revista dos
Transportes Públicos ano 34, 3º quadrimestre 2011
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Associação Nacional de Transportes Públicos - ANTP
A ANTP, fundada em 1977, é uma pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, voltada ao setor de transporte público e do trânsito urbano do Brasil e que tem por objetivo desenvolver e difundir conhecimentos visando seu contínuo aprimoramento. Com sede na cidade de São Paulo, possui um escritório em Brasília e seis coordenações regionais - Espírito Santo, Minas Gerais, Norte, Nordeste, Paraná e Rio de Janeiro. Conta com associados de todos os segmentos – do setor público, da indústria, do setor privado, de operação de trans porte, das consultorias, dos sindicatos patronais e de trabalhadores, das universidades e de ONGs. A organização mantém em funcionamento 12 comissões técnicas e diversos grupos de trabalho que reúnem cerca de 300 técnicos que trabalham de forma voluntária sobre questões específicas produzindo, sistematicamente, projetos de grande significado para a mobilidade urbana. A ANTP promove, bienalmente, o Congresso Brasileiro de Transporte e Trânsito e, periodicamen te, seminários, cursos e outros eventos destinados ao debate e busca de soluções para os pro blemas de mobilidade nas cidades brasileiras. A ANTP edita a Revista dos Transportes Públicos, já no seu número 129, o Informativo Eletrônico da ANTP, assim como os Manuais Técnicos e os Cadernos Técnicos, sempre com a mesma finalidade de difundir estudos e experiências mais importantes realizadas no transporte urbano no Brasil e na América Latina. A ANTP publicou três livros de referência para o setor – o primei ro em 1997, o segundo em 2003 e o terceiro em 2007, reunindo as melhores experiências de transporte e trânsito no país. A ANTP secretaria as atividades do Fórum Nacional de Secretários de Transporte Urbano e Trânsito e dos Fóruns Regionais: Gaúcho, Fluminense, Mineiro, Norte-Nordeste e Paulista. A ANTP promove, desde junho de 1995, o Prêmio ANTP de Qualidade, destinado a estimular a adoção de programas de gestão da qualidade nas operadoras metro-ferroviárias, operadoras rodo viárias urbanas, metropolitanas e de longa distância e órgãos gestores de transporte e trânsito. Além das atividades permanentes, a Associação conta com uma série de projetos em parceria com outras organizações. Com o apoio do BNDES e do Ministério das Cidades implantou o Sistema de Informações sobre Transporte e Trânsito – SITT que apresenta indicadores temáticos – economia, mobilidade, custos para os usuários, uso de recursos humanos, usos de energia e emissão de poluentes – que permitem apoiar as decisões das políticas voltadas à mobilidade. Desde 1997 a Associação mantém convênio com o Ipea para desenvolvimento de projetos. Naquele ano, foi realizado o estudo sobre os custos dos congestionamentos nas maiores cida des brasileiras, em 2002/2003, foi realizado o estudo sobre os custos sociais e econômicos dos acidentes de trânsito nas cidades brasileiras e, em 2006, o estudo sobre os custos sociais e econômicos dos acidentes nas rodovias brasileiras. A ANTP secretaria o Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte – MDT, que reúne cerca de 350 entidades e instituições que vêm resistindo à política de sucateamento e de desprestígio do transporte público, e lutando pela criação de recursos permanentes para o setor e pelo baratea mento da tarifa. No plano internacional, a ANTP atua como representante da União Internacional dos Transportes Públicos - UITP na América Latina, responsabilizando-se pela secretaria executiva de sua Divisão América Latina, e é signatária da Rede Mundial de Transporte Sustentável, coordenada pela UITP. Mantém intercâmbios com associações de transporte público – Associação Norte-Americana de Transportes Públicos – APTA (USA), Associação Canadense de Transporte Públicos – Cuta (Canadá) e Associação Latino-Americana de Metrôs e Subterrâneos – Alamys. ANTP Rua Marconi, 34, 2º andar, conjs. 21 e 22, República, CEP 01047-000, São Paulo, SP, Brasil Tel.: (11) 3371-2299, fax: (11) 3253-8095 Email: antpsp@antp.org.br, home page: www.antp.org.br
AN P Editorial
Afinal, o que a ANTP defende? turismo sobre trilhos
O Expresso Turístico da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos: presença da ferrovia no turismo regional de São Paulo transporte e meio ambiente
Mudança do clima e mobilidade urbana: uma relação biunívoca história dos transportes
O extermínio do bonde em São Paulo como política pública opinião dos usuários
Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas mobilidade urbana
Aportes do Plano de Mobilidade Urbana e Transporte de Curitiba e Belo Horizonte segundo critérios do Plano Nacional de Mobilidade Políticas de transporte
Aspectos da mobilidade urbana em cidades do Baixo Amazonas: indicadores para elaboração de políticas públicas faixa de pedestres
Uso da ferramenta SIG-Detran como suporte na avaliação de fatores espaciais de risco em faixas de pedestres ponto de vista
Equações custo-benefício no transporte público planejamento e gestão urbana
Transporte e clima urbano em Natal/RN Ano 34 • 3º quadrimestre 2011 • nº 129
Revista dos Transportes Públicos - ANTP Publicação da Associação Nacional de Transportes Públicos - ANTP Destinada a difundir informações e estudos sobre transporte público de passageiros, trânsito e mobilidade urbana ISSN 0102 - 7212
Conselho editorial Ayrton Camargo e Silva Carlos Paiva Cardoso César Cavalcanti de Oliveira Eduardo Alcântara Vasconcellos Eli Bensoussan Canetti Helcio Raymundo João Alberto Manaus Kátia Kauark Leite Marcos Pimentel Bicalho Regis Rafael Tavares da Silva Renato Nunes Balbim Rogerio Belda Diretor responsável Valeska Peres Pinto Editor Peter L. Alouche Secretária de edição Bruna C. S. Santos Preparação de texto Regina Maria Nogueira Capa Composição do Expresso Turístico da CPTM estacionada na plataforma 4 da Estação da Luz, de onde partem os roteiros para Jundiaí, Mogi das Cruzes e Paranapiacaba. Produção gráfica PW Gráficos e Editores Associados Impressão Gráfica Bandeirantes Redação Rua Marconi, 34 - 2º andar, conjs. 21 e 22, República 01047-000, São Paulo, SP Tel.: (11) 3371-2299 - Fax: (11) 3253-8095
Assinatura anual: R$ 95,00 (três edições quadrimestrais). Encaminhado um exemplar à Biblioteca Nacional em cumprimento à Lei do Depósito Legal. Decreto Federal 1.825 de 20.12.1907.
Sumário
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Editorial A final, o que
a ANTP defende? Ailton Brasiliense Pires
7 turismo sobre trilhos O Expresso Turístico da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos: presença da ferrovia no turismo regional de São Paulo Ayrton Camargo e Silva 15 transporte e meio ambiente Mudança do clima e mobilidade urbana: uma relação biunívoca João Alencar Oliveira Júnior, D.Sc. 31 história dos transportes O extermínio do bonde em São Paulo como política pública Ayrton Camargo e Silva 39 opinião dos usuários Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas Max Wilson Ramos e Leise Kelli de Oliveira 51 mobilidade urbana Aportes do Plano de Mobilidade Urbana e Transporte de Curitiba e Belo Horizonte segundo critérios do Plano Nacional de Mobilidade Débora Pinto Follador e Tomás Antonio Moreira
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Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
71 Políticas de transporte Aspectos da mobilidade urbana em cidades do Baixo Amazonas: indicadores para elaboração de políticas públicas Maisa Sales Gama Tobias, Nírvia Ravena, Rui António Rodrigues Ramos e Daniel Souto Rodrigues 85 faixa de pedestres Uso da ferramenta SIG-Detran como suporte na avaliação de fatores espaciais de risco em faixas de pedestres Hudson Carrer Pereira e Pastor Willy Gonzales Taco 05 ponto de vista 1 Equações custo-benefício no transporte público Adriano Murgel Branco 09 planejamento e gestão urbana 1 Transporte e clima urbano em Natal/RN Bernardo J. C. Torquato e Marcela M. G. da Silva 125
Entidades associadas
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Calendário de eventos nacionais e internacionais
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Editorial
Afinal, o que a ANTP defende? Ailton Brasiliense Pires Presidente da ANTP
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Vez ou outra alguém nos rotula como defensores de transporte de trilhos, ou de pneus, ou de trânsito. Ao longo dos 34 anos da ANTP realizamos 18 congressos, publicamos mais de 125 números da Revista dos Transportes Públicos, cada um deles com, em média, oito artigos, totalizando mais de 1.000 documentos. Promovemos centenas de seminários, cursos, palestras; secretariamos os fóruns de secretários nacional e estaduais de transportes públicos e trânsito, além de, recentemente, gerarmos mais de 200 horas de programação na ANTP TV, contribuindo para o debate nacional sobre os problemas e as soluções para o setor. Para realizarmos eventos de tal envergadura, estimulamos a criação de mais de 10 comissões técnicas que têm sido uma base fundamental para aglutinarmos pessoas e empresas, na construção de propostas que são encaminhadas aos poderes Executivos e Legislativos, nos três níveis de governo. A tônica de nossa atuação tem sido a de colocar a vida urbana como foco. Nossas cidades, com raras exceções, tiveram, têm ou deveriam ter um Plano Diretor como orientador de seus planejamentos. Temos tomado como referência aquelas poucas que assim têm trabalhado. Assim sendo, defendemos a necessidade de desenvolvermos projetos que corrijam as enormes distorções de planejamento urbano implantadas no passado. Condenamos a manutenção de erros históricos, tais como: a concentração de empregos em áreas centrais e a expulsão da população para moradias em regiões periféricas, aumentando a dependência do transporte motorizado, os tempos de viagem e seus custos. Aumentar a oferta de transporte público, simplesmente, e não rediscutir o uso do solo, não é suficiente. Tomo como referência a cidade de São Paulo. Todas as linhas de transporte público que operam no eixo leste-oeste têm 80% da demanda nos horários de pico em uma direção e, apenas 20% no contrafluxo, provocando um péssimo serviço num sentido e superdimensionado no outro. Não é à toa que, nas nossas cidades, se praticam as tarifas mais altas da história de cada uma delas. 5
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Os defensores unipartidários dos modais entendem que devemos concordar com a tese do aumento da oferta sem a contrapartida de revisão da organização do planejamento urbano. Se essa posição for mantida, o futuro de nossas cidades estará condenado a um péssimo serviço, consolidando este modelo anacrônico. Hoje, mais de 160 milhões de pessoas vivem em áreas urbanas. Segundo o IBGE, entre 2030 e 2040, deveremos atingir entre 230 e 240 milhões de habitantes, dos quais mais de 200 milhões irão morar em cidades. Assim sendo, entre 40 e 50 milhões de pessoas a exigir moradias, empregos e serviços públicos. Mantido o atual modelo de espraiamento urbano, teremos tarifas ainda mais altas, tempos de percurso maiores, mais acidentes e mais poluição atmosférica. Não é isso o que queremos! Nestes 34 anos, lutamos para que tenhamos cidades com crescimento planejado e não inchadas. Entendemos que devemos defender a construção de sistemas de transporte sobre trilhos onde a demanda e o Plano Diretor orientarem e não a qualquer custo. A implantação subterrânea preserva a cidade. Desta forma, podemos transportar mais de 100 mil pessoas em apenas 11 metros de seção de túnel. Imaginar outra opção que não trilhos para estas demandas significaria destruir a cidade para poder transportar as pessoas. Porém, para demandas menores, a melhor relação custo-benefício é a dos ônibus, com ofertas compatíveis com o conforto, a segurança, a confiabilidade, a regularidade e tarifas módicas. Trilhos e pneus devem se complementar em redes integradas, garantindo que os ônibus tenham a máxima prioridade no uso do sistema viário, com projetos adequados da infraestrutura viária, que garantam eficiência para atrair usuários dos meios de transporte individual, e com qualidade urbanística, que contribuam para a qualificação dos espaços públicos. A qualidade do espaço urbano precisa ainda ser complementada com a construção de calçadas adequadas, implantação de faixas de travessia para pedestres, pontos de ônibus com cobertura, assentos, informações sobre os serviços e, ainda, em espaço viário que permita uma opção segura pelo transporte cicloviário. Defendemos a construção de cidades planejadas, ainda que tardiamente. Não podemos aceitar que estejamos condenados a viver eternamente com os erros do passado. Ainda que as soluções exijam maiores tempos e recursos, afinal, hoje contamos com conhecimentos suficientes para melhorarmos nossa vida urbana futura. Vivemos na 7ª economia do mundo e com ambição de nos tornarmos a 4ª até 2030 ou 2040. Aspiramos viver em um país mais rico, com melhor distribuição de renda e de oportunidades, inclusive urbanas. Neste cenário as cidades serão sustentáveis e terão bons sistemas de transporte público e vias urbanas mais seguras; teremos mais qualidade de vida, menos acidentes de trânsito e menos poluição. A proposta da ONU e da OMS de reduzirmos à metade o número de mortes no trânsito precisa ser meta da sociedade e dos governantes. Dessa forma, podemos viver em cidades melhores, com a proposição e construção das cidades que queremos. É isso que defendemos! 6
turismo sobre trilhos
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O Expresso Turístico da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos: presença da ferrovia no turismo regional de São Paulo Ayrton Camargo e Silva
Secretaria dos Transportes Metropolitanos/EFCJ E-mail: acamargoesilva@efcj.sp.gov.br
O final da década de 1950 viu o apogeu do transporte ferroviário de passageiros de longo percurso no Estado de São Paulo. Dezenas de composições deixavam a ou partiam da estação da Luz diariamente com destino a centenas de estações ou paradas distribuídas pelas linhas das seis operadoras ferroviárias que atendiam os paulistas. Alguns trens marcaram época, como o Ouro Verde e o Ouro Branco, da Sorocabana, o Santa Cruz, da Central do Brasil, e o famoso “R” ou Trem Azul, da Cia. Paulista de Estradas de Ferro, entre outros. A década de 1970 inicia-se com o transporte ferroviário diminuído em sua importância, seja no transporte de carga, seja no de passageiros, sendo esse último remanescente em algumas regiões metropolitanas e aglomerados urbanos, no transporte diário de usuários, atendendo sobretudo às zonas dormitórios das grandes cidades. Todo esse sofisticado sistema foi completamente desmontado no final da década de 1990, depois de operar por quase 130 anos. No início dessa mesma década, na Região Metropolitana de São Paulo, o grande descompasso entre a expansão urbana e as carências da rede de transporte público de massa criou um ambiente propício à estadualização das linhas de trens metropolitanos pertencentes ao governo federal, o que propiciou a criação de uma rede integrada de trens metropolitanos que, modernizada, poderia atender com eficiência os deslocamentos em sua área de influência. Os investimentos realizados na modernização da rede não se restringiram ao sistema de trem metropolitano, efetivados na ampliação da frota, na reconstrução de estações e na renovação de sistemas como sinalização, alimentação elétrica e telecomunicação. Eles passaram também pela atualização na reconstrução de seu papel em relação às diversas necessida7
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des da população em suas variadas formas de deslocamento e também no revigoramento de sua imagem. Disso ressurge a ferrovia como apta a prover deslocamentos em segmentos até então inexplorados. A partir do início do século XXI, com os grandes investimentos realizados na modernização da malha de trens metropolitanos, abriu-se a oportunidade de ampliar a atuação da operadora para segmentos ainda não atendidos, como, por exemplo, o transporte voltado ao turismo, operando serviços diferenciados nos finais de semana e feriados, dando acesso a pontos de interesse localizados em municípios na área de influência de sua rede. Concepção do serviço Nesse quadro, a Secretaria dos Transportes Metropolitanos concebeu o Expresso Turístico, um serviço diferenciado de transporte ferroviário, disponível aos sábados, domingos e feriados, que busca articular polos de interesse turístico, localizados em municípios na área de influência da malha da CPTM, acessíveis por suas linhas, oferecendo um programa completo de visita com duração de um dia. Para a implantação do serviço, a CPTM realizou um convênio com a Associação Brasileira de Preservação Ferroviária – ABPF que cedeu dois carros de passageiros de aço inoxidável até então desativados, fabricados pela Mafersa em 1962. Eles integraram a frota da Estrada de Ferro Araraquarense, tendo operado posteriormente na Fepasa, operadora ferroviária do governo do Estado de São Paulo até a década de 1990. Em troca da cessão, a CPTM os recuperou integralmente em suas oficinas. Foram identificados os eixos com maiores atrativos turísticos, seja pelas suas características históricas, seja pelos atrativos nos destinos, cuja visitação seria potencializada a partir da implantação de um serviço ferroviário turístico. Foram identificados os eixos Luz-Jundiaí, Luz-Mogi das Cruzes e Luz-Paranapiacaba. Esses roteiros têm sua área de influência ampliada, na medida em que são complementados por roteiros opcionais rodoviários, sendo realizados por uma operadora turística privada de turismo receptivo, ganhadora de licitação para exploração de um quiosque de vendas de passagens na estação da Luz. Assim, para os trechos de Jundiaí e Mogi das Cruzes, foram concebidos três roteiros rodoviários opcionais complementares, a saber, o Cultural que contempla, em Jundiaí, a visita ao Museu Ferroviário da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, o Solar do Barão de Jundiaí e o Museu da Energia, junto ao Theatro Polytheama; e em Mogi das Cruzes, o Museu Municipal e a Igreja do Carmo; o Ambiental, que em Jundiaí inclui uma caminhada pela Serra do Japi e, em Mogi das Cru8
O Expresso Turístico da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos: presença ...
O turismo rural é uma das alternativas de visitação dos roteiros complementares do Expresso Turístico. Foto de pomar de morangos em Jundiaí onde o visitante pode colher as frutas no próprio pé.
zes o Parque da Neblina; e o Temático, que contempla visitas a centros produtores de frutas em Jundiaí e, em Mogi das Cruzes, a um centro produtor de orquídeas. Em Paranapiacaba, os roteiros são feitos a pé pela vila visitando o Castelinho, o Mercado, o Centro de Documentação da Madeira, entre outros pontos de interesse.
Composição do Expresso Turístico da CPTM estacionada na plataforma 4 da estação da Luz, de onde partem os roteiros para Jundiaí, Mogi das Cruzes e Paranapiacaba.
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Vale destacar que, nos roteiros para Jundiaí e Paranapiacaba, operados nas linhas da antiga São Paulo Railway, a primeira ferrovia implantada no Estado de São Paulo, é possível ver as estações de Jaraguá, Caieras, Franco da Rocha, Várzea Paulista, Jundiaí, Luz, Brás e Rio Grande da Serra, todas elas em sua configuração original e tombadas como patrimônio histórico pelo Condephaat, órgão estadual responsável pela preservação do patrimônio histórico paulista. O primeiro roteiro da fase 1 foi inaugurado em abril de 2009, atendendo a região de Jundiaí; o segundo, para Mogi das Cruzes, passou a operar em junho de 2009 e o terceiro, para Paranapiacaba, em setembro de 2010. Os roteiros operam sem paradas intermediárias, à exceção do roteiro para Paranapiacaba que possui uma parada na estação de Santo André, para facilitar o acesso dos moradores da região do ABC e também por ser Paranapiacaba distrito desse município. Para a operação do roteiro para Paranapiacaba, a CPTM solicitou autorização à Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, uma vez que o trecho entre a estação de Rio Grande da Serra (terminal da linha 10 da CPTM) e Paranapiacaba pertence à União e encontra-se concedida à MRS Logística para a operação de transporte ferroviário de carga. Trata-se do primeiro serviço ferroviário operado pela CPTM fora de sua rede.
A composição do Expresso Turístico finalmente chega a Paranapiacaba. Foto de uma das viagens teste realizadas em agosto de 2010.
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Tripulação do Expresso Turístico com uniformes especialmente desenvolvidos para esse novo serviço da CPTM: saia e lenço para as mulheres, paletó, gravata e quepe para os homens.
Poucos meses após a implantação do roteiro para Mogi das Cruzes, a CPTM disponibilizou aos usuários desse percurso um vagão destinado ao transporte de bicicletas, como forma de estimular os percursos cicloviários nas visitas aos pontos de interesse turístico daquele município. A implantação do Expresso Turístico exigiu treinamento especial dos funcionários operacionais, uma vez que a empresa até então não tinha experiência com um público usuário com características totalmente diferentes do usuário do serviço metropolitano, em geral mais observador, curioso, exigente de atenção e explicações sobre os pontos de interesse situados ao longo do roteiro. Diferentemente do passageiro apressado e estressado do trem metropolitano, o usuário do Expresso Turístico opta pelo serviço da CPTM no seu mais precioso momento, que é o de lazer, desfrutando-o juntamente com sua família e amigos. Para identificação dos funcionários, foram adotados uniformes especiais, diversos daqueles utilizados no serviço metropolitano, composto por paletó, gravata e quepe para os homens e saia e lenço no pescoço para as mulheres, numa ação intencional de construir uma imagem diferenciada para esse serviço perante os passageiros. Ao longo da viagem, os passageiros recebem informações sobre os principais pontos de interesse histórico, paisagístico e ambiental, fornecidos por monitores treinados, disponibilizados por um convênio realizado entre a Secretaria de Estado de Turismo e a Secretaria dos Transportes Metropolitanos. Também são prestadas orientações de segurança e informações gerais aos passageiros, inspiradas nas mensagens utilizadas no transporte aéreo. O serviço conta com um site (www.cptm.sp.gov.br/expressoturistico) criado especialmente para disponibilizar as principais informações sobre os roteiros, mostrando em tempo real a disponibilidade de lugares para venda em cada viagem, em até 120 dias da data da consulta, uma vez que as vendas das passagens são realizadas com esse período de antecedência. 11
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Resultados Pesquisas realizadas pela CPTM nos primeiros meses de operação do serviço revelaram que os usuários têm em media mais de 45 anos, são do sexo feminino, têm curso superior, viajam em grupo de até quatro pessoas, moram na Região Metropolitana de São Paulo, não são usuários do trem metropolitano da CPTM, nunca haviam viajado de trem turístico, avaliam positivamente o serviço e tiveram suas expectativas superadas, entre diversos outros aspectos. Em mais de dois anos de operação, já foram transportadas mais de 35 mil passageiros e, devido à enorme procura, as passagens são logo adquiridas mal as bilheterias da CPTM iniciam suas vendas. Grande parte desse sucesso pode ser creditada à possibilidade da população reencontrar-se com um meio de transporte que marcou durante décadas a vida da cidade e que se confunde com o crescimento urbano de muitas delas, durante muitos anos associado ao que de mais moderno o país teve em tecnologia de transporte público. Parte dessa emoção pode ser compartilhada nos depoimentos dos passageiros, registrados no Diário de Bordo, dentro do site do Expresso Turístico (www.cptm.sp.gov.br/expressoturistico). Vale destacar que esse projeto da CPTM, desde o seu início, obteve uma repercussão na mídia extremamente positiva, sem que houvesse uma matéria sequer com abordagem negativa ou crítica, contribuindo, de forma efetiva, para a construção de uma imagem positiva da empresa ante um público de maior poder aquisitivo e formador de opinião. Alguns depoimentos dos usuários: “(...) A viagem foi boa, sossegada e deliciosa (...)” Vagner Alexandre Abreu, por e-mail à CPTM “(...) fico extremamente feliz ‘vendo’ que está sendo um enorme sucesso essa ‘descoberta nostálgica’ da viagem de trem. Parabéns à CPTM e toda equipe. Armando dos Santos Daniel, por e-mail à CPTM “Gostaria de parabenizá-los pelo Expresso Turístico. Tive o prazer de ir a Jundiaí com minha família e pude constatar como tudo funcionou muito bem. O atendimento aos turistas oferecido pela CPTM foi ótimo, fomos recebidos por funcionários educados e atenciosos que em muito nos auxiliaram com informações e simpatia para tornar o passeio ainda mais gostoso. Vale destacar a pontualidade do trem (...)” Francisco Miguel Câmara, por e-mail ao Governo do Estado de São Paulo 12
O Expresso Turístico da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos: presença ...
“Espero que esse projeto se estenda por muito tempo e que possamos a cada dia melhorar, (...) É um prazer estar participando! A roupa de chefe de trem foi um espetáculo...” Rosemary Aparecida Donná, encarregada de estação de Francisco Morato, a chefe de trem da primeira viagem comercial
Em dezembro de 2010, a CPTM desenvolvia a fase 2 do Expresso Turístico, que prevê a implantação de mais um roteiro com duração de um dia, a ligação Luz-São Roque; e as ligações com duração de um final de semana, entre Luz-Pindamonhangaba, integrando-se nessa cidade com os trens para Campos do Jordão operados pela Estrada de Ferro Campos do Jordão, e o roteiro Luz-Aparecida. Para implantar esses seus roteiros, a CPTM solicitou ao DNIT cessão de carros ferroviários de longo percurso, pertencentes anteriormente à frota das antigas RFFSA e FEPASA. Também se encontra em fase final de recuperação a automotriz Budd, que pertenceu à Estrada de Ferro Central do Brasil e que, durante muitos anos, operou entre São Paulo e o Rio de Janeiro. Totalmente recuperada, dará mais flexibilidade operacional aos roteiros das fase 1 e fase 2 do Expresso Turístico.
Automotriz diesel Budd, em fase final de reforma, prevista para operar na fase 2 do Expresso Turístico, nos roteiros para Pindamonhangaba e Aparecida e outros.
A implantação do Expresso Turístico é uma iniciativa da Secretaria dos Transportes Metropolitanos, cuja operação está a cargo da CPTM. Conta também com a participação da Secretaria Estadual de Turismo, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e com o apoio da Associação Brasileira de Preservação Ferroviária e das prefeituras de Jundiaí, Mogi das Cruzes e Santo André. 13
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Revista dos Transportes Públicos - ANTP Orientação para os autores de artigos A Revista dos Transportes Públicos está aberta à publicação de artigos sobre transportes públicos e trânsito, nas diversas áreas listadas abaixo: - temas transversais: planejamento e gestão urbana; gestão da qualidade; marketing; desenvolvimento tecnológico; meio ambiente; transporte não motorizado; história e memória; - transporte público: gestão / políticas de transporte público; economia do transporte público; planejamento e concepção de sistemas; implantação e operação do serviço de transporte público; - trânsito: restrição de acesso e circulação de veículos; circulação urbana da carga; programas e políticas de segurança no trânsito; operação de trânsito. O autor deve indicar qual o tema e o subtema a que seu artigo deve ser relacionado. O artigo deve ter, no máximo, 25 laudas digitadas (20 linhas com 70 toques cada uma), acompanhado de um resumo de seu conteúdo, em no máximo cinco linhas de 70 toques. As ilustrações e gráficos já estão contabilizados neste tamanho. O artigo e o resumo devem ser enviados para o e-mail bruna@antp.org.br ou em cd por correio para a ANTP - Rua Marconi, 34, 2º andar, conjs. 21 e 22, República, CEP 01047-000, São Paulo, SP. No cd devem ser discriminados o programa, sua versão e os nomes dos arquivos. O artigo expressa a opinião do(s) seu(s) autor(es) e, portanto, é de responsabilidade do(s) mesmo(s). Os autores não recebem nenhuma remuneração da ANTP e todos os direitos autorais do(s) artigo(s) são cedidos à ANTP sem ônus para nenhuma das partes. A publicação de um artigo fica a critério do Conselho Editorial, podendo ser reproduzido, bastando, para tanto, mencionar como fonte a Revista dos Transportes Públicos, da ANTP.
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transporte e meio ambiente
Mudança do clima e mobilidade urbana: uma relação biunívoca
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João Alencar Oliveira Júnior, D.Sc.
Analista de Infraestrutura. Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão – MP. Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos – SPI. Ministério das Cidades – MCidades. Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana – SeMob. Brasília, Distrito Federal, Brasil E-mails: jalencarjr@yahoo.com - joao.alencar@cidades.gov.br
O objetivo deste artigo é discutir aspectos de políticas e medidas mitigadoras de gases de efeito local (GELs) e de efeito estufa (GEEs) relacionadas ao desafio de uma mobilidade orientada para um cenário que tenha por diretriz a mudança na matriz modal de transportes associada à mudança da sua matriz energética, na consecução de uma economia de baixa emissão de carbono. Busca-se fundamentar os pontos de vista a partir da análise da legislação federal que regula o assunto para, com base no marco regulatório, identificar as oportunidades e as omissões normativas que possam viabilizar a implantação de tais políticas e medidas mitigadoras. MARCO REGULATÓRIO E A MUDANÇA DO CLIMA As políticas e medidas mitigadoras da emissão dos gases de efeito estufa (GEEs) possuem por fundamento legal o artigo 225 da Constituição Federal de 1988, pois, na medida em que se constitucionaliza o direito a sustentabilidade ambiental, tanto cabe à sociedade quanto ao Estado o dever de empreender medidas visando atingir tal objetivo, conforme se observa abaixo no referido dispositivo: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (art. 225, CF/1988).
É mister salientar que o próprio texto constitucional expressamente impôs deveres ao poder público para assegurar a efetividade deste direito (art. 225, § 1º, CF). Dentre o rol elencado no referido parágrafo destacam-se os seguintes incisos: 15
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IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
Os incisos IV e V do artigo 225 da CF foram regulamentados pela Lei nº 11.105/2005, apenas quanto aos aspectos relacionados às normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados. No entanto, existem outros aspectos relacionados aos impactos ambientais decorrentes da atividade humana (antropogênicos) que devem ser considerados, quando se discute a relação entre o consumo de energia e a produção de transporte de carga e de passageiros. Assim como, o resultado da queima do combustível utilizado nesta atividade econômica, ou seja, a emissão de gases de efeito local (GELs) e de efeito estufa (GEEs). Todavia, algumas expressões merecem ser interpretadas, pois se tratam de aspectos-chave nesta questão. O supracitado inciso IV apresenta a expressão “atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente”. Porém, qual seria tal atividade a exigir estudo de prévio impacto ambiental? Esta resposta se encontra positivada em lei anterior à Constituição Federal, por ela recepcionada, conforme se observa a seguir. Política Nacional do Meio Ambiente – Lei nº 6.938/1981 A Lei nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, apresenta importantes conceitos que elucidam a dificuldade de compreender o quão abrangente se torna tal dispositivo, quando analisado sistemicamente com outro marco legal. O artigo 3º desta lei considera: I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente; 16
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III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora (art. 3º, I, II, III e V, Lei nº 6.938/1981).
Deste conjunto definidor se extraem conclusões sobre o objeto de análise, quando se trata de políticas e medidas mitigadoras de emissões de GELs (CO, HC, NOX, SOX MP5, MP10) e de GEEs (CO2, CH4, N2O). Considerando uma ordem inversa de abordagem, entende-se que o ar atmosférico, na complexidade de elementos que compõem a atmosfera, ou mesmo como elemento constitutivo da biosfera na qual habitamos, pode ser entendido como recurso ambiental (art. 3º, V, Lei nº 6.938/1981 e art. 2º, V, Lei nº 9.985/2000). Da mesma forma, o ar atmosférico integra o conceito de meio ambiente, pois seus elementos em percentagem adequada são indispensáveis à vida neste planeta (art. 3º, I, Lei nº 6.938/1981). Portanto, conclui-se que o ar atmosférico utilizado no processo de queima do combustível é um recurso ambiental e, como tal, trata-se de um bem ambiental a ser tutelado pelo Estado, por meio do marco regulatório do meio ambiente, implicando, por sua vez, no controle efetivo das emissões e da concentração no meio ambiente dos gases resultantes da combustão dos combustíveis utilizados no setor de transportes, assim como a necessidade da adoção de medidas mitigadoras. Considerando que a degradação da qualidade ambiental se dá mediante a alteração adversa das características do meio ambiente (art. 3º, II, Lei nº 6.938/1981), pode-se também inferir que, em regra, a qualidade ambiental do ar resultante da queima do combustível seja inferior àquela antes da combustão. Portanto, mesmo que se tenha regulamentado os padrões de emissões de GELs e de GEEs, por tipo de veículo (motorização) e de combustível (diesel, biodiesel, gás natural veicular – GNV, gasolina, etanol etc.), o resultado será a degradação da qualidade ambiental quando comparada com as condições anteriores. No entanto, por razão de oferta de energia, custo de produção, ou mesmo, estratégia de desenvolvimento econômico, podese adotar tecnologias que degradem mais ou menos o meio ambiente e o próprio ar atmosférico. 17
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Contudo, o artigo 3º, III, a, b, c, d, e, da Lei nº 6.938/1981, apresenta uma variação da degradação da qualidade ambiental ao considerar que aquelas atividades que direta ou indiretamente provoquem prejuízos à saúde, à segurança e ao bem-estar da população, assim como criem condições adversas às atividades sociais e econômicas, afetem a fauna e flora e as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente, lancem matérias e energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos, sejam consideradas como poluição ao meio ambiente. Traduzindo tais alíneas para o binômio energia e mobilidade urbana, não há como negar os impactos negativos resultantes da queima de combustível, em particular, nas áreas urbanas que são mais impactadas pelos GELs emitidos simultaneamente com os GEEs, sendo impossível dissociá-los, embora estes últimos tenham impacto planetário na mudança do clima e, consequentemente, na biota da Terra, assim como são negociados em bolsas de valores. Embora o controle de emissões se dê por unidade (emissão de GELs e de GEEs em g/km ou g/litro) veicular ou concentração de poluente em área urbana (µg/cm3), o efeito é cumulativo em milhões de toneladas de GELs e de GEEs e produzido em função da frota veicular, da quilometragem rodada, do tipo de tecnologia veicular e do combustível utilizado para mover pessoas e cargas numa cidade, estado e país. Entende-se inadequada a mensuração dos impactos ambientais apenas quando se computa a emissão em regime de tráfego forçado ou congestionado (stop and go), bem como quando os níveis de concentração de poluentes se mostram em patamares “regular, ruim ou irrespirável”. A queima do combustível mesmo sem a produção do momento de transporte deve ser mensurada quanto à quantidade de toneladas de GELs e GEEs lançadas no meio ambiente urbano e na atmosfera, ignorando-se inclusive o fato da emissão dos gases de efeito local e estufa estarem dentro dos padrões ambientais exigidos na fabricação de veículos. Desta maneira, as considerações sobre o binômio energia e mobilidade urbana nos direcionam a outros questionamentos, tais como: a. O que seria atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente neste binômio, a exigir estudo prévio de impacto ambiental, se os impactos dos GEEs possuem dimensão intertemporal de décadas, quiçá de séculos? b. Será que os estudos de impacto ambiental (EIA) e os respectivos relatórios de impacto no meio ambiente (Rima) estão considerando tais problemas na dimensão adequada em se tratando da construção de infraestrutura de transportes, sua operação ao longo do tempo, ou mesmo do fomento à mobilidade individual motorizada, enquanto consequência da política econômica? 18
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c. Será suficiente o estabelecimento de padrões de emissões de GELs e de GEEs para mitigar ou mesmo evitar o aumento exagerado da emissão de tais gases e os consequentes impactos na qualidade de vida nas grandes cidades e no meio ambiente urbano e rural? A Lei nº 6.938/1981 tem por fundamentação teórica dois princípios ambientais: o princípio da precaução e o princípio do poluidor pagador (PPP). O primeiro adverte quanto à necessidade de adotar medidas mitigadoras que reduzam a degradação da qualidade ambiental. O segundo, positivado no artigo 225, § 3º, da CF, inovou ao adotar a teoria da responsabilidade objetiva pelo dano ambiental ao considerar que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”, ampliando, assim, o simples conceito de poluidor do artigo 3º, IV, da Lei nº 6.938/1981: “poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental”. Nestes dois princípios, que em regra são normativamente superiores à lei, residem os fundamentos para internalizar o custo ambiental a que se sujeita a sociedade ao respirar um ar degradado em razão do binômio energia e mobilidade urbana. Por um lado, requer uma atitude comissiva do poder público na adoção de tecnologias menos poluentes e amigas do clima e, de outro, autoriza a repartição deste custo entre os beneficiários direitos e indiretos da utilização das infraestruturas de transporte de carga e de passageiros usadas no provimento da mobilidade urbana nas cidades. Pode-se igualmente considerar que a adoção de políticas e medidas mitigadoras de GELs e de GEEs se encontra colimada com a Política Nacional de Meio Ambiente, na medida em que esta objetiva a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida e, também, assegurar as condições de desenvolvimento socioeconômico no país, aos interesses de segurança nacional e a proteção da dignidade da vida humana (art. 2º, Lei nº 6.938/1981), inclusive nas cidades. Estatuto da Cidade – Lei nº 10.257/2001 A Lei nº 10.257/2001 estabelece diretrizes gerais para a política urbana, além de reforçar a necessidade do estudo de impacto ambiental (EIA) enquanto instrumento daquela política. Esta inovou no ordenamento jurídico ao introduzir um novo instrumento de análise, que foi a exigência da realização do estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV), conforme art. 4º, VI, da referida lei. Cita-se, ainda, o estabelecimento de instrumentos urbanísticos da política, abrangendo o plane19
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jamento nacional, regional e estadual da ordenação do território e do desenvolvimento econômico e social. Entende-se que, neste processo de planejamento, o setor de transporte e da mobilidade deveria ter importante papel no delineamento de tais planos, sem olvidar sua dimensão socioambiental (art. 4º, I, Lei nº 10.257/2001) em razão da escolha de tecnologias e modalidades de transportes baseadas na emissão de baixo carbono. Deve-se, ainda, levar em conta a repercussão dessas inovações tecnológicas no cálculo do valor da tarifa do transporte público a ser cobrada dos usuários que, em regra, possuem renda entre um a três salários mínimos. Exige-se, por sua vez, a elaboração do planejamento metropolitano, dos aglomerados urbanos e das microrregiões (art. 4º, II, Lei nº 10.257/2001). Além disso, foi bastante detalhado no planejamento municipal, apontando quais setores deveriam compor tal planejamento. Todavia, nada impede que tais variáveis também sejam consideradas nas demais escalas do planejamento territorial, seja este urbano ou rural. Até porque, dentre tais variáveis de planejamento municipal se encontra a possibilidade da realização de planos, programas e projetos setoriais (art. 4º, III, g, Lei nº 10.257/2001). O Estatuto da Cidade inovou no estabelecimento de institutos jurídicos e políticos (art. 4º, V, Lei nº 10.257/2001), nos quais se destacam as operações urbanas consorciadas, ainda pouco utilizadas, mas que possuem grande potencial de reestruturação do tecido urbano visando à redefinição do padrão de mobilidade urbana, ou seja, uma redistribuição de atividades urbanas e utilização de diversas modalidades de transportes proporcionando sensíveis impactos socioambientais. Assim sendo, cabe ao poder municipal, por meio de lei específica e em conformidade com o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, definir quais áreas podem ser objeto de implantação das operações consorciadas. Neste caso, requer-se a elaboração do Plano de Operação Urbana Consorciada contendo, também, o estudo prévio de impacto de vizinhança – EIV (art. 4º, VI e arts 32 e 33, Lei nº 10.257/2001). Este diploma legal define a operação urbana consorciada como o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo poder público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar, em uma área, transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental (art. 32, § 1º, Lei nº 10.257/2001). O Estatuto da Cidade, ao tratar do estudo de impacto de vizinhança (EIV), deixa em aberto, para a regulamentação municipal, a definição de quais serão os empreendimentos e atividades públicas e privadas a serem 20
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exigidas para a realização do EIV, para se obter as licenças ou autorizações de construir, ampliar e por em funcionamento tais atividades (art. 36, Lei nº 10.257/2001). Contudo, o Estatuto da Cidade lista um rol mínimo de variáveis que deve conter o IEV, dentre os quais se destacam as análises de adensamento populacional, uso e ocupação do solo e a geração de tráfego e a demanda por transporte público (art. 37, I a VI, Lei nº 10.257/2001), devendo ser assegurada ampla divulgação dos estudos (art. 37, § 1º, Lei nº 10.257/2001). A lei deixa evidente que o EIV não substitui a elaboração e aprovação do estudo de impacto ambiental (EIA), isto é, os estudos se complementam. No caso do setor de transporte de carga e de passageiros e nos estudos de mobilidade urbana, seria oportuno que se considerassem, na realização de tais estudos, não apenas a implantação da infraestrutura de transportes, mas, principalmente, os impactos da sua operação no curto, médio e longo prazo, em particular quanto aos aspectos relacionados à tecnologia de transporte adotada e o tipo de combustível utilizado. O Estatuto da Cidade trouxe uma grande inovação que foi a obrigatoriedade da elaboração do Plano Diretor para cidades acima de 20 mil habitantes (art. 41, I, Lei nº 10.257/2001), aquelas integrantes de regiões metropolitanas e de aglomerados urbanos (art. 41, II, Lei nº 10.257/2001), bem como as que pretendam regulamentar a utilização dos instrumentos do artigo 182, § 4º, I, II e III, da CF (art. 41, III, Lei nº 10.257/2001), ou seja, as sanções aos proprietários de propriedade urbana que não cumpram sua função social, podendo ser realizada, pelo poder municipal, o parcelamento ou edificação compulsória, o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo, e a desapropriação. Também estão obrigados à elaboração do plano diretor os municípios localizados em áreas de especial interesse turístico (art. 41, IV, Lei nº 10.257/2001), assim como aqueles na área de influência de empreendimentos ou atividade de significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional (art. 41, V, Lei nº 10.257/2001). Embora o transporte de carga e de pessoas possa ser compreendido como setor a ser considerado na elaboração dos planos diretores municipais, a prática demonstra que não se elabora adequadamente o plano de transporte municipal, ou como se entende hoje, o plano de mobilidade urbana, com a profundidade que se exige para tal tipo de abordagem e complexidade deste setor. O Estatuto da Cidade exige a elaboração do plano de transporte urbano apenas nas cidades com população superior a 500 mil habitantes, seja em separado ou inserido no plano diretor, mas com ele compatível (art. 41, § 2º, Lei nº 10.257/2001), o que se constitui numa grande limitação desta lei. 21
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É importante destacar que os diplomas legais até então analisados não trataram da questão do meio ambiente focada na dimensão das mudanças climáticas, muito menos da compreensão de que o binômio energia e mobilidade urbana está relacionado à dimensão urbana. Não se apreende, dos dispositivos analisados, a preocupação com a emissão de GELs e GEEs, embora o Estatuto da Cidade seja posterior à Conferência Rio 92 e à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Mudança do clima – normas específicas Os primeiros marcos regulatórios a tratarem da temática da mudança do clima e dos gases de efeito estufa no ordenamento nacional foram o Decreto nº 2.652/1998, promulgado após ratificação do Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo nº 01/1994, que introduziu no ordenamento pátrio a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, e o Decreto nº 5.445/2005, que promulgou o Protocolo de Quioto, após ratificação congressual, mediante o Decreto Legislativo nº 144/2002, ambos adquirindo o status de lei ordinária federal. Por sua vez, a Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC (Lei nº 12.187/2009) e o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.114/2009) foram instituídos em 2009. Pode-se, ainda, incluir a criação do Fundo Social – FS, instituído pela Lei nº 12.351/2010, que trata da exploração da jazida de petróleo e gás do pré-sal. Vislumbra-se, portanto, a possibilidade de se utilizar tais recursos para mudar significativamente as relações entre a energia, os transportes e a mobilidade urbana em nossas cidades, com o objetivo de mitigar os efeitos das mudanças climáticas e a adoção de tecnologia de baixo carbono, principalmente no transporte público e no não motorizado, com recursos provenientes do Fundo Social e do Fundo do Clima. A Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC positivou, no art. 2º, I a X, da Lei nº 12.187/2009, várias definições técnico-científicas sobre a terminologia utilizada nos estudos de mudanças do clima. Numa leitura atenta identificam-se suas implicações com o binômio energia e mobilidade urbana, sobretudo quanto às relações existentes entre o deslocamento de pessoas e cargas no tecido urbano, tendo por suporte uma matriz energética baseada no óleo diesel como combustível predominante nas modalidades de transporte público de passageiros e de cargas urbanas e nacionais. No transporte individual por automóvel, a utilização do etanol como substituto ou aditivo na gasolina, também contribui para a mitigação das emissões deste modo de transportes, mesmo considerando a 22
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sazonalidade do preço do açúcar que influencia na formação do preço do etanol e da gasolina devido à escassez do produto no mercado interno. Tal efeito de substituição na matriz energética produz um efeito de elasticidade de preço, possibilitando aos proprietários de veículos com tecnologia flex (bicombustível) optar pelo consumo exclusivo da gasolina, anulando em parte as vantagens ambientais de uma frota de automóveis com tal tecnologia. Por conseguinte, a política energética deve levar em consideração os efeitos ambientais de uma política desregulada, via preço, e possuir mecanismos de regulação do mercado com estoques reguladores, de forma a impactar menos o meio ambiente em razão de tais sazonalidades na oferta do combustível. Até porque o transporte individual por automóvel é responsável pelo consumo de 72% da energia do setor de transporte urbano (ANTP, 2010). Conforme se vê, existe sim uma relação biunívoca e direta entre uma política de transporte e da mobilidade urbana, com as políticas energéticas, ambientais e industriais, principalmente neste novo cenário de mudança do clima e do pré-sal. Desta maneira, a queima de combustível fóssil numa matriz energética que privilegia combustíveis intensivos em carbono e produtores de GEEs e GELs, que são utilizados nos modos de transportes dedicados à mobilidade urbana de pessoas e cargas, possui grande potencial tanto para a modificação na matriz modal (migração da demanda do transporte individual motorizado para o transporte público de passageiros e o não motorizado) quanto na adoção de uma matriz energética menos poluente e amiga do clima, como o gás natural e a eletricidade de base hidroelétrica, eólica e termoelétrica a gás natural, ou mesmo os biocombustíveis. A decisão do mix de combustíveis nos modos de transportes públicos numa cidade será função das vantagens locacionais mais competitivas entre a produção e o consumo de energia nos centros urbanos para prover a mobilidade urbana. Principalmente quando se tem a oferta de gás natural em aproximadamente 50% das 324 cidades brasileiras com mais de 60 mil habitantes que possuem transporte público por ônibus, segundo dados da ANP, que relaciona os municípios que possuem posto de combustível com gás natural, quando confrontados com a relação daquelas que possuem transporte público. Os efeitos adversos da mudança do clima, ao provocar alterações no meio físico ou natural com resultados deletérios significativos sobre os ecossistemas naturais e antropogênicos, bem como nos sistemas socioeconômicos, na saúde e bem estar humano, poderiam ser miti23
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gados pela adoção de uma nova matriz de transporte urbano associada a uma matriz energética menos intensiva em carbono, mitigando, assim, as emissões de GELs e de GEEs. Isso proporciona a redução dos efeitos climáticos extremos impactantes da própria mobilidade urbana, a exemplo das chuvas intensas e alagamentos nas áreas urbanas, que põem em colapso a infraestrutura de transporte urbano, vital para a mobilidade nos centros urbanos. Um aspecto relevante do marco regulatório é o chamamento à responsabilidade pelas ações executadas pelos entes políticos e órgãos da administração pública, quanto à adoção dos princípios ambientais da precaução, prevenção, desenvolvimento sustentável e responsabilidade objetiva, que norteiam o direito ambiental sustentável, sem olvidar do princípio da participação cidadã exigido pelo ordenamento jurídico pátrio, orientadores das ações relacionadas à Política Nacional de Mudança do Clima e da intersetorialidade socioeconômica e ambiental (art. 3º, da Lei nº 12.187/2009). O art. 3º, I a V, da Lei nº 12.187/2009, lista um conjunto de considerações norteadoras das ações públicas visando atingir os objetivos da PNMC. Por exemplo: a. O dever de atuar em benefício da presente e futuras gerações na mitigação dos impactos decorrentes das ações antrópicas sobre o sistema climático (art. 3º, I e IV, da Lei nº 12.187/2009), ou seja, a lei reforça a adoção do princípio e direito constitucional ao desenvolvimento sustentável (art. 225, CF/1988); b. Deve adotar medidas para prever, evitar ou minimizar as causas identificadas de mudança do clima com origem antrópica, sobre os quais exista razoável consenso por parte dos meios científicos e técnicos sobre o tema (art. 3º, II, da Lei nº 12.187/2009), isto é, reforça o princípio ambiental da precaução e da prevenção; c. A adoção de tais medidas, entendidas enquanto políticas, programas, ações, planos e projetos governamentais nos três níveis de governo, deve considerar aspectos socioeconômicos, a distribuição dos ônus e encargos decorrentes entre os setores econômicos e a população, de forma equitativa e equilibrada, ponderando responsabilidades individuais em relação às fontes emissoras dos GEEs (art. 3º, III e V, da Lei nº 12.187/2009). Traduzir tais recomendações setorialmente exigirá grande esforço de coordenação entre as políticas de mobilidade urbana, ambiental e climática, energética, de inclusão social, industrial e de logística, de forma a implicar numa mudança simultânea da matriz modal e energética. Esta mudança nos levará à discussão de como proporcionar uma transformação substancial na mobilidade urbana em nossas 24
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cidades, em particular, no financiamento dela, associada ao uso de transporte de média e alta capacidade, com tarifas compatíveis com a renda da população nas grandes cidades e regiões metropolitanas. Isto sem esquecer a necessária maturidade político-institucional dos entes federativos envolvidos para a articulação destas ações intersetoriais, intergovernamentais e interfederativas. Implica dizer que o conserto da mobilidade urbana em nossas cidades envolverá um concerto de alto nível, orquestrado pelos dirigentes e atores políticos, para a construção de um novo pacto social pela mobilidade urbana a ser firmado com a população brasileira, conforme defende Oliveira Júnior, J. A. (2010 e 2011). O referido art. 3º deve ser analisado em conjunto com o art. 11, parágrafo único, da Lei nº 12.187/2009, que estabelece a obrigatoriedade de compatibilizar as políticas públicas e os programas governamentais com os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos da PNMC. Soma-se a esta obrigatoriedade a incumbência de elaborar planos setoriais de mitigação e adaptação às mudanças climáticas visando à consolidação de uma economia de baixo carbono, tendo como um dos setores, o setor de transportes de carga e de passageiros de longa distância (interestadual) e o transporte público urbano de passageiros. A estratégia adotada é o estabelecimento de metas de redução gradativa das emissões antrópicas, quantificáveis e verificáveis para cada setor regulado, por meio da utilização do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e das Ações de Mitigação Nacionalmente Apropriadas (Namas). Os primeiros setores econômicos regulamentados com base na Lei nº 12.187/2009 foram os de mudança de uso da terra, energia, agropecuária, processos industriais e tratamento de resíduos (Decreto nº 7.390/2010), com a elaboração dos respectivos planos, conforme exigido pelo dispositivo da lei. Por sua vez, o Plano Setorial de Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas no Transporte Público Urbano deverá ser elaborado até 15 de dezembro de 2011 (art. 4º, caput, Decreto nº 7.390/2010), devendo conter conteúdo mínimo que abranja: I – meta de redução de emissões em 2020, incluindo metas gradativas com intervalo máximo de três anos; II – ações a serem implementadas; III – definição de indicadores para o monitoramento e avaliação de sua efetividade; IV – proposta de instrumentos de regulação e incentivo para implementação do respectivo Plano; e V – estudos setoriais de competitividade com estimativa de custos e impactos (art. 4º, I a V, Decreto nº 7.390/2010). 25
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O plano setorial deve ser elaborado a partir de ampla consulta pública aos setores relacionados ao transporte público urbano. As metas setoriais devem ser expressas em percentuais de redução das emissões previstas para o ano de 2020 e servirão de parâmetro para o estabelecimento do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões – MBRE (art. 4º, §§ 1º a 3º, Decreto nº 7.390/2010). A Lei nº 12.187/2009, no artigo 6º, incisos de I a XVIII, apresenta um conjunto de instrumentos da PNMC. Neste momento, pretende-se destacar apenas aqueles relacionados aos mecanismos financeiros, econômicos, creditícios e tributários que podem servir para financiar a mudança para uma economia de baixo carbono e, em especial, os relacionados ao financiamento da mobilidade urbana. A lei prevê a possibilidade de instituir medidas fiscais e tributárias visando à redução de emissões e remoções de GEEs, inclusive o estabelecimento de alíquotas diferenciadas, isenções, compensações e incentivos, a serem definidas em lei (art. 6º, VI, Lei nº 12.187/2009). Da mesma maneira, antevê o estabelecimento de linhas de crédito e financiamento específicas de agentes financeiros públicos e privados (art. 6º, VII, Lei nº 12.187/2009). A possibilidade de utilização dos mecanismos financeiros e econômicos da Convenção-Quadro de Mudança do Clima e do Protocolo de Quioto, por exemplo, os Mecanismos de Desenvolvimento Limpo – MDLs e os Nationally Appropriate Mitigation Action – Namas (Ação de Mitigação Nacionalmente Apropriada), assim como mecanismos nacionais criados para este fim (art. 6º, X e XI, Lei nº 12.187/2009). Considera, ainda, a implantação de medidas existentes ou a serem criadas que estimulem o desenvolvimento de processos e tecnologias, objetivando a redução e remoção dos GEEs e a adaptação às mudanças do clima, destacando-se o estabelecimento de critérios de preferência nas licitações e concorrências públicas, incluindo as parcerias público-privadas (PPPs), concessões e permissões de serviços públicos; na exploração dos recursos naturais, e propostas que apresentem maiores economias de energia, água e outros recursos naturais, menores emissões de GEEs e de resíduos (art. 6º, XII, Lei nº 12.187/2009). Estabelece, também, a obrigação das instituições financeiras oficiais disponibilizarem linhas de crédito específicas para desenvolver ações e atividades que atendam aos objetivos da PNMC e voltadas à indução de conduta dos agentes privados no âmbito das suas ações e responsabilidades em relação ao esforço de mitigar os efeitos da mudança do clima (art. 8º, Lei nº 12.187/2009). Instituiu no âmbito nacional, o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões – MBRE, 26
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seguindo a tendência internacional de fomentar, via mercado, a compra e venda de carbono (CO2EQ). Conforme se observa, a lei estabelece um elenco de eventos portadores de futuro, mas devido à tão recente inovação legal, muito ainda carece de regulamentação, quantos aos dispositivos inovadores nela existentes. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com o Segundo Inventário Brasileiro de Emissões Antrópicas de Gases de Efeito Estufa (MCT, 2010), as emissões de CO2 provenientes da queima de combustível fóssil cresceram 74% no período de 1990 a 2005, quando, em 2005, foram emitidos 299,941 milhões de tCO2. O setor de transporte foi responsável por 44,5% das emissões de CO2. Daquele total, o modo rodoviário contribui com 92% dessas emissões, enquanto que o consumo de diesel foi o responsável pela emissão de 105,231 milhões de tCO2, o que equivale a 35,1%. Entretanto, estes valores se encontram agregados em razão das informações consolidadas no Balanço Energético Nacional – BEN, que apresenta o consumo de tonelada equivalente de petróleo (tep) nos diversos setores da economia, sem desagregá-los quanto aos seus subsetores, isto é, não se disponibiliza o consumo energético (diesel, biodiesel, etanol ou eletricidade etc.) por modalidade de transporte (ônibus, táxi, mototáxi, van/topic, trem, metrô etc.) utilizada na mobilidade urbana de cargas e de pessoas. Tal limitação é, sem dúvida, uma grande dificuldade no dimensionamento e estimativa do papel da mobilidade urbana, em se tratando da participação do transporte público de passageiros na emissão dos GEEs e GELs, de forma a possibilitar, a partir das estimativas, o delineamento de políticas, estratégias, ações e cenários prospectivos factíveis de serem implementados no âmbito dos entes federativos, considerando-se as respectivas atribuições da União, dos estados e, em particular, dos municípios, que estão mais diretamente envolvidos com o provimento e planejamento do transporte público nas cidades. Acredita-se que, a partir do marco regulatório da mudança do clima, os municípios, estados e a União deverão orientar as políticas de planejamento urbano e da mobilidade urbana (transporte público) para um cenário de uma economia de baixa emissão de carbono nos centros urbanos. Entende-se que o desafio desta mudança de matriz modal e energética no setor de transporte urbano seja um grande evento portador de futuro que se inicia agora. O tempo demonstrará que se trata de um processo continuado a ser adotado pela presente e futuras gerações, 27
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caso se queira assegurar a sustentabilidade no planejamento da mobilidade urbana em nossas cidades. Fica o convite para que os gestores municipais, estaduais e federais passem a considerar em suas agendas políticas, a construção de um pacto social pela mobilidade urbana (vide Oliveira Júnior, J. A., 2010 e 2011), adicionalmente centrada numa emissão de baixo carbono. Por fim, um aspecto a ser considerado é a abordagem limitada da Lei nº 12.187/2009 ao focar o Plano Setorial de Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas apenas no transporte público urbano (art. 11, parágrafo único, Lei nº 12.187/2009) pois, segundo estimativa da ANTP (2010), o grande responsável pelo consumo de energia e a correspondente emissão de GEEs e GELs é o transporte individual, com o automóvel consumindo 72% e a motocicleta 3% da energia utilizada na mobilidade urbana, ou seja, 75% do consumo de energia. No entanto, tais modos de transportes se encontram fora do foco da lei, devendo contribuir, para a mitigação de tais gases, por meio de ações transversais indutoras do transporte público e do não motorizado e de ações desestimuladoras ao uso do transporte individual, que é intensivo em energia e pouco eficiente no transporte de passageiros, o que resulta numa emissão per capita de GEEs e GELs bastante elevada quando comparada com o transporte público. Desta maneira, a elaboração dos planos setoriais de mitigação e adaptação deve atentar para a necessidade de propor ações transversais visando reduzir o uso e intensidade de energia no transporte individual de passageiros e, ao mesmo tempo, estimular o uso de transporte público e não motorizado, isto é, induzir uma mudança na matriz modal e energética do setor de transporte público de passageiros. Do contrário será bastante limitada a contribuição da mobilidade urbana no esforço nacional e internacional de redução da emissão dos gases de efeito estufa e da mitigação dos efeitos da mudança do clima. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTP. Associação Nacional de Transporte Público. Sistema de Informações da Mobilidade Urbana: Relatório geral 2009. São Paulo/SP, 2010, 113 p. Brasil. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 2 set. 1981. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988, atualizada até a Emenda Constitucional nº 64. Brasília, DF, 1988. Brasil. Decreto Legislativo nº 01, de 3 de fevereiro de 1994, aprova o texto da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima adotada em Nova
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Mudança do clima e mobilidade urbana: uma relação biunívoca
Iorque, em 9 de maio de 1992. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 3 fev. 1994. Brasil. Decreto nº 2.652, de 1 de julho de 1998, promulga a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima adotada em Nova Iorque, em 9 de maio de 1992. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 1 jul. 1998. Brasil. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 19 jul. 2000. Brasil. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 11 jul. 2001. Brasil. Decreto Legislativo nº 144, de 20 de junho de 2002, aprova o texto do Protocolo de Quioto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima aberto a assinaturas na cidade de Quioto, Japão, em 14 de dezembro de 1997, por ocasião da Terceira Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 20 jun. 2002. Brasil. Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005, regulamenta os incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória nº 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10 e 16 da Lei nº 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 28 mar. 2005. Brasil. Decreto nº 5.445, de 12 de maio de 2005, promulga o Protocolo de Quioto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, aberto a assinaturas na cidade de Quioto, Japão, em 11 de dezembro de 1997, por ocasião da Terceira Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 13 mai. 2005. Brasil. Lei nº 12.114, de 9 de dezembro de 2009, cria o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, altera os arts. 6º e 50 da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 10 dez. 2009. Brasil. Lei nº 12.187, de 29 de dezembro de 2009, institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima - PNMC e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 30 dez. 2009. Brasil. Decreto nº 7.390, de 9 de dezembro de 2010, regulamenta os arts. 6º, 11 e 12 da Lei nº 12.187, de 29 de dezembro de 2009, que institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima - PNMC, e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 10 dez. 2010. Brasil. Lei nº 12.351, de 22 de dezembro de 2010, dispõe sobre a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, sob o regime de partilha de produção, em áreas do pré-sal e em áreas estratégicas; cria
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o Fundo Social - FS e dispõe sobre sua estrutura e fontes de recursos; altera dispositivos da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997; e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília, DF, 23 dez. 2010. MCT. Ministério de Ciência e Tecnologia. Segundo Inventário brasileiro de emissões antrópicas de gases de efeito estufa. Relatório de referência: emissões de gases de efeito estufa por queima de combustíveis – abordagem bottom-up, Brasília/DF, 2010, 79 p. OLIVEIRA JÚNIOR, J. A. Direito à mobilidade urbana: a construção de um direito social. Apresentado e publicado nos Anais eletrônicos do XVI Congresso Latinoamericano de Transporte Público e Urbano (XVI CLATPU), de 6 a 8 de outubro de 2010, na Cidade do México/DF, México. Publicado na Revista dos Transportes Públicos da Associação Nacional de Transporte Público – ANTP, 2011, nº 127, p. 63-75, ano 33, 1º Quadrimestre, ISSN 0102-7212, 2011, São Paulo/SP. Disponível em: http://issuu. com/efzy/docs/rtp2011-127/1?mode=a_p.
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história dos transportes
O extermínio do bonde em São Paulo como política pública*
AN P
Ayrton Camargo e Silva
Secretaria dos Transportes Metropolitanos/EFCJ E-mail: acamargoesilva@efcj.sp.gov.br
Símbolo da modernização de São Paulo, o primeiro meio de transporte público da capital foi extinto, não por ser obsoleto, mas em virtude de decisões políticas que criaram um novo modelo de cidade na década de 1930
O transporte público surgiu na cidade de São Paulo na segunda metade do século XIX, na esteira do processo que integrou as grandes fazendas de café da região às redes do mercado mundial. Em 1855, o aumento da produção agrícola da província e a precariedade das vias de circulação que ligavam as áreas produtoras ao porto de Santos levaram o presidente provincial, José Antônio Saraiva, a defender a implantação de uma ligação ferroviária que conectasse o litoral ao interior do estado. O trem chegou ao município de São Paulo em 1867, e a estação de passageiros da ferrovia foi implantada na região da Luz, então localizada fora dos limites da capital. Inicialmente, o trajeto entre a estação e a praça da Sé, no centro da cidade, era percorrido por tílburis de aluguel (espécie de pequena carruagem de duas rodas e dois assentos, sem capota, puxada por animais), que já operavam desde 1865. O aumento do fluxo de passageiros, no entanto, gerou a necessidade de um sistema mais regular e confiável de transporte, com tarifas e horários fixos. Essa demanda deu origem ao primeiro sistema de transporte coletivo regular na cidade de São Paulo. No dia 12 de outubro de 1872 foi inaugurada a linha pioneira da rede de bondes puxados a burro. * Artigo publicado originalmente na revista História Viva nº 94 (edição de agosto de 2011).
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Aos poucos, a cidade foi ganhando novos contornos graças a grandes intervenções urbanísticas. Nesse período, porém, nenhuma discussão ou plano vinculou o crescimento da cidade à necessidade de se desenvolver uma rede viária baseada no transporte coletivo. As obras se limitavam a corrigir as características geométricas do sistema viário herdado da era colonial e a conectá-lo às novas zonas de expansão urbana. Foi com base nessa lógica que o sistema de transporte coletivo em São Paulo entrou em uma nova fase a partir de 1899, quando um grupo de investidores canadenses pleiteou junto à Câmara Municipal uma concessão para explorar um pacote de serviços públicos na cidade. Motivados pela possibilidade de eletrificação dos sistemas de viação e por outras oportunidades de expansão capitalista abertas pelo investimento em infraestrutura urbana, os canadenses negociaram um contrato que lhes garantiu a administração dos serviços de viação pública de transportes de carga e de passageiros, bem como a geração e distribuição de energia elétrica e a instalação de iluminação pública. A empresa criada para gerir essa operação foi batizada de The São Paulo Tramway, Light and Power Company – a Light, como ficou popularmente conhecida. Depois de intensas batalhas jurídicas e até campais, a empresa canadense obteve a concessão para operar bondes elétricos que começaram a circular em São Paulo no dia 7 de maio de 1900. Até então, os serviços de transporte público eram explorados, em caráter de monopólio, por uma empresa de capital nacional, a Companhia Viação Paulista, que apresentava graves problemas operacionais. Além disso, a Light adquiriu outra empresa nacional, a Companhia Água e Luz do Estado de São Paulo, criada em 1892 com o objetivo de gerar e distribuir energia elétrica. Dessa forma, os canadenses consolidaram seu monopólio sobre os serviços públicos da cidade. Em 1909, esse monopólio foi questionado por empresários nacionais. Uma interpretação alternativa do contrato de concessão dado à empresa canadense abriu uma brecha para que o grupo Guinle, dono de uma usina elétrica em Santos, tentasse distribuir energia nas vias não atendidas pela Light. Após uma intensa batalha com a prefeitura, o monopólio da empresa canadense foi confirmado, levando-a a oferecer à prefeitura ações como a extinção dos anéis tarifários da rede dos bondes e a unificação de suas tarifas em 200 réis; implantar passe escolar com desconto de 50%; adotar veículos especiais para operários também com desconto de 50% sobre a tarifa vigente; oferecer desconto nas tarifas de energia elétrica etc. 32
O extermínio do bonde em São Paulo como política pública
O contrato de concessão da Light para transporte público não previa cláusulas de reajuste tarifário periódico atrelado à variação da inflação. A tarifa dos bondes elétricos foi fixada em função do preço da passagem dos bondes a burro, vigente desde 1872, como se os insumos utilizados na operação de uma linha do gênero pudessem servir de referência para os custos de uma empresa que utilizasse a tração elétrica. A participação das receitas do serviço de bondes no total das receitas da Light, desde o início da operação, atingiu seu ponto culminante em 1902, quando representou 84,1% do total, para em seguida declinar num ritmo discreto, porém contínuo. Em 1910, esse índice foi de 67,8%, alcançando 58,2% em 1920 e fechando 1924 em 46,8%. Assim, o balanço financeiro relativo ao ano de 1923 deu o alerta: pela primeira vez na contabilidade da companhia, a arrecadação do sistema de bondes passava a representar menos da metade de todas as receitas. Era preciso agir rápido para reverter essa queda. Esse decréscimo pode ser explicado em parte pela grande expansão que a distribuição de energia elétrica passou a representar nos negócios da empresa, levando-a a aumentar os investimentos em geração de energia. Vale lembrar que as tarifas de energia elétrica sofriam reajustes periódicos, ao contrário das tarifas da rede de bondes. Insatisfeita com o congelamento das tarifas do sistema de bondes, a Light encaminhou à prefeitura, em 4 de abril de 1924, o pedido de revisão do contrato de 1909, solicitando um reajuste das tarifas. O pleito baseava-se em um histórico das perdas de arrecadação que alertava para o risco de descapitalização do sistema de transporte da Light. O relatório expunha o que considerava, entre outros aspectos, os efeitos da inflação que corroera a tarifa. Segundo a empresa, a inadequação das tarifas tornava-se mais grave ao se considerar a inflação do período que tinha reduzido em 34% o valor da moeda brasileira entre 1895 e 1913. Isso sem falar das alterações cambiais ocorridas após a Primeira Guerra Mundial que incidiram fortemente sobre os insumos importados necessários para a manutenção do sistema, uma vez que não havia similar produzido no país. Não houve resposta da prefeitura. No dia 5 de julho de 1924, a cidade foi surpreendida pelo levante tenentista que praticamente paralisou o estado. Para reprimir a insurreição, o governo do presidente Arthur Bernardes lançou pesados bombardeios sobre a cidade toda, buscando atingir alvos civis, como forma de isolar os rebeldes ante a opinião pública. Os ataques provocaram grandes prejuízos à Light ao destruir dezenas de quilômetros de linhas de bonde e de transmissão elétrica. 33
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Alguns meses depois, entre fevereiro e junho de 1925, seria a vez de São Paulo viver uma das maiores secas de sua história até então, o que levou a um período de grande racionamento do consumo de energia elétrica. A crise atingiu enormemente o sistema de bondes que foi obrigado a reduzir a oferta de veículos em operação bem como os horários de funcionamento das linhas. A lacuna deixada pelo serviço de bondes durante o período da seca abriu caminho para a entrada em cena do ônibus no serviço regular de transporte coletivo na cidade. A elevação dos custos operacionais do sistema de bondes e o aparecimento dos ônibus em decorrência da seca de 1924/1925 forçaram a Light a formular uma nova estratégia para tentar obter do poder publico o aumento das tarifas. Desta vez, o pleito do reajuste foi associado a um amplo plano de investimentos de longo prazo, reforçando seu monopólio nos serviços de transporte público urbano de carga e passageiros sobre trilhos e pneus. E isso, por sua vez, colocaria a necessidade de renovação de seu contrato de concessão, definindo um prazo compatível com a remuneração do capital investido para a implantação das melhorias. As propostas da empresa foram reunidas em um documento intitulado “Plano Integrado de Transportes”, que foi entregue à prefeitura em 25 de maio de 1927. De acordo com esse texto, a Light se propunha, entre outras coisas, a construir trechos curtos de linhas subterrâneas de trânsito rápido na área central, de forma a liberar as ruas do tráfego de bondes; construir linhas de trânsito rápido totalmente segregadas das ruas a partir da zona central em direção aos bairros; retirar os bondes do Triângulo (zona sofisticada, no coração do centro da cidade) e de ruas estreitas, redesenhando a rede; ampliar a extensão das linhas e da frota de bondes em 50%; e implantar linhas alimentadoras dos bondes em vias exclusivas e nos trechos em subterrâneo, operadas por ônibus, construindo um sistema integrado, numa concepção arrojada e até então totalmente inovadora.
Antiga faixa exclusiva de bondes na Av. São João, reconfigurada e invadida por todo tipo de veículos.Como então assegurar um bom desempenho operacional ao sistema tranviário? Foto dec. 50. Col. A Camargo e Silva.
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O extermínio do bonde em São Paulo como política pública
A empresa pleiteava o monopólio na operação dessa nova rede de transporte que integraria, sem concorrência, ônibus e bondes. Isso garantiria uma arrecadação tarifária também centralizada, podendo ocorrer subsídio cruzado entre os sistemas, que comporia um fundo único de recursos. Escaldada pelo congelamento tarifário, a Light propunha reajustes semestrais da tarifa, com base na variação do custo do serviço. Caso houvesse excesso de saldo, esse valor deveria integrar um fundo que cobriria eventuais déficits futuros da rede. O prazo de concessão deveria ser de 30 anos, renovado indefinidamente por períodos de 20 anos. A prefeitura poderia não renovar o contrato, desde que indenizasse à companhia, em ouro, o capital investido, com o acréscimo de mais 10% desse valor, a título de compensação. Apesar de o contrato vigente desde 1909 só expirar em 1941, recomendava-se que a renovação fosse negociada com antecedência. Naquele momento, porém, dois anos depois que a Light solicitara pela primeira vez o reajuste tarifário, o quadro era outro. O sistema de bondes sofria ameaças não só pela inadequação da política de tarifas, mas também pela concorrência das primeiras linhas de ônibus que haviam surgido de maneira clandestina durante a seca de 1925 e ainda operavam de forma precária, mas que pareciam ter chegado para ficar.
Na cidade que surge do Plano de Avenidas de Prestes Maia não há lugar para o transporte coletivo. Tunel da avenida 9 de Julho, a primeira implantada em fundo de vale na cidade de São Paulo. Foto LIfe, dec. 1940.
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A proposta da Light baseava-se na ideia de valorizar o centro da cidade diante do avanço da urbanização sobre novas áreas, descongestionando o trânsito na área central por meio do transporte público de massa, tanto de superfície quanto subterrâneo. Justamente o oposto do que propunha o Plano de Avenidas. O projeto, que estava sendo elaborado na mesma época pelo urbanista Francisco Prestes Maia (1896-1965), propunha a implantação de um sistema viário articulado por amplas avenidas radiais e perimetrais, que abririam caminho para o avanço de carros particulares e ônibus rumo às novas zonas de expansão urbana da cidade. O destino do plano da Light foi selado pela Revolução de 1930 que mudou a conjuntura política do país e levou um novo grupo ao poder, junto ao qual a companhia canadense não tinha bom trânsito. Além disso, Prestes Maia foi nomeado prefeito de São Paulo em 1938 e começou a colocar em prática seu Plano de Avenidas que redirecionou a expansão da cidade. Estava configurado o cenário institucional, político e urbanístico para a derrocada do sistema de bondes. Nesse período de turbulência institucional, a Light nunca obteve resposta do poder público ao seu plano de investimentos, silêncio esse que, na prática, definiu o fim do sistema de bondes da cidade, cuja agonia duraria quase 41 anos.
Parque do Anhangabaú, de espaço de vivência e contemplação para local de estacionamento de automoveis e, em seguida, espinha dorsal da ligação rodoviária norte-sul proposta pelo Plano de Avenidas. Foto Life, dec. 1940.
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O extermínio do bonde em São Paulo como política pública
Desestimulada, a Light anunciou, em 1937, seu desinteresse em renovar o contrato de operação do sistema de bondes que expiraria em 1941. Com isso, a companhia anunciou que passaria para a prefeitura a administração de toda a infraestrutura que havia implantado em São Paulo. A medida levou a uma crise e a administração municipal criou, em 1939, uma comissão para elaborar um modelo institucional, operacional e tecnológico de gestão do transporte público na cidade. Sob o vigilante acompanhamento de Prestes Maia, a comissão definiu as bases de como o transporte se estruturaria na cidade. Entre outros importantes aspectos, ela propôs que a concessão do serviço caberia a uma empresa pública monopolista e que os bondes deveriam ser paulatinamente desativados e substituídos preferencialmente por trólebus, mas chamando a atenção também para a existência dos ônibus. Na prática, a falta de investimentos a altura das necessidades da demanda levou ao reaparecimento dos ônibus operados por grupos privados e ao adiamento da extinção dos bondes, ainda que o sistema estivesse completamente sucateado. No início da década de 1950, as bases do Plano de Avenidas já haviam sido implantadas e pesados investimentos viários consolidavam a circulação sobre pneus. O transporte público não acompanhava a expansão urbana. Os trólebus, anunciados como a modernização dos transportes, tinham uma participação quase simbólica, e o metrô não passava de uma miragem em algum lugar do futuro. Após a caótica gestão de Adhemar de Barros na prefeitura de São Paulo, entre 1957 e 1961, Prestes Maia o sucedeu e retomou a desativação do sistema de bondes, pondo em prática uma das conclusões da comissão de transportes criada por ele em sua primeira gestão. Finalmente, coube ao seu sucessor, Faria Lima, jogar a pá de cal sobre o primeiro meio de transporte público da cidade. O funeral, com direito a banda de música e foguetórios, foi celebrado no dia 27 de março de 1968.
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Programa de TV da ANTP na Internet, às quintas-feiras das 16h00 às 17h00
www.antptv.com.br
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opinião dos usuários
Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas
AN P
Max Wilson Ramos
E-mail: maxw@pbh.gov.br
Leise Kelli de Oliveira E-mail: leise@etg.ufmg.br
Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – DETG
Nos dias atuais, em que a qualidade do serviço de transporte não sustenta a crescente migração para o meio individual por automóveis e motocicletas dos potenciais usuários do sistema de transporte público, é imprescindível avaliar minuciosamente o indicador que afere o nível de satisfação desses usuários também pelo critério de como os usuários são tratados pelos operadores. Deve-se, a partir dos resultados detetados, desenvolver ações de melhoria da qualidade concernentes à minimização da insatisfação dos mesmos. Já foi comprovado que o trânsito, quando muito congestionado, pode levar os motoristas a um nível de estresse bastante elevado. As interações inevitáveis com outros motoristas, alguns deles conduzindo seus veículos de forma indevida, com pedestres, por vezes desatentos, o relacionamento nem sempre cordial com os usuários do transporte público, além de outros problemas pessoais, podem contribuir para um desequilíbrio na forma de agir do motorista de ônibus. Neste contexto, em 2010, a Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte S.A. (BHTrans) recebeu mais de vinte e um mil registros de reclamações relacionados ao transporte público que atende à capital dos mineiros. Cerca de 24% desses são relacionados a um grupo de eventos denominado na empresa por “conduta inadequada dos operadores”, que totaliza atitudes indevidas, segundo os usuários reclamantes, tanto de motoristas dos ônibus quanto dos agentes de bordo. Dentre outros, pode-se citar, como exemplos de reclamações dessa natureza, falta de educação, freadas ou arrancadas bruscas, avançar sinal, não girar a roleta após pagamento da tarifa em dinheiro pelos passageiros que embarcam e desembarcam pela porta dianteira, ofensas, arrancar o veículo com passageiros embarcando ou desembarcando. 39
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A maior parte das reclamações é cabível aos motoristas. A partir desse cenário e almejando sua melhoria, este artigo apresenta os resultados da avaliação da importância que os usuários de ônibus de Belo Horizonte dão à postura dos motoristas durante uma viagem. Para tal avaliação, utilizou-se a técnica de preferência declarada. Este artigo apresenta os resultados e diretrizes de ações para melhoria do problema identificado. O COMPORTAMENTO DOS OPERADORES DE TRANSPORTE PÚBLICO Problemas advindos do relacionamento entre os operadores do transporte e os passageiros têm sido foco de vários estudos, uma vez que o serviço de transporte é essencial à população das cidades e o comportamento dos operadores tem grande relevância. Erros no trabalho do motorista, por exemplo, podem ocasionar acidentes. Estudos referentes aos motoristas, apresentados por Mendes (1987), relatam que eles atribuem como principais dificuldades no trabalho o relacionamento com os passageiros, considerando-os como principal motivo de desgastes e fonte constante de conflitos. Como conclusão citam que a constante ocorrência de incidentes com os passageiros refletem-se não só no bem-estar dos motoristas quanto na qualidade do serviço prestado. Lima Júnior (1995) descreve os principais critérios de avaliação da qualidade para o transporte público na visão do usuário e, dentre eles, cita a empatia, correspondente à avaliação da disposição do motorista e cobrador em dar informações e de demonstrar atenção com pessoas idosas e deficientes físicos. Outro critério citado no trabalho é a segurança, relacionado à condução do veículo pelo motorista. Sobre a qualidade dos serviços de transporte coletivo oferecidos à população, Ferraz e Torres (2004) consideram doze principais fatores caracterizadores que influenciam na qualidade do transporte público por ônibus. Dentre eles, o comportamento dos operadores, fator relacionado à postura dos motoristas e cobradores durante o desempenho de suas atividades. Os autores sugerem como parâmetros de avaliação para esse fator “Motoristas dirigindo com habilidade e cuidado e motoristas e cobradores prestativos e educados”. González et al. (2000) avaliaram a qualidade do transporte urbano por ônibus na Espanha sob a ótica dos usuários utilizando medidas psicométricas. Dentre os aspectos avaliados, foram considerados o profissionalismo dos condutores e o cuidado com idosos e deficientes. 40
Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas
Esses trabalhos indicam que a conduta dos operadores tem sido considerada na realização de pesquisas para avaliação da qualidade de serviços de transportes. Questionamentos referentes à educação dos operadores e se os motoristas costumam frear ou acelerar suavemente, ou ainda se é seguro andar de ônibus em relação a acidentes visam refletir a participação dos operadores na qualidade ao interagirem com os usuários. Em Belo Horizonte, a BHTrans consolidou as reclamações dos usuários do transporte público por ônibus para conhecer os principais problemas. A tabela 1 apresenta todas as reclamações relacionadas à conduta inadequada dos operadores do transporte coletivo por ônibus (motoristas e agentes de bordo) registradas em dezembro de 2010. Tabela 1 Reclamações associadas à conduta inadequada dos operadores do transporte por ônibus Reclamação
Percentual
Falta de educação
59,3
Arrancar com passageiro embarcando e/ou desembarcando
12,2
Freadas / arrancadas bruscas
5,5
Conversa desnecessária do operador
5,2
Não rodar a roleta
4,0
Ameaças
2,8
Ofensas verbais
2,8
Fechar cruzamento
2,4
Não saber operar o elevador para deficiente
1,5
Avançar sinal
1,2
Agressão física
0,9
Namorar no serviço
0,6
Operador fora do posto de trabalho
0,6
Dirigir com portas abertas
0,3
Fumar no ônibus
0,3
Passageiro viajando sentado no motor
0,3
Fonte: BHTRANS (dezembro/2010).
Os dados evidenciam, como os autores acima citados, que a educação é um fator importante para o usuário, assim como a forma de dirigir. Esses elementos foram considerados para avaliar a conduta dos operadores de transporte utilizando a técnica de preferência declarada. 41
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A TÉCNICA DE PREFERÊNCIA DECLARADA O termo preferência declarada (PD) refere-se a uma família de técnicas de coleta de dados que utiliza declarações de indivíduos sobre suas preferências, dentro de um conjunto de alternativas hipotéticas, objetivando estimar funções utilidade (Kroes e Sheldon, 1988). Segundo Bastos (1994), a forma e complexidade do experimento, um dos fatores de sucesso da pesquisa, passa pela decisão de quais atributos devem ser considerados e seus respectivos níveis. Conforme Ortúzar e Willumsen (1990), o princípio básico dos modelos de escolha discreta, que compõe a técnica de preferência declarada, enuncia que a probabilidade de um indivíduo de fazer uma determinada opção é função das características socioeconômicas e da atratividade da alternativa em comparação a outras. A aplicação da pesquisa de preferência declarada possibilita estimar os coeficientes dos atributos da função utilidade que representam a atratividade das alternativas, ou seja, o peso relativo de cada variável de decisão na utilidade para o entrevistado. O objetivo é determinar a probabilidade de escolha de determinada alternativa pelos entrevistados e, assim, explicar o comportamento dos mesmos. Neste trabalho, foi utilizado o modelo Logit Multinomial, de escolha discreta. Nele, o comportamento de escolha dos usuários é modelado através da identificação das suas funções de utilidade (Ben-Akiva e Lerman, 1985). O desenvolvimento de um experimento no qual a técnica de PD é aplicada, de acordo com Ortúzar e Willumsen (1994), deve ser executado cumprindo-se os seguintes estágios: - Identificar os atributos-chaves de cada alternativa e construir conjuntos de escolha. Todos os atributos essenciais devem estar presentes e as opões devem ser plausíveis e realistas. - Projetar o experimento de maneira que as opções apresentadas aos respondentes facilitem expressar suas preferências. A forma de apresentação das alternativas deve ser de fácil entendimento, devendo estar em consonância com a experiência dos respondentes e suas restrições. - Desenvolver uma estratégia de amostragem que assegure um bom e representativo conjunto de dados. - Conduzir o levantamento de forma apropriada, incluindo supervisão e procedimentos de controle de qualidade. - Usar boas técnicas de estimação de modelos, sendo mais adequado e seguro, do ponto de vista de representação da realidade, a utilização conjunta de dados de preferência declarada e preferência revelada. 42
Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas
DEFINIÇÃO DO EXPERIMENTO O objetivo deste estudo consiste em identificar qual é a preferência dos usuários dos serviços de transporte por ônibus no tocante ao conflito que por vezes eles têm em relação à conduta dos motoristas. Para definir os atributos necessários à pesquisa de preferência declarada, as reclamações listadas na tabela 1 foram agrupadas em três grupos e estão apresentadas na tabela 2. Desta forma, neste trabalho, considerou-se, como atributos, este agrupamento, sendo: educação, forma de conduzir o veículo e atitude em situações de conflito. Tabela 2 Agrupamento das reclamações Reclamação
Percentual
Educação
59,3
Forma de conduzir o veículo
26,9
Atitude em situações de conflito
6,4
Outros
7,4
Neste experimento, foram considerados dois níveis para os atributos, apresentados no quadro 1. O nível “zero” representa a situação em que os motoristas são educados, conduzem os veículos de forma segura e resolvem as situações de conflito que possam ocorrer durante a viagem, agindo não agressivamente. O nível 1, por sua vez, foi escolhido como representação da situação atual. Quadro 1 Atributos e níveis da pesquisa Atributos
Níveis “Zero”
1
Educação
Educado
Mal educado
Forma de conduzir o veículo
Com segurança
Sem segurança
Atitude em situação de conflito
Não agressiva
Agressiva
A pesquisa foi elaborada tendo como base o ensaio 3.1 desenvolvido por Souza (1999). Nas entrevistas com os usuários de ônibus, as combinações dos diferentes níveis eram exibidas em forma de cartões com quatro alternativas de escolha em cada. Para facilitar o entendimento dos entrevistados e mostrar as alternativas de forma mais simples e objetiva, foram utilizadas figuras que expressavam as diferentes combinações de níveis para os atributos, como apresentado na figura 1.
43
Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
Figura 1 Imagens representativas dos atributos e níveis utilizados nos cartões
A pesquisa foi realizada em pontos de embarque e desembarque de passageiros, no dia 21 de abril de 2011. Para apresentar um nível de confiança de 90% seria necessária a realização de 100 entrevistas. Foram realizadas 104 entrevistas. RESULTADOS A tabela 3 apresenta o resumo do perfil dos entrevistados, onde pode-se verificar que a maioria é do sexo feminino, entre 18 e 25 anos, com utilização frequente do transporte público. Tabela 3 Resumo do perfil dos entrevistados Sexo Faixa etária
Frequência semanal de utilização do transporte coletivo por ônibus
44
Masculino Feminino 18 a 25 anos 26 a 35 anos 36 a 45 anos mais de 45 anos 1 a 2 vezes 3 a 5 vezes Raramente
Percentual 45,2 54,8 33,7 31,7 17,3 17,3 9,6 66,4 24,0
Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas
Além disso, foi solicitado que os entrevistados atribuíssem uma nota de 1 e 5 (sendo 1 a menor) para a atitude dos motoristas, levando-se em consideração não apenas os atributos da pesquisa, mas a forma como prestavam o serviço de sua responsabilidade. Os resultados apresentados na tabela 4 apontam que as pessoas do sexo feminino atribuem nota média inferior que os entrevistados do sexo masculino. Além disso, verifica-se que a menor nota média (2,5) foi atribuída pelas pessoas do sexo feminino, pertencentes à faixa etária compreendida entre 18 e 25 anos e que utilizam frequentemente o transporte coletivo por ônibus (3 a 5 vezes por semana). Tabela 4 Nota geral atribuída aos motoristas Sexo
Idade
Frequência
Nota geral
Masculino
18 a 25 anos
3,0
2,7
3,6
3,0
26 a 35 anos
3,0
3,8
3,7
3,7
36 a 45 anos
*
3,5
4,3
3,9
Mais de 45 anos
3,0
4,0
*
3,9
Masculino geral
3,0
3,5
3,8
3,5
Feminino
18 a 25 anos
3,3
2,5
4,3
3,0
26 a 35 anos
4,0
3,1
3,3
3,2
36 a 45 anos
4,0
2,7
3,3
3,0
Mais de 45 anos
5,0
3,8
3,7
3,9
Feminino geral
3,8
2,9
3,6
3,2
Geral
3,6
3,2
3,7
3,3
(*) Não houve entrevistados neste sexo/faixa etária.
Os resultados da pesquisa de preferência declarada estão apresentados na tabela 5. Os valores apresentados no teste T-student, calculados a partir do quociente entre os coeficientes estimados e seus respectivos desvios padrão, serão significativos com 90% de confiança caso sejam superiores a 1,945. Assim, é possível aceitar que os coeficientes são significativos (módulo dos valores superiores ao número padronizado) e podem ser incluídos no modelo. Da mesma forma, os valores calculados na pesquisa para Rho e Rho ajustado (0,3471 e 0,3380) revelam que a calibração apresenta um bom desempenho, pois estes estão compreendidos no intervalo entre 0,2 e 0,4.
45
Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
Tabela 5 Resultados obtidos Atributo Educação Forma de conduzir o veículo Atitude em situações de conflito
Coeficiente
Teste T
-1,0014 -2,1735 -0,7318
-6,2197 -10,6035 -4,6831
A figura 2 mostra os percentuais dos atributos, indicando a relevância dos mesmos. Diferentemente do resultado da análise das reclamações, a forma de conduzir o veículo é o atributo mais relevante para os entrevistados. Contudo, não é surpresa que, nas viagens de ônibus, os usuários prefiram a segurança expressada na forma de conduzir o veículo pelo motorista do que outros atributos. Figura 2 Representação gráfica da máxima utilidade
A tabela 6 apresenta os resultados da pesquisa por estratificação da amostra. Verifica-se, a partir da análise dessas tabelas, que, para os entrevistados do sexo feminino, a habilidade do motorista em lidar com situações de conflito é mais importante que para os homens, além do fato de que as pessoas idosas consideram mais importante a forma como os veículos são conduzidos. Observa-se também que é menor a importância atribuída à segurança, expressada na forma como os motoristas conduzem os veículos, para as pessoas que utilizam o transporte por ônibus frequentemente (de 3 a 5 vezes por semana). Em relação às notas atribuídas, observa-se que os entrevistados que melhor avaliaram os motoristas preferem que estes sejam mais educados a que tenham habilidade de lidar com situações de conflito. No entanto, o inverso desta preferência é verificado para as pessoas que pior avaliaram os motoristas. 46
Rho
0,3962
0,2897
0,4187
0,2782
0,4605
0,2647
0,3295
0,4958
0,3704
0,3986
0,2883
0,2935
Estratificação da amostra
Sexo masculino
Sexo feminino
18 a 25 anos
26 a 35 anos
36 a 45 anos
Acima de 45 anos
Utilização de 3 a 5 vezes
Utilização de 1 a 2 vezes por semana
Rara utilização
Nota 4 ou 5
Nota 3
Nota 1 ou 2
-0,6756
-1,1189
-1,1637
-0,7128
-1,5854
-1,2013
-1,7534
-1,4754
-0,4875
-1,1695
-0,8613
-1,2285
Coeficiente
Educação
Atributo
16,93
34,22
24,55
16,35
26,79
30,97
48,89
25,85
15,48
23,46
23,40
28,20
% relativo
Tabela 6 Resultados da pesquisa por estratificação da amostra
-2,1706
-1,9280
-2,5477
-2,6132
-3,9280
-2,0870
-1,3673
-2,8685
-2,1701
-2,8008
-2,0176
-2,4994
Coeficiente
54,41
58,96
53,74
59,92
66,37
53,80
38,12
50,26
68,89
56,19
54,82
57,38
% relativo
Forma de conduzir o veículo
-1,1435
-0,2233
-1,0292
-1,0348
-0,4052
-0,5908
-0,4658
-1,3632
-0,4923
-1,0146
-0,8017
-0,6278
Coeficiente
28,66
6,83
21,71
23,73
6,85
15,23
12,99
23,89
15,63
20,35
21,78
14,41
% relativo
Atitude em situação de conflito
Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas
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Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
CONSIDERAÇÕES FINAIS É notório que uma parcela da população vem abandonando o transporte público devido à facilidade e às vantagens oferecidas no mercado para aquisição do veículo privado. Tal fato deve-se também à baixa qualidade dos serviços de transporte oferecidos. A reversão desse quadro somente será possível a partir do momento em que o serviço ofertado esteja em conformidade às exigências dos clientes, os usuários do transporte púbico. A qualidade dos serviços de transporte por ônibus, sob o ponto de vista dos usuários, está associada ao valor e às utilidades agregadas. Assim sendo, esses serviços serão adequados e apresentarão um nível de excelência que satisfaça seus usuários quando atenderem às várias características que irão se refletir na qualidade desejada. Dentre essas, pode-se afirmar que um dos fatores de significativa influência na qualidade é o comportamento dos operadores. Por meio da aplicação da técnica de preferência declarada, os resultados apresentados neste trabalho demonstram que eles podem ser usados na busca pela melhoria da qualidade dos serviços de transporte por ônibus, uma vez que os atributos avaliados são significativos e úteis para os usuários de ônibus. A forma como o motorista de ônibus conduz o veículo reflete-se na segurança da viagem, sendo o atributo mais importante para os usuários. No entanto, os problemas relacionados à educação dos operadores são os maiores motivadores das reclamações registradas junto à BHTrans, órgão gestor do transporte em Belo Horizonte. Os resultados da pesquisa também mostram a importância atribuída tanto à educação do motorista quanto à habilidade que esse deve ter quando houver quaisquer situações de conflito dentro do ônibus. Dessa forma, poderão contribuir como norteadores à elaboração de programas de treinamento dos motoristas de ônibus e na definição de ações que visem minimizar as reclamações dos usuários e, por sua vez, agregar valor aos serviços de transporte. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEN-AKIVA, M.; LERMAN, S. Discrete choice analysis: Theory and application to travel demand. 7. ed. Cambridge: MIT Press, 1985. KROES, E. P.; SHELDON, R. J. Stated preference methods. An introduction. Journal of Transport Economics and Policy. Londres, v. XXII, n. 1, janeiro 1988, p. 11-25. LIMA Jr., O. F. Qualidade em serviços de transportes: conceituação e procedimentos para diagnóstico. Tese de doutorado. Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, 1995, 215 p.
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Preferência dos usuários de ônibus de Belo Horizonte em relação à conduta dos motoristas
FERRAZ, A. C. P.; TORRES, I. G. E. Transporte público urbano. São Paulo: Rima Editora, 2004, 428 p. MENDES, L. R. Serviço essencial x trabalho penoso: Análise das condições de trabalho dos motoristas de ônibus coletivo urbano na cidade de Belo Horizonte. Belo Horizonte. Dissertação de mestrado. Cepead/Face/UFMG, 1987. GONZÁLEZ, M. S. R.; PESQUEIRA, G. S.; FERNANDEZ, C. A. Construcción y análisis de un cuestionario de evaluación de los medios de transporte público. Psicothema, 2000, vol. 12, nº 3, p. 399-405. ISSN 0214. KROES, Eric P.; SHELDON, Robert J. Stated preference methods. An introduction. Journal of Transport Economics and Policy. Londres, v. XXII, n. 1, janeiro 1988, p. 11-25. BASTOS L. C. Planejamento da rede escolar: uma abordagem utilizando preferência declarada. Tese de doutorado em Engenharia de Produção. Universidade Federal de Santa Catarina, 1994. ORTÚZAR, Juan de Dios; WILLUMSEN, Luis G. Modeling transport. Chichester England: John Wiley & Sons, 1990. BEN-AKIVA, M.; LERMAN, S. R. Discrete choice analysis. The MIT Press, 1989. ORTÚZAR, J. de D. & WILLUMSEN, L. G. Modelling transport. 3. ed. Nova Iorque: John Wiley & Sons Ltd., 1994. SOUZA, O. A. Delineamento experimental em ensaios fatoriais utilizando a técnica de preferência declarada. Tese de doutorado. Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Engenharia de Produção, 1999.
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Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
Sistema de Informações da Mobilidade Urbana Desenvolvido pela ANTP, em parceria com o BNDES, consiste em banco de dados e informações especialmente desenhado para permitir, aos setores públicos federal, estaduais e municipais, o adequado acompanhamento das várias facetas de caráter econômico e social envolvidas na dinâmica do transporte e trânsito urbanos dos municípios brasileiros com população superior a 60 mil habitantes. O Sistema de Informações da Mobilidade Urbana foi desenvolvido para agregar mais de 150 dados básicos dos 437 municípios com 60.000 ou mais habitantes em 2003, obtidos por meio de questionário enviado pela ANTP e preenchidos pelos responsáveis do transporte e trânsito municipais e metropolitanos. A abrangência das áreas consideradas são as seguintes: ônibus municipais, ônibus metropolitanos, metro-ferroviário, trânsito e mobilidade urbana. Consulte o Sistema de Informações da Mobilidade Urbana no site da ANTP - www.antp.org.br
50
mobilidade urbana
AN P
Aportes do Plano de Mobilidade Urbana e Transporte de Curitiba e Belo Horizonte segundo critérios do Plano Nacional de Mobilidade Débora Pinto Follador
Arquiteta e urbanista, pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) – Brasil; mestre em Gestão Urbana, pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Brasil. Atualmente trabalha na Ambiens Sociedade Cooperativa. Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana e do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, Brasil E-mail: deborafollador@gmail.com
Tomás Antonio Moreira
Arquiteto e urbanista, pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUCCAMP – Brasil com mestrado e Ph.D em urbanismo e habitação na França, Bélgica e Canadá. Atualmente é professor de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Brasil, pesquisador do Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos da FAU-USP e pesquisador vinculado ao Observatório das Metrópoles – Núcleo Curitiba. Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana e do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, Brasil E-mail: tomas.moreira@pucpr.br
Mobilidade Urbana no Brasil O crescimento urbano desordenado, o descompasso entre a necessidade de transporte coletivo e seu respectivo provimento, o aumento do número dos automóveis individuais ladeado pelo consequente aumento de congestionamentos, a ausência de integração entre política e gestão de transportes, pessoas, modos de transporte, uso e ocupação do solo e meio ambiente estão contribuindo para a efetivação de um meio urbano insustentável. A atividade de se locomover nas grandes cidades vem apresentando dificuldades cada vez mais preocupantes, em um ritmo bem mais acelerado que aquele verificado pela efetivação de medidas mitigadoras deste quadro. Este crescimento, sem o respaldo de um planejamento integrado entre políticas de transporte e uso e ocupação do solo, resulta em um cenário caótico em que problemas relacionados à mobilidade urbana, em especial ao trânsito ganham destaque. Além disso: 51
Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
a histórica dificuldade de incorporar a ideia de mobilidade urbana ao planejamento urbano e regional coloca-se com relevância dentre as causas da crise de qualidade das cidades brasileiras, contribuindo fortemente para a geração dos cenários atuais onde se constatam cidades insustentáveis do ponto de vista ambiental e econômico (Ministério das Cidades, 2004, p. 3).
A ênfase dada ao automóvel e sua valorização, em relação aos demais modais de transporte, aponta que as cidades começaram a apresentar dificuldades no que diz respeito às diversas atividades existentes no meio urbano, bem como na associação entre elas. As “atividades-meio” (entre elas, circulação) e as “atividades-fim” (moradia, trabalho, social, lazer) não são sustentadas pelo provimento de meios de transporte e nem pelo planejamento e gestão eficazes para que a relação entre pessoas e veículos ocorra de forma viável (Prado, 1973). Enquanto esse cenário – em que o transporte individual se apresenta de forma predominante no meio urbano – é mantido, as dificuldades em relação a acessibilidade e deslocamento se fazem presentes, auxiliando de forma negativa no aumento dos problemas gerados por este quadro. Tanto o custo dos deslocamentos quanto o custo das suas externalidades, por habitante, cresce com o tamanho das cidades, principalmente para o transporte individual, variando bem menos no caso do transporte coletivo. Em ambas as situações, o transporte individual custa bem mais para a sociedade do que o coletivo: quatro vezes mais no custo dos deslocamentos por habitante e 3,3 vezes mais no custo das externalidades (Ministério das Cidades, 2007). Nas grandes cidades, com população a partir de quinhentos mil habitantes, o custo de externalidades relacionadas à poluição, por exemplo, se sobressai em relação ao custo de externalidades relacionado aos acidentes (gráfico 1). Isso se justifica, entre muitas outras razões, pelo número excessivo de veículos individuais que, por dividirem ao mesmo tempo um espaço que não é suficiente para o fluxo de todos esses veículos, resultam em muitas horas despendidas no trânsito, ocasionando grandes congestionamentos e, consequentemente, maiores níveis de emissão de CO2. Nas cidades menores, com população entre sessenta mil e quinhentos mil habitantes, onde ainda o espaço urbano consegue atender a um número menor de veículos em trânsito, sem congestionamentos e fluxo rápido de modais e pessoas, a realidade é inversa: os maiores custos referem-se às externalidades vinculadas aos acidentes, enquanto que os custos relacionados à poluição se dão em menor número.
52
Aportes do Plano de Mobilidade Urbana e Transporte de Curitiba e Belo Horizonte ...
Gráfico 1 Custos de externalidades por tipo e classe de população de cidade (valores em bilhões de R$ por ano)
Fonte: Autor, baseado em ANTP apud Ministério das Cidades, 2007.
Com relação ao custo de externalidades de meios de transporte (gráfico 2), independentemente de qual seja o porte da cidade, o transporte individual é sempre mais custoso. “Em todas as categorias de cidades, o transporte individual responde por mais de 75% destes custos, reforçando a necessidade de tomada de medidas no âmbito do planejamento que levem a mudanças na matriz modal das cidades brasileiras” (Ministério das Cidades, 2007, p. 53). Com relação ao custo de deslocamento por habitante, ao ano, o transporte individual é três vezes mais custoso que o transporte coletivo. Nas cidades com população entre sessenta mil habitantes até quinhentos mil habitantes, o transporte individual custa seis vezes mais que o transporte coletivo (gráfico 3). Gráfico 2 Custos de externalidades por categoria modal e classe de população de cidade (valores em bilhões de R$ por ano)
Fonte: Autor, baseado em ANTP apud Ministério das Cidades, 2007.
53
Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
Gráfico 3 Custos de deslocamento por categoria modal
Fonte: Autor, baseado em ANTP apud Ministério das Cidades, 2007.
Analisando o custo anual por habitante das externalidades, novamente o transporte individual se sobressai, apresentando um valor quatro vezes maior do que o transporte coletivo, nas cidades com população acima de um milhão. Nas cidades com população entre sessenta mil e cem mil habitantes, o custo de externalidades referentes ao transporte individual é três vezes maior que o custo de externalidades do transporte coletivo (gráfico 4). Gráfico 4 Custos de externalidades por categoria modal
Fonte: Autor, baseado em ANTP apud Ministério das Cidades, 2007.
Considerando essas informações entende-se que, independente do porte da cidade, o transporte individual é sempre mais custoso que o transporte coletivo. Apesar de existirem medidas institucionais que procuram atuar de forma auxiliadora na busca pela mobilidade sustentável, o que se 54
Aportes do Plano de Mobilidade Urbana e Transporte de Curitiba e Belo Horizonte ...
confere na prática é um quadro completamente oposto ao almejado. Atualmente, o quadro da mobilidade urbana no Brasil revela um cenário desalentador: “enquanto os níveis de congestionamentos e as frotas veiculares são crescentes, não parece haver suficientes políticas e ações que promovam a melhoria das condições de circulação, acompanhando as complexas relações de deslocamento” (Medeiros; Barros, 2009, p. 29). Consequentemente, os meios não motorizados estão sendo massacrados pelo perfil contemporâneo das cidades. “A participação das viagens motorizadas, tanto por transporte individual quanto por transporte coletivo, crescem nas cidades maiores, na mesma proporção em que se reduzem as viagens a pé e por bicicleta” (Ministério das Cidades, 2007, p. 52), conforme o gráfico 5. Nos últimos dez anos, houve um acréscimo considerável do número de veículos individuais no país. Enquanto os automóveis apresentaram um aumento de 74% e as motos, 280%, os ônibus participaram com apenas 67% de aumento no número de veículos (Denatran, 2009). Segundo Carvalho (2009, p. 26), vários fatores contribuíram para os resultados expressivos da indústria de motos, “com destaque para a ampliação do crédito, que permitiu às pessoas de baixa renda acesso a linhas de financiamento com prazos maiores, juros menores e cobertura total do bem”. Como consequência, além do caos ocasionado pelos automóveis, esse modal de transporte vem assumindo um papel tão negligente quanto o primeiro, piorando ainda mais o cenário do tráfego nas grandes cidades. Gráfico 5 Mobilidade total segundo classes de população das cidades
Fonte: Autor, baseado em ANTP apud Ministério das Cidades, 2007.
Como resultado desse perfil, as viagens por modos individuais vêm aumentando consideravelmente. De acordo com a tabela 1, entre os anos de 2003 e 2008, o transporte coletivo apresentou uma diminuição na participação no total de viagens, se comparado com os demais modos. Tanto o transporte individual quanto o não motorizado mostra55
Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
ram um índice de acréscimo de viagens superior ao do transporte coletivo, no período. Além disso, se forem observados os perfis anuais desses modos, conclui-se que a relação entre eles também mudou significativamente: enquanto em 2003 o número de viagens por transporte coletivo era maior que as viagens por transporte individual, em 2008 ocorreu o oposto, ou seja, o número de viagens por transporte individual era maior que o número de viagens por transporte coletivo. Tabela 1 Evolução das viagens por modo (milhões de viagens/ano) Dados Ônibus municipal Ônibus intermunicipal Trilhos Transporte coletivo - total Automóvel Motocicleta Transporte individual - total Bicicleta A pé Não motorizado – total Total
2003 10.961 2.352 1.444 14.756 13.297 948 14.245 1.206 19.258 20.464 49.465
2004 11.004 2.323 1.455 14.782 13.647 1.027 14.674 1.311 19.645 20.956 50.412
2005 11.324 2.391 1.501 15.216 14.162 1.121 15.283 1.363 20.287 21.650 52.149
2006 11.480 2.445 1.649 15.574 14.588 1.241 15.828 1.418 20.636 22.054 53.456
2007 11.877 2.513 1.810 16.200 15.024 1.401 16.425 21.060 21.060 22.592 55.216
2008 12.099 2.695 1.980 16.774 15.389 1.582 16.971 21.584 21.584 23.237 56.983
Fonte: Elaboração do autor com base na ANTP, 2009.
Com relação às viagens realizadas por modo não motorizado, verificou-se que, em 2003, elas eram 1,43 vezes maiores que as viagens por transporte individual e, em 2008, essa relação caiu para 1,36. O mesmo não aconteceu com relação ao transporte coletivo, pois a relação entre os modos se manteve a mesma entre nesse período, ou seja, o número de viagens realizadas por meio do modo não motorizado se manteve 1,38 vezes maior que as viagens realizadas por meio do transporte coletivo. Tomando ciência destes dados apresentados resume-se que o número de viagens realizadas pelo transporte individual foi o que apresentou o maior crescimento. Direcionando o comparativo para a representatividade dos modos motorizados, individuais e coletivos no meio urbano, no que tange à ocupação na via, poluição, energia e acidentes (gráfico 6), o ônibus, modal coletivo principal no contexto nacional, é o meio com menores impactos e consumos relacionados, por passageiro transportado, ao espaço ocupado na via, pela poluição gerada, pela energia despendida e pelos acidentes ocasionados, se comparado com o automóvel e com a motocicleta. O automóvel é o que ocupa mais espaço e despende maior energia por passageiro transportado. Já a motocicleta é o modal que apresenta os maiores índices nos quesitos referentes à poluição e acidentes. 56
Aportes do Plano de Mobilidade Urbana e Transporte de Curitiba e Belo Horizonte ...
Gráfico 6 Consumos e impacto relativos com uso de ônibus, motos e autos em cidade brasileiras (Valor do ônibus = 1)
Fonte: Autor, baseado em ANTP, 2010.
Com relação ao custo gerado por esses modais para seus usuários, por região do país, observa-se que, independente da região, o custo da motocicleta é praticamente 50% maior que o custo do ônibus, enquanto que o custo do automóvel é cerca de 150% superior ao custo do ônibus. Voltando o espectro da análise para as regiões, tem-se que, em linhas gerais, as regiões com menores índices são Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Já as regiões Nordeste e Norte são as que apresentam os custos mais altos. No que diz respeito aos custos referentes à motocicleta, verifica-se que eles são relativamente inferiores na região Sudeste, “exatamente a região onde estão as cidades que apresentam maiores problemas de trânsito. [...] Este fato é consequência dos preços de combustíveis serem menores nesta região” (ANTP, 2010). Gráfico 7 Custo total relativo de uma viagem de 7 km com diferentes modos, por região (considerando o custo da viagem de ônibus igual a R$ 1,00 e desconsiderando o tempo de congestionamento, ou seja, aumento de tempo de percurso)
Fonte: Autor, baseado em ANTP, 2010. 57
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Em face desse cenário atual insustentável e excludente da mobilidade urbana, em que o predomínio por um modal inviável é evidente e o acesso à cidade é praticamente restrito a uma parcela da população, reflete-se que a política urbana, aliada a um planejamento de mobilidade urbana, deve priorizar os modais de transporte coletivo, os não motorizados e, sobretudo, os pedestres, visando à inclusão social, a racionalização dos investimentos públicos e a redução dos congestionamentos. A política urbana relativa à mobilidade já se fazia presente desde os anos 1970, mas é com a Constituição de 1988 que há a demarcação de que a União passou a ser responsável pela determinação das diretrizes da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano - política esta que se estendia também ao transporte urbano –, pela definição dos princípios e diretrizes para o sistema nacional de viação, pela proposição da Política Nacional de Transporte e pela legislação de trânsito e transporte. No período de 1999-2002, o transporte urbano passou a ser discutido no âmbito da então criada Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Presidência da República (Sedu⁄PR), que passou a ter atribuições específicas sobre habitação, saneamento e transporte urbano. A inclusão do transporte constituiu uma oportunidade de organizar o desenvolvimento urbano no país em novos moldes (Vasconcellos, 2005, p. 96).
No ano de 2000, a Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano da Presidência da República (Sedu⁄PR) criou o Grupo Executivo de Transporte Urbano (GTrans). Como justificativa para tal fato, a Secretaria mencionou as mudanças constatadas na dinâmica da ocupação urbana, resultando em um maior crescimento da periferia e consequente aumento da demanda por transporte; aumento do transporte individual e informal no meio urbano; sobrecarga do sistema viário; crescimento no número de acidentes (Gomide, 2007). Entre os anos de 2000 e 2002, o GTrans desenvolveu trabalhos para a elaboração de uma política nacional para o setor, incluindo a elaboração de uma proposta legislativa federal destinada ao transporte coletivo – documento este que resultou em reações adversas dentro do setor, uma vez que permitia a acomodação da frágil situação regulatória dos serviços de ônibus urbanos no país (Gomide, 2007). “Mesmo assim, a proposta foi encaminhada à Casa Civil da Presidência da República, porém sem providências. No início de 2003, o anteprojeto foi retirado da Casa Civil, a pedido do Ministério das Cidades” (Gomide, 2007, p. 81). A fim de formular e implementar a política de mobilidade urbana sustentável, o Ministério das Cidades instituiu a Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana – SeMob. Como principal medida tomada, a SeMob formulou a Política Nacional de Mobilidade Urbana. O processo de elaboração desse projeto teve início com 58
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os debates entre diversos atores em setembro de 2004, quando houve a aprovação das premissas da política pelo Conselho das Cidades. Após essa etapa, foi elaborado um documento com a fundamentação do projeto, apresentado e discutido com as entidades representativas do setor e da sociedade, em diversas reuniões. Na sequência, foi feito o anteprojeto de lei, com a participação da Casa Civil, o qual foi submetido a julgamento público através de audiências públicas. A partir das emendas e sugestões resultantes dessas audiências, a versão final foi constituída e aprovada, unanimemente, em agosto de 2006 pelo Conselho das Cidades. Todo esse processo foi acompanhado pela Casa Civil, pelo ministro da Fazenda e pelo ministro das Cidades (Gomide, 2007). No ano de 2007, mais precisamente no mês de agosto, o presidente da República encaminhou ao Congresso Nacional o projeto de lei de diretrizes da política nacional de mobilidade urbana. Na mesma época, o ministro das Cidades divulgou a intenção do governo federal de formular o PAC da mobilidade urbana, para majorar os recursos designados para construção de vias expressas de ônibus, ciclovias, pavimentação urbana e sinalização para o transporte coletivo nas cidades (Gomide, 2007). Como elemento norteador da Política Nacional de Mobilidade Urbana destaca-se a elaboração de planos diretores de transporte e da mobilidade, em municípios com mais de 500 mil habitantes, já estabelecido no Estatuto das Cidades de 2001. De forma a auxiliar na elaboração destes, o Ministério das Cidades e a SeMob conceberam o Caderno de referência para elaboração de plano de mobilidade. Este guia segue os princípios estabelecidos na Política Nacional de Desenvolvimento e na Política Nacional de Mobilidade Urbana Sustentável. Planos de Mobilidade Urbana de Curitiba e Belo Horizonte Abordagem A abordagem dos planos de mobilidade urbana de Curitiba e de Belo Horizonte (PlanMob-BH e PlanMob-CTBA) foi empreendida por estas já terem finalizado seus respectivos planos e por possuírem características comuns de forma a tornar a validação da análise comparativa mais coerente. Para tanto, foi considerado o documento Regiões de influência das cidades (REGIC), elaborado pelo IBGE (2007), que hierarquiza os centros urbanos a partir de análises que englobam a classificação dos centros de gestão do território, intensidade de relacionamentos e a dimensão da região de influência de cada centro (IBGE, 2007). A utilização deste estudo para auxiliar na determinação do recorte de análise é bastante pertinente, uma vez que “(...) de fato, a 59
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estrutura e a organização do território são o substrato que condiciona, e sobre o qual atuam as políticas públicas e os agentes sociais e econômicos que compõem a sociedade” (IBGE, 2007, p. 9). Esta abordagem é instigada para verificar se a composição dos planos de Belo Horizonte e Curitiba contemplam as especificações existentes no Caderno de referência para elaboração de plano de mobilidade – documento elaborado pelo Ministério das Cidades em parceria com a Secretaria Nacional de Transportes e da Mobilidade Urbana, a partir dos conceitos da Política Nacional de Mobilidade Urbana Sustentável. A determinação dos itens analisados nos planos foi baseada nas diretrizes presentes no livro PlanMob: Construindo a cidade sustentável – Caderno de referência para elaboração de plano de mobilidade urbana (Semob; Ministério das Cidades, 2007). A partir de uma leitura analítica da obra, as variáveis para apreciação foram agrupadas conforme temática e função dentro do plano, assim como os respectivos critérios de validação. Determinou-se que as análises e comparações seriam organizadas em seis grupos, a saber: grupo 1. Composição do Plano; grupo 2. Fundamentos a serem considerados e abordados pelo plano; grupo 3. Componentes fundamentais do plano; grupo 4. Temas a serem abordados no plano; grupo 5. Diretrizes; grupo 6. Proposições. No grupo 1. Composição do plano, analisou-se quais itens balizaram a constituição do plano, desde seus objetivos e métodos aplicados até seu plano de trabalho. Suas variáveis são: objetivos do plano; metodologia; plano de trabalho. No grupo 2. Fundamentos a serem considerados e abordados pelo plano, verificou-se se os elementos que devem ser os fundamentadores do plano – uma vez se tratando de um plano diretor de transporte e da mobilidade – estão compondo o plano e sob qual abordagem isso ocorre, no caso de. As variáveis constituintes desse grupo são: mobilidade; sustentabilidade; acessibilidade; circulação; participação popular. O grupo 3. Componentes fundamentais do plano, foi destinado à analise sobre quais elementos urbanos, que deveriam estar presentes no plano diretor de transporte e da mobilidade, estão fazendo parte do plano e qual a menção atribuída. Quanto às variáveis, são as seguintes: características morfológicas e urbanas do município; menção ao plano diretor; sistema viário; serviços de transporte público; modos não motorizados de transportes; modos motorizados individuais de transportes. No grupo 4. Temas particulares a serem abordados no plano, constatou-se quais e de que maneira os temas particulares indicados estão sendo tratados no plano. Sua composição se faz com as variáveis a seguir: organização da circulação em áreas centrais e polos locais; 60
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classificação e hierarquização do sistema viário; implantação e qualificação de calçadas e áreas de circulação a pé; criação de condições adequadas à circulação de bicicletas; sistemas integrados de transporte coletivo; tratamento viário para o transporte coletivo; modelo tarifário para o transporte coletivo urbano; regulamentação da circulação do transporte de carga; controle de demanda de tráfego urbano. No grupo 5. Diretrizes a serem abordadas no plano, verificou-se quais e de que forma os temas definidos pelo Ministério das Cidades e pela SeMob estão presentes no plano – o que, neste grupo, deve acontecer de forma mais genérica, ou seja, em forma de diretrizes. Suas variáveis são: diretrizes para avaliação dos impactos ambientais e urbanísticos dos sistemas de transporte; diretrizes e normas gerais para o planejamento integrado da gestão urbana e de transporte; diretrizes e meios para a acessibilidade universal; diretrizes e modelo de gestão pública da política de mobilidade urbana. Por fim, o grupo 6. Proposições, foi designado a analisar quais e de que forma as propostas indicadas pelo Ministério das Cidades e pela SeMob estão constituindo o plano diretor de transporte e da mobilidade. As variáveis que compõem o grupo são: formulação de proposta de rede de transporte coletivo integrada; análise do modelo tarifário do transporte coletivo e de integração entre serviços, porventura existente; identificação do sistema viário de interesse para a circulação do transporte coletivo e, em especial, dos corredores de tráfego no qual deverão ser previstas diretrizes para a priorização de sua circulação, incluindo a identificação das soluções propostas; identificação de locais para instalação de terminais ou estações de integração ou de conexão da rede de serviços de transporte coletivo, em bairros e⁄ou na área central; avaliação das condições dos terminais de transporte coletivo existentes e propostas de melhoria, caso necessárias; análise do transporte de cargas, em especial em relação à circulação de caminhões com peso bruto elevado e de cargas perigosas; análise pormenorizada da situação da área central ou de corredores viários comerciais, principalmente em relação ao uso das calçadas, aos níveis de saturação e às condições de estacionamento; avaliação de medidas para restrição ao transporte individual; realização de estudos de viabilidade econômico-financeira das soluções estruturais propostas. Análise A partir das informações levantadas no plano de mobilidade e depois de realizadas as avaliações qualitativas e quantitativas segundo as variáveis e critérios estabelecidos, verificou-se que, com relação ao grupo 1 – Composição dos planos, o PlanMob-Ctba apresentou 88% de atendimento às variáveis, uma vez que não foram apresentados os objetivos 61
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específicos por etapa de elaboração, apenas o objetivo geral e os objetivos específicos do plano – organizados por temas, segundo o enfoque utilizado na elaboração do plano. O PlanMob-BH, por sua vez, contemplou apenas 61% dos critérios, já que não mencionou o objetivo geral e tampouco os objetivos específicos do plano, apresentando apenas os objetivos específicos de cada etapa. Além disso, o plano não apresentou uma leitura geral da metodologia pela qual foi elaborado, apenas o detalhamento por etapa de elaboração. Com relação ao grupo 2 – Fundamentos, o PlanMob-BH apresentou um desempenho superior ao do PlanMob-Ctba, com 75% de atendimento contra 47%. Ambos os planos não atenderam aos critérios da variável “participação popular”. Em contato com pessoas que participaram da elaboração dos planos, houve a afirmação de ter existido o processo participativo, efetivado, segundo eles, através da disponibilização da versão preliminar do documento na internet. Entretanto, apesar de os documentos terem sido disponibilizados em sites, esta ação não se enquadra no critério formal do processo participativo, uma vez que a participação popular, tal qual é abordada no Estatuto das Cidades (2001), não pode ser tratada como simples legitimação de políticas pré-concebidas. Ela “(...) deve ser parte estrutural da política de desenvolvimento urbano, contemplando inclusive a sua concepção, e não ser tratada como um elemento a mais no seu processo de definição e implementação” (Estatuto das Cidades, 2001, p. 194-195). Além disso, segundo os parâmetros presentes no Caderno de referência para elaboração de plano de mobilidade, um processo participativo é efetivo quando ocorre o acesso à informação e o controle social, pela população, de todo o processo de formulação e avaliação das políticas públicas (Brasil, 2007, p. 48). Desta forma, a participação popular no desenvolvimento dos planos de Belo Horizonte e Curitiba deveria ter existido em todas as etapas de elaboração – e não apenas indiretamente, por meio da avaliação do documento preliminar disponibilizado na internet, como de fato aconteceu. Quanto aos demais critérios, de uma forma geral Belo Horizonte atendeu a todos eles integralmente, com exceção da variável “acessibilidade”, em que apenas 75% das exigências foram contempladas – assim como Curitiba, que também apresentou este percentual nessa variável. Garantir a acessibilidade é garantir a inclusão social, através do acesso democrático à cidade, da universalização do acesso ao transporte público, da acessibilidade universal e da valorização dos deslocamentos de pedestres e ciclistas. O fato de o plano de Belo Horizonte não ter tratado de forma abrangente a legislação existente para a acessibilidade reduz, consequentemente, a garantia da acessi62
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bilidade no meio urbano. Da mesma forma, o plano de Curitiba não apresentou meios efetivos para a garantia, de forma plena, da acessibilidade/inclusão social na cidade, uma vez que não aprofundou, por exemplo, a situação dos ciclistas em seu teor. Dando sequência aos piores desempenhos do grupo, verificou-se que o de Curitiba corresponde às variáveis “mobilidade” e “sustentabilidade”. Quanto à primeira, não houve o cuidado, por parte do plano, de abrangência dos critérios “aspectos socioeconômicos” e “meio ambiente”, critérios estes fundamentais para a composição da variável, já que interferem diretamente na dinâmica da mesma (Brasil, 2007, p. 41). No que se refere à segunda variável, tem-se que a importância de abordar a questão da sustentabilidade em um plano de mobilidade se dá, principalmente, pelo fato de que as atividades de transporte e mobilidade produzem fortes impactos no meio ambiente, seja de forma direta (como pela emissão de poluentes ou congestionamentos), seja de forma indireta (por se tratar de um elemento indutor fundamental do desenvolvimento econômico e urbano). Nesse sentido, buscar e propor tecnologias menos poluentes e sistemas de circulação que reduzam os impactos ambientais associados ao setor auxiliará na manutenção do meio urbano para as gerações presentes e futuras – elementos estes não presentes no PlanMob-Ctba. A partir de uma leitura geral do grupo 3 - Componentes fundamentais, constatou-se que o atendimento aos critérios de cada variável por parte de Belo Horizonte foi de 88%, enquanto que o de Curitiba foi de 97,16%. Quanto às variáveis, tanto Belo Horizonte quanto Curitiba apresentaram um menor atendimento no “sistema viário”. Tratar do sistema viário significa tratar: do espaço público por onde circulam pessoas, meios de transportes, mercadorias; do espaço público onde são abrigadas as redes de abastecimento de água, energia elétrica, telefonia, coleta e esgotamento de águas pluviais, lixo, esgoto sanitário; de equipamentos instalados nas próprias vias, no subsolo ou no seu espaço aéreo. Assim, o planejamento, a operação e a manutenção das vias e dos serviços que se dão nelas são fatores essenciais para a qualidade de vida nas cidades e para a eficiência da circulação urbana (Brasil, 2007, p. 74). Logo, não tratar da “operação e fiscalização no sistema viário” – como é o caso dos planos de Belo Horizonte e Curitiba – é não tratar de um dos elementos essenciais para a circulação urbana. Dentro de um plano de mobilidade, é imprescindível a existência de elementos capazes de orientar ações coordenadas de engenharia, educação e fiscalização para operações (rotineiras ou eventuais, programadas ou emergenciais) de organização do tráfego em pontos estratégicos do sistema viário, 63
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acompanhamento de eventos especiais, remoção de interferências, atendimento a emergências e acidentes (Brasil, 2007, p. 79). Ainda nessa variável, além da ausência de abordagem do critério referente à “operação e fiscalização no sistema viário”, Belo Horizonte também não atendeu ao critério de “leitura integrada com a região metropolitana”. A importância da abordagem desse critério se dá pelo fato de que, em regiões com elevado grau de urbanização, como é o caso de Belo Horizonte e sua região metropolitana, as necessidades de circulação de pessoas e mercadorias não podem ser restritas aos limites institucionais dos municípios. É necessário, portanto, um planejamento em escala mais ampla, que oriente os investimentos e as ações operacionais, com o objetivo de constituição de um sistema viário de interesse regional que consiga absorver esses fluxos adequadamente e com mínimas externalidades negativas. Além desses déficits, Belo Horizonte teve um desempenho inferior também na variável “modos não motorizados”, já que não abordou a diretriz referente a “carroças e veículos com tração animal”. Como é possível observar nas cidades, o número desses modos tem aumentado significamente. Logo, os mesmos devem ser considerados no planejamento da mobilidade urbana, assim como os demais modais, estando sujeitos às mesmas normas de circulação e conduta (Brasil, 2007, p. 89). O desempenho dos planos no grupo 4 – Temas particulares atingiu pontuações muito próximas. Na variável “organização da circulação em áreas centrais e polos locais”, tanto o PlanMob-BH quanto o PlanMob-Ctba contemplaram apenas 33% dos critérios especificados – pontuação essa atribuída ao fato de que nenhum dos planos em questão tratou dos critérios referentes à “análise/alargamento das calçadas para melhoria das condições de circulação dos pedestres” e, tampouco, à “sinalização semafórica”. Segundo os parâmetros da mobilidade sustentável – em que os meios não motorizados devem ser priorizados –, para que haja um alargamento das calçadas e consequente melhoria das condições de circulação dos pedestres devem ser analisadas, primeiramente, as possibilidades para que isso ocorra. Quanto à “sinalização semafórica”, por se tratar de uma ferramenta destinada à organização da circulação urbana, também é item imprescindível nos planos de mobilidade (Brasil, 2007, p. 138). Outra variável em que as duas capitais apresentaram um atendimento inferior ao esperado foi na “implantação e qualificação de calçadas e áreas de circulação a pé” – 83,3% em Belo Horizonte e 66,64% em Curitiba. Sobre o transporte a pé, tem-se que o mesmo é expressivo em todas as cidades brasileiras. Por este motivo, investir nas calçadas é fundamental para a garantia do direito de ir e vir dos cidadãos. Um fato corriqueiro observado nas cidades é que, devido à omissão dos pode64
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res públicos sobre a administração das calçadas, muitos abusos começaram a fazer parte do meio urbano, como, por exemplo, a invasão das calçadas pelos automóveis; a colocação de mesas nos espaços até então destinados aos pedestres; ocupação das calçadas pelo comércio (Brasil, 2007, p. 124-125). Dessa forma, tão importante quanto investir é fiscalizar o uso nessas áreas, de forma a evitar esses excessos. Com relação ao critério referente à “fiscalização quanto ao uso correto das calçadas e passeios”, o mesmo não foi abordado tanto pelo PlanMobBH quanto pelo PlanMob-Ctba, havendo ainda a carência de tratamento, por este último, do critério referente à “atenção à localização adequada dos equipamentos urbanos públicos” nas calçadas. Belo Horizonte apresentou um desempenho regular também na variável “sistema integrado de transporte coletivo urbano”, em que o atendimento foi de 66,66%. A integração entre os sistemas de transportes coletivos tem se afirmado, cada vez mais, como uma necessidade para a população que diariamente realiza várias viagens pela cidade. Contudo, para a viabilização de um sistema integrado de transportes é fundamental a existência de um modelo operacional capaz de organizar as redes existentes ou previstas – critério este não contemplado pelo PlanMob-BH. Sobre o grupo 5 tem-se que, considerando que o conteúdo do Caderno de referência para elaboração de plano de mobilidade – neste estudo organizado em grupos, variáveis e diretrizes - deve estar presente em todo e qualquer plano de mobilidade de forma clara e direta, possibilitando uma identificação rápida e concisa dos elementos que compõem o documento –, verificou-se que o PlanMob-BH não apresentou diretrizes na sua composição. Com relação à Curitiba, o PlanMob-CTBA contempla 73% dos critérios, tendo atendido 50% das variáveis relativas às “diretrizes para avaliação dos impactos ambientais e urbanísticos dos sistemas de transporte”, 66,66% da variável “diretrizes e normas gerais para o planejamento integrado da gestão urbana e de transporte”, 75%, da variável “diretrizes e modelo de gestão pública da política de mobilidade urbana” e 100%, da variável “diretrizes e meios para a acessibilidade universal”. Um dos elementos mais importantes do plano de mobilidade são as diretrizes, pois são elas que iniciam a apropriação do caminho a que serão direcionadas as proposições. Considerando essa importância, elas devem ser elaboradas de forma a traduzir as iniciativas para implementação dos conceitos definidos na Política Nacional de Mobilidade Urbana, na intenção da construção de cidades sustentáveis e de fortalecimento da gestão pública, de prioridade ao transporte coletivo e aos 65
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meios de transporte não motorizados, de inclusão social, de gestão democrática e de sustentabilidade ambiental (Brasil, 2007, p. 113). Dessa forma, tal qual aparece na composição do grupo 5, os temas que deveriam compor o grupo de diretrizes e que nesse estudo foram organizados em variáveis e critérios, não só são imprescindíveis como devem estar contemplados em sua totalidade tanto no PlanMob-BH quanto no PlanMob-Ctba. O fato de Belo Horizonte não ter apresentado as diretrizes de forma nítida e direta fragiliza o documento. Curitiba, por sua vez, apesar de ter apresentado um grupo de diretrizes, este se mostrou incompleto uma vez que alguns critérios não foram abordados no plano, como é o caso dos que respaldam elementos como meio ambiente, avaliação de impactos e tendências urbanas e custeio de gestão. No que diz respeito ao grupo 6, tratar de propostas significa tratar, salvas as exceções, da última etapa de qualquer plano. Como cada cidade possui uma realidade e, consequentemente, demandas diferentes, torna-se inviável e até mesmo impossível traçar critérios a serem atendidos de forma generalizada. Por este motivo, neste grupo – “Proposições” – foram estabelecidas apenas as variáveis consideradas como obrigatórias em um plano de mobilidade. Partindo do mesmo princípio da análise anterior, de que todo o conteúdo do Caderno de referência para elaboração de plano de mobilidade – neste estudo organizado em grupo, variáveis e diretrizes – deve estar presente em todo e qualquer plano de mobilidade de forma clara e direta, verificou-se que o PlanMob-CTBA não apresentou propostas. O plano de Belo Horizonte contemplou todas as variáveis integralmente. Análise comparativa A partir das análises detalhadas acima, foi possível a realização de uma análise comparativa visando à conclusão acerca dos planos no que tange à sua composição, potencialidades, fragilidades e carências. Desta forma, verificou-se que os planos apresentaram uma diferença considerável entre si nos grupos 1, 2, 5 e 6 (composição, fundamentos, diretrizes e proposições, respectivamente). Destes, o PlanMobCTBA se destacou nos grupos 1 (atendimento de 88% contra 61% do PlanMob-BH) e 5 (atendimento de 73% contra 0% do PlanMobBH); o PlanMob-BH se destacou nos grupos 2 e 6 (atendimento de 75% e 100%, respectivamente, contra 0% do PlanMob-CTBA). Nos grupos referentes aos componentes fundamentais (grupo 3) e temas particulares (grupo 4), os planos apresentaram uma composição bastante semelhante. 66
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Na leitura geral final dos planos, tem-se que ambos possuem um conteúdo razoável, apresentando uma diferença de apenas 3% de um para outro (Belo Horizonte apresentou uma composição de 68% em conformidade com os parâmetros de análise e Curitiba, de 65%). Um déficit comum entre os documentos foi a ausência da participação popular na sua elaboração, fato este que diminui consideravelmente o teor compositivo do processo elaborativo de ambos. Segundo o governo federal, a base de uma política urbana com participação popular está no reconhecimento de que a participação nas políticas públicas é um direito dos cidadãos e de que o caminho para o enfrentamento da crise urbana está diretamente vinculado à articulação e à integração de esforços e recursos nos níveis dos governos federal, estadual e municipal, com participação dos diferentes segmentos da sociedade. Nesse sentido, a inexistência da participação da sociedade na formulação do conteúdo do documento fragiliza sua capacidade de efetivação da mobilidade. Outras deficiências comuns nos planos merecem destaque: a abordagem do sistema viário - mais especificamente sobre a operação e fiscalização; abordagem de calçadas e passeios. Com relação ao sistema viário (operação e fiscalização), é importante que sejam traçadas de forma detalhada ações capazes de nortear a organização, fiscalização, punição e controle do tráfego garantindo, desta forma, a mobilidade das pessoas, bens e modais. Quanto às calçadas e passeios, considerando que o transporte a pé é um modo de locomoção importante em todas as cidades brasileiras, independente do porte, é imprescindível que existam medidas capazes de melhorar a situação das mesmas, garantindo a circulação de todos os cidadãos. Dessa forma, apesar da agressiva expansão do sistema rodoviário, intervenções paisagísticas e trânsito de veículos, a questão das calçadas e passeios é uma das que devem ser priorizadas, havendo a normalização de execução, fiscalização quanto ao uso correto destes espaços, normatização quanto à localização de equipamentos urbanos e mobiliários urbanos, desenho universal, materiais de qualidade, largura mínima para a circulação de pedestres etc. Sobre essas deficiências comuns tem-se que, conforme a análise detalhada no presente estudo, tanto no PlanMob-BH quanto no PlanMob-CTBA, o tratamento dessas questões ficou muito incipiente, não existindo o cuidado sugerido pelas variáveis e tampouco pelos respectivos critérios. Dando continuidade a essa leitura-síntese geral, alguns elementos não foram considerados ou, no caso de, foram trabalhados através de 67
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uma leitura muito superficial nos planos. No que se refere ao PlanMob-BH, verificou-se uma fragilidade quanto à abordagem de legislações (municipais, estaduais e federais) existentes sobre os assuntos tratados, bem como quanto à abordagem do transporte coletivo. O PlanMob-CTBA, por sua vez, não aprofundou a assimilação dos aspectos socioeconômicos para embasar o plano como um todo, além de tratar de maneira muito indireta as questões do meio ambiente, sustentabilidade e bicicletas. Quanto à estruturação do plano, as duas peças apresentaram faltas gravíssimas: no PlanMob-BH a inexistência de diretrizes – que deveriam ser colocadas no plano de forma clara e direta – dificultou a apropriação das proposições já que, apesar de muito bem detalhadas e inseridas em cenários reais, carecem de um elemento anterior capaz de indicar a direção que objetiva o plano. No PlanMob-CTBA, por sua vez, a ausência de proposições fragilizou a concepção do mesmo, pois, devido a essa deficiência, a função da peça ficou muito vaga, uma vez que, conceitualmente, ela deveria atuar como um instrumento norteador e indutor de práticas relacionadas à mobilidade. Considerações finais Por meio das análises realizadas chegou-se ao resultado de que Belo Horizonte e Curitiba possuem um documento importante, porém incipiente em seu conteúdo, uma vez que ambos os planos não contemplaram integralmente as especificações que devem estar presentes em todo e qualquer plano de mobilidade. A análise de um plano de mobilidade se dá tanto pela importância a que tanto o plano – materialização do planejamento – quanto a mobilidade vêm recebendo nas cidades, consequência do crescimento acelerado do número de automóveis, motocicletas, congestionamentos; da expansão horizontal da urbe para regiões carentes de infraestrutura (como rede de transporte público), o que acarreta viagens mais longas, esporádicas e demoradas; da redução dos espaços destinados aos modais não motorizados; do aumento no impacto agressivo ao meio ambiente. Todos esses problemas carecem de um elemento que seja capaz de nortear a sua regulação. Porém, para que o meio urbano possua condições que se mostrem viáveis à mobilidade, não basta apenas existir o plano: o mesmo deve ser constituído a partir de uma postura ampla, de forma a abranger todos os atores envolvidos na dinâmica do município. Não obstante, o documento tem de apresentar os caminhos para a integração sustentável desses atores. 68
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Nesse sentido, analisar o que é e de que forma é buscada a mobilidade – centro de discussão dessa pesquisa –, foi considerado verbo imperativo, pois, em face da concepção genérica de que o plano de mobilidade deve atuar no sentido de organizar a circulação de pessoas, bens e serviços, com a garantia de priorização dos modos não motorizados e do meio ambiente, este entendimento se mostrou mais que fundamental. Quanto aos resultados das análises, algumas considerações merecem destaque. Sobre o Plano de Mobilidade Urbana de Belo Horizonte, o mesmo expôs um cuidado menor com os modos não motorizados, além do fato de que o mesmo não apresentou uma leitura regional na abordagem das variáveis. O Plano de Mobilidade Urbana e Transporte Integrado de Curitiba, por sua vez, não aprofundou as questões relacionadas aos aspectos socioeconômicos, de meio ambiente e sustentabilidade. Os temas que receberam um tratamento detalhado em ambos os planos foram os referentes à circulação, sistema viário, serviços de transporte público, modais motorizados individuais e transporte de carga. Além disso, ao tratarem de aspectos também existentes em seus planos diretores, Belo Horizonte e Curitiba os resgataram, de forma a garantir a conectividade entre as intenções do plano de mobilidade e do plano diretor. No que diz respeito à composição dos planos, os dois cometeram falhas graves: Belo Horizonte, por não apresentar diretrizes claras e prontamente identificáveis, o que fragiliza o seu conteúdo, pois, apesar de apresentar propostas muito bem detalhadas, as mesmas carecem de um elemento norteador que direcione o rumo para onde o plano pretende chegar; e Curitiba, por apresentar como elemento final de seu plano as diretrizes e não as propostas sugerindo, portanto, apenas as intenções. Talvez a maior falta que tanto o PlanMob-BH quanto o PlanMob-Ctba tenham cometido nas etapas de elaboração foi a ausência da participação popular no processo de elaboração dos documentos. A participação da sociedade na discussão de um plano de mobilidade é necessária para que as relações entre os setores econômicos, sociais e políticos sejam efetivadas e, consequentemente, indiquem a direção para a produção de cidades mais justas e democráticas. Assim, frente ao fato de que o processo participativo representa a garantia de que a sociedade também possui poder de decisão sobre o planejamento urbano, a sua ausência nas etapas estruturais induz à conclusão de que provavelmente muitas das demandas que a sociedade considera importantes, bem como posições contrárias ao que foi estabelecido, não foram avaliadas. 69
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Políticas de transporte
AN P
Aspectos da mobilidade urbana em cidades do Baixo Amazonas: indicadores para elaboração de políticas públicas Maisa Sales Gama Tobias Nírvia Ravena
Universidade da Amazônia e Universidade Federal do Pará E-mail: maisatobias@unama.br;maisa@ufpa.br E-mail: niravena@uol.com.br
Rui António Rodrigues Ramos Daniel Souto Rodrigues Universidade do Minho E-mail: rui.ramos@civil.uminho.pt E-mail: dsr@civil.uminho.pt
A necessidade de movimentação urbana é ao mesmo tempo causa e efeito do desenvolvimento (Affonso, 2002), devendo ser integrada às ações dos principais agentes que afetam a forma como uma cidade se desenvolve. A mobilidade urbana pode ser vista como um atributo associado às pessoas e aos bens, que corresponde às diferentes respostas dadas por indivíduos e agentes econômicos às suas necessidades de deslocamento. Neste contexto, devem ainda ser consideradas as dimensões do espaço urbano e a complexidade de atividades nele desenvolvidas, como também a capacidade das pessoas de se deslocarem no meio urbano para realizar as mesmas. Sob este aspecto, as políticas públicas têm um fator determinante na elaboração de programas que englobam várias dimensões relativas à vida do indivíduo. Destacam-se aquelas ligadas aos problemas de transportes, que se tornam de mais fácil solução quando a União, estados e municípios interagem de forma negociada junto com a participação popular. A Constituição brasileira de 1988 (título III, cap. IV, art. 30) ressaltou a responsabilidade dos municípios como principais atores na implementação das políticas de transporte e de ordenamento territorial. No Brasil, a política relativa à mobilidade urbana ainda está centrada fortemente no uso do automóvel, mas essa realidade vem sendo modificada em função dos impactos negativos provocados pelo seu uso (econômicos e ambientais). Somam-se a esses impactos negativos demandas configuradas pela realidade complexa e diferenciada dos níveis regionais do país. Este artigo apresenta caminhos para a formulação de políticas de transporte no nível local, utilizando o conceito de mobilidade como uma 71
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medida de equidade social e como um indicador para subsidiar propostas de (re)direcionamento de políticas de transporte urbano em cinco cidades do Baixo Amazonas (Santarém, Alenquer, Monte Alegre, Óbidos e Oriximiná). As situações são de vulnerabilidade e segregação socioespacial, que podem ser explicadas tanto pelas condições de vida da população quanto pelas relações que a mesma estabelece com os espaços urbanos em termos de mobilidade. Dados secundários e de pesquisa de campo, empreendida na região, revelaram que a circulação de pessoas e mercadorias transcende o espaço inter-regional, apresentando essas cidades insuficiência de infraestrutura e de políticas de transporte para o desempenho de todas as suas funções sociais. Na análise, a mobilidade é uma medida de equidade social e um indicador no (re)direcionamento de políticas de transporte urbano. A REGIÃO DO BAIXO AMAZONAS O Baixo Amazonas é uma meso-região do Estado do Pará, no norte do Brasil, numa área de 315.856,73 km2 (IBGE, 2003), população absoluta de 638.582 habitantes (IBGE, 2007), produto interno bruto PIB de R$ 3.283.945,24 e PIB per capita de R$ 5.048,76 (IBGE, 2008). As cidades da região são: Alenquer, Belterra, Curuá, Faro, Juruti, Monte Alegre, Santarém, Almeirim, Óbidos, Oriximiná, Prainha e Terra Santa. Na tabela 1 e figuras 1 e 2 tem-se os dados territoriais e de localização regional, respectivamente. Tabela 1 Dados territoriais das cidades sob estudo Município Santarém Óbidos Oriximiná Monte Alegre Alenquer Total
Fundação(*) 1661 1755 1877 1755 1881
População 294.774 49.254 62.963 55.459 52.714 515.164 (72% da região)
Área (km2) 22.887 28.021 107.603 18.153 23.645 200.309 (63% da região)
Fonte: IBGE, 2010. Nota: (*) Dados obtidos de fontes diversas, havendo algumas contradições, podendo ser aceitos como indicativo aproximado da data de fundação destas cidades.
Aspectos do desenvolvimento territorial do Baixo Amazonas A região é formada, em sua maioria, por cidades de colonização antiga, ligadas às primeiras expedições de colonizadores ao rio Amazonas, com povoados que deram origem a Santarém, Alenquer, Almeirim, Monte Alegre e Óbidos. Por seu lado, Faro, cidade mais recente que as anteriores, 72
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tornou-se município em 1768. A partir de 1970, tem-se na região importantes empreendimentos: a construção da BR-163 (rodovia Cuiabá-Santarém) e do porto de Santarém e a exploração de bauxita no rio Trombetas. Figura 1 Território das cidades sob estudo
Figura 2 Localização ribeirinha das cidades sob estudo
Atualmente, a região vem sendo dinamizada pela produção da soja, no eixo da BR-163, havendo, também, destaque econômico para a fruticultura, o turismo, como uma das atividades econômicas de maior potencialidade na região e, ainda, as atividades tradicionais ligadas à extração da madeira, culturas da mandioca e arroz, a pecuária, a pesca etc. 73
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Cidades sob estudo As cinco cidades foram selecionadas pela proximidade geográfica e por serem de porte médio, em torno da maior cidade da região, Santarém. Juntas representam praticamente 72% da população e 68% da extensão territorial do Baixo Amazonas (tabela 1). Com base em dados secundários, nas tabelas 2 e 3, tem-se algumas variáveis que demonstram a superioridade hierárquica de Santarém. Para complementar, nas visitas in loco, foram feitas 500 entrevistas a residentes dessas cidades, obtendo-se uma descrição geral das condições sociais, econômicas, de transporte e de uso e ocupação do solo. Pode-se observar, por exemplo, que a população é essencialmente jovem, de escolaridade média e de baixa renda (figura 3) e, particularmente, na relação ocupação versus renda, percebeu-se uma predominância nas principais ocupações da população das cidades de pessoas com renda entre um e dois salários mínimos (figura 4). O trânsito e o transporte público Como instrumento básico de orientação do desenvolvimento urbano, pode-se dizer que todas essas cidades possuem algum tipo de marco regulatório em relação ao trânsito e ao transporte. No quadro 1, temse a caracterização urbana das cidades, a partir de visitas in loco e, no quadro 2, a síntese das situações levantadas in loco junto aos órgãos municipais e, outros, obtidos em consulta direta a cidadãos comuns e técnicos dessas cidades. Tabela 2 Índice de Desenvolvimento Humano – IDH e PIB per capita Cidades Alenquer Monte Alegre Óbidos Oriximiná Santarém
IDH2000 0,673 0,690 0,681 0,717 0,746
PIB per capita (preços correntes - R$) 3.016,77 4.235,01 3.905,04 16.982,09 6.004,42
Fonte: Atlas de Desenvolvimento Humano/PNUD (2000) - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, 2000.
Tabela 3 Frota veicular registrada em cada cidade, % Cidades Alenquer Monte Alegre Óbidos Oriximiná Santarém
Automóveis 14,3 12,4 24,5 32,9 37,9
Ônibus 1,0 1,0 1,0 0,69 1,18
Motos 71,0 73,0 68,6 48,0 46,0
Fonte: Ministério da Justiça, Departamento Nacional de Trânsito - Denatran, 2009.
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Total 3.013 5.579 2.406 3.442 43.334
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O trânsito Apenas na cidade de Santarém o trânsito é municipalizado desde 1995, sendo gerenciado pela Secretaria Municipal de Transporte Público e Trânsito - SMT. Este município já apresenta um centro comercial bastante congestionado e situações de trânsito no sentido periferia-centro com grandes congestionamentos em horários de pico. Quadro 1 Caracterização urbana das cidades Cidades Alenquer: a cidade fica situada na margem esquerda do rio Amazonas. A morfologia urbana é radial, com o centro comercial na beira do rio. A base econômica está no comércio, na agricultura, pesca e pecuária, com raízes na economia familiar.
Localização/acesso/imagens O acesso usual é via fluvial à partir de Santarém, em lanchas, barcos ou por balsa, com travessia hidroviária e seguindo por 150 km de estradas (PA 254) até esta cidade, com duração de 3h até 6h de viagem.
Monte Alegre: a cidade está situada na margem esquerda do rio Amazonas, com relevo constituído de terras firmes e alagáveis. A morfologia urbana é radial, com o centro comercial na beira do rio. A economia é baseada na pecuária, extração de pedras para construção, produção, pesca, agricultura e turismo. Óbidos: situada na margem esquerda do rio Amazonas, com relevo constituído de terras firmes e alagáveis. A sede está no ponto mais estreito do rio Amazonas (1.890 metros no leito normal). A morfologia urbana é radial, com o centro comercial na beira do rio. A base da economia: fibra de juta, a castanha do Pará e a pesca.
O acesso se dá via aérea (vôos privados); via fluvial, através de lanchas e barcos e, ainda, por balsa, com travessia hidroviária a partir de Santarém, seguido de rodovia (PA 254).
O acesso se dá via aérea (vôos privados); via fluvial, através de lanchas e barcos e, ainda, por balsa, com travessia hidroviária a partir de Santarém, seguido de rodovia (PA 254). A partir de Santarém o tempo médio de viagem é de 2,5h a 6h.
Continua
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Quadro 1 - continuação Cidades Santarém: situada na margem direita do rio Amazonas, no encontro das águas com o rio Tapajós. O relevo é constituído de terras firmes e alagáveis. É a cidade mais importante da região, com economia predominante de comércio e serviços no sítio urbano e, na parte rural, de agricultura e pesca. Como as demais cidades ribeirinhas, a morfologia urbana é radial, com o centro comercial na beira do rio. Oriximiná: A cidade situase na margem esquerda do rio Trombetas, com relevo constituído de terras firmes e alagáveis. É uma das cidades mais importantes da região, com a extração de bauxita em porto Trombetas sendo considerada uma referência a nível mundial. A morfologia urbana é radial, com o centro comercial na beira do rio. A base da economia é voltada para a área rural, com destaque para a agropecuária e a extração de minério e, no sítio urbano, a parte de comércio e serviços. Oriximiná apresenta situações típicas do transporte nas cidades sob estudo: o transporte hidroviário, e a predominância do transporte individual, sejam motos ou bicicletas.
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Localização/acesso/imagens Tem acesso por via aérea (vôos comerciais e privados) a Belém, capital do Estado, e a Manaus (distando 1,5h de Belém e 45 minutos de Manaus). Contudo, o mais importante acesso é por via fluvial, através de lanchas e barcos (com ligações diretas às demais cidades sob estudo). Possui, ainda, acesso rodoviário pela Transamazônica. Nas imagens abaixo, pode-se observar a principal atração turística da região e, ainda, a orla da cidade.
O acesso se dá via aérea (vôos privados); via fluvial, através de lanchas e barcos e, ainda, por balsa, com travessia hidroviária a partir de Santarém, seguido de rodovia até a sede do município (PA 254). A duração média de viagem, em relação às demais cidades sob estudo, varia de 3h a 9h, porém, dentro do território da cidade há lugares que são alcançados após 16h de barco.
Aspectos da mobilidade urbana em cidades do Baixo Amazonas: indicadores ...
Figura 3 Faixa etária e escolaridade dos residentes nas cinco cidades sob estudo
A sinalização de trânsito está presente principalmente na parte comercial da cidade de Santarém. A preferência dos motoristas pelas vias asfaltadas contribui para o congestionamento, seguido dos ônibus e do fato da cidade ter grande parte do seu sistema viário ainda não asfaltado. As demais cidades são conveniadas com o Detran-PA para os serviços de engenharia, educação e policiamento do trânsito, com deficiências no planejamento para a complementaridade entre modos de transporte. Figura 4 Relação ocupação versus renda nas cinco cidades sob estudo
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De maneira geral, nessas cidades, apenas na parte comercial, em geral na orla do rio, se observam situações de trânsito mais congestionado, como também são esses locais os mais sinalizados. Geralmente, no sentido centro-periferia há crescente aumento de vias não asfaltadas e sem sinalização. No quadro 3, tem-se uma síntese dos principais modos de transporte e o resultado da pesquisa em campo sobre a utilização dos modos de transporte disponíveis. Quadro 2 Síntese dos instrumentos de gestão urbana das cidades Cidades Alenquer
Monte Alegre
Óbidos
Instrumento legal Plano Diretor (Lei nº 044/2006), Código de Postura e Código de Obras. Lei de uso do solo e de cobrança de renda imobiliária (Lei nº 033/2007), Regulamento de Trânsito (Lei nº 678/2006) que institui a municipalização.
Situação de implantação Os códigos encontram-se desatualizados (tanto o Código de Postura como o de Obras são de 1964) e o Plano Diretor não contempla o macrozoneamento das áreas onde se pretende induzir a expansão urbana, prejudicando a sua aplicação. Além desses aspectos, a legislação não é conhecida pelos próprios gestores e, ainda, a descontinuidade administrativa dificulta a gestão do espaço urbano. O cadastro fundiário existe apenas para fins de controle de ocupação de áreas urbanas, consideradas prioritárias e para a cobrança do IPTU. O trânsito ainda não é municipalizado, apesar de haver dispositivo legal sobre o assunto. A Prefeitura necessita do apoio do Detran-PA e da Polícia Militar Estadual. Os códigos encontram-se desatualizados, Plano Diretor (Lei nº 4.664/2006), Zoneamento prejudicando inclusive a aplicação do Plano Agroecológico, Código de Diretor que precisa de regulamentação Postura, Código de Obras específica de seus dispositivos. O cadastro fundiário existe apenas para fins de controle e Código Tributário. Regulamento de Trânsito de ocupação de áreas urbanas, consideradas (Lei nº 4.690/2007) que prioritárias e para a cobrança do IPTU. Há um institui a municipalização. Departamento de Trânsito Municipal, porém, o trânsito não é municipalizado por completo, ou seja, a Prefeitura não assumiu plenamente a gestão, necessitando de apoio do DetranPA e da Polícia Militar Estadual. Plano Diretor Participativo Os instrumentos encontram-se atualizados e (Lei nº 3.408/2006, alterada pode-se observar que o Plano Diretor aplica-se pela Lei nº 3.443/2007), no centro principal do núcleo urbano, porém, Lei Orgânica, Código de em áreas periféricas é sentida a sua ausência. Postura, Código de O cadastro fundiário existe para fins de Obras (Lei nº 3.762/2009) controle de ocupação de áreas urbanas e para e Código Tributário a cobrança do IPTU. Há um Departamento de (Lei nº 3.866/2010). Trânsito Municipal atuante, o trânsito é Regimento de Mototáxi municipalizado por completo, porém, a cidade (Lei nº 3.445/2008). ainda necessita de apoio do Detran-PA e da Regulamento de Trânsito Polícia Militar Estadual. Também, tem-se a (Lei nº 3.389/2005). regulamentação do mototáxi que é o um dos mais importantes modos de transporte público. Continua
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Quadro 2 - continuação Cidades Oriximiná
Santarém
Instrumento legal Plano Diretor (Lei nº 6.720/2006), Macrozoneamento, Código de Postura (Lei nº 7.233/2009), Código de Obras, Código Tributário, Código do Meio Ambiente (Lei nº 7.302/2010). Decreto sobre a passagem de transporte de carga na área urbana (Decreto nº 098/2010). Lei do Mototáxi nº 7.232/2009. Plano Diretor Participativo (Lei nº 18.051/2006); Lei Orgânica, Código de Postura, Código de Obras e Código Tributário (Lei nº 16.229/1998). Lei do perímetro urbano. Encontra-se em tramitação projeto de zoneamento econômico-ecológico com base no Decreto Federal 622. Lei Municipal de Meio Ambiente (Lei nº 17.894 de 15/12/2004). Plano Municipal de Habitação de Interesse Social (PMHIS). Regulamentos de Transporte Coletivo, de Taxi e de Mototáxi.
Situação de implantação Alguns instrumentos de gestão encontramse desatualizados. O Plano Diretor não tem absolutamente aplicação prática, assim como o Código de Postura. O cadastro fundiário existe apenas para fins de controle de ocupação de áreas urbanas e para a cobrança do IPTU. Não foi observada municipalização do trânsito, dependendo a cidade exclusivamente do Detran-PA e da Polícia Militar Estadual. O mototáxi e o táxi são os principais modos de transporte público. O Plano Diretor tem sua aplicação prejudicada pela falta de regulamentação dos seus dispositivos. O Código de Postura, o Código Obras e a Lei do perímetro urbano estão desatualizados. Na realização do Plano Diretor houve a execução do cadastro multifinalitário, o que possibilitou regular pelo menos metade dos bairros. O cadastro fundiário existe para fins efetivos de controle de ocupação de áreas urbanas. O trânsito é municipalizado e gerenciado pela Secretaria Municipal de Transportes, existindo regulamentações básicas de transporte público. Também, a cidade possui uma Secretaria Municipal de Organização Portuária - Semop, criada pela Lei nº 18.237 de dezembro de 2008, um avanço no reconhecimento da importância do transporte fluvial na região. Sob esta Secretaria está a responsabilidade de gestão do transporte fluvial na orla e dos portos municipais.
O transporte público Em geral, em todas as cidades, o transporte carece de regulamentação e de planos complementares para efetivamente funcionar e a maioria das viagens é feita por transporte informal. Apenas em Santarém o transporte público é regulamentado: ônibus, táxi e mototáxi, concedidos mediante permissão. Nas demais cidades, a exploração dos transportes é precária, mediante autorizações do executivo, para fins específicos. Como pode ser percebido no quadro 3, a preferência é geral por transporte de barco, seguido de motos, bicicletas e o transporte a pé. No caso do transporte individual, com exceção do mototáxi, que existe em todas as cidades, tem-se geralmente o automóvel, a moto e a bicicleta como os 79
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modos mais utilizados. Sendo transporte motorizado, o barco é o mais utilizado, para viagens entre as áreas urbanas e rurais, explorado por particulares ou empresas sem qualquer regulação, apenas algumas linhas são reguladas de forma precária pela Agência Estadual de Regulação do Estado do Pará ou mesmo pela Agência Nacional de Transporte Aquaviário. No meio urbano e intraurbano, o barco se mantém na preferência de utilização, porém, é reconhecido pela população como um modo de transporte inseguro e carente de conforto, tanto no que diz respeito à embarcação quanto à infraestrutura nos terminais hidroviários na região. A constatação da insegurança apontada pelos usuários demonstra que a inexistência de um marco regulatório para transporte fluvial nos níveis municipais coexiste com a insuficiência da regulação desse transporte pelo Estado e pela União. Esse fenômeno interfere na execução de políticas baseadas na complementaridade modal, demonstrando que nesses municípios a mobilidade não se apresenta como medida de equidade social. Na figura 5 tem-se uma imagem de embarque em Santarém, no mesmo lugar, em 1995 e em 2010, respectivamente, capturada por um dos autores deste trabalho, mostrando que a situação se perpetua com poucos avanços na qualidade do serviço do transporte de passageiros. Quadro 3 Modos de transporte predominantes e percentual de utilização Modos Alenquer Modos públicos de transporte Ônibus √ Taxi √ Mototaxi √ Barco √ Van/Kombi Modos individuais de transporte √ Autos √ Bicicleta √ A pé (+1km) √ Barco
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Monte Alegre
Óbidos
Oriximiná Santarém
√ √ √ √
√ √ √ √
√ √ √ √
√ √ √ √ √
√ √ √ √
√ √ √ √
√ √ √ √
√ √ √ √
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Figura 5 Situações de embarque na orla da Santarém em 1995 e 2010, respectivamente
INDICADORES PARA ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS A política de transporte na Amazônia é resultado de um modelo proposto para todo o território nacional em que o planejamento de transportes, atrelado às diretrizes de desenvolvimento, foi uma estratégia promovida pelos governos militares, associando-o à integração regional. As políticas atuais de desenvolvimento regional mantêm esta lógica, presente no projeto de Lei Federal nº 1.687, aprovado em 2007, em que o transporte é elemento estratégico das ações de planejamento e de desenvolvimento na Amazônia e no país. Nesta perspectiva, a informação e participação são apontadas como elementos fundamentais para que instrumentos de planejamento, tais como os planos diretores urbanos, sejam incluídos na formulação das estratégias de implementação das políticas de transporte (Sucena et al, 2005; Andrade et al, 2006; Gomide, 2008). No entanto, mesmo com essas recomendações, a regulação do transporte no Brasil tem padronizado as políticas desse setor. Assim como as políticas de transporte, os planos diretores na Amazônia enfrentam dificuldades na sua implementação, pois se originam também de políticas urbanas padronizadas, centradas em contextos socioambientais que não correspondem às especificidades toponímicas, sociais e ambientais da Amazônia. As cidades de Alenquer, Monte Alegre, Óbidos, Oriximiná e Santarém estão inseridas formalmente no contexto de planejamento de transporte na Amazônia, ou seja, uma complementaridade modal baseada na dominância do uso de barcos, com trajetos que unem o rural e o urbano. A análise associada das figuras 3 e 4, da tabela 3 e do quadro 3 revela que a mobilidade urbana nessas cidades não se apresenta como medida de equidade e que as políticas de transporte elaboradas nos níveis federativos da União e do Estado não conseguem atingir os níveis locais, sendo a composição de modos de transporte um desafio para a formulação de políticas públicas de transporte para a região. Os resultados da pesquisa permitiram apontar um conjunto de cinco condicionantes que definem a 81
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dinâmica dos transportes nesses municípios do Baixo Amazonas. Estes condicionantes caracterizam, de forma específica, a mobilidade na região e devem ser considerados na formulação das políticas de transporte nos níveis estaduais e da União para que a política de transporte possa ser implementada com êxito nos níveis locais. São eles: Condicionante 1 - Histórico: as cidades do Baixo Amazonas, até a metade do século XX, dependiam exclusivamente do transporte hidroviário, com territórios extensos e sedes à beira do rio e grande vazio habitacional na área rural. A partir da segunda metade do século XX, no regime militar e nos períodos posteriores, a região foi incluída em políticas de desenvolvimento que priorizaram a construção de rodovias, alterando o vetor dos fluxos de transporte para o interior, promovendo a redistribuição entre rodovias e rios. As alterações econômicas e demográficas promovidas por essas políticas resultaram numa alteração espacial em que o sistema viário dos centros históricos desses municípios, com ruas e calçadas estreitas, não comporta estas alterações drásticas. Nesses municípios, são comuns problemas de acessibilidade para os pedestres e ciclistas e espaço viário escasso para os veículos (ver figura 6). Condicionante 2 - Concentração de infraestrutura social urbana nos centros comerciais: exceto em Santarém, observa-se in loco a concentração de escolas, unidades de saúde, órgãos públicos e demais unidades de serviço urbano nos centros comerciais, o que condiciona a que toda a população se dirija ao centro para o atendimento de suas atividade diárias. Há inoperância de complementaridade modal, sendo a mobilidade precária. Na periferia, a falta de saneamento dificulta a pavimentação das vias que, de maneira geral, é deficiente, com calçadas em desnível. A ausência de terminais para o transporte é outro aspecto crítico, o que dificulta o acesso aos modos coletivos de transporte. Figura 6 Centro comercial de Santarém
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Condicionante 3 - Características socioeconômicas da população: a população é essencialmente de baixa renda. Na análise da escala de indicadores (tabela 2), pode-se afirmar que Santarém e Oriximiná estão acima das demais, tendo Óbidos uma posição intermediária e Monte Alegre e Alenquer as condições mais desfavoráveis. Oriximiná tem seus dados socioeconômicos mistificados em virtude do projeto mineral existente em seu território que não reflete a realidade dessas cidades que apresentam incidência de pobreza atingindo parte significativa da população. Condicionante 4 - O transporte e o trânsito: o barco é o modo de transporte mais utilizado nas mobilidades interurbanas, intraurbanas e regional, mas é dentro do espaço urbano que as situações de mobilidade se deterioram. Exceto Santarém, o transporte público urbano nas demais cidades praticamente não existe, ficando a população refém do transporte individual e privado. O trânsito é municipalizado somente em Santarém e parcialmente em Óbidos, dependendo as demais cidades do Estado. Condicionante 5 - Insuficiência de marcos regulatórios: observou-se in loco que, apesar de todos as cidades possuírem instrumentos de gestão, há dificuldades para a implantação, seja por questões burocráticas ou de articulação ou até mesmo incapacidade institucional para colocá-los em prática. Em particular, em relação aos planos diretores, foram verificados diversos óbices de ordem jurídica, institucional, de planejamento e mesmo operacional para a prática de tais planos diretores. É necessário, também, destacar que mesmo que a mobilidade seja majoritariamente realizada através do modo de transporte fluvial, há carência de regulação deste modo de transporte nos níveis municipais e insuficiência de fiscalização dos dispositivos de regulação que operam nas instâncias federativas do Estado e da União. Há, também, necessidade de atualização de instrumentos de gestão e a criação de outros, além da municipalização do trânsito na maioria das cidades. CONCLUSÕES A mobilidade, como medida de equidade e indicador para a formulação de políticas de transporte associada a condicionantes socioeconômicos, permite que as especificidades socioeconômicas, ambientais e toponímicas da região do Baixo Amazonas sejam inseridas nos desenhos das políticas integradas de transporte. O desenvolvimento regional do Baixo Amazonas está comprometido, uma vez que a qualidade de vida das populações locais e a capacidade de captar novos investimentos relacionados às atividades transformadoras estão limitadas pelo modelo de transporte assentado na predominância da informalidade. A incapacidade das instâncias municipais em implementar políticas de transporte da União e do Estado como os planos 83
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diretores e também de desenhar políticas de transporte municipalizadas para as cidades do Baixo Amazonas pode ser apontada como causa e, ao mesmo tempo, consequência da carência da população do Baixo Amazonas. A saída apontada é a municipalização do trânsito na maioria das cidades e a montagem de um conjunto de regulamentação municipal do modo de transporte fluvial. Em síntese, nos indicadores apresentados, viu-se urgência política de intervenção no sistema de transporte público, no ordenamento dos centros comerciais para tráfego de pessoas e cargas e, ainda, na ampliação das redes de ensino e saúde para torná-las mais acessíveis à população. Dessa forma, a mobilidade na região não será um fator de exclusão social da população aos direitos mais fundamentais do homem, mas sim um elemento dinamizador do desenvolvimento dessa região. Este primeiro estudo se insere num projeto de pesquisa mais abrangente que os autores estão desenvolvendo para avaliar a operação dos diversos modos (hidroviário e terrestre) e a importância das conexões entre as cidades sob estudo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AFFONSO, N. S. Mobilidade e qualidade de vida. Revista dos Transportes Públicos, nº 96, 2002. ANDRADE, A. R.; BALASSIANO, R.; SANTOS, M. P. S. Planejamento de transportes: Informação e participação como fundamentos para o seu desenvolvimento. REGE Revista de Gestão, vol. 13, nº 3, 2006. DENATRAN. Frota de veículos em 2009. Disponível em: <http://www.denatran.gov.br/ frota.htm>. Acesso em: 13/05/2010. GOMIDE, A. A. Agenda governamental e formulação de políticas públicas: o projeto de lei de diretrizes da política nacional de mobilidade urbana. 2008. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/eventos/982.pdf>. Acesso em: 13/05/2010. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Contagem da população. Rio de Janeiro. (Censos de 2000; 2003; 2007 e 2010). MINISTÉRIO DAS CIDADES. Política de Mobilidade Urbana (PL 1687/2007). Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/secretarias-nacionais/transporte-e-mobilidade.....>. Acesso em: 13/05/2010. PNUD. Atlas de Desenvolvimento Humano/Índice de Desenvolvimento Humano - Municipal 1991 e 2000. Disponível em: <http://www.fjp.gov.br/index.php/servicos/82servicos-cepp/72-indicadores-e-analises-de-desenvolvimento-humano>. Acesso em: 13/05/2010. SUCENA, M. P.; SILVA, V. L.; PEREIRA, A. L.; PORTUGAL, L. S. Uma aplicação da lógica Fuzzy para a melhoria da mobilidade urbana focada no usuário. In: XII SIMPEP - Simpósio de Engenharia de Produção. Anais. Bauru, SP, Brasil, 7 a 9 de novembro de 2005.
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faixa de pedestres
AN P
Uso da ferramenta SIG-Detran como suporte na avaliação de fatores espaciais de risco em faixas de pedestres Hudson Carrer Pereira
Departamento de Trânsito do Distrito Federal E-mail: hudcp@yahoo.com.br
Pastor Willy Gonzales Taco
Programa de Pós-Graduação em Transportes Universidade de Brasília E-mail: pastor@unb.br e pwgtaco@hotmail.com
O Distrito Federal tem sido pioneiro no respeito à faixa de pedestres no Brasil. Após 10 anos de campanhas, condutores de veículos automotores sentem-se seguros em frear na proximidade da faixa não semaforizada e pedestres em atravessá-la, sendo prudente sempre o contato visual entre ambos. Contudo, embora a faixa de pedestre tenha seu uso disseminado no Distrito Federal, os dados do Núcleo de Pesquisa e Estatística (Nuped) do Detran/DF mostram que, desde abril de 1997, ano em que a faixa de pedestre foi adotada pelo Código de Trânsito Brasileiro, até dezembro de 2010, 77 pessoas morreram (69 pedestres, dois passageiros de automóvel, um condutor de automóvel, três ciclistas e dois motociclistas) e 2.024 pessoas ficaram feridas nas faixas de pedestres (Nuped, 2011). Assim, as estatísticas mostram que, somente no ano de 2010, foram registradas sete ocorrências que resultaram em sete vítimas fatais (todos pedestres atropelados), sendo que, em seis das ocorrências, já havia pelo menos um veículo parado na faixa. Ainda que parte dos acidentes seja devido ao comportamento educacional dos condutores, como também pela falta de fiscalização, este estudo contempla as ações de engenharia que o órgão com circunscrição sobre a via pode adotar como forma de mitigar os riscos de acidentes/ocorrências, utilizando o Sistema de Informações Geográficas (SIG) que tem sido desenvolvido pelo Detran/DF (SIG-Detran), que possibilitaria a análise espacial das condições físicas e ambientais da via e do seu entorno, em confronto com critérios para implantação das faixas de pedestres, obtidos junto ao Núcleo de Estudos e Elaboração de Projetos (Nupro) do Detran/DF.
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SIG DETRAN O Departamento de Trânsito do Distrito Federal tem desenvolvido um Sistema de Informações Geográficas para atender às necessidades do órgão para o georreferenciamento dos equipamentos instalados e das vias sob sua circunscrição. O SIG-Detran está constituído de sete módulos já desenvolvidos, sendo que os de sinalização semafórica e de fiscalização eletrônica estão em estágio mais avançando de utilização, com todos os equipamentos georreferenciados (figura 1). Figura 1 Módulos do Sistema SIG-Detran
Cada um dos módulos cumpre uma função específica e apresenta dados e informações conforme os objetivos de interesse do Detran/ DF. A seguir faz-se um breve resumo de cada um dos módulos e seus estágios de desenvolvimento: i)
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Sinalização semafórica: Está integrado parcialmente ao sistema de patrimônio em que se controla o material utilizado, as trocas de lâmpadas e as ocorrências (com envio automático de mensagem eletrônica via e-mail para a empresa responsável pela
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reparação), constando também o projeto do cruzamento georreferenciado. ii) Fiscalização eletrônica: Está integrado parcialmente ao sistema de multas (informações são descarregadas por mídia eletrônica ao fim de cada mês); os equipamentos e os projetos estão georreferenciados; pode-se consultar os estudos de implantação e laudos de aferição, gerar relatórios de medição para pagamento e relatórios de consulta das informações do tráfego (volume, velocidade e infrações). iii) Sistema viário: As bases geográficas são atualizadas e corrigidas conforme equipe disponível. Na atualidade, as bases geográficas e informações tabulares sobre as vias estão desatualizadas e incompletas, respectivamente. iv) Sinalização vertical e horizontal: No banco de dados do SIGDetran tem-se o controle dos contratos de sinalização por lote e locais, medições e relatórios de execução. Os pontos de sinalização vertical não estão georreferenciados. Já com relação à sinalização horizontal, foram lançadas somente as faixas de pedestres elevadas que representam pequena quantidade frente ao número total de faixas de pedestres. v) Ondulações transversais: Nesse módulo controlam-se os pedidos e as respectivas autorizações para a execução de lombadas e de sonorizadores. No entanto, estas ondulações ainda não estão georreferenciadas. vi) Projetos: Todos os projetos que interfiram no sistema viário podem ser cadastrados nesse módulo para atualização da base. Em fase de desenvolvimento, espera-se contar com uma rotina de encaminhamento do projeto já elaborado ao Núcleo de Geoprocessamento (Nugeo) do Detran/DF. vii) Acidentes: Estão cadastrados no SIG-Detran somente os acidentes fatais de 2007 a 2010. O sistema busca automaticamente as ocorrências da base utilizada pelo Nuped. A interface visual do SIG-Detran possibilita a consulta e visualização de feições geográficas das informações georreferenciadas. Por exemplo, para o caso de um cruzamento semaforizado (figura 2), as janelas de interface possibilitam ver a região em questão, a localização específica do cruzamento com os diagramas geométricos, as informações associadas dos equipamentos, acidentes, tipo de via etc. assim como imagens em formato digital do local.
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Figura 2 Interface do SIG-Detran para um cruzamento semaforizado na Rodoviária do Plano Piloto
CRITÉRIOS PARA IMPLANTAÇÃO DE FAIXAS DE PEDESTRES O Manual de Sinalização Horizontal (Contran, 2007) dispõe que a faixa de pedestres deve ser utilizada em locais onde haja necessidade de ordenar e regulamentar a travessia de pedestres, devendo a faixa do tipo zebrada ser utilizada em locais, semaforizados ou não, onde o volume de pedestres é significativo, nas proximidades de escolas ou polos geradores de viagens, em meio de quadra ou onde estudos de engenharia indicarem sua necessidade. Embora o manual considere o número de pedestres, este não faz menção à quantidade necessária de pedestres ou do fluxo de veículos para justificar a implantação da faixa. Já a Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CET/ SP) adota como critério para implantação de faixa de pedestre o fluxo de travessia superior a 120 pedestres / hora pico e em todo percurso definido como rota de escolares (CET, 2000). Outros estudos consideram as brechas nos fluxos veiculares e o tempo de espera de ocorrência de uma brecha para a tomada de decisão de forma objetiva, com base no fluxo de pedestres e de veículos. Quando se trata de faixas de pedestres semaforizadas, diversos métodos (MUTCD, Valdes, Denatran, CET, Ming, apud Cucci Neto, 2000) estabelecem de forma objetiva quando uma faixa deve ser semaforizada em função do número de pedestres e do número de 88
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veículos, em horário de pico. O critério proposto pelo Denatran (1984) que, assim como o Detran, faz parte do Sistema Nacional de Trânsito, indica que a implantação de um semáforo é justificada quando houver o fluxo mínimo de: i) 600 veículos equivalentes/hora pico (quando a via não possui canteiro central ou quando o canteiro central possui largura menor que 1 metro); ou 1.000 veículos equivalentes/hora pico (quando a via possui canteiro central com largura igual ou superior a 1 metro); e, ii) 250 pedestres/hora pico; sendo que para áreas escolares essa quantidade é de 150 pedestres/hora pico. Critérios do Núcleo de Estudos e Elaboração de Projetos do Detran/DF Como forma de padronizar e facilitar a análise dos pedidos de implantação de faixas de pedestres, em janeiro de 2011, o Núcleo de Estudos e Elaboração de Projetos (Nupro) do Detran/DF estabeleceu condições a serem seguidas por seus analistas, tendo como referência os métodos do Denatran (Denatran, 1984) e da Highway design handbook for older drivers and pedestrians (Staplin et al., 2001). Ainda ressalta-se que, desde então, todos os novos projetos de faixas de pedestres seguem esta rotina, sendo realizada a adequação das faixas existentes conforme disponibilidade das equipes de trabalho. As condições e os critérios definidos são os seguintes: i) Condições para implantação de faixas de pedestres não semaforizadas: • Com relação ao fluxo: • volume/capacidade de tráfego na hora pico entre 0,1 e 0,3; e, • volume de pedestres de 100 pedestres/h < Vp < 250 pedestres/h, em trecho de 50 metros antes e após o local pretendido. • Com relação à quantidade de faixas de trânsito a atravessar: • pistas com até duas faixas de tráfego contínuas (sentido único ou duplo). • Com relação à velocidade máxima regulamentada da via: • até 50 km/h. ii) Condições para implantação de faixas de pedestres semaforizadas: • Com relação ao fluxo: • volume/capacidade de tráfego na hora pico acima de 0,3; e, • volume de pedestres acima de 250 pedestres/hora pico, em trecho de 50 metros antes e após o local pretendido. 89
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• Com relação à quantidade de faixas de trânsito a atravessar: • pistas com três ou mais faixas de tráfego contínuas no local da faixa (sentido único ou duplo). • Com relação à velocidade máxima regulamentada da via: • acima de 50 km/h. iii) Condições impróprias para implantação de faixas de pedestres: • Com relação às vias: • vias de trânsito rápido. • Com relação à geometria e à visibilidade: • trechos em rampa com declividade elevada; • trechos em curva e entre o ponto de tangência e o ponto de parada de segurança do veículo, correspondente à velocidade máxima regulamentada no trecho; • a menos de 70 metros à jusante de paradas de ônibus; e, • em locais com interferência sobre as condições de visibilidade dos condutores. iv) Condições a serem observadas em campo: • Veículos: • movimentos permitidos e realizados; • volumes de tráfego; • tipos (ônibus, motocicletas, automóveis etc.); e, • variações temporais (horárias, semanais etc.). • Pedestres: • movimentos realizados; • quantidade; • categorias (escolares, deficientes, idosos etc.); e, • variações temporais (horárias, semanais etc.). • Urbanização: • calçadas; pavimentação; meio-fio; acessibilidade; drenagem; iluminação; vegetação; sinalização; uso do solo. • Outros: • áreas escolares; • presença de outros dispositivos redutores de velocidade; e, • ofuscamento por incidência solar. Como exemplo, ao adotar a relação volume/capacidade de 0,3 para justificar a implantação de um semáforo, considerando para o cálculo da capacidade a relação de Webster (525 * largura da pista), para uma pista com largura de 7 metros, teremos aproximadamente 551 veículos por faixa/hora pico, valor próximo ao método do Denatran (600 veículos/hora pico).
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MÉTODO O trabalho iniciou-se com a busca de informações no banco de dados do SIG-Detran, de forma a subsidiar a análise de faixas de pedestres e a tomada de decisões, considerando o número de atropelamentos e não o número total de acidentes. A justificativa é que foi constatado que algumas colisões traseiras não diziam respeito às faixas de pedestre, como informado no Boletim de Ocorrência, mas sim à falta de pista de desaceleração em retorno próximo. A informação sobre os atropelamentos em faixas de pedestres foi obtida junto ao Nuped, englobando o período de 2007 a 2010. Acidentes Os dados foram coletados a partir do Boletim de Ocorrência preenchido pela Polícia Civil e Militar do Distrito Federal, no período em questão. Observa-se que, além da falha de preenchimento acima citada, percebeu-se que a precisão do local tem sido prejudicada pela falta de critérios no preenchimento do boletim. A utilização de nomes de estabelecimentos como referência prejudica o banco de dados no médio e longo prazo, em razão da dinâmica urbana. Percebeu-se também que duas referências serviam para caracterizar uma única faixa de pedestre, uma vez que esta ligava ambos os estabelecimentos, causando duplicidade e erro nas informações obtidas. Ressalta-se que, havendo dúvidas quanto à localização dos acidentes, de forma a minimizar estes erros, o Nuped envia equipe de técnicos ao local e só então lança estas informações no banco de dados estatístico. Delimitação da área de estudo Foram selecionadas três faixas de pedestres tomando como critério de seleção o número de atropelamentos e as diferentes características (classificação da via, largura da pista, quantidade de travessias de pedestres etc.) entre os locais existentes no DF, para enriquecimento da análise. As faixas escolhidas foram: i) Quadra QE 17, avenida do Contorno, no Guará II; ii) CLSW 303, 1ª avenida, no Sudoeste; e, iii) QNM 02, avenida M1-Norte, em Ceilândia. Para que não se tornasse repetitiva a análise de elementos comuns entre as faixas, esclarece-se que os elementos analisados na faixa do Guará II foram suprimidos da faixa localizada no Sudoeste e, da mesma forma, para Ceilândia.
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Figura 3 Localização das faixas de pedestres escolhidas
Coleta de dados nas faixas de pedestres Utilizou-se como recurso para análise a gravação de vídeos das faixas de pedestres, na posição de pedestre, de condutor de carro de passeio e de condutor de ônibus. As filmagens também foram realizadas em diferentes períodos do dia: ao amanhecer (incidência solar), em horário de pico e no período noturno. Para fins de análise espacial foram obtidas as imagens de satélite do Google Earth que também ajudaram na análise temporal, principalmente na visualização das linhas de desejo dos deslocamentos de travessia dos pedestres, bem como na observação da dinâmica urbana em diversos períodos de anos (2002, 2005 e 2008) a fim de avaliar o surgimento de novas edificações e seus impactos na via. ANÁLISE DOS DADOS A seguir descrevem-se os principais problemas verificados nas faixas de pedestres escolhidas, tecendo-se propostas de melhorias a serem incorporadas no desenvolvimento, mapeamento e armazenamento de informações do SIG-Detran para subsidiar a tomada de decisões, além de propor incorporações aos critérios de implantação das faixas de pedestres desenvolvidos pelo Nupro. Quadra QE 17, avenida do Contorno, Guará II A avenida do Contorno no Guará II é uma via arterial, com duplo sentido de circulação, com três faixas de circulação em cada sentido (às vezes quatro faixas ao contabilizar a faixa de aceleração ou de desaceleração), separadas por canteiro central com mais de 3 metros de 92
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largura. A velocidade dos veículos, a quantidade de faixas de trânsito contínuas a serem atravessadas e a ausência de calçada foram os principais fatores de risco observados. i) Propostas de melhorias no uso do SIG A utilização de imagens de satélite obtidas no Google Earth permitiu identificar as linhas de desejo dos deslocamentos dos pedestres (figura 4) e sua compatibilidade com a instalação da faixa (figura 5), fator este não explícito nos critérios de implantação. Nas imagens, em diferentes períodos de tempo, pode ser observada a dinâmica de crescimento urbano com o aparecimento de polos geradores de viagens, que influenciam o comportamento dos pedestres (figura 5), devendo o analista de trânsito considerar os horários de funcionamento dos estabelecimentos, como também os dias da semana. No caso, a instalação de um colégio e de um templo da igreja adventista, catalogados no SIG-Detran (figura 7), devem merecer destaque pela particularidade do horário do colégio (há cursos de educação continuada espaçados durante o dia) e do dia da semana em que são realizadas as celebrações religiosas (aos sábados). Percebe-se também a criação de faixa de desaceleração e baia de ônibus (figura 6) onde antes havia somente um ponto de parada (figura 4). Quanto à base do sistema SIG-Detran, pode-se notar que está desatualizada. A abertura de novos acessos, a redução da calçada para acesso a um posto de abastecimento de combustível, a implantação de ciclovia e a faixa de desaceleração com baia para ônibus (figura 6) não são contemplados na atual base do sistema viário (figura 7). Figura 4 Entorno da faixa em junho de 2002
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Figura 5 Entorno da faixa em junho de 2005
Figura 6 Entorno da faixa em outubro de 2008
Figura 7 Entorno da faixa na interface SIG-Detran
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ii) Propostas de melhorias nos critérios de implantação Foram observados diversos locais ao longo da av. Contorno que apresentam risco para pedestres e condutores, dentre eles: • ausência de calçada; • faixa de pedestre a menos de 70 metros à jusante da parada de ônibus; • vegetação encobrindo placas de sinalização; • travessia de quatro faixas de trânsito contínuas, sem semáforo (o critério do Nupro estabelece faixa de pedestres semaforizada a partir de três faixas de trânsito); • velocidade máxima permitida de 60 km/h (o critério do Nupro estabelece faixa semaforizada acima de 50 km/h). Ressalta-se que a tomada de decisão para implantação de semáforo nos casos supracitados deve considerar também a quantidade de veículos e de pedestres pelo local. CLSW 303, 1ª avenida, Sudoeste A 1ª avenida do Sudoeste é uma via coletora, com duplo sentido de circulação, com duas faixas de circulação em cada sentido, separadas por canteiro central com mais de três metros de largura. Esta via foi a que apresentou piores condições de visibilidade por três características específicas. A primeira característica foi a incidência de iluminação solar frontal aos condutores no início da manhã. Para os condutores de ônibus este fator ficou mais evidenciado pelo tamanho reduzido da pala de sol em relação à posição de assento do condutor. Enquanto a inércia é fator que contribui para os acidentes em veículos longos, para os condutores de veículos de passeio a velocidade elevada sem visibilidade também representa grandes riscos aos pedestres. A segunda característica observada foi a falta de iluminação no período noturno. Por fim, a terceira, concomitante às características citadas, é a presença de vegetação encobrindo tanto a sinalização vertical como também os pedestres em posição de atravessar a faixa (figuras 8 e 9). Verificou-se também que as condições da calçada prejudicam a acessibilidade e a presença de tachões longitudinais no centro da pista inibe os motociclistas de trafegarem entre as faixas de trânsito.
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Figura 8 Veículo a 20 metros da faixa
Figura 9 Veículo a 10 metros da faixa
i) Propostas de melhorias no uso do SIG-Detran Os critérios do Nupro citam a iluminação como fator de análise, mas não é especificado o parâmetro de avaliação. Em referência às condições noturnas, o iluminamento é diretamente proporcional à 96
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intensidade luminosa da fonte, na direção do ponto considerado, e inversamente proporcional ao quadrado da distância da fonte ao ponto iluminado (Gonçalves, 1984). Assim, propõe-se que o Detran e a Companhia Energética de Brasília possam desenvolver trabalho conjunto em georreferenciar o(s) ponto(s) fixos de luz mais próximos às faixas de pedestres, trazendo como atributo a informação da intensidade da fonte luminosa. Com esses parâmetros seria possível definir requisitos mínimos de iluminação que poderiam ser manipulados no ambiente SIG, levando em consideração também os dados do georreferenciamento dos locais de acidentes de trânsito no período noturno. De igual maneira, a incidência solar, seja no período da manhã, ou no período da tarde, pode ser incorporada como atributo no SIG-Detran. ii) Propostas de melhorias nos critérios de implantação A análise relativa à iluminação deve ser realizada observando-se a barreira que, no presente caso, é a vegetação entre a fonte de iluminação e o pedestre. Ofuscamentos, relação velocidade e visibilidade e uso de materiais retro-refletivos também devem ser observados. A iluminação da faixa de pedestre deve abranger toda a área de travessia, incluindo seu posicionamento na calçada. Relata-se que, em anos anteriores, foi utilizado sistema de lâmpadas acionadas por movimento (detecção de presença do pedestre), o que implicou em acidente com vítima fatal quando da falha de manutenção do equipamento (lâmpada queimada). Este sistema automático foi retirado. Com relação às condições da calçada e do pavimento, deve-se atentar ao efeito fear of falling (traduzido literalmente como “medo de cair”) que, segundo Cumming et al. (2000), envolve fatores físicos, psicológicos e funcionais, podendo ser descrito como a baixa confiança para evitar quedas, tendo como consequência o desvio de atenção, principalmente de idosos, em se concentrar na acessibilidade proporcionada pelo pavimento, diminuindo seu nível de atenção ao trânsito de veículos, aumentando os riscos de atropelamentos. QNM 02, via M1 Norte, Ceilândia A avenida M1 Norte, na altura da QNM 02, é uma via coletora, com duplo sentido de circulação, com duas faixas de circulação em cada sentido, separadas por canteiro central com mais de três metros de largura. Esta via apresenta grande número de acidentes envolvendo motociclistas e pedestres. O fluxo de pedestres e de veículos é intenso ao longo do dia no local de implantação da faixa. Pela interrupção contínua do trânsito veicular para passagem de pedestres, o tempo de espera do condutor 97
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acaba aumentando, tendo como consequência comportamentos mais arriscados. Entende-se que a contagem de pedestres e de veículos justificaria a necessidade de uma faixa de pedestre semaforizada para o local. i) Propostas de melhorias no uso do SIG A existência de equipamentos eletrônicos deve ser explorada vislumbrando-se a geração de relatórios que forneçam o volume veicular em horário de pico e a velocidade praticada pelos condutores, já existente no SIG-Detran, de forma a verificar a necessidade de uma faixa de pedestre semaforizada ou não, após a contagem do fluxo de pedestres. ii) Propostas de melhorias nos critérios de implantação Considerando os veículos envolvidos nos acidentes neste local (motocicletas x pedestres), o grande fluxo de veículos e de pedestres acaba implicando em longas filas de veículos à montante da faixa. Como a largura das faixas de trânsito favorece que motociclistas trafeguem no corredor, a combinação da falta de visibilidade e da velocidade elevada dos motociclistas é fator determinante para os atropelamentos registrados. Recomenda-se avaliar a implantação de tachões refletivos posicionados longitudinalmente ao longo da via para esses casos, de forma que inibam motociclistas a utilizar os corredores, recomendação esta que deve ser incorporada nos critérios a serem observados quando da análise de implantação de faixas de pedestres. Outras características nas faixas e entorno Em nenhum dos locais observados foi registrado o estacionamento de veículos à montante da faixa de pedestre. A regulamentação de proibição de parada e estacionamento nestes locais é fundamental para a visibilidade entre condutores e pedestres. Assim, como complementação a este trabalho, apresentam-se outras situações que merecem atenção do analista de trânsito na avaliação de implantação de uma faixa de pedestre. i) Vegetação Prejudicando principalmente os condutores de ônibus em razão do ângulo de visão, considerando ainda a inércia destes veículos, a vegetação encobrindo as placas de sinalização representa fator de risco na identificação de uma faixa de travessia de pedestres, como pode ser visualizado nas figuras 10 e 11, e merece atenção dos órgãos responsáveis. Também observa-se o tamanho da pala de sol em frente ao parabrisa do veículo que, ao amanhecer ou ao final da tarde, pode prejudicar a visibilidade. 98
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Figura 10 Veículo a 30 metros da faixa
Figura 11 Veículo a 10 metros da faixa
ii) Veículo parado para travessia de pedestre encobrindo a visão de quem vem em outra faixa de trânsito Considerando que dados estatísticos do Nuped mostram que, das sete ocorrências com vítimas fatais em faixas de pedestres, em seis delas já havia um veículo parado para a travessia do pedestre (figura 11), entende-se como viável o uso de sinalização específica chamada zig-zag lanes, ainda não regulamentada pelo Denatran, que consiste de sinalização horizontal composta por um trecho de linhas em ziguezague no eixo e nas laterais da via, à montante da faixa de pedestres. 99
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Como, em todos os casos observados, o Detran/DF cumpriu o estabelecido pela legislação em relação à distância mínima entre a faixa de retenção e a faixa de pedestre, que é de 1,60 metros (Contran, 2007), sugere-se aumentar esta distância, contribuindo para redução de acidentes. Importante frisar também a proibição de implantar faixas de pedestres a menos de 70 metros à jusante das paradas de ônibus. Isto pode ser facilmente visualizado no SIG, desde que a base esteja atualizada. Figura 12 Croqui de acidente fatal na faixa de pedestre, DF (Nuped, 2011)
Em situação observada em campo, próxima ao croqui elaborado pelo Nuped, pode-se observar, na figura 13, um ônibus saindo de uma parada e, na figura 14, o momento em que o ônibus quase encobre a visão do condutor que trafega pela faixa de trânsito da esquerda. Observa-se que, em conjunto com o ofuscamento causado pela incidência solar, a falta de atenção de um pedestre ou a imprudência de um condutor contribuem para a ocorrência de acidentes. Figura 13 Ônibus saindo de parada
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Figura 14 Ônibus quase encobrindo a visão em direção do pedestre
iii) Trecho em curva Constando no critério do Nupro como condição imprópria, a faixa de pedestre em trecho curvo aparece em destaque na figura 15, apresentando a situação em que um veículo lento encobre a visão entre o carro de passeio e a presença ou não de um pedestre, que poderia estar iniciando a travessia. Figura 15 Faixa de pedestre situada em trecho curvo
iv) Dispositivos eletrônicos de velocidade O critério do Nupro cita os controladores de velocidade como dispositivos para melhorar a segurança de travessia de pedestres, porém ainda não estabelece as melhores condições de aplicação. Para o 101
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ponto em destaque na figura 16, há uma barreira eletrônica à montante da faixa de pedestre, sendo registrado pelo Nuped elevado número de colisões traseiras, em que o condutor desvia a atenção para o velocímetro do veículo e para o painel da barreira, e, somente após cruzá-la, volta a atenção para o trânsito, deparando-se com pedestre ou com outro veículo parado esperando a travessia de pedestres pela faixa. Figura 16 Barreira eletrônica à montante de faixa de pedestre
Após definido o critério de uso destes dispositivos, uma vez que todos os equipamentos eletrônicos de velocidade estão georreferenciados, bastaria georreferenciar as faixas de pedestres existentes para realizar o controle pelo próprio SIG. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com o estudo de três faixas de pedestres este trabalho atingiu o objetivo de sugerir implementações ao SIG-Detran para dar suporte à tomada de decisão pelo órgão com circunscrição sobre a via, como também sugerir melhorias aos critérios estabelecidos para implantação de faixas de pedestres. Verificou-se que o Detran/DF possui um Sistema de Informações Geográficas capaz de fornecer ampla gama de informações úteis para tomada de decisão, porém requer-se que a base geográfica seja consolidada, além dos equipamentos eletrônicos e de sinalização semafórica já georreferenciados. A falta de demanda pelos diversos núcleos dentro do órgão de trânsito e a necessidade de sistematização das informações também merecem destaque, processo para o qual a atual gestão está voltada. 102
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A utilização do SIG-Detran possibilitou acrescentar conhecimento das condições espaciais e temporais da faixa nunca antes tido pelos especialistas da instituição, tornando-se, assim, um grande avanço em relação às condições anteriores. Desta forma, da análise dos critérios adotados pelo Núcleo de Estudos e Elaboração de Projetos do Detran/ DF, observa-se que existe a necessidade de avaliação e reformulação das “condições a serem observadas” pelo analista de trânsito. Com relação aos registros de acidentes (boletins de ocorrência), em nível governamental, entende-se que todos os atores envolvidos devem se mobilizar para evitar a perda de informação ou a inserção de informações errôneas, a fim de possibilitar análises mais precisas, o que facilita e potencializa as soluções dos técnicos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Avineri, E., et al. Pedestrians’ behaviour in cross walks: The effects of fear of falling and age. Accid. Anal. Prev. (2011), doi:10.1016/j.aap.2010.11.028 Cucci Neto, João. Projeto semafórico: os pedestres. São Paulo. Disponível em: <http://meusite.mackenzie.com.br/professor_cucci/texto12.pdf> Cumming, R. G., Salked, G., Thomas, M., Szonyi, G. Prospective study of the impact of fear of falling on activities of daily living, SF-36 scores, and nursing home admission. Journal of Gerontology A: Biological Sciences 55, M299–M305, 2000. CET - Companhia de Engenharia de Tráfego. Manual de programação semafórica. São Paulo, 2000. CONTRAN – Conselho Nacional de Trânsito. Manual brasileiro de trânsito. Volume IV Sinalização Horizontal. 2ª edição. Brasília, 2007. DENATRAN - Departamento Nacional de Trânsito. Manual de semáforos. Brasília, 1984 (Coleção Serviços de Engenharia, v. 4). ___________. Manual brasileiro de trânsito do Denatran: sinalização de áreas escolares. Brasília-DF, 2000. ___________. Código de Trânsito Brasileiro e legislação complementar em vigor, 2008. Staplin, L., Lococo, K., Byington, S., and Harkey, D. Highway design handbook for older drivers and pedestrians. FHWA-RD-01-103. McLean, VA, 2001. Nuped. Informativo nº 01. Núcleo de Pesquisa e Estatística do Detran/DF. Detran/DF. Brasília, DF, 2011. Gonçalves, J. E. L. Iluminação e visibilidade. Série Boletim Técnico da CET nº 27. São Paulo: Companhia de Engenharia de Tráfego – CET, 1982, 112 p. il. SIG-Detran - Sistema de Informações Geográficas do Detran/DF. Versão 1.88. Detran. Brasília-DF, 2004.
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ponto de vista
Equações custo-benefício no transporte público
AN P
Adriano Murgel Branco
Engenheiro e administrador. Foi diretor de várias empresas públicas, secretário de Transportes e Habitação do Estado de São Paulo, professor na Universidade Mackenzie e Escola de Engenharia Mauá e exerceu consultoria em quase todos os países da América Latina e Moçambique. Consultor na área de políticas públicas com destaque para transporte e habitação. E-mail: ambranco@uol.com.br
Há presentemente uma discussão acirrada sobre a melhor escolha do modelo de transporte público. Metrô e trens metropolitanos são inquestionáveis quanto à sua elevada capacidade de transporte. Por isso pouco se indaga em relação aos seus resultados econômicos, sabidamente deficitários. Em 1998, iniciei, como conselheiro da CPTM e do Metrô, uma discussão acerca dos balanços das empresas que prestam esses serviços que, invariavelmente, apresentam resultados negativos que podem ser ainda piores se levadas em conta as depreciações. Assim, por exemplo, o balanço da Companhia do Metrô, relativo ao exercício de 1999, indicou, em grandes números, uma receita de R$ 500 milhões e uma despesa de R$ 700 milhões, registrando, portanto, um prejuízo de R$ 200 milhões. Normalmente, o comentário que se ouve é no sentido de que as empresas, por serem governamentais, são deficitárias... Mas o debate que se impunha era relativo à avaliação dos benefícios sociais que as empresas prestam e que podem justificar o seu eventual “prejuízo”. Em 1998, eu escrevera o artigo “Os custos sociais do transporte urbano brasileiro”, publicado no 1º trimestre de 1999 pela Revista dos Transportes Brasileiros da ANTP, em que avaliava em cerca de 22 bilhões de reais os custos sociais, na Região Metropolitana de São Paulo, decorrentes das deficiências do transporte coletivo, causadores dos graves problemas de congestionamento da cidade (hoje esse número supera R$ 40 bilhões). Esse era, então, o valor das externalidades negativas a serem computadas nos balanços patrimoniais dos transportes. Restava, então, calcular as externalidades positivas do metrô (como também dos outros meios de transporte) para se chegar a um balanço representativo das atividades. Isso foi feito já no ano de 2000, em que 105
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a Companhia do Metrô pôde mencionar um benefício social avaliado em R$ 2,6 bilhões, folgadamente superior ao seu déficit patrimonial de R$ 300 milhões. Ficava claro para todos nós que analisar os possíveis resultados de um serviço público, como o de transporte de massa em base de singelas equações de custo/benefício patrimoniais, principalmente como orientadoras das decisões de investimento público, era um procedimento totalmente descabido. Agora se discute a implantação de corredores de ônibus/trólebus na cidade e na RMSP, como forma de atenuar os insuportáveis congestionamentos. Para tal, comparam-se alternativas tecnológicas, como os ônibus a diesel, a combustíveis um pouco mais “limpos”, a hidrogênio e os trólebus. E, neste último caso, confrontam-se pelo menos três tecnologias: os trólebus convencionais, aqueles alimentados por contatos apenas nos pontos de parada e os que podem receber cargas somente nos terminais, sob a forma de um fluxo magnético proveniente dos equipamentos especiais embutidos no piso. Para início de conversa, não faz qualquer sentido implantar ônibus, mais ou menos poluentes, em corredores que concentram as emissões, quaisquer que sejam as equações custo/benefício, que não levam em conta as pesadas externalidades representadas pelas emissões, pelo ruído, pelo baixo rendimento energético. A saída é, então, o veículo elétrico, alimentado por hidrogênio, por eletricidade direta como nos trólebus convencionais (em rede contínua ou intermitente) ou nos trólebus alimentados por fluxos eletromagnéticos. Neste caso, as diferenças representadas pelas externalidades se minimizam, facilitando as comparações. Mesmo assim, caberá sempre escolher o melhor e não o mais barato, pois o resultado econômico e social não será medido apenas pelas receitas tarifárias e pelos custos operacionais. A grande importância dos corredores de trólebus na cidade de São Paulo é criar um sistema de média capacidade, situado entre aqueles de alta capacidade (trem e metrô com 60.000 passageiros por hora e por sentido) e os tradicionais ônibus que, em condições normais de circulação, não transportam mais do que 10.000 a 12.000 passageiros/hora/sentido. O sistema de média capacidade, representado pelos corredores de trólebus e pelos eventuais sistemas de monotrilho, será capaz de transportar habitualmente algo como 40.000 pass./h/sentido, oferecendo, principalmente aos usuários de automóvel, um novo modo de transporte de boa qualidade, a um custo de implantação razoável e da construção rápida. Essa nova oportunidade oferecida aos cidadãos paulistanos e metropolitanos lhes dará a opção de deixar em casa o automóvel e se 106
Equações custo-benefício no transporte público
deslocar rapidamente, com maior conforto e por um custo muito menor. É nesse rumo que se pode ter a esperança de mudar a perversa distribuição modal que levou 45% das viagens na metrópole a ficarem dependentes do automóvel e apenas 55% realizadas pelo sistema público. Basta ver que cada viagem por automóvel ocupa 30 vezes mais espaço do que por ônibus, para se ter a dimensão do desequilíbrio modal. Basta saber que uma viagem por automóvel consome 26 vezes mais energia – e uma energia poluidora, proveniente do petróleo – do que a viagem por metrô, para ver quão distante da racionalidade se desenvolveu o transporte público. A escolha da tecnologia do transporte de média capacidade tem, então, tudo a ver com uma equação custo/benefício social, que justifica a melhor opção, qualquer que seja o seu custo, compatível com a demanda a atender. Uma demanda que desmobilize o automóvel, fazendo sobrar espaço público para arrefecer as pressões do congestionamento, permitindo aos automóveis remanescentes e aos ônibus circular com maior velocidade e economia e até ampliar a capacidade de estacionamento, que vem sendo restringida hoje, com razão, em favor da circulação.
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Grande parte do arquivo técnico da antp está disponível ao seu público a partir da WEBlioteca: artigos publicados na Revista dos Transportes Públicos, trabalhos técnicos apresentados nos Congressos nacionais ocorridos a partir de 1997, apresentações de eventos técnicos organizados ou apoiados pela antp, incluindo os Fóruns de Secretários e Dirigentes de Transporte e Trânsito, conteúdo com ações de promoção de transporte e trânsito premiado pela Bienal ANTP de Marketing, matérias da Revista Movimento e muito mais. Um eficiente sistema de busca permite que você encontre o conteúdo procurado através de palavras-chave relacionadas com o assunto ou através do código do documento.
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planejamento e gestão urbana
Transporte e clima urbano em Natal/RN
AN P
Bernardo J. C. Torquato
Arquiteto e urbanista Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN E-mail: bernardotorquato@hotmail.com
Marcela M. G. da Silva
Arquiteta e urbanista Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN E-mail: marcela.germano@hotmail.com
O problema relacionado à questão do transporte e da qualidade de vida está presente nas cidades brasileiras nas últimas décadas. Isto se deve ao intenso processo de crescimento urbano que está intimamente associado à dinamização das atividades econômicas, êxodo rural para os centros principais, migrações populacionais entre cidades, diminuição da população das metrópoles e aumento dos núcleos médios. Esses processos atribuem às cidades brasileiras índices de países desenvolvidos, atingindo a taxa de urbanização de 83% em 2000 (ANTP, 1999, s.p.). Por sua vez, a urbanização ocorre por meio da substituição do ambiente natural por estruturas artificiais em sua superfície e acarreta alterações na atmosfera urbana, principalmente em função da modificação na qualidade do clima. A nova e crescente expansão das cidades foi adaptada ao uso eficiente do automóvel que drenou recursos para a ampliação do sistema viário e técnicas para garantia de boas condições de fluidez. O transporte público é intensificado, porém, quase sempre insuficiente para atender a demanda crescente e sofre um processo de “crises cíclicas” que se refletem em sua eficiência: com o aumento do tráfego, o transporte público fica mais lento, reduzindo sua demanda e receita; então, são inseridos mais veículos, aumentando os custos em infraestrutura como pavimentação de vias; com o encarecimento do transporte público, cada vez mais pessoas aderem ao uso do transporte particular, aumentando os congestionamentos. Por fim, o mais prejudicado é o grupo que corresponde à parcela da população que não possui condições financeiras de adquirir ou sustentar o veículo particular. Cria-se, então, uma nítida separação entre aqueles que dispõem do automóvel particular e os que dependem do transporte público, o que evidencia as grandes disparidades socioeconômicas da sociedade. 109
Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
O crescimento desordenado do ambiente construído da cidade e a falta ou a ineficiência de um ordenamento de caráter técnico refletem-se no atual sistema viário, gerando o caos nos meios de transporte. Observa-se que o transporte não motorizado (ainda bastante utilizado por determinados grupo sociais) que, anteriormente à cultura do automóvel particular, era tido como principal meio de transporte, teve seu uso limitado; as calçadas, aos poucos, foram sendo excluídas para ceder lugar às novas vias, as distâncias se tornaram maiores e menos acessíveis e os trajetos menos seguros, uma vez que o indivíduo, seja ele pedestre ou ciclista, é mais vulnerável a possíveis acidentes. É gerada então uma dependência do transporte motorizado, que tem como pré-requisito a instalação de uma infraestrutura adequada, bem projetada e gerenciada para que ocorra uma movimentação eficiente na cidade. A partir do cenário de mobilidade da cidade do Natal, atento às problemáticas relacionadas ao transporte e visando contribuir para a discussão de um necessário processo de reavaliação das políticas públicas neste setor, surge uma questão: como a infraestrutura básica e o modo de transporte comprometem as condições ambientais nos bairros da cidade? Para isto, foram levantadas algumas hipóteses: (1) As características sociais das zonas ou bairros determinam o tipo de locomoção. O grupo social em que as pessoas estão enquadradas delimita as possibilidades de escolha: num primeiro caso, a falta de acesso a determinados meios de transporte acarreta o uso do deslocamento a pé; ou esta escolha proposital mesmo o usuário tendo outras opções de trânsito. (2) A infraestrutura condiciona a disponibilidade de meios de transporte. Entendem-se por infraestrutura todos os instrumentos encontrados nas zonas de tráfego que permitam o uso do modo de transporte escolhido ou não pelo usuário, dentre eles o passeio público, a ciclovia, a rua devidamente pavimentada, entre outros. (3) As consequências deste processo são: o aumento de superfícies impermeabilizadas, ruídos, retenção de calor, emissão de gases gerando condições desfavoráveis ao conforto urbano e favorecendo a elevação da temperatura e poluição de forma geral. Em 2008, o governo do Estado do Rio Grande do Norte contratou a empresa de consultoria Oficina para a elaboração do Plano Diretor de Transporte Metropolitano da Região Metropolitana de Natal – RMN que visa à estruturação do sistema viário a fim de amenizar as problemáticas relacionadas ao transporte na cidade. A pesquisa realizada pela empresa revelou informações que necessitam ser aprofundadas e que podem servir de referências significativas e inéditas. O crescente índice de motorização, que tem o carro como principal agente, leva à crença popular, enfatizada pela mídia, de que este seja o principal meio de transporte. Na verdade, o mencionado estudo mostra que o modo de transporte a pé apresenta o maior percentual, 110
Transporte e clima urbano em Natal/RN
responsável por 36,5% (760.453) das viagens realizadas na cidade, enquanto o transporte motorizado individual (automóvel) possui o índice de 23,3% (484.293) de um total de 2.082.711 deslocamentos efetuados (Oficina, 2008). Estas e outras informações contidas na pesquisa despertaram o interesse para a compreensão das especificidades de tal realidade e foram as fontes primeiras de dados que subsidiaram este trabalho, como se verá em continuação. Neste sentido, o estudo apresentado a seguir tem como objetivo geral entender o papel da mobilidade urbana na qualidade ambiental, tendo como pano de fundo a espacialidade socioeconômica, a fim de aprofundar o significado destes dados e apontar alguns elementos que devem ser considerados na discussão acerca dessa temática. Para melhor compreensão dos métodos e processos que foram desenvolvidos na pesquisa, foi seguida uma metodologia dividida em quatro partes. A primeira parte refere-se à pesquisa origem e destino realizada pela empresa Oficina Engenheiros Consultores Associados, tomada como base para o início do desenvolvimento deste estudo. Em seguida, explica-se o critério de escolha utilizado para determinação das áreas a serem estudadas a partir do cruzamento dos dados extraídos da pesquisa. A terceira parte da metodologia trata da comparação entre as áreas estudadas relacionada aos deslocamentos na cidade. A quarta etapa diz respeito aos critérios utilizados no levantamento fotográfico das áreas – determinação da rota e escolha das ruas – e a observação das consequências dos meios de transporte evidenciados e sua influência nas condições ambientais assim como das condições ambientais para o desenvolvimento dos meios de transporte evidenciados. Metodologia do estudo Origem e destino A pesquisa origem e destino (OD), realizada pela empresa Oficina Consultores, visou o levantamento do volume e das características atuais dos deslocamentos feitos pela população em suas atividades diárias em uma aglomeração urbana. Para isso, foram criadas 93 zonas de tráfego, das quais 54 estão diretamente locadas dentro dos limites da cidade e outras 39 referentes aos municípios vizinhos que compõem a Região Metropolitana de Natal. Em seguida, foram elaborados questionários que serviram de amostra das zonas de tráfego e revelaram uma estimativa de todo o universo da pesquisa que abrange 264.320 domicílios e população estimada de 1.116.998 habitantes. Em fase posterior, pesquisaram-se 8.500 domicílios, o que resultou em 32.000 pessoas entrevistadas. Esses foram os dados que permitiram a seleção das áreas estudadas que constituiu o passo seguinte. 111
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Figura 1 Natal Zonas de tráfego
Figura 2 Natal Localização das áreas estudadas
Fonte: Oficina.
Fonte: Oficina. Nota: Elaboração dos autores.
Determinação das áreas de estudo A partir do cruzamento dos dados referentes às viagens não motorizadas (a pé e bicicleta), foram identificadas duas zonas de tráfego (Oficina, 2007) consideradas significativas para o que se pretendia estudar, ou seja, que apresentavam situações extremas relacionadas à quantidade de deslocamentos. As áreas encontradas nas condições descritas correspondem às zonas de tráfego 26 e 46 da pesquisa OD, representadas respectivamente pelo campus universitário e pelo bairro de Nossa Senhora da Apresentação. Para fins da pesquisa desenvolvida, foram atribuídas às zonas as seguintes denominações: área de estudo I (zona de tráfego 26) e área de estudo II (zona de tráfego 46). Deslocamentos urbanos Esta etapa visou compreender todo o processo que envolve o deslocamento do usuário dentro do cenário urbano de Natal, identificando possíveis problemas e facilidades encontradas para sua 112
Transporte e clima urbano em Natal/RN
mobilidade. Foram elaborados e analisados gráficos referentes às áreas de estudo I e II separadamente, apresentados com valores absolutos e percentuais. Em um segundo momento, foram feitas comparações entre as áreas estudadas, revelando a disparidade do número absoluto de viagens realizadas e, devido a este fator, foi necessário considerar valores percentuais no momento da elaboração desses gráficos. Levantamento fotográfico e das condições ambientais Em virtude dos índices encontrados, verificou-se a necessidade de fazer uma visita ao local para perceber os fatores que influenciam, justificam e qualificam as características de cada área. A fim de registrar e apresentar tal constatação, optou-se pela realização de um levantamento fotográfico, dando enfoque à questão da infraestrutura (passeios públicos e vias), ao comportamento dos meios de transporte presentes e a relação destes com os aspectos ambientais, observando alguns condicionantes do clima urbano. Em cada zona de tráfego foram selecionadas as principais vias, caracterizadas pela concentração de equipamentos públicos e privados. Da análise das imagens foi possível averiguar a realidade e elaborar novas comparações acerca das duas áreas de estudo. transporte e condições socioeconômicas O foco de estudo A partir dos dados obtidos da pesquisa OD, foi possível identificar os casos que apresentam maiores e menores índices de deslocamentos com o uso do meio de transporte não motorizado (bicicleta e a pé). As áreas de estudo I e II foram determinadas em função do cruzamento destes valores. Observando as figura 3 e 4, verifica-se que, na área de estudo I, são apresentados os maiores índices (valores estimados a partir da expansão mencionada anteriormente): 31.384 e 5.376 respectivamente para viagens a pé e de bicicleta, enquanto na segunda área (área de estudo II), verifica-se o oposto, ou seja, os menores índices, 489 e 0 viagens respectivamente. Foi esta diferença encontrada nas duas áreas que despertou o interesse de pesquisar os motivos que geram tal configuração.
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Figura 3 Viagens à pé
Figura 4 Viagens de bicicleta
Fonte: Oficina. Nota: Elaboração dos autores.
Fonte: Oficina. Nota: Elaboração dos autores.
O cenário inicial Baseado no cenário de mobilidade da cidade, e tendo em vista os deslocamentos e a caracterização da desigualdade socioespacial, esta etapa visava a breve caracterização de cada área com base no bairro em que está inserida e a identificação de seus principais equipamentos públicos geradores de trafego. Área I Esta área está localizada numa porção do bairro de Lagoa Nova, zona Sul da cidade. O bairro foi consolidado na década de 1960, a partir do aglomerado de conjuntos residenciais de médias proporções construídos pelo Estado, como os conjuntos Potilândia, Nova Dimensão, Roselândia e Lagoa Nova I e II. A construção do campus da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, principal equipamento urbano do bairro, iniciou-se na década de 1970. Área II Em meados da década de 1980, surge o bairro que homenageia a padroeira da cidade do Natal, Nossa Senhora da Apresentação, na zona Norte da cidade, onde está inserida a área de estudo II. Este bair114
Transporte e clima urbano em Natal/RN
ro firmou-se a partir da construção de extensos conjuntos de habitação social, como Parque dos Coqueiros (1990), Alvorada IV, Planície das Mangueiras e Alameda das Fronteiras. Devido a sua localização, situada à margem da BR 406 e próxima ao Distrito Industrial de Natal, o bairro foi beneficiado com a construção de infraestrutura de serviços, sistemas de transporte e comércios. Entre os equipamentos da área, destaca-se o Hospital Estadual Maria Alice Fernandes, localizado na rua Pedro Álvares Cabral, no conjunto Parque dos Coqueiros, que teve sua construção finalizada em 1992. Os dados quantitativos Na pesquisa origem e destino, base do estudo, foram entrevistados os moradores em domicílios particulares e coletivos encontrados nas áreas escolhidas. No sentido de melhor compreender essas áreas, os itens do questionário considerados neste trabalho e que serão discutidos neste momento referem-se aos motivos, modo de transporte e tempo de deslocamento das viagens, assim como renda salarial e escolaridade, e, no caso de mudança do meio de transporte, o motivo que levou a esta mudança. De forma geral, essa análise permitiu uma comparação entre as duas realidades em estudo. Em relação aos motivos do destino das viagens, houve uma semelhança, pois nas duas áreas os entrevistados seguiam principalmente para suas residências. Na avaliação do tempo de deslocamento, percebeu-se que há relação com o tipo de transporte predominantemente usado em cada área. Na área I, a maioria dos entrevistados utiliza carros individuais e gasta de 20 a 30 minutos em trânsito. Na área II, um número considerável de pessoas (46%) utiliza os modos não motorizados - bicicleta e a pé - o que se reflete em percursos curtos e, consequentemente, menor tempo gasto. Em casos de mudança no meio de transporte, há diferenças entre as áreas. Na área I, a melhoria nas condições financeiras indicou a diminuição do uso do ônibus municipal e aumento do uso de automóvel particular. Na área II, não foi percebida uma mudança determinante tendo ocorrido apenas a diminuição do número de pedestres. O nível de escolaridade mostrado pela pesquisa confirma dados do Censo 2000 (IBGE, 2000), mostrando que, no bairro onde a área I está inserida, 64,72% dos moradores atingiram de 11 a 14 anos ou acima de 15 anos de estudo, enquanto que, na área II, o grupo mais significativo (32,97%) possui de 4 a 7 anos de estudo. Quanto à renda mensal, na área I, há um equilíbrio e, na área II, há predominância daqueles que recebem até um salário mínimo. No item a seguir será apresentado o levantamento fotográfico que visa mostrar as realidades até então analisadas apenas através dos referidos dados. 115
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A imagem dos bairros Nesta etapa foram feitos visita e levantamento fotográfico nas áreas de estudo para melhor qualificar os dados estatísticos. A partir da percepção dos pesquisadores e da análise do acervo fotográfico, é possível compreender as questão da infraestrutura, como passeios públicos e vias, e verificar o comportamento dos modos de transporte presentes nas áreas. Área I O levantamento fotográfico durante a visita resultou na elaboração do percurso apresentado na figura 4. A escolha do caminho visitado foi determinada pela hierarquia das vias e pela presença de equipamentos urbanos. Figura 4 Equipamentos urbanos na Área I
Fonte: Google Earth. Nota: Elaboração dos autores.
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Transporte e clima urbano em Natal/RN
As fotografias mostram diversos fatores que influenciam a utilização dos passeios públicos e vias pelos usuários da área. A deficiência de calçadas para pedestres e carência de vias para bicicletas, a presença de passeios inadequados (estreitos) e de obstáculos, como gelo baiano e desníveis, são as principais dificuldades encontradas. Percebeu-se a predominância do uso residencial, com vias sem saída, ou seja, que têm ligações limitadas, ocasionando a circulação apenas de pessoas que moram ou trabalham nesta porção da cidade. Constatou-se também predominância de muros altos e cegos, que não permitem a comunicação entre a rua (pública) e a residência (privada). Esta comunicação geraria uma maior segurança aos transeuntes e aos moradores. Tais características podem ser visualizadas nas imagens das figuras 5 a 8. Figura 5 Ausência de calçadas
Avenida Capitão Mor Gouveia Fonte: Autores.
Figura 6 Calçadas inadequadas
Avenida João Medeiros Fonte: Autores.
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Figura 7 Predominância de muros altos e uso residencial
Rua Macêdo Soares Fonte: Autores.
Figura 8 Ausência de calçadas
Rua Maria Amaral Fonte: Autores.
Área II O critério de escolha dos caminhos percorridos foi o mesmo da área I: a importância das vias e a presença de equipamentos urbanos. A figura 9 mostra a localização dos equipamentos urbanos, o roteiro do percurso e as vias.
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transporte e clima urbano em natal/rn
Figura 9 Equipamento urbano na Área II
Fonte: Google Earth. Nota: Elaboração dos autores.
as imagens das figuras 10 a 13 caracterizam a área II. Dentre os fatores que dificultam a circulação de pedestres e usuários de bicicletas, tem-se a deficiência de passeios públicos e ciclovias, encontradas apenas em 119
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frente a alguns equipamentos públicos. Nos locais onde deveriam existir as calçadas, a presença do barro e desníveis são alguns dos obstáculos encontrados. Percebeu-se o frequente uso das vias de carros para circulação de pedestres e bicicletas. A diversidade de usos encontrada permite a utilização do modo de transporte a pé e de bicicleta devido à proximidade com os locais de destino, como serviços e comércios. A circulação nas áreas de estudo permitiu a compreensão de como está a infraestrutura ligada aos transportes não motorizados e motorizados, que incluem os passeios públicos, ciclovias e vias, e como ela influencia o uso desses meios de transporte. Na área I, o uso do carro Figura 10 Ausência de calçamento e passeios
Rua Ponte Nova Fonte: Autores.
Figura 11 Ausência de calçamento e passeios
Avenida Maranguape Fonte: Autores.
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Transporte e clima urbano em Natal/RN
individual, modo de transporte utilizado pela maioria dos entrevistados, é favorecido pelas características encontradas na área – insegurança, deficiência de calçadas para pedestres e carência de vias para bicicletas, presença de passeios inadequados e de obstáculos, vias sem ligações. Na área II, diferenciada pela maior difusão do transporte não motorizado, que representa 46% das viagens realizadas na área, constatou-se a inadequação de sua infraestrutura – deficiência de passeios públicos e inexistência de ciclovias. A presença de uso comercial e de serviço favorece a permanência dos usuários nesta área, assim como o uso desses meios de transporte. Figura 12 Ausência de calçadas leva as pessoas a circular nas vias
Avenida Boa Sorte Fonte: Autores.
Figura 13 Rua no Conjunto Parque dos Coqueiros
Avenida dos Expedicionários Fonte: Autores.
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transporte e condições ambientais Que elementos apresentados no item anterior podem contribuir para o estudo da qualidade de vida referente às condições ambientais e, principalmente, ao clima urbano? Conforme Mascaró (1996, p. 15), o traçado urbano começa pela definição de avenidas, ruas e caminhos para pedestres, necessários para tornar acessíveis as diferentes partes do espaço a ser organizado. Estes acessos precisam ser estruturados – recobrimento do solo, dimensionamento das vias – de forma a proporcionar a fluidez no modo de transporte. Em contrapartida a este modelo de estruturação básica, devem ser consideradas as questões de impacto ambiental. As principais alterações climáticas provocadas pela urbanização são, segundo Romero (1988): (1) Mudança da superfície física da terra pela densa construção e pavimentação, fazendo com que a superfície fique impermeável, aumentando sua capacidade térmica e rugosidade e alterando o movimento do ar; (2) Emissão de contaminantes que aumentam a precipitação e modificam a transparência da atmosfera; e (3) Aumento da capacidade armazenadora de calor. O aumento de temperatura do ar nas grandes cidades em relação ao seu ambiente vizinho é gerado por alterações das características térmicas das superfícies, decorrentes da substituição de áreas verdes por edificações e pavimentações. Esse efeito é conhecido como “ilha de calor urbana” (Oke, 1996). Como o material das superfícies urbanas tem usualmente grande capacidade calorífera, seu potencial de armazenar energia é maior que o das superfícies rurais e, portanto, é maior também seu potencial de aumentar a temperatura noturna do ar através da irradiação de energia acumulada. De acordo com Santamouris (1997) e Hough (1998), o armazenamento de calor e sua consequente emissão para a atmosfera são significativamente maiores no asfalto que nos solos de concreto e sem pavimento. Outras características inerentes às operações dos pedestres são completamente diferentes das operações dos veículos. Importantes aspectos que contribuem para a qualidade global da experiência dos pedestres em caminhar compreendem o conforto, a conveniência, a segurança, a seguridade e a economia que são definidos pelo EBTU (1984, p. 18): (1) conforto – controle do clima, condições da superfície da via para caminhar; (2) conveniência – trajetória direta, conflitos com pedestres e obstáculos, disponibilidade de rampas e controle de pedestres; (3) segurança – riscos associados com o tráfego de veículos, obstáculos e condições de superfície; (4) seguridade – quantidade de iluminação e vigilância, nível das atividades na via para caminhar, restrições à visão ampla; e (5) economia – custo para os usuários (primordialmente associado com as demoras na viagem). 122
Transporte e clima urbano em Natal/RN
Na análise do recobrimento do solo da área I encontraram-se diversos tipos – pavimento com asfalto, paralelepípedo, solo semipermeável, permeável e área construída. Considerou-se como solo semipermeável aquele que, dada a sua compactação, possui menor permeabilidade. Pode-se constatar a abundância de áreas verdes na porção em que o campus da UFRN está inserido, entretanto há grande deficiência de vegetação na área onde se concentram as residências. A maior parte da vegetação localiza-se dentro dos lotes. Percebeu-se uma problemática na porção residencial da área: apesar do tamanho razoável dos lotes, a grande presença de pavimentação e construções gera a impermeabilização de águas pluviais e emissão de calor que, consequentemente, ocasionam alagamentos e desconforto térmico aos usuários da área. A área II é caracterizada pela presença de revestimentos do solo em asfalto, paralelepípedo e de solo semipermeável, além das áreas construídas. Estes tipos de recobrimentos são favoráveis às alterações climáticas que resultam em ilhas de calor, discutidas anteriormente. A presença de áreas verdes é satisfatória nas proximidades de alguns conjuntos habitacionais e insuficiente nas áreas onde se concentram as porções comerciais. Percebeu-se inadequação e inexistência de passeios nas áreas comerciais, o que se reflete na sua forma de ocupação, e a insegurança dos usuários ao andar a pé ou de bicicleta. A prioridade na adequação da maioria das vias ao uso dos meios de transporte motorizado foi constatada na visita, uma vez que o uso do pavimento asfáltico é recorrente e predominante na atual política de estruturação do bairro. Isto é incoerente com a real necessidade da área. CONCLUSÕES A questão do transporte associado às condições ambientais está presente em todas as cidades; o problema gerado pela falta de estruturação da rede de transporte se reflete no cenário vivenciado em Natal. A facilidade na aquisição do transporte individual está evidenciada e vem crescendo. É cada vez mais fácil financiar um automóvel, aumentando a frota e possibilitando que mesmo a parcela da população que carece de boas condições financeiras possa adquirir seu transporte individual. A pesquisa desenvolvida neste estudo teve como principal objetivo identificar a relação existente entre as variáveis ambientais e a infraestrutura básica proporcionada para o transporte urbano. As características sociais das áreas estudadas influenciaram no meio de transporte. O uso do carro individual é o modo de deslocamento mais utilizado pelos entrevistados que residem na área I e, de fato, estes apresentam o melhor poder aquisitivo. A área II destaca-se pelo maior índice do transporte não motorizado, que é justificado pelas mesmas condições financeiras dos que a habitam ou utilizam. Na área I, iden123
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tificou-se a deficiência de calçadas para pedestres e carência de vias para bicicletas, presença de passeios inadequados e de obstáculos e vias sem ligações. Na área II, também se verificou a inadequação em sua rede de infraestruturao que não impede o alto índice de deslocamentos em meios não motorizados. Em ambas as áreas constataramse principalmente a pavimentação, quando existia, em asfalto e concreto, materiais caracterizados pela alta capacidade de condução térmica causando aumento da temperatura local. O reconhecimento da importância da climatologia urbana nos problemas de planejamento urbano poderá trazer maior atenção a essa área. No caso de Natal, foram constatados indícios de ilhas de calor resultantes das políticas inadequadas de pavimentação de vias públicas. Entende-se que o tipo de recobrimento do solo adotado é divergente da realidade dos modos de transporte mais popularizados na área. Referências bibliográficas ANTP. Associação Nacional de Transportes Públicos. Circulação com qualidade na cidade do século XXI. São Paulo: Associação Nacional de Transportes Públicos - ANTP, 1999. HOUGH, Michael. Naturaleza y ciudad: planificación urbana y procesos ecológicos. Barcelona: Gustavo Gili, 1998. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTÁTISTICA - IBGE. Censo 2000. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em: 20 out. 2008. BRASIL, MT. Empresa Brasileira dos Transportes Urbanos – EBTU. Pedestres. Série Cadernos Técnicos. Brasília, DF, 1984, 53 p. COSTA, Angelina Dias Leão. Análise bioclimática e investigação do conforto térmico em ambientes externos: uma experiência no bairro de Petrópolis em Natal-RN. Dissertação de mestrado em Arquitetura e Urbanismo. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2003. MASCARÓ, Lúcia. Ambiência urbana. Porto Alegre: Sagra- D. C. Luzzato, 1996. OFICINA CONSULTORES. Estudo de um novo desenho para o sistema de transporte de Natal. Natal: Secretaria de Transporte e Trânsito Urbano - STTU, 2000. OKE, T. R. Boundary layer climates. 2ª edição. Londres e Nova Iorque: Routledge. 1987, 435 p. DETRAN. Departamento Estadual de Trânsito do Rio Grande do Norte. Relatório estatístico da frota de veículos do Rio Grande do Norte. 2004/2008. ROMERO, Marta Adriana B. Princípios bioclimáticos para o desenho urbano. São Paulo: Projeto, 1988. SANTAMOURIS, M. Energy and indoor climate in urban environments – Recent trends. In: ENCONTRO NACIONAL DE CONFORTO NO AMBIENTE CONSTRUÍDO, 4, Anais. Salvador: FAUFBA/Antac, 1997. p. 15-24. TORQUATO, Adriana Maria Soares Cunha. Pesquisa domiciliar de Origem e Destino: 20072008. Natal: Oficina, Engenheiros, Consultores e Associados, 2008.
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Entidades associadas
AN P
Abramcet – Associação Brasileira de Monitoramento e Controle Eletrônico de Trânsito Agência Municipal de Trânsito e Transporte de Corumbá/MS Agência Municipal de Trânsito, Transporte e Mobilidade de Goiânia/GO Agência Municipal de Transporte e Trânsito – Campo Grande/MS Apb Prodata do Brasil – São Paulo Artificium Tecnologia Ltda. – Cotia/SP Associação Brasileira da Indústria Ferroviária Associação das Empresas de Transporte de Passageiros de Porto Alegre - Aetppa Associação das Empresas de Transportes Urbanos de Passageiros de Guarulhos Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Metrô – São Paulo Associação Matogrossense Transporte Urbanos – Cuiabá/MT Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano - Ntu Atech - Fundação Aplicações de Tecnologias Críticas – São Paulo Autarquia Municipal de Defesa Social, Trânsito e Transportes – Caruaru/PE Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e de Cidadania de Fortaleza BB Transporte e Turismo Ltda. – Barueri/SP Brain Engenharia Ltda. – São Paulo Centro de Transporte Sustentável do Brasil – Porto Alegre/RS Centro Federal de Educação Tecnológica - CEFET – MG Cittati Tecnologia e Serviço S/A – São Paulo CMTC- Companhia Metropolitana de Transporte Coletivos - GO Cobrape Cia. Brasileira de Projetos e Empreendimentos – São Paulo Coleurb - Coletivo Urbano Ltda. – Passo Fundo/RS Companhia Brasileira de Trens Urbanos – Rio de Janeiro Companhia Brasileira de Trens Urbanos - Metrorec – Recife/PE Companhia Cearense de Transportes Metropolitanos de Fortaleza – Metrofor – CE Companhia de Desenvolvimento e Urbanização – Joinville/SC Companhia de Engenharia de Tráfego - São Paulo – São Paulo Companhia de Engenharia de Tráfego de Santos – Santos/SP Companhia de Engenharia de Transporte e Trânsito - CETTRANS – Cascavel/PR Companhia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife/PE Companhia de Transportes do Município de Belém - CTBEL Companhia de Transportes Urbanos da Grande Vitória/ES Companhia do Metropolitano de São Paulo - Sede Companhia do Metropolitano do Distrito Federal Companhia Municipal de Transporte Coletivo de Araucária –PR Companhia Paulista de Trens Metropolitanos – São Paulo
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Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 34 - 2011 - 3º quadrimestre
Companhia Tróleibus Araraquara/SP Concessão Metroviária do Rio de Janeiro S.A Consórcio da Rede Metropolitana de Transportes Coletivos da Grande Goiânia –GO Cooperativa de Transporte Coletivo de Passageiros do Estado de Pernambuco Coopertranse - Cooperativa de Trabalho dos Profissionais Especializados no Transporte de Passageiros em Geral de São Paulo Data Traffic - S/A. – Aparecida de Goiânia/GO Declink - Desenvolvimento e Consultoria de Informática Ltda – Rio de Janeiro Departamento de Ciências Exatas e da Terra – Salvador/BA Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais Departamento de Estradas de Rodagem do Estado da Paraíba Diretoria de Transporte e Vias Públicas - DTV – São Caetano do Sul/SP Emdec - Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas S/A – SP EMPLASA - Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano SA – São Paulo Empresa de Desenvolvimento Urbano e Social de Sorocaba Ltda. – SP Empresa de Transportes Coletivos de São Bernardo do Campo/SP Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre S/A – RS Empresa Metropolitana de Transp. Urb. de São Paulo S.A – São Bernardo do Campo/SP Empresa Municipal de Planejamento, Gestão e Educação em Trânsito e Transportes de Montes Claros - MCTRANS – MG Empresa Municipal de Transportes e Trânsito - Transbetim – Betim/MG Empresa Pública de Transporte e Circulação - RS FABUS - Associação Nacional dos Fabricantes de Ônibus Federação das Empresas de Transp. de Pass. por Fretamento do Est. de São Paulo Federação Nacional dos Arquitetos Fetranspor - Federação das Empresas de Transp. de Pass. do Estado do Rio Janeiro Fundação para Desenvolvimento Tecnológico da Engenharia – São Paulo Fundação Universidade Empresa de Tecnologia e Ciências – Porto Alegre/RS Grande Recife Consórcio de Transporte – Recife/PE Instituição Educacional São Miguel Paulista – São Paulo Instituto de Mobilidade Sustentável - Ruaviva – Belo Horizonte/MG Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento – Rio de Janeiro Instituto Municipal de Engenharia e Fiscalização do Trânsito - Manaustrans – Manaus/AM Instituto Municipal de Trânsito e Transportes Urbanos - IMTT – Manaus/AM IPPUC - Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba/PR IPPUL - Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina/PR Joalina Transportes Ltda. – Petrolina/PE Logit Engenharia Consultiva Ltda. – São Paulo Logitrans - Logística Engenharia e Transportes Ltda. – Curitiba/PR Marcopolo S/A – Caxias do Sul/RS Maubertec - Engenharia de Projetos Ltda. – São Paulo MC Cartões Plásticos Ltda – São Paulo Metra - Sistema Metropolitano de Transporte Ltda – São Bernardo do Campo/SP NITTRANS - Niterói Transporte e Trânsito S/A – RJ NovaKoasin Equipamentos e Sistemas Ltda – São Paulo Núcleo Estudos Terceiros Setor - Vitória/ES Oficina Consultores Associados S/C Ltda. – São Paulo Opus - Oficina de Projetos Urbanos Consultores Associados Ltda. – São Paulo Perkons S.A – Pinhais/PR Prefeitura Municipal da Estância Balneária de Praia Grande –SP Prefeitura Municipal da Estância Balneária de Ubatuba –SP Prefeitura Municipal de Caxias do Sul/RS Prefeitura Municipal de Limeira/SP Prefeitura Municipal de Marabá/PA Prefeitura Municipal de Mauá/SP Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes/SP Prefeitura Municipal de Rio Claro/SP
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Entidades associadas
Prefeitura Municipal de Santo André/SP Prefeitura Municipal de São Bernardo do Campo/SP Prefeitura Municipal de São Carlos/SP Prefeitura Municipal de Valinhos/SP Prefeitura Municipal de Viamão/RS Prime Engenharia e Comércio Ltda. – São Paulo Procint Projeto e Consultoria Internacional SC Ltda. – São Paulo Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Urbano - UFPE – Recife/PE Programa Pos Graduação - Engenharia Urbana – Universidade Federal de São Carlos/SP Rodoviária Metropolitana Ltda. – São Lourenço da Mata/PE RTI - Assoc. Riograndense das Empresas Transp. Rodov. Inter. Passag. – Porto Alegre/RS São Paulo Transportes S.A. – São Paulo Scania Latin America Ltda. – São Bernardo do Campo/SP Secretaria de Estado de Transportes do Rio de Janeiro Secretaria de Estado dos Transportes e Obras Públicas - ES Secretaria de Planejamento, Transportes e Meio Ambiente – Olinda/PE Secretaria de Transportes e Trânsito – Guarulhos/SP Secretaria Municipal de Serviços Públicos – Patos de Minas/MG Secretaria Municipal de Tráfego e Transporte - São Luís/MA Secretaria Municipal de Trânsito e Transportes - Barretos/SP Secretaria Municipal de Trânsito e Transportes de Piracicaba/SP Secretaria Municipal de Trânsito e Transporte Urbano – SMTU – Cuiabá/SP Secretaria Municipal de Transporte de São Paulo Secretaria Municipal de Transportes - Maringá/PR Secretaria Municipal de Transportes - São José dos Campos/SP Secretaria Municipal de Transportes de Jundiaí/SP Secretaria Municipal de Transportes e Infra-Estrutura Urbana - Setran – Vitória/ES Secretaria Municipal de Transportes e Trânsito - Setra – Juiz de Fora/MG Secretaria Municipal de Transportes, Mobilidade e Terminais – Florianópolis/SC Serviço Autônomo Municipal de Trânsito e Transportes de Blumenau/SC Setepla Tecnometal Engenharia Ltda. – São Paulo Sindata Tecnologia e Sistemas de Trânsito Ltda. Me – Santo André/SP Sindicato das Empresas de Ônibus da Cidade do Rio de Janeiro - Rio Ônibus Sindicato das Empresas de Transp. Urb. Passag. do Munic. de Maceió – SINTURB – AL Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros – Goiânia/GO Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte/MG Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Salvador/BA Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado de São Paulo Sindicato das Empresas de Transporte Urbano e Metrop. de Passag.de Curitiba e Reg. Metrop. – PR Sindicato das Empresas de Transp. de Passageiros e Fretamento e Turismo – São Paulo Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários de Estado do Rio de Janeiro Sindicato Interestadual Indústrias de Materiais e Equip. Ferrov. Rodov. – São Paulo Sinergia Estudos e Projetos Ltda. – Rio de Janeiro Socicam Administração, Projetos e Representação – São Paulo Superintendência de Transportes e Trânsito de João Pessoa – SMTT – PB Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito de Teresina/PI Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito – SMTT – Aracaju/SE TACOM - Engenharia Projetos Ltda. – Belo Horizonte/MG Termini Ltda. – São Paulo Transdata Indústria e Serviço de Automação Ltda. – Campinas/SP TTC - Engenharia de Tráfego e de Transportes S/C Ltda. – São Paulo União de Ensino Superior do Pará - UNESPA Universidade Federal do Pará Urbanização de Curitiba S/A – PR Volvo do Brasil Veículos Ltda. – Curitiba/PR
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Calendário de eventos nacionais e internacionais Titulo ou assunto
Local e data
Promotor
Contato
51ª Reunião do Fórum Paulista de Secretários e Dirigentes Públicos de Transporte e Trânsito IX Seminário Nacional Metroferroviário
São Carlos, SP 9 e 10/2/12 a confirmar
ANTP
www.antp.org.br
Rio de Janeiro, RJ março a definir Teresina, PI março a definir
ANTP
www.antp.org.br
ANTP
www.antp.org.br
ANTP
www.antp.org.br
77ª Reunião do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Públicos de Transporte Urbano e Trânsito 52ª Reunião do Jundiaí, SP Fórum Paulista de 31/5 e 1/6/12 Secretários e a confirmar Dirigentes Públicos de Transporte e Trânsito
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Associação Nacional de Transportes Públicos - ANTP Conselho Diretor (biênio 2010/2011) Ailton Brasiliense Pires presidente Claudio de Senna Frederico vice-presidente Nelson Barreto Coutinho Bezerra de Menezes vice-presidente José Antonio Fernandes Martins vice-presidente Joubert Fortes Flores Filho – vice-presidente Lélis Marcos Teixeira vice-presidente Marcos Bicalho dos Santos – vice-presidente Plínio Assmann – vice-presidente Rômulo Dante Orrico Filho – vice-presidente Vicente Abate – vice-presidente Alexandre Sansão Fortes (SMTR/ RJ); Antonio Luiz Mourão Santana (Oficina); Cesar Cavalcanti de Oliveira (UFPE); Pablo Barrio Arconada (BNDES); Denise de Moura Cadette Gazzinelli Cruz (CTeturb/Vitória); Elionaldo Maurício Magalhães Moraes (CBTU); Fernando Faria Bezerra (AMC/Fortaleza); Atílio Pereira (SMTT/Guarulhos); Jurandir Fernando Ribeiro Fernandes (STM/SP); Marcos Valente Isfer (Urbanização de Curitiba S/A); Maria Cristina Molina Ladeira
(SMT/Porto Alegre); Otavio Vieira da Cunha Filho (NTU); Paulo Assis Benites (Trends); Pedro Luis de Brito Machado (SPTrans); Ramon Vitor César (BHTrans); Mário Manuel Seabra Rodrigues Bandeira (CPTM/SP); Sérgio Marasco Torrecillas (Emdec). Suplentes (biênio 2010/2011) Elmir Germani (TTC); Humberto Kasper (Trensurb/Porto Alegre); João Gustavo Haenel Filho (Socicam/SP); João Luis da Silva Dias (Rua Viva); Joaquim Lopes Silva Junior (EMTU/SP); José Geraldo Baião (Aeamesp); Oscar José Gameiro Silveira Campos (ST/SBC); Renato Gianolla (Urbes/Sorocaba); Sergio Henrique Passos Avelleda (Metrô/SP); Willian Aquino (Sinergia e Projetos). Conselho Fiscal Titulares João Carlos Camilo de Souza (Setpesp) José Eduardo Marques Cupertino (EMTU/SP) Roberto Renato Scheliga (membro benemérito) Membros natos Rogerio Belda
ANTP/São Paulo Rua Marconi, 34, 2º andar, conjs. 21 e 22, República, 01047-000, São Paulo, SP Tel.: (11) 3371.2299 Fax: (11) 3253.8095 E-mail: antpsp@antp.org.br Site: www.antp.org.br
Prêmio ANTP Qualidade Denise M. C. Gazzinelli Cruz (coordenadora nacional); Alexandre Resende; Cassia Maria Terence Guimarães; João Batista R. Moraes Neto; Paulo Afonso Lopes da Silva; Valeska Peres Pinto
Equipe ANTP Marcos Pimentel Bicalho superintendente Valeska Peres Pinto coordenadora técnica Nazareno Stanislau Affonso escritório de Brasília Eduardo Alcântara Vasconcellos assessor técnico Cassia Maria Terence Guimarães administração/finanças Valéria Aguiar - eventos
Sistema de Informações da Mobilidade Urbana Eduardo A. Vasconcellos; Adolfo Mendonça Bruna C. S. Santos Divisão América Latina / DAL – UITP Eleonora Pazos Fernando de Caires Barbosa
Escritório Brasília (ANTP/BSB) Nazareno Stanislau Affonso SCS, Q. 4, Ed. Mineiro, Bl. A, S. 506 70304-911, Brasília, DF Tel. e fax: (61) 3202.0899 E-mail: antpbrasilia@uol.com.br Coordenadores Regionais Espírito Santo (ANTP/ES) Denise de M. Cadete Gazzinelli Cruz Av. Hugo Viola, 1.001, Bl. A, Sala 215, Mata da Praia 29060-420, Vitória, ES, Tel. e fax: (27) 3223.9100 E-mail: denise@antp.org.br Minas Gerais (ANTP/MG) Ricardo Mendanha Ladeira Tel: (31) 3379.5695 E-mail: antpmg@antp.org.br Tel: (31) 3250.4087 Rua Januária, 181 - Floresta 31110-060, Belo Horizonte, MG Norte (ANTP/N) Patrícia Bittencourt Tavares das Neves Av. Duque de Caxias, 863, apto. 301, Marco 66093-400, Belém, PA E-mail: pbneves@ufpa.br Cel.: (91) 8804.7651 Nordeste (ANTP/NE) César Cavalcanti de Oliveira Cais de Santa Rita, s/nº Bairro São José 50020-360, Recife, PE Tel.: (81) 3221.5144 res. Tel.: (81) 3424.1941 Fax: (81) 3224.0610 E-mail: antpne@hotlink.com.br Paraná (ANTP/PR) Yara Christina Eisenbach Rua Lindolfo Pessoa, 179 /12 80240-330, Curitiba, PR Tel.: (41) 3342.6579 res. Tel.: (41) 3310.5022 com. E-mail: yarabach@globo.com Rio de Janeiro (ANTP/RJ) Willian Alberto de Aquino Pereira Praia do Flamengo, 278, cj. 52 22210-030, Rio de Janeiro, RJ Tel. e fax: (21) 2553.3994 E-mail: sinergia@transporteideias. com.br
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