Notícias Diárias de Hematologia 16 de Novembro 2019

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Notícias Diárias 21.ª Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Hematologia (SPH) | www.sph.org.pt | Publicação de distribuição gratuita

14 a 16 de novembro ACEDA À VERSÃO DIGITAL

Update em regulação do metabolismo do ferro

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novembro sábado

A Prof.ª Clara Camaschella, hematologista e docente no Instituto Científico San Raffaele, em Milão, nesta fotografia acompanhada pela Prof.ª Graça Porto, uma das moderadoras da sua palestra, fala hoje sobre os avanços no conhecimento do metabolismo do ferro (P.9). A manipulação da via da hepcidina tem sido a mais estudada, tanto para a deficiência como para a sobrecarga de ferro, embora também estejam em curso experiências de modulação da atividade da ferroportina. O programa educacional de hoje inclui ainda a genómica dos linfomas (P.2), a avaliação da doença residual mínima em hemopatias malignas (P.3), as evoluções técnicas da radioterapia (P.4), as novas perspetivas de prognóstico e tratamento do linfoma folicular (P.6) e o papel do transplante de células estaminais no linfoma não-Hodgkin (P.8)


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«Com informação genética, vamos poder selecionar a terapêutica mais personalizada» DR

Estará a genómica dos linfomas pronta para entrar na prática clínica? Numa antevisão da sua palestra, que decorrerá entre as 9h00 e as 9h40, a Prof.ª Jessica Okosun, hematologista e investigadora no Barts Cancer Institute, em Londres, explica o que já se sabe e aquilo que falta estabelecer para que o valor diagnóstico e prognóstico da genómica passe a fazer parte do dia-a-dia dos médicos que se dedicam aos linfomas. por Luís Garcia

Essas dúvidas são transversais a todos os tipos de linfoma?

Em que ponto está o conhecimento atual no âmbito da genómica dos linfomas?

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O acesso a tecnologias como a next-generation sequencing [NGS] permitiu conhecer a genómica da maioria dos mais de 60 subtipos de linfoma identificados. Sabemos agora quais os genes que estão frequentemente alterados, pelo menos nos subtipos mais comuns.

De que modo esse conhecimento está a ser transposto para a prática cínica? Penso que, neste momento, estamos numa encruzilhada. Por um lado, temos muita informação que advém do progresso nos projetos de investigação e não da prática clínica, uma vez que o estudo genético ainda não é uma prática standard nos doentes com linfoma. Por outro lado, estamos a tentar perceber se podemos utilizar estes dados para decidir como tratar os nossos doentes. Temos a informação, mas não sabemos como utilizá-la. Há vários ensaios clínicos em curso que usam a informação genómica e que nos vão ajudar a perceber como utilizar estes dados. A genómica é como uma enciclopédia. Dispomos agora de um catálogo com todas estas mutações, mas não compreendemos em que medida o primeiro capítulo é mais importante do que o segundo.

Compreendemos um pouco melhor os subtipos mais comuns, como o linfoma difuso de grandes células B. Pelo contrário, sabemos muito pouco sobre os linfomas mais raros porque não os estudámos o suficiente. É preciso ter acesso a um maior número de casos para perceber quando determinada informação genómica está associada a alto ou a baixo risco.

O que se pode esperar num futuro próximo? Em alguns tipos de linfoma, vamos começar a ver chegar à prática clínica alguma informação genética que pode ajudar-nos a classificar alguns subtipos e, por vezes, a guiar o diagnóstico. A genómica tem de representar um apoio ao diagnóstico e/ou à seleção da terapêutica em função de determinados marcadores genéticos. Estes preditores podem permitir-nos dizer que, se o doente tem a mutação A, deve ser tratado com o fármaco X; se tem a mutação B, é melhor tratá-lo com a terapêutica Y.

A genómica também pode contribuir para selecionar a terapêutica? Sim, em certos casos. Um exemplo disso é a mutação EZH2, que está presente em alguns linfomas e pode ser revertida por determinados fármacos. Há ensaios clínicos em curso que sugerem que, se o doente tiver essa mutação e for tratado com terapêutica dirigida, se consegue

um melhor prognóstico. Com base na informação genética, vamos poder selecionar a terapêutica de forma mais personalizada. Outra aplicação desta informação poderá ser a monitorização do cancro. Nos cancros sólidos, há atualmente uma enorme tendência para recorrer às biópsias líquidas, que permitem verificar se há impressões genéticas do cancro no sangue, com um método pouco invasivo. Se conseguirmos identificar esta «pegada», podemos monitorizá-la ao longo do tratamento. Se desaparecer, é porque a terapêutica está a resultar; se permanecer, é porque o linfoma é resistente àquele tratamento.

A genómica dos linfomas está pronta para o prime time? Penso que ainda não está totalmente pronta, mas estamos numa fase muito entusiasmante, dado que temos muita informação do laboratório e estamos a tentar transpô-la para o consultório. Começamos a perceber o enorme potencial que estes dados poderão ter na prática clínica. Um dos motivos pelos quais penso que a genómica não está pronta para o prime time está relacionado com o custo dos testes genéticos. A menos que haja uma implicação bem demonstrada para o doente, não há motivo para fazer um teste dispendioso que acabará por não ser utilizado. Na minha palestra, vou falar um pouco sobre a relação custo-benefício e darei exemplos de como, nos EUA (onde esta área está muito mais avançada), a monitorização genética está a ser utilizada em alguns centros de investigação. ND

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«A DRM é fundamental na abordagem dos doentes com hemopatias malignas» Com uma utilização cada vez mais generalizada, a doença residual mínima (DRM) é hoje considerada importante para estabelecer o prognóstico e redefinir a estratégia terapêutica de várias patologias hemato-oncológicas. Entre as 9h40 e as 10h10, o Prof. Ramon García Sanz, diretor da Unidade de Histocompatibilidade e Hematologia Molecular do Hospital Universitário de Salamanca, vai referir as virtudes, as limitações e o modo de tirar o melhor partido deste critério de resposta ao tratamento. por Luís Garcia

Qual é a importância de alcançar DRM? Depende da patologia, mas, de um modo geral, é fundamental, porque nos vai permitir antever quais os doentes com bom e mau prognóstico, ajudando-nos a optar pelo melhor tratamento possível. A DRM é um dado fundamental na abordagem dos doentes com hemopatias malignas.

Os estudos demonstram essa relevância? Há muitos ensaios clínicos em curso sobre diversas patologias que estão a avaliar a relevância da DRM. Na leucemia promielocítica aguda, sabemos que os doentes que não alcançam resposta completa por DRM têm muito mau prognóstico, apresentando uma taxa de recidivas de 100%. Na leucemia mieloide crónica, utilizamos a DRM para subir ou baixar as doses da terapêutica e, sobretudo, para decidir se mantemos o mesmo tratamento ou o alteramos. No mieloma múltiplo, a DRM ajuda-nos a decidir se um doente faz ou não um segundo transplante, ou se devemos optar por uma manutenção mais ou menos prolongada. Na leucemia linfocítica crónica, sabemos que os

Otimizar o estudo da DRM

doentes que não alcançam a DRM negativa têm uma redução da sobrevivência sem progressão e da sobrevivência global. No linfoma de células do manto, a situação é semelhante. Na leucemia mieloide aguda também, pelo que estamos a mudar o sistema de classificação prognóstica do doente e a fazer a consequente adaptação dos tratamentos. No nosso centro, os doentes que não alcançam resposta completa vão para transplante alogénico. Os doentes que atingem resposta completa por DRM vão para o transplante autólogo, porque são considerados de bom prognóstico.

Como deve o médico adaptar as suas decisões terapêuticas em função da DRM? Em geral, para qualquer doente, encontrar uma DRM positiva é motivo de preocupação e sinal de que, provavelmente, o doente vai necessitar de mais tratamento e de um seguimento mais intensivo. Pelo contrário, uma DRM negativa tranquiliza-nos e ajuda-nos a prever que o doente terá um melhor prognóstico e que a terapêutica instituída é adequada. Em alguns casos, pode até levar-nos a interromper o tratamento.

O título da palestra do Prof. Ramon García Sanz não deixa grandes dúvidas sobre o que será abordado: «Análise da doença residual mínima em hemopatias malignas: a sua utilidade na prática clínica». Ainda assim, o hematologista especifica os tópicos centrais da sua comunicação: «Temos ao dispor uma ferramenta muito útil para a clínica, que é a avaliação da DRM, seja através de técnicas de citometria de fluxo, de biologia molecular ou de imagem. Já existem meios para estudarmos a DRM e temos de tentar disponibilizá-los a todos os doentes.» O outro grande ponto da palestra deste especialista serão as formas de otimização do estudo da DRM. «Em algumas doenças, já temos meios para estudar a DRM, mas noutras ainda não dispomos de dados suficientemente claros para podermos utilizá-la de um modo imprescindível», admite Ramon García Sanz, que recomenda vivamente o recurso a este critério de resposta ao tratamento nos doentes com hemopatias malignas.

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Quais os principais desafios para alcançar DRM negativa? Identifico dois. O primeiro é a disponibilização de tecnologias que nos permitam a deteção mais sensível da doença. Algumas técnicas dão resultados negativos quando, na verdade, o doente tem DRM positiva. Por exemplo, no linfoma, a tomografia por emissão de positrões [PET] não permite identificar os doentes que podem recair, uma vez que alguns apresentam um exame negativo, mas têm recidiva. Para ultrapassar esta limitação da PET, pode-se tentar utilizar a biópsia líquida, que analisa o ADN tumoral circulante. Já no mieloma múltiplo, pode-se utilizar a next-generation sequencing [NGS] associada a técnicas de imagem. Além dos desafios tecnológicos, temos dificuldades terapêuticas. Necessitamos de tratamentos eficazes, que permitam que todos os doentes alcancem DRM negativa, se possível. Claro que isto não é fácil, porque depende da eficácia do tratamento e da utilização das melhores combinações.

A DRM é já um critério utilizado na prática clínica da generalidade dos centros europeus? Infelizmente, não. As novas tecnologias são utilizadas, sim, porque não há outra solução, mas continua a haver muitos hospitais em Espanha e no mundo que não têm disponível um estudo de DRM adequado. ND 16 de novembro de 2019


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Um novo olhar sobre a radioterapia nos linfomas

Face à evolução de outras terapêuticas, a radioterapia tem perdido espaço no tratamento dos linfomas. No entanto, esta modalidade de tratamento registou uma evolução tecnológica assinalável que faz dela uma ferramenta muito útil no contexto da Hematologia, como vai assinalar na sua palestra, entre as 10h10 e as 10h50, o Dr. Ângelo Oliveira, radioncologista no Instituto Português de Oncologia do Porto. por Luís Garcia

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uportada pelo fabrico de equipamentos de megavoltagem e pela utilização de volumes extensos de tratamento, a radioterapia assumiu, em meados do século XX, um papel central no tratamento dos linfomas, constituindo a primeira modalidade curativa para alguns casos e sendo considerada classicamente a terapêutica isolada mais efetiva. No entanto, este tipo de tratamento estava longe de não ter inconvenientes: «devido à necessidade de utilizar doses elevadas em grandes volumes, com tecnologia ainda numa fase inicial de desenvolvimento, a resposta terapêutica sustentada e duradoura que se conseguia obter era acompanhada de toxicidade significativa, quer aguda, quer sobretudo tardia», explica Ângelo Oliveira. Em resultado do desenvolvimento de respostas de quimioterapia e imunoterapia cada vez mais eficazes no tratamento dos linfomas, da introdução de novos agentes farmacológicos e da preocupação com a toxicidade tardia da radioterapia, esta viu o seu papel reduzir-se. «Verificou-se uma propensão para a redução da utilização, da dose e do volume da radioterapia – e até para a sua omissão», refere o orador. No entanto, adverte, «esta tendência condiciona um risco acrescido de os oncologistas não identificarem as situações clínicas nas quais a radioterapia mantém um importante papel terapêutico, facto que

poderá afetar negativamente o controlo local e, eventualmente, comprometer o sucesso terapêutico». Para Ângelo Oliveira, não há dúvidas de que «os avanços da tecnologia relacionada com a radioterapia e do conhecimento biológico da integração e da sequência da radioterapia combinada com a quimioterapia mantêm a terapêutica com radiações como um componente importante no tratamento dos linfomas». Esta modalidade pode ser utilizada como tratamento primário, como parte de uma estratégia combinada para maximizar o controlo local, como elemento de terapêutica de salvação em situações refratárias ou recidivantes, ou mesmo com intuito paliativo sintomático.

Desfazer mitos Segundo Ângelo Oliveira, importa desfazer alguns mitos associados à radioterapia. Numa «viagem» pela radioncologia contemporânea, o preletor vai apresentar casos exemplificativos das novas opções terapêuticas nesta área, que permitem «maior rigor e segurança, resultando numa menor irradiação dos órgãos em risco (tecidos normais)». Do ponto de vista do radioncologista, «os elementos clínicos imagiológicos iniciais são indispensáveis para a radioterapia de precisão que irá ser planeada sequencialmente à terapêutica sistémica, muitas vezes já com desaparecimento do alvo que constitui o volume tumoral inicial».

Baseando-se no seu conhecimento sobre o mapa nacional de Serviços de Radioncologia, Ângelo Oliveira sublinha a necessidade de definir um modelo de referenciação adequado, que permita que os doentes dos Serviços de Hematologia sem recursos de Radioncologia não sejam privados da comunicação entre especialidades. «Mais importante do que um maior recurso à radioterapia em Hematologia, será desejável uma melhor utilização», defende. Para promover a interação entre ambas as especialidades, Ângelo Oliveira sugere intervenções em três frentes. Em primeiro lugar, na formação, «incluindo estágios com aprendizagem recíproca em ambos os programas de formação específica, conhecendo assim a realidade dos parceiros da equipa multidisciplinar e estimulando o progresso científico». Por outro lado, na clínica, com interação e envolvimento de ambas as especialidades na elaboração de protocolos terapêuticos comuns. Finalmente, no dia-a-dia, «transformando as consultas multidisciplinares existentes em mais do que a mera apresentação de casos clínicos sem resposta pretendida às terapêuticas sistémicas e permitindo que a Radioncologia possa transmitir uma opinião e oferecer alternativas tão ou mais efetivas, com menor custo e, eventualmente, com menos toxicidade». ND

Inovações na radioterapia

• Técnicas de radioterapia guiada pela imagem; • Novos conceitos de volume-alvo; • Avanços na planimetria; • Utilização de ferramentas como a modulação de intensidade do feixe: intensity modulated radiation therapy (IMRT) e volumetry modulated arc therapy (VMAT); • Monitorização ótica da superfície do doente; • Possibilidade de radioterapia em inspiração profunda sustentada.piração profunda sustentada.


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«Ainda estamos longe da cura do linfoma folicular»

Entre as 11h20 e as 12h00, o Dr. Armando López-Guillermo, hematologista no Hospital Clínic, em Barcelona, vai apresentar uma revisão sobre linfoma folicular (LF). Em entrevista, o palestrante faz uma súmula dos principais avanços verificados no passado e dos que são esperados para o futuro, destacando a utilização de novas classes terapêuticas, com menor toxicidade, a combinação de fármacos. por Luís Garcia

à procura de conseguir outro grande avanço, que poderá advir de três linhas: novos anticorpos monoclonais, como o obinutuzumab ou o polatuzumab vedotina; fármacos imunomoduladores, como a lenalidomida; ou inibidores de pequenas moléculas com ação específica, muitos deles de toma oral e com boa tolerabilidade, mas que ainda estão em ensaios clínicos.

Que outros aspetos é importante melhorar no tratamento deste linfoma? 6

Em que ponto está o tratamento atual do LF? Sendo um linfoma indolente ou não agressivo, hoje em dia, a sobrevivência dos doentes é muito prolongada – a mediana supera os 20 anos. No entanto, com as terapêuticas atuais, não somos capazes de curar a grande maioria dos doentes. Inicialmente, respondem ao tratamento, mas, ao fim de algum tempo, recaem e é necessário voltar a tratá-los. Ainda não conseguimos evitar que isto aconteça.

Quais foram as maiores mudanças no tratamento do LF nos últimos anos? À semelhança dos outros linfomas, o tratamento habitual do LF é a quimioterapia [QT]. A grande mudança que se verificou no início dos anos 2000 foi a introdução da imunoquimioterapia, juntando rituximab à QT, que permitiu uma melhoria substancial de todos os parâmetros, incluindo a sobrevivência dos doentes. Atualmente, estamos

Novidades «na calha»

De acordo com o Dr. Armando López-Guillermo, estas são as classes terapêuticas sobre as quais se esperam mais desenvolvimentos a curto ou médio prazo: • Anticorpos monoclonais; • Imunomoduladores; • Inibidores de pequenas moléculas com ação específica.

Além da cura, seria importante que conseguíssemos ter tratamentos menos tóxicos. Idealmente, seriam esquemas sem QT, dado que esta está sempre associada a toxicidade. Alguns dos regimes sem QT parecem ser, pelo menos, tão efetivos como a QT, mas falta-nos mais tempo de seguimento para confirmar os resultados.

O que se pode esperar dos anticorpos monoclonais neste âmbito? Entre os novos anticorpos monoclonais, o obinutuzumab – que é parecido com o rituxumab, mas mais ativo – já demonstrou ser eficaz, tanto na recidiva como em primeira linha, sempre em combinação com QT. Este fármaco já tem indicação da Agência Europeia de Medicamentos e pode ser utilizado nos doentes de alto risco, com QT, bem como nos doentes em recidiva ou refratários ao regime com rituximab. Há outros anticorpos com dados interessantes em ensaios clínicos, mas ainda sem indicação formal.

Quais as principais novidades ao nível dos imunomoduladores? A lenalidomida, que já é utilizada para outras doenças, como o mieloma múltiplo, é o imunomodulador que está mais adiantado para o LF. Um estudo muito interessante demonstrou que a lenalidomida com rituxiamab pode ter eficácia semelhante à imunoquimioterapia, tanto em primeira como em segunda linha. A questão é que, como não está demonstrada uma eficácia superior à da imunoquimioterapia, o standard continua a ser este regime.

Em que fase está o recurso a pequenas moléculas com ação específica? Encontram-se em estudo muitos fármacos e logo veremos como serão inseridos no organigrama do tratamento do LF. O idelalisib é o único que está aprovado formalmente na Europa para doentes com LF em recaída na terceira fase da doença. Utilizamo-lo porque demonstrou ser eficaz, embora com uma certa toxicidade.

Além do aparecimento de novas classes terapêuticas e novos fármacos, o que podemos esperar para o futuro próximo do tratamento do LF? Um dos objetivos será encontrar combinações de alguns destes fármacos – por exemplo, um anticorpo monoclonal com um inibidor de pequenas moléculas ou um imunomodulador. Seria bom dispormos de associações muito específicas e seletivas, logo mais eficazes e com menor toxicidade (provavelmente, sem QT). É isto que procuramos para melhorar os resultados: aumentar a sobrevivência e, idealmente, conseguir que não haja recidivas, ou seja, curar a doença. Mas ainda estamos longe desse desiderato.

Que outros desafios permanecem na prática clínica? Globalmente, os doentes com LF têm uma mediana de sobrevivência muito prolongada. Porém, há dois grupos nos quais os resultados são mais desoladores. Um é o dos doentes que sofrem uma transformação histológica, ou seja, nos quais o LF se transforma num linfoma mais agressivo. Isto não é frequente – ocorre talvez em 1% dos doentes, a cada ano –, mas, quando sucede, torna necessário fazer tratamento do linfoma agressivo e o prognóstico do doente piora muito. O outro grupo que nos preocupa especialmente é o dos doentes com recidiva precoce – por exemplo, na fase de manutenção ou ao fim de poucos meses de tratamento. Estes casos são os de pior prognóstico e não dispõem de boas soluções terapêuticas. ND


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Transplante de células estaminais no linfoma não Hodgkin

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papel do transplante de células estaminais no tratamento dos doentes com linfomas não Hodgkin vai ser discutido pela Dr.ª Silvia Montoto, hematologista no Barts Health NHS Trust, em Londres, entre 12h00 e as 12h40. A também presidente do Lymphoma Working Party da European Society for Blood and Marrow Transplantation, que vai apresentar as principais indicações do transplante autólogo e alogénico e a evidência em que se baseiam, começa por salientar a heterogeneidade deste grupo de doenças, que resulta em estratégias terapêuticas substancialmente distintas. «O linfoma difuso de grandes células B é uma doença potencialmente curável. Sabemos que o melhor tratamento em primeira linha é o esquema R-CHOP [rituximab, ciclofosfamida, doxorrubicina, vincristina e prednisona]. No entanto, há uma proporção de doentes que não atingem resposta completa em primeira linha

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ou recaem. Para esses, sabemos que o transplante é a melhor opção», afirma Silvia Montoto. No caso do linfoma de células do manto, o transplante autólogo está indicado para a primeira remissão. Já no linfoma folicular – «que continua a ser considerado uma doença

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incurável, pelo menos com tratamento convencional –, a abordagem pode ser bastante variável, desde a simples vigilância até ao transplante alogénico – que, em geral, só está indicado em doentes que têm recidiva após um transplante autólogo. «A escolha de uma alternativa em detrimento de outra depende de muitas variáveis, como a idade, as comorbilidades, os sintomas, a idade do diagnóstico ou as recidivas. E cada uma destas opções de tratamento pode ser a mais adequada para o mesmo doente em diferentes circunstâncias», sublinha Silvia Montoto. De acordo com a preletora, algumas das indicações para transplante estão a mudar e, em alguns casos, indicações que eram claras no passado já não o são atualmente. É o que se passa, por exemplo, com o linfoma folicular, no âmbito do qual «há menos doentes a necessitar de transplante autólogo, provavelmente porque estão a ter acesso a terapêuticas que proporcionam respostas mais longas». ND


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«Num futuro próximo, deveremos saber como individualizar a terapêutica com ferro» O programa educacional da Reunião Anual da SPH 2019 fecha com a apresentação do que se conhece e do que ainda falta esclarecer acerca da regulação do metabolismo do ferro. Em entrevista, a Prof.ª Clara Camaschella, hematologista e docente no Instituto Científico San Raffaele, em Milão, avança alguns dos dados que vai comentar na sua palestra, entre as 12h40 e as 13h30. por Luís Garcia

O que se sabe hoje acerca do metabolismo do ferro? Fizemos muitos progressos no entendimento do metabolismo do ferro e da sua regulação nos últimos anos. No entanto, naturalmente, à medida que avançamos, percebemos que não sabemos tudo. Já sabíamos que o ferro é um elemento essencial, mas tóxico, quando presente em excesso. Porém, compreendemos agora bastante melhor todo o metabolismo envolvido no bloqueio desse excesso. Sabemos que a regulação do ferro se dá a nível sistémico (através da hepcidina e da ferroportina), celular e, provavelmente, dos tecidos.

Quais os aspetos que falta esclarecer? Conhecemos bem a absorção do ferro não heme no intestino, mas não a do ferro heme. Como médicos, dizemos aos doentes com deficiência deste nutriente para comerem carne, porque tem ferro heme, mas não sabemos exatamente como é absorvido. Conhecemos bem algumas vias, mas não todas.

Que papel assume a hepcidina na regulação do metabolismo do ferro? A hepcidina, cujo conhecimento representa o maior avanço no campo da regulação sistémica, é uma hormona inibitória com um papel fisiológico que consiste em bloquear a entrada de ferro e diminuir a sua quantidade na

circulação sanguínea, ao impedir a reciclagem deste nutriente nos macrófagos. Quando há um problema na resposta fisiológica, como acontece, por exemplo, na hemocromatose hereditária, o papel da regulação homeostática da hepcidina é afetado, originando uma sobrecarga de ferro. Da mesma forma, quando a eritropoiese está limitada, o que sucede em doenças como a talassemia, a anemia diseritropoiética e a anemia sideroblástica, a hepcidina não pode ser ativada, mesmo que haja muito ferro no corpo. O mecanismo é diferente, mas o resultado é semelhante ao da hemocromatose.

Que desequilíbrios são provocados pelo excesso de hepcidina? Na anemia ferropriva refratária ao ferro, os doentes têm hepcidina constitucionalmente demasiado elevada, o que bloqueia a entrada de ferro no corpo e torna ineficaz a toma de ferro oral. Consequentemente, estes casos apresentam anemia por deficiência de ferro. Esta doença é rara, mas constitui um bom modelo de estudo para perceber o que acontece em doenças muito mais frequentes, como a anemia inflamatória. Neste caso, a hepcidina responde ao ferro, mas também às citoquinas inflamatórias. Por isso, em caso de inflamação – como sucede em diversas patologias, entre as quais doenças oncológicas, diabetes e doenças autoimunes –, a hepcidina fica aumentada e sequestra ferro nos macrófagos.

Impacto da anemia por insuficiência de ferro

A anemia por insuficiência de ferro será uma das doenças abordadas pela Prof.ª Clara Camaschella na sua palestra. Afetando cerca de 1,2 mil milhões de pessoas em todo o mundo, esta anemia «é causada por um aumento das necessidades fisiológicas de ferro em crianças, adolescentes, mulheres jovens e grávidas; por uma absorção de ferro insuficiente; por problemas na absorção do ferro; ou por perda de sangue crónica», explica a hematologista de Milão. E acrescenta: «A adaptação à insuficiência de ferro ao nível do tecido é controlada pelas proteínas reguladoras do ferro, de modo a aumentar a sua absorção e retenção. Ao nível sistémico, a supressão da hepcidina aumenta a libertação do ferro no plasma através da ação dos enterócitos e da reciclagem dos macrófagos.»

Até que ponto o conhecimento da biologia do ferro é importante para o desenvolvimento de novas terapêuticas? Há várias tentativas em curso, algumas das quais já em fase de ensaios clínicos. A manipulação da via da hepcidina tem sido a opção mais experimentada, embora também estejam em curso experiências de modulação da atividade da ferroportina. No âmbito da deficiência de ferro, está em ensaio clínico de fase III um antiativador da hepcidina (anti-Bmp6) dedicado à anemia inflamatória, por exemplo. Também estão em estudo terapêuticas que visam aumentar a atividade da ferroportina que, na deficiência de ferro, está bloqueada pela hepcidina. Para os doentes com sobrecarga de ferro, estão a ser estudados vários tratamentos, como análogos da hepcidina. Além disso, encontram-se em ensaios clínicos de fases I e II moléculas que bloqueiam a ferroportina, sendo dirigidas, sobretudo, à anemia e não tanto à hemocromatose, embora também se espere que resultem nesta patologia, que é grave e tem uma maior necessidade clínica de terapêuticas, além da quelação e do transplante de medula óssea.

Que outros avanços se espera que ocorram no futuro próximo? O progresso na investigação básica e nos estudos clínicos vai certamente aumentar as oportunidades de tratamento. Num futuro próximo, deveremos saber como individualizar a terapêutica com ferro (isoladamente ou em combinação), de acordo com as condições patológicas específicas do doente e aspetos como a idade, o género e as comorbilidades. ND 16 de novembro de 2019

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Bem-estar do doente hemato-oncológico, da infância à vida adulta

Hoje, o Programa de Enfermagem (das 9h00 às 14h00, no auditório 2) é composto por duas mesas-redondas, uma dedicada a particularidades da criança com doença hemato-oncológica e outra centrada em abordagens complementares, que contribuem para o bem-estar dos doentes, como a alimentação funcional, o reiki e a acupuntura. por Luís Garcia e Pedro Bastos Reis seu sofrimento, porque não os podem verbalizar com as pessoas mais próximas. As famílias veem os enfermeiros como a sua âncora do dia-a-dia e, muitas vezes, precisam apenas de um sorriso», diz a moderadora.

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A sala do Programa de Enfermagem na tarde de ontem, com oradores, moderadores e assistência

om moderação de Alexandra Belchior, enfermeira no Centro Clínico da Fundação Champalimaud, em Lisboa, e Teresa Fraga, enfermeira na Kastelo – Associação no Meio do Nada, a primeira mesa-redonda arranca com a intervenção de Sónia Pereira, enfermeira no Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto. «Uma criança com doença hemato-oncológica passa parte da sua vida em unidades de saúde, seja em internamentos, hospitais de dia, consultas ou exames», começa por contextualizar Teresa Fraga. Por isso, deixa uma mensagem aos profissionais de saúde: «Todos nós que cuidamos destas crianças deveríamos proporcionar-lhes um ambiente agradável e alegre, o que passa por as tratarmos num espaço adequado à sua idade e com atividades lúdicas, para que o seu sofrimento seja atenuado.» Na palestra seguinte, Odete Ferreira, enfermeira no IPO do Porto, vai sugerir estratégias que podem ser adotadas em caso de insucesso no tratamento de crianças com patologias hemato-oncológicas. «É importante que uma equipa de cuidados paliativos pediátricos seja chamada antes do insucesso, porque podemos sempre dar qualidade de vida a estas crianças», afirma Teresa Fraga, remetendo para a Carta de Trieste, sobre os direitos da criança em fim de vida. «As crianças têm o direito a ser tratadas em unidades apropriadas à sua idade e não podem sentir

que nos estamos a desligar delas, porque, se o sentirem, vão desistir de viver e isso não pode acontecer», ressalva a moderadora. A primeira mesa-redonda de hoje termina com a preleção da Dr.ª Susana Moutinho, psicóloga no IPO do Porto, sobre a abordagem psico-oncológica ao impacto da doença na criança e na família. Neste caso, Teresa Fraga salienta a importância da

«As crianças têm o direito a ser tratadas em unidades apropriadas à sua idade e não podem sentir que nos estamos a desligar delas, porque, se o sentirem, vão desistir de viver e isso não pode acontecer» comunicação eficaz ao longo de todo o processo, bem como a necessidade de os profissionais de saúde saberem ouvir e compreender as dificuldades dos familiares da criança. «A comunicação tem de ser empática e, muitas vezes, temos de ser meros ouvintes, porque, em certos casos, as famílias não querem a nossa opinião. Querem ser ouvidas, querem verbalizar as suas angústias e o

Abordagens complementares para o bem-estar Na mesa-redonda cujo início está marcado para as 11h30, o debate centra-se nas abordagens complementares ao bem-estar do doente hemato-oncológico. Com moderação de Anselmo Madureira, enfermeiro-chefe dos Serviços de Nefrologia e Hematologia do Centro Hospitalar Universitário do Porto/Hospital de Santo António, e Sónia Veloso Trevisan, enfermeira no mesmo centro hospitalar, os oradores vão falar sobre a ajuda que pode advir da alimentação funcional, do reiki e da acupuntura, apesar de ainda não estarem disponíveis na maioria dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde. A Prof.ª Marisa Machado, docente de Farmácia na Escola Superior de Saúde do Vale do Ave/Instituto Politécnico de Saúde do Norte – Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário (CESPU), em Famalicão, abordará o papel da alimentação funcional no doente oncológico. Segue-se a comunicação de Zilda Alarcão, enfermeira que coordenou um estudo sobre reiki em doentes oncológicos no Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto. Por último, José Malta, enfermeiro, acupuntor e docente na Escola Superior de Enfermagem do Porto, vai discorrer sobre a ajuda que pode advir da acupuntura. Anselmo Madureira revela que esta será «uma sessão com muitas surpresas e apresentações capazes de gerar discussão», salientando «o enriquecimento em termos de conhecimento que estas abordagens complementares podem trazer para o interior das instituições hospitalares». O moderador chama ainda a atenção para a importância de «saber ouvir os doentes e as famílias, que cada vez questionam mais as equipas de enfermagem sobre estas técnicas complementares ao bem-estar». ND


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A FECHAR

Estado da arte e perspetivas de futuro no tratamento do mieloma múltiplo

O tratamento de manutenção com lenalidomida, independentemente da idade do doente, e a ação sinérgica dos agentes imunomoduladores (IMiD) com os inibidores do proteossoma (IP) nos doentes com mieloma múltiplo (MM) estiveram em evidência no simpósio organizado pela Celgene na passada quinta-feira. Um dos destaques da sessão foi a apresentação dos dados do estudo OPTIMISMM1, no qual a associação pomalidomida+bortezomib+dexametasona (PVd) demonstrou maior eficácia do que a dupla bortezomib/ /dexametasona, com uma melhoria significativa da sobrevivência livre de progressão. A moderadora (Dr.ª Graça Esteves) e os três palestrantes neste simpósio sintetizam algumas das principais ideias transmitidas.

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Prof.ª Catarina Geraldes, Dr.ª Graça Esteves, Dr. Albert Oriol e Prof.ª Cristina João (da esq. para a dta.)

Qual a importância das novas combinações baseadas em IMiD no futuro tratamento do MM? Os IMiD são drogas que têm elevado sinergismo com os IP e os anticorpos monoclonais. A lenalidomida tem substituído progressivamente a talidomida, pela sua maior eficácia e menor taxa de neuropatia periférica, não ultrapassando, no entanto, o mau prognóstico de algumas anomalias citogenéticas. A pomalidomida já demonstrou, desde os estudos preliminares, que é o IMiD disponível mais eficaz e o único que parece ultrapassar o mau prognóstico citogenético. Está, no entanto, com a avaliação prévia aprovada pela Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (INFARMED) apenas para os doentes duplamente refratários a um IP e a um IMiD. Considera que, neste momento, o panorama do MM em Portugal espelha o que se faz noutros países em termos de tratamentos, ensaios clínicos, etc.? Foi aprovada recentemente pelo INFARMED a terapêutica de manutenção pós-transplante com lenalidomida, que já estava a ser praticada em algumas instituições. Por outro lado, a terapêutica inicial do doente idoso, no nosso país, varia entre um regime fixo contendo bortezomib em dupleto ou tripleto e regimes contínuos contendo IMiD (talidomida ou lenalidomida). Não há prática generalizada com o regime lenalidomida, bortezomib e dexametasona [RVd] nestes casos, apesar de os doentes de alto risco beneficiarem desta combinação, mesmo na sua forma light. Em caso de recaída, para os doentes previamente expostos a bortezomib e IMiD, mas ainda com doença sensível aos mesmos, podemos escolher uma das alternativas de associação disponíveis: anticorpos monoclonais (daratumumab) ou IP de segunda geração (carfilzomib, ixazomib). Para os doentes duplamente refratários, pomalidomida em associação com dexametasona obteve recentemente comparticipação especificamente para este grupo de doentes. Sabemos, no entanto, pelos estudos que estão a decorrer, que o controlo da doença duplamente refratária é muito superior quando a este dupleto se associam fármacos como os anticorpos monoclonais ou os IP de segunda geração. Na prática clínica, conhecemos a resistência das instituições hospitalares à utilização dos novos fármacos no tratamento de segunda linha, sendo estes geralmente utilizados em linhas posteriores. Portugal é um país periférico para a indústria farmacêutica e com fama de reduzida inclusão de doentes em ensaios clínicos, o que é parcialmente verdade, apesar do esforço que as equipas hospitalares têm feito no sentido de encontrar doentes elegíveis para os estudos que decorrem no nosso país. O Grupo Português de Mieloma Múltiplo tem tentado ultrapassar esse obstáculo junto da European Myeloma Network, de modo a podermos futuramente participar em estudos promovidos por este grupo.

NP-PT-NA-0005

Dr.ª Graça Esteves, hematologista no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria


Prof.ª Catarina Geraldes, hematologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra Qual é a abordagem terapêutica mais adequada em doentes jovens com MM? Nos doentes jovens com MM, é importante realizar a melhor indução para reduzir ao máximo ou, se possível, eliminar a carga tumoral, seguida de quimioterapia de alta dose e transplante autólogo de progenitores hematopoiéticos. Com o objetivo de manter e aprofundar a qualidade da resposta após o transplante, é importante realizar uma terapêutica de manutenção para assegurar uma maior duração de resposta e, assim, atrasar a recaída. Atualmente, utilizamos diferentes esquemas terapêuticos de indução, se bem que apenas o tratamento com lenalidomida em manutenção demonstrou resultados de eficácia que permitem mais de cinco anos de sobrevivência livre de progressão (PFS) e mais de dez anos de sobrevivência global (OS). E no doente idoso? Nos doentes idosos fit, a abordagem é sobreponível à dos doentes mais jovens, excetuando-se a quimioterapia de alta dose e o transplante. Os objetivos terapêuticos são idênticos nestas duas populações de doentes: alcançar respostas de excelente qualidade, que serão mais duradouras. Nos doentes idosos, este facto é particularmente relevante porque muitos apenas recebem uma linha de tratamento. Deste modo, o tratamento de primeira linha com lenalidomida e dexametasona até à progressão é uma das opções mais recomendadas. No estudo FIRST, foram demonstradas a importância e a eficácia do tratamento até à progressão da doença, em comparação com os esquemas de duração fixa. A mais recente evidência de eficácia desta combinação (lenalidomida com dexametasona) demonstrou uma PFS de 33,8 meses. Como ajudam as novas combinações aprovadas a alcançar estes objetivos? Graças às novas combinações e às sinergias entre os mecanismos de ação dos diferentes fármacos, falamos hoje de conseguir melhorar a eficácia dos tratamentos de indução (sinergias IMiD+IP), assim como utilizar a melhor opção em manutenção. Os objetivos são aprofundar respostas e negativar doença residual mínima, conduzindo a uma melhoria significativa da sobrevivência dos doentes com MM. Atrasar a recidiva o máximo tempo possível, mantendo o doente sem manifestações da doença, é o objetivo principal do tratamento, tentando sempre não comprometer a qualidade de vida dos doentes.

Dr. Albert Oriol, hematologista no Instituto Catalão de Oncologia, em Badalona, Barcelona No MM, tradicionalmente, há duas abordagens de tratamento: por ciclos fixos ou num esquema até à progressão. É possível melhorar os resultados destas duas abordagens com as novas opções que existem hoje? Para melhorar estes tratamentos, devemos privilegiar dois parâmetros: o modo de aumentar a intensidade e o prolongamento da duração do tratamento. Aumentando a intensidade inicial, conseguimos mais respostas de qualidade e, consequentemente, maiores PFS. Prolongando a duração do tratamento, controlamos melhor o MM, o que também resulta numa melhoria da PFS. A sinergia entre IMiD e IP é uma realidade na prática clínica que vai além da evidência proveniente do laboratório? Pode-se dizer que estas sinergias se traduzem em resultados para os doentes? De facto, a evidência sobre a sinergia IMiD+IP advém dos ensaios clínicos, mais do que do laboratório. Um claro exemplo disso são os resultados do estudo norte-americano SWOG 0777, que permitiu obter a aprovação pela European Medicines Agency para um esquema baseado na indução com RVd, seguido de lenalidomida e dexametasona até à progressão, em doentes não candidatos a transplante. Esta é mais uma demonstração da sinergia IMiD+IP, que obtém um aumento tanto da sobrevivência livre de progressão como da sobrevivência global, versus bortezomib ou lenalidomida. Que outras sinergias apresentam os IMiD? Os IMiD não possuem sinergias apenas com os IP: temos também claras evidências das suas sinergias com os anticorpos monoclonais.

Prof.ª Cristina João, hematologista no Centro Clínico da Fundação Champalimaud, em Lisboa Que dados destaca do estudo OPTIMISMM? Destacaria que o OPTIMISMM é um estudo desenhado especificamente para avaliar a eficácia do esquema pomalidomida+bortezomib+ dexametasona (PVd) em doentes 100% expostos a lenalidomida e com uma alta percentagem de refratariedade a esta terapêutica – uma população crescente e clinicamente relevante. A combinação baseada em pomalidomida e bortezomib demonstrou ser superior, em termos de eficácia, quando comparada com bortezomib e dexametasona na população global do estudo. A eficácia desta combinação maximizou-se utilizando PVd logo em segunda linha, obtendo-se uma mediana de PFS de aproximadamente 21 meses e uma taxa de resposta global de 90,1%. Além disso, a eficácia manteve-se no subgrupo de doentes refratários a lenalidomida, tendo PVd conseguido proporcionar uma PFS de aproximadamente 18 meses. Qual a relevância dos resultados do estudo OPTIMISMM na prática clínica real? Tendo em conta que o número de doentes que progridem sob lenalidomida continuará a aumentar, é fundamental dispor de opções de tratamento que tenham demonstrado resgatar estes doentes. PVd é a primeira combinação que demonstrou eficácia num ensaio clínico de fase III, que avaliou uma população 100% exposta a lenalidomida. O OPTIMISMM é um estudo de grande relevância, porque incluiu uma população de doentes que é cada vez mais frequente na nossa prática clínica. Além disso, demonstrou, de forma clara, o benefício da imunomodulação contínua no tratamento do MM. ND 1. Richardson PG, et al. Pomalidomide, bortezomib, and dexamethasone for patients with relapsed or refractory multiple myeloma previously treated with lenalidomide (OPTIMISMM): a randomised, open-label, phase 3 trial. Lancet Oncol. 2019;20(6):781-794. NOTA: as combinações de lenalidomida, bortezomib e dexametasona e de pomalidomida, bortezomib e dexametasona encontram-se pendentes de avaliação prévia pelo INFARMED.

16 de novembro de 2019

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