O Pátio - Edição 46

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IV SIMPOSIUM INTERNACIONAL DA EPM-CELP Para lá de todas as fronteiras uma singela homenagem a Eugénio Lisboa Chegou-nos com a voz, a presença, o halo de quem diz “confesso que vivi”, confesso que vivo, aqui, neste Universo, no seu todo, indissociável em categorias e onde tu não te distingues dele. Chegou-nos a voz, a presença de Eugénio Lisboa, Homem de cultura científica e humanista fundidas, só Homem e Homem só, no Cosmos de que faz parte. Voz da condição humana, da tragédia humana, da antevisão da morte, individual e universal. Voz que se alça para além das fronteiras que os homens traçaram, homem de raízes profundas no saber universal, de Shakespeare a Newton e na perplexidade de Nils Bohr, de mãos manchadas no sangue de Hiroshima. De Los Álamos, também, viu erguer-se o gigantesco cogumelo que paira sobre a cabeça da Humanidade, nivelados todos que estaremos pelo Nada, “Néant”. O caminho da entropia é o que o Homem decidir, destruindo-se ao destruir o Mundo, anulando até a memória de ter sido. Cogumelo do eterno esquecimento alisando a História, depois de Hiroshima nunca mais seremos os mesmos e urge que a consciência vigie os cadinhos da ciência, sob pena do inverno se perpetuar : “Um frio estelar rouba à glória a memória./ Ao mais e ao menos uma fria brisa alisa. / Arrefecido o homem, já da sua história / fica só nada, que o fluir do tempo pisa. / Do que fomos, nem de nos termos esquecido / traço fica. / Inocente, o tempo, liso, flui, / nem sabendo que não sabe. O já ter sido / é nem ter chegado a ser: o passado alui./ Eterno, sem lembrança, o frio acontecido” . Profética voz que nos ecoa dos anos da peste, gravando na topografia desta cidade uma outra que já não existe, a de Alberto Lacerda, a que consumiu Reinaldo Ferreira, a de folhearmos o livro de água de Glória de Sant’Ana, a de dividirmos as noites com Sebastião

insinuante que retorna devagar,/ ao palato amargo,/ à boca ardida,/ à crista do tempo,/ ao meio da vida” (Rui Knopfli). A meio do caminho da vida a nostalgia da infância, retorna, amiúdes vezes à lembrança um lugar mítico que já não há “«Gostaria tanto de acreditar num além onde pudesse voltar a encontrar a minha casa, o meu quarto, o Nero e a estantezinha de prateleiras mínimas onde cabiam à justa, as novelas Inquérito que eu lia como quem descobre! Porque não há uma máquina do tempo que me permita voltar à Mendonça Barreto e encontrar ali, pela primeira vez, a Senhora de Rênal a perguntarme, com uma doçura que me trespassou: «Que voulez-vous ici, mon enfant?». Quem sabe aquele canto da memória de Eugénio Lisboa permaneça imutável nalgum lugar?

Alba, a dos olhos deslumbrados de Fernando Couto, a de Fonseca Amaral, a de bebermos uma ou duas laurentinas com Grabato Dias. Poeta entre os poetas de Moçambique, poetas de Portugal, poetas do Mundo, que urge resgatar, assim que se entender que a poesia é como comermos mangas verdes com sal, dispensa ideologia e convém saborear cada palavra “de sabor longínquo,/ sabor acre,/ da infância a canivete repartida/no largo semicírculo da amizade,/ sabor

Niels Bohr: cientista que fugindo da perseguição nazi se instala nos EUA, onde fará parte da equipa que prepara a bomba atómica Los Álamos – central nuclear de onde partiu a destruição de Hiroshima e Nagasaki no fim da segunda guerra mundial Alberto Lacerda, Reinaldo Ferreira, Eugénio Lisboa, Rui Knopfli, Sebastião Alba, Fernando Couto, Glória de Sant’Anna, Grabato Dias pertencem a uma geração de poetas de Moçambique que, por razões ligadas à descolonização, não têm sido objecto da atenção que as suas obras literárias merecem, quer em Moçambique, quer em Portugal. Bibliografia consultada: Teresa Martins Marques, Eugénio Lisboa, um princípe das duas culturas. TN

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