Caderno de textos _ cap 01 _ Combate as opressões

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Combate às opressões

capítulo 01


Caderno de textos | CoNEA Brasília 2014

Combate às Opressões: uma análise geral

por Isabela Peccini

A vida em sociedade é uma lista de regras e padrões. Como agir, se relacionar, se vestir, ser. Quando um casal está prestes a ter um filho ou filha, a cor do quarto novo já está implicita: menino é azul e menina é rosa. Vamos crescendo e os presentes também já estão definidos: meninos gostam de carrinhos e futebol e meninas gostam de bonecas e brincar em casa. Os homens são, naturalmente, os mais fortes, mais ágeis e mais durões. As mulheres, mais frágeis, sentimentais e bobas. Os homens devem trabalhar para sustentar a família. As mulheres, cuidar da casa e do dia a dia. Uma família é constituída por pai, mãe, filhos e filhas. Nos olhamos no espelho e o ideal nunca está lá. Corpo magro, cabelo liso, loiro e longo, olhos claros e pele mais ainda: aí sim, chegaremos à perfeição. Todos esses e outros padrões não se tornaram padrões por acaso. Eles são frutos da naturalização da exclusão e opressão a parte dos indivíduos da nossa sociedade e foram construídos historicamente. Apesar de não serem duas coisas absolutamente dependentes, não se pode deixar de analisar uma relação direta entre o patriarcado e a constituição do capitalismo na nossa sociedade. Como analisa Engels em “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”, a partir do momento em que se estabelece a propriedade privada, se estabelece, também, o início da sociedade patriarcal. Nas sociedades anteriores, as relações eram mais livres, a descendência dos indíviduos era garantida pela mulher e não pelo homem e era ela o centro da família - que não era configurada por um homem e uma mulher e, sim, por homens e mulheres que se relacionavam e viviam juntos com seus filhos e filhas. A partir do momento em que a terra e tudo o que nela é produzido passa a ser uma propriedade privada, o homem passa a ser o responsável e dono dessa terra, precisando garantir a sua descendência para que sua propriedade se mantenha na família e, aí, o homem se torna o seu centro, exigindo fidelidade da mulher e a relegando ao trabalho mais “leve”. Essa configuração de família, torna-se, então, predominante e a propriedade privada se estende, com o tempo, à própria mulher sendo propriedade do homem e, sendo, esta relação

(homem-mulher), a única relação aceita entre os individuos. De forma semelhante, as relações intraraciais no nosso país sempre foram marcadas pelo conceito da propriedade privada. Negros e negras foram, por anos, considerados animais pensantes e propriedades de brancos, que os escravizavam. E, mesmo com séculos de luta por parte de escravos revoltosos, abolicionistas e pessoas organizadas contra o racismo, ainda vivemos em uma sociedade em que a população pobre é, em sua grande maioria, negra, em que as nossas universidades são, ainda, dominadas por brancos e em que o trabalho menos qualificado e reconhecido é, também, predominantemente negro. Toda essa construção social se reflete, hoje, em todas as escalas e espaços vividos por nós. É por essa ideologia que mulheres continuam sendo estupradas e culpadas por isso, que uma pessoa homossexual morre vítima de homofobia a cada 28 horas no Brasil, contando só os casos que são registrados, segundo levantamento do Grupo Gay da Bahia (GGB), que pessoas trans* são expulsas dos banheiros do gênero que se identificam e assediadas nos banheiros de seu gênero biológico, que negros e negras morrem todos os dias, criminalizados pela cor de sua pele - só citando alguns exemplos de opressões. E porque isso é uma construção social e que está enraizada nas nossas relações, essa opressão não deixa de acontecer nos espaços que construímos e organizamos, como os Encontros da FeNEA. Reproduzimos os assédios sofridos por mulheres todos os dias, quando estamos no bar e insistimos o beijo do “10% ou beijo”, quando tratamos o corpo da mulher como uma estratégia de venda, quando utilizamos palavras opressoras mesmo sendo uma “brincadeira”, quando amigos e amigas homossexuais são agredidos verbalmente ou fisicamente nos nossos espaços e quando temos minoria ou não temos pessoas trans* e negras nos mesmos. O combate às opressões está diretamente ligado à luta por liberdade e por respeito. Ao direito de ser quem se é, sem restrições, sem julgamentos, sem regras. A sair na rua sem medo e voltar em segurança. A organização é, portanto, ainda essencial para lutar contra todo o tipo de opressão na nossa sociedade. Os movimentos sociais feministas, LGBT e de negros e negras cumprem o papel da resistência. Afinal, mesmo mulheres podendo votar e trabalhar, negros e negras sen-


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do livres, pessoas LGBT tendo um mínimo de liberdade para serem quem são, ainda vivemos opressões cotidianas e naturalizadas na nossa sociedade que precisam ser diariamente combatidas. Essa luta é diária, coletiva mas, também, individual. O lugar de cada um na sociedade como ela se organiza hoje, faz o indívidio ter mais ou menos privilégios em relação aos outros. Ao privilegiado, é necessário perceber seus privilégios e, portanto, seu lugar de opressor, se enxergar como opressor e trabalhar na desconstrução de seus privilégios. Para realizar essa desconstrução é necessário entender como se dá e como é historicamente a construção da opressão na nossa sociedade, perceber que nunca “é uma brincadeira”, que muitas palavras ou expressões tem origens opressoras e reproduzí-las não é reproduzir um discurso vazio mas, sim, um discurso opressor em sua essência. É necessário perceber, também, como as opressões são transversais e as lutas precisam estar alinhadas. Não há como, por exemplo, lutar pela mulher, sem lutar pela mulher negra ou pela mulher trans ou pela mulher homossexual. Uma única pessoa sofre mais de uma opressão e todas elas devem ser combatidas. Essa luta é abrir espaço para quem é, na sociedade, silenciado pelo opressor e pelos padrões. Por isso, não há como se aprofundar no combate às opressões de uma forma geral sem olhar para cada uma delas de forma separada, sempre entendendo o quanto todas elas estão relacionadas e agindo a todo momento.

Feminismo, Militância e Autocuidado por Manuela Melo

A nós mulheres foi delegado o cuidado. O cuidado da casa, dos filhos e filhas, dos irmãos e irmãs, do marido, dos animais domésticos. O cuidado na profissão: somos maioria na enfermagem, no serviço social, na pedagogia. O cuidado (dos outros) perpassa nossa realidade desde muito cedo. Quando as mulheres brancas de classe média alta saíram de casa para “trabalhar” (como dizem, né, porque sabemos que em casa o que se faz é trabalho também), passaram a pagar (muito pouco) outras mulheres (muitas vezes negras e sempre pobres) para fazer o cuidado.

Com a casa, com filhos/as, animais. O cuidado pode ser menos rotina na vida de algumas mulheres que de outras, mas segue sendo uma atividade implacavelmente feminina, por conta do patriarcado e da divisão sexual do trabalho. As mulheres reivindicam há muitas décadas o espaço público. O espaço político, institucional, a participação e reconhecimento nos movimentos sociais, no trabalho, na mídia. Queremos, com razão, ocupar a rua, espaço historicamente masculino. A rua era deles, a casa, nossa — e digamos, nem isso, porque por séculos nos foi negado inclusive o direito de propriedade. Queremos o espaço público e por isso ainda hoje saímos às ruas para dizer: O corpo é meu, a cidade é nossa! Reivindicar o espaço público não é negar o privado. É negar, em verdade, a dicotomia público-privado, que só serve à desvalorização do chamado espaço privado, espaço destinado a nós historicamente. Faz tempo que se diz que o pessoal é político, isto é, o que se faz no “privado” tem conotações políticas, de opressão e dominação. E que o político é pessoal: as relações políticas precisam considerar as dimensões dos sentimentos, da emoção, da vivência subjetiva das pessoas. Não devemos negar o cuidado. O cuidado é essencial, e é por isso que o patriarcado o mantém tão intacto. Não há como viver sem cuidado. Não há porque viver sem cuidado. O cuidado nos fortalece para a luta. O cuidado faz parte da luta. Nesse sentido, se cuidar é uma tarefa militante. Vivemos em um mundo capitalista de fluxo de informações e pressão pela produtividade que nos oprime na dimensão subjetiva e objetiva e nos ameaça a saúde física e mental. As mulheres militantes, em geral, são responsáveis pelas atividades de cuidado da casa, dos/ as filhos/as, do seu trabalho fora de casa, da sua capacitação e educação (mais mulheres têm educação formal que homens, mas isso não se reflete na oferta de empregos para nós, então em geral nos capacitamos cada vez mais para tentar, sem sucesso, compensar essa diferença), e também das atividades militantes. Para além da tal dupla jornada de trabalho. Para muito além. As atividades militantes também envolvem cuidados. Cuidados com os companheiros e companheiras, com as populações oprimidas:


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com as mulheres vítimas de violência doméstica, com os drogadictos, com as mulheres que abortam; e o cuidado com o próprio funcionamento da atividade desenvolvida.

delos de produtividade e meritocracia em nossa atividade militante. Se não podemos ter lazer, amor, se não podemos nos cuidar, não é a nossa revolução.

Nessa tripla ou quádrupla jornada de trabalho e de cuidado, em que momento cuidamos de nós? Esquecemos de nossa saúde física e mental. De nosso lazer, de nosso crescimento pessoal, de nossa conexão com as pessoas. Acabamos, muitas, vezes, adoecendo fisicamente, ou em depressão, por dedicarmos nosso tempo ao externo e negarmos a nós mesmas o cuidado que também merecemos.

Mulheres, cuidem-se. O auto-cuidado é uma tarefa revolucionária!

Foucault dizia que não é preciso ser triste para ser militante, mesmo que a coisa que se combata seja abominável. Mas as coisas que combatemos são mesmo abomináveis. As pessoas morrem de fome, são estupradas, assassinadas por homofobia, não têm onde morar, são assassinadas pela polícia, são internadas contra a sua vontade — e a lista é infinita. Militar é se confrontar com o que há de pior no mundo, porque na práxis militante nós vamos aos poucos entendendo melhor como o mundo funciona e ele funciona abominavelmente. Militar é uma tarefa de resistência, porque somos reprimidos pelo estado, pela ideologia dominante, pela mídia, ….e a lista segue. Para resistir é preciso força. Para termos força é preciso cuidado. Já dizia a Gal Costa: é preciso estar atenta e forte. Como fazer para manter as esperanças, a vontade de viver e de mudar o mundo, quando todos os dias nos reprimem e machucam? É preciso cuidado. Cuidado individual e coletivo. O cuidado deve ser uma tarefa comunitária. Não há relação que seja meramente política. sua(seu) companheira(o) de militância deve te cuidar e você deve cuidar dele também, para que sigamos nos fortalecendo, resistindo e crescendo. Então, repito, cuidar é uma tarefa militante. E não achemos que o cuidado é egoísmo, perda de tempo, coisa de pequena burguesia; isso só faz reproduzir as estruturas patriarcais capitalistas de cuidado (as mulheres vão seguir cuidando dos outros e não de si) e nos enfraquece perante nossos adversários na luta social, que estão todos muito bem cuidados pelas mulheres que eles pagam para isso. Emma Goldman uma vez disse que “Se eu não posso dançar, não é a minha revolução”. E é essa a verdade. Não podemos reproduzir a lógica de trabalho capitalista que nos impõe mo-

A Luta contra o Racismo é um dever! por Rafael Cantuária

Um jogador de futebol negro xingado de macaco pela torcida do time rival; Um trabalhador negro desaparece após entrar em uma viatura da Polícia Militar em uma favela no RJ; O corpo de uma mulher negra é arrastado por uma viatura policial no Rio de Janeiro; Um jovem negro é acusado de roubo num shopping em Salvador. Essas coisas parecem casos distintos, mas estão interligadas, pelo racismo diário e institucionalizado em nosso país. Todos os dias em um país de maioria negra, para muitos, como o humorista Danilo Gentilli, o racismo não passa de uma piada, algo que é engraçado e faz rir, mas faz rir a quem? Talvez faça rir os torcedores do Grêmio que de forma vergonhosa insultaram o goleiro do Santos, talvez faça rir o Luciano Huck, que vendeu camisas de sua grife pessoal com a estampa “Somos todos macacos”, talvez faça rir os inúmeros brancos contrários as cotas raciais e até o Juiz do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que condenou Rafael Braga, único condenado por crime relacionado aos protestos de Junho de 2013, e que por coincidência ou não, é um jovem negro e morador de rua. Isso nos evidencia que o Brasil é um país racista, e ignorar esse fato é privilegiar os já privilegiados, àqueles que a todo custo buscam inferiorizar as pessoas socialmente por sua cor da pele. E em contrapartida ao crescimento dos efeitos do racismo em nosso país, a atuação da justiça parece se omitir diante dessas violações de direitos humanos. Para a justiça, Rafael é criminoso por portar duas garrafas de produto de limpeza, mas os policiais que arrastaram Cláudia e desapareceram com o corpo do Amarildo, não. E essa “absorção” por parte da justiça com os “novos capitães do mato” é rotineira, principalmente nas periferias. Quantos jovens negros


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são humilhados, agredidos e assinados em um ano nas mãos da PM e nada acontece? Mas esse fato não se prende só ao judiciário, está presente em todas as esferas da sociedade, desde as novelas branquicistas, aos brinquedos de crianças e o mercado de trabalho, onde os negros recebem bem menos que os brancos. Portanto, a luta contra o racismo é um dever. Assim como Mário Lúcio, conhecido como Aranha e o jovem negro acusado de roubo em Salvador, enfrentaram o racismo de forma radical e autônoma, denunciaram seus agressores e os colocaram em seus devidos lugares, todo cidadão consciente deve tomar para o si o dever de destruir o racismo. Zumbi e Dandara vivem em cada negro!

Linda. Como você é linda! por Vanessa Rodrigues

A partir de um relato pessoal, a autora propõe que revejamos a maneira como iniciamos nossas conversas com meninas, evitando as corriqueiras perguntas/comentários sobre a aparência física. Afinal, diz a autora, “ensinar as meninas que a aparência delas é a primeira coisa que se nota ensina a elas que o visual é mais importante do que qualquer outra coisa”. Assim, ela diz que tem se acostumado a perguntar sobre livros ou assuntos gerais que passam longe de vestidos, sapatos ou batons. Como todas as pessoas que compartilharam na época, li e acolhi esse artigo com entusiasmo. Achei um frescor. E passei mesmo a me policiar nos papos. Aliás, tenho que contar que simplesmente adoro conversar com meninas e elas costumam me adorar também. Temos química, sempre. E aí eu estava num aniversário e, dividindo a mesa com dois casais de amigos, citei esse texto e comentei sobre como estava agindo a partir de sua leitura. Os dois casais são brancos, mas um deles tem uma filha negra, adotada ainda bebê. E quando terminei de falar, minha amiga me respondeu, no ato: “Não com a minha filha! Te peço, Vanessa, que continue, sim, elogiando a aparência da Manoela*. Elogie seu sorriso, elogie suas roupas e

elogie, principalmente, seu cabelo. Porque ninguém o faz. Se num grupo de amigas ela é a única menina negra, ela é aquela que ninguém lembra de elogiar. Você é uma das poucas pessoas que sempre diz que ela é linda. Deixa que do resto eu cuido”. Confesso que fiquei muda na hora. Não tive o que responder e me senti envergonhada. Acho que me senti mesmo foi insensível, encantada pela literatura, mas incapaz de trazer aquilo para as nuances da vida real, da vida que forja meninas inseguras em busca por aceitação o tempo todo, mas que também nos aponta as falsas simetrias, que diz que os contextos são diferentes e que, por isso, nos exigem reflexões e comportamentos distintos. Da vida que diz que meninas que não têm o cabelo liso ou o nariz “afilado” não são belas default. Aliás, são quase invisíveis, na maioria das vezes só sendo vistas se for para criticar, pra constranger, pra diminuir. Claro que tem uma perspectiva totalmente metalinguística nisso. Porque é justamente o que o artigo aborda: do extremo destaque que damos à aparência de meninas e mulheres e do impacto disso em suas vidas. E, claro, a questão de fundo sempre será: mas, por que temos que ser bonitas? Quantos manifestos e artigos sobre o direito de sermos feias, de não sermos tratadas como enfeites do mundo ou como bibelôs já não escrevemos, divulgamos ou assinamos, convictas e ferozes? Afinal, mesmo as campanhas do “Desafio Sem Make” ou de “Belezas Fora do Padrão” (como o de mulheres gordas, por exemplo) sempre trazem o apelo da aceitação pela aparência física, mesmo que seja por meio de uma pretensa proposta transgressora e de não obviedade. Ao mesmo tempo, não consigo defender que elogiar a aparência de meninas negras seja um estímulo à futilidade ou tão somente a reiteração de um modelo que tanto queremos combater. Meninas que sofrem pelo racismo estrutural, que constantemente veem seus cabelos, sua cor de pele, seu nariz, sua boca, seu sorriso observados de maneira negativa, que veem sua autoestima mutilada, roubada, combalida por causa de um padrão eurocêntrico de beleza, precisam ser lembradas o tempo todo que também são bonitas.


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E, especialmente a partir desse episódio, em meu ativismo tenho me cobrado a necessidade de olhar o caso a caso mesmo. Adoro e aprendo muito com esses textos que me sacodem, me fazem pensar, me trazem propostas e me tiram da minha zona de conforto. Mas, realmente me esforço pra não perder minha conexão com a realidade, ao menos, aquela cotidiana, a que está ao meu alcance. Aquela que me lembra que elogio à aparência per se pode ser bastante empoderador e politicamente forte o suficiente para valer a pena iniciar uma conversa com uma menina de 11 anos. *O nome foi modificado para preservar a identidade da menina.

HOMOSSEXUALIDADE – DA OPRESSÃO À LIBERTAÇÃO por Hiro Okita

O ano de 1977 viu os universitários de São Paulo saírem às ruas gritando por “liberdades democráticas”. Um ano depois, uma greve no ABC pegava todo mundo de surpresa, lançando a classe trabalhadora novamente na cena política brasileira. O movimento negro subiu as escadas do Teatro Municipal para questionar um dos mais arraigados mitos brasileiros, o da inexistência do racismo no lado de cá do Equador. Grupos feministas se organizaram colocando em cheque a estrutura do machismo brasileiro. Em meio a essa efervescência toda, provocada pelos novos movimentos e pelos debates entre os novos grupos, surgiram também pequenos agrupamentos no Rio e em São Paulo, que colocavam em discussão o problema da sexualidade, e das restrições impostas aos homossexuais. Desde as primeiras reuniões semiclandestinas do primeiro grupo homossexual de São Paulo, em 1978, muita coisa aconteceu. 1980 marca a realização do I Encontro Brasileiro de Grupos Homossexuais Organizados e, em 1981, acontecem dois encontros regionais, um no nordeste e outro em São Paulo. Um ato público e uma passeata de quase mil pessoas, entre homossexuais, negros, feministas e travestis, realizados no inverno de 1980 contra a onda de repressão policial, transformaram o 13 de junho no Dia Nacional da Luta Homossexual. O texto que apresentamos é o produto da participação e da discussão de um grupo de ho-

mossexuais socialistas, que acompanha o movimento desde os seus primeiros passos. Surgiu da necessidade de se elaborar um estudo mais profundo acerca da nossa opinião, enquanto homossexuais, para melhor entender o processo da nossa libertação e a sua inter-relação com outros movimentos sociais que lutam contra a opressão e a exploração e pela transformação total da sociedade. Nos primeiros debates sobre o movimento homossexual levados nas universidades era quase inevitável que alguém se manifestasse para colocar se a luta homossexual não seria uma questão a ser resolvida depois da transformação política, econômica e social do sistema, que culminaria no desaparecimento do Estado. Implícita nessa colocação, no entanto, estava sempre a perspectiva de “solução” da questão homossexual através do afogamento dos homossexuais, que também desapareceriam. A esse tipo de questionamento seguiam-se, também inevitavelmente, frágeis contestações de algum grupo do movimento homossexual com suas invariáveis e acaloradas argumentações contra a esquerda, que não “serve para nada” e que “em Cuba, por exemplo, levaram os homossexuais para cortarem cana, depois da revolução”. O movimento homossexual, ainda segundo a frágil argumentação dos grupos que dirigiam esses debates, seria um novo fenômeno social de marginalizados ou minorias, que em seu conjunto formam a maioria da sociedade. Os homossexuais, ao lado das mulheres, dos negros, dos índios e ecologistas, formariam o cenário das lutas reivindicatórias dos anos 1980, à revelia e quase contra qualquer outro movimento político ou social que lutasse pela transformação do sistema. O balanço destes debates também aparecia como inevitável: as “lutas maiores” relegavam aos homossexuais o espaço de “luta menor” e, portanto, de pouca importância, ou pelo menos, de pouca importância imediata. Sobrava, então, o movimento homossexual prensado, por um lado, pela esquerda ortodoxa com sua moral burguesa, que ridicularizava o movimento e, por outro, pelos grupos de homossexuais que ignoravam qualquer discussão sobre uma possível combinação da luta homossexual no contexto da luta de todos os explorados e oprimidos. No mesmo ano de 1980 os


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debates dentro do próprio movimento homossexual começaram a tomar outros rumos. Preocupava ao movimento uma suposta postura oportunista das esquerdas brasileiras em relação à discussão homossexual. Essa preocupação leva todos os grupos do movimento homossexual a colocarem-se “contra qualquer tipo de poder” (menos o da ditadura militar!) e a senha para esses grupos passou a ser “autonomia”. Todos os homossexuais brasileiros, de todas as classes sociais e ideologias, independente de qualquer postura política, unidos em sua sexualidade e marginalização, caminharam juntos até o paraíso, se a esquerda não os desviasse de seu curso! Este nosso trabalho é uma tentativa de ampliar o debate dentro e fora do movimento homossexual, sobre a origem e a dinâmica da opressão aos homossexuais e o caminho para sua libertação. Não é um tratado do tipo Homossexualidade. Doença ou Normalidade, que um dos temas mais escolhidos para os trabalhos de fim de semestre nas escolas de Sociologia e Psicologia. Tampouco tem a pretensão de ser uma resposta a todos os trabalhos pseudo científicos ou de psicologia popular que poluíram o espaço da literatura sobre a homossexualidade nos últimos cinquenta anos. Analisamos a homossexualidade enquanto uma variação do comportamento sexual, que se remete a todas as sociedades, épocas, culturas e classes sociais. O nosso trabalho é uma tentativa de analisar a questão da discriminação e opressão aos homossexuais no seu contexto histórico-social. A partir dessa análise, apontar perspectivas para a sua libertação, sobre a base da transformação radical da atual sociedade, no caminho de uma sociedade sem classes. APONTAMENTOS DA EVOLUÇÃO NO BRASIL Pode-se dizer que o movimento homossexual não aconteceu no Brasil enquanto não aconteceram os movimentos de juventude, que a partir dos anos 1960 viriam a questionar todos os valores da sociedade burguesa, como reflexo dos movimentos europeu e norte-americano, que pelo próprio caráter de suas contestações impulsionaram o movimento homossexual em nível mundial. O reflexo desse movimento mundial no Brasil foi a radicalização do movimento estudantil, que se tornaria ponta de lança no en-

frentamento com a ditadura. Em nível cultural, toda essa mobilização vai se refletir no surgimento do movimento tropicalista, que traz para o campo das artes, e principalmente o da música, toda a gama de contestações ao sistema. As palavras de Caetano Veloso, “É proibido proibir”, não só refletiram todo conteúdo contestatório do movimento estudantil, violentamente reprimido, como também apontava uma revolta contra toda higidez moral da sociedade brasileira. Todo espaço estava preparado para que surgisse o movimento homossexual no Brasil. No entanto, todo o aparato repressor desencadeado pelo sistema, como a censura, a lei de imprensa, o AI-5, a proibição de qualquer organização de cunho político, foram limitando esse espaço até abafá-lo. No entanto, durante a época do milagre brasileiro, a juventude continuava solapando a moral rígida da sociedade brasileira, num questionamento dos valores impostos sobre sexualidade, casamento, família e modo de vida. A partir de 1975, com a crescente deterioração do já falido milagre, começa a abrir-se um espaço para aprofundamento dessas discussões e críticas do sistema. O movimento homossexual, então, vai assumir o espaço que lhe foi roubado pela repressão no fim dos anos 1960. O primeiro passo é dado em 1976 por um grupo de homossexuais masculinos, em São Paulo, que tenta se organizar para discutir sua sexualidade e reagir à repressão ao homossexual. Esse grupo não conseguiu avançar. Desfazendo-se pouco depois. No fim de 1977, a vinda de Winston Leyland, editor da revista americana Gay Sunshine, para coletar no Brasil e no resto da América Latina material literário de autores homossexuais, desencadeou o processo de movimentação dos homossexuais. Leyland recebeu mais notoriedade do que se esperava por parte da grande imprensa, e a visita dele provocou uma série de reuniões de um grupo de escritores, jornalistas e intelectuais, que resolvem editar o jornal Lampião da Esquina. Este jornal alternativo propõe-se a discutir, além da questão homossexual, também o feminismo, a luta contra o racismo e o movimento em defesa do índio. Nesta época de “meia-abertura” a revista Isto é dedicava uma capa e extensa matéria ao tema do “homossexualismo”, sendo por isso ameaçada de processo pela Lei de Imprensa; também o jornalista Celso Cury, do jornal Última


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Hora, por ter publicado em sua coluna várias matérias sobre “homossexualismo”, foi vítima da mesma Lei. Por esta ocasião, o governo pretendia acabar com toda a imprensa alternativa, por vias indiretas, ou seja, pela fiscalização e pressão. Dentre as publicações indicadas no relatório do Centro de Inteligência do Exército, como alvo deste plano de governo, encontrava-se o jornal Lampião, que segundo o relatório, dispunha-se “a defender as atitudes homossexuais como atos normais da vida humana” (!). O governo abriu inquérito contra os editores do jornal, baseado na Lei de Imprensa, alegando um “atentado à moral e aos bons costumes”.

semi-autonomia dentro do grupo, para poderem colocar as suas questões específicas. Surge, então, dentro do Somos, o grupo Lésbico-feminista, que vai desenvolver todo um trabalho com o movimento feminista e que em maio de 1980 se desligaria da totalidade do grupo.

Ao mesmo tempo em que o Lampião surgia, começaram a aparecer grupos homossexuais baseados na experiência vivencial de seus integrantes, como, por exemplo, o grupo que se autodenominava Núcleo de Ação pelos Direitos do Homossexual, que através da consciência individual procurava criar uma identidade enquanto grupo de homossexuais.

Em fins de 1979, há três grupos em São Paulo e começam a surgir grupos no Rio e em outras cidades. O Lampião chama, então, estes grupos ao Rio de Janeiro, para organizarem o I Encontro Brasileiro de Grupos Homossexuais, que seria realizado em São Paulo, durante a Semana Santa de 1980.

Além de discussões internas sobre homossexualidade, o grupo fez uma denúncia do jornal Notícias Populares, órgão reconhecidamente anti-homossexual dentro da imprensa paulista. No começo de 1979, com o nome “Somos – Grupo de Afirmação Homossexual”, participava de debates na USP sobre “mostras”, que estimulariam a formação de outros grupos na Grande São Paulo. O Grupo Somos cresce muito neste período, e uma das primeiras atividades externas foi a formação de um comitê em defesa do jornal Lampião, quando do processo que este sofria pelos órgãos de segurança. O Somos fez circular um abaixo-assinado nos meios artísticos e intelectuais pela causa do jornal (o mesmo jornal que três anos depois de sua criação, distante das feministas, do negro, do movimento em defesa do índio e do proletário, colocou-se contra a mobilização do próprio movimento homossexual, criticando setores e grupos mais ativos do movimento, acabando por fazê-lo retroceder no seu ascenso, dividindo os grupos e boicotando os informes da luta). O ano de 1979 marcou a participação das mulheres no grupo Somos, que passaram a se organizar dentro do grupo, enfrentando barreiras de machismo entre os homossexuais masculinos. A discussão surgida em torno da questão do machismo levou as lésbicas a organizarem-se com uma

A primeira participação do Somos em mobilizações, como grupo de homossexuais, foi no 20 de novembro de 1979, na comemoração do dia de Zumbi, promovida pelo Movimento Negro Unificado, quando portou uma faixa contra a discriminação racial, assinada “Somos – Grupo de Afirmação Homossexual”.

O I Encontro foi fechado aos grupos nos dois primeiros dias, tendo no terceiro dia uma plenária aberta ao público, com mais de 800 participantes. Na abertura da plenária, foi lida uma moção de apoio aos metalúrgicos do ABC, em plena greve, tendo sido muito aplaudida. A discussão da relação do movimento homossexual com outros setores oprimidos e explorados, ocupou grande parte dos dois dias anteriores, e acabaria por tumultuar a plenária diversas vezes. Uma proposta de participação no Primeiro de Maio foi levada à votação, perdendo por um voto. Foi um divisor de águas dentro do movimento homossexual, enquanto questionava os rumos que o movimento tomaria. Logo depois do Encontro a discussão sobre a participação no Primeiro de Maio polarizou o Grupo Somos, que não conseguiu chegar a um consenso sobre uma atuação unitária no Dia do Trabalhador. Formou-se, então, uma comissão de homossexuais pró-Primeiro de Maio para organizar o primeiro contato do movimento homossexual com os trabalhadores do ABC. Havia uma certa apreensão em relação à reação dos operários a essa atuação inédita na história do país, mas quando os cinquenta homossexuais (homens e mulheres) entraram no Estádio de Vila Euclides, a reação dos cem mil operários ali reunidos foi das mais inesperadas. Aplaudiram vivamente o grupo que portava duas faixas: “Contra a intervenção nos sindicatos” e “Contra


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a discriminação do trabalhador(a) homossexual”. Enquanto isso, os membros do Somos que se opuseram à participação no ABC faziam um piquenique no Zoológico. A polarização do grupo não se restringiu às discussões sobre o Primeiro de Maio. Nas reuniões que se seguiram, deu-se início a uma verdadeira “caça às bruxas”, dirigida a certos ativistas acusados de serem membros da Convergência Socialista, que teriam se infiltrado no grupo para levar o movimento homossexual a lutas que nada tinham a ver com a questão homossexual. Os elementos do Somos que sustentavam as acusações, ao invés de levarem uma discussão interna sobre a questão, retiraram-se do grupo. Em fins de maio de 1980, culminando numa sutil campanha moralista na imprensa, é desencadeada em São Paulo a operação Rondão, encaminhada pelo delegado Wilson Richetti, que através de prisões arbitrárias impõe o terror ao gueto homossexual, prendendo travestis, homossexuais, lésbicas, prostitutas e desempregados. Os grupos, mesmo divididos pelas questões ideológicas, organizaram junto com o Movimento Negro Unificado e grupos feministas uma série de atividades contra a onda de repressão policial, culminando com um ato público nas escadas do Teatro Municipal no dia 13 de junho. Quase quinhentas pessoas se acercaram do autofalante ali instalado, saindo logo após numa passeata pelas principais ruas do gueto homossexual masculino. Gritando palavras de ordem como “Abaixo a repressão, mais amor e mais tesão”, a passeata foi engrossada no caminho, terminando na boca do lixo com aproximadamente mil pessoas. Depois dessa manifestação contra a violência, o Movimento Homossexual entrou num processo de desaceleração, voltando-se para dentro, repensando suas posições. Pode-se dizer que ele está entrando definitivamente na sua maturidade. Três anos depois do início do movimento os grupos ainda parecem estar num processo de perplexidade quanto aos rumos de atuação. Não chegaram a um acordo sobre o II Encontro Brasileiro de Grupos Homossexuais, que deveria se realizar no Rio, em abril de 1981; mal conseguiram dar uma resposta à onda de repressão às lésbicas que ocorreu em São Paulo

em novembro de 1980. Essa inatividade é reflexo, principalmente, das diferenças ideológicas. Mas não significa, absolutamente, a estagnação. Prova disso foi o Encontro Regional, realizado na USP em abril de 1981, onde, superando essas diferenças, os grupos paulistas optaram pela unidade de ação, atuando juntos contra a repressão e a discriminação. Nesse Encontro Regional, foi tirado um ato comemorativo em 13 de junho, quando houve a mobilização contra Richetti e a repressão policial. Esta data está sendo proposta como Dia Nacional da Luta Homossexual. No Nordeste, realizou-se também um encontro regional para discutir as atividades em comum entre os vários grupos que surgiram no último ano e meio. Às vésperas do Primeiro de Maio deste ano, formou-se o grupo de militantes homossexuais, construindo o PT, Partido dos Trabalhadores, que, além de ter participado do Dia do Trabalhador no ABC, tem uma proposta de levar a discussão da homossexualidade à classe trabalhadora, através do Partido dos Trabalhadores. Esse projeto de trabalho dentro de um partido político, proposto por militantes de vários grupos homossexuais, pôde abrir um novo espaço de atuação para os homossexuais, num terreno privilegiado, por tratar-se de um partido de trabalhadores – único setor social cujos interesses coincidem com a necessidade de transformação radical da sociedade, caminho da libertação definitiva dos homossexuais.

Azul (não) é cor de menino, rosa (não) é cor de menina por Maria Clara Araújo

Durante toda gestação de minha mãe biológica fui tratada como menina. Em meu quarto pintado de rosa, da futura família adotiva, tudo estava preparado para uma pequena garota que começaria, assim que saísse daquele ventre, a cumprir o papel que as pessoas achavam que eu ia cumprir simplesmente por ter uma vagina, sem nem saber se eu seria de fato uma mulher. Bonecas, brincos, pequenas sapatilhas, tudo já tinha sido comprado. Tudo estava pavimentado para a chegada de uma nova e pequena mulher na sociedade. Até que nasci. Com um pênis.


Caderno de textos | CoNEA Brasília 2014

Espanto! “Mas não era mulher?” Disse minha tia. “Será que ela ainda irá querer?” Perguntou a enfermeira “Óbvio que irei querer.” Afirmou minha mãe adotiva. “Mas vamos ter que mudar todo o quarto.” Eu era só uma criança. Uma pequena criança que tinha acabado de ser rejeitada por sua mãe biológica, mas que já tinha um lar definido em outro lugar. Um lar que tinha quarto “de menina” me esperando, afinal até ali eu era reconhecida dessa forma. Quando meu órgão genital foi identificado eu passei a virar menino aos olhos da minha família. Esperavam de mim que eu me comportasse “como homem” (como se isso existisse) simplesmente por ter um pênis, novamente sem nem saber se eu era homem ou mulher, afinal gênero não está necessariamente ligado à genitália. Já meu quarto passou a ser azul. Ganhou carrinhos e perdeu sapatilhas, que foram trocadas por pequenos sapatinhos. A partir daquele momento, passei a viver como homem. Vivi 16 anos daquela maneira. Mas sou mulher. É preciso que vocês saibam o que é o sistema chamado de binário, aquele que nos divide em duas castas: homem e mulher. E diz que nós só podemos pertencer a algum destes dois gêneros, o que sabemos que não é verdade, porque existem também as pessoas trans não-binárias. Esses dois gêneros (homem/mulher) carregam consigo valores e padrões que irão ser socialmente disseminados desde muito cedo. Quando nos educam, ditam direções para cada um deles e sempre ressaltam que tais coisas são para um e outras são para o outro. Durante o período que vivi sendo lida como garoto, me deparei inúmeras vezes com a frustração de pessoas ao meu redor por eu não suprir as expectativas deles. Faltava-me todos os estereótipos que se esperam de um homem: virilidade, amor pelo futebol, apego aos brinquedos ditos como masculino como carro, pipa e afins. Toda aquela imposição não tinha nada a ver comigo. Não me enchia os olhos. Eram a expectativa DOS OUTROS sobre mim, mas não o que EU desejava para minha vida. O que me atraia, o que eu gostava. Ainda quando criança cheguei a me apegar pela cor rosa, a cor socialmente dita como de meninas, e por isso sofri repressão. Repressão porque para um homem, o ser viril, usar rosa

parece o diminuir perante os outros. Usar rosa o vende como menos homem do que os outros. Porque as pessoas pensam que ser mulher é ser menor do que um homem, e portanto gostar de rosa é motivo de vergonha. Lembrando que muito se acredita que isso é influência da época nazista, onde homossexuais tinham um triângulo rosa em suas fardas. Mas existe mais homem ou menos homem? Qual é a necessidade disso? E o que conceitua o que é ser homem em nossa sociedade? O mais engraçado de toda essa minha relação conturbada com as expectativas dos outros é que eu também não supro as expectativas do que é ser uma mulher (numa visão machista, é claro) quando não sou delicada, não me interesso em afazeres domésticos e não me sinto obrigada a estar sempre maquiada, depilada, deslumbrante. Ouço bastante de minha mãe que “se você é mulher, por que está saindo dessa maneira?” ou “mulher gosta de cuidar da casa e você não lava nem um prato”. Ou seja, não entro em nenhuma das caixinhas que a sociedade dita como “de homem” ou “de mulher”. Não segui nenhum dos padrões, não me vi em nenhuma das normativas. Se isso me deslegitima? Pra mim, não. Acredito que gênero é muito mais do que ”se não fizer/usar aquilo, não é isso”. Gênero é o que eu sou. Como eu me vejo. Não molduras pré-estabelecidas e normativas. Aliás, fujo das normativas. Transgredir sempre foi algo comum em minha vida e continuarei fazendo isso.


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