Carta aos Prefeitos Eleitos

CARTA AOS PREFEITOS

Senhores Prefeitos,

Os prefeitos eleitos para o exercício de 2013 a 2016, e seus respectivos secretários de transporte e trânsito, estarão governando tendo como referência um país com uma política econômica estável e grandes investimentos em infraestrutura. O Governo Federal, por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por exemplo, está disponibilizando recursos para as cidades brasileiras para a infraestrutura da mobilidade urbana e para habitação, dentre outros.

Mantida a tendência do crescimento urbano, dentro de 20 anos 90% dos habitantes do país estarão concentrados nas cidades, que ganharão mais 40 milhões de habitantes que terão que morar, trabalhar, estudar e se locomover.

Mantidas as condições econômicas, o crédito facilitado e a distribuição de renda em ascensão, no mesmo período as cidades brasileiras contarão com uma frota de 120 milhões de automóveis, contra os 70 milhões atuais.

A cidade é onde as pessoas vivem e buscam soluções para suas necessidades básicas, como trabalho, saúde, educação, lazer, dentre inúmeras outras. Recai sobre o governo local grande parte da responsabilidade pela qualidade de vida da sua população e o acesso universal à cidade é um dos seus atributos. Daí que não se pode mais permitir que a cidade cresça de forma desordenada e que recursos públicos em infraestrutura pública sejam destinados apenas para parte de sua população.

Em 3 de janeiro de 2012, foi publicada a Lei 12.587, que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana e que ganhou vigência a partir de 13 de abril do mesmo ano. Ali se encontram os princípios, as diretrizes e os objetivos da mobilidade urbana, que devem ser os novos paradigmas para o prefeito e sua equipe, dentre os quais destacam-se:

Rua Marconi, 34 – 2º andar – Conjs. 21 e 22 CEP 01047-000 São Paulo - SP – Brasil Tel. (11) 3371-2299 Fax (11) 3253-8095 E.mail: antpsp@antp.org.br - Home page: www.antp.org.br

• Acessibilidade universal; • Desenvolvimento sustentável nas dimensões socioeconômicas e ambientais; • Equidade no acesso dos cidadãos ao transporte público coletivo; • Eficiência, eficácia e efetividade dos serviços de transporte urbano e da circulação urbana; • Gestão democrática e controle social local da Política de Mobilidade Urbana; • Segurança nos deslocamentos das pessoas; • Justa distribuição dos benefícios e ônus no uso de diferentes modos e serviços; • Equidade no uso do espaço público de circulação, vias e logradouros.

A lei de mobilidade urbana é uma conquista da sociedade brasileira e vem sendo construída e debatida há pelo menos 30 anos pela ANTP. Nossa entidade é parte desta história, estando, desde sua origem, ao lado daqueles que lutaram pela elaboração e publicação da lei.

A situação atual das cidades brasileiras, mantida a escolha do veículo particular (automóvel) como base dos seus deslocamentos, levará as cidades a médio e longo prazos (e em algumas a curto prazo) ao colapso. Para dar vazão a este tipo de política de transporte, vultosos recursos públicos foram aplicados na expansão da malha viária e dos sistemas de gestão de trânsito ao longo da história. Até para quem não é especialista no assunto, é notória a impossibilidade de resolver os problemas do congestionamento em face da escassez de espaço viário. Diga-se que tais projetos urbanos foram financiados pelo orçamento público, do qual todos contribuíram, mas que poucos usufruem com a mesma intensidade. Para transportar, por exemplo, o mesmo número de pessoas por hora/sentido que um sistema de ônibus estruturador em faixa exclusiva são necessárias pelo menos seis faixas de tráfego para os automóveis.

Não se trata de demonizar o automóvel. Como todos sabemos, a sua cadeia produtiva gera empregos, impostos e dinamiza a economia. Entre adquirir o automóvel, um desejo que todos têm o direito de possuir, e usa-lo de forma a prejudicar o conjunto da coletividade, é um traço cultural que toda sociedade deve buscar modificar. Se é desejável e importante para o país desenvolver sua indústria automobilística, e com isso esquentar a economia, também é desejável que sejam construídas formas de permitir à maioria da população se deslocar em condições de conforto e segurança sem a necessidade do uso do automóvel no dia a dia.

Rua Marconi, 34 – 2º andar – Conjs. 21 e 22 CEP 01047-000 São Paulo - SP – Brasil Tel. (11) 3371-2299 Fax (11) 3253-8095 E.mail: antpsp@antp.org.br - Home page: www.antp.org.br

Estudo realizado pela ANTP e o IPEA, em 1998, indicou que a tarifa do transporte coletivo em São Paulo poderia ser reduzida em 16% e, consequentemente, gerar economia para usuários do sistema, se a velocidade média dos ônibus fosse elevada em razão da redução de congestionamento, o que só poderia ocorrer se os coletivos tivessem prioridade de circulação na via.

Em outro estudo realizado pela ANTP e o IPEA, os desperdícios decorrentes de congestionamentos, sem considerar aqueles relativos à saúde da população devidos à poluição ambiental, chegam a dezenas de bilhões de reais.

Da mesma forma poderíamos falar do desenvolvimento urbano desordenado, que cria deslocamentos absurdos da população quando distribui (ou incentiva a distribuição) de moradias e postos de trabalho separados por grandes distâncias, elevando o “custo da cidade” e reduzindo sua competitividade. É preciso estar atento ao processo de urbanização e construção nas cidades, de maneira que estejam alinhados com as diretrizes de um plano diretor.

Com relação à habitação popular, o papel do município é preponderante para evitar (ou não estimular) a instalação desses grandes conjuntos habitacionais em regiões periféricas da cidade, pois que exigirão, em seguida, atendimentos precários de vários bens públicos, em especial de transporte para a comunidade local, cujo ônus recairá sobre a gestão municipal e sua população.

A implementação da lei de mobilidade requer mudança de mentalidade, exigindo que as decisões locais se espelhem nos princípios, diretrizes e objetivos da lei, em todas as suas dimensões. É muito provável que em muitos municípios ocorrerão processos licitatórios para transporte coletivo ou mesmo para outros modais de maior capacidade de transporte. A lei é clara e estabelece marcos e referenciais regulatórios importantes para se garantir o acesso universal ao sistema, a modicidade da tarifa, metas de qualidade e informações aos usuários. Itens básicos dos serviços como itinerários, pontos de transferência intermodal, regularidade, pontualidade, tempos de espera e de viagem, conforto, funcionários treinados e outros atributos são condições mínimas indispensáveis e perfeitamente ao alcance da administração local.

A transparência em todos os aspectos, a começar pelo processo licitatório, definição da rede de serviços, metas de qualidade, planilha tarifária e compartilhamento e equidade no uso do espaço viário, é exigência da lei de mobilidade urbana, cabendo ao município criar as condições para que isso ocorra. Veja-se a obrigatoriedade de criação dos conselhos municipais de mobilidade e a realização de audiências públicas.

Pesquisa Origem e Destino elaborada na Região Metropolitana de São Paulo constatou que um terço das viagens são realizadas a pé, um terço por transporte público e um terço por transporte individual. Não se pode mais admitir que os pedestres não tenham calçadas dignas e travessias seguras e

Rua Marconi, 34 – 2º andar – Conjs. 21 e 22 CEP 01047-000 São Paulo - SP – Brasil Tel. (11) 3371-2299 Fax (11) 3253-8095 E.mail: antpsp@antp.org.br - Home page: www.antp.org.br

que a via não seja compartilhada com a circulação de bicicletas e ônibus, princípios basilares da Lei de Mobilidade, e nem deixar de considerar que o Código de Trânsito Brasileiro inclui na definição de via, as calçadas, a pista de rolamento e os canteiros centrais, ou seja, que a via, para efeito da gestão do trânsito, vai de fachada a fachada dos seus lotes lindeiros.

Ressalta-se, também, que governos estaduais e municipais não podem deixar de considerar nos seus planejamentos as viagens intermunicipais e os seus respectivos sistemas de transporte e que estes também devem atender as premissas dos planos diretores municipais.

Com relação à violência no trânsito, não vamos esquecer que o Brasil foi signatário da resolução da ONU que lançou, em maio de 2011, a campanha da Década de Segurança Viária, propondo uma meta de redução de 50% no número de mortes no período de 2011 a 2020. Infelizmente, ao contrário de muitos países, as mortes no trânsito vêm aumentando no Brasil e, em 2011, alcançamos o patamar de quase 43 mil mortes e 400 mil feridos, a um custo de R$30 bilhões a preços de 2006, segundo estudo realizado pela ANTP e o IPEA. A segurança viária é expressamente definida no primeiro artigo do CTB – “a segurança do trânsito é um direto de todos e um dever dos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito”. A ANTP participou ativamente ao lado de outras instituições na elaboração de um plano nacional de redução de mortes no trânsito para o país. No documento elaborado e consolidado, encontra-se o conjunto de ações para a gestão, infraestrutura viária, fiscalização, educação e saúde e que deve servir de diretriz para todos os governantes.

Naturalmente que para empreender melhorias serão necessários recursos e investimentos, que já estão sendo aplicados ou previstos nos orçamentos municipais, bastando que sejam revistos e analisados à luz da Lei de Mobilidade e do Código de Trânsito Brasileiro.

Para a mobilidade urbana concorre um conjunto de atividades distribuídas em várias pastas da administração municipal, além de setores da iniciativa privada.

A sua implementação, portanto, vai requerer uma organização local que considere estes atores, de maneira a se estabelecer a coerência das ações e a convergência nos objetivos dos planos setoriais, além de uma coordenação geral e a indispensável liderança do prefeito.

Vale lembrar que com a promulgação em 2005 da Lei 11.107, que dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios passaram a ter um instrumento com segurança jurídica para realizarem suas cooperações visando o enfrentamento de problemas comuns que exigem articulação e união dos atores para a sua solução. A cooperação entre os entes federados, por meio dos Consórcios

Rua Marconi, 34 – 2º andar – Conjs. 21 e 22 CEP 01047-000 São Paulo - SP – Brasil Tel. (11) 3371-2299 Fax (11) 3253-8095 E.mail: antpsp@antp.org.br - Home page: www.antp.org.br

Públicos, é de relevância estratégica, oportunizando alternativas práticas e efetivas para o encaminhamento de muitas questões que não podem ser equacionadas e resolvidas em uma única esfera da federação.

A ANTP tem atuado nestes 35 anos de existência pautada na defesa do transporte coletivo, da cidade sustentável, dos modos não motorizados e da redução de mortes no trânsito. O Congresso Brasileiro de Transporte e Trânsito, evento que realiza a cada dois anos, a Revista dos Transportes Públicos, que vem sendo editada desde 1978, o Sistema de Informações da Mobilidade e inúmeras outras ações compõem sua forma de atuação desde sua criação. Tendo ao seu lado uma grande família de associados e colaboradores, a ANTP contribuiu, nesses anos todos, para propor e conquistar importantes políticas públicas, e registrar e disseminar conhecimento através do seu acervo técnico de primeira qualidade que contempla milhares de documentos.

Aos prefeitos e secretários de transporte e trânsito que ora encerram os seus mandatos, nos congratulamos com aqueles que pautaram suas ações na luta em prol da melhoria da qualidade da vida urbana, desejando que continuem atuando a favor desses valores em suas novas atribuições.

Aos prefeitos e secretários de transporte e trânsito que assumirão os novos mandatos em 1º de janeiro de 2013, desejamos que mais do que cumprir, que adotem a Política Nacional de Mobilidade Urbana e o Código de Trânsito Brasileiro como fonte de inspiração diária na condução da cidade. A todos, colocamos a história e as bandeiras de luta da ANTP à disposição.

Finalmente, conclamamos os secretários que participarão das novas gestões municipais que continuem prestigiando o Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes de Transporte e Trânsito, como vem ocorrendo nas 79 edições desses últimos 20 anos.

São Paulo, 19 de novembro de 2012.

Ailton Brasiliense Pires

Luiz Carlos Mantovani Néspoli

Presidente

Superintendente

Rua Marconi, 34 – 2º andar – Conjs. 21 e 22 CEP 01047-000 São Paulo - SP – Brasil Tel. (11) 3371-2299 Fax (11) 3253-8095 E.mail: antpsp@antp.org.br - Home page: www.antp.org.br