VIAJANDO COM… … O CAVALEIRO DA DINAMARCA Sophia de Mello Breyner Andresen
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ERA UMA VEZ… “Há muitos anos, há dezenas e centenas de anos, havia em certo lugar da Dinamarca, no extremo norte do país, perto do mar, uma grande floresta de pinheiros, tílias, abetos e carvalhos. Nessa floresta morava com a sua família um Cavaleiro. Viviam numa casa construída numa clareira rodeada de bétulas. E em frente da porta havia um grande pinheiro que era a árvore mais alta da floresta. (…) Até que certo Natal aconteceu naquela casa uma coisa que ninguém esperava. Terminada a ceia o Cavaleiro voltouse para a sua família, para os seus amigos e para os seus criados e disse: (…) – De hoje a um ano não estarei aqui. (…) Vou em peregrinação à Terra Santa e quero passar o próximo Natal na gruta onde Cristo nasceu e onde rezaram os pastores, os reis Magos e os Anjos.
(…) Na Primavera o Cavaleiro deixou a sua floresta e dirigiuse para a cidade mais próxima, que era um porto de mar. Nesse porto embarcou e…”
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“… levado por bom vento que soprava do Norte para o Sul, chegou muito antes do Natal às costas da Palestina. Dali seguiu com outros peregrinos para Jerusalém. Visitou um por um os lugares santos.”
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Jerusalém, 23 de Dezembro Queridos familiares e amigos: Após uma longa e difícil viagem, finalmente cheguei ao destino previsto. Bela
cidade,
Jerusalém,
repleta
de
belíssimos
monumentos! Visitei todos os lugares santos, um por um. Espero com muita ansiedade o dia de Natal, para visitar a gruta de Belém! Lá, rezarei e louvarei a Deus e a todos os anjos que muita fé nos dão para cada dia que nasce. Espero poder passar o próximo Natal convosco. Se Deus quiser, aí estarei daqui a um ano.
P.S.: cumprimentos para todos!
Com amor e carinho, Cavaleiro (Ana Francisca)
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Jerusalém, 19 Dezembro
Queridos filhos Cheguei às costas da Palestina muito antes do Natal, por isso, visitei os lugares santos. Rezei no Monte do Calvário e no Jardim das Oliveiras, lavei a minha cara nas águas do Jordão e vi, no luminoso Inverno da Galileia, as águas azuis do lago de Tiberíade. Também procurei nas ruas de Jerusalém e nas pedras, o sangue e sofrimento que ali deixou o Filho do Homem, Jesus. Quem me dera que vocês estivessem aqui comigo! Bom, está na hora de me despedir. Portem-se bem enquanto estou ausente e façam tudo o que a vossa mãe mandar! Beijos e saudades do vosso pai. Cavaleiro (Tatiana Bastos)
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“Depois, em fins de Fevereiro, despediu-se de Jerusalém e, na companhia de outros peregrinos, partiu para o porto de Jafa. (…) Em Jafa, foram obrigados a esperar pelo bom tempo e só embarcaram em meados de Março.”
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Jafa, 5 de Março Queridos filhos Estou a escrever esta carta porque já não vos vejo há muito tempo e estou com muitas saudades vossas. Na viagem para Jafa, juntei-me a um grupo de outros peregrinos, entre os quais encontrei um mercador de Veneza com quem travei grande amizade. Ele convidou-me para passar por Veneza e ficar algum tempo em casa dele e eu aceitei. Aí em casa anda tudo bem? Vocês têm-se divertido? Têm visto algum animal na floresta? Não se magoem e não entrem na floresta sem estarem acompanhados por algum adulto. Muitos beijinhos Cavaleiro (David) PS: No próximo Natal, quero que me contem novas histórias porque eu vou contar-vos o que tenho visto e feito.
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“A beleza de Ravena enchia-o de espanto. NĂŁo se cansava de admirar as belas igrejas, as altas naves, os leves arcos, as finas fileiras de colunas. Mais do que tudo admirava os mosaicos multicolores onde se erguiam esguias figuras de rainhas e santos que poisavam nele o seu olhar.â€?
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Ravena, 2 de Março
Olá meus queridos filhos Vocês estão bem aí na Dinamarca? Eu estou a escrever-vos para dizer o que me aconteceu quando vinha de Jerusalém para a casa. Na viagem de regresso houve uma grande tempestade no mar que desmantelou o navio todo. Tive que parar em Ravena. Aqui, em Ravena, tudo é muito bonito e grandioso. A beleza de Ravena enche-me de espanto! Agora vou para casa de um mercador muito simpático em Veneza, que eu conheci durante a minha peregrinação em Jerusalém. Agora não tenho mais assunto para falar. Um grande beijinho e um abraço que vos dou com muitas saudades do vosso
Pai (Francisco)
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Ravena, 15 de Março
Querida esposa: Como vão as coisas por ai? Por aqui vai tudo bem. Eu estou em Ravena. É um local bonito para visitar, principalmente as belas igrejas…. Mas do que eu gostei mais foram os mosaicos multicolores onde se erguem esguias figuras de rainhas e santos. É uma cidade espantosa! Na viagem de regresso, travei conhecimento com um mercador tão simpático que se ofereceu para me levar até Veneza de onde, com facilidade, poderei chegar a Génova. Lá, conseguirei apanhar um barco para a Flandres e depois disso voltarei depressa para junto de ti. Sinto muitas saudades tuas e da nossa família.
Um beijo do teu marido (Eduardo).
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Ravena, 21 de Março
Querida mulher Como tinha dito que faria, passei a noite de Natal a rezar onde a Virgem, São José e os Santos adoraram o Menino, que tinha nascido. Depois do Natal, fiquei mais algum tempo a visitar outros lugares na Palestina. Só em Fevereiro fui para o porto de Jafa, onde tive de esperar pelo bom tempo, para embarcar. A viagem até Ravena foi difícil. Em Ravena tudo me espanta e não me canso de admirar os mosaicos multicolores. Infelizmente, o navio não está em condições, por isso partirei para Veneza e alojar-me-ei em casa de um mercador. Um grande abraço, Cavaleiro (Nádia Neves)
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“O Cavaleiro aceitou o conselho do Mercador e seguiu para Veneza. Veneza, construída à beira do mar Adriático sobre pequenas ilhas e sobre estacas, era nesse tempo uma das cidades mais poderosas
do
mundo.
Ali
tudo
foi
espanto
para
o
dinamarquês. As ruas eram canais onde deslizavam estreitos barcos finos e escuros. Os palácios cresciam das águas que reflectiam os mármores, as pinturas, as colunas.”
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Veneza, 5 de Abril
Querida mulher: Como estás? Por cá tudo bem. Estou de momento em Veneza. Tudo é espantoso para mim! As ruas são canais e os palácios crescem das águas! Estou alojado no palácio do Mercador, homem que me disse para vir por Veneza. À noite, ceámos numa grande sala ao som do alaúde. Veneza tem muitas histórias, uma delas sobre Vanina e Guidobaldo, e do seu amor um pelo outro. Prometo-te que estarei em casa antes do Natal. Diz a todos para não se preocuparem e que tenho muitas saudades, especialmente de ti e das crianças!
Com amor do teu marido! (Joana)
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“E no princípio de Maio chegou a Florença. Vista do alto das colinas floridas a cidade erguia no céu azul os seus telhados vermelhos, a suas torres, os seus campanários, as suas cúpulas.”
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Florença, 3 de Maio
Querida esposa, Sei que devem estar aflitos, mas não se preocupem. Acabei de chegar de Veneza onde vi muitas coisas belas, mas quando cheguei a Florença, vi coisas tão maravilhosas, embora graves e austeras, que me prenderam a visão. Aqui em Florença é tudo muito bonito, há telhados vermelhos, torres, campanários e cúpulas. Nesta cidade tão bela há pequenas lojas onde se vendem coiros, colares de coral, armas, pratos de estanho e prata, lãs, sedas, jóias de oiro que me fazem pensar em ti. Fiquei hospedado em casa do banqueiro Averardo onde fui muito bem recebido. Durante a minha estadia, aprendi e ouvi histórias e aventuras fantásticas que me ensinaram muitas coisas novas. Já não tenho mais tempo para escrever, por isso voltarei a fazê-lo assim que puder. Não sei quando regressarei a casa, mas espero chegar antes da noite de Natal para podermos festejar juntos com os nossos pais, filhos, amigos e criados. Dá um abraço por mim à família… Deste que não te esquece Cavaleiro (Filipa)
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Florença, 21 de Maio
Querida esposa, Estou agora em Florença, uma cidade com uma beleza imensa, com igrejas de mármore preto e branco e estátuas de bronze entre outras preciosidades! O banqueiro Averardo, para quem meu amigo veneziano me tinha entregue uma carta, recebeu-me e hospedou-me em sua casa com bastante alegria! Aí, quando chegaram os seus amigos, ouvi as suas aventuras e histórias lendários do passado. Impressionantes! Visitei conventos, palácios, bibliotecas e igrejas. Há uns dias, o banqueiro convidou-me para ficar a viver em Florença, mas eu recusei, para cumprir a promessa que vos fiz de passar o próximo Natal convosco. Agora tenho de prosseguir a minha viagem para chegar aí a tempo. Um abraço do teu marido que te ama.
Cavaleiro (Gabriela Anjos Silva)
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Florença, 13 de Maio
Meus queridos filhos, Neste momento, estou em Florença e tenho muitas saudades vossas. Vocês nem imaginam por onde já passei. Já visitei Jerusalém, Jafa, Ravena, Veneza, Génova, Ferrara e Bolonha. As cidades são incríveis.e os meus amigos narraram-me lindas histórias de heróis que cada vez me despertam mais o interesse. Recentemente, ouvi a história de Giotto e Cimabué. Giotto pintava e Cimabué foi o seu mestre. Giotto era pastor e começou a pintar sem ninguém saber. Um dia Cimabué encontrou-o e tornou-o seu discípulo e fez dele um grande pintor. Uma outra história, que me contaram, falava sobre a beleza de Beatriz, uma donzela de Florença que morreu muito jovem. O seu apaixonado Dante foi a uma floresta onde encontrou a sombra de Virgílio que o guiou até ao Paraíso... Mais não vos digo. Devem tentar ser curiosos para saberem mais sobre estas maravilhosas histórias. Em breve chegarei, para vos abraçar. Vosso pai amigo. Cavaleiro (Jorge Bernardes)
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“Então dirigiu-se para Génova. Mas quando chegou ao grande porto de mar era já o fim de Setembro e os navios que seguiam para a Flandres já tinham partido todos.”
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Génova, 28 de Setembro
Querida esposa: Já passei por muitas aventuras e ouvi histórias lindíssimas que tu adorarias ouvir. Estou agora no grande porto de mar em Génova. Quero seguir para a Flandres, mas os navios já partiram todos. Como
eu
queria
desesperadamente
seguir
viagem,
percorri os cais, falei com os capitães, fui a casa dos armadores… e o que todos me disseram foi sempre a mesma coisa: só daqui a vários meses é que posso arranjar um navio para a Flandres. Fiquei tão preocupado com estas notícias, que nem dormi, nem comi durante 2 dias a pensar no assunto… Entretanto, recuperei o ânimo e resolvi seguir viagem por terra! Fica bem! Um abraço do teu amigo que te ama Cavaleiro (Nair Lopes Mendes)
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“Mas quando chegou à Flandres era já Inverno e sobre os telhados e os campos caía a primeira neve. O Cavaleiro dirigiu-se para Antuérpia e aí procurou o negociante flamengo, para o qual o banqueiro Averardo lhe tinha dado uma carta.”
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Antuérpia, 27 de Novembro
Querida Esposa, Já estou em Antuérpia. Para cá chegar tive de ir a Génova, mas quando cheguei ao grande porto já era fim de Setembro e os navios que seguiam para a Flandres já tinham partido todos. Percorri o cais, falei com os capitães, até fui a casa dos armadores e a resposta que me deram era sempre a mesma - só daqui a vários meses é que havia navios para a Flandres. Fiquei desesperado, mas depois recuperei o ânimo e resolvi continuar a cavalo, por terra, até Bruges. Atravessei os Alpes, os campos, as planícies, os vales e as montanhas da França, até que cheguei à Flandres. Aí já era Inverno e já começava a cair a primeira neve. Então dirigi-me para Antuérpia e agora estou em casa de um banqueiro, que me foi indicado pelo meu amigo mercador. Muitos beijinhos para todos, Vou dando notícias. Cavaleiro (Ana Catarina C Real) P .S. - Devo estar aí antes da Noite de Natal ou na Noite de Natal.
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Antuérpia, 27 de Novembro
Querida mulher Espero que esteja tudo bem aí por casa, eu estou muito bem. Agora estou alojado em Antuérpia, uma cidade maravilhosa cheia de monumentos bonitos e interessantes e muitos locais para visitar. Tenho uma má noticia - já falei com vários capitães e armadores de vários navios e todos me responderam que já não vão partir para a Dinamarca, pois vai ser um Inverno muito rigoroso e ninguém se atreve a viajar por mar.Assim, tomei uma decisão, partirei para a Dinamarca por terra. Chegarei aí são e salvo, se Deus quiser, para que possamos passar o Natal novamente em família.
Beijos do teu marido Cavaleiro (Sara Silva)
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“Caminhou durante longas semanas. Como os dias eram curtos e não se podia viajar de noite, avançava lentamente. (…) Finalmente, na antevéspera de Natal, ao fim da tarde, chegou a uma pequena povoação que ficava a poucos quilómetros da sua floresta. (…) Era o dia 24 de Dezembro, um dos dias mais curtos do ano, e ele caminhava com grande pressa, pois queria aproveitar as poucas horas de luz. Antes da meia-noite, sem falta, tinha de chegar à sua casa rodeada de bétulas. Caminhava ao acaso, levado por pura esperança, pois nada via e nada ouvia. (…) Então na massa escura dos arvoredos começou ao longe a crescer uma pequena claridade (…) Era um grande triângulo radioso cujo cimo subia mais alto do que todas as árvores. (…)
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Mas quando chegou em frente da claridade viu que não era uma fogueira. Pois era ali a clareira de bétulas onde ficava a sua casa. E ao lado da casa, o grande abeto escuro, a maior árvore da floresta, estava coberta de luzes. Porque os anjos do Natal a tinham enfeitado com dezenas de pequeninas estrelas para guiar o Cavaleiro.
Esta história, levada de boca em boca, correu os países do Norte. E é por isso que na noite de Natal se iluminam os pinheiros.”
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Aos alunos do 7º B…
Escola Básica de S.ta Bárbara Fânzeres, Fevereiro de 2009
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