Comunicação

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Jogo Tradicional como promotor do desenvolvimento sustentável dos territórios Elsa Fernandes

Resumo A satisfação das necessidades humanas continua, continuará a ser, o lema de todo o desenvolvimento – social, político, ambiental, económico. A sustentabilidade assenta no equilíbrio entre a satisfação das necessidades no presente, com a aprendizagem transmitida pelo passado e sem comprometer o futuro. O Jogo Tradicional na perspectiva cultural, desportiva, turística, económica, pedagógica, social vai de encontro ao conceito sistémico do desenvolvimento sustentado, localizando-se na intersecção da tríade – ambiente, sociopolítico, económico. Pretende esta comunicação focar a discussão na importância da identidade, da cultura, do ambiente, do conhecimento, da comunicação, da economia para uma evolução equilibrada dos territórios e propor alguns percursos/opções no sentido do respeito pela diferença, pela genuidade e pela unicidade, mas com os olhos postos na complementariede entre territórios – as suas gentes e a sua história. Esta comunicação orienta-se na perspectiva que o Jogo Tradicional é, deve ser, analisado enquanto meio de comunicação entre pessoas, transmitindo de valores e saberes; enquanto meio turístico que enriquece a oferta existente, distinguindo-a; enquanto ferramenta de animação, incrementando economicamente; enquanto promotor dos territórios, indo de encontro à evolução natural da sociedade. É fundamental enquadrar esta comunicação na óptica que o equilíbrio entre o passado, o presente e o futuro não se encerra na tradição, enquanto aspecto estanque do passado ou no desenvolvimento, enquanto elemento estanque do futuro. A tradição é transmissão e o desenvolvimento é crescimento. Juntos criam harmonia e equilíbrio no sistema do qual todos fazemos parte e permitem o progresso tão desejado. Palavras chave: Jogo Tradicional, desenvolvimento, sustentabilidade, territórios, turismo, cultura.

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Jogo Tradicional como promotor do desenvolvimento sustentável dos territórios Comunicação no âmbito das V Jornadas da História dos Jogos em Portugal que decorreu na Guarda em Setembro de 2016 Por Elsa Fernandes

O desenvolvimento sustentável tem sido de há uns anos a esta parte o chavão discursivo preferido de políticos, economicistas, ambientalistas, sociólogos... • a nível internacional as estruturas supranacionais têm vindo a discutir e definir estratégias que promovam o equilíbrio; • investigadores e académicos têm-se esforçado em criar teorias e conceitos que promovam o desenvolvimento sem comprometer, ainda mais, o futuro. No entanto, a inclusão de uma temática tão complexa no quotidiano tem sido difícil. E esta dificuldade nota-se quanto mais distante nos encontramos dos centros de decisão. O paradigma de desenvolvimento sustentável enfatiza dimensões como o crescimento económico; a erradicação da pobreza; a promoção da equidade e a inclusão social; a igualdade de género e étnica; a sustentabilidade ambiental; a participação política e os direitos humanos - consideradas factores determinantes para o aumento da qualidade de vida e garante para um futuro promissor. Estaremos todos de acordo quanto à importância do desenvolvimento sustentável para o bem estar do colectivo e todos recordamos, por certo, a sua premissa mais básica resumida no ponto de equilíbrio entre o crescimento económico, a equidade social e a proteção do ambiente. No entanto, a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural em 2002 recentra a questão do desenvolvimento sustentável, afirmando no seu artigo 1º a este respeito que: "Fonte de intercâmbios, de inovação e de criatividade, a diversidade cultural é, para o género humano, tão necessária como a diversidade biológica para a natureza.". E neste sentido a diversidade cultural “enquanto meio para alcançar a satisfação intelectual, emocional, moral e espiritual" passa a ser entendida como a quarta area política do desenvolvimento sustentável, a par com a sustentabilidade ambiental, económica e sociopolítica. E para fins desta reflexão é neste contexto que nos interessa entendê-la e focar o desenvolvimento sustentável. Porque para fins desta comunicação interessa-nos centrar na importância da identidade, da cultura, do ambiente, do conhecimento, da comunicação, da economia enquanto meios que concorrem para uma evolução equilibrada dos territórios e propor alguns 2/6


percursos no sentido do respeito pela diferença, pela genuidade e pela unicidade, mas com os olhos postos na complementaridade entre territórios – as suas gentes e a sua história. Orientamo-nos na perspectiva que o Jogo Tradicional é, deve ser, analisado enquanto meio de comunicação entre pessoas; • • • •

transmissor de valores e saberes; meio turístico que enriquece a oferta, distinguindo-a; ferramenta de animação, que incrementa economicamente as regiões; promotor dos territórios que vai de encontro à evolução natural da sociedade.

Um estudioso guardense afirma que “O jogo é um fenómeno universal, presente em todas as épocas e civilizações. A permanência do lúdico, ao longo do percurso histórico e civilizacional, no mundo das crianças, dos jovens e dos adultos, é um indicador da importância que, na sucessão dos séculos e milénios, lhe foi reconhecida.” Mas não chega enfatizar a importância do jogo tradicional. Temos a certeza que todos aqui presentes lhe reconhecem as múltiplas virtudes. É necessário enquadrar o jogo tradicional por forma a ser valorizado na ação quotidiana... • • •

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Socializando através da prática lúdica em recreios ou em ações de intergeracionalidade; Educando através da prática pedagógica em diversas disciplinas de diversos graus de ensino... mas também: Intervindo nos grupos e nas comunidades de forma participada e bilateral, possibilitando um turismo interativo, uma cultura vivida e um jogo pedagógico. Promovendo a vivência de locais e de ambientes, compartilhando conhecimento e experiências. Recuperando hábitos, tradições e valores e transforma-las em aspectos passíveis de incrementar os territórios.

Os últimos anos têm sido ricos em estudos dedicados ao Jogo Tradicional e no entanto continua-se a presenciar um distanciamento entre a sua prática e as gerações mais recentes. Talvez seja tempo de abrir novos caminhos de reflexão que permitam posicionar o Jogo Tradicional num patamar mais próximo das necessidades da sociedade atual. É fundamental encontrar o equilíbrio entre o passado, o presente e o futuro – a tradição não pode ser entendida como aspecto estanque do passado e o desenvolvimento não pode ser um elemento estanque do futuro. E é no entendimento deste equilíbrio que podemos contextualizar o Jogo Tradicional como recurso social, pedagógico, desportivo e também turístico e económico.

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Depois da ânsia da globalização, o novo milénio tem vindo a afirmar a importância das escalas locais e regionais. Tanto o sector público como privado tem tido a preocupação de encontrar especificidades das localidades e dos seus recursos que promovam uma distinção e resultem em vantagens competitivas. Valoriza-se a autenticidade, a diversidade, a adaptabilidade ou a estabilidade da identidade territorial. E esta valorização passou a ser o discurso mais ouvido em políticas de desenvolvimento local, sem no entanto se traduzir depois adequadamente na prática. No entanto sabemos que a identidade dos territórios confere singularidade e originalidade e derivado do nosso conhecimento de prática no terreno sabemos que os jogos tradicionais promovem essa identidade e potenciam-na criando mais-valias passíveis de serem contabilizadas de forma positiva para o desenvolvimento local. Há uns anos desenvolvemos um trabalho no âmbito de uma pós-graduação da UBI onde defendemos os Jogos Tradicionais como promotores do turismo cultural neste território da Beira Interior e, em especial, centrado na Guarda. Damos conta que os pressupostos da altura confluem para os pressupostos desta reflexão. Defendemos na altura os jogos tradicionais como recurso turístico e a existência de um Museu do Jogo e de um Observatório das Tradições que pudessem potenciar a região. Parece-nos pertinente recordar algumas propostas defendidas à época e que nos parecem ainda muito atuais. O Museu do Jogo Tradicional e um Observatório de Tradições, porque: • •

O jogo é uma componente muito importante na vida e na história dos povos. O contributo do jogo para o património cultural do País e em particular desta região é extremamente rico e importante para a compreensão do sentir e do viver de um povo. Limitações e dispersão de entidades que superintendem esta área têm dificultado a recolha e tratamento dos diversos acervos documentais pertencentes a entidades públicas e privadas, de molde a contribuírem de forma cativa para a compreensão da sociedade portuguesa em geral e do atividade lúdica e tradicional em particular; Criar uma rede de etnografia e cultura popular europeia através da escolha de outras localidades como a Guarda.

O Museu do Jogo Tradicional é uma pretensão de há muitos anos da Associação de Jogos Tradicionais da Guarda que nunca se concretizou por manifesta falta de envolvimento das instituições da região. A AJTG é uma associação sem fins lucrativos que não pode comprometer-se de forma isolada com uma estrutura deste género, no entanto tem provas dadas há mais de 37 anos das suas capacidades e dos seus conhecimentos para poder 4/6


impulsionar um Museu temático, assim as entidades públicas a apoiem e a promovam. Em complemento com o Museu do Jogo propunha-se, na altura, um Observatório das Tradições enquanto estrutura dedicada à investigação e ao desenvolvimento nas vertentes antropológica, social, desportiva, económica... oferecendo à comunidade um espaço de estudo aberto ao mundo académico e científico habitualmente carente por informação temática e credível. Atualmente continuamos a defender estes dois equipamentos que para além de necessários são potenciadores de dinâmicas sociais e económicas com impacto positivo a médio e longo prazo no território. De referir que já nos anos 60 se reivindicava um Museu Etnográfico das Beiras e um Museu do Artesanato Português, em pressupostos idênticos ao que se defende para um Museu do Jogo Tradicional. Dado tratarem-se de estruturas vivas que respondem aos anseios das comunidades e delas são o reflexo podem influenciar positivamente as mesmas, potenciando a autoestima, aumentando o reconhecimento da singularidade local e criando sentimentos de pertença, enfatizando desta forma a identidade do território. Em simultâneo ambas as estruturas concorrem para uma componente política e económica já que são certamente promotoras de uma oferta turística distinta e de um incremento das economias locais – postos de trabalho, recuperação e construção de materiais, investigação e desenvolvimento, formação em áreas específicas, etc. – indo de encontro a um cluster muito especializado. Por fim é de referir que é no empenho de algumas associações como a AJTG que tem sobrevivido o Jogo Tradicional e que é através delas que se continua a fomentar a sua prática. Temos a certeza que para se tornar um mecanismo promotor de desenvolvimento, o Jogo Tradicional terá que ser abraçado institucionalmente por outras entidades com poder para definir estratégias locais e regionais e que possam potenciar os jogos tradicionais como recurso económico e como promotor de desenvolvimento. A criação de estruturas guardiãs da história e dos costumes e dos valores não pode ser uma intenção exclusiva de uma entidade associativa. Ela tem que ser absorvida pelas comunidades formal e informalmente. E este tem sido o grande problema, dado que há décadas que o jogo tradicional tem sido empurrado de umas áreas para as outras e se de facto o jogo tradicional é transversal – desporto, cultura, saúde, educação,... – também é verdade que quem o promove e desenvolve necessita de obter respostas de entidades que sejam parceiras interessadas e conhecedoras. Guarda, Setembro 2016

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