Revista Estilo Zaffari - Edição 29

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A n o 6 N 0 2 9 R $ 3, 50

Imensidão OS ALIMENTOS SAGRADOS DA CULINÁRIA JUDAICA CINCO SOBREMESAS CAMPEÃS DE AUDIÊNCIA

azul A PATAGÔNIA É INACREDITÁVEL!



NOTA

DO

EDITOR

Celebrando a vida Você já foi à Patagônia? Não? Então vá! A Patagônia é muito mais que uma viagem, é uma oportunidade de transcendência. Na verdade, é quase uma lavagem cerebral. De tão lindo, esse lugar não parece de verdade. E lá, nos confins do continente americano, apreciando a grandiloqüência daquela natureza, você vai se dar conta de uma série de coisas que a vida cotidiana, urbana e veloz, não nos permite perceber. Tem gente que se encontra na Patagônia, tem gente que se perde de vez. De qualquer forma, é uma experiência transformadora. Não é à toa que esse lugar ímpar e indescritível está na capa da Estilo Zaffari. Encare isso como uma dica de amigo, ok? Esta edição tem também uma homenagem à comunidade judaica do Rio Grande do Sul, pelo aniversário de 100 anos da imigração. Nossa colaboradora Beatriz Karam Guimarães escreveu um texto que fala da intensa relação dos judeus com a cultura, especialmente com os livros. Aliás, você sabia que a criação da maravilhosa Feira do Livro de Porto Alegre teve o toque de um judeu chamado Maurício Rosemblat? Leia o texto da Bia e depois vá para a cozinha testar os pratos tradicionais da culinária judaica, que “roubamos” do livro de receitas de uma família de amigos judeus, os Chwartzmann. O livro é um tesouro de família e guarda os sabores da infância de quatro meninas, chamadas Lilian, Clarice, Flávia e Luciana. Já que estamos falando em amigos, família, infância, aproveite para enfiar o pé na jaca feito criança e se deliciar com as “Sobremesas campeãs de audiência”. Escolhemos cinco dos doces mais pedidos nas casas e restaurantes brasileiros e revelamos as suas receitas. Quer mais uma dica? Esqueça a dieta. Preciso admitir, aliás, que esta edição da Estilo Zaffari vai abalar o autocontrole de qualquer um, ainda que seja um ferrenho vigilante do peso. Preparamos uma matéria sobre degustação de azeites, pra você repetir em casa com os amigos. É um programa e tanto, regado a vinhos e complementado com pães e queijos especiais. Superdiet. Pra terminar, entrevistamos o superstar da gastronomia nacional: Alex Atala. Conhecido por enfeitiçar paladares com suas receitas, Alex é um experimentador, um alquimista, um aventureiro da culinária. E tem mais: ele é uma delícia. Bon appétit!


Milene Leal milene@contextomkt.com.br

EDITORA E DIRETORA DE REDAÇÃO REDAÇÃO Beatriz Guimarães, Fernanda Doering, Luciana Stein, Paula Taitelbaum, Rafael Beck, Rejane Wilke

REVISÃO Flávio Dotti Cesa PROJETO GRÁFICO Odyr Bernardi DIREÇÃO E EDIÇÃO DE ARTE Luciane Trindade luciane@contextomkt.com.br ILUSTRAÇÕES Nik FOTOGRAFIA Angela Farias, Cris Berger, Cristiano Sant’Anna, Letícia Remião PRODUÇÃO DE ALIMENTOS Jorge Nascimento COLUNISTAS Fernando Lokschin, Luís Augusto Fischer, Martha Medeiros, Malu Coelho, Ruza Amon, Tetê Pacheco

EDITORA RESPONSÁVEL Milene Leal (7036/30/42 RS) COLABORADORES Ana Paula Amodeo Elbling, Dóris Grossman, Marcelo Capra, Marco Aurélio Merguizzo, Vitor Knijnik, Ponto de Antiguidades, Livraria Cultura

Izabella Boaz izabella@contextomkt.com.br

DIRETORA DE ATENDIMENTO PUBLICIDADE HRM Representações (51) 3231.6287 9983.7169 9987.3165 rosamaggioni@hrmmultimidia.com.br

DEPTO. DE ATENÇÃO AO LEITOR Renata Xavier Soares renata@contextomkt.com.br A revista Estilo Zaffari é uma publicação bimestral da Contexto Marketing Editorial Ltda., sob licença da Companhia Zaffari Comércio e Indústria. Distribuição exclusiva nas lojas da rede Zaffari e Bourbon. Estilo Zaffari não publica matéria editorial paga e não é responsável por opiniões ou conceitos emitidos em entrevistas, artigos e colunas assinadas. É vedada a reprodução total ou parcial do conteúdo desta revista sem prévia autorização e sem citação da fonte.

TIRAGEM 25.000 exemplares PRÉ-IMPRESSÃO Maredi IMPRESSÃO Pallotti

ENDEREÇO DA REDAÇÃO Rua Padre Chagas, 185/801– Porto Alegre/RS – Brasil – 90570-080 (51) 3395.2515 (51) 3395.2404 (51) 3395.1781 estilozaffari@contextomkt.com.br

CAPA: FOTO DO PARQUE TORRES DEL PAINE, NA PATAGÔNIA CHILENA, POR CRIS BERGER



Correio QUEREMOS AGULHAS Oi, pessoal da Estilo Zaffari! Parabéns! A revista está cada vez melhor. Lendo a reportagem da Paula Taitelbaum (p. 83) sobre acupuntura, revigorei a vontade de utilizar-me dessa antiga técnica. Haveria condição de me ser fornecido o telefone – ou endereço – do Sr. Miyai? No aguardo de uma resposta, abraços fraternos a toda a equipe. MARIA LORENI CARGNELUTTI

ELOGIOS SAGRADOS Parabéns pela edição de agosto! A cada exemplar me encanto mais e mais com a qualidade dessa revista. A reportagem “Gloriosa Veneza” está belíssima! Digna de grandes publicações! Parabéns ao Nik, que ao visitar Veneza conseguiu ilustrar tudo com tamanha precisão! Vocês estão de parabéns! Um grande abraço e sigam em frente! Nós, mortais, agradecemos! IARA MIGUEL DE CAMARGO

Prezada Iara, ficamos encantados com o seu e-mail, que faz elogios maravilhosos à Estilo Zaffari. Transmitimos ao Nik as considerações sobre a matéria de Veneza, e ele também adorou os elogios. Depois de mensagens como a sua, é ainda mais estimulante seguir em frente e realizar o nosso trabalho. Obrigado, um grande abraço.

PURO DELEITE Prezados amigos Sou leitor assíduo da sua revista e gostaria de agradecer pelo prazer que ela proporciona. O texto consistente e charmoso conquista o leitor pelo deleite proporcionado. Visitarei cada cafeteria mencionada e com certeza não me arrependerei. Cordialmente, MAURÍCIO ZANATTA ADIX FOMENTO MERCANTIL LTDA.

Maurício, nossos redatores adoraram a expressão “texto consistente e charmoso”. É um elogio e tanto! Se nossas matérias conseguem combinar qualidade em forma e em conteúdo, estamos no caminho certo. Obrigado, abraço!

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Olá, Maria! Claro que podemos fornecer o contato do Sr. Miyai! Ligue para 3332-1791 e aproveite todos as benesses descritas pela Paula naquela reportagem. É uma alegria para a autora e para nós sabermos que a matéria foi o impulso que faltava! Abraços.

ENCANTAMENTO Realmente ADORAMOS o material que vocês publicaram sobre a Pousada Colonial De Rossi, de Antônio Prado. Os De Rossi estão muito felizes e já receberam inúmeras ligações de leitores da Estilo Zaffari. Muito obrigado! Também queremos parabenizar a revista pelos assuntos e qualidade fotográfica das matérias. Estamos colecionando as revistas! Na última edição, ficamos ENCANTADOS com as ilustrações do NIK, em especial na matéria sobre Veneza. Gostaríamos de sugerir que a revista fizesse uma promoção e sorteasse uma daquelas ilustrações originais. Seria uma honra ter uma delas em casa. Se isso ocorrer, queremos participar da promoção. Um abração. JAQUE E SANDRO CLAMER GUIA COMUNICAÇÃO, CAXIAS DO SUL

Prezados amigos, foi com prazer que publicamos na seção Cesta Básica a dica sobre a Pousada De Rossi. A revista só recomenda lugares que conhece e aprova, então, é uma satisfação saber que a matéria gerou bons contatos para a família De Rossi. Sobre o Nik, concordamos em gênero, número e grau com a avaliação de vocês! O trabalho dele tem sido realmente sensacional, e a idéia de premiar os leitores com um original das ilustrações foi sugerida também por outras pessoas. Nós vamos pensar com muito carinho nessa sugestão, ok? Abraços.


VIAJANDO CONOSCO

FLUTUANDO Bom dia! Não poderia deixar de elogiar a revista (e todos os seus colaboradores!), que está a cada edição mais surpreendente. Cheguei à conclusão de que sempre que leio a Estilo fico um pouco mais feliz, um pouco mais “leve”. Muito obrigada... e parabéns!Um abraço. RENATA VASCONCELLOS MARTINS

Prezada Renata, é uma grande alegria receber mensagens como a sua. Esperamos surpreendê-la sempre, proporcionando uma leitura agradável, informativa e, sem dúvida, leve. A Estilo Zaffari é uma revista feliz! Um abraço e continue escrevendo pra nós, ok?

Dia desses, eu estava sentada em minha sala no escritório e passei os olhos na Estilo de agosto. Faltava ler a reportagem sobre a Guatemala. Naquele dia frio, céu cinzento, era do que eu precisava para me alegrar e me emocionar. A repórter elaborou uma deliciosa matéria, e conseguiu que os leitores, de alguma forma, fizessem um pouco da viagem com ela. Olhando algumas fotos, pensei comigo: – Eu gostaria de viver mil vidas! Porque há muito mais coisas e lugares belos nesse mundo do que podemos apreciar em uma única existência. Agradeço à Estilo, sempre rica em matérias legais, por ter me levado à Guatemala em um dia frio de Porto Alegre... Abraços e sucesso. ANA BEUST PORTO

Querida Ana: Tivemos o privilégio de ler sua carta no dia do fechamento desta edição da Estilo Zaffari. Estávamos – eu, Luciane Trindade e Izabella Boaz – conversando sobre os últimos ajustes na revista, quando chegou esse carinho em forma de carta. Pena que Cris Berger, a autora da reportagem sobre a Guatemala, não estivesse conosco para viver a emoção que seu texto proporcionou. Obrigada pelo gesto de apoio e apreço, que tanta falta faz às pessoas hoje em dia! Um grande abraço, Milene Leal

CONFISSÃO Com tantos meios de comunicação, tanta notícia, tanto spam, um homem de certa idade sente-se confuso e meio duro para certas magias. Eis que a simplicidade me pegou de assalto, o estilo e a elegância me reportaram aos instintos aventureiros que só a juventude tem o condão de tornar possíveis. Eu fui até lá, subi a pirâmide e tudo mais, quase ralei meu joelho na escada... Meus parabéns. MÁRIO LÚCIO

Mário, transmitimos à autora da reportagem sobre a Guatemala, Cris Berger, os seus amáveis elogios. Assim como nós, ela adorou saber que a matéria inspirou sua “viagem” e suas aventuras. Obrigado por seu lindo e-mail e continue nos prestigiando, por favor!

MÃE CORUJA Não poderia ser melhor a reportagem sobre o Txai Resort – Itacaré, BA. Além da capacidade de descrever as belezas do lugar, vocês deixaram uma mãe completamente encantada com tudo o que leu sobre o filho, no caso, o chef Paulo Martins. Parabéns e obrigada! NEUSA GUILHERME

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Cotidiano MARTHA MEDEIR OS

SOMENTE O NECESSÁRIO O supérfluo me diverte, mas não me tem como refém Para ser bem do contra, o clássico da Disney de que eu mais gostava na infância não tinha princesa nem fada: era Mogli, o menino lobo. E a minha parte preferida do filme era quando o urso Balu cantava “Eu uso o necessário/somente o necessário/o extraordinário é demais/o necessário/somente o necessário/por isso é que essa vida eu vivo em paz”. As únicas coisas realmente importantes são as que acontecem por meio da necessidade. Só o que é verdadeiramente necessário se torna legítimo. Eu era uma criança e já começava a entender a diferença entre o dispensável e o vital. A vida é longa e o supérfluo é importante para preencher os dias. Quase tudo é supérfluo, de quase tudo nós poderíamos abrir mão e ainda assim ter uma vida plena. Só que não nos agrada uma vida franciscana, e tampouco queremos nos sentir saciados apenas por comida e afeto. Inventamos de querer mais, de ter mais, de subir na vida, seja lá o que isso signifique. E então criamos metas audaciosas, incrementamos nossos sonhos e abrimos as portas para o desnecessário. Quando alguém diz que tudo o que precisa é de um amor e uma cabana, não está se iludindo. É mesmo tudo de que precisamos, mas que alegria inenarrável ver aquele caminhão de mudanças trazendo pra cabana uma televisão de plasma e um aparelho de DVD acompanhado de toda a filmografia de Hitchcock, Truffaut e Woody Allen. E centenas de CDs. E roupas, livros e um computador. Conectado à internet. E hidratantes, maquiagem e um secador de cabe-

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los. E um descascador de alho, uma centrífuga, uma furadeira, um George Foreman Grill, um lençol elétrico e um celular. Pronto, agora só falta a máquina fotográfica digital para você registrar como está feliz. Necessidade a gente tem de ser compreendido, e por isso fazemos amigos. De descansarmos o corpo e as idéias, e por isso dormimos. De dar e receber carinho e prazer, e por isso o sexo. De meditarmos, de sermos humildes, de acreditarmos em algo maior que nós, e por isso Deus. De entendermos a nós mesmos e aos outros por meio de uma linguagem mais subjetiva e emocional, e por isso a arte. De respirarmos, e por isso a natureza. Eu tenho um monte de parafernália em casa – menos o George Foreman Grill –, mas não esqueço nem por um minuto o urso Balu cantando sua fórmula de viver em paz. Dificilmente alguém vai me ouvir dizendo coisas como “não vivo sem uma batedeira Topa Tudo, não vivo sem um carro esporte com air bag, não vivo sem um aplicador de cílios postiços”. Eu não vivo é sem amigos, amor, comida, sono, sexo, natureza, espiritualidade e arte. O resto me diverte e facilita meus dias, mas não me tem como refém. Aprendi não com os contos de fada tradicionais, mas com as histórias de um menino que vivia no mato e era feliz. O mato eu dispenso, mas felicidade é comigo mesmo. Somente o necessário. O extraordinário é demais. MARTHA MEDEIROS É ESCRITORA


Cesta básica NESTA SEÇÃO VOCÊ ENCONTRA DICAS E SUGESTÕES PARA CURTIR O DIA-A-DIA E SE DIVERTIR DE VERDADE: MÚSICA, CINEMA, LUGARES, COMIDINHAS, OBJETOS ESPECIAIS, PASSEIOS, COMPRAS. BOM PROVEITO

Elis & Tom Em 1974, Elis completava 10 anos de sucesso dentro da Philips. Os executivos da gravadora resolveram então presenteá-la. O que você quer, Elis? Carro? Viagem? Dinheiro? Nada disso. Elis quis dar um presente para o mundo. Pediu para gravar um disco com Tom Jobim, que na época morava nos EUA. Tom topou o projeto, mas ficou apreensivo de trabalhar com uma cantora que não era de sua geração e que fazia um som já mais eletrificado. Elis, por sua vez, ficou insegura de trabalhar com um ídolo. Pra completar, ela levou para os EUA o seu próprio arranjador, Cesar Camargo Mariano, desconhecido do Tom e que ainda por cima era marido da cantora. As gravações foram tensas, cheias de incertezas a respeito dos caminhos adotados. E foi dessa tensão que surgiu um disco memorável, delicado, emotivo. É incrível pensar que eles não se deram conta de que estavam realizando uma obra-prima. Chico Buarque já declarou que “Águas de Março” é um dos sambas mais lindos que existe. E a gravação de Elis & Tom é o registro definitivo dessa música. O resto do repertório foi escolhido a dedo pelos três. O produto que a Trama lançou agora é muito especial e respeitoso. O próprio Cesar Camargo fez o trabalho de recuperar as gravações originais, trazendo à tona timbres que as tecnologias antigas omitiam. A edição dupla vem com uma nova mixagem em estéreo no formato CD e DVD áudio. E traz duas faixas que não entraram na edição original: “Fotografia” e “Bonita”. Muitas sobras de estúdio, que normalmente são cortadas na edição final, foram acrescidas. No disco relançado, podem-se ouvir conversas entre os músicos, ruídos de passos e finais mais longos em algumas faixas. Mais do que nos transportarem à atmosfera da época, os ruídos ajudam a humanizar essa obra divina.

VITOR KNIJNIK, PUBLICITÁRIO

FOTO: CRISTIANO SANT’ANNA


Cesta básica

FOTO: CRIS BERGER

Patagônia de tirar o fôlego Cris Berger viajou ao extremo sul do Chile e voltou encantada com a exuberância da natureza do Parque Nacional Torres del Paine. As imagens obtidas na viagem podem ser vistas nesta edição da Estilo Zaffari (a partir da página 38) e na mostra fotográfica “A imensidão, o infinito: a Patagônia”, que fica exposta no Barbazul (av. Itaqui, 57) de 11 a 20 novembro. Depois as fotografias seguem para o 2º piso do Shopping Bourbon Country, onde permanecem até 5 de dezembro. Agradecimentos aos apoiadores do projeto: explora en patagonia – Hotel Salto Chico, Gráfica Impresul, Comcentra Comunicação e Imobiliária Guarida.

AVENTURA NA FLORESTA Aqueles que sempre sonharam em se aventurar pelos recantos da Floresta Amazônica – e até mesmo aqueles que, como eu, já tiveram essa experiência única – ganharam um livro à altura. A obra “Travessia da Amazônia”, do jornalista, aventureiro e explorador gaúcho Airton Ortiz, traz aos leitores uma visão diferente dos tradicionais roteiros de viagem, repletos de hotéis luxuosos e tours organizados. O autor prefere mergulhar nos mistérios da floresta, em busca de paisagens, pessoas e experiências inusitadas, trazendo a seus leitores um relato ímpar, no qual a aventura é a verdadeira protagonista. Tudo isso em uma narrativa ágil, sempre fascinante e repleta de informações sobre a Amazônia, um mundo de mistérios e segredos ainda inexplorados.

RAFAEL BECK, JORNALISTA


Copo rodopiando e nariz mergulhado na taça, o enochato, versão esnobe do enófilo – que é, de fato, o verdadeiro apreciador de vinho –, é um personagem hoje cada vez mais presente em restaurantes bacanas de todo o País. Como falar e entender de vinho virou moda nas rodinhas sociais, o sujeito em questão parece um profundo conhecedor, mas é apenas um representante dessa estirpe de emergentes do taste vin. Calhamaço de 384 páginas recheadas de informações sobre o complexo mundo do vinho, a edição em português do Larousse do Vinho (Editora Larousse do Brasil, tel. (11) 3044-1515; R$ 119,00) pode ser um santo remédio contra esses impostores de Dionísio e exibicionistas de Baco. Fonte de informação segura e guia de consulta obrigatório para se ter à mão – sempre –, o livro é adaptado e atualizado segundo o perfil do nosso consumidor. Ao lado do consultor Jorge Lucki e de outros especialistas nacionais, Michel Rolland, enólogo francês que dá consultoria à vinícola Miolo, assina o prefácio. Além de todas essas boas razões, a obra é ricamente ilustrada e oferece, ainda, um índice que facilita a pesquisa por nomes de vinho ou regiões, um glossário temático e, crucial ao consumidor já iniciado, tabelas com as principais safras. Com esse olhar e molejo brazucas, o Larousse do Vinho encontra bom abrigo em qualquer adega – seja ela de um enófilo, seja de um enochato.

MARCO AURÉLIO MERGUIZZO, JORNALISTA ENOGASTRONÔMICO

FOTOS: CRISTIANO SANT’ANNA

PARA OS AMANTES E OS EXIBICIONISTAS DE BACO

Peppo: um novo italiano na capital Uma nova opção para jantar é o restaurante Peppo, instalado numa charmosa casa do bairro Moinhos de Vento. As alvenarias aparentes fazem do ambiente um espaço acolhedor e despojado, realçando as esquadrias originais da casa. Uma intervenção inteligente que valorizou suas qualidades arquitetônicas. O bar é muito agradável. O visual é simpático e tem a luz certa para o momento certo. O cardápio oferece variadas opções da culinária italiana, reservando toques peculiares em alguns pratos. O serviço é atencioso. A comida é excelente a um custo razoável. Não deixe de visitar o simpático banheiro original da casa...

ANA PAULA ELBLING, ARQUITETA


Consumo T E T Ê

PAC H E C O

NAS ALTURAS Auto-estima? Não seria melhor escrever alta-estima? A temperatura caiu repentinamente bem no meio da primavera e por isso senti uma necessidade urgente de usar botas. Como meu pé ia ficar escondido mesmo, coloquei uma daquelas péssimas meias de se usar com tênis. Quentinha, felpuda, sabe? A imagem no espelho denunciou algo grave e invisível que até então eu nunca havia percebido. Não estava mal, visualmente falando. Mas do ponto de vista feminino, me senti uma mulher derrotada. Básica. Totalmente prática. Protegida. Confortável. Pronta para o supermercado, para buscar as crianças na escola, entende? Tive vontade de chorar. De que adiantou todo o dinheiro que gastei na vida comprando Vogues importadas se é para perder o páreo para roupas básicas e meias felpudinhas? Pra que um guarda-roupas atolado de coisas que nunca são usadas porque, aí está a questão, jamais existe ocasião para elas? É o fim do glamour. Minha mãe é de uma geração que se vestia de verdade. Não era nada prático e muito menos confortável usar aquelas coisas apertando a cintura. Mas as mulheres ficavam lindas. Para cada situação especial encomendava-se um novo vestido do Rui. Não era uma questão de dinheiro apenas. Era uma questão de charme. De coisas que não estavam prontas. Precisavam ser feitas, encomendadas, pensadas. Era um

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tempo em que tudo precisava combinar com a Audrey Hepburn, com o Humprey Bogart. Inclusive as festas, restaurantes e relacionamentos em geral. Não sei se as mulheres desse tempo eram mais felizes do que somos hoje, com nossos sutiãs básicos, jeans básicos e camisetas básicas. Mas sinto que, se continuar esse básico-confortável todo na nossa volta, vai ocorrer o desaparecimento do detalhe. É grave. Porque junto com o detalhe vão-se embora a gentileza, o cuidado, a educação. Resolvi me revoltar nesse dia. E, apesar do frio e do ridículo da situação, tirei a bota, as meias, e coloquei um escarpin marrom altíssimo para ir ao supermercado. Sabe de uma coisa? Mudou tudo. Eu me senti mais relevante. Com um pouco de dor nas costas, mas distante dos probleminhas térreos. Aqueles de sempre, nenhuma novidade: o trabalho, os filhos, o trânsito estressante, o livro que não foi lido, a sessão de cinema perdida. Me senti flutuando sobre a falta de charme e a sem gracice que se instala nas conversas atualmente. Eu me senti ótima. Pra pensar: auto-estima? Não seria melhor escrever alta-estima? O nível do chão só é bom para as minhocas.

TETÊ PACHECO É PUBLICITÁRIA



Especial

OS JUDEUS E O RIO GRANDE DO SUL: UM SÉCULO DE GRANDES REALIZAÇÕES POR

B E AT R I Z

G U I M A R Ã E S

FOTOS

L E T Í C I A

Em 2004 comemoram-se os 100 anos da imigração judaica no Rio Grande do Sul. Para nós, gaúchos, há muito o que celebrar. Mesmo sendo uma comunidade pequena – em torno de 13 mil pessoas –, sua contribuição à cultura rio-grandense é imensa. Considera-se o ano de 1904 como o início da imigração judaica no estado, pela vinda de famílias e pela criação das primeiras colônias, como a Philippson e a Quatro Irmãos, nas regiões de Santa Maria e Erechim. De acordo com a professora Anita Brumer, estudiosa do tema, a partir desses núcleos pioneiros é que vão se criar comunidades consolidadas, que tiveram um papel muito importante na formação do RS. Muitos judeus vieram para Porto Alegre, instala-

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R E M I Ã O

I L U S T R A Ç Õ E S

N I K

ram-se no bairro Bonfim e começaram a trabalhar como comerciantes, vendendo roupas, tecidos, armarinhos, de porta em porta. Tinha início, assim, um sistema de contato direto com os clientes, em que as facilidades de pagamento, o crédito e os descontos acabaram se tornando uma grande novidade. Muitos judeus eram artesãos e deram início a pequenos negócios que, por fim, transformaram-se em fábricas – principalmente de móveis e de vestuário. Mais tarde, apareceram também os grandes empreendimentos comerciais. Da Europa para os trópicos: a primeira geração Um grupo significativo de judeus chegou ao Brasil durante a década de 30, em razão das perseguições sofri-



Especial IMIGRAÇÃO JUDAICA: 100 ANOS DE IDÉIAS E PIONEIRISMO, 50 ANOS DE FEIRA DO LIVRO

das na Europa, principalmente na Alemanha. Grande parte deles era de intelectuais e artistas fortemente inseridos na vida cultural européia. Puderam, por isso, desenvolver aqui inúmeras atividades ligadas a música, literatura, pintura, crítica de arte, jornalismo, e arquitetura. É na década de 30, também, que chega a Porto Alegre Herbert Caro, que acabou se tornando um dos maiores tradutores do alemão para o português. Suas traduções de “Dr. Fausto”, “A Montanha Mágica”, “Os Buddenbrooks”, por exemplo, são elogiadíssimas e foram fundamentais para que o público brasileiro conhecesse a obra de Thomas Mann. Nesta primeira geração de judeus europeus que chegaram ao Brasil está Maurício Rosemblat, um intelectual cujas atividades estavam ligadas aos livros. Foi ele um dos idealizadores da Feira do Livro, um dos eventos culturais mais importantes de Porto Alegre e a primeira feira de livros ao ar livre no País. Os livros e as flores dos jacarandás na Praça Coberta de jacarandás, formando um duomo natural com suas copas, a Praça da Alfândega deveria se chamar Praça dos Livros. Há muito tempo que a praça é do povo e um templo de livros, numa combinação tão perfeita que ninguém poderia imaginar lugar melhor para este evento. Há 50 anos, Maurício Rosemblat, junto com o editor Henrique Bertaso e o jornalista Say Marques, conseguiu concretizar o sonho de uma feira de livros ao ar livre. Há 50 anos que os novembros de Porto Alegre são diferentes dos novembros de qualquer outro lugar do mundo. Em que outra cidade livros são vendidos em cestos sob jacarandás em flor? Em que lugar do mundo as pessoas levam carrinhos de feira para comprar livros, elevando esses carrinhos – acostumados a carregar cebolas, bananas e outros que tais – a uma condição tão nobre? Afinal, estarão transportando os Machados, os

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Eças, os Simões Lopes Neto, os Balzacs, os poemas do Quintana... Ah, e os saldos? Irresistíveis. Em que lugar do Brasil um membro da ABL – Moacyr Scliar – circula pela feira como qualquer cidadão comum? Em que lugar do Brasil a gente vê o Luis Fernando Verissimo na fila de autógrafos da Lígia Fagundes Telles? Em que outra cidade a gente vê pessoas comuns, anônimas, crianças, jovens e adultos circulando entre livros, se divertindo, se informando e mobilizando um mercado fantástico? Quando se comemoram os 100 anos da imigração judaica no RS, talvez a Feira do Livro, um dos maiores orgulhos de Porto Alegre, seja o melhor exemplo da contribuição dessa comunidade ao povo gaúcho. Essa grande realização só reforça a longa e antiga história de paixão dos judeus pelos livros. A comunicação e as artes Nas artes plásticas, um dos primeiros artistas da comunidade judaica gaúcha a obter projeção nacional foi Carlos Scliar. Nascido em Santa Maria em 1920, muito cedo começou a trabalhar com artes gráficas e pintura. Há trabalhos seus por todo o Brasil, inclusive uma série sobre Ouro Preto, além dos painéis expostos na Prefeitura de Porto Alegre, feitos especialmente para a cidade. Recentemente, o MARGS apresentou uma mostra comemorativa aos 100 anos da imigração judaica, sob a curadoria de Marisa Soibelman. Foram apresentados ali trabalhos de artistas plásticos reconhecidos, como Alfredo Nicolaiewsky, Anico Herskovits, Carlos Wladimirsky, Clara Pechansky, Elida Tessler, Fernando Baril, Miriam Tolpolar e Paulina Eizerik. Na literatura temos Moacyr Scliar, com uma produção literária intensa, motivo de orgulho para os gaúchos. Também Cintia Moscovich, jornalista e escritora já consagrada, que escreveu Reino das Cebolas, de contos, e o romance Duas Iguais. Da nova geração, Clarah



Especial Averbuck, que estreou ainda muito jovem, com uma escrita vibrante e original, lançando Máquina de Pinball, já adaptado para teatro e cinema. Eva Sopher e o Theatro São Pedro Daqueles poucos imigrantes que chegaram aqui no começo do século passado, e que percorreram uma longa e difícil estrada de adaptação a um país totalmente diferente, surgiu uma comunidade sólida, atuante, e que tem contribuído imensamente nas áreas empresarial, científica, política e tecnológica, mas sobretudo na cultura gaúcha. O melhor exemplo de garra, persistência e investimento na cultura do Rio Grande do Sul é o de Eva Sopher, que das ruínas de um teatro centenário transformou o Theatro São Pedro em uma das casas de espetáculo mais respeitadas do país. Não se pode pensar Porto Alegre sem o Theatro São Pedro, ele próprio um espetáculo e motivo de orgulho para todos nós. Aos 80 anos, Eva Sopher está à frente de um dos mais belos e ousados projetos culturais da América Latina: o Multipalco. Um complexo cultural de 13 mil m2, com dois teatros, salas de ensaio, concha acústica, salas de aulas, bar, restaurante, praças, etc. Será mais um marco na cultura do estado. Nesses cem anos, pioneirismo e desenvolvimento têm sido a grande marca da comunidade judaica no Rio Grande do Sul. Talvez, de uma forma simbólica, a popu-

lação gaúcha tenha demonstrado seu agradecimento ao apoiar massivamente o nome de Moacyr Scliar para a Academia Brasileira de Letras. Foi uma manifestação espontânea e única no país.

A COZINHA JUDAICA: TRADIÇÃO E MUDANÇA A característica principal da cozinha judaica são as regras culturais e religiosas que orientam a relação com os alimentos. A mesa é considerada um espaço sagrado, de reunião, de celebração, de agradecimento e de alegria. A comida preparada segundo os preceitos da kashrut tem suas origens na Bíblia e segue mandamentos criados há milênios, que envolvem higiene, comportamento à mesa (nunca desperdiçar alimentos, moderação ao comer), modo específico de abater animais, proibição de misturar laticínios com carne, proibição de consumir certos alimentos: porcos, coelhos e animais doentes ou roubados, peixes sem escamas e moluscos. Estas são algumas dentre várias outras regras. Mas as regras sofreram transformações e questionamentos ao longo do tempo. Também variavam de acordo com cada país ou região. Atualmente, muitas das leis da kashrut tornaram-se difíceis de ser seguidas, inclusive pelas mudanças tecnológicas e pela in-

PERSONALIDADES BRILHANTES, TRABALHO ÁRDUO,


viabilidade econômica de produzir alimentos em condições especiais. Além disso, nos últimos 30 anos tem havido uma enorme transformação nas cozinhas do mundo inteiro. Todas as culinárias regionais passaram ou estão passando por mudanças radicais, banindo certos alimentos, adotando outros, pois há hoje uma consciência muito grande sobre o que comemos, o que devemos ou não comer. Da mesma forma, a cozinha judaica brasileira, originária em grande parte da Europa central e oriental, vem sofrendo transformações, no sentido de tornar-se mais leve e acessível, sem perder seus traços típicos. Por outro lado, a proximidade com Israel, com sua cozinha ensolarada e mediterrânea, tem sido também um fator de influência e mudança. Quase todos os alimentos da culinária judaica estão envoltos por um simbolismo ligado à própria história do povo judeu. E é principalmente nas datas religiosas que essa simbologia se faz presente. Shabbat, o dia sagrado O sábado é considerado o dia sagrado, dia de descanso e de agradecimento, e portanto não deve envolver nenhum tipo de trabalho de preparação de alimentos. O grande desafio é apresentar um alimento saboroso que tenha sido preparado na véspera. O shabbat começa ao entardecer da sexta-feira e termina no sábado ao anoi-

tecer. Com algumas variações, o cardápio inclui o challah – o pão trançado – , vinho, peixe frio, ou patê, caldo de galinha e cozido de legumes e grãos, chamado chollent, ou cozido de carnes, e sobremesa. Pessach, a Páscoa judaica O Pessach é comemorado por oito dias e simboliza a libertação dos judeus do domínio egípcio. O principal alimento é a matzá, uma espécie de biscoito sem nenhuma fermentação, portanto sem sal ou açúcar. A matzá simboliza a pressa com que o povo judeu teve que deixar o Egito: não havia tempo para que o pão fermentasse. Nas passagens bíblicas, uma ovelha é sacrificada como símbolo da libertação. Neste evento, a ovelha deve ser assada, nunca ensopada, ou cozida de outra forma. Além disso, são servidas ervas levemente amargas que representam os dissabores sofridos. Também é servido vinho, geralmente um tinto encorpado. Rosh Hashana, o Ano Novo No Rosh Hashana, durante os festejos do ano novo, uma grande variedade de alimentos são preparados para celebrar a esperança, prosperidade, fertilidade e alegria. Por isso as maçãs, o mel, as romãs, uvas e tâmaras, que simbolizam a doçura e a abundância, estão quase sempre presentes. Além delas, há o peixe, que representa também a fertilidade, fortuna e sabedoria.

VIDA CULTURAL INTENSA, HISTÓRIA E TRADIÇÕES


Especial


CHALLAH – PÃO DOCE

VARENIKES – PASTÉIS DE BATATA

15 G DE FERMENTO BIOLÓGICO INSTANTÂNEO

MASSA

OU 1 TABLETE DE FERMENTO FRESCO

1/2 KG DE FARINHA DE TRIGO

300 ML DE ÁGUA MORNA

ÁGUA SUFICIENTE PARA FORMAR UMA

4 COLHERES (SOPA) DE AÇÚCAR

MASSA MACIA

3 OVOS BATIDOS

RECHEIO

30 G DE MANTEIGA NA TEMPERATURA AMBIENTE

1 KG DE BATATAS

2 COLHERES (SOPA) DE MEL

2 CEBOLAS PEQUENAS

1 PITADA DE SAL

SAL / PIMENTA / AZEITE

500 A 600 G DE FARINHA DE TRIGO Modo de fazer: Numa vasilha grande misture a farinha de trigo, o fermento biológico instantâneo, o açúcar, o sal, a manteiga, os ovos e o mel. Adicione a água aos poucos, até obter uma massa homogênea. Sove até obter uma massa lisa. Deixe descansar por 1 hora. Novamente sove a amassa e divida em duas partes. Com cada metade da massa faça um rolo comprido, ponha-os em forma de cruz e forme a trança. Coloque a trança na fôrma e deixe crescer por uma hora. Pincele com o ovo diluído em um pouco de água ou leite e leve ao forno médio a 180°C por aproximadamente 1 hora. Obs.: se for usar o fermento biológico fresco é necessário diluir em água morna, adicionada do sal e do açúcar, e esperar uns 10 minutos para iniciar a ação da levedura.

Modo de fazer: Sove bem a massa. Divida em duas partes e deixe descansar enquanto se prepara o recheio. Ao comprimir com o dedo e a massa voltar, estará pronta para espichar. Enfarinhe a mesa. Espiche a massa com um rolo, não muito grossa. Corte com um copo. Modo de fazer o recheio: Descasque as batatas, cozinhe-as em água e sal e amasseas bem com o garfo. Frite a cebola bem picadinha no azeite, junte a batata e, querendo, uma pitata de pimenta. Quando a massa e o recheio estiverem prontos, recheie as rodelas com purê de batata, feche as pontas e ferva em água e sal. Deixe cozinhar aproximadamente meia hora. Ao servir regue com cebolinha frita no azeite ou na gordura de galinha ou com molho de carne ou galinha.


Especial

BURRECAS DE RICOTA

GUEFILTE FISH – BOLINHO DE PEIXE

MASSA

1 KG DE PIAVA OU TRAÍRA

250 G DE RICOTA / 250 G DE MANTEIGA

2 CEBOLAS CRUAS

250 G DE FARINHA DE TRIGO

2 CEBOLAS EM RODELAS, LIGEIRAMENTE FRITAS

RECHEIO

2 OVOS INTEIROS

200 G DE QUEIJO-DE-MINAS AMASSADO

5 CENOURAS

100 G DE QUEIJO PARMESÃO RALADO

2 FATIAS DE PÃO SEM CASCA, MOLHADAS

2 COLHERES (SOPA) DE LEITE

EM MEIO COPO DE ÁGUA OU 5 BOLACHAS

2 A 3 OVOS / SAL

CREAM-CRAKERS MOÍDAS

1 OVO PARA PINCELAR QUEIJO RALADO PARA POLVILHAR Modo de fazer: Misture todos os ingredientes da massa e guarde-a na geladeira. Essa massa pode ser preparada com antecedência e guardada na geladeira, dentro de um saco plástico, por 2 ou 3 dias. Misture todos os ingredientes do recheio até ficar uma massa homogênea. Abra a massa com um rolo até 3 mílimetros de espessura. Corte em discos de 10 centímetros de diâmetro. Ponha o recheio e feche, unindo bem as bordas. Coloque as burrecas numa assadeira molhada e pincele com ovo batido. Polvilhe com queijo parmesão ralado e leve ao forno para assar.

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Modo de fazer: Moa duas ou três vezes todos os ingredientes, inclusive o pão, que não deve ser espremido. Acrescente à massa a água em que o pão foi embebido. Numa panela grande, frite a cebola, acrescente o sal, pimenta e as três cenouras inteiras (para cozinhar) e água suficiente para abrir os bolinhos. Faça os bolinhos de 8 cm de comprimento e coloque com cuidado na panela com água fervendo. Acrescente água à medida que for secando. Tempo de cozimento: 2 horas. Corte as cenouras já cozidas em fatias e com elas enfeite os bolinhos. Obs.: para dar gosto especial, coloque no fundo da panela a cabeça e o espinhaço do peixe. Coe esse molho e use-o para cozinhar os bolinhos e acompanhar o peixe. Quando frio fica gelatinoso.



Especial

PEISACH – PUDIM DE FRUTAS

FLUDEN

6 BANANAS-CATURRAS

250 G DE FARINHA DE TRIGO

SUCO DE 1 LIMÃO

200 G DE MANTEIGA OU MARGARINA NA

1 COPO DE AÇÚCAR

TEMPERATURA AMBIENTE

100 G DE AMEIXAS PRETAS (COZIDAS

1 ENVELOPE DE FERMENTO QUÍMICO

E SEM CAROÇO)

RECHEIO

3 OVOS INTEIROS

300 G DE GELÉIA DE UVA, DAMASCO, LARANJA OU MORANGO

Modo de fazer: Bata tudo no liquidificador e coloque numa fôrma de pudim média, caramelada com açúcar, e leve a cozinhar em banho-maria.

100 G DE AÇÚCAR / SUCO DE 2 LIMÕES 200 G DE AMENDOIM TORRADO OU MOÍDO Modo de fazer: Misture tudo com a mão até poder espichar a massa. Divida em duas partes. Pegue uma porção e espiche em espessura média. Cubra com esta massa uma assadeira previamente untada com azeite. Sobre essa massa espalhe a geléia de morango, laranja, uva ou damasco. A seguir espalhe uma mistura de meio quilo de amendoim torrado e moído, açúcar, canela e suco de limão para umedecer. Coloque por cima a outra porção de massa espichada. Marque com a faca os pedaços e leve ao forno médio por meia hora. A massa permanece branca quando pronta.

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Sabor

PRAQUES – TROUXINHA DE REPOLHO 1 REPOLHO ROXO 1/2 KG DE GUISADO 1 CEBOLA GRANDE PICADA 2 DENTES DE ALHO 1/4 DE XÍCARA (CHÁ) DE ARROZ CRU AZEITE MOLHO 2 CEBOLAS PICADAS / AZEITE DE OLIVA SUMO DE 2 LIMÕES 1 COLHER (SOPA) DE AÇÚCAR 500 G DE TOMATES VERMELHOS PARA MOLHO Modo de fazer: Cozinhe o repolho inteiro em água e sal durante uns 10 minutos. Escorra bem e separe as folhas com cuidado para não rasgá-las. Misture o guisado cru com arroz, junte a cebola (previamente frita no azeite) e o sal. Recheie cada folha de repolho com esta mistura, enrolando-a e dobrando as folhas como uma trouxinha. Ponha a cozinhar no molho. Modo de fazer o molho: Refogue a cebola no azeite, junte os tomates pelados e picados e adicione um pouco d’água. Deixe ferver por 5 minutos e coloque as trouxinhas. Após ferver por 5 minutos, junte o sumo de limão e o açúcar a gosto, deixando cozinhar mais 15 minutos para pegar bem o gosto dos temperos. As trouxinhas estarão prontas quando o guisado e o arroz estiverem cozidos. Elas ficam crescidas.



O sabor e o saber F E R NA N D O

LO K S C H I N

CANASTRAS RECHEADAS Trigo, sempre uma dádiva à mesa Caim e Abel, as duas primeiras pessoas concebidas e nascidas naturalmente, já se dividiam entre agricultura e pecuária: mataram-se por isto. A longo prazo, o lavrador e algoz Caim levou vantagem, e hoje mais de três quartos da nossa alimentação é de origem vegetal. Nascido na África, o homem se criou na Eurásia, e lá as evidências mais antigas de agricultura remontam à cevada e ao trigo. Quando a safra do trigo não era boa, restava o consolo da cevada. Oito milênios de cultivo fizeram desaparecer o trigo em estado selvagem, seu ciclo vital se tornou dependente do homem, e, se deixássemos de plantar trigo, o “mais belo dos vegetais” se extinguiria. O pastor pode ser nômade (G. nomas, ‘pasto’) mas o agricultor (G. ager, ‘terra’) se enraiza no solo tal a planta. Foi a agricultura que, ao fixar o homem num território, fez brotar a comunidade e, assim, a civilização (L. civitas, ‘cidade’). Cultivando o solo, o homem cultivou o intelecto. A agricultura fez tanto pela civilização que o sentido da palavra cultura ascendeu do solo ao saber. Grécia e Roma, nossos berços culturais, antes do que impérios militares foram sociedades agropastoris. Ainda ecoa a raiz agrícola do neo-latim que falamos: ler (legere) deriva de colegere, ‘colher’, a escolha das letras é comparada com a de frutos. Lógica brotou de colere, ‘cultivar’, certo passou por cernere, ‘peneirar’, e contar saiu por putare, ‘podar’. Os números romanos também traem o passado camponês: os dedos da mão entalhados na madeira. O I, o II e o III são dedos; o V é a mão espalmada e o X junta duas mãos opostas, 10 dedos. Nossa herança agrícola mais rica é o trigo. Amarelo, o trigo é o sol da terra, ouro comestível, origem do melhor e mais saboroso pão. Culto, a cerimônia religiosa, é um termo nascido de cultivar. Todo alimento é sagrado, a planta cultivada é cultuada, e como o milho para os astecas e a batata para os incas, o trigo foi cultuado por todos os povos que o cultivaram. A cerimônia mais expressiva de adoração ao trigo era a da cidade grega de Eleusis, a Epopsia. Um único grão de trigo era contemplado em longo silêncio – o olhar pode reverenciar mais que mil palavras. Uma palavra que invoca a religiosidade pagã do trigo é imolar. À semelhança de um bife à milanesa, os romanos borrifavam suas vítimas sacrificiais com farinha de trigo, a que chamavam de mola, um termo afim a mó e moinho. Não há cultura que não misture comida, sexo e religião, trindade que molda o cerne da experiência humana, forma do homem enfrentar sua mortalidade. A semente sepultada no solo para renascer multiplicada, uma das imagens de vida eterna, foi a usada por João: o grão de trigo que cai na terra morre mas frutifica. Outra metáfora agrícola universal é a sexual. A fenda no solo, como a mulher, acolhe a semente (gêmea de sêmen) para gerar frutos. O trigo é o cereal-símbolo do alimento-símbolo, o pão, sempre uma dádiva à mesa. Muitos idiomas usam as mesmas palavras nos sentidos de ‘trigo’, ‘pão’, ‘alimento’ e inclusive ‘dinheiro’, o ganha-pão. O que torna o trigo especial é a quantidade de glúten, a ideal FOTOS: LETÍCIA REMIÃO

para panificação: esta substância retém o gás carbônico produzido pelo fermento, o que dá volume e consistência ao pão. O pão fermentado foi uma invenção egípcia, um subproduto da fabricação da cerveja, bebida que goza da mesma popularidade desde a construção das pirâmides. Em todos os locais e épocas em que foi cultivado o trigo se tornou o cereal mais valorizado. Seu grão era a medida de peso na Babilônia e punhados de trigo, a moeda de troca. Na Bíblia, a ‘ceifa do trigo’ muitas vezes é a referência de tempo no calendário. Desde o aramaico, o Pai Nosso, a prece judaica ensinada por Jesus, o que rogamos a Deus é “o pão nosso de cada dia nos dai hoje”. O primeiro conforto é a comida. É emblemático que nossa fonte alimentar primordial tenha o nome grego do pão de trigo: placenta. Jesus, que figurou seu corpo como um pão, nasceu em Belém, palavra que significa ‘padaria’ em hebraico (bet lehem, ‘casa do pão’). Se Jesus transformou a água em vinho, ele multiplicou o pão, alimentando 4000 fiéis. O pão é a representação da providência, por séculos abençoado com o sinal da cruz. No islamismo o pão simboliza tudo o que é precioso, originalmente um artigo que não poderia ser vendido ou comprado, só ofertado ou recebido. Sopa descrevia inicialmente a fatia de pão em que se embebia, ensopava um molho ou caldo alimentar. Apanágio era a quantia destinada pelo nobre a seus filhos, não a herança da primogenitura, mas a pensão alimentícia para prover o pão (F.a. apaner). O cardápio da carência admite duas opções: comer o disponível ou a fome. Os pobres comiam pão de cevada, em tempos mais difíceis misturada com capim, cinzas e até lama, mas os ricos comiam o pão de trigo, quanto maior a riqueza mais pura a farinha. O trigo como ideal de pureza criou as expressões ‘farinha do mesmo saco’, ‘trigo limpo’ e ‘separar o joio do trigo’ – semelhante ao trigo ao germinar, o joio só produz palha. A palavra trigo (L. triticum) se liga a seu destino de ser ‘triturado’, virar farinha, já o inglês wheat reflete a cor branca (I. white) da farinha pura. Roma levava a sério a política de pão e circo. A distribuição de pão ao povo era a base da assistência social do estado. O patrício tinha carne e a plebe cultivava legumes, mas os soldados comiam quase só trigo. O pão é trigo solidificado e condensado, energia fácil de conservar e transportar, por isto seu uso militar. Um pão de trigo era a ração de dois legionários, os companheiros (com pagni). Nem rápida nem ambulante, as Canastras de Trigo nos convidam à Epopsia – o que revelará o seu interior? Depois, a eucaristia da deglutição, dois corpos reunidos um dentro do outro. Nada de tirar, mas botar o pão na boca. Em cada refeição há um sacrifício que nos salva. Nesta, o mais belo dos vegetais é a dádiva imolada, um apanágio de companheiros. Como diz o poema, o pão é o perdão à mesa. Nem só de pão vive o homem, mas a vida, desde a placenta, nos é dada pelo trigo. Nos criamos todos em Belém, uma padaria.


RECHEIO: REFOGUE EM ÓLEO DE OLIVA CEBOLA RALADA, PEDACINHOS DE ALHO E CUBOS DE TOMATE (SEM PELE E SEMENTES). ACRESCENTE CAMARÕES E COGUMELOS JÁ COZIDOS (CORTADOS EM QUATRO). COLOQUE RICOTA RALADA E ENCORPE O MOLHO COM FARINHA DE TRIGO. TEMPERE COM SAL, PIMENTA, SALSA E CEBOLINHA. TIRE LOGO DO FOGO. ADICIONE MASCARPONE, CAMEMBERT OU GORGONZOLA. CANASTRAS: DESCONGELAR A MASSA FOLHADA PRONTA POR 30 MIN. CORTAR A MASSA EM QUADRADOS (15 CM). COLOCAR UM POUCO DE RECHEIO NO CENTRO. PINCELAR AS EXTREMIDADES COM GEMA BATIDA. DOBRAR AS LATERAIS POR SOBRE O CENTRO E COLAR. ENVELOPAR AS EXTREMIDADES SUPERIOR E INFERIOR. PINCELAR A FACE DE CIMA COM GEMA BATIDA. DOURAR NO FORNO PRÉ-AQUECIDO (30 A 45 MINUTOS). SERVIR GUARNECIDA COM ASPARGOS VERDES SOBRE CAMA DE VERDES. FERNANDO LOKSCHIN É MÉDICO E GOURMET fer nando@vanet.com.br


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ImensidĂŁo

azul T E X TO S

E

F OTO S

P O R

C R I S

B E R G E R


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TORRES DEL PAINE: LONGE DA CIVILIZAÇÃO, MAIS PERTO DE DEUS 40

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América Latina, Estreito de Magalhães, Patagônia chilena: Parque Nacional Torres del Paine. Um endereço remoto. Longe da civilização, mais perto de Deus. Uma experiência de vida que espera por você. É fácil perceber que quem leva a vida por esses lados tem uma natural paz de espírito. Será a influência das montanhas, a beleza dos lagos, o mistério das geleiras, a leveza de viver junto a tão estonteante beleza natural? Talvez seja fazer o bem que deixe todos com aqueles sorrisos rasgados. E o brilho no olhar? Ah! Bem, isto deve ser o reflexo das Torres del Paine. Poucos dias antes de embarcar rumo ao Chile ganhei de aniversário o livro “Pensar é transgredir”, de Lya Luft. Logo no primeiro trecho da viagem comecei a ler. Foi quando percebi que nada é por acaso. Algo me dizia que aquele livro não estava em minhas mãos por um motivo qualquer. Ele me fazia pensar, me levava a mergulhar mais fundo, a buscar respostas perdidas. E assim Porto Alegre, meu porto seguro, ficava para trás. Pela frente, a Patagônia chilena. Um destino que me despertava fascínio. Havia algo


naquela terra longínqua reservado para mim, e eu estava a alguns passos de descobrir. Agora, olhando para trás, entendo o que meu coração pressentia. Não voltei apenas renovada, voltei uma nova pessoa. Deixei para trás uma Cris que preferia olhar montanhas de longe em vez de as escalar, que escolhia a segurança da terra firme no lugar de terrenos irregulares ou escorregadios. Tempos passados. Hoje me tornei uma amante da natureza, descobri o prazer de sentir o vento soprar forte, de ousar, arriscar e receber em troca o prazer da conquista. Quando penso na Patagônia, imagino uma pintura que captura o olhar, impedindo-o de se desviar de sua beleza. O que se vive por lá jamais se perderá na memória. Nem a passagem dos anos poderá apagar. Azul patagônico O Parque foi criado em 1959. Ele está ao redor da Cordilheira dos Paine, que tem 12 milhões de anos. Em 1978, a Unesco o declarou Reserva da Biosfera. Tem 242

mil hectares e faz fronteira com a grande massa dos Campos de Hielo Sur. Você tem diversas maneiras de explorálo: caminhando, a cavalo, de bicicleta, lancha ou van. Muitas vezes se usa um pouco de cada. As Torres del Paine são uma formação montanhosa de 3 mil metros de altura. Ela divide os holofotes com o Glaciar Gray, formado pela neve que não se derreteu ao longo dos anos. Ventos fortes são famosos e podem chegar até 110 quilômetros por hora. A paisagem fica por conta de montanhas e fiordes. Os verdadeiros moradores das Torres Del Paine são as 25 espécies de mamíferos e as 105 de aves. Não é difícil encontrá-los ao redor do parque. Os guanacos (primos das lhamas peruanas) são os mais fáceis de serem vistos. Eles vivem cerca de 15 anos, são ligeiros (alcançam 70 quilômetros por hora) e saltam até um metro e quarenta centímetros de altura. O maior predador deles é o puma. A origem do nome do parque deixa dúvidas. Não se sabe ao certo se vem dos extintos índios aonikenkis ou se foi batizado por exploradores europeus. Na língua

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O HOTEL EXPLORA NÃO É SÓ O QUE EU PENSAVA. É MUITO MAIS! PREPARE-SE PARA SER BEM TRATADO dos aonikenkis, Paine significa azul. Azul que se destaca na paisagem e colore o céu, lagos e geleiras. Na Patagônia cada estação tem sua própria beleza. No outono, o vermelho, o laranja e o amarelo ganham a copa das árvores e deixam o parque apaixonante. No inverno tudo fica branquinho e as Torres del Paine são pintadas de vermelho a cada amanhecer. Na primavera são as flores, é claro, que emprestam um charme especial às montanhas; no verão os exploradores ganham um dia mais longo para apreciar o espetáculo, já que o sol nasce às 5 da manhã e só se despede às 11 da noite. A temperatura máxima não ultrapassa os 240C e a mínima os - 90C. A temporada de ventos mais fortes acontece entre o final da primavera e o início do verão. Quando é verão no Brasil também é na Patagônia. Sinta-se em casa! Há muito tempo eu namorava a Patagônia. Cá entre nós: tinha um desejo especial de ficar hospedada no hotel Explora, que leva o nome de Salto Chico. Quando o convite chegou, vibrei! O mais bacana: chegou no dia do meu aniversário! O Explora não é o que

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eu pensava, é muito mais! Ele oferece 21 tipos de roteiros diferenciados para desvendar o Parque. Todas as noites, antes de o jantar ser servido, os hóspedes se reúnem com os guias nas salas de estar para decidir qual será a aventura do próximo dia. Esse é um momento especial. Entre um cálice de vinho e alguns aperitivos, corre um bate-papo descontraído. Seu maior compromisso será a difícil tarefa de decidir qual o roteiro a ser explorado no dia seguinte. Os guias têm conhecimento de arqueologia, história, geografia e primeiros socorros. O pessoal realmente é profissional, além de ser muito bacana. Quando sua viagem chegar ao fim, você certamente terá feito novos amigos. As instalações do Explora são bárbaras. Eu ganhei um quarto com vista para as Torres. De manhã cedinho sempre acordava para ver o sol as colorir de rosa. No banheiro, duas janelinhas aproximavam ainda mais as torres do meu olhar. Um pote com sais convidava para um banho de imersão. Dentro de uma sacolinha linda, de estopa, minicosméticos. Um mimo que me encantou ainda mais. Na chegada, quem vai recepcionar você é a Rosá-



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A PATAGÔNIA PARECE UMA LINDA PINTURA. E EU ESTAVA LÁ, DENTRO DELA rio. Uma simpatia só. E todo fim de dia ela vai lhe perguntar como foi sua expedição. Prepare-se para ser bem tratado. Só tenha cuidado para não ficar mal acostumado com tanto mimo. Expedição ao Glaciar O Glaciar Grey foi o primeiro lugar que desvendei. Possui vinte e sete quilômetros de comprimento e começou a ser formado há 15 mil anos. Em algumas partes suas paredes alcançam 30 metros de altura. Caminhei 12 quilômetros para vê-lo de pertinho. A jornada começa a bordo de um barco que sai do hotel Explora e atravessa o lago Pehoe. Já do outro lado da margem os guias fazem uma rápida instrução sobre o que se tem pela frente. O grupo é dividido em dois. O critério é o ritmo de cada um. Nem preciso falar que fiquei no grupo dos que não têm pressa de chegar. Na verdade acho que eles já imaginavam que eu iria parar um incontável número de vezes para fotografar e inventaram esta divisão. A minha sorte é que o pessoal que ficou junto comigo foi muito tranqüilo. Descobri durante a jornada que o bacana do passeio não é apenas contemplar a bela paisagem, mas a oportunidade de conhecer novas pessoas, fazer amigos, trocar experiências e exercitar a capacidade de rir de si mesmo. Comigo ficaram a Helen e o Neil, de

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DEPOIS DE EXPLORAR O PARQUE, ENTREGUE-SE AOS CONFORTOS DO EXPLORA. É HORA DE RELAXAR Manchester, England, e a Beth e o Emiro, de Curitiba. Foi inevitável lembrar da tumultuada vida urbana e pensar como é bom estar na Patagônia. O duro é saber que se tem de voltar. Resolvi empurrar os pensamentos ruins para o lado e seguir adiante. Afinal, uma grande caminhada estava à frente. Durante o percurso tivemos muitos momentos de silêncio, quando os únicos sons eram os dos passos, da respiração e do balançar dos galhos das árvores. No meio do caminho encontramos um pica-pau. Cabeça vermelha, corpo negro, trabalhando em uma árvore. Desta vez não fui a única que se preocupou em fotografar. O picapau foi generoso conosco e fez até pose. Mais adiante nos deparamos com a Laguna Los Patos. De cima da montanha avistamos os primeiros icebergs e nos surpreendemos com sua coloração azulada. Enchemos nossos cantis nas águas do Rio del Piedras e quando menos esperávamos chegamos em uma praia só de pedras, rodeada por uma cadeia de montanhas, com blocos de gelos desfilando nas águas calmas do lago Grey. Perguntei qual era o nome daquele lugar tão especial. Como ele não tinha um nome, o Rodrigo (nosso guia)

pediu que eu o batizasse. Pensei um pouquinho e achei que Federico Fellini não se importaria de emprestar La Dolce Vita para esse cantinho tão especial da Patagônia chilena. Minha sugestão foi aceita e agora minha praia preferida já tem como ser chamada. Foi nela que almoçamos. Confesso, nunca tive um almoço tão especial. A começar pela vista. O cardápio foi caprichado. Começamos com uma deliciosa sopa de abóbora, depois comemos sanduíches de frutos do mar e, para fechar com chave de ouro, licor Baileys. Tudo isso servido em cima de uma toalha de mesa linda, xadrez azul e branco (azul para combinar com o céu). De volta à estrada. Prometi aos meus novos amigos que eu iria me controlar, não tiraria mais fotos, e só pararia quando chegássemos perto das geleiras. Cumpri minha promessa. Olha que não foi fácil, mas promessa é promessa. Bem, as geleiras são um espetáculo à parte. Chegamos bem pertinho delas, a bordo de outro barco. Parece que foram pintadas em um degradê de azul. É uma imagem que nossos olhos não estão acostumados a contemplar. Como não poderia deixar de ser, um pedaço de iceberg que havia se desgrudado da grande barreira de

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AO ESCALAR AQUELAS MONTANHAS, GANHEI UM TROFÉU: A IMENSIDÃO, O INFINITO, A PATAGÔNIA! gelo foi literalmente pescado do lago, partido em pedaços e servido com uísque para os viajantes. Tamanha beleza mereceu um brinde. Então, só nos restou dizer: salud! Um lugar feito de lendas O dia seguinte amanheceu de forma especial. O céu de um azul porto-alegrense. A visibilidade atingia 100%. Nuvens branquinhas davam um toque mágico ao cenário. Se antes eu achava que a Patagônia parecia uma pintura, a partir desse momento passei a ter certeza que eu estava dentro de uma. Saturação de cores. O sol pintava as águas do lago Pehoe de verdeesmeralda. O cume das montanhas podia ser visto com precisão. A vegetação amarelada dava um toque romântico ao ambiente. Enquanto os olhos eram abençoados, o corpo punha-se em movimento. Destino final: o alto de Las Cornisas. A subida começava a ficar íngreme, a respiração ganhava seu ritmo, o sangue corria mais rápido, a concentração se fazia importante. Um bastão ajudava a driblar as dificuldades do trajeto. Eu já me sentia uma alpinista. Estava gostando de ver meu corpo, então se-

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dentário com a falta de tempo que a vida urbana me acarreta, em movimento. Por isso nem percebi que a trilha se tornava mais vertical, que as pedras dificultavam a caminhada e que eu estava aprendendo a manter o equilíbrio. Cheguei a sentir medo por alguns segundos, mas aí eu já havia conquistado a primeira metade da escalada. Como troféu, a imensidão, o infinito, a Patagônia! Ainda faltava conquistar a última parte do trajeto que levava até o topo da montanha. De repente o vento começou a soprar mais forte. Rajadas de 50 quilômetros por hora me empurravam para cima. Agradeci pela direção do vento ser a mesma que a minha. Da garganta da montanha o vento cantava sua música. Alguns metros mais: conquistada a base. Resolvi descansar sob o calor do sol. Assim fiquei a admirar as montanhas vizinhas, os vales espelhados nos lagos, o dançar das nuvens. Árvores retorcidas emprestavam um clima selvagem ao ambiente. Fim do ócio. Levantei acampamento. A descida foi uma delícia. Minha linda amiga e guia, Catalina, falou sobre a flora local e contou um segredo que passo para vocês: diz a



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A PATAGÔNIA FALA COM A GENTE. NÃO NOS DEIXA INDIFERENTES, NOS FAZ PENSAR lenda que quem comer do fruto do Calafate voltará à Patagônia. A árvore floresce em outubro e transformase em fruto no mês de dezembro. Se você estiver na Patagônia nesse período do ano, acredite na lenda. À tarde foi a vez da cavalgada pela Laguna Linda. Meu cavalo revelou-se o rebelde da turma, arriscou umas corridinhas, pegou atalhos. Cheio de vontade própria. Alguém do grupo disse que o cavalo se identifica com o cavaleiro. Será? Eu havia montado há 17 anos. Então foi como a primeira vez. É gostoso ver a paisagem de cima do lombo de um cavalo. O cenário ganha novo ângulo. O que me fez pensar que assim deveríamos levar a vida, sempre buscando novas maneiras de ver o mundo. Como eu pude demorar tanto para ter a experiência de cavalgar? Esta viagem estava me mostrando a importância de viver, de experimentar. Acho que a Patagônia fala com a gente. Não nos deixa indiferentes, nos faz pensar. De volta à estância, hora do mate, bem mais amargo que o nosso. Nos reunimos em volta do fogão à lenha. Na janela o dia se despedia e pintava o céu de amarelo e vermelho. Conhecemos os baqueanos, nome dado aos homens que conhecem bem a região. Despedi-me, já com saudades. Acabava o dia menos urbana e um pouco mais alpinista e amazona.

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PAZ DE ESPÍRITO E PLENA SENSAÇÃO DE LIBERDADE. A VIDA URBANA COMEÇA A PARECER TÃO INSENSATA! Delícias à sua espera Depois de horas de peregrinação pelo Parque, entregue-se às delícias da casa de baños del Ona do hotel Explora. Um caminho de madeira leva até ela. Na aconchegante recepção você vai ganhar toalhas, roupão e chinelinhos. Você estará absolutamente exausto. Mente e corpo em harmonia. Paz de espírito e plena sensação de liberdade. Frio dominando o ambiente, água quente driblando a baixa temperatura, um cálice de champanhe e uma profunda sensação de bem-estar. À sua espera: uma piscina climatizada, duas jacuzzis ao ar livre (quentíssimas), saunas e sala de massagens. Hora de relaxar. A gastronomia é outro ponto alto da sua estadia. Quem assina os pratos da cozinha do Explora é o chef francês Eric Legois. A cada almoço e jantar você terá duas opções de menu para escolher. Acredite, optar entre elas será uma difícil decisão. Caso a situação chegue ao extremo da dúvida, faça como eu, peça as dois e bon appétit! De volta ao quarto, mais surpresas. Em cima de cada travesseiro, uma caixinha. Dentro, dois bombons. As cortinas foram abaixadas, o lençol desdobrado, cama pronta para uma merecida noite de repouso. Durma com os anjos.

Segredos da natureza O último dia amanheceu chuvoso e manteve-se assim até acabar. A chuva não assusta os mais determinados, mas confesso que os encantos do Explora foram mais fortes que meu espírito aventureiro. Lugar perfeito para não fazer nada, viver um romance, ler um livro, tirar uma sonequinha fora de hora, deixar a preguiça chegar. Ao meio-dia, churrasco na estância Quincho. Horas agradáveis e descontraídas. O fogo e o vinho cuidaram de aquecer todos. Parecíamos amigos de longa data. Cordeiros, salmões e batatas foram assados em uma grande churrasqueira de chão localizada no meio do galpão. Enquanto o céu molhava a terra nos conhecíamos melhor. O mundo me parecia tão razoável! Aqueles momentos, absolutamente adequados. A vida urbana começava a parecer algo insensato. Um processo de autoconhecimento, que começara nas linhas da Lya Luft, expandia-se dentro do território patagônico. Cheguei a me perguntar o que havia naquela terra que me deixava tão sensível. Penso que a natureza tem um pozinho mágico que nos torna mais humanos, reais e verdadeiros.

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DICAS DE QUEM FOI SIGA A BÚSSOLA EU CHEGUEI AO PARQUE NACIONAL TORRES DEL PAINE VIA SANTIAGO. DORMI UMA NOITE NA CAPITAL CHILENA E NA MANHÃ SEGUINTE VOEI PARA O EXTREMO SUL DO CHILE, ONDE SE ENCONTRA A CIDADE DE PUNTA ARENAS. A PARTIR DESTE PONTO O TRAJETO É FEITO COM UMA VAN DO EXPLORA. SÃO 5 HORAS ATRAVESSANDO O BELO PAMPA PATAGÔNICO.

VESTUÁRIO INTELIGENTE NÃO QUERO DEIXAR DE FALAR NA FAMA QUE A PATAGÔNIA TEM DE SER GELADA. EU FUI NO MEIO DE SETEMBRO E ME DEI MUITO BEM COM O CLIMA. DENTRO DO HOTEL A CALEFAÇÃO NOS FAZ ESQUECER DA TEMPERATURA EXTERNA. AO AR LIVRE É NECESSÁRIO USAR ROUPAS INTELIGENTES. DO QUE ESTOU FALANDO? DE COISINHAS BÁSICAS QUE NÃO PODEM FALTAR NA SUA MALA. UM SAPATO APROPRIADO PARA ESCALADAS (NEM PENSE EM NÃO AMACIÁ-LO ANTES), UM PAR DE LUVAS, UM GORRO, UM CACHECOL, CALÇAS CONFORTÁVEIS E UM CASACO QUE PROTEJA DO VENTO E DO FRIO. O RESTO FICA POR CONTA DO CALOR PROVOCADO PELAS CAMINHADAS.

UMA PROMESSA QUERIDOS LEITORES DA ESTILO ZAFFARI, PREPAREM-SE PARA PERDER O FÔLEGO: A PATAGÔNIA É DESLUMBRANTE. OUSO AFIRMAR QUE NÃO HÁ COMO NÃO VOLTAR COMPLETAMENTE APAIXONADO PELA OBRA DE ARTE QUE A NATUREZA ESCULPIU NAQUELE CANTO DO MUNDO. POR ISSO, ENTREGUE-SE SEM RESERVAS E VIVA INTENSAMENTE! E NÃO ESQUEÇA: VOCÊ ESTÁ PRESTES A CONHECER UM DOS LUGARES MAIS LINDOS DO NOSSO PLANETA.

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DE CIMA DO LOMBO DE UM CAVALO, O CENÁRIO GANHA NOVO ÂNGULO

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Bem Viver MAR CELO ZANELLA CAPRA

ENFIM, O SUPER-HOMEM Células-tronco vão revolucionar a história da humanidade Desde a descoberta de que todas as células do nosso corpo carregam as mesmas informações, de modo que uma célula do fígado e uma célula da pele têm exatamente o mesmo material genético, meticulosamente arquivado no livro da vida, o DNA, uma conclusão parecia óbvia: poderíamos transformar um tecido em outro? Afinal, se elas possuem as mesmas informações, seria apenas necessário “ler o livro em outro capítulo”. Desta forma, células que durante seu desenvolvimento receberam a determinação de se tornarem células da pele poderiam mudar de profissão, uma vez que guardam dentro de si todas as informações necessárias para qualquer outra atividade, necessitando apenas de estímulos adequados. O que parecia simples mostrou-se praticamente impossível. As células, depois de terem sido treinadas a assumir determinada função, são muito resistentes à troca de ofício. Além disso, muitos tipos de células, ditas maduras, não se reproduzem facilmente. Quando um órgão adoece e suas células morrem, o espaço por elas ocupado é substituído por uma substância chamada colágeno, não havendo, via de regra, regeneração do órgão a partir das células remanescentes. Procurou-se então utilizar células mais jovens, entre elas, as do embrião, do cordão umbilical dos recém-nascidos e da medula óssea. Tais células, chamadas de células-tronco, apresentam uma capacidade reprodutiva maior e não estão ainda comprometidas com determinada tarefa, podendo, de acordo com o estímulo recebido, formar diferentes órgãos do nosso corpo.

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Desta forma, poderíamos reconstituir um coração doente com células jovens da medula óssea que, mesmo não sendo do ramo, poderiam, em lá chegando, perceber que suas colegas estão em apuros e assumir esta nova função. Talvez, ainda melhor, treinar essas células em laboratório para injetá-las mais aptas à função desejada. Como as células são retiradas do próprio paciente, não haveria rejeição, problema limitante de todos os tipos de transplante. Outra aplicação fantástica seria em pacientes com lesões na coluna vertebral: poderíamos utilizar tais células para reconstituir os nervos de uma pessoa que está impedida de caminhar? Christopher Reeve em pessoa (versão conhecida do Super-Homem de Nietzsche) estava empenhado nesta idéia. Do futuro para o presente, as células-tronco são uma realidade que bate à porta. Cientistas, médicos, jornalistas, organizações não-governamentais, políticos e pacientes portadores das mais diversas doenças lêem, escrevem e falam sobre este assunto, que promete revolucionar a história da humanidade. Muitos progressos já foram obtidos, como a reconstituição do sangue após o transplante de medula óssea, os bancos de cordão umbilical, os resultados iniciais em doenças cardíacas, parecendo ser apenas o início. Da ficção para a realidade, do Super-Homem para o homem, somente o tempo (e muito trabalho) responderão. MARCELO ZANELLA CAPRA É MÉDICO HEMATOLOGISTA E MESTRE EM CLÍNICA MÉDICA PELA UFRGS



Saúde


Equilíbrio perfeito EU ESTOU SENTADA NO CHÃO DA SALA, BRINCANDO COM A MINHA FILHA, QUANDO MEU MARIDO ME OLHA E DIZ: “NOSSA, TUA POSTURA TÁ TÃO BOA, O QUE TU FEZ?”. SENTINDO-ME MAIS ESTICADA DO QUE NUNCA, RESPONDO: “FIZ MINHA PRIMEIRA AULA DE PILATES”. CORTA PARA OUTRA CENA. EU AQUI, TRÊS MESES DEPOIS, PRONTA PARA CONTAR TUDO O QUE EU SEI NA PRÁTICA E NA TEORIA SOBRE O MÉTODO PILATES. MAS ANTES, UM AVISO: ESTOU APAIXONADA POR ELE. PORTANTO, SE VOCÊ TIVER A IMPRESSÃO DE QUE, LÁ PELAS TANTAS, O TEXTO ESTÁ ELOGIOSO DEMAIS, NÃO ME CULPE. É O AMOR.

POR

PAULA

TAITELBAUM

FOTOS

LETÍCIA

REMIÃO

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Saúde


JOSEPH PILATES CRIOU O MÉTODO E CERCA DE 500 POSIÇÕES DIFERENTES Umbigo no céu da boca Pilates virou febre, moda, matéria de capa em revistas nacionais. Como odeio modismos, não me interessei em saber nada a respeito. E nem me interessaria, não fosse uma amiga chegar e dizer que tinha marcado uma aula experimental para mim. Dia tal, em tal horário, no endereço tal. Fui. Sem saber onde estava indo, mas fui. O estúdio escolhido por ela foi o GR Pilates, uma casa bem iluminada, arejada e cheia de camas que mais pareciam de... tortura. Ai que medo, pensei. Pois bem, a aula foi assim: eu nas camas de tortura, esticando correntes, empurrando molas e puxando elásticos. Enquanto isso, um professor ao meu lado não parava de repetir “cola esse umbigo no céu da boca, cola esse umbigo no céu da boca”. Juro que tentei engolir o meu umbigo, mas no primeiro dia não foi assim tão fácil. Aliás, nada é fácil. Mas eu garanto: é compensador. Como disse, já no primeiro dia, depois de uma sessão individual de 50 minutos, saí ultra-alongada e sentindo um bem-estar tremendo. Bem-estar que foi aumentando a cada aula, à medida que eu realizava os movimentos com mais precisão, sentia meus músculos se fortalecendo e conseguia permanecer com a barriga tão encolhida quanto a daquele cara que aparecia nas fotos espalhadas por todo o estúdio. Quem é o cara? Ora, ele: Joseph Hubertus Pilates. O pai do método Além do GR Pilates, também visitei o Studio Ballance e o Physio Pilates para escrever esta matéria.

Em todos eles, vi nas paredes imagens impressionantes de Joseph Pilates. Fotos de um homem de corpo escultural em posições que demonstram total controle físico. Ninguém diz que o atleta das fotos foi uma criança doente, raquítica. Nascido na Alemanha em 1880, Joseph ainda era um garoto quando decidiu que superaria seus próprios limites. Não apenas superou, como inventou uma ciência, a Contrologia, nome original do método Pilates. A Contrologia desenvolve, ao mesmo tempo, força, flexibilidade, controle do corpo e equilíbrio da mente. Para isso, existem umas 500 posições diferentes e uns quantos aparelhos para exercitá-las. Todos inventados por Pilates. De onde vinha tanta inspiração? De livros de anatomia, da filosofia oriental, da civilização grega e, claro, da vida. Dizem que a idéia do uso de molas, por exemplo, nasceu quando Pilates trabalhou com soldados ingleses feridos de guerra que não podiam sair de suas camas hospitalares. Já algumas das posições, que hoje já conheço de cor, foram inspiradas no balé. Ao chegar em Nova Iorque, Pilates abriu seu estúdio no mesmo prédio do famoso dançarino George Balanchine. Os alunos de Balanchine passaram a ser alunos de Pilates, e os movimentos dos bailarinos foram incorporados. E o umbigo no céu da boca? É uma derivação do Yoga. Quando trabalhamos conscientemente esta parte do corpo, fortalecemos nosso Plexo Solar, o chakra que governa nossa liberdade, poder e controle. Pilates rebatizou este ponto de Power House ou, traduzindo, a Casa da Força.

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O ABDÔMEN É A “CASA DA FORÇA” DO PILATES, O CENTRO DE EQUILÍBRIO A casa da força Conversando com Georgia Ros, bailarina, professora de educação física e sócia do GR Pilates, confirmo que, em Contrologia, tudo é focado no Power House, o centro de equilíbrio. “Pilates estudou os yoguis, estudou essa energia. Quando começamos a mobilizar essa força, sentimos que temos capacidade para tudo, nossa auto-estima aumenta, controlamos as emoções. É como se estivéssemos sempre protegidos. E ao ficarmos protegidos, abrimos nosso peito, melhoramos nossa postura.” Tânia Carvalho, que faz Pilates há quase dois anos, atestou: “É concentração total nos músculos abdominais. Com a barriga a gente pode tudo!!!!”. Tânia ainda contou que cresceu 3 centímetros desde que começou. “Fui experimentar o vestido que usei na festa de casamento do meu filho e o dito estava com a cintura curta. Fiquei louca! Achei... sei lá... Pois bem, cresci.” Pra completar, ela ainda comentou mais uma coisa, que eu confirmo e assino embaixo: a consciência do Pilates permanece com a gente mesmo depois da aula, durante todo o tempo. De uma forma natural, colocamos o umbigo pra dentro e a nossa coluna acaba indo pro lugar certo. Método milagroso Eu realmente pensava que Pilates não era para qualquer um. Só para os fortes e destemidos. Hoje já sei que ele pode, e deve, ser praticado por quem tem algum problema de coluna ou de limitação nos movimentos. A bailarina Ângela Spiazzi possui uma calcificação muscular

no quadril e seus movimentos estavam ficando cada vez mais limitados. Até que, em 1999, ela teve o primeiro contato com o método. “Se não fosse Pilates acho que eu nem estaria andando. Com o passar dos anos, o rendimento de um bailarino vai caindo. O meu, ao contrário, só está aumentando, ganhei consciência corporal e força.” Falando assim, pode parecer que Pilates é um método milagroso. Estou pra dizer que é quase isso. Para os que têm problemas de coluna, como uma escoliose, por exemplo, ele oferece resultados impressionantes. Foi justamente depois de ver a diferença na coluna de uma colega que estava morando em Nova Iorque que Alessandra Tegoni se interessou em saber o que era Pilates. “Sou formada em dança clássica. No início dos anos 90, estava fazendo aula e percebi que a coluna de uma bailarina, antes desalinhada, estava muito melhor. Perguntei o que ela tinha feito e, pela primeira vez, ouvi falar em Pilates.” Alessandra ficou tão impressionada que em 1992, já formada em fisioterapia, mudou-se para a Big Apple. Lá, fez a formação no estúdio de Romana Krysanowska, discípula de Joseph Pilates e herdeira de sua escola. “Foi amor à primeira vista. Passei 6 meses fazendo o curso de forma intensiva, estudando e praticando oito horas por dia. Adquiri controle, consciência e bem-estar. Uma dor com a qual eu convivia diariamente sumiu.” Dois anos e meio depois, de volta a Porto Alegre, Alessandra abriu o primeiro estúdio do Pilates original no Brasil: o Studio Ballance. Em 1997, nossa cidade tornou-se pioneira em Pilates.

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Saúde


PORTO ALEGRE FOI PIONEIRA EM PILATES NO BRASIL, NO ANO DE 1997 Diferentes linhas Apesar de parecer moderninha, sou meio tradicional em algumas coisas. Então prefiro o Pilates clássico, exatamente como Joseph criou. Mas o mundo é tão flexível quanto ele e surgiram algumas variações. Hoje, são cinco linhas, três delas existentes no Brasil, duas em Porto Alegre. A linha Studio Pilates é a original, seguida pelo Studio Ballance e pelo GR Pilates, que defendem exatamente o que seu mestre pregou. Entre as regras básicas, está a de que as aulas devem ser individuais ou em dupla, no máximo duas vezes por semana (quem está bem avançado pode fazer até três) e com poucas repetições nos exercícios. Joseph Pilates dizia que, ao fazer muitas vezes o mesmo movimento, o cérebro entra no sistema automático e perdemos a consciência do corpo. Já a linha Polestar é um pouco diferente. Lilianne Green Hagemann é professora de educação física, fisioterapeuta e sócia do Physio Pilates, estúdio e centro de formação que segue essa linha. Ela me contou que, nas aulas ministradas em seu estúdio, não existem regras, cada caso é um caso e é o próprio aluno que define a quantidade de repetições. “O instrutor deixa a pessoa ir até o seu limite, quando ela começa a sair do prumo é hora de parar aquele movimento.” Na Physio Pilates, as aulas podem ser em grupos de até seis alunos, de vez em quando rola música (na linha original, quanto mais silêncio, melhor) e dá pra

PILATES NA PRÁTICA

GR PILATES: 3029-8083

fazer aula até quatro vezes por semana. “Também não quero que o Pilates fique massificado, temos que prezar a qualidade, jamais a quantidade”, defende Lilianne, que tem cerca de 50 alunos em seu estúdio. No Brasil, além da Studio Pilates e da Polestar, existe a Phisical Mind, que é mais voltada para a reabilitação. As linhas Yoguelates e Stott Pilates, segundo me informaram, não chegaram por aqui. O investimento Fazer Pilates é, literalmente, um investimento em nós mesmos, ou seja, não é barato. E até os donos dos estúdios concordam que nem todos podem pagar. “Pilates é a única coisa que bailarino consegue fazer além de balé, só que, no Brasil, os profissionais da dança ganham pouco e não têm condições de praticar”, diz Alessandra Tegoni. Na verdade, é mais caro do que a mensalidade de uma academia, mas mais barato do que uma sessão de terapia. Sem contar que você pensará duas vezes antes de matar uma aula. E se for um aluno dedicado e tiver um instrutor que o “puxe”, seu corpo mudará em poucos meses. Ou seja, você terá a certeza de que o investimento valeu a pena. Ontem, por exemplo, foi a glória. Eu consegui, pela primeira vez na minha vida, encostar a testa inteira nos joelhos, mantendo as pernas esticadas. Você tem idéia do que é isso para quem, três meses atrás, não colocava as mãos nas pontas dos pés sem dobrar os joelhos? I love Pilates.

PHYSIO PILATES: 3321-2622

STUDIO BALLANCE: 3022-6912 Estilo Zaffari

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Gula


Campeãs de audiência

ABERTURA MILENE LEAL TEXTOS FERNANDA DOERING FOTOS CRISTIANO SANT’ANNA

Tem gente (como eu, por exemplo) que ao receber um cardápio de restaurante vai direto ao final, pra coringar as sobremesas. Prato principal, comida salgada? Ah, depois a gente vê... Pois os adoradores de doces têm lá suas preferências (algumas singelas taras, digamos). Esta reportagem revela as receitas dos objetos de desejo de dez entre dez formigões. Conversando com eles, elegemos cinco sobremesas “campeãs de audiência”: pudim de leite condensado, quindão, petit gateau com sorvete, mousse de chocolate e cheese cake. É claro que nossa pequena lista não esgota o elenco de oscarizados. Mas, dentre sobremesas tradicionais e outras mais moderninhas, essas cinco são unanimidade. Para fornecer as receitas, fomos procurar quem

entende do riscado. Duas mulheres que não têm na culinária a sua profissão, mas que são famosas pelas delícias que aprontam na cozinha. E três restaurantes de Porto Alegre que elaboram com maestria essas sobremesas e corroboram com números o acerto das escolhas que fizemos. Os doces selecionados são os mais pedidos em cada um desses estabelecimentos. Quem discordar da nossa eleição que se manifeste. Prometemos dar continuidade à série com a reportagem “campeãs de audiência 2”, acatando as sugestões dos leitores. Mas que ninguém venha com doce de laranja azeda, arroz-de-leite, doce de mamão e outros itens controversos. Só valem receitas que não vão fazer ninguém, mas ninguém mesmo, virar a cara. Bom proveito!


Gula

Pudim de Leite Condensado 2 LATAS DE LEITE CONDENSADO 2 MEDIDAS DE LATA DE LEITE 4 OVOS INTEIROS 2 COLHERES (SOPA) DE MAISENA

Modo de fazer: Coloque todos os ingredientes no liquidificador até misturá-los bem. A fôrma utilizada deve ser alta, própria para pudins. Para caramelá-la, leve-a ao fogo brando e use 10 colheres de açúcar. Coloque, então, o líquido do pudim no recipiente da fôrma e leve ao fogo por aproximadamente 30 minutos, em banho-maria. Deixe esfriar um pouco, antes de levar tudo ao refrigerador. Melhor tirar o pudim da fôrma no dia seguinte. Na fôrma – já vazia –, um pouco de água sobre o caramelado dará uma calda que pode cobrir o pudim. Em caso de dificuldade para tirar o pudim da fôrma, passe-a rapidamente pela chama do fogão.

LOIVA BALDI LOIVA ROSA BALDI É GAÚCHA, NATURAL DE ESTAÇÃO LEÃO, NO MUNICÍPIO DE DOM PEDRITO, E VEIO MORAR EM PORTO ALEGRE AOS 9 ANOS DE IDADE. HOJE, CASADA HÁ 49 ANOS, TEM CINCO FILHOS – QUATRO MOÇAS E UM RAPAZ – E SETE NETOS. POR TER COMEÇADO A TRABALHAR MUITO CEDO, LOIVA NÃO SE TORNOU UMA ESPECIALISTA NA ARTE DE COZINHAR: “NÃO ME CONSIDERO UMA PESSOA FANÁTICA PELA CULINÁRIA, MAS SE ME PROPONHO A IR PARA A COZINHA FAÇO TUDO BEM DIREITINHO, COM TODO O CUIDADO E CARINHO”. MUITAS DAS DELÍCIAS QUE COMPÕEM A SUA MESA SÃO RETIRADAS DE REVISTAS DE GASTRONOMIA OU DE RECEITAS DIVULGADAS NOS RÓTULOS DOS MAIS VARIADOS PRODUTOS: “TENHO MUITA FACILIDADE EM APRENDER NOVAS IDÉIAS. E, AO SEGUIR AS RECEITAS, DOU O MEU TOQUE ESPECIAL”. UMA DAS EXTRAVAGÂNCIAS DE QUE LOIVA NÃO ABRE MÃO SÃO OS JANTARES REALIZADOS EM SUA CASA, UMA VEZ POR SEMANA: “SÃO UMA EXCELENTE OPORTUNIDADE PARA REUNIR A FAMÍLIA, E, POR ISSO, SEMPRE FAÇO UM PRATO MAIS ESPECIAL”. AS RECEITAS DEGUSTADAS NESSAS OCASIÕES SÃO AS PREFERIDAS DOS PARENTES MAIS CHEGADOS. É O CASO DO FILÉ AO FORNO COM BACON E MOSTARDA: “O PESSOAL COME TUDO. NÃO SOBRA UM PEDACINHO SEQUER”. ENTRE AS SOBREMESAS, ALGUMAS JÁ FORAM ELEITAS COMO AS MAIS DELICIOSAS: “MEU PUDIM DE LEITE CONDENSADO JÁ É UMA TRADIÇÃO FAMILIAR. TODO MUNDO ADORA. MAS EU TAMBÉM FAÇO UMA AMBROSIA DE DAR ÁGUA NA BOCA”.



Gula


Petit Gateau com Sorvete 3 OVOS INTEIROS 3 GEMAS 100 G DE AÇÚCAR 100 G DE FARINHA DE TRIGO 200 G DE CHOCOLATE MEIO-AMARGO 125 G DE MANTEIGA SORVETE DE CREME Modo de fazer: Na batedeira, bata os ovos inteiros, as gemas e o açúcar. Derreta em banho-maria o chocolate e a manteiga. Quando a mistura da batedeira estiver parecida com uma gemada, retire-a do recipiente e junte-a com a outra. É preciso misturar à mão. Depois, coloque nas forminhas já untadas com manteiga e leve para assar em forno convencional por apenas oito minutos. Essa sobremesa fica deliciosa se for acompanhada de sorvete.

SANDUÍCHE VOADOR O SANDUÍCHE VOADOR É UM ESPAÇO ACONCHEGANTE, DIFERENTE, ACOLHEDOR, LOCALIZADO NO CORAÇÃO DO MOINHOS DE VENTO, UM DOS BAIRROS MAIS CHARMOSOS DE PORTO ALEGRE. O CARDÁPIO DA CASA É SUPERPERSONALIZADO E OFERECE PETISCOS, PRATOS SOFISTICADOS, SALADAS, QUICHES E CAFÉS. TUDO EM UM AMBIENTE PECULIAR, COM TOQUES DO UNIVERSO DOMÉSTICO. OS ORIGINAIS SANDUÍCHES, QUE DERAM NOME AO BISTRÔ, JÁ SÃO TRADICIONAIS E FAZEM SUCESSO ENTRE OS CLIENTES MAIS FIÉIS. O LUGAR TRAZ TAMBÉM UMA EXCELENTE CARTA DE VINHOS. A QUALIDADE DOS DELICIOSOS PRATOS SERVIDOS NO SANDUÍCHE VOADOR TEM UM SEGREDO ESPECIAL: É SUPERVISIONADA DE PERTO PELA PROPRIETÁRIA DÓRIS GROSSMAN, COM O AUXÍLIO DE SUA AMIGA MARTA FEDRIZZI. PARA AGRADAR AO PÚBLICO QUE FREQÜENTA O BISTRÔ, DÓRIS E MARTA GOSTAM DE TESTAR E EXPERIMENTAR SABORES, CRIANDO NOVOS PRATOS E PRIORIZANDO A HARMONIA DOS INGREDIENTES. A IDÉIA É OFERECER RECEITAS SABOROSAS E TAMBÉM SAUDÁVEIS, DANDO UM TOQUE ESPECIAL AO DIA-A-DIA DOS CLIENTES.

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Gula

Cheese Cake de Amora MASSA 250 G DE BISCOITO DE MAISENA 100 G DE MANTEIGA / CANELA RECHEIO 3 OVOS / 400 G DE CREAM CHEESE 1 LATA DE LEITE CONDENSADO 1 LIMÃO / GELÉIA DE AMORA Modo de fazer: Transforme o biscoito em uma farinha usando o liquidificador ou um processador de alimentos. Junte a manteiga e a canela. Misture até obter uma farofa. Com a ajuda das costas de uma colher, molde a massa até forrar toda a forma. Em um recipiente, misture os ovos, o cream cheese, o leite condensado e o limão. Leve ao forno baixo e asse por aproximadamente 35 minutos. Retire do forno e coloque a geléia sobre a torta. Volte ao forno por mais 5 minutos. Deixe esfriar, retire da fôrma e sirva gelado.

ARMAZÉM VENTURA O ARMAZÉM VENTURA, LOCALIZADO NO BAIRRO BELA VISTA, FOI INAUGURADO EM MAIO DE 2003 E JÁ CONQUISTOU UMA CLIENTELA FIEL. SOB O COMANDO DE HUGO BAZILONI, MARCELO DAMACENO FERREIRA E ISABELA COIMBRA, É UM LUGAR DIFERENCIADO E ECLÉTICO, POIS OFERECE DIVERSAS OPÇÕES GASTRONÔMICAS E DE ENTRETENIMENTO EM UM MESMO AMBIENTE. AO MEIO-DIA, BUFFET COM DIVERSOS PRATOS QUENTES E FRIOS. À TARDE A CASA SE TRANSFORMA EM UMA ACONCHEGANTE CAFETERIA, ATÉ AS 18H30, OFERECENDO DELICIOSAS SOBREMESAS: TORTAS DE MOUSSE DE MARACUJÁ COM CHOCOLATE, DE CAFÉ COM CHOCOLATE, DE LIMÃO E AS FAMOSAS CHEESE CAKES DE AMORA E DE GOIABA, AS PREFERIDAS DA CLIENTELA. AO ENTARDECER, O ARMAZÉM VENTURA VIRA UMA ÓTIMA OPÇÃO DE HAPPY HOUR. A PARTIR DAS 20H O LUGAR PASSA A SERVIR JANTAR À LA CARTE, COM UMA VARIEDADE DE FILÉS, PEIXES E MASSAS INCREMENTANDO O CARDÁPIO.



Gula


Mousse de Chocolate 200 G DE GORDURA HIDROGENADA 160 G DE MANTEIGA 300 G DE AÇÚCAR 7 GEMAS / 240 G DE CHOCOLATE EM PÓ MERENGUE 7 CLARAS DE OVOS / 100 G DE AÇÚCAR C LO S D U M O U L I N PARA DECORAR RASPAS DE CHOCOLATE BRANCO

Modo de fazer o mousse: Bata a gordura hidrogenada, o açúcar e a manteiga por uns 15 minutos na batedeira, em velocidade máxima, até dobrar o volume. Junte as gemas e deixe bater por mais 10 minutos. Em seguida acrescente o chocolate em pó meioamargo, sempre batendo. Junte a mistura ao merengue, mexendo delicamente de baixo para cima. Leve para refrigerar por aproximadamente 45 minutos. Para a sobremesa ser montada em bolas é preciso usar uma colher de sorvete, que deve ser molhada em água quente cada vez que for mergulhada na mousse. Também pode ser servida em taças individuais com raspas de chocolate por cima. Modo de fazer o merengue: Numa batedeira, coloque as claras e vá batendo. Adicione o açúcar aos poucos e, quando estiver em ponto de suspiro, acrescente na mistura.

O MELHOR DA COZINHA MEDITERRÂNEA ESTÁ NO RESTAURANTE CLOS DU MOULIN, ABERTO DESDE A INAUGURAÇÃO DO SHERATON PORTO ALEGRE HOTEL, EM 6 DE JULHO DE 2001. O LUGAR, JÁ CONSAGRADO NA CAPITAL GAÚCHA PELOS SEUS FESTIVAIS GASTRONÔMICOS E JANTARES TEMÁTICOS, CONTA COM O TRABALHO DO CHEF MAURO DE SOUZA, QUE ESTÁ HÁ 17 ANOS NA REDE SHERATON E, DESDE MARÇO DE 2003, EM PORTO ALEGRE. ALÉM DAS ATIVIDADES GASTRONÔMICAS JÁ TRADICIONAIS, O CLOS DU MOULIN OFERECE TAMBÉM O JAZZ BRUNCH, SERVIDO NO ALMOÇO DOS DOMINGOS. ESPECIALIDADES DA CULINÁRIA MUNDIAL E A MELHOR SELEÇÃO DE STANDARDS DO JAZZ INCREMENTAM O CARDÁPIO. O ALMOÇO OFERECE ILHAS GASTRONÔMICAS COM PRATOS COMO SALMÃO INTEIRO COM TERRINES, PEIXE À FIORENTINE, TIMBALE DE ATUM COM ABACATE, ESTAÇÃO DE SUSHI E SASHIMI, ESTAÇÃO DE SALADAS, PERNIL DE JAVALI AO MOLHO DE ACEROLA, ESTAÇÃO DE SOBREMESAS, ENTRE OUTRAS DELÍCIAS. O RESTAURANTE CONTA COM UMA REFINADA CARTA DE VINHOS, DISPONDO DAS MELHORES CASTAS FRANCESAS, ITALIANAS, ALEMÃS, AUSTRALIANAS, NEOZELANDESAS E TAMBÉM GAÚCHAS, ORIGINADAS DO VALE DOS VINHEDOS, DE BENTO GONÇALVES E OUTRAS REGIÕES PRODUTORAS. OUTRA EXCELENTE OPÇÃO GASTRONÔMICA DO SHERATON É O BISTRÔ PORTO ALEGRE, UMA CASA TEMÁTICA DECORADA COM FOTOS ANTIGAS DA CAPITAL GAÚCHA. O CARDÁPIO É À LA CARTE E OFERECE RECEITAS DE SEIS GRANDES CHEFS BRASILEIROS.

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Gula

Quindão ½ KG DE COCO RALADO ½ KG DE AÇÚCAR 18 GEMAS

Modo de fazer: Coloque o coco em uma tigela grande e peneire as gemas por cima. Mexa bastante e acrescente o açúcar. Depois de muito bem misturado e batido, deixe descansar por uma hora. Após esse tempo, derrame a massa na fôrma grande (com buraco no meio), untada com manteiga e açúcar cristal. Deixe descansar por duas horas, período que o coco leva para ficar no lugar certo. Depois, leve a fôrma tapada ao forno quente, em banho-maria, por uma hora. Em seguida, deixe fora do forno por 30 minutos. Retire da fôrma direto para o prato.

MARIEL KRAEMER DE ARAÚJO DESDE PEQUENA, MARIEL KRAEMER DE ARAÚJO SEMPRE DEU UM JEITINHO DE ESTAR ENVOLVIDA NAS FUNÇÕES DE COZINHA. ASSIM, APRENDEU MUITO COM SUA MÃE, PRINCIPALMENTE SOBRE A CULINÁRIA ALEMÃ. COM O PASSAR DO TEMPO, FOI APRIMORANDO SEU CONHECIMENTO GASTRONÔMICO: “NUNCA ME GUIEI MUITO POR RECEITAS JÁ PRONTAS. GOSTO MESMO É DE EXPERIMENTAR, DE TESTAR OS SABORES E CRIAR MEUS PRÓPRIOS PRATOS”. DURANTE CINCO ANOS MOROU EM NOVO HAMBURGO E DEDICOU-SE A DAR AULAS DE CULINÁRIA PARA PEQUENOS GRUPOS DE ALUNOS: “APRENDI BASTANTE NESTA ÉPOCA, POIS TROCÁVAMOS MUITAS RECEITAS E INFORMAÇÕES”. DE VOLTA A PORTO ALEGRE, MARIEL TRABALHOU COMO AGENTE DE VIAGENS DURANTE 20 ANOS: “QUANDO ME APOSENTEI, DECIDI QUE ERA O MOMENTO CERTO PARA ME DEDICAR A DUAS PAIXÕES QUE SEMPRE TIVE: A CULINÁRIA E A PINTURA”. NA COZINHA, MARIEL DEU VAZÃO A UM FASCÍNIO ESPECIAL POR DOCES: “ADORO CHOCOLATES E TORTAS. E NÃO GOSTO DE FAZER NADA MIÚDO. PREFIRO SOBREMESAS GRANDES, BEM DECORADAS, BONITAS, VISTOSAS, AQUELAS QUE ENCHEM OS OLHOS. MINHAS RECEITAS JÁ SÃO TRADICIONAIS NA FAMÍLIA. ONDE QUER QUE EU VÁ, LEVO UM DOS MEUS DOCES E O SUCESSO É GARANTIDO”. MARIEL CONFESSA QUE UM DOS SEGREDOS DE SUAS DELÍCIAS ESTÁ NA ESCOLHA DOS INGREDIENTES: “UMA RECEITA DEVE CONTER PRODUTOS DE QUALIDADE. É PRECISO TER CUIDADO NA HORA DE ESCOLHER”. ENTRE AS SUAS ESPECIALIDADES ESTÃO O QUINDÃO, TORTAS DE CHOCOLATE, DE LIMÃO, DE FRUTAS E DE MORANGO COM PAPO-DE-ANJO.


(con) vivências R U Z A

A M O N

HOMENS ENFIM LIVRES Eles finalmente permitem que nós os vejamos de perto Querem saber de um programa que eu só consigo fazer em Porto Alegre? Ir ao teatro e depois tietar nos camarins (quando conheço os atores, é lógico). Pois enquanto eu tietava no camarim da peça Os Homens de Perto, o ator Zé Victor Castiel me definia os três personagens do enredo como homens destituídos de qualquer artifício psicológico, convivendo com suas atrapalhações e incompetências. Em decorrência da gradativa perda de poder da categoria masculina, se transformaram em homens bem mais autênticos, “que já não se importam nem mesmo com o fato de serem feios”, resumiu Zé Victor. Vencidos pela hegemonia feminina? Não! Exemplos de homens enfim livres, pensei. Livres para ser o que realmente são. Livres dos ternos acinzentados, dos cintos de trissé, dos truques para disfarçar a calvície, da frase “fala com o teu pai”, da pinta de quem sabe tudo. Livres para usarem calças capri, camisa cor-derosa, passear com cachorrinhos minúsculos e ver a novela das oito. Libertos, e ainda por cima premiados com a descoberta de que continuam sendo desejados pelas mulheres, do mesmo jeito de antes (se não ainda mais). Por outro lado – na mão contrária, para ser exata –, nós mulheres temos estado bem empenhadas em parecer

diferentes do que realmente somos, investindo em recursos plásticos de toda a ordem. Mega Hair, silicone, unhas de porcelana, lentes de contato, bronzeamento artificial e clareamento nos dentes até podem ser técnicas novas, mas não é de hoje que bebemos de fontes alternativas à “beleza natural”. O que me parece novo é o clima de obrigatoriedade, o sentimento de estarmos sendo pressionadas a usá-las, prisioneiras desesperadas de uma gincana estética sem fim. Afinal, estaríamos buscando ser mais desejadas, mais invejadas, mais respeitadas ou mais poderosas? Daqui a pouco, todas nós teremos uma carteirinha, parecida com aquela das vacinas infantis, com a descrição dos procedimentos, data de vencimento e espaço para o carimbo. Quem não preencher sua cartela estará fora do jogo. (Prometo cumprir todas as etapas, mas por favor me deixem pular as que envolvam agulhas!) Livres estão os homens desde que se permitiram ser vistos de perto. Com o lema “Sou assim, e daí?”, eles atiraram para cima os grilhões e, por mais irônico que possa parecer, nunca antes estiveram tão vaidosos.

RUZA AMON É JORNALISTA

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Casa

CONVIDE SEUS AMIGOS PARA UMA DEGUSTAÇÃO DE AZEITES. ELES NUNCA VIRAM NADA IGUAL POR

R E J A N E

W I L K E

F OTO S

L E T Í C I A

Provavelmente você já foi convidado para algum tipo de degustação: de queijos, sopas, comidas típicas de várias nacionalidades ou bebidas como vinhos, chás ou cachaças. Mas um convite para uma degustação de azeites é coisa rara. Pois esta repórter, afortunadamente, viu-se diante da inusitada oportunidade de apreciar um desfile das variadas configurações aromáticas de que um azeite de oliva é capaz. O cenário para a performance foi a casa de amigos muito amados, em Lisboa, Portugal. Mas se você quiser oferecer a seus amigos uma noite gastronômica intensa e original, não é nada difícil preparar uma degustação de azeites. E aproveite para dar uma verdadeira aula sobre o assunto. Seguindo as sugestões a seguir, você poderá se transformar num expert em poucos minutos!

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R E M I Ã O

Antes de mais nada, os portugueses são rigorosos quanto ao vocabulário: quando se fala em azeite, é sempre o de oliva; quando se trata de outros produtos, como os de soja, girassol, milho, etc., será óleo. Segundo eles, azeite de soja, por exemplo, não existe. Nem óleo de oliva. Então, vamos respeitar o exato sentido das palavras. Azeites têm sabor, servem para temperar. Óleos não têm sabor nem cheiro, servem como condutores de calor, para fritar. Isso em Portugal, e no Brasil por tabela. Mas se formos levar ao pé da letra, que outro nome daríamos para a sagrada – e consagrada – combinação alho e óleo, inventada pelos italianos, e feita invariavelmente com azeite de oliva? Como se vê, discussões semânticas, embora importantes, são intermináveis. Mas agora o que interessa é a nossa degustação.



Casa

AZEITES, QUEIJOS, PÃES, VINHOS. ESTES SÃO OS O ritual e seus personagens Uma degustação que se preze terá que ter no mínimo quatro tipos diferentes de azeite de oliva. A composição básica desse repertório leva azeite puro e aqueles aromatizados com alho, ervas finas e pimentas. Você pode usar um único tipo de azeite – claro que de excelente qualidade, porque ninguém faria uma degustação com azeites inferiores, é lógico – e preparar as três versões: ao primeiro você acrescenta alho triturado, ao outro, uns toques de orégano, manjericão, alecrim, salsa, hortelã ou alguma outra erva de sua predileção e ao terceiro você junta uma mistura de alguns tipos de pimenta: do reino, malagueta, calabresa ou da Jamaica, em doses parcimoniosas, evidentemente, pois ninguém quer ver seus convidados chorando. Mas a degustação vai muito além dos azeites. A cerimônia deve começar com um Caldo Verde, a tradi-

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cional sopa portuguesa de batata e couve cortadinha em fios tão finos que parecem cabelo! O caldo funciona, digamos, como um lastro para o que virá a seguir. O desfile prossegue com a tábua de queijos, geralmente uma equilibrada combinação de suaves ou adocicados (como brie e os esburacados suíços), defumados (provolone) e picantes (parmesão). Pães não podem faltar. Escolha pelo menos uns três tipos diferentes, ao gosto dos convidados. Disponha a tábua de queijos, os pães e as pequenas tigelas, cada uma com um tipo de azeite, e pronto! Cada convidado pega um pequeno pedaço de pão e encharca-o no azeite preferido, levando-o à boca com calma, respirando fundo, para poder usufruir todas as deliciosas sensações provocadas pelo contato desse verdadeiro milagre de aromas e sabores com suas mucosas. A degustação não será completa se não estiver subli-


QUATRO ELEMENTOS-CHAVE DA DEGUSTAÇÃO nhada por um bom vinho, português ou – suprema provocação! – espanhol. Nenhuma regra determina o tipo de vinho. Tintos ou brancos são bem-vindos, dependendo do paladar dos comensais, da estação do ano ou da sua criatividade. E atenção: se você quiser garantir sua hidratação bebendo água, faça isso antes de começar a degustar os azeites. A água não “limpa” a boca entre um azeite e outro, até porque, como se sabe, água e gordura são incompatíveis. Deixe que as propriedades adstringentes do vinho se encarreguem disso. Entre dois nacos de pão devidamente impregnados de azeite sorva sem pressa um gole de vinho, e os sabores dos azeites não se misturarão. Vinhos e doces Por fim, não esqueça de reservar um lugar especial para as sobremesas. Portuguesas, com certeza. Meus ami-

gos serviram toucinho do céu de Guimarães e pão-de-ló com doce de ovos de Alfeizerão, mas pode-se acrescentar ambrosia, que em Portugal se chama encharcada, ovos nevados, que eles chamam de farófias, ou a divina pasta de amêndoas que atende pelo nome de siricaia. Para arrematar essas doçuras todas, um vinho do Porto. Os bons azeites têm bouquet, como os vinhos Alexandre Rodrigues, engenheiro de gestão industrial especialista em azeites, explica que, no que respeita ao sabor, existem mais de 50 características possíveis de serem detectadas ao se provar um azeite de oliva: “Pode ser amargo, picante, frutado, pode ter traços de terra, madeira e outros componentes”. Também existem variações de cor, espessura e cheiro. “Os azeites têm bouquet, como os vinhos.” Além dessas, há as características químicas, como

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Casa

O AZEITE DE OLIVA DE QUALIDADE SUPERIOR É teor de acidez, de cera, de absorvência, e também a questão de como a luz é absorvida ou refratada pelo produto. Rodrigues conta que, de acordo com a mais recente legislação da Comunidade Européia, os azeites são classificados em três categorias: virgem extra, virgem e refinado. O virgem extra é obtido unicamente por processo mecânico e tem acidez máxima de 0,7%. “As azeitonas são selecionadas, trituradas, e o óleo vai se depositando no fundo, para então ser filtrado”, explica Rodrigues. “É o azeite de qualidade superior”. Já o azeite de oliva virgem é aquele que, apesar de extraído pelo mesmo processo, não alcança igual padrão de pontos nos testes. Sua acidez pode chegar a 0,8%. O azeite classificado como refinado também é extraído por processo mecânico, mas de azeitonas com maior teor de acidez. “Isso depende muito das condições do clima,

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do solo e das chuvas”, esclarece o consultor, acrescentando que esse tipo passa por um processo químico de refinamento para baixar a acidez. Até há pouco tempo os azeites refinados podiam chegar a 1,5% de acidez, mas a nova legislação limitou essa taxa a um máximo de 1,0%. Apesar disso, Alexandre Rodrigues faz questão de observar que a baixa acidez não é tudo. “Antigamente se pensava que bastava ter baixa acidez para ser um azeite de qualidade superior. Hoje se sabe que isto não basta.” E dá um exemplo: “Um refinado com acidez de 0,5% continua sendo inferior a um virgem extra com 0,7%.” Outro detalhe controverso é a questão da temperatura. “Algumas pessoas ainda se preocupam em descobrir se um azeite foi extraído a quente ou a frio. Esse critério já não faz diferença. Hoje a maioria dos azeites é extraída a uma temperatura abaixo de 27 graus”, afirma Rodrigues.


OBTIDO EM PROCESSO UNICAMENTE MECÂNICO Diferenças culturais Portugueses e espanhóis têm hábitos e costumes diferentes na hora de usar os azeites. Enquanto em Portugal as frituras são feitas com óleo, na Espanha frita-se com azeite de oliva. À mesa, os espanhóis adoram derramar azeite por cima de saladas cruas, o que não acontece com seus vizinhos portugueses. O mesmo acontece com o pão dos aperitivos e couverts: na Espanha usa-se o azeite, e em Portugal prefere-se a manteiga. Segundo Rodrigues, o azeite de oliva praticamente não tem colesterol, ou se tiver, será um teor muito baixo, e é responsável pela fama da dieta alimentar da região em torno do mar Mediterrâneo, reconhecida como uma das mais saudáveis do mundo. E embora Portugal seja um dos principais produtores e exportadores, a Espanha detém um folgado primeiro lugar. Além desses dois países, Itália,

França e Grécia fazem parte do time dos grandes do setor. Não por coincidência, as regiões produtoras de azeitonas também produzem uvas, daí resultando essa feliz convivência entre azeites e vinhos. A razão é simples: ambas as culturas não exigem muita água nem solos ricos em nutrientes, adequando-se a regiões secas e áridas, de base calcária. Graças a essas condições climáticas especiais, os habitantes desses países gozam do supremo privilégio de consumir azeites de oliva de excelente qualidade a preços acessíveis. Sem distinção de classe, todos derramam doses abundantes no prato em todas as refeições, desde o café da manhã, para inveja e gozo dos viajantes brasileiros, que aproveitam para se vingar daquelas parcimoniosas latinhas com furo feito com alfinete, nos restaurantes do lado de cá do Atlântico.

PRODUÇÃO DA MESA E DOS ALIMENTOS FOTOGRAFADOS: DÓRIS GROSSMAN, BISTRÔ SANDUÍCHE VOADOR Estilo Zaffari

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Perfil

Comida com ~

emoçao QUANDO VOCÊ ENTRA NO RESTAURANTE DO CHEF ALEX ATALA, O D.O.M., TEM A SENSAÇÃO DE QUE ESTÁ NUM LOCAL VERDADEIRAMENTE ADULTO E ESSECIALMENTE EUROPEU. DECORAÇÃO SÓBRIA DE RUY OTHAKE EM TONS BERINJELA E MARROM E POLTRONAS DE COURO. AOS POUCOS, ALGUNS DETALHES INTRIGANTES SE REVELAM. SÃO FLECHAS INDÍGENAS, PEÇAS DO ARTESANATO AMAZÔNICO E MÚSICA BRASILEIRA NO AR. ASSIM COMO O RESTAURANTE QUE COMANDA, O CHEF PAULISTANO TEM CARA DE GRINGO, MAS AO FALAR SE MOSTRA MAIS PARA PASTEL DE FEIRA DO QUE PARA FOIES GRAS IMPORTADO. FRITA OS ESTEREÓTIPOS. JÁ FOI DJ DE UMA DAS BOATES MAIS FAMOSAS DE SÃO PAULO, TRAZ TATUAGENS PELO CORPO E FUMA. COMEÇOU A COZINHAR AOS 19 ANOS, VIAJOU O MUNDO E, AOS 36, FAZ SUCESSO NO PAÍS E NO EXTERIOR COM UMA COZINHA INVENTIVA DE NOTAS BRASILEIRAS – ESTILO EM QUE POUCOS COLOCAVAM FÉ. ATALA FOI O PRIMEIRO CHEF BRASILEIRO A DAR AULAS NA ESCOLA FRANCESA LE CORDON BLEU. HOJE, ELE PASSA PARTE DO SEU DIA NA FRENTE DO FOGÃO, O ENTARDECER COM OS TRÊS FILHOS E OUTRO TANTO CONVENCENDO JORNALISTAS DE QUE NADA TEM DE CELEBRIDADE – EMBORA SEJA RECONHECIDO COMO UMA.

POR LU C I A NA

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S T E I N

FOTOS A N G E L A

FA R I A S



Perfil MEU MAIOR OBJETIVO É CAUSAR EMOÇÕES ATRAVÉS DO SABOR. E ATIVAR O INTELECTO DO COMENSAL

O QUE VOCÊ PERSEGUE COM A SUA COZINHA? A gastronomia é aparentemente simples: é você pegar todo o seu conhecimento, todo o seu equipamento e colocar a favor de um prato e de um ingrediente. Mas meu objetivo maior é causar emoções através do sabor – assim como ativar o intelecto do comensal. O momento que persigo é aquele em que meu cliente diz: “Ah, eu nunca comi isso com aquilo, que curioso”, ou diz: “Ah, isso me remete à infância”. Um pouco da idéia do meu restaurante é propor essa viagem a um lugar onde você nunca foi antes, ou trazer de volta um passado. A cozinha tem essa possibilidade de te levar a um lugar ou a um momento da tua vida, de te transportar.

O que aconteceu é que, até aquele momento, aquele bolinho era a maior emoção que uma comida te causou. Depois vieram outras. Tudo que você comer na vida passa por esse parâmetro que vai sendo construído desde a infância.

COMO SE CONSEGUE ISSO NA PRÁTICA? Através das combinações que você faz. Por exemplo, servimos bacalhau com couve e feijão preto – uma estrutura complexa que traça uma relação entre Brasil e Portugal. Ou ainda carpaccio de palmito fresco com vieira e molho de coral – uma estrutura de prato asiático, mas feito de uma maneira muito própria, que quando você coloca na boca ele te remete ao Amazonas. São misturas inusitadas como a sopa de cogumelos com tucupi – ali se costura um viés comum entre o tucupi e o cogumelo. Você se lembra – ou imagina – do cheiro de bosque, a floresta, o húmus, daquele aroma de algo fermentado das folhas que caem no chão. São mensagens muito subliminares, mas acredito que as pessoas percebem isso de alguma forma.

QUANDO A GENTE COMEÇA A COMER BEM, PODE ACONTECER ALGO CURIOSO. VOCÊ PODE COMEÇAR A REJEITAR CERTOS PRATOS QUE NÃO FORAM TÃO BEM FEITOS. ISSO ACONTECE COM VOCÊ? VOCÊ RECLAMA QUANDO COME ALGO NÃO ESTÁ COMO GOSTARIA? Eu como com emoção e acho que é uma tremenda emoção entrar num boteco e comer uma queijadinha – daquelas de pote. O meu restaurante é um lugar gastronômico, mas esse meu objetivo gastronômico não é o único e não pode deturpar a minha relação com o alimento. Além do mais, a base da minha cozinha são produtos muito populares, feijão, mandioca, frutas brasileiras, quiabo, jiló, preparados talvez de uma maneira sofisticada. Tudo que é bem feito é bom.

VOCÊ SE LEMBRA DAS MELHORES COISAS QUE JÁ PROVOU? O sabor depende do registro das nossas memórias. Todo mundo tem uma memória de infância. É um bolinho da tia, da vizinha, da vó, um biscoito, um sorvete. Acho que muitas pessoas já passaram por isso: anos depois procuram um sabor, provam, e ele não causa mais a mesma emoção. O paladar é um sentido que a gente desenvolve na vida, mas que é afetado pelas nossas memórias de infância. Não é que aquele bolinho não era o melhor do mundo.

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NA VERDADE A GENTE PASSA O TEMPO TODO COMPARANDO OS SABORES DOS BOLOS QUE A GENTE PROVA QUANDO ADULTO COM A LEMBRANÇA DO BOLO DE CHOCOLATE DA MÃE? Acho que sim. Tipo: “Ah, isso é quase tão bom quanto um Chicabon”, ou “tão bom quanto o bolinho da minha avó”. O que tento fazer é que as pessoas, ao comer no meu restaurante, se emocionem do mesmo jeito que acontece quando comem um bolinho da vó.

PODE-SE FAZER TUDO NA COZINHA? Acho que, de certa maneira, a gastronomia é perversa e libidinosa, com jeitinho você faz tudo. VOCÊ TEM UM MENU FIXO NO RESTAURANTE. COMO FAZ PARA NÃO DEIXAR A AVENTURA DA COZINHA DE LADO? É uma experimentação constante. Somos 23 cozinheiros e quase todo dia discutimos e experimentamos. Pensamos se o sorbet, por exemplo, com mais um grau – mais derretido – poderia servir melhor a uma sobremesa. Ou se,



Perfil ACHO QUE A COZINHA É UM DOS MAIORES ELOS ENTRE A NATUREZA E A NOSSA CULTURA

mais consistente, não seria mais adequado para uma salada. É uma equipe constantemente buscando inovações. COMO VOCÊ SE RELACIONA COM OS SEUS COZINHEIROS E COM SEUS FORNECEDORES? Na minha cozinha, hoje a paz reina. Mas aviso: o chef vive uma dualidade tremenda. Ele tenta não ser chato, mas sabe que tem de ser exigente. A gente trabalha com duas linhas de pressão, o relógio e a perfeição. Tenho um relacionamento muito estreito com meus fornecedores – eles conhecem o meu grau de exigência com o alimento. Prefiro que eles me liguem de madrugada para me dizer que o peixe não está bom e me sugiram opções, em vez de me apresentarem algo que não está fresco. Eu pago para ter um peixe fresco. Se o peixe estiver mais ou menos fresco e eu aceitar, sou eu que estou dando um novo padrão – por isso sou exigente. No entanto, eu sofro pouco com isso hoje em dia. Sofro mais com a parte administrativa do restaurante. VOCÊ PROCURA TER CONTROLE DA SITUAÇÃO NA COZINHA E COM SEUS FORNECEDORES. O QUE ESCAPA DO SEU CONTROLE? Tanta coisa! Uma coisa é um cliente sentar numa mesa com fome – outra, é sem fome. Uma coisa é você servir um prato a alguém que está almoçando com uma companhia agradável. Outra coisa é servir alguém que está comendo com um chato. A recepção do prato depende de mil fatores. São circunstâncias externas à cozinha, mas que comprometem uma refeição. Por exemplo, se o dia está quente, a cebola e as ervas podem sofrer alterações. A natureza está sempre em mudança e ela se comunica com a gente. Acho que a cozinha... um prato... é um dos maiores elos entre a natureza e a nossa cultura. VOCÊ SENTE QUE SUA COMIDA MUDA DE SABOR QUANDO VOCÊ COZINHA INDISPOSTO? Se eu não estou bem na cozinha, me afasto. Essa semana foi muito pesada. Dormi muito pouco. Há dois dias, quando o restaurante estava cheio e a cozinha estava ten-

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sa, eu disse para os meninos que estava indo lá para o fundo, porque não me sentia bem, meus reflexos não estavam 100%. Preferi fazer uma tarefa de fundo, como ajeitar uma erva, tornear um legume. Quem não está bem não trabalha. Um prato é uma produção em cadeia – cheia de variáveis incontroláveis. A gente monta uma cozinha para o almoço, mas não sei se virão 20 ou 50 pessoas. Não sei se todos comerão peixe ou se nenhum comerá peixe. E eu preciso vender um cardápio de maneira homogênea, senão tudo estraga. Com tudo isso, procuro me manter estável, mas às vezes não consigo. ALÉM DO RESTAURANTE VOCÊ TEM UM PROGRAMA NO CANAL GNT. ESTÁ FELIZ COM O PROGRAMA? Gosto porque tenho a chance de conversar um pouco com as pessoas. Eu não foco na receita em si, mas sim no processo, no preparo. A cozinha criativa se baseia na cozinha clássica. E todas as receitas da cozinha clássica estão na internet. O que vai fazer a diferença é a compreensão da receita. O que transforma uma boa receita num prato excepcional é entender o que você está fazendo, entender como a panela trabalha com o fogo. Acho legal explicar essas coisas para as pessoas. COMO É SEU DIA? Eu chego no DOM às 9h30 ou 10 h, no máximo 11h – se der tudo errado na minha manhã. Não consigo sair antes das seis da tarde. Das seis às oito eu vou para casa ficar com as crianças. Meu dia é efetivamente melhor se eu ficar ao menos uma hora com eles. Volto às oito da noite para o restaurante e tenho mais seis ou oito horas de trabalho pela frente. VOCÊ COSTUMA IR A OUTROS RESTAURANTES? Isso é algo de que me penitencio um pouco. Devia ir com mais freqüência, mas quando chego lá me sinto sempre trabalhando. Quando me dou conta, estou de olho no serviço, na qualidade da cadeira. Gosto do Fasano, do Café



Perfil DE CERTA MANEIRA, A GASTRONOMIA É PERVERSA E LIBIDINOSA. COM JEITINHO VOCÊ FAZ TUDO

Antique, ou vou numa churrascaria. Às vezes vou a lugares simples sem pretensão gastronômica e me alimento criativamente lá. Num dia desses, pedi uma berinjela e ela veio um pouquinho queimada. Ela estava meio amarga. Talvez aquele prato não estivesse bom, mas aquela berinjela queimada me rendeu uma idéia. Por isso acho que a cozinha é perversa e libidinosa: você pega algo que pode estar horrendo, mas que se trabalhado de outra maneira pode ser interessante. Sou um grande freqüentador de feira de rua, de quitanda. Tenho uma história curiosa sobre isso. Uma vez, uma jornalista insistiu muito em fotografar minha casa. Eu não quis. Não é meu estilo. E daí ficou uma situação chata, porque parecia que eu queria esconder a minha casa. Eu falei: “Ok, se você acha que eu estou escondendo, você vai conhecer a minha casa”. Ela foi e saiu de lá superdesapontada. É uma casa com todas as coisas de uma casa normal. Tem panela torta, uma geladeira normal. Eu passo o dia numa cozinha fenomenal, vou ter outra cozinha profissional em casa por quê? Tudo demais faz mal. Não sou um viciado em gastronomia. Sou um profissional de gastronomia. O QUE VOCÊ ACHA QUE AS PESSOAS ESTÃO QUERENDO DA COZINHA HOJE? A cozinha é muito popular, a cozinha virou pop. E chefes se tornaram celebridades... Cozinheiros não podem esquecer que são artesãos que transformam o alimento numa manufatura. ESSA MANUFATURA MUDOU MUITO ATRAVÉS DOS TEMPOS? Acho que talvez a cozinha seja uma das mais estáveis manufaturas. Os métodos de cozimento não se transformaram muito. Fritar é fritar – e se frita do mesmo jeito desde que o mundo é mundo. A tecnologia pode dar conforto, mas o processo é o mesmo. O que se teve são trocas e díalogos entre as culturas. Eu já vi gente dizendo: “Ah, eu fui no restaurante do Alex e... era só comida”. O que a gente

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faz é só comida! Loucura é achar que você vai ao restaurante de um chef e vai comer coisas muito diferentes. São os pequenos detalhes que podem fazer algo extraordinário. Quando estou na praia, adoro provar os pastéis de todas as barraquinhas. Por que um pastel é melhor do que os outros? Daí que contam a emoção e a técnica pessoal. ONDE VOCÊ FICA ENTRE ESSES DOIS MUNDOS? Eu sou mais técnico, mas o resultado que eu busco não é a técnica perfeita, mas sim a emoção. Eu só engesso os processos de preparo quando eu acho que eles são fundamentais para conseguir a harmonia da mão experimentada – eu não posso deixar um ajudante de cozinha errar até aprender, eu tenho de dar um caminho a ele. NA SUA OPINIÃO, QUAL É O LUGAR DO LUXO NA COZINHA? Essa é uma questão sobre a qual eu brigo muito. O que é mais luxuoso, você abrir uma lata de caviar ou você assar legumes e com as lágrimas que correm você fazer o molho do prato? O luxo para mim está no artesanal. Vamos falar em termos de moda: Gucci e Hèrmes foram celeiros. Eles foram profissionais do couro, que com a excelência de seu trabalho criaram grifes. A essência do luxo não é o quanto você paga, mas a sensibilidade do artesão. Nos anos 2000, o maior luxo é ser autêntico. COMO ESSA AUTENTICIDADE SE REFLETE NA GASTRONOMIA? Isso é bem engraçado. Parece que só hoje eu posso usar ingredientes tidos como triviais no meu cardápio – antes as pessoas poderiam achar “pobre”. Só hoje posso usar sardinha. Essas coisas simples, que são a essência da gastronomia, é que me encantam. Me encanta pensar num ingrediente simples e nas versões que ele pode ter. Uma manteiga gelada num pão quente, uma manteiga macia num pão crocante. Ou, ainda, quando você queima uma manteiga e ela ganha aquelas notas de amêndoas, ou mesmo comer aquele milho queimado que sobrou da pipoca...



AS COISAS SIMPLES, QUE SÃO A ESSÊNCIA DA GASTRONOMIA, É QUE ME ENCANTAM VIEIRAS, LULAS E FOIE GRAS SOBRE PALMITO AMAZÔNICO COM MOLHO DE CORAL 8 VIEIRAS 1 RAIZ-FORTE FRESCA 60 G DE FOIE GRAS 32 FATIAS FINAS DE PALMITO PUPUNHA 120 G DE LULA / 20 G DE ALGA MARINHA HIJIKI 24 FOLHAS DE ESTRAGÃO FRESCO 10 ML DE AZEITE DE ERVAS* 10 ML DE AZEITE DE OLIVA 10 ML DE AZEITE DE MANJERICÃO* 20 ML DE EMULSÃO DE SHOYU SAL MALDON PIMENTA-DO-REINO MOÍDA NA HORA SALSINHA PICADA FINO CIBOULETTE PICADA FINO / MOLHO DE CORAL*

MOLHO DE CORAL

Corte a lula em anéis finos e mergulhe-os em água fervente por cerca de um minuto e, a seguir, na água fria, para que o choque térmico interrompa o cozimento. Coe e reserve. A seguir hidrate a alga marinha em água fria por dois minutos. Escorra e misture-a com os anéis de lula. Tempere com azeite de ervas, ciboulette, salsinha, azeite, sal e pimentado-reino. Divida a vieira ao meio e recheie-a com raiz-forte. Para a montagem, corte as vieiras em 3 lâminas e sobre cada uma coloque um pouco de raiz forte. Comece a montagem intercalando as lâminas de palmito com as lâminas de Vieira, formando uma torre. Finalize com as algas e as lulas temperadas, o foie gras e um risco do molho de coral, pimenta-doreino, a emulsão de shoyu e o azeite de manjericão.

AZEITE DE MANJERICÃO 1 MAÇO DE MANJERICÃO DE FOLHAS GRANDES (BASILICÃO) 300 ML DE ÓLEO DE CANOLA

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100 ML DE SUCO DE LIMÃO / 50 ML DE MOLHO SHOYU 90 G DE CORAL Esprema o suco de limão, misture com os outros ingredientes e bata no liquidificador. Passe a mistura por uma peneira fina.

AZEITE DE ERVAS 30 G DE SALSINHA / 10 G DE SÁLVIA 10 G DE TOMILHO FRESCO / 5 G DE ORÉGANO 15 G DE ALECRIM / 500 ML DE AZEITE DE OLIVA EXTRAVIRGEM Separe as folhas dos talos e descarte-os. Pique todas as folhas sobre uma tábua e misture ao azeite. Aqueça essa mistura a 80ºC por cinqüenta minutos no termomix ou por duas horas no fogo baixo em banho-maria.

Coloque as folhas de manjericão em água fervente por trinta segundos. Coe as folhas e rapidamente coloque-as em água gelada, a fim de interromper o processo de cozimento. Esse procedimento garante uma cor mais viva ao azeite. Coe e delicadamente aperte as folhas para retirar o excesso de água. Leve as folhas e o óleo ao liquidificador e bata por aproximadamente um minuto. Passe o conteúdo para uma panela e aqueça (sem ultrapassar 80ºC) por dez minutos. Retire do fogo, espere esfriar e coe no chinois fino. Rendimento: 4 porções.



Assim, ó... L U Í S

A U G U S TO

F I S C H E R

MEIO SÉCULO DE FEIRA DO LIVRO Também no mundo editorial o RS é mais ou menos separatista Em números redondos e aproximados, referentes aos últimos anos: durante pouco mais de duas semanas, a cada ano, a Feira do Livro de Porto Alegre vê um milhão de pessoas passarem pelas alamedas de barracas, na Praça da Alfândega, e comprarem mais de 400 mil livros. Dá mais de 20 mil livros por dia (mas no conjunto, um livro para duas pessoas). De todo modo, é número para impressionar qualquer um. Ali está um mercado consumidor de verdade, concreto, visível. E é um mercado interessante desde a primeira edição, 50 outubros atrás, em 1955. Desde que acanhadas 14 barracas levantaram suas folhas e expuseram seus livros, a Feira foi concebida para alcançar justamente o não-leitor, o leitor apenas potencial, que não freqüenta a livraria durante o ano, que compra pouco e lê pouco. Daí nasceu um divertido e sintomático mal-entendido, que a cada edição se repete: gente mais intelectualizada gostaria que a Feira do Livro de Porto Alegre tivesse entre os best-sellers apenas livros de alta qualidade, e por isso fica frustrada ao ver brilharem os nomes de autores secundários, os livros de auto-ajuda, os esotéricos da moda. Mas é justamente essa venda que faz a Feira ser a Feira. Não há nem haverá público que compre, em 15 dias, 400 mil exemplares de Dostoiévski ou de Salinger, de Machado de Assis ou de Erico Verissimo. A Câmara Rio-Grandense do Livro, entidade que organiza a Feira, é em si mesma um sintoma interessante para pensar o fenômeno: como em tantos outros campos de atividade, econômica ou simbólica, também no mundo editorial o Rio Grande do Sul é mais ou menos separatista; os editores e livreiros do estado não se contentaram em ser filiados à genérica Câmara Brasileira do Livro, tendo mesmo chegado a abrir litígio com ela. Daí terem deliberado por uma organização autônoma, hoje em paz com a instituição nacional. É o único caso de Câmara regional em todo o Brasil. Em boa parte, os livreiros e editores sul-rio-grandenses apenas respondem a uma velha determinação histórica, legada por gerações e gerações de pensadores, políticos, escritores e gentes em

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geral: ser diferente do brasileiro, ser singular, ser autônomo. No caso concreto, essa diferença se expressa em números: o Rio Grande tem média de consumo anual de 2 livros por habitante, simplesmente o dobro da média nacional, estando fora dessa conta os livros didáticos. Nada que possa se comparado às médias de países de cultura letrada antiga, mas ainda assim um bom desempenho. No Rio Grande do Sul, livro existe e faz sentido, por alguns motivos que podem ser apontados com relativa facilidade. Primeiro: a vontade de ser diferente do país, o que gera a demanda pela reflexão e pela simbolização dessa circunstância, e produz inteligência por escrito. Segundo: a tradição letrada de boa parte dos imigrantes, especialmente os de alguma confissão luterana, para quem Deus conversa diretamente com cada fiel, de maneira que cada indivíduo precisa habilitar-se na leitura das palavras que ele supostamente proferiu ou pelo menos inspirou. Terceiro: o legado republicano, presente pelo menos desde a década de 1830, acentuando-se a partir dos anos de 1860, quando simbolicamente erigiu-se a Sociedade Partenon Literário, em Porto Alegre, que além de cultivar as letras instaurou escola de alfabetização para adultos. Quarto: a boa tradição governamental gaúcha, que desde muito tempo atrás espalhou e espalha escolas pela geografia do estado, pelo menos desde a Primeira República. Não se trata de nenhuma maravilha, é certo. O estado conta umas 200 livrarias (e mais de 500 municípios). Na ponta negativa, vale a pena lembrar que 85% dos municípios não conhecem nenhuma loja de livros, e boa parte deles sequer dispõe de uma simples biblioteca pública. Muito falta fazer para levar o livro até os cantos do estado e da cidade. Mas a Feira nos dá esperança de que isso vai acontecer, de que em algum momento vamos integrar todos no mundo da leitura. A Feira é um breve êxtase, que sempre deixa um gosto de mundo melhor. LUÍS AUGUSTO FISCHER É PROFESSOR DE LITERATURA E ESCRITOR




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