Revista informativa oficial da Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral
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Avanços e estratégias a implementar na abordagem do AVC A 7.ª Reunião Nacional de Unidades de AVC e a 14.ª Reunião da Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral (SPAVC), que decorreram no passado mês de outubro, proporcionaram aos profissionais de saúde que lidam diariamente com esta patologia uma importante atualização quanto ao estado da arte nesta área. A otimização dos procedimentos nas várias fases do AVC, para um tratamento mais adequado do doente, bem como as particularidades do AVC na criança e os avanços terapêuticos registados no último ano, foram alguns dos assuntos em discussão Pág.14 e 15 ALGUNS DOS INTERVENIENTES NAS REUNIÕES (da esquerda para a direita, de baixo para cima): Prof. Vítor Tedim Cruz, Prof. Castro Lopes, Dr.ª Ana Paiva Nunes, Dr.ª Carla Ferreira, Dr.ª Teresa Pinho e Melo, Prof.ª Patrícia Canhão, Dr. Miguel Veloso, Dr.ª Luísa Biscoito, Dr.ª Marta Carvalho, Dr. Miguel Rodrigues, Dr. João Diogo Pinho, Dr. João Sargento Freitas e Dr. Pedro Castro
Quadrimestral Dezembro de 2016 | Ano 2 | € 0,01
Stroke.pt
n.°7
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Agenda DR
2 a 4 de fevereiro
11.º Congresso Português do AVC
Sheraton Porto Hotel spavc.org data
evento
local
+info.
JANEIRO 25
European Brain Council Workshop
Bruxelas, Bélgica
eso-stroke.org
31 jan. a 3 fev.
4th ESO-ESMINT-ESNR Stroke Winter School
Berna, Suíça
eso-stroke.org
Sheraton Porto Hotel
spavc.org
Auditório da Biblioteca Almeida Garrett, Porto
neuropediatria.pt
Portugal
spavc.org
FEVEREIRO 2a4
11.º Congresso Português do AVC
4
Curso «AVC na fase aguda»
16 e 17
XI Congresso da Sociedade Portuguesa de Neuropediatria MARÇO
31
Dia Nacional do Doente com AVC abril
7e8
Lisbon Stroke Summit
Lisboa
22 a 28
69th American Academy of Neurology Annual Meeting
Boston, EUA
aan.com
30 abril a 4 maio
11th World Congress of the International Society of Physical and Rehabilitation Medicine
Buenos Aires, Argentina
isprm.org
MAIO 15 a 17
World Live Neurovascular Conference 2017
Los Angeles, EUA
wlnc.org
16 a 18
The European Stroke Organisation Conference 2017
Praga, República Checa
eso-stroke.org
Berlim
neurosonology2017.de
VidaMar Resort Hotel Madeira, Funchal
spneurologia.com
Amesterdão, Holanda
uems-neuroboard.org
Amesterdão
ean.org/amsterdam2017
19 a 21
22nd
1a3
SOBREVIVÊNCIA Meeting of the European Society of Neurosonology MELHORADA, junho EM PACIENTES Neuro 2017 COM AVC. 9th European Board Examination in Neurology
23
O Seu Parceiro na Prevenção do TEV (Tromboembolismo Venoso) JULHO
24 a 27
3rd Congress of the European Academy of Neurology
Resultados do ensaio clínico CLOTS 3 Ficha Técnica: Kendall SCD™ Sistema de Compressão Propriedade: Sequencial com Deteção de Preenchimento 29,9% 14,0% Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral Vascular Canais oficiais da SPAVC:
REDUÇÃO Risco de Mortalidade
Pneumática Intermitente) estudado no ensaio em pacientes com AVC em pacientes com AVC www.spavc.org • secretariado@spavc.org • f www.facebook.com/ clínico CLOTS 3 /soc.por.avc • t www.twitter.com/spavc_pt • spavc_pt l Sociedade Portuguesa do AVC
© SPAVC, 2016. Todos os direitos reservados Os colaboradores médicos que intervieram na elaboração deste documento Resultados Poderosos. Prevenção Comprovada da SPAVC não auferiram qualquer honorário por este motivo.
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Referências 1. Dennis MS, et al. Effectiveness of intermittent pneumatic compression in reduction of risk of deep vein thrombosis in patients who have had a stroke (CLOTS 3): a multicentre randomised controlled trial. The Lancet. Published online: 31 May, 2013.
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editorial
O AVC pertence às doenças do sistema nervoso
E
m Medicina há um aforismo, retirado de múltiplos contextos, desde interpretações bíblicas até citações de líderes políti‑ cos – «Não é como começa, mas como acaba». Faz sentido. O sintoma é onde começa, não é a doença, não é onde acaba. Mesmo na área da patologia neurológica, onde tanto se investe na semiologia e na fenomenologia das queixas dos doentes, esse é ape‑ nas o início, sendo a localização topográfica o destino do raciocínio clínico. Daí, onde está a doença – nos sintomas, na possível etiologia ou no órgão afetado? Parece-me óbvio que onde acaba é no órgão e, para que a doença possa ser tratada ou mitigada, temos de olhar para o órgão atingido. Em fevereiro de 2014, o Professor Bo Norrving esteve no 8.º Con‑ gresso Português do AVC e falou-nos do seu trabalho na 11.ª Classi‑ ficação Internacional de Doenças (ICD-11). A proposta era agrupar todas as doenças cerebrovasculares num único bloco – ao invés de estarem dispersas por vários capítulos como na ICD-10 –, que ficaria no capítulo das doenças do sistema nervoso. Em setembro de 2016, o Departamento de Saúde e Sistemas de Informação da Organização Mundial de Saúde decidiu, unilateralmente e sem discussão pública, revogar essa decisão e mover o bloco das doenças cerebrovasculares de novo para o sistema circulatório. Sem argumentação científica e sem consultar ou notificar o grupo que criou o bloco das doenças cerebrovasculares1. A inclusão das doenças cerebrovasculares no sistema circulatório será benéfica para alguns, mas prejudicará muitos mais. De que for‑ ma se pode medir o impacto das sequelas neurológicas, se estas do‑ enças estiverem diluídas nos números de múltiplas patologias isqué‑ micas? Não representa o mesmo peso específico ter 30% ou 70% de AVC, se apenas se souber que existem «100 doentes da circulação». A Classificação Internacional de Doenças desvirtua-se, passa de ferra‑ menta estatística poderosa a amálgama indeterminada. A cada minuto em que um grande vaso da circulação encefálica está ocluído, 1,9 milhões de neurónios, 14 mil milhões de sinapses e 12 quilómetros de fibras mielinizadas são destruídos2. É desta cala‑ midade que advêm os sintomas e a incapacidade; não da morte do epitélio dos vasos ou de miócitos cardíacos. Por esse motivo, colocar
Miguel Rodrigues Tesoureiro da SPAVC
as doenças cerebrovasculares no capítulo da circulação está errado. A SPAVC junta-se às várias sociedades científicas internacionais liga‑ das ao AVC e à Neurologia para dizer: o AVC ocorre no encéfalo, até pode ser na medula ou mesmo na retina3, mas aí acaba. Não ocorre no coração, nem nos vasos. Pertence às doenças do sistema nervoso.
Referências bibliográficas: 1) Raad Shakir, Steve Davis, Bo Norrving, Wolfgang Grisold, William M Carroll, Valery Feigin, Vladimir Hachinski. Revising the ICD: stroke is a brain disease. Lancet 2016 http://dx.doi. org/10.1016/S0140-6736(16)31850-5. 2) Jeffrey L. Saver. Time Is Brain—Quantified. Stroke. 2006; 37:263-266. 3) Ralph L. Sacco, Scott E. Kasner, Joseph P. Broderick et al. An Updated Definition of Stroke for the 21st Century. Stroke. 2013; 44:2064-2089.
Sumário NEWS IN FOCUS 6. SPAVC reforça comunicação com a população, através de uma maior participação nos media e da publicação de manuais informativos 7. Campanha de alerta para os sinais de AVC nos jogos da Liga NOS e bolsa de investigação a atribuir pela SPAVC na área da doença vascular cerebral LINKS 8. A Prof.ª Valeria Caso, presidente da European Stroke Organisation, fala, em entrevista, sobre os principais projetos desta instituição e os desafios no tratamento do AVC SCAN 10. Reportagem na Unidade de AVC do Hospital Garcia de Orta, em Almada, a funcionar em pleno desde fevereiro de 2016
KNOW-HOW 14. 7.ª Reunião Nacional de Unidades de AVC discutiu todo o processo de tratamento desta patologia 15. AVC pediátrico esteve em destaque na 14.ª Reunião da SPAVC 16. A Prof.ª Elsa Azevedo escreve sobre as recomendações para a profilaxia da trombose venosa profunda em doentes com AVC 18. Iniciativas do Dia Mundial do AVC (29 de outubro): sessão científica em Palmela e ações de exercício físico em Setúbal, Braga e Coimbra 20. Associação Portugal AVC, constituída por sobreviventes a este evento, apresentou-se com o seu 1.º Encontro Nacional 21. Antevisão do 11.º Congresso Português do AVC (2 a 4 de fevereiro de 2017), pelo Prof. José Ferro e pela Dr.ª Marta Carvalho Dezembro de 2016 | 5
News in Focus
Contra o AVC, comunicar, sensibilizar e alertar
-X
outros associados: Prof. José Castro Lopes, Prof.ª Patrícia Canhão, Prof. Vítor Tedim Cruz, Prof.ª Elsa Azevedo, Dr. Miguel Rodrigues, Dr.ª Carla Ferreira, Dr. Alexandre Amaral e Silva, Dr.ª Sandra Alves, Dr.ª Rita Lopes da Silva, Dr. João Pedro Marto, Dr. João Pinho, Prof.ª Ana Catarina Fonseca, Dr. António Pinto Camelo, Dr. Fernando Pita, Prof.ª Ana Verdelho e Dr.ª Isabel Henriques. Estes profissionais têm sido os porta-vozes da SPAVC em diferentes meios de comunicação generalistas e espe‑ cializados, nacionais e regionais.
Raio
sou de 2 980 para 4 455 (à data de 22 de de‑ zembro), um acréscimo de 1 475 seguidores em seis meses. Ao nível mediático, foram con‑ tabilizadas 206 referências à SPAVC, corres‑ pondendo a 13 presenças em televisão, 4 em rádio, 28 em artigos impressos e 161 online.» Nestas ações de comunicação, a SPAVC tem dado a conhecer o seu âmbito de atu‑ ação através da divulgação de iniciativas próprias como o parecer sobre a intervenção endovascular no AVC isquémico agudo, a 14.ª Reunião da SPAVC, a 7.ª Reunião Nacional de Unidades de AVC e as atividades promovi‑ das no Dia Mundial do AVC. «A SPAVC tem-se afirmado também como fonte de excelência na comunicação de temas e patologias as‑ sociados ao AVC, aproveitando algumas efe‑ mérides, nomeadamente o Dia Mundial do Cérebro, o Dia Mundial da Obesidade, o Dia Mundial da Alimentação e o Dia Mundial da Diabetes», acrescenta Patrícia Rebelo. O trabalho permanente de assessoria me‑ diática desenvolvido desde junho contou com o envolvimento de vários elementos dos órgãos sociais da SPAVC, bem como de
eb elo , da
D
esde a sua fundação, em março de 2005, a Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral (SPAVC) tem entre os seus principais objetivos contribuir para a preven‑ ção e a redução da mortalidade e da incapaci‑ dade provocadas pelo AVC, envolvendo a po‑ pulação. Neste sentido, tem vindo a promover sessões de esclarecimento gratuitas, campa‑ nhas de sensibilização e outras ações dirigidas à população um pouco por todo o País. Em junho deste ano, a SPAVC avançou com um serviço profissionalizado de assessoria mediática e gestão dos seus canais de comu‑ nicação próprios (website, Facebook, Twitter, LinkedIn e Instagram). Os principais objetivos desta aposta passaram por conseguir «uma comunicação mais assídua, planeada e de na‑ tureza variada com os profissionais de saúde e com a população, alcançando um público mais amplo por intermédio dos meios de co‑ municação social», afirma Patrícia Rebelo, da Raio-X, a empresa que assegura a assessoria de comunicação da SPAVC. Os resultados já são bem visíveis, segundo esta responsável: «Só no Facebook, o número de “gostos” pas‑
R ia ríc Pat
Manuais dirigidos à população e aos jornalistas
P
O essencial sobre
Acidente Vascular Cerebral (AVC) Guia Prático para a população
6 | Stroke.pt
or ocasião do Dia Mundial do AVC deste ano (29 de outubro), a SPAVC apresentou e distribuiu duas novas publicações sob a sua chancela, com edição da Raio-X: O Essencial sobre Acidente Vascular Cerebral, um guia prá‑ tico dirigido à população, e Tudo o que Precisa de Saber sobre Acidente Vascular Cerebral, um manual digital para jornalistas. «Há ainda muitas pessoas que desconhecem os sinais de alarme e os procedimentos em caso de suspeita de um AVC. Neste sentido, a SPAVC aproveitou o Dia Mundial do AVC, altura em que há maior atenção mediática e maior rece‑ tividade do público em relação ao tema, para distribuir dois formatos informativos que vi‑ sam ajudar a melhor prevenir e tratar o AVC», defende Patrícia Rebelo, da Raio-X.
Definição, sintomas e sinais de alerta, fatores de risco, epidemiologia, sequelas e complicações do AVC são alguns dos tópi‑ cos abordados no guia dirigido ao público em geral. Por sua vez, o manual digital para jornalistas foi apresentado à comunicação social pelo Prof. Miguel Viana Baptista, di‑ retor do Serviço de Neurologia no Centro Hospitalar Lisboa Ocidental/Hospital de Egas Moniz e coordenador científico do projeto, em vésperas da efeméride. «O objetivo destas iniciativas passa pela di‑ vulgação de informação credível e cienti‑ ficamente certificada sobre este problema de saúde pública, e por contribuir para o aumento da literacia em Saúde», remata Patrícia Rebelo.
Liga NOS «jogou» no alerta para os sinais do AVC
T
endo em conta a elevada exposição mediática do futebol, o Serviço de Neu‑ rologia do Hospital de Egas Moniz (HEM), em parceria com o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental (CHLO), em parceria com a Nova Medical School/Universidade Nova de Lisboa, a Sociedade Portuguesa do Aci‑ dente Vascular Cerebral (SPAVC) e a Socie‑ dade Portuguesa de Neurorradiologia de Intervenção, criou uma campanha con‑ junta com a Liga Portuguesa de Futebol Profissional/Liga NOS, de modo a sensibilizar a população para os principais sinais de alerta do AVC. «Este pode ser o jogo da sua vida» foi o nome dado à campanha que decorreu du‑ rante os nove jogos da 9.ª Jornada da Liga NOS, entre os dias 28 e 31 de outubro, en‑ globando assim o Dia Mundial do AVC. A ini‑ ciativa dividiu-se em três componentes: «a entrada das equipas em campo com t-shirts alusivas ao Dia Mundial do AVC, banners pu‑ blicitários da iniciativa no alinhamento ini‑
cial das equipas e a leitura de um texto sobre AVC pelo speaker do estádio, antes de o jogo começar e no intervalo», explica o Dr. João Pedro Marto, interno no Serviço de Neurolo‑ gia no CHLO/HEM. A iniciativa, baseada no slogan «Seja mais rápido que um AVC», teve como objetivo divulgar os sinais de alerta e a necessidade de ativação da Via Verde, através de uma chamada para o 112, em caso de suspeita de AVC. Para medir os resultados desta ini‑ ciativa, no futuro, tentar-se-á «saber se, após a campanha, os números de ativações do INEM e de vítimas de AVC que chegaram aos serviços através do 112 foram superiores ao habitual», esclarece o Prof. Miguel Viana Baptista, diretor do Serviço de Neurologia do CHLO/HEM. «Na 9.ª jornada da Liga NOS, 89 783 pes‑ soas viram os jogos nos estádios, havendo ainda um grande número de telespectado‑ res por jogo. Estima-se ainda que cerca de meio milhão de pessoas tenham assistido
Bolsa de investigação na área da doença vascular cerebral
A
SPAVC vai atribuir mais uma Bolsa de Investigação em Doença Vascular Cerebral, no montante de 5 000 euros. Com periodicidade anual, este apoio des‑ tina-se a financiar, total ou parcialmente, o melhor projeto de investigação cientí‑ fica na área da doença vascular cerebral a ser realizado, pelo menos em parte, em instituições portuguesas. As candidaturas à edição de 2017 podem ser enviadas por e-mail (secretariado@spavc.org), até dia 10 de janeiro. Segundo o presidente da SPAVC, Prof. Castro Lopes, «o júri terá em conta o in‑ teresse da candidatura, bem como o mérito científico dos candidatos e das
instituições participantes, de acordo com uma grelha de avaliação composta por critérios bem definidos pela SPAVC». De acordo com o responsável, a atribuição desta bolsa decorre do artigo 3.º dos Es‑ tatutos da SPAVC, o qual refere que esta Sociedade «tem um objetivo de cariz social, concretamente traduzido na pre‑ venção e educação sobre esta doença, mediante a criação de planos de ação e de apoio, identificando os níveis de inter‑ venção mais efetivos, assim contribuindo para a melhoria da saúde em Portugal». Mais informações sobre esta bolsa estão disponíveis em www.spavc.org/pt/informacoes/bolsas-e-premios-2.
aos jogos do Sport Lisboa e Benfica, do Fu‑ tebol Clube do Porto e do Sporting Clube de Portugal», sublinha João Pedro Marto. Dos 16 clubes da Liga NOS, 14 associaram-se à campanha e vestiram a camisola. Vários in‑ ternos de Neurologia, de norte a sul do País, também colaboraram na iniciativa, nos di‑ versos estádios.
Está a chegar a App da SPAVC
A
té ao final do corrente mês de dezem‑ bro, a SPAVC vai lançar a sua aplicação (App) para smartphones e tablets. O conte‑ údo será vastíssimo, incluindo toda a infor‑ mação presente no website da Sociedade, além de galerias de imagens e vídeos. Os utilizadores poderão também ter acesso a um feed de notícias sobre as novidades e iniciativas da área, bem como um calendá‑ rio constantemente atualizado de eventos nacionais e internacionais. Aquando do lançamento da aplicação, o conteúdo de grande destaque será o 11.º Congresso Português do AVC, que vai decorrer entre 2 e 4 de fevereiro próximo, no Sheraton Porto Hotel. À semelhança do que aconteceu em edições anteriores, através da App, a assistência terá acesso ao programa completo do congresso, a informações es‑ pecíficas sobre cada sessão e também sobre todos os preletores, entre outros dados. Para descarregar a aplicação, que é gratuita, basta aceder à Play Store, no caso dos dispositivos Android, ou à App Store, no sistema opera‑ tivo iOS. O projeto está a ser desenvolvido pela empresa RHP e conta com o apoio da Boehringer Ingelheim.
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Links
Entrevista
«Fazer com que todos os doentes com AVC recebam cuidados especializados é o principal desafio atual» Para a Prof.ª Valeria Caso, a falta de acesso a unidades de AVC e a disparidade entre os cuidados prestados em cada centro são ainda problemas que urge ultrapassar na Europa. Em entrevista, a presidente da European Stroke Organisation (ESO) fala sobre as iniciativas desta associação, com destaque para o processo de certificação das uni‑ dades de AVC, e elogia os especialistas portugueses pelo seu envolvimento em projetos internacionais. Luís Garcia
Quais as principais atividades em que a ESO está empenhada atualmente? Vamos iniciar o projeto do Inquérito Pan-Europeu, em cooperação com a European Academy of Neurology [EAN], a European Society for Minimally Invasive Neurologi‑ cal Therapy [ESMINT] e a Stroke Alliance for Europe [SAFE], que visa investigar a prática atual do tratamento endovascular do AVC e os sistemas de cuidados que o suportam. Uma task force destas entidades está a con‑ tactar todas as sociedades nacionais de AVC e Neurologia dos vários países europeus, para identificar todos os hospitais onde se 8 | Stroke.pt
trata o AVC na Europa. Depois, será enviado um questionário estruturado a todos estes hospitais para avaliar a disponibilidade de técnicas endovasculares.
Em que outros projetos a ESO tem estado envolvida? Iniciámos o projeto ESO-EAST, uma colabo‑ ração a cinco anos com médicos do Leste Europeu, com o intuito de otimizar e imple‑ mentar as melhores práticas no tratamento do AVC, instituindo uma cooperação mútua e produtiva com estes países [mais infor‑ mação em http://eso-stroke.org/eso-east].
Também estamos a preparar um registo de qualidade para o tratamento do AVC na Europa de Leste, em parceria com o Hospi‑ tal Universitário de Santa Ana, em Brno, na República Checa. Além disso, continuamos a atualizar as guidelines da ESO, que podem ser consultadas neste link: http://eso-stroke. org/eso-guideline-directory.
E em termos de reuniões, o que destaca das mais recentes? A mais recente foi a ESO-Karolinska Stroke Update Conference, que decorreu entre 13 e 15 de novembro passado, em Estocolmo.
O objetivo deste evento passou pela atua‑ lização de conhecimentos sobre a inves‑ tigação terapêutica na área do AVC, dando espaço à discussão sobre a forma de im‑ plementar estes resultados na prática clíni‑ ca. Foi também uma oportunidade para os participantes discutirem as novidades das guidelines da ESO sobre AVC e de inspirarem novas atualizações a estas recomendações. A reunião contou com cerca de 300 parti‑ cipantes, de 34 países. A European Stroke Organisation Conference [ESOC] 2016, que teve lugar em Barcelona, de 10 a 12 de maio, também foi um sucesso, com mais de 3 700 congressistas, provenientes de 97 países, e mais de 1 400 abstracts submetidos. Duran‑ te a sessão dedicada aos ensaios clínicos de grande dimensão, foram comunicadas três novas publicações no New England Journal of Medicine.
Quais as suas expectativas para a ESOC 2017, que terá lugar em Praga, entre 16 e 18 de maio? Em Praga, o novo Program Committee será composto, pela primeira vez, por um misto de colegas seniores e «jovens estrelas em ascensão», com o objetivo de criar um pro‑ grama científico que reflita melhor os inte‑ resses na investigação de todos os membros da ESO. No mesmo sentido, decidimos au‑ mentar o tempo dedicado às comunicações orais. O espaço alocado aos profissionais de saúde não médicos também será alargado a várias sessões ao longo do congresso, como reconhecimento do contributo e da impor‑ tância destes profissionais no tratamento e na investigação do AVC.
A ESO está também a trabalhar na certificação das unidades de AVC. Em que fase está esse processo? É com orgulho que a ESO está a criar a Pla‑ taforma de Certificação de Unidades e Cen‑ tros de AVC para as instituições europeias. Este projeto vai aumentar a confiança das comunidades na qualidade e na segurança dos cuidados prestados e dos próprios ser‑ viços. As unidades de AVC serão avaliadas por auditores, pelo ESO Stroke Unit Committee e por laboratórios. O resultado deste processo de certificação será incluído numa base de dados e disponibilizado no website da ESO.
Que importância assume a certificação? Este projeto visa melhorar a qualidade dos cuidados de saúde, reduzindo a variação de procedimentos clínicos, e providenciar um benchmark para a qualidade do tratamento do AVC. Será, na realidade, uma oportuni-
dade para que os profissionais de cada cen‑ tro possam melhorar as suas competências e aumentar o seu conhecimento.
Quais são os requisitos essenciais que um centro deve reunir para receber a certificação? A abordagem de uma equipa multidiscipli‑ nar implica que as unidades de AVC estejam dotadas de médicos, enfermeiros, fisiotera‑ peutas, terapeutas ocupacionais, terapeutas da fala, neuropsicólogos e assistentes sociais (incluindo um gestor de caso) com interesse particular, treino e experiência em cuidados aos doentes com AVC. Esta equipa multi‑ disciplinar deve trabalhar em conjunto, de modo organizado e sistemático.
Que imagem tem dos médicos que se dedicam ao AVC em Portugal? São muito ativos na ESO. Tenho uma longa amizade pessoal com o Prof. José Ferro, que integra o nosso Board of Directors e o Guidelines Committee. Também colaboramos com a Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral, nomeadamente com o Prof. Castro Lopes, que é membro da ESO. Além disso, há algumas «jovens estrelas em ascensão na ESO», como a Prof.ª Ana Catarina Fonseca e a Dr.ª Diana Aguiar Dias de Sousa, que es‑ tão a fazer um ótimo trabalho. A Prof.ª Ana Catarina está a trabalhar com o European Brain Council num projeto sobre o valor do tratamento do AVC, e a Dr.ª Diana está a tra‑ balhar, juntamente com o Prof. Urs Fischer, de Berna, no inquérito sobre as técnicas endovasculares.
Na sua opinião, quais são os maiores desafios atuais na abordagem do AVC? O principal desafio é que todos os doentes com AVC recebam cuidados especializados nesta área. Com base num relatório da autoria do Prof. Didier Leys, sabemos que apenas um em cada sete doentes com AVC na Europa é admitido numa unidade de AVC e 42% deles são tratados em hospitais que não dispõem de instalações ou experiência para providen‑ ciar cuidados de qualidade a estes doentes.
Que desenvolvimentos espera para o futuro, nesta área? Do meu ponto de vista, haverá muito mais investigação na «vida após o AVC», ou seja, utilizaremos as tecnologias atuais para melhorar os resultados nos doentes que sofreram um AVC. Outro desafio será a pre‑ valência da demência vascular: precisamos de proteger os cérebros saudáveis com uma intervenção no estilo de vida, incluindo estí‑ mulos cognitivos.
Em que investigações está a trabalhar de momento? A minha principal área de interesse é o AVC nas mulheres. Estou a tentar aumentar o número de doentes do sexo feminino que participam em ensaios aleatorizados, para perceber se existe diferença no AVC entre os dois géneros ou se os resultados distintos que se verificam entre homens e mulheres se devem a diferenças sociais. Além disso, estou a trabalhar num ensaio clínico aleato‑ rizado e controlado sobre a realidade virtual no AVC agudo.
Mais sobre Valeria Caso Neurologista na Unidade de AVC do Hospital Universitário de Perugia e professora assistente de Neurologia na Universidade de Perugia, em Itália, foi também nesta instituição que a Prof.ª Valeria Caso concluiu o seu doutoramento, em 2003. Eleita presidente da European Stroke Organisation em 2014 e em funções desde 2016, a especialista está particularmente envolvida no projeto ESO-EAST, que visa melhorar e acelerar o tratamento do AVC nos países do Leste Europeu. Com mais de 200 artigos e capítulos de livros publicados, Valeria Caso já integrou o board editorial do Journal of Neurology, Neurosurgery & Psichiatry e fez revisão por pares em mais de 30 jornais internacionais, num total de cerca de 200 artigos. Esteve também envolvida em 20 ensaios multicêntricos e supervisionou várias teses de mestrado e diversos internatos. Atualmente, dedica-se ainda a projetos de investigação internacionais sobre dissecções da artéria cervical, coração e cérebro, hemorragia intracerebral e tratamento do AVC agudo. Esta neurologista tem particular interesse pelo estudo do AVC na mulher e está a trabalhar na elaboração de guidelines neste âmbito. Dezembro de 2016 | 9
scan
Reportagem
Trabalho de equipa no combate ao AVC
Equipa (da esq. para a dta.): Drs. Tiago Geraldes, João Garrido e Fábio Carneiro (internos), Drs. Cláudia Guarda, Ana Ribeiro e Miguel Grunho; Enf.ª Elisabete Domingues, Dr.ª Irene Mendes (diretora do Serviço de Neurologia), Enf.as Dina Silva e Elsa Pereira (enfermeira-chefe do Serviço de Neurologia), Dr. Miguel Rodrigues (coordenador da Unidade de AVC), Enf.as Edite Sanchez e Núria Moreira, Sónia Évora (assistente operacional), Dr. Francisco Antunes (interno), Dr. Pedro Pereira, Sofia Pinto (fisioterapeuta), Maria Almerinda Ferreira (assistente operacional), Enf.as Andreia Gomes, Carolina Soares e Inês Spínola
A funcionar em pleno desde fevereiro deste ano, a Unidade de AVC (UAVC) do Hospital Garcia de Orta (HGO), em Almada, coordenada pelo Dr. Miguel Rodrigues, constitui um estímulo para os profissionais do Serviço de Neurologia, que encontram ali uma oportunidade para dar resposta mais rápida e eficaz a estes doentes. Sandra Diogo
É
ao 6.º andar do HGO que nos dirigimos numa manhã soalheira de quinta-feira para falar com o Dr. Miguel Rodrigues. Prático e cordial, o coordenador da UAVC avisa-nos de que está a decorrer o processo de higiene aos doentes, pelo que não é pos‑ sível iniciar a visita imediatamente. Por isso, encaminha-nos para o gabinete, dando iní‑ cio a uma longa conversa, na qual fica claro o seu empenho para que todos os doentes recebam os melhores cuidados possíveis . «Esta Unidade foi pensada para fazer parte integrante do Serviço de Neurologia, permi‑ tindo que todos os profissionais contribuam para o seu sucesso. A nossa organização baseia-se num princípio de circulação de recursos, ou seja, eu sou o único médico des‑ tacado exclusivamente para a UAVC, mas to‑ dos os médicos que fazem urgência ou que têm doentes no internamento contribuem para o acompanhamento do doente com AVC agudo», começa por explicar Miguel Rodrigues. Na prática, isso significa o en‑ volvimento dos oito neurologistas e dos 27 enfermeiros que fazem parte do Serviço de Neurologia, além da assistência prestada por internos e do apoio ocasional de médi‑ cos externos e especialistas de outros Servi‑ 10 | Stroke.pt
ços, como a Neurorradiologia, a Neurocirur‑ gia, os Cuidados Intensivos, a Cardiologia e a Medicina Física e de Reabilitação. Na opinião do coordenador, o espírito de equipa e a entreajuda são os grandes fatores que distinguem esta Unidade. «É normal, mesmo fora do horário de traba‑ lho, discutirmos os casos entre nós e tomar‑ mos decisões conjuntas», revela. Só assim é possível dar resposta ao elevado número de doentes que recorrem ao HGO. «No ano passado, tivemos 1 200 internamentos por AVC em todo o hospital (isquémico, hemor‑ rágico ou por hemorragia subaracnoidea) e isso não permite que apenas uma estrutura consiga gerir todos os casos.» Ainda que a UAVC só esteja a funcionar em pleno desde fevereiro deste ano, o proje‑ to começou a ser desenhado em 2007, pela mão do anterior diretor do Serviço de Neu‑ rologia, Prof. Miguel Viana Baptista, e pelo Dr. Fernando Pita, que montaram, na altura, a primeira versão da Unidade. «Tratava-se de uma sala com apenas três monitores e as condições necessárias para fazer trombólise e vigiar os doentes. Não era o espaço ideal, mas foi o possível, porque a Via Verde do AVC já era uma realidade neste hospital, desde 2006,
e tínhamos de dar resposta ao doente numa fase aguda», lembra Miguel Rodrigues. Convidado em 2011 para coordenar a UAVC nos moldes atuais, só este ano é que o neurologista viu reunidas todas as condições para obedecer aos critérios de uma unidade deste género: quatro camas e um posto de trabalho para o médico e para o enfermeiro. «Atualmente, temos um espaço muito mais funcional, que permite não só continuar a acompanhar os doentes que chegam pela Via Verde do AVC, mas também dar resposta ao novo desafio da Urgência Metropolitana.»
Cuidados diferenciados Pela UAVC do HGO passam, maioritaria‑ mente, doentes em fase aguda, que neces‑ sitam de trombólise ou trombectomia, mas também são assistidos casos associados a outras patologias, como AVC hemorrágico, trombose venosa cerebral ou situações mais instáveis, que precisam de outros cuidados. «Nos casos mais comuns, o doente é admiti‑ do na Unidade e acompanhado pelo médico que o recebe na Urgência. Se ficar decidido que é uma situação com indicação para tra‑ tamento de fase aguda, o doente é tratado por esse clínico, monitorizado pelos enfer‑
meiros e o médico que está de urgência vai acompanhando a evolução», revela Miguel Rodrigues. Além da realização de uma TAC (tomogra‑ fia axial computorizada), tão precocemente quanto possível, os doentes fazem um eco-Doppler das carótidas e transcraniano, que podem ou não repetir no dia seguinte, ou uma ressonância magnética. «A intenção é sempre realizar os exames o mais rapida‑ mente possível, de modo a podermos defi‑ nir qual a melhor estratégia de tratamento e para que o doente também possa começar a fazer o levante o mais depressa possível, o que só traz vantagens para a recuperação», frisa o coordenador. Ainda que reconheça que todos os do‑ entes com AVC beneficiariam do acompa‑ nhamento numa unidade própria, Miguel Rodrigues admite que esse apoio diferen‑ ciado não é possível, pelo que «só são in‑ ternados os doentes que irão ter maior be‑ nefício». Isto significa que a UAVC está em constante dinamismo: os doentes apenas ali permanecem o tempo necessário para a estabilização, a monitorização e o tratamen‑ to, transitando, depois, para a enfermaria. «No entanto, foram definidos protocolos co‑ muns e existe um manual que todos os pro‑ fissionais conhecem e consultam para que os cuidados aos doentes com AVC sejam homogéneos, desde a Unidade até à enfermaria, para além, claro, das reuniões de serviço em que os casos são discutidos», destaca. A dificuldade de gestão de camas é, aliás, um dos grandes desafios para a boa gestão destes casos. «A admissão dos doentes é rá‑ pida, mas depois enfrentamos, por vezes, al‑ gumas dificuldades ao nível da celeridade na realização de certos exames e no momento da alta, uma vez que nem todos os doentes estão capazes de cuidar de si próprios após a estabilização. E há uma certa dificuldade em
Investigação em curso À semelhança do que acontece noutros hospitais da mesma dimensão, o Hospital Garcia de Orta está envolvido em vários ensaios clínicos na fase aguda do AVC. Há pouco tempo, terminou o estudo LIFE, que visava determinar a influência dos fármacos na fase de reabilitação, assim como em alguns registos, como o SITS (Safe Implementation of Treatment in Stroke). «Desde o início de 2015, estamos a participar, com 17 doentes, em dois estudos sobre o papel dos novos anticoagulantes orais no AVC isquémico embólico de fonte indeterminada, o RE-SPECT ESUS [Dabigatran Etexilate for Secondary Stroke Prevention in Patients with Embolic Stroke of Undetermined Source] e o NAVIGATE ESUS [Rivaroxaban Versus Aspirin in Secondary Prevention of Stroke and Prevention of Systemic Embolism in Patients With Recent Embolic Stroke of Undertermined Source]», explica Miguel Rodrigues, adiantando que os resultados de eficácia só devem começar a ser conhecidos daqui por mais algum tempo (os estudos devem prolongar-se durante mais dois anos). Para o coordenador da UAVC, estas investigações têm uma importância incontornável, já que, «a partir do momento em que ficar definido se os doentes precisam ou não de um anticoagulante, será possível tratá-los melhor». que a família os receba ou que sejam coloca‑ dos na Rede Nacional de Cuidados Continu‑ ados e Integrados ou noutra estrutura que os possa apoiar», refere Miguel Rodrigues.
Articulação com outros hospitais A UAVC presta apoio aos concelhos de Al‑ mada e Seixal, equivalendo a cerca de 340 mil habitantes. No entanto, de forma secun‑ dária, também recebe doentes com AVC do Barreiro e do Montijo, bem como alguns das zonas de Setúbal, Alcácer do Sal e Sesimbra, quando o Centro Hospitalar de Setúbal não consegue dar resposta. Mais raramente, e quase sempre no Verão, atende doentes da Grande Lisboa que estão a passar férias na zona de Almada. Integrado na Urgência Metropolitana de Lisboa, juntamente com o Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, o Centro Hospitalar de Lisboa
O Dr. Miguel Rodrigues realiza um eco-Doppler carotídeo cervical, para verificar o estado das artérias, num doente que sofreu um AVC
Central/Hospital de São José e o Centro Hos‑ pitalar de Lisboa Ocidental/Hospital de Egas Moniz, o HGO recebe ainda os doentes inse‑ ridos neste programa todas as sextas-feiras, entre as 8h00 e as 20h00, e, uma vez de qua‑ tro em quatro semanas, assegura também o fim de semana (desde as 8h00 de sexta-feira às 8h00 de segunda-feira). «Na fase aguda, a articulação com outros hospitais enfrenta uma dificuldade impor‑ tante: o transporte secundário dos doentes para a trombectomia. Mas este não é um problema específico do HGO – o tempo ne‑ cessário para conseguir uma ambulância é um desafio em todos os hospitais», classifica Miguel Rodrigues. Embora saliente que, no que diz respeito à transferência dos doentes para a sua área de residência, «a ligação en‑ tre hospitais funciona bem e é relativamente rápida», o coordenador alerta que alguns as‑ petos ainda precisam de ser acertados, no‑ meadamente em relação à forma e ao timing em que os doentes devem ser recebidos nos hospitais que os referenciaram inicialmente. «Tudo isto começou por ser definido por um despacho que estamos a cumprir, mas, em conversas entre nós, percebemos que há aspetos que podem e devem ser alterados», refere Miguel Rodrigues, apresentando, a tí‑ tulo de exemplo, o facto de alguns hospitais transferirem os doentes para os centros de referenciação para trombectomia sem a rea‑ lização de uma angio-TAC. «Alguns hospitais sentem que não têm os meios necessários para fazer o diagnóstico completo, mas, ao transferirem um doente sem realizar esse exame, podem fazer com que ele seja en‑ caminhado para um tratamento de que não Dezembro de 2016 | 11
scan
Reportagem
Números 8 neurologistas 3 neurorradiologistas 1 especialista em Medicina Física
e de Reabilitação
2/3 fisioterapeutas 1 interno de Neurologia por ano 3/4 internos de outras especialidades por trimestre
Apoiada por duas alunas do 4.º ano, a fisioterapeuta Sofia Pinto (ao centro) realiza alguns exercícios de reabilitação com um doente para ajudar à recuperação muscular
precisa – e isto merece maior reflexão por parte da Administração Regional de Saúde», alerta.
Aposta na reabilitação Com a constituição da Unidade, os profis‑ sionais dedicados ao tratamento do AVC sentem que prestam um acompanhamento privilegiado a estes doentes. «Conseguimos dar uma resposta muito mais célere e isso é um fator de motivação para toda a equipa, já que nos permite desenvolver um projeto de reabilitação a nível respiratório, motor e da deglutição», elucida Elsa Pereira, enfermeira-chefe do Serviço de Neurologia desde 2014. Para a também especialista em exercício, a in‑ terajuda entre os especialistas que lidam com estes doentes é essencial na sua recuperação. Por isso, além da estreita colaboração com os médicos, a equipa de enfermagem tem um «acordo de cavalheiros com os colegas da fi‑
sioterapia»: os enfermeiros tratam do levante do doente e das mobilizações na cama, e os fisioterapeutas dos exercícios fora do leito. «O nosso grande objetivo é tornar os do‑ entes o mais independentes possível, prin‑ cipalmente em relação à marcha, para que, a partir do momento em que vão para casa, possam ajudar nas transferências e a dar alguns passos», explica Sofia Pinto, fisiote‑ rapeuta na UAVC. Para que os resultados se‑ jam mais visíveis, estes profissionais tentam intervir logo nas primeiras 48/72 horas após o internamento, desde que o doente este‑ ja hemodinamicamente estável. «Quando atuávamos só no Serviço de Neurologia, era frequente o doente já ter adquirido algumas posturas que precisávamos de combater antes de iniciar a reabilitação propriamente dita», refere a fisioterapeuta. Apologista de que o trabalho realizado na fase aguda serve de alicerce para toda
Formação e protocolos Para a Dr.ª Irene Mendes, diretora do Serviço de Neurologia, a integração do Dr. Miguel Rodrigues na equipa tem constituído uma mais-valia na estrutura organizativa da UAVC, nomeadamente «através da articulação com a Medicina Interna, no estabelecimento de protocolos e na implementação das normas internacionais de cuidados aos doentes». Para dar resposta às exigências da Urgência Metropolitana, por exemplo, há um grupo de profissionais de Neurorradiologia, Neurocirurgia e Neurologia que se reúne periodicamente para discutir os casos e articular protocolos de cuidados quando o doente exige tratamento multidisciplinar. «A realização de trombectomia está definida num protocolo, assim como a alimentação dos doentes com disfagia, mas há outras regras de atuação que ainda estão em desenvolvimento, como os procedimentos para os casos em que é necessário realizar uma craniectomia descompressiva, que pressupõe a atuação conjunta com a Neurocirurgia, para que os doentes com AVC sejam diagnosticados precocemente e operados o mais depressa possível», refere Miguel Rodrigues. 12 | Stroke.pt
27 enfermeiros 4 camas na UAVC 14 camas na enfermaria 1 200 internamentos por AVC em 2015
114 internamentos na UAVC (fevereiro a agosto de 2016)
37 doentes submetidos
a trombectomia (janeiro a outubro de 2016)
51 doentes submetidos a
trombólise (janeiro a outubro de 2016)
a reabilitação posterior do doente, Sofia Pinto defende a existência de mais um fisio‑ terapeuta na UAVC, de modo a assegurar o tratamento diariamente a todos os doentes depois de terem alta (atualmente, o acom‑ panhamento é feito dia sim, dia não). No caso de alguns doentes mais jovens e com bom potencial de recuperação, articulamo-nos de modo a que sejam encaminhados para unidades de reabilitação mais inten‑ sivas, como é o caso do Centro de Medici‑ na de Reabilitação de Alcoitão», informa Miguel Rodrigues. Para o coordenador, o reforço de recursos humanos é a grande aposta para o futuro e o avanço que permitirá uma resposta ainda mais eficaz aos doentes com AVC. Algumas estratégias já estão em andamento: «Um projeto para o futuro imediato é a integração de um técnico de cardiopneumologia que possa fazer exames como o eco-Doppler ca‑ rotídeo e transcraniano mais precocemente e apenas com a supervisão dos médicos. Isso vai ser importante para os doentes da nossa Unidade e do Serviço de Neurologia, mas também para outros serviços, nome‑ adamente a Neurocirurgia e os Cuidados Intensivos», remata.
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KNOW-HOW Reuniões/formação
Do tratamento agudo à reabilitação Encontrar soluções para otimizar a atuação dos profissionais de saúde perante o doente com AVC, desde a fase aguda à reabilitação, foi o principal objetivo da 7.ª Reunião Nacional de Unidades de AVC, que decorreu no dia 21 de outubro passado, em Lisboa. Marisa Teixeira
O
tratamento agudo do AVC foi um dos temas em foco nesta Reunião, numa sessão em que, como explica o Prof. Vítor Tedim Cruz, diretor do Serviço de Neurologia da Unidade Local de Saúde de Matosinhos/Hospital Pedro Hispano e um dos moderadores, «foi abordado um conjun‑ to de temas críticos para a atualização do estado da arte da cadeia de cuidados na fase aguda do AVC». Segundo este especialista, «é importante refletir sobre todos os aspetos da organização de cuidados que condicio‑ nam o tempo entre o princípio dos sintomas e o início do tratamento». Também moderadora nesta sessão, a Dr.ª Carla Ferreira, coordenadora da Unidade de AVC do Hospital de Braga, acrescenta: «Discutiram-se igualmente as atuais con‑ traindicações para a trombólise endove‑ nosa, com vista a alargar a população-alvo deste tratamento, bem como a abordagem da hipertensão arterial e das complicações hemorrágicas na trombólise.» No âmbito da terapêutica endovascular do AVC agudo, foi traçado o retrato nacional da trombectomia pelo Dr. Manuel Ribeiro, neu‑ rorradiologista no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho. «Em Portugal, a Neu‑ rorradiologia de Intervenção, ainda sem redes de referenciação estabelecidas, efetuou apro‑ ximadamente 350 trombectomias em 2015», referiu. Em 2016, de acordo com este especia‑ lista, estima-se que se ultrapassem as 800. Na opinião de Manuel Ribeiro, «este au‑ mento do volume de doentes tratados está relacionado, sobretudo, com a maior dis‑ ponibilidade dos Centros de Neurointer‑
O Prof. Castro Lopes (ao centro) e o Prof. Pedro Cantista (à direita) moderaram a sessão dedicada à reabilitação dos doentes com AVC, que contou com as intervenções da Dr.ª Ana Alves e da Dr.ª Joana Almeida (à esquerda)
venção», embora «esta evolução não possa esconder uma necessidade de organização que conecte a rede atual das Unidades de AVC aos Centros de Intervenção Neurovas‑ cular, permitindo um acréscimo do número de doentes tratados». Por sua vez, a Dr.ª Isabel Fragata, neuror‑ radiologista no Centro Hospitalar de Lisboa Central/Hospital de São José, comentou as complicações durante e após a trombec‑ tomia, sendo o seu principal objetivo que «neurologistas e internistas percebam algu‑ mas das dificuldades que podem surgir nes‑ te contexto e como deverão ser resolvidas». Esta especialista frisou a importância da in‑ tervenção de uma equipa especializada para resolver estas complicações, muitas delas graves. «Não basta saber abrir uma artéria. Se esta for perfurada, há que saber resol‑ ver o problema – e isso só se consegue com
SABIA QUE… … na sequência dos ensaios clínicos publicados em 2015, as guidelines para o tratamento do AVC agudo da European Stroke Organisation-Karolinska e da American Heart Association/American Stroke Association passaram a incluir a trombectomia mecânica em doentes com oclusão de grande vaso? Nestes consensos, recomenda-se que o tratamento endovascular seja realizado em centros diferenciados, onde existem departamentos de Neurocirurgia, Neurologia (com Unidade de AVC), Unidade de Cuidados Intensivos e Neurorradiologia, devendo ser disponibilizado num regime de 24 horas, ao longo de sete dias por semana. 14 | Stroke.pt
formação específica, que requer uma curva de aprendizagem relativamente longa», defendeu. Nesta sessão, foram igualmente discutidos os critérios para trombectomia e o papel da imagem na decisão de interven‑ ção endovascular. Na última sessão, dedicada à reabilitação, o Prof. Pedro Cantista, especialista em Medi‑ cina Física e de Reabilitação (MFR) no Cen‑ tro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António e um dos moderadores, ressaltou três aspetos. «Em primeiro lugar, há um pro‑ gresso efetivo na tecnologia e na eficácia das diversas modalidades de cuidados de reabilitação do AVC. Por outro lado, estes cuidados ainda não estão suficientemente disponíveis para todos os cidadãos do País. Embora esse planeamento já tenha sido efetuado e organizado há mais de 14 anos, existem ainda dificuldades e até retroces‑ sos, como, por exemplo, na diminuição de camas de MFR nos hospitais. Finalmente, é necessário dar continuidade à reabilita‑ ção após a alta hospitalar, quer através de programas domiciliários, quer em unidades de ambulatório nas áreas dos doentes.» De acordo com Pedro Cantista, «alguns destes doentes vão necessitar de cuidados de MFR toda a sua vida e, caso isso não suceda, irão, inexoravelmente, sofrer uma regressão fun‑ cional, pelo que são necessários e cruciais programas de manutenção para muitos destes doentes».
AVC pediátrico em destaque As particularidades e os papéis da neurorradiologia e da neurossono‑ logia no âmbito do AVC na criança estiveram em foco na 14.ª edição da Reunião da SPAVC, que teve lu‑ gar em Lisboa, no dia 22 de outubro. Os avanços decorrentes de estudos levados a cabo no último ano estive‑ ram também em debate. Marisa Teixeira
«O
AVC é uma entidade mais rara na criança do que no adulto e as suas causas são mais diver‑ sificadas, sendo as doenças cardíacas, hema‑ tológicas, infeciosas e metabólicas as mais frequentes», alertou a Dr.ª Rita Lopes da Silva, neuropediatra no Centro Hospitalar de Lisboa Central/Hospital Dona Estefânia (CHLC/HDE). «A raridade do AVC em idade pediátrica difi‑ culta a realização de ensaios clínicos, por isso, a maior parte das recomendações terapêuti‑ cas resulta da extrapolação dos resultados de estudos realizados em adultos», explicou. Rita Lopes da Silva lembrou o facto de a Consulta Pediátrica de Doenças Neurovasculares do CHLC/HDE, única no País, acompanhar crian‑ ças e adolescentes que já sofreram um AVC ou que apresentam uma doença com risco elevado, de modo a instituir as medidas ne‑ cessárias para a sua prevenção. Em seguida, a Dr.ª Carla Conceição, neu‑ rorradiologista no CHLC/HDE, comentou
A Dr.ª Carla Conceição falou sobre o papel da neurorradiologia no diagnóstico do AVC na criança
que «a neurorradiologia tem um papel fun‑ damental no diagnóstico, na investigação da etiologia e no prognóstico do AVC em idade pediátrica, sendo a sua importância ainda maior pelo facto de várias situações clínicas mimetizarem a sintomatologia do AVC». Se‑ gundo esta oradora, «a imagem, sobretudo os estudos de ressonância magnética [RM] e angio-RM, pode dar informações sobre a possível etiologia». Além disso, «a RM pode fornecer informações úteis ao prognóstico, baseadas, por exemplo, nas características do AVC em fase aguda e na correlação com défi‑ ces a longo prazo». Por sua vez, o Dr. Manuel Manita, respon‑ sável pelo Laboratório de Neurossonologia
da Unidade Cerebrovascular do Centro Hos‑ pitalar de Lisboa Central/Hospital de São José, partilhou a sua experiência, nomea‑ damente na colaboração entre o seu grupo de trabalho, a neurossonologia e a neurope‑ diatria do CHLC/HDE. «São várias as doenças nas crianças que devem ser avaliadas com eco-Doppler e temos muita prática neste campo, especialmente em relação à drepa‑ nocitose, uma anemia de células falciformes relativamente frequente», referiu o orador. E assegurou: «Felizmente, esta relação entre a neurossonologia e a Neurologia pediátri‑ ca tem sido eficaz, com excelentes resulta‑ dos na prevenção primária e secundária do AVC.»
Estudos na área do AVC realizados no último ano «O estudo PATCH [Platelet transfusion versus standard care after acute stroke due to spontaneous cerebral haemorrhage associated with antiplatelet therapy] mostrou que a probabilidade de morte ou dependência aos três meses foi maior no braço de doentes submetido a transfusão», avançou a Prof.ª Ana Catarina Fonseca, neurologista no Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, na sessão dedicada aos avanços na área do AVC no último ano. E continuou: «No ensaio INCH [Fresh frozen plasma versus prothrombin complex concentrate in patients with intracranial haemorrhage related to vitamin K antagonists], observou-se uma normalização mais rápida do INR [international normalized ratio] nos doentes tratados com complexo concentrado de protrombina.» A preletora salientou ainda a publicação do THRACE (Trial and Cost Effectiveness Evaluation of Intra-arterial Thrombectomy in Acute Ischemic Stroke) e uma meta-análise que confirmou o benefício da trombectomia na maioria dos AVC isquémicos causados por oclusão de um vaso da circulação anterior proximal. Por sua vez, o Dr. João Diogo Pinho, neurologista no Hospital de Braga, destacou os estudos SPRINT (Systolic Blood Pressure Intervention Trial), que «demonstrou o benefício na prevenção primária de eventos cardíacos e morte cardiovascular com alvos mais baixos para controlo da pressão arterial», e HOPE-3 [Heart Outcomes Prevention Evaluation-3], «no qual o uso de estatina em doentes com risco vascular intermédio e sem dislipidemia se associou a uma menor incidência de AVC isquémico». Já na prevenção secundária, João Diogo Pinho evidenciou o estudo CREST (Carotid Revascularization Endarterectomy versus Stenting Trial), que revelou a equivalência do stenting e da endarterectomia carotídea em doentes com estenose carotídea severa, quanto à segurança do periprocedimento e a ocorrência de AVC ipsilateral a longo prazo. Dezembro de 2016 | 15
KNOW-HOW Reuniões/formação
Opinião
Resumo da conferência apresentada pela Prof.ª Elsa Azevedo na 14.ª Reunião da SPAVC, no dia 22 de outubro
Risco de TVP no AVC: atualização das recomendações significativa no TEP (OR=0,69) (95% IC 0,49-0,98) e na TVP (OR=0,21) (95% IC 0,15-0,29), sem efeito significativo na mortalidade ou es‑ tado funcional no seguimento. Houve, contu‑ do, um aumento significativo de hemorragia sintomática intracraniana (OR=1,68 95% IC 1,11-2,55) e extracraniana (OR=1,65 95% IC 1,0-2,75). Em conclusão, no doente com AVC agudo e mobilidade reduzida, poderá preve‑ nir-se a TVP com CPI, tanto no AVC isquémico como no hemorrágico, havendo particular vantagem neste último, e pode usar-se uma HBPM se houver baixo risco hemorrágico.
Prof.ª Elsa Azevedo Neurologista no Centro Hospitalar de São João, no Porto
A
trombose venosa profunda (TVP) é causa importante de morbimortali‑ dade no AVC, em grande parte pelo risco de tromboembolismo pulmonar (TEP). Estão em maior risco os doentes com AVC grave, imobilizados, desidratados, infetados, que tenham cancro, insuficiência cardíaca, obesidade e antecedentes de tromboem‑ bolismo venoso (TEV)1-3. O risco de TEV é maior na fase aguda do AVC2-3. A TVP pode ser sintomática em cerca de 5% dos doentes hospitalizados, mas pode ser detetada, mes‑ mo assintomática, em 18-73% dos doentes, usando eco-Doppler, ressonância magnética ou fibrinogénio marcado4,6. O TEV é, contudo, uma causa de morte e morbilidade potencialmente prevenível, sen‑ do essencial uma avaliação sistemática do seu risco na admissão do doente. Em geral, é considerado em risco um doente com dificuldade de locomoção que o impeça de ir sozinho à casa de banho7, além de se considerarem os fatores facilitadores enumerados acima. A prevenção da TVP pode ser feita por métodos não farmacológicos – compressão pneumática intermitente (CPI), além de me‑ didas gerais, como mobilização e hidratação, e farmacológicos, destacando-se a hepari‑ na de baixo peso molecular (HBPM). A CPI consiste numa compressão sequencial dos membros inferiores até à coxa, melhorando
o retorno venoso nas veias profundas para reduzir a probabilidade de trombose, e po‑ derá também estimular a libertação de subs‑ tâncias fibrinolíticas intrínsecas8. O maior estudo da CPI na prevenção do TEV no AVC foi o CLOTS 37, ensaio multicêntrico rando‑ mizado com grupo paralelo – abordagem habitual do centro versus esta abordagem acrescida de CPI. O objetivo foi determinar se o uso sistemático de CPI em doentes imo‑ bilizados por AVC reduzia o risco de sofrerem TVP e TEP, nos primeiros 30 dias. Utilizou-se CPI circunferencial sequencial com tecnologia de deteção do preenchimen‑ to venoso, para uma frequência de compres‑ são adaptada ao doente. O outcome primário foi a TVP poplítea ou femoral sintomática ou assintomática detetada nos exames de eco-Doppler do protocolo do estudo, ou qualquer TVP poplítea ou femoral sintomática ocorrida nos 30 dias e confirmada por imagem. Incluí‑ ram-se 2 876 doentes, mediana de 76 anos. O grupo tratado com CPI teve menor risco abso‑ luto de TVP proximal [3,6% (12,1% vs 8,5%)], e menor risco de TVP ajustado a fatores de confusão [OR 0,66 (IC 95% 0,51-0,84)]: -34% RR de TVP com CPI. Este efeito foi mais expressi‑ vo em doentes com hemorragia intracerebral (6,7% vs 17,0%, OR, 0,36; 95% [IC] 0,17–0,75). Foi ainda demonstrada diminuição da proba‑ bilidade de morte até aos 6 meses pós-rando‑ mização nos doentes alocados a CPI. Uma meta-análise9 de ensaios com hepa‑ rinas/HBPM em doentes não cirúrgicos, in‑ cluindo com AVC (n= 36 122 doentes), mos‑ trou que estes fármacos provocaram redução
Recomendações da European Stroke Organisation (ESO) para profilaxia do TEV em doentes imobilizados por AVC isquémico agudo9: N ão se recomendam meias de compres‑ são graduada para a prevenção da TVP; R ecomenda-se CPI sequencial até à coxa, que não deve ser usada se existirem úlce‑ ras nas pernas e deve ser usada com cui‑ dado em doentes já com TVP, insuficiência cardíaca, doença vascular periférica grave, ou confusão que leve a tentativa de levan‑ te não supervisionado, podendo resultar em queda e traumatismo; A anticoagulação profilática com HBPM deve ser considerada se o benefício da re‑ dução do risco de TEV for suficientemente elevado para contrabalançar o aumento de risco hemorrágico intra e extracraniano associado ao seu uso; É necessária mais investigação para tes‑ tar a eficácia da estimulação elétrica neuromuscular.
Recomendações da ESO para profilaxia do TVP em doentes com hemorragia intracerebral espontânea10: N ão se recomendam meias de compres‑ são graduada; R ecomenda-se CPI para melhorar o prog‑ nóstico e reduzir o risco de TVP nos do‑ entes com hemorragia intracerebral e imobilidade; N ão há evidência suficiente para esta‑ belecer recomendações fortes acerca de como, quando e a quem a anticoagulação poderá ser dada para prevenir o TVP.
Referências: 1) Kelly J, et al. Dehydration and venous thromboembolism after acute stroke. QJM 2004; 97: 293–296. 2) Dennis M, et al. for the CLOTS (Clots in Legs Or sTockings after Stroke) trials collaboration. The timing, extent, progression and regression of DVT in immobile stroke patients: observational data from the CLOTS randomized trials. J Thromb Haem 2011; 9: 2193–2200. 3) Dennis M, et al. for the CLOTS trials collaboration. Can clinical features distinguish between immobile patients with stroke at high and low risk of deep vein thrombosis? Statistical modelling based on the CLOTS trials cohorts. J Neurol Neurosurg Psych 2011; 82: 1067–1073. 4) Dennis M, et al. for the CLOTS trials collaboration. The timing, extent, progression and regression of DVT in immobile stroke patients: observational data from the CLOTS randomized trials. J Thromb Haem 2011; 9: 2193–2200. 5) McCarthy ST, et al. Low dose heparin as a prophylaxis against deep-vein thrombosis after acute stroke. Lancet 1977; ii: 800–801. 6) Kelly J, et al. Venous thromboembolism after acute ischemic stroke: a prospective study using magnetic resonance direct thrombus imaging. Stroke 2004; 35: 2320–2325. 7) CLOTS Trials Collaboration, et al. Effectiveness of intermittent pneumatic compression in reduction of risk of deep vein thrombosis in patients who have had a stroke (CLOTS 3): a multicentre randomised controlled trial. The Lancet 2013; 382(9891): 516-524. 8) Kohro S, et al. Intermittent pneumatic foot compression can activate blood fi brinolysis without changes in blood coagulability and platelet activation. Acta Anaesthesiol Scand 2005; 49: 660–64. 9) Dennis M, et al, for the ESO. ESO guidelines for prophylaxis for venous thromboembolism in immobile patients with acute ischaemic stroke. Eur Stroke Journal 2016; 1(1): 6-19. 10) Steiner T, et al. ESO guidelines for the management of spontaneous intracerebral hemorrhage. Int J Stroke 2014. 9(7): 840-855.
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KNOW-HOW Reuniões/formação
Sensibilização e formação no Dia Mundial do AVC A propósito do Dia Mundial do AVC, assinalado a 29 de outubro, decorreram iniciativas formativas e de sensibili‑ zação da população para a prevenção, o diagnóstico e o tratamento do AVC em várias localidades portuguesas, como Palmela, Setúbal, Braga e Coimbra. A necessidade de contrariar o sedentarismo, como forma de prevenir o AVC, foi uma das mensagens fortes deste ano.
Formação para profissionais em Palmela
ALGUNS ORADORES NO ENCONTRO: Dr.ª Cátia Carmona, Dr. Carlos Carvalho, Enf.ª Helena Matos, Dr. Rui Matos, Dr. Rui Guerreiro, Dr.ª Ana Fryxell, Enf.ª Marisa Biscaia, Dr. Rodrigo Vieira, Enf.ª Tânia Rocha e Enf.º José Manuel Severino
O
I Encontro Regional do Serviço de Neu‑ rologia do Centro Hospitalar de Setúbal (CHS)/Agrupamento de Centros de Saúde da Arrábida (ACES Arrábida) decorreu no dia 29 de outubro, em Palmela. Com o objetivo de debater o tema «Trilogia do AVC: diagnosti‑ car, tratar e prevenir», o encontro dirigiu-se a neurologistas, clínicos de Medicina Interna, enfermeiros dedicados à Neurologia e, em particular, aos especialistas de Medicina Geral e Familiar do ACES Arrábida.
Segundo o Dr. Rui Guerreiro, coordenador da Unidade de AVC (UAVC) do CHS, o Dia Mundial do AVC foi a «oportunidade ideal» para os médicos dos cuidados de saúde hos‑ pitalares e primários trabalharem em con‑ junto, numa colaboração estreita que consi‑ dera «fundamental». «Fizemos uma revisão das orientações mais recentes, numa pers‑ petiva hospitalar, com a intenção de abordar a prevenção primária e secundária do AVC. Houve ainda tempo para uma reflexão sobre
a necessidade do controlo dos fatores de risco clássicos, como a hipertensão arterial, a diabetes, a dislipidemia e a obesidade», refe‑ re o responsável. O Dr. Rui Matos, diretor do Serviço de Neu‑ rologia do CHS, reforça esta ideia, acres‑ centando a «necessidade de mostrar aos colegas de Medicina Geral e Familiar qual o procedimento efetuado no tratamento do AVC agudo e o funcionamento da Via Verde do AVC». Do ponto de vista da prevenção, este neurologista considera também «im‑ prescindível o controlo dos fatores de risco por parte dos cuidados de saúde primários e a necessidade de informar e corresponsabili‑ zar o doente pela prevenção». Durante a sessão, foram abordadas tera‑ pêuticas como a trombectomia endovascu‑ lar, «que tem revelado resultados de eficá‑ cia robustos», de acordo com Rui Guerreiro. O Dr. Miguel Rodrigues, coordenador da UAVC do Hospital Garcia de Orta, em Alma‑ da, abordou «as estratégias de tratamento da doença carotídea sintomática, nome‑ adamente a endarterectomia carotídea (como primeira opção de tratamento na maior parte dos casos) e a angioplastia da carótida (uma opção apenas para doentes selecionados)».
Dança e ginástica em Setúbal
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ambém no Dia Mundial do AVC, o Centro Hospitalar de Setúbal, em parceria com a Câmara Municipal de Setúbal, a SPAVC e a Liga dos Amigos do Hospital de São Ber‑ nardo, organizou uma ação de sensibiliza‑ ção para a prevenção do AVC. A iniciativa «Vamos prevenir: mexa-se!» teve lugar na Praça do Bocage, em Setúbal. Segundo José Manuel Almeida, enfermeiro-chefe no CHS, «os objetivos da iniciativa foram, fundamen‑ talmente, sensibilizar a população para a necessidade da atividade física e o seu im‑ pacto positivo na prevenção do AVC, alertar para os fatores de risco primários e secundá‑ rios e também para os sinais de alerta». José Manuel Almeida acrescenta ainda que é crucial «saber chamar e motivar as pessoas para a prática de exercício». Nes‑
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te contexto, decorreram aulas de Sh’Bam e ginástica aeróbica abertas a todos aqueles que quisessem participar. No final da ma‑ nhã, o enfermeiro fez um balanço positivo da iniciativa, mostrando-se satisfeito com a adesão da população às atividades. Anabela Resende, secretária da Direção da associação Portugal AVC, também esteve
presente. Esta sobrevivente de AVC considera importante «a participação da associação em iniciativas de sensibilização para a preven‑ ção» e salienta a necessidade de divulgação das «possibilidades de tratamento pós-AVC, sendo que muitas pessoas não sabem como obtê-lo, acabando por ver a sua reabilitação condicionada».
Na Praça do Bocage, em Setúbal, decorreram aulas de Sh’Bam e de ginástica aeróbica abertas à população
Bracarenses em movimento para serem «mais rápidos do que um AVC»
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ambém no âmbito das comemorações do Dia Mundial do AVC, mas na manhã de dia 30 de outubro, cerca de 1 200 pessoas encheram a Avenida Central, em Braga, para participar numa «corrida e caminhada vital contra o AVC», que teve como lema «seja mais rápido do que um AVC». Enquanto uns correram ao longo de nove quilómetros, ou‑ tros optaram pela caminhada de três, tudo em prol de uma boa causa. Esta ação de sen‑ sibilização contou ainda com a realização de rastreios a fatores de risco: os participantes tiveram a oportunidade de medir a glicemia, a pressão arterial e o índice de massa corpo‑ ral, além de obterem aconselhamento sobre as mudanças que deveriam adotar para ter um estilo de vida mais saudável. «Mais uma vez, a SPAVC, o Hospital de Braga, o Núcleo de Estudantes de Medicina da Universidade do Minho e a Câmara Mu‑ nicipal de Braga uniram esforços para levar a cabo esta “Corrida e caminhada vital con‑ tra o AVC”, com o objetivo de sensibilizar a comunidade para os riscos desta patologia
e a importância da sua prevenção, para a qual contribui a prática de exercício físico regular», salienta a Dr.ª Carla Ferreira, coor‑ denadora da Unidade de AVC do Hospital de Braga. Na opinião desta neurologista, a ter‑ ceira edição deste evento foi, mais uma vez, um sucesso, «com uma forte participação da população, na corrida, na caminhada e no rastreio». «Um balanço positivo que nos incentiva a continuar a realizar estas ativida‑ des nos próximos anos», sublinha.
Caminhada com a população em Coimbra
DR
Municipal No decurso da caminhada, os participantes encontraram o presidente da Câmara o do AVC prevençã à alusiva t-shirt uma m oferecera quem a , de Coimbra, Dr. Manuel Machado
S
ob a coordenação da Unidade de AVC do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC), também a «cidade dos es‑ tudantes» se juntou às celebrações do Dia Mundial do AVC, com uma sessão de infor‑
mação à população sobre esta patologia, se‑ guida de uma caminhada pela zona histórica da cidade. No dia 29 de outubro, pelas 9h00, o ponto de encontro foi a sala de aulas do Serviço de
Neurologia do CHUC, onde dezenas de pes‑ soas puderam assistir a uma sessão de escla‑ recimento, que, de acordo com o Dr. João Sargento Freitas, neurologista neste hos‑ pital, «teve como principal objetivo explicar brevemente a patologia cerebrovascular e a importância do seu tratamento precoce». Em seguida, os participantes juntaram-se para uma caminhada de oito quilómetros e, ao longo do percurso, foram sendo distribuí‑ dos panfletos a centenas de transeuntes que por ali passaram. «O balanço foi bastante po‑ sitivo, pois conseguimos transmitir as princi‑ pais mensagens a um número significativo de pessoas. É sempre relevante informar a população sobre os principais fatores de ris‑ co e os sinais de alerta do AVC, bem como proceder em caso de suspeita de um even‑ to», realça João Sargento Freitas.
SPAVC aderiu a campanha global
E
ste ano, a SPAVC aderiu à campanha do Dia Mundial do AVC promovida pela World Stroke Organiza‑ tion, que foi realizada em torno da ideia de que esta patologia tem tratamento. «Podemos melhorar vidas com mais alerta, acesso e ação» foi uma das mensagens transmitidas nesta ação, bem como informações relativas à patologia em causa, como, por exemplo, o facto de o atendimento especializado em Unidades de AVC aumentar a probabilidade de bom prognóstico em 14% ou o tratamento por trombectomia aumentar em 50% as probabilidades de um bom resultado.
KNOW-HOW Reuniões/formação
Portugal AVC apresentou-se em 1.º Encontro Nacional a claudicar. Há muito por fazer e expectati‑ vas que não são simples de concretizar, mas o caminho será certamente mais fácil se esti‑ vermos todos juntos», afirma.
Grupos de ajuda mútua e reabilitação
membros dos órgãos sociais: Prof. José Manuel Calheiros (presidente da Assembleia-Geral – AG), Prof.ª Elsa Azevedo (vice-presidente), Gisela Viana (secretária da AG), Ana Lúcia Rodrigues (vice-presidente da AG), Dr.ª Ana Alves (vice-presidente), Diana Wong Ramos (tesoureira), Edgar Mota (vogal do Conselho Fiscal), Anabela Resende (secretária da Direção) e António Conceição (presidente). Ausentes na foto: Dr.ª Juliana Sá (presidente do Conselho Fiscal) e Ana Santos (vogal do Conselho Fiscal)
PT.AVC – União de Sobreviventes, Familiares e Amigos ou, mais simplesmen‑ te, Portugal AVC. Assim se chama a associação apresentada publicamente no dia 5 de outubro deste ano, no Porto, durante o seu 1.º Encontro Nacio‑ nal, que contou com a presença de doentes, familiares e amigos, bem como médicos, fisioterapeutas e outros profissionais de saúde ligados a esta área. Cláudia Sobral Azevedo
A
ideia de constituir uma associação de sobreviventes de AVC surgiu da necessidade de unir pessoas que vivem diariamente com as sequelas desta doença, as suas famílias e cuidadores. «Sen‑ tia-se a falta de uma associação protago‑ nizada pelos próprios sobreviventes, com uma perceção única do problema, para que façam ouvir a sua voz», explica António Conceição, presidente da PT.AVC e, ele pró‑ prio, sobrevivente de um AVC. De acordo com o responsável, os principais objetivos da associação são «fomentar experiências locais, promover a criação de grupos de ajuda mútua, fornecer informação precisa, simples e de qualidade (através do website e do Facebook) e dar voz própria a estas pessoas na sociedade, junto de entidades públicas e privadas». O presidente da SPAVC, Prof. Castro Lopes, é um dos grandes entusiastas da criação da PT.AVC, que considera «uma feliz iniciativa». Lembrando que o AVC pode ser prevenido e tratado, Castro Lopes refere que se trata, so‑ bretudo, de «uma questão de relógio», pelo que é preciso reconhecer os sintomas e exi‑ 20 | Stroke.pt
gir o encaminhamento imediato para uma Unidade de AVC. Também o Prof. José Manuel Calheiros, presidente da Assembleia-Geral da PT.AVC e professor catedrático de Epidemiologia e Medicina Preventiva na Faculdade de Ciên‑ cias Médicas da Universidade de Beira Inte‑ rior, aplaude a iniciativa, com a qual sonha há décadas, mas mostra-se muito preocupa‑ do com o estado da prevenção do AVC em Portugal. «O Serviço Nacional de Saúde está
Este 1.º Encontro Nacional contou com a par‑ tilha de experiências internacionais de apoio a sobreviventes de AVC em Israel e Espanha. Em Barcelona, o Projeto Hospigam tem pro‑ movido grupos de ajuda mútua para pessoas que sofreram um AVC e querem partilhar in‑ formação, experiências, sentimentos, neces‑ sidades e estratégias de adaptação na fase pós-alta. Segundo a Dr.ª Inmaculada Bori, diretora da Unidade de Reabilitação Neuroló‑ gica e Dano Cerebral do Hospital Universitari de la Vall d’Hebron, esta intervenção grupal em hospital de agudos permite «romper o isolamento social, proporcionar suporte emo‑ cional e material, melhorar a autoestima e a qualidade de vida dos doentes». De 15 em 15 dias, os sobreviventes reúnem-se no hospital e debatem temas-chave, como a família, a sexualidade, a integração, as ajudas disponí‑ veis e os seus direitos. A sessão contou com intervenções sobre a reabilitação dos sobreviventes de AVC, a car‑ go da Dr.ª Ana Alves, especialista em Medi‑ cina Física e de Reabilitação, e do Prof. Vítor Tedim Cruz, diretor do Serviço de Neurologia da Unidade Local de Saúde de Matosinhos/ Hospital Pedro Hispano. Houve ainda tempo para os testemunhos de dois sobreviventes de AVC, Dário Madeira e Diana Ramos (mem‑ bro da Direção), e tomaram posse os órgãos sociais da PT.AVC para 2016/2019, nos quais se incluem sobreviventes, cuidadores e pro‑ fissionais de saúde de todo o País.
Quem é o presidente da PT.AVC? Há cerca de oito anos, António Conceição estava a trabalhar numa agência bancária, da qual era gerente, quando começou a perder força na perna e no braço direitos, sem perceber o que se passava. «Não conhecia os sintomas do AVC, mas os meus colegas chamaram o 112 e fui imediatamente assistido», recorda o presidente da Portugal AVC, hoje com 50 anos de idade. Esteve internado cerca de um mês e passou outros três num centro de reabilitação. Apesar das sequelas visíveis, a recuperação foi «muito boa», como reconhece. A sua determinação, a fisioterapia e a qualidade dos cuidados de saúde a que teve acesso foram determinantes. Voltou a trabalhar no banco e, hoje, adaptou-se a uma vida que considera praticamente normal. António Conceição quer ser mais um exemplo e lutar pelos direitos de todos os que, como ele, ganharam «uma espécie de euromilhões ao contrário».
Trombectomia e outros temas atuais no 11.º Congresso Português do AVC Nos dias 2, 3 e 4 de fevereiro de 2017, o Congresso Português do AVC vai regressar ao Sheraton Porto Hotel, para a sua 11.ª edição. O programa científico será abrangente, tocando vários temas controversos e atuais, desde a preven‑ ção à reabilitação, passando pela experiência nacional e internacional com a trombectomia. Rui Alexandre Coelho
Prof. José Ferro
Dr.ª Marta Carvalho
A
alteração do estilo de vida com vista à prevenção do AVC vai ser o tema em discussão na primeira sessão do Congresso. Para o Prof. José Ferro, pre‑ sidente da Comissão Científica e diretor do Serviço de Neurologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria, «nun‑ ca é de mais acentuar a prevenção, uma vez que 80% dos fatores de risco para o AVC são conhecidos». O desafio é o controlo efetivo destes fatores de risco, que implica mudanças comportamentais. Nesta mesa, serão toca‑ das três vertentes destas alterações: contro‑ lo nutricional (a cargo da Dr.ª Cátia Borges, nutricionista no Agrupamento de Centros de Saúde Grande Porto IV Póvoa de Varzim/ /Vila do Conde), a prescrição de atividade física (discutida pelo Prof. José Carlos Ribeiro, docente na Faculdade de Desporto da Uni‑ versidade do Porto) e a cessação tabágica (abordada pela Dr.ª Sofia Ravara, pneumolo‑ gista e responsável pela Consulta de Cessação
Tabágica do Centro Hospitalar Cova da Beira/ /Hospital Pêro da Covilhã). Ainda no primeiro dia, José Ferro destaca a conferência do Prof. Martin Holtkamp, coor‑ denador do Grupo de Epileptologia Clínica e Experimental do Hospital Universitário Cha‑ rité, em Berlim. Em foco estará a abordagem das crises de epilepsia durante o AVC, um tema não contemplado no programa cientí‑ fico dos anteriores congressos da SPAVC. José Ferro salienta também a mesa-redon‑ da «Controvérsias no tratamento do AVC agu‑ do», já no dia 3 de fevereiro, que contará com a experiência de médicos que «têm utilizado a trombectomia em várias situações, desde a dissecção até às oclusões distais». Nesta sessão, vão intervir o Dr. Antoni Davalos, di‑ retor do Departamento de Neurociências do Hospital Universitari Germans Trias i Pujol, em Barcelona; o Dr. Philip Bath, diretor do Depar‑ tamento de Neurociências na Universidade de Nottingham, no Reino Unido; o Dr. Manuel Ribeiro, neurorradiologista no Centro Hospita‑ lar de Vila Nova de Gaia/Espinho; e o Dr. João Reis, neurorradiologista no Centro Hospitalar de Lisboa Central/Hospital de São José.
Manter as bases do passado Segundo a Dr.ª Marta Carvalho, presidente da Comissão Organizadora e neurologista no Centro Hospitalar de São João, no Porto, esta edição do Congresso procurará manter a base dos anos anteriores. «Vamos cobrir as vá‑ rias vertentes de abordagem do AVC, desde a prevenção primária até à fase aguda. Falare‑ mos também das complicações, abordando não só a epilepsia pós-AVC e a deterioração cognitiva, mas também os fatores de risco e
a importância da reabilitação», resume. A re‑ lação entre a diabetes e o AVC isquémico, o sono como causa e consequência de AVC, a importância do risco vascular na deterioração cognitiva e a abordagem do doente com pa‑ tologia nos pequenos vasos serão outros te‑ mas abordados no Congresso. Na tarde do último dia, já depois da entre‑ ga de prémios, haverá lugar para o Curso de AVC na Fase Aguda, destinado, sobretudo, a internos de várias áreas nos primeiros anos de internato. A coordenação será da Dr.ª Carla Ferreira, coordenadora da Unidade de AVC do Hospital de Braga, e do Dr. Miguel Rodrigues, coordenador da Unidade de AVC do Hospital Garcia de Orta, em Almada. O 11.º Congresso Português do AVC não vai encerrar sem a habitual sessão de infor‑ mação à população. Marta Carvalho descre‑ ve este momento como «uma forma de in‑ tervenção na sociedade civil, no sentido de transmitir os conhecimentos científicos que permitam perceber a patologia, reconhecer os sintomas e saber o que fazer para evitar o AVC».
Algumas novidades lém dos habituais prémios para as melhores apresentações e cartazes, o 11.º A Congresso Português do AVC terá como novidade a atribuição do Prémio SPAVC 2017 destinado ao melhor trabalho de enfermeiros e técnicos na área do AVC; No último dia do Congresso, decorrerá o «Momento ESO», uma conferência de encerramento, na qual o Prof. José Ferro, membro do Guidelines Committee da European Stroke Organisation (ESO), vai refletir sobre a missão global desta instituição e o seu papel na abordagem do AVC enquanto problema mundial. Dezembro de 2016 | 21
KNOW-HOW Reuniões/formação
Despiste da fibrilhação auricular no pós-AVC Opinião
significativamente mais velhos; com mais extrassistolia supraventricular e mais runs de taquicardia auricular. O estudo CRYSTAL AF4 incluiu 441 doen‑ tes com 40 ou mais anos, sem história de FA e com AIT/AVC isquémico criptogénico nos últimos 90 dias. Estes foram randomizados a avaliação convencional ou a um DE im‑ plantável (que permite um registo contínuo do eletrocardiograma durante cerca de três anos). Aos seis meses, 1,4% dos doentes com avaliação convencional versus 8,9% com DE implantável apresentavam FA (p<0,001). Uma subanálise deste estudo verificou que a idade e o prolongamento do intervalo PR estavam independentemente associados à deteção de FA5.
Dr.ª Katya Reis Santos Cardiologista no Hospital da Luz Lisboa
A
fibrilhação auricular (FA) pode es‑ tar na origem de 20 a 30% dos aci‑ dentes vasculares cerebrais (AVC) isquémicos1. No nosso País, esta arritmia atinge 2,5% dos indivíduos com mais de 40 anos2. A FA pode apresentar-se de forma intermitente e assintomática, o que dificulta a sua identificação. Nestes casos, mo‑ nitorizações eletrocardiográficas contínuas e de longa duração têm maior probabilidade de assegurar a sua deteção. No con‑ texto dos sobreviventes de acidente isqué‑ mico transitório (AIT)/AVC isquémico, os estudos EMBRACE3 e CRYSTAL AF4 compro‑ varam a maior eficácia destas estratégias, comparativamente às convencionais, no diagnóstico da FA. O estudo EMBRACE3 incluiu 572 doentes com 55 ou mais anos, sem história de FA e com AIT/AVC isquémico de causa indeter‑ minada nos últimos seis meses. Os doen‑ tes foram randomizados a novo Holter de 24 horas ou à colocação de um detetor de eventos (DE) externo, com algoritmo auto‑ mático de deteção de FA, durante 30 dias. Aos 90 dias, 3,2% dos doentes com Holter versus 16,1% com DE externos apresenta‑ vam FA (p<0,001). Os doentes com FA eram
Importância da monitorização prolongada Recentemente, a European Society of Cardio‑ logy publicou novas guidelines para o con‑ trolo da FA, nas quais aborda a problemática da deteção de FA pós-AVC. Nos doentes com AIT/AVC isquémico, recomendam o despiste de FA com monitorização eletrocardiográfica de curta duração, seguida de monitorização eletrocardiográfica contínua durante pelo menos 72 horas (recomendação classe IB)1. Na ausência de documentação de FA com esta estratégia, referem que o uso de DE externos (não invasivos) de longa duração ou DE im‑ plantáveis devem ser considerados para do‑ cumentação de FA assintomática nos doentes com AVC (recomendação classe IIaB)1. Surge, assim, um sublinhar da importância de uma pesquisa mais ativa de FA nos sobreviventes de AVC, que inclui o recurso a monitorizações contínuas prolongadas. Idealmente, deveríamos selecionar os do‑ entes que mais beneficiam destas monito‑ rizações intensivas. Os estudos EMBRACE3 e CRYSTAL AF4,5 sugerem algumas característi‑ cas, mas os resultados de subanálises devem ser interpretados com cautela. Talvez mais do que privilegiar a seleção de um grupo, estes estudos reforçam um que não deve ser esquecido: o dos idosos. Na população geral, a prevalência de FA aumenta com a idade2 e o mesmo se verificou nos sobreviventes de
AIT/AVC isquémico, sendo este o único fator associado a deteção de FA em ambos os es‑ tudos mencionados3,4,5. Por outro lado, se a anticoagulação é con‑ sensual após deteção de episódios prolon‑ gados e frequentes de FA, o mesmo pode não ser verdade para episódios muito curtos e raros de FA numa monitorização inten‑ siva. Apesar deste facto, tanto no estudo EMBRACE3, como no estudo CRYSTAL AF4, a decisão terapêutica após deteção de FA foi deixada à descrição do investigador e asso‑ ciou-se a uma maior taxa de anticoagulação, traduzindo uma preferência por esta estraté‑ gia nestes doentes.
«Nos doentes com AIT/ /AVC isquémico, as novas guidelines da European Society of Cardiology recomendam o despiste de FA com monitorização eletrocardiográfica de curta duração, seguida de monitorização eletrocardiográfica contínua durante pelo menos 72 horas» No estudo CRYSTAL AF4, nos poucos do‑ entes (26) com informação quanto ao tempo máximo em FA por dia, 92% apresentavam FA de duração superior a 6 minutos (valor que, no estudo ASSERT, de monitorização prolongada em doentes com dispositivos cardíacos com elétrodo auricular, se asso‑ ciou a um risco acrescido de AVC isquémico ou embolia periférica [HR 2.49; 95% CI 1.28– –4.85; p=0.007])6. Fica então a mensagem das novas diretivas europeias para o contro‑ lo da FA (aprovadas pela European Stroke Organisation) para um uso de monitoriza‑ ções mais prolongadas (DE externos ou mes‑ mo implantáveis) no despiste de FA assinto‑ mática pós-AVC1.
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