NÚMERO 5
Miolo 5.indd 1
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
1
16/7/2006 07:34:47
2
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 2
NÚMERO 5
16/7/2006 07:34:52
editorial
¡
REVISTA MOVIMENTO, mobilidade & cidadania junho de 2006 – número 5 Associação Nacional de Transportes Públicos Alameda Santos, 1000 – 7o andar CEP: 01418-100 www.antp.org.br rev_movimento@antp.org.br Presidente Rogerio Belda Vice-Presidentes César Cavalcanti de Oliveira Cláudio de Senna Frederico José Antônio Fernandes Martins Jurandir F. R. Fernandes Luiz Antônio Queiroz Luiz Carlos Freyze David Ricardo Mendanha Ladeira Otávio Vieira da Cunha Filho Superintendente Marcos Pimentel Bicalho COORDENAÇÃO Cristina Baddini Lucas Secretaria Executiva Cláudia Montero
Em setembro de 2004, a ANTP lançou a revista Movimento – Mobilidade & Cidadania para ser mais um instrumento de disseminação do conceito da mobilidade urbana, fundado no transporte coletivo e nos meios de transporte não motorizados, uma condição essencial para a construção de cidades com qualidade de vida, ambientalmente sustentáveis e com eqüidade na sua apropriação por todas as pessoas. Após suas quatro primeiras edições, Movimento passou por um processo de reavaliação e inicia agora uma nova fase. Seu projeto inicial foi reafirmado e um Conselho Editorial foi montado para orientar permanentemente os seus rumos e avaliar os seus resultados. Nesta quinta edição, os problemas do transporte individual voltam à pauta com os helicópteros, presentes cada vez mais nos céus das grandes cidades brasileiras e reforçando o paradoxo da excelência para poucos em detrimento da exclusão de muitos; voltam também com as mudanças nos padrões da construção habitacional de média e alta renda para ceder mais espaço para os automóveis.
REDAÇÃO Editor Alexandre Asquini (MTb 28.624) Repórteres e colaboradores desta edição: Francisco Ângelo, Helena Fonseca, Luiz Henriques Neto, Marilita Gnecco de Camargo Braga (engenheira), Miguel de Oliveira e Rudel Trindade Júnior (engenheiro) Revisão Solange A. Visconte Letras & Números Traduções (11)4534-0273 ARTE Projeto de Arte Ampersand Comunicação Gráfica (ampersand@ampersdesign.com.br) Editor de Arte Leandro Gusmão Siman (leandro.siman@ig.com.br ou leandro.siman@bol.com]
Na outra ponta, o Seminário de Transporte Metroferroviário, realizado pela ANTP no Rio de Janeiro, em abril, trouxe à baila a discussão das dificuldades para a ampliação deste meio de transporte coletivo de alta capacidade, que é considerado por muitos como a melhor solução para transportar grandes quantidades de passageiros. Este é o tema da reportagem de capa desta edição. Outro assunto relevante é a luta em defesa do vale-transporte, na qual a ANTP se engajou decididamente, junto com outras entidades, e conseguiu mais uma vitória no sentido de fortalecer os sistemas de transporte público no País. No que diz respeito ao trânsito, merece destaque a matéria sobre a nova legislação que entrou em vigor em fevereiro, que aumenta o rigor da fiscalização contra os condutores que dirigem sob efeito do álcool e discute a sua influência na quantidade relativa e na gravidade dos acidentes de trânsito.
DEPARTAMENTO COMERCIAL Cláudia Montero (11)33712299/ (11)76754637 claudia_antp@hotmail.com GRÁFICA Formacerta (formacerta@formacerta.com.br) TIRAGEM 10.000 exemplares A revista Movimento, Mobilidade & Cidadania é uma publicação da Associação Nacional de Transportes Públicos – ANTP. Os artigos e matérias assinados são de responsabilidade de seus autores. Todos os direitos reservados.
Outros temas de igual importância completam a pauta deste número da revista, que, a cada edição, se consolida como uma peça importante na estrutura de comunicação e informação da ANTP; mais leve e, por isso mesmo, com grande potencial de penetração junto a públicos não usualmente freqüentadores dos espaços tradicionais da Associação.
Marcos Bicalho Superintendente da ANTP
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 3
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
3
16/7/2006 07:34:55
movimento MOBILIDADE & CIDADANIA
Foto de capa: Tony Escalante
6
mobilidade
Uma frota crescente, ruídos e o risco real de acidentes podem estar transformando os helicópteros num problema para a maior cidade do País
s & y
Implantação de metrôs
financiamento
10
Entre 2002 e 2005, a Cide-Combustíveis arrecadou cerca de R$31,5 bilhões; porém, menos de 1% chegou ao setor de transporte público urbano cidades
14
Proliferam os condomínios residenciais com duas ou mais vagas de estacionamento por unidade, tornando esses empreendimentos potenciais pólos geradores de tráfego entrevista
18
A publicitária e jornalista Cynthia Bertholini Santos e o economista Florindo Katsuhisa Enoki falam sobre estudo em que discutem aspectos da publicidade apresentada no Brasil para vender automóveis
Falta de investimentos contínuos detém o ritmo de expansão, mantendo a malha de metrôs abaixo das necessidades observadas nos maiores centros urbanos brasileiros
caminha lentamente no País
idéia
22 32
Os pesquisadores Rudel Trindade Júnior e Marilita Gnecco de Camargo Braga,
L
da Coppe/UFRJ, analisam os acidentes de trânsito nos sites dos Detrans
Y 2 % T à
exclusão
36
Nos primeiros meses de 2006, nada menos que quatro propostas legislativas para transformar o pagamento do vale-transporte em dinheiro crônica
40
A melhor maneira de chegar às maravilhosas paisagens do Rio de Janeiro ambiente urbano
42
Aos quinze anos, a Rua 24 Horas, de Curitiba, encontra sua própria vocação como proposta de encontro e convivência no centro de uma grande cidade mão dupla
54
Dirigentes de trânsito de duas cidades que já regulamentaram o moto-táxi opinam sobre se as motos servem mesmo como veículo de transporte público legislação
56
Lei possibilita maior rigor contra motoristas de dirigem sob efeito do álcool atlas
60
Londres aposenta os velhos Routmasters e investe na reorganização do sistema de transporte por ônibus arquivo
62
Um sistema de bonde com veículos recuperados é instrumento para revitalização do centro da cidade de Santos
4
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 4
NÚMERO 5
16/7/2006 07:34:59
portal da antp
¤
Em seis meses, duas vezes
e meia mais audiência Em junho, completam-se seis meses do início de operação do novo Portal da ANTP. Em maio de 2006, houve 34 mil consultas, contra as 14 mil registradas no primeiro mês de funcionamento do sistema, que, mês a mês, ganha melhorias. esde o lançamento oficial do Portal da ANTP, no início de dezembro de 2005, sua audiência vem aumentando a uma taxa 20% ao mês, ou seja, em maio de 2006, o número de visitas foi quase duas vezes e meia maior do que o registrado no último mês do ano passado. Em maio de 2006, houve média diária de 1.200 visitas à página principal do portal, somando cerca de 34.000 no mês e um total de 6 giga bytes de transferência. O recorde está no registro de 3.600 visitas em um dia. O total de acessos em dezembro de 2005, primeiro mês do portal, foi de aproximadamente 14.000 visitas.
D
“As áreas de notícias – incluindo o noticiário gerado pela própria ANTP e o clipping de notícias recolhidas da mídia externa – são, certamente, as principais responsáveis pelo aumento das consultas, seguidas de perto pela consultas ao conteúdo técnico da ANTP”, afirma o engenheiro Carlos Alberto Alqueres, que foi o consultor responsável pela implantação do portal e pelo desenvolvimento das soluções que, paulatinamente, vêm sendo implementadas nesse sistema. Ele antecipa que as áreas de notícias contarão com eficientes sistemas para a recuperação de artigos anteriores e a busca de informações específicas.
Avanços Alqueres explica que a decisão inicial foi de implantar o portal sobre uma plataforma tecnológica bastante atualizada, que suporta uma base de dados, na qual, por sua vez, vem sendo armazenado um conjunto informações do interesse de técnicos, especialistas e pesquisadores do setor. “As necessidades internas da ANTP nos têm feito implementar melhorias consecutivas na parte do portal destinada à divulgação de eventos da Entidade”, diz, acrescentando que a estrutura de dados em implementação tornará esta área o caminho natural para cadastro, pesquisa e busca de trabalhos apresentados nos congressos, seminários, encontros, entre outras promoções da ANTP. “Estamos confiantes de que isto determinará o aumento do interesse do visitante em explorar o conteúdo disponível, o que, por sua vez, propiciará o incremento da audiência”. Os sistemas de divulgação de eventos consomem informações diretamente das tabelas do cadastro da ANTP – apresentação de patrocinadores ou apoiadores de eventos, por exemplo –, resultando em um sistema com informações relacionadas e com atualização constante. Ainda segundo o engenheiro, o cadastro das empresas associadas da ANTP está completo e, agora, contém os logos das empresas e também descrições sobre suas atividades e mercados. Já a partir deste ano, o controle e acompanhamento de pagamentos das anuidades vêm sendo feitos por meio da Internet, com utilização de ferramentas provenientes do novo portal. “Estamos fazendo evoluir agora o cadastro de pessoas físicas, que, é claro, estará bastante acoplado com os demais – eventos, empresas, trabalhos técnicos, comissões e grupos técnicos da ANTP”. Dessa forma, as informações divulgadas no portal são uma combinação dos dados registrados em cada um destes cadastros, e como existirão processos independentes de alimentação de cada um deles, teremos um sistema cujo conteúdo estará sendo permanentemente gerado de forma distribuída.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 5
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
5
16/7/2006 07:34:59
mobilidade
Os helicópteros já são um problema? P O R HELENA FONSECA
Ágeis e versáteis, mas também
Á
ruidosos, os helicópteros são instrumentos imprescindíveis para certas atividades públicas
nos grandes centros urbanos, sobretudo, em ações como policiamento, atendimento médico e outras emergências. Porém, definitivamente, estão longe de constituir uma solução para a mobilidade urbana em cidades estranguladas por crescentes congestionamentos, que, por ABLESTOCK
sua vez, interferem na eficiência do transporte
6
público de superfície - este, sim, destinado a milhões.
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 6
NÚMERO 5
16/7/2006 07:35:10
Na verdade, a finalidade principal do uso de
Apenas neste ano, já ocorreram, em todo o
helicópteros, pelo menos na maior cidade do
Brasil, 11 acidentes com esse tipo de aeronave,
País, tem sido preservar da barafunda urbana
sendo três no Estado de São Paulo.
executivos e funcionários de empresas públicas
A Agência Nacional de Aviação Civil con-
e privadas, num esforço dispendioso mas, por
sidera ainda pequeno o número absoluto de
enquanto, razoavelmente eficaz, de recuperar
acidentes com helicópteros, mas a quantidade
nos céus a competitividade há muito perdida
dessas ocorrências até o início de maio de 2006
nos deslocamentos pelo solo.
já se aproxima do número total de 2005, quan-
Mas há uma questão: esta saída é para
do foram observados 15 acidentes.
poucos. Não só por conta do custo que ela
Um dos mais recentes acidentes aconteceu
envolve, mas também porque os ares, assim
no mês de abril, envolvendo uma aeronave que
com as vias urbanas, também estão sujeitos a
se preparava para fazer inspeção numa linha
‘congestionamentos’. E, além disso, os últimos
de transmissão no tradicional e bem povoado
acontecimentos lembram que os helicópteros
bairro da Lapa, na Zona Oeste da cidade.
também podem cair.
Com o aparelho em pane, o piloto buscou um local seguro para pousar de imediato, mas teve que evitar uma quadra esportiva escolar, repleta de crianças. Sobre ruas do bairro, a
no País, dos quais, 23 no Estado de São Paulo.
aeronave perdeu altitude, bateu a hélice no
TONY ESCALANTE
Acidentes. De 2001 até maio de 2006, aconteceram 65 acidentes com helicópteros
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 7
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
7
16/7/2006 07:35:28
mobilidade
fio de alta tensão, explodiu e incendiou-se,
atitudes das autoridades no sentido de reduzir
ocasionando a morte de três pessoas.
alguns problemas em áreas próximas às prin-
O helicóptero sempre foi visto como um símbolo de poder econômico. Até pouco tempo
cipais rotas desse tipo de aeronave. Já houve casos de interdição de helipontos.
atrás, era meio de transporte acessível a um
Uma das queixas mais freqüentes é o exces-
limitado número de pessoas de altíssimo poder
sivo ruído dos aparelhos ao pousar e decolar nos
aquisitivo e autoridades públicas de alto esca-
helipontos situados em edifícios, o que supera o
lão, além de profissionais que prestam serviços
volume máximo aceitável, de 75 decibéis. Além
emergenciais oficiais.
disso, moradores de apartamentos localizados
Com os crescentes congestionamentos em
nas proximidades dos helipontos freqüentemen-
ruas e avenidas, viajar pelo solo paulistano se
te se assustam com as conseqüências do forte
tornou uma tarefa demorada e sujeita a toda
deslocamento de ar quando da aproximação das
sorte de intercorrências. Assim, em que pese
aeronaves.
o custo, locomover-se de helicóptero passou a
Para amenizar em parte esses problemas e
ser uma alternativa para mais e mais pessoas
“dissuadir moradores de promover restrições”, a
e organizações que podem pagar e não têm
Associação dos Pilotos de Helicópteros do Estado
tempo a perder.
de São Paulo (Aphesp) mantém um Programa
O Brasil já conta com 997 helicópteros, a se-
de Redução de Ruídos, dentro do qual sugeriu
gunda maior frota do mundo. No Estado de São
alterações nas regras de condução das aeronaves,
Paulo, está quase a metade desse contingente:
aceitas pelo Serviço Regional de Proteção ao Vôo
456 aparelhos, dos quais, cerca de 350 costu-
de São Paulo, órgão ligado à Aeronáutica.
mam trafegar pelo espaço aéreo da capital.
Agora, ao sobrevoarem a cidade de São
A finalidade principal do uso dessas ae-
Paulo, as aeronaves devem ficar a 150 metros
ronaves ainda é o translado de executivos e
do chão (altitude equivalente a um edifício de
funcionários de empresas públicas e priva-
50 andares), significando de 30 a 60 metros
das, mas diversas outras atividades também
acima do parâmetro anteriormente vigente.
são contempladas, como táxi aéreo, malote
Essa altitude visa diminuir em parte os ruídos
postal, policial, agrícola, serviços médicos,
que incomodam a população dos bairros situ-
reportagens, fotografias aéreas, fiscalização de
ados na rota dos helicópteros. A altitude de
linhas de transmissão, vôos de instrução, entre
circulação só não é maior para impedir que seja
outras. A Eletropaulo, por exemplo, tem 1700
invadido o espaço de passagem dos aviões.
quilômetros de linhas de transmissão e realiza
A Aphesp assinala que altitude e distância
75 vôos anualmente para inspecioná-las - o que
horizontal são mesmo a melhor maneira para
significa 146 horas de vôo por ano.
reduzir os ruídos provocados pelas aeronaves. Mas sugere outras técnicas de vôo para mini-
Congestionamento nos céus? Já virou rotina para o paulistano ver e ouvir tantos
8
seguro e conveniente.
helicópteros. Os vôos são tão numerosos e
Uma recomendação é o emprego de movi-
alguns incômodos são tão perceptíveis, que já
mentos de controle graduais e suaves. Assina-
provocam a reação de uma parcela da popula-
lando que o ruído será sempre maior direta-
ção. Entidades de moradores têm reivindicado
mente abaixo do helicóptero do que nas laterais
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 8
mizar ruídos, a serem empregadas quando for
NÚMERO 5
16/7/2006 07:35:28
da rota de vôo, a entidade diz aos comandantes
tempo de percurso de uma viagem do bairro de
para evitarem o sobrevôo de edifícios sensíveis
Moema para a Avenida Paulista poderá ser até
a ruídos e, também, para evitarem passar sobre
duplicado, de 12 minutos para 25 minutos”.
pontos em que haja aglomerações, como partidas de futebol ou shows ao ar livre.
Helipontos. Se a frota de helicópteros cresce,
Frisando que o barulho repetitivo “é muito
aumenta também a quantidade de locais para pou-
mais irritante do que uma única ocorrência”, a
so e decolagem. O número de helipontos homo-
entidade orienta os pilotos que sobrevoam cos-
logados pela Aeronáutica passou de 109 pontos,
tumeiramente determinada área para que alterem
em abril de 2001, para 182, em maio de 2004.
a rota com alguma freqüência, evitando passar
Hoje, são 210 pontos, a maioria concentrada no
sempre por cima dos mesmos prédios.
quadrilátero de maior movimento, compreendido
Para o coronel aviador Paullo Esteves, asses-
pelo estádio do Morumbi, Avenida Paulista, ponte
sor de Comunicação Social do Departamento de
do Jaguaré e aeroporto de Congonhas.
Controle do Espaço Aéreo (Decea), acidentes com
De acordo com a Secretaria de Planejamento
aeronaves, incluindo helicópteros, são um risco
da Prefeitura de São Paulo, somente 38% dos
sempre presente, sobretudo, porque máquinas e
pontos de pouso estão licenciados para funcionar.
pessoas podem falhar. Mas ele assinala que nunca
Para instalar um heliponto, é necessário o aval da
houve uma colisão entre aeronaves, justamente
Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), que
porque o adequado controle do espaço aéreo
impõe normas de segurança de operações de vôo,
reserva caminhos específicos para cada aparelho:
e a licença da prefeitura. A Secretaria coordena
“Para imaginar como funciona o controle do trá-
uma equipe com integrantes de outras secretarias
fego aéreo, pense no céu como um espaço vertical
para estudar um projeto de lei e apresentá-lo à
fatiado em várias camadas, correspondentes às
Câmara, criando uma legislação específica para os
rotas traçadas para uso dos helicópteros, sem
helipontos, na tentativa de reduzir ao máximo o
colidir com o espaço de circulação dos aviões”.
incômodo à população.
Ele acrescenta que o sistema “oferece aos pilotos informações seguras e confiáveis, permitindo as melhores rotas, otimizando o fluxo do tráfego e facilitando as operações de decolagem, subida, vôo em rota, descida e pouso”. Atualmente, o piloto de helicóptero é obrigado a manter contato com um operador no aeroporto de Congonhas. O coronel afirma que, para o fenômeno do aumento da frota, a única solução é ‘fatiar’ ainda mais ainda o espaço aéreo. Isso desenha um futuro em que o congestionamento no céu poderá subtrair parte do ganho de tempo aeronaves quiserem descer na Avenida Paulista, uma parte delas terá que esperar. Assim, o
DIVULGAÇÃO
que os helicópteros proporcionam. “Se várias
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 9
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
9
16/7/2006 07:35:29
s
financiamento
Onde está o dinheiro da
Cide-Combustíveis? Criada em 2002, a Cide-Combustíveis arrecadou até 2005 cerca de R$ 31,5 bilhões. Esse dinheiro deveria ser empregado em obras de infra-estrutura, DIVULGAÇÃO
inclusive de transporte público, mas ainda não chegou de fato ao setor. ntre 2002 e 2005, a arrecadação da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível, conhecida como Cide-Combustíveis, alcançou aproximadamente R$31,5 bilhões, que deveriam ser empregados em obras de infra-estrutura, incluindo o transporte público urbano, mas a realidade é bem outra: nem 1% desse valor chegou a obras que podem melhorar a mobilidade nas cidades. Que se tenha notícia, o único montante proveniente da Cide-Combustíveis, que foi efetivamente investido em transporte público urbano, foram R$130 milhões aplicados pelo governo paulista nas obras de expansão do metrô e de requalificação da CPTM. A Cide-Combustíveis arrecada anualmente, em números redondos, algo em torno de R$8 bilhões. Desse total, a União fica com 71%, os Estados recebem os restantes 29%, com a obrigação de repassar aos municípios ¼ dessa fatia; assim, os Estados ficam com 21,75% da arrecadação total e os municípios com 7,25% da
E
10
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 10
arrecadação total. Um grupo considerável de especialistas e entidades do setor, entre os quais está a ANTP, reivindicam que esses recursos sejam destinados ao transporte público urbano, segundo um critério que leva em conta o grau de responsabilidade de cada esfera de governo em relação a esse tema. A proposta é que a União destine a projetos de infra-estrutura de transporte público urbano 25% da parte que lhe cabe da Cide-Combustíveis, ou seja, ¼ dos 71%, significando 17,75% da arrecadação total. Os Estados aplicariam 50% de sua parcela, o que corresponderia a 10,87% da arrecadação total. E os municípios investiriam a totalidade de sua quota, ou seja, 7,25% da arrecadação total. Dessa forma, haveria para o setor de transporte público quase 1/3 dos valores arrecadados pela Cide-Combustíveis, algo próximo de R$2,6 bilhões por ano, considerada aquela arrecadação “redonda” de R$ 8 bilhões. Esse montante seria suficiente para manter simultaneamente programas continuados de expansão e requalificação da rede metroferroviária nos grandes centros urbanos, implantação de sistemas de média capacidade, como corredores
NÚMERO 5
16/7/2006 07:35:32
de ônibus, entre outras melhorias. E daria aos administradores a condição de planejar a ampliação dos sistemas e à indústria de material de transporte a certeza de que sempre haveria compras, condição para reduzir o custo de seus produtos e cacifar-se para exportações, garantido empregos no País. Contudo, essa fórmula de participação não está expressa em lei e, portanto, o dinheiro da Cide-Combustíveis não é vinculado, de modo que cabe as governantes decidir aplicá-lo ou não no transporte público urbano, podendo legalmente escolher, por exemplo, investir em estradas ou outros projetos de infra-estrutura dentro do domínio econômico coberto pela Cide-Combustíveis. Mas, na realidade, nem isso está sendo feito.
Desvios Para compreender exatamente quais têm sido os desvios de recursos da Cide-Combustíveis pelo menos na esfera federal, é importante ler as justificativas e o próprio acórdão 1857/2005, relatado em 16 de novembro de 2005 pelo ministro Marcos Vinícios Villaça, do Tribunal de Contas da União (TCU), acessível por meio do portal dessa instituição na Internet. Na peça, o ministro explica que, constitucionalmente, uma contribuição de intervenção no domínio econômico deve obediência às finalidades que justificaram a sua criação. No caso da Cide-Combustíveis, a contribuição é cobrada dos consumidores de petróleo, gás e álcool para que os governos possam oferecer uma contrapartida direta, com investimentos nas áreas relacionadas com tais insumos, por intermédio de subsídio aos preços e ao frete dos produtos, recuperação de danos ambientais decorrentes de sua produção, “e, sobretudo, na melhoria e expansão da infraestrutura de transportes”. Contudo, nos quatro primeiros anos de vida do tributo, a administração federal cometeu nada menos que cinco tipos de desvios na utilização dos recursos arrecadados. Um deles se refere ao pagamento de despesas alheias às destinações determinadas pela Constituição Federal, como proventos de servidores inativos e encargos da
dívida externa. Outro ponto foi o pagamento de despesas “bastante questionáveis”, como a cobertura de apoio administrativo do Ministério dos Transportes, na qual está incluída a concessão de benefícios assistenciais a servidores. Houve falta de aplicação “de montante expressivo dos recursos arrecadados”, e a administração federal aproveitou das disponibilidades financeiras, decorrentes da contenção das despesas próprias, para a formação de superávit primário e permutação de antigas dotações orçamentárias financiadas por impostos pelas provisões da CideCombustíveis. De forma quase didática, o ministro explica que o governo se utiliza de dois mecanismos para não gastar uma grande parcela do que arrecada com a Cide-Combustíveis.Um desses mecanismos ocorre ainda na fase de planejamento, com o abastecimento da Reserva de Contingência com receitas da contribuição. O segundo, acontece na execução orçamentária, mediante o contingenciamento de gastos programados. Combinados, os dois mecanismos ocasionaram, entre 2002 e 2004, a acumulação de 41% dos recursos da Cide-Combustíveis ofereceu, ou seja, pouco mais de R$ 9 bilhões – o que se tornou possível porque não existe um fundo próprio que conferisse independência na gestão dos recursos da contribuição relativamente às programações orçamentária e financeira do governo federal. No acórdão, o TCU determina ao governo que não aloque recursos da Cide-Combustíveis para ações que não apresentem relação direta com os programas de transportes e meio ambiente, e recomenda que não programe a alocação de recursos da contribuição para a Reserva de Contingência, “por ser incompatível com as finalidades” da legislação sobre o tema. Para que os recursos da Cide-Combustíveis sejam efetivamente utilizados, o acórdão recomenda ao governo federal, incluindo o Ministério das Cidades, a formulação de política setorial para a aplicação dos recursos arrecadados, “por meio de uma programação de gastos intertemporal que permita a utilização dos recursos em sua finalidade original”.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 11
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
11
16/7/2006 07:35:35
12
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 12
NÚMERO 5
16/7/2006 07:35:40
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 13
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
13
16/7/2006 07:35:43
&
cidades
P O R HELENA FONSECA
O boom das vagas em ABLESTOCK
empreendimentos residenciais
14
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 14
NĂšMERO 5
16/7/2006 07:35:59
té meio século
A
atrás, quando começou a implantação da
indústria automobilística no mentos não oferecerem vagas de garagens. De modo geral, naquela época, somente os
ABLESTOCK
Brasil, era comum os aparta-
apartamentos de alto padrão é
respondentes a 23 empreen-
capazes de produzir uma quan-
que ostentavam essa regalia.
dimentos novos, dos quais, 16
tidade considerável de viagens,
Aos poucos, com o cres-
com a oferta de duas até quatro
gerando impactos negativos na
cimento do número de au-
vagas de garagem. Porém, a
vizinhança, como filas de veícu-
tomóveis, os incorporadores
oferta de quatro vagas está
los para acesso, perturbação do
passaram a adicionar vagas aos
longe de ser um limite na maior
tráfego de passagem, aumento
projetos, e a segunda vaga de
cidade do País, onde é possível
da poluição ambiental e sonora,
garagem passou a ser um dife-
encontrar muitos empreendi-
entre outros.
rencial. Hoje, já é relativamente
mentos que oferecem cinco ou
A legislação paulistana, por
comum nas maiores cidades a
seis vagas por apartamento, e
exemplo, assinala que, quando
oferta de novos empreendimen-
alguns com mais do que isso,
o empreendimento residencial
tos residenciais com até cinco
chegando mesmo a 12 vagas
possui 500 vagas ou mais, é
vagas por apartamento.
por unidade.
considerado um pólo gerador de
Uma simples verificação nos
Cláudio Bernardes, vice-pre-
tráfego. Levando em conta esse
anúncios imobiliários em jornais
sidente do Secovi, o sindicato
parâmetro, nos últimos anos,
de ampla circulação em grandes
do setor imobiliário, assinala
14% dos projetos apresentados
cidades oferece o panorama da
que as construtoras tendem
para análise da Companhia de
situação. Na capital mineira, o
a se aproximar do objetivo de
Engenharia de Tráfego (CET-
jornal O Estado de Minas, de
quem compra o imóvel. “Hoje, a
SP) como pólos geradores de
7 de maio de 2006, anunciava
tendência é o crescente número
tráfego correspondem a imóveis
60 novos empreendimentos
de automóveis nas famílias”,
residenciais. Geralmente, estão
residenciais, dos quais, 45 com
diz, acrescentando que as cons-
localizados em grandes terre-
a oferta de duas até cinco vagas
trutoras seguem a legislação,
nos, em região com o uso do
por apartamento. Em Curitiba,
que exige que o estacionamento
solo em transformação, destina-
na mesma data, os classificados
seja subterrâneo, o que tem um
dos a empreendimentos para a
de imóveis do jornal Gazeta
ônus: “Quanto mais andares
classe média, caracterizando-se
do Povo mostravam em desta-
desse tipo, maior o custo do
essencialmente por oferecer
que 22 empreendimentos, dos
imóvel”.
muitos apartamentos com uma
quais, dez com oferta de duas até cinco vagas.
Alguns desses empreendi-
vaga na garagem.
mentos residenciais já pode-
Os empreendimentos de
Ainda em 7 de maio, o jornal
riam ser considerados pólos
alto padrão, com algumas exce-
O Estado de São Paulo trouxe
geradores de tráfego, ou seja,
ções, não são classificados como
destacadamente anúncios cor-
pelo menos potencialmente, são
pólos geradores de tráfego, ape-
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 15
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
15
16/7/2006 07:36:11
&
cidades
sar de oferecerem cinco a seis
de Transporte e Trânsito de
mento, do Instituto de Pesquisa
garagens por habitação, porque,
Belo Horizonte S/A (BHTrans),
e Planejamento Urbano de
de modo geral, o número de
Ricardo Mendanha Ladeira,
Curitiba (IPPUC).
unidades multiplicado pelo
informa que a análise de empre-
A expectativa é de que esse
número de vagas não atinge o
endimentos residenciais como
estudo esteja concluído até o
total de vagas que permitiria a
pólos geradores de tráfego ainda
final do ano. Maria Cristina
classificação.
não é feita na capital mineira.
explica que, a exemplo de Belo
Mas é preciso notar um
Ele concorda que, em bairros
Horizonte, por ora, os empre-
aspecto: há empreendimen-
com grande número de edifí-
endimentos residenciais em
tos residenciais que, embora
cios, todos com muitas vagas
Curitiba não são vistos como
não atinjam aquele limite de
na garagem, o exame deveria
pólos geradores de tráfego.
500 vagas, se situam ao lado
avaliar o impacto do conjunto
“O que temos é que os pólos
de vários outros nas mesmas
de edifícios.
geradores de tráfego sempre
condições, em bairros de ver-
Com fator de motorização
ocorrem em empreendimentos
ticalização intensa, de modo
situado entre os mais elevados
comerciais, com área de pelo
que a soma de todos eles faz
do País, com dois habitantes
menos 5 mil metros quadra-
intensificar o tráfego local. A
por automóvel, Curitiba está
dos”, diz, assinalando que para
solução, para esses casos, se-
desenvolvendo um estudo sobre
um cada um desses casos é feito
ria fazer com que a legislação
a necessidade de estaciona-
um estudo. “Se são detectadas
permitisse a avaliação não por
mentos em empreendimentos
interferências no ambiente,
unidade de empreendimento,
de grande porte, de modo a
exigimos medidas mitigadoras
mas considerando o conjunto
modificar a legislação municipal
ou compensatórias”, frisa.
de empreendimentos numa de-
a respeito desse tema, informou
O vice-presidente do Secovi
terminada porção da cidade.
a arquiteta Maria Cristina Tro-
reconhece que a verticalização
vão Santana, da área de Planeja-
traz impactos inevitáveis na
O presidente da Empresa
vizinhança, principalmente quanto à circulação de carros e pedestres, o que exige atenção especial dos órgãos públicos e a adoção de medidas de planejamento, avaliação e fiscalização, mas, com um chavão, devolve a bola para aqueles que têm a responsabilidade de investir na mobilidade: “O correto seria criar condições para que as pessoas utilizassem a rede pública de transporte, mas como ela não
DIVULGAÇÃO
é ágil e apresenta deficiências,
16
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 16
as pessoas usam o carro para se deslocar”, conclui Cláudio Bernardes.
NÚMERO 5
16/7/2006 07:36:12
Dia 4 de julho • SISTEMAS INTELIGENTES DE TRANSPORTE • EXEMPLOS DE SUCESSO • OPERAÇÃO DO TRÂNSITO • APLICAÇÃO DE ITS EM EMPRESAS E PROGRAMAS
Dia 5 de julho • GESTÃO DO TRANSPORTE PÚBLICO • SISTEMAS DE PAGAMENTO – BILHETAGEM ELETRÔNICA
Dia 6 de julho • INTEGRAÇÃO E A BILHETAGEM ELETRÔNICA • A BABEL TECNOLOGICA • RELACIONAMENTO COM USUÁRIOS E CLIENTES •PRODUTOS E SERVIÇOS ITS
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 17
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
17
16/7/2006 07:36:33
y
entrevista
CYNTHIA BERTHOLINI SANTOS E FLORINDO KATSUHISA ENOKI
A publicitária e jornalista Cynthia Bertholini Santos e o economista Florindo Katsuhisa Enoki são os autores de uma monografia de especialização em Educação para o
ARQUIVO PESSOAL
Trânsito, concluída em 2004, na Universidade de Brasília, que discute aspectos da publicidade apresentada nos meios de comunicação do Brasil para vender automóveis. Nesse estudo, eles evidenciam que, além do culto ao individualismo e à competitividade, as mensagens contidas nos anúncios podem, também, levar os consumidores a se arriscarem no trânsito e a desprezarem as regras mais simples de cidadania. Atualmente, Enoki está trabalhando em Angola e Cynthia participa da Câmara Temática de Educação para o Trânsito e Cidadania – órgão de assessoramento ao Conselho Nacional de Trânsito (Contran) –, representando a Agência Nacional
ARQUIVO PESSOAL
de Transportes Terrestres (ANTT), onde trabalha.
18
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 18
As perguntas foram dirigidas por e-mail a Cynthia, encarregada de respondê-las, após discutir as respostas com Enoki. NÚMERO 5
16/7/2006 07:36:35
P O R ALEXANDRE ASQUINI
A publicidade de automóveis e a insegurança no trânsito
Vocês mostram que filmes publicitários para a TV podem estimular comportamentos que comprometem a segurança no trânsito. Seria o aspecto mais nocivo dessas campanhas o fato de trabalharem muito bem o emocional do telespectador/consumidor em favor de um individualismo e de uma competitividade exacerbados? Achamos muito difícil definir o que é mais nocivo. Não se trata apenas de exacerbação de individualismo e de competitividade. As mensagens presentes nos anúncios podem, também, levar o consumidor a um comportamento de risco sob a falsa segurança propiciada pelo automóvel, sugerida pela publicidade, ou ainda, a simples busca do prazer, desprezando regras elementares de cidadania. Mas, sem dúvida, o apelo emocional, tão bem trabalhado pela publicidade, contribui significativamente para os valores individualistas transmitidos. A questão não está necessariamente na linguagem que a publicidade utiliza, mas nesses valores que pouco reforçam a união, a cooperação, a solidariedade, a inclusão, a convivência e outros aspectos fundamentais para um trânsito mais humano e para uma melhor qualidade de vida.
Vocês criticam as três esferas de governo por não investirem em educação no trânsito, admitindo, contudo, que os recursos são muito reduzidos perto do que os fabricantes de automóveis gastam em publicidade. Por outro lado, propõem que o Estado seja mais firme como regulador e se aproxime do setor publicitário e das montadoras para favorecer um novo ambiente na publicidade de veículos. Tal proposta é factível em curto prazo? Não parece contraditória? Achamos que são duas propostas que se complementam. A primeira é a de exigir que o Estado cumpra a lei mediante aplicação do que é arrecadado do
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 19
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
19
16/7/2006 07:36:35
y
entrevista
DPVAT e das multas de trânsito em ações educativas de trânsito. A segunda é a que sugere que o Estado use seu poder regulador – não, evidentemente, sob a forma de censura, o que seria uma intervenção – e também que se comunique melhor com a iniciativa privada, principalmente dos setores de publicidade e das montadoras. Sabemos que as mesmas montadoras que vendem os automóveis no Brasil estão presentes em outros países e, conforme demonstramos em nosso estudo, há países em que a regulamentação da publicidade certamente não permitiria que anúncios como os apresentados no Brasil fossem veiculados. Estamos certos de que as propostas são factíveis em curto prazo, justamente pelo fato de a criação publicitária ter encontrado, nesses países, meios de vender automóveis com o que chamamos de responsabilidade social.
“As mensagens presentes nos anúncios podem, também, levar o consumidor a um comportamento de risco sob a falsa segurança propiciada pelo automóvel, sugerida pela publicidade, ou ainda, a simples busca do prazer, desprezando regras elementares de cidadania.” No estudo, vocês sugerem que deve haver a participação da sociedade organizada nesse processo. Como seria isso? A sociedade organizada, no Brasil, já tem alguma participação no esforço de reduzir acidentes de trânsito. Podemos citar, por exemplo, a Fundação Thiago Gonzaga, de Porto Alegre. Cabe também menção à Ambev, que, desde 2004, tem veiculado comerciais de sua cerveja Skol exclusivamente com apelos de não dirigir alcoolizado. Isso é muito diferente do que fazem as outras indústrias, que se limitam a inserir a mensagem “Beba com moderação” ou equivalente. A monografia tem um ano e meio. Nesse período, vocês perceberam alguma mudança na forma como a publicidade de automóveis está sendo criada e veiculada? Não. A monografia, infelizmente, circulou muito pouco. Acreditamos que iniciativas como esta, da revista Movimento, poderão dar voz a nosso trabalho e ajudar a atingir o objetivo a que nos propusemos. Diferentemente da indústria de bebidas alcoólicas – leia-se cerveja –, as montadoras não se sentem ameaçadas no seu negócio. O que a Ambev fez foi se antecipar à ameaça que corria no Congresso em projeto de lei que equiparava o álcool à droga. Havia a intenção de, assim como nas propagandas de cigarros, obrigar à advertência
20
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 20
NÚMERO 5
16/7/2006 07:36:35
contra a dependência química que o álcool geraria. Ao lançar mão de campanhas que alertavam para o risco de beber e dirigir, a Ambev se tornou uma empresa responsável socialmente. Isso não significa, como dissemos, que somos favoráveis em absoluto à censura. Mas conforme citamos na monografia, a indústria automobilística brasileira passou a incluir itens de segurança para passageiros em seus veículos somente a partir da década de 70; reagiu também quando teve os carros chamados de carroças – no governo Collor –, mas ainda resiste em equipar seus veículos com dispositivos de segurança que se transformam em acessórios. Por que essas empresas mexeriam em sua publicidade, numa época em que, cada vez mais, o melhor é o primeiro, o mais rápido etc.?
“Por que as indústrias automobilísticas mexeriam em sua publicidade, numa época em que, cada vez mais, o melhor é o primeiro, o mais rápido etc.?” O estudo está escrito numa linguagem agradável e é muito objetivo, além de indicar caminhos para quem queira se aprofundar no assunto. Qual tem sido a repercussão do trabalho? Vocês próprios pretendem continuá-lo de alguma maneira? A repercussão tem sido muito boa. Diríamos que foi além do que esperávamos. O estudo foi apresentado na Câmara Temática de Educação para o Trânsito e Cidadania do Contran; foi remetida cópia ao Denatran; tem sido solicitado por colegas ligados ao trânsito para palestras e mesmo para aulas em faculdades de publicidade. Com certeza, gostaríamos de continuá-lo, mas há a distância entre nós; deixaram para o futuro um aprofundamento maior do estudo, que é, ao nosso ver, extremamente palpitante. Gostaríamos de ressaltar que a educação para o trânsito não está circunscrita a iniciativas isoladas, mas o poder da publicidade pode ser avassalador e comprometer os esforços que estão sendo, ainda que acanhadamente, construídos (em campanhas, em salas de aula etc.). Tampouco podemos atribuir à publicidade a responsabilidade exclusiva, mas devemos tentar transformá-la, em toda sua genialidade, numa grande aliada. Aliás, a imprensa também tem papel fundamental na construção de uma sociedade mais harmônica, equânime e justa. Essa é a função da comunicação social...
Como ter acesso à monografia Além de disponível na Bibliot eca da UnB, o t ext o pode ser acessado por meio do Portal da ANTP, no seguinte endereço: www.antp.org.br.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 21
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
21
16/7/2006 07:36:35
ABLESTOCK
capa
Por que a implantação de metrôs caminha tão devagar no Brasil? P O R ALEXANDRE ASQUINI
22
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 22
NÚMERO 5
16/7/2006 07:37:09
N
o final de março de 2006, São
duas novas estações, o que elevará o número
Paulo ampliou em três quilôme-
de passageiros transportados diariamente de
tros a sua Linha 2 - Verde, que
370 mil para cerca de 520 mil.
serve a diversos bairros valoriza-
Também está em construção na cidade de
dos, incluindo o centro financeiro e de negócios
São Paulo a Linha 4 - Amarela, com pouco mais
da cidade, a Avenida Paulista.
de 12 quilômetros, que ligará o bairro da Luz,
Há a promessa de que, até novembro deste
praticamente no centro da cidade, à Vila Sônia,
ano, outros 500 metros sejam acrescentados a
na Zona Oeste, com a vantagem de permitir a
essa linha, agregando ao sistema a estação Alto
interconexão de diferentes linhas do Metrô e da
Ipiranga, com mais 90 mil passageiros todos
Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
os dias. Numa segunda etapa, a linha será
(CPTM), agregando mais 900 mil passageiros
ampliada em mais 3,4 quilômetros, somando
ao sistema.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 23
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
23
16/7/2006 07:37:19
capa
Outras metrópoles mundiais que iniciaram Todos concordam que esses novos números
a operação de seus sistemas de metrôs mais ou
paulistanos são muito interessantes, mas a
menos na mesma época apresentam melhor
expansão a que eles se referem é ainda insufi-
desempenho. O metrô de Seul, que começou
ciente para as necessidades da maior metrópole
a rodar em 1974, portanto, junto com o metrô
do País. E o ritmo do crescimento é lento.
paulistano, conta hoje com 144 quilômetros de
Depois que fez rodar o primeiro trem há
linhas, com 114 estações. Ainda na Ásia, Hong
quase 32 anos, a Companhia do Metrô de São
Kong, que inaugurou seu sistema em 1979, jun-
Paulo conseguiu instalar apenas 61 quilôme-
to com o metrô carioca, conta atualmente com
tros de linhas e 54 estações - velocidade de
quatro linhas, num total de 76,7 quilômetros
implantação que se situa abaixo de dois quilô-
de extensão e 45 estações.
metros por ano. No Rio de Janeiro, a situação
Nos Estados Unidos, o metrô de São Fran-
não é melhor: o primeiro trem do metrô carioca
cisco, inaugurado em 1972, possui 153 quilô-
correu em 1979 e até hoje há apenas 34,9 qui-
metros de extensão, com 39 estações, e o metrô
lômetros de linhas, com 31 estações.
da capital federal, Washington, que começou
Algumas razões e conseqüências do baixo investimento em trilhos Para Jorge Rebelo, do Banco Mundial, de-
implantados e podem ter sua inauguração em
vido aos problemas de caixa enfrentados pelas
um prazo menor, até dentro de um mesmo
três esferas da administração pública no Brasil,
mandato, o que não deixa de ser um atrativo
vai ser “muito difícil avançar com os sistemas
para muitos administradores públicos.
sobre trilhos, com o nível de rapidez que seria desejável para regiões metropolitanas”.
24
“Ninguém discute a vantagem que tem o setor
Os defensores dos metrôs não gostam que
metroferroviário. Agora, o problema é que o
se diga que esses sistemas são ‘muito caros’,
investimento é realmente muito alto, e a maior
afirmando, com base em diferentes estudos,
parte dos Estados e os governos municipais e
que, em sua longa vida útil, acabam tendo
mesmo governo federal estão com problema
custo inferior ao de outros modos de trans-
de caixa”.
porte público. Contudo, reconhecem que o
Ele acredita que a maneira de resolver essa
desembolso na fase de implantação é elevado,
situação é, antes de tudo, ser mais cauteloso
ultrapassando a casa dos 100 milhões de dóla-
na escolha dos investimentos. “Não há dúvida
res por quilômetro.
de que, no miolo das grandes regiões metro-
Além disso, o tempo de maturação e im-
politanas, os sistemas metroferroviários são
plantação do projeto de metrô é relativamente
absolutamente necessários, mas é preciso fazer
longo. Outros modos, sem a mesma capacidade
um esforço muito grande para diminuir o custo
de carregamento e com projetos comparativa-
de construção e diminuir também o custo do
mente mais simples, custam menos para serem
material rodante”.
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 24
Tendo em conta essa realidade, Rebelo frisa:
NÚMERO 5
16/7/2006 07:37:22
a operar em 1976, ostenta 166 quilômetros de linhas com 83 estações. Já o sistema da Cidade do México, inaugurado cinco anos antes do que o sistema de São Paulo, disponibiliza 201 quilômetros de trilhos e 147 estações. Durante o VI Seminário Metroferroviário, realizado no início de março de 2006 pela Comissão Metroferroviária da ANTP, o presidente desse organismo, o diretor de Operações do Metrô-SP, Décio Tambelli, apresentou um quadro que resume a pequena participação do transporte público urbano. Informou que, somados, metrôs e trens urbanos brasileiros possuem uma malha com 877
TONY ESCALANTE
setor metroferroviário na matriz brasileira de
REDUZIR CUSTOS
que houvesse um ritmo constante de implantação
Investimentos regulares na construção de
de sistemas”.
metrôs e na requalificação das linhas já operantes
O presidente da Associação Brasileira da In-
de metrôs e trens urbanos poderiam contribuir
dústria Ferroviária (Abifer), Luís Cesário Amaro
com a redução do custo dos projetos, pelo menos
da Silveira, complementa: “Não existe nenhum
no que diz respeito ao material rodante.
país do mundo que tenha um sistema de metrô
Décio Tambelli comenta que a falta de inves-
ou de trens desenvolvido que não tenha atrás
timentos constantes em projetos de metrô ou de
de si uma indústria que o suporte. Então, isso é
requalificação das ferrovias urbanas obriga a in-
muito importante para o crescimento dos nossos
dústria de material rodante a produzir em soluços,
sistemas”. No VI Seminário Metroferroviário,
encarecendo o seu produto e, conseqüentemente
houve uma avaliação da necessidade de novos
os projetos de implantação, expansão ou requali-
trens para os próximos cinco anos. A conclusão
ficação dos sistemas. “Isso é muito complicado!
é de que todas as operadoras metroferroviárias
O Brasil já teve três indústrias de fabricação de
no Brasil necessitam de novos trens, inclusive o
trens e hoje tem uma só e ainda trabalhando com
Metrô de São Paulo. Estimou-se que 150 trens
altos e baixos. Poderíamos reduzir substancial-
sejam necessários no País nos próximos cinco
mente os custos, produzindo no Brasil, desde
anos, totalizando aproximadamente 750 carros.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 25
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
25
16/7/2006 07:37:25
capa
21 mil profissionais e fatura algo próximo R$ quilômetros, o que é muito pouco, considerando
1,3 bilhão por ano.
que só o sistema de metrô da cidade de Nova York tem mais da metade dessa extensão. A frota
INSENSIBILIDADE?
brasileira é 2.648 carros, o que representa menos
Sistemas de alta capacidade, os trens e os
da metade do número de carros à disposição dos
metrôs têm a vantagem de transportar muita
usuários do metrô nova-iorquino.
gente através de distâncias urbanas razoavel-
Os sistemas urbanos sobre trilhos são
mente longas com segurança, rapidez e certo
responsáveis pelo deslocamento de apenas
conforto, podendo, ainda, articular toda a rede
7% dos passageiros urbanos. “Esses são da-
de transporte a um custo energético menor e
dos que não nos deixam felizes, não. É uma
praticamente sem poluir. Apesar de todas essas
participação muito pequena. Esperamos que
qualidades - comprovadas em alguns sistemas em
nesses próximos anos possamos crescer sig-
operação nas maiores cidades - o Brasil avança a
nificativamente”, desabafou Tambelli, antes de
passos de tartaruga na efetivação do transporte
complementar os dados atuais: o setor emprega
sobre trilhos. Por que isso acontece?
Metrôs não podem ser vistos só como um modo de transporte Em que pese a visão estritamente econô-
mentos ferroviários, rodoviários e duas rodas,
mica a presidir os grandes projetos de infra-
suas partes e peças, Ronaldo Rocha, concorda
estrutura, cada vez fica mais evidente que os
com a proposta Emiliano. “Estamos sempre
sistemas estruturantes como os metrôs e trens
falando da ‘taxa interna de retorno’, mas
urbanos não podem ser avaliados apenas como
chegou a hora de analisar o custo gerado pela
meios transporte, cujos investimentos em im-
falta do transporte adequado nos grandes cen-
plantação ou requalificação ficam circunscritos
tros”, disse assinalando que existem estudos
aos próprios sistemas.
referentes a São Paulo que demonstram que a
O diretor de Relações Metroferroviárias da
falta de um transporte adequado sobre trilhos
Aeamesp, Emiliano Affonso, defende a concre-
custa pelo menos R$ 22 bilhões de reais por
tização do conceito da ‘taxa externa de retorno’
ano à metrópole.
para análise dos projetos metroferroviário.
Segundo ainda Rocha, um outro estudo,
Trata-se de uma forma de evidenciar os ganhos
elaborado pela Secretaria de Transportes Me-
monetizáveis que os sistemas metroferroviá-
tropolitanos do Estado de São Paulo, respon-
rios trazem para as cidades, como, por exemplo,
sável por todo o sistema sobre trilho na Região
o incremento de impostos nos três níveis de
Metropolitana de São Paulo, indica que com R$
governo, economia de petróleo, diminuição dos
30 bilhões seriam resolvidos os problemas de
custos com acidentes e poluição etc.
investimentos no setor. “Ou seja, com um ano
O representante do sindicato empresarial que reúne os fabricantes de materiais e equipa-
26
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 26
e meio do que é perdido, nós resolveríamos a questão!”
NÚMERO 5
16/7/2006 07:37:28
“Eu acho que é falta de sensibilidade política. Poucos são os governantes que investem nesse tema”, continua Tambelli. O consultor Peter Alouche, que acaba de deixar a Companhia do Metrô de São Paulo, após 35 anos de serviços, aponta outro fator: “Evidentemente, no Brasil, há o que podemos chamar de concorrência entre necessidades: a necessidade de saúde, de escolas e de transporte público...”, diz, assinalando que administrador tem que fazer as suas escolhas. Para o engenheiro e consultor Plínio Assno, a razão principal de o sistema sobre trilhos andar a passos tão curtos “é que o metrô é tão
ABLESTOCK
mann, primeiro presidente do metrô paulista-
Tomando como base a cifra apresentada por
o privado nem o público nesse setor. Há uma
Rocha, Charles Marot, do BNDES, conta que
série de problemas de ‘bancabilidade’, parti-
existe um estudo desse banco de fomento, ‘já
cularmente do setor público, que é o grande
defasado’, dando conta de que há a possibili-
investidor”, disse.
dade de colocação de R$35 bilhões de reais em
O especialista do BNDES fala da esperança
investimentos no setor ao longo de dez anos.
aberta com a Linha 4 - Amarela do Metrô-SP,
“Isso propiciaria cerca de mais seis ou sete
que inaugurou uma Parceria Público Privada
milhões de passageiros por dia nos sistemas
(PPP) no setor, mas assinala que o transporte
sobre trilhos, sendo que 70% ou 75% disso
público - não apenas no Brasil, mas também
em São Paulo e no Rio de Janeiro”.
em outras partes do mundo - não estimula o
Mas se existe essa possibilidade, por que o
investidor. No caso da nova linha do metrô
dinheiro não é destinado para esse fim, resol-
paulistano, a informação é de que o governo
vendo a questão? A resposta, dada pelo próprio
estadual será obrigado a aportar mais de ¾ dos
Marot, está na ‘incapacidade’ dos tomadores
recursos necessários para a obra - exatamente,
desses recursos. “O BNDES tem muito di-
77%, o que equivale a US$ 1,26 bilhão, dei-
nheiro que a poderia orçar, mas continuamos
xando para os investidores privados os 23%
com aquela situação que já se prolonga por
restantes, ou US$ 340 milhões.
uma década: não conseguimos financiar nem
Além disso, muitos vêem como um problema
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 27
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
27
16/7/2006 07:37:37
capa
o fato de o investidor privado ficar com toda a receita tarifária por trinta anos e ter garantias de que essa receita se concretizará conforme o esperado. Um dos temores é que para honrar o contrato com os investidores, o governo estadual acabe, eventualmente, desequilibrando a Companhia do Metrô e a CPTM. O presidente do Metrô Rio, José Gustavo de Souza Costa, propõe que o BNDES administre os recursos criados para financiar a infra-estrutura de transporte público e que não chegam ao setor. Ele argumenta que, se os recursos arrecadados pela CIDE, em vez de ficarem retidos TONY ESCALANTE
na conta do superávit primário ou pulverizados nos grandes sistemas estruturadores durante algum tempo, em poucos anos estaria coberta
empolgante que o pessoal que nele trabalha
pliação das redes metrôs e à requalificação dos
olha apenas para dentro”, deixando claro,
sistemas de trens urbanos.
com uma ponta de ironia, que anda faltando
Por enquanto, o presidente Luís Inácio Lula
articulação política para conseguir novos in-
da Silva, virtual candidato do Partido dos Traba-
vestimentos no setor.
lhadores à reeleição, não se referiu à questão da
Claros compromissos dos futuros gover-
ampliação dos sistemas metroferroviários num
nantes com a ampliação da malha ferroviária
eventual segundo período de mandato. Sua ad-
nas maiores metrópoles é o que defende a
ministração tem sido acusada de não dar muita
Associação de Engenheiros e Arquitetos de
bola para o setor, dificultando a chegada de verbas
Metrô (Aeamesp). Segundo o presidente, o
federais para ampliar ou renovar os sistemas.
engenheiro Manoel da Silva Ferreira Filho, a a
28
para Estados e Municípios, fossem investidos
Representantes do governo paulista assina-
entidade vai buscar fazer de sua 12 Semana
lam que, em outros países, os investimentos no
de Tecnologia Metroferroviária, no final de
setor contam com grandes financiamentos por
agosto e início de setembro de 2006 - portanto
parte do governo central. Lembram ainda que o
às portas do pleito de outubro -, um fórum em
Estado de São Paulo, neste momento, tem mais
que representantes das principais candidaturas
de 16 quilômetros de linhas em construção,
à presidência e aos governos estaduais digam
sem nenhuma ajuda do governo federal, nem
publicamente se a proposta dos respectivos
mesmo por meio de agentes financeiros, como
candidatos é ou não dar continuidade à am-
é o caso do BNDES.
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 28
NÚMERO 5
16/7/2006 07:37:44
a necessidade de recursos para o setor. Um número crescente de especialistas do
em novas linhas de metrô e na modernização dos sistemas já em operação.
setor tem advogado a tese de que uma saída
Defensor da idéia do petróleo financiar os
para novos investimentos no sistema metro-
sistemas metroferroviários, o presidente da
ferroviário possa vir do êxito da Petrobrás em
CBTU, João Luís da Silva Dias, propõe a cons-
conquistar a auto-suficiência.
trução de um modelo fiscal para o transporte
O raciocínio é simples: sabe-se que o custo
público, cuja base será manter nos grandes
de produção de petróleo no Brasil é menor do
centros todo o recurso que neles é gerado para
que 20 dólares por barril, e que a grande estatal
fins de aplicação no setor.
brasileira de petróleo realiza a venda do insumo
Ele defende a vinculação de recursos para o
no mercado interno a um preço em torno de 40
setor, perguntando e respondendo: “Por que tem
dólares o barril. Assim, se parte do produto vier
que ser vinculado? Porque quem administra um
a ser economizada internamente e devidamente
metrô como o de São Paulo, por exemplo, tem
exportada, poderá render, em valores atuais,
que saber de quanto recurso disporá em 2012,
mais de 70 dólares por barril. Com parte da
2013, 2014 e assim por diante. Ou seja, ele tem
diferença de 30 dólares por barril seria possível,
que ter um horizonte para fazer os investimentos
em poucos anos, amortizar os investimentos
necessários e que são realmente significativos”.
Nem todos os críticos da falta de verbas para
que administrações anteriores também pouco
metrôs e trens urbanos são oposicionistas. Há
fizeram a respeito - tanto que a situação da
integrantes do governo federal que afirmam, em
reduzida extensão das malhas metroviárias é
tom severo, que só quando outros projetos de
um problema que se arrasta praticamente desde
infra-estrutura se mostraram inviáveis, a União
que os sistemas de São Paulo e Rio de Janeiro
concordou em inserir os metrôs e trens urbanos
foram implantados, ainda no regime militar.
na lista dos que terão recursos via o Projeto Piloto de Investimentos (PPI) - um critério que elege
DIFICULDADES PERSISTENTES
investimentos a serem priorizados pelo governo,
Especialistas do setor vêm se manifestando
retirando-os da relação de verbas que suportam
contra práticas que persistentemente dificultam
o famigerado superávit primário. De todo modo,
os projetos capazes de ampliar e qualificar os
consta que o governo tenha considerado R$ 765
transportes públicos, em especial metrôs e trens
milhões no PPI para projetos de transporte públi-
urbanos. Um exemplo disto é a incoerência nos
co, incluindo o setor metroferroviário.
custos da energia de tração, gravados pela horo-
Além disso, por uma questão de justiça com
sazonalidade, medida que pune o excesso de con-
a atual administração federal, que tem arcado
sumo de energia elétrica nos sistemas, justamente
sozinha com o ônus do não-investimento em
nas horas de maior demanda de transporte.
sistemas metroferroviários, é preciso dizer
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 29
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
29
16/7/2006 07:37:44
capa
Seminário da ANTP sobre sistemas inteligentes quer compreender mudanças trazidas pela bilhetagem eletrônica Cerca de quatro meses depois que o Bilhete
Por sua vez, o sistema Rio Ônibus, geren-
Único paulistano passou a permitir a integração
ciado pelo Sindicato das Empresas de Ônibus
tarifária entre ônibus municipais e o sistema
do Município do Rio de Janeiro, promove a
metroferroviário, o Metrô de São Paulo anun-
integração de um conjunto significativo de
ciou que um novo patamar de demanda havia
estações de trem e de metrô, proporcionando
sido alcançado no final de abril de 2006: foram
aos passageiros a integração de 19 linhas de
registradas mais de 2 milhões de entradas
ônibus municipais e quatro linhas intermunici-
diárias no sistema, às quais se somam trans-
pais com o Metrô-Rio, e a integração de ônibus
ferências gratuitas entre linhas, compondo
municipais com a operadora de trens Supervia,
um total de 2,8 milhões de usuários em um
em quatro estações.
único dia. A direção da companhia salientou que esse crescimento já era esperado e vinha
CENÁRIO EM MUDANÇA
sendo monitorado.
O crescimento efetivo da demanda é um
O Bilhete Único foi estendido para os sis-
indicativo de que a tecnologia da bilhetagem ele-
temas sobre trilhos no final de dezembro de
trônica continua alterando o cenário da integração
2005, ocasião em que se iniciou um processo
entre sistemas de transporte público e de que será
gradativo de expansão do número de estações
necessário estudar e antever o que ainda poderá
metroferroviárias a permitir a integração. Em
mudar e quais os novos problemas a serem en-
maio de 2006, 118 estações do Metrô-SP e da
frentados - entre os quais, está a superlotação dos
Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
carros do metrô em horários de pico, argumento
(CPTM) já estavam permitindo o uso do Bi-
de grande peso em favor de novos investimentos
lhete Único.
nesse tipo de solução de transporte.
Outra crítica apontada por especialistas é o fato de não haver uma definição clara de quem são os beneficiários das políticas de gratuidades e, principalmente, as fontes de custeio desses benefícios. Recursos destinados para esta fi-
TONY ESCALANTE
nalidade poderiam ser aplicados em obras de
30
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 30
ampliação da malha metroviária. Técnicos do setor que atuam em São Paulo apontam outro fator para explicar o ritmo lento da expansão do metrô: a chamada “indústria
NÚMERO 5
16/7/2006 07:37:52
No seminário que programou para o perío-
Paralelamente ao seminário, haverá uma exposi-
do de 4 a 6 de julho de 2006, no recinto da Fe-
ção de produtos e serviços para esse segmento. O
comércio, em São Paulo, com o título Sistemas
programa completo do seminário pode ser visto
inteligentes e o futuro da mobilidade urbana, a
no Portal da ANTP (www.antp.org.br).
ANTP reservou duas das dez sessões para tratar de aspectos da bilhetagem eletrônica.
O seminário permitirá também uma visão dos sistemas inteligentes aplicados ao transporte,
Uma das sessões discutirá as novas oportu-
incluindo um painel com exemplos de sucesso;
nidades abertas com a bilhetagem eletrônica,
aplicações desses sistemas em operação de trân-
inclusive, a obtenção de dados para o planeja-
sito e no gerenciamento de empresas e gestão do
mento. Num outro momento do seminário, o
transporte. Haverá uma sessão específica sobre
vice-presidente da ANTP, Jurandir Fernandes,
o relacionamento com usuários e clientes, e
coordenará o debate sobre o tema integração
também um painel com produtos e serviços em
intermodal e tarifária, com foco justamente
sistemas inteligentes.
sobre os casos de São Paulo e Rio de Janeiro. Haverá ainda uma terceira sessão dedicada à
COMISSÃO PERMANENTE
intercambiabilidade e à interoperabilidade dos
A partir do seminário, a ANTP deverá criar
sistemas inteligentes.
uma comissão permanente de trabalho sobre
A bilhetagem eletrônica está incluída entre os
sistemas inteligentes de transporte, reunindo
sistemas inteligentes de transporte (conhecidos
associados que estão atuando em diferentes áreas:
internacionalmente pela sigla ITS): um conjunto
no trânsito, por exemplo, com a utilização de sis-
de tecnologias que tem como base a combinação
temas inteligentes para semaforização e recursos
dos recursos da informática com os das teleco-
de gestão inteligente de tráfego, e também orga-
municações em sistemas e veículos de transporte,
nizações e empresas que já tenham estruturado
facilitando a obtenção remota e o rápido trata-
o seu setor de sistemas inteligentes, incluindo
mento de dados para um melhor desempenho
órgãos gestores, operadoras de transporte público
de uma empresa ou de um sistema operacional.
por ônibus, trens e metrô.
de liminares”, que impede o andamento de
andamento dos processos ambientais, os quais
licitações. Eles afirmam que a Justiça recebe um
não podem ser antecipados para agilizar a im-
pedido e concede uma liminar em 24 horas, e
plantação de obras de infra-estrutura. Deixam
vai examinar o tema depois de 40 ou 50 dias,
claro, no entanto, que “ninguém é contra esses
e, “enquanto isso, tudo se paralisa, gerando
procedimentos, nem quer passar por cima de-
custos; e a população está lá aguardando, e os
les. Mas é preciso que os aparelhos do estado
excluídos continuam andando a pé!”
que tratam dessa matéria se modernizem para
Para esses técnicos, há ainda o aspecto do
dar respostas rápidas”.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 31
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
31
16/7/2006 07:37:52
L idéia
Rudel Trindade Júnior e Marilita Gneco de Camergo Braga
Acidentes de trânsito nos sites dos Detrans Brasil é o segundo país em horas
O
de utilização da internet. Segundo o relatório produzido pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e
Estatística (Ibope), cada um dos 14,1 milhões de internautas residenciais, ativos, passou, em média, 19 horas e 24 minutos navegando na internet, em março de 2006, uma utilização superada apenas pelos franceses, com 19 horas e 28 minutos; um CRIS ISIDORO
recorde também naquele país. O relatório do Ibope acrescenta que o Brasil é o país com maior índice de uso de sites governamentais, entre os treze avaliados. Em residên-
O endereço eletrônico governamental mais
cias, a proporção de brasileiros que usou páginas
procurado é o da Receita Federal. Porém, há pro-
eletrônicas governamentais não teve comparação
cura por governos estaduais, além de órgãos do
com nenhum outro país, atingindo quase 39% do
judiciário. Os Departamentos Estaduais de Trân-
total de usuários ativos. Para Alexandre Maga-
sito (Detrans) figuram entre as dez palavras mais
lhães, analista de internet do Ibope, esse grande
pesquisadas nos serviços de busca da internet.
alcance dos endereços eletrônicos governamen-
32
tais está ligado à qualidade e à quantidade das
Resultados da pesquisa
informações colocadas à disposição pelos órgãos
No Brasil, mais de 30 mil pessoas morrem
públicos e à facilidade proporcionada pela Web
por ano em acidentes de trânsito. Estima-se um
para a resolução de problemas dos cidadãos junto
custo anual de R$5,3 bilhões para o conjunto das
às instâncias públicas.
aglomerações urbanas brasileiras. Isto representa
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 32
NÚMERO 5
16/7/2006 07:37:55
cerca de 0,4% do PIB do País, um valor que cres-
utilizadas (por exemplo, se possibilitam o down-
ceria consideravelmente, se fossem incluídos os
load dos dados); sua padronização em relação às
custos dos acidentes rodoviários. Para enfrentar
planilhas do SINET e às informações apresentadas;
um problema dessa magnitude, é preciso conhecer
a abrangência da cobertura territorial (dados de
suas causas. Porém, as estatísticas brasileiras são,
todo o Estado ou somente da Capital); o tipo e
reconhecidamente, falhas. O desconhecimento das
a severidade dos acidentes; se havia informações
características dos acidentes dificulta a aplicação
sobre condutores, frota e infrações de trânsito; e
de ações efetivas de redução de acidentes, assim
a existência de indicadores de acidentes. A Tabela 1 mostra a existência dos sites e aspec-
como de políticas públicas adequadas. Nesse contexto, tendo como base os sistemas de informações internacionais e os procedimentos
tos relacionados com a navegabilidade e interação com o usuário.
estabelecidos pelo Sistema Nacional de Estatísticas
A existência e atualidade das informações
de Acidentes de Trânsito (SINET), realizou-se uma
estatísticas de acidentes foram analisadas (Tabela
verificação das informações fornecidas nos sites
2). Ressalta-se que 11 sites (40,7%) não fornecem
dos 27 Detrans (26 Estados e o Distrito Federal),
dados de acidentes de trânsito e, nos 16 que os
no mês de outubro de 2004. A abordagem enfo-
apresentam, um terço dos dados é anterior a 2003.
cou os dados estatísticos de acidentes de trânsito,
Os Detrans de São Paulo e do Ceará, por exemplo,
bem como as informações necessárias ao desen-
mostram valores de 2000. Um dado de extrema relevância, apresentado
volvimento de estudos de acidentes e possíveis
na Tabela 2, é a utilização das planilhas estabeleci-
comparações entre localidades. Foram analisados 46 itens, relacionados com os
das pelo SINET: 22 Detrans (85,2%) não seguem
seguintes tópicos: a existência de sites e a facilida-
a padronização estipulada pelo Denatran. Dessa
de na navegação; se os sites continham estatísticas
forma, fica inviabilizada a comparação estatística
de acidentes de trânsito; a forma como podem ser
precisa e eficiente entre os Estados.
Tabela 1 - Existência de site e características da navegação - detrans (*)
Possui site
24
88,9%
2
7,4%
1
3,7%
Possui mapa do site
11
40,7%
16
59,3%
0
0,0%
Possui ferramenta de busca no site
7
25,9%
20
74,1%
0
0,0%
Apresenta endereço para correspondência 21
77,8%
2
7,4%
4
14,8%
Possui telefone para contato
25
92,6%
2
7,4%
0
0,0%
Possui e-mail para contato
22
81,5%
4
14,8%
1
3,7%
Possui link para o Denatran
17
63,0%
10
37,0%
0
0,0%
Possui links para outros Detrans
9
33,3%
6
22,2%
12
44,4%
Possui links para o site do Governo do Estado
20
74,1%
7
25,9%
0
0,0%
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 33
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
33
16/7/2006 07:37:56
L idéia
Com base nos 46 itens pesquisados, os sites
o Estado de Santa Catarina, o único que dispõe de
foram ordenados, de acordo com sua pontuação:
anuário estatístico on-line, e os de Mato Grosso do
foi dado 1 (um) ponto para cada item com res-
Sul e do Piauí, pela uniformização de suas plani-
posta SIM e 0 (zero) para os itens com resposta
lhas, seguindo o padrão estabelecido pelo SINET,
NÃO ou Incompletos. Para o cálculo da média
e por apresentarem informações importantes,
geral aritmética dos 46 itens avaliados nos sites,
como a constatação de consumo de álcool pelos
realizou-se a conversão dos somatórios obtidos
envolvidos em acidentes.
em uma escala numérica de 0 (zero) a 10 (dez),
O site do Denatran, com a pontuação 6,1, ficou
com a finalidade de hierarquizar os resultados das
acima da média brasileira (3,4), com aspectos
avaliações. (Gráfico 1).
positivos, como a possibilidade de se utilizar os
Os cinco sites melhores classificados, segundo
dados de acidentes em planilhas eletrônicas e uma
os critérios estabelecidos nesta pesquisa, foram
boa ferramenta de pesquisa sobre a legislação de
os dos seguintes Detrans: Santa Catarina, Ceará,
trânsito. Porém, a falta de atualização das informa-
Bahia, Mato Grosso do Sul e Piauí. Os cinco com
ções sobre os acidentes (os dados mais recentes são
pior classificação foram: Roraima, Amazonas,
de 2002) e a sua divulgação de forma incompleta
Amapá, Minas Gerais e Acre. A média geral dos 27
impossibilitam a utilização das informações de
Detrans foi de 3,4. Ressalta-se a inclusão do Detran
modo preciso e útil. A navegabilidade é boa, com
de Minas Gerais no último grupo, embora o Estado
fácil acesso às estatísticas e ao fornecimento de
possua a terceira maior frota do País.
telefones e endereços de e-mail dos responsáveis
Quanto aos aspectos das informações sobre os
pelas áreas técnicas, embora um pedido de infor-
acidentes de trânsito, se destacam positivamente
mações feito por e-mail à área de estatística não
Tabela 2 - Estatísticas de acidentes de trânsito nos sites dos Detrans (*)
Contém estatísticas de acidente de trânsito
15
55,6%
11
40,7%
1
3,7%
Apresenta os técnicos responsáveis pela elaboração das estatísticas
12
44,4%
15
55,6%
0
0,0%
Os relatórios podem ser utilizados em planilhas eletrônicas
1
3,7%
26
96,3%
0
0,0%
Ano da informação estatística mais recente 2000 Números de Detrans (**)
34
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 34
2001
2002
2003
2004
2 (12,5%) 2 (12,5%) 1 (6,3%) 6 (37,4%) 5 (31,3%) 16 (100%)
NÚMERO 5
16/7/2006 07:37:58
tenha sido respondido. Destaca-se a não utilização
deficiências relevantes, já que dados como a média
das planilhas estabelecidas pelo SINET.
de idade da frota, os custos e os indicadores que relacionam as fatalidades com a frota, população e
Conclusões
quilometragem percorrida não são apresentados,
Aproveitando-se da crescente demanda e da
em mais de 90% dos sites dos Detrans.
facilidade de divulgar informações pela internet,
Segundo estudo da Firjan (2002), a criação
importantes bancos de dados internacionais de aci-
de um e-gov eficaz é um processo complexo, que
dentes de trânsito procuram fornecer informações
envolve inúmeros fatores, a começar por uma re-
aos pesquisadores, aos gerenciadores das políticas
definição do papel do Estado como um prestador
públicas, às seguradoras e aos demais interessados.
de serviços. O fato de os portais serem concebidos
Atraem cada vez mais usuários aos seus sistemas
seguindo o organograma dos governos, e não as
e possibilitam comparações estatísticas entre
necessidades dos cidadãos, apenas transfere para
diversas situações, como faz o International Road
o mundo virtual a burocracia do mundo real, o que
Traffic and Accident Database (IRTAD), que con-
se convencionou chamar de e-burocracia.
centra as informações dos trinta países membros
Esta situação se repete quanto à forma como os
da Organization for Economic Co-operation and
Detrans e, possivelmente, outros órgãos de trânsito
Development (OECD).
apresentam as estatísticas de acidentes de trânsito
Verificou-se, em relação aos acidentes de trân-
na internet. Desperdiça-se, assim, uma grande
sito, que as informações nos sites dos Detrans, no
oportunidade de difundir e propiciar melhor enten-
Brasil, são incompletas e não padronizadas: 85,2%
dimento sobre a acidentalidade, sobretudo, face à
dos Detrans não apresentam as planilhas determi-
aceitação recorde da internet pelos brasileiros.
nadas pelo SINET. Dessa forma, a comparação de
Dados confiáveis são essenciais à melhoria das
dados entre os vários Estados e cidades não pode
condições de segurança no trânsito. Necessita-se
ser realizada de modo preciso.
que sejam coletados e difundidos por metodologias comuns por todos os órgãos envolvidos no sistema. A ausência de um eficiente banco de dados no Brasil
responsáveis pelas informações estatísticas, quan-
continua sendo uma grande limitação às atividades
do não existem, são de difícil acesso. Verificou-se
voltadas para a proteção da população.
Gráfico 1: Classificação dos sites dos Detrans
Aspectos básicos, como a apresentação de endereços, telefones e e-mails dos Detrans e dos
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 35
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
35
16/7/2006 07:37:59
Y
exclusão
TONY ESCALANTE
Temporada de caça ao vale-transporte 36
Nos primeiros meses de 2006, houve quatro propostas legislativas para transformar o pagamento do vale-transporte em dinheiro.
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 36
NÚMERO 5
16/7/2006 07:38:21
vale-transporte completou vinte
O
anos em dezembro de 2005, mas o inferno astral desse benefício prosseguiu no primeiro semestre
deste ano. No final de janeiro, houve uma primeira ameaça, ocorrida por meio da Emenda 72 ao Projeto de Lei 6272/2005, apresentada pelo deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA), que previa o pagamento do vale-transporte em dinheiro, determinando ainda que, sobre esse pagamento, não incidiriam encargos sociais. Devido à pressão que sofreu, a liderança do PFL recuou e optou por retirar o destaque da emenda. Em 16 de fevereiro, no entanto, o Diário Oficial da União surpreendeu o setor de transporte público urbano com a publicação da Medida Provisória 280/2006, contendo dispositivo que permitia ao empregador pagar em dinheiro o valor que subsidia os deslocamentos de assalariados de casa para o trabalho, e vice-versa. A ANTP, e o Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos (MDT), e a Frente Parlamentar do Transporte Público (FPTP) , além de sindicatos e centrais de trabalhadores, entidades empresariais se manifestaram contra a possibilidade de o pagamento do valetransporte ser feito em dinheiro, apontando vários problemas que essa sistemática acarretaria. Um deles seria o estímulo ao uso do transporte individual (automóveis e motos), com aumento de congestionamentos, demora nos deslocamentos e mais poluição. Além disso, a diminuição do número de passageiros nos ônibus, trens e metrôs desequilibraria as operadoras, dificultando os esforços para reduzir as tarifas, com o objetivo de promover a inclusão social nos grandes centros urbanos, incentivando o transporte clandestino. O grave problema que a Medida Provisória 280/2006 era tentar acabar com uma conquista do movimento social. Naquele estágio, o governo, aparentemente, havia compreendido ser um erro permitir
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 37
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
37
16/7/2006 07:38:25
Y
exclusão
o pagamento do vale-transporte em dinheiro e
o empregador de recolher os encargos sociais. Con-
resolveu recuar. Na sexta-feira que antecedeu o
tudo, o INSS tem entendimento diametralmente
Carnaval, 24 de fevereiro, revogou a possibilidade
oposto e quer que as empresas façam o recolhi-
de pagamento do vale-transporte em dinheiro. A
mento dos encargos. “Se o perdão for aprovado,
revogação foi feita por meio da Medida Provisória
corremos o risco de muitas empresas continuarem
283/2006, assinada pelo próprio presidente Lula,
pagando o vale-transporte em dinheiro, esperando,
pelo vice-presidente José Alencar e por nada me-
de quando em quando, o perdão do débito com
nos do que dez ministros.
o INSS por meio de uma lei”, diz o coordenador
No dia 27 de abril, porém, o deputado gover-
Na noite de 8 de junho deste ano, a emenda
à Medida Provisória 283, sugerindo novamente
do senador Gilberto Mestrinho foi votada des-
o pagamento do vale-transporte em dinheiro aos
tacadamente no plenário do Senado Federal e
trabalhadores. Dias depois, o parlamentar recuou
acabou derrubada.
devido a grande pressão das lideranças de pelo
De todo modo, nos corredores do Congresso
menos cinco dos maiores partidos da casa, inclu-
Nacional, parlamentares admitem que existe um
sive o próprio PT, e retirou sua emenda.
forte trabalho, sobretudo de bancos, construtoras
A proposta de Pimentel continha um agravante em relação a propostas anteriores: a determinação
porte em dinheiro. Também o documento Agenda Legislativa da
porte com uma parcela de 6% do salário do trabalha-
Indústria, editado pela Confederação Nacional
dor. O MDT exemplifica o impacto dessa medida em
da Indústria (CNI), incluiu o pagamento do
particular, mostrando que quem ganha um salário
vale-transporte em dinheiro como uma meta
mínimo - R$ 350,00 - receberia do empregador
do setor e combate projetos que modernizam
apenas R$ 21,00 para ir ao trabalho durante todo
o vale-transporte - em especial o Projeto de Lei
o mês. Em São Paulo, isso significaria poder fazer
5393/2005, do deputado Mário Negromonte, que
dez viagens de ônibus ou de metrô, e em Belém, no
busca modernizar o vale transporte. Esse projeto - aprovado no início de junho
No final de maio, surgiu a notícia de uma
pela Comissão de Viação e Transporte da Câmara
nova tentativa de mudar o vale-transporte, desta
- inclui como beneficiários do vale-transporte os
vez, no senado. O relator da matéria naquela
servidores estaduais e municipais; proibindo ao
época, no Senado, o senador Gilberto Mestrinho
empregador substituir o fornecimento do vale-
(PMDB-AM), formulou emenda à Medida Pro-
transporte por dinheiro e tipificando como este-
visória 283/2006, buscando validar os acordos
lionato a fabricação, a venda, ou qualquer outro
coletivos que estabelecem o pagamento do be-
meio de fraude do vale-transporte.
nefício em dinheiro, e, dessa forma, perdoando
O projeto também qualifica o vale-transporte
débitos referentes aos encargos desses benefícios.
como direito trabalhista e aumenta as sanções às
A mesma proposta havia sido sugerida pela
empresas que não concederem o benefício em sua
relatoria na Câmara Federal e foi derrubada no
forma original, e concede ao órgão gestor responsável
início de maio
pela comercialização do vale-transporte poderes para
Para o senador, mesmo pago em dinheiro, o benefício não se confunde com o salário, dispensando
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 38
e companhias telefônicas para pagar o vale-trans-
de que a empresa só participe do custeio do trans-
máximo, 15 viagens de ônibus.
38
nacional MDT, Nazareno Affonso.
nista José Pimentel (PT-CE) apresentou emenda
denunciar ao Ministério do Trabalho as empresas que ajam irregularmente quanto a esse benefício.
NÚMERO 5
16/7/2006 07:38:25
IMPACTOS
bidos por meio de outros dados disponibilizados
O vale-transporte se tornou realidade em
pela NTU. Em 2004, apenas 38% da administra-
1985, a partir de uma idéia concebida e proposta
ção direta federal adquiria vale-transporte para
pela ANTP para garantir que os trabalhadores de
seus empregados; nas Forças Armadas, esse
menor poder aquisitivo pudessem ter acesso ao
índice era de 24%. Em 2005, o quadro se tornou
transporte público, mesmo diante da rapidez com
ainda pior: tanto na administração direta como
que, na época, evoluía a inflação. E é importante
nas Forças Armadas, o índice de aquisição do
notar que se trata de um subsídio ao trabalhador,
vale-transporte caiu para 20%.
e não às operadoras.
Considerando ainda 2005, em outros setores
Ao viabilizar o acesso do trabalhador ao
da administração pública federal, o uso do vale-
transporte, os vales-transporte fizeram cair o ab-
transporte se mantinha acima de 50%: escolas
senteísmo decorrente da falta de recursos do tra-
(53%), autarquias (50%) e bancos federais (57%).
balhador para seus deslocamentos e praticamente
O relatório assinala que, em função de obrigação
eliminou ocorrências como os ‘quebra-quebra’,
legal, instituições estaduais e municipais continuam
que haviam se tornado rotina, sobretudo, nos
oferecendo o vale-transporte a seus funcionários,
momentos de reajustes tarifários não coincidentes
com poucos casos de desobediência.
com reajustes salariais. O temor dos que acompanham a evolução
DEBATE NECESSÁRIO
do transporte público urbano é de que o traba-
Examinando os fatos do primeiro semestre
lhador, ao receber o auxílio para o transporte
de 2006 e também as tentativas anteriores de
em dinheiro, direcione esse recurso para suprir
reduzir a abrangência do benefício - algumas
outras necessidades da família, como se fosse
delas, como se viu, com êxito -, percebe-se que
um aumento real de salário, e, depois, acabe sem
há questões que não podem ser escamoteadas.
dinheiro para ir trabalhar.
Por trás da reação empresarial ao vale-trans-
Medidas que alteram o vale-transporte trazem
porte existem problemas reais, sobretudo, a
conseqüências também para as operadoras do
dificuldade operacional e o custo financeiro
setor. O relatório Vale-Transporte, 20 anos, edi-
das empresas para a compra do vale-transporte
tado pela Associação Nacional das Empresas de
e para fazê-lo chegar ao trabalhador. De certa
Transporte Urbano (NTU) e disponível no portal
forma, o setor se acostumou com a idéia de
da entidade (www.ntu.org.br), revela que, em
ter uma clientela cativa, e pouco é feito para
2005, 43,7% dos passageiros utilizaram o vale-
melhorar a qualidade do atendimento - falha
transporte para pagar a passagem nas viagens de
que precisa ser urgentemente sanada.
ida e de volta entre a residência e o trabalho.
Com a autoridade de quem, há 20 anos,
Em 14 de dezembro de 1998, a Medida Provi-
foi a propositora da idéia.do vale-transporte,
sória no 1.783 (que viria a ser reeditada 36 vezes
a ANTP acredita que essa questão deva ser
nos anos seguintes) e o Decreto no 2.880, que a
urgentemente colocada na pauta de discussão
regulamentou, extinguiram a obrigatoriedade da
do setor, num amplo debate, com a participação
aquisição do vale-transporte para os servidores
daqueles que têm se esforçado para manter o
públicos federais, abrindo a possibilidade de que o
benefício tal como foi concebido, mas também
valor do benefício fosse incorporado ao salário.
com a presença dos segmentos se sentem de
Os efeitos daquela medida podem ser perce-
alguma maneira prejudicados.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 39
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
39
16/7/2006 07:38:25
2
crônica
ÃO
Ç RA ST ILU KA RI N O
CC RO
O melhor modo de chegar às maravilhosas paisagens do
Rio de Janeiro P O R LUIZ HENRIQUES NETO
No final de O Estrangeiro, de Camus, Mersault pensa que muito sol ‘na moleira’ leva a gente a fazer coisas
a modernidade chegando ao Brasil junto com
estranhas. Talvez ele tenha uma certa razão e,
acreditem ou não, teve gente que foi até lá só
por isso, todo mundo se torne tão bem-educa-
para poder andar de trem no subterrâneo e vol-
do na estação de metrô. Até a linha amarela é
tar contando vantagem. Era sensacional, uma
respeitada. E isso numa terra onde cinqüentões
conquista da engenharia, era fabuloso etc., etc.
bigodudos e mal-encarados entram nas filas
Tivemos que aturar isso quase um ano, quando
de caixa preferencial ou então querem passar
inauguramos a ponte Rio-Niterói e passamos
pelo caixa expresso de supermercado com um
a ter a nossa própria conquista de engenharia
carrinho cheio de cervejas, biscoitos, pizzas
para impressionar os outros.
congeladas e cem gramas de mortadela.
40
Mas se a ponte levou todo mundo para a
E nem se pode mais dizer que é a novida-
Região dos Lagos no fim de semana (e obrigou
de. Já lá se vão vinte e cinco anos, um quarto
as moças de Búzios a passarem a usar sutiã na
de século, com algo mais do que minhocas,
praia; que droga!), ir até o trabalho continuou
segredos e esqueletos embaixo de nossos pés.
sendo muito difícil. Ainda mais tendo que
Mas no princípio, era algo de assombrar. Era
atravessar todos aqueles canteiros de obras.
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 40
a tevê em cores. São Paulo saiu na frente e,
NÚMERO 5
16/7/2006 07:38:25
Porque o centro da cidade parecia uma tela
conquistadores, como o cinema nos tinha en-
de videogame – aqueles de plataforma. Era
sinado que havia nos subterrâneos.
tapume para lá, tapume para cá, e tábuas,
Desde aquele percurso de três minutos
muitas tábuas, para passar de uma plataforma
entre as duas primeiras estações, nunca vi
de madeira à guisa de calçada para outra. E os
ninguém fumando no metrô. Numa época
anos passavam e os buracos aumentavam, o
em que até cobradores e motoristas fumavam
Senado Federal era demolido, o Café Lamas
em ônibus, era inacreditável. Todos respeita-
se mudava do Largo do Machado para onde
vam a linha amarela (“Não ultrapasse a faixa
está até hoje, cinemas eram derrubados, e a
amarela”). Ninguém grafitava nada. Ninguém
cidade permanecia intransitável. Oh, céus! O
quebrava nada. Os responsáveis pelos trens
que tínhamos feito (além de inventar a tanga,
descobriram algo óbvio: trate as pessoas bem e
é claro) para merecer tamanha provação? Por
elas retribuirão na mesma moeda. Uma verdade
que os paulistas podiam passear enquanto
Confuciana: pague o bem com o bem, e o mal,
suávamos no meio de todos aqueles canteiros
com a justiça.
de obras enlameados?
E o tempo passou, tanto para nós como
Mas a origem de nossos infortúnios não
para os trens. Mas eles continuaram rodando,
era, afinal, a invenção da tanga, já que, mais ou
inteiros e limpos. E quase sempre no horário.
menos na mesma época da breve popularidade
A Linha 2 levou o metrô para a Zona Norte,
do topless nas areias de Ipanema, começou um
tornando-o, enfim, realmente um transporte de
rumor de que finalmente algo se movia nas en-
massa e, ainda assim, mesmo com tanta gente
tranhas da cidade: entre a Glória e a Cinelândia,
se espremendo nos vagões, eles continuaram
as primeiras estações a ficarem prontas.
inteiros. Nada quebrado, nada largado. Até hoje, na hora do rush, ainda é possível ver
O metrô tinha que começar sendo o caminho para a Glória
os assentos preferenciais vazios, com tantos
Da Glória para a Cinelândia, são dez minu-
acreditar em Albert Camus.
bigodudos cinqüentões em pé. Dá quase para
tos de caminhada. Mas eu aproveitava a ida ao
Os horários aumentaram e incluíram o do-
dentista para justificar pegá-lo. Assim, raciona-
mingo no Maracanã, que durante tanto tempo
lizava, poupava uma caminhada de dois quar-
foi o pior pesadelo do metrô. Mas mesmo as
teirões e meio até a Antônio Carlos para pegar
torcidas o deixaram inteiro. Mesmo o povo
o ônibus para o São Bento. É claro que quando
que vai todo ano no Reveillon. Que foi ver os
minha mãe me dava dinheiro para a passagem,
Rolling Stones. Que vai à praia todo domingo.
sabia que eu queria era ver a novidade.
Cortesia e respeito são sempre bidirecionais.
E que novidade! As estações eram todas
O metrô continua limpo, com ar-condi-
de mármore. O ar-condicionado, enfim o ar-
cionado, silencioso em comparação com a
condicionado! Quando o trem dava a partida,
barulheira do trânsito lá em cima, e em breve
eu soltava as mãos para conferir a suavidade
vai esticar até a praia de Ipanema. Não tem
da composição. “Nossa, dá para ficar em pé
tiroteio, engarrafamento, acidente. Só tem uma
se segurar”, eu pensava, enquanto dançava de
coisa em que ele ainda perde para o transporte
um lado para o outro, forçando uma barra para
de superfície: não tem as maravilhosas paisa-
depois poder contar para quem ainda não tinha
gens do Rio de Janeiro para se olhar durante
andado como tudo era fantástico embaixo da
a viagem. Mas ainda é a melhor maneira de se
terra. E sem robôs assassinos ou alienígenas
chegar a elas.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 41
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
41
16/7/2006 07:38:25
%
ambiente urbano
Em Curitiba, uma rua que não dorme Em Curitiba,uma rua permanece com suas lojas abertas todas as horas do dia. Pioneira como proposta de encontro e convivência no centro de uma grande cidade, a Rua 24 Horas tem uma importância adicional de que pouco se fala: foi o primeiro equipamento urbano a ser criado dentro de uma linguagem arquitetônica característica da capital paranaense, que inclui as estufas do Jardim Botânico, a Ópera de Arame e as mundialmente afamadas “estações-tubo”.
lguns dias antes do início da próxima
A
primavera, a Rua 24 Horas, em Curi-
Inicialmente, os arquitetos consideraram que o
tiba, estará completando 15 anos
sucesso de uma rua permanentemente aberta seria
de inauguração. Nesse período, se
a diversidade de uso. “A rua deveria oferecer de tudo
consolidou como ponto de encontro e convivência
um pouco”, diz Célia, explicando que essa intenção
dos curitibanos e cartão postal da cidade.
influenciou o fato de as lojas serem pequenas, “qua-
O projeto é uma idéia do arquiteto Jaime Lerner
se quiosques”. Desenvolvendo a proposta, o grupo
e foi desenvolvido e implantado em sua gestão como
acabou identificando alguns usos considerados
prefeito. Ele achava, na ocasião, que Curitiba já era
adequados: floricultura, farmácia, padaria, livraria,
dinâmica o suficiente para abrigar um equipamento
lojas de discos, entre outros.
desse tipo, inspirado em iniciativas vistas em suas viagens internacionais.
42
Um segundo passo foi definir a localização. A primeira idéia foi transformar a principal rua cen-
Três arquitetos participaram do projeto de
tral, a XV de Novembro, já, então, fechada para
criação da Rua 24 Horas. Abraão Assad era o coor-
pedestres. Mas os arquitetos perceberam que se
denador do grupo. Atuaram também Simone Soares
tratava de uma via com um comércio consolidado,
e Célia Bim, que, ainda hoje, trabalha no Instituto
cujos proprietários não poderiam ser obrigados a
de Pesquisa e Planejamento de Curitiba. Foi Célia
manterem seus estabelecimentos abertos o tempo
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 42
que nos contou a história dessa realização.
NÚMERO 5
16/7/2006 07:38:25
©2000 PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA/FOTO: NANI GÓIS/SMCS (0904-08A) NÚMERO 5
Miolo 5.indd 43
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
43
16/7/2006 07:38:27
ambiente urbano
FOTO SMCS
%
feitura não colocou dinheiro. Tudo foi financiado por aqueles que compraram as lojas para atuar no empreendimento”.
Arquitetura A Rua 24 Horas, com 120 metros de extensão e 12 metros de largura, é coberta e toda envidraçada, e tem uma forma arquitetônica agradável. “Curitiba é uma cidade fria, com muito vento, chove muito, então, também não teria como a rua acontecer se fosse aberta”. Os arquitetos optaram por uma solução metálica, tubular, projetando 32 arcos para permitir a cobertura. Era algo, de certa forma, inédito, numa época em que quase não havia na cidade equipamentos com esse material. “Foi um estilo que acabou marcando a gestão de Jaime Lerner, porque depois da Rua 24 Horas, eu e Abrão fizemos a estufa do Jardim Botânico, com outro tipo de material, mas com a mesma linguagem arquitônica”, conta Célia A primeira idéia do projeto era fazer da XV de Novembro a rua que nunca fecha
Bim, acrescentando que, em seguida, surgiram as estações-tubo e a Ópera de Arame.
todo. “E a rua somente teria sentido se 100% das
A arquiteta fala das dificuldades em lidar com o
lojas permanecessem abertas todas as horas do
material. “Nós apanhamos muito na época da cons-
dia. Não traria nenhum impacto uma rua que,
trução, porque não tínhamos empresa em Curitiba
durante a madrugada, tivesse uma loja aberta
que trabalhasse com estrutura metálica tubular.
seguida de cinco ou seis fechadas”.
Essa estrutura é toda arredondada. Então, eles
O problema da localização persistia. Teria que ser um lugar central, que fosse bem freqüentado.
Está em estudo a possibilidade de modifica-
A solução veio não com uma via já existente, mas
ção do material com que é feita a cobertura. “A
em uma diretriz de rua no próprio centro da cida-
rua foi toda feita em vidro facetado, cortadinho,
de, quase na divisa com o nobre bairro do Batel.
para que pudesse dar a curvatura que queríamos,
Os arquitetos não queriam que o equipamento
e isso gerou alguns problemas de infiltração de
corresse o risco de se deteriorar. “Tínhamos que
água em dias de chuva”, diz Célia, acrescentan-
ter a segurança de que não iria ser um espaço
do que existe a idéia de substituição do vidro
tomado pela prostituição ou por drogados”.
por policarbonato, um material já disponível há
Definida a localização, foi necessário resolver a parte legal do empreendimento. “Tivemos que
44
quinze anos, mas que foi desprezado por não ser suficientemente conhecido na época.
fazer passar um projeto de lei específico pela
Por pouco, a Rua 24 Horas não foi original-
Câmara Municipal, que concedeu a autorização”.
mente aberta à passagem de automóveis. “No
Outra questão foi o financiamento da obra. “A Pre-
começo, tínhamos essa idéia, mas achamos que
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 44
tiveram que criar calandras especiais na fábrica”.
NÚMERO 5
16/7/2006 07:38:29
iria ficar muito estreita a parte destinada aos
com participação dos lojistas, que programam
pedestres, e, então, preferimos que ela fosse
atividades promocionais, como semanas temáticas,
totalmente dos pedestres, para que as pessoas pu-
para motivar os freqüentadores.
dessem circular de uma forma bem tranqüila”.
Depois de uma década e meia, Célia Bim avalia
Os arquitetos criaram também uma atração
que a escolha do local foi adequada; a rua resultou
especial, os relógios colocados numa das entradas
familiar, freqüentada por estudantes e turistas, e
da rua com ponteiros que marcam as 24 horas
com bom fluxo todas as horas do dia. Muitas pes-
do dia. Cada um deles pesa cerca de 60 quilos.
soas desenvolveram o hábito de, ao regressarem do
Ambos permanecem iluminados à noite e são co-
cinema, teatro, show ou de uma festa, dar uma pas-
mandados por uma central eletrônica a quartzo.
sada na Rua 24 Horas para comer alguma coisa.
Internamente, em frente às lojas, existe espaço
A arquiteta admite que a proposta tomou um
apropriado para mesas. E há uma pracinha cen-
caminho que não foi o imaginado inicialmente
tral onde também existem mesas e, a pedido dos
por seus criadores. “Hoje, quase 80% da rua são
comerciantes, foi instalado um palco, utilizado
compostos de estabelecimentos de alimentação.
para shows de música.
Então, aqueles usos que gostaríamos e aquela diversidade pretendida desapareceram aos poucos. Não foi possível segurar; seria muito difícil para os
A Rua 24 Horas é administrada pela Urbani-
comerciantes, porque eles têm muitos custos, em
zação de Curitiba S/A (Urbs), que mantém um
razão de operarem o dia todo. Mas consideramos
escritório no local. Há uma organização interna,
que a rua encontrou a sua vocação”. FOTO: LUIZ COSTA/SMCS
A Rua, hoje
Inaugurada em 1992, a Ópera de Arame é um teatro circular, com estrutura tubular, transparente, localizado em uma cratera no Parque das Pedreiras
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 45
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
45
16/7/2006 07:38:35
ambiente urbano
A rua não tem estacionamento. Quem quiser
FOTO: CESAR BRUSTOLIN/SMCS
%
chegar até ela deve necessariamente circular por suas imediações. Com o tempo, foi preciso fazer adaptações nesse entorno, para atender às reivindicações de freqüentadores com necessidades especiais. Quando a rua foi concebida, não se pensou nela como um equipamento turístico. A Rua 24. Horas acabou adquirindo essa condição por aparecer nos cartões postais e publicações que falam da cidade. Há uma linha de ônibus turística que, por uma parada na Rua 24 Horas. “Hoje em dia, é muito difícil que alguém venha para Curitiba e não vá até essa rua. Até por causa de sua localização, próxima de vários hotéis. É fácil para as pessoas irem até lá caminhando”, diz Célia.
FOTO: VALDEACIR GALOR/SMCS
exigência de quem visita a cidade, acabou ganhando
Estufa do Jardim Botânico de Curitiba, inaugurado em outubro de 1991
Ela acrescenta que as pessoas que freqüentam a Rua 24 Horas se sentem seguras. Ela é fechada, protegendo do frio e da chuva, mas por ser um ambiente transparente, permite que as pessoas, à noite, vejam as estrelas e o luar. “Fico feliz porque acredito que a rua se recriou como um grande ponto de encontro”, conclui a arquiteta. Exemplo reforçam uma questão: se forem bem planejadas e adequadamente acompanhadas pelo poder público, pela iniciativa privada e pela própria comunidade, as vias exclusivas para pedestres podem dar bons resultados, melhorando a cidade, trazendo melhor qualidade de vida para a população, além de atrair
As estações-tubo facilitam o acesso aos ônibus FOTO: CESAR BRUSTOLIN/SMCS
A Rua 24 Horas e a Rua XV de Novembro
a simpatia dos turistas. Os quinze anos dessa iniciativa curitibana negam e reprovam cidades que, tendo avançado na mentalidade de fechar certos caminhos aos automóveis, entregando-os integralmente aos pedestres, decidem recuar, sob o frágil e falso argumento de que somente os veículos individuais são capazes de conduzir clientes para os estabelecimentos que participam de projetos de revitalização urbana.
46
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 46
Vista diurna de um dos acessos à Rua 24 Horas
NÚMERO 5
16/7/2006 07:38:46
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 47
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
47
16/7/2006 07:38:51
espressas
FOTOS BRUNA CALEGARI
Seminário Internacional Meio Ambiente e Mobilidade Urbana Durante três dias, de 15 a 18 de maio de 2006, em São Paulo, 35 especialistas brasileiros e estrangeiros debateram problemas e desafios decorrentes das estreitas correlações entre a necessidade de deslocamento nas cidades e a questão ambiental. Isso aconteceu durante o seminário internacional Meio Ambiente e
Jeff Kenworthy
Mobilidade Urbana, realizado pela Comissão de Meio Ambiente da ANTP e pelo Instituto Movimento. No encontro, apontou-se a gravidade da situação em termos do aumento da poluição local e global, com o acirramento das mudanças climáticas na Terra e o aumento dos acidentes de trânsito e dos congestionamentos nas cidades. Ficou claro também que os países em desenvolvimento, em especial, China e Índia, mas também o Brasil, não encontraram soluções para esses problemas. Diferentes participantes do encontro assinalaram que os problemas
Lew Fulton
identificados propõem desafios e tarefas para diferentes áreas, frisando que a cooperação interdisciplinar é o caminho para a busca de soluções. Temas. Na primeira metade do seminário, foram abordados temas nacionais por especialistas brasileiros. Depois, participaram os especialistas estrangeiros: Sérgio Sanchez, diretor do Programa de Iniciativa do Ar Limpo para a América Latina, do Banco Mundial; o pesquisador australiano Jeff Kenworthy, da Murdoch
Sérgio Sanches
University; Lee Schipper, chefe de pesquisas do Centro para Transporte e Meio Ambiente do World Resources Institute (WRI), e Lew Fulton, do Programa Ambiental das Nações Unidas. Nas sessões dedicadas a soluções, houve exposições sobre as novas propostas para Santiago do Chile, com um sistema de média capacidade sobre pneus integrado ao metrô da cidade. Foram também discutidos os novos corredores de ônibus no Brasil: em Curitiba, o corredor Tiradentes, de São Paulo, e a proposta do Transporte Expresso Urbano (TEU), da ANTP. Lee Schipper UITP. A coordenadora do Programa de Transporte Sustentável da União Internacional de Transporte Público (UITP), Heather Allen, fez uma apresentação sobre como vem funcionando a Rede de Transporte Sustentável InternacioBRUNA CALEGARI
nal, coordenada pela UITP e da qual a ANTP participa desde o início, e que tem também a adesão de algumas organizações brasileiras. Allen com Jurandir Fernandes
48
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 48
NÚMERO 5
16/7/2006 07:39:05
Linha de ação ambiental para a ANTP BRUNA CALEGARI
No seminário internacional Meio Ambiente e Mobilidade Urbana, realizado em São Paulo em maio, a Comissão de Meio Ambiente da ANTP apresentou e discutiu com o plenário um documento contendo propostas para sua linha de ação em futuro imediato. O texto final, incorporando os resultados desse debate, será publicado em breve. O documento alinha 25 pontos Laura Ceneviva
concernentes às seguintes diretrizes: Incentivar
a utilização do transporte público e do transporte não motorizado; Promover a utilização de veículos de baixo impacto poluidor; Desincentivar a utilização do transporte individual, Promover o adensamento das áreas centrais e controlar a dispersão urbana; Promover a gestão ambiental urbana, e Promover a disseminação de informações sobre meio ambiente nos setores de Transporte, Trânsito e Planejamento Urbano. A presidente da Comissão, Laura Lúcia Vieira Ceneviva, disse ter sido muito positivo e animador o interesse do público em debater os tópicos do documento.
Livro organiza informações sobre transporte e meio ambiente O consultor da ANTP e diretor do Instituto Movimento, Eduardo Alcântara Vasconcellos, lançou o livro Transporte Urbano e Meio Ambiente, que busca organizar temas e informações sobre esses dois grandes temas. O autor frisa que não se trata de uma obra intelectual. “O livro procura definir melhor alguns conceitos, organizar determinadas idéias sobre os dois assuntos e resumir alguns estudos que foram feitos em diversas partes do mundo e também no Brasil. Ele acentua que a leitura é simples. “Não há nada muito complicado. Acho que qualquer pessoa, mesmo que não circule muito pela área técnica, vai entender 95% do que está escrito lá. Pelo menos, procurei evitar que houvesse esse tipo de dificuldade, porque o objetivo é disseminar e facilitar o conhecimento”. Editado pelo próprio autor, o livro está à venda por meio do endereço: eavas@ uol.com.br <mailto:eavas@uol.com.br> e na ANTP.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 49
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
49
16/7/2006 07:39:09
espressas
Marcopolo firma acordo para joint venture na Índia Em maio de 2007, entrará em operação a joint venture formada no início de maio de 2006 pela brasileira Marcopolo S/A e pela Tata Motors Limited, a maior montadora de veículos da Índia. Com investimento inicial de 13 milhões de dólares, o principal objetivo desse empreendimento será a montagem e comercialização de ônibus rodoviários, urbanos, mini e microônibus para o mercado indiano e para exportação. A Marcopolo participará com 49% do capital social, e a Tata, com 51%; e a gestão será compartilhada entre
ANTP vai acompanhar orçamento da União A ANTP foi a primeira entidade do Brasil a receber da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional a senha para ter acesso completo aos dados do programa Siga Brasil - uma base de dados ligada ao Sistema de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi), que permite acompanhar a execução do orçamento da União, incluindo informações sobre as emendas dos parlamentares ao orçamento e o detalhamento da própria peça orçamentária. A entrega da senha ocorreu em maio de 2006. Os representantes do Escritório da ANTP em Brasília passaram por um treinamento para saber como consultar o Siga Brasil.
as duas empresas. Caberá à empresa brasileira aportar tecnologia para a montagem das carrocerias, incluindo design,
Debate nacional sobre licitações
métodos, processos e a gestão industrial,
A licitação do transporte público urbano constitui uma
enquanto a organização indiana fornecerá
determinação legal e deve mesmo ser utilizada como
os chassis e será responsável pela comer-
instrumento de qualificação dos sistemas. “Não adianta
cialização dos ônibus completos. A receita
fazer uma licitação, se não houver um plano de organiza-
da joint venture prevista para o primeiro
ção do transporte”, disse o presidente da ANTP, Rogério
ano é de 98 milhões de dólares, devendo
Belda, ao indicar o que, no seu entender, foi um impor-
alcançar, no quinto ano de atividade, uma
tante ponto de convergência obtido no Seminário Nacional
receita de 395 milhões de dólares.
de Licitação e Contratação de Serviços de Transporte Público Coletivo, em Natal, no dia 19 de maio de 2006 - iniciativa conjunta do Ministério das Cidades e da prefeitura daquela capital, por meio da Secretaria Municipal de Transporte e Trânsito (STTU). Além do presidente da ANTP, o encontro teve como expositores e debatedores representantes da Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade (Sembob), vinculada ao Ministério das Cidades, e também secretários municipais, representantes de universidades e consultores. A primeira edição desse seminário foi realizada em novembro de 2005, em
Com unidades de produção no Brasil e no Exterior, a Marcopolo oferece aos clientes mais de 30 modelos ônibus, incluindo rodoviários, urbanos, microônibus e mini-ônibus.
50
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 50
Belo Horizonte. Um relatório com a síntese dos debates travados naquela ocasião está disponível no portal do Ministério das Cidades, na Internet.
NÚMERO 5
16/7/2006 07:39:22
Corredor metropolitano de SP melhorou, na avaliação da população A Pesquisa da ANTP - Imagem dos Transportes na Região Metropolitana de São Paulo revela que,em 2005,comparativamente com 2004,o Corredor São Mateus-Jabaquara foi o único modo de transporte público que melhorou, na avaliação de seus usuários, recebendo 88% de aprovação (eexcelente ou bom) contra 80% de aprovação em 2004. Os outros modos se mantiveram em patamares praticamente iguais aos da pesquisa anterior, exceção feita ao sistema de ônibus da Capital, que registrou queda mais acentuada,de 61%para 52%.Veja no quadro a evolução dos principais sistemas nos últimos cinco anos. Para a pesquisa de 2005, foram entrevistadas 2.300 pessoas com mais de 16 anos, de todas as classes sociais, entre 18 de outubro e 26 de novembro de 2005. Entendimento. O presidente da ANTP, Rogerio Belda, disse que a pesquisa deve ser entendida como um indicador daquilo que os usuários dos sistemas de transporte público percebem e valorizam, e não um julgamento dos sistemas. E, mostrando um gráfico com as oscilações na avaliação dos diferentes sistemas nos últimos anos, considerou que as respostas também sofrem, em alguma medida, influência das oscilações no estado de ânimo da população, ‘que, em certos momentos, é mais crítica, e em outros, menos crítica’. Ele também afirmou que a intensificação do processo de integração entre os sistemas da RMSP – a transferência livre entre metrôs e trens, a adoção do bilhete único nos ônibus municipais e, mais recentemente, nos sistemas sobre trilhos – inauguram o processo de transformação da mobilidade e já estão exigindo novos esforços metodológicos para a compreensão da realidade do setor. A pesquisa revelou que 56% dos entrevistados moradores da Capital usam o bilhete único; entre moradores das demais áreas da RMSP, o índice chegou a 37%. Para os usuários, as duas principais vantagens do bilhete único são a possibilidade de pegar vários ônibus com uma só passagem (78%) e passar mais rápido na catraca (48%). Um resumo da pesquisa pode ser encontrado no Portal da ANTP (wwww.antp.org.br).
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 51
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
51
16/7/2006 07:39:23
espressas
Seminários discutirão tendências e desafios da mobilidade urbana A ANTP, com o apoio do BNDES, promoverá nos próximos meses quatro seminários gerenciais sobre o tema Panorama da Mobilidade Urbana no Brasil: Tendências e Desafios, nas cidades de São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife. O calendário será oportunamente publicado no Portal da ANTP (www.antp.org.br]. Cerca de 120 secretários dirigentes e técnicos de alto nível dos segmentos de transporte urbano e trânsito - 30 por cidade - terão acesso a essa atividade, cujo objetivo é aprofundar uma análise das tendências do setor a partir de dados obtidos em escala nacional pelo Sistema de Informações da Mobilidade Urbana, estruturado pela ANTP. Tendências da mobilidade. Desde 2003, o Sistema de Informações reúne dados de 437 municípios de todo o País, que tenham mais de 60 mil habitantes, referentes ao trânsito e ao transporte coletivo municipal e intermunicipal por ônibus, trens urbanos e metrôs. Para esses seminários gerenciais, os dados foram tabulados de forma a permitir uma leitura dos mais importantes indicadores nacionais, em contraposição com as necessidades locais. “Procuramos facilitar a compreensão de tendências da mobilidade nas cidades e a identificação de desafios fundamentais para o setor”, assinalou Marcos Pimentel Bicalho, superintendente da ANTP, acrescentando que isso vai propiciar uma reflexão sobre medidas estratégicas a serem adotadas para melhorar as condições de vida nessas cidades. Atividades. Os seminários terão duração de dois dias - sempre uma sexta-feira e um sábado -, com 16 horas de atividades. Os trabalhos serão iniciados com uma apresentação resumida dos dados do Sistema de Informações, realizada por consultores da ANTP. Em seguida, em plenárias ou em grupos, os participantes desenvolverão atividades de reflexão monitoradas, sempre voltadas para a identificação e superação de desafios que estão colocados para os dirigentes municipais e operadores dos serviços.
52
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 52
NÚMERO 5
16/7/2006 07:39:28
Recomendações para a Região Metropolitana de Belém A Diretoria Regional Norte da ANTP está coordenan-
dentro desses preceitos. Defende a instituição de
do o detalhamento da carta final do Seminário sobre
uma autoridade metropolitana de transporte, de
Transportes Públicos na Região Metropolitana de
sustentação jurídica e técnico-operacional, de modo
Belém (RMB), promovido em abril pela Assembléia
a possibilitar a participação de todos os municípios
Legislativa do Estado do Pará e pela Câmara Muni-
da RMB. Quanto às tarifas, sugere que o Estado e
cipal de Belém, com a participação dos outros muni-
os municípios avaliem sua contribuição para desone-
cípios da região: Ananindeua, Marituba, Benevides e
ração dos custos do transporte público na linha da
Santa Bárbara. O vice-presidente da ANTP, Jurandir
redução dos tributos e das taxas incidentes sobre
Fernandes, participou do encontro, que teve coorde-
o serviço. Outras propostas: a criação da Frente
nação técnica da diretora regional Norte da ANTP,
Estadual Parlamentar pelo Direito ao Transporte
Patrícia Bittencourt Neves. O documento final salien-
Público - FPDT, uma comissão para acompanhar as
ta que o transporte público deve ser instrumento de
condições dos sistemas de transporte e o estudo
desenvolvimento, de qualidade de vida e equidade no
da possibilidade de criação de uma regional do
uso dos espaços públicos de mobilidade, e reivindica
Movimento em Defesa do Transporte Público de
a união de esforços para a conquista de objetivos
Qualidade (MDT).
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 53
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
53
16/7/2006 07:39:29
T
m ã o
d u p l a
não
TRANSPORTE E TRÂNSITO: WALDOMIRO FANTINI JÚNIOR, engenheiro
desemprego, tivemos um repentino surgimento
Diretor de Transportes da Empresa Municipal de Desenvolvimento Urbano e Rural de Bauru (Emdurb), de Bauru-SP
da informal atividade de transporte de passageiros por meio das motocicletas. Nessa época, chegamos a ter mais de 1500 moto-taxistas exercendo
A cidade de Bauru, localizada no centro-oeste
Este novo serviço trouxe consigo graves
mada em 350 mil habitantes, possui uma presença
problemas ao sistema viário, acidentes, pertur-
marcante no setor educacional e é um importante
bação do sossego nos pontos de concentração da
pólo comercial e de prestação de serviços.
atividade e, em alguns casos, o favorecimento de
sim
De 1997 a 1999, principalmente em função de
Embora com um bom sistema de Transporte
lidade na aquisição de motos e do alto índice de
Coletivo, o município regulamentou a atividade
LUCIANO LINHARES, engenheiro eletricista Ex-presidente da Companhia de Transporte Coletivo de Fortaleza e autor da primeira lei de regulamentação do sistema de mototáxi do Brasil
lhada e oficial do “Sistema de Mototáxi” no Brasil ocorreu na cidade de Sobral, Zona Norte do Ceará, por meio da iniciativa do autor deste texto, quando, exercendo mandato de vereador e a presidência
Antes de responder à pergunta formulada por
do Conselho Municipal de Transportes Urbanos
esta sessão, a pessoa deve se informar da origem e
– Comtur, na cidade de Sobral-CE, em maio de
do porquê do surgimento do serviço de mototáxi
1996, criou o Projeto de Lei Nº 110/96, que, após
no Brasil. Deve também conhecer e entender as
ser aprovado, se tornou a Lei Municipal de Sobral
diferentes realidades econômicas, culturais e de
Nº 073/96, promulgada em 03.09.1996, que “Dis-
mobilidade disponíveis à população das diversas
põe sobre o Regulamento do Serviço de Mototáxi
regiões do País, observando os diferentes tipos e
e Moto-entrega do Município de Sobral”.
tamanhos de cidades, inclusive, suas topografias
Assim como em Sobral, o serviço de mototáxi
e os seus traçados urbanos, em especial, os das
surgiu em centenas de cidades do Brasil para
vias públicas.
democratizar a mobilidade e suprir a deficiência
Historicamente, a lembrança de utilizar a
nos sistemas de transportes públicos, em espe-
motocicleta para fazer o transporte de pessoas
cial, das pequenas e médias cidades, bem como
mediante pagamento ocorreu na cidade de Cra-
de áreas específicas das grandes metrópoles do
teús, no interior do Ceará, no início de 1996.
nosso país.
Daí surgiu um insipiente Decreto da Prefeitura
As motos são veículos adequados para um
de Crateús, com apenas dois ou três artigos,
serviço de transporte público, desde que seja
admitindo a existência do serviço.
regulamentado e rigorosamente fiscalizado, com
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 54
atividades ilícitas.
um modismo trazido de outras regiões, da faci-
No entanto, a primeira regulamentação deta-
54
esta atividade, sem qualquer controle.
do Estado de São Paulo, tem uma população esti-
base em uma lei municipal como a da cidade de
NÚMERO 5
16/7/2006 07:39:29
<
As motos são veículos adequados para um serviço de transporte público?
em 1999 e, a partir de então, tivemos um pequeno
619 acidentes envolvendo motocicletas, com 52
esfriamento da atividade, sendo que hoje contamos
vítimas graves e 6 mortes, sendo a grande maioria
com cerca de 400 clandestinos e 250 regulamenta-
de moto-taxistas.
dos; porém, as dificuldades continuaram.
Assim, entendemos que a soma de todos
O maior problema encontrado é que o próprio
os fatores envolvidos, isto é, a irreverência dos
“profissional” não considera este tipo de transpor-
condutores, o despreparo de passageiros em
te de forma séria, e, sim, como um eterno “bico”,
andar de moto, as más condições do veículo,
preferindo a informalidade. Na maioria das vezes,
dificuldades de fiscalização deste serviço, traz um
não consegue se regularizar por problemas de
risco iminente à sociedade, que, em um primeiro
antecedentes criminais, más condições ou falta
momento, prefere trocar a segurança pela rapidez
de documentação de sua motocicleta.
da viagem, aceitando com normalidade os riscos
De janeiro a abril de 2006, tivemos em Bauru
que esse tipo de transporte representa.
Sobral, a “lei-mãe” do sistema de mototáxi, que,
de mototáxi desconhecem estatísticas oficiais que
já em 1996, ao ser elaborada, regulamentou e
mostram que, dos acidentes envolvendo moto-
estabeleceu indispensáveis e cuidadosos crité-
ciclistas, apenas 2,8% envolvem mototaxistas e
rios de funcionamento do mototáxi, observando
seus passageiros (Fonte: Autarquia Municipal de
a necessária segurança no trânsito e a correta
Trânsito e Cidadania-AMC de Fortaleza).
utilização deste modal de transporte público, na qual se observa: • O limite do número de mototáxis, de acordo com o número de habitantes da cidade; • O adequado tipo e potência, bem como a idade máxima de uso das motocicletas; • A definição de limites máximos de velocidade de tráfego, em diferentes áreas; • A definição das áreas das cidades nas quais o mototáxi pode circular; • O uso de equipamentos de proteção do mototaxista e passageiro, inclusive, touca descartável para o capacete;
Na verdade, a grande quantidade de acidentes com motocicletas envolve motoboys de entrega de documentos e mercadorias nas grandes cidades, devido à alta velocidade com que trafegam, em busca de maior produtividade e ganho. Outro segmento envolvido nessa estatística é o dos condutores autônomos de motocicleta, que, principalmente por não serem fiscalizados, trafegam em alta velocidade, sem os cuidados e os equipamentos de proteção necessários e exigidos por lei. Portanto, ao contrário dos motoboys e dos condutores autônomos, o serviço de mototáxi não
• A exigência de qualificação, experiência mí-
contribui para a estatística de vítimas nem para o
nima, bons antecedentes e carga horária máxima
excessivo gasto com saúde nos acidentes de trânsito.
de trabalho dos mototaxistas, dentre outros.
O mototáxi é o mais revolucionário e democrático
Os que são contrários à existência dos serviços
meio de transporte público do Brasil.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 55
>
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
55
16/7/2006 07:39:30
legislação
E
ntrou em vigor em fevereiro de 2006 a Lei
de embriaguez, excitação ou torpor”, ou seja, passa a valer
Federal 11.275, que altera três artigos do
o testemunho do agente.
Código de Trânsito Brasileiro, possibili-
“Essa lei permite a elaboração de procedimentos que
tando a efetiva fiscalização para identificar
resultarçao numa fiscalização mais eficaz. Trata-se de
TONY ESCALANTE
condutores que apresentem sinais de embriaguez.
56
Uma mudança especialmente importante refere-se ao
(etilômetro, vulgarmente conhecido como bafômetro) e se
artigo 277. Um segundo parágrafo adicionado a esse artigo
delega ao agente a condição de comprovar oficialmente que
prevê que, em caso de recusa em se submeter aos testes, a
o motorista ingeriu álcool a ponto de não ter condições
infração poderá ser caracterizada por outras provas legais,
de conduzir o veículo. Isso quebra o argumento de con-
colhidas pelo agente de trânsito “acerca dos notórios sinais
dutores que mesmo apresentwando sinais de embriguez
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 56
uma mudança radical: deixa-se de usar apenas o aparelho
NÚMERO 5
16/7/2006 07:39:34
Mais rigor contra quem combina álcool e volante P O R MIGUEL DE OLIVEIRA
se recusam a soprar o bafômetro”, afirma Dulce Lutfalla,
do um ordenamento sobre a questão, a ser encaminhado
coordenadora do Grupo de Trabalho do Esforço Legal,
ainda em junho de 2006 para o Contran, de modo que se
vinculado à Comissão de Trânsito da ANTP.
produza uma resolução desse organismo a esse respeito,
Mas, como o agente de trânsito poderá distinguir ob-
com força de lei. A informação foi prestada no final de maio
jetivamente esses sinais? Com uma significativa ajuda da
pela coordenadora da Câmara Temática do Esforço Legal,
Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet),
Lea Mariza Stocchero Hatschbach. Essa câmara temática,
que desenvolveu um estudo a respeito – disponível no
como as outras cinco em funcionamento, é integrada por
portal da entidade, no endereço www.abramet.org.br – a
especialistas de todo o País e seu objetivo é justamente
Câmara Temática do Esforço Legal, órgão técnico vinculado
estudar e oferecer sugestões e embasamento técnico sobre
ao Conselho Nacional de Trânsito (Contran), está concluin-
assuntos específicos para decisões do Contran.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 57
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
57
16/7/2006 07:39:37
legislação
elaborando um norteamento eficaz porque a lei deve ser igual para todos, sem o risco de interpretações equivocadas”. explica. De acordo com a Abramet, com seis decigramas de álcool na corrente sangüínea, limite máximo permitido pela lei, o motorista começa a ter a coordenação motora prejudicada, com a perda de noção em julgar distâncias e da fraca sensibilidade a luzes vermelhas. “De maneira completamente equivocada, os motoristas alcoolizados pensam que tudo está sob seu controle ao volante, mas a euforia aumenta muito. Sob efeito do álcool, o motorista tende a desenvolver maior velocidade, embora tenha menor condição de controlar o seu automóvel. Assim, ABLESTOCK
arrisca a si próprio, quem está com ele no carro, ocupantes de outros veículos e também pedestres”, diz Cristina Badini, presidente da Comissão de Enquanto a regulamentação nacional não sai,
Trânsito da ANTP.
pelo menos dois conselhos estaduais de trânsito
Segundo ela, ampliar o rigor contra a prática
– os do Paraná e do Rio Grande do Sul – já se
de dirigir alcoolizado é um passo importante para
anteciparam, instituindo mecanismos próprios.
aumentar a segurança no trânsito. A especialista
Na verdade, a lei, no seu corpo, não exige uma
também considera um avanço o pedido dos fabrican-
regulamentação, porém especialistas concordam
tes de bebidas, nos meios de comunicação, para que
ser adequado que haja um procedimento uni-
as pessoas não se excedam no álcool. De todo modo,
forme de todos os órgãos de trânsito “Por essa
assinala que outras medidas ainda têm que ser
razão é importante que a resolução saia o mais
adotadas, mencionando como exemplos, a proibição
rapidamente possível”, frisa Dulce Lutfalla.
da venda de bebidas alcoólicas em estabelecimento
Contra a ampliação do rigor, tem-se ouvido um argumento insistente: a possibilidade de
localizados junto às rodovias e maior agilidade para os julgamento dos crimes de trânsito.
que policiais despreparados possam cometer não usam bebidas. “Acho uma preocupação
Testes darão objetividade à análise de motoristas alcoolizados
exagerada, quando sabemos que pelo menos
O texto de resolução a ser apresentado ao
um terço dos motoristas e motociclistas mortos
Contran ainda não está concluído, mas, obser-
nas ruas e rodovias apresentam níveis de álcool
vando o estudo da Abramet, é possível entender
acima do limite legal”, responde o deputado
como podem ser identificados pelos agentes de
Beto Albuquerque, autor do projeto que se
trânsito os sinais objetivos de que uma pessoa
transformou na Lei Federal 11.275.
está alcoolizada.
abuso, testemunhando contra motoristas que
58
Lea Hatschbach observa que os casos de abu-
O hálito de bebida é um indicativo, mas o
sos são passíveis de serem apurados. “Estamos
estudo da Abramet concede importância relativa
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 58
NÚMERO 5
16/7/2006 07:39:47
a esse sinal, pois é reduzida a correlação entre a
permancer com os olhos abertos e depois fechados.
intensidade do odor de álcool no hálito e sua con-
Em condições normais, o equilíbrio não se altera.
centração sanguínea.
Quando embriagada, a pessoa oscila, tendendo a
Para identificar sinais de alcoolemia, é impor-
cair para um dos lados.
tante verificar a aparência da pessoa examinada:
Outro teste é andar em linha reta. Pede-se ao
se apresenta, sonolência face congesta, olhos ver-
examinado que, com os olhos abertos, caminhe
melhos, vômitos, soluços, desordem nas vestes e
em determinado sentido, e que retorne em seguida
pupilas dilatadas. É importante também observar
sobre seus passos ou mude de imediato a direção
se a atitude é agressiva e/ou arrogante e se a pessoa
da marcha. Segundo o estudo, a marcha da pessoa
está exaltada, falante ou deprimida. Outro indicati-
sob efeito do álcool “caracteriza-se pelo aumento
vo é a orientação, ou seja, o examinado saber onde
da base de sustentação e tendência a desvios de
está, a data ou que horas são.
direção, incoordenadamente corrigidos”.
Submeter a pessoa a perguntas objetivas permi-
Há ainda testes que permitem avaliar a coor-
te uma avaliação da memória – se sabe onde mora,
denação dos movimentos. Um deles, denominado
se lembra de atos que tenha praticado – e verificar
Diadococinesia, consiste em pedir que o examinado
se é capaz de sair-se bem num prova de cálculo
proceda à inversão sucessiva da situação das mãos:
simples. Outro sinal a ser buscado diz respeito à
“os membros superiores são estendidos para frente
expressão: se o examinado fala com clareza e se tem
e a superfície palmar de ambas as mãos é voltada
condições de ler o trecho de um texto de jornal.
para baixo e para cima sucessivamente e no plano horizontal”. Na prova Índex-nariz, é pedido ao examinado para estender e encolher os braços e, a seguir, colo-
treinados. Um deles, denominado Equilíbrio Está-
car os dedos indicadores no nariz, repetidamente,
tico (Sinal de Romberg), consiste em pedir ao exa-
primeiramente, com os olhos abertos e, em seguida,
minado que permaneça de pé por dois minutos com
com os olhos fechados. Durante o movimento,
os pés posicionados paralelamente, bem próximos
observa-se a harmonia, a medida e o aparecimento
mas sem se tocarem. Primeiro, o examinado deve
de tremores.
ILUSTRAÇÃO KARIN ROCCO
Sobriedade. O estudo indica alguns testes de sobriedade que podem ser aplicados por agentes
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 59
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
59
16/7/2006 07:39:47
à
atlas
Londres
Um novo momento do sistema de ônibus N
o início de maio de 2006, todos
As autoridades londrinas acreditam que os ônibus
os ônibus na linha 127, entre os
sejam a melhor opção para o crescimento da oferta
bairros de Purley e Tooting, ao sul
de transporte público na cidade, em curto prazo. As mudanças no sistema estão sendo viabilizadas dentro de um plano estratégico municipal
horários dessa rota foi revisada. Este foi apenas
definido no início da década, e que, entre outras
um dos itens do cronograma de transformação e
medidas, trouxe a instituição de cobrança de pedá-
ampliação do sistema de ônibus da capital inglesa.
gio para automóveis no centro da cidade. O pedágio
ABLESTOCK
de Londres, foram substituídos por
modernos veículos de dois andares, e a grade de
60
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 60
NÚMERO 5
16/7/2006 07:39:58
urbano foi posto em prática com êxito em 17 de fevereiro de 2003 e conseguiu reduzir o tráfego na área central. Por lei, todo o dinheiro levantado com o pedágio urbano é obrigatoriamente utilizado em investimentos em infra-estrutura do transporte. Por se tratar de uma iniciativa que fatalmente acarretaria maior necessidade de transporte público, o pedágio urbano foi acompanhado por uma série de medidas concebidas para tornar o transporte “mais fácil,
operadores privados, os quais trabalham sob con-
mais barato, mais rápido e mais confiável”. Esse
trato com a London Buses. A cada dia de semana,
empenho é aplaudido, mas há críticas quanto ao
os 6.800 ônibus do sistema londrino carregam em
carregamento dos sistemas no horário do rush, além
torno de seis milhões de passageiros em mais de
do que, dependendo de para onde se vá, a passagem
700 diferentes linhas.
pode custar 3 libras – um preço salgado, mesmo para os padrões londrinos. O diretor de operações da autoridade de transporte da capital, a Transport
Mudanças ‘aposentam’ os Routemasters
for London (TfL), Mike Weston, informa que to-
A modernização do sistema londrino de ôni-
dos os novos ônibus, com design atualizado, são
bus determinou a aposentadoria de um marco da
plenamente acessíveis e garantem aos passageiros
cidade: os velhos Routemasters, ônibus de dois
uma viagem mais cômoda através da cidade. Ele
andares com um característico design pós-guerra,
apresenta dados que confirmam o esperado cresci-
que estiveram em operação regular entre julho de
mento da demanda em anos recentes: “Houve um
1954 (quando começaram a substituir os bondes
aumento de 39% no número de passageiros nestes
elétricos, também de dois andares) até dezembro
últimos cinco anos, e as modificações no serviço
de 2005.
de ônibus são somente parte da nossa resposta à demanda crescente na rede”.
Esses ônibus eram atendidos por um cobrador, além do motorista, e tinham como característica o
Tal taxa de crescimento está alinhada com a
fato de não possuírem portas e, sim, uma platafor-
estratégia da administração municipal londrina,
ma traseira, aberta, o que levava muita gente a se
que projetou crescimento de 40% no uso do
acidentar na tentativa de subir ou descer do veículo
transporte público entre 2001 e 2011, a partir
em movimento, angariando para os Routemasters a
de um investimento da ordem de 84,6 milhões
pecha de perigosos. A plataforma constituía obstá-
de libras (aproximadamente, R$323 milhões, em
culo para quem se locomove em cadeiras de rodas
valores atuais).
ou conduz carrinhos de bebês.
A empresa London Buses, sob autorização da
“Embora estejamos melhorando a rede de
Transport for London (TfL), administra o serviço
ônibus introduzindo ônibus novos e acessíveis, os
de ônibus. Suas atribuições compreendem não
Routemasters não desaparecerão”, informa o site da
apenas o planejamento das linhas como também a
TfL, assegurando que duas linhas de natureza turís-
especificação e fiscalização do padrão de qualidade
tica, na parte central da cidade, serão atendidas pelo
dos serviços, e, ainda, a responsabilidade pelos
modelo. Os veículos que servirão a essas rotas foram
terminais e pontos de paradas, e outros suportes
repintados para lembrar o visual que, nos anos 60,
necessários. Os serviços de ônibus estão a cargo de
fez deles um ícone mundial da cidade.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 61
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
61
16/7/2006 07:40:12
arquivo
Linha de bondes ajuda a revalorizar centro de Santos
FOTOS DIVULGAÇÃO
P O R FRANCISCO ÂNGELO
62
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 62
NÚMERO 5
16/7/2006 07:40:13
A
A cidade de Santos, no litoral paulista, tem
motivos de sobra para se alegrar neste início
de uma linha turística de bondes, inaugurada em setembro de 2000.
de século. E não é só por causa do time de
Os veículos elétricos percorrem atualmente
futebol da cidade, que voltou a ganhar títulos
um circuito de 1.700 metros, sendo que já está
depois de longo jejum. Também os bondes,
pronto um edital de licitação para ampliar a
que não eram vistos circulando pelas ruas
rede de trilhos e dormentes em mais 3.500
da cidade desde 1971, voltaram a fazer parte
metros. O bonde sai da estação Buck Jones,
do cenário santista, graças a um projeto de
na praça Mauá (sede do Paço Municipal) e
revitalização do centro histórico da cidade. O
passa pelas principais vias da região central,
programa, conduzido pela prefeitura, incluiu
área que representou o auge da economia da
como uma de suas principais ações a criação
cidade, centrada no porto e na economia do
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 63
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
63
16/7/2006 07:40:16
arquivo
café, e que depois experimentou um período
dado de “camarão”, devido à cor vermelha da
de decadência e estagnação.
parte externa. Ele é praticamente do mesmo
De acordo com o historiador de transporte e diretor da ANTP Cultural, Ayrton Camargo
modelo do primeiro veículo, com o diferencial de ser fechado.
e Silva, o projeto santista é um dos melhores
O “camarão” fez parte do segundo momen-
do País, pois alia a revitalização de um meio
to dos bondes santistas, quando a Companhia
de transporte com a revalorização de toda
City já não operava mais o serviço e todo o
uma região degradada, e também ajuda na re-
seu patrimônio foi encampando pelo, então,
tomada dos vínculos culturais e emotivos dos
recém-criado SMTC (Serviço Municipal de
moradores com a cidade. “É como se os pontos
Transportes Coletivos), em 1951. Visando
restaurados fossem perolazinhas. A linha de
aumentar a segurança e, principalmente, com-
bonde é o colar que une essas perolazinhas”.
bater a evasão de receita do sistema, a empresa
Nestes seis anos, a prefeitura santista
municipal iniciou a reforma e o fechamento de
estima que mais de 100 mil pessoas já passe-
praticamente toda a frota existente.
aram pela linha revitalizada. “É nossa atração
O sistema de bondes que existiu em Santos
turística mais visitada”, afirma Cleide Quin-
é considerado por muitos especialistas como um
tas, assessora de imprensa da Companhia de
dos mais eficientes e inovadores que existiu no
Engenharia de Tráfego (CET) de Santos, órgão
Brasil. Segundo Camargo e Silva, o sistema de
responsável pelos trabalhos de recuperação
numeração das linhas de bonde santistas obe-
e restauro dos bondes, que contaram com a
decia a uma lógica numérica, algo que inexistiu,
atuação de mais de vinte profissionais.
por exemplo, no sistema de bondes paulistanos. Além disso, existiam linhas para praticamente
Bondes históricos
todos os pontos da cidade. “Toda a cidade era
A CET de Santos restaurou diferentes
bem servida. O desmonte dessa rede foi um dos
modelos de bondes. O carro 32 e o seu rebo-
maiores crimes já cometidos contra um sistema
que, que inauguraram a atração em 2000, são
de transporte tão presente e tão eficiente”.
do tipo aberto e representam a primeira fase
O último veículo que foi restaurado e posto
destes veículos na cidade. Depois do Rio de
em operação na linha turística faz parte de uma
Janeiro, Santos foi a segunda cidade do País
nova fase do programa santista. Trata-se do
a instalar um serviço de bondes movidos à
bonde português 193, que estreou no começo
tração animal, em 1871. O carro-reboque,
de 2006. Ele integra um lote de três veículos
puxado pelo bonde 32, é uma réplica de um
doados, em maio de 2005, pelo Museu do
bonde a burro dessa época. Em 1904, a The
Carro Elétrico da cidade do Porto. Segundo
City of Santos Improvements Company, então
Cleide Quintas, o objetivo é “transformar San-
concessionária dos serviços de luz e gás da
tos numa espécie de museu vivo do bonde”.
cidade, assumiu o serviço de bondes e, cinco
Para tanto, Santos tem procurado, a exemplo
anos mais tarde, eletrificou o serviço, impor-
do Porto, outras cidades que possuam veículos
tando cerca de 20 unidades da firma Hurst
para doação.
Nelson, da Escócia. Outro bonde recuperado e entregue posteriormente, em 2002, é o de número 40, apeli-
64
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 64
Os outros dois bondes portugueses só entrarão em operação quando a linha turística for ampliada.
NÚMERO 5
16/7/2006 07:40:17
SERVIÇO. O bonde funciona de terça-feira a domingo, das 10 às 17 horas. A passagem custa R$0,50 e o embarque e desembarque se dão pela praça Mauá. O itinerário atual da linha de bonde turística de Santos é o seguinte: Praça Mauá, Rua General Câmara, Rua do Comércio, Largo Marquês de Monte Alegre, Estação do Valongo, Rua Tuiuti, Rua Barão do Rio Branco, Rua Augusto Severo e Rua Cidade de Toledo, retornando ao ponto original.
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 65
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
65
16/7/2006 07:40:18
arquivo
66
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 66
NÚMERO 5
16/7/2006 07:40:20
NÚMERO 5
Miolo 5.indd 67
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
67
16/7/2006 07:40:20
O n o v o S e n io r e s t a b e l e ce um a nova re f e rê nci a e m s e g u r a n ç a , a gi l i d a d e e e conom i a , Si m Se nhor.
68
movimento, MOBILIDADE & CIDADANIA
Miolo 5.indd 68
NÚMERO 5
w w w.mar c opol o.c om.br
16/7/2006 07:40:21