ESCOLA PORTUGUESA DE MOÇAMBIQUE
-
CENTRO DE ENSINO E LÍNGUA PORTUGUESA
10 contos
ANO V
.
NÚMEROS 29-30
.
DEZEMBRO 2005 / JANEIRO 2006
FESTA DE NATAL
. JORNAL MENSAL
Homenagem a MALANGATANA
separ at a separat ata
destaques Festa de Natal Homenagem a
8-9
Malangatana (separata) 1 - 16 Dia Mundial de Luta 7 contra o SIDA Doação de sangue 8
EDITORIAL
A EPM-CELP EM FOCO notícias curtas
Dezembro e Janeiro são dois meses emblemáticos do nosso calendário gregoriano, pois marcam o fim de um já longínquo princípio e o princípio de um novo recomeço, que há-de terminar, por sua vez, inevitavelmente, daqui a mais doze meses, num novo fim aberto ao futuro princípio. Este nosso número do Pátio das Laranjeiras é bem o exemplo desta dialéctica, pois, sendo um número duplo, traz informações de Dezembro, do Ano Velho, e notícias de Janeiro, do Ano Novo. Do Dezembro do Ano Velho, temos, por exemplo, a Festa de Natal e a Separata sobre a Homenagem a Malangatana. Do Janeiro do Ano Novo, podemos destacar, de entre outras hipóteses, a Tertúlia Literária sobre Noémia de Sousa ou a Recolha de Sangue efectuada pelo Banco de Sangue de Moçambique, efectuada na escola, que, em si mesmo, é também um bom símbolo para o recomeço. Recomecemos, então, o nosso trabalho!
Almoço de confr a ter nização Realizou-se o tradicional almoço de Natal, no dia 14 de Janeiro, no Pátio das Laranjeiras. Neste almoço, estiveram presentes todos os funcionários desta Instituição (docentes e não docentes) e todos contribuíram para a confecção das entradas, pratos principais e sobremesas. Dado que a nossa Escola é caracterizada pela sua humana riqueza multicultural, não é de espantar a multiculturalidade das iguarias degustadas e apreciadas. Todos puderam, deste modo, comprazer-se com os portugueses e saborosos pastéis de bacalhau e bacalhau à Gomes de Sá, com as apetitosas e indianas chamussas, com o colorido arroz briany, com o frango estufado à moda de Goa, com a matapa e xima moçambicanas, entre outros manjares. A sobremesa também foi variada e colorida. Parabéns aos cozinheiros e aos pasteleiros!!! Foi um momento de camaradagem, onde todos conviveram e puderam desfrutar de uma pausa para se divertirem e dançarem na Escola. Alguns professores recém- chegados, neste ano lectivo, aprenderam a bailar algumas tradicionais danças moçambicanas.
notícias curtas Reunião do Conselho Directivo da EPM-CELP com os seus alunos
Educar para a cidadania, responsabilidade e autoreflexão No sentido de promover a educação para a cidadania, responsabilidade e auto reflexão, mais uma vez o Conselho Directivo da Escola convidou os seus alunos para uma reunião, que se realizou no Auditório Carlos Paredes, nos dias 10 e 11 de Janeiro, com a seguinte agenda de trabalho: análise do aproveitamento e comportamento e cumprimento do regulamento interno. Nesta reunião estiveram presentes, para além dos membros do Conselho Directivo, representados pela Presidente, Drª Albina Santos Silva e pela Engenheira Manuela Jacinto, os alunos do 2º, 3º ciclos e secundário, os professores da turma, a coordenadora dos diferentes níveis de ensino, Drª Margarida Vaz e a Psicóloga da Escola, Drª Alexandra Melo.
Orlando da Costa O Dr. Orlando da Costa, escritor com vasta obra publicada e que nos deu o gosto de o escutarmos no I Simposium faleceu vítima de doença prolongada. À família enlutada apresentamos as nossas sentidas condolências.
Bem-vindos a 2006.
Auditório Carlos Paredes
Salas para Formação
176 lugares / Palco / Bastidores Sistema de tradução simultânea Projecção de vídeo / DVD em ecrã gigante Ar condicionado Sistemas de som e de iluminação Ao seu dispor. Contacte-nos.
110 computadores Internet Impressão de documentos Projecção de vídeo Digitalização Ar condicionado Ao seu dispor. Contacte-nos.
2
A EPM-CELP EM FOCO notícias curtas Tertúlia literária
E as conversas com arte acontecem … Aconteceu no sábado, dia 21 de Janeiro, pelas 15 horas, a terceira iniciativa da tertúlia literária que a Escola Portuguesa de Moçambique, através da Área Disciplinar de Língua Portuguesa, tem dinamizado, neste ano lectivo. É uma iniciativa que tem como objectivos principais: cultivar o gosto pelas literaturas de expressão portuguesa, dar a conhecer autores lusófonos, assim como as linguagens e mundividências por eles veiculadas. Esta actividade, que pretende ser um espaço de dinamização cultural e troca de ideias sobre diferentes tipos de arte, prestará homenagem à poetisa moçambicana, Noémia de Sousa, que nasceu a 20 de Setembro de 1926, na Catembe, Maputo. Tem um único livro publicado “Sangue Negro”, em 2001.
notícias curtas
notícias curtas
primeiro ciclo ao secundário, em participar neste concurso aliciante deverão falar com os seus professores de Já dizia o poeta “Todo o mundo é Língua Portuguesa. composto de mudança” e, como não Observatório de Qualipodia deixar de ser a nossa Escola dade na não escapa a estas mudanças próEPM-CELP prias da vida e do ser. Foi por isso, que, por motivos pes- Pretende-se que a Escola preste soais e profissionais, se foram em- os melhores serviços e por isso bora alguns funcionários, a referir: tem que, constantemente, se Maria do Céu Pacheco e Kalina reconverter de modo a responder Boudorova, professoras do 1º Ciclo às mudanças do mundo e da sociee de da disciplina de Matemática do dade. Citando Juan Carlos Pedesco 2º e 3º Ciclos, respectivamente; e “… exige-se que a escola e a socieainda Galina Vassileva, funcionária dade se transformem num local de técnico- administrativa. emancipação e mudança social.” É também por isso que novos coleFoi por isso que a EPM-CELP criou gas chegaram: Maria Alice Pereira, um Observatório de Qualidade, neste Sandra Alves e Alexandre Areias e , ano lectivo. Neste observatório estão ainda, Sandra Anjo e João Silva. a trabalhar os professores Dr.ª PieSejam bem-vindos e que a vossa dade Pereira e o Dr. Raimundo estadia seja bem passada. Tembe. O Projecto Observatório de Qualidade é uma estrutura que pretende de forma continuada e sistemática, realizar exercícios de auto-avaliação, procedendo a uma reflexão crítica. Serve para ajudar a Escola a compreender e utilizar técnicas de gestão de qualidade de modo a melhorar o respectivo desempenho, pretendendo a autoregulação e melhoria do seu desempenho. Normalmente, a qualidade da escola é medida de uma forma atomizada e incompleta, tendo em conta apenas os níveis de sucesso/insucesso esOlimpíadas colar dos alunos e o desempenho dos de Português seus profissionais. A qualidade da esA segunda fase das Olimpíadas de cola tem a ver com a forma como toPortuguês decorreram nos dias 23 dos os dias toda a comunidade escoa 27 de Janeiro. É uma actividade lar desempenha as suas funções, promovida pelo grupo disciplinar de como cada pessoa se enquadra na língua portuguesa que visa, princi- EPM - CELP e vê o seu papel dentro palmente, desenvolver o convívio dela e contribui para a melhoria do clientre turmas, despertar o interesse ma e cultura institucional. pela gramática e pelo uso correcto É, portanto, objectivo deste projecto, da língua portuguesa, como tam- criar uma cultura de auto-avaliação da bém estimular o espírito crítico e a escola e a sua interiorização na coprática de investigação. munidade educativa, envolvendo no Os alunos interessados, desde o processo todos os seus actores, alunos, famílias e trabalhadores.
Eis os que partem, eis os que chegam
3
O SUOR DE QUEM ESTUDA Área Disciplinar de Filosofia
Porque nem só do pão vive o Homem... Os trabalhos que a seguir se apresentam, foram elaborados por alunos/as no horizonte da disciplina de Filosofia do 10º ano de escolaridade do ensino secundário. Entendo/entendemos que a paixão pelo ensino se cumpre plenamente na tarefa diária de encaminhar a alma dos mais jovens para o “sítio de onde vem a luz”. Trata-se apenas de um “encaminhamento” para que possam pressentir a necessidade de se ultrapassarem continuamente a si mesmos. Termino referindo as sábias palavras de George Steiner: “A recompensa significativa de um professor é conseguir incitar os alunos que descobre a serem mais capazes do que ele, cujos talentos, por seu turno, deverão gerar obras para além das suas». PG Escrevo para poder partilhar ou ao menos registar um sentimento que muitas vezes me atormenta e arrelia. Ao compreender “A Alegoria da Caverna” de Platão revivi momentos, não raros, em que nas várias discussões que tive (e tenho) sobre temas infinitos experimentei uma ligeira frustração ao perceber a futilidade em que muitos vivem e não sabem. Tentei descortinar as razões pelas quais grande parte das pessoas, se não a maior parte vive de forma supérflua aceitando tudo que a sociedade impõe ou transmite sem reflectir. E compreendi que mesmo antes do ser humano separar-se do cordão umbilical já é influenciado por tudo o que o rodeia, a cultura, a religião e a mentalidade. Mentalidade essa, que ao crescer irá desenvolver-se de acordo com os ensinamento transmitidos, de acordo com educação dada. Embora perceba isto, acredito que todos nós por mais presos que estejamos à nossa condição socio-cultural, podemos reaprender a olhar o mundo. Mas para isso há que desaprender o aprendido e duvidar do certo. Acredito que quanto mais maturidade vamos ganhando mais nos sentimos pequenos perante a grandeza do conhecimento que há sempre por vir e aprendemos com cada situação que nos surja, por mais simples que pareça. Somos um grão na imensa areia cósmica. Por vezes quando olho para as pessoas que me rodeiam repito para mim mesma que não quero cair na mesma existência banal e na mesma vida mecânica, de quem vive porque assim tem de ser. As pessoas são cada vez mais medíocres, ficam-se pelo básico e perdem a sede de conhecer. Entusiasmo-me com tudo e sempre que descubro algo sinto uma vontade enorme de poder passar o pouco que sei , sensação que se confronta com a impotência que muitas vezes sinto ao observar a falta de vontade e a pouca abertura que as pessoas tem para ouvir outras ideias, contemplar outros raios do mesmo sol e assim poderem crescer. Sinto que muitas vezes as pessoas consomem opiniões, não digo que tenha sido
diferente comigo, mas aprendi a mastigar antes de engolir. As pessoas têm ideias tão fixas e tão certas que antes de ouvirem outra opinião já a consideram errada, são lineares e fechadas em si mesmas, no seu contexto. Porque teremos de pensar todos de igual maneira? os nossos olhos são diferentes, as nossa vivências são distintas e por isso as ideias também ... temos é de compreende-las e absorver o que de positivo elas tem para irmos sempre construindo diferentes opiniões próprias sobre o mesmo assunto, analisando as diferentes situações em que ele se pode enquadrar. Tive a sorte de nascer numa casa onde o debate e a discussão construtiva estiveram sempre presentes. Hoje vejo que as pessoas levam a discussão sempre no sentido negativo e quem surge com uma ideia diferente e tenta argumentar é sempre acusado de querer ter razão ou de se achar superior. Lembrome nitidamente de ouvir comentários do género: “Como gostas de discutir, queres sempre ter razão...” Desgasta-me conversar com pessoas que acham que uma discussão trata-se de ganhar ou perder, ter ou não ter razão, porque para mim a discussão, dependendo da forma como é feita, é um modo de crescimento, de captação de novos e diferentes pensares, e todos ganhamos e vencemos. Mas é necessário procurar argumentos que sustentem as nossa ideias, o que muitas vezes não é feito, as pessoas criticam tudo e mais alguma coisa sem antes analisarem o panorama e compreenderem o problema. Essa crítica destrutiva irrita-me imenso, frequente na realidade em que vivo, a realidade moçambicana. Existe nas pessoa um desejo de destruir as outras, para se sentirem menos infelizes com a infelicidade dos outros. Na minha opinião a critica é essencial, é o moinho do avanço, é aquilo que quando feito de forma positiva ajuda-nos a crescer. Isto é: para se criticar positivamente é preciso identificar o problema, as suas causas e consequências
4
e o mais importante encontrar soluções e alternativas. Criticamos, reclamamos de tudo e responsabilizamos os outros pelas nossas frustrações. Todos nós culpamos factores externos pelos nossos fracassos, se chumbei foi porque o professor não era bom, se o país está assim é por causa do sistema, se me deixo subornar é porque estou insatisfeito com o meu salário. Sabemos que dificuldades existem muitas, mas nem por isso nos devemos acomodar. Para nos sentirmos mais aliviados e para não assumirmos responsabilidades apontamos sempre mil e umas justificações. Esquecemos que a nossa vida são as nossas decisões e o nosso esforço, esquecemos que o país não é só o governo e, sim, todos os que fazem parte do país, e como disse uma escritora, queremos tanto mudar o mundo e esquecemos que ele é o reflexo das nossas atitudes. Por isso, todos nós devemos olhar para as nossas vidas e com um espírito optimista decidir mudar de atitude e acreditar que essa é uma maneira de mudar o mundo. Muitos de nós não são nem felizes nem infelizes e, porque têm medo de sofrer evitam qualquer mudança e fecham os olhos a qualquer ideia que possa perturbar a tão conformista, cómoda e rotineira vida. Como não quero ser assim, digam o que disserem, viverei tudo intensamente sem medo de sofrer e defenderei as minhas ideias procurando não que os outros a aceitem mas que reflictam sobre as suas convicções. Irei sempre tentar aprender com tudo que me trouxer a vida, ser melhor e melhor e contribuir para um mundo com mais luz, mesmo que digam que sou uma idealista, sonhadora e que isso são “tretas”, que não adianta nada serse honesto ou ajudar os outros. Direi que os sonhos movem a vida e que assim como os escravos sonharam com a liberdade, lutaram por isso e morreram sem a ter, séculos depois ela chegou, e eu, sonharei com um mundo melhor lutarei por isso e ao morrer sei que vivi de forma plena porque vivi o que pensei. Tassiana Tomé, 10.º C
ESCOLHAS DA BIBLIOTECA O outro no nosso olhar Nada tem mais força do que uma ideia que se constitui como verdade. Pode dizer-se que nisto reside o poder das ideologias. Será abusivo dizer-se que a representação que temos dos árabes, do Islão, do Oriente se constitui como ideologia? Em caso afirmativo, como remontar à genealogia desta mesma representação? De que forma escritores como Flaubert, Chateaubriant, Lamartine, Nerval ou Marco Pólo incorporaram mais um anel a esta grande árvore de “conhecimento” a que chamamos orientalismo? Como é que esta noção de cultura distinta da nossa pode servir finalidades políticas como a guerra ou a dominação? Edward Said em Orientalismo e posteriormente em Cultura e Imperialismo analisa a génese e a constituição das representações ocidentais do Oriente e o papel desempenhado pela cultura na cristalização desta representação. Edward Said, autor de “Orientalismo” nasce a 1 de Novembro de 1935 na Palestina e morre a 25 de Setembro de 2003, nos Estados Unidos. Exilado após a 2ª Guerra Mundial, no Egipto e depois no Líbano, radica-se nos EUA aos 17 anos, onde desenvolve os seus estudos, doutorando-se em literatura comparada, pela Universidade de Harvard. Exerce a actividade docente, na Universidade da Columbia e publica várias obras dedicadas às relações entre o Ocidente e o Oriente, das quais se destacam Orientalismo (1977), Cultura e Imperialismo ( 1994). Em 1967 inicia a sua actividade política ligada à causa Palestina, no âmbito da qual publicaria vários livros e ensaios. Said é considerado um dos principais
pensadores de uma corrente de intelectuais, intitulada “subaltern studies”, constituída por historiadores, pesquisadores literários e críticos da cultura. Os trabalhos transdisciplinares destes investigadores sociais procuram subverter a ordem hegemónica dos textos fornecidos pelo Ocidente relativamente aos países sob a sua dominação política e cultural, dando a voz aos chamados “subalternos”. Orientalismo é o primeiro e talvez o livro mais relevante da obra de Said e constitui-se como o início de um trabalho de dissecação do discurso veiculado nalgumas das grandes obras literárias produzidas em França, Inglaterra e Estados Unidos da América nos séculos XVIII, XIX e XX, sobre o Próximo Oriente, o Islão e o Mundo Árabe. Tendo como suporte, a teoria do discurso de Foucault e as teorias sobre a hegemonia cultural de Gramsci, este livro, pretende examinar o orientalismo, enquanto discurso, nalguns autores como Chateaubriant, Flaubert, Lane, Michaelis. O orientalismo enquanto “saber sobre o oriente” baseia-se, para Said, na relação de poder, de cariz imperialista, do Ocidente sobre o Oriente, que permite que o primeiro fale pelo segundo, representando-o e construindo a sua imagem como contraponto da sua. A hegemonia cultural é a base sobre a qual ambas as partes “consentem” e justificam a dominação de uma sobre a outra. Desta forma, o conhecimento do Oriente, veiculado pelos autores ocidentais, ao invés de ser um conhecimento puro, constitui-se como instrumento político, ao cristalizar uma imagem do Outro, que faz perdurar uma relação hegemónica. Este livro serviu de suporte teórico a vá-
rias obras, entre quais destaco a Leitura do Obscuro, de Jorge Urrutia, publicada pela Editorial Teorema e que se debruça sobre o discurso acerca de África, presente na literatura de viagens dos primeiros navegadores espanhóis, e onde podemos descortinar estereótipos sobre os africanos que permanecem intactos nos nossos dias. Que o consentimento que possamos sentir ao ler Said nos faça questionar as nossas relações com o Outro! É o que pretende exprimir o autor ao afirmar “Nós, como bons académicos contemporâneos, lemos uma obra como Imperialismo e Cultura e entendemos perfeitamente a relevância do tema ali tratado. Em seguida, silenciamos diante do imperialismo a que estamos actualmente submetidos.” Orientalismo Edward W. Said, Livros Cotovia. T.N.
A EPM-CELP EM FOCO Biblioteca José Craveirinha tem nova disposição A tradição dita: na mudança do ano há que renovar. Não fugimos à regra até porque o número de livros vai sendo cada vez maior. Para recolocar os cerca de 10000 livros existentes e para os que estão para vir, a escola adquiriu novas estantes para a biblioteca.
5
Isto obrigou naturalmente a uma mudança na disposição do mobiliário, equacionando funcionalidade, conforto e segurança. E já que estamos em maré de mudança, vamos aproveitar este novo alento para dispor os livros de forma a incitar a leitura e a facilitar a consulta das obras existentes. T.N.
CENTRO DE FORMAÇÃO Formação Continua A professora Doutora Carolina Fernandes de Carvalho, no âmbito da formação contínua dos professores, leccionou o módulo, Desenvolvimento Sociomoral, de 11 a 25 de Janeiro.
Cooperação Dois biólogos da Universidade de Aveiro, Carlos Fonseca e Amadeu Soares visitaram a EPM – CELP tendo em vista uma futura cooperação cientifico – pedagógica inserida no projecto Pensas@Moz.
Orfanato Foi disponibilizada alguma ajuda material (material didáctico, lápis, esferográficas e cadernos) para o Orfanato Remar, situado na Matola.
Escola Nacional de Artes Visuais Pelo apoio que a EPM – CELP tem vindo a dar à Escola Nacional de Artes Visuais de Maputo, recebemos a seguinte carta do Director da ENAV. A Direcção da Escola Nacional de Artes Visuais vem por este meio agradecer todo o apoio que recebeu de V.Excias ao longo do ano que está prestes a findar e
renovar a vontade e interesse de ver esta importante relação de trabalho fortalecida, no ano 2006. Festas Felizes e próspero ano novo de 2006, são os votos sinceros de toda a comunidade Escolar das Artes Visuais.
ISFIC
Instituto Superior de Formação, Investigação e Ciência Uma nova instituição do Ensino Superior de direito privado moçambicano, ISFIC – Instituto Superior de Formação, Investigação e Ciência, está pronta a funcionar, provisoriamente nas instalações da EPM – CELP. Oferece os seguintes cursos: Educação e Serviço Social; Gestão de Empresas Turísticas; Gestão de Recursos Humanos; Marketing e Publicidade; Psicologia Social e do Trabalho. À nova instituição auguramos o melhor futuro e a maior longevidade.
Ponto de Vista do Leitor
Biblioteca Poeta José Craveirinha - uma luz ao fundo do túnel No dia 16 de Novembro, a Biblioteca Poeta José Craveirinha criou um espaço público para a população circunvizinha, do Bairro Polana Caniço B. Eis o testemunho de um dos seus frequentadores. “A Biblioteca Poeta José Craveirinha, da EPM-CELP brindou-nos com uma iniciativa brilhante – por ter aberto um espaço de leitura ao ar livre destinado à extensão pública. Esta iniciativa surge como uma luz ao fundo do túnel numa altura em que os estudantes e os leitores não compradores em geral, se têm servido como pretexto para justificar o percurso sinuoso das leituras da exiguidade de bibliotecas com livros imprescindíveis que sirvam de fundamento na efectuação de trabalhos de carácter investigativo e didáctico-científico. Com livros importantes constituídos por conteúdos interessantes esta biblioteca, que representa uma homenagem póstuma ao Poeta-Mor moçambicano José Craveirinha, insere-se na expansão do gosto pela leitura, uma vez que esta em relação
os e científicos. É de agradecer e congratular uma iniciativa do género cujo objectivo é tornar mais acessível o encontro com a sabedoria, contribuindo deste modo para o desenvolvimento cultural da sociedade. É neste âmbito que se combate a agnosia literária. Com a abertura deste espaço para a extensão pública deu-se um passo gigantesco e significativo para nós, os leitores. E assim sendo, o gosto pela leitura ganhará uma afirmação abrangente - os leitores passando a dispor de facilidade para se informaao paladar do saber, é o doce incor- rem sobre a vida e obra dos diversos ruptível. autores que recheiam o panorama Para os estudantes que não inte- literário lusófono.» gram a EPM-CELP, este prolongamento da Biblioteca é um gesto filantrópico muito estimulante, sem deiJoaquim Jorge Macie xar de ser um meio primordial para a Residente na Rua Carlos Cardoso - Polana Caniço aquisição de conhecimentos literári-
6
CENTRO DE RECURSOS EDUCATIVOS Produção gráfica, fotográfica e videográfica Nos meses de Dezembro e Janeiro foram pubicados, pelo Sector de Produção Gráfica e Publicações, o catálogo da exposição e uma brochura da Colecção Memórias & Educação, n.º 10, ambos referentes à Homenagem a Malangatana Valente Ngwenya, que a Escola organizou; foram concebidos, editados e impressos os “Pátios das Laranjeiras” 28 e 29-30, este último inclui uma separata; foi editado, em versão electrónica para posterior impressão, a revista Aprender Juntos n.º 6, que contém as actas do II Simposium Internacional, realizado em Abril de 2005; e, foram ainda concebidos e impressos 4 convites, 1 desdobrável, 2 brochuras, 4 cartazes e 2 posteres, além da reprodução de CD’s e DVD’s Rom e material diverso, que veicula a imagem da Instituição. No que toca ao Sector de Fotografia e Vídeo, foram efectuados 1057 registos fotográficos e 4 filmes / documentários de actividades realizadas.
Cartaz
www.edu-port.ac.mz No primeiro trimestre do corrente ano lectivo a página da Internet da Escola foi visitada por um total de 44 307 visitantes, tendo Outubro sido o mês de maior afluência. Ao longo do primeiro período a página foi sendo actualizada com notícias da Escola e do exterior, com links importantes, nomeadamente, os endereços de correio electrónico dos departamentos mais relevantes para a Comunidade, o Regulamento Interno, os horários, turmas, algumas fotos, entre outros. Houve uma constante actualização da “Última Hora” para que os utilizadores estivessem sempre a par das últimas e mais importantes novidades relacionadas com a Escola. Durante a primeira quinzena do mês de Janeiro foram colocadas na página fichas de avaliação e planificações das disciplinas de Inglês e Ciências Físico-Químicas e, ainda, alguns protocolos da Fábrica da Ciência. Foi igualmente feita uma actualização dos cartazes realizados pelo CRE durante o primeiro período.
Capa e contracapa do catálogo da Exposição de Pintura de Jacob Macambaco, na EPM-CELP
1 de Dezembro - Dia Mundial de Luta contra o SIDA No dia 1 de Dezembro, no âmbito do Dia Mundial da luta contra o SIDA veio à Escola uma delegação da Comunidade de Sant’Egídio, coordenada pela jornalista Paola Rolletta, dar uma palestra sobre a actividade que desenvolvem integrada no programa Dream (Drug Resource Enhancement against AIDS and Malnutrition). A Comunidade de Sant’Egídio é uma Organização não governamental com sede em Roma, que trabalha em todos os continentes com programas de cooperação para o desenvolvimento de defesa dos direitos humanos, de apoio e facilitação de processos de paz e de reconciliação. Moçambique é o primeiro país onde está a ser implementado o o programa DREAM, um dos múltiplos pro-
gramas de saúde pública coordenado por esta Organização. É um programa de luta global contra a infecção por HIV nos países com poucos recursos que inclui o controlo, prevenção e tratamento desta doença e está a ser implementado em Moçambique, Malawi, Tanzânia, Quénia, Guiné-Bissau, GuinéConacry e Angola. Este programa tem duas vertentes: a primeira consiste em impedir a progressão da infecção em pessoas vivendo com HIV – é chamada a terapia antiretroviral. A segunda consiste em impedir a propagação do vírus das mulheres grávidas para os fetos e das mães que amamentam para os
7
Memórias e Educação n.º 9
seus bebés Mais de dois terços das pessoas com HIV/SIDA, vivem em África. São dezenas de milhões de pessoas e só um número muito restrito (os que têm disponibilidade económica) têm acesso ao tratamento antiretroviral. O tratamento antiretroviral embora não cure a SIDA, permite que os doentes melhorem o seu estado geral, tendo uma qualidade de vida razoável. Desta forma, esta doença deixa de ser uma doença terminal. Assim, a prevenção da SIDA não pode ser vista de forma isolada do tratamento antiretroviral. A possibilidade de acesso a um tratamento é fundamental para que as pessoas se sensibilizem para a necessidade de conhecerem o seu estado de saúde relativamente ao vírus HIV, e tomarem as medidas adequadas. T.M. / T.N.
FOTOREPORTAGEM
8
A EPM-CELP EM FOCO O Natal na EPM – CELP O Grupo Pré – Escolar e o 1º Ciclo do Ensino Básico comemoraram o Natal realizando diversas actividades. O Bazar de Natal, que decorreu no “parrôt”, junto ao parque infantil, foi visitado por toda a comunidade educativa que não resistiu à compra dos enfeites elaborados pelos alunos com materiais de desperdício. Os meninos do Pré – Escolar e do 1º Ciclo também deliciaram os visitantes com as iguarias confeccionadas: rabanadas, aletria, arroz doce, entre outras. Os pais dos alunos do 3º ano assistiram à peça de teatro “O Pai Natal Guloso”, apresentada pelos seus educandos no Auditório Carlos Paredes e, posteriormente, deslocaram-se para o Pátio das Buganvílias onde foram encerradas as comemorações do Natal, com canções. Ao final da Festa não podia faltar o nosso “Gorducho Sensacional”. Quem é ele? Quem é ele? Claro…o nosso querido Pai Natal! A.M.A.
A verdadeira história do Pai Natal Embora o seu início tenha raízes religiosas, o “Velho” de cabelos brancos, com a barriga redonda e gargalhada rítmica foi aceite como símbolo da generosidade e da boa vontade do homem de maneira universal e laica. Eis uma boa oportunidade para descobrir como a história fez evoluir a vida e figura de São Nicolau até à de Santa Claus ou Pai Natal, sendo esta personagem, século após século, a ilusão do Natal em forma humana. Reza a história que o Pai Natal nasceu no ano de 350 d.C., em Patara. Actualmente, ninguém sabe ao certo onde é que o São Nicolau, outros dos nomes por que é conhecido, vive. Uns dizem que é na Noruega, mas há quem afirme que, afinal, reside na Finlândia e ainda há outros que dizem que ele mora, certamente, no Pólo Norte. Antes de estar directamente relacionado com as lendas de Natal, São Nicolau era conhecido por salvar marinheiros das tempestades e por oferecer generosos presentes aos mais pobres. Colaboração de uma encarregada de educação da Educação Pré-Escolar
Doar Sangue na EPM-CELP Ser-se generoso é preciso! Nos dias 24 e 25 de Janeiro, uma brigada do Banco de Sangue veio à nossa Escola recolher aquele líquido tão precioso! Não é a primeira vez que esta iniciativa tem lugar. Há quatro anos atrás, a Dra Patrícia fez a ponte entre o Banco de Sangue e a Escola Portuguesa de Moçambique e, desde essa altura, duas vezes por ano, alunos, professores e funcionários, maiores de 16 anos e saudáveis, podem contribuir para salvar algumas vidas humanas tão valiosas quanto as suas. Sabe-se que cada contributo de meio litro de sangue pode salvar dois adultos ou 3 crianças. Em conversa com a Dr.ª Patrícia Silva apercebemo-nos da enorme carência de sangue que os nossos hospitais têm. Diariamente, os médicos são confrontados com doentes acidentados necessitando de transfusões, doentes anémicos devido à malária e à má nutrição, doentes cancerígenos, hepáticos e hematológicos, todos eles necessitando de sangue para se salvarem. O Banco de Sangue, sediado no Hospital Central, recolhe e distribui o sangue pelas várias unidades sanitárias que efectuam transfusões. Os dadores podem dirigir-se directamente ao Banco de Sangue, mas, neste momento, isto não cobre as necessidades. Por esta razão, o Banco de Sangue possui unidades móveis que vão às escolas, quartéis, fábricas, angariar este líquido vital. O sangue é testado para HIV e outras doenças como a hepatite, e caso exista algum problema, este é comunicado ao dador. Nos dois dias em que durou esta iniciativa 50 pessoas doaram sangue. Saliente-se a generosidade dos alunos que estiveram em maioria. Será que a idade nos vai tornando mais insensíveis? T.N.
9
PÁGINAS COM HISTÓRIA A misteriosa figura de Lourenço Marques e o descobrimento da Baía da Lagoa
Excerto do Mapa de Cantino, 1502
A cidade que hoje conhecemos como Maputo, foi fundada com outro nome, Lourenço Marques. Reza a tradição que Lourenço Marques teria sido o primeiro português a desembarcar nestas terras. Seria piloto ou capitão da armada de Pedro Álvares Cabral ou de João da Nova, e que, numa das viagens para a Índia, aqui teria desembarcado em busca de água e víveres. Contudo, muito pouco sabemos realmente sobre a sua pessoa e sobre quem foi de facto o primeiro navegador a pisar estas terras. A primeira passagem de uma frota portuguesa pela costa oriental de África foi a de Vasco da Gama em 1498, viagem que culminou com a descoberta pelos europeus do caminho marítimo para a Índia e que permitiu o estabelecimento de contactos com os povos do Oriente e da costa oriental africana. Depois da viagem de Vasco da Gama, viajaram até à Índia, Pedro Álvares Cabral, que comandou a segunda armada e João da Nova, que liderou a terceira e muitas outras viagens se seguiram. A partir dessa descoberta estabeleceu-se uma carreira regular de comércio marítimo entre Lisboa e a Índia denominada Rota do Cabo. Sabemos que a Baía da Lagoa ou da Boa Morte (nome pelo qual era conhecida a actual Baía de Maputo) era já conhecida dos portugueses logo nos primeiros anos de navegação para a Índia. Um famoso mapa português, conhecido como mapa
de Cantino, considerado o mais antigo planisfério a incorporar uma visão do mundo que podemos chamar de moderna, ilustrava já em 1502 os três rios que nela desaguam - o Manhiça (actual Incomati), o rio da Lagoa, depois chamado do Espírito Santo e de Lourenço Marques (actual Umbeluzi)e o Maputo. Partindo deste facto e não tendo qualquer registo de que os navios de Vasco da Gama tenham tocado estas terras, supõe-se que teriam sido os navios de Álvares Cabral ou de João da Nova a fazer esta descoberta. No entanto, se não há nos cronistas nenhuma indicação ou informação sobre uma paragem da armada de Vasco da Gama por esta altura de costa, o mesmo se passa para a segunda e terceira armada. Se alguma coisa sabemos, com base nos textos vagos dos cronistas, é que a armada comandada por João da Nova não sofreu nenhum contratempo e navegou segura e regularmente reunida desde que saiu de Lisboa, a 5 de Março de 1501, e regressou da Índia a 11 ou 13 de Setembro de 1502. Com a armada de Álvares Cabral, pelo contrário, não sucedeu assim. A tempestade destroçou a frota, algumas naus afundaram-se, outras andaram perdidas e só voltaram a reunir-se ao almirante, seis delas, por altura de Sofala. Diogo Dias, por exemplo, perdeu-se completamente, andou em aventuras pela costa e Madagáscar tendo por fim regressado a Portugal. Assim, e embora a armada de Pedro Álvares Cabral não tenha tocado no Rio da Lagoa, a hipótese de que algumas dessas naus errantes tenham chegado até à baía não é de desprezar. A questão permanece até hoje em aberto –e, provavelmente, nunca chegaremos a saber quem foi o primeiro europeu a chegar à baía. Até à exploração por Lourenço Marques, quarenta anos mais tarde, não há notícia de relações com a baía nem, mesmo, de simples frequência dela pelos capitães da carreira da Índia. A Baía de Lourenço Marques ficava fora da linha normal de navegação, que entre Moçambique e o Cabo procurava afastar-se da costa, quer seguindo em linha directa entre a ponta sul de Madagáscar e o Cabo, quer pelo golfão, passado “por fora” de Madagáscar. Em 1544-1545, o capitão de Moçambique mandou Lourenço Marques, numa fusta, “descobrir dois rios que estavam além do Cabo das Correntes”, como nos diz uma carta de D. João de Castro, então Vice-rei da Índia ao Rei D. João III. Que motivo teria despertado tal interesse? Duas razões são possíveis: uma diz respeito à prosperidade do negócio do marfim, que ganhava cada vez continua na pág. seguinte
10
PÁGINAS COM HISTÓRIA (continuação da pág. anterior)
mais importância para o comércio. A notícia e o conhecimento da sua comercialização na costa da baía talvez tivesse chegado a Moçambique ou à Índia. Outra razão era a de que, já então, tivessem começado a aparecer na baía navios de outras nações. Seja o que for que tenha motivado a expedição, o que sabemos é que Lourenço Marques se deslocou, sozinho ou acompanhado por António Caldeira, no reconhecimento do rio da Lagoa em 1544-1545. Em resultado desta exploração, iniciou-se um longo período de trocas comerciais, sem nunca os portugueses terem aí fixado nenhuma feitoria ou aquartelamento. O comércio era feito entre os portugueses e os régulos locais, dentro dos navios ou com a vinda à terra da tripulação, realizando esta expedição anualmente ou de dois em dois anos. Certa tradição autóctone, que se presume de memória do primeiro contacto dos Rongas da baía com os brancos diz o seguinte: Um dia, o príncipe Mantimana, filho de Maromana, filho de Mpfumo, filho de Nlharúti que foi o invasor (vindo de Psatine, Swazilândia) das terras da baía, andava a passear na praia de Cá-Mpfumo e viu uma estranha coisa: um grupo de seres que vinham pela praia, com gestos como de gente – mas brancos! Mantimana cuidou que seriam bichos e correu à povoação. Juntou-se gente, discutiu-se e, por fim, aceitouse que tais seres eram, realmente, homens, embora brancos. Levaram-nos ao rei que lhes deu agasalho. Dias depois, gente do Tembe veio reclamar os homens brancos, os quais tinham morto Ncoro, rei do Tembe. Os de Mpfumo, porém, negaram-se a entregar-lhos.. Assim reza a história, infelizmente, as contradições e as falhas das tábuas genealógicas da casa de Mpfumo, recolhidas por vários investigadores, não nos permitem fixar, com suficiente aproximação, a data do acontecimento. De Lourenço Marques pouco mais sabemos. Em 1554 Lourenço Marques partiu da Índia para uma viagem à baía, onde não chegou por naufragar na costa. Em carta régia de 11 de Fevereiro de 1557 apresentam-no-lo como cavaleiro da casa d’El-Rei. Em recompensa pelos serviços prestados, Sua Majestade nomeia-o escrivão da feitoria de Cochim “por tempo de seis anos, posto que pelo regimento houvessem de ser três”. Nada mais se sabe. Para a geografia, Lourenço Marques não foi o descobridor da Baía da Lagoa, mas ganhou para a história o lugar do seu primeiro explorador. A baía cedo ganhou o seu nome, contudo, a cidade só muito mais tarde apareceu. A partir do final do séc. XVII ingleses e holandeses concorrem no resgate do marfim e âmbar nas terras da baía e, não se contentando com isso, no séc. XVIII erguem feitorias e fortins, disputando entre si terras e
comércio. Da mesma maneira, navegadores ao serviço da Companhia Austríaca de Trieste se pretendem estabelecer construindo uma pequena feitoria, destruída pelos portugueses em 1781. A partir, porém, de 1752, com a instituição da Capitania-Geral de Moçambique, em que o governo passa a ser autónomo do Governo da Índia, inicia-se um período de maior atenção a estes territórios por parte de Portugal. Deve-se ao governador de Moçambique, Vicente Caetano da Maia e Vasconcelos a primeira tentativa de domínio político da baía. Em 19 de Abril de 1782, dia de S. José, foi estabelecido um presídio no lugar onde fora a feitoria holandesa, a três quartos de légua da “ponta de Mapfumo”, isto é, da Ponta Vermelha. Esta feitoria/fortaleza foi destruída um ano depois pelos franceses. Com efeito, ingleses, holandeses, franceses, continuaram a tentar dominar a baía e só em 1799 é que esta volta a ser reocupada pelos portugueses, e restaurados a feitoria e o presídio. A dificuldade de manutenção da soberania por parte dos portugueses mantém-se durante todo o séc. XIX em luta com os régulos e com os ingleses que reivindicam os territórios como seus. Só em 1875, por arbitragem do então presidente francês marechal Mac- Mahon são reconhecidos os direitos dos portugueses sobre as terras da Lagoa. Em 9 de Dezembro de 1876, a povoação de Lourenço Marques, que ainda em 1844 só contava, fora do recinto, com 19 casas de madeira e 127 palhotas, foi elevada a vila, nela sendo instituído o regime municipal. Em 1877 o rei D. Luís concedeu-lhe foros de cidade, cujo plano urbanístico já havia sido traçado em 1867 por J. José Machado. Por fim, em 1898, a capital que até então tinha sido a velha cidade de Moçambique, passou para a Baía da Lagoa. Nascia assim a mais nova das cidades e vilas históricas moçambicanas, a Cidade de Lourenço Marques… P.B.H.
11
Mapa da Baía da Lagoa, 1876
ROSTOS DA ESCRITA Luísa Ducla Soares Este é o mês de uma escritora muito apreciada pela pequenada, Luísa Ducla Soares. Tem um estilo muito peculiar que se caracteriza pelo humor, pelo non sense e pela subversão que está muito presente nas suas obras. A título de exemplo basta referir o conto “ A mão da Princesa” onde temos um rei que quer casar a sua filha. Os pretendentes têm que realizar determinado tipo de provas e o vencedor terá a mão da princesa. Esta, que é rebelde e tem um espírito livre, quando sabe que seu pai quer dar a sua mão em casamento, replica exclamando “Qual mão, qual pé! Também quero realizar uma prova e se vencer, não me casarei!” Luísa Ducla Soares nasceu em Lisboa no dia 20 de Julho de 1939. É licenciada em Filologia Germânica e iniciou a sua actividade profissional como tradutora, consultora literária e jornalista. Trabalha desde 1979 na Biblioteca Nacional onde é assessora principal e responsável pela Área de Informação Bibliográfica. Por motivos políticos, não aceitou o Grande Prémio de Literatura Infantil que o SNI pretendeu atribuir-lhe pelo livro História da Papoila, em 1973. Dedicou-se, desde então, à literatura infanto-juvenil, não só enquanto escritora, mas também como estudiosa, participando regularmente em congressos e em projectos de divulgação e animação cultural em escolas e bibliotecas. Luísa Ducla Soares acha importante o contacto directo com o público infanto- juvenil para a promoção da leitura: «A escrita para crianças tem de ser, antes de mais comunicação, e a recepção delas é essencial para que eu perceba se uma mensagem passa ou não.» Publicou à volta de 100 livros, além de ter escrito 26 guiões televisivos, que constituem a série sobre Língua Portuguesa “Alhos e Bugalhos” e tem escrito poemas para canções. Foi editado, em 1999, um CD com letras exclusivamente da sua autoria e musicadas por Suzana Ralha. Em 1996, recebeu o Prémio Calouste Gulbenkian para o melhor livro do biénio 1984-85 por 6 Histórias de Encantar e o Grande prémio Calouste Gulbenkian pelo conjunto da sua obra. Alguns dos seus livros encontram-se expostos na biblioteca da nossa Escola e, quem quiser, ler é só requisitá-los. Aqui vai um poema que fizeram as delícias dos meninos e meninas do Pré- Escolar e primeiro Ciclo:
12
Ilustração de José Pedro Bessa, in A GATA TARECA E OUTROS POEMAS LEVADOS DA BRECA, de Luísa Ducla Soares, Edição Teorema, 1990
OFICINA DE ESCRITA CRIATIVA Num pr at o de trigo papam prat ato três tigr es tigres
JOGOS COM LETRAS
TR,TR, TR…
O rrat at o rroeu oeu a rrolha olha da garr afa ato garrafa de rum do rrei ei da Rús sia Rússia
Num prato de trtrigo papam trtrês tigres Tr Três tigres trtrigo papam num prato Papam num trtrigo de tigres Tr Três pratos papam trtrigo
Tr R RRRR…
O rato roeu a rolha rrrrafa de rum A rolha roeu a garr O rei de rum roeu o rato A Rússia do rei o rato roeu
E a Preciosa preocupada Com os trtrinchantes dos tr tr trtr… trtragou o trtrigo, os tigres, os trtrês
E o Rui com raiva RRR…. Dos raios dos RRR Roeu o rato, a rolha, a garr rrrrafa O rum , o rei e a Rússia.
Feito por: Patrícia 4ºC e Natália 5ºB
Est a burr a ttort ort a tr ot a Esta burra orta trot ota ort a Trot a, tr ot a a burr a ttort ota, trot ota burra orta TR, TR,TR…
Padr e Pedr o pint a pr ego Padre Pedro pinta prego egoss Padr e Pedr o pr ega pr Padre Pedro prega prego egoss ego PPP…
A burra trtrota trtrota torta A burra trtrota a torta trtrota Torta torta a burra trtrota Tr Trota torta da burra
Tr P
Padre Pedro pinta pregos Pregos Pintam Padre Pedro Pinta padre pregos Pedro Pedro pregos Padre pinta
E a Teresa atarantada com os Tontos dos tr, tr, tr Tentava destrtrtravar o Seu trtrava línguas.
E a Patrícia com Pavor Dos patetas Dos ppp… Perdeu a paciência E pappou o Padre, o Pedro e os pregos.
13
Feito por: Érica e Ana, 4.º C
PARA ALÉM DAS AULAS O Despor to Escolar na Desporto or tuguesa de Moçambique - CELP Por ortuguesa Escola P A Escola Portuguesa de Moçambique oferece-nos diversas modalidades desportivas tais como: a natação, o futebol, o voleibol, o basquetebol, o karate e muito mais. A escola tem recintos desportivos de alta competição e professores de alta competição. Os campeonatos iniciar-se-ão dentro de dois meses, por volta de Março e vão participar diversas escolas neste torneiro. Não interessa ganhar, mas, sim, o convívio de várias escolas, como a escolas: Muçulmana, Internacional, Americana, Maxaquene, Josina Machele, Arco-íris, Francesa, Nhuamba e outras. Na equipa de futebol, temos por volta de 15 a 20 jogadores em cada escalão: sub 12 masculino e feminino, sub 14, sub 16 e sub 18. Treinamos duas vezes por semana, duas horas por dia. A nossa escola ganhou dezoito medalhas em diversas modalidades.
Feito por: Ricardo Cacho, nº19, 7ºD Zuber Martins, nº22, 7ºD Luís Guerra , nº13, 7ºD Nuno Relvas, nº16 , 7ºD Patrick Gomes, nº17, 7ºD Énio George, nº23, 7ºD
Flora da Escola Jacaranda mimosifoglia
Pertence à família das bignoniaceae, esta árvore, vulgarmente conhecida por Jacarandá, de aspecto leve e delicado, apresenta semelhanças a um feto
(polipódio). As suas florescências de cor violácea em forma de sino, com uma subtil e agradável fragrância surgem, no hemisfério sul entre os meses de Outubro a Fevereiro, durando, sensivelmente, até surgirem as novas folhas. De crescimento rápido, pode atingir uma altura de 12 metros, e a sua copa os 18 metros de diâmetro. De aspecto bastante irregular, frondosa, mas, pouco compacta, assemelha-se a uma jarra quando atinge a idade adulta. Esta árvore, deve ser podada para atingir uma estrutura forte. Cresce em pleno sol, é tolerante a solos argilosos, arenosos, ácidos e moderadamente alcalinos, mas bem dre-
14
nados. É muito resistente à seca. As raízes são bastante fortes, podendo interferir com relvados e levantar passeios. Pode sofrer de acumulação de fungos nas raízes no caso de se encontrar em solos pouco drenados. No geral, não apresenta doenças. O arranjo das folhas, muito peculiar, é alternado. Medem aproximadamente 5 cm de comprimento, e são sempre verdes. Os frutos, secos e lenhosos de cor castanha, apresentam a forma de cápsulas redondas que chegam a
medir 8 cm de diâmetro. Não atraiem nenhum animal, e, por isso, não servem de alimento à vida selvagem. L.V.
PENSAMENTOS DE UM PAI .Sabedoria
Oriental - O melhor educador é aquele que conseguiu educar-se a si mesmo.
AOS EDUCADORES «O ilustre escritor brasileiro Augusto Cury enumera em seu livro intitulado “Pais Brilhantes, Professores Fascinantes”, o que ele considera ser os sete pecados capitais dos educadores. - O primeiro deles é corrigir o educando publicamente. Um educador jamais deveria expor o defeito de uma pessoa, por pior que ela seja, diante dos outros. Um educador deve valorizar mais a pessoa que erra do que o erro da pessoa. - O segundo é expressar autoridade com agressividade. Os educadores que impõem sua autoridade são aqueles que têm receio das suas próprias fragilidades. Para que se tenha êxito na educação, é preciso considerar que o diálogo é uma ferramenta educacional insubstituível. - O terceiro é ser excessivamente crítico: obstruir a infância da criança. Os fracos condenam, os fortes compreendem, os fracos julgam, os fortes perdoam. Os fracos impõem suas ideias à força, os fortes as expõem com afecto e segurança. - O quarto é punir quando estiver irado e colocar limites sem dar explicações. A maturidade de uma pessoa é revelada pela forma inteligente com que ela corrige alguém. Jamais coloque limites sem dar explicações. Para educar, use primeiro o silêncio e depois as ideias. Elogie o educando antes de corrigi-lo ou criticá-lo. Diga o quanto ele é importante, antes de apontar-lhe o defeito. Ele acolherá melhor suas observações e o amará para sempre. - Quinto: ser impaciente e desistir de educar. É preciso compreender que por trás de cada educando arredio, de cada jovem agressivo, há uma criança que precisa de afecto. Todos queremos educar jovens dóceis, mas são os
que nos frustram que testam nossa qualidade de educadores. São os filhos complicados que testam a grandeza do nosso amor. - O sexto, é não cumprir com a palavra. As relações sociais são um contrato assinado no palco da vida. Não o quebre. Não dissimule suas reacções. Seja honesto com os educandos. Cumpra o que prometer. A confiança é um edifício difícil de ser construído, fácil de ser demolido e muito difícil de ser reconstruído. - Sétimo: destruir a esperança e os sonhos. A maior falha que os educadores podem cometer é destruir a esperança e os sonhos dos jovens. Sem esperança não há estradas, sem sonhos não há motivação para caminhar. O mundo pode desabar sobre uma pessoa, ela pode ter perdido tudo na vida, mas, se tem esperança e sonhos, ela tem brilho nos olhos e alegria na alma. Você que é pai, professor ou responsável pela educação de alguém, considere que há um mundo a ser descoberto dentro de cada criança e de cada jovem. Só não consegue descobri-lo quem está encarcerado dentro do seu próprio mundo. Lembre-se que a educação é a única ferramenta capaz de transformar o mundo para melhor, e que essa ferramenta está nas suas mãos. Do seu uso adequado depende o presente e dependerá o futuro. O jovem é o presente e a criança é a esperança do porvir. Pense nisso e faça valer a pena o seu título de educador. Eduque. Construa um mundo melhor. Plante no solo dos corações infantojuvenis as flores da esperança.» Colaboração de um encarregado de educação
O Alfabeto do Amigo AMIGOS Os amigos são, talvez, a seguir à família, aqueles que melhor compreendem os nossos momentos de alegria e de tristeza, de contentamento e de raiva, de prazer e de insatisfação, de convívio e de solidão. Por vezes, estamos tão atarefados que nos esquecemos de perceber pequenos sinais que podem ser úteis na relação com aqueles de quem gostamos. Ao lado podes ler o Alfabeto do Amigo, lembrando aquelas pequenas grandes coisas que só os amigos, os verdadeiros!, têm para nos dar. Diverte-te e regista!
Aceita-te como és Bota fé em ti Chama-te só para te dizer “Olá!” Dá-te amor incondicional Ensina-te o que sabe de bom Faz-te favores que os outros não fariam Grava na memória bons momentos que passaram juntos Humor não lhe falta para tu sorrires Interpreta com bondade tudo o que tu dizes Jamais te julga estando tu certo ou errado Livra-te da solidão Manda-te pensamentos de ternura e gratidão Nunca te abandona
15
Oferece-te ajuda quando sente que tu precisas Perdoa e compreende as tuas falhas humanas Quer ver-te sempre feliz Ri contigo Sempre se faz presente nos momentos de aflição Toma as tuas dores e evita que te maltratem Um sorriso teu basta para fazê-lo sorrir Xinga e briga por ti Zela, enfim, pela jóia que tu representas Adaptado de http://paginas.terra.com.br/arte/romantichome
A.M.
ÚLTIMA PÁGINA “OS Pequenos Violinos”
Países e Povos na Nossa Escola Ao longo dos próximos números dar-vos-emos a conhecer os países presentes na Escola, através das nacionalidades dos nossos alunos. (Números anteriores: África do Sul e Alemanha)
No passado dia 16 de Dezembro, e imbuídos pelo Espírito Natalício, a classe de violino da EPM-CELP “Os Pequenos Violinos” dirigida pelo professor Hugo Gomes realizou um concerto de Natal na Pediatria do Hospital Central de Maputo (HCM). Em colaboração com a coordenação da Pré-Escolar e 1º Ciclo do Ensino Básico, assim como com os respectivos professores e alunos, conseguiu-se angariar alimentos e brinquedos que se ofereceram à Direcção da Pediatria para as crianças internadas no HCM. O concerto realizou-se nas instalações do HCM, num antigo bloco da Pediatria e estiveram presentes várias centenas de crianças hospitalizadas acompanhadas pelas mães. No concerto estiveram também vários membros da Direcção do HCM assim como da EPM-CELP e contou com a cobertura da RTP África. Proximamente teremos um segundo concerto com as mesmas particularidades de solidariedade na “Casa do Gaiato”. Já no próximo Abril teremos uma 3ª edição da Masterclass de Violino, organizada pela nossa escola e que contará com a presença generosa de professores de Portugal de violino, violoncelo e piano e que possivelmente culminará em dois concertos, em Maputo e Joanesburgo. Também se prevê que a orquestra de violinos da EPM-CELP venha a realizar dois concertos em Portugal no final do ano lectivo 2005/2006. H.G.
Angola
Argélia
Nome oficial: República de Angola Superfície: 1.246.700 Km2 População: 10.978.552 habitantes (2004) Densidade populacional: 8,8 hab / Km2 (2004) Língua oficial: português (outras línguas: umbundu, kimbundu, kikongo, quioco e ganguela) Independência: 11 de Novembro de 1975 (potência colonizadora: Portugal) Regime político: república, sistema multipartidário Constituição em vigor: Novembro de 1975 (revista em 1978,1980,1991 e 1992) Capital: Luanda (2.550.000 hab em 2004) Principais cidades: Luanda / Huambo / Benguela / Lobito Moeda: Kwanza (AOA) Prod. Interno Bruto (PIB): 11.248 milhões de dólares (USD) (2002) PIB/capita: 860 USD Esperança de vida: 36,8 anos Taxa de crescimento da população: 1,93 % Taxa de alfabetismo: 41,7 % Taxa de mortalidade infantil: 19,3 % População urbana: 35 % População rural: 65 % Exportações: petróleo e derivados, diamantes, gás, café, sisal, madeira, algodão e peixe. Importações: equipamentos (mecânicos e eléctricos / electrónicos), produtos alimentares, automóveis e sobressalentes, têxteis e vestuário, medicamentos e material militar.
Nome oficial: República Argelina Democrática e Popular Superfície: 2.381.741 Km2 População: 33.357.089 (2004) Densidade populacional: 14 hab / Km2 (2004) Língua oficial: árabe (outras línguas importantes: francês e berbere) Independência: 5 de Julho de 1962 (potência . colonizadora: França) Regime político: república, sistema multipartidário Constituição em vigor: 19 de Novembro de 1976 (revista em: 1988, 1989 e 1996) Capital: Argel Principais cidades: Argel / Oran / Constantina / Annaba Moeda: Dinar (DZD) Prod. Interno Bruto (PIB): 55.914 milhões de dólares (USD) (2002) PIB/capita: 1.790 USD Esperança de vida: 70,8 anos Taxa de crescimento da população: 1,61% Taxa de alfabetismo: 71,1 % Taxa de mortalidade infantil: 3,6 % População urbana: 58 % População rural: 42 % Exportações: petróleo e derivados, gás natural e produtos agrícolas. Importações:equipamentos, produtos alimentares (cereais, óleo, açúcar, leite), bebidas e bens de consumo.
Microsoft Encarta 2005 (traduzido e adaptado)
Microsoft Encarta 2005 (traduzido e adaptado)
Pátio das Laranjeiras, n.ºs 29-30 Directora: Albina Santos Silva . Coordenação Editorial: Vítor Roque . Coordenação Executiva: Jorge Pereira, Núcleo de Apoio, Informação, Relações Públicas e Publicações . Redacção: Judite dos Santos, Rosa Alice Dixe, Vítor Roque . Concepção Gráfica e Paginação: Judite dos Santos . Fotografia: Jorge Pereira, Vítor Roque . Colaboração: Ana Manuela Albasini, António Aresta, Hugo Gomes, Maria de Lurdes do Vale, Michele Neves, Paulo Guedes, Pedro Bugarin Henriques, Rosa Alice Dixe, Teresa Noronha . Revisão: Rosa Alice Dixe . Produção: Centro de Recursos Educativos, Janeiro de 2006 Propriedade: Escola Portuguesa de Moçambique - Centro de Ensino e Língua Portuguesa Av. do Palmar, 562 . Caixa Postal 2940 . Maputo . Moçambique . Telefone: 00 258 21 481300 www.edu-port.ac.mz . E-mail: epm-celp@edu-port.ac.mz
16
.
Telefax: 00 258 21 481343
ESCOLA PORTUGUESA DE MOÇAMBIQUE
-
CENTRO DE ENSINO E LÍNGUA PORTUGUESA
10 contos ANO V
.
NÚMEROS 29-30
.
DEZEMBRO 2005 / JANEIRO 2006
MALANGATANA HOYE! Sonho de um negrito Quando vai no cidade um dia... há de trabalhar muinto e quando contra dinheiro há de vai compra calsa alto aquele guali da Josia Mesmo do branco há de vai ngomari com gomas para ficas duro muito para quando passas com ferras há de fica bem depois os meninas vai cair na chão e vai namorar com meu mori Mesmo os gravatas de pequeno para ponhar no garganta maji quer peretos de casares os raparigas hás de gostari eu eu leva no meu casa redondos para dar mo chá com jamu com os leites cruzu azuli Malangatana Valente Ngwenya
EDITORIAL Nenhuma escola é uma ilha, isto é, uma instituição educativa rodeada por “terra” de todos os lados. A relação escola-meio (sociedade) é assunto sobejamente estudado por políticos e investigadores: uns defendem que a escola reproduz o sistema social, possuindo, por isso mesmo, um certo imobilismo intrinsecamente negativo; outros, pelo contrário, defendem que só através dela é que se poderá modificar, melhorar e alterar a própria sociedade Este não é, decerto, o local, nem o momento mais apropriado para desenvolver esta temática. Hoje, queremos simplesmente reafirmar que consideramos fundamental a existência de uma interacção permanente da escola – desta escola! –, com o seu meio envolvente. Sendo esta, uma instituição de ensino de matriz cultural portuguesa, implantada no seio da sociedade moçambicana, mais evidente e compreensível se torna esta nossa preocupação. Para além destas reflexões, julgamos pertinente acrescentar mais duas ou três. Actualmente, vivemos um momento de acentuda globalização. Neste contexto, qualquer sociedade, seja ela a portuguesa ou a moçambicana, sofre impactos de diversa ordem à matriz que lhe dá forma e substância. A sociedade global, numa perspectiva mais pessimista, tudo reduz ao vil cifrão: as relações entre estados, a cultura e até o próprio ser humano é visto como custos e benefícios! Se nada se fizer em contrário, na escola e na sociedade, este homem ecomonicus de índole “nova”, acabará por alterar a humanidade do próprio homem. Esta alteração trará, necessariamente, a alteração dos valores éticos e morais: o homem passará a ser valorizado, não pelo que realmente é, mas pelo que possui. O Humanismo dará então lugar ao Economicismo. Como combater esta possibilidade? Pensamos que um dos caminhos capazes de combater o excessivo tecnicismo globalista poderá ser o caminho traçado pela arte. De facto, talvez a arte, e porque esta materializa a herança cultural, possa forçar o regresso a esses valores humanistas, que têm dado forma à civilização que nos tem regido até ao momento. É dentro deste contexto que mais facilmente se poderá entender a homenagem que a Escola Portuguesa de Moçambique prestou ao pintor moçambicano Malangatana. Malangatana, não é, decerto, um representante desse pretenso homem economicus. Pelo contrário, ele é o humanista, o guardião dos valores universais e estruturantes. As suas telas falam-nos do homem inquieto, especulativo, do homem de Valores. É nas suas telas, na sua escultura e na sua poesia, que Malangatana preserva e projecta essa tradição. Por isso mesmo lhe quisemos fazer esta singela homenagem, que aqui ficará registada, para a posteridade, nas páginas desta separata do nosso jornal “Pátio das Laranjeiras”. É por não querermos ser uma ilha isolada, que sempre temos procurado interagir com o meio que nos rodeia, para assim o podermos mostrar aos nossos alunos. Hoje, com a inauguração da Ala das Artes Visuais, Mestre Malangatana Valente Negwenya, no nosso pátio mais nobre – o Pátio das Laranjeiras –, quisemos fazer algo de inovador. Quisemos que um dos maiores cultores deste meio viesse até nos, para se mostrar aos nossos alunos. Malangatana Valente Ngwenya sempre foi capaz de vir até nós, de estar e trabalhar connosco, mostrando aos nossos alunos como é o homem moçambicano. Por isso mesmo: - Obrigado Mestre Malangata, pela sua tão antiga e calorosa disponibilidade! O Mestre bem merece a homenagem que lhe queremos dar. Seja sempre bem-vindo a esta escola. E traga sempre consigo os seus valores, que temos a esperança, quase a certeza absoluta, que florescerão na mente dos nossos alunos e na dos nossos colaboradores.
2
MALANGATANA HOYE! Discurso proferido pela Dr.ª Albina Santos Silva, em homenagem ao Mestre Malangatana Valente Ngwenya Mestre Malangatana Deixe-me tratá-lo por Amigo, grande amigo desta casa, meu amigo de alguns anos... Não quero usar, nesta ocasião, palavras de circunstância, pois será dispiciendo qualquer comentário sobre si e sobre a sua obra. Estamos perante um Homem e um Artista, detentor de um carácter excepcional, de dimensão cosmopolita e universal. Devo, contudo, dirigir algumas palavras para aqueles que trabalham nesta casa e, em especial, para os nossos alunos, por forma a poderem aprender com a sua presença nesta Escola e contribuir, assim, para o desenvolvimento de uma consciência crítica e mais conhecedora. Devemos todos aprender com o exemplo de um Homem, que sabe enfrentar a realidade e o mundo, com objectividade, tranquilidade, firmeza, justiça e, ainda, com muita esperança e sonho. A Educação Artística é uma vertente fundamental para o desenvolvimento global do ser Humano, devendo constituir uma plataforma de promoção de uma sociedade mais justa, mais solidária, mais sensível, afirmando os valores da tolerância e da compreensão dos Povos pelos Povos, das Culturas pela Cultura. E porque o lugar da Arte é inquestionável no processo educativo, no ensino democrático e inclusivo, tem-se, naturalmente, que considerar a vivência e o conhecimento artístico, como um direito de todos. A busca do belo, da harmonia, da expressão, da perfeição, na superação dos próprios limites e na aceitação dos próprios erros, deve constituir a linha orientadora da Educação pela Arte. É neste contexto educativo que quero agradecer publicamente, em nome da EPM-CELP, e em meu nome pessoal, o facto de o Mestre Malangatana ter permitido emprestar o seu nome ao espaço, onde, nesta casa, se ensina a Educação Artística, onde o aluno aprende a ser criador e apreciador da Arte e da Cultura.
A nossa responsabilidade é grande, pois, aqui, crescem diariamente crianças oriundas de 24 nacionalidades, de múltiplas origens, culturas e etnias. Ficamos seguros, contudo, que com o seu exemplo de Homem, melhor aprenderemos a aceitar o outro, a procurar a criatividade e a expressão do sublime. Mestre Malangatana é, e continua a ser, um exemplo vivo de uma pedagogia activa para esta casa. Mestre Malangatana criou uma obra, que, por nunca ter abandonado a sua origem, a sua terra e a sua cultura, a dotou de um valor universal. Há dias, navegava pela Net à procura de algo e deparei-me com inúmeras páginas dedicadas ao Homem, à Vida, à Obra e, ainda, ao sonho e à esperança, do Mestre Malangatana. As inúmeras páginas são coincidentes na revelação da humildade e a grandeza do percurso do Mestre. A sua vida é um exemplo de humildade, de força, de esperança e de dádiva. De guardador de gado a menino–criado, de apanhador de bolas a curandeiro e aprendiz de médico tradicional, de Homem autodidacta a artista plástico, chegamos ao Mestre.
3
HOMENAGEM DA EPM-CELP
São inúmeras as facetas da sua vida artística: Pintor, Ceramista, Aguarelista, Gravador, Desenhador, Escultor, Artesão de Tapeçaria... Não esquecemos, ainda, as suas facetas de Poeta, Actor, Cantor, Dançarino, Instrumentista... Valerá a pena lembrar que o Mestre se assume como artista profissional, no limiar dos anos 60. Esta é uma Década de grandes agitações e transformações sociais, políticas, económicas e culturais em todo o mundo. É a década : • da independência da maior parte das antigas colónias europeias; • dos protestos estudantis em França e outros países; • da afirmação do movimento dos direitos civis nos Estados Unidos; • dos protestos contra a guerra no Vietnam; • das lutas contra a ditadura militar no Brasil; • das lutas contra a ditadura em Portugal; • do reforço da organização dos movimentos de libertação nacional em diversos continentes;
Hoje, Mestre Malangatana continua a marcar novos encontros com a História, com os exemplos da sua obra e da sua vida dedicados às crianças, ao desenvolvimento de Moçambique, da África e do Mundo. E sempre, sempre cheio de sonho, cheio de esperança, de poesia e de tolerância, como só os homens humildes e grandes sabem ser. Obrigada, Mestre Malangatana, por nos ajudar a construir o mundo novo que todos desejamos possuir nas nossas mãos, nas nossas cabeças, nos nossos corações.
• do movimento feminista; • da libertação sexual; • dos movimentos de contracultura. Seguramente, o mestre Malangatana não ficou indiferente a este efervescente cadinho, moldando a sua sensibilidade e vontade neste tempo telúrico, de grandes transformações e de muitas interrogações e expectativas. E é neste percurso da História que Malangatana dedica a sua vida e a sua obra à Independência do seu Povo e do seu País, marcando novos Encontros com a História. E sempre, sempre sem ódios e rancores. E sempre, sempre com bonomia, afabilidade, tolerância. E sempre, sempre com uma grande serenidade e tranquilidade interior.
4
Afinal, que melhor referência poderíamos escolher para esta casa? Que melhor referência para superar as nossas incoerências, as vãs vaidades, as insuficiências, e os erros… Que melhor referência poderíamos procurar para encontrar o caminho da perfeição? Obrigada, Mestre Malangatana, por tudo o que nos deu e pelos ensinamentos que nos transmitiu, através do Exemplo da sua Vida! Maputo, 08 de Dezembro de 2005
MALANGATANA HOYE! Homenagear Malangatana A homenagem a Malangatana, organizada pela Escola Portuguesa de Moçambique, ocorreu no passado dia 8 de Dezembro de 2005, dia em que o mestre fez 49 anos de casamento e 45 anos de obra pública, tomando como ponto de referência para esta contagem a data da sua primeira exposição pública oficial. Com esse objectivo, foram organizadas, por esta Escola, várias acções, de entre as quais destacamos: abertura de uma Exposição, com obras de pintura e cerâmica do mestre; a institucionalização, num dos corredores laterais do nosso “Pátio das Laranjeiras”, de uma Ala Temática, com o nome do pintor (Malangatana Valente Negwenya), dedicada às Artes Visuais, e constituída por salas de Educação Visual e Tecnológica, Espaço Oficinal e de uma sala de Desenho; e, ainda, a criação e implementação de um espectáculo cultural. É o resumo dessas actividades que aqui queremos descrever.
Abertura e inauguração A cerimónia de abertura da Exposição “Ver e Sentir Malangatana”, estava marcada para as 16.00 horas do dia 8 de Dezembro de 2005. Contudo, cerca de uma hora antes, tudo estava já preparado e à espera da chegado do mestre-pintor: os quadros, nos seus cavaletes, espalhavam-se por pontos estratégicos do Átrio de Entrada da Escola; representantes dos alunos aguardavam, impacientes e escrupulosamente alinhados; no interior, o Grupo de Danças Tradicionais de Marracuene, composto por um grupo de crianças e jovens, e por um grupo de dançarinos mais velhos, aguardavam, também impacientes, o “Amigo de Matalana”. Neste grupo, eram as crianças as que davam maior mostra de uma maior inquietação, impaciência e nervosismo. Os convidados, entretanto chegados, iam circulando pela sala da exposição, admirando este ou aquele quadro ou fazendo este ou aquele comentário sobre esta ou aquela obra mais do seu agrado. Ao chegar o mestre, que veio acompanhado pela sua esposa, D. Gelita Mhangwana, as individualidades oficiais convidadas tomaram os seus respectivos lugares e preparam-se para o início das cerimónias. Para além de muitos amigos pessoais e do mundo artístico e jornalístico moçambicanos, estiveram presentes, entre outros, o Presidente do Conselho Municipal da Cidade de Maputo, Dr. Eneas Comiche, o Embaixador de Portugal em Moçambique, Dr. José de Freitas Ferraz, o Adido Cultural da Embaixada de Portugal, Dr. António Braga, o poeta Calane da Silva, o dramaturgo Lindo Lhongo, a representante da Embaixada dos Países Baixos, todos os membros do Conselho Directivo da Escola Portuguesa de Moçambique, vários professores da escola e público anónimo. Arrepiando muitos dos presentes, os ritmos e a atmosfera africana penetraram a sala, quando o Grupo de Dançarinos de Marracuene iniciou a sua dança tradicional, destacando-se, do conjunto, o seu artista mais idoso, cuja indumentária e fisionomia faziam claramente lembrar um dos feiticeiros velhos, que povoam, em muitos de nós, as nossas memórias e lembranças ancestrais de África. As lanças levitavam no ar, os escudos de pele protegiam de terríveis ataques imaginários e os gritos estridentes das mulheres ecoavam pelas paredes, em ecos sucessivos, contrastando com o som grave do cantar dos homens. Malangatana ouviu, atento, encantado com a primeira de algumas das surpresas que lhe tinham sido preparadas, sem ele o saber totalmente. Findas as danças, os professores Luísa Antunes e Lázaro Impuia, explicaram aos presentes o significado da homenagem que então se encetava, bem como
5
HOMENAGEM DA EPM-CELP o nome do Grupo Interveniente. Em seguida, a Dr. Albina Santos Silva proferiu umas breves palavras de agradecimento aos presentes e convidou-os a acompanhar o mestre, numa visita guiada às obras expostas, dando por inaugurada a exposição já referida. Finda esta visita, os presentes foram convidados a deslocarem-se ao Pátio das Laranjeiras, para assim poderem assistir à inauguração oficial da nova Ala, dedicada às Artes Visuais, e que passou a ter o nome do Mestre Malangatana Valente Negwenya. Na ocasião, a Drª Albina Santos Silva, proferiu um discurso inaugural (ver página 3), onde realçou o homem, a obra e a intenção e significado da homenagem levada a cabo por esta instituição. Findo o discurso e descerramento da placa alusiva, seguiu-se uma breve visita às instalações e salas que constituem a nova Ala de Artes Visuais, Mestre Malangatana Valente Negwenya. No seu interior, encontrava-se exposta uma pequena amostra de trabalhos de alunos, jovens artistas do Curso de Artes e, quem sabe, mestres no futuro!
Momento cultural O momento cultural preparado para homenagear Malangatana, decorreu no Auditório Carlos Paredes, onde os professores Luísa Antunes e Lázaro Impuia continuaram a desempenhar o seu papel de apresentadores oficiais do evento. O espectáculo teve início com a prata da casa. O grupo “Pequenos Violinos”, coordenados pelo professor Hugo Gomes, encantaram todos os presentes com a sua mestria e saber estar em palco. Malangatana pareceu um dos mais entusiastas no aplauso, uma vez que na actuação estavam reunidos dois dos seus maiores encantos conhecidos: as crianças e a música. Após a intervenção destes jovens músicos, a homenagem prosseguiu com o visionamento do documentário “Pensar-Alto Malangatana”, integralmente produzido pelo Centro de Recursos Educativos da Escola Portuguesa de Moçambique. Este vídeo, tendo em conta que era constituído, de entre outros elementos, pela recolha de vários depoimentos sobre a Vida e Obra do Mestre, correspondeu a um dos momentos altos do evento, tendo sido, no final, objecto de agradáveis manifestações de apreço. Mestre Malangatana, para além de pintor, é também poeta, com obra já publicada. Por isso mesmo, facilmente se entenderá o momento que se seguiu – a declamação de alguns dos seus poemas. Este momento foi protagonizado por um conjunto de alunos da escola e pelo poeta (e amigo pessoal!) Calane da Silva. Se o poeta confirmou os dotes sobejamente conhecidos de declamador, os alunos não desmereceram no mesmo papel, tendo demonstrado que aprenderam bem a lição. Visivelmente emocionado, Malangatana parecia absorver com agrado todas estas suas telas verbais, que mais uma vez coloriam, agora com palavras escritas, a sua temática fundamental – o homem moçambicano. A Drª. Ana Paula, professora desta escola, declamou, de seguida, um poema, de sua autoria, dedicado a Malangatana, intitulado “Kokuana Malangatana” (Avó Malangatana). O evento aproximava-se rapidamente do seu final, mas, como acontece também no episódio das Bodas de Canã, descrito na Bíblia, o melhor estava ainda reservado para o fim. Referimo-nos à intervenção do Grupo Infantil de Danças Tradicionais de Marracuene. A dança apresentada, plena de energia, foi galhardamente defendida pelos
6
MALANGATANA HOYE! jovens dançarinos de Marracuene, localidade dos arredores de Maputo. Ao som forte e ritmado dos tambores, ampliado por gargantas afinadas, audazes e desafiadoras, os jovens de Marracuene contorceram o corpo, ergueram os braços e as lanças que empunhavam, e levantaram bem alto os pés descalços, num evidente gesto de intimação ou guerra, deixando intencionalmente esvoaçar no espaço, as longas franjas brancas que enfeitavam, logo a partir dos joelhos, as suas esguias, negras e magras pernas de antigos guerreiros africanos. Num final de intensidade frenética, os corpos atirados ao chão, misturaramse em merecido êxtase final, seguido de breve e arfante descanso, para, mais uma vez, em acto quase contínuo, a dança recomeçar, em redobrada energia e desafio bélico. O suor escorria pelo rosto dos jovens dançarinos e ensopava a pele e as camisolas de algodão que vestiam, talvez a única nota anacrónica deste frenético e energético grupo de jovens, ensinados a gostar do seu passado cultural e a respeitar as tradições do povo de que descendem. Este foi, de facto, um comovente e loquaz gesto de defesa e eficaz preservação do património cultural de um povo. Depois da energia dos corpos, seguiu-se a energia da palavra do mestre Malangatana. Chamado ao palco, para falar sobre o que entendesse, o Mestre fez jus à sua fama de bom conversador e acabado entertainer. A todos deliciou com uma boa miríade de histórias interessantes do seu tempo de jovem aprendiz de pintor… Recordou Pancho Guedes, Augusto Cabral e José Forjaz, homens que o acompanharam ou ampararam no início da sua caminhada de artista. Com outras histórias, mais recentes, interpelou amigos e convidados presentes na sala: “E tu, fulano de tal, tu lembras-te quando…?”. “E quando, em Lisboa, pintei uma parede da casa de um nosso amigo comum e a senhora dele engravidou por essa altura… Lembraste?!” E o tempo ia passando de história em história, num visível acto de encantamento e recordação, de exaltação da Amizade e do Amigo… Recordou e engrandeceu também outros amigos de infância, presentes na sala: Lindo Lhongo, Champlino Ngwenya e Machiana, todos de Matalana, terra natal do Mestre… e fê-los levantar, para que todos os conhecessem e vissem bem! Todo o discurso do mestre terminou com um enorme agradecimento a todos os presentes e, em especial, à Escola Portuguesa de Moçambique, e à sua amiga, a Drª Albina Santos Silva, presidente “dessa instituição de ensino”, entidade promotora da homenagem que o honrava, e, assim, honrava também, por extensão, todos aqueles que o “empurraram” e “têm empurrado” desde sempre, nesta sua caminhada de artista. Sem eles, como referiu, o futuro, hoje passado-celebrado, teria sido certamente outro. As surpresas e as emoções não tinham ainda acabado para o “Kokuana Malangata”. Uma pareceu emociona-lo de forma particular: é que a Associação de Estudantes da Escola Portuguesa de Moçambique decidiu atribuir ao mestre o Diploma de “Aluno Honoris Causa”, distinção académica interna apenas atribuível a personalidades especiais e que com ela mantém especial e significativo relacionamento, impondo-lhe as insígnias da praxe: a camisola e o chapéu do fardamento da escola. Seguidamente, a Drª Albina Santos Silva, Presidente do Conselho Directivo da Escola Portuguesa de Moçambique, também constituído, pela Engª. Manuela Jacinto, e pelo Dr. José Fernandes, entregou a Malangatana a Medalha da Escola, e ainda uma Cópia do Vídeo anteriormente visionado, “Pensar-Alto Malangatana”.
7
HOMENAGEM DA EPM-CELP A homenagem terminou, como não podia deixar de ser, em total apoteose, conseguida através da intervenção do grupo Majescoral. Sabíamos do velho gosto do Mestre, pelo som e encantamento das Vozes Humanas, pois, em frequentes ocasiões, de cariz social e privado, é costume o próprio entoar, com agrado e bastante competência, desde canções tradicionais da sua terra natal, a áreas de ópera clássica, de Verdi e outros que tais… A emoção do mestre foi grande e o agrado gigante, a acreditar nas muitas expressões e múltiplos trejeitos faciais que foi mostrando, ao longo da fabulosa e deveras extraordinárias intervenção deste grupo coral. Queremos acreditar que o próprio Majescoral, considerou esta sua actuação como única e muito especial, como uma espécie de homenagem sua a Malangatana, uma espécie de homenagem de artistas a um único grande artista, tal a garra e alma com que cantaram. Os sussurros e murmúrios, os crescendos e descendos vocálicos, os dós e os mis, os bemóis e sustenidos, todos aqueles entrecruzados e requebros de melodias, alcançados por todas aquelas dezenas de cordas vocais e soberbamente arquitectados e harmonizados pelo maestro do grupo, deliciaram, estamos certos, todos os que estiveram presentes neste evento cultural. Parabéns, então, ao mestre, porque é Mestre; mas parabéns também à escola que tal ideia teve e em tão boa hora a pôs em prática. V.R.
Kokwana Malangatana Vem da terra dos espíritos o teu cântico negro que reza Verde - laranja Branco - azul Ocre - vermelho Vermelho - negro Negro! Negro! Negro canto de kokwana no feitiço da bruma. Feitiço - feiticeiro da - palavra - feiticeiro Feiticeiro - da - cor do - gesto - feiticeiro. Feitiço! Feitiço na dança da voz dos ritos da antiga fala Verde - laranja Ocre - vermelho
Branco - azul Vermelho - negro
Negro! Negro! Negro feitiço de ngoma em noites da xingomana.
Ana Paula Jesus Dedicatória da EPM-CELP Maputo - Dezembro - 2005
Monstros Devoradores, 1968
8
HOMENAGEM DA EPM-CELP Algumas notas sobre a Vida e a Obra de Malangatana Malangatana Valente Ngwenya, nasce em Matalana, a 06 de Junho de 1936 e, em 1945, inicia os seus estudos primários, na Escola da Missão Suíça, aí existente. Em 1947, muda-se para Bolaze, onde desempenha, transitoriamente, a função de ajudante de curandeiro (Nyawuti), e ajuda a curar a doença mental, que, na altura, apoquentava a sua mãe. Após ter obtido o diploma da 3ª Classe Rudimentar, em 1948, vai para Lourenço Marques, onde se torna criado de crianças. Em 1953, começa a trabalhar no Clube de Lourenço Marques, como “apanha bolas”, onde conhece o biólogo Augusto Cabral, que o incentiva a pintar. Com o seu apoio, ainda nesse mesmo ano, frequenta o Núcleo de Arte, onde conhece o pintor Zé Júlio, que o apoia, e com quem expõe, pela primeira vez, em Lourenço Marques, numa exposição colectiva. Posteriormente, em 1960, o arquitecto “Pancho” Miranda Guedes cede-lhe uma garagem, que Malangatana transforma em atelier, e simultaneamente, adquire-lhe duas obras suas por mês, a um valor que era muito superior ao do seu ordenado como criado de bar. É em 1961 que Malangatana realiza a sua primeira exposição individual. Nesse ano, a revista “Black Orpheus”, inclui o seu nome, numa das suas edições, e faz-lhe uma longa e elogiosa referência. Em 1971, vai para Portugal, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, nas especialidades de Gravura e Cerâmica. Em 1977, o Ministério de Educação e Cultura de Moçambique encarrega-o de criar o Museu Nacional de Arte, situado na cidade de Maputo. Muito ligado à sua comunidade, Malangatana foi membro fundador da Comissão Pró-Escolar de Matalana, que tinha por objectivo principal, conseguir a reabertura da Escola Primária de Matalana, que fora, em 1947, encerrada pela administração portuguesa de então. Este grupo manter-se-á activo, mesmo após a reabertura da já referida escola, em 1963. Actualmente, as actividades deste grupo materializamse no que hoje se chama Centro Cultural de Matalana, do qual Malangatana é Presidente. Homem multifacetado (pintor, poeta, dramaturgo, cantor, etc.), Malangatana acaba por participar também na célebre apresentação, em Lourenço Marques, da peça “Lovolo”, (Lobolo). No âmbito da poesia, Malangatana possui já publicados alguns livros. Para além destas publicações, Malangatana possui também publicados
9
MALANGATANA HOYE!
Pintura, Despedida para a guerra, 1964
Escultura móvel - representou Moçambique na EXpo 98, de Lisboa, 1998
Pintura, O filho da lenda, 1973
Pintura, Sem título, 2002
Mural da futura casa do Mestre, em Matalana
várias monografias e catálogos com as suas pinturas. Possui obras suas espalhadas por quase todo o mundo. Para além da pintura, possui murais pintados e/ou esculpidos em cimento, em vários pontos de Maputo, na cidade da Beira, na Africa do Sul, Angola, Brasil, Bulgária, Colômbia, Chile, Checoslováquia, Cuba, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Grã-Bretanha, Holanda, Índia, Islândia, Itália, Nigéria, Noruega, Paquistão, Portugal, Alemanha, Suécia, Suazilândia, ex-URSS, Zimbabwe e em outros países. Ao longo da sua vida artística, Malangatana tem exposto regularmente, sendo já detentor de vários prémios e Menções Honrosas, como são os casos da Menção Honrosa no “I Concurso de Artes Plásticas”, em Lourenço Marques, o 1º Prémio de Pintura nas “Comemorações de Lourenço Marques” (1962), o 2º Prémio de
10
Pintura (ex aequo), nas “Comemorações do 24 de Julho”, em Lourenço Marques (1968), o 2º Prémio de Pintura, alusivo ao “V Centenário de Vasco da Gama”, em Lourenço Marques (1969), o Diploma e Medalha de Mérito da Academia de Tomasse Campanella de Artes e Ciências na Itália (1970), a Medalha Nachingwea, pela contribuição à cultura (1984), Medalha Cirilo e Methodis na Bulgária (1987), o Prémio da Associação Internacional dos Críticos de Arte, em Lisboa (1990) e várias comendas internacionais, como a da Ordem do Cruzeiro do Sul do Brasil (1990), a do Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, em Portugal (1995), a do Prémio Príncipe Klaus, em 1997, entre outros. Actualmente é membro do Conselho de Estado, em Moçambique. B.L.J
MALANGATANA HOYE! Um vídeo para Malangatana
Uma visão pessoal sobre o “Making-Off” do vídeo “Pensar-Alto Malangatana” …
A génese do Projecto O Centro de Recursos Educativos da Escola Portuguesa de Moçambique é umas das três valências que dão corpo a esta Escola, que o governo Português, numa perspectiva global de cooperação com África, mantém em Moçambique. Para além do Centro de Recursos, a escola possui também um Centro de Formação e uma Escola Integrada, que engloba todos os níveis escolares pré-universitários, desde a Educação Infantil ao 12º ano de Escolaridade. O Centro de Recursos, para além de fazer a gestão da Biblioteca e da Rede Informática da Escola, possui uma Oficina Didáctica, subdividida em Secção de Produção Gráfica e Publicações e Secção de Fotografia e Vídeo, possuindo, assim, a capacidade de produção de alguns tipos de documentos audiovisuais. Nele trabalham várias pessoas, docentes e não docentes, de nacionalidade quer portuguesa, quer moçambicana. Depois de a Direcção da Escola ter decidido concretizar a homenagem ao mestre-pintor Malangatana, e de ter optado pela feitura de um vídeo sobre a Vida e Obra do pintor, o entusiasmo dos membros do Centro de Recursos foi grande, devido, por um lado, ao conhecimento pessoal que alguns dos seus membros detêm da pessoa que está por detrás do nome, e, por outro, devido à atracção e simpatia que o pintor irradia sempre que nos visita ou trabalha com esta instituição. Para a concretização deste vídeo, foram designados o Sr. Ilton Ngoca, trabalhador com formação técnica na área do audiovisual, o Sr. Benites José, amigo pessoal do Mestre e aluno de uma licenciatura da área de linguística, da Faculdade de Letras da Universidade Eduardo Mondlane, e eu próprio, que, para além de professor, desempenho funções técnico-pedagógicas no Centro de Recursos. Para quem acabara de chegar a Maputo, capital de Moçambique, e que pouco conhecia da sua realidade geográfica e cultural, a elaboração deste vídeo foi mais do que uma simples exigência de trabalho. Ele acabou por constituir uma experiência única, alucinante e enriquecedora, que me permitiu conhecer e conviver com um conjunto alargado de pessoas, bem como o
contactar com diversas zonas da cidade e seus arredores, que, de outra forma, não seria tão fácil conhecer. Os meus cicerones foram esses dois moçambicanos fantásticos: o Ilton e o Benites. É o testemunho dessa experiência que aqui me atrevo a deixar.
Malangatana em reunião de trabalho na EPM-CELP
Conhecer o Mestre Conhecer o mestre Malangatana foi para mim uma experiência muito gratificante. Malangatana é, de facto, um homem de fácil convívio, de discurso acessível e cativante e que tem sempre uma história para contar: “Naquele tempo, eu…” A sua enorme vivência do mundo, europeu e africano, permitiu-lhe produzir uma síntese pessoal, que o marca e individualiza. Visitar o seu estúdio de trabalho é quase um acto religioso, uma vez que ali nos é revelado um pouco do mistério da criação. Os pincéis e as tintas, que se espalham pelas mesas, deixam antever homens e mulheres de África… A luz envidraçada das janelas cria um rendilhado de zonas vivas e ténues, que realçam os olhos de monstros e de caras fantásticas, que nos olham por entre as tonalidades das tintas distendidas no pano da tela, suspensas dos cavaletes e das paredes. O mundo do homem moçambicano está ali, materializado pela força criadora do pincel.
11
HOMENAGEM DA EPM-CELP
Biblioteca e representação de Moçambique na Expo 98
Atelier de Malangatana Valente Ngwenya
Mas a sua força e energia não se revela apenas nas telas que materializa. Revela-se também na insistência e força dos sonhos que se atreve a sonhar para a sua gente e para a sua terra natal – Matalana.
Em Matalana Matalana é uma pequena povoação que se situa no distrito de Marracuene, a cerca de 40 km de Maputo. Foi aqui que Malangatana nasceu, há muitos, muitos anos atrás. Foi ali, também, que em plena paisagem campestre, o mestre e os seus pares – amigos de infância, também artistas! –, foram plantando, no meio de cajueiros, mafurreiras, e massaleiras, um projecto comunitário de carácter cultural - o Centro Cultural de Matalana.
Dormitório para Artistas, Matalana
Este centro pretende constituir-se num pólo dinamizador da cultura tradicional moçambicana e contribuir para a formação de jovens artistas: pintores, escultores, músicos, etc. O projecto, – como qualquer projecto –, está inacabado e tem vivido de apoios e dádivas particulares. ( Já agora, se alguém quiser ajudar… pode! )
12
De entre os edifícios já concluídos, destaca-se o dormitório, construído com o apoio monetário da administração portuguesa do então território de Macau. Este edifício, da autoria do Arquitecto José Forjaz, possui uma curiosa forma circular, que faz ecoar nos nossos olhos as linhas curvilíneas e sensuais das casas tradicionais de Matalana. Este edifício vai-se espacizando em redor de um frondoso cajueiro, e é constituído por uma sucessão infindável de pequenos quartos individuais, bastante espartanos. A sua curiosa configuração é, assim, com o seu pátio interior, propício ao convívio e à troca de experiências… antes da hora de ir dormir – a hora dos contos que antecipam os sonhos! O edifício da futura biblioteca já existe, mas algumas das suas salas estão hoje adaptadas ao papel de Oficinas de Artes, dado que o futuro Edifício dos Ateliers se encontra, ainda, na fase inicial de construção – nas fundações!. Na entrada principal da biblioteca, encontramos um pequeno veículo, a pedais, imobilizado em estátua, que possui uma história curiosa, uma vez que incorporou os objectos que representaram Moçambique na Expo 98, realizada em Lisboa. Este veículo recria, nos seus elementos gráficos e humanos, um mito tradicional desta zona. Para além de uma série de construções tradicionais, que albergam actualmente o espólio do futuro Museu Etnográfico de Matalana, podemos ainda encontrar a Casa da Música e o Anfiteatro ao ar livre, onde hoje já se dão cursos de música e se fazem espectáculos em certas épocas do ano. Mas nem só de cultura vive o homem. Para além da alma, também o homem tem corpo, de que precisa
MALANGATANA HOYE!
Casa da Música - Matalana
tratar, quer quando está bem de saúde, quer quando está doente. É por essa razão que, neste Centro Cultural, se pode também encontrar um Centro de Saúde. Foi neste ambiente campestre que entrevistámos o administrador do Centro Cultural, o Sr. Champlino Ngwenya. A entrevista, por insistência do próprio, foi realizada em língua Ronga, que é a língua autóctone falada nesta zona. Será curioso referir que esta é apenas uma das dezenas de línguas autóctones faladas em todo o território de Moçambique. Por esta razão, o Benites e o Ilton foram os entrevistadores e tradutores de serviço. Para mim reservei o discreto papel de ouvinte atento daquele misterioso e curioso entrecruzar de sonoridades comunicativas. Mas Matalana é o lugar de todos os sonhos... Para além destes, já descritos, Malangatana Ngwenya possui um outro, mais pessoal – o de concluir a casa que está a construir junto da velha casa de sua mãe. É uma casa fantástica, de grandes janelas, sorvendo a luz, e rodeada de natureza por todos os lados. É de lá que retirámos a imagem que se segue e que revela a intervenção do mestre nas paredes do pátio interior.
No Bairro do Aeroporto As dimensões da cidade de Maputo podem parecer diminutas, mas, de facto, não o são. Segundo os meus amigos moçambicanos, a cidade cresceu muito. Embora mantenha o seu núcleo urbano central, espraiouse por ondas sucessivas de bairros nos arredores. É no Bairro do Aeroporto que Malangatana vive desde
Mural da casa de Malangatana, ainda em construção, e onde se entrevê um crocodilo (lado direito da imagem), animal que faz parte do nome do pintor – Ngwenya
sempre, e é lá que tem o seu atelier de trabalho. As construções de cimento deste bairro misturam-se com outras de outro tipo e as ruas não estão pavimentadas – nem sequer com aquela espécie de pavimento antigo, a precisar de manutenção. Não, as ruas ali são mesmo de terra batida!... E quando chove, na época das chuvas… A evitar o encavalitar das habitações, há quintais, e nos quintais há o vivificante verde das mangueiras e das papaieiras… Foi neste ambiente peri-urbano que encontrámos e entrevistámos dois amigos de infância de Malangatana. O primeiro a ser entrevistado foi o Sr. Lindo Lhongo, que é, nada mais nada menos, que um dos primeiros dramaturgos moçambicanos, negros, que, no tempo colonial, mostrou à cidade branca que moçambicano também percebia de teatro. E da conversa com Lindo Lhongo, surge a ideia de uma espécie de Geração de Matalana. Esta terra afortunada, produziu, mais ou menos no mesmo período histórico, de entre pintores, escultores, poetas, músicos e cantores, cerca de uma dezena de nomes significativos dos primórdios da cultura moçambicana – uns mais conhecidos do que outros, mas de onde se destaca, sem sombra de dúvida, o de Malangatana. E onde há seres humanos há conversas, e onde há conversas há histórias. E surgiu ali mesmo, de repente, uma história deliciosa, mítica, encantadora, e reveladora de interculturalidade: «Quando Deus (seja lá quem ele for!) resolveu distribuir os génios criadores pela terra, pegou na sua enorme mão de semeador e começou a distribuí-los: um para aqui; este para ali; outro para além… Porém, ao passar por Matalana, adormeceu. Contudo, a sua enorme mão de semea-
13
HOMENAGEM DA EPM-CELP
Pormenor de uma pintura de Malangatana
Mural do Museu de História Matural, Maputo
dor continuou o seu labor distributivo: um para aqui, outro para aqui, mais um para aqui!... Quando acordou, continuou o seu caminho, sem ter dado conta da boa sementeira que deixara em Matalana!» Os sorrisos foram muitos… No mesmo Bairro do Aeroporto, vive um outro pintor – Shikanni –, de quem guardo uma grata recordação. Após a entrevista, dirigiu-se a mim, e sabendo que eu era um recém-chegado ao seu país disse: «Sabe, nós, moçambicanos, somos pobres, mas gostamos de honrar quem nos visita. Por isso damos o que temos»… E ofereceu-me um desenho sobre papel, a tinta da china - o seu primeiro desenho de 2005.
Em Xipamanine Em Xipamanine, não me atrevia eu a passar sozinho, mesmo de carro!... Receios, decerto infundados, de novato, mas mesmo assim receios… As ruas, também de terra batida, estreitam-se bastante. As casas de cimento, aglomeram-se umas com as outras, por redução evidente dos quintais… A limpeza revela-se problemática… Xipamanine é um espaço grande, mas é ali que se encontra um dos maiores mercados da cidade de Maputo… E onde há comércio honesto, há também, como em qualquer parte do planeta, os aproveitadores do suor alheio, o que exige cautelas e precauções. Foi aí, num canto desse espaço, que encontrámos a casa do pintor Mankeu. Mankeu, também filho de Matalana, é amigo de infância de Malangatana. Quando jovem, por não ter encontrado trabalho na então Lourenço Marques colonial (tal como ainda hoje acontece na actual Maputo!), emigra para a África do Sul. Quando regressa, reencontra o seu amigo Malangatana, já
14
pintor conhecido e com obra feita. E quando dois amigos pintores se encontram, de que é que falam? De pintura, claro! E é por influência de Malangata, que Mankeu começa também a sentir o desejo de pintar e de fazer obra como o amigo. E hoje, Mankeu trilhou o seu próprio caminho, tem o seu próprio espaço, tem o seu próprio estilo e traço identificador, mas é pintor… como o amigo!...
Na cidade de cimento A cidade de cimento corresponde, genericamente, ao núcleo urbano da antiga Lourenço Marques. Desde a baía, o casario subiu a encosta, deixando para trás o Edifício dos Correios, a Estação dos Caminhos de Ferro, com a sua cúpula de desenhada por Eiffel (o mesmo que projectou a Torre Eiffel de Paris), passou pelo Edifício do Conselho Municipal, pela Catedral, pelo Jardim Tunduru (antigo Jardim Vasco da Gama), e veio a adormecer, lá no alto, em sucessivas avenidas largas e rectilíneas, bordejadas de acácias rubras e jacarandás, de flor lilás, e rodeou toda a zona do Hospital Central e da Av. Eduardo Mondlane. Foi por aqui, neste planalto adormecido, que encontrámos e entrevistámos outros amigos de Malangatana: o Arquitecto José Forjaz, no seu atelier, que se situa numa bela vivenda colonial, junto ao actual Shopping Polana; o Engº Álvaro Henriques, na mesma zona; e a Drª Inês Nogueira da Costa, professora universitária, nas instalações que a Universidade Eduardo Mondlane possui junto do Conselho Municipal. Detentores de vasta e diversificada cultura, com todos eles aprendi uma nova imagem de Malangatana, talvez mais técnica e científica (as características do traço, as constâncias de conteúdo, a evolução da forma…),
MALANGATANA HOYE!
Escola primária do Zimpeto
mas que, no fundo, acabavam sempre por realçar o lado humano do pintor. No Museu de História Natural, também materializado nesse alto que olha a baía, lá em baixo, ao fundo, procurámos o seu director – procurámos o iniciador da história Malangatana, um dos homens que incentivou o pintor a pintar. Não estava, por se encontrar doente. Mais tarde, acabámos por o entrevistar na sua própria casa e ficámos a saber como tudo começou: como era o trabalho de “apanha bolas” do jovem Malangatana no Clube de Ténis de Lourenço Marques e como a simples história de umas velhas sapatilhas puderam dar início à história da vida de um pintor.
Na caça à obra… Malangatana é um artista multifacetado. Para além de pintor é também escultor, cantor, poeta... Mesmo na área da expressão plástica, a sua obra não se limita a artes de interior… Pelo contrário, possui também obras de rua, umas de dimensão grandiosas, outras simples murais, que decoram pátios de escolas – objectos que, sem dúvida, enriquecem de alma vários recantos, alguns bem modestos, da cidade de Maputo. O grupo decidiu dar-lhes caça e partiu à sua descoberta! Desses arredores, guardo uma imagem difusa, incapaz de os redescobrir sozinho, sem o precioso apoio dos meus dois amigos moçambicanos. Ficaram também algumas histórias, como aquela do guarda de uma escola, que se passeava no interior, no pátio, com uma kalashnikov ao ombro. «Amigo, isso deve ser só para assustar. Não tem balas, pois não?!» Depois de avaliar a situação, e de um ligeiro trejeito de surpresa, o guarda sorriu e retirou o carregador da arma
Malangatana, “Quando nasce?” Obra pintada por ocasião do Workshop de Artes Plásticas organizado pela EPM-CELP em Novembro de 2005
e mostrou-mo. Afinal tinha! «É para quem quiser fazer mal às crianças!» Mas, felizmente, as crianças estavam em férias escolares, no recato de suas casas, e, na escola, só se encontravam o director, a quem pedimos autorização para filmar, e alguns professores ocupados nas suas tarefas burocráticas. Sei que estivemos a filmar um enorme mural e uma pintura de parede em instalações universitárias; que recollhemos imagens da escultura da Mabor, já à saída da cidade, e outra na Avenida de Angola; que estivemos no Bairro Jorge Dimitrov – Benfica e na Escola Primária de Zimpeto. Enfim, lugares que recordo, mas que já não saberei revisitar sem ajuda. De facto, fazer o vídeo para Malangatana foi trabalho, mas trabalho agradável. Não admira, por isso, que, na hora da avaliação crítica, a Directora da Escola tivesse dito: «O filme está muito bom, mas está muito comprido. As pessoas vão dispersar-se! Há que retirar mais alguns minutos.» Todos nós sabíamos que tinha. Mas como cortar, se a nossa vontade subjectiva era mostrar as quase duas horas e meia de gravações que fizemos? No final, negociámos os trinta minutos, que consideramos cheios de momentos significativos. Ao terminar, terei mesmo que agradecer a todos as memórias que me permitiram guardar desta terra que ainda estou a aprender!... Em especial ao Benites e ao Ilton, Sportinguista ferrenho (Enfim, nem tudo pode ser perfeito!) V.R.
15
HOMENAGEM DA EPM-CELP Centro de Recursos Educativos
Produções / Documentos de apoio ao evento 2
1
3
4
5
1 Convite para a sessão cultural de homenagem 2 Programa do evento 3 Catálogo das obras da Exposição “Ver e Sentir Malangatana”, da colecção do Mestre 4 Publicação da Colecção Memórias & Educação, n.º 10, intitulada “Malangatana - Nota Biográfica” 5 Cartaz alusivo ao evento
16
FICHA TÉCNICA: Direcção: Albina Santos Silva; Coordenação Executiva: Jorge Pereira; Coordenação, Texto e Fotografia: Vítor Roque ; Concepção Gráfica e Paginação: Judite dos Santos ; Colaboração: Benites Lucas José ; Produção: CRE, Janeiro 2006 Esta separata está integrada no Jornal Pátio das Laranjeiras (n.ºs 2930), da Escola Portuguesa de Moçambique - Centro de Ensino e Língua Portuguesa e não pode ser distribuída separadamente.