Notícias Prévias 2017
19.ª Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) | www.sph.org.pt | 0,01 €
Novembro de 2017
16 a 18 de novembro
CENTRO DE CONGRESSOS DO Hotel TIVOLI MARINA VILAMOURA
Impulso à investigação nacional em Hematologia Organizada pelo Serviço de Hematologia Clínica e Transplantação de Medula do Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, a 19.ª edição da Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia reforça a aposta na produção científica nacional, reservando totalmente a tarde de sexta-feira (17 de novembro) para a apresentação de comunicações orais e pósteres. Na elaboração do programa, a Comissão Organizadora e a Comissão Científica procuraram privilegiar patologias sobre as quais há desenvolvimentos recentes, como explicam, em entrevista, os respetivos presidentes, Dr. João Raposo e Prof. João Forjaz de Lacerda (pág.4 a 8). É o caso da leucemia linfoblástica aguda Philadelphia-like (pág.14), da hemoglobinúria paroxística noturna (pág.18) e da drepanocitose (pág.19). A imunoterapia, sobretudo os inibidores dos checkpoints imunitários (pág.22), e a medicina de precisão (pág.24) serão também temas em destaque neste congresso PUB
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EDITORIAL
SUMÁRIO
Privilegiar a partilha de experiências
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Q
uando alguns de nós começaram a carreira como hematologistas, não havia reuniões gerais da especialidade. Ocasionalmente, um Serviço de Hematologia organizava um encontro temático ou uma sessão de casos clínicos e convidava colegas de outros centros para participar, mas muitos dos hematologistas nem se conheciam entre si. Esta realidade começou a mudar em 1999, quando a Direção da Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) decidiu criar as suas Reuniões Anuais. Tive o prazer de integrar essa Direção presidida pelo Prof. António Parreira. Desde logo, procurámos fidelizar uma data e não acredito que haja, atualmente, um hematologista em Portugal que não saiba que a Reunião Anual da SPH decorre nos primeiros 15 dias de novembro. A importância deste encontro científico, que ganhou um rumo e que procuramos melhorar de ano para ano, não se resume à atualização de conhecimentos mediante a mais recente evi-
dência disponível. É a ocasião, por excelência, para sairmos da azáfama dos nossos centros e nos encontrarmos, partilharmos experiências ou pontos de vista e conhecermos aquilo que os nossos colegas estão a fazer. É por isso que, este ano, mais uma vez, reservaremos a tarde de sexta-feira, integralmente, para a apresentação de comunicações orais e pósteres. Sem a indústria farmacêutica e de equipamentos médicos não há reuniões científicas. Desta vez, optámos por concentrar as sessões organizadas pela indústria na quinta-feira, reservando a sexta-feira e o sábado, integralmente, para o programa científico elaborado pelas Comissões Científica e Organizadora da Reunião Anual da SPH 2017. Os cursos pré-congresso e os simpósios-satélite prometem ser interessantes, complementando o restante programa. Por isso, convido todos aqueles que puderem e quiserem a estar presentes na Reunião logo desde quinta-feira de manhã. Penso que valerá a pena. Às Lições, demos o nome de dois pioneiros da Hematologia nacional: o Prof. Francisco Parreira e o Prof. Armando Ducla Soares. Serão proferidas, respetivamente, pelo Dr. Jordi Esteve, do Hospital Clínic de Barcelona, que abordará as implicações terapêuticas do perfil molecular na leucemia mieloide aguda; e pela Prof.ª Maria do Carmo Fonseca, presidente do Instituto de Medicina Molecular da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, que falará sobre a medicina de precisão em Hematologia. Estes são pontos de destaque de um programa que, apesar da sua reduzida extensão, acreditamos ser equilibrado. Esperamos que o achem interessante. Encontramo-nos em Vilamoura,
ENTREVISTA | Em representação das Comissões Organizadora e Científica, o Dr. João Raposo, o Dr. Carlos Martins e o Prof. João Forjaz de Lacerda explicam o programa científico e o porquê das mudanças introduzidas na Reunião da SPH 2017
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ENTREVISTA | O ADN e o organigrama do Serviço de Hematologia Clínica e Transplantação de Medula do Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, que organiza a Reunião Anual da SPH 2017
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OPINIÕES | O programa científico em
análise pelos elementos da Comissão Científica de outros centros hospitalares
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16 DE NOVEMBRO | Resumo dos cursos
pré-congresso sobre imunoterapia, marcadores genéticos preditivos de leucemia linfocítica crónica e farmacoeconomia em hemato-oncologia
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17 DE NOVEMBRO | Desafios da
leucemia linfoblástica aguda Phi-like 18 DE NOVEMBRO | Implicações
terapêuticas dos subtipos biológicos de linfomas difusos de grandes células B
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18 DE NOVEMBRO | Da biologia
à terapêutica da hemoglobinúria paroxística noturna
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18 DE NOVEMBRO | Atualização
no tratamento da drepanocitose
18 DE NOVEMBRO | Estudo, riscos, profilaxia e tratamento da trombofilia 19 DE NOVEMBRO | Aplicação dos
inibidores dos checkpoints imunitários nas neoplasias hematológicas
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19 DE NOVEMBRO | Entrevista com a Prof.ª Maria do Carmo Fonseca, presidente do Instituto de Medicina Molecular, sobre a medicina de precisão em Oncologia
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PROGRAMA DE ENFERMAGEM |
Antevisão das várias sessões marcadas pela multidisciplinaridade de conhecimentos
João Raposo
Presidente da Comissão Organizadora da Reunião Anual da SPH 2017
Ficha Técnica Edição:
Congresso organizado por:
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PATROCINADORES DESTA EDIÇÃO:
Publicação isenta de registo na ERC, ao abrigo do Decreto Regulamentar n.º 8/99, de 6 de junho, artigo 12.º, 1.ª alínea
Novembro 2017
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entrevista
Produção científica nacional em destaque na Reunião Anual da SPH 2017
A concentração de todos os cursos e simpósios-satélite organizados pela indústria farmacêutica e de equipamentos na quinta-feira, 16 de novembro, é uma das principais novidades da Reunião Anual da SPH 2017, organizada pelo Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria (CHLN/HSM). O destaque dado às comunicações orais e aos pósteres é outro «ponto de honra» deste encontro, como afirmam, nesta entrevista, o Dr. João Raposo (presidente da Comissão Organizadora e diretor do Serviço de Hematologia Clínica e Transplantação de Medula do CHLN/HSM), o Prof. João Forjaz de Lacerda (presidente da Comissão Científica) e o Dr. Carlos Martins (membro da Comissão Organizadora). por Luís Garcia
vos médicos, muitas das quais perspetivando-se interessantíssimas, como os cursos que decorrerão na parte da manhã. Enquanto presidente da Comissão Organizadora, estou a tentar sensibilizar os meus pares, diretores dos Serviços de Hematologia nacionais, para facilitarem, dentro do possível, a chegada dos internos na quarta-feira à noite, de modo a poderem estar presentes na Reunião logo na quinta-feira de manhã.
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Dr. João Raposo
Quais são as principais novidades da Reunião Anual da SPH 2017? Dr. João Raposo (RP): O aspeto que mais se destaca é a tentativa de resolver uma questão que não é consensual: a conjugação das sessões promovidas pela indústria farmacêutica e de equipamentos médicos com o programa científico, que é independente e elaborado pelas Comissões Organizadora e Científica mandatadas para tal. Algumas pessoas, entre as quais me incluo, entendem que as duas vertentes não devem estar
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trabalhos foram submetidos para apresentação na Reunião da SPH 2017
misturadas no tempo. No entanto, devemos ter em conta que, sem o apoio da indústria, não existem, pura e simplesmente, reuniões científicas. Para resolver esta questão, a SPH já experimentou várias modalidades, como colocar simpósiossatélite à hora do almoço ou intercalados no programa científico. Desta vez, achámos que era altura de separar as águas, mantendo o sinergismo. Para isso, o dia pré-congresso, 16 de novembro, é completamente dedicado às sessões organizadas pela indústria farmacêutica e de dispositi-
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foram selecionados para comunicação oral
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foram selecionados para póster
Prof. João Forjaz de Lacerda (JFL): De facto, penso que valerá a pena ir de véspera para o Algarve, porque a quinta-feira é um dia claramente a assistir, com cursos na parte da manhã e vários simpósios-satélite na parte da tarde. Até porque, em certa medida, complementarão muito bem o programa científico de sexta-feira e sábado. Apesar do viés que, naturalmente, estas sessões podem ter, contarão com muitas palestras de convidados nacionais e internacionais idóneos, que vão transmitir a evidência dos fármacos mais recentes, sobretudo para as patologias hemato-oncológicas. A concentração das sessões da indústria na quinta-feira não significa, de modo algum, uma desvalorização do seu papel, mas sim uma forma de, entre outros aspetos, evitar os atrasos que, por vezes, marcam os simpósios-satélite da hora do almoço. Vamos pugnar para que os horários sejam cumpridos, de modo a que as pessoas tenham tempo para falar, estabelecer parcerias e aprofundar relacionamentos científicos. Dr. Carlos Martins (CM): A indústria farmacêutica vai continuar a ter um papel preponderante na Reunião, até pela localização da exposição técnica, que será instalada no espaço central entre as salas das sessões. Necessariamente, os participantes vão circular pela exposição técnica.
Quais foram as principais preocupações na elaboração do programa científico? JFL: Procurámos trazer para o Programa Educacional um conjunto de tópicos que têm desenvolvimentos científicos recentes e importantes, mas que ainda não tinham sido tratados em reuniões anteriores da SPH ou não o eram há muito tempo. Como o programa científico da Reunião deste ano
é curto, optámos por organizar sessões que não são dedicadas a um único tema, mas sim com duas ou três palestras sobre patologias diferentes, de modo a aumentar a variedade de temas abordados. Tentámos que o programa fosse equilibrado, tocando a Hematologia oncológica, não oncológica, o transplante de progenitores hematopoiéticos e as terapêuticas celulares. JR: Como trabalhamos num Serviço de Hematologia eclético, procurámos conjugar temas oncológicos, que vão estar bastante em foco também na quinta-feira, como linfomas, leucemias, mielomas, etc., e não oncológicos. Neste caso, haverá temas com bastante atualidade e «pano para mangas» para discussão, como trombofilia, drepanocitose e hemoglobinúria paroxística noturna.
O que norteou a escolha dos oradores? JR: Procurámos convidar os especialistas mais habilitados a partilhar o seu saber sobre cada patologia e assentámos um ponto: não haver qualquer palestrante do nosso Serviço. Nós organizamos, outros falam. Quando forem outros a organizar, se nos quiserem convidar, falaremos sobre o que sabemos e partilharemos a nossa experiência com todo o gosto.
AS SESSÕES «À LUPA» Dissecando agora o programa científico, o que será discutido na primeira sessão do Programa Educacional, que é dedicada à Hemato-Oncologia? JFL: Essa sessão vai ter uma intervenção sobre leucemias linfoblásticas agudas Philadelphia-like. Trata-se de um novo subtipo desta doença, com características moleculares e genéticas particulares, que também têm uma correlação com o prognóstico e levantam questões muito importantes no âmbito das opções terapêuticas. Este é um tópico muito atual e vale a pena discuti-lo na Reunião da SPH.
O que esperar das duas Lições? JFL: A Lição Francisco Parreira, na sexta-feira, será proferida por uma figura de grande relevância no estudo do perfil molecular da leucemia mieloide aguda – o Dr. Jordi Esteve, do Hospital Clínic de Barcelona. Estou certo de que fará uma palestra muito interessante. Para a Lição Ducla Soares, convidámos a Prof.ª Maria do Carmo Fonseca, docente na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e presidente do Instituto de Medicina Molecular, que falará sobre um tópico muito atual e que está
«A Lição Francisco Parreira, na sexta-feira, será proferida por uma figura de grande relevância no estudo do perfil molecular da leucemia mieloide aguda – o Dr. Jordi Esteve, do Hospital Clínic de Barcelona. Estou certo de que fará uma palestra muito interessante» Prof. João Forjaz de Lacerda a emergir na cena internacional: a Medicina de Precisão em Oncologia. Este tema pode parecer um pouco vago, mas, para os hematologistas, é muito interessante ouvir uma investigadora que olha para as patologias a partir de uma perspetiva mais biológica e que absorve a informação de fóruns internacionais diferentes daqueles que nós
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entrevista
Dr. Carlos Martins
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«A Lição Ducla Soares é uma das sessões mais interessantes do programa científico. A Prof.ª Maria do Carmo Fonseca faz palestras excecionais e o tema da medicina de precisão em Oncologia, apesar de nos reservar algumas surpresas, é muito pertinente na atualidade» Dr. Carlos Martins frequentamos. A Prof.ª Maria do Carmo Fonseca abordará os chamados basket trials, que são ensaios clínicos que incluem doentes com patologias diferentes, sejam elas hemato-oncológicas ou de tumores sólidos, que partilham uma determinada alteração molecular que os torna elegíveis para a utilização do mesmo fármaco. CM: A Lição Ducla Soares é, certamente, uma das sessões mais interessantes do programa científico. A Prof.ª Maria do Carmo Fonseca faz sempre palestras excecionais e o tema da medicina de precisão em Oncologia, apesar de nos reservar algumas surpresas, é muito pertinente na atualidade.
O que será abordado no Programa Educacional que versa sobre as doenças hematológicas benignas? JFL: Para essa sessão, escolhemos três tópicos de grande atualidade, ainda que alvo de alguma discussão. Em relação à hemoglobinúria paroxística noturna, persistem dúvidas sobre como tratar os doentes, existindo como opções as terapêuticas farmacológicas, mas também o transplante de progenitores hematopoiéticos. Na drepanocitose, embora a terapêutica standard esteja bem estabelecida há muito tempo e não haja grandes novidades, discute-se o encaminhamento do doente para transplante de progenitores hematopoiéticos ou para ensaios clínicos de terapêutica génica. Finalmente, na área da coagulação, serão abordadas as indicações terapêuticas e, sobretudo, profiláticas nos casos de trombofilias. Tenho a impressão de que há uma tendência generalizada para hipertratar ou instituir medicação profilática num grande número de doentes de forma pouco controlada. No entanto, temos hoje normas e evidência que suportam claramente a profilaxia de alguns doentes versus a poupança de outros a esta intervenção e aos seus possíveis efeitos secundários.
Já no sábado, 18 de novembro, serão debatidas as terapêuticas celulares. Que novidades existem neste campo? JFL: A terapêutica celular é tema premente a nível mundial e está presente em quase todas as reuniões de Hematologia. O denominador comum
nas três palestras deste Programa Educacional é a terapia celular com linfócitos T e a forma como esta pode ser efetivada no tratamento de doenças hemato-oncológicas. Na primeira palestra, o Dr. Fernando Príncipe, do Centro Hospitalar de São João, vai falar sobre os inibidores dos checkpoint imunitários, que bloqueiam a supressão dos linfócitos T e permitem que estes reconheçam as células malignas. O segundo orador, Prof. Carlos Ramos, é um investigador português radicado há vários anos nos EUA, que trabalha no Baylor College of Medicine, em Houston, instituição que já tem uma tradição importante na utilização das células T modificadas com recetores CAR [sigla em inglês para recetor antigénico quimérico]. Este palestrante vai traçar a história da utilização destas células nas várias patologias hematológicas. Por sua vez, a Prof.ª Emma Morris, investigadora no University College London, apresentará outra forma de modificar as células T para o tratamento de leucemias agudas. Tenho grande expectativa em relação a esta sessão, porque é verdadeiramente inovadora. Os inibidores dos checkpoint imunitários já são utilizados na prática clínica, mas as outras duas terapêuticas ainda estão em fase de estudos de âmbito académico ou, como acontece com as células CAR-T, em ensaios clínicos promovidos pela indústria farmacêutica.
Que abordagem foi escolhida para o Programa Educacional sobre o transplante de progenitores hematopoiéticos? JFL: A nossa preocupação foi, fundamentalmente, tocar temas que não fossem muito usuais. Por isso, será discutida a elegibilidade para transplante de doentes idosos, temperada pela necessidade de terapêutica de suporte e cuidados paliativos no seu sentido mais lato. Na sua palestra, a Dr.ª Ashley Rosko, da Ohio State University, nos EUA, vai abordar a orientação dos doentes idosos com mieloma múltiplo para receberem ou não um autotransplante de proge-
«Uma das nossas grandes preocupações foi não remeter para segundo plano a produção científica nacional. Por isso, reservámos toda a tarde nobre de sexta-feira para a apresentação de comunicações orais e a discussão de pósteress» Prof. João Forjaz de Lacerda
nitores hematopoiéticos. Já o Prof. José Antonio Pérez Simón, do Hospital Universitario Virgen del Rocío, em Sevilha, refletirá sobre a decisão de fazer ou não transplante em doentes idosos com leucemia mieloide aguda. A idade será o melhor indicador para inviabilizar o transplante? Esta é a questão central da sessão. CM: Os idosos preocupam-nos cada vez mais. Os centros que transplantam e os que referenciam os doentes debatem-se sempre com este problema: quais os casos com indicação para transplante? Existem tabelas de avaliação do doente idoso, mas a dificuldade de decisão é cada vez maior. Espero que, nesta sessão, haja muitas perguntas e debate, porque penso que seria bastante útil perceber até que ponto os médicos assistentes não referenciam o doente por considerarem que não tem indicação para transplante exclusivamente pela idade.
PRÉMIOS
Mais uma vez, a SPH distingue os trabalhos de excelência com vários prémios, no valor total de 10 500 euros. Na sessão de encerramento, que decorrerá no dia 18 de novembro, entre as 13h00 e as 13h30, serão entregues os seguintes prémios: Melhor Apresentação Oral 1.º prémio: 1 500 euros 2.º prémio: 1 000 euros Prémio Jovem Hematologista Valor: 1 250 euros Melhor Póster de Trabalho Experimental 1.º prémio: 1 000 euros 2.º prémio: 750 euros Melhor Póster de Trabalho Clínico 1.º prémio: 1 000 euros 2.º prémio: 750 euros Melhor Trabalho de Enfermagem 1.º prémio: 750 euros 2.º prémio: 500 euros Melhor Trabalho em Síndromes Mieloproliferativas Valor: 1 000 euros Melhor Trabalho em Síndromes Mielodisplásicas Valor: 1 000 euros
Prof. João Forjaz de Lacerda
A Reunião Anual da SPH dá sempre grande destaque às comunicações orais. A aposta mantém-se? JFL: Uma das nossas grandes preocupações foi não remeter para segundo plano a produção científica nacional. Por isso, reservámos toda a tarde nobre de sexta-feira para a apresentação de comunicações orais e a discussão de pósteres. Uma preocupação adicional que tivemos foi dar maior realce aos pósteres, reservando-lhes uma sala ampla, com espaço para «respirar», um lugar aprazível para os congressistas. Haverá também outra novidade neste âmbito: em vez de todos os pósteres serem discutidos, a Comissão Científica vai escolher apenas alguns para discussão. Isto não quer dizer que os restantes não sejam importantes; pelo contrário, os autores deverão estar presentes para defender o seu trabalho, e esperamos que os participantes na Reunião percorram os pósteres e interpelem os autores. No fundo, vamos ter três níveis para os trabalhos submetidos este ano: as comunicações orais, os pósteres selecionados para discussão e os restantes em exibição. JR: A Reunião Anual da SPH é o evento nacional em que se pode verdadeiramente conhecer algum do trabalho que se faz nos hospitais, através, sobretudo, das comunicações orais e dos pósteres. É a oportunidade ideal para trocar impressões e conhecer os colegas. Passamos a maior parte do nosso tempo «esmagados» pela atividade assistencial, pelo que me parece muito útil ter um dia e meio por ano para nos juntarmos aos nossos colegas e discutirmos a Hematologia portuguesa.
«A Reunião Anual da SPH é o evento nacional em que se pode verdadeiramente conhecer algum do trabalho que se faz nos hospitais, através, sobretudo, das comunicações orais e dos pósteres. É a oportunidade ideal para trocar impressões e conhecer os colegas» Dr. João Raposo
CM: Grande parte dos hematologistas portugueses tem oportunidade de frequentar, regularmente, os grandes congressos internacionais, como o da American Society of Hematology e o da European Hematology Association, nos quais são apresentadas, todos os anos, as principais novidades nesta área. Por isso, além das palestras com um formato mais tradicional, é fundamental conhecer o que fazem os nossos colegas e discutir a realidade nacional da especialidade, o que acaba por acontecer muito nas apresentações de comunicações orais e pósteres.
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entrevista
ADN DO SERVIÇO ORGANIZADOR Quais os principais marcos da história do Serviço de Hematologia e Transplantação de Medula do CHLN/HSM? JR: Este Serviço nasceu com os fundadores da Hematologia portuguesa que, em Lisboa, foram, entre outros, o Prof. Armando Ducla Soares e o Prof. Francisco Parreira [ver caixa na página seguinte]. Numa fase inicial, a Hematologia integrava um grande Serviço de Medicina Interna que, na transição da década de 1980 para a de 1990, se fragmentou, dando a origem a vários Serviços, entre os quais o de Hematologia Clínica e Transplantação de Medula. Em 1989, teve início o programa de transplante de medula óssea, no qual o HSM viria a ser pioneiro em várias técnicas, entre as quais o transplante autólogo e haploidêntico. Foi também deste Serviço que saíram os primeiros hematologistas de raiz, com exames finais de especialidade feitos. Os Profs. António Parreira, Leonor Parreira, Manuel Abecasis, Tavares de Castro e, bem mais recentemente, o Dr. Fernando Leal da Costa, foram alguns dos especialistas formados nesta grande escola de Hematologia.
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Como evoluiu o Serviço desde então? CM: Ao longo dos anos, registou-se uma evolução drástica, em todos os aspetos. Quando entrei para o Serviço, não se faziam transplantes, por exemplo, e os tratamentos que disponibilizávamos aos doentes não tinham nada a ver com aqueles que temos oportunidade de lhes oferecer hoje. Para dar um exemplo que agora nos parece quase anedótico: nos primeiros doentes com leucemia mieloide crónica, tínhamos grande dificuldade em identificar o cromossoma Philadelphia, que é o «bilhete de identidade» da doença e se identifica num cariótipo. Sobretudo na área da Hemato-Oncologia, a terapêutica e o diagnóstico tiveram avanços enormes que, felizmente para os doentes, se acompanharam por uma melhoria na sobrevivência e na qualidade de vida.
Qual é o organigrama atual? JR: Temos a Unidade de Transplante de Medula Óssea e a Unidade de Tratamento Intensivo de Doenças Hematológicas, com oito camas cada. Além da enfermaria, que tem 22 camas, asseguramos a consulta externa e o hospital de dia, que foi o primeiro do país de Hematologia e um dos primeiros considerando todas as especialidades. É antigo, mas tem muito know-how acumulado no tratamento de todo o tipo de patologias hematológicas, sendo o terceiro hospital de dia do HSM com mais movimento. Temos uma cultura de pouco internamento e apostamos bastante no ambulatório. Gostaríamos muito de implementar a abertura do hospital de dia ao sábado e ao domingo, que traria vantagens para a administração de algumas terapêuticas em doentes com patologias mais complicadas.
Quais as principais patologias tratadas no Serviço? JR: Toda a patologia hematológica. Isto é uma vantagem em relação a alguns serviços que tratam sobretudo Hemato-Oncologia. Somos um Serviço muito eclético, damos apoio a todo o Hospital, recebemos doentes, muitas vezes graves, e todos os médicos se veem confrontados com a necessidade de intervir em várias áreas, embora se dediquem mais a uma ou outra, consoante a sua diferenciação. É também por isso que temos ligações próximas com todas as especialidades. Um hospital com estas características recebe os casos mais complicados, os doentes mais graves, com complicações de órgão múltiplas, que nos levam a contactar com colegas das diferentes especialidades.
O Serviço dispõe de laboratório próprio? JR: Somos um hospital predominantemente dedicado à clínica e não dispomos de laboratórios próprios. O Serviço começou a trabalhar nestes moldes e, agora, seria difícil inverter este processo. Trabalhamos com os laboratórios do Hospital e outros agregados à Faculdade, como o Instituto de Medicina Molecular.
A influência de Ducla Soares e Francisco Parreira
Pertencer a um hospital universitário traz vantagens? JR: A ligação com a Faculdade de Medicina é óbvia e forte: temos um doutorado, o Prof. João Forjaz de Lacerda, que é o diretor da Clínica Universitária da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, e alguns dos nossos especialistas são assistentes convidados nesta instituição. Vamos também tentar reforçar a nossa proximidade com o Instituto de Medicina Molecular, no intuito de aumentar a investigação de iniciativa médica no nosso Serviço, que ainda é escassa. Mas temos muita prática na investigação promovida pela indústria farmacêutica. Fomos dos primeiros Serviços de Hematologia a começar esta atividade, por volta de 2001, e alguns dos nossos seniores foram coautores de trabalhos internacionais importantes, como aquele que originou a primeira aprovação mundial do rituximab. Infelizmente, a pressão da atividade assistencial não nos tem permitido dedicar mais tempo à investigação. Nos países mais desenvolvidos, pelo menos 30% do tempo de trabalho de um elemento sénior é dedicado a pensar, a organizar e a investigar, e não em atividade assistencial. No nosso caso, não podemos deixar de dar resposta aos doentes, porque eles são a razão de existirem médicos; o resto vem por acréscimo.
Quais os principais desafios que enfrentam hoje em dia? JR: O principal desafio é a escassez de médicos. Dos nossos 11 hematologistas, apenas três têm menos de 50 anos. Assim, torna-se difícil responder à urgência de 24 horas, à referenciação de outros serviços e de outros hospitais e a toda a carga assistencial. Neste momento, temos 12 internos de especialidade e estamos numa fase de remodelação e rejuvenescimento, mas, naturalmente, o reforço do quadro médico não depende só de nós. A dispersão física do Serviço, que está repartido por dois pisos, com vários setores administrativos independentes também é um pouco difícil de gerir, por vezes. Mas vamos conseguindo ultrapassar essas dificuldades no dia a dia. NP
Este ano, as Lições da Reunião da SPH recebem os nomes de duas figuras centrais da história da Hematologia portuguesa, ambas ligadas à Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa: os Profs. Armando Ducla Soares e Francisco Parreira. O primeiro «promoveu o desenvolvimento da Hematologia no seio da Medicina Interna, é considerado um dos pais da Hematologia nacional e foi um grande clínico, muito respeitado», frisa João Forjaz de Lacerda. E João Raposo acrescenta: «Uma figura espantosa da nossa Medicina, que ainda tive oportunidade de conhecer.» Francisco Parreira «foi um médico muito ligado à patologia laboratorial das doenças hematológicas, com um trabalho que deu muitos frutos e resultou numa escola de Hematologia Clínica, mas também Laboratorial», refere João Forjaz de Lacerda. Em conjunto com a Dr.ª Margarida Carneiro de Moura, Francisco Parreira «deu início e sedimentou a escola da morfologia, em particular das doenças hemato-oncológicas, que ainda hoje existe no Hospital de Santa Maria». «Quisemos honrar os Profs. Ducla Soares e Francisco Parreira porque tiveram um enorme papel no desenvolvimento da Hematologia nacional e marcaram a nossa instituição», remata João Raposo.
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Opiniões
Comissão Científica realça novas terapêuticas e investigação nacional Dr.ª Cláudia Casais
«C
Centro Hospitalar Universitário do Porto/Hospital de Santo António
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omo já é habitual, o programa da Reunião Anual da SPH tem uma vertente educacional que é importante para os colegas ainda em formação, mas também para a atualização dos restantes em algumas áreas específicas. Tem também uma componente informativa, que nos permite ficar a par daquilo que os colegas estão a desenvolver em todo o país. Se é verdade que, hoje, temos acesso aos artigos científicos com novidades vindas do mundo inteiro, por vezes, é mais difícil saber o que se está a fazer a poucos quilómetros de distância do nosso hospital. Na minha opinião, o intercâmbio entre os centros nacionais é o aspeto mais importante da Reunião Anual da SPH, tanto no quadro do programa científico deste ano, como no contacto informal e pessoal entre colegas. Relativamente ao programa científico deste ano, começo por destacar um tema muito atual: os subtipos biológicos dos linfomas difusos de grandes células B. Conseguiu-se um grande avanço na tentativa de classificar os subtipos da doença, no entanto, a passagem dessa classificação biológica para a terapêutica ainda não aconteceu, ou seja, não sabemos se vamos conseguir dar o salto entre os avanços na classificação biológica e as suas consequências na terapêutica. Também acho importante o facto de o programa não se focar apenas nas doenças oncológicas. A Hematologia tem de manter uma grande abertura relativamente à patologia não oncológica, que, apesar de ser habitualmente menos presente nos congressos e reuniões, representa uma fatia muito relevante da nossa atividade clínica. Tenho particular curiosidade em saber o que apresentará a Dr.ª Anabela Morais sobre a drepanocitose, por exemplo, mas também sobre o que dirá a Dr.ª Sara Morais acerca da trombofilia hereditária, que abrange muitas especialidades médicas e cirúrgicas além da Hematologia. As terapêuticas celulares também serão abordadas, com temas como as células CAR-T (sigla em inglês para recetor do antigénio quimérico das células T) e as células T modificadas, que são muito promissoras e recentes em Hematologia. A abordagem terapêutica do doente idoso é outro tópico sobre o qual é cada vez mais premente falarmos, dado que pelo menos metade dos nossos doentes são considerados idosos. Cada vez mais, precisamos de ajustar a terapêutica a estes doentes e não integrá-los nos protocolos que estamos a usar.»
Dr.ª Joana Azevedo
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Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra Reunião Anual da SPH é um dos momentos em que os diferentes Serviços de Hematologia do país se reúnem para uma análise e partilha daquilo que de melhor e mais interessante se realizou ao longo do ano. Vivemos tempos particularmente entusiasmantes e desafiantes nesta área a nível mundial. Esta disciplina sempre primou pelo estímulo e acompanhamento dos avanços laboratoriais e da sua aplicação à clínica, numa sinergia de interação mútua. Reflexo disso mesmo são, por exemplo, o modo como os avanços tecnológicos delineiam hoje a caracterização e a classificação das doenças hematológicas, mas também o constante contributo que trazem à nossa compreensão destas patologias e sua melhor definição, assim como as novas terapêuticas que se tornam cada vez mais disponíveis. O Programa Educacional e as Lições deste ano são, parece-me, um reflexo da preocupação, do interesse e da necessidade que todos sentimos de acompanhar esta evolução e de incorporar este “estado da arte” na prática real e clínica da Hematologia. Espero, portanto, que a Reunião deste ano se revele não só o habitual espaço de partilha da realidade dos diferentes centros, de discussão construtiva e enriquecedora, como também uma oportunidade para a reafirmação e o fortalecimento da especialidade em Portugal.»
Dr.ª Joana Caldas
Centro Hospitalar de Lisboa Central/Hospital de Santo António dos Capuchos
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programa desta Reunião Anual da SPH parece-me realmente desafiante e apetecível. As minhas expectativas são elevadas, devido aos diversos temas que vão ser abordados, abrangendo as múltiplas facetas da Hematologia no mundo da patologia “benigna”, desde o glóbulo vermelho e a avaliação das anemias hereditárias, às trombofilias e à hemoglobinúria paroxística noturna. Mas também será abarcada a maior parte da patologia hemato-oncológica, numa perspetiva muito atual, nomeadamente em temas muito importantes, como implicações genéticas, estratificações de risco e terapêutica individualizada na leucemia linfoblástica aguda (LLA), na leucemia linfocítica crónica (LLC) e no mieloma múltiplo (MM), entre outras patologias. Globalmente, julgo que esta Reunião poderá contribuir com informação inovadora em diversos domínios da Hematologia, nomeadamente em áreas que nos são muito “queridas” e “primas”, como a imunologia, permitindo um conhecimento mais profundo das diversas patologias e perspetivando assim a abertura de portas para novas terapêuticas. É o caso das células CAR-T em hemato-oncologia (abordadas pela Prof.ª Emma Morris e pelo Dr. Carlos Ramos), e as células T modificadas em leucemia mieloide aguda, entre outras. Este programa parece assim estar desenhado para dar ênfase aos temas mais atuais, como os princípios da imunoterapia no cancro, a atualidade do MM e da LLA Phi-like, o alotransplante ou o linfoma não Hodgkin folicular. Será também apresentado um algoritmo prático de abordagem da LLC na prática clínica portuguesa e serão apresentados dados sobre a pesquisa de marcadores claramente definidores de prognóstico nesta patologia, entre diversos temas. Outro tópico que considero extremamente importante quando falamos de terapêuticas muito caras é a avaliação farmacoeconómica, que todos nós, médicos, temos o dever e a responsabilidade de saber fazer, como “juízes” que somos da melhor relação custo-benefício, que julgo muito importante ser levada em conta. Por outro lado, a possibilidade de partilha de experiências nacionais entre pares contribuirá, com certeza, para uma importante troca de ideias. Num país pequeno como o nosso, esta partilha constitui sempre um desafio para a criação de grupos de trabalho, quer no campo da investigação laboratorial, quer de tratamento, ou quaisquer outros, que julgo serem essenciais para a abordagem uniforme das doenças raras.»
Prof. António Almeida
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Instituto Português de Oncologia de Lisboa ada a sua reduzida dimensão, a Reunião Anual da SPH permite sempre um contacto muito próximo entre os hematologistas portugueses. Creio que, este ano, o programa está muito bem desenhado, com uma boa proporção de hematologistas portugueses e estrangeiros, que revelam conhecimentos profundos. Temos grandes figuras nacionais, como a Prof.ª Maria do Carmo Fonseca, que nos vai falar da medicina de precisão e das novas tecnologias, e também especialistas internacionais, como a Prof.ª Emma Morris e o Dr. Carlos Ramos (português, mas a trabalhar nos EUA), que vão falar sobre as células CAR-T e as células T modificadas, muito em foco hoje em dia, à semelhança dos inibidores de checkpoint, que serão abordados pelo Dr. Fernando Príncipe. As novas terapêuticas vão ter um papel importante nestas sessões, em particular, mas estou certo de que cada orador incidirá nos tratamentos mais recentes para cada patologia. Considero importante a abrangência temática do programa científico. Não vamos falar apenas sobre hemato-oncologia, mas também sobre patologia benigna e coagulação. Tanto discutiremos leucemias agudas, mielomas e linfomas, como drepanocitose e trombofilias. Também espero que dos diversos Serviços saiam trabalhos informativos que nos ajudem a avançar no conhecimento da Hematologia em Portugal, como tem acontecido nos anos anteriores. É fundamental que os hematologistas portugueses tenham espaços onde possam apresentar o seu trabalho num mundo cada vez mais competitivo e onde há uma dificuldade crescente para conseguir apresentar trabalhos nos congressos. Pelo programa abrangente e completo, mas também pela possibilidade de apresentar e discutir trabalhos nacionais, a minha expectativa é de que esta seja uma Reunião muito proveitosa.» NP
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16 de novembro
Formação pluridisciplinar A manhã inaugural da Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia, no dia 16 de novembro, será inteiramente dedicada a cursos dirigidos a internos e especialistas que queiram adquirir ou aprofundar conhecimentos em imunoterapia (Curso I), farmacoeconomia (Curso II) e marcadores positivos de prognóstico na leucemia linfocítica crónica (Curso III). Em baixo, os coordenadores dos cursos abordam os temas essenciais destas ações de formação.
Novas estratégias com a imunoterapia
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s objetivos deste workshop passam por discutir as estratégias que a imunoterapia está a trazer à Hematologia, concretamente ao tratamento das leucemias, do mieloma múltiplo e dos linfomas. Nas últimas décadas, percebemos que os tumores conseguem inativar o sistema imunitário, desencadeando um tipo de travão molecular que impede que os linfócitos destruam as células tumorais. Para contrariar este efeito, foram desenvolvidos anticorpos bloqueadores destes travões, permitindo que o sistema imunitário fique ativo e destrua as células tumorais. Em linfomas como o de Hodgkin ou o do manto, esta estratégia resultou em grandes percentagens de doentes a reagir positivamente e com benefício clínico real. Para as leucemias, em particular as de linfócitos B, foi aprovada, recentemente, a terapia com células CAR-T, que são extraídas do doente, manipuladas geneticamente em laboratório e, posteriormente, injetadas no doente para alvejar as células leucémicas. O mesmo se passa com o mieloma múltiplo, embora com um nível de sucesso mais discreto.» Prof. Bruno Silva-Santos, investigador no Instituto de Medicina Molecular de Lisboa e co-organizador do Curso I (entre as 9h30 e as 12h30, na Sala Gemini 2)
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Otimizar custos em saúde
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farmacoeconomia é uma área científica que visa ajudar nas tomadas de decisão na área da saúde. O objetivo não é condicionar opções, mas sim dar um conjunto de alternativas para que o decisor tenha mais um ponto de vista para fundamentar decisões. O primeiro aspeto que os formandos vão aprender é que a “meta” da farmacoeconomia não é o custo mais baixo, mas sim a melhor utilização possível dos meios financeiros disponíveis para investir. Trata-se de uma área multidisciplinar, em que os médicos nos dizem quais são os resultados que devemos valorizar no tratamento. A partir daí, o economista orienta-se para a avaliação do custo de proporcionar essa solução aos doentes, e isso engloba a disponibilização do medicamento e a gestão de efeitos secundários e de outras comorbilidades que o doente possa ter. Qualquer medicamento tem, pelo menos, um relatório de farmacoeconomia associado. Como este curso promovido pela companhia farmacêutica Takeda é introdutório, o ideal será que, após a sua conclusão, os formandos consigam ler e interpretar os gráficos, os conceitos e as técnicas utilizadas nesses relatórios.» Prof. Francisco Nuno Rocha Gonçalves, membro do Conselho de Administração do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto e coordenador do Curso II (entre as 9h30 e as 13h00, na Sala Vega)
DR
Peso dos indicadores genéticos no tratamento da LLC
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niciativa da Gilead, este curso destina-se, sobretudo, a jovens hematologistas ou internos e pretende divulgar, de forma mais aprofundada, a importância dos indicadores genéticos no tratamento da leucemia linfocítica crónica (LLC). Hoje, a Hematologia e a Oncologia baseiam-se um pouco na procura de marcadores, muitas vezes genéticos, para selecionar o fármaco com maior possibilidade de ter sucesso em determinado doente. Nesse sentido, organizámos um curso ministrado por profissionais que, no laboratório, executam as diferentes técnicas para detetar as alterações genéticas desta doença e, assim, dar a conhecer as suas limitações e a importância dos resultados. Teremos, por exemplo, o contributo da Dr.ª Susana Lisboa, do IPO do Porto, que nos vai falar de como e quando pesquisar a deleção do cromossoma 17p. Outra intervenção, que foca um dos pontos mais interessantes da atualidade, será conduzida pela Dr.ª Maria Luís Amorim, do Centro Hospitalar de São João, no Porto, a respeito da pesquisa de mutações no gene p53, que nos ajudam a identificar doentes de alto risco e que necessitam de tratamento diferenciado. Teremos também uma convidada estrangeira, a Dr.ª Blanca Espinet, do Hospital del Mar, em Barcelona, que irá versar sobre o cariótipo convencional, uma técnica antiga que muitas vezes é difícil de realizar na LLC, porque as células se dividem de forma muito lenta no laboratório.» Dr. José Mário Mariz, diretor do Serviço de Onco-Hematologia do IPO do Porto e coordenador do Curso III (entre as 9h30 e as 12h30, na sala Aquarius) NP
Inovação no tratamento do linfoma folicular com obinutuzumab
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obinutuzumab representa uma nova arma para o tratamento do linfoma folicular (LF) e vai estar no centro do debate no simpósio-satélite organizado pela Roche, entre as 16h10 e as 17h10, na Sala Gemini 1. Os resultados do estudo GADOLIN1 estarão em destaque nesta sessão moderada pelo Dr. José Mário Mariz, diretor do Serviço de Onco-Hematologia do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto. A oradora é a Prof.ª Maria Gomes da Silva, diretora do Serviço de Hematologia do IPO de Lisboa, que fará uma contextualização sobre o tratamento atual do LF, evidenciando o papel do obinutuzumab. Segundo avança o moderador, o estudo GADOLIN, que foi o primeiro ensaio clínico de fase III a testar o obinutuzumab em doentes com LF indolente CD20+ refratários a rituximab, apresentou «resultados bastante interessantes». «A taxa de resposta ao obinutuzumab foi bastante positiva e, sobretudo, registou-se um aumento do tempo até progressão da doença». Até há pouco tempo, o tratamento do LF baseava-se em vários
esquemas de quimioterapia, quase sempre associados ao rituximab. «A partir do momento em que o doente deixava de responder a essa associação, passava-se para outros fármacos, nomeadamente a bendamustina e, mais recentemente, o idelalisib. Agora, temos duas alternativas diferentes das que dispúnhamos para tratar o LF resistente ao rituximab», afirma o hematologista. Nos doentes mais jovens, por exemplo, «o obinutuzumab poderá controlar o LF, permitindo que depois se avance para um transplante de medula óssea autólogo ou alogénico». Na opinião de José Mário Mariz, o aumento do tempo até progressão da doença é a maior vantagem apresentada pelo obinutuzumab e «parece ser superior ao verificado com o idelalisib, embora as duas terapêuticas não tenham sido comparadas diretamente». Outra mais-valia deste anticorpo monoclonal humanizado anti-CD20 «é o facto de a maioria dos hematologistas já o terem experienciado no contexto da leucemia linfocítica crónica, o que facilita a sua utilização com segurança». NP Luís Garcia
1 Sehn LH et al. Obinutuzumab plus bendamustine versus bendamustine monotherapy in patients with rituximab-refractory indolent non-Hodgkin lymphoma (GADOLIN): a randomised, controlled, open-label, multicentre, phase 3 trial. Lancet Oncol. 2016;17(8):1081-1093.
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publicidade Novembro 2017
17 de novembro Programa Educacional – Hemato-oncologia
Particularidades da LLA Phi-like
Entre as 9h00 e as 9h30, a Dr.ª Joana Caldas, hematologista no Centro Hospitalar de Lisboa Central/ /Hospital de Santo António dos Capuchos, irá abordar as particularidades da leucemia linfoblástica aguda Philadelphia-like (LLA Phi-like), no âmbito do Programa Educacional dedicado à hemato-oncologia. por Sandra Diogo
Fator de mau prognóstico
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pesar de ser uma história de sucesso no campo da Oncologia pediátrica, a LLA é a neoplasia mais comum na infância, permanecendo a principal causa de morte entre crianças e jovens adultos», refere a Dr.ª Joana Caldas. Com base neste cenário, a oradora começará por realçar os avanços alcançados nesta área na última década, nomeadamente a análise por sequenciação (next generation sequencing) de todo o genoma por várias técnicas, como a de fosfoflow de grandes coortes com LLA, que permitiu aprofundar o conhecimento da base genética da patologia, revolucionando a anterior estratificação em grupos de risco e introduzindo novas variáveis de prognóstico. «Estes estudos identificaram
novos subtipos da doença, cada um caracterizado por constelações de alterações estruturais e de sequência, que perturbam vias celulares-chave, incluindo o desenvolvimento linfoide, a regulação do ciclo celular, a supressão de tumor, o recetor das citocinas e cinases, a sinalização Ras e as modificações da cromatina (alterações epigenéticas)», salienta a hematologista. É neste contexto que se insere a identificação de um subtipo particular de LLA B de alto risco, a LLA Phi-like, em crianças, adolescentes e jovens adultos. Este subtipo caracteriza-se por ter um perfil de expressão de genes idêntico ao observado na LLA Phi positiva (ou BCR-ABL1 positiva), mas sem a presença subjacente do produto de fusão BCR-ABL1.
Prevalência desconhecida em Portugal
Segundo Joana Caldas, a LLA Phi-like é caracterizada por uma miríade de alterações genéticas que ativam genes recetores de citocinas e vias de sinalização de cinases da tirosina envolvidas na proliferação, na maturação linfoide B, na supressão do crescimento celular e na regulação epigenética. De acordo com a especialista, os doentes com LLA Phi-like exibem quase sempre características clínicas associadas a mau prognóstico: «Estes doentes apresentam, geralmente, contagem de leucócitos inicial superior a 100 000/uL ao diagnóstico e elevada doença mínima residual no fim da indução, bem como maior falência na indução, comparativamente aos doentes com LLA não Phi-like», confirma. No que diz respeito ao tratamento, Joana Caldas realça que, embora mais frequente do que a LLA Phi positiva, a heterogeneidade genética deste subtipo da patologia representa um fator limitante ao desenvolvimento de estudos controlados e aleatorizados bem desenhados e estatisticamente significativos no estabelecimento da verdadeira eficácia para cada pequeno subgrupo. Ainda assim, «dada a alta prevalência de lesões ativadoras de cinases alvejáveis em doentes com LLA Phi-like, há provas convincentes de observação em modelos clínicos e experimentais para o uso de importantes combinações de quimioterapia com inibidores da tirosina-cinase». Ou seja, na opinião da palestrante, «a LLA Phi-like ilustra o novo paradigma de como descobertas genómicas se podem traduzir em novos caminhos terapêuticos, na era da medicina de precisão, oferecendo novas oportunidades para melhorar os resultados em subgrupos de alto risco de LLA B». NP
Segundo dados do National Cancer Institute, sabe-se que, a nível mundial, a LLA Phi-like afeta 15% das crianças com LLA de alto risco, tendo tendência a aumentar com a idade, atingindo cerca de 21% dos adolescentes e 27% dos adultos jovens com LLA B. «É quase três vezes mais comum do que a LLA B Phi positiva e, em contraste com o aumento logarítmico da incidência desta última, parece ter um pico nos adolescentes e adultos jovens (até 45 anos), para diminuir a menos de 10% em pessoas com idades entre 40 e 85 anos», informa Joana Caldas. Ainda que esta baixa prevalência na faixa etária mais avançada tenha sido alvo de controvérsia nos estudos de perfil genómico, a hematologista explica que um estudo multicêntrico recente com quase 800 doentes confirmou uma frequência mais alta (27%) do que se pensava. Além disso, acrescenta a oradora, «este subtipo de leucemia parece ter uma predileção pelos indivíduos de ascendência hispânica, o que pode ser parcialmente explicado pela alta associação dos rearranjos CRLF2, em particular com este grupo étnico». Dado que ainda não existem estudos suficientes que permitam avaliar a incidência da LLA Phi-like em Portugal, Joana Caldas lança o desafio para que esse trabalho seja iniciado, «nomeadamente em estudos de colaboração entre os Serviços que tratam as leucemias agudas».
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17 de novembro Programa Educacional – Hemato-oncologia
Implicações terapêuticas dos subtipos biológicos de LNH DGCB A identificação do subtipo de linfoma não Hodgkin difuso de grandes células B (LNH DGCB) é um passo importante para a definição da estratégia terapêutica, mas faltam melhores técnicas para fazer uma subclassificação mais fiável que possibilite um tratamento mais focado na alteração genética em causa. Esta é uma das ideias centrais que o Dr. José Mário Mariz, diretor do Serviço de Onco-Hematologia do Instituto Português de Oncologia do Porto, defenderá na palestra que vai decorrer entre as 9h30 e as 10h00. por Luís Garcia que uma terapêutica standard, como aquela que usamos, pudesse curar todos os doentes, mas, infelizmente, não o conseguimos», admite. Embora o prognóstico dependa do subtipo histológico e do estadiamento, a taxa de cura do LNH DGCB centro-germinativo ronda os 60% e do não centro-germinativo os 40%.
«Existem vários fármacos novos que são mais específicos, as chamadas terapêuticas-alvo, porque atuam nas grandes células dos doentes com determinada alteração genética»
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LN DGCB é a neoplasia hematológica mais frequente a nível mundial. Os sintomas mais comuns são o aparecimento de gânglios no pescoço, axilas ou virilhas, podendo existir sintomas mais sistémicos não específicos, como febre, falta de apetite, perda de peso ou sudorese noturna. De acordo com o Dr. José Mário Mariz, «o único meio de diagnóstico disponível é a biópsia histológica do local afetado», podendo também ser usada a tomografia axial computorizada (TAC) ou a tomografia por emissão de positrões (PET) para fazer o estadiamento da doença. O atingimento de muitas áreas ganglionares ou de outros órgãos é indicador de maior risco, existindo também marcadores no sangue, como a desidrogenase lática, que, estando aumentada, é um marcador de pior prognóstico. Segundo o hematologista, um dos desafios colocados por esta patologia é o facto de ser extremamente heterogénea. «Ainda nos falta conhecer muito sobre a biologia do LNH DGCB, mas sabemos que, na realidade, são várias doenças. A identificação destes diferentes subtipos moleculares é complexa e ainda não está disponível para ser utilizada no dia a dia», refere. No futuro, José Mário Mariz gostaria de assistir a um acesso mais generalizado à tecnologia que permite identificar melhor os subtipos moleculares, com vista à seleção de um tratamento específico consoante
a alteração molecular de cada doente. «O futuro passará, seguramente, por um tratamento mais individualizado. Só não sei quando vai acontecer», avança. Existem dois principais subtipos de LNH DGCB (ver caixa). «No dia a dia, tentamos chegar a esta subclassificação, mas, na maioria dos centros, a técnica utilizada não é muito fiável e não permite ter 100% de certeza de que o doente tenha um subtipo ou outro. Precisamos de evoluir para uma técnica que dê outras garantias de identificação dos subtipos», sublinha o orador.
Evolução do tratamento Segundo José Mário Mariz, o tratamento standard do LNH DGCB passa pela associação de um anticorpo monoclonal, o rituximab, com quimioterapia convencional, ou seja, um esquema R-CHOP (rituximab, ciclofosfamida, doxorrubicina, vincristina e prednisolona). «Tratando-se de uma doença tão heterogénea, seria muito difícil esperar
De acordo com este hematologista, «existem vários fármacos novos, já utilizados no tratamento de outras patologias, que são mais específicos, as chamadas terapêuticas-alvo, porque atuam nas células dos doentes com determinada alteração genética». O futuro deverá passar pela medicina de precisão, ou seja, pela utilização de um fármaco para bloquear especificamente uma mutação previamente identificada, com ganhos para o doente em termos de prognóstico. Na sua palestra, José Mário Mariz chamará ainda a atenção para a necessidade de procurar ferramentas capazes de ajudar a identificar, com maior detalhe, a patologia de cada doente. «Em função disso, tentaremos utilizar, de forma mais racional, fármacos que terão seguramente um papel importante, mas que também são bastante dispendiosos. Vai ser muito interessante utilizá-los naqueles doentes em que já existe uma grande probabilidade de que sejam eficazes», conclui o orador. NP
Principais subtipos de LNH DGCB
•C entro-germinativo: mais frequente e com melhor prognóstico; •N ão centro-germinativo: menos frequente e com pior prognóstico, também chamado de linfoma difuso de grandes células B ativadas ou tipo ABC.
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17 de novembro Programa Educacional – Doenças hematológicas benignas
Da fisiopatologia ao tratamento da HPN
Na primeira intervenção da sessão educacional dedicada às doenças hematológicas benignas, entre as 11h30 e as 12h00, o Prof. António Almeida apresentará a caracterização da hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), desde a biologia até à terapêutica.
E
por Luís Garcia
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mbora a incidência da HPN seja de 1 a 2 casos por milhão de habitantes, estimase que o clone HPN exista em cerca de 5 a 10 pessoas por milhão. Este clone é uma alteração genética adquirida e caracterizada por uma população de células com deficiência numa âncora da membrana, o que aumenta a suscetibilidade das células à destruição por complemento. Segundo o Prof. António Almeida, hematologista no Instituto Português de Oncologia de Lisboa, estes clones surgem, «predominantemente, no contexto da anemia aplásica, em que há uma reação das células T contra as células estaminais na medula, mas também pode surgir no contexto das mielodisplasias». Embora a mutação no gene PIG-A do cromossoma X possa ocorrer na população em geral, os clones HPN apenas vingam num contexto de doença hematológica e ataque imunitário à medula. «Nos últimos anos, têm sido dissecadas as causas moleculares e as mutações do gene PIG-A no âmbito do ataque autoimune que permite a estes clones sobreviver. Também se têm percebido melhor o papel do complemento na HPN e a forma como o bloqueio do complemento permite reverter algumas das características clínicas da doença», afirma António Almeida.
Diagnóstico e complicações O teste-padrão para o diagnóstico da HPN é a citometria de fluxo, que permite identificar as células deficientes e quantificar a proporção de células afetadas, devendo ser realizado em todos os doentes com suspeita desta hemoglobinúria (ver caixa abaixo). De acordo com António Almeida, o diagnóstico é precisamente um dos maiores desafios, uma vez que, «como todas as doenças raras, a HPN requer que se esteja alerta para a sua existência e se peça o teste de diagnóstico específico». As principais complicações da HPN são a hemólise e os fenómenos trombóticos, uma vez
«O diagnóstico é um dos maiores desafios da HPN, porque requer que se esteja alerta para a sua existência e se peça o teste de diagnóstico específico (citometria de fluxo)» que «o ataque do complemento aos glóbulos vermelhos e às plaquetas dispõe de substâncias trombogénicas, levando, portanto, a um aumento de tromboses que podem ser fatais». No entanto, frisa António Almeida, a hemólise persistente também origina outros problemas, como a depleção
Quando suspeitar de HPN?
•A nemia hemolítica sem evidência de ser autoimune; •A plasia medular; •M ielodisplasia de baixo risco com evidência de hemólise; •D esidrogenase láctica (LDH) persistentemente elevada sem outras causas identificadas;
• S intomas constitucionais típicos de HPN (espasmos musculares, disfunção erétil,
insuficiência renal) associados a dados laboratoriais como LDH elevada e hemólise.
de óxido nítrico, que leva à vasoconstrição e a espasmos musculares (sobretudo de músculo liso), a problemas pulmonares (em especial hipertensão pulmonar), disfunção erétil e fadiga crónica. Já a deposição de hemoglobina nos rins pode causar insuficiência renal.
Avanços no tratamento Até há cerca de uma década, o tratamento da HPN disponível era essencialmente de suporte: anticoagulação e transfusões nos doentes com anemia sintomática. Os indivíduos com evidência de doença mais grave, sobretudo aqueles que apresentavam fenómenos trombóticos, eram – e continuam a ser, em alguns casos – candidatos a transplante de medula. No entanto, existe hoje um anticorpo monoclonal que trava a destruição dos glóbulos vermelhos pelo complemento. «Este medicamento, o eculizumab, tem grande sucesso não só na redução da anemia e da dependência transfusional, mas também na diminuição das complicações trombóticas, renais e pulmonares, e até no aumento da sobrevivência dos doentes com HPN», refere António Almeida, acrescentando que este fármaco se tornou a terapêutica-padrão para casos de HPN com gravidade clínica em quase todos os países europeus. Apresentando «resultados excelentes», o eculizumab constitui «um tratamento curativo e vitalício». No entanto, «o problema principal é o custo muito elevado, que dificulta o acesso a este fármaco em muitos países, incluindo o nosso». NP
Desafios do tratamento da drepanocitose A mais grave das síndromes falciformes e a mais comum das patologias monogénicas a nível mundial, a drepanocitose, será o tema da palestra que decorre entre as 12h00 e as 12h30, inserida na Sessão Educacional de doenças hematológicas benignas. Vão estar em destaque as razões que dificultam a previsão da gravidade e da evolução clínica desta doença, o que faz com que a abordagem terapêutica seja um desafio muito particular. por Rui Alexandre Coelho
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entrada na vertente terapêutica, a intervenção será conduzida pela Dr.ª Anabela Morais, coordenadora da Unidade de Hematologia Pediátrica do Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria (CHLN/HSM), que encontra na sua especialidade (Pediatria) a origem dos «enormes avanços verificados na sobrevivência» a esta patologia ao longo dos últimos anos. Também conhecida por anemia de células falciformes (homozigotia SS), a drepanocitose atinge vários órgãos e sistemas de forma progressiva, irreversível e precoce. Deve ser abordada pelos pediatras numa perspetiva de «otimização da abordagem terapêutica modificadora da sua história natural, para que o doente chegue à idade adulta com menos lesão crónica de órgão», refere Anabela Morais. A terapêutica da drepanocitose divide-se em dois grandes grupos e, segundo esta preletora, os avanços têm ocorrido sobretudo no grupo terapêutico de suporte. Para tal, a comunidade pe-
diátrica tem apostado numa estratégia que passa por ações como «o rastreio neonatal universal; a implementação da profilaxia da infeção (que deixou de ser a principal causa de morte nestes doentes); o desenvolvimento e a generalização de protocolos específicos sempre que uma criança tem febre; e o reconhecimento e tratamento precoce de duas complicações agudas que passaram a ser as principais causas de morte nestes doentes: a síndrome torácica aguda e o acidente vascular cerebral [AVC]», explica Anabela Morais.
Utilização precoce da hidroxicarbamida O segundo grupo terapêutico é aquele que interfere e altera a evolução natural da drepanocitose, com eficácia a longo prazo. Neste ponto, a pediatra no CHLN/HSM identifica três grandes estratégias: o regime transfusional regular, a hidroxicarbamida e o transplante de células progenitoras hematopoiéticas.
Depranocitose «desconstruída»
•É uma doença autossómica recessiva e caracteriza-se pela presença de uma hemoglobina anormal, que é a hemoglobina S;
•É a mais grave das síndromes falciformes e tem uma expressão fenotípica muito variável;
•E ntre os vários fatores determinantes da gravidade clínica, a concentração de hemoglobina F é aquele que tem maior valor prognóstico;
•A VC e síndrome torácica são as suas complicações agudas mais frequentes; •C erca de 94% das crianças e adolescentes com esta doença atingem a idade adulta; •A pesar de todos os avanços na terapêutica, comparativamente à população em geral, a depranocitose provoca uma redução da esperança média de vida em cerca de 30 anos; •E m julho de 2017, a FDA aprovou a utilização da L-gulatimina para o tratamento da dor nestes doentes.
Em relação às transfusões, Anabela Morais sublinha que têm sido a terapêutica mais utilizada na história da drepanocitose. No entanto, «não são uma opção ideal a longo prazo, tanto pelos riscos inerentes como por não prevenirem totalmente a progressão da doença crónica». Agente citotóxico e mielossupressor, a hidroxicarbamida foi, até recentemente (ver caixa), o único fármaco modificador da doença aprovado. A sua utilização no adulto está autorizada pela Food and Drug Administration e a European Medicines Agency aprovou-o para adultos e crianças com idade superior a 2 anos, como medicamento órfão. Contudo, resultados de ensaios clínicos suscitaram a inclusão da hidroxicarbamida em guidelines internacionais, que recomendam a sua utilização off-label mais precoce, em concreto para doentes acima de 9 meses de idade, independentemente da gravidade clínica. Segundo Anabela Morais, «este fármaco é bem tolerado, mas tem alguns efeitos secundários, nomeadamente infertilidade, embora esta situação seja reversível, na maioria dos casos». Finalmente, e apesar de estar limitada a um número relativamente pequeno de doentes – apenas entre 10 a 20% dos doentes com drepanocitose têm um irmão totalmente HLA (antígeno leucocitário humano) compatível –, a transplantação alogénica de células progenitoras é a única terapêutica curativa conhecida. Entre as suas vantagens, realce para «a estabilização da doença e a melhoria da função pulmonar, neurológica e do próprio crescimento da criança», frisa Anabela Morais. Os estudos indicam que a taxa global de sobrevivência livre de doença após o transplante de células progenitoras hematopoiéticas de um irmão HLA compatível é de cerca de 90%. Mas há complicações expectáveis a longo prazo, sobretudo a infertilidade. NP Novembro 2017
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17 de novembro Programa Educacional – Doenças hematológicas benignas
Investigar a trombofilia? Sim, mas quando influncia o outcome clínico Depois de anos de entusiasmo com os estudos da trombofilia, cada vez mais se levantam questões sobre a sua utilidade e indicação. Este aspeto, a par da explicação dos tipos de trombofilia e de outros fatores de risco para a trombose, virá «a lume» entre as 12h30 e as 13h00, na palestra da Dr.ª Sara Morais. por Rui Alexandre Coelho
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generalização dos estudos da trombofilia teve origem nos anos de 1990, após a descrição de dois polimorfismos genéticos muito comuns na população caucasiana (FVLeiden e FII20210). Passou-se, então, a incluir no estudo da trombofilia a avaliação da trombose arterial e da morbilidade obstétrica, ao mesmo tempo que se investiu na procura generalizada de predisposições genéticas para a trombose, através de estudos populacionais alargados. Estes estudos permitiram detetar «um grande número de fatores de risco fracos para trombose venosa, mas de utilidade clínica nula e, portanto, sem recomendação para sua avaliação», como afirma a Dr.ª Sara Morais, responsável pela área de Trombose e Hemóstase no Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar Universitário do Porto/ /Hospital de Santo António (CHUP/HSA). Com a associação entre trombofilia e trombose arterial ou morbilidade obstétrica a ser contestada, o termo «trombofilia» volta a referir-se apenas à trombose venosa. Os objetivos do estudo da trombofilia passam pela avaliação do risco de recorrência de tromboembolismo venoso (TEV) após a suspensão da terapêutica anticoagulante em doentes com trombose prévia, ou pela avaliação do risco de um primeiro episódio de TEV em indivíduos
assintomáticos, mas com história familiar positiva de trombose venosa. «Esta avaliação só deve ser feita se permitir decidir sobre o tratamento anticoagulante, pois, cada vez mais, pensa-se que a decisão de efetuar estudos da trombofilia deve depender da probabilidade de os seus resultados influenciarem as decisões terapêuticas», observa a hematologista no CHUP/HSA. No entanto, até ao momento, essa influência «ainda não foi convincentemente demonstrada», salvo em raros casos. Segundo Sara Morais, «a doença tromboembólica venosa é uma doença que envolve a interação
de múltiplos fatores de risco que, de modo individual, têm relativamente pouco efeito, mas, quando combinados, aumentam consideravelmente o risco de trombose». Pode manifestar-se por trombose venosa profunda ou embolia pulmonar e é um problema muito comum, mantendo-se como uma importante causa de morbilidade e mortalidade no mundo ocidental. Segundo Sara Morais, configuram trombofilia «todas as alterações da coagulação que se associam a tendência para desenvolver TEV, sendo que estas alterações podem ser congénitas, adquiridas ou mistas». Nas trombofilias congénitas, apenas seis alterações associam-se, inequivocamente, a trombose venosa: deficiências de antitrombina (AT); de proteína C (PC); de proteína S (PS); de fator V Leiden; de protrombina 20210 e de disfibrinogenemia. No seu conjunto, as deficiências de AT, PC e PS são muito raras, mas podem levar a um fenótipo altamente penetrante, com aumento do risco de trombose superior a dez vezes para os portadores heterozigóticos. «O FV Leiden é o fator de risco herdado mais comum para TEV e estima-se que contribua para cerca de 25% das tromboses atribuídas a causas genéticas», acrescenta a hematologista. A trombofilia não é doença per se, mas sim uma suscetibilidade para doença, não implicando a necessidade absoluta de tratamento. «A grande maioria dos doentes não desenvolve trombose. Assim, a trombofilia deve ser considerada no contexto dos outros fatores de risco para trombose, ou como preditora de recorrência de trombose», conclui Sara Morais NP
Tromboembolismo venoso em números •1 a 2 eventos trombóticos por ano em cada 1
000 pessoas fazem do tromboembolismo venoso (TEV) a doença vascular mais comum, logo a seguir à doença arterial coronária e cerebrovascular. Esta incidência é dependente da idade, com predomínio nos grupos etários mais avançados (aos 75 anos é de cerca de 1%);
•A prevalência da trombofilia congénita na população caucasiana com TEV prévio varia entre 24% e 37%;
•5 % é a prevalência de portadores do fator V Leiden nas populações de origem
europeia, o que se configura como o fator de risco herdado mais comum. No entanto, menos de 5% dos portadores desenvolvem trombose ao longo da vida;
•A pós suspensão do tratamento anticoagulante, o risco de recorrência da trombose venosa aos 10 anos é de cerca de 40%.
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18 de novembro Programa Educacional – Novas terapêuticas celulares
O «novo mundo» da imunoterapia
O aprofundar do conhecimento das células e da resposta imunológica permitiu o desenvolvimento de anticorpos monoclonais específicos para certos determinantes antigénicos das células tumorais. Essa porta – a dos inibidores dos checkpoints imunitários – já foi aberta a várias especialidades médicas e começa a ter aplicação prática também na hemato-oncologia, como explicará o Dr. Fernando Príncipe na sua palestra, entre as 9h00 e as 9h30. por Rui Alexandre Coelho No caso do linfoma primário do mediastino, que tem semelhanças com o linfoma de Hodgkin, partilhando a alteração genética do cromossoma 9p24, que tem a expressão do PD-1, foram demonstrados «resultados animadores» com os inibidores dos checkpoints imunitários, sublinha Fernando Príncipe. O mesmo se verificou em outros linfomas de «privilégio imunológico», como os linfomas primários do sistema nervoso central ou do testículo.
Principais desafios
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O
último dos citostáticos a ser aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) para o linfoma de Hodgkin, em 1977, foi a carmustina. O uso clínico de anticorpos monoclonais chegou apenas em 2011 com o anticorpo conjugado CD30 (brentuximab vedotina), para o linfoma de Hodgkin refratário/em recaída. Recentemente, surgiram novos anticorpos dirigidos ao eixo PD-1-PDL-1/PD-L2. O primeiro, aprovado em 2016, foi o nivolumab, ao qual se seguiu, já em 2017, o pembrolizumab.
«É ainda cedo para grandes reflexões, mas os resultados clínicos dos inibidores dos checkpoints imunitários nos doentes com linfoma de Hodgkin em recaída/refratário são de um entusiasmo crescente, com aumento da sobrevida livre de doença»
Na opinião do Dr. Fernando Príncipe, hematologista no Centro Hospitalar de São João, no Porto, «é ainda cedo para grandes reflexões, mas os resultados clínicos dos inibidores dos checkpoints imunitários nos doentes com linfoma de Hodgkin em recaída/refratários são de um entusiasmo crescente». Na sua palestra, serão apresentados alguns destes dados e será feita uma reflexão sobre o seu uso em determinadas situações clínicas. Segundo o orador, «é evidente o aumento da sobrevida livre de doença e a ponte que pode ser feita para decisões posteriores, como a alotransplantação». Os inibidores dos checkpoints imunitários já constituem uma opção para o tratamento de linfomas Hodgkin em recaída/refratários em Portugal, onde são comercializados com «uma boa relação custo-benefício». O nivolumab está indicado para o tratamento de doentes adultos com linfoma Hodgkin clássico refratário ou recidivado, após transplante autólogo de progenitores hematopoiéticos e para o tratamento de associação com o brentuximab vedotina. Já o pembrolizumab em monoterapia está indicado para doentes adultos com linfoma de Hodgkin clássico refratário ou recidivado, em quem o transplante autológo de células estaminais falhou, tal como para o tratamento de associação com o brentuximab vedotina, ou que não são elegíveis para transplante e deixaram de responder ao brentuximab vedotina.
A introdução de uma nova classe terapêutica implica enfrentar desafios novos na prática clínica, tanto na seleção dos doentes como das terapêuticas para as diferentes fases da doença. Segundo Fernando Príncipe, o maior desafio passa pelas opções terapêuticas em sequência. «Utilizamos os fármacos em função da aprovação e das indicações da European Medicines Agency, da Food and Drug Administration e da prática clínica que começa a ser definida», refere o hematologista.
«Da mesma maneira que estamos a alterar a imunologia de uma célula T que vai responder a uma célula tumoral, também estamos a alterar a imunologia natural pelo efeito do anticorpo monoclonal nestes locais de checkpoint» «Contudo, os maiores desafios têm a ver com a aplicação correta e a sequência certa da sua utilização, bem como a avaliação dos novos efeitos secundários imunológicos destes anticorpos, se possível sempre em ensaios clínicos», sublinha Fernando Príncipe. E acrescenta: «Da mesma maneira que estamos a alterar a imunologia de uma célula T que vai responder a uma célula tumoral, também estamos a alterar a imunologia natural pelo efeito do anticorpo monoclonal nestes locais de checkpoint.» NP
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18 de novembro
Que peso têm na oncogénese o ambiente, a hereditariedade e a genética? O primeiro ponto que é importante esclarecermos é que, na origem do cancro, não existe só ambiente versus hereditariedade. Há um terceiro componente que, já sabemos, é também uma causa muito importante – os erros que ocorrem espontaneamente durante as divisões das células estaminais. Cada vez que uma célula estaminal se divide, ocorrem, em média, três mutações que originam um acumular de mutações. A partir daqui, é uma questão de sorte ou azar, porque as mutações podem acontecer em genes que são inócuos do ponto de vista da oncogénese, mas também podem acontecer em genes que, uma vez mutados, vão estimular a proliferação ou inibir a diferenciação, sendo desencadeadores da oncogénese. Têm surgido vários estudos a sustentar esta evidência. O mais famoso vem do grupo liderado por um grande investigador da oncobiologia, o Dr. Bert Vogelstein. Esse trabalho, publicado este ano na revista Science, chama claramente a atenção para o papel inevitável das mutações espontâneas que vão acontecendo nas células estaminais na origem do cancro.
«Na origem do cancro, não existe só ambiente versus hereditariedade. Uma terceira causa muito importante são os erros que ocorrem espontaneamente durante as divisões das células estaminais»
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«A medicina de precisão veio dar muito mais importância aos testes genéticos» «Medicina de Precisão em Oncologia: desafios futuros» é o tema que a Prof.ª Maria do Carmo Fonseca, presidente do Instituto de Medicina Molecular da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL), vai desenvolver na Lição Ducla Soares, entre as 12h00 e as 13h00. Nesta entrevista, a também professora catedrática da FMUL traça o enquadramento científico desta variante da medicina personalizada que já se instalou na prática clínica, sobretudo em Oncologia, e aborda a influência das células estaminais na oncogénese e as promessas da imunoterapia, que considera «o grande game-changer» do tratamento das patologias oncológicas. por Luís Garcia e Rui Alexandre Coelho
Mas é uma hipótese ou uma certeza que as mutações espontâneas nas células estaminais desencadeiam cancro? Ainda é uma hipótese, mas bastante consensual. As células estaminais são as que têm a capacidade de se dividir e dar origem a novas populações de células. Se as mutações ocorrerem em células que já estão pré-determinadas para se diferenciarem, provavelmente, as mutações não terão tanto impacto e não conseguem originar cancro.
Isso quer dizer também que as células estaminais têm um papel no tratamento das neoplasias? Têm um papel relevante, porque, se os tratamentos não conseguirem destruir as células estaminais que foram alvo de mutação, abre-se a porta para a recidiva. Muitos tratamentos eliminam as células que estão em divisão: não as estaminais, mas as que delas derivam. A partir daí, consegue-se obter uma redução drástica da massa tumoral. Porém, se não se destruírem as
células estaminais, estas vão voltar a dividir-se, aos poucos, e o tumor voltará a recidivar.
Na sua conferência da Reunião da SPH vai falar sobre a medicina de precisão. Como e quando apareceu essa designação? Surgiu em 2015, nos EUA, e está associada a uma estratégia dos National Institutes of Health [NIH]. Cada diretor novo tem a missão de escolher uma prioridade e o atual é o Dr. Francis Collins, que liderou o Projeto Genoma Humano. Enquanto médico geneticista, ele tem, como eu, uma visão da vida muito centrada nos genes, pois entende que são eles os grandes determinantes da função celular. Ao assumir a direção dos NIH, o Dr. Francis Collins deu, naturalmente, uma grande importância aos perfis genéticos e moleculares das doenças. Em consequência, a medicina de precisão passou a ser uma prioridade nos EUA, onde tem muito impacto para o desenvolvimento científico na área da Saúde, mas com influência mundial.
Qual a diferença entre medicina de precisão e medicina personalizada? A medicina personalizada centra-se na pessoa, ao passo que a medicina de precisão tem por objetivo escolher terapêuticas que serão direcionadas a um alvo molecular específico. Por exemplo, quando «atiramos uma seta», que é o tratamento, o centro do alvo é uma molécula que, por trás de si, tem uma informação genética. Portanto, a medicina de precisão centra-se nas moléculas, não tanto nas pessoas. Mas, obviamente, cada pessoa tem as suas próprias moléculas alteradas, pelo que podemos considerar que a medicina de precisão é uma vertente da medicina personalizada que se centra mais nas moléculas.
«A medicina de precisão tem por objetivo escolher terapêuticas direcionadas a um alvo molecular específico. É uma vertente da medicina personalizada que se centra mais nas moléculas» Na prática clínica, o que muda com a medicina de precisão? Há um foco muito maior nas análises moleculares versus as análises de Anatomia Patológica. Neste momento, praticamente todos os tipos de cancro têm de ser caracterizados em termos do seu perfil molecular. Não basta fazer uma caracterização anatomopatológica ou imunocitoquímica; é pre-
ciso realizar testes aos genes e perceber quais as mutações que se encontram em cada cancro. Portanto, a medicina de precisão veio dar muito mais importância aos testes genéticos e moleculares em Oncologia, introduzindo também a procura global, porque a abordagem tradicional era ir à procura de candidatos. Primeiro, procurava-se a mutação mais frequente; se não estivesse presente, passava-se à segunda mais frequente e daí em diante. Perdia-se muito tempo com essa abordagem. Hoje em dia, graças às novas tecnologias de sequenciação de nova geração, conseguimos que o primeiro teste já seja global.
Que obstáculos impedem o amplo recurso aos tratamentos do cancro de nova geração no nosso país? Essencialmente, o custo. Tudo isto implica testes genéticos que são caros e, muitas vezes, é preciso solicitar a aprovação do Infarmed [Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde] para fármacos usados off-label, porque, se um doente tem uma determinada mutação, então é passível de ser tratado com um determinado inibidor, mesmo que não esteja ainda aprovado para tratar aquele tipo de cancro. Essa molécula pode estar aprovada para o tratamento do cancro do pulmão, mas não para o cancro da mama, por exemplo. No entanto, se o tumor da mama tem a mesma mutação-alvo, pode-se pedir a aprovação off-label para administrar a mesma molécula. Obviamente que os inibidores de
«Neste momento, praticamente todos os tipos de cancro têm de ser caracterizados em termos do seu perfil molecular. É preciso realizar testes aos genes e perceber quais as mutações que se encontram em cada cancro» nova geração são muito caros, porque, sendo recentes, ainda se está a suportar os custos do seu desenvolvimento.
Há uma tendência para a medicina de precisão se instaurar e crescer? Sem dúvida e nem será necessário chamar-lhe medicina de precisão, tão natural é a sua abordagem. Praticamente todos os novos medicamentos para o cancro, excetuando a imunoterapia, que é um caso à parte, são baseados em pequenas moléculas, anticorpos e inibidores que têm um alvo molecular. E sabemos que só vão funcionar se esse alvo estiver presente. Assim, a medicina de precisão passa a ser uma abordagem de rotina. NP
Imunoterapia, o grande «game-changer»
O entusiasmo generalizado que a imunoterapia tem suscitado no campo do tratamento oncológico tem fundamento, de acordo com a Prof.ª Maria do Carmo Fonseca. «É na imunoterapia que está o nosso grande game-changer. Finalmente, conseguimos ter tecnologia que nos permite modelar o sistema imunológico do próprio doente para destruir as células cancerosas. Os resultados são extremamente promissores e podem ser revolucionários.» A investigadora e presidente do Instituto de Medicina Molecular olha para esta nova estratégia terapêutica do cancro como um tipo de Medicina completamente personalizada. «Estamos a trabalhar na modificação genética das células T do próprio doente. Por exemplo, num doente com leucemia, retiramos as células T e alteramos o seu património genético para que passem a reconhecer os antigénios do tumor do próprio doente. Assim, a célula T que faz o seu papel normal passa a conseguir reconhecer as células tumorais e a destruí-las com a eficácia do nosso sistema imune, que consegue ser superior aos tais inibidores que temos testado até agora», explica. Claro que é preciso refrear um pouco o entusiasmo. Afinal, foi apenas há um ano que a norte-americana Food and Drug Administration aprovou o primeiro tratamento com células T modificadas exatamente para uma leucemia, a linfoblástica aguda, e daí resultaram problemas de toxicidade que ainda é preciso estudar. Mas, contrapõe Maria do Carmo Fonseca, «também há casos de cura e, portanto, o potencial da imunoterapia é muito grande».
Novembro 2017
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PROGRAMA DE ENFERMAGEM
Multidisciplinaridade para responder melhor às necessidades dos doentes O Programa de Enfermagem da Reunião Anual da SPH 2017 tem como base os desafios com que estes profissionais se deparam no dia a dia para dar resposta às particularidades dos doentes hemato-oncológicos. Ao Notícias Prévias, os membros da Comissão Organizadora (CO), este ano pertencente ao Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria (CHLN/HSM), e alguns membros da Comissão Científica (CC) avançam uma análise sobre os temas que vão estar em discussão nos dias 17 e 18 de novembro.
Enfermeiras Anabela Proença (CC), Cristina Santos (CC), Maria de Lurdes Batoréu (CC), Ortélia Dias (CO), Rosa Romão (CC), Maria Manuel Loios (CO) e Ana Paula Branco (CO) - da esq. para a dta.
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A saúde mental do doente hemato-oncológico (17 de nov., das 8h30 às 9h30)
«O doente oncológico passa por um sofrimento físico inquestionável, mas está também sujeito a um grande sofrimento psicológico, pela carga que a doença acarreta, associada ao medo da morte, ao afastamento da família, à perda de papéis sociais, etc. Nesse sentido, pretendemos analisar algumas ferramentas que nos ajudam a desmistificar e a classificar a ansiedade e a depressão resultantes, assim como falar sobre as alterações cognitivas que surgem muitas vezes nestes doentes, nomeadamente em idosos e pessoas com várias comorbilidades. Os doentes oncológicos exigem particular atenção da nossa parte. Pequenos gestos nossos, como um olhar, um abraço ou um toque, têm grande impacto. Não temos de ser apenas excelentes na técnica, mas também na arte de comunicar e de perceber o outro, nomeadamente na perspetiva da comunicação não-verbal.» Paula Branco, enfermeira especialista na Unidade de Transplante de Medula Óssea (UTMO) do CHLN/HSM, membro da CO e moderadora da sessão
Ocorrências e intercorrências (17 de nov., das 9h30 às 10h30)
«Vamos abordar três situações clínicas que ocorrem com frequência: enterocolite neutropénica, choque sético e trombose venosa profunda. Trata-se de problemas que resultam, muitas vezes, da doença de base e que condicionam todo o tratamento, inclusive o esquema estabelecido em termos de tempo, não só porque aumentam o risco de vida, como ampliam os tempos de internamento e, consequentemente, os custos. Para além de chamar a atenção para estas situações clínicas graves que diminuem e fragilizam ainda mais um doente habitualmente bastante debilitado, pretende-se alertar para o facto de o enfermeiro ter de estar cada vez mais desperto para detetar precocemente estes problemas e, em consequência, atuar de forma mais atempada e eficaz. Existem sinais e sintomas que vão sendo observados e que, conjugados com o estado geral do doente, nos despertam para, entre outras, estas três situações.» Anabela Proença, enfermeira no Serviço de Hematologia e Transplantação de Medula do CHLN/HSM, membro da CC e moderadora da sessão
Cuidar com segurança na Hematologia (17 de nov., das 11h00 às 12h00)
«Esta sessão aborda a pertinência da segurança de forma abrangente: administração segura de fármacos, prevenir e tratar o extravasamento em quimioterapia, dotação segura e sistema de classificação de doentes. A prevenção e a formação são estratégias de intervenção que utilizamos prioritariamente, implicando conhecimentos permanentemente atualizados das doenças e dos principais protocolos de quimioterapia, para além, claro, do respeito pela individualidade do doente. Quanto ao rácio enfermeiro/doente adequado, a hemato-oncologia é sempre muito prejudicada em termos de número de horas atribuídas, uma vez que o doente oncológico precisa de muito apoio do enfermeiro. Assim, a dotação segura e o sistema de classificação dos doentes pelo seu nível de gravidade e, em consequência, o número de horas de acompanhamento necessário por parte do enfermeiro necessitam de uma atualização urgente. Ainda mais se tivermos em conta a cada vez maior complexidade dos protocolos terapêuticos em Hematologia.» Rosa Romão, enfermeira-chefe no Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar de Lisboa Central/ /Hospital Santo António dos Capuchos (CHLC/HSAC), membro da CC e moderadora da sessão
Capacitação dos doentes e cuidadores (17 de nov., das 12h00 às 13h00)
«No Hospital de Dia de Hematologia do CHLN/HSM foi implementada a Consulta de Enfermagem incidindo na Educação para a Saúde e promovendo o autocuidado e a capacitação do utente/cuidador para a gestão da doença e eventos adversos. Na continuidade do plano de cuidados de cada doente, são monitorizados os eventos adversos durante o seu processo terapêutico, recorrendo o enfermeiro a instrumentos e guidelines que fundamentam, uniformizam e simplificam o trabalho. Nos diferentes setores da Unidade de Transplante de Medula Óssea do HSM, apostámos na implementação de um programa educacional com dois objetivos distintos mas convergentes. Em relação ao doente, ajudar a tomar conhecimento da sua patologia e promover o autocuidado. Em relação ao enfermeiro/equipa, uniformizar e partilhar toda a informação prestada ao doente e à família ao longo do internamento. Para tal, implementou-se um guião que inclui aspetos relacionados com a vida diária (alimentação, higiene, lazer, etc.) e respetivos instrumentos de registo.» Ortélia Dias, enfermeira-chefe do Hospital de Dia de Hematologia do CHLN/HSM e membro da CO
Sexualidade e fertilidade do doente hemato-oncológico (17 de nov., das 14h30 às 15h30)
Tratamento da pessoa idosa (18 de nov., das 9h30 às 10h30)
«Este é um tema habitualmente pouco abordado e que os doentes ainda têm algum pudor em discutir junto do médico, procurando fazê-lo com o enfermeiro, dada a relação de maior proximidade. Dada a privacidade existente na Consulta de Enfermagem, a sexualidade e a fertilidade fazem parte dos temas abordados na mesma, situação para a qual a equipa de Enfermagem sente necessidade da partilha de experiências diferentes com outros profissionais da equipa multidisciplinar, que se complementam entre si e que contribuem para que os enfermeiros esclareçam melhor as dúvidas dos utentes nesta área específica. Nesse sentido, esta mesa-redonda conta com a participação de uma ginecologista-obstetra e sexóloga, de um urologista e de uma ginecologista obstetra que faz conservação de gâmetas.» Enf.ª Ortélia Dias
A problemática das estirpes multirresistentes (18 de nov., das 8h30 às 9h30)
«Esta sessão pretende debater a realidade avassaladora das estirpes multirresistentes existentes em todos os hospitais do mundo. Portugal, infelizmente, ultrapassa muito os resultados do norte da Europa. Esta é uma problemática que nos preocupa particularmente, uma vez que estamos a falar do acompanhamento de doentes hemato-oncológicos, isto é, que são imunocomprometidos. Para termos uma visão mais ampla sobre o tema e percebermos o que está a ser feito, se as estratégias são comuns entre os hospitais portugueses e como podemos inverter esta situação, convidámos três oradoras peritas nestas áreas – a presidente da Associação Nacional de Controlo da Infeção, a enfermeira-chefe do Grupo de Coordenação Local do Programa de Prevenção e Controlo das Infeções e da Resistência aos Antimicrobianos do CHLN/HSM e outra enfermeira do CHLC/HSAC.» Maria Manuel Loios, enfermeira-chefe da UTMO do CHLN/HSM e membro da CO
«A população portuguesa está a envelhecer e, como consequência desse aumento da longevidade, as doenças oncológicas estão a crescer exponencialmente. Esta questão levanta uma dicotomia complicada para os enfermeiros, por terem de cuidar do doente idoso com todas as suas comorbilidades, em que a demência assume um papel importante, visto atingir 2 a 25% dos idosos com mais de 65 anos e uma doença oncológica. Este facto torna o dia a dia do enfermeiro um desafio permanente, obrigando-o a desenvolver estratégias para cuidar. Por outro lado, temos de lidar com as consequências de novas intervenções terapêuticas, cujos resultados podem não ser tão satisfatórios como se desejaria, precisamente devido às debilidades desta população. Tudo isto pressupõe a necessidade de formação para nos adaptarmos a esta nova realidade, até porque começam a surgir tratamentos específicos para as pessoas idosas com patologias oncológicas que têm novas particularidades.» Maria de Lurdes Batoréu, enfermeira-chefe do Internamento do Serviço de Hematologia do CHLN/HSM e membro da CO
Cuidar na multiculturalidade
Cuidados e decisões em fim de vida
(18 de nov., das 11h00 às 12h00)
(18 de nov., das 12h00 às 13h00)
«Escolhemos debater este tema porque é comum a todos os hospitais que têm Serviço de Hematologia e que se situam nos três grandes centros (Lisboa, Porto e Coimbra). Como são muito poucos e situam-se em três grandes centros (Lisboa, Porto e Coimbra), habitualmente, estes hospitais recebem doentes de todos os pontos do país. A esse aspeto, acrescem as particularidades decorrentes do aumento da imigração e, no caso do HSM, a existência de um acordo com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa. Estes doentes têm especificidades da sua cultura, religião, maneira de estar e até da própria língua que nos causam grandes desafios. Isso nota-se mais acentuadamente ao nível dos problemas provocados pelas restrições alimentares associadas ao facto de serem doentes imunodeprimidos. Paralelamente, são doentes que não têm direito a apoio social quando saem do hospital, o que levanta graves dificuldades no seu acompanhamento.» Enf.ª Maria de Lurdes Batoréu
«Nesta mesa-redonda, a discussão passará por analisar os cuidados e as decisões em fim de vida, assim como a obstinação terapêutica que possa ocorrer e as questões económicas implícitas. Não é um tema fácil de abordar por nós e pelas próprias famílias, pois é sempre muito complicado dizer que não há mais nada a fazer. Ainda persiste a ideia de que os cuidados paliativos são uma forma de desistir do doente. É preciso explicar que isso não é verdade, na medida em que esses cuidados ainda têm muito a oferecer ao doente. Aliás, proporcionar um fim de vida com qualidade é uma das respostas mais dignas que podemos dar. Por outro lado, são cada vez mais os doentes que começam, eles próprios, a impor os limites ao seu tratamento e, nesses casos, o nosso papel deve ser um vez mais exercido do utente e da família. Com o propósito de perceber o ponto de vista de diversas áreas da sociedade sobre este assunto, convidámos para a discussão uma hematologista do CHLN/HSM, uma enfermeira do Hospital Nossa Senhora da Arrábida, um jornalista do Diário de Notícias, uma psicóloga clínica do CHLC/HSAC e um padre da Clínica S. João de Ávila.» Enf.ª Ortélia Dias
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