecimento das suas ações e completar, no próprio site, todas as atividades relacionadas com aquele serviço. Na pesquisa realizada por Selvi et al. (2008) com municípios da Região Metropolitana de Curitiba, os autores verificaram que dos 26 websites dos governos municipais, 5 foram desconsiderados da análise, pois não estavam disponíveis ou não continham qualquer tipo de informação ou serviço aos usuários. Outros 15 websites obtiveram classificação em nível I de qualidade. Foram identificados 4 websites de prefeituras classificados no nível III de qualidade. Já as Prefeituras Municipais de Curitiba e Pinhais foram as únicas que tiveram seus websites classificados em nível IV de qualidade, o maior nível alcançado na pesquisa (SELVI et al., 2008). Este nível consiste em um serviço transacional de fato: além das informações, podem ser impressos formulários e enviados para o governo pelo correio, os exames e entrevistas podem ser marcados on-line, mas o grande diferencial deste nível é que o usuário pode inserir seus dados diretamente nos bancos de dados do website. Outro modelo de avaliação é utilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que apresenta os resultados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais, realizado em 2009 (IBGE, 2009). A pesquisa investigou todos os 5.565 municípios brasileiros e, a partir disso, foram levantados dados relativos à gestão e à estrutura das cidades. Conforme os dados do IBGE, 99,9% dos municípios brasileiros contavam com computadores na administração direta, dos quais 89,4% estão ligados em rede e 99,5% com acesso à internet4. Chama a atenção que 96,4% dos acessos à internet são realizados através de banda larga. O IBGE também investigou a existência de websites dos governos municipais, classificando-os como informativos (aqueles que disponibilizam apenas informações, mas nenhum tipo de interação com o usuário), interativos (permitem receber informações e dados por parte dos cidadãos, além de reclamações, sugestões, mudanças de endereço, etc.) ou transacionais (nestes existe uma troca de valores, como pagamentos de impostos e contas, educação a distância e matrículas da rede pública de ensino). Em 2009, 60% das 4
O estudo do IBGE faz referência somente ao número de computadores, não informando sobre os softwares utilizados. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 109-121, 2012
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prefeituras dos municípios do país já possuíam website. Destes, 1.497 municípios classificaram sua página como informativa e 1.060 como interativa. Já 780 municípios classificaram sua página como transacional, e estavam fortemente concentrados nas Regiões Sudeste e Sul, com 65,6% municípios do total. Já na região sul do país, 953 prefeituras de municípios possuem website, destes 836 estão ativos e a maior parte deles (45,6%) é classificado apenas como website informativo, o nível mais baixo. À parte dos modelos de avaliação anteriormente apresentados, o presente trabalho optou por um terceiro modelo, proposto por Klering e Schröeder (2008), por considerar os critérios de avaliação mais claros e detalhados. Esse modelo consiste em critérios que permitem a classificação dos websites em seis níveis de virtualização: sites institucionais estáticos com função meramente informacional (nível 1), sites institucionais dinâmicos com serviços on-line (nível 2), sites interativos com feedback sobre os processos (nível 3), sites transacionais com maior tecnologia e interação (nível 4), sites participativos com tecnologia de participação e comunicação dos cidadãos (nível 5) e sites personalizados com customização e ênfase nas necessidades individuais do cidadão (nível 6). Estes níveis são apresentados com maior detalhamento na Tabela 1. Tabela 1 - Modelo de avaliação de websites Nível de Virtualização do website
Funcionalidades Avaliadas
● Dados institucionais e de governo NÍVEL I: Institucionais Estáticos básicos; Sites com função meramente ● Marketing singelo, que apresenta de informacional forma sucinta poucos aspectos de destaque do município. NÍVEL II: Institucionais Dinâmicos Sites dinâmicos com serviços on-line
● Eventos programados; Acessos; ● Cronogramas e horários de funcionamento de serviços públicos; ● Licitações em andamento
NÍVEL III: Interativos ou Consultivos Sites com feedback sobre os processos
● Ações em andamento; ● Leis aprovadas; ● Prestam contas de atos e julgamentos feitos; ● Links úteis; ● Permitem receber críticas, sugestões e apreciações, dando retorno.
NÍVEL IV: Transacionais Sites com maior tecnologia e interação
● Obtenção de comprovantes eletrônicos de quitação de débitos; ● Pagamento on-line de impostos; ● Votação sobre assunto de interesse comum; ● Oferecem serviços de estatísticas.
Exemplo de website de Prefeitura Mariana Pimentel (RS) www.marianapimentel.rs.gov.br
Passo Fundo (RS) www.passofundo.rs.gov.br
Curitiba (PR) www.curitiba.pr.gov.br
Porto Alegre (RS) www.portoalegre.rs.gov.br
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● Recurso de vídeos produzidos e de imagens de webcams; NÍVEL V: Participativos Sites com tecnologia de ● Disponibilizam serviços virtuais de participação e comunicação dos auto-atendimento; cidadãos ● Promovem teleconferências, e reuniões on-line, chats, vídeo chats.
Não foram identificados exemplos
● Permitem conversar on-line; ● Monitoraram acontecimentos por diferentes planos de navegação; ● Permitem realizar filtros, atribuir e customizar diferentes papéis e comportamentos.
Não foram identificados exemplos
NÍVEL VI: Personalizados Sites com customização e ênfase nas necessidades individuais do cidadão
Fonte: Baseado em Klering e Schröeder (2008)
3 METODOLOGIA De acordo com Lakatos e Marconi (2001), o método pode ser conceituado como o conjunto de atividades sistemáticas que permite alcançar o objetivo de pesquisa, ou seja, obter conhecimentos validos e verdadeiros acerca do tema que está sendo estudado. O presente estudo, tendo como objetivo analisar os websites dos governos dos municípios do Vale do Rio Pardo, utiliza um delineamento de pesquisa exploratório descritivo. Conforme Santos e Candeloro (2006), as pesquisas desse tipo buscam fundamentalmente proporcionar ampla visão sobre o tema selecionado, bem como descrever as características de um fenômeno ou de um fato. O delineamento de pesquisa adotado é adequado aos objetivos propostos, uma vez que não se identificou estudos anteriores com os municípios da região que tenham abordado este tema. 3.1 Amostra Como objeto de estudo, foram selecionados os 23 municípios do Vale do Rio Pardo, no Rio Grande do Sul, conforme relação disponibilizada pela Fundação de Economia e Estatística do Estado do Rio Grande do Sul (FEE, 2011). Destes municípios, 13 possuem até 10 mil habitantes, 6 possuem entre 10 e 30 mil habitantes e 4 possuem mais de 30 mil habitantes, conforme apresentado na Tabela 2. Essa separação foi realizada com o objetivo de permitir uma melhor visualização e comparação entre os municípios, de acordo com o seu porte. Além de constar o número de habitantes, cada município é identificado por uma sigla que é utilizada como referência na seção de análises.
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Tabela 2 - Municípios do Vale do Rio Pardo e respectivo número de habitantes Municípios com 0 a 10 mil Habitantes Boqueirão do Leão General Camara Herveiras Ibarama Lagoa Bonita do Sul Mato Leitão Pantano Grande Passa Sete Passo do Sobrado Segredo Tunas Vale Verde Estrela Velha
BL GC HE IB LS ML PG PAS PS SE TU VV EV
Municípios com 10 a 30 mil Habitantes 7.673 8.446 2.954 4.371 2.662 3.865 9.895 5.154 6.011 7.158 4.395 3.253 3.628
Arroio do Tigre Encruzilhada do Sul Sinimbu Sobradinho Vale do Sol Vera Cruz
AT ES SI SO VS VC
Municípios com Mais de 30 mil Habitantes 12.648 24.534 11.077 14.283 11.077 23.983
Candelária Rio Pardo Santa Cruz do Sul Venâncio Aires
CA RP SCS VA
30.171 37.591 118.374 65.946
Fonte: Fundação de Economia e Estatística (2011)
3.2 Técnicas de Coleta e Análise de Dados A coleta de dados ocorreu durante o mês de agosto de 2011. Inicialmente foi feita uma pesquisa para identificar o website da prefeitura de cada município, utilizando como referência o Guia Sócio Econômico do Vale do Rio Pardo (2011) e pesquisa em buscadores da internet. A partir da lista dos websites identificados analisou-se as funcionalidades disponíveis em cada website classificando-o de acordo com modelo proposto por Klering e Schröeder (2008), apresentado na seção anterior deste trabalho. Para testar se as prefeituras retornam informações solicitadas através de seu website foi enviado um e-mail a cada um deles, a partir do “Fale Conosco” ou Ouvidoria disponibilizado no próprio website, solicitando informações gerais. A partir da análise dos websites, optou-se ainda pela realização de uma entrevista semi-estruturada com o responsável pelo gerenciamento do melhor website identificado, com o objetivo de compreender a importância do portal da prefeitura, de que maneira ele é gerenciado e as dificuldades encontradas pelo governo municipal para sua manutenção. 4 RESULTADOS DA PESQUISA A primeira etapa da pesquisa consistiu na verificação da existência de um website para cada governo municipal do Vale do Rio Pardo. Das 23 prefeituras dos municípios da região, 16 possuem website, isto é, o equivalente a 70% dos municípios, conforme pode ser visualizado no Gráfico 1. Comparando estes números com aqueles coletados pelo IBGE em 2009 em nível nacional, verifica-se que no Vale do Rio Pardo o percentual de prefeituras com website é superior à média brasileira. No entanto, quando se compara os percentuais com a Região Sul do país, o resultado é inferior, pois na média dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul cerca de 80% dos municípios possuem website.
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Gráfico 1- Identificação de websites de prefeituras municipais Municípios que não possuem website
30%
Municípios que possuem website
70%
A segunda etapa da pesquisa consistiu na avaliação dos websites encontrados, conforme detalhamento apresentado na metodologia e modelo destacado na revisão de literatura. Para melhor visualização, apresenta-se os resultados para cada grupo de municípios separadamente. Do total de treze prefeituras de municípios com até 10.000 habitantes, seis não possuem website5. Os resultados da avaliação dos websites dos outros sete governos municipais podem ser observados no Gráfico 2, no qual os municípios são apresentados por meio das siglas referidas na Tabela 2. O website da prefeitura de Passa Sete não pode ser avaliado porque, embora esteja publicado na internet, é de acesso restrito permitido apenas para pessoas cadastradas, sem que haja a opção de realizar o cadastro no próprio portal. Em relação aos demais websites, verificou-se que nenhum atendeu todos os requisitos do nível 2, mas todos preencheram alguns requisitos do nível 3. De maneira geral, estas prefeituras possuem websites com baixo nível de virtualização e que se caracterizam por apresentar somente informações básicas aos cidadãos, com marketing bastante singelo e que descreve de forma sucinta e simplificada aspectos de destaque do município. Além disso, o website contém pouco ou nenhum tipo de serviço municipal disponível aos cidadãos. De certa forma, trata-se de um resultado esperado, já que são municípios pequenos e com grande percentual de população que vive no meio rural (6 municípios têm o número de habitantes no meio rural maior que o número de habitantes no meio urbano) e possivelmente tem acesso limitado à internet. Gráfico 2 - Avaliação dos websites das prefeituras de municípios com até 10.000 habitantes Nível 4
Nível 3
Nível 2 Nível 1 BL
5
EV
ML
PG
PAS
OS
VV
Municípios com até 10.000 habitantes em que as prefeituras não possuem website: General Câmara; Herveiras; Ibarama; Lagoa Bonita do Sul; Segredo; e Tunas.
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No grupo de seis prefeituras dos municípios com população entre 10.000 e 30.000 habitantes somente um não tem website6. A avaliação das outras cinco prefeituras é apresentada no Gráfico 3 e observa-se pequenas diferenças em relação ao grupo anterior. O website de três prefeituras (Encruzilhada do Sul, Sinimbu e Vera Cruz) cumpriram todos os requisitos do nível 2 de virtualização e parcialmente os requisitos do nível 3. Destaca-se neste grupo o website da prefeitura de Encruzilhada do Sul, que cumpre um requisito do nível 4, apresentando serviços estatísticos, com dados atualizados e completos, diferenciando-se dos demais. Gráfico 3 - Avaliação dos websites das prefeituras dos de municípios com população entre 10.000 e 30.000 habitantes. Nível 4 Nível 3 Nível 2 Nível 1 ES
SI
SO
VS
VC
Por último, foram analisados os websites das quatro prefeituras de municípios com mais de 30.000 habitantes. Dado o número de habitantes desses municípios, era esperado que os websites tivessem níveis maiores de virtualização e que permitissem maior comunicação com os cidadãos, prestação de serviços on-line e interação com os munícipes. Os resultados apresentados no Gráfico 4, no entanto, revelam que, destes websites, somente um cumpre todos os requisitos do nível 2 de virtualização e nenhum cumpre todos os requisitos do nível 3. O website da prefeitura de Rio Pardo atende um requisito do nível 4, mas não atende todos os requisitos do nível 3. Analisando estes resultados em comparação com aqueles das prefeituras dos municípios do grupo anterior (de 10.000 a 30.000 habitantes), verifica-se que as prefeituras dos municípios maiores possuem websites menos completos do que os do grupo intermediário. Gráfico 4 - Avaliação dos websites das prefeituras dos municípios com menos de 10.000 habitantes. Nível 4 Nível 3 Nível 2 Nível 1 CA
RP
SCS
VA
A partir da verificação de todos os websites avaliados, conclui-se que o do governo municipal de Encruzilhada do Sul possui o maior nível de virtualização, isto é, atende o maior número de requisitos no modelo utilizado. Na sequência, apresenta-se a entrevista realizada com o responsável pelo gerenciamento, manutenção e atualização deste website. 6
Município entre 10.000 e 30.000 habitantes cuja prefeitura não possui website: Arroio do Tigre. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 109-121, 2012
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Em relação à mensagem enviada ao website através da ouvidoria ou “Fale conosco”, foi constatado um número muito baixo de retornos. Das 23 prefeituras para as quais foi enviada mensagem somente Mato Leitão e Rio Pardo responderam. Isso demonstra que, embora a maioria das prefeituras possua websites e ofereça canais de comunicação através deles, não estão preparadas para atender os contatos realizados, seja por falta de recursos humanos para essa tarefa ou porque não é dada atenção aos pedidos de informações solicitados. 4.1 Entrevista com o responsável pelo gerenciamento do website da Prefeitura de Encruzilhada do Sul Dentre todos os websites analisados este foi o que ficou melhor avaliado, atendendo todos os requisitos dos níveis 1 e 2, parcialmente o nível 3 e ainda uma funcionalidade do nível 4. O website do governo municipal de Encruzilhada do Sul apresenta os dados gerais e história do município e informações do governo vigente. Também é possível conhecer os pontos turísticos, bares, festas e movimentos culturais na página on-line. Além disto, são disponibilizadas aos cidadãos as licitações, leis e decretos, editais de concursos e contas públicas. Este website oferece também notícias sobre o município em tempo real. Segundo o entrevistado, o website é importante por facilitar o trabalho dos funcionários da prefeitura em vários aspectos e por melhorar a relação com os cidadãos, principalmente na melhoria da comunicação entre ambas às partes. A prefeitura de Encruzilhada do Sul também tem o cuidado de manter o website com informações atuais, realizando atualizações e manutenções no mínimo 3 vezes por semana, que são realizadas pelo entrevistado e os demais funcionários da assessoria de comunicação. Por outro lado o assessor afirma que também existem dificuldades para o desenvolvimento de novos projetos e melhorias dos serviços oferecidos, pois não há recursos financeiros destinados a manutenção do website e muitas vezes falta apoio dos superiores. Alguns gestores públicos acreditam que o fato de existir uma página ativa na internet já é suficiente. Quanto à falta de resposta para a mensagem enviada para a ouvidoria do website da prefeitura de Encruzilhada do Sul, o assessor justifica que contatos realizados através deste meio não são de responsabilidade da assessoria de comunicação da prefeitura, por isso ele não soube responder o porquê da falta de retorno. Entre pontos positivos e negativos, pode-se perceber através do entrevistado que os benefícios que o website traz para o trabalho da prefeitura são válidos e importantes, mas que as dificuldades existem em grande número, pois depende da vontade de todos os envolvidos que o website seja mais valorizado para que consequentemente ele possa ser desenvolvido da melhor maneira possível. 4.2 Implicações da Pesquisa Os resultados da pesquisa geram um conjunto de implicações teóricas, implicações para a gestão pública e para o desenvolvimento regional. O modelo de Klering e Schröeder (2008) utilizado para análise dos websites não havia sido anteriormente utilizado em pesquisas empíricas. Por isso, verificou-se algumas limitações relacionadas à dificuldade de classificar os websites em apenas um nível, afinal poucos conseguiam atingir todos os requisitos de cada nível. Em geral, as prefeituras dos municípios do Vale do Rio Pardo atingiram parcialmente os níveis 1 e 2, concluindo apenas o nível 1, o que dificulta encaixá-lo
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em apenas um nível de virtualização. Como implicação teórica, verificou-se a necessidade de adaptações no modelo utilizado, que tornem sua aplicação mais prática e a classificação mais coerente. A realização desta pesquisa também gerou resultados que poderão ser de utilidade para os gestores municipais da Região do Vale do Rio Pardo e até mesmo de outras localidades. Os baixos níveis de virtualização indicam a necessidade de realizar investimentos que permitam qualificar os websites e acrescentar funcionalidades que melhorem os “governos virtuais”. A cooperação entre as prefeituras dos municípios seria uma maneira eficaz e menos onerosa para aperfeiçoar os websites de governos municipais e, inclusive, criar websites para as prefeituras daqueles municípios que ainda não possuem um. As prefeituras poderiam realizar essa parceria no âmbito da associação de municípios já existente no Vale do Rio Pardo, contratando empresas terceirizadas que criem essa ferramenta eletrônica com a qualidade necessária a custos menores do que cada prefeitura desenvolver ou aperfeiçoar seu website individualmente. Levando em consideração que os websites são produtos não acabados e com função de utilidade pública, eles exigem atenção e dedicação especial. Outra sugestão importante para melhorar os websites dos governos municipais da região do Vale do Rio Pardo é a capacitação de funcionários que possam manter o website em boas condições de uso, com informações atuais e serviços atendidos com eficiência. São necessárias pessoas que trabalhem com dedicação exclusive para as atividades de manutenção e atualização diária dos websites, para que ele possua as qualidades básicas e funcionalidades que os cidadãos precisam. É importante salientar que cada prefeitura municipal pode estabelecer objetivos relacionados à melhoria do seu website. Prefeituras que não possuem website têm como necessidade imediata desenvolver seu portal, que pode ser gradativamente aperfeiçoado. Prefeituras cujos websites ainda não atingem o nível 2 poderiam criar esforços para fornecer dados mais gerais sobre o município, agenda de eventos, cronogramas e horários de funcionamentos dos serviços públicos, licitações em andamento, links para outros sites úteis, informações sobre concursos públicos municipais e legislação municipal online, desta forma cumprindo todos os requisitos desse nível de virtualização. Para as prefeituras que ainda não atingem o nível 3 deveriam ser criados websites que fornecessem informações sobre ações do governo em andamento, consulta a processos, prestação de contas públicas, ouvidoria, enquetes de opinião e consultas on-line de débitos de impostos (IPTU) para enfim alcançar o nível 3 de qualidade. Já no nível de desenvolvimento regional, a existência de websites de prefeituras municipais qualificados traria vantagens para diversas áreas. A virtualização pode ser importante para o turismo, atração de investimentos através da divulgação das oportunidades e vantagens que o município oferece, gerando renda, empregos e oportunidades, movimentando a economia da cidade e também da região em que ela está inserida. Para o turismo, o website funciona como um meio de fazer propaganda e divulgar os atrativos turísticos, eventos e movimentos culturais do município, além da disponibilização de mapas de como chegar até a cidade. Os websites podem oferecer informações ainda mais completas com uma listagem de lugares para hospedagem (hotéis, pousadas e campings) e também para refeições (restaurantes, bares e confeitarias).
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Através deste artigo, buscou-se avaliar os níveis de virtualização dos websites das prefeituras do Vale do Rio Pardo (RS), analisando os serviços e informações que os governos municipais da região estudada oferecem aos seus cidadãos através de portais de internet. Pode-se concluir que a pesquisa revelou resultados pouco satisfatórios, primeiramente pelo número significativo de prefeituras que não possuem página na internet. Além disso, o nível de virtualização daquelas que possuem websites pode ser considerado baixo, uma vez que estas prefeituras apresentaram websites simples que em geral contêm informações básicas e marketing discreto, além de poucos serviços disponíveis aos cidadãos. Era esperado que o nível de virtualização dos websites das 4 prefeituras dos municípios com mais de 30.000 habitantes fosse mais elevado, o que não ocorreu, pois os resultados deste grupo foram semelhantes, e até inferiores, aos resultados dos municípios com menor número de habitantes. O melhor resultado entre os conjunto de websites avaliados foi o da prefeitura do município de Encruzilhada do Sul, que tem apenas 24.534 habitantes. Analisando o conjunto de resultados, considera-se que existe um grande espaço de aperfeiçoamento por parte dos governos municipais, no sentido de utilizar as Tecnologias da Informação e Comunicação para oferecer maior transparência de dados e informações. Tais estratégias de comunicação podem não só dar visibilidade às ações públicas como também reforçar a democracia, à medida que permitem a interação efetiva dos cidadãos com os governos que os representam. Finalmente, não se deve esquecer o papel dos websites na promoção do turismo e atração de investimentos, aspectos que, apesar do baixo investimento necessário, foram pouco explorados pelos municípios da região. A principal limitação da pesquisa é o fato de não ter coletado informações com os gestores públicos e com os cidadãos, restringindo-se à análise dos websites. Estudos futuros poderiam ser direcionados aos gestores municipais, identificando suas percepções em relação aos websites das prefeituras, projetos de aperfeiçoamento, dificuldades em termos de recursos físicos, financeiros e humanos, assim como a opinião dos cidadãos sobre o website da prefeitura do município onde reside. REFERÊNCIAS AGUNE, R.; CARLOS, J. Governo eletrônico e novos processos de trabalho. In: LEVY, E.; DRAGO, P. (Org.). Gestão pública no Brasil contemporâneo. São Paulo: Fundap, 2005. BHATNAGAR, S. Universal e-government and the digital divide, Asia pacific 2004, Beijing, July 15-16, 2004. CASTELLS, M. A sociedade em rede. 6. ed., rev. e ampl. São Paulo: Paz e Terra, 2002. FERRER, F.; SANTOS, P. E-government: o governo eletrônico no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2004. FEE. Desenvolvido pela Fundação de Economia e Estatística (2011). Apresenta informações de economia e estatística do estado do Rio Grande do Sul. Disponível em: <http.//www.fee.tche.br>.
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MÍDIA E IDENTIDADE – O REGIONAL NO JORNAL NACIONAL1 Nairo Luiz ORLANDI2 Carolina Junqueira LOPES3 Ângela Cristina Trevisan FELIPPI4 Fabiana Quatrin PICCININ5 RESUMO O artigo se propõe a discutir como o telejornal mais antigo e de maior audiência do Brasil, o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão, constrói, por meio de suas notícias, a realidade brasileira e, desta forma, contribui para a construção de identidades sobre as distintas regiões do Brasil. Toma-se, particularmente, o caso das regiões do Rio Grande do Sul para um olhar mais atento. Compreende-se a construção de identidade na mídia como estreitamente relacionada aos processos de visibilidade pública e de construção de sentidos ofertados pelo jornalismo de televisão sobre as regiões e suas populações. No artigo, buscase estabelecer uma relação entre as implicações de determinada produção de sentidos e o processo de desenvolvimento. Tomam-se as teorias dos estudos culturais e da análise do discurso como base reflexiva para a discussão feita por meio de pesquisa bibliográfica. Palavras-chave: Telejornal. Identidade cultural. Desenvolvimento Regional. Análise do discurso.
ABSTRACT The article proposes to discuss how the oldest and most widely viewed Brazilian TV newscast, the Jornal Nacional, from Rede Globo de Televisão, constructs Brazilian reality through the news, and, in this way, contributes to the construction of the different regions of Brazil. It looks particularly at the regions of Rio Grande do Sul. It comprehends the identity construction in media as closely related to public visibility processes and construction of meanings offered by television journalism about regions and populations. It seeks to establish a relation between implications of a particular prodution of meanings and the 1
O artigo faz parte da pesquisa As representações da heterogeneidade regional do Rio Grande do Sul no Jornal Nacional, da Rede Globo, desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, da Universidade de Santa Cruz do Sul.
2
Graduado em Jornalismo na Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC/RS. Jornalista. E-mail: nairo.orlandi@atlantida.com.br. Bolsista (PROBIC/FAPERGS).
3
Graduado em Jornalismo na Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC/RS. Jornalista. E-mail: carolinajlopes@gmail.com. Bolsista (PROBIC/FAPERGS).
4
Professora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e do Departamento de Comunicação Social da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC/RS; Doutora em Comunicação Social, bolsista do Fundo de Apoio à Pesquisa da UNISC. E-mail: angelafe@unisc.br
5
Professora do Programa de Pós-Graduação em Letras e do Departamento de Comunicação Social da Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC/RS; Doutora em Comunicação Social; bolsista do Fundo de Apoio à Pesquisa da UNISC. E-mail: fabi@unisc.br
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development process. The cultural studies theory and analysis of speech were taken as basis for reflective discussion by means of literature. Keywords: TV newcast. Cultural identity. Regional development. Analysis of speech. 1 INTRODUÇÃO Os processos de globalização acentuaram os debates teóricos em torno da questão da identidade cultural. A intensificação das migrações dos povos pelo planeta, dos negócios transnacionais, do alcance sem precedentes das trocas informacionais e comunicacionais via mídia alteraram o panorama das identidades culturais, levando também o campo acadêmico a se dedicar com mais vigor a essas questões. Identidade cultural é uma construção social, que se dá na relação que um indivíduo estabelece com outro, quando vai assumindo ou rechaçando certas características dadas pelo outro/coletividade, através de categorias compartilhadas. É também um discurso, mas um discurso que vem de uma prática social e que, por sua vez, também a constitui. Identidade, então, está em permanente construção, nunca acabada, sofrendo ação da história. A compreensão da identidade cultural, nessa perspectiva, a dos estudos culturais, tem que ser visada a partir do conceito de cultura. Cultura seria uma estrutura de significados compartilhados incorporados em formas simbólicas — a linguagem — por meio das quais os indivíduos se comunicam. Identidade, um discurso sobre si mesmo ou sobre o grupo na interação com os outros, que só é possível por meio de uma estrutura de significados comuns e da linguagem. Estudar identidade é estudar como as formas simbólicas são mobilizadas para sua construção (LARRAIN, 2003, p. 32). “Cultura é ordinária”, diz Williams (1993, p.1). É o modo de vida de um povo e os significados comuns atribuídos por ele à realidade; é a descrição das práticas de atividade intelectual e artística, mas também os processos de descoberta e criação; e é o processo de desenvolvimento mental. Para Hall (1997), é inegável a importância sem precedentes que a cultura assumiu, no sentido de propiciar o desenvolvimento de processos econômicos e políticos através das tecnologias da informação. E também a cultura tornou-se importante no aspecto econômico, dada a expansão das indústrias culturais, dos meios de produção e de circulação culturais. O melhor exemplo é o da mídia, que, além de ser um dos principais meios de circulação de informações, idéias e imagens pelo planeta, é um setor econômico dos mais importantes, não só pelo seu capital e pelo volume de recursos que faz circular, mas como sustentáculo de trocas econômicas globais. Cultura não é uma esfera autônoma, interfere e é afetada pelos processos econômicos, sociais e políticos. O movimento da globalização na cultura interferiu na produção, circulação e consumo de bens culturais, criando uma cultura global (ORTIZ, 1994). Para Hall (2003), há dois processos opostos funcionando atualmente com a globalização, um formado por forças dominantes de homogeneização cultural, que detêm o domínio do mercado cultural, e ameaça homogeneizar a cultura. Por outro lado, sem o poder de confrontar as primeiras, estão forças que vão disseminando as diferenças culturais pelo globo, que não subvertem a ordem dominante, mas vão negociando com ela. É a “proliferação subalterna da diferença” (2003, p. 60). Como o mercado global depende do novo, dessas diferenças, inclusive num processo que Hall (1999) denomina de mercantilização da etnia, ele as vai assimilando. E isso
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é feito através da comunicação, que é o maior motor de inserção das culturas locais no mercado global (MARTÍN-BARBERO, 2002). Mediadas pela tecnologia e pelos meios de comunicação, as culturas regionais e nacionais são difundidas pelo globo, causando uma revolução nas identidades. No que tange às identidades culturais, a globalização tem produzido diferentes resultados. De um lado tem-se uma cultura global proliferando-se, com padronização de produtos, gostos, formas de pensar, gerando uma identidade global. De outro, um revival das culturas locais — e até nacionais em muitos países —, como movimentos fortes pela defesa do direito de se representar. Propiciada pelos meios de comunicação e pelas tecnologias da informação e com o recuo da ação dos Estados na manutenção da coesão, a partir da cultura e identidade nacionais, as culturas regionais vão ganhando espaço, sendo difundidas, e uma pluralidade de novas identidades vão sendo construídas e postas em cena, especialmente por meio das redes comunicacionais. Nesse movimento, as comunidades vão buscar no passado as referências para a reafirmação de uma identidade, ancoradas na memória e a partir da etnia, do gênero, da sexualidade, da classe e do pertencimento a um território. Mas acabam por criar novas identidades, como forma de resistência à cultura de massa global e uma reação ao processo desenfreado de globalização, uma tentativa de reafirmação do controle sobre a vida. Em alguns casos, esses processos estão longe de ser traquilos, por isso uma dinâmica de causa e conseqüência resultam em movimentos políticos, como os separatistas, o fundamentalismo religioso (CASTELLS,1999, p. 94). 2 TELEJORNALISMO E CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES Na sociedade ocidental, de um modo geral, os meios de comunicação, desde seu desenvolvimento, têm tido papel fundamental na formação das identidades. Jornais e novelas, cinema, rádio e televisão são meios técnicos e discursivos para representação dos territórios e populações, especialmente as nacionais. Na América Latina, a mídia e o Estado fizeram uma aliança que propiciou a consolidação ambos. A Rede Globo é o exemplo disso no Brasil. Aliada ao governo militar, nos anos 1960 e 70, teve as condições materiais para sua expansão e, em contrapartida, forneceu ao regime difusão com alcance em quase todo território para um projeto de identidade nacional. Através dos discursos que faz circular, a mídia é quem dá visibilidade às culturas regionais nos mercados nacionais e internacionais, mas também sustenta movimentos culturais identitários de caráter regional acabando por (re)construir identidades. Os grupos querem o direito de construir sua própria imagem (MARTÍN-BARBERO, 1997), e a mídia quer o novo que lhe garanta a audiência, numa lógica de mercantilização da etnia, de representação da diferença que possa ser comercializável e que sofre bricolagens conforme as imposições do mercado. E essas comunidades imaginadas são formadas a partir dos meios de comunicação, que são as referências de mundo para boa parte das pessoas. Porém quando a mídia dá espaço para culturas regionais, geralmente o faz numa perspectiva comercial, como produto vendável (MARTÍN-BARBERO, 2002). Há uma seleção do que terá espaço e de como estas culturas serão construídas. Fatalmente, há exclusão na construção de determinados discursos sobre determinada cultura e identidade. Certos sentidos irão predominar em detrimento de outros. Nesse caso, são sentidos gerados a partir do investimento nesse processo, no que há de mais exótico e excêntrico acerca das
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manifestações culturais, uma vez que a escolha e o tratamento dos assuntos se move, muitas vezes, pela sua mercantilização. É importante considerar que toda produção de conteúdo da mídia é produção de discurso, ou seja, são construções simbólicas determinadas, leituras possíveis da realidade, que se transformam em discurso para a sociedade. Discursos que tem um local de produção, sujeito às regras do gênero narrativo, às condições técnicas e aos processos de produção, à legislação da área, à cultura profissional, aos interesses políticos e econômicos da empresa que a produz. Os discursos resultantes desses processos constituem o que falam, têm força de verdade, marcam. No caso de um determinado território – como o Rio Grande do Sul e suas regiões – o modo como é construído num telejornal como o Jornal Nacional pode gerar conseqüências como a solidificação de representações positivas ou negativas sobre possibilidades de investimentos, de geração de renda e de emprego, de instalação de projetos empresariais, tomando-se apenas o aspecto econômico. No que diz respeito à superestrutura, como agente simbólico, o jornalismo de televisão tem desempenhado um papel estratégico desde as primeiras transmissões das emissoras na construção da credibilidade do veículo e na conquista de sua legitimidade como agente formador da opinião pública, especialmente por seu compromisso com a retratação “fiel” dos acontecimentos. O telejornal é o responsável, dentro da grade de programação de uma Tv, na produção e apresentação de notícias, e como tal, apresenta-se como o porta-voz dos acontecimentos por meio dos quais os telespectadores pensam tomar conta dos principais fatos e notícias que se sucedem no dia. Os telejornais são produtos de informação de maior impacto na sociedade contemporânea e as principais fontes de informação para maioria da população brasileira. Uma das principais características da linguagem dos noticiários de Tv é garantir a verdade aos conteúdos dos discursos e também a própria credibilidade do enunciador. Produzem sentidos que resultam numa pretensa objetividade e no mito da imparcialidade. Os textos provocam efeitos de realidade. E as construções dos enunciados jornalísticos se confundem com o real porque os personagens são reais e a matéria-prima da produção são os fatos sociais (BECKER, 2004, p. 9).
Assim como boa parte da produção das emissoras, os telejornais são produzidos em rede, de forma verticalizada, cujo controle fica na cabeça de rede, expressão utilizada para indicar a sede da emissora. Isso, somado às características dos gêneros noticiosos televisivos, parece resultar num jornalismo que acaba por investir nos estereótipos por não dar conta das nuanças e sutilezas das diversidades regionais. Ou seja, o sistema operacional racionalista tende a simplificar as diferenças na sua prática diária quando da concepção da notícia, do tratamento da pauta e da edição da reportagem. Com isso, no caso do Brasil, tende a se apresentar um país com representações convencionalmente estabelecidas sobre as suas regiões, baseadas nas identidades oficiais, nos elementos culturais mais conhecidos e tomados como os caracterizadores de regiões, essas muito mais plurais do que essas representações podem abarcar. A operação em rede, para Williams (1990, p.13) se estabelece como o próprio fundamento da lógica da tecnologia de radiodifusão, determinando o sentido do fluxo de informação interposto entre a cabeça de rede e as regiões. E é esse fluxo, como se disse, Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 122-133, 2012
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posto em uma relação vertical e padronizada que não permite dar conta a contento das diversidades regionais especialmente porque, para além do acordo firmado entre a emissora cabeça de rede e suas afiliadas, esta, ao centralizar as decisões, exerce poder em relação às TVs regionais. Segundo Kurth (2006, p. 91), esta “hierarquia do nacional sobre o local limita a autonomia das regiões distantes do Sudeste de se auto-representarem culturalmente. Assim como os horários obrigatórios são determinados pela emissora cabeça de rede, o padrão das produções também segue determinações convenções. Por conta disso, Ehá implicações na questão nos discursos e sentidos gerados e na(s) identidade(s) cultural(is) construídas a partir deles: O conceito de operação de rede envolve mais do que um grande número de emissoras, próprias e afiliadas, sob a mesma bandeira. Ele pressupõe uma operação sincronizada, exibição conjunta e simultânea da mesma programação, mesma linha editorial dos programas jornalísticos e regras de comercialização idênticas em todas as emissoras. Tudo trabalha para a eficiência do negócio televisivo. Nem sempre os interesses locais e nacionais são os mesmos, mas, na programação em cadeia, o nacional se impõe sobre o regional e o local. Esta produção de conteúdos uniformes, em um país de dimensões continentais como o Brasil, pode ter conseqüências para a autorepresentação das culturas regionais (KURTH, 2006, p. 91).
Um dos riscos mais iminentes na cobertura jornalística feita a partir dos moldes estabelecidos entre a Rede Globo e suas afiliadas diz respeito ao que chama de “estigmas folclorizantes”. A produção jornalística da TV precisa, portanto, atender às demandas da própria prática de redação e às da audiência, muitas vezes, espetacularizando e banalizando os fatos, transformando as particularidades regionais em caricaturas. Neste sentido, como diz Kurth (2006, p.92), a produção emitida de um único centro retira dos diferentes grupos sociais a possibilidade de construção de suas próprias representações. Evidencia-se, neste contexto, como de fato a mídia trabalha pela fragmentação das identidades na contemporaneidade. E a televisão, sobretudo, o faz pela sua linguagem fragmentada, que mistura acontecimentos do local e do global, do presente e do passado e uma estrutura narrativa de microrrelatos, pela desagregação social que promove, pela privatização da experiência de recepção que oferece (MARTÍN-BARBERO, 1997). E, a partir da multiplicidade de relatos que disponibiliza, desconectados, descontextualizados em sua maioria, a Tv e sua linguagem não propiciam o relato unificador como, em certo momento histórico fez, pelo discurso da identidade nacional. Também Priolli (2000) chama atenção para os efeitos do jornalismo em dimensões nacionais: A “identidade nacional”, portanto, ou a visão que os brasileiros têm de si mesmos e do país, passou a ser mediada fortemente pelo ponto de vista das duas maiores metrópoles. Consolidou-se a idéia de um centro dinâmico, avançado e cosmopolita – o eixo Rio-São Paulo – em contraste com uma periferia atrasada, conservadora e provinciana. (PRIOLLI, 2000, p.19). Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 122-133, 2012
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Também Kurth chama atenção para um efeito de homogeneização dos processos e produtos produzida pelos telejornais em função da necessidade de unicidade que a ação em rede demanda e que resulta naturalizada por conta da força legitimadora do jornalismo de televisão, e ainda de uma hierarquização do nacional sobre o regional: No caso das redes, a representação de unidade parece tentar naturalizar a sobreposição dos aspectos internacionais e nacionais ante as questões regionais, para justificar ou mascarar a lógica mercantil da produção de informação. Ao mesmo tempo reforça a integração do indivíduo em uma sociedade aberta e globalizada. A estratégia segue uma construção ideológica de representar os acontecimentos internacionais e nacionais como se “naturalmente” fossem mais importantes ou essenciais à vida em comunidade do que aqueles locais. A naturalização é a evidência de como funcionam os códigos ideológicos na produção de sentido para constituir um “senso comum” na sociedade. (KURTH, 2006, p. 97).
As características dos gêneros jornalísticos televisivos, em que o tempo e a tecnologia são elementos fundamentais no processo produtivo, os tornam locais férteis de produção de estereótipos, padronizações, homogeneizações, espaço para os discursos do senso comum e do establishment. Especialmente em programas como o Jornal Nacional, com características massivas e em televisão aberta. Por isso, dificilmente consegue dar conta da pluralidade de um território, especialmente num programa, como é o caso do telejornal, que precisa apresentar uma realidade nacional de um país das dimensões do Brasil. 3 JORNAL NACIONAL E O RIO GRANDE DO SUL O Jornal Nacional, dentre os quatro telejornais diários da Rede Globo6, foi o primeiro a operar em rede nacional no país. De forma ininterrupta, está desde 1969 no ar e se transformou, ao longo deste período, num dos telejornais com maior audiência no horário nobre. O programa conquistou credibilidade, tornando-se sinônimo para a grande maioria das pessoas do próprio conceito de telejornalismo, em que pese a imagem de representante oficial dos governos a ele vinculada. Além disso, é importante registrar que o telejornal se mantém líder de audiência e um ícone importante do jornalismo de televisão, embora essa audiência tenha sofrido algumas quedas a partir da década de 1990 por uma série de fatores, entre eles a chamada era da multiplicidade da oferta7 na TV. Toda história, aliás, do Jornal Nacional, o referencia como um grande marco na sociedade brasileira. A apresentação do telejornal ao país pela Rede Globo foi um grande 6
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Atualmente, a Rede Globo mantém os telejornais Bom Dia Brasil (manhã), Jornal Hoje (início da tarde), Jornal Nacional (noite, por volta de 20h20min) e Jornal da Globo (final da noite/início da madrugada). Segundo Piccinin (2007), a era da multiciplicidade da oferta produziu uma das alterações mais importantes do cenário televisivo brasileiro a partir da década de 90. Juntamente com a Internet, a TV paga vai constituir o cenário da oferta múltipla e tornar-se responsável pela progressiva queda dos índices de audiência da TV aberta nesse período, por conta do deslocamento do segmento culturalmente sofisticado dos telespectadores – classes A e B – para as emissoras de sinal fechado. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 122-133, 2012
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acontecimento por oferecer-se como o programa “integrador” de um Brasil novo (BORELLI e PRIOLLI, 2000). Teve forte apoio financeiro e técnico do governo militar nos anos de 1970, que tinham interesse na integração nacional e nas comunicações como sustentáculos ideológicos dos seus governos. O posicionamento dos telejornais da Rede Globo, e entre eles o Jornal Nacional, também resulta da própria posição da emissora e do grupo do qual fazem parte, as Organizações Globo8. O sistema de teledifusão da Rede Globo conta com cinco emissoras próprias e 121 emissoras afiliadas no país, cobrindo a quase totalidade dos municípios brasileiros (BONNER, 2009). A Rede Globo começou a se expandir em 1972, tendo como objetivo consolidar a programação no país e, ao mesmo tempo, estabelecer relações, especialmente econômicas, nas diferentes regiões e estados. Aproveitou o momento tecnológico, político e econômico que exigia inovação, seguindo tendência internacional de uso das tecnologias de microondas e satélites geradores de novos mapas de cobertura. Salomão (2006) diz que a proposta de regionalização das tevês atende a várias demandas ao mesmo tempo. Todas vinculadas primeiramente a uma ordem econômica. Segundo a autora, as emissoras regionais tornam a audiência mais próxima das audiências na medida em que os conteúdos reafirmam a marca. Por outro lado, são também negócios que visam o crescimento econômico-financeiro fora do eixo das metrópoles, em busca das verbas publicitárias. E neste sentido, as emissoras regionais servem também aos próprios anunciantes que passam a investir em propagandas localizadas. Assim, depois de se fortalecer nas capitais, o objetivo da Rede Globo foi se expandir pelo país, para além das regiões metropolitanas do eixo Rio de Janeiro-São Paulo. O projeto de regionalização ganhou impulso com a implantação no seu organograma de um setor específico para atender as suas afiliadas (FERNANDES, 1996). A operação se deu por meio da incorporação de afiliadas regionais e da relação via o estabelecimento de uma rede axiomática – network - constituída da cabeça de rede e suas emissoras afiliadas. A cabeça de rede opera a partir de um ponto central que controla a emissão, retransmitindo a programação verticalmente e recebendo produção mediante pedidos previamente feitos à sua afiliada. As empresas afiliadas retransmitem a maior parte da programação para uma área de abrangência, ao mesmo tempo em que inserem, nesta programação, produção local, devidamente negociada em horários, duração e dias estipulados pela cabeça de rede, no caso a Rede Globo. Assim, em última análise, o gerenciamento das necessidades de cobertura, o julgamento sobre o que é notícia e a forma de tratamento adequada são feitos pela cabeça de rede, muitas vezes distante e sem um conhecimento preciso das múltiplas e variadas realidades existentes num país como o Brasil e seus estados e regiões. E nas regiões, o quadro nacional se repete na relação entre as cabeças de rede e suas praças. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a emissora afiliada, a RBS TV, pertencente ao
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As Organizações Globo são conduzidas por meio da holding Globopar. Segundo Bolaño (2004), juntamente com o Serviço de Televisão Aberta oferecido pela Rede Globo, a Globopar administra também Serviços de Televisão Paga, Programação de Televisão Paga, Serviços de Telecomunicações, Imobiliária, Publicação, Fonografia, Sistema Globo de Rádio (quinze estações), CBN - Central Brasileira de Notícias (cinco estações próprias e dezesseis afiliadas) e a Infoglobo (jornais O Globo e Extra), constituindo assim um importante oligopólio nacional.
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grupo multimídia Rede Brasil Sul de Comunicações - RBS9, é a emissora cabeça de rede no estado e fica localizada em Porto Alegre. A partir dela, se dá a relação com as 11 praças distribuídas pelo estado10, que operam por meio de um mapa de cobertura que contempla, numa regionalização própria, todo território em que seu sinal é captado, ou seja, todo estado. As praças estão localizadas em municípios de médio porte (geralmente os que concentram maior população, sistemas de serviço público e privado e renda da região), e dessas praças com suas sucursais, localizadas em municípios também de médio porte da mesma região da praça (porém de menor população, oferta de serviços e renda em relação aos municípios sede da praça). A relação de hierarquia entre cabeça de rede e praça e entre praça e sucursal reproduz o modelo ditado pela Tv Globo em relação às suas afiliadas. Desses diferentes níveis de poder, geram-se várias conseqüências. Uma delas é a tendência da cobertura jornalística privilegiar os municípios onde estão sediadas as praças e as sucursais, tanto por uma questão infra-estrutural, como por um entendimento da cultura jornalística da relevância desse município em relação aos demais. Outra consequência é o tipo de representações que essa situação gera, reforçando esses municípios como hegemônicos econômica, política, social e culturalmente na região e todas as implicações que isso pode gerar. É importante lembrar que é a afiliada quem produz e envia à Rede Globo a maior parte das notícias da sua área de cobertura para a programação nacional. Sendo assim, essas representações não só se reproduzem nas regiões das praças e no estado, como nacionalmente e, muitas vezes, até internacionalmente, porque a Rede Globo mantém canais internacionais (Globo Internacional) nos quais se reproduz a programação veiculada no Brasil com algumas pequenas inserções produzidas no exterior. A RBS é considerada uma das afiliadas de maior sucesso da Rede Globo. A parceria entre as emissoras se deu nos anos 70, período também de formação da RBS como rede no Rio Grande do Sul, partindo de jornais e rádios que já possuía, incorporando a televisão. De forma semelhante à Globo, seu bom desempenho em termos de crescimento ao longo das décadas e hegemonia no Rio Grande do Sul (bem como em Santa Catarina), se deve principalmente pela valorização de um padrão de qualidade técnica da programação, com investimento nas novas tecnologias e a contínua ênfase na programação regional, que inclui em seus limites geográficos os traços culturais e o tamanho de cada mercado das regiões de Santa Catariana e Rio Grande do Sul. A programação da RBS TV é composta basicamente por telejornais locais, por programas esportivos, programas de variedade e um crescente espaço para a ficção. 9
A Rede Brasil Sul de Comunicações – RBS - é o grupo que possui a afiliada responsável por retransmitir o sinal da Rede Globo nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, a RBS TV. Atualmente, é o maior conglomerado regional do Brasil e um dos maiores nacionais. Integram a RBS, nos dois estados, sete jornais diários, 24 estações de rádio AM e FM, três portais de internet, dezoito emissoras de televisão afiliadas, duas emissoras de TV locais denominadas comunitárias e um canal nacional voltado para o agronegócio. Outros empreendimentos do grupo incluem gravadora de discos, empresa de distribuição, produtora de vídeo, assessoria em marketing para jovens e organização de eventos, além de uma fundação para ações de responsabilidade social. Apesar de trocarem programação e pertencerem ao mesmo grupo, a RBS TV do Rio Grande do Sul e a de Santa Catarina estabelecem uma rede própria em cada estado, sendo a sede de cada uma localizada, respectivamente, em Porto Alegre e em Floriapópolis. (REDE BRASIL SUL DE COMUNICAÇÃO, 2012)
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As praças são: RBS TV Caxias do Sul, RBS TV Passo Fundo, RBS TV Erechim, RBS TV Cruz Alta, RBS TV Santa Rosa, RBS TV Uruguaiana, RBS TV Bagé, RBS TV Santa Maria, RBS TV Santa Cruz do Sul, RBS TV Pelotas, RBS TV Rio Grande. As informações vêm do site http://comercial.redeglobo.com.br/atlas2004/index.php. Revista Jovens Pesquisadores, Santa Cruz do Sul, n. 1, p. 122-133, 2012
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A RBS TV é a emissora líder em horas de produção entre todas as afiliadas da Globo. No caso da RBS no Rio Grande do Sul, a empresa possui, em Porto Alegre, um núcleo de jornalistas responsáveis por gerenciar esta negociação com a Rede Globo diariamente. E essa negociação acontece inclusive com a equipe do Jornal Nacional. Ou seja, quem conduz a produção das notícias sobre as regiões do Rio Grande do Sul que irão para a cadeia nacional é um núcleo da RBS dedicado especialmente à produção para os telejornais da Rede Globo, localizado em Porto Alegre, na cabeça da rede da RBS TV, chamado Núcleo Globo. Esse núcleo, por sua vez, se vale da rede de emissoras que a RBS mantém no Rio Grande do Sul para “colher” pautas e notícias e reportagens finalizadas para a TV Globo. E essas afiliadas são também responsáveis por retransmitir a programação da Rede Globo na maior parte das vinte quatro horas do dia, recebendo, em troca, um tempo para veicular programação própria na área de veiculação do seu sinal. Vê-se que esse sistema de afiliamento permite à emissora cabeça de rede, no caso da Rede Globo um controle de programação e, em última instância também territorial como diz Rosario (2008). A tecnologia serve à delimitação de circunscrição de poder, neste caso a serviço das demandas do mercado. Para a autora, a psicosfera traz a idéia de um Brasil oficial, através da criação de uma identidade nacional, mesmo em confronto com o Brasil real, neste caso plural, diverso, multifacetado. Por isso, a integração nacional é antes de tudo a integração de mercados que gerando uma reprodução de hábitos, costumes e valores do eixo Rio-São Paulo para o restante do país através da programação nacional. A constituição da idéia de unidade rigidamente controlada pelo Padrão Globo de Qualidade que requer a atuação em rede se dá na relação entre a cabeça de rede e as afiliadas por meio de ações continuamente reforçadas entre ambas. Segundo Pachler (2006) ainda que as emissoras afiliadas não operem a partir de um manual, essa formatação padronizada às matérias que contribui para a redução das diferenças e multiculturalidades das notícias regionais, neste caso, oriundas do Rio Grande do Sul seguem alguns movimentos. Além do Núcleo Globo que opera na RBS TV, conforme já descrito, e que tem tanto a responsabilidade de oferecer material à cabeça de rede, quanto receber e operacionalizar as demandas aqui no estado, a Rede Globo está autorizada contratualmente, a escolher, em comum acordo com a afiliada, o gerente de jornalismo da emissora. Para a autora, isso garante que esteja no cargo um profissional em total sintonia com o Padrão Globo, evitando o desrespeito aos itens acordados no aditivo de programação, ao fim, à linha editorial. Ainda, três outros momentos estabelecidos, o Encontro das Praças, o Uniglobo Virtual e as reuniões de caixa, amarram a relação de padronização da forma e dos conteúdos. O primeiro é uma integração entre profissionais da cabeça de rede e das afiliadas; o segundo, treinamentos para os funcionários feitos pela Globo sobre reportagem, edição de texto e imagem, entre outros; e o terceiro, reuniões diárias à distância com ofertas e demandas de pauta Além disso, Pachler (2006) lembra oportunamente que os próprios repórteres sentemse estimulados a fazer a notícia se enquadrar no formato padrão, uma vez que é meta aparecer na rede e especialmente no Jornal Nacional. O profissional internaliza a linha editorial, naturalizando as práticas produtivas e editoriais, inclusive com vistas a sua manutenção e ascensão dentro do grupo de comunicação. Como a tarefa não é fácil, porque é fruto de uma disputa de oferta das 121 emissoras afiliadas, nessa corrida, todo esforço é válido para tornar-se um repórter rede que tem além do prestígio, o salário mais que duplicado. E no mesmo sentido, as emissoras afiliadas não vêem o Padrão Global como uma
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demanda sacrificiosa e, sim, a crença de que ao se pautarem por estas orientações estão fazendo o jornalismo da melhor maneira e com garantia de qualidade. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A prática jornalística, em função da organização das rotinas produtivas, dos negócios de mídia e dos gêneros, limita as possibilidades de representação dos territórios e das populações. O Jornal Nacional se debate diariamente entre a tentativa de “noticiar” um todo sobre o Brasil (e o mundo, pois tem espaço para notícias internacionais) em seus 35 minutos diários de programação. Ao escolher determinados acontecimentos para eleger como notícia e certos ângulos de tratamento desses, constrói sentidos e identidades sobre o Brasil e suas partes. Nesse cenário, o Rio Grande do Sul ocupa condição periférica do ponto de vista infraestrutural, tanto do aspecto geopolítico, quanto na geografia da mídia nacional, o que implica num menor conhecimento sobre a realidade do estado por parte da produção do Jornal Nacional. Por outro lado, tem a maior afiliada da Tv Globo, a RBS TV, que como emissora e pertencente a um dos maiores grupos de comunicação regional do país, de certa forma, faz um contraponto nesse jogo de forças desigual. Ao se organizar num grupo forte, a RBS tem condições de disputar nessa arena espaços para sua produção, muito embora tenha que se sujeitar a certas regras, como os padrões e formatos de produção e à linha editorial ditada pela Tv Globo. Nesse embate, a tendência é que a RBS Tv, muito provavelmente, busque no material enviado à cabeça de rede corresponder às expectativas editoriais dessa de modo a conquistar mais espaços na grade do Jornal Nacional, bem como de outros telejornais. Desta forma, percebe-se que as conseqüências que essa ‘geografia’ ocasiona em termos de construção de identidade sobre o Rio Grande do Sul ou qualquer outro estado ou região fora do eixo de concentração nacional da mídia tendem às construções consensuais, geralmente recheadas de estereótipos e folclorizações. E que essas, por sua vez, em última análise, atuam nos imaginários das coletividades – tanto no espaço regional, como no nacional – constituindo-se, muitas vezes, em resistências e entraves ao processo de desenvolvimento e emancipação dessas comunidades. REFERÊNCIAS ATLAS DE COBERTURA. Disponível em: <http://comercial.redeglobo.com.br/atlas2004/ index.php>. Acesso em 06/01/2011. BECKER, Beatriz. A linguagem do telejornal. Rio de Janeiro: E-papers, 2004. BOLÃNO, Cesar. Mercado Brasileiro de Televisão. São Paulo: Aracaju, 2004. BONNER, Wiliam. Jornal Nacional: modo de fazer. Rio de Janeiro: Globo, 2009. BORELLI, Silvia H. S.; PRIOLLI, Gabriel (Org.). A Deusa ferida: por que a Rede Globo não é mais a campeã absoluta de audiência. São Paulo: Summus, 2000.
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