ELEFANTE BU #53

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#53 fevereiro de 2011


nº53 inspiração. Daí a razão pelo formato novo do zine, com páginas quadradas (como ele não é impresso, tenho essa liberdade). O logotipo, claro, tinha de acompanhar essa proposta. Houve algumas reformulações também na distribuição do conteúdo. A música vem em primeiro lugar, o miolo é das resenhas e o zine termina sempre com matérias de cinema, literatura e cultura pop em geral. Os textos também tendem a serem mais enxutos para facilitar a leitura on-line. O que não quer dizer que as reportagens de seis, oito páginas vão deixar de existir. Se o assunto valer à pena, porque não? Mas não é mais a prioridade – e também estava ficando meio megalomaníaca com essa história de só querer saber de grandes reportagens, o que não era saudável. Tudo tem o seu lugar. Para inaugurar dois representantes dos mais legais e aclamados pela crítica que vieram de São Paulo e no Rio de Janeiro: Cérebro Eletrônico e Fino Coletivo. Fazia tempo, aliás, que eu falava sobre o pessoal dessas duas capitais. O zine segue com uma entrevista sensacional com Demétrio Panarotto e demais diretores do curtadocumentário Cerveja Falada. Isso mesmo, um dos irmãos Panarotto – famosos por causa da banda Repolho e suas canções com letras, no mínimo, inacreditáveis – também é cineasta e dos mais competentes. E tem mais coisas até para descobrir. Aproveite!

O primeiro vinil que disseram que tive – era muito criança para saber –, foi o especial infantil Arca de Noé, com clássicos cantados pelo que existia de mais fino na MPB. Também tive Os Saltimbanco, do Chico Buarque, mas só gostava de escutar História de Uma Gata, com a Nara Leão. Isso por causa do filme Os Saltimbancos Trapalhões. Lembro que a Lucinha Lins também cantava. Como não tinha a trilha sonora do filme e gostava muito da música, recorria a esse vinil. Também tive todos os discos desses especiais infantis que a Globo passava nos programas de fim de ano e os do Balão Mágico. Mas de comprar mesmo, o primeiro disco que lembro com clareza é o do Balão Mágico, um que tinha um carrossel para montar no encarte e que o Toby tinha saído, inclusive. Não gostava muito desse disco em particular. Para você ver que já era uma crítica desde a infância. Eu sou de uma geração que a adolescência foi marcada pelo início da internet e revolução digital, mas a infância não: foi típica de quem viveu os anos 1980: carrinho de rolimã, bicicleta Caloi Cecizinha, joelho ralado no asfalto, beti, Atari, fitas k7, vitrola e muitos discos. Foram nessas coisas que pensei quando estava a elaborar um novo projeto gráfico para o Elefante Bu. Acho que o vinil é o formato de mídia mais elegante para se escutar música. Não é por menos que hoje virou um artigo de luxo, algo para colecionadores. Pensei com carinho nele e decidir transformá-lo na minha maior

créditos edição: Djenane Arraes

capa: Edu Moares

textos: Djenane Arraes


cérebro eletrônico

zach ashton fino coletivo

tulipa ruiz

minha fama de mau kick-ass

buffy 30 anos

uma noite em 67 cerveja falada

contato:

agradecimentos: Sérgio Martins Tatá Aeroplano Renato Terra Scott Allie Demétrio Panarotto

Guto Lima Luiz Henrique Cudo Alvinho Lancellotti Zach Ashton

@elefantebu elefantebu@yahoo.com.br issuu.com/elefantebu elefantebu.blogspot.com


Foto: Edu Moraes

Após passar por reformulações, a banda Cérebro Eletrônico entra na festa tropicalista e lança Deus e o Diabo no Liquidificador, um dos discos mais elogiados de 2010. O Elebu entrevistou o vocalista Tatá Aeroplano

na vibe de sampa


Elefante Bu – O que é pós-Tropicalismo? O texto informativo do disco colocou algumas linhas como esta que colocam mais interrogação do que explicam ao passo que vejo as coisas por um caminho bem mais simples. Afinal, esses conceitos são para explicar ou para confundir? Tatá Aeroplano – Realmente é uma confusão que me lembra a música do Tom Zé: "Eu to te explicando pra te confundir/ eu to te confundindo pra te esclarecer.” Mas concordo com você, o caminho é bem mais simples e está ligado totalmente ao fim dos anos 1960, quando rolou a Tropicália, movimento fundamental para misturar tudo e claro, confundir um pouco, né? Hoje temos muita liberdade para criar um disco, temos liberdade estética total. Musical nem se fala. E não precisa ter nome. Acho que hoje os músicos estão super sintonizados no que está acontecendo e o mais importante: existe um clima de troca musical muito bom, isso é o que realmente importa! EB – Colocar deus e o diabo no liquidificador foi dar uma resposta ao politicamente correto da música nacional de hoje? TA – Foi a necessidade de fazer um disco sem precisar consultar ninguém. Isso é possível nos dias de hoje com a nova configuração do mercado, ou seja, ninguém chegou e disse: olha, mas tem que ter uma música mais radiofônica e talz. A banda concebeu o disco com liberdade extrema e a Phonobase, parceira que lançou o álbum, abraçou totalmente a idéia. Eu vivi um período da minha vida e as letras do disco vieram inspiradas nesse momento. Posteriormente, quando nos reunimos, cada um traz idéias diferentes, mas fomos unânimes na hora de colocaram Deus e o Diabo no Liquidificador... nós colocamos e apertamos o play pra ver no que dava! EB – Como você consegue administrar duas bandas e mais projetos paralelos ao mesmo tempo? TA – No início, lá em 2003, era muito caótico. Imagine quatro ou cinco bandas autorais e ter que organizar, gravar e fazer shows com elas. Mas com o passar do tempo, tudo se organizou naturalmente. Uma coisa bacana é que eu componho muito, também gosto de experimentar e participar de outras bandas e grupos, então organizei totalmente minha vida pra isso e conseguimos equilibrar nossas agendas individuais com as agendas das outras bandas. Atualmente estou com o Cérebro Eletrônico, Zeroum, Jumbo Elektro e Frame Circus. EB – Outra característica interessante sua é a o músico total: canta, toca, compõe e ainda produz para si e também o trabalho de terceiros. Mas isso acontece também com alguns outros indivíduos que se destacam na música brasileira, como o Kassin e o Fernando Catatau. Essa tendência

"multidisciplinar" pode ser vista como uma forma que se tem de viver de música hoje em dia? TA – É totalmente isso, é uma forma de viver de música hoje em dia. Uma coisa inspira a outra. Quando eu sou convidado para produzir um som, ou participar de um disco, adoro trabalhar uns lances musicais que não faço com o Cérebro, ou outra banda que participo. Como sou apaixonado por música, sou totalmente dominado e guiado por ela. Também discoteco muito, e isso me mantém conectado com os sons novos brasileiros e gringos e claro, me ajuda a compor mais. Sou muito fã do Kassin e Catatau, eles me inspiram há muito tempo. EB – Como você se sentiu em ver Deus e o Diabo em listas de destaques do ano depois da Cérebro Eletrônico passar por algumas reformulações? TA – Fiquei feliz, pois trabalhamos e nos divertimos bastante pro disco sair, e foi um processo muito prazeroso, a banda tem uma vibe muita boa, ou seja, a gente se encontra pra ensaiar, fazer um show ou dar uma entrevista e rola um lance totalmente terapêutico psicodélico, um astral que nos acompanha desde que começamos. E olha, não é papo hippie não, é sério, isso é fundamental pra gente gravar novos discos do jeito que a gente vem fazendo. EB – Um monte de gente fala da geração da Lapa, no Rio, mas teve um dia que estava conversando com uma colega cantora de São Paulo que me disse: nada se compara com a cena paulistana de hoje. Só não temos a mesma visibilidade. E citou algumas pessoas para exemplificar, entre elas, você. Você concorda? A cena paulistana é rica, mas está com pouca visibilidade? TA – Eu vou te dizer uma coisa muito bacana: Sampa tá parecendo cidade do interior. Tipo, eu tenho passado dias e dias fazendo sons com os amigos, tenho um grande amigo, poeta e compositor, o Paulo César de Carvalho, e lá na casa dele, a gente se reúne pra tocar violão, junta muita gente legal: Pélico, banda Trupe Chá de Boldo, Peri Pane, Juliano Gauche, Los Pirata, Guilhermoso Wild Chicken, Carlos Zimbher, o Poeta Arruda. Na última festa que teve por lá, até a Alzira Espíndola marcou presença e o violão não parou de tocar por mais de 12 horas. É tipo uma rave de violão. Tem noites que colo na casa do Hélio Flanders, e ele é fantástico, sempre liga o gravador e começamos a criar. Já fizemos isso algumas vezes. E tem toda a turma de viagens astrais e carnavais, Tulipa, Gustavo Ruiz, Leo Cavancanti, Dudu Tsuda, passamos um fim de ano lindo no Matutu de 2005 pra 2006. São essas coisas que acho que estão fazendo diferença em Sampa, porque nós não entramos na nóia da cidade e sim, vivemos nela dentro de uma vibe, de uma energia muito boa que tem rolado musicalmente por aqui... visibilidade é questão de tempo né?


beleza de

coletivo Djenane Arraes O bairro da Lapa, no Rio de janeiro, pega fogo. Daí sai um movimento muito interessante de bons cantores e bandas. Gente não necessariamente nova na música. Pegue aí, por exemplo, a Orquestra Imperial: aquele manancial de valores consagrados que está ali para trabalhar com aquele gigante coletivo, mas não deixa de lançar o trabalho solo. Essa efervescência foi possível graças ao trabalho de revitalização do bairro que visou reacender a cultura e o turismo. Em resumo: a vontade política ajudou a criar espaços e isso atraiu uma turma para lá. “A Lapa é um lugar maravilhoso para tocar. De fato, nos sentimos em casa. Mas é a escassez de casas de shows, principalmente na Zona Sul carioca, que nos faz tão presentes na Lapa. O nosso movimento é totalmente declarado. É um movimento nosso”, disse Alvinho Lancellotti, vocal do Fino Coletivo – uma das bandas mais interessantes presentes no bairro. O sexteto Fino Coletivo é formado por músicos de alto gabarito vindos de várias partes do país que se encontraram ali na capital fluminense para fazer um som elegante e pop que agrega influências locais com um suave sotaque nordestino. Fazem parte: Lancellotti, Alvinho Cabral, Adriano Siri, Donatinho, Daniel Medeiros e Rodrigo Scofield. Lançaram, no ano passado, o disco Copacabana, que foi muito elogiado pela crítica dos principais jornais brasileiros. “Ter o trabalho reconhecido é sempre motivo de muita alegria. Acreditamos que estamos dentro do processo normal de quem construir uma carreira com aquilo que acreditamos ser a nossa verdade. É muito gostoso ver o nosso público fazendo o nosso próprio público crescer de maneira gradual. O tamanho que essa massa irá atingir é que não sabemos. Mas a farinha é de boa qualidade”. O som também não fica atrás. Copacabana é dançante e melódico ao mesmo tempo. A banda fez um excelente uso dos dois vocalistas principais. Lancellotti e Siri funcionam muito melhor juntos do que

Amarante e Camelo, por exemplo, e fazem versos como “se vacilar o jacaré abraça” ficarem bem mais interessantes do que são de fato. Não que as letras sejam ruins: pelo contrário. Tem pegadas espertíssimas como: “Desde que fui batizado/ minha alma amarelou/ minha pele era negra, desbotou”. Outra bacana é: “Por que é coisa da antiga ser malandro traidor/ Hoje visto a camisa pelo bem no nosso amor”. Claro que tem passagens nem tão interessantes, mas aí é que o som muito bem elaborado domina e resolve o jogo. No disco também há uma regravação de Swing de Campo Grande, dos Novos Baianos. A banda foi muito inteligente ao mexerem muito em uma música que nasceu perfeita. O que eles fizeram ali foi trazer a música para o estilo da banda e fazer com que ela se tornasse uma unidade em relação às outras 13 faixas. Interessante é que mesmo parte de um movimento da Lapa, o nome do disco faz referência a um dos bairros da Zona Sul mais famosos e que foi cenário principal da bossa nova e de toda a geração que se formou no lendário Beco das Garrafas. Lancellotti afirmou que, apesar de tudo, é com essa geração que eles se identificam mais. Se a sonoridade em si não denuncia isso, o currículo dos integrantes confirma a história. Donatinho é filho de João Donato e Lancellotti é filho do compositor Ivor Lancellotti, que tem músicas gravadas por Clara Nunes, Nana Caymmi, João Nogueira, entre outros. O disco foi lançado pela Oi Música, que começa a chamar atenção como alternativa entre as diversas formas de se fazer discos hoje em dia: por leis de incentivo, gravadoras ou do próprio bolso. “Apostamos na Oi pela maneira atual que eles pensam e trabalham a nossa música. Venda em formato digital, aplicativo para iPhone, assessoria nas redes sociais, etc”, disse Lancellotti. No mais, vale mesmo à pena escutar esse coletivo que tem de mais fino, segundo Lancellotti, “a vontade de estar no palco e a alegria em compor uma canção”. Ótimas canções por sinal.



cinco cantos

do mundo por zach ashton


foto: Ricardo Ribas

Costa da Lagoa – Florianópolis (SC – Brasil) “Para mim é um lugar mágico, onde tenho memórias incríveis. Você só pode chegar lá de barco. Os Pescadores são cheio de vida. É um grande lugar para se desligar do resto do mundo.”

Ras Abu Galun (Sania – Egito) “Provavelmente é um dos lugares mais mágicos do planeta. Você se hospeda em pequenos vilarejos Beduínos e só é possível chegar até lá andando ou de camelo. A água do Mar Vermelho é uma das mais lindas que já vi e as estrelas parecem um cobertor.”

The Everglades (Flórida – EUA) “Muitas pessoas não sabem que a apenas uma hora de Miami está um dos ecossistemas mais bonitos do planeta. Muita vida e diversidade. Lá você se sente pequeno e sem importância.”

Istambul (Turquia) “A noite lá é incrível. É um lugar do qual gostaria de me perder. Existem muitas ruas seculares com pequenos pubs, clubes e lugares para comer. Imagine um lugar de 2 mil anos: a energia dele está nos muros e você pode respirar a história do passado.”

Black's Beach – San Diego (Califórnia – EUA) “Surfei por lá muitas vezes, então é um lugar que está no meu coração. Pegue a trilha secreta para chegar até à praia, daí você estará fisgado. As ondas são incríveis e é normal se ver golfinhos ao seu lado enquanto surfa.”



discos tulipa ruiz - efêmera

mombojó - amigo do tempo

Efêmera está em todas as listas de melhores discos de 2010. A Folha de S. Paulo teve a audácia de incluí-lo num dos mais influentes da década. Concordo com as listas, discordo da Folha. O boom de cantoras vem se prolongando nos últimos cinco anos e muitas delas tiveram o momento de brilho: Fernanda Takai, Céu, Roberta Sá, Ana Cañas, Vanessa da Mata e até a Mallu Magalhães teve a sua vez. A grande mídia elegeu Maria Gadú para ser a sugada e dissecada da vez, mas é Tulipa Ruiz o grande nome do ano pela maravilha de disco que produziu. Só tem música boa do início ao fim, onde ela usa de tudo e na medida certa. É o tecladinho retrô que parece de vídeo game em Brocal Dourado, o violão simples e bem tocado na delicada Do Amor, ou o teclado que pontua na espetacular Pontual – a minha favorita. Aliás, essa capacidade de colocar uma cena corriqueira, como ir ao cinema, em música é coisa que achava que só os Beatles e o Chico Buarque tinham feito bem. Sobre ela ser a mais influente da década, aí é um exagero. O disco é excelente, mas não traz nada de novo e nem é um estouro de popularidade para influenciar massas. De qualquer forma, é ótimo tê-lo.

Passei muito tempo torcendo o nariz para a Mombojó. O primeiro disco, Nada de Novo, me deixava com dor de cabeça por alguma razão e, naquele momento, irritava o estilo Mundo Livre S/A depressivo quando a própria banda do Fred 04 lançava O Outro Mundo de Manuela do Rosário, último bom disco da carreira dos veteranos de Recife. Não havia crítica positiva que me sensibilizasse. Só fui olhar com interesse para os pernambucanos depois de assisti-los ao vivo ano passado. Se as músicas ficavam tão boas no palco, seria lógico presumir que isso veio de discos muito bons. Parei para ouvir Amigo do Tempo e gostei. Mombojó tinha crescido muito no som e a voz arrastada e sussurrada de Felipe S tornou-se agradável. Tem ouro naquele disco em forma de faixas como Papapa, Casa Caiada e Aumenta o Volume. A primeira música é a melhor do álbum pelo ritmo acelerado (para os padrões da Mombojó e pelo longuíssimo final instrumental que é muito superior a toda discografia junta do NXZero, Restart e Fresno. Amigo do Tempo me fez sorrir à Mombojó, ainda assim procuro entender como é que a banda soa muito, mas muito melhor no palco do que no estúdio.

mca - ao vivo no teatro do ibirapuera

garotas suecas - banda escaldante

O indivíduo que nunca foi a um show da Móveis Coloniais de Acajú e colocar os olhos no ótimo DVD Ao Vivo no Auditório do Ibirapuera vai ficar com vontade de ver a big band ao menos uma vez. E quem teve este prazer antes, é capaz de olhar as imagens e afirmar que estar lá dentro é muito melhor do que a tela mostra. O primeiro DVD da Móveis cumpre muitíssimo bem o seu papel de mostrar a energia dos integrantes em cima do palco, estes que fazem um dos melhores shows entre os grupos nacionais de qualquer estilo ou gravadora sem precisar de pirotecnia, breguetes dançantes e iluminação sofisticada. Outra coisa boa é que ele nã se fizeram de regrados e colocaram as músicas mais fortes entre os dois discos lançados. Estão lá todos os bons hits: Perca Peso, Menina Moça, o Tempo, Lista de Casamento, Seria o Rolex?. Até a tradicional roda de Copacabana estava lá, mesmo que se transformando num quadrado devido ao local. Aliás, esse é o defeito: teatro. Esfriou as coisas. Provável que a escolha tenha sido influenciada por facilidades de gravação, som e outros detalhes técnicos. Mas imagine como melhor seria se fosse no Circo Voador?

O som da Garotas Suecas é uma das coisas mais empolgantes que tem na música nacional de hoje. O disco Banda Escaldante (ou seria o contrário?), nome encontrado com facilidade nas listas de melhores do ano, só veio carimbar e registrar em cartório essa constatação. Duvida: procure por Mercado Roque Santeiro nos meios e sites de sua preferência e escute a deliciosa fusão sonora com metais, teclados, guitarrinha samba-rock, um baixo bem swingado e tamborins. “O roque tem tudo; tudo que é o roque tem/ e pode ser que eu esteja errado/ mas se não tem no roque ainda não foi inventado”. Genialidade de duplo sentido – mas um duplo que passa longe daquele tipo nauseantemente explorado pelo axé e similares. Parafraseando o sexteto, pode ser que eu esteja errado, mas a influência tropicalista do som trás também algumas boas brincadeiras nas letras das próprias canções. Não se perca por aí parece ser uma referência a Não vá se perder por aí, clássico dos Mutantes. O disco todo bom é encerrado de um jeito maravilhoso em Sunday Night Blues, sob as bênçãos de Jorge Ben. Ele está disponibilizado gratuitamente no site oficial da Garotas Suecas.



filmes/séries predador 3

kick-ass

Não se pode exigir muita coisa de um filme como Predador 3 (Predators, USA, 2010), produzido por Robert Rodriguez. Você já sabe como é a história, como funcionam os monstros, que a dinâmica do grupo é igual ao jogo “resta 1”. Não há muito que fazer. É melhor pegar a pipoca, o guaraná (ou coca-cola, para não me acusarem de ser nacionalista) e se divertir. E Predador 3 tem a sua graça, a começar pelo produtor que assinou clássicos B como Drinque no Inferno e Manchete. O outro barato é ver o premiado ator Adrien Brody, vencedor de um Oscar, metido numa floresta alienígena junto com a Alice Braga e o Laurence Fishburne – que nunca mais conseguiu deixar de ser Morpheus. São elemento que fazem deste predador o segundo mais legal da franquia (o primeiro de 1987 com o Arnold Schwarzenegger é imbatível). Primeiro porque é o primeiro que tem atores do primeiro time de filmes A e B no elenco. Veja só: vencedor de Oscar, meu caro. Soma-se aí a uma luta de espadas bem bacana envolvendo um personagem que pertencia à máfia japonesa. Os aspectos técnicos também são interessantes: o ritmo é bom, o tempo de filme é suficiente e a direção não vacilou.

Kick-Ass (EUA, 2009) é o melhor filme já feito de pancadaria/superherói na história do cinema. Ponto. Apesar de Batman, Bruce Lee e Kill Bill serem referências óbvias nesta produção dirigida por Matthew Vaughn, Kick-Ass conseguiu trazer frescor para o gênero, talvez por ter no projeto pessoas que realmente amem quadrinhos e que tivessem o firme propósito em fazer algo diferenciado depois de tantas produções decepcionantes. Pegue o elenco e verá Nicolas Cage, por exemplo. O ator é um reconhecido fanático por quadrinhos que tinha frustração na carreira por não conseguir no cinema desempenhar os papeis dos personagens que tanto apreciava nos gibis. Em Kick-Ass ele representou um quaseBatman tão canalha que beirou a perfeição. O personagem de Cage é um ex-policial que teve a vida desgraçada pelo chefe do crime local. Quando sai da carceragem, ele treina a filha (Chloe Grace Moretz) na arte do combate ao crime. Ela vira a Hit Girl, a heroína mais sensacional que eu já vi. O Kick-Ass em si é um nerd que resolve ser herói mascarado e se mete no caminho. Bom, ele não é importante e nem mesmo é interessante. Hit Girl é o há.

v - visitors (2009) Assistir V – Visitors (2009) é mais ou menos como ver todas as porcarias que você amou vindas da televisão americana num lugar só. O seriado é o remake de clássico do trash produzido no início dos anos 1980, mas a nova versão traz efeitos decentes e um baita elenco formado por atores vindos de outras séries Cult. É protagonizado por Elizabeth Mitchell (Lost), e antagonizado pela brasileira Morena Baccarin (Firefly). Ainda estão presentes Laura Vandervoort (Smallville), Charles Mesure (Xena e Hércules), Scott Wolf (Party of Five) e Joel Gretsch (The 4400). É o tipo da produção que pode ser canastrona, ainda assim você assiste só por causa dessas pessoas. Em V – Visitors, a Terra é invadida por naves que se estabelecem das principais cidades do mundo. A belíssima líder alienígena Anna (Baccarin) clama que os visitantes vieram em paz e conquista o planeta. Na verdade, os aliens não passam de lagartos verdes mal intencionados. O rosto bonito de Anna não engana a agente do FBI Érica Evans (Mitchell), que torna-se líder de um grupo de resistência formado por humanos e alguns visitantes rebelados. Atualmente na segunda temporada, V - Visitors traz pouco mistério, o roteiro é nada brilhante, mas a diversão é garantida.

a rede social Quer dizer que Mark Zuckerberg começou a maior rede social do planeta, o Facebook, para se vingar (e ao mesmo tempo impressionar) uma menina? Parece até sacanagem, mas é exatamente isso que A Rede Social (The Social Network, EUA, 2010), de David Fincher, revela. O estudante de Harvard Zuckerberg entrou para o mundo das grandes corporações da internet roubando idéias alheias, usando o dinheiro do melhor e único amigo. Tudo com uma dose extra de sacanagem motivada pelo ciúme e inveja. Mas é justamente isso que faz A Rede Social ser tão interessante. Diferente de outras cinebiografias por aí, o filme não tenta endeusar o criador do Facebook, ao contrário, faz com que o espectador possa ficar com o pé atrás e em alerta caso encontre o próprio, assim como acontece com os vários tipinhos comuns que sempre cruzam conosco por aí em busca de alguma vantagem. A diferença é que Zuckerberg é um gênio. Ele foi interpretado com maestria pelo jovem Jesse Eisenberg. Até Justin Timberlake faz uma atuação convincente! Só pode ser resultado do excelente trabalho de David Fincher. Nesse sentido, o filme merece as indicações a prêmios que recebeu.



hq/livros minha fama de mau

All Star Superman

Erasmo Carlos é mesmo o “Tremendão”. É um baita compositor – um dos mais importantes do rock e da música romântica brasileira – vascaíno, e também um sujeito dos mais corajosos. A autobiografia Minha Fama de Mau está aí para comprovar. Ele começa a própria história narrando uma transa e, ao longo do livro, não tem o menor pudor em falar também de outras inúmeras aventuras sexuais com as namoradas que teve pelo caminho. Claro que a narrativa de Erasmo não se resume a isso, embora mostre o quanto é honesto ao contar a própria história. Minha Fama de Mau é como se fosse um roteiro de um grande filme dividido em histórias curtas e boas de se ouvir sobre passagens inúmeras de Erasmo. Ali estão as molecagens na infância, pancadarias que se envolveu com o grupo de amigos, o trabalho com Carlos Imperial e como ele foi alçado na condição de ídolo na Jovem Guarda, as primeiras composições então ingênuas, mas que mostravam o estilo simples e direto do compositor. Há um capítulo inteiro dedicado a parceria com Roberto Carlos: é o momento onde ele suaviza um bocado o tom, mas nunca perde o bom-humor. Preste atenção no episódio do alisador primitivo. Leitura obrigatória.

As versões e universos sobre os superheróis são tantos que hoje não se sabe mais o que é a linha regular do desenvolvimento da história ou o que é meramente uma fanfiction escrita por autores consagrados (e devidamente pagos pela editora). A série All Star Superman, de Grant Morrison e desenhos de Frank Quintely, não esconde que é uma fic. Nela, o Homem de Aço cai numa cilada armada por Lex Luthor e começa a desenvolver um câncer agressivo. Em seus supostos últimos dias, Superman revela sua identidade à Lois Lame (que não acredita) e dá a ela um presente de ter superpoderes por um dia, o que culmina uma ótima história. E o mesmo acontece com os personagens mais importantes da mitologia: Lex Luthor, Perry White, Jimmy Olsen, Martha e Johnatan Kent. Grant Morrison termina por fazer uma belíssima homenagem, quase uma declaração de amor, ao maior dos heróis dos quadrinhos, onde ele fez questão de reunir todos os elementos tradicionais e saborosos que até aquele ano, 2006, haviam se perdido. Foi com toda justiça que All Star Superman levou o prêmio o Eisner de melhor nova série. É uma edição obrigatória na coleção de qualquer fã de quadrinhos.

os beats - graphic novel

dez (quase) amores

Antes de adquirir Os Beats – Graphic Novel, editado por Paul Buhle, pense bem sobre o que você espera dele. Se for para ter boa informação sobre a geração que influenciou a contracultura estadunidense, então recomendo esquecer os quadrinhos e investir em livretos melhores e mais baratos, como Geração Beat, de Claudio Willer, que faz parte da coleção Encyclopaedia da L&PM Pocket. Mas se o seu motivo for meramente por apreciar o formato e a arte dos quadrinhos, neste caso Os Beats vale à pena. Ou metade dele vale o investimento. A primeira metade do livro faz uma pincelada na história dos principais representantes do movimento beat, em especial Jack Kerouac, Allen Ginsberg e William Burroughs. O roteiro de Harvey Pekar é fraco e a arte de Ed Piskor é estilo Joe Sacco, mas sem o talento deste. Caso conheça a história do movimento, pule a primeira metade e esqueça esses dois indivíduos. Vá direto ao capítulo A City Lights e os Beats em San Francisco, na página 122. A partir dali o conteúdo melhora e a arte torna-se bem mais atraente. Dispense particular atenção à arte de Summer McClinton: é excelente e lembra muito Hervé Bourhis (O Pequeno Livro do Rock).

Dez (Quase) Amores, de Claudia Tajes, traz uma história sensacional, já consagrada, inclusive, com adaptações para o teatro. Uma jornalista conta a história da vida amorosa dela com alguns indivíduos (são mais de dez). São relações absurdas, a maioria desastrosa, mas todas possíveis. Caso não tenha vivido na pele algo próximo das situações descritas por Claudia, é fato que você conhece alguém que sim. Essa identificação consegue aproximar muito leitores muito diversificados. Fora que a escrita de Claudia é impressionante, envolvente. Ela tem tiradas dignas de roteiros de sitcoms: é aquela frase esperta que te faz gargalhar alto. Como, por exemplo: ‘filha é para dar desgosto mesmo’. Dez (Quase) Amores é uma leitura muito feminina e isso pode afastar o interesse do público masculino. Por outro lado, é sempre bom ter a oportunidade de entender um pouco mais dessa cabeça maluca que todas as mulheres têm e ainda dar boas risadas com as confusões da personagem cativante criada por Claudia.


Com terceira temporada confirmada, Misfits continua a ditar novos paradigmas para séries de heróis Djenane Arraes Os cinco heróis britânicos criados por Howard Overman não são erros e muito menos aberrações. Está aí o sucesso inusitado de Misfits para comprovar. A primeira temporada, de apenas seis episódios transmitida pelo canal E4 em 2009, introduziu ao mundo uma nova forma de se desenvolver uma mitologia baseada em super-heróis em meio de uma avalanche de filmes de alto orçamento baseados em HQs, e de séries de TV (além da mal-sucedida Heroes, Smallville ainda respirava). Os britânicos não estavam interessados no padrão mitológico estadunidense, tão pouco nos melindres dos censores pela moralidade. Talvez eles nunca estiveram, afinal. Por isso mesmo, é provável que só naquele país fosse possível a criação de personagens delinqüentes de vinte e poucos anos que descobriram ter super-poderes após serem expostos por uma tempestade bizarra e não deram à mínima. Os jovens de Misfits tinham habilidades que refletiam seus traços e modos de vida. O jovial e brincalhão Nathan (Robert Sheehan) tornou-se imortal; a desconfiada e esquentada Kelly (Lauren Socha) passou a ler pensamentos; o arrependido atleta Curtis (Nathan Stewart-Jarrett) podia voltar no tempo; o nerd Simon (Iwan Rheon) ficava invisível; e Alisha (Antonia Thomas), de vida quase libertina, provocava super-tesão em quem tocasse. E o que eles fizeram com essas novas informações: quase nada. Eles tinham alguns assassinatos acidentais a esconder primeiro: todos dos monitores do serviço probatório a qual foram condenados pelos pequenos delitos. Era isso e também resolver alguns abacaxis pessoais pelo caminho. Não, aqueles Misfits de fato não tinham tempo para bancar heróis e salvar criancinhas, velhinhos e gatinhos em cima da árvore. A primeira temporada não conseguiu alcançar nem um milhão em números de audiência, mas a repercussão posterior dela foi enorme. Ela deu aos jovens equívocos da natureza não apenas uma segunda leva de episódios transmitidos entre novembro e dezembro de 2010, como também a liderança ao canal E4 e a incrível expansão da audiência – praticamente o triplo em relação à primeira temporada. O último episódio da segunda temporada bateu o recorde da série com 1,7 milhão, número expressivo se considerar a população do Reino Unido e a classificação indicativa de 18 anos ou “R”. É praticamente a audiência de muito dos hits da TV à cabo norte-americana. Outros fatores que tornaram o feito surpreendente é a quantidade mínima de episódios (13 nas duas temporadas, essa é a quantidade mínima de uma temporada dos seriados americanos) além do ano que separou uma e outra. É mais ou menos como acontece na atual forma de se fazer “seriados” na Rede Globo.

Misfits tem algumas peculiaridades que explicam o sucesso dentro de um formato ingrato. O número reduzido de capítulos permite coerência na história. Os plots são desenvolvidos e concluídos com mais rapidez. O grande mistério do segundo ano da série, por exemplo, era a identidade de um herói mascarado que salvava a pele do grupo. Isso foi desvendado no terceiro episódio e a história dele foi concluída no seguinte: rápido, excitante e satisfatório. Não houve inclusão massiva de novos personagens para tirar o foco dos principais, erro comum em muitos dos shows televisivos. O mascarado misterioso revelou-se ser muito bem conhecido da audiência de Misfits e a garota que seria namorada de Curtis apareceu, serviu a um bom propósito e foi embora. E mesmo enquanto esteve na tela, a personagem jamais desviou a atenção dos cinco principais. É o tipo de fidelidade que o público aprecia. Não é que novos personagens não sejam bem-vindos, mas as pessoas tendem a estabelecer laços com os mais antigos. Uma vez que a classificação indicativa “R”, de restrito, Misfits não se fez de rogado e mostrou os pelos pubianos dos cinco atores em cenas dignas de soft porn. Apenas uma delas, entre os personagens Alisha e Simon, foi trabalhada num sentido mais romântico e artístico (dentro do que isso representa em Misfits) porque eles formam o casal mais próximo do que se pode considerar “fofinho”. Mesmo assim, foi uma baita cena de sexo oral que os dois protagonizaram. As restrições também foram bem utilizadas nos diálogos, no linguajar, nas piadas de triplo sentido, nas histórias que contém alto teor de álcool, rock'n'roll e algumas drogas. Aliás, a trilha sonora que se pode fazer com as canções do seriado é algo próximo ao sensacional. Tem desde Echo and The Bunnyman, Joy Division, Jeff Beck e outros clássicos óbvios ingleses, coisas mais recentes e de grande qualidade, como Florence + The Machine, até algumas preciosidades nem tão conhecidas assim. Imagine um episódio terminar com I Don't Know What's Happened To The Kids Today, de Labi Siffre. Épico. Mas a maior das virtudes de Misfits é o fato da série ter um único roteirista: o próprio idealizador Howard Overman. Apesar dos episódios passarem pela mão de diferentes diretores, o que dá uma salutar dinâmica interessante de estilos de filmagem, o conteúdo permanece sólido e coerente. Em Misfits, com a mão firme de Overman, não há riscos de personagens com múltiplas personalidades. No estilo do roteirista, não há espaços para o bom-mocismo e lições de moral, o que é ótimo. Misfits não dá ao espectador o que ele quer ver, muito menos o que é preciso ser visto. A série apenas é o que é: autêntica.



lira dos

30 anos


Buffy Summers fez 30 anos de idade em janeiro deste ano e o peso de sua idade vai passar a ser sentida até no gibi. Na nova temporada dos quadrinhos que deve começar no segundo semestre de 2011, a personagem vai continuar a amadurecer e vai mostrar os desdobramentos dos representantes da chamada “geração y”: àquela da qual eu faço parte, assim como a própria Buffy. É algo muito interessante se considerar que super-heróis clássicos perderam tal identidade há muito tempo. Taí mais um atrativo deste ícone pop, um dos preferidos para estudos acadêmicos em universidades estadunidenses. O brasileiro costuma não compreender bem o apelo da personagem. Para muitos, Buffy é aquela loira do filme, que por sua vez é confundido com o seriado de TV. Mas trata-se aqui de um personagem que serviu de referência às heroínas independentes que surgiram ao longo da década de 1990 e na seguinte. Buffy foi uma das primeiras a quebrar o estereótipo da loirinha frágil que ou era a vítima, ou era a namorada, ou era a vilã: nunca a protagonista de fato. Estão aí exemplos como a Rainha Branca (X-Men), Gwen Stacy (Homem-Aranha), Sue Storm Richards (Quarteto Fantástico). O criador de Buffy, Joss Whedon, disse certa vez que estava entediado com o clichê e decidiu subverter. Nascia dessa idéia a caça-vampiros. Sem Buffy e Nikita, por exemplo, não haveria Uma Thurman no papel de noiva em Kill Bill e nem mesmo a recente e adorável Hit Girl, de Kick-Ass. Mas o maior atrativo do personagem não é o ícone feminista. Buffy é um indivíduo que é um espelho da geração que a assistiu e se mantém fiel a ela. Os sociólogos definem como geração Y aquela que testemunhou o início da internet, cresceu num mundo democrático e de economia estável, por isso deixou de pensar mais em questões coletivas para se preocupar com questões mais pessoais. Buffy não se preocupa em salvar o mundo, apesar de ser essa sua responsabilidade. A motivação maior é manter a sua família à salvo e tentar resolver a vida pessoal, que é uma zona. Num diálogo com a melhor amiga Willow Rosenberg – que na prática é entendida melhor como uma espécie de “irmã do meio” na relação entre a caçadora e a irmã mais nova, Dawn –, Buffy a valoriza pelas habilidades com tecnologia da informação e por ser uma hacker: “Isso é um poder muito prático. Faz um bom dinheiro e computadores se tornaram bem populares entre os mais jovens”. Diálogo velho? Que nada. Foi publicado em janeiro neste ano e sintetiza a relação da personagem com o público que ela dialoga melhor. A história da caça-vampiros começou com um filme fracassado, que migrou para uma série de televisão cult por sete anos – onde ela ganhou o rosto definitivo na atriz Sarah Michelle Gellar –, e teve continuidade bem-sucedida nos quadrinhos. Quando foi lançado, em 2007, o gibi alcançou mais de 100 mil cópias. Quatro anos depois, a 8ª temporada da saga (encerrada em janeiro deste ano), tinha média de vendas de 40 mil unidades. Mesmo com a queda de quase 60% das vendagens com o passar do tempo, o título continuou figurando no top 30 nos Estados Unidos. “É o nosso gibi mais vendido nesses quatro anos”, afirmou Scott Allie, editor da Dark Horse. O segredo é que Buffy não é sobre “peitos”, segundo Allie. “Todas as heroínas dos quadrinhos acabam

recaindo nisso. Alguém teria dito que o público masculino não seguiria uma heroína que não tivesse super-atributos físicos. Mas Buffy está envolvida e boa escrita e caracterização profunda e é isso que tem envolvido as pessoas ao longo de quatro anos”. Foi justa essa boa história que sustentou a 8ª temporada de Buffy apesar dos erros estratégicos tanto de joss Whedon quanto da Dark Horse. É sabido que quatro anos é um tempo longo demais para sustentar uma saga nos quadrinhos, sobretudo quando houve hiatos de até dois meses entre algumas das etapas. As editoras costumam trabalhar as sagas por até um ano, no máximo dois quando se trata de um hit monumental de um escritor consagrado. “É que fizemos uma opção pela qualidade”, disse Allie, “poderíamos lançar todos os meses à fio, claro, mas a história ficaria descerebrada com o tempo”. Para a 9° temporada, Allie afirma que “será uma história em menor escala, mais pessoal: uma volta às origens”.

Buffy e Willow Rosenberg são os principais personagens femininos. Apesar de melhores amigas, os acadêmicos interpretam a verdadeira relação delas como de duas irmãs.


O enredo A história de Buffy nos quadrinhos começa cerca de um ano depois dos acontecimentos que marcaram o fim do seriado: Sunnydale, a cidade natal da caçadora, é destruída. Ela agora está na Escócia, onde comanda a base de operações central das caça-vampiros (existem milhares espalhadas pelo mundo). Xander Harris coordena o lugar; Dawn Summers virou uma gigante, vítima de um feitiço de vingança de um namorado traído; Willow Rosenberg estava por aí tentando entender e controlar os poderes dela. A turma se une novamente após um ataque bizarro de zumbis ao castelo. Willow salva a pátria quando Buffy está ausente de alguma maneira (como sempre fez). É quando a gangue toma conhecimento de Twilight (não o vampiro emo da moda) e dos planos do exército norte-americano em acabar com o grupo de caçadoras. Uns três anos depois de história, Buffy e a gangue enfrentam uma batalha sangrenta no Tibet, onde a caçadora ganha poderes equivalentes aos do Superman e descobre que Twilight é na verdade Angel, o primeiro e eterno amor dela. O ex-vampiro armou toda a confusão para que Buffy pudesse finalmente os mesmo poderes que ele tinha e os dois pudessem fazer um sexo cósmico, tão poderoso que criaria um mundo inteiramente novo: uma versão evoluída a esse inferninho em que vivemos. Mas Buffy se recusa a ser a Eva deste novo jardim do Éden e retorna ao inferninho onde está a verdadeira família dela. Ao se rebelar contra as forças cósmicas, Buffy condena o mundo, que passa a sofrer uma invasão massiva de demônios. A gangue volta à cratera que restou de Sunnydale onde enfrentam a guerra da vida deles, mas os objetivos de cada não estão necessariamente coesos. Buffy quer arrumar a bagunça que fez por causa do orgasmo estrelar. Mas a forma mais simples seria destruir uma espécie de gema que extinguiria a magia do mundo, isso incluiria os poderes de todas as caçadoras. Willow, embora também quisesse arrumar a bagunça que a melhor amiga aprontou, luta de verdade para conservar a tal gema e também para manter os próprios poderes intactos. A morte do mentor Giles pelas mãos de Twilight faz com que Buffy haja por instinto e ela destrói a magia, além de, segundo Willow, “matar a alma da mãe Terra”.

Acontece que, lá pelo ano dois da história, Buffy é transportada 200 anos do futuro, onde ela conhece o mundo sem magia e com pouca memória. E não gosta do que vê. As cidades, agora verticalizadas, funcionam sob uma nova lógica: quanto mais perto do chão estiver, mais pobre, perigoso e poluído. Os vampiros e demônios circulam com liberdade, aterrorizando as pessoas e só existe uma meia-caça-vampiros tendo que fazer todo o serviço sujo. Buffy também descobre uma Willow imortal (não-vampira), sofrendo pelo acúmulo de magia dentro do corpo que a faz ficar, de certa forma, manipulativa e má. Em vez de evitar, todas as ações de Buffy no fim da 8ª temporada teoricamente confirmam o futuro não muito animador. A 9ª temporada vai abortar questões sobre destino e livre-arbítrio. Será que é mesmo possível mudar o futuro? Essa é a volta às origens que Allie se referia. O grande mérito de Buffy foi abordar as questões simples apesar do tumulto fora de casa. É a necessidade de se ter um emprego para pagar as contas apesar dos demônios que querem destruir a cidade. É conseguir conciliar razão com o coração na hora da crise. É também não se levar tão à sério. Buffy vai ter que encarar tudo isso com o peso do pensamento de uma geração que está com 30 anos nas costas. Nada mais atraente.

Xander Harris, Spike, Buffy, Willow e Dawn são os personagens que compõe a atual base das histórias da caça-vampiros.


principais histórias da 8ª temporada #5 Não é fundamental para entender a 8ª temporada, mas essa história de número único foi premiada. Uma das caçadoras fala de como foi a convocação, como ela abraçou o destino até mesmo quando ordenaram que ela pintasse o cabelo para fingir ser Buffy rumo a uma missão suicida no mundo inferior (debaixo da terra). A caça-vampiros fala da força que tem um nome, no caso dela, o mais importante era de Buffy, e como era complicado e, ao mesmo tempo honroso, viver à sobra dele. No final, ela morre, mas cumpre a missão.

#19 Conclusão do episódio Time of your life, quando Buffy vai parar 200 anos no futuro. Buffy fica frente a frente com a rancorosa e maquiavélica Willow do futuro. Após uma luta com a caçadora do futuro (que seria épica se fosse em live action), Buffy mata a amiga cravando no peito o machado místico. Há uma explosão de luzes e a ruiva olha agradecida para a caçadora antes de morrer. Logo em seguida, a Willow do tempo presente, de olhos vendados, consegue resgatar Buffy. Os eventos traumatizam Buffy, que promete mudar o futuro.

#10 Buffy e Willow vão visitar um demônio que pode dar algumas respostas sobre o que significava Twilight. O demônio revela coisas que uma queria esconder da outra. Buffy cometia atividades criminosas para sustentar a rede de caça-vampiros. Willow um demônio como guia. No final, foi revelado que Buffy sairia derrotada por causa de uma traição de alguém muito próximo e inesperado. Ela imediatamente acusa Willow, mas acaba ouvindo a terrível confissão: a ruiva se arrependia por tê-la ressuscitado porque o preço foi a vida da pessoa que mais amou.

#35 Conclusão do episódio Twilight. Depois de descobrir que o grande vilão era Angel, e em seguida os dois fizerem sexo a ponto de criar uma realidade superior, Buffy se recusa em deixar a família (Dawn, Willow, Xander e Giles) no mundo inferior para viver a nova vida ao lado do grande amor. Para piorar, a criação do novo mundo abre um portal que infecta a terra com demônios enormes e violentos. Buffy e Angel voltam para tentar consertar o mal que fizeram. Mas o número de demônios é demais até para os dois. O dia é salvo por Spike.

#15 Conclusão do controverso episódio Wolves at the gate, quando Buffy tem uma experiência homossexual com Satsu, outra caça-vampiros. A gangue vai combater uma gangue de vampiros no Japão com a ajuda de ninguém menos do que conde Drácula. Tem de tudo na batalha, até mesmo o confronto da gigante Dawn com uma réplica robô do Godzilla no centro de Tóquio. Este é considerado o melhor capítulo e também o último mais descompromissado da temporada. Depois de Wolves, tudo fica mais sério e confuso.

#39 Parte quatro do último episódio, Last Gleaming. Angel é possuído por Twilight e trava uma luta contra Buffy enquanto todo o resto cuida dos demônios. Giles pega o machado místico das caçadoras e tenta matar Twilight pelas costas, mas é surpreendido e morre. Buffy assiste ao assassinato e se desespera. Ela pega o machado que destrói a gema que mantinha viva a magia no mundo. Twilight, Willow e todas as outras caçadoras perdem os poderes, e os demônios invasores desaparecem. O problema é que esse resultado configura uma guerra perdida.


sábio mestre cervejeiro

Que Bhrama Chopp! Cerveja é Mocinha, fabricada pela Canoinhense. É coisa fina, da melhor qualidade. E ainda tem a Nó de Pinho, a Jahu e a Malzebier. Essas cervejas são produtos da fábrica artesanal de Rupprecht Loeffler, considerada a mais antiga em atividade do país. A história deste mestre cervejeiro é contada no curta-documentário Cerveja Falada (Brasil, 2010), de Demétrio Panarotto, Guto Lima e Luis Henrique Cudo. É uma produção simples, mas muito saborosa de se ver que partiu do documentário para a televisão Histórias da Cerveja em Santa Catarina, de 2008. Confira a entrevista.


Elefante Bu - O que foi pensado primeiro? O doc Cerveja Falada ou o doc TV do qual o Rupprecht Loeffler também participa? Guto Lima – Primeiramente fizemos o Histórias da Cerveja em Santa Catarina, em 2008. Esse era um projeto para ser exibido na televisão, com um formato, roteiro, fotografia focado nisso. O documentário era mais abrangente, pois fazia um apanhado desde as cervejarias que não existem mais até as micro-cervejarias atuais. Foi aí que “descobrimos” a Cervejaria Canoinhense. A diferença é que ela é antiga, mas resistindo até hoje. Seu mestre cervejeiro, Rupprecht Loeffler, que esse ano completará 94 anos, continua atendendo na Cervejaria e coordenado a produção. Ele acabou sendo um dos personagens do primeiro trabalho, mas teve de ganhar um filme só para ele, o Cerveja Falada. Demétrio Panarotto – O Histórias da Cerveja em Santa Catarina veio antes com a intenção de “documentar” uma tradição que chegou ao estado (e ao Brasil) a partir da metade do Século 19 com os imigrantes alemães: a tradição da produção de cerveja e de que cada município poderia (ou deveria) ter uma ou mais cervejarias que abastecessem a demanda local. Essa tradição se manteve até mais ou menos a metade do século passado e a segunda guerra mundial foi determinante para que ela se quebrasse, afinal de contas, o malte e o lúpulo eram (e ainda são na sua grande parte) importados da Alemanha, e depois que os mares foram fechados durante a guerra nem todas as cervejarias tiveram condições de manter a produção. A tradição se quebrou e foi retomada no fim do Século 20. Acho que o que determina a retomada é o fato de que o monopólio fez com que se privilegiasse um tipo de produto, e sem a concorrência quem perde, no primeiro momento, como sempre, é o público, mas no momento seguinte essa cultura cervejeira é retomada e com ela se descobre uma gama de outros produtos que o consumidor desconhecia. De outra maneira, descobre-se que existe outro público para além do bordão limitador de que “o brasileiro consome cerveja pilsen, pois é uma cerveja mais leve que se adapta melhor a um país quente, tropical...” Ainda, com essas mudanças de hábito, descobre-se que a própria cerveja pilsen tem sabores, perfumes, texturas que passam despercebidos na produção industrial. Onde entra o seu Ruprecht nessa história? Ele e a sua cervejaria canoinhense atravessam todo esse período (as fórmulas vieram com o pai dele no final do Século 19) e se mantém fazendo cerveja de uma maneira que hoje é considerado arcaico em qualquer lugar do mundo. E isso para nós é o grande mote da cervejaria: ela não se enquadra nos moldes de fabricação atual, seja da grande indústria, seja das micro cervejarias... Seu Ruprecht, na tentativa de manter a tradição de seus antepassados, mantémse fiel as fórmulas e aos métodos, mas também a uma estrutura (equipamentos) hoje encontrados apenas em museus especializados como maneira de ilustrar algo que já foi dado como superado. Elebu – A impressão que tenho quando vejo os dois filmes é de que o brasileiro não sabe porcaria nenhuma sobre cerveja e como apreciá-la. É bem por aí mesmo?

Guto Lima – Olha. Eu diria que sim. Mas o filme não diz isso não, até porque o brasileiro está devagar mudando seu paladar para cerveja. Eu não entendo quase nada de cerveja, mas meu paladar mudou completamente após a realização do primeiro filme. Hoje tento beber apenas cervejas que julgo ter qualidade superior a qualidade média da maioria das cervejarias brasileira. Uma amostra dessa mudança que é as grandes tem investido e comprado as pequenas. Há aí um público consumidor que pode beber menos, mas paga mais caro para beber melhor. E esse público não para de aumentar. Pelo menos tem cada vez mais gente descobrindo novas cervejas e cervejarias e gostando. Demétrio Panarotto – Talvez essa discussão seja ultrapassada, pois os apreciadores de cerveja descobriram que o mais legal com essa nova tendência de micro cervejarias e cervejeiros artesanais é a possibilidade de conversar, discutir e trocar experiências sobre o assunto. Antes parece que a cerveja era apenas um combustível para falar de outras coisas, e de um tempo pra cá se descobriu que é possível não apenas beber, mas falar sobre cerveja. Outra coisa que muda é que o brasileiro sempre se disse um bebedor de cerveja e o que entra em jogo a partir do momento em que passa a se falar sobre cerveja é a diferença entre bebedor e apreciador. Luiz Henrique Cudo – Não acho que seja por aí, não. Pois além do hábito, o que tem que se considerar é uma demanda de mercado. Talvez o interesse por cervejas especiais sempre existiu, mas havia poucas ofertas no mercado e o que temos hoje é um aumento nesta oferta. Elebu – Existe o crescimento de fábricas artesanais de cerveja no Brasil como o de Santa Catarina? Guto Lima – Sim, um crescimento não só das fabricas quanto da quantidade de fábricas. O mercado está aumentando e tem que se dar conta da demanda. Há também um crescimento muito grande, mesmo, dos chamados cervejeiros caseiros. Eles se reúnem em uma entidade chamada ACerva, que existe nos mais diversos estados brasileiros, e fazem cerveja para consumo próprio e experimentarem entre si. Uma grande confraria de cervejeiros. Demétrio Panarotto – Só para vocês terem uma idéia, tem um dado que parece importante para entender o estado de SC: em torno da ACerva Catarinense, sem contar os demais cervejeiros que optaram por não se cadastrarem, existem mais de 100 associados produzindo cerveja periodicamente. Com tanta gente envolvida com a produção de cerveja é natural que essa informação adquirida com a produção, esse know how, se transforme em combustível para a troca de experiências. Talvez alguns desses, poucos, aventurem-se para além daquilo que se estabelece como caseiro, mas independente disso, o legal é pensar na cerveja como um hobby que ultrapassa o lugar comum: beber pra encher a cara e falar de mulher e/ou futebol, não que isso não aconteça, mas o legal é descobrir que a cerveja, como o vinho e outras culturas gastronômicas, também é combustível para se falar sobre cerveja.


Elebu – Vocês acham que a tradição da cerveja de Rupprecht Loeffler será duradoura? Guto Lima – Eu espero que sim, Na verdade já é né? A cervejaria tem mais de 100 anos e ele está com quase 94. O que vier é lucro! Mas tem que se preserva a história, mais do que tudo. Até quando a cervejaria continuará produzindo isso ainda é um mistério, mas suas histórias ainda vão longe. Demétrio Panarotto – Acho que é meio consenso meu, do Guto e do Cudo que seria muito legal que isso se mantivesse, mas também nos parece, e isso foi um dos motivos que nos mobilizou a fazer o documentário neste momento, que as coisas quando precisam ser documentadas elas se encontram em um limite entre aquilo que pode se acabar ou sofrer transformações consideráveis. E quando digo isso é porque acredito que a cervejaria se encontre neste limite, então, o documentário serve como um registro e como um convite para que as pessoas se desloquem para visitar a cervejaria, pois ao mesmo tempo em que algum dos herdeiros possa assumir o controle, tocar a cervejaria e manter a tradição, pode ser também que em um futuro não muito distante, e o que determina isso é a própria idade e a condição física do seu Rupprecht, deixe de existir.

Demétrio Panarotto – Hoje parece tão difícil as pessoas se manterem fiéis aos seus sonhos, parece que o sonho também é algo consumível. Parece que as pessoas acreditaram demais na idéia da conquista como desfecho, como final feliz, como se não existisse o esforço pela manutenção da conquista. Desta maneira, acredito que a grande história de vida de seu Rupprecht não é apenas a luta pela conquista, mas a luta permanente pela manutenção do sonho. Não que não se possa ter outros sonhos ou mudar o rumo diante de outras possibilidades, acho que isso também pode ser válido, mas o legal é pensar como o seu Rupprecht não abre mão do sonho e faz com que os outros objetivos girem em torno dele. Talvez isso seja importante para mantê-lo, aos 94 anos de idade, com a vivacidade que demonstra ter. Luiz Henrique Cudo – Assim como meus colegas, o que me admira no “seu” Loeffler é a determinação. O modo como ele encara o trabalho, dedicando toda a sua vida a fazer o que ama e o valor que ele dá a este legado familiar. O que vejo na atividade de “seu” Loeffler é muito mais uma maneira de levar a vida do que uma atividade comercial. Ele dita as regras do que faz sem se importar com as regras de mercado. Elebu – Como está a recepção do Cerveja Falada?

Elebu – Qual foi o maior ensinamento deixado de Loeffler a vocês? Guto Lima – A resistência e fazer o que ama. Por mais clichê que seja dizer isso estou para ver alguém nessa vida que tenha resistido tanto, em tantos sentidos, pelo amor que ele sente pela sua profissão e toda a história da cervejaria. Ou seja, sua história de vida.

Guto Lima – Tem sido muito boa! O público de maneira geral tem gostado muito. Temos tentado fazer o máximo de exibições possíveis. Estamos também inscrevendo o filme em festivais do Brasil e do exterior. Estamos lançando em breve também o DVD, que conterá muitos extras e o filme com legenda em diversas línguas.


Demétrio Panarotto – Como o assunto naturalmente chama a atenção ele nos permite fazer com que o documentário circule em espaços destinados a produção cinematográfica, bem como, pensar em espaços que se interessem especificamente pelo assunto. Luiz Henrique Cudo – Tem sido excelente! E hoje recebido muitos comentários de que mesmo sendo um documentário sobre um cervejeiro e sua histórica cervejaria, ele apresenta uma bela história de vida. Elebu – Vocês estão conseguindo distribuir bem o filme? Guto Lima – As possibilidades de distribuição de um curta metragem são muito restritas. Como esse filme tem um segmento bem interessado nele tentaremos potencializar isso, através de parcerias as ACervas espalhadas pelo Brasil. O complicado é que tudo tem custo e não temos verba par investir nessa distribuição. Mas faremos o que for possível para potencializar o alcance de público do filme. Daqui a uns seis meses pretendemos que ele esteja disponível também para ser assistido na internet. Demétrio Panarotto – O Guto fala da questão financeira e acredito que a nossa situação passa por tentar equacionar isso: tentar fazer o filme chegar à maior quantidade possível de lugares com um orçamento reduzido. E é natural que a internet sirva como possibilidade de ação. Elebu – Terra Deu Terra Come, de Rodrigo Siqueira, conseguiu uma audiência 8x maior em cineclubes do que no circuito comercial. Vocês

pensaram nessa possibilidade de distribuição para o Cerveja Falada? Guto Lima – Uma grande iniciativa essa. Existe hoje no Brasil um grande circuito alternativo para a exibição de produção nacional, que são os cineclubes. Com certeza vamos querer andar por esse caminho e estar no maior número possível de cineclubes. De toda forma tudo isso tem custo, de bancar a cópia, de mandar a cópia, de organizar esse circuito... e o Terra Deu Terra Come é um longa de 88 minutos e o Cerveja Falada é um curta de 15 minutos. O que dá para fazer é bolar uma sessão "etílica" e oferecer aos cineclubes. Vamos pensar melhor nisso também. O que temos que pensar é que não basta só distribuir e as pessoas assistirem. A roda precisa continuar girando, por isso tem de se pensar uma forma de algo retornar aos diretores e aos produtores também. Viver de produzir filmes é inviável. Precisamos descobrir como viver do que fazemos e essa fórmula precisa ser descoberta. Mas vamos bolar alguma alternativa. Quem sabe vender cerveja durante as exibições? Hehehe! Demétrio Panarotto – Acho que os circuitos independentes – seja no cinema, na música, nas manifestações artísticas de uma maneira geral –, sempre surgem como uma boa alternativa, pois nem sempre a visão financeira se encontra na linha de frente; e muitas vezes existe um envolvimento de pessoas ainda apaixonadas pelo que fazem. Então, estamos sempre a procura de alternativas para fazer com que o material circule, alternativas de espaços e/ou de ações que possam potencializar a circulação dentro das nossas condições e, ao mesmo tempo, que respeitem a nossa paixão pelo cinema e pela cerveja. Talvez a história do seu Rupprecht ajude a equalizar esta questão.

O curta-documentário Cerveja Falada, essencialmente sobre Rupprecht Loeffler e sua cervejaria Canoinhense, foi premiado no edital Prêmio Cinemateca Catarinense/Fundação Catarinense de Cultura de 2008 e rodado durante os meses de junho e julho de 2009, na cidade de Canoinhas, interior de Santa Catarina. Montado em Florianópolis no segundo semestre do mesmo ano, a obra foi finalizada 35 mm no mês de março de 2010, em São Paulo. A produção é assinada pela Exato Segundo Produções Artísticas. Para assistir ao trailer: http://www.youtube.com/watch?v=JuQNi-BQROs


revoluções em

O documentário brasileiro mais visto em 2010 resgata a história do Festival da Música Popular Brasileira que mudou a história da cultura nacional


Houve um momento na história onde em uma só noite de 21 de outubro de 1967 aconteceram eventos que marcariam a cultura brasileira. Chico Buarque cantou Roda Viva, até então a obra prima do repertório de canções políticas que ele havia lançado nos anos 1960 e só seria superada por Construção e Deus Lhe Pague, em 1971. Caetano Veloso e Gilberto Gil quebraram tabus ao introduzir a guitarra elétrica na MPB e ainda deram o pontapé inicial para o movimento tropicalista. E também teve espaço para o pitoresco instante em que Sérgio Ricardo antecipou o punk ao quebrar o violão no palco e atirá-lo na platéia. Essas cenas correram o imaginário por décadas, sempre repetidas nos depoimentos de quem testemunhou ou foi protagonista em especiais de TV e reportagens de impressos. Ano passado, os diretores Renato Terra e Ricardo Calil lançaram o documentário Uma Noite Em 67 (Brasil, 2010), uma produção que não encerra o assunto, mas que melhor conseguiu reconstruir as finais do III Festival da Música Popular Brasileira, da TV Record. O bom trabalho dos diretores e produtores se converteu em uma ótima audiência. Segundo a Agência nacional do Cinema (Ancine), Uma Noite Em 67 foi o documentário brasileiro mais visto. Atraiu um público de pouco mais de 82 mil pessoas em apenas 26 salas comerciais, com arrecadação de R$ 760 mil. Entre os filmes nacionais de qualquer gênero, o doc ficou em 16° no ranking dos mais vistos de 74 produções lançadas em 2010. “Foi uma surpresa porque foi o primeiro filme da nossa produtora. Claro que quando você lança algo, você espera agradar, mas foi uma surpresa a dimensão que ele tomou. A gente abriu o festival É Tudo Verdade de 2010 e a sessão foi maravilhosa. Ali mesmo começou um burburinho e a divulgação boca-a-boca. E depois, no lançamento, houve uma repercussão muito forte na imprensa, o que ajudou a tomar toda essa dimensão”, disse Renato Terra. O número do público é maior do que os dados oficiais da Ancine que não conta a presença em festivais (o filme abriu o É Tudo Verdade de 2010), cineclubes e exibições internacionais. Segundo Renato, Uma Noite Em 67 foi exibido em Portugal, Uruguai, Estados Unidos e em Israel . “Nesse sentido, o filme também tem nos surpreendido. Lá em Portugal, eu e Ricardo estávamos na sessão [Festival de Cinema de Lisboa]. O curioso é que, aqui, a maioria das pessoas já sabe o que vai acontecer. Mas quando o Sérgio Ricardo quebrou o violão, as pessoas começaram a aplaudir e fizeram interjeições de surpresa. É muito legal ver o filme batendo diferente em pessoas de outras culturas”. A forma do doc é simples e enxuta. As cinco canções melhores

classificadas mais a apresentação de Sérgio Ricardo formam blocos formados por depoimentos dos protagonistas e demais que vivenciaram. Estão lá as opiniões e análises de Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Roberto Carlos (isso foi um feito dos diretores) e vários outros. Segundo Renato, as entrevistas foram gravadas no período de um mês entre dezembro e janeiro de 2008. “Só uma ou duas ficou para fevereiro por causa da agenda do artista. A do Caetano foi a última que a gente fez. Mas a Beth [Accoly, produtora] conseguiu organizar tudo num período de um mês, o que foi fundamental para o orçamento do filme. Porque aí você contrata todo mundo num período específico”. Todo o projeto levou de cinco a seis anos para ser realizado entre trabalho de pesquisa, levantar verba e realizar. “É um processo burocrático longo. Primeiro você tem que conseguir alguém que compre a idéia de dois diretores iniciantes”. A opção em retratar o III Festival da Música Popular Brasileira em específico é que, para eles, não houve outro que tenha conseguido repetir a qualidade musical. “Todos lembram e sabem cantar pelo menos as quatro primeiras colocadas até hoje. E Não seria injustiça alguma se qualquer uma delas tivesse vencido”. O que Renato coloca também foram as diversas discussões que aconteceram pouco antes e depois do festival. Em 1967, por exemplo, aconteceu a famosa passeata contra a guitarra elétrica conduzida pelos artistas da novíssima MPB. Elis Regina estava lá e era uma das vozes mais entusiasmadas da causa. Gilberto Gil também marcou presença “por causa de Elis”, como ele mesmo disse no documentário. Depois o próprio apareceu acompanhado dos Mutantes (nada mais rock'n'roll) para defender Domingo no Parque, umas das músicas catalisadoras do tropicalismo. “Você te divisões na música brasileira que surgiram a partir do festival de 67 e que repercutem até hoje”, defendeu Renato. Os diretores não colocaram registros de arquivo além dos próprios vídeos das apresentações. Se por um lado foi uma decisão em favor da coerência e compromisso com o formato, por outro deixa no ar uma sensação de que se poderia ter feito mais. A hora e quinze de duração passa muito rápido. Essa sensação é reforçada pelos extras do DVD. São informações formam um segundo filme com passagens igualmente interessantes e saborosas. Há dois capítulos que os artistas e personalidades falam de causos e outro muito legal com alguns dos torcedores que recordam algumas histórias. Ficou a impressão que isso poderia ser usado de alguma forma e que só traria benefícios. Mas ainda bem que foi um material aproveitado no DVD.


#53 fevereiro de 2011


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