N.º 7 | Ano 4 | Outubro de 2016 | Semestral | € 0,01
Revista oficial da Sociedade Portuguesa de Transplantação
Estabelecer pontes na transplantação Um programa extenso e abrangente, que abarca as diferentes áreas do transplante e não evita os tópicos mais controversos, vai marcar o XIII Congresso Português/XV Congresso Luso-Brasileiro/ /II Encontro Ibérico de Transplantação. O evento, que decorrerá de 13 a 15 de outubro, no Centro de Congressos do Porto Palácio Hotel, será também palco de uma ampla troca de experiências entre profissionais portugueses, brasileiros e espanhóis que se dedicam à transplantação Págs.16 a 23
A Dr.ª Susana Sampaio, presidente da Sociedade Portuguesa de Transplantação (SPT) desde o passado mês de abril, apresenta os principais planos para o triénio 2016-2019 e analisa a realidade nacional na área da transplantação, alertando para a carência de recursos humanos Pág.6
genda DATA
Evento
Local
+Info
4
ERA-EDTA CME Course (European Renal Association-European Dialysis and Transplant Association)
Berlim, Alemanha
descartes.aeycongresse.de
10 a 12
BeST16 – AST (American Society of Transplantation) + ESOT (European Society for Organ Transplantation) Joint Basic Science Meeting
Fort Lauderdale, EUA
esot.org
14 a 16
8th International NICE/EPITA (National Institute for Health and Care Excellence/European Pancreas and Islet Transplantation Association) Workshop
Genebra, Suíça
esot.org
24 e 25
11th ELTR (European Liver Transplant Registry) Workshop and 9th ELITA (European Liver and Intestine Transplant Association) Meeting on Liver Preservation and Machine Perfusion
Paris, França
esot.org
15th Annual Meeting of the STS (Swiss Transplantation Society)
Thun, Suíça
swisstransplantationsociety.com
The AST Cutting Edge of Transplantation (CEOT) 2017
Phoenix, Arizona, EUA
myast.org
26 a 29
43rd Annual Meeting of the European Society of Blood and Marrow Transplantation (EBMT)
Marselha, França
ebmt.org
27 a 31
2017 BANFF-SCT Joint Scientific Meeting (Banff Foundation for Allograft Pathology and Catalan Transplantation Society)
Barcelona, Espanha
sctransplant.org/ sct2017
6a8
Encontro Renal 2017
Hotel Tivoli Marina Vilamoura
spnefro.pt
7e8
Simpósio Internacional de Angiologia e Cirurgia Vascular
Porto Palácio Hotel
portovascularsymposium.com
22 a 25
Congresso Português de Cardiologia 2017
Palácio de Congressos do Algarve, Albufeira
spc.pt
29 a 3 maio
2017 American Transplant Congress (ATC)
Chicago, EUA
atcmeeting.org
24 a 26
TTS 2017 – 15th Transplantation Science Symposium
Victoria, Canadá
tss2017.org
27 a 30
IPTA 2017 – 9th Congress of the International Pediatric Transplant Association
Barcelona, Espanha
tts.org/ipta
3a6
54th ERA-EDTA Congress
Madrid, Espanha
era-edta.org
14 a 17
FOCIS (Federation of Clinical Immunology Societies) 2017
Chicago, EUA
focisnet.org
NOVEMBRO 2016
2017 JANEIRO 27 e 28 FEVEREIRO 23 a 25 MARÇO
ABRIL
MAIO
JUNHO
16 e 17
Lisbon Clinical Nephrology Update
Lisboa
lisbonclinicalnephrologyupdate.com
21 a 24
ASAIO (American Society for Artificial Internal Organs) 63rd Annual Conference
Chicago, EUA
asaio.com
2017 American Transplant Congress (ATC) 29 de abril a 3 de maio de 2017 | Chicago, EUA
2 | outubro 2016
DR
Dedicação e entusiasmo no novo mandato
Sumário
APONTAMENTOS 5 Portugueses venceram 11 medalhas nos Jogos Europeus para Dialisados e Transplantados 2016
E
ste número da TransMissão é o primeiro após a eleição da nova Direção da SPT, que, numa perspetiva de continuidade e revendo-se, com entusiasmo, no papel desenvolvido pelo anterior elenco diretivo, une vontades comuns de pessoas com origem nas diversas áreas da transplantação, pretendendo manter o papel ativo desta Sociedade na divulgação dos problemas que os profissionais enfrentam no seu dia a dia. O incremento do número de órgãos colhidos e de transplantes efetuados no primeiro semestre de 2016 traduz a dedicação das equipas de colheita e das unidades de transplantação, que continuam a lutar com a falta de recursos humanos. Esta Direção mantém o compromisso de estar atenta aos problemas que têm surgido devido à conjuntura económica, ter um papel ativo na sua divulgação e colaborar com as instituições oficiais, avançando com propostas para soluções. A Lei de Alocação de Órgãos necessita de revisão e atualização urgentes. Em abril deste ano, a SPT realizou um fórum sobre esta temática (página 14 e 15) que contou com a participação entusiástica de profissionais da área. A partir desta plataforma, torna-se premente avançar com propostas que permitam a alteração da lei. Esta edição da TransMissão é sobretudo dedicada ao XIII Congresso Português/XV Congresso Luso-Brasileiro/II Encontro Ibérico de Transplantação, que vai decorrer no Porto (páginas 16 a 21). A organização do I Encontro Ibérico foi um sucesso e esperamos manter esta relação com a nossa congénere Sociedad Española de Trasplantes com a realização do II Encontro Ibérico. Além disso, o XV Congresso Luso-Brasileiro será um momento importante na ligação que a SPT mantém, desde longa data, com a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos,
VOZ ATIVA 6 Entrevista com a Dr.ª Susana Sampaio, presidente da SPT desde abril IN VIVO 8 Reportagem sobre o Programa de Transplantação Hepática do Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António TransFORMAR 10 Prof. Alfredo Mota homenageado no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra 12 Destaques das iniciativas do Dia do Transplante 14 Cobertura do Fórum Aberto sobre Alocação de Órgãos 16 Debate sobre doação em vida no XIII Congresso Português/XV Congresso Luso-Brasileiro/II Encontro Ibérico de Transplantação 17 Estratégias para aumentar a doação 18 Imunossupressão nos casos de rejeição humoral 19 Avanços no tratamento da síndrome hemolítica urémica 20 Profilaxia das infeções fúngicas após transplante hepático 21 Decisões difíceis em transplante hepático
preservando a linha de desenvolvimento de boas relações com outras sociedades. Para este Congresso, procurámos selecionar temas atuais que, simultaneamente, fossem abrangentes e discutissem problemas do dia a dia dos profissionais. Esperamos que o evento promova uma verdadeira troca de experiências, prometendo, à partida, ser um sucesso, dado o número recorde de resumos enviados. Desejamos que esta edição da TransMissão seja mais um «momento» de ligação à nossa SPT e esperamos encontrá-los no nosso Congresso!
Susana Sampaio Presidente da Sociedade Portuguesa de Transplantação (SPT)
EM ANÁLISE ® HOJ 22INICIE Evolução CERTICAN recente da transplantação em Portugal, ANTECIPE OS BONS RESULT Brasil e Espanha
Órgãos Sociais da Sociedade Portuguesa de Transplantação (2016-2019)
... COM DOSE REDUZIDA DE ICN Assembleia-Geral E FUNÇÃO RENAL PRESERV Presidente: La Salete Martins (Porto) Certican 0,25 mg Branco) comprimidos, Certican 0,5e mg comprimidos, Certican 0,75 mgAlmeida comprimidos, Certican 1 mg comprimidos. Apresentações: Cada comprimido Vogais: Rui Filipe (Castelo Manuela (Porto) da rejeição de órgãos em doentes adultos com risco imunológico baixo a moderado que receberam um transplante alogénico renal ou cardíaco. Certican dev corticosteróides. Profilaxia da rejeição de órgãos em doentes que receberam um transplante hepático. No transplante hepático, Certican deve ser usado em assoc uma dose diária de 1,5 mg administrada duas vezes por dia (0,75 mg duas vezes por dia), para a população geral. É recomendada uma dose diária de 1,0 mg d com a dose inicial aproximadamente 4 semanas após o transplante. Os níveis-vale de everolímus no sangue devem ser cuidadosamente monitorizados em do Conselho Fiscal aterçoaproximadamente dois terços da dose normal para doentes com compromisso hepático ligeiro, para aproximadamente metade da dose normal para doentes da dose normal para doentes com compromisso hepático grave. A experiência existente é insuficiente para recomendar o uso em crianças e adolescente com hipersensibilidade conhecida ao everolímus, ao sirolímus ou a qualquer dos excipientes. Precauções/Advertências: Recomenda-se precaução com a coelho) e o regime(Lisboa) de Certican/ciclosporina/corticosteróides. Risco aumentado de desenvolvimento de linfomas e outros tumores malignos, particularmente da Presidente: Alice Santana para as infecções, especialmente com agentes patogénicos oportunistas (bacterianas, fúngicas, virais e por protozoários). Entre estas condições encontram-se progressiva (LMP) associada a vírus JC. Os doentes devem ser monitorizados quanto à hiperlipidémia. Certican foi associado com o desenvolvimento de angioed inibidores da ECA como co-medicação. Doses reduzidas de ciclosporina são necessárias para o uso em associação com Certican de modo a evitar disfunção Vogais: Inês Castro Ferreira e Carla Damas (Porto) de everolímus e ciclosporina, proteinúria e da função renal. O uso de Certican com ciclosporina em doentes transplantados renais de novo foi associado com au com uma exposição reduzida ao tacrolímus não conduziu ao agravamento da função renal em comparação com a exposição padrão ao tacrolímus. Não é recom
Direção Presidente: Susana Sampaio (Porto) Vice-presidente: Jorge Daniel (Porto) Tesoureira: Cristina Jorge (Lisboa) Vogais: André Weigert (Lisboa), David Prieto de la Plaza, Fernando Macário e Pedro Nunes (Coimbra)
Ficha técnica Propriedade:
ALTAMENTE EF PREVENÇÃ
fortes conhecidos do CYP3A4, a não ser que o benefício seja superior ao risco. Foi notificado um aumento do risco de trombose arterial e venosa, resultando em p Certican, tal como outros inibidores mTOR, pode prejudicar a cicatrização aumentando a ocorrência de complicações pós-transplante tais como a deiscência necessitar de mais cuidados cirúrgicos. A linfocele é o efeito mais frequentemente notificado em doentes transplantados renais e tem tendência a ser mais freque de derrame pericárdico e pleural aumenta em doentes transplantados cardíacos e a frequência de hérnias inguinais encontra-se aumentada nos doentes transp com elevado índice de massa corporal. A administração concomitante de Certican com um inibidor da calcineurina (ICN) pode aumentar o risco de síndrom induzida por INC. Foram casis6 dede doença pulmonarartigo intersticial 12.º, (DPI), tendo ocorrido alguns casos fatais. É necessário o ajuste de dose ou Publicação isenta de registo na ERC, ao abrigo do Decretotrombótica Regulamentar n.ºnotificados 8/99, junho, alínea intersticial. Verificou-se que o Certican aumentade o risco de novos casos de diabetes mellitus após1.ª transplante. As concentrações de glucose no sangue devem se Devem ser usadas medidas contraceptivas adequadas. Não deve ser tomado durante a gravidez a não ser que seja claramente necessário. Não deve ser usado de azoospermia e oligospermia reversível em doentes tratados com inibidores mTOR, Doentes com problemas hereditários de intolerância à galactose, defic Esfera das Ideias, Campo Grande, n.º 56, B everolímus com substratos do CYP3A4 e CYP2D6 que têm uma janela tomar esteLda. medicamento. Interacções: Deve ter-se precaução quando8.º se coadministra Edição: de rifampicina, rifabutina ou cetoconazol, itraconazol, voriconazol, claritromicina, telitromicina ou ritonavir, já que pode ser necessário alterar a dose de Certica João, eritromicina, fluconazol, fenitoína,219 carbamazepina, fenobarbital, bloqueadores218 dos canais de cálcio, inibidores da protease e fármacos anti-HIV. A utilização Tel.: (+351) 172 815 / (+351) 155 107 1700 - 093 Lisboa secundários muito frequentes (>10%) incluem infeções (virais, bacterianas e fúngicas), infeção do trato respiratório superior, infeção do trato respiratório infe urinário, associados à administração de Certican em associação com a ciclosporina em microemulsão e com corticosteróides incluem leucopenia, hiperlipidem EsferaDasIdeiasLda geral@esferadasideias.pt hipocaliemia, hipertensão,www.esferadasideias.pt acontecimentos tromboembólicos venosos, dor abdominal, vómitos, diarreia, náuseas, derrames pericárdico e pleural, leucopenia Sociedade Portuguesa de Transplantação10449_Press_Ilustration_205x280_afc.ai 1 10/03/16 17:24 dispneia, tosse. Os efeitos adversos frequentes (1 a 10%) sépsis, trombocitopénia, infeção de feridas, anemia, coagulopatia, púrpura trombótica trombocitop Direção: Madalena Barbosa (mbarbosa@esferadasideias.pt) trombóticas (incluindo púrpura trombótica trombocitopénica/síndrome hemolítica urémica), linfocele, epistaxes, tromboembolismo venoso, trombose do enxert Av. de Berna, n.º 30, 3.ºF 1050 - 042 Lisboa dor, dificuldade na cicatrização de feridas, pirexia, edema angioneurótico, acne, complicações de feridas cirúrgicas, pancreatite, proteinúria, necrose tubular rena malignos ou não especificados, neoplasias da pele malignas e não especificadas, erupção cutânea, mialgias, artralgia, edema periférico, hérnia da incisão. Os Marketing e Publicidade: Ricardo Pereira (rpereira@esferadasideias.pt) Tel.: (+351) 220 164 206 / 933 205 201 hipogonadismo masculino (diminuição da testosterona, aumento da FSH e LH), doença pulmonar intersticial, hepatite não infeciosa, perturbações hepáticas, icter As reacções adversas(lgarcia@esferadasideias.pt) raras (0,01 a 0,1%) incluem a proteinose alveolar pulmonar e vasculite leucocitoclástica. CER_RCM2014_03_IEC_v07 Medicamento s Coordenação: Luís Garcia contactar o titular da Autorização de Introdução no Mercado. Regime de Comparticipação: Escalão A. Data da última atualização: 03/2014. E-mail: secretariado@spt.pt
Website: www.spt.pt
10449_Press_Ilustration_205x280_afc.ai
1
10/03/16
17:24
Redação: Luís Referências: Garcia,1. Vitko Marisa Teixeira e Sandra Diogo S et al. Transplantation 2004; 78(10): 1532–1540. 2. Resumo das Características do Medicamento, data da última atualização 03/2014. 3. Tedesco-Silva H et a 5. Holdaas H et Susana al. Clin Transplant Vale 2008; 22:366-71. 6. Kovarik JM et al. Ther Drug Monit 2004; 26(5): 499–505. Design e paginação: Novartis Farma – Produtos Farmacêuticos S.A. | Sede Social: Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, n.º 10E, Taguspark, 2740-255 Porto Salvo | Pessoa Coletiva Colaborações:Capital AnaSocial: Luísa Pereira, João Xará (textos) e Rui Jorge (fotografia) € 2.400.000 | www.novartis.pt
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apontamentos
Portugal conquistou 11 medalhas nos Jogos Europeus para Transplantados e Dialisados
A
provar que nem só de futebol vivem os sucessos desportivos nacionais, cinco atletas portugueses trouxeram para casa quatro medalhas de ouro, duas de prata e cinco de bronze pela sua participação na 9.ª edição dos European Transplant and Dialysis Sports Championships, que decorreram em Vantaa, na Finlândia, de 10 a 17 de julho passado. As conquistas ocorreram nas modalidades de natação, ténis de mesa e ténis. Para Filipe Pinto, transplantado renal há 12 anos e repetente em jogos internacionais, esta segunda experiência não poderia ter corrido melhor: uma medalha de ouro nos 400 metros livres, uma de prata nos 100 metros costas e duas de bronze nos 100 metros livres e 200 metros estilos. «A natação ajuda-me a não ter uma vida sedentária, que é o pior que pode acontecer a um transplantado», salienta o atleta, que treina quatro ou cinco vezes por semana, durante uma hora e meia, no Clube Natação da Amadora. Também José Costa, transplantado renal e outro dos desportistas mais medalhados, encara o benefício do exercício físico como o grande incentivo para participar nestes eventos. «A natação é importante para manter a boa forma, melhorar a qualidade de vida e sofrer menos efeitos secundários dos imunossupressores», explica, garantindo que,
DR
Campeões na vida e no desporto (da esq. para a dta.): Cláudio Mendes, Miguel Monteiro, Luís Guedes, Filipe Pinto e José Costa
apesar de já contar mais de 30 anos de participação neste tipo de competições, não equaciona parar. Uma medalha de ouro nos 100 metros livres, uma de prata nos 50 metros costas e outra de 50 metros livres mostram que não tem motivos para pensar nisso. Mas nem todos estes atletas tiveram uma relação tão fácil com o desporto. No caso de Miguel Monteiro, galardoado com uma medalha de ouro na modalidade ténis pares (com Luís Guedes) e uma de bronze na versão singulares, que pratica esta modalidade desde os 10 anos, esta paixão esteve quase a ser interrompida quando foi submetido ao transplante de coração. «O ténis é um dos desportos mais exigentes fisicamente, por isso, disseram-me que não poderia conti-
nuar a jogar. Mas a verdade é que as graves perturbações do equilíbrio e da visão que tive a seguir à doença foram sendo atenuadas com a atividade física.» O espírito de resiliência é uma das mais-valias que Cláudio Mendes, vencedor na modalidade de ténis de mesa, vê nestes encontros internacionais. «Além de melhorar a nossa autoestima, pois sentimo-nos integrados na sociedade, existe o outro lado, quer cultural quer social, que é muito importante quando enfrentamos uma doença crónica. A partilha de experiências e conhecimentos é muito enriquecedora, porque percebemos que não estamos sozinhos e que, com o apoio de todos, tudo se torna mais fácil.»
Destaques do 26th International Congress of the Transplantation Society DR
Os Drs. Fernando Macário e Susana Sampaio representaram a Direção da SPT neste Congresso
A
cidade de Hong Kong, na China, acolheu, entre 17 e 23 de agosto passado, o 26th International Congress of the Transplantation Society, no qual foram debatidos temas basilares de toda a atividade de colheita de órgãos, transplantação e respetiva coordena-
ção. De acordo com o Dr. Fernando Macário, nefrologista e especialista em transplante renal no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, que foi um dos portugueses presentes no evento, «da ciência básica até aos mais diversos temas clínicos, nada ficou por abordar». «Discutiram-se as maiores novidades em termos de diagnóstico e de tratamento, com particular ênfase em estratégias de personalização da imunossupressão, e foram apresentados os mais recentes avanços da bioengenharia de órgãos e do campo da transplantação, vislumbrando-se um futuro, embora não muito próximo, de mudança de paradigma no tratamento das doenças terminais de órgão», avança Fernando Macário. Outro dos temas alvo de destaque em várias sessões do Congresso foi a lesão mediada por anticorpos, que continua a ser um dos problemas mais atuais da transplantação. «A ética da escolha na doação e na transplantação foi também debatida e constitui um tema da maior atualidade, principal-
mente num congresso realizado na China», comenta Fernando Macário. E prossegue: «Numa nação que divulga novas normas e regulamentação para a doação e a colheita de órgãos e pretende fugir à imagem das atrocidades cometidas com a colheita de órgãos em condenados à morte, sem qualquer respeito pelas mais elementares normas éticas, levantam-se vozes que reclamam a verificação eficaz desse cumprimento das regras éticas.» Entre os destaques nacionais neste Congresso, na ótica de Fernando Macário, figuraram «duas comunicações de grande qualidade» proferidas pelo Dr. Jorge Malheiro, nefrologista no Centro Hospitalar do Porto/ /Hospital de Santo António: «Preformed C1q-binding DSA are more clearly associated with adverse outcomes after HLA-incompatible kidney transplantation than DSA strength» e «Low access of highly-sensitized patients to kidney transplantation associated with virtual crossmatch using standard MFI threshold: data from Northern Portugal». |5
oz ativa
«Muitas unidades de transplantação estão a trabalhar no limite» Depois de três anos como vice-presidente, a Dr.ª Susana Sampaio preside à SPT desde o dia 2 de abril passado. Em entrevista, a nefrologista no Centro Hospitalar de São João, no Porto, adianta alguns dos projetos da atual Direção para o triénio 2016-2019 e alerta para as consequências negativas da escassez de recursos humanos com que se debatem algumas unidades de transplantação, como o desperdício de órgãos ou a falta de tempo para a investigação. Luís Garcia Olhando para os novos corpos sociais da SPT, que mantêm quase todos os elementos do mandato anterior, intuímos que este triénio será de continuidade. É assim? Os atuais corpos sociais da SPT foram constituídos numa perspetiva de continuidade, mas também com o objetivo de integrar elementos mais jovens e provenientes de outras áreas da transplantação além da renal, nomeadamente pulmonar e cardíaca. Que novidades estão previstas para este mandato? Gostaríamos de iniciar reuniões de consenso, nomeadamente para a elaboração de protocolos terapêuticos em algumas áreas que se têm vindo a desenvolver e cuja prática médica tem sofrido alterações, como a terapêutica da hepatite C, a síndrome hemolítica urémica atípica ou a dessensibilização, entre outras. Também gostaríamos de atualizar o nosso registo de sócios, promover a angariação de novos associados e criar um anuário da SPT. Existe ainda muito trabalho a fazer na organização das unidades de transplantação e dos gabinetes de coordenação, assim como na melhoria da lei de alocação de órgãos e na colaboração das nossas entidades com as de outros países, nomeadamente no desenvolvimento de um programa ibérico de doação cruzada. Pretendemos também manter as reuniões em formato de fórum para debater assuntos que afetam a atividade dos profissionais da 6 | outubro 2016
área, em particular a falta de recursos humanos. Tencionamos ainda organizar, em 2017, o 5.º Curso de Transplantação Renal, dirigido essencialmente a internos e jovens especialistas. Gostaríamos de contar com a colaboração da Sociedad Española de Trasplante [SET] neste curso, bem como noutro que equacionamos realizar alusivo à transplantação hepática. Também consideramos de grande importância a colaboração com a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos [ABTO]. Além da organização de reuniões e cursos, pretendem fomentar a formação e a investigação de outras formas? A diminuição do apoio da indústria farmacêutica, em virtude da conjuntura económica adversa que o País atravessa, afetou as bolsas da SPT para a investigação e a publicação. No entanto, como consideramos que a formação e a promoção da atividade científica dos colegas mais jovens constituem um dever de uma sociedade científica, a reformulação dos prémios da SPT parece-nos de grande importância. A proposta que levaremos a votação em assembleia-geral aponta no sentido de uma maior responsabilização dos vencedores pela verba recebida, fazendo depender do trabalho desenvolvido o pagamento parcelar dos prémios, mediante a apresentação de relatórios anuais financeiros e das atividades realizadas.
Como avalia o estado da investigação e da formação na área do transplante em Portugal? O nosso País deveria apresentar mais trabalhos neste campo, mas a investigação, sobretudo a clínica, necessita de dedicação e tempo. As unidades de transplantação lutam dia a dia com a falta de recursos humanos, o que torna difícil a realização de mais e melhor investigação. Em alguns países, o tempo laboral inclui horas dedicadas exclusivamente a esta atividade, mas tal realidade ainda está muito distante da nossa. O facto de o internato de Nefrologia incluir a valência de transplante faz com que os nossos internos adquiram ótima formação. Porém, seria desejável a existência de mais cursos e maior intercâmbio entre as várias unidades. Quais os principais obstáculos à melhoria dos números nacionais de colheita e transplantação? Há ainda muito a fazer em termos organizativos? As políticas de incentivo à transplantação devem ser mantidas, o que passa por garantir que as unidades de transplantação tenham os recursos humanos necessários para assegurarem a atividade assistencial. Muitas delas estão a trabalhar no limite. As unidades de cuidados intensivos também necessitam de mais recursos. A manutenção de um potencial dador consome tempo e recursos humanos, o que, em algumas unidades, pode ser um fator limitante para a sinalização dos dadores. A reorganização dos gabinetes de coordenação e a realização de reuniões entre os coordenadores hospitalares são também formas de estimular esta atividade, e a reestruturação das unidades de transplantação necessita de debate futuro. Ainda há um grande desperdício de órgãos em Portugal? Portugal tem taxas de colheita e de implantação que estão em linha com os melhores números internacionais. No entanto, ainda existe algum desperdício, na medida em que algumas unidades, por ausência de meios de diagnóstico disponíveis durante 24 horas (biópsia renal, nos casos de órgãos de critérios expandidos, por exemplo), rejeitam órgãos que, de outra forma, poderiam ser aproveitados. A alteração desta situação passa pela otimiza-
ção dos meios disponíveis com a implementação de uma escala metropolitana. A transplantação de dador vivo é uma solução? O que tenciona fazer a SPT para promovê-la? O número de doentes renais crónicos em lista de espera continua a aumentar. Como os órgãos de dador falecido disponíveis não suprem as necessidades, a transplantação de dador vivo poderá ajudar a ultrapassar esta carência. A promoção da doação através de campanhas é uma excelente forma de chamar a atenção da população e de levá-la a procurar mais informação. A SPT lançou uma campanha de promoção da doação, mas não houve outras iniciativas desde aí. Estamos disponíveis para colaborar em futuras campanhas, mas pensamos que o próximo passo deve partir da Tutela, dado que, muitas vezes, a divulgação destas iniciativas esbarra com os valores proibitivos dos meios de comunicação. Poderá ser possível alterar este panorama através de publicidade institucional. A formação dos profissionais de saúde também é importante para o incentivo à doação em vida. A SPT, em colaboração com o Instituto Português do Sangue e da Transplantação, pretende dar início à formação de profissionais que, não estando diretamente envolvidos na transplantação, estão em contacto com os doentes que podem vir a beneficiar de um transplante. Que importância atribui ao início da realização de transplantes com órgãos de dadores em paragem cardiocirculatória no nosso País? Os diversos centros nacionais estão preparados para efetuar este tipo de transplante? A alteração da legislação que permitiu a colheita de órgãos em coração parado poderá vir a ser mais uma alternativa para o incremento do número de colheitas. Nem todos os centros estão preparados para este tipo de colheita, dado que se, por um lado, implica uma logística montada 24 horas por dia, também requer a existência de equipas formadas para a aplicação de ECMO [oxigenação por membrana extracorpórea, na sigla em inglês]. Penso que, em termos de economia de meios e recursos, a existência de uma equipa em cada região (norte, centro e sul) poderá permitir um programa de colheita em coração parado com sucesso.
A não perder no Congresso O XIII Congresso Português/XV Congresso Luso-Brasileiro/II Encontro Ibérico de Transplantação, que decorrerá de 13 a 15 de outubro, no Centro de Congressos do Porto Palácio Hotel, vai ser o ponto mais alto da atividade da SPT em 2016. Susana Sampaio, que também preside à Comissão Organizadora, salienta alguns dos principais destaques: «Começaremos o Congresso pela apresentação do estado atual da transplantação, pela voz dos presidentes da SET e da ABTO e pelo responsável do Registo da SPT. A doação em vida e os problemas éticos associados, focando o dador altruísta, o comércio de órgãos e o impacto da Declaração de Istambul na transplantação serão também debatidos, em sessões que contarão com a participação do Prof. Rui Nunes, do Prof. José Medina Pestana e do Dr. Domingos Machado. Uma das manhãs será dedicada às infeções, nomeadamente as multirresistentes e as fúngicas, com destaque para a intervenção do Prof. Faouzi Saliba. Os novos fármacos disponíveis para o tratamento da hepatite C e o seu impacto no transplante serão abordados pela Dr.ª Maria Carlota Londoño, coordenadora dos protocolos de tratamento desta patologia em Espanha. Outros temas de grande atualidade abordados no Congresso serão a rejeição humoral e os protocolos de dessensibilização, apresentados, respetivamente, pelo Prof. Fernando Nolasco e pela Prof.ª Cristina Castro, bem como o transplante ABO incompatível, que será analisado pelo Dr. Leonídio Dias. Destaco ainda as sessões que vão debater as estratégias para aumentar a doação e as mais recentes novidades na transplantação. As comunicações orais e breves continuarão a ser um ponto alto da reunião, permitindo mostrar a atividade desenvolvida pelas várias unidades nacionais e internacionais. No encerramento, destaque ainda para a entrega dos prémios, a apresentação dos trabalhos que receberam bolsas de investigação da SPT e o anúncio do próximo Congresso Luso-Brasileiro.» |7
vivo
EQUIPA (da esq. para a dta.): Fila da frente: Prof.ª Helena Pessegueiro, Dr. Vítor Lopes, Dr. Jorge Daniel (diretor), Dr. Rui Almeida, enfermeira Rosário Caetano Pereira e enfermeira-chefe Fátima Morais. Fila de trás: Dr.ª Ana Ribeiro, Dr.ª Rita Costa (internas), enfermeiros Fernando Nunes, Margarida Pinheiro, Adelaide Cruz e Marta Pala e Eugénia Vieira (secretária)
21 anos de transplante hepático com rigor e profissionalismo O Programa de Transplantação Hepática do Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António (CHP/HSA) comemorou duas décadas em 2015 e já conta com mais de 1 200 transplantes realizados. Para o diretor, Dr. Jorge Daniel, o reconhecido sucesso passa pelo forte sentido de responsabilidade e profissionalismo de todos os elementos da equipa. Sandra Diogo
A
reportagem num dos três centros nacionais de transplantação de fígado começa de modo inesperado. Chegados ao Hospital de Santo António, Jorge Daniel recebe-nos com um desafio: «Está a decorrer um transplante neste momento. Querem assistir?» É assim que tomamos contacto com a realidade destes profissionais – não há agenda e os planos podem sofrer constantes alterações. Por isso mesmo, o diretor não hesita em definir algumas características essenciais para se poder fazer parte deste grupo: «É preciso gostar muito desta área, porque ninguém consegue ser bom se não gostar daquilo que faz, mas depois há outros aspetos particulares que são incontornáveis, como ter uma capacidade de abnegação muito grande, já que a transplantação não é uma atividade programada.» A dirigir o Programa de Transplantação Hepática desde julho de 2009 e a Unidade de Transplantação Hepática e Pancreática desde 2010, Jorge Daniel já está habituado às exigências da profissão, até porque faz parte da história da transplantação hepática do CHP/ /HSA desde o seu início. Então com 32 anos e acabado de terminar a especialidade, foi um dos que acompanharam o Dr. Mário Centeno Pereira e o Dr. Vítor Ribeiro quando o Programa se começou a desenhar, em 1993, culminando com a realização do primeiro transplante de fígado, no dia 25 de maio de 1995. «Sou o único sobrevivente da equipa cirúrgica que iniciou este projeto», revela Jorge Daniel, sem esconder a emoção que isso lhe proporciona. Desde então, tem sido assegurada uma média de 60/70 transplantes por ano. «Este doente que está a ser transplantado [foto da página ao lado] sofre de paramiloidose. A causa do transplante foi o insucesso da terapêutica médica com tafamidis. O fígado deste doente vai ser utilizado noutro recetor, portador de uma doença maligna primária de fígado», explica o especialista. 8 | outubro 2016
Números 1 230 transplantes hepáticos realizados desde 2009
5 0 candidatos constituem a lista de espera atual 5 0/60 anos é a faixa etária da maioria dos doentes submetidos a transplante
1 2 camas de internamento distribuídas por 3 enfermarias 5 28 consultas pré-transplante* 1 568 consultas pós-transplante* *Primeiro semestre de 2015
Até há cerca de cinco anos, 30% dos doentes transplantados eram portadores de paramiloidose, uma vez que o transplante constituía a única esperança de cura para estes doentes. «Com o aparecimento de fármacos, nomeadamente o tafamidis, cujo objetivo é atrasar a progressão da doença, o número destes doentes diminuiu bastante. No entanto, como os resultados parecem não ser aqueles que se esperava, é provável que este número volte a aumentar», alerta Jorge Daniel, acrescentando que as cirroses causadas pela infeção por vírus B ou C e as de origem alcoólica são outras patologias frequentes nos recetores de transplante hepático.
Para que o Programa de Transplantação Hepática funcione, é necessária a colaboração de especialistas de diversos serviços: além do grupo de cirurgiões, anestesistas e internistas, conta com o apoio da Unidade de Cuidados Intensivos, da Psiquiatria, da Neurologia, da Hematologia e da Radiologia de Intervenção. Aos internistas (Prof.ª Helena Pessegueiro, Dr.ª Sofia Ferreira, Dr. Vítor Lopes e Dr.ª Judit Gandara) cabe acompanhar os doentes no pré e no pós-operatório. «Na consulta de doenças hepáticas, atendemos pessoas referenciadas por todos os hospitais da zona norte, com doença de foro hepático compensada ou descompensada. Os doentes com indicação potencial para transplante hepático são submetidos a uma pré-avaliação, que inclui uma variedade de exames e consultas de outras especialidades. Na parte final deste processo, o doente é apresentado em reunião multidisciplinar», elucida o Dr. Vítor Lopes, internista integrado neste grupo desde 2009. A partir desse momento, o doente entra em lista de espera ativa para transplante. «A lista ativa conta sempre com cerca de 50 doentes. São vários os fatores que levam à escolha do recetor a ser transplantado: compatibilidade ABO, peso, altura, gravidade da doença, tempo em lista de espera, entre outros», descreve Jorge Daniel.
«Saber de experiência feito»
Os Drs. José Davide, António Canha e Paulo Soares, acompanhados pela enfermeira Teresa Moutinho, realizam um transplante de fígado num doente com paramiloidose
O debate de ideias e a troca de experiências entre os elementos da equipa é uma das mais-valias que contribuem para o sucesso do Programa de Transplantação Hepática do CHP/HSA. Essa é uma estratégia que, na opinião de Jorge Daniel, acaba por ter um contributo essencial para a melhoria dos serviços prestados. «Em termos de técnica cirúrgica, não tem havido grandes alterações, mas o que mais conta é a experiência e essa é a principal diferença que se nota nestes 20 anos de atividade.» Todos os elementos do Programa têm atividades formativas no estrangeiro, incluindo a participação em congressos internacionais, e a publicação de artigos em revistas científicas nacionais e internacionais faz parte do quotidiano da equipa. «Além disso, a nossa Unidade é procurada por elementos clínicos em formação. Recebemos dois médicos para estágios com duração de três meses, estando o calendário, neste momento, já preenchido até 2019», confirma o diretor. A participação em ensaios clínicos também é frequente, sendo o exemplo mais recente um estudo multinacional e multicêntrico sobre a profilaxia antifúngica no transplante hepático. O controlo de qualidade é auditado anualmente e
todos os dados reportados ao Registo Europeu de Transplantação Hepática e ao Registo Mundial da Transplantação Hepática na Polineuropatia Amiloidótica Familiar. Para o diretor, a luta pela melhoria é uma preocupação constante, sabendo que «os programas são institucionais e transversais ao longo do tempo». Nesse sentido, Jorge Daniel acredita que, um dia, vai deixar este Programa mais valorizado e com um grau de eficiência superior. «Antes de assumir esta responsabilidade, os doentes transplantados não tinham uma área própria, ou seja, depois de saírem dos cuidados intensivos, o internamento era feito no Serviço de Cirurgia Geral. Esta situação não era cómoda, provocando diversos constrangimentos, uma vez que estes doentes necessitam de cuidados de enfermagem e terapêutica bastante distintos. Quando fui convidado, manifestei muito o meu interesse em ter uma área própria para a transplantação e foi assim que surgiu a Unidade de Transplantação Hepática e Pancreática.» Apesar disso, o especialista admite que há um aspeto que gostaria de ver melhorado: o número de dadores, até porque «a equipa está dimensionada para transplantar muito mais doentes por ano».
Aspetos críticos para o sucesso do transplante Os riscos associados ao processo de transplante manifestam-se em vários momentos. «No imediato, e embora seja muito raro, pode acontecer o fígado nunca “arrancar”. Mas há outras preocupações, nomeadamente infeciosas. Nos aspetos técnicos, a trombose da artéria hepática é uma das complicações mais temíveis, porque obriga, quase sempre, a fazer um apelo nacional para um novo fígado», exemplifica Jorge Daniel. A transplantação constitui ainda um desafio para o anestesista que acompanha a cirurgia, «não só pela complexidade do ato médico, mas também dos próprios doentes que, em muitos casos, têm outras patologias associadas», sublinha o Dr. Simão Esteves, responsável pelo grupo de anestesistas do Programa de Transplantação Hepática. Para este especialista, que faz parte da equipa desde 1992, «é preciso ter em consideração não só as doenças cardiovasculares e respiratórias inerentes à doença hepática e que podem suscitar problemas no intraoperatório, como também as questões associadas à coagulação e às hemorragias extremas». No que diz respeito ao pós-transplante, as complicações infeciosas voltam a ser motivo de especial cuidado, até porque se está perante doentes imunossuprimidos, frequentemente com comorbilidades associadas, como diabetes, hipertensão arterial, obesidade e insuficiência renal. Por isso, o primeiro ano pós-transplante implica uma grande ligação ao hospital, com consultas que começam por ser quinzenais e depois mensais, até se espaçarem para semestrais. O número de consultas realizadas, cerca de 3 000 por ano, reflete a necessidade de manter uma consulta aberta a um universo de cerca de 700 doentes transplantados. |9
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Alfredo Mota homenageado pelos seus 40 anos de serviço no CHUC Os avanços na imunossupressão na transplantação renal estiveram em discussão no Encontro Científico de Urologia e Transplantação que decorreu a 23 de junho passado, no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC). No entanto, foi o reconhecimento da «carreira de dedicação» do Prof. Alfredo Mota, ex-diretor do Serviço de Urologia e Transplantação Renal, que motivou os aplausos ecoados numa sala repleta de colegas, familiares e amigos. João Xará
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sessão incluiu uma palestra do Dr. António Morais Sarmento, diretor clínico da Unidade de Hemodiálise do Hospital da Prelada, no Porto, sobre a transplantação renal em Portugal. Registando o aumento dos critérios de transplantação e de doação, bem como a redução progressiva do número de rejeições agudas, o especialista apontou as células estaminais como a «nova promessa» nesta área, mas lamentou a inexistência de novos imunossupressores. Segundo o Prof. Josep Campistol, diretor-geral do Hospital Clínic de Barcelona e também orador neste encontro, «nos últimos 15 anos, praticamente não houve melhorias na sobrevivência média dos doentes com transplante renal a longo prazo». O especialista alertou para o impacto negativo do tratamento imunossupressor a nível cardiovascular e para a morte do doente por cancro. «Precisamos de bons marcadores que nos indiquem o nível de eficácia da imunossupressão no controlo da resposta celular e humoral», defendeu. Neste quadro, o belatacept, que controla a ativação dos linfócitos T e possui uma boa potência imunossupressora, «parece ter efeitos positivos no transplante renal, sem nefrotoxicidade».
Várias figuras de renome na área da Saúde, sobretudo ligadas à transplantação ou à Urologia, fizeram questão de marcar presença na homenagem a Alfredo Mota
Os três diretores do Serviço de Urologia e Transplantação Renal do CHUC: Alfredo Mota (2003 a 2016), Linhares Furtado (1967 a 2003) e Arnaldo Figueiredo (atual diretor, desde março de 2016)
Relativamente aos inibidores de mTOR (mammalian target of rapamycin), Josep Campistol considera que, apesar de estarem há 15 anos no mercado, não se tem feito justiça ao seu potencial. «Introduzimo-los de forma errada e, só recentemente, os usamos em contexto de imunossupressão preventiva, na fase inicial do transplante. Hoje, os inibidores de mTOR parecem a melhor estratégia para os transplantes a curto e longo prazo», admitiu o nefrologista espanhol. O momento mais emotivo da sessão foi o reconhecimento de quatro décadas de trabalho de Alfredo Mota no CHUC, cujo Serviço de Urologia e Transplantação Renal dirigiu durante 13 anos. Ao Prof. Arnaldo Figueiredo, seu sucessor desde 19 de março deste ano, coube apresentar a vida e os feitos profissionais de Alfredo Mota. «No seu mandato, fomentou a cirurgia laparoscópica neste que é o único Serviço português certificado pelo European Board of Urology», sublinhou. A «identidade clara» que imprimiu no CHUC e a equipa multidisciplinar que criou foram alguns dos pontos destacados por Arnaldo Figueiredo. A homenagem juntou colegas, amigos, familiares e médicos que ocuparam os corredores e degraus da sala de conferências. Alfredo Mota recordou que, em sua casa, tudo girava à volta do seu pai, o Dr. Ângelo Mota, e que, com ele, conheceu o mundo da Urologia. Revêse na frase de Ortega y Gasset – «Nós somos nós e a nossa circunstância» – e desenvolveu «arduamente, na educação e no trabalho», aquilo que herdou pela genética. Trabalhou ao lado do seu «mestre», o Prof. Alexandre Linhares Furtado, entre 1975 e 2003. «A ele devo a descoberta da transplantação e uma constante vigilância da ética e da técnica», admitiu. Alfredo Mota considera que o futuro reside nos órgãos artificiais, mas que o grande progresso seria «tornar a transplantação desnecessária».
Testemunhos sobre «um homem sensível e inteligente» Linhares Furtado, que antecedeu a Alfredo Mota na liderança do Serviço de Urologia e Transplantação Renal, invocou «um homem sensível, inteligente e de sentido de humor apurado». Por sua vez, o Dr. José Martins Nunes, presidente do Conselho de Administração do CHUC, destacou a sua liderança no processo de fusão dos dois Serviços de Urologia de Coimbra (Hospitais da Universidade de Coimbra e Hospital dos Covões) e o seu papel na creditação do Serviço como centro de referência nacional para o tratamento do cancro do testículo e na transplantação renal, em março de 2016. Na sessão de homenagem, estiveram também presentes os Drs. José Tereso, presidente da Administração Regional de Saúde do Centro, e Carlos Cortes, presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos. 10 | outubro 2016
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Mesa da sessão solene (da esq. para a dta.): João Cadete, vice-presidente da Associação Portuguesa de Insuficientes Renais; Fernando Vilares, presidente da Associação Portuguesa de Enfermeiros de Diálise e Transplantação; Ana França, coordenadora nacional de transplantação no Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST); Hélder Trindade, presidente do IPST; Fernando Jorge, presidente da Associação dos Doentes Renais do Norte de Portugal; Carlos Paula, representante da Novartis; e Susana Sampaio, presidente da SPT
8.º Dia do Transplante celebrou nova vida dos doentes Sob o tema da fotografia, tantas vezes presente para registar momentos felizes, doentes, familiares e profissionais ligados à área da transplantação celebraram o 8.º Dia do Transplante, assinalado a 20 de julho, no Parque Florestal de Monsanto, em Lisboa, partilhando imagens que marcaram a sua caminhada pelo processo de transplante. Sandra Diogo
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oi no rescaldo das grandes conquistas desportivas que marcaram a realidade nacional durante o mês de julho que a comunidade médica e a sociedade civil se juntaram para celebrar a vitória de outros campeões: os transplantados e respetivos dadores. Organizadas pela SPT, as ações comemorati-
A sessão solene do 8.º Dia do Transplante decorreu no Auditório do Centro de Interpretação de Monsanto, em Lisboa, e acolheu cerca de 150 pessoas
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vas do 8.º Dia do Transplante contaram com a participação de cerca de 150 pessoas, entre médicos e enfermeiros, profissionais do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST), doentes e familiares, que este ano se juntaram sob o lema da fotografia. «Normalmente, as pessoas tiram fotografias em situações de festa e, uma vez que muitas veem como um momento de felicidade o dia em que foram transplantadas, pensámos que o mote da fotografia seria uma boa oportunidade para os doentes transmitirem as suas emoções desse dia ou associadas à sua vida enquanto transplantadas», começou por explicar a Dr.ª Susana Sampaio, presidente da SPT. E como este é um processo a cuja carga emocional os profissionais médicos também não estão imunes, a própria SPT, através do seu anterior presidente, Dr. Fernando Macário, contribuiu para assinalar o momento, partilhando imagens dos festejos dos anos anteriores. «Ao longo destes anos, muitos acontecimentos marcaram a transplantação em Portugal. Os números tiveram altos e baixos e recuperam agora a um ritmo que desejo, sinceramente, que se mantenha ascendente. As equipas de coordenação, de colheita e também as de transplantação mantiveram sempre o seu esforço em prol da atividade, muitas vezes com condições longe das ideais e com dificuldades acrescidas por mudanças ao sabor da política e por reformas que tardam, mas, seguramente, vêm a caminho. Porém, a experiência das equipas no terreno permite que Portugal mantenha um nível destacado na transplantação dos diferentes órgãos com qualidade técnica e científica irrepreensível», salientou Fernando Macário.
Informação é vida Um dos objetivos da celebração do Dia do Transplante passa por estimular o convívio entre profissionais de saúde e sociedade civil, no sentido de desmistificar e esclarecer algumas dúvidas que ainda persistem sobre o processo de transplante. «A população deve habituar-se a discutir a transplantação e a aceitá-la como uma forma de tratamento. Isto visa a aceitação do recurso ao dador falecido, mas também à doação em vida», destacou o Prof. Hélder Trindade, presidente do IPST. A informação à população é encarada como particularmente importante pelos profissionais da área, na medida em que, se é verdade que o número de transplantes realizados em Portugal voltou a aumentar, também não deixa de ser uma realidade o crescimento das listas de espera. «Por um lado, somos um país com incidência elevada de diabetes e de hipertensão, muitas vezes não controladas, ou seja, doenças de base que levam à insuficiência renal. Por outro lado, como estamos a aproveitar dadores com cada vez mais idade, também temos o problema dos rins que não podem ser utilizados», justificou o presidente do IPST. Na opinião do responsável, estes encontros funcionam como uma oportunidade para esclarecer doentes e familiares sobre a importância de um estilo de vida saudável, do cumprimento dos tratamentos e do acompanhamento nos centros de saúde. «Se tivermos uma população mais saudável, é provável que daqui a alguns anos (muitos) comecemos a reverter a tendência atual», defendeu Hélder Trindade.
Como o Parque Florestal de Monsanto é território protegido, este ano, não foi possível realizar a já tradicional plantação da árvore da vida, mas esse gesto simbólico não deixou de ser assinalado: a planta foi sorteada, de modo a que o vencedor decidisse onde plantá-la. A contemplada foi Mafalda Vaz, que prometeu plantar a árvore no terreno do Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António, onde a avó foi transplantada.
Doentes e familiares esclarecidos são também uma mais-valia para o dia a dia dos enfermeiros que trabalham nesta área. «Um doente informado permite-nos dar mais atenção a aspetos importantes no pós-transplante imediato, como a monitorização e a prevenção das complicações pós-operatórias», exemplificou Fernando Vilares, presidente da Associação Portuguesa de Enfermeiros de Diálise e Transplantação.
Fé e força de vontade Sob o lema do 8.º Dia do Transplante, a SPT lançou o repto aos doentes de partilharem fotografias que ilustrassem a sua história como insuficientes renais. Ana Nogueira, Marcelo Brites, Alcinda Ascensão e Sofia Santos responderam ao apelo e subiram ao palco da sessão solene para mostrar algumas imagens representativas do seu percurso desde o início dos tratamentos até ao transplante. «O meu objetivo foi passar uma mensagem de esperança e mostrar como, mesmo nos momentos menos bons – que não são assim tão poucos –, é possível manter um espírito positivo e alegre. Podemos não ter cura, mas temos uma solução», realça Sofia Santos. Esta jovem partilhou com a TransMissão duas das fotografias que mostrou no dia 20 de julho: à esquerda, na sua primeira peregrinação a Fátima após o transplante (10 meses). Abaixo, no dia em que o Grupo Desportivo de Transplantados de Portugal, ao qual pertence, organizou uma iniciativa de agradecimento à Força Aérea, pelo seu importante contributo no transporte de órgãos para transplante.
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Critérios de alocação de órgãos sob escrutínio
Por iniciativa da SPT, cerca de 30 especialistas ligados à área da transplantação reuniram-se em Coimbra, para discutir a necessidade de alterar os critérios de alocação de órgãos que estão atualmente em vigor
Decorreu no dia 2 de abril deste ano, em Coimbra, o Fórum Aberto sobre Alocação de Órgãos, promovido pela SPT. Em discussão esteve a necessidade de se fazerem alterações ao despacho que regula a atividade desde 2007. Sandra Diogo
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ários especialistas da área da transplantação reuniram-se para falar sobre a urgência em rever alguns dos princípios orientadores da transplantação em Portugal, com particular enfoque nas áreas de Nefrologia, Hepatologia e Cardiologia. A discussão começou com a intervenção da Dr.ª Cristina Jorge, nefrologista no Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental/Hospital de Santa Cruz, que apresentou os resultados de um inquérito feito aos sócios da SPT sobre os atuais critérios de alocação de órgãos. As conclusões não deixaram margem para dúvidas e reforçaram a pertinência do encontro: a maioria não concorda, em geral, com o sistema em vigor. Esta nefrologista enumerou os aspetos controversos do atual despacho: «Privilegia-se em excesso o tempo de diálise; negligencia-se a compatibilidade HLA [antigénios leucocitários humanos, na sigla em inglês]; não se emparelha a longevidade do rim doado com a do recetor; protegem-se os hiperimunizados, mas sem suporte da compatibilidade HLA; e estimula-se o retransplante nas mesmas condições do transplante anterior.» Considerando que mais de 60% da perda de enxertos renais resultam da rejeição mediada por anticorpos e que os doentes hiperimunizados e retransplantados estão mais vulneráveis a esta situação, Cristina Jorge defendeu a revisão urgente destes critérios. Para suportar a sua opinião, a especialista relembrou os dados que relacionam a proporcionalidade entre a incompatibilidade dador/recetor e a percentagem de doentes com terapêutica antirrejeição nos primeiros três anos após transplante. No mesmo sentido, a incompatibilidade está associada a uma maior mortalidade, tanto por patologia cardiovascular, como por infeção (ainda que esse critério não tenha sido significativo nas neoplasias), e é rele14 | outubro 2016
vante na percentagem de doentes com fratura da anca, bem como na incidência de linfoma não Hodgkin, três anos após transplante. Da discussão ficou claro que os critérios atuais de eficácia, transparência e equidade não estão a ser completamente respeitados. «Há doentes que, com base no mesmo algoritmo, têm uma pontuação muito diferente, o que estabelece um critério de desigualdade. E algumas unidades transplantam muito mais doentes do que outras, sem que isso seja do conhecimento do doente porque não há transparência neste processo», alertou Cristina Jorge. Consensual entre os nefrologistas presentes foi a necessidade de alterar a importância dada ao tempo em diálise. Sobre este critério, a Prof.ª La Salete Martins, nefrologista no Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António (CHP/HSA), foi perentória: «É urgente rever esta situação porque há doentes que estão a ser
Números do coração Transplantações em 2014, na Europa – 2 146 Transplantes em Portugal, em 2015 – 20 Transplantes em Portugal, no 1.º trimestre de 2016 – 4 Transplantes realizados desde 2003, em Coimbra – 258 Percentagem de transplantes realizados em Coimbra – 60% Idade média dos dadores – 58 anos Esperança média de vida antes do transplante – 2 anos Esperança média de vida após o transplante – 10 anos
transplantados sem qualquer compatibilidade e nós sabemos que vão ter problemas a longo prazo, dado que terão maior risco de perda mais precoce do enxerto, de perda imunológica e de ficarem hipersensibilizados.» A especialista considera a pontuação de 0,1 por cada mês de espera em diálise excessiva e sugere mesmo «um valor de cerca de metade, pelo menos para indivíduos com até cinco anos de espera».
Importância de uma base de dados Para falar sobre a realidade dos hepatologistas portugueses tomou a palavra o Dr. Jorge Daniel, diretor da Unidade de Transplantação Hepática e Pancreática do CHP/HSA. Salientando que a doação de fígado no nosso País «é muito bem rentabilizada e com números só superados por Espanha», o especialista afirmou que o objetivo é continuar o bom trabalho, «alertando todos os hospitais para a existência de potenciais dadores, no sentido de não se perderem órgãos». Nesse contexto, e embora tenha admitido que os atuais critérios que regulam a transplantação de fígado «não estão a funcionar mal», o especialista defendeu uma revisão. Jorge Daniel salientou que, cada vez mais, há aceitação de dadores com critérios expandidos e deixou uma sugestão: «Há um critério em Espanha, que deveria ser adotado no nosso País, referente ao facto de o fígado que é retribuído dever ser da mesma década daquele que foi oferecido.» Sobre esta questão, o Dr. Emanuel Furtado, diretor da Unidade de Transplantação Hepática do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC), reforçou a importância da criação de uma base de dados que permita ter uma melhor perceção da realidade nacional. «Neste momento, cada região gere a sua lista de espera, mas seria benéfico fazer-se um registo – e é nesse sentido que uma lista única poderá ser uma mais-valia», sugeriu. «Até para se amenizarem as diferenças regionais que existem hoje e que são comuns aos três órgãos em análise nesta reunião.»
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A intervenção do Prof. Manuel Antunes, diretor do Serviço de Cirurgia Cardiotorácica do CHUC, veio reforçar a necessidade da criação de uma base de dados que englobe toda a informação sobre o processo de transplantação. «Na Europa, 21,4% dos órgãos doados são corações, mas, no nosso País, esse valor é de apenas 15%. Não acredito que a nossa população de dadores seja muito diferente da europeia, por isso, é preciso atuar para modificar estes números, até porque enfrentamos uma escassez de órgãos», alertou. Foi, aliás, face a essa realidade que Manuel Antunes defendeu a alteração dos critérios de seleção dos dadores, com principal destaque para a aceitação de dadores marginais. «Como não temos órgãos suficientes, já se considera a possibilidade de recorrer a dadores que possam ter alguma doença coronária e tratá-la durante ou posteriormente ao transplante.» Para reforçar a sua opinião, o especialista apresentou dados sobre a influência da idade dos dadores (dos 40 para os 50 anos), nos quais não se verificou diferença significativa da mortalidade e da morbilidade no ato da transplantação. Manuel Antunes apresentou também a sua discordância sobre a polémica que envolve as situações de empate e em que o órgão é atribuído ao doente que está há mais tempo em lista de espera, enfatizando que «esses doentes não estão numa situação suficientemente problemática ou estão à espera do melhor órgão, o que não é legal». A finalizar a sua intervenção, deixou uma sugestão para a melhoria desta área em Portugal: «Garantir que os incentivos à transplantação são distribuídos equitativamente a todas as unidades.» Em jeito de conclusão, o Dr. Fernando Macário, nefrologista no CHUC e ex-presidente da SPT, explicou que a solução para os problemas discutidos «passará pela elaboração de um novo despacho, que, continuando a ser justo, potencie a possibilidade de dar o melhor rim ao melhor recetor, para otimizar os resultados a longo prazo». E rematou: «Não queremos ser apenas justos, mas também eficazes.»
Crianças e jovens com DRC juntos em campo de férias
m grupo de 23 crianças e jovens com doença renal crónica (DRC) em diferentes fases (pré-diálise, diálise ou transplantados) participou no projeto Cresce 2016, um campo de férias organizado pela Associação Portuguesa de Insuficientes Renais (APIR). As atividades desta segunda edição decorreram de 29 de agosto a 3 de setembro e culminaram com uma sessão de encerramento, que decorreu no Seminário Torre d’Aguilha, em Cascais, na qual a SPT esteve representada pelo Prof. André Weigert, nefrologista no Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental/Hospital de Santa Cruz. Para o vogal da Direção da SPT, o Cresce «é um projeto extremamente interessante, com diversas atividades desportivas, lúdicas e culturais, que visa ajudar crianças e jovens a melhorarem a forma como encaram a doença, a compartilharem os seus receitos e a aumentarem a sua autoestima». Ao longo da semana, acompanhados por monitores e enfermeiros, os participantes aprenderam a confecionar refeições, tiveram uma sessão de psicodrama orientada pelo encenador Miguel Mestre e realizaram atividades ao ar livre, como arborismo e um batismo de vela. Além de formação mais específica sobre a saúde renal e a hemodiálise, os jovens participaram também num workshop de fotografia e visitaram o Museu do Mar, o Farol de Santa Marta, em Cascais, e o Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa. Na manhã do dia 3 de setembro, decorreu o 1.º Encontro de Pais e Cuidadores, cujos participantes assistiram também à cerimónia
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O Prof. André Weigert deu alguns conselhos aos jovens participantes, nomeadamente sobre a importância da adesão ao tratamento
de encerramento do Cresce 2016. «Nesta sessão, os monitores, a médica e os enfermeiros que acompanharam os jovens no projeto deram o feedback das atividades, seguindo-se uma conversa aberta a todos, na qual pudemos falar um pouco sobre os aspetos que nos parecem mais relevantes para a vida das crianças e jovens com DRC. incluindo as falhas de adesão à terapêutica, que podem prejudicar gravemente alguns jovens transplantados», refere André Weigert. Luís Garcia | 15
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Controvérsias da doação em vida debatidas no Congresso
Dr. António Castro Henriques
Prof. José Medina Pestana
Prof. Rui Nunes
De 13 a 15 de outubro, o Centro de Congressos do Porto Palácio Hotel recebe o XIII Congresso Português/XV Congresso Luso-Brasileiro/II Encontro Ibérico de Transplantação. A primeira sessão plenária, entre as 11h00 e as 12h00 de dia 13, terá como tema «Dador vivo. Dador altruísta» e promete ser polémica, com um cruzar de opiniões entre defensores e opositores desta opção. Sandra Diogo
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discussão será moderada pelo Dr. José Guerra (nefrologista no Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria), pelo Prof. Mário Abbud Filho (diretor do Centro Interdepartamental de Transplantes de Órgãos e Tecidos da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/Hospital de Base, no Brasil) e pelo Dr. Domingos Machado (coordenador da Unidade de Transplantação Renal do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental/Hospital de Santa Cruz). Nesta sessão, debater-se-ão os argumentos contra e a favor da doação em vida, dadores familiares ou relacionados emocionalmente e dadores anónimos («bom samaritano»), assim como a perspetiva ética que envolve a atividade. A defender o dador anónimo estará o Dr. António Castro Henriques, responsável pela Unidade de Transplantação Renal do Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António (CHP/HSA), para quem esta é uma iniciativa que deve ser posta em marcha, «principalmente reforçando a sua importância para os transplantes cruzados, permitindo desencadear depois muitos outros». Castro Henriques refuta que este procedimento seja particularmente arriscado, baseando-se na experiência do CHP/HSA: «99% das cirurgias são feitas por laparoscopia, uma técnica muito pouco invasiva, que permite a alta do dador dois ou três dias após a colheita. Ainda que as complicações pós-operatórias rondem os 10%, já fizemos mais de 200 transplantes de dador vivo e nunca tivemos um caso de morte.» Neste contexto, o especialista acredita que a doação em vida se vai alargar cada vez mais a nível mundial, até porque, de acordo com um estudo publicado pelo CHP/HSA, «95% dos dadores não estão arrependidos, mesmo aqueles cujo rim se perdeu devido a um processo de rejeição ou trombose, o que ocorre em menos de 2% dos casos». E defende: «Não é isto que vai acabar com as listas de espera, mas é mais um passo para que diminuam.»
Prioridade à segurança dos dadores Ao Prof. José Medina Pestana, diretor do Hospital do Rim e da Hipertensão da Universidade Federal de São Paulo, caberá expor os argumentos contra a doação em vida. Para o especialista brasi16 | outubro 2016
leiro, os inconvenientes desta opção são claros: «É preciso pensar mais na segurança do dador do que na do recetor. Hoje em dia, a diálise é uma opção bastante razoável, pois tem sofrido alterações significativas na última década, que a tornaram um processo cada vez melhor e mais seguro.» Embora reconheça que os riscos associados ao processo de transplante são reduzidos (a mortalidade é de três em cada dez mil), Medina Pestana considera-os suficientes para que outras opções devam ser consideradas. «Por um lado, há o peso da imunossupressão para a pessoa que foi transplantada, com os respetivos malefícios a longo prazo, como a maior probabilidade de desenvolvimento de tumores. Por outro lado, os perigos, a longo prazo, de um dador jovem viver só com um rim são muito grandes.» Neste sentido, o nefrologista defende que a Medicina deve «fugir da solução fácil que a doação em vida representa e concentrar-se em reduzir o número de órgãos perdidos de dadores falecidos».
Perspetiva ética da doação em vida Para abordar as questões éticas que a doação em vida suscita tomará a palavra o Prof. Rui Nunes, presidente da Associação Portuguesa de Bioética. Salvaguardando que o enquadramento legal da atividade no nosso País é «bastante adequado», o também diretor do Serviço de Bioética e Ética Médica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto defende que o sistema de saúde e a Medicina devem evoluir para uma realidade em que a doação em vida não seja sequer questionável. «Não discuto que este enorme altruísmo deva ser reconhecido, mas gostava de desenhar uma sociedade do século XXI em que ninguém fosse compelido a doar um órgão», concretiza. Para isso, Rui Nunes apresenta duas soluções que lhe parecem viáveis: «Efetuar mais investigação, e de maior qualidade, no campo das células estaminais, que têm um potencial ilimitado e uma probabilidade muito menor de rejeição; e verificar se os critérios de colheita de órgãos em doentes em coração parado devem continuar a ser tão estritos como os que existem atualmente.»
Doação renal cruzada para ultrapassar incompatibilidade ABO As formas de aumentar a doação serão debatidas na sessão que decorre no dia 13 de outubro, entre as 17h15 e as 18h45, na Sala A. O transplante com dador vivo ABO incompatível, a doação renal cruzada e a colheita de órgãos em doentes em paragem cardiocirculatória serão os principais tópicos em analisados. Ana Luísa Pereira Dr. Leonídio Dias
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omo forma de tratamento da insuficiência renal crónica (IRC) estádio 5, «o transplante renal permite maior sobrevivência com melhor qualidade de vida, sendo também mais económico do que as terapêuticas dialíticas», afirma o Dr. Leonídio Dias, nefrologista na Unidade de Transplantação Renal do Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António (CHP/HSA) e primeiro orador na sessão. De acordo com este especialista, «o transplante renal de dador vivo potencia estes resultados, devido à maior sobrevivência do enxerto relativamente ao transplante com rim de dador falecido». Por outro lado, «nas listas de espera para rim de dador falecido, os doentes do grupo sanguíneo O apresentam tempos de espera significativamente superiores aos dos doentes dos outros grupos sanguíneos». Embora admita que o Programa Nacional de Doação Renal Cruzada é uma possibilidade para ultrapassar a incompatibilidade ABO, Leonídio Dias lembra que, «nestes programas, há um excesso de recetores do grupo O e dadores de outros grupos, o que dificulta a possibilidade de encontrar um par compatível». De acordo com este orador, «o transplante com dador vivo ABO incompatível [ABOi] é hoje prática comum em diversos países europeus, Austrália, Japão e Estados Unidos, sendo a sobrevivência
Evolução do Programa Espanhol de Doação Renal Cruzada 8 centros de transplante renal e 5 laboratórios de histocompatibilidade em 2009, quando se iniciou o Programa 2 4 centros de transplante renal e 17 laboratórios de histocompatibilidade atualmente 1 47 transplantes renais cruzados realizados entre 2009 e 2015, dos quais 64 duplos, 51 triplos e 32 em 10 cadeias de dadores altruístas
Prof.ª María Valentín Muñoz
destes doentes semelhante à dos doentes transplantados com rim ABO compatível e originando resultados reprodutíveis, o que encoraja a sua disseminação por outros centros». Em Portugal, muitos potenciais dadores vivos têm sido recusados devido à incompatibilidade ABO, mas uma resolução recente do Conselho Europeu exorta os países-membros a implementarem o transplante ABOi, «tendo em conta os excelentes resultados, a escassez de órgãos e a crescente acumulação de doentes em lista de espera para rim de dador falecido», refere Leonídio Dias. No CHP/HSA, onde se regista a maior atividade nacional de transplantação de dador vivo, «existia já experiência de dessensibilização em recetores com incompatibilidade HLA e, por isso, iniciou-se um programa de transplantação com dador ABOi, que tem obtido resultados animadores», frisa o especialista. E conclui: «Esperamos que esta forma de transplante se torne uma alternativa viável de tratamento da IRC também em Portugal.»
Experiência espanhola na doação cruzada A Prof.ª María Valentín Muñoz, responsável pelo programa de transplantação renal de dador vivo da Organización Nacional de Trasplantes (ONT), apresentará a experiência espanhola na área da doação renal cruzada, que tem sido uma das estratégias usadas para ultrapassar a incompatibilidade ABO e HLA. O Programa Espanhol de Doação Renal Cruzada foi iniciado em 2009 e «posicionou-se como uma excelente estratégia para aumentar a doação de rim em vida, que é atualmente responsável por 10% dos transplantes de rim em Espanha», revela María Valentín. Além disso, «o transplante renal cruzado aumentou as hipóteses disponíveis para os recetores com dadores voluntários incompatíveis, os quais, devido ao seu nível de imunização ou ao seu grupo sanguíneo, são menos propensos a receber um enxerto compatível», conclui a especialista. Nesta sessão, será também orador o Prof. Fritz Diekmann (nefrologista no Hospital Clínic de Barcelona), abordando o tema «Dador em paragem cardiocirculatória – Maastrich III». Os moderadores serão o Prof. José Medina Pestana (diretor do Hospital do Rim e da Hipertensão da Universidade Federal de São Paulo, Brasil), a Dr.ª Ana França (coordenadora nacional de transplantação no Instituto Português do Sangue e da Transplantação) e o Dr. Lucas Batista (coordenador da Área Cirúrgica de Transplantação do Centro Hospitalar Lisboa Norte/Hospital de Santa Maria). | 17
ransformar
Papel da imunossupressão nos casos de rejeição humoral
O
segundo dia do Congresso, 14 de outubro, contará com a sessão «DSA [donor specific antibody], rejeição humoral e imunossupressão – o que há de novo?», que decorrerá entre as 12h00 e as 13h00. Vai ser discutida a importância da existência destes anticorpos na rejeição dos transplantes, tanto a curto como a longo prazo, bem como as respostas que a ciência e a Medicina já encontraram para minimizar as suas consequências. «Nos últimos dez anos, apercebemo-nos de que uma parte importante dos recetores desenvolve anticorpos contra o novo órgão ao longo do tempo, provavelmente em associação, entre outros fatores, à não adesão à terapêutica de imunossupressão ou a alterações à mesma», explica o Prof. Fernando Nolasco, diretor do Serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar de Lisboa Central/ /Hospital Curry Cabral e um dos oradores na sessão. Para o nefrologista, este problema veio modificar o paradigma da transplantação, até porque as estratégias terapêuticas ainda estão longe de resolver a situação. «Neste momento, temos métodos de identificação dos graus de sensibilização e dos anticorpos muito mais precisos a nível molecular, assim como do manuseamento e vigilância da sua evolução, mas precisamos de conseguir fazer o diagnóstico mais precocemente, quando as lesões ainda são poucas e pequenas», salienta. Neste contexto, e uma vez que os problemas de rejeição tendem a reaparecer, Fernando Nolasco defende a importância de uma
melhor vigilância dos doentes transplantados: «Estes indivíduos que têm produção de anticorpos vão precisar de outro transplante dentro de alguns anos e, nesses casos, a probabilidade de rejeição é ainda maior.» Nesta sessão, participarão também o Prof. Jean Villard, diretor da Unidade de Transplantação e Imunologia do Hospital Universitário de Genebra, na Suíça, para falar sobre a importância da caracterização do DSA; e o Prof. Michel Mourad, diretor da Unidade de Transplantação Renal e Pancreática das Clínicas Universitárias Saint-Luc, na Bélgica, que abordará as estratégias baseadas na farmacogenética para a imunossupressão após transplante renal.
opinião Prof.ª La Salete Martins | Nefrologista no Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António (CHP/HSA)
Minimizar a infeção intra-abdominal e o risco trombótico NA DP
N
os doentes em diálise peritoneal (DP) que efetuam transplante duplo de rim e pâncreas (TRP), observámos uma taxa de complicações mais elevada, quer em termos de infeções da cavidade abdominal quer de trombose dos enxertos, o que é algo inquietante, tendo em conta que estes doentes até tinham menos tempo de diálise do que aqueles que efetuaram hemodiálise, tendo, por esse motivo, à partida, um melhor prognóstico. Estes achados não se verificam apenas no CHP/HSA, mas também em outros centros que fazem este tipo de transplante. Contudo, não se trata de uma constatação uniforme, uma vez que outras unidades que fazem TRP não encontraram diferenças entre doentes em DP e doentes em hemodiálise. Enquanto no caso da infeção intra-abdominal é mais fácil perceber a existência de um risco acrescido, pois pode haver algum dano estrutural prévio do peritoneu, no caso do risco trombótico é mais complexo. Apesar de já fazermos profilaxia com medicação antitrombótica, a taxa de trombose é superior nestes casos. Nesse sentido, um estudo aprofundado para avaliar o risco trombótico do doente que fez DP está a ser equacionado com a especialidade de Hematologia, tentando descobrir um fator de predisposição nestes doentes, com vista a uma prevenção mais eficaz. 18 | outubro 2016
Em termos de durabilidade do transplante duplo, após os primeiros dois a três meses, a longevidade é muito positiva, quer do rim quer do pâncreas, o que se deve, em parte, ao facto de os doentes receberem órgãos muito selecionados e provenientes de dadores com idade máxima de 45 a 50 anos. Sendo a maioria das rejeições tratável no TRP, embora a sua incidência seja superior à do transplante de rim isolado, conseguimos obter uma taxa de sucesso ao primeiro ano que ronda os 96% para o rim e 87% para o pâncreas. Aos dez anos, cerca de 75% dos enxertos estão funcionais, um ótimo resultado, que nos coloca a par de outros grandes centros internacionais. Nota: «Complicam mais os doentes que faziam DP? Porquê?» é o tema que a Prof.ª La Salete Martins irá apresentar na sessão «Rim-pâncreas», que decorrerá no dia 13 de outubro, entre as 12h00 e as 13h30, na Sala A. A sessão será moderada pelo Dr. António Castro Henriques (nefrologista e responsável pela Unidade de Transplantação Renal do CHP/HSA), pela Dr.ª Erika Rangel (docente e investigadora no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, Brasil) e pelo Dr. José Davide (coordenador da Unidade de Cirurgia Hepatobiliopancreática do CHP/HSA). Os outros oradores serão a Dr.ª Donzília Silva (cirurgiã na Unidade de Cirurgia Hepatobiliopancreática do CHP/HSA) e o Prof. Aníbal Ferreira (nefrologista no Centro Hospitalar de Lisboa Central/Hospital de Curry Cabral e presidente da Sociedade Portuguesa de Nefrologia).
opinião Prof. Josep Campistol | Nefrologista e diretor-geral do Hospital Clínic de Barcelona
Avanços no tratamento da síndrome hemolítica urémica
A
microangiopatia trombótica é uma entidade clínica caracterizada por uma tríade: anemia microangiopática (esquizócitos), trombocitopenia e lesão de órgão-alvo. Consiste numa trombose da microcirculação devido à ativação endotelial e à formação de trombos plaquetários, sendo que, neste processo, participa diretamente a ativação do sistema complemento. A síndrome hemolítica urémica atípica (SHUa), que é uma forma de microangiopatia trombótica, baseia-se numa ativação crónica e descontrolada do sistema complemento, com lesão endotelial, trombose da microcirculação e lesão de órgão, geralmente o rim, mas existindo também, de forma frequente, dano a nível sistémico (sistema nervoso central, aparelho cardiocirculatório ou pele). A ativação do complemento é devida a um defeito – geralmente de origem genética – na regulação deste sistema, decorrente da ausência de inibidores no loop de ativação C3-C5. Um estímulo de baixa intensidade gera uma ativação descontrolada do complemento, com lesão endotelial, anemia, trombocitopenia e lesão renal. O aumento da lactato desidrogenase (LDH), juntamente com a tríade anemia-trombocitopenia-insuficiência renal, e o défice de haptoglobina traduzem a extensão da lesão endotelial e as consequências sobre o órgão afetado. Até há pouco tempo, não existia tratamento eficaz para a SHUa – apenas a plasmaférese conseguia reduzir a atividade hemolítica
sem resolver o quadro de trombose nem melhorar a funcionalidade do órgão afetado. No entanto, há alguns anos, a introdução do eculizumab (anticorpo monoclonal anti-C5) conseguiu modificar a história natural da doença. Vários estudos demonstram a sua eficácia no controlo da microangiopatia trombótica e na reversibilidade da lesão do órgão-alvo, com recuperação da função renal. Porém, o uso do eculizumab deve ser precoce, para reverter a microangiopatia e minimizar a lesão renal e/ou sistémica, sendo necessário que a continuidade do tratamento seja individualizada, com base no quadro clínico e na presença de mutações genéticas que predispõem para recidiva de microangiopatia trombótica. Nota: «SHUa: recorrência, de novo e microangiopatias» é o tema que o Prof. Josep Campistol irá apresentar na sessão «SHUa e transplante renal», que decorrerá no dia 14 de outubro, entre as 17h45 e as 18h45, na Sala A. A sessão será moderada pela Prof.ª Marilda Mazzali (coordenadora do Programa de Transplante Renal do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP, em São Paulo, Brasil ), pela Dr.ª Joana Santos (nefrologista no Centro Hospitalar de São João, no Porto) e pelo Dr. Fernando Macário (nefrologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra). A Dr.ª Josefina Santos (nefrologista no Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António) e o Prof. Manuel Arias Rodriguez (diretor do Serviço de Nefrologia do Hospital Universitario Marqués de Valdecilla, em Santander) serão os outros oradores desta sessão.
opinião Dr. Jorge Malheiro | Nefrologista no Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António (CHP/HSA)
Otimizar as estratégias de dessensibilização
C
erca de 15 a 20% dos doentes que esperam por um transplante renal encontram-se hipersensibilizados, apresentando anticorpos anti-HLA [antigénio leucocitário humano, na sigla em inglês] contra uma percentagem bastante elevada da população, o que dificulta a sua compatibilidade com eventuais dadores. Segundo dados do CHP/ /HSA, os doentes hipersensibilizados esperaram duas a três vezes mais por um dador falecido compatível do que os não sensibilizados. A sua probabilidade de ser HLA-incompatível com um potencial dador vivo é igualmente elevada. Estes doentes, quando transplantados, apresentam um risco de rejeição superior, o que tem limitado as estratégias para aumento da sua elegibilidade para transplante. No entanto, nos últimos 15 anos, diversos centros internacionais demonstraram a eficácia da dessensibilização para aumentar o sucesso do transplante renal nestes casos. Um estudo recente demonstrou a vantagem da transplantação HLA-incompatível associada a protocolos de dessensibilização para a sobrevivência dos doentes, em comparação com a permanência em lista de espera (com ou sem acesso a transplante HLA-compatível) ou em diálise. Assim, transplantar candidatos hipersensibilizados é um desafio que obriga, por um lado, a considerar o ajuste dos critérios de aloca-
ção de órgãos a este subgrupo de candidatos e, por outro, a investir em protocolos de dessensibilização que permitam a transplantação renal HLA-incompatível. Este tipo de transplantação renal, associado a estratégias de dessensibilização, será, muitas vezes, a melhor possibilidade de receber um transplante, não obstante o risco de rejeição aguda ou crónica ativa mediada por anticorpos. Contudo, os esquemas de imunossupressão mais agressivos colocam estes doentes em maior risco de complicações infeciosas ou neoplásicas, pelo que a definição de critérios clínicos de elegibilidade, a adequação do protocolo de dessensibilização ao grau de incompatibilidade HLA e a obtenção de um consentimento informado e esclarecido junto do doente são etapas essenciais para otimizar a relação custo/benefício desta estratégia. NOTA: «Que doentes em LA [lista ativa] podem beneficiar de dessensibilização» é o tema que o Dr. Jorge Malheiro irá apresentar na sessão «Dessensibilização», que decorrerá no dia 14 de outubro, entre as 16h00 e as 17h30, na Sala A. A mesa será moderada pelos nefrologistas Dr. Federico Oppenheimer (diretor da Unidade de Transplante Renal do Hospital Clínic de Barcelona) e Dr.ª Manuela Bustorf (Centro Hospitalar de São João, no Porto), enquanto a Dr.ª Cristina Castro (nefrologista no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) será a preletora do outro tema desta sessão: «Esquemas terapêuticos de dessensibilização». | 19
ransformar opinião Prof. Faouzi Saliba | Hepatologista no Hospital Paul Brousse, em Villejuif, França
vigilância microbiológica e profilaxia das infeções após transplante hepático
A
doença hepática em fase terminal predispõe a infeções bacterianas e fúngicas, como consequência da diminuição da imunidade. A infeção fúngica (IF) associada a transplante de fígado tem uma incidência de 5 a 22% e representa um risco significativo para os recetores de órgãos, aumentando a morbilidade e a mortalidade. O fungo Candida spp representa 35 a 91% de todas as IF, seguido pelo fungo Aspergillus spp, responsável por 9 a 34%. Vários estudos analisaram os benefícios de fármacos profiláticos (fluconazol, itraconazol ou formulações lipídicas de anfotericina B) no desenvolvimento de IF após transplante hepático. Verificou-se que a profilaxia reduz a colonização, as infeções fúngicas comprovadas e a mortalidade atribuível à IF, mas não afeta a mortalidade global. O efeito benéfico foi predominantemente associado à redução da infeção por Candida albicans, não tendo sido observado qualquer benefício na infeção por Aspergillus. As equinocandinas são atualmente recomendadas como tratamento de primeira linha para a candidíase, devido à sua eficácia, ao seu perfil de segurança e à ausência de interações medicamentosas. Dois recentes estudos analisaram a utilização destes fármacos na profilaxia das IF em transplante hepático de elevado risco. No ensaio TENPIN [Liver Transplant European Study Into the Prevention of Fungal Infection], a micafungina provou não ser inferior ao tratamento-padrão (fluconazol, anfotericina B lipossomal ou caspofungina). Os testes de função hepática foram semelhan-
DR
tes, mas a micafungina revelou-se melhor no que respeita à função renal. Um estudo divulgado em 2014 (Winston DJ, et al.) foi desenvolvido para mostrar a superioridade da anidulafungina relativamente ao fluconazol. Apesar de a incidência global de IF ter sido semelhante, a anidulafungina foi associada a menor colonização ou infeção por Aspergillus, menor avanço da IF nos doentes que receberam fluconazol pré-transplante e menos casos de resistência antifúngica. Apesar de não haver consenso acerca da abordagem ideal, as estratégias profiláticas direcionadas para doentes de elevado risco são de grande importância, em combinação com um programa de vigilância microbiológica de rotina.
Nota: O Prof. Faouzi Saliba irá apresentar o tema «Infeções fúngicas» na sessão «Infeções em transplante», que decorrerá no dia 15 de outubro, entre as 8h30 e as 10h30, na Sala A. A sessão será moderada pela Prof.ª Taina Sandes (nefrologista que integra o Programa de Transplante Renal do Hospital Geral de Fortaleza, no Brasil), pelo Dr. Jorge Pratas (nefrologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra) e pelo Prof. José Maria Aguado (internista e diretor da Unidade de Doenças Infeciosas do Hospital Universitario 12 de Octubre, em Madrid). Os outros oradores desta sessão serão o Prof. Edson Abdala (alergologista e imunologista em São Paulo, Brasil) e a Prof.ª Mónica Oleastro (investigadora no Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, em Lisboa).
opinião Dr.ª Maria Carlota Londoño | Hepatologista no Hospital Clínic de Barcelona, Espanha
Novos antivirais eficazes e seguros nos transplantes hepáticos e renais
O
vírus da hepatite C (VHC) exerce um impacto negativo nos transplantes de fígado e de rim. A erradicação viral tem-se associada a uma melhoria significativa da sobrevida do enxerto, mas a aplicação da terapêutica tem sido dificultada pela baixa eficácia e pelo elevado número de eventos adversos do interferão (IFN). Felizmente, a segurança e a eficácia dos novos antivirais de ação direta (AAD) alteraram completamente o cenário. Terapêuticas livres de IFN no pós-transplante de fígado originam taxas de resposta virológica sustentada (RVS) acima de 90% em doentes com fibrose leve ou cirrose compensada, e quase de 100% em pessoas com hepatite C. Em doentes com cirrose descompensada após transplante, a taxa de RVS baixa para 50 a 70%. Apesar da boa eficácia, existem ainda algumas questões por resolver: o melhor regime terapêutico, o momento apropriado para iniciar o tratamento antiviral, a necessidade de incluir a ribavirina e a duração ótima da terapêutica. 20 | outubro 2016
Nos transplantados renais, os resultados de eficácia e segurança relativos ao uso de diferentes combinações de AAD são semelhantes. A principal preocupação da terapêutica antiviral nestes doentes é o risco de rejeição do enxerto renal, sendo necessário um controlo rigoroso. Em conclusão, a utilização de AAD em transplantados renais e hepáticos é segura e eficaz. Idealmente, a terapêutica antiviral deve ser iniciada logo após o transplante, assim que a imunossupressão seja estável.
Nota: A Dr.ª Maria Carlota Londoño irá apresentar o tema «Tratamento do VHC – o que há de novo» na sessão plenária «Hepatite C no transplante», que decorrerá no dia 15 de outubro, entre as 11h00 e as 13h00, na Sala A. A sessão será moderada pelo Prof. Valentín Cuervas-Mons (diretor da Unidade de Transplante Hepático do Hospital Universitario Puerta de Hierro, em Madrid) e pelo Dr. Carlos Oliveira (nefrologista na Unidade de Transplantação do Hospital Garcia de Orta, em Almada). Serão também palestrantes as Dr.as Lídia Santos e Suzana Calretas, respetivamente nefrologista e internista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra.
DR
«O transplante com incompatibilidade ABO é das decisões mais difíceis» Moderador da sessão «Decisões difíceis em transplante hepático», o Dr. Jorge Daniel, diretor da Unidade de Transplantação Hepática e Pancreática do Centro Hospitalar do Porto/Hospital de Santo António, antecipa alguns dos temas que se vão discutir: as dificuldades que os especialistas enfrentam no momento de selecionar um doente para transplante e os grandes desafios, técnicos e médicos, a que têm de responder atualmente. Sandra Diogo A sessão que vai moderar centra-se nas dificuldades que os especialistas enfrentam no transplante hepático. Por exemplo, nos casos de incompatibilidade ABO, em que circunstâncias se justifica avançar para o transplante? É sabido que cerca de 40% destes enxertos incompatíveis acabam por entrar em falência muito mais precocemente do que os órgãos compatíveis – daí a taxa de retransplante nestes doentes ser maior. Assim, só se faz um transplante nestas circunstâncias em situações muito especiais. Por exemplo, por vezes, perante um doente com uma hepatite aguda fulminante, cujo estado se vai deteriorando, é utilizado o primeiro órgão a aparecer, mesmo que seja incompatível. Esta é, sem dúvida, uma das decisões mais difíceis, porque não sabemos se passada uma hora não existiria já um fígado compatível. Até quando se justifica continuar a retransplantar um doente? Todos os grupos de transplante têm uma percentagem de retransplantes que ronda os 10%. Esta situação pode ocorrer por rejeição tardia e, portanto, por perda de enxerto. São vários os fatores equacionados para a decisão de um retransplante, que é multidisciplinar e analisada caso a caso. Existe um consenso na avaliação cardíaca dos doentes em pré-transplante? Sim, mas este tema justifica-se no Congresso porque é sempre importante discutirmos a importância de estes doentes possuírem uma capacidade orgânica que lhes permita suportar a agressão que um transplante hepático pressupõe. Por exemplo, há doenças que provocam insuficiência hepática e que também atingem o coração. Assim, quando estamos a estudar um doente para transplantação, essa avaliação engloba vários órgãos e sistemas: uma situação é um doente ter uma doença hepática terminal, com indicação para transplante; outra é ter capacidade para resistir a esse mesmo transplante.
A trombose da veia porta é outro dos desafios para um cirurgião? Em muitos doentes com cirrose hepática, e em consequência da própria doença, instala-se uma trombose da veia porta. Esta situação, quando não é reversível por tratamento hipocoagulante, torna o êxito do transplante hepático mais difícil. Este aspeto está relacionado com causas técnicas, aumentando muito a mortalidade operatória e, portanto, o insucesso do transplante. No grupo que dirijo, a trombose da veia porta completa e irreversível é causa para não aceitação de um doente para transplante hepático.
Nota: A sessão «Decisões difíceis em transplante hepático», que decorrerá no dia 14 de outubro, na Sala B, das 16h00 às 17h30, terá como oradores a Dr.ª Sofia Ferreira (hepatologista na Unidade de Transplantação Hepática e Pancreática do CHP/HSA), o Prof. Lúcio Pacheco (diretor da Unidade de Transplantação do Hospital Estadual da Criança, no Rio de Janeiro) e o Dr. António Canha (chefe de equipa de Cirurgia Geral no Serviço de Urgência do CHP/HSA). No mesmo dia, também na Sala B, entre as 10h30 e as 12h00, decorrerá a sessão «Novidades no transplante hepático», na qual participarão a Prof.ª Helena Pessegueiro (hepatologista na Unidade de Transplantação Hepática e Pancreática do CHP/HSA), o Prof. Edson Abdala (chefe da equipa de Infecciologia do Serviço de Transplante de Fígado e Órgãos do Aparelho Digestivo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) e o Dr. Carlos Bento (anestesista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra).
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m análise
Portugal, Brasil e Espanha: Realidade da transplantação
Dr. Fernando Macário
Dr. Roberto Manfro
Prof. Valentín Cuervas-Mons
A atividade da transplantação em Portugal, Brasil e Espanha será um dos temas em destaque no XIII Congresso Português/XV Congresso Luso-Brasileiro/II Encontro Ibérico de Transplantação. Os números relativos a cada um dos três países serão apresentados no dia 13 de outubro, após a sessão de abertura, entre as 9h00 e as 10h00. Marisa Teixeira
E
demonstra que existe potencial para melhoria. Segundo o também ex-presidente da SPT, «os números preliminares de 2016 apontam para um aumento significativo da atividade de colheita e transplantação em todas as zonas do País, comparando com o período homólogo do ano passado». Na sua opinião, estes são dados muito positivos, que podem significar uma consolidação de crescimento e elevadas taxas de transplantação a partir de dadores falecidos. Contudo, Fernando Macário alerta para a existência de muitos outros fatores que carecem de uma clara intervenção. «A transplantação a partir de dador vivo mostra ainda números muito aquém dos desejados. São necessárias medidas de fundo no sentido da revisão e reorganização de diversos aspetos da atividade de
m 2015, segundo o Instituto Português do Sangue e da Transplantação, os dadores falecidos em Portugal foram 318, um número superior ao dos anos anteriores (301 em 2011, 252 em 2012, 295 em 2013 e 289 em 2014). O número de órgãos colhidos e transplantados também aumentou, mas com uma variação positiva menos significativa, revelando uma menor taxa de aproveitamento de órgãos. O Dr. Fernando Macário, nefrologista e especialista em transplante renal no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, que apresentará no Congresso a informação mais recente relativa a Portugal neste âmbito, avança que, «em termos de transplantação, ainda não se alcançou o máximo histórico de 2009 e 2010, nem se igualaram as taxas de transplantação de Espanha», o que
EVOLUção da transplantação nos três países 600 530
500
Portugal
429
450 450
2011 2012 2013 2014 2015
477
400 300 219
200 100 46
0
30
55
188
209
43 51
Coração
22 | outubro 2016
251
243
Rim
Fígado
18 14 16 19 15
25 19 25 26 36
Pulmão
Pâncreas
colheita e transplantação», sublinha o especialista. E acrescenta: «A Coordenação da Transplantação do IPST debate-se com uma carência gritante de meios, as regras da alocação de órgãos devem ser revistas e a descentralização do seguimento dos transplantados renais deve avançar, como a SPT já reivindicou várias vezes.» Fernando Macário ressalva que, embora Portugal disponha já dos chamados centros de referência de transplantação, não se percebe claramente o alcance desta medida. Por outro lado, a rede de centros de transplantação deveria, na sua ótica, ser repensada, sobretudo em algumas áreas. A renovação das equipas de transplantação com incentivo à formação profissional de excelência é também uma matéria que o anterior presidente da SPT considera ser merecedora de reflexão, pois «está esquecida e deve ser rapidamente incentivada». Em suma, para o especialista, «falar de atividade da transplantação não deve ser reduzido a um somatório de números positivos, mas sim seguir no sentido da justiça na atribuição dos órgãos disponíveis e da excelência no tratamento daqueles que os recebem».
Reduzir assimetrias entre regiões brasileiras O cenário atual da transplantação no Brasil será comentado pelo Dr. Roberto Manfro, presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) e nefrologista no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Na opinião deste especialista, apesar da sua robustez, o programa de transplantes brasileiro «necessita de crescer e de melhorias para suprir as necessidades de uma população com mais de 200 milhões de pessoas». Nos últimos anos, a taxa de doação efetiva tem vindo a crescer, embora se tenha verificado uma estabilização em 2015. À semelhança do que acontece em todo o mundo, os programas mais ativos são os de transplante renal e hepático. «Quanto ao primeiro, tem-se observado um crescimento mais lento nos últimos anos, que decorre, principalmente, da diminuição dos transplantes com dador vivo, que não é inteiramente compensada pelo crescimento do número de transplantes com dadores falecidos», explica Roberto Manfro. E adianta: «O programa de transplante hepático também tem apresentado um crescimento contínuo, embora mais lento nos três últimos anos. Merece ainda destaque o importante crescimento observado na transplantação cardíaca, em especial nos últimos quatro anos.»
Rim
brasil
6 000
Um dos principais desafios da transplantação no Brasil, de acordo com este responsável, é a redução das importantes assimetrias atualmente existentes. «As regiões sul e sudeste brasileiras apresentam elevados índices de doações e transplantes, enquanto nas restantes, particularmente na região norte, esses índices são ainda muito baixos.» O estabelecimento de um maior número de programas ativos de transplante cardíaco, pulmonar e pancreático é outro importante desígnio, já que as taxas de transplante destes órgãos são ainda muito baixas. No início do ano de 2016, observou-se uma diminuição na doação e na transplantação no Brasil que, na opinião de Roberto Manfro, se deveu, «possivelmente, à crise política, social e económica que ocorreu no país». No entanto, os dados do segundo trimestre já mostram alguma recuperação das atividades de doação e transplantação.
Aumento do transplante de dador vivo em Espanha Em 2015, foram realizados 4 769 transplantes de órgãos sólidos em Espanha: 2 052 de rim, 1 093 de fígado e cerca de 300 de coração e de pulmão. Segundo o Prof. Valentín Cuervas-Mons, presidente da Sociedad Española de Trasplante (SET) e diretor do Serviço de Medicina Interna e da Unidade de Transplante Hepático do Hospital Universitario Puerta de Hierro, em Madrid, «ao longo do tempo, tem-se assistido a um aumento progressivo do número de transplantes de dador após morte cardíaca e de dador vivo». Ao todo, o transplante de órgãos sólidos de dador após morte cerebral representou 80% do total de transplantes realizados em 2015, sendo que, no ano 2000, representava 98%. Em Espanha, a taxa anual de transplantes por milhão de população (pmp), em 2015, foi de 102,3 (rim: 5,4 pmp; fígado: 23,2 pmp; coração: 6,4 pmp). Segundo Valentín Cuervas-Mons, a taxa de transplantes de órgãos sólidos de dador após morte cerebral atingiu um plateau em todos os tipos de transplante de órgãos sólidos. Já a atividade de transplante pulmonar, renal e hepático com dadores após morte cardíaca tem vindo a aumentar nos últimos anos, verificando-se ainda uma taxa baixa, mas crescente, de transplante de dadores vivos de rim e fígado. De acordo com o presidente da SET, «atualmente, 180 hospitais espanhóis têm acreditação para colheita de órgãos, 42 para transplante de órgãos em adultos e dez unidades hospitalares estão acreditadas em transplante pediátrico».
Fígado
Coração
Pulmão
Pâncreas
Intestino
4 500 4 000
5 000 4 000 3 000
Coração Fígado
3 500
Pâncreas Pulmão
2 500
3 000
2 000
Rim
2 000
1 500 1 000
1 000
500
0
espanha
19 89 19 90 19 91 19 92 19 93 19 94 19 95 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 20 08 20 09 20 10 20 11 20 12 20 13 20 14 20 15
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