Notícias Prévias 20.ª Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) | www.sph.org.pt | 0,01 €
Novembro de 2018
15 a 17 de novembro
CENTRO DE CONGRESSOS DO HOTEL TIVOLI MARINA VILAMOURA
Fase de ebulição científica, maior necessidade de atualização Organizada pelo Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central/Hospital de Santo António dos Capuchos (pág.4), a Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) 2018, além de destacar a produção científica nacional, com as comunicações orais e os pósteres a serem apresentados em «horário nobre», oferece um equilíbrio entre temas clássicos, mas que continuam a desafiar a prática clínica, como a minimização transfusional (pág.22) ou as infeções (pág.26), e a grande ebulição terapêutica que se regista, sobretudo, no âmbito das hemopatias malignas. A este nível, a Dr.ª Aida Botelho de Sousa, presidente da SPH e diretora do Serviço organizador, sublinha a evolução no conhecimento das mutações das leucemias agudas e os novos fármacos que permitem almejar a cura (pág.8) EQUPA DO SERVIÇO ORGANIZADOR (da esq. para a dta.): À frente – Margarida Santos (técnica de diagnóstico e terapêutica), Dr.ª Leonor Sarmento e Paula Lage (assistente técnica). Ao meio – Enf.ª Cândida Damião, Dr.ª Aida Botelho de Sousa, Dr.ª Joana Caldas e Dr.ª Alexandra Monteiro. Atrás – Enf.ª Fátima Pereira, Dr.ª Paula Sousa e Santos, Dora Bárbara (assistente técnica), Dr.ª Luísa Checa, Enf.ª Paula Jorge, Ricardo Dias (assistente técnico), Enf.ª Helena Xavier, Enf.ª Andreia Rocha, Enf.º Francisco Damião, Enf.ª Rosa Romão, Enf.ª Mafalda Loureiro, Dr.ª Margarida Fevereiro, Dr.ª Isabel Poças, Alexandra Lurenço (técnica de saúde), Dr. Marcos Lemos, Timóteo Costa (técnico de diagnóstico e terapêutica), Susana Santos (técnica superior de saúde), Ana Barbosa (técnica superior de saúde) e Maria José Caeiro (assistente técnica) PUB
publicidade
21
publicidade
EDITORIAL
Um primeiro ano de mandato desafiante
A
Direcção da Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) que tomou posse em Janeiro de 2018, constituída pelos Drs. João Raposo, José Pedro Carda, Rita Coutinho, Fátima Costa e por mim própria, está empenhada em fomentar a colaboração entre os hematologistas, incentivar a actividade científica e promover acções de natureza formativa. No entanto, a Direcção de uma Sociedade Científica não trabalha para si própria nem para um grupo virtual ideal: os seus projectos carecem de aceitação e adesão activa dos sócios. Deve ser um elemento facilitador de oportunidades para a troca de experiências e a discussão de temas controversos. Outro obstáculo em que soçobram boas iniciativas consiste na simples falta de tempo – a comunidade hematológica tem poucas pessoas, poucas horas disponíveis extra-rotina e é composta, a exemplo de outras áreas, por uma maioria que carece de ser trazida para a participação activa e uma minoria motivada mas sobrecarregada.
O que foi iniciado nestes 9 meses? • R enovação do website da SPH, agora mais ami-
gável e actualizado; • Reforço do apoio e enquadramento dos grupos de interesse, que se encontram em estádios muito diversos: Grupo de Linfomas e Grupo Português do Mieloma Múltiplo muito activos; Grupo de Neoplasias Mielóides Crónicas e Clube do Glóbulo Vermelho e do Ferro em reorganização; Grupo de Genética Laboratorial em Hemato-oncologia recém-criado; Grupo de Leucemias Agudas em fase embrionária. Veremos apresentar, ainda neste mês de Novembro, estudos multicêntricos retrospectivos, potenciais «provas de capacidade» de futuros trabalhos prospectivos, em associação ou não a grupos europeus; • Atribuição de bolsas de formação avançada e de iniciação à investigação, e patrocínio conjunto com a Associação Portuguesa Contra as Leucemias (APCL) e empresas da indústria farmacêutica de duas bolsas de investigação; • S essões interactivas de discussão de casos clínicos (tirando partido das salas de vídeo-conferência Paul-Janssen), que podem aproximar as equipas bem mais do que iniciativas mais formais.
Que outras iniciativas temos em preparação? • Encontro sobre questões tão relevantes como
o acesso às novas drogas, a gestão dos ensaios clínicos, a organização dos serviços ou a contratação de especialistas, actualmente sujeita a regras aberrantes. Só a participação activa dos interessados fará a «prova de bondade» destas duas últimas iniciativas; • P ublicação de estados da arte em patologias frequentes, em conclusão de negociações; • I nvestimento junto da direcção da European Hematology Association (EHA) na correcção do erro de classificação da especialidade em Portugal, derivado de um mal-entendido de interpretação, que é muito limitador do trabalho dos hematologistas portugueses fora de portas.
Desafios da Hematologia na actualidade A Hematologia assiste a avanços notáveis e rapidíssimos, com tradução para a clínica de descobertas básicas e com disseminação para a comunidade de tecnologias antes reservadas à investigação. Em muitas áreas, as recomendações diagnósticas e de estratificação prognóstica estão a mudar. Tudo isto gera enorme entusiasmo, mas também absoluta necessidade de sintetizar e integrar este florescente conhecimento, actualizando os hematologistas quanto às mudanças de paradigma terapêutico trazidas pela aprovação, com uma rapidez sem precedentes, de múltiplas novas drogas. Este parece ser o principal desafio actual. Outro desafio é a escassez de novos hematologistas em Portugal, cujo número é ainda insuficiente para fazer face à saída de seniores, mas também de juniores atraídos por condições de trabalho menos exigentes ou salários mais robustos. Para mais, o número de doentes está a aumentar em termos reais, devido à maior longevidade, e em termos aparentes, por muitas hemopatias serem cada vez menos mortais.
cionais e conferências. Para fomentar a divulgação 3 do trabalho dos centros e a discussão entre os participantes, as comunicações livres (orais ou pósteres) ocuparão quase metade da duração do programa científico. Manter-se-ão os habituais prémios para algumas das melhores comunicações. A reunião volta este ano a ser acreditada pela EHA. Decorrerá em paralelo, como tem sido tradição, um promissor Programa de Enfermagem. O programa científico é denso e aliciante, mas haverá espaço para reuniões dos grupos de APROVADO interesse e os intervalos permitirão aproveitar a marina envolvente, nesta altura do anoPELA quaseEMA liberta de turistas.
Aida Botelho de Sousa
Reunião da SPH 2018
Presidente da Sociedade Portuguesa de Hematologia
A 20.ª edição da Reunião Anual da SPH decorre em Vilamoura, é organizada pelo Serviço de Hematologia Clínica do Hospital de Santo António dos Capuchos e incluirá as habituais sessões educa-
NOTA: a autora deste texto escreve segundo as regras do anterior Acordo Ortográfico.
Ficha Técnica EDIÇÃO:
CONGRESSO ORGANIZADO POR:
Secretariado Veranatura - Conference Organizers Rua Augusto Macedo, n.º 12-D - Esc. 2 • 1600-503 Lisboa Tel.: (+351) 217 120 778 • (+351) 217 120 779 geral@sph.org.pt • www.sph.org.pt
Na LLA recidivante ou refratária, direcione o seu alvo
Esfera das Ideias, Lda. Campo Grande, n.º 56, 8.º B • 1700-093 Lisboa Tel.: (+351) 219 172 815 • geral@esferadasideias.pt www.esferadasideias.pt • f EsferaDasIdeiasLda Direção: Madalena Barbosa (mbarbosa@esferadasideias.pt) Marketing e Publicidade: Ricardo Pereira (mbarbosa@esferadasideias.pt) Coordenação editorial: Luís Garcia (lgarcia@esferadasideias.pt) Textos: Ana Rita Lúcio, Luís Garcia, Rui Alexandre Coelho e Sandra Diogo • Fotografia: João Ferrão • Design e paginação: Susana Vale
PATROCINADORES DESTA EDIÇÃO:
Publicação isenta de registo na ERC, ao abrigo do Decreto Regulamentar n.º 8/99, de 6 de junho, artigo 12.º, 1.ª alínea
anuncio 225x155_Besponsa_AF3.indd 1
Novembro 2018
sa co 0 m re tr B P e re d d u h d e u P d 3 u p n co a in n h in Ta P co ≤ d sí ≤ [C e d p a a co fo ce (2 d o in h e re d d m n M T
REPORTAGEM
EQUIPA MÉDICA (da esq. para a dta.): À frente – Joana Caldas, Isabel Poças, Gilda Ferreira, Leonor Sarmento, Luísa Checa e Paula Sousa e Santos. Atrás – Mariana Fernandes, Marcos Lemos, Aida Botelho de Sousa, Maria Henrique, Rebeca Brito e Alexandra Monteiro
4
Referência no tratamento das leucemias agudas com implantação clínico-laboratorial Especialmente vocacionado para o tratamento das hemopatias malignas e, dentro destas, com particular diferenciação em leucemias agudas, o Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central/Hospital de Santo António dos Capuchos (CHULC/HSAC) tem como principal mais-valia o facto de integrar, no mesmo edifício, as vertentes clínica e laboratorial. Elegendo o trabalho em equipa como outra trave-mestra da sua atividade, que é pautada pelo compromisso férreo com a qualidade assistencial, este Serviço debate-se, no entanto, com os desafios colocados pela escassez de recursos humanos e pela necessidade de renovação e ampliação de instalações. por Ana Rita Lúcio e Madalena Barbosa
P
rotegido por vetustas paredes que denunciam o passado secular do antigo convento onde se instala o HSAC, o Serviço de Hematologia Clínica (SHC) é o protagonista de uma história cujo relato nos leva, igualmente, a recuar no tempo, ao ano da sua fundação, em 1975, pelo Dr. Renato Valadas Preto, à época diretor do Serviço de Medicina. Louvado, nas palavras da Dr.ª Aida Botelho de Sousa – que assume a direção desde 2003 –, pela «investigação pioneira em doenças da hemoglobina», este internista transmitiu às gerações seguintes uma herança que se converteu num dos valores distintivos deste Serviço de Hematologia: a relação próxima entre a clínica e o laboratório. Desde o início que os hematologistas tiram partido de um laboratório fisicamente integrado dentro do perímetro do Serviço. Aida Botelho de Sousa sublinha que a «filosofia clínico-laboratorial» prestou-se, inicialmente, a apoiar a abordagem às doenças da hemoglobina, sobre as quais Valadas Preto tinha particular interesse. Hoje em dia, essa simbiose entre clínica e laboratório «é instrumen-
tal», designadamente na resposta às leucemias agudas e aos linfomas, doenças para as quais este Serviço tem «especial vocação», segundo a sua diretora, apesar de se dedicar ao diagnóstico e ao tratamento de todas as patologias do foro hematológico. Essa é uma das razões pelas quais dispor de um «laboratório que funciona dentro de portas é um fator essencial para o bom desempenho do Serviço». Atualmente, «tanto nas leucemias agudas ou crónicas como nos linfomas, as decisões diagnósticas, prognósticas e terapêuticas são cada vez mais baseadas em dados de classificação laboratorial, fornecidos pela imunofenotipagem». Como tal, «a discussão estreita entre os elementos que se dedicam à clínica e ao laboratório é crucial, assim como a translação de conhecimentos entre ambas as áreas», explica Aida Botelho de Sousa.
Laboratório no centro de toda a atuação O Laboratório do Serviço de Hematologia Clínica (SHC) do CHULC/HSAC é composto por três secções: Citomorfologia, coordenada pela
Dr.ª Isabel Poças, patologista clínica especializada em citologia hematológica; Citometria de Fluxo, coordenada pela Dr.ª Joana Caldas, hematologista; e Citogenética, coordenada pela Dr.ª Patrícia Ribeiro, também hematologista. Além destas responsáveis, estão afetos ao Laboratório três técnicos superiores e quatro técnicos de diagnóstico e terapêutica. Concordando que «é uma grande mais-valia, tanto para os doentes como para os profissionais de saúde, o Laboratório funcionar dentro do Serviço», Joana Caldas serve-se de uma metáfora curiosa para caracterizar a articulação entre os domínios clínico e laboratorial. «Funcionamos quase como uma “linha de montagem”: quando o doente chega até nós, no Hospital de Dia, é feita a colheita dos produtos necessários para confirmar a suspeita diagnóstica, que são imediatamente transferidos para o Laboratório. Desta forma, obtemos a confirmação diagnóstica, geralmente em poucas horas, o que nos ajuda a não perder tempo na instituição do tratamento.» Conjugando a prática clínica com o trabalho laboratorial, esta
hematologista confessa que é para si «particularmente gratificante ter a oportunidade de consultar o doente e, em seguida, analisar as suas células no laboratório, de modo a resultar num diagnóstico». Quanto à citometria de fluxo, Joana Caldas refere que esta «é uma área em franca expansão», que, além da utilidade diagnóstica, «adquiriu também um singular interesse prognóstico, devido ao estudo da doença residual mínima [DRM]». Este é um conceito «cada vez mais utilizado na abordagem da maioria das patologias hemato-oncológicas», nomeadamente das leucemias agudas, do mieloma múltiplo e da leucemia linfocítica crónica, sendo já encarado como um fator que influencia a decisão terapêutica». Perante «o número crescente de indicações para realizar citometria de fluxo», a responsável por esta secção admite a necessidade de «mais colaboradores para dar resposta a esta técnica que, tantas vezes, dirige o estudo molecular e citogenético». Seguir as diretrizes do EuroFlow, que «pugnam pela uniformização de práticas a nível europeu», é outro desafio que esta secção do Laboratório abraça. Responsável pela secção de citogenética (clássica e FISH [hibridação fluorescente in situ]), a Dr.ª Patrícia Ribeiro acrescenta que a permeabilidade entre laboratório e clínica contribui para tornar este SHC «autossuficiente em todos os exames complementares necessários para melhor definir o prognóstico das leucemias, à luz do conhecimento atual». Esta é uma «vantagem inequívoca», que se repercute «na qualidade do ensino» proporcionado aos internos que aqui completam a sua formação, aos quais, desde cedo, «é incutida esta dualidade clínico-laboratorial». Com vista a facilitar a interligação entre ambas as vertentes, Patrícia Ribeiro considera «fundamental» que haja um responsável clínico no laboratório. «Assim, consultamos o doente, observamos e orientamos a parte laboratorial, fazendo, por exemplo, sugestões para que se efetue determinada análise em detrimento de outra, o que possibilita uma maior rentabilização dos recursos.» Embora reconhecendo que «existem técnicas caras que ainda não são realizadas neste Serviço», a
hematologista vaticina que «o futuro será marcado, sobretudo, pelo estudo genético, pelo que a next generation sequencing [NGS] será essencial». Para contornar uma das limitações do SHC do CHULC/HSAC – a impossibilidade de fazer investigação básica, desde logo devido à falta de espaço –, Patrícia Ribeiro realça a importância das parcerias estabelecidas com laboratórios universitários, que «permitem recorrer a tecnologias mais inovadoras». «A investigação desenvolvida no âmbito da leucemia mieloide crónica é um desses exemplos», diz.
Sala de Citomorfologia
Sala de Citometria de Fluxo
Internamento, Consulta Externa, Hospitais de Dia e Urgência As 24 camas existentes no internamento, em salas com ar filtrado sob pressão positiva e filtros HEPA (high efficiency particulate arrestance), «estão quase totalmente destinadas aos doentes leucémicos agudos, razão pela qual, quando há necessidade de internar doentes com outras patologias hematológicas, temos de o fazer “fora de portas”, em camas de outros Serviços, que assim ficam a nosso cargo», revela Aida Botelho de Sousa, acrescentando que tal «justifica a taxa de ocupação do internamento de 115%, em média». Além destas 24 camas, existem mais quatro, em quartos isolados, na Unidade de Transplante Hematopoiético Autólogo. Todos os doentes com hemopatias que dispensam internamento são seguidos na Consulta Externa. De acordo com a diretora, «as hemopatias malignas representam cerca de 50% das consultas», mais concretamente os linfomas, as leucemias mieloides crónicas, as leucemias linfáticas crónicas e outras neoplasias mieloproliferativas crónicas. As doenças benignas representam a outra metade das consultas externas, sendo que existem duas consultas específicas de hemoglobinopatias e hemóstase. O SHC do CHULC/HSAC dispõe de dois Hospitais de Dia, um deles partilhado com o Serviço de Oncologia Médica, onde se realizam os tratamentos de quimioterapia. Já no Hospital de Dia Hematológico realizam-se todos os restantes procedimentos diagnósticos e terapêuticos que «podem ser feitos de forma programada e em ambulatório, visando
Números de 2017
11 hematologistas 7 internos 1 patologista clínica 45 enfermeiros 25 assistentes operacionais 6 assistentes técnicos 3 técnicos superiores de saúde 4 técnicos de diagnóstico e terapêutica 24 camas de internamento 115% de taxa de ocupação média 4 quartos isolados na Unidade de
Transplante
700 internamentos 3 a 4 semanas de demora média no internamento
15 000 consultas externas (das quais 1 700 primeiras consultas) 65 transplantes autólogos de células progenitoras hematopoiéticas
100 colheitas de células para transplante a redução do número de internamentos inúteis», frisa Aida Botelho de Sousa. É com particular orgulho que a diretora alude a outra valência «absolutamente fundamental na vida de um Serviço de Hematologia de intensivos»: a prestação de cuidados urgentes. Neste âmbito, os hematologistas dão resposta à urgência interna, que abrange «os doentes internados neste e noutros Serviços da “casa” ou seguidos nos Hospitais de Dia», e à urgência referenciada, que se destina aos «doentes encaminhados por outras unidades de saúde, em situações que não podem esperar pela consulta». Referindo que a urgência referenciada funciona 24 horas por dia, sete dias por semana, Aida Botelho de Sousa afirma: «Na maior parte dos casos, é desta forma que os doentes com leucemias agudas chegam até nós.»
Sala de Citogenética
Novembro 2018
5
REPORTAGEM
Transplante: resultados consolidados permitem alargar fronteiras Iniciado em 1997, o Programa de Transplante Autólogo de Células Progenitoras Hematopoiéticas (TACPH) é coordenado por Aida Botelho de Sousa desde 2001, que salienta «os resultados muito favoráveis» desta valência. «No nosso Serviço, a mortalidade associada ao transplante ao centésimo dia é de 1,1%. Já a sobrevivência mediana, com um seguimento médio de sete anos, situa-se nos 66%, índices que são sobreponíveis aos dos registos europeus e norte-americanos.» Dos 11 hematologistas que trabalham neste SHC, três dedicam-se a esta área, embora não exclusivamente, realizando «uma média de 65 transplantes por ano». Segundo a diretora, a Unidade de TACPH do Hospital de Santo António dos Capuchos «é um dos dois centros, em todo o país, que se encarregam integralmente de todo o work-up pré-transplante (aférese, processamento, congelamento e armazenamento das células progenitoras hematopoiéticas)», além do consequente transplante. Contudo, prevê-se que os procedimentos pré-transplante sejam transferidos para o Serviço de Imuno-Hemoterapia. «Essa transição trará a vantagem de nos libertar de uma fatia extremamente pesada do
6
trabalho, mas também a desvantagem de deixarmos de ter um controlo direto sobre o processo», reflete Aida Botelho de Sousa. Mieloma múltiplo, linfoma não Hodgkin, linfoma de Hodgkin e, minoritariamente, leucemias agudas e tumores de células germinativas são as neoplasias hematológicas que mais frequentemente motivam a realização de TACPH. A transplantação alogénica não figura, porém, nos planos próximos deste Serviço. «Enquanto a mudança para infraestruturas de mais recente construção não se concretizar, não poderemos ampliar a nossa atividade como gostaríamos», lamenta a diretora. Não obstante, de olhos postos no futuro, é com regozijo que Aida Botelho de Sousa avança que o Serviço que dirige estará, a breve trecho, «em condições de iniciar um programa de transplante de células progenitoras hematopoiéticas para tratamento de doenças autoimunes, nomeadamente a esclerose sistémica e a esclerose múltipla». E pormenoriza: «Passámos o último ano a protocolar, em conjunto com a Medicina Interna, a Cardiologia, a Pneumologia e a Neurologia do nosso centro hospitalar, os critérios de inclusão e exclusão destes doentes, em conformidade com as regras da European Society for Blood and Marrow
Transplantation, para termos a certeza de que poderemos ambicionar a eficiência máxima com a mínima mortalidade possível.»
Formar e investigar: desígnios imprescindíveis A escassez de recursos médicos, aqui como noutras unidades de Hematologia, «é crónica e um dos grandes obstáculos», sublinha a Dr.ª Aida Botelho de Sousa. Todavia, a necessidade de «contratar cinco hematologistas nos próximos dois anos, de modo a cobrir todas as atividades do SHC do CHULC/HSAC com qualidade e em tempo útil», não impede que a atual equipa faça todos os esforços para responder também «a dois outros domínios essenciais na vida dos serviços hospitalares diferenciados: a formação e a investigação». Do ponto de vista formativo, este Serviço partilha «o ensino pré-graduado de Hematologia aos alunos do 5.º ano da Nova Medical School/Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa com o Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa», nota a diretora. Já em termos pós-graduados, a par de receber internos do Ano Comum e de formação específica em Hematologia, este SHC proporciona estágios de três a quatro meses a internos de outras especialidades, como
Enfermagem na vanguarda
Os 45 enfermeiros que trabalham no Serviço de Hematologia Clínica do CHULC/HSAC «dão apoio a todos os setores, à exceção do laboratório», refere Cândida Damião, a enfermeira responsável. Ao passo que os elementos afetos ao internamento, aos Hospitais de Dia, à Urgência e à Consulta Externa são distribuídos rotativamente por estas áreas, «a equipa que dá suporte à Unidade de Transplante é fixa, sendo composta por oito enfermeiros». «Acompanhar a vanguarda dos cuidados prestados aos doentes hemato-oncológicos, que são altamente críticos, é o grande propósito do trabalho desenvolvido pela Enfermagem neste Serviço», enfatiza Cândida Damião.
ENFERMEIROS PRESENTES NO DIA DA REUNÃO MENSAL DE OUTUBRO (da esq. para a dta.): À frente – Simão Pimenta, Márcia Caeiro, Inês Bastos, Joana Pimpão, Verónica Amador, Diana Roriz, Sofia Antunes, Joana Sousa, Cândida Damião e Fátima Pereira. Atrás – Mariana Cândido, Rute Severino, Ana Cristina Guerreiro, Cláudia Oliveira, Paula Jorge, Cátia Sampaio, Ana Frade, Cesaltina Anes, Adriana Pinto, Joana Vaz, Melanie Cristeta, Fernanda Viana, Joana Monteiro, Catarina Carvalho, Ana Gomes e Ana Rita Brito
Oncologia, Medicina Interna ou Imuno-Hemoterapia, vindos de diversos pontos do país. No que concerne à atividade científica, Aida Botelho de Sousa reconhece que «o Serviço necessita e deseja fazer bastante mais investigação do que aquela que é capaz de fazer de momento». E acrescenta: «Desde que a equipa reduziu, tivemos de colocar um travão aos trabalhos de iniciativa do investigador, mantendo-se, ainda assim, os ensaios multicêntricos patrocinados pela indústria farmacêutica, bem como estudos de colaboração com entidades internacionais, como a European Society for Blood and Marrow Transplantation e a European Organisation for Research and Treatment of Cancer.» Cinco dos onze hematologistas do Serviço dedicam-se à investigação, sobretudo a ensaios clínicos de leucemias agudas, mieloma múltiplo e síndromes mielodisplásicas. NP
A Dr.ª Fátima Costa dá uma aula de Hematologia a um grupo de alunos do 5.º ano da Faculdade de Medicina da Universidade Nova de Lisboa
Qualidade como imperativo
Elegendo o compromisso com a excelência como uma das suas metas permanentes, o Serviço de Hematologia Clínica do CHULC/ /HSAC implementou um sistema de gestão da qualidade que, na opinião de Aida Botelho de Sousa, «tem sido instrumental para a melhoria contínua dos resultados». Internamente, a gestão da qualidade é assegurada pela enfermeira responsável, Cândida Damião, e pela coordenadora administrativa, Paula Lage. Em resultado desta forte preocupação com a qualidade dos cuidados prestados, o Serviço foi acreditado pelo organismo internacional CHKS em 2014. Quatro anos depois, a sua Unidade de Transplante Autólogo de Células Progenitoras Hematopoiéticas recebeu a acreditação da Direção-Geral da Saúde. 7 PUB
publicidade Novembro 2018
ENTREVISTA A Reunião da SPH 2018 é acreditada pela
«Após 20 anos, há novidades importantes para o tratamento das leucemias agudas»
8
A Dr.ª Aida Botelho de Sousa, diretora do Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central/Hospital de Santo António dos Capuchos (CHULC/ /HSAC), o organizador da Reunião Anual da SPH 2018, explica as linhas mestras e os temas do programa científico. Além de destacar a produção científica nacional, com as comunicações orais e os pósteres a serem apresentados em «horário nobre», esta reunião oferece um equilíbrio entre temas clássicos, mas que continuam a desafiar a prática clínica, como as infeções ou a minimização transfusional, e a grande ebulição terapêutica que se regista, sobretudo, no âmbito das hemopatias malignas. A este nível, a também presidente da SPH sublinha a evolução no conhecimento das mutações das leucemias agudas e os novos fármacos que permitem almejar a cura. por Ana Rita Lúcio e Madalena Barbosa
Quais as linhas orientadoras da Reunião Anual da SPH 2018? Desde logo, propusemo-nos elaborar um programa científico abrangente e equilibrado entre a abordagem de temas com implicações imediatas no nosso dia-a-dia e a análise do estado da arte da investigação em Hematologia. Por outro lado, tivemos a preocupação de incidir sobre questões menos discutidas em edições anteriores da Reunião Anual da SPH.
Porque decidiram concentrar no primeiro dia, quinta-feira, as sessões organizadas e patrocinadas pelas empresas que atuam nesta área? É certo que a presença da indústria farmacêutica e de dispositivos médicos é necessária – aliás, o seu apoio é indispensável à viabilização de qualquer reunião científica –, mas o princípio da «separação das águas» é algo que consideramos salutar. Este ano, temos um dia pré-congresso (quinta-feira, 15 de novembro) com um programa de excelente qualidade, composto por cursos, na parte da manhã, e por vários simpósios-satélite, na parte da tarde. Como tal, lanço o repto aos meus pares, diretores dos Serviços de Hematologia nacionais, para que libertem, o mais possível, não só os seus internos, como também os especialistas, de modo
a que possam chegar na quarta-feira à noite e estar presentes na Reunião da SPH logo na quinta-feira de manhã. Com esse objetivo, vamos disponibilizar transporte gratuito, um autocarro que partirá do Porto ao fim da tarde de 14 de novembro, com paragens em Coimbra e Lisboa [mais informações no website da SPH, https://sph.org.pt, e inscrições através do e-mail cidaliampacheco@veranatura.pt].
As comunicações orais e os pósteres vão ser apresentados em «horário nobre», isto é, das 8h00 às 9h00 e durante toda a tarde de sexta-feira. Porque lhes é dado este destaque? Consideramos fundamental dar valorização máxima à produção científica nacional, nomeadamente às comunicações livres, sejam orais ou em pósteres, pelo que lhes reservámos o primeiro momento da manhã e toda a tarde de sexta-feira. Este ano, foram submetidos para apresentação na nossa Reunião 147 trabalhos. Dos 134 trabalhos médicos, a Comissão Científica selecionou 40 para apresentar em comunicação oral e cerca de 80 em póster. Outro dos nossos pontos de honra, quanto à apresentação destes trabalhos e a todo o programa científico, é dar tempo para discussão e interação com a assistência, o que, por vezes, tende a ser relegado para segundo plano.
Como comenta os temas escolhidos para o Programa Educacional 1? Tendo por base a decisão de não apresentar programas educacionais monotemáticos, a primeira destas sessões aborda diferentes áreas, começando
pelas doenças mieloproliferativas crónicas, nomeadamente a policitemia vera e a trombocitemia essencial, com a Prof.ª Emília Cortesão, hematologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, a fazer uma revisão sobre as novas recomendações internacionais. Em seguida, a Dr.ª Sara Morais, responsável pela área de Trombose e Hemóstase do Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar Universitário do Porto/Hospital de Santo António, versará sobre as novidades no âmbito da anticoagulação dos doentes com hemopatias malignas. Depois, o Dr. António Robalo Nunes, imuno-hemoterapeuta no Hospital das Forças Armadas/ /Polo de Lisboa, vai falar sobre uma questão que considero de extrema importância em Hematologia: a racionalização transfusional. Nos últimos anos, publicaram-se estudos muito robustos na demonstração de que transfundir em excesso é deletério. Contudo, na prática clínica diária, a aplicação de estratégias de minimização das transfusões continua a enfrentar algumas dificuldades. O Programa Educacional 1 encerra com um debate pleno de atualidade, que será lançado pelo Dr. Fernando Príncipe, hematologista no Centro Hospitalar Universitário de São João, a respeito do atual papel da esplenectomia no tratamento de segunda linha da púrpura trombocitopénica imune.
O Programa Educacional 2, também na sexta-feira de manhã, centra-se na problemática das infeções. Porquê? O Serviço de Hematologia Clínica do CHULC/HSAC está, desde há vários anos, muito vocacionado
European Hematology Association (EHA)
para o tratamento e o estudo das infeções nos doentes imunodeprimidos, daí que esta área nos seja particularmente cara. O Dr. Filipe Calinas, gastrenterologista no CHULC/HSAC, com subespecialização em Hepatologia, procurará alertar os hematologistas para a necessidade de investigar as infeções por vírus das hepatites B e C e de proceder ao seu tratamento antes de iniciar qualquer terapêutica imunossupressora. A seguir, será colocada a tónica num dos temas que mais preocupa os hematologistas nos dias de hoje: a existência de bactérias resistentes a praticamente todos os antibióticos, o que se tem refletido no aumento da mortalidade dos doentes leucémicos agudos e transplantados, podendo vir a limitar a intensidade do seu tratamento. Atualmente, este é o principal problema enfrentado pelos serviços que tratam leucemias agudas e pelas unidades de transplante. Por isso, é absolutamente crítico que os hematologistas se debrucem sobre este tema. Esperamos que a palestra do Prof. José Artur Paiva, diretor clínico do Centro Hospitalar Universitário de São João e ex-diretor do Programa Nacional de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência a Antimicrobianos, marque o início de uma discussão aberta sobre as medidas que cada Serviço de Hematologia está a conseguir implementar para combater este problema.
O tema escolhido para a Lição de sexta-feira relaciona-se com este desafio? Infelizmente, nem sempre é dado o devido relevo à vacinação dos doentes com leucemia aguda e dos doentes alvo de transplante de células progenitoras hematopoiéticas. Por exemplo, quando se destrói a medula óssea com a quimioterapia intensiva de condicionamento num doente transplantado, a memória vacinal desaparece do sistema imuni-
O pioneirismo de Valadas Preto
Para a Dr.ª Aida Botelho de Sousa, a homenagem ao Dr. Renato Valadas Preto, através da atribuição do seu nome à Lição de 17 de novembro, «é de plena justiça». Fundador do Serviço de Hematologia do Hospital de Santo António dos Capuchos, em 1975, no seio do Serviço de Medicina, do qual era diretor, este internista «fez investigação pioneira em doenças da hemoglobina e publicou trabalhos muito importantes sobre a drepanocitose», pelo que, desde o início, este Serviço de Hematologia teve um cunho clínico-laboratorial. A atual diretora, que, enquanto interna, ainda trabalhou com Valadas Preto, considera-o «uma figura notável a vários títulos». Conhecido pelo seu «humor cáustico e até provocador», era também «um médico muito inovador e cheio de ideias», além de um «homem extremamente culto, inteligente e um pianista devoto». tário, pelo que temos de revacinar estes doentes, mas temos sido um pouco «preguiçosos» a este nível. Foi por isso que escolhemos este tema para a Lição do dia 16 de novembro, convidando para preletora a Prof.ª Catherine Cordonnier, diretora do Departamento de Hematologia dos Hôpitaux Universitaires Henri Mondor, em Créteil, França. Esta especialista é um membro muito ativo na European Conference on Infections in Leukaemia [ECIL] e uma das redatoras da ECIL4, da qual eu também fiz parte.
Os Programas Educacionais 3 e 4, já no sábado, centram-se nas hemopatias malignas. O que evidencia destas duas sessões? O Programa Educacional 3 arranca com a preleção da Dr.ª Graça Esteves, hematologista no Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, sobre a amiloidose de cadeias leves, uma doença de diagnóstico difícil e relativamente à qual é importante fazer uma revisão. Em seguida, a Prof.ª Maria Gomes da Silva, diretora do Serviço de Hematologia do IPO de Lisboa, apresentará o que
há de novo no tratamento do linfoma de células do manto. Ao Prof. Peter Johnson, responsável pelo Southampton Cancer Research UK Centre, caberá traçar o panorama da terapêutica de primeira linha do linfoma difuso de grandes células B, sublinhando a utilidade da estratificação de risco por subtipo de doença. Já o Prof. Martin Hutchings, hematologista no Copenhagen University Hospital e presidente do Comité Científico do Grupo de Linfoma da European Organisation for Research and Treatment of Cancer [EORTC], vai focar a redução da toxicidade do tratamento do linfoma de Hodgkin com os novos anticorpos, mantendo a elevada taxa de cura que já se atingiu. O Programa Educacional 4 centra-se nas leucemias agudas porque, finalmente, depois de 20 anos, há novidades importantes para o seu tratamento. A Dr.ª Nicola Gökbuget, hematologista na Universitätsklinikum Frankfurt, na Alemanha, vai abordar a importância de decidir o tratamento da leucemia linfoblástica aguda em função da doença residual mínima. Segue-se a preleção de outro alemão, o Dr. Klaus Metzeler, investigador na Ludwig-Maximilians-Universität München, que, à luz dos novos conhecimentos da sequenciação dos genomas integrais da leucemia mieloide aguda [LMA], dará conta das mutações que desencadeiam esta doença, pelo que devem orientar o tratamento.
O programa científico encerra com a Lição Valadas Preto. Porque foi escolhido para preletor o Prof. Robert P. Gale?
COMISSÃO ORGANIZADORA DA REUNIÃO ANUAL SPH 2018: Paula Lage, Dr.ª Aida Botelho de Sousa, Dr. Marcos Lemos, Dr.ª Joana Caldas, Dr.ª Margarida Fevereiro, Dr.ª Alexandra Monteiro e Dr.ª Leonor Morais Sarmento. Ausente na fotografia: Dr.ª Cátia Lino Gaspar
Este hematologista norte-americano, que atualmente exerce no Hammersmith Hospital, no Reino Unido, e é docente no Imperial College London, dispensa apresentações. No entanto, posso dizer que, ao longo das últimas décadas, montou algumas unidades de transplante medular nos EUA; é o editor-chefe da Leukemia, uma das principais revistas científicas em Hematologia; e é um provocador nato, que escreve editoriais a pôr em causa o seu próprio trabalho. Neste momento, o Prof. Gale interessa-se muito pelas mutações da LMA e pelo tratamento diferenciado. Depois de 20 anos a fazermos o mesmo, finalmente temos novos fármacos que nos dão esperanças de poder curar a LMA. NP Novembro 2018
9
COMISSÃO CIENTÍFICA
Comissão Científica realça novas terapêuticas e investigação nacional Segundo os membros da Comissão Científica, o programa da Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) 2018 tem como principal vantagem o facto de conciliar a abordagem de novas investigações, nomeadamente ao nível da terapia celular e das terapêuticas personalizadas, com problemas bem conhecidos, mas que continuam a desafiar a atuação dos hematologistas. É o caso das infeções por enterobacteriáceas produtoras de carbapenemases e da anticoagulação no doente hemato-oncológico.
Dr. Fernando Príncipe
O
Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto
10
programa da Reunião SPH 2018 representa a necessidade de evolução científica dos hematologistas tanto em termos de investigação como de resposta aos desafios diários da prática clínica. Penso que há uma necessidade de atualização e de informação relacionadas com o uso dos novos medicamentos em contexto da vida real e fora dos ensaios clínicos, bem como de definição dos grupos terapêuticos com custo/benefício e eficácia, daí a premência de criar consensos sobre as melhores práticas. Nesse sentido, os cursos deste ano são importantes para a definição das práticas diagnósticas e terapêuticas, que estão em constante evolução, nomeadamente no campo do mieloma múltiplo. Também será discutida a importância que as células CAR-T poderão ter na referenciação de doentes e serviços. Nas restantes sessões, no âmbito da Hematologia Clínica geral, vão ser discutidos temas que carecem de atualização por existirem novos fármacos, nomeadamente a hipocoagulação dos doentes hemato-oncológicos e as melhores estratégias para os regimes pré-transfusionais. Já no âmbito da hemato-oncologia, controlar e tratar adequadamente as infeções é um grande desafio, pela emergência das estirpes resistentes resultantes da pressão antibiótica. É igualmente necessário discutir a doença residual mínima na sua vertente diagnóstica e a sua ligação à prática terapêutica, bem como conhecer e diagnosticar as mutações da doença clonal neoplásica. A presença de vários palestrantes estrangeiros é o resultado da internacionalização da Hematologia portuguesa e representa o reconhecimento além-fronteiras dos projetos de investigação e da prática clínica em Portugal. Já a apresentação de comunicações orais e pósteres demonstrará que os hematologistas e internos desta especialidade são dinâmicos e desenvolvem trabalhos de índole internacional.
Prof.ª Margarida Lima
A
Centro Hospitalar Universitário do Porto/Hospital de Santo António Reunião Anual da SPH 2018 tem como principal preocupação discutir alguns temas atuais, mas também ter uma função formativa para os médicos mais jovens. Importa salientar que uma das grandes mais-valias deste evento é permitir a convivência e a partilha de experiências entre as pessoas que trabalham na área da Hematologia. O programa científico deste ano é muito diversificado e aborda algumas das áreas que registaram maior evolução nos últimos anos. Refiro-me, por exemplo, às bases moleculares das doenças e às novas abordagens terapêuticas. Por outro lado, não foram esquecidos os temas mais convencionais, mas que continuam a merecer discussão, como o papel da esplenectomia na trombocitopenia imune e a anticoagulação em doentes hemato-oncológicos. Na prática, o que me parece mais salutar no programa deste ano é o facto de abordar aspetos tão diversos quanto aqueles que dependem de uma aquisição de conhecimentos muito recente e assuntos antigos, mas que continuam a merecer discussão. Por outro lado, teremos ainda a oportunidade de analisar um tema que, embora não seja específico da Hematologia, é muito atual: a resistência aos antibióticos, uma realidade preocupante nos hospitais e um verdadeiro problema de saúde pública, que desafia todos os profissionais de saúde. Não termino sem destacar a atribuição de prémios para os melhores trabalhos apresentados sob a forma de póster e comunicação oral, cujo mérito deve ser reconhecido.
Dr.ª Patrícia Ribeiro
C
Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central/Hospital de Santo António dos Capuchos reio que a Reunião Anual da SPH deve desempenhar uma ação fundamental no que concerne não só a divulgar e a promover a discussão dos temas de maior relevo e atualidade no campo da Hematologia, como também a desenvolver iniciativas educacionais e formativas prementes. A Comissão Científica assume um papel importante a esse nível, sobretudo na seleção dos melhores trabalhos a apresentar na Reunião e no fomento do debate à volta dos mesmos. Seguindo e até aprofundando uma opção tomada nas últimas edições, este ano, a apresentação de trabalhos científicos sob a forma de comunicações orais e pósteres ocupará um espaço notadamente privilegiado. No que respeita ao Programa Educacional, ressalvo que o leque de temáticas a abordar, embora variado, dará especial atenção às infeções virais e bacterianas, bem como à sua prevenção com recurso a programas de vacinação vocacionados para os doentes imunocomprometidos, isto é, indivíduos transplantados e/ou com leucemia aguda. A preocupação com a problemática das infeções e o ressurgimento de multirresistências bacterianas é crescente e transversal a várias especialidades médicas, com a Hematologia a não ser exceção. Paralelamente, é de salientar que estas questões serão analisadas na Reunião por excelentes oradores nacionais e internacionais. Outro assunto que considero particularmente apaixonante e desafiante é aquele sobre o qual incidirá o Prof. Robert P. Gale, docente no Imperial College London e hematologista no Hammersmith Hospital, na Lição Valadas Preto, que tem o provocador título «Can we cure AML? How?». Historicamente, o Serviço de Hematologia Clínica do Hospital de Santo António dos Capuchos, que organiza esta Reunião Anual e no qual trabalho, tem desempenhado um papel relevante no tratamento das leucemias agudas. Por isso, é com particular expectativa que aguardo essa preleção, que, seguramente, suscitará a participação ativa da audiência.
11 PUB
publicidade Novembro 2018
COMISSÃO CIENTÍFICA
Dr.ª Daniela Alves
Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria
E
stamos perante um programa muito abrangente, que conta com diversos temas que vale a pena revisitar. Por exemplo, falar-se-á sobre o papel da esplenectomia na púrpura trombocitopénica idiopática (PTI), uma vez que, agora, com os novos fármacos existentes, temos tendência a lembrar-nos menos deste tratamento. É importante discutirmos o papel das terapêuticas mais convencionais nesta era de novos fármacos. Além disso, vão ser abordadas muitas das grandes polémicas da Hematologia, nomeadamente se há ou não lugar para o tratamento diferencial em primeira linha do linfoma difuso de grandes células B, o tratamento sempre difícil do linfoma de células do manto e as novas formas de abordagem às patologias mieloproliferativas. Remetendo para outros temas em análise nesta Reunião, temos, cada vez mais, de refletir sobre a anticoagulação nos doentes com neoplasias hematológicas, as estratégias de autonomização transfusional e o acompanhamento dos doentes com hepatite B ou C juntamente com os infeciologistas. Ou seja, temos de valorizar cada vez mais as terapêuticas que consideramos quase de suporte e que são muito úteis para conseguirmos tratar a patologia que levou o doente até nós. Prevejo que a sessão sobre o tratamento do linfoma difuso de grandes células B vá gerar alguma discussão, porque a estratégia que seguimos atualmente é a standard e sabemos que fica aquém do que gostaríamos em termos de sobrevivência, dado que se trata de uma patologia com grande heterogeneidade. Infelizmente, muitas das nossas tentativas para otimizar o tratamento e melhorar os outcomes não têm alcançado os resultados desejados em alguns subgrupos de doentes.
Dr.ª Francesca Pierdomenico
A
Instituto Português de Oncologia de Lisboa
12
Reunião Anual da SPH representa uma oportunidade única de encontro, aprendizagem e crescimento para todos os hematologistas, com particular atenção para os mais jovens. Considero que o programa deste ano cumpre esses objetivos, não só por ser composto por uma grande variedade de temas, abordando a patologia benigna e maligna, mas também por contar com a participação de experts nacionais e internacionais. Serão discutidas questões críticas e atuais, como o problema das infeções por enterobacteriáceas produtoras de carbapenemases e a anticoagulação no doente hemato-oncológico. Confesso que tenho particular expectativa e interesse pelas apresentações sobre a evolução clonal e a abordagem terapêutica dirigida na leucemia mieloide aguda, bem como pelo curso pré-congresso de terapia celular. Outro aspeto a destacar são as comunicações orais e os pósteres, uma vez que, nos últimos anos, o número e a qualidade dos trabalhos enviados para apresentação na Reunião Anual da SPH têm sido crescentes. Tenho muito boas espectativas sobre os trabalhos deste ano e espero ver projetos colaborativos de vários centros.
Dr.ª Ilídia Moreira
O
Instituto Português de Oncologia do Porto programa científico deste ano é muito interessante, pois os temas escolhidos abordam a nossa realidade clínica e procuram responder a questões muito práticas e que exigem um conhecimento específico elevado para a sua resolução. Sejamos nós especialistas graduados ou em formação, o desafio é conseguirmos definir a melhor estratégia de acordo com conhecimentos atualizados e as variáveis clínicas envolvidas. São exemplos os temas como a anticoagulação no doente hematológico, o suporte transfusional, a esplenectomia na trombocitopenia imune ou as infeções pelos vírus das hepatites B e C. Por outro lado, é necessária uma maior consciencialização para a importância de adotar medidas mais eficazes para evitar o aparecimento de resistências bacterianas e melhor tratarmos as infeções dos doentes neutropénicos e imunodeprimidos. Tenho particular interesse pela palestra sobre terapêutica dirigida na leucemia linfoblástica aguda. De acordo com a doença residual mínima detetável e com o papel dos novos agentes terapêuticos, estaremos mais próximos da cura e da menor toxicidade? Quanto à Lição de sexta-feira, intitulada «Vacinação na leucemia aguda e nos doentes transplantados», a verdade é que, na prática clínica, é importante seguir orientações para adotar a melhor estratégia terapêutica possível em doentes com imunossupressão severa. A qualidade dos oradores convidados e a partilha de experiências dos diferentes centros nacionais são excelentes convites à participação ativa na Reunião Anual da SPH 2018.
publicidade
PROGRAMA DE ENFERMAGEM
Discussões úteis para a prática da enfermagem hemato-oncológica
O Programa de Enfermagem da Reunião Anual da SPH 2018 vai discutir questões tão pertinentes, atuais e diversificadas quanto a literacia para a segurança dos cuidados, as intervenções de enfermagem junto do doente transplantado, o contributo da nutrição para o sucesso terapêutico, a prevenção das infeções e das multirresistências aos antibióticos ou os desafios da investigação, uma atividade essencial, mas que os enfermeiros têm dificuldade em conseguir abraçar. Cândida Damião, enfermeira responsável pelo Serviço de Hematologia Clínica Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central/Hospital de Santo António dos Capuchos (CHULC/HSAC) e presidente da Comissão Organizadora deste Programa Enfermagem, comenta cada um dos temas que, nos dias 16 e 17 de novembro, vão sustentar o debate multidisciplinar sobre o papel dos enfermeiros em Hemato-oncologia.
Literacia para a segurança dos cuidados de saúde (16 de nov., das 9h15 às 10h15)
14
Enfermeiros Paula Jorge (Comissão Científica – CC), Francisco Damião (CC), Cândida Damião (Comissão Organizadora – CO), Mafalda Loureiro (CO), Rosa Romão (CO), Helena Xavier (CO) e Andreia Rocha (CC)
Transplante no doente hemato-oncológico (16 de nov., das 10h15 às 11h00)
«Este é um tema muito pertinente, considerando que o transplante, tanto autólogo como alogénico, é uma arma terapêutica importante para um conjunto de patologias hemato-oncológicas. Os enfermeiros têm um contributo bastante relevante a este nível, não só do ponto de vista clínico e terapêutico, adjuvando a ação médica, mas também na relação e comunicação com os doentes e respetivas famílias. Para responder corretamente às várias questões que lhes são colocadas, é extremamente útil que os enfermeiros conheçam o percurso dos doentes até ao transplante. Esta sessão incide, sobretudo, sobre a experiência do Centro Hospitalar Universitário de São João [CHUSJ), no Porto, pelo que o Dr. Ricardo Pinto, hematologista, explicará como, porquê e quando se justifica o recurso ao transplante. Em seguida, um enfermeiro do Hospital de Dia do Serviço de Hematologia Clínica e outro do Serviço de Imuno-hemoterapia do CHUSJ vão falar sobre o trabalho desenvolvido em contexto de hospital de dia com os doentes transplantados.»
«Esta é uma temática incontornável no nosso dia-a-dia: não podemos discutir os cuidados de enfermagem prestados aos doentes hemato-oncológicos sem falar de literacia para a segurança dos cuidados de saúde. Sendo uma questão relevante em qualquer área da saúde, a segurança é, naturalmente, um ponto crítico em hemato-oncologia, tendo em conta que esta especialidade lida, em larga medida, com doentes imunocomprometidos e com esquemas terapêuticos complexos e rigorosos. Esta a sessão vai debruçar-se sobre a necessidade de reforçar a capacitação dos profissionais de saúde e das equipas para literacia em saúde. Por outro lado, será também abordada a importância de consciencializar e envolver os doentes na defesa da sua própria segurança. Com vista a ilustrar este tema com exemplos práticos, será partilhada a experiência da equipa de enfermagem do Hospital de Dia Hemato-Oncológico do CHULC/HSAC nesta matéria.»
Espalhar a prevenção e não a infeção (16 de nov., das 11h30 às 13h00)
«A premência da prevenção e do controlo das infeções, bem como a crescente ameaça das bactérias multirresistentes aos antibióticos serão debatidas no programa dirigido aos hematologistas e o programa de enfermagem não poderia ficar alheio a esta problemática. Os enfermeiros têm um importante papel na instituição de medidas e de uma cultura global de prevenção. Sob o mote “Espalhar a prevenção e não a infeção”, pretendemos abordar os desafios e as estratégias de controlo das infeções preconizadas pelo Programa Nacional de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência a Antimicrobianos da Direção-Geral da Saúde. A importância de existirem enfermeiros dinamizadores de boas práticas nos cuidados aos doentes hemato-oncológicos, assim como a prevenção das infeções nosocomiais associadas ao cateter venoso central serão outros temas em análise nesta mesa-redonda. Por último, na palestra “Dormindo com o inimigo”, a tónica recairá sobre uma questão talvez desconhecida para muitos, mas à qual devemos estar atentos: os colchões hospitalares como importantes focos de infeções.»
Nutrição em hemato-oncologia e showcooking (16 de nov., das 14h30 às 17h00)
«A hemato-oncologia é, por excelência, uma área que carece de abordagem multidisciplinar, incluindo a nutrição. Com o mote desta mesa-redonda, “Aliança no sucesso terapêutico”, pretendemos apelar à concertação de esforços entre nutricionistas e enfermeiros. O primeiro tópico em análise será a relevância da nutrição nos doentes hemato-oncológicos e é fácil perceber porquê: os doentes que não garantam o aporte necessário em termos nutricionais estarão, forçosamente, em condições mais fragilizadas. A seguir, abordaremos os desafios e obstáculos enfrentados pelas equipas de enfermagem na gestão da nutrição. A sessão culminará com a preleção do Dr. Telmo Barroso, nutricionista no CUF Descobertas Hospital, em Lisboa, sobre as estratégias de planeamento alimentar que devem ser implementadas em contexto de internamento. Passando da teoria à prática, segue-se um showcooking conduzido por Telmo Barroso, no qual serão confecionados alguns snacks adequados para os doentes hemato-oncológicos.»
Investigar para inovar
(17 de nov., das 11h30 às 13h30) «A formação e a atualização científicas decorrentes da investigação são absolutamente cruciais: não é possível praticar cuidados de enfermagem com qualidade se não houver investigação. Todavia, na gestão diária do fluxo de trabalho em serviços tão exigentes como os de hemato-oncologia, conseguir reservar tempo e recursos humanos para a investigação é, no mínimo, desafiante. Ainda assim, é fundamental que o façamos e foi precisamente com vista a promover a investigação no âmbito da enfermagem hemato-oncológica que decidimos promover este debate. Depois de um enquadramento geral sobre a relevância e as contingências da investigação clínica em enfermagem, esta sessão incidirá sobre o percurso e as diferentes fases em que se dividem os ensaios clínicos, destacando o papel do study nurse. A experiência de enfermeiros da Clínica da Universidad de Navarra, em Espanha, na coordenação de ensaios clínicos será também relatada nesta mesa-redonda.»
Associação Portuguesa Contra a Leucemia (APCL) (17 de nov., das 10h30 às 11h00)
«Partindo da premissa de que os enfermeiros são basilares na prestação de cuidados aos doentes hemato-oncológicos e na relação que se estabelece com os mesmos e respetivas famílias, considerámos útil conhecer mais a fundo o trabalho desenvolvido pela APCL. Esta sessão conta com intervenções de membros da direção da APCL, que apresentarão os objetivos, as áreas de atuação e os desafios desta associação. Fundada em 2002, a APCL tem como principais intuitos consciencializar e mobilizar a sociedade civil para o apoio aos doentes com leucemia e outras neoplasias hematológicas afins, bem como contribuir para o aumento da eficácia do tratamento destas patologias.»
Gestão de projetos: criar, inovar e implementar
(17 de nov., das 09h00 às 10h30) «Esta mesa-redonda colocará em evidência uma seleção de projetos que as comissões organizadora e científica do Programa de Enfermagem deste ano consideraram particularmente pertinentes e ilustrativos dos desafios comuns à maioria dos serviços e unidades de hemato-oncologia nacionais. A inaugurar este momento de partilha figurará um projeto promovido pela equipa de enfermagem do Serviço de Hematologia Clínica do CHULC/ /HSAC – o Grupo de Apoio aos Cuidadores Informais do Doente Hemato-Oncológico. Este grupo foi criado para suprir a necessidade de apoio aos cuidadores informais, através da organização de sessões de esclarecimento e informação sobre vários temas que os preocupam. A equipa de enfermagem do Serviço de Hematologia Clínica do CHULC/HSAC é também responsável pelo projeto que será apresentado a seguir – a criação de uma reunião específica de acolhimento ao doente e à família, aquando do primeiro internamento. A sessão prossegue com o resumo da participação da equipa de enfermagem do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental/Hospital de São Francisco Xavier no projeto «Outcomes de Doença Mieloproliferativa», uma iniciativa multicêntrica que conta com o apoio da Associação de Enfermagem Oncológica Portuguesa. O último projeto a apresentar intitula-se «Imunoterapia: novos desafios – um estudo de caso», está a ser levado a cabo pela equipa de enfermagem do Serviço de Hematologia do Instituto Português de Oncologia de Lisboa e passa pela administração de um novo anticorpo monoclonal em contexto de internamento e de hospital de dia.»
«Não é possível praticar cuidados de enfermagem com qualidade se não houver investigação. Todavia, na gestão diária do fluxo de trabalho em serviços tão exigentes como os de hemato-oncologia, conseguir tempo e recursos humanos para a investigação é, no mínimo, desafiante» Enf.ª Cândida Damião Novembro 2018
15
15 DE NOVEMBRO
Células CAR-T no tratamento do LDGCB
O
16
Prof. Manuel Abecasis
Dr. José Mário Mariz
s resultados já disponíveis sobre a utilização de células CAR-T (acrónimo inglês para recetor antigénico quimérico) no tratamento do linfoma difuso de grandes células B (LDGCB) e o papel que a imunoterapia com células T autólogas geneticamente modificadas poderá desempenhar no futuro serão discutidos no curso pré-congresso apoiado pela Gilead, que vai decorrer entre as 9h30 e as 13h00, na sala 1. Após uma introdução do moderador, Prof. Manuel Abecasis, que dirige o Departamento de Hematologia do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa, a Prof.ª Maria Gomes da Silva, diretora
do Serviço de Hematologia da mesma instituição, abordará as necessidades médicas não satisfeitas no tratamento do LDGCB. A seguir, serão discutidas pelo Prof. João Forjaz de Lacerda, hematologista no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, as perspetivas imunológica e da ciência básica, ao passo que o Dr. José Mário Mariz, diretor da Clínica de Onco-Hematologia do IPO do Porto, apresentará os ensaios clínicos que testam estas terapias no LDGCB. Depois, a Prof.ª Catherine Thieblemont, hematologista no Hospital Saint Louis, em Paris, falará sobre como selecionar os doentes com este
tipo de linfoma para o tratamento com células CAR-T. Finalmente, a Prof.ª Emma Morris, docente de Terapia Genética e Celular no Institute of Immunity and Transplantation do University College London, vai partilhar a experiência de vida real com estas terapias, desde a preparação do centro para a adoção destas novas tecnologias até à partilha de casos clínicos. Segundo Manuel Abecasis, as células CAR-T podem ser uma solução para doentes com LDGCB recidivantes ou refratários após duas ou mais linhas de terapêutica sistémica, ou que têm uma recidiva num período de 12 meses após o autotransplante de células progenitoras hematopoiéticas, para os quais, até agora, havia muito pouco a oferecer. «O aparecimento da terapia com células CAR-T abre uma nova abordagem, possibilitando que alguns doentes fiquem com a doença controlada e remissões prolongadas apenas com esta terapia celular», refere o moderador. Por sua vez, José Mário Mariz afirma que, apesar de a experiência com as células CAR-T no contexto do LDGCB ser «ainda muito limitada e com pouco tempo de seguimento», os resultados já existentes «parecem muito promissores». E concretiza: «Sabemos que pode haver respostas globais (completas + parciais) numa percentagem muito elevada de doentes (70 a 80%).» NP Luís Garcia
Tratamento do mieloma múltiplo em recaída
O
mieloma múltiplo (MM) é uma doença hematológica caracterizada pela proliferação clonal de células plasmáticas na medula óssea1. A incidência estimada do MM no mundo, em 2012, foi de 114 251 doentes e foram atribuídas a esta doença aproximadamente 80 019 mortes2. O MM continua a ser uma doença incurável que se caracteriza por um padrão recorrente de recaída e remissão. Os doentes enfrentam prognósticos que pioram a cada recaída como resposta à terapêutica3-7. Avanços recentes no tratamento do MM em recaída (MMr) conduziram a melhorias na profundidade de resposta, na sobrevivência livre de progressão e na sobrevivência global8-10. No entanto, apesar destas melhorias, quase todos os doentes com MMr irão, provavelmente, recair, pelo que é necessário entender e enquadrar o uso otimizado destas novas terapêuticas para se
alcançar um equilíbrio adequado entre eficácia e segurança. No curso pré-congresso patrocinado pela Amgen, a decorrer entre as 9h30 e as 11h00 do dia 15 de novembro, na sala 2, pretende-se, por um lado, fazer uma revisão dos principais endpoints a considerar quando se analisam os resultados dos estudos em MM e o porquê dessa importância. Por outro lado, pretende-se fazer uma revisão dos tratamentos atualmente existentes para o MMr, com a apresentação dos DR dados mais recentes à luz das recomendações atuais e das alterações nos padrões que influenciam as decisões terapêuticas. Este curso é moderado pela Dr.ª Graça Esteves, hematologista no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, e conta com as preleções da Prof.ª Cristina João, hematologista no Centro Clínico da Fundação Champalimaud,
e da Prof.ª Catarina Geraldes, hematologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. NP Bibliografia: 1. National Cancer Institute: SEER Cancer Statistics Factsheets: Myeloma. Surveillance, Epidemiology, and End Results Program website http://seer. cancer.gov/statfacts/html/mulmy. html. Accessed 6 Oct 2016. 2. World Health Organization: GLOBOCAN 2012: Estimated Cancer Incidence, Mortality and Prevalence Worldwide in 2012. International Agency for Research on Cancer website. http://globocan.iarc.fr/Pages/fact_sheets_population. aspx. Accessed 5 Dec 2016. 3. Durie B, Moreau P, Sonneveld P, Morgan GJ, Lahuerta JJ, Beksac M, et al. Regional differences in the treatment approaches for relapsed multiple myeloma: an IMF study. J Clin Oncol. 2012;30(Suppl):Abstract 8095. 4. Jordan K, Proskorovsky I, Lewis P, Ishak J, Payne K, Lordan N, et al. Effect of general symptom level, specific adverse events, treatment patterns, and patient characteristics on health-related quality of life in patients with multiple myeloma: results of a European, multicenter cohort study. Support Care Cancer. 2014;22:417–26. 5. Kumar SK, Therneau TM, Gertz MA, Lacy MQ, Dispenzieri A, Rajkumar SV, et al. Clinical course of patients with relapsed multiple myeloma. Mayo Clin Proc. 2004;79:867–74. 6. Mols F, Oerlemans S, Vos AH, Koster A, Verelst S, Sonneveld P, et al. Healthrelated quality of life and disease-specific complaints among multiple myeloma patients up to 10 yr after diagnosis: results from a populationbased study using the PROFILES registry. Eur J Hematol. 2012;89:311–9. 7. Orlowski RZ. Novel agents for multiple myeloma to overcome resistance in phase III clinical trials. Semin Oncol. 2013;40:634– 51. 8. Dimopoulos MA, Goldschmidt H, Niesvizky R, Joshua D, Chng W-J, Oriol A, et al. Carfilzomib or bortezomib in relapsed or refractory multiple myeloma (ENDEAVOR): an interim overall survival analysis of an open-label, randomised, phase 3 trial. Lancet Oncol. 2017;18:1327–37. 9. National Comprehensive Cancer Network website. https://www.nccn.org/. Accessed 15 Jan 2017. 10. Usmani SZ, Rodriguez-Otero P, Bhutani M, Mateos MV, Miguel JS. Defining and treating high-risk multiple myeloma. Leukemia. 2015;29:2119–25.
Debelar a LMA com a terapêutica personalizada
Prof. João Barata
Dr. Ricardo Pinto
Dr.ª Joana Infante
Dr. Marcos Lemos
Dr.ª Margarida Coucelo
Sob o mote «Are we closer to cure leukemia? From target to personalized therapy», o curso organizado pela Novartis na quinta-feira, entre as 9h30 e as 13h00, vai analisar os novos horizontes do tratamento da leucemia mieloide aguda (LMA), que permitem perseguir o objetivo da cura. É o caso dos novos anticorpos monoclonais conjugados com drogas, dos inibidores de sinases ou da terapêutica com células CAR-T, que alcançou resultados clínicos sifnificativos em leucemia linfoblástica aguda e, recentemente, as primeiras evidências de sucesso em LMA.
A
por Ana Rita Lúcio
pós a nota de abertura da moderadora, Dr.ª Aida Botelho de Sousa, diretora do Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central/Hospital de Santo António dos Capuchos (CHULC/HSAC) e presidente da Sociedade Portuguesa de Hematologia, a primeira preleção caberá ao Prof. João Barata, diretor de laboratório no Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes e docente na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, que versará sobre alguns aspetos da biologia do cancro relevantes para o desenvolvimento de terapêuticas dirigidas. «Sabemos que as células tumorais são particularmente dependentes da ativação do que designamos por vias de transdução de sinal, isto é, de uma cadeia de informação que é transmitida dentro da célula», exemplifica o orador. Esse conhecimento abriu portas ao «desenvolvimento de fármacos que inibem essas vias», permitindo que «as células tumorais sejam eliminadas, sem afetar significativamente as células normais», afirma João Barata. A propósito do «crescente arsenal de armas terapêuticas antitumorais que exploram o potencial do sistema imunitário no combate ao cancro», este investigador discorrerá ainda sobre o papel de «terapêuticas biológicas capazes de fazer o targeting das células tumorais», como os anticorpos monoclonais e as células CAR-T, que «têm alcançado resultados clínicos muito interessantes».
Desafios no combate à LMA Em seguida, o Dr. Ricardo Pinto, hematologista no Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto, vai apresentar o estado da arte atual das terapêuticas dirigidas para a LMA. Por sua vez, a Dr.ª Joana Infante, interna no Serviço de
Hematologia Clínica e Transplantação de Medula do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte/ /Hospital de Santa Maria, fará a primeira de três apresentações de casos clínicos ilustrativos dos principais desafios do tratamento da LMA. «Relativamente ao doente jovem, creio que o maior desafio é a obtenção de doença residual mínima negativa, de modo a prolongar a sobrevivência livre de recaída», defende esta oradora. Não menos importante, na opinião de Joana Infante, é «procurar tratamentos eficazes para as LMA de citogenética de mau prognóstico e também otimizar a abordagem aos doentes mais frágeis, através de terapêuticas menos tóxicas, que possam oferecer a melhor qualidade de vida possível». «Nesse sentido, apesar de haver ainda um longo caminho a percorrer, estamos a viver uma época de revolução no tratamento da LMA. As novas moléculas dirigidas ao alvo começam a fazer parte da rotina clínica e existe a esperança de, no futuro, podermos combinar as várias moléculas de acordo com o perfil mutacional de cada LMA», sublinha a interna. Por seu turno, o Dr. Marcos Lemos, interno no Serviço de Hematologia Clínica do CHULC/ /HSAC, que também vai apresentar um caso clínico, começa por referir que, após muitos anos sem inovação significativa no tratamento da LMA, «novas opções terapêuticas já disponíveis ou que se aproximam da aprovação podem mudar o paradigma da doença». «São exemplo os inibidores do gene FLT3, como a midostaurina – já disponível –, mas igualmente outros fármacos do mesmo grupo que estão em fases adiantadas de ensaios clínicos com resultados promissores.» Do mesmo modo, «os inibidores do gene IDH têm demonstrado resultados inte-
ressantes nos ensaios já realizados». Além disso, «ultrapassados os problemas de toxicidade relacionados com a dosagem, destaca-se o “regresso” do gemtuzumab-ozogamicina, que espero que possa ser mais uma opção terapêutica válida», elenca Marcos Lemos.
NGS para classificação genética da LMA O caso clínico a apresentar pela Dr.ª Margarida Coucelo, responsável pelo Setor de Hemato-Oncologia Molecular do laboratório do Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, está relacionado com a experiência deste laboratório no diagnóstico e na caracterização genética das LMA por next generation sequencing (NGS). De acordo com a preletora, as aplicações desta tecnologia de sequenciação genética, que «tem a capacidade de estudar e analisar milhões de pares de bases em simultâneo», são vastas, indo «desde a sequenciação do genoma completo, do exoma e do transcriptoma, até à sequenciação dirigida (painel de genes)». Segundo Margarida Coucelo, «a vantagem mais relevante da NGS no estudo da LMA é a capacidade de, numa única abordagem, classificar e estratificar a doença do ponto de vista genético, bem como identificar potenciais alvos terapêuticos». Em consequência, «a sua utilização é cada vez mais útil no contexto da medicina personalizada». Exatamente sobre a aplicação da medicina personalizada ao tratamento da LMA, a maior promessa de um futuro que se aproxima a passos largos, vai falar a última oradora deste curso. Hematologista no Hospital Universitario 12 de Octubre, em Madrid, a Dr.ª María Liz Paciello Coronel explicará os requisitos para obtenção do reconhecimento de centro de excelência no tratamento com células CAR-T. NP Novembro 2018
17
15 DE NOVEMBRO
«O obinutuzumab é um anticorpo monoclonal mais eficaz do que o rituximab» Em entrevista, o Prof. Robert Marcus, consultor de Hematologia no King’s College Hospital, em Londres, defende que todos os doentes com linfoma folicular em estádio avançado e sintomático devem fazer imunoquimioterapia seguida de manutenção, destacando a evidência que demonstra a superioridade do obinutuzumab face ao rituximab em termos de sobrevivência livre de progressão e sobrevivência global1,2. Este especialista é o orador do simpósio-satélite promovido pela Roche no dia 15 de novembro, das 19h15 às 20h15, na sala 2, que conta com a moderação do Dr. José Mário Mariz (diretor do Serviço de Onco-Hematologia do IPO Porto) e a intervenção no painel de discussão da Prof.ª Maria Gomes da Silva (diretora do Departamento de Hematologia do IPO Lisboa) e do Dr. José Pedro Carda (hematologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra). por Luís Garcia
Como olha para os novos resultados de sobrevivência global do estudo GADOLIN3? São muito interessantes. Parece haver um plateau no follow-up a longo prazo e uma sobrevivência livre de progressão bastante impressionante nos doentes refratários a rituximab tratados com bendamustina + obinutuzumab que não tinham recebido estes fármacos anteriormente.
E como comenta os novos resultados da sobrevivência global com obinutuzumab resultantes do estudo CLL 112?
18
DR
Como analisa o tratamento atual do linfoma folicular (LF)? Podemos dividir o LF em três estádios: localizado, avançado assintomático e avançado sintomático. No primeiro caso, o standard of care tem sido, há muitos anos, apenas radioterapia. No entanto, este tratamento cura menos de 50% dos doentes. Agora, surgiu evidência, nomeadamente um ensaio clínico aleatorizado de um grupo australiano, de que o tratamento com anticorpo monoclonal + radioterapia ou quimioterapia + anticorpo monoclonal + radioterapia obtém melhores resultados do que apenas a radioterapia3. A minha opção para os doentes com LF em estádio localizado seria de radioterapia no estádio 1 e de radioterapia + rituximab no estádio 2.
E para o LF em estádio avançado, que tratamento preconiza? Nos doentes em estádio avançado assintomático, defendo que não se faça qualquer tratamento, porque não existe evidência de benefício. Nos casos de LF em estádio avançado sintomático, há forte evidência de que a imunoquimioterapia é superior à quimioterapia. Vários estudos indicam que a imunoquimioterapia seguida de manutenção melhora a sobrevivência livre de
progressão em relação à quimioterapia, embora não necessariamente a sobrevivência global – este aspeto ainda não é muito claro. Por isso, penso que a imunoquimioterapia seguida de manutenção devia ser feita em todos os doentes com LF em estádio avançado sintomático, desde que a consigam tolerar. Se começarem a ter problemas, como infeções, devemos parar a manutenção, sobretudo nos doentes que atingiram uma remissão negativa na PET [tomografia por emissão de positrões].
Mais uma vez, são dados que demonstram a superioridade do obinutuzumab relativamente ao rituxumab. Pode dizer-se que o clorambucilo já não é o parceiro ideal, mas devemos olhar para os resultados tal como eles são – e este fármaco continua a ser adequado para os doentes mais velhos e sem deleção do gene P53. O facto de o obinutuzumab ter demonstrado uma toxicidade muito reduzida neste estudo dá suporte à sua utilização em doentes de idade mais avançada.
O que nos pode contar sobre a sua experiência com o obinutuzumab?
Recentemente, foram publicados alguns dados do estudo GALLIUM4 relativos à progressão do LF a 24 meses (POD24, na sigla em inglês) nos doentes que fazem tratamento de primeira linha. Que importância atribui a estes resultados?
No âmbito de ensaio clínico, utilizamos o obinutuzumab em doentes com LF há dois ou três anos no King’s College Hospital. Verificámos que, com exceção de alguns eventos relacionados com a infusão no início do tratamento, este anticorpo monoclonal não é mais tóxico do que o rituximab. Em termos de quimioterapia, optámos pelo regime CVP [ciclofosfamida, vincristina e prednisona] e constatámos que, além de ser mais eficaz do que o rituximab, a associação de obinutuzumab a este esquema de quimioterapia tem baixa toxicidade e é, em geral, bem tolerada. NP
Os doentes que recaem cedo – dentro de seis, 12, 18 ou 24 meses – têm um prognóstico muito pior, independentemente de serem tratados com obinutuzumab ou rituximab. Mas os dados do estudo GALLIUM4 demonstram que menos doentes tratados com obinutuzumab têm POD24 versus os doentes tratados com rituximab, o que demonstra que o primeiro é um anticorpo monoclonal de eficácia superior.
Referências: 1. Cheson BD, et al. Overall Survival Benefit in Patients With Rituximab-Refractory Indolent Non-Hodgkin Lymphoma Who Received Obinutuzumab Plus Bendamustine Induction and Obinutuzumab Maintenance in the GADOLIN Study. J Clin Oncol. 2018;36(22):2259-66. 2. Goede, et al. Overall survival benefit of obinutuzumab over rituximab when combined with chlorambucil in patients with chronic lymphocytic leukemia and comorbidities: final survival analysis of the CLL11 study, presented at EHA 2018. 3. MacManus M, et al. Randomized Trial of Systemic Therapy After Involved-Field Radiotherapy in Patients With Early-Stage Follicular Lymphoma: TROG 99.03. J Clin Oncol. 2018;36(29):2918-25. 4. Marcus R, et al. Obinutuzumab for the First-Line Treatment of Follicular Lymphoma. N Engl J Med. 2017;377:1331-44.
publicidade
16 DE NOVEMBRO
OPINIÃO
O que há de novo para a policitemia vera e a trombocitemia essencial Prof.ª Emília Cortesão
•H ematologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra •O radora no Programa Educacional 1, com a preleção «PV e TE: novos conceitos, novas estratégias» (das 9h00 às 9h30 de sexta-feira)
A 20
policitemia vera (PV) e a trombocitemia essencial (TE) são neoplasias mieloproliferativas crónicas cuja etiologia é desconhecida na maioria dos casos. Estas entidades caracterizam-se por uma hematopoiese clonal, estando associadas à presença da mutação V617F no gene Janus kinase 2 (JAK2) em 95% das PV e 60% das TE. Paralelamente, cursam com complicações trombóticas e/ou hemorrágicas, manifestações sistémicas e sintomas da microcirculação. Podem também evoluir para mielofibrose (MF) e, menos frequentemente, para leucemia aguda.
«Para estabelecer o diagnóstico de transformação em mielofibrose pós-policitemia vera e pós-trombocitemia essencial, recomenda-se a utilização dos critérios desenvolvidos pelo International Working Group for Myelofibrosis Research and Treatment» Os critérios de diagnóstico da PV e da TE foram revistos em 2016, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), permitindo a realização de um diagnóstico mais preciso. De acordo com esta revisão, foi reduzido o limiar de hemoglobina (superior a 16,5 g/dL no homem e superior a 16 g/dL na mulher) a considerar na PV e a biópsia medular óssea passou a desempenhar um papel fundamental não só no diagnóstico, mas também no prognóstico, devendo ser considerada como exame de rotina para avaliação da fibrose. Por outro lado, a pesquisa da formação endógena de colónias de eritrócitos in vitro foi abolida como critério de diagnóstico,
devido à sua limitada aplicação prática. Relativamente à TE, embora se mantenha um diagnóstico de exclusão, sugere-se o estudo mutacional do gene JAK2, dos genes da calreticulina (CALR) e da leucemia mieloproliferativa (MPL). Para estabelecer o diagnóstico de transformação em MF pós-PV e pós-TE, recomenda-se a utilização dos critérios desenvolvidos pelo International Working Group for Myelofibrosis Research and Treatment (IWG-MRT). Os parâmetros a ter em consideração nesta avaliação são: diagnóstico prévio de PV ou TE segundo os critérios da OMS, grau de fibrose medular, anemia, esfregaço leucoeritroblástico, esplenomegalia, sintomas constitucionais e desidrogenase do lactato.
Estratificação do risco e individualização terapêutica O risco trombótico associado à PV e à TE pode ser avaliado de acordo com o score convencional (baixo versus alto). Este é calculado com base na idade (superior a 60 anos) e na história prévia de trombose. Alguns autores defendem ainda a criação de um grupo intermédio para a TE, na presença de fatores de risco cardiovascular e na ausência de história prévia de trombose, bem como idade igual ou inferior a 60 anos. Não obstante, o International Prognostic Score for Thrombosis in Essential Thrombocythemia (IPSET) revisto para a TE possibilita uma melhor previsão do risco trombótico, comparativamente ao score convencional, uma vez que considera o status mutacional do gene JAK2. O tratamento da PV visa manter um hematócrito inferior a 45%. Para os doentes de alto risco, preconiza-se a hidroxiureia como primeira linha terapêutica, seja associada ou não a flebotomia. O interferão é uma alternativa disponível para os doentes jovens e as grávidas. Estas opções terapêuticas podem ser necessárias também, ocasionalmente, em doentes de baixo risco. Deve-se ainda associar ácido acetilsalicílico (AAS) em baixa dose para o tratamento de doentes que não apresentem contraindicação. Atualmente, o ruxolitinib, um inibidor das JAK (Janus associated kinases), apresenta-se
como alternativa terapêutica para os doentes com PV resistentes ou intolerantes à hidroxiureia. Quanto ao tratamento da TE, recomenda-se, igualmente, a hidroxiureia como primeira linha em doentes de alto risco, tendo como alternativa off-label o interferão. O uso de anagrelide reserva-se, habitualmente, para a segunda linha em doentes intolerantes à hidroxiureia ou com doses inaceitáveis deste fármaco para controlo das contagens plaquetares. Nos doentes de baixo risco, a estratégia utilizada é o que comumente se designa por watch-and-wait. A utilização de AAS em baixa dose está indicada nos doentes de alto risco e nos doentes de baixo risco com mutação dos genes JAK2 ou MPL. Na ausência de risco cardiovascular, deve-se evitar a administração de AAS aos doentes jovens com mutação CALR.
«O aperfeiçoamento da estratificação do risco possibilita a seleção de estratégias terapêuticas mais adequadas e dirigidas a cada grupo de doentes, resultando num aumento da sobrevivência e na melhoria da qualidade de vida dos doentes» O recurso à biologia molecular e o desenvolvimento de novos fármacos, assim como a realização de ensaios clínicos controlados, têm vindo a permitir alcançar um diagnóstico mais precoce e preciso e a identificação de variáveis com valor prognóstico. O aperfeiçoamento da estratificação do risco possibilita a seleção de estratégias terapêuticas mais adequadas e dirigidas a cada grupo de doentes, resultando num aumento da sobrevivência e na melhoria da qualidade de vida dos doentes. NP
publicidade
16 DE NOVEMBRO
«A minimização transfusional resulta em ganhos de saúde e económico-financeiros» «Transfundir menos, habitualmente, é transfundir melhor». Este é o mote da palestra que o Dr. António Robalo Nunes, médico imuno-hemoterapeuta no Hospital das Forças Armadas/Polo de Lisboa, vai proferir no âmbito do Programa Educacional 1, entre as 10h00 e as 10h30 de sexta-feira. Em entrevista, o preletor alerta para os riscos associados à transfusão de componentes sanguíneos e defende que as estratégias de minimização permitem alcançar ganhos em termos de saúde e económico-financeiros. Elencando alguns dos passos que permitem a restrição transfusional, Robalo Nunes sublinha que esta estratégia é particularmente relevante no plano da Hematologia e da Hemato-oncologia. por Ana Rita Lúcio
No caso concreto da Hematologia, qual a importância da minimização transfusional?
22
O que está em causa quando se fala de minimização transfusional? Quer dizer transfundir menos, o que, habitualmente, está em linha com o conceito de transfundir melhor. Esta premissa deriva da evidência, que tem demonstrado um aumento global do risco de mortalidade e morbilidade associado a este procedimento, embora reconheça as grandes virtudes terapêuticas da transfusão de componentes sanguíneos. Trata-se de uma terapêutica indiscutível e inevitável, mas não podemos deixar de reconhecer os riscos que compreende. A transfusão tem um risco biológico, para além dos custos associados, que são elevados e, muitas vezes, condicionam a sua disponibilidade. Em suma, o que defenderei na minha palestra é que as estratégias de minimização transfusional resultam em ganhos de saúde e económico-financeiros.
Pode dar exemplos dessas estratégias? As estratégias de minimização transfusional têm sido amplamente desenvolvidas no âmbito do perioperatório, com programas de patient blood management. Em Portugal, está a ser lançado um programa-piloto a este nível, que envolve nove unidades hospitalares, as quais se vão articular entre si nesta lógica de minimização transfusional.
Em Hematologia e Hemato-oncologia, as estratégias concertadas de diminuição da carga transfusional têm particular importância. Não nos podemos esquecer de que os riscos associados à transfusão de componentes sanguíneos, que se manifestam nos planos infecioso e imunológico, podem ter implicações muito sérias nos doentes hematológicos e, nomeadamente, hemato-oncológicos, que, com muita frequência, estão imunodeprimidos. Por outro lado, estamos a falar também de doentes com elevados requisitos de suporte transfusional ao longo do curso das suas doenças hemato-oncológicas ou de anemias crónicas, por exemplo.
Como é possível reduzir o recurso à transfusão sem prejudicar os doentes que precisam mesmo desta terapêutica? A adoção institucional de valores de referência para transfundir ou não deve ser fortemente incentivada. Existem normas de orientação clínica [NOC] publicadas pela Direção-Geral da Saúde, que se baseiam na melhor evidência disponível, sobre a utilização dos componentes sanguíneos, os valores de referência e as circunstâncias em que se deve transfundir. Não obstante, o respeito pelas guidelines e NOC não deve ser dissociado do senso clínico e da atenção às condições específicas de cada doente. De igual modo, qualquer estratégia de minimização transfusional carece do compromisso da instituição hospitalar como um todo. Este trabalho não pode ser feito isoladamente; é necessário o envolvimento dos serviços médicos e cirúrgicos, bem como o suporte institucional dos decisores. É fundamental que este conceito de minimização transfusional – transfundir menos é transfundir melhor – não seja apenas uma manifestação episódica e ocasional, mas antes uma cultura vigente nas instituições.
«Transfundir menos, habitualmente, está em linha com o conceito de transfundir melhor. Esta premissa deriva da evidência, que tem demonstrado um aumento global do risco de mortalidade e morbilidade associado a este procedimento, embora reconheça as grandes virtudes terapêuticas da transfusão de componentes sanguíneos» Quais são as alternativas à transfusão de componentes sanguíneos? Em primeiro lugar, há que ter em conta que as estratégias transfusionais restritivas não podem, elas próprias, constituir um risco. Ou seja, também há o risco de não transfundir e circunstâncias em que a transfusão é inevitável. Todavia, podemos e devemos abordar os doentes segundo uma perspetiva global, procurando perceber em que circunstâncias se podem utilizar as alternativas farmacológicas de que dispomos hoje, como é o caso do ferro intravenoso para o tratamento das anemias de causa ferropénica, quando é necessário obter uma resposta rápida. Outro exemplo são os agentes estimuladores da eritropoiese, desde que esteja garantida a existência de ferro biodisponível. Estas alternativas farmacológicas, não biológicas, podem contribuir para a minimização da transfusão de componentes sanguíneos. NP
publicidade
publicidade
16 DE NOVEMBRO
OPINIÃO
Não descartar a esplenectomia no tratamento da PTI Dr. Fernando Príncipe •H ematologista no Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto •O rador no Programa Educacional 1, com a preleção «PTI: esplenectomia obsoleta?», que decorrerá entre as 10h30 e as 11h00
A
evolução no tratamento da púrpura trombocitopénica imune (PTI), nomeadamente na última década, é inegável. Em resultado, está agora em discussão o lugar da esplenectomia como tratamento de segunda linha, que tem algumas décadas de resultados na PTI crónica e refratária à terapêutica medicamentosa de primeira linha. No entanto, esta abordagem cirúrgica tem vindo a ser preterida em prol de alternativas farmacológicas. Mas será que estas novas opções terapêuticas, na ausência de estudos randomizados, posicionam a esplenectomia como obsoleta para a PTI persistente ou crónica?
«Uma reflexão atenta sobre o armamentário terapêutico disponível para o combate à PTI não deve desprezar ou esquecer o conhecimento acumulado ao longo de mais de um século sobre o papel da esplenectomia no tratamento desta patologia» O relegar da atitude cirúrgica para terceira ou quarta linha terapêutica não é alheio ao reconhecimento dos riscos que, habitualmente, se associam a qualquer tipo de cirurgia. No caso concreto da esplenectomia, os riscos de ocorrência de hemorragias, de infeções e/ou de eventos tromboembólicos não são negligenciáveis. Não obstante, a evidência atesta que a esplenectomia continua a ser, inequivocamente, a mais curativa das opções. É verdade que os novos fármacos disponíveis para o tratamento de segunda linha da PTI – os
agonistas dos recetores da trombopoietina – têm vindo a demonstrar eficácia e segurança clínica. Porém, são tratamentos que exigem administração constante (diária ou semanal) e não têm tempo de recuo suficiente desde a sua introdução na prática clínica, que possa garantir total segurança, ao contrário da esplenectomia e da outra opção terapêutica – o rituximab. Como tal, as consequências a longo prazo do prolongamento destes novos fármacos são ainda desconhecidas, designadamente do ponto de vista hematológico e imunológico. O rituximab é um anticorpo monoclonal quimérico, já nosso conhecido para o tratamento das doenças linfoproliferativas. Tem sido usado em off-label como tratamento de doenças autoimunes, entre elas a PTI. O perfil de eficácia e segurança do rituximab neste âmbito está demonstrado, mas também implica riscos que têm de ser avaliados, tal como os riscos da esplenectomia e dos agonistas dos recetores da trombopoietina. A incerteza quanto à definição do que poderá ser a sequência ótima no tratamento da PTI não tem impedido, contudo, que a esplenectomia seja preterida ou adiada numa percentagem significativa de doentes. Isto acontece mesmo perante a evidência de que a atitude cirúrgica mais precoce poderá traduzir-se numa resposta terapêutica mais eficaz e célere. Uma vez que não existem guidelines baseadas em estudos randomizados, é importante que a decisão terapêutica seja individualizada e adaptada ao doente.
Individualizar o tratamento Uma reflexão atenta sobre o armamentário terapêutico disponível para o combate à PTI não deve desprezar ou esquecer o conhecimento acumulado ao longo de mais de um século sobre o papel da esplenectomia no tratamento desta patologia. E, de modo não menos relevante, deve ter em conta também o conhecimento
«No caso específico da PTI, a esplenectomia está associada a uma taxa de resposta muito elevada, com a falência de resposta aos cinco anos a rondar os 23%» ainda mais ancestral sobre as consequências das esplenectomias realizadas em indivíduos saudáveis, nomeadamente devido à ocorrência de traumatismos. Sendo claro que o baço é um órgão importante, é sabido que a sua ausência não interfere diretamente com a sobrevivência da generalidade dos indivíduos sujeitos a esplenectomia. Adicionalmente, no caso específico da PTI, a esplenectomia está associada a uma taxa de resposta muito elevada, com a falência de resposta aos cinco anos a rondar os 23%. Tal demonstra que esta atitude cirúrgica tem um perfil de eficácia e segurança satisfatório ao longo do tempo, algo que não podemos afirmar, taxativamente, a respeito dos fármacos alternativos à esplenectomia na segunda linha de tratamento da PTI. O que defenderei na minha preleção é que a esplenectomia terá sempre um papel a desempenhar no âmbito do tratamento de segunda linha da PTI, não sendo, de maneira alguma, um procedimento obsoleto. Há a necessidade de a individualizar, numa fase de evolução da PTI, num perfil de risco cirúrgico e de aceitação do doente, com as certezas e incertezas dos tratamentos médicos contínuos não curativos e na ausência de estudos randomizados entre estas três opções terapêuticas: esplenectomia, rituximab e agonistas dos recetores de trombopoietina. NP
Novembro 2018
25
16 DE NOVEMBRO
«A resistência das enterobacteriáceas produtoras de carbapenemases progrediu muito» Entrevistado a propósito do tema que vai desenvolver no Programa Educacional 1, entre as 12h00 e as 12h30 do dia 16 de novembro – «Enterobacteriáceas produtoras de carbapenemases: como resistir?», o Prof. José Artur Paiva sublinha que é importante promover uma política responsável de prescrição antibiótica. O diretor clínico do Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto, e ex-diretor do Programa Nacional de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência a Antimicrobianos (PPCIRA), afirma que, como grandes prescritoras destes fármacos, as unidades de Hematologia e Hemato-oncologia assumem um papel particularmente importante na luta contra as resistências bacterianas. por Ana Rita Lúcio também se associa o dano colateral coletivo, ou seja, ao prescrevermos um destes fármacos, sabemos que estamos a induzir a seleção de bactérias resistentes e que estas são transmissíveis de pessoa para pessoa.
Porque é importante falar de resistência aos antibióticos num congresso de Hematologia?
26
Como é possível combater as resistências das bactérias aos antibióticos? A capacidade de desenvolver resistência aos antibióticos é inata às bactérias, mas é também fortemente potenciada pela exposição a estes agentes. Por conseguinte, de modo a reduzir a emergência de resistência antimicrobiana, há que promover o uso responsável desta terapêutica, que se deve alicerçar num conjunto de atitudes. A mais importante passa por não prescrever antibióticos quando não são necessários ou por um período de tempo excessivo. Por outro lado, deve-se evitar a prescrição de antibióticos que produzem um dano colateral excessivo. Terapêutica adequada consiste em recorrer a um antibiótico capaz de curar a infeção com efetividade, mas terapêutica ótima é mais do que isso: é optar por um antibiótico capaz de curar a infeção com efetividade, causando o mínimo dano colateral possível. Com a maioria dos fármacos, o que está em causa é o dano colateral individual, que se limita à pessoa que os toma. No caso dos antibióticos, ao potencial dano colateral individual
As unidades de Hematologia e Hemato-oncologia são grandes consumidoras de antibióticos, porque as infeções são frequentes nos doentes aí tratados, já que tanto as doenças hemato-oncológicas como as terapêuticas que lhes são dirigidas causam imunossupressão. Como tal, os médicos que trabalham nestas unidades são grandes prescritores de antibióticos, pelo que esta reunião é um fórum muito útil para os sensibilizar ainda mais sobre a importância do uso responsável da antibioterapia. No entanto, creio que os hematologistas têm uma cultura muito recetiva e promotora desta mensagem, porque conhecem bem as consequências deletérias que o uso excessivo de antibióticos pode ter nos seus doentes e nas suas unidades.
Que metodologias devem ser privilegiadas com vista ao uso responsável dos antibióticos? A metodologia que defendo prende-se com o que em língua inglesa se designa por antimicrobial stewardship e, em português, por programas de apoio à prescrição de antibióticos [PAPA]. Tenho
pugnado, desde há vários anos, pela capacidade de cada hospital constituir um grupo de peritos nesta área da prescrição antibiótica e do controlo da infeção. Este grupo deve ser multidisciplinar, com a participação de médicos, enfermeiros e farmacêuticos, para, em colaboração com as unidades prescritoras, garantir o acompanhamento, a translação, a capacitação e o fomento da literacia neste âmbito. Por outro lado, deve ser assegurada a recolha de dados sobre a prescrição de antibióticos e as resistências mmicrobianas, de forma a serem discutidos dentro de cada unidade, de modo a promover a definição de estratégias, metas e objetivos claros e consensuais.
Que passos estão a ser dados no nosso país para criar esses grupos de peritos? Portugal tem, desde 2013, o PPCIRA, um programa com caráter prioritário promovido pela Direção-Geral da Saúde, no âmbito do qual se têm desenvolvido uma série de iniciativas relativamente a esta matéria. Por exemplo, foi constituída uma estrutura de alcance central, regional e local, sendo que cada Administração Regional de Saúde tem uma direção responsável por este programa e cada centro hospitalar e agrupamento de centros de saúde está incumbido de formar um grupo local de prevenção de infeção e de resistências aos antibióticos. Paralelamente, temos participado ativamente nas iniciativas deste âmbito promovidas pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças e pela Organização Mundial da Saúde. NP
Como enfrentar as enterobacteriáceas produtoras de carbapenemases?
Na sua preleção, o Prof. José Artur Paiva vai focar-se na resistência das enterobacteriáceas produtoras de carbapenemases, que tem «progredido de forma muito significativa» nos últimos anos. Segundo este especialista em Medicina Interna e em Medicina Intensiva, «as enterobacteriáceas produtoras de carbapenemases são crescentemente prevalentes, particularmente no imunodeprimido, e podem causar infeções de difícil tratamento». Estas bactérias «são resistentes à família de antibióticos de mais largo espetro», o que conduz à necessidade de recorrer «ou a antibióticos inovadores, cujo uso deve ser reservado para não serem desperdiçados precocemente, ou a antibióticos que já não se usavam há muito tempo e que têm vindo a ser recuperados».
publicidade
17 DE NOVEMBRO
Terapêutica do linfoma de células do manto A ampliação do conhecimento sobre as características biológicas do linfoma de células do manto, bem como as suas repercussões sobre o gizar de novas estratégias terapêuticas têm-se traduzido em ganhos importantes ao nível da sobrevivência dos doentes com este tipo de linfoma não Hodgkin geralmente agressivo. Esta é uma das premissas da comunicação da Prof.ª Maria Gomes da Silva, diretora do Serviço de Hematologia do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa, entre as 9h30 e as 10h00 do dia 17 de novembro. por Ana Rita Lúcio
28
A
presentando-se como um «subtipo raro» de linfoma não Hodgkin, o linfoma de células do manto é, habitualmente, «uma doença agressiva e incurável», mais frequente em indivíduos do sexo masculino e «com um pico de incidência acima dos 60 anos», clarifica a Prof.ª Maria Gomes da Silva. Ainda assim, reconhece-se, atualmente, a existência de um subgrupo de doentes nos quais esta patologia assume um «comportamento mais indolente», embora estes casos sejam, por vezes, «difíceis de identificar antes do tratamento».
Depois de fazer este enquadramento inicial sobre o tema que vai abordar no âmbito do Programa Educacional de sábado, a hematologista salienta que «se conhece cada vez mais o que caracteriza o linfoma de células do manto a nível biológico». Esta doença tem «uma assinatura génica proliferativa, que se traduz em aspetos histológicos e numa repercussão prognóstica importante», especifica. Quanto ao tratamento, Maria Gomes da Silva sublinha que «as abordagens terapêuticas são, geralmente, estratificadas em função da idade e das comorbilidades» dos doentes. Na eventualidade de se equacionar estar perante um subtipo de linfoma de células do manto indolente, «pode-se adotar uma atitude expectante durante o tempo necessário para verificar se a doença progride rapidamente ou não». Todavia, «a maioria dos doentes precisam de ser tratados na altura do diagnóstico».
Transplante autólogo: sim ou não? Segundo a diretora do Serviço de Hematologia do IPO de Lisboa, tanto em indivíduos jovens como em idosos, «a estratégia terapêutica de primeira linha assenta em protocolos de quimioterapia em associação com rituximab, que variam com a idade e as comorbilidades». Não obstante, nos doentes mais jovens, «procura-se também consolidar a resposta da quimioimunoterapia com recurso ao transplante autólogo de medula óssea seguido de tratamento de manutenção com rituximab, que demonstrou benefício em termos de sobrevivên-
Novas perspetivas terapêuticas
Como frisa a Prof.ª Maria Gomes da Silva, os anos mais recentes têm sido marcados pelo advento de «novos agentes terapêuticos dirigidos a mecanismos biológicos que contribuem para a sobrevivência das células» afetadas pelo linfoma das células do manto (LCM). Estando ainda a ser testada a administração isolada destes novos fármacos ou em associação com anticorpos monoclonais e com quimioterapia, a especialista considera que os resultados obtidos até agora trazem «boas notícias». «Mais uma vez, não estamos a falar de estratégias curativas, mas de moléculas que permitem obter respostas mais duradouras numa fração significativa de doentes tratados com outras terapêuticas prévias», explica Maria Gomes da Silva. E concretiza: «Há fármacos já aprovados para monoterapia do LCM em recidiva, como é o caso do ibrutinib, um inibidor da tirosina-cinase de Bruton [BTK], ou o acalabrutinib, um inibidor da BTK de segunda geração.» Este último «está aprovado apenas nos Estados Unidos para o tratamento do LCM em recidiva refratária».
«Está demonstrado que o transplante autólogo obtém uma taxa elevada de respostas completas e de doença residual negativa, pelo que e continua a ser o tratamento-padrão em doentes elegíveis com linfoma de células do manto» cia destes doentes», explica a especialista. Além disso, «o tratamento de manutenção também se mostrou benéfico nos doentes não submetidos a transplante». Apesar de tudo, adverte Maria Gomes da Silva, o transplante autólogo, à semelhança das demais armas terapêuticas disponíveis para fazer face ao linfoma de células do manto, não é uma estratégia curativa, pelo que se antecipa que surjam recidivas mais tarde. Aliás, «a generalidade dos doentes acaba por recair, quer sejam idosos ou jovens e quer tenham sido submetidos ou não a transplante ou a tratamento de manutenção». Como tal, torna-se forçoso «considerar segundas e, por vezes, terceiras e quartas linhas de tratamento». A respeito do impacto da transplantação autóloga, Maria Gomes da Silva refere que a sua equipa está a participar num ensaio clínico multicêntrico em curso, que tem, entre outros, «o objetivo de aferir se todos os doentes, em circunstâncias elegíveis, terão necessidade de transplante de medula óssea». Independentemente das respostas que se buscam, a responsável sublinha que as mais-valias deste procedimento passam, sobretudo, pela «obtenção de uma resposta tão profunda e duradoura quanto possível». E conclui: «Está demonstrado que o transplante autólogo obtém uma taxa elevada de respostas completas e de doença residual negativa, pelo que continua a ser o tratamento-padrão em doentes elegíveis com linfoma de células do manto.» NP
publicidade
DIVULGAÇÃO
Lenalidomida na primeira linha e na terapêutica de manutenção do MM Numa iniciativa tripartida que incluiu reuniões em Coimbra, Porto e Évora, respetivamente a 17 de maio, 26 de junho e 22 de setembro deste ano, as First Line Talks, promovidas pela Celgene, juntaram especialistas nacionais e internacionais para refletir sobre o estado da arte do tratamento de primeira linha e de manutenção do mieloma múltiplo (MM), tanto em doentes candidatos como não candidatos a transplante de células progenitoras hematopoiéticas. Seguem-se os pontos de vista de alguns dos peritos que tomaram a palavra nessas sessões. por Ana Rita Lúcio
30
L
embrando que «a maioria dos doentes com MM de novo diagnóstico não são candidatos a transplante de células progenitoras hematopoiéticas [TCPH]», a Prof.ª María-Victoria Mateos, diretora do Programa de Mieloma e coordenadora da Unidade de Ensaios Clínicos do Departamento de Hematologia do Hospital Universitário de Salamanca, salienta que, nestes casos, o principal objetivo do tratamento de primeira linha é «alcançar respostas o mais profundas possível». Tal contribui para «uma sobrevivência livre de progressão [SLP] e uma sobrevivência global [SG] mais dilatadas». Dado que estes doentes, na sua maioria, têm idade superior a 65 anos, impõe-se que «o perfil de segurança e toxicidade da terapêutica eleita seja aceitável, para preservar a qualidade de vida dos doentes», aponta María-Victoria Mateos. E acrescenta: «Tão importante quanto obter respostas de alta qualidade é mantê-las, de modo a atrasar, o mais possível, a progressão da doença. Isso é determinante nos doentes adultos não candidatos a TCPH, junto dos quais devemos procurar tirar o máximo benefício do tratamento de primeira linha.» Sustentando-se, sobretudo, nos resultados do estudo FIRST (Frontline Investigation of Revlimid and Dexamethasone versus Standard Thalidomide) versus standard MPT (melfalano+ prednisolona + talidomida), esta hematologista refere que, atualmente, «existe consenso sobre os benefícios do tratamento contínuo para a generalidade dos doentes com MM, particularmente os não candidatos a TCPH». «Este estudo demonstrou a superioridade do tratamento contínuo com lenalidomida e dexametasona, em termos de SLP e SG.»
UM MOMENTO DA REUNIÃO DE ÉVORA, A 22 DE SETEMBRO: Prof.ª María-Victoria Mateos (no púlpito), Prof. Paulo Lúcio, Prof.ª Cristina João e Prof.ª Catarina Geraldes
Por conseguinte, María-Victoria Mateos realça o «papel muito relevante da imunomodulação nos doentes com MM candidatos e não candidatos a TCPH, quer tenham diagnóstico de novo, quer ao longo das diferentes fases da doença». E justificou: «Tendo em conta os mecanismos fisiopatológicos do MM, recorrer a tratamentos que, por um lado, destroem as células plasmáticas e, por outro, potenciam o sistema imunitário é fundamental para conseguir controlar esta doença.»
Associações com lenalidomida em primeira linha Por sua vez, o Prof. Paulo Lúcio, diretor da Unidade de Hemato-Oncologia do Centro Clínico da Fundação Champalimaud, em Lisboa, chama a atenção para as vantagens da associação lenalidomida/ /dexametasona (len/dex) versus o esquema VMP [bortezomib, melfalano e prednisona]». A primeira associação é de administração oral, o que «implica menos constrangimentos à qualidade de vida dos doentes», sendo também um tratamento «que traz algumas vantagens também para a instituição hospitalar», uma vez que «a logística necessária à administração de fármacos injetáveis e consequente ocupação do hospital de dia é mais pesada». De igual modo, a associação len/dex «tem a vantagem acrescida de apresentar um perfil de tolerabilidade muito satisfatório». Em termos de raciocínio clínico, «é muito perigoso assumir que se vai reservar uma boa estratégia terapêutica para uma recaída posterior». Na opinião deste hematologista, essa «não é uma opção defensável», tendo em conta que, «regra geral, os doentes em recaída respondem
«Toda a evidência científica publicada confirma que o tratamento até à progressão está associado a sobrevivências livres de doença e sobrevivências globais mais longas» Prof. Paulo Lúcio pior ao tratamento e, como confirma a experiência e toda a evidência disponível a respeito, cada linha terapêutica tende a perder doentes em relação à anterior». Nesse sentido, Paulo Lúcio é perentório a afirmar que, «sempre que a indicação clínica aconselhar a combinação len/dex em primeira linha, jamais deixaria de a utilizar com a justificação de a reservar para a segunda linha». Aludindo também às conclusões do estudo FIRST e à consequente aprovação da associação len/dex para o tratamento de primeira linha do MM, Paulo Lúcio refere que «a opção pela lenalidomida neste âmbito tem sido dominante e tudo indica que se vá consolidar com as aprovações esperadas para breve de combinações triplas com este imunomodulador em primeira linha». Adicionalmente, este hematologista manifesta-se a favor da terapêutica contínua: «Toda a evidência científica publicada confirma que o tratamento até à progressão está associado a sobrevivências livres de doença e sobrevivências globais mais longas.»
Tratamento de manutenção após transplante Analisando o caso concreto dos long-runners em manutenção, o Dr. Fernando Leal da Costa, responsável pela Clínica de Mieloma do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa, explica que, hoje em dia, «este conceito corresponde a um conjunto de doentes que não é, de todo, negligenciável». E concretiza: «Cerca de 40% dos doentes com MM têm sobrevivências superiores a 10 anos e todos nós seguimos doentes com sobrevivências na ordem dos 20 anos. Esses bons resultados decorrem da extraordinária evolução terapêutica observada nas últimas décadas.» Para este especialista, «já não há quaisquer dúvidas sobre as mais-valias do tratamento de manutenção» do MM após TCPH, que, segundo diferentes estudos, apresenta «benefícios claros em termos de sobrevivência com qualidade de vida». Como tal, «do ponto de vista ético, é obrigatório oferecer este tratamento aos doentes com MM», até porque é uma opção custo-eficaz. «Tendo em conta que o número de anos de vida em acréscimo é tão significativo do ponto de vista estatístico – a probabilidade de sobrevivência mais do que duplica –, a terapêutica de manutenção torna-se imediatamente custo-eficaz», frisa Fernando Leal da Costa. Por sua vez, a Dr.ª Fernanda Trigo, hematologista no Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ), no Porto, afirma que o principal objetivo do tratamento de primeira linha nos doentes com MM candidatos a TCPH é proporcionar uma resposta o mais profunda e duradoura possível. «Quanto mais eficazes formos no atingimento dessa meta, em melhores condições os doentes irão para o transplante e, consequentemente, melhor será a resposta à terapêutica de indução e melhores serão a SLP e a SG dos doentes.» Segundo esta especialista, o tratamento de manutenção até à progressão do MM começa a ser uma realidade. «Há dados suficientemente robustos e contundentes que nos mostram que fazer esta terapêutica é melhor do que não fazer nada, inclusivamente nos doentes que têm uma citogenética mais desfavorável.» Não obstante,
Prof.ª María-Victoria Mateos
«Os resultados dos vários estudos realizados nos últimos anos comprovam os benefícios da lenalidomida como terapêutica de manutenção pós-transplante» Prof.ª Catarina Geraldes
que se refletem no aumento da SLP e da SG». «Estamos a falar de dois anos e meio a mais de SG, comparativamente aos doentes não sujeitos a qualquer tratamento de manutenção», concretiza Catarina Geraldes. Falando sobre o que se espera desta abordagem nos próximos anos, a hematologista acredita que, «em alguns subgrupos de doentes, nomeadamente os que têm uma citogenética de risco desfavorável ou que não chegam a alcançar doença residual mínima após o transplante, poder-se-á ponderar a associação de lenalidomida a um inibidor do proteassoma, com o objetivo de intensificar a resposta». NP
o período de tempo durante o qual se deve prolongar este tratamento permanece em debate. Adiantando que o Serviço de Hematologia Clínica do CHUSJ soma já «alguma experiência» na administração de terapêutica de manutenção a doentes com MM previamente transplantados, Fernanda Trigo explica o porquê desta opção: «O que ambicionamos com a manutenção é, passo o pleonasmo, manter a resposta obtida com o transplante ao longo do tempo, que se pretende que seja o mais completa possível do ponto de vista clínico, quer a nível hematológico quer medular.»
Vantagens da terapêutica imunomoduladora contínua
31
Dr.ª Fernanda Trigo
Parecer semelhante tem a Prof.ª Catarina Geraldes, hematologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, que não hesita em afirmar: «De acordo com o conhecimento atual, todos os doentes com MM candidatos a TCPH devem realizar terapêutica de manutenção. Está demonstrado que o tratamento contínuo com um imunomodulador como a lenalidomida tem um efeito antitumoral direto sobre o clone maligno e restaura o sistema imunitário, potenciando o seu próprio efeito antimieloma, o que contribui para que se possa controlar a doença durante mais tempo.» Isso mesmo indiciam os vários estudos realizados nos últimos anos neste âmbito, cujos resultados «comprovam os benefícios da lenalidomida como terapêutica de manutenção pós-transplante,
Dr. Fernando Leal da Costa
Prof. Paulo Lúcio
Prof.ª Catarina Geraldes
Novembro 2018
publicidade