CRU N.º 34

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CASA EDITORIAL LEIO TODOS! Uma subsidiária EIA! (Editores Independentes Associados Cru #34 Maio de 2012 Editor: Esgar Acelerado Grafismo: Zbigniev Koniek (Estúdios Meninos Rabinos Ink.) Capa: Fotografia de Daniela Alves Distribuição: Traficantes Ilimitados. Impressão: Diário do Porto Tiragem: 300 exemplares Redacção: CRU, uma revista do caralho! Apartado 317 4490 Póvoa de Varzim eMail: crurreio@gmail.com FB: www.facebook.com/cru.fanzine Issuu: www.issuu.com/esgar Esta soberba revista foi impressa em papel produzido a partir de árvores abatidas clandestinamente na amazónia com tinta preta de durabilidade testada em pele de animais vivos em laboratórios clandestinos no sudoeste asiático. Todos os artigos foram escritos pelos nossos colaboradores em pergaminho de búfala - os melhores! -, utilizando penas de aves raras ilegalmente importadas e adquiridas na feira dos animais de Rebordosa (obrigado, agente Silva, por fechar os olhos ao que lá se passa). As reuniões de trabalho terminaram sempre em alegres jantaradas com consumo excessivo de posta à mirandesa e vinho tinto do Douro. Vacas Clementina e Elizabete, nunca as esqueceremos!... A Cru não tem quaisquer subsídios. A verba para a sua edição foi obtida num torneio de póker que nos correu muito bem num casino chinês clandestino na zona industrial do Mindelo. Apesar de já andarmos a pensar nisso há muito tempo, a Cru não tem qualquer livro de estilo. Também nos estamos a marimbar para gralhas e revisões - é assim mesmo, é à punk! Divirta-se a encontrá-los e participe no nosso passatempo: Eu tenho Melhor Olho para Gralhas que os Fulanos da Cru. O leitor que nos enviar a lista mais extensa ganha um convite para ser o nosso revisor no próximo número. Por último, fincamos o pé, a Cru não obedece ao novo acordo ortográfico, para o qual nos estamos a marimbar. E desejamos uma boa estadia no inferno a todos quanto passaram a escrever arquitecto, actual e espectador sem o “c”. Morram, sacanas! Morram!

HEY, HEY... ADIVINHE QUEM VOLTOU! É verdade, a Cru está de volta! Não podíamos deixar de ser sensíveis à onda de manifestações espontâneas que se espalharam por todo o país exigindo o regresso da revista rasca e vadia. A insistência foi de tal modo que nos obrigou a cuidadas análises socioeconómicas e políticas que se viriam a tornar decisivas na nossa decisão. Vinte e um anos volvidos desde a edição do primeiro número da Cru - onde parodiavamos figuras como Aníbal Cavaco Silva, Paulo Portas, professor Marcelo de Sousa e muitos outros... -, não é que, tal alienígenas dos Ficheiros Secretos, eles continuam aí?... Convenhamos, se afinal de contas tudo continua na mesma, porque é que não ha-

veríamos, também nós, de continuar a surgir nas bancas, ou seja lá onde for que nos encontrem à venda?... Verdade seja dita, também não podíamos manter-nos insensíveis à luta da pobre senhora aí em cima. A Cru tinha de voltar nem que fosse para não sermos responsáveis pela sua carência sexual. Isso nunca! Se ela fosse um bocadinho mais jeitosa, alguém da redacção já a tinha convencido a encetar outras formas de luta... Mas pronto, fizemos o que nos competia, e a nada mais nos sentimos obrigados. Sim, a Cru está de volta. Esperamos que pelo menos a senhora do cartaz esteja satisfeita. A redacção

Participam neste número, por ordem de aparição: Daniela Alves (capa), Happy Jack (capa b), Rosa Feijão, Marcos Farrajota, Zita Carícias, Amílcar Macieira, Nuno Saraiva, Rios Albertino, Marco Valério Marcial (RIP), Rita Mendes, Rogério Rotring, Darren Merinuk, A. Sugadita, Wasted Rita, Alice in Goreland, valter hugo mãe, Esgar Acelerado, Anónimo Cobarde, Johnny Ryan, Alex Gozblau, Lucinda Luminosa, Jorge Silva, Rudolfo, Valquíria Aragão, Mariana a Miserável, Horácio Frutuoso, Luís Manso, Emerenciano Osga, João Oliveira, Madame Lydia, Isabel Lhano (capa c) e Rosário Pinheiro (contracapa).

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Ilustrações de Ros Feijão

Cara Cru, Permitam-me o desabafo. Fiquei muito contente ao saber do regresso da revista que, para mim, foi uma companhia segura e fonte de inspiração na juventude. Minha nossa senhora, quantas vezes terei eu me dedicado a devaneios onanísticos enquanto desfolhava, já que não se desflorava (era muito jovem, mais conhecimento teórico que prático), as páginas com os contos da Zita Carícias... Digam-me, ela participa neste número? Desde que a Cru deixou de ser publicada nunca mais tive contacto com a sua prosa. Variadas buscas pelos alfarrabistas de Álcacer-do-Sal resultaram infrutíferas. Não consigo encontrar o “Conta e Ensina” em parte alguma. Contam fazer uma reedição?... Gregório Gustavo Gomes Gonçalves Alcácer-do-Sal Olá, Gregório Gustavo Gomes Gonçalves, Caramba, esse é mesmo o seu nome? Os leitores ainda vão pensar que isto é tudo inventado... Bela pergunta, a sua. E de fácil resposta. Tem esta Cru na mão? Está a ler estas linhas? Então procure lá... Vê alguma coisa da Zita Carícias? Se sim, ela participa neste número; se não, olhe, precisa de um desenho? Há cada leitor com cada dúvida mais estúpida. Quanto ao resto, não encontra o livro nos seus alfarrabistas locais? Já ouviu falar de autocarros? E combóios? E mesmo viatura própria? Experimente procurar nos alfarrabistas de Foros de Albergaria, Pêgo do Altar ou mesmo Monte do Gorgolim de Cima, só para dizer umas terras aí perto de Álcacer. Olá Cru, Sou uma jovem ilustradora à procura de oportunidades de publicação. (...) Soube através do facebook que iam editar um novo número e pensei que podiam precisar de alguém para fazer alguma ilustração. Estou à vossa disposição. Podem ver o meu

portfolio online em www.facebook.com/ (...). Ana Recheado Sequeira via facebook Olá Ana, Antes de tudo deixa-nos dizer que sempre que recebemos emails de raparigas a dizer que estão à nossa disposição ficamos muito entusiasmados. Quer dizer, a palavra certa é “entusasmados”, se é que nos estás a perceber. Por isso fomos logo a correr consultar o teu portefólio. Gostamos muito. Nem tanto dos teus trabalhos, sejamos sinceros; isso de desenhar gatinhos e raparigas com olhinhos manga... enfim! Mas já as fotos do teu álbum pessoal, alto lá! Sobretudo aquelas da praia... Categoria! Vê-se logo que és uma rapariga com um bom par de talentos! Vamos enviar-te a nossa morada por mensagem privada; podes vir fazer-nos uma visita quando quiseres. PS - Não tragas o teu pai.

Caros amigos, (...) Não posso deixar passar sem reparo a resposta que acabam de dar à Ana Sequeira. Compreendo e aceito o vosso sentido de humor tão particular, mas por vezes ultrapassam os limites do admissível na forma como tratam as pessoas que vos escrevem(...). Insinuar que ficam excitados com as mensagens que recebem deitando abaixo o trabalho de uma jovem ilustradora sem uma única crítica construtiva não me parece digno de profissionais. Mais, as referências aos “talentos” da minha filha são completamente descabidas. Passem bem, é a última vez que compro a revista. Aliás, só comprei desta vez para ver se publicavam o meu protesto. Ah, não gostei das BDs do Johnny Ryan, Rudolfo e Esgar Acelerado. É por causa dessa tralha que não têm lugar para os desenhos da minha filha?... Alexandre Recheado Sequeira via email Caro Alexandre Sequeira, Gratos pela mensagem, que aqui respondemos. Deixe-nos adivinhar, é o senhor gordo de bigode e fio de ouro ao peito que aparece numa das fotos de praia a comer uma coxa de frango? Aquela que tem por legenda “I Love My Daddy”?... Pois bem, está tudo explicado. Ainda não será um dado científico, mas este caso quase que prova que o mau-gosto é genético. Assim como as mamas. Apesar de as suas serem maiores, terem mais pêlos e serem um pouco mais descaídos. Nesse aspecto, os talentos da sua filha

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são superiores. Muito superiores. E desses nós gostamos! Disponha sempre. Ei Cru, tudo fixe? Soube que iam lançar um novo número e como fiel leitor do fanzine/revista desde o início gostava de sugerir uma banda para uma entrevista ou uma crítica. Nos últimos meses tenho ouvido falar muito dos Troika, mas não consigo encontrar nada deles nem no YouTube nem na Blitz. São assim tão underground? É que é mesmo estranho, até o prof. Marcelo fala neles.Caneco, devem ser “mêmo” bons! (...) Estou muito curioso e conto com a minha revista preferida para falar aí um bocadinho deles. José Gouveia Freixo de Espada-à-Cinta Caro José Gouveia, Efectivamente os Troika são do caralho! A melhor banda de Dub-electro-surf-metal-noise de que há memória. E tão underground que se recusam a dar entrevistas, concertos, editar discos ou mesmo lançar demos. Olhe, para falar verdade nem sequer são uma banda. Chegue-se cá, vamos contar-lhe um segredo. Ultimamente tem sentido assim como que uma sensação estranha no ânus? Assim como se estivesse a ser enrabado muito devagarinho?... Yep, são eles, é a Troika. Esclarecido? Senhores da Cru, (...) É uma pena que número após número a vossa publicação continue a cair no humor fácil e barato, na utilização excessiva de palavrões, sexo e violência. (...) Digam-me há mesmo motivo para isso? Não conseguem fazer coisas mais sérias e bonitas? Que desperdício de papel! Suzette Laudrette Assiete Paris, França Cara Suzette, Touché! A sua carta fez-nos pensar. Muito. Ora bem... Se haverá motivo para o que fazemos? Pois bem, a gente gosta. É motivo suficiente? De qualquer forma, como editores atentos ao feedback dos seus leitores, prometemos para breve uma edição “especial coisas bonitas” da Cru. Só com imagens de namorados a caminhar na praia ao pôr-do-sol, gatinhos a brincar com bolas de lã e... raios, não nos conseguimos lembrar de mais nada. Vê como é difícil?


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CONTA E ENSINA Zita Carícias •

Depois de anos de retiro das lides da escrita, eis que me encontro de novo perante vós, meus queridos leitores, incumbida da difícil tarefa de esclarecer, ensinar e aconselhar. Apresento-vos os conselhos de D. Maria da Graça Moraes e Salavisa, querida amiga de longa data, mulher muito experiente e muito vivida, que apesar da sua idade se mantém no apogeu. Aliás esta mulher é ainda capaz, enquanto damos à língua, de me levar várias vezes ao meu “apogeu”, se é que me faço entender. Deixo-vos pois com os seus conselhos avisados.

C

omo uma mãe que guia as suas filhas amantíssimas, abraço a tarefa de aconselhar a jovem fértil, vigorosa, impregnada do instinto reprodutor, ao tempo frenética e inexperiente, na sua demanda pelo melhor macho, aquele que satisfará as suas necessidades mais precípuas. Numa época em que a sociedade envelhece e decaí, inexoravelmente, em que os géneros, papéis e usos se confundem, como evitar o erro e a decepção? Não se contentem com imitações frouxas, ou pior, com adamados confusos, que não sabem bem o que fazer com o seu “lado feminino”, extra-sensíveis, interessados nas tuas mais mundanas conversas de gaja: para isso Deus criou os invertidos, bendito seja. Evitai os pomposos, cheios de si, quais balões inflados, redondinhos, impantes nas suas cores festivas. Quando bate o ponto, arrebentam facilmente, demasiado rápido, com um barulhinho ligeiramente desagradável, e não há forma de os encher de novo, se é que me percebem. Todo em todo uma experiência frustrante, posso afiançar-vos. Assegurem-se que o varão já foi desmamado, e que já resolveu o seu complexo de Édipo: convenhamos minhas queridas leitoras que não há nada mais comicamente pungente que um homem crescido, entesoado, que enquanto estremece em frémito, esguichando esporra, clama pela mãezinha em uivos; imaginem a pobre senhora respondendo à convocatória, arriscando-se a apanhar com uns salpicos, retorquindo em tom maternal – “ó meu filho vais sujar tudo. Toma lá um lenço de papel para te limpares…”.

Procurem pois, de forma consciente, o vosso varão encantado e não hesiteis, cumpridos os quesitos essenciais de aparência e sociabilidade, experimentar; tal como o apreciador prova o vinho, pode cheirar longamente o néctar mas só degustando é que perceberá o verdadeiro potencial que apresenta; depois cuspirá delicadamente e passará ao próximo cálice. E agora algo que vos poderá confundir: não se esqueçam que procuram homens, e não alegres companheiras de folguedos. Se as vossas inclinações apontarem nesse sentido poderemos falar, mas noutra ocasião. Aqui pretendo orientar a fêmea que deseja o macho inteiro, sem compromissos ou efeminações. Aquele que, na sua presença nos arremata o olhar, aperta o estômago e nos molha o conho. Aquele que queremos provar, que temos que ter. Isto nada nos diminui, ao contrário do que algumas insatisfeitas frustradas vos poderão querer fazer crer,

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antes nos define enquanto mulheres. No coito deverão procurar a plenitude da vossa natureza animal, possuir e ser possuída, o arrebato e a violência da penetração, o choque dos colhões daquele que vos dá prazer. Dito isto é importante que não criem ilusões minhas queridas amigas. Antes do nirvana, a menos que se contentem com pouco, há muito a fazer: a probabilidade de encontrarem um homem que saiba fazer uso dos seus atributos e encontrar o caminho no corpo feminino é muito reduzida. Tirando uns poucos naturalmente dotados (não confundam capacidade com tamanho. Como em tudo na vida convém não ter mais olhos que barriga, sendo que neste particular a expressão se aplica literalmente. Minhas amigas, não se iludam, desejem o membro que se adapte à vossa íntima anatomia sem dor nem desconforto, pois há ocasiões em que tanto se deseja a grande vergasta que vos sairá maior o presente que a encomenda e se sentirão como o condenado à frente do pelotão de fuzilamento) e outros, menos ainda, que acumularam experiência sabendo escutar os nossos suspiros de prazer, a maioria é de uma tristíssima e indigente instrução relativamente

aos prazeres da carne. Há pois que os educar. Não os sobrecarreguem com demasiada ou complexa instrução, pois bem sabemos que a capacidade de retenção e assimilação é assaz limitada, especialmente quando a glande do vergalho reclama a condução das operações. Ensinem-lhes pois o essencial e de forma prática; os movimentos, os sítios, os tempos. Não se deixem tentar pela facilidade induzida pela luxúria e sejam claras e firmes; não tentem começar no G o que deve começar por A, B, C. Mas acima de tudo não esqueçam a regra de ouro: nunca, mas nunca, deverá o varalho perceber as vossas suaves orientações. Será sempre ele, retesado, venado e viril o condutor da função, mesmo que não saiba distinguir um orifício doutro. Abracem a tarefa como quem lapida uma tosca pedra e a transforma num diamante. Façam destes ensinamentos uma demanda, um objectivo de vida. Ensinem o mais que puderem ao maior número que conseguirem, transformem-na em arte: a recompensa será vossa e de todas as vossas irmãs. Maria da Graça Moraes e Salavisa Ao 2.º dia do mês de Maio do ano 2012 do Senhor

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FILMES QUE O TEMPO ESQUECEU Amílcar Macieira •

M

udar-me para os EUA impossibilitou a minha participação no último número da Cru. Não que a redacção não tivesse insistido na minha participação, mas preferi afastar-me por completo de todos os velhos hábitos de Portugal. Agradeço a todos quanto sentiram a falta da minha rubrica. Segundo o editor, bastante claros na correspondência para a Cru insistindo no meu regresso, o que o terá obrigado a um e-mail categórico: “Tens que escrever alguma coisa para este novo número, Amílcar!”. Assim, é com muito prazer que regresso às páginas desta revista como crítico cinematográfico de serviço... Se é que se possa chamar cinema ao que habitualmente vou vendo. Em Junho passado, mês que passei no Alabama, descobri um fabuloso canal local de cinema e vídeo - H9WS. Emitindo apenas entre as 18 e as 6 horas durante a semana e 24/24 horas aos fins-de-semana e feriados, este canal transmite exclusivamente filmes de série B a Z, e outras obras que não poderão sofrer nenhuma classificação sem a criação de novas letras no alfabeto - o que não considero muito provável a curto prazo, mesmo com as parvoíces do acordo ortográfico. O Paraíso, portanto, para os apreciadores do cinema “rasca” e “arqueólogos cinematográficos”, categoria na qual orgulhosamente me incluo. Com a grelha preenchida com a transmissão de obscuros clássicos da 7ª arte made in America, ciclos temáticos, ciclos de autor, “actor” ou apenas de responsáveis pelos efeitos e “defeitos” especiais, a singularidade deste canal é a cuidadosa atenção a recentes produções caseiras dos seus espectadores. Não me refiro à imbecilidade de programas tipo “Isto Só Video” e sucedáneos, antes a verdadeiras pérolas repletas de ingenuidade, imaginação, gore, violência e poesia realizadas por cidadãos comuns numa amostra dos receios e singularidades da américa profunda. Nos próximos números da Cru (se vierem a acontecer), revisitarei em profundidade algumas dessas produções. Entretanto, destaque para três obras em particular, tão únicas que não podem passar sem referência imediata. Inéditas em Portugal, senhores dos festivais. Ah, pois!, andam distraídos, não é?...

IS THAT A ROCKET IN YOUR POCKET?

Realizador: Johnny B. Bad | Actores: Laurie Peterson, Charllote Nogood, Chip G. Pillson, Eddie Bowie, Margaret Danger, Geraldine D. Lux, Thomas Pixotta, Laura Dermme, Lucy Xiang Yan, Gustav Eiffel IV... | EUA, 1995

Is That a Rocket In Your Pocket? é uma obra-prima do cinema no sentido mais redutor do termo: imagens em movimento, apenas isso, nada mais do que isso. Estrutura narrativa, interpretação, edição ou continuidade parecem ser conceitos ainda não compreendidos pelo realizador e sua equipa de produção. No entanto, numa altura em que a indústria cinematográfica esbanja milhões a produzir lixo, não deixa de ser reconfortante assistir a algo também “trash”, mas feito apenas com uns poucos milhares. É que, para além de poupadinho, Johnny B. Bad é muito mais divertido... Vejamos: Lord Fuckner, imperador do Planeta Triple X, prepara a invasão da Terra. Os seus exércitos estão a um passo de nos aniquilar quando se apercebem da diferença entre meninos e meninas. E pronto... Oriundos de um planeta sem sexo, os invasores alienígenas deixam-se vencer numa série de emboscadas sexuais promovidas pelo exército da resistência, esbeltas guerrilheiras de seios firmes e fartos. Como nós gostamos.

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BAYOU BEAT

THE GIRL SAID YES!

Realizador: Robert W. Partridge | Actores: Robert Taylor, Julie London, Ann B. Cassavettes, Maureen Slute, Charles McGrawl, Royal Danish, Richard Nerdman, Douglas S. Davies, Ray Steeal, Stanley Eve, Nacho Galin... | EUA, 1972

Realizador: Sam Hardwood | Actores: William Dick Haines, Leila McHyams, Polly Wet Moran, Marie Fuckher, Francis X. Bushman Jr., Clara Blandick, William Janney, William T. Long, Junior Coghlan, Phyllis B. Crane... | EUA, 1967

Um pastor luterano viúvo dos arredores de Baton Rouge é pai de três endiabradas adolescentes desejosas de experimentar a vida para além dos rígidos padrões morais paternos. Numa pequena comunidade rural rodeada de pântanos, esse desejo não é mais que um sonho, até à chegada à vila de um grupo de motoqueiros em fuga da polícia após uma série de assaltos mal sucedidos. Do encontro desses hippies sobre rodas com as filhas do pastor, entre jacarés e areias mevediças, Bayou Beat Picnic, mais do que um filme é a desculpa para uma sucessão de encenações, mais ou menos explícitas, de sexo, consumo de substâncias alucinógeneas, ingestão desregrada de álcool, violência, sexo e drogas, álcool, orgias, drogas... e sexo! Uma metáfora beatnik da perda de inocência que se transfigura num violente ataque às convenções sociais e morais, quando o pastor, após experimentar ácidos, viola as filhas e se torna líder do grupo numa vida renascida para o crime e luxúria sem remorsos.

Com uma carreira prodigiosa de várias centenas de filmes, entre longas, curtas e médias metragens, parece não existir género que Sam Hardwood, o iconoclasta realizador de Orange County, Califórnia, não tenha abordado pelo menos uma vez na sua filmografia. The Girl Said Yes, obra que marca o início da sua fase mais intimista, é um curioso exercício de estilo inspirado nos filmes de propaganda escolares do início da década de 1950. Patricia Love (interpretada pela sensual Leila McHyams) é uma professora substituta que percorre as escolas a divulgar filmes de cuidados higiénicos e hábitos sexuais. Mas, muito ao contrário do que projecciona e aconselha nas suas sessões, Patricia Love é uma rapariga que ainda não aprendeu a dizer que não. Carente, introduz aos prazeres carnais inúmeros adolescentes das escolas por onde vai passando. Estas “actividades extra-curriculares”, registadas em película, acabam por se tornar públicas, dando início a uma sucessão de situações embaraçosas.

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MOLESKINE ERÓTICO

Rios Albertino, Marcial e anónimo - Ilustrações de Nuno Saraiva •

Do Vergalho sem usar de estafados truques de dedo iniciou a peleja com vigoroso enredo de língua pois era de sua vontade puxar o brilho dos fiordes da índia e enquanto ela descaía em transes de passa mundo já o macho internava os beiços no carnoso pitéu dos seus baixios mas como ela era filha dos trópicos e não se dando por vencida aperaltou-lhe um corrido nos foles e na flauta que os céus se renderam perante tão nutrida sabedoria esgotados os preâmbulos e quando já não se distinguiam de quem eram os agudos ais que se fundiam aos roucos uis desnorteando a moral do seu vergalho o marítimo Albertino depositou-lhe em sete voltas corridas a semente de lusitano orgulho Rios Albertino

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Enquanto saudava Júpiter com múltiplas

Apanhaste-me, mulher, a enrabar um rapaz,

preces,

e alto e bom som disseste que também tinhas cu.

a cabeça inclinada para trás,

não o dizia assim mesmo Juno ao lascivo Júpiter,

que não deixava de se deitar

levantado até à ponta dos pés,

Etão, no Capitólio, soltou um peido.

Os homens riram-se, mas o próprio pai dos

e quando Hércules, em vez do arco, vergava Hilas

com Ganimedes já crescidinho?

deuses,

achas que Mégara não tinha nádegas?

ofendido, condenou o adorador a jantar

a fugitiva Dafne fazia os ardores de Apolo:

quem lhe apagou o fogo? um rapaz espartano.

em casa três noites.

Depois deste escândalo, o pobre Etão,

Briseida nunca se negava de costas, mas Aquiles

quando quer ir ao Capitólio,

preferia o doce amigo.

dirige-se antes às latrinas de Patérclio

Por isso, mulher, poupa termos masculinos

e peida-se dez e vinte vezes.

para isso que aí tens: não é cu, são duas conas.

Contudo, embora tenha tomado cautela

com os seus estrépitos,

saúda Júpiter com as nádegas contraídas. Marcial

Marcial Marcial ou Marco Valério Marcial (em latim Marcus Valerius Martialis; 1 de março entre 38 e 40, em Bilbilis Augusta, actual Calatayud, Espanha - 102, também na Espanha), poeta epigramático latino.

Tudo o que por detrás derramo Mamo. Quando em descarregar me ocupo Chupo. Todo o fruto e carnal pomo Como. Quando bons peidos afinco Trinco. Muita merda também chinco, Sem que tenha disso achaque, Da mesma sorte que um traque, Mamo, chupo, como, trinco. (anónimo)

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BODAS, FUNERAIS E MENINOS QUE NÃO CONSEGUEM DORMIR Rogério Rotring - Ilustração de Rita Mendes •

E

stava uma tarde quente e seca. Procurei por isso a frescura do rio, como fazia habitualmente em tardes como essa. Tinham construído há poucos meses um pontão de pedra que entrava pelo rio dentro; servia de acesso aos pequenos barcos que ali acostassem. Sentei-me num degrau, de pés descalços, a escrever, ou a ler... Não me consigo recordar, mas o que realmente fazia não me parece, para o caso, de qualquer importância. Apenas importa que a dado momento acabei por reparar que tinha os pés repletos de formigas. Decidi afogá-las! Sorri e enfiei os pés na água, com crueldade. Retirei-os volvidos uns momentos, tão certo da minha maldade como do seu extermínio. Para meu espanto, as formigas ainda lá estavam, passeando tranquilamente entre os poucos pêlos, por cima das unhas, entre os dedos, não respeitando qualquer parte da anatomia dos meus pés. Ao jeito de desafio, mergulhei-os de novo na água e contei até cem. “Então quem mandava ali?” Mas, ao retirá-los, muitas eram ainda as que persistiam na sua deambulação. “Queriam lá ver?!” Não que tivesse por hábito lavar os pés com refrigerante ou mel, ou polvilhá-los de açúcar para servirem de chupa-chupas para insectos. “Que história era esta?” De novo pés dentro de água. Esperei uns bons 4 ou 5 minutos, apenas para me frustar de novo com mal sucedida tentativa de assassinato. Ainda lá continuavam. Raio de formigas! Este forte desejo de extermínio trouxe-me à memória o momento em que pela primeira vez vi uma salamandra, devia ter uns sete ou oito anos, na cidade, no passeio à saída de casa. Que raio de coisa nojenta e peganhosa era aquela? Corri a apanhar uma velha enxada do avô e truz!, acabei com ela! Não que as coisas tivessem sido assim tão fáceis. Vi-me obrigado a desferir vários, muitos golpes, porque o bicho parecia não estar interessado em definhar. Continuava a mover-se depois de cada golpe como que desafiando a minha vontade. Mas fui eu o mais persistente e a coisa acabou em vários bocadinhos de salamandra reluzindo ao sol da manhã. Mais tarde,

com alguns remorsos, decidi voltar ao local do crime para apanhar os restos e prestar-lhes as devidas cerimónias fúnebres. Podia ser um bicho nojento mas não me parecia honroso deixar o que restava dele na rua a apodrecer. Não encontrei o mínimo vestígio da Salamandra. Nessa noite não preguei olho. Não me saía da cabeça que aquele bicho que até então eu nunca vira e cujos restos mortais tinham misteriosamente desaparecido podia ser a mascote de uma bruxa. Talvez da velha Gregória do Poço, que morava mesmo em frente. Ou então, muito pior do que isso, seria a salamandra a personificação do próprio mafarrico que surgira para me atormentar? De que outra forma podiam ter desaparecido os pedacinhos de salamandra?... Ela não tinha morrido; não podia morrer, era o Diabo! Mal tinha virado as costas, julgando-a morta, os seus restos tinham-se juntado de novo, como por feitiçaria, voltando à sua forma inicial para se vingarem durante a noite, enquanto eu dormia. O que é que eu tinha feito?!… Por essa altura eram muito frequentes os meus sonhos com o Diabo. O mais comum era aquele em batia à porta de casa disfarçado de mendigo a pedir esmola. Era convidado a entrar por toda a família que lhe oferecia uma malga de sopa. Eu parecia ser o único a reconhecê-lo na sua verdadeira identidade, de nada valendo as minhas desesperadas chamadas de atenção. O mafarrico era muito educado e simpático com toda a gente, mesmo comigo, até que ficávamos sozinhos. Então, sorria maquiavelicamente, aproximava o seu rosto do meu e… nesse momento, felizmente, acordava. Estas memórias de infância fizeram-me reconsiderar o meu sadismo. Muito admirado com a capacidade dos seus pequenos pulmões, pedi desculpa às formigas, enxotando-as com todo o cuidado dos meus pés. Seriam elas mesmo formigas ou reencarnações do demónio? Não queria saber. Marimbei-me para a honra e reconheci a derrota. E nessa noite não tive problemas para dormir.

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POSTHUMAN

Fotografias de Daniela Alves •

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TRATADO SEMIÓTICO DO PIRILAU ESTRANGEIRO A. Sugadita - Ilustração de Wasted Rita •

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ra uma vez um Rei. Um Rei Menino, ainda pré-adolescente mas já senhor de espada, coroa e noiva. Vivia na Corte e todos os seus desejos e vontades eram realizados com apenas um estalar de dedos. Habituado desde tenra idade à vassalagem, o Senhor Rei Menino cresceu no meio das aias mulheres, em redor de vastas saias. Todos os dias ia passear pelo campo e correr por entre as macieiras atrás das pombas. Certo dia, o nosso Rei Menino entusiasmou-se mais do que o costume e sai disparado pelo campo fora e, não notando a terra molhada, resvala por uma ladeira e desaparece a rebolar pela montanha abaixo. Cá vemos o pobre moço, todo desfeito e desarrumado, com a nobreza amassada e o corpo cheio de bosta seca a caminhar de regresso ao castelo. Ainda o vendo ao longe, já os gritos da Rainha Mãe saíam disparados, “Mas que se passa Menino Rei? Que desordem impertinente vem a ser esta?” E uma vozinha fina, aguda e atrevida ouve-se em todo o castelo: “Oi, deixe o cara. Ele caiu ele e foi Jesus que o salvou”. De pronto todos os guardas se esmeraram em posição de busca para encontrar quem ousara proferir tal impropério. Mas a vozinha

continuava “Ele não teve culpa não. É o Demónio que fez rasteira e aí o moço foi caindo e se sujando e no fim vira tudo igual. Dá a ele uma segunda chance. Ó, quanto é de aluguel por esta casa aqui?” Nisto, já todos se inquietavam e ninguém percebia quem assim falava e ninguém compreendia esta fala. O nosso Rei Menino empalideceu. À sua volta a trama adensava-se porque não se sabia quem seria o sujeito mouro que assim discursava. Nisto, a Menina Futura Rainha empalidece também e aponta para o entre-pernas do seu futuro amado. Qual não é o espanto de todos ao constatar que era o pirilau real que falava e, ainda por cima, em estrangeiro. “Pôxa cara, levei um susto, todos olhando para mim. Estou ficando com fome, não tem nada maneiro para se trincar?” E foi assim que, pela primeira vez na história mundial das cortes se procedeu à revisão lexical da linguagem e todos se habituaram ao insaciável pirilau e ao seu vetusto atrevimento de se alimentar ostensivamente e ser bem alimentado. Para sempre ficará registado nos anais da história nobiliárquica o testemunho da sua eterna emoção “Galera, eu amo eu”.

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ESTE ROCK DE BAUNILHA NÃO TEM NADA Alice in Goreland •

D

irty talk, algemas, chicotes, látex, stilletos são alguns dos elementos mais óbvios, mas a lista é interminável. Fetiches sofisticados ou altamente bizarros, há em todos nós um certo fascínio por eles ou algum sentimento de voyeurismo. Não admira que o rock e o punk, por norma despidos de limites politicamente correctos e peritos na arte da subversão, da irreverência e da transgressão, se deixem entusiasmar com o universo do sadomasoquismo. Perversões e tabus sexuais têm sido a fuckin’ tease: umas vezes com conotações políticas, anti-sistema, outras com posturas feministas contra a promoção da mulher a objecto sexual, outras simplesmente de glorificação do BDSM. Rock’n’roll e hedonismo resultam numa simbiose de tal forma explosiva que já originaram algumas das melhores músicas de sempre. Desde o icónico Iggy Pop que implorava I Wanna Be Your Dog, a Lou Reed que (cantava sobre quem) se deixava seduzir com shiny boots of leather, aos Depeche Mode, em que Dave Gahan admite que há um jogo que tem de experimentar chamado Master and Servant, são muitas as letras que abordam o bondage, a disciplina, a dominação e a submissão, o sadismo e o masoquismo. Explícitas, implícitas, dúbias e ambíguas. A sua linguagem, como a dos contos libertinos de Marquês de Sade, desafia a moralidade da sociedade, ousa-se falar de sexualidade sem limitações. Tudo é bom quando é excessivo. E o rock não é também ele excessivo? Os Depeche Mode sempre se mostraram bastante interessados pela temática. Não se ficaram pela mais óbvia e já referida “Master and Servant”, com aqueles sons de chicote intempestivo que também ouvimos em “Lagartija Nick”, de Bauhaus ou em “Whip It”, de Devo. A letra de “Strangelove” é ambígua ao aludir a pecado e perdão, mas o código fetichista parece estar sempre presente. E o videoclip de “In Your Room” também não dá margem para dúvidas. Agora a verdade é que quando pensamos em fetiches, rock’n’roll e videoclips, The Cramps estão no topo da lista. Embora Lux Interior e Poison Ivy tenham estado juntos mais de 30 anos, a tensão sexual

entre os dois parecia inesgotável. Tanto as músicas como os videoclips emanam fetichismo e sexualidade. As meias de liga, os saltos, os corpetes, as palmadinhas de amor... Está lá tudo. Ivy era uma bad girl à altura de Lux: tocava guitarra, posou para capas de álbuns com o seu look de pin up over the top, foi a protagonista de videoclips como “Like a Bad Girl Should”. Também Lux Interior, altamente provocador, aparece no vídeo de “Naked Girl Falling Down The Stairs” num catsuit em látex vermelho que nem uma segunda pele ou com aquele outfit indescritível em “Creature From the Black Leather Lagoon”. E se Godard defendia “all you need to make a movie is a girl and a gun”, The Cramps vão mais longe e para os seus vídeos algo melhor que bikini girls with machine guns? Merzbow é outro dos grandes apaixonados pela temática do sadomasoquismo. Escreve frequentemente sobre BDSM e Music for Bondage Performance I e II é exemplificativo. Se precisarem de banda sonora, Masami Akita já tratou de tudo. E há fotografias tiradas pelo próprio não vos vá faltar orientação. (P.S.: Não aconselhável aos mais sensíveis.) Quando Sacher-Masoch escreveu “Venus in Furs”, nem poderia imaginar que esse viria a ser o título de uma das grandes músicas do século XX de The Velvet Underground. As botas, o couro e o látex, materiais associados ao sadomasoquismo, a fetishwear, são muitas vezes protagonistas. Neste tema também eles estão em destaque. A letra é, de resto, directa, a melodia arrepiante e a voz de Lou Reed dá-lhe uma tonalidade profunda que nos desperta pensamentos licenciosos. Kiss the boot of shiny, shiny leather Shiny leather in the dark Tongue of thongs, the belt that does await you Strike dear mistress, and cure his heart Taste the whip, in love not given lightly Taste the whip, now bleed for me É curioso ver que estes dominadores da palavra, se colocam frequentemente na posição de bottom. Costuma-se dizer, aliás, que muitos dos indivíduos

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The Cramps: Poison Ivy e Lux Interior

Poison Ivy

Poison Ivy outra vez (nunca ĂŠ demasiado)

Lux Interior e Poison Ivy (acertaram, quem mais?...) CRU #34 [ 21 ]


Lux Interior (sim, o artigo é acompanhado só com fotos dos The Cramps. Gostamos deles, que querem?...)

que aderem à posição de submisso são no dia-a-dia pessoas com algum poder. Na verdade, a inversão de papéis pode ser estimulante e aparentemente algumas rock stars também gostavam de ser abusadas. Para além de Iggy, Hank de Turbonegro desafia - so come on baby – spank my ass, com leather straps tight around my flesh, baby make it hurt, baby make it last. Parece-me bem: bad boys também merecem ser castigados... Os ingleses Adam & the Ants também cantaram este jogo de poder e sedução. Em “Beat My Guest” recuperam a imagem de puppy play dos Stooges - “I love you, be your dog” - e Adam Ant em “Whip in My Valise” pergunta incansável e arrebatado: “Who taught you to torture?”. Já o sedutor Leonard Cohen, com uma linguagem mais elegante, é certo, rende-se: “if you want a lover I’ll do anything you ask me to / and if you want another kind of love I’ll wear a mask for you”. Pelo outro lado, os britânicos Vibrators, dominadores, apresentavam ao mundo em 77 o explícito “I need a Slave”. Put some chains on you honey, I’m gonna pull ‘em up real tight. E “S/M” de Nekromantix faz-se anunciar com aquele início orgásmico e uma

postura sádica: I am a sadist with a whip I get my kicks I like The slap beat yeah tie up chicks You’re a masochist a victim of my sexual Fantasy my sexslave begging for orgasm... Mas ninguém levou o sadomasoquismo a um patamar tão sério como Betsy Bitch, “a primeira dama do heavy metal americano”. No álbum “Be My Slave”, o BDSM é o grande tema, de tal forma que chegaram a apelidar o estilo de Bitch como dominatrix metal. De facto, palavras como “the whip is my toy, handcuffs are your joy, you hold me down and I’m screaming for more” ou “I love to crack my whips and see you bow before me” fazem deste registo um hino a este estilo de vida. Não há comités, nem sequer o Parents Music Resource Center – P.M.R.C. –, que impeçam o rock de (d)escrever e cantar o desejo, o prazer e o imaginário do BDSM. As mãezinhas que desistam e o sadomasoquismo que seja celebrado! É rock sem baunilha para ser saboreado.

15 CHICOTADAS AUDITIVAS IMPERDÍVEIS The Cramps: Queen of Pain - Reverend Horton Heat: Love Whip - X-Ray Spex: Oh! Bondage Up Yours! Velvet Underground: Venus in Furs - Iggy and the Stooges: I Wanna Be Your Dog - Turbonegro: Just Flesh Killer Pussy: Teenage Enema Nurses in Bondage - Siouxsie and the Banshees: Melt! - Adam & the Ants: Whip in My Valise - Bauhaus: Lagartija Nick - Leonard Cohen: I’m Your Man - Vibrators: I Need a Slave Vice Squad: Latex - Love Nekromantix: S/M - Crass: Bata Motel CRU #34 [ 22 ]


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ORGULHO E PRECONCEITO

Anónimo Cobarde - Ilustração de Esgar Acelerado •

A Música na Publicidade A Publicidade é um mundo no qual me custava muito trabalhar. Para começar, ter de usar música de merda em anúncios para convencer cretinos a consumir coisas, ia-me tirar do sério. E depois ia ter vontade de esmurrar um gajo que contrata músicos para fazer versões de canções conhecidas mas ligeiramente alteradas, ao ponto de não ficarem iguais às originais e assim não pagarem direitos de autor. Este nível de desonestidade só com muita porrada, daquela que temos sempre a aumentar dentro de nós por tantos anos passados agarrados a jogos de computador que sacamos da internet e a ouvir música do Demo. Outra coisa insuportável na publicidade é a quantidade de temas indie-rock épico de abrir os braços ao mundo, com o pôr-do-sol de fundo. Aquele tipo de som que, ou vos faz sentir capazes de tudo e que o mundo é maravilhoso e somos todos amigos e andamos aqui a saltitar nus na praia, enquanto fadas madrinhas vos segredam ao ouvido que tudo vai correr bem. Ou então que a minha misantropia está mais uma vez a ser posta à prova.

Regresso ao Passado, ou Futuro... ou sei lá A vinda dos She Wants Revenge a Portugal foi, para mim, a gota de água nesta coisa de ficar preso num determinado tempo. Em todos os géneros musicais há este fenómeno. Diz-se que os rockabillies puristas não têm interesse em música saída depois de 1959, o ano em que o Buddy Holly morreu. Não é 1959? Ninguém quer saber. Todos contactamos, há muitos anos, com quarentões que só ouviam Led Zeppelin e The Doors aos quais chamávamos, “velhas guardas”. E agora estamos nós, quase, ou já, nos quarenta e andam-me estes marmanjos da nossa geração a ouvir música de meter os pés para dentro e pedir licença para viver. Os She Wants Revenge fazem uma música chata que

já se fazia nos anos 80 e para a qual um adulto, hoje em dia, não deveria ter paciência - a não ser que ande a Prozac, tenha crises amorosas típicas de adolescente e acne, ou tudo junto. Este tipo de música era apelidado de Som da Frente, nos anos 80, muito por causa desse grande nome da rádio - António Sérgio, numa altura em que ouvir rádio valia a pena porque havia rádios piratas e programas de autor. Agora é tudo merda e não se fala mais de rádio. Outro nome dado era Vanguarda. Música de Vanguarda. Nada pretencioso. Englobava uma data de bandas que iam desde os Joy Division aos No Means No, passando pelos The Clash ou pelos SPK. Mais abrangente naquela altura era difícil até porque eram tempos em que ou se era Punk, ou Metaleiro, ou Rockabilly ou Vanguardista. E apesar de tudo, os Vanguardistas eram os que ouviam mais géneros musicais. Seria de esperar que a evolução desses gajos fosse no sentido de, hoje, ouvirem mais diversidade ainda e terem largado essas cagadas mais deprimentes de adolescência. Mas não, a maior parte continua a ouvir os Echo & The Bunnyman e o Peter Murphy (parece que encheu o Hard-Club, o ano passado) e quando não são bandas daquela época são bandas de agora a fazer o mesmo, como os She Wants Revenge ou aqueles outros muito chatos e insuportáveis, os Interpol. Até era capaz de compreender um adolescente de hoje em dia a ouvir estas tretas. Apesar de tudo, qualquer coisa que nunca ouvimos é novidade. E este é um tipo de música para adolescentes. Para os outros, digo: ouçam um bocadinho de Black Keys e vão apanhar sol. (O que me lixa a teoria é que eu sei que eles até ouvem Black Keys... ouçam mais vezes então, chatos do caralho!) Eu também comecei com aquelas tretas, e cheguei a pensar que os Sisters of Mercy eram a melhor merda de sempre. Também fui adolescente e imbecil, como todos os adolescentes. Havia aquele ritual de ir à discoteca apanhar com parolada durante três horas e quarenta e cinto minutos para ficarmos todos felizes, porque o DJ no fim passava uma música dos

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Jesus & Mary Chain, outra dos Sisters of Mercy e qualquer outra dos The Cure. E um gajo dançava assim, num embalo meio como um judeu a rezar. Para a frente e para trás. Para a frente e para trás. Para a frente e para trás. Alguns mais destemidos abriam os braços como uma espécie de corvo meio apaneleirado. Desconfio que era um bocado como o Bono dançava na época ou se calhar por causa do vocalista da banda mais azeiteira de sempre da Península Ibérica - Heroes del Silencio. E não me estou a esquecer nem dos Pólo Norte nem dos Santos & Pecadores. Falo de azeite, daquele que escorre por calças de napa preta. O que incomoda nem é o facto de ser música deprimente. Aceitam-se coisas deprimentes mas com alma, de adulto com a vida fodida, putos a chatear, esposas que não deixam ir para os copos e contas para pagar. Tristezas à homem. Os She Wants Revenge e outras mariquices do género fazem música

deprimente para banda sonora de primeira namorada que nos deixa e nos faz pensar que NUNCA mais vamos arranjar melhor. NÃO TENS IDADE PARA ISSO, CARALHO!!1 [1] Talvez tenha metido os pés pelas mãos a explicar-me e a mostrar o meu ponto de vista, mas acredito que a direcção da Cru me fodesse a cabeça se o meu texto fosse só: os She Wants Revenge são uma merda. Comam palha, vão-se foder! [2]

[1] Atenção Esgar: deixa ficar a gralha do 1 depois de !!, É uma piada de internet a pessoal que fala com maiúsculas e com muitos pontos de exclamação sempre seguidos de 1. N.A. (Decidi deixar a tua observação como nota de rodapé. Ainda tem mais piada! N.E.) [2] Podes ter a certeza. O que fariamos com o espaço reservado para esta crónica se escrevesses só isso? Preenchíamos com bonecos?... Concordo plenamente; os She Want Revenge são uma treta, mas mesmo que escrevesses uma tese de 900 páginas com tudo explicado ainda assim haveria quem nunca conseguisse perceber. Enfim, não se pode dizer que não tenhas tentado... N.E.

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THE COMIC-BOOK HOLOCAUST Johnny Ryan •

Falos, vaginas a fazer de ió-iós, mijo e merda, nazis e judeus, doenças venéreas, violência, violações, genocídios e o apocalipse, estes são alguns dos “materiais” com que Johnny Ryan vai criando as suas histórias. Nada merece o seu respeito. Num mundo que caminha para a higienização dos actos e das ideias e para o politicamente correcto sabe bem ler os seus comics. Aqui não há vacas sagradas. Por isso mesmo, Johnny Ryan é um autor que, ao mesmo tempo que tem uma vasta legião de fãs e seguidores vai, também, acumulando um grande número de detractores e inimigos. 69-11 é uma das suas ilustrações mais polémicas: uma das torres do World Trade Center faz um broche a um dos aviões do atentado que lhe corresponde com um minete. Uma imagem muito pouco agradável para o conservadorismo dos leitores norte-americanos. Terá a sátira ido demasiado longe? Johnny Ryan é um autor inteligente ou apenas um provocador barato?... Decida o leitor. Neste número da Cru publicamos três pranchas de The Comic-Book Holocaust, livro que compila cerca de uma centena de pranchas do seu caderno de esboços, cada uma dedicada a uma personagem de banda desenhada. De Astérix a Batman, ninguém sai incólume. Mas o resultado é divertido. E em última análise essa é uma grande lição. Saber brincar sem medo de ultrapassar os limites da decência e do correcto. Obrigado, Johnny Ryan. EA

Prison Pit

Planet of the Alfs

69-11

Boobs Pooter - Angry Youth Comics #13

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NUNCA VAIS DAR CABO DA PIRATARIA, E A PIRATARIA NUNCA VAI DAR CABO DE TI (desconhecido) - ilustração de Alex Gozblau •

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gora que as brigas entre a SOPA e a PIPA esmoreceram e que Hollywood prepara a sua próximo pretexto para lançar uma ofensiva contra a liberdade na internet através da ACTA e da PCIP, talvez valha a pena parar para pensar como é que a guerra contra a pirataria pode ser realmente ganha. Na verdade não há vitória possível, mas isto é algo que nenhuma empresa está disposta a ouvir. À medida que a tecnologia evolui, a luta entre a pirataria e os direitos de autor vai aumentando, e os piratas estão sempre, sempre um passo à frente. Ou seja, não estou para aqui a tentar escrever um artigo pró-pirataria, apenas a tentar mostrar que a pirataria é uma realidade inevitável, apesar de as empresas de comunicação se recusarem admiti-lo. O que é óbvio é que a solução não passa pela legislação. A pirataria já é ilegal nos Estados Unidos e em muitos outros países no mundo e, no entanto, a prática vai persistindo e é feita cada vez mais às claras. Para além de se legalizar a banição de sites, à semelhança do que acontece na China e no Irão, não há nenhuma outra solução legislativa. E era precisamente isso que a SOPA e a PIPA estavam a tentar fazer, opondo-se de forma tão evidente aos princípios defendidos pela Primeira Emenda que a tentativa foi completamente aniquilada por protestos em toda a internet. Tamanho consenso na internet só poderia ser alcançado caso alguém tentasse proibir a publicação e partilha online de fotos de gatinhos. O que fazer, então? Precisamente o contrário. Perceber que a pirataria é, na verdade, um problema de serviços. Neste momento, através do browser do computador no qual estou a escrever este artigo, é possível fazer o download e começar a ver um filme depois de uns poucos cliques certeiros. (Tudo isto não passa de uma mera suposição, é óbvio.): 1. Mover o rato e clicar no bookmark “Pirate Bay”; 2. Escrever “The Hangover 2” (filme péssimo, na verdade, só para dar o exemplo de uma estréia recente.); 3. Clicar no resultado com maior velocidade para download; 4. Clicar em “download torrent”; 5. Abrir automati-

camente o uTorrent; 6. Esperar dez minutos pelo download e 7. Ver o filme e revê-lo quando quiser. Não é muito correcto de um ponto de vista ético, não deve ser feito, mas está disponível, é fácil e não só não há ninguém para nos impedir, como nunca haverá. Se depois de dez anos e de milhões e milhões de dólares gastos em despesas jurídicas conseguirem finalmente pôr fim ao Pirate Bay, existirão sempre centenas de outros sites de torrents e mais irão seguramente surgir. E caso se consiga pura e simplesmente proibir a circulação de torrents na net, algo novo os substituirá. A pirataria não consiste em tomar de assalto lojas e armazéns, em partir uma janela e fugir com o stock. É mais como estar numa loja com todos os dvds do mundo, sem empregados nem seguranças. E assim que se pega num dvd ele é automaticamente substituído por outro. Ou seja, na verdade não se está a roubar nada de concreto. Imaginando que estás numa loja deste género, a única coisa que te impede de clonar todos os filmes à vista seria a tua ética, os teus princípios morais. E qualquer pessoa que saiba como entrar nesta loja não vai deixar que a sua consciência o impeça de o fazer, especialmente não existindo uma “perda” tangível que o faça realmente sentir-se culpado. Ou seja, não se trata de algo que tenha uma existência material. Não se vai sentir a falta de nada e, geralmente, é isso que prova a existência de um roubo, é isso que o assinala. O argumento das indústrias da música e do cinema de que por cada download se perdeu uma venda é absurdo. Caso possa, talvez leve todos os filmes da tal loja imaginária, mas será que gastaria três milhões de dólares na compra de todos os seus dvds? Não. Provavelmente compraria apenas os meus dois filmes favoritos. Logo, sim, há perdas, mas são ínfimas comparadas com o que essas empresas dizem. O verdadeiro inimigo, aquele que os estúdios e produtores deveriam lutar, podemos encontrá-lo nas sete etapas do processo de download em dez minutos (o qual irá demorar apenas cerca de dez se-

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gundos assim que a velocidade da net nos Estados Unidos se equiparar à do resto do mundo). Actualmente, a indústrias da música e cinematográficas ainda estão presas ao passado e avançam muito lentamente rumo ao futuro. Ainda acreditam que as pessoas, daqui por cinco anos, vão querer comprar dvds e blu-rays e que um bilhete de cinema vale de facto quinze dólares. A Netflix é aquilo que mais joga a seu favor neste momento, mas os estúdios insistem em fazer-lhe a vida difícil e a vê-la como uma ameaça e não como uma solução. É perturbador. O que os estúdios têm de perceber é que todos os produtos que vendem são excessivamente caros. É incrível que, por exemplo, o preço dos bilhetes de cinema continue a aumentar. Como é que podem de facto achar que ao cobrarem dez ou quinze dólares por um bilhete vão fazer com que o número de espectadores das salas de cinema aumente? Em vez de baixarem os preços, duplicam-nos, pensando que coisas como o 3D e o IMAX justificam um aumento de cinco dólares por bilhete. Não conseguiram perceber que as pessoas preferem que as coisas sejam fáceis. Deslocar-se a um cinema já é por si só suficientemente trabalhoso sem que se tenha de pagar pelo privilégio. Ir a uma loja comprar um dvd em vez de o alugar ou fazer o download é, em termos gerais, algo de pouco prático a não ser que : a) gostes mesmo de um filme em particular ou b) sejas um apaixonado por cinema ou um coleccionador ávido. Vi há uns tempos no reddit um conceito para uma ferramenta de distribuição online de filmes que seria o maior aliado da indústria do cinema - se estes se dessem ao trabalho de a analisar. Era, no fundo, como o Steam (a distribuidora online para clientes de jogos-de-vídeo para PC). Dar-nos-ia a possibilidade de alugar ou de fazer o download de filmes de forma fácil, de fazer listas e selecções personalizadas, de utilizar diferentes interfaces e partilhar conteúdos com amigos e outros utilizadores. O serviço seria de facto mais eficaz do que o processo de pirataria por sete etapas: 1. Abrir “Movie Steam”; 2. Procurar “The Hangover 2”; 3. Clicar no enter para alugar o filme por $2 durante 24 horas e 4. Ver o filme. O processo seria mais eficaz, poupando-nos três etapas! E teria a vantagem de não nos fazer sentir culpados por estarmos a fazer algo de ilegal. Em parte, o Netflix funciona assim, apesar de o utilizador nunca possuir na verdade os filmes que quer ver e de a possibilidade de escolha ser muito limitada. No que à compra de novos filmes diz respeito, os

estúdios estão tão presos a uma imagem do passado que dá vontade de rir. As ofertas consistem frequentemente na compra de um blu-ray por trinta dólares que tem como extra um segundo disco com meia dúzia de cenas cortadas... Poupem-nos! E que tal pagar antes dez dólares pelo novo Harry Potter e vê-lo quando e onde me apetecer? Ou seja, trata-se de uma negociação em que o cliente poderá sempre fazer o download gratuito do filme. Mas parece que, pelo contrário, são eles que nos estão a fazer um favor ao considerarem a hipótese de porem à disposição um download legal. Como se fossem eles a ditar as regras do jogo! Não é assim que funciona uma negociação! Talvez as regras do jogo não sejam as mais correctas, mas é esta a realidade a enfrentar. No entanto, os estúdios ameaçam acabar com a Netflix cobrando-lhes enormes percentagens em troca de uma autorização de acesso aos seus conteúdos. A Netflix está na linha da frente contra a pirataria e os grandes estúdios não parecem querer perceber isso. É incrível. O “Movie Steam” traria consigo alguns problemas práticos. Seria difícil fazer com que várias multinacionais concordassem utilizar o mesmo serviço de distribuição, e eu de certeza que não gostaria de ver a “Sony Steam,” a “Universal Steam” e a “Paramount Steam” amontoadas no meu computador. Também seria difícil gerar um consenso entre elas no que a uma descida de preços diz respeito, visto estarem habituadas a cobrar entre quinze a trinta dólares por produtos físicos. Seria quase impossível fazer com que não inventassem novos direitos de autor digitais, e nem pensar na opção de partilhar um filme com outra pessoa. Claro que tal medida também poria fim a serviços como o Netflix e a Redbox (e dava cabo de uma vez por todas da Blockbuster), afectando todos os pequenos comércios de venda de dvds. É óbvio que podemos sempre argumentar que os dvds vão de qualquer forma desaparecer dentro de dez anos e que as pequenas lojas terão de qualquer das formas de encarar essa realidade. O argumento de que “as pessoas vão sempre querer suportes materiais” também é corrente, mas pessoalmente desconfio que tal pode não ser o caso dentro de vinte, dez ou mesmo cinco anos. Ora, ao oferecerem um serviço deste género, pelo menos estariam a tentar adaptar-se à realidade. Pelo menos estariam a ir na direcção certa. Fazer pressão para que se aprovem leis que ameaçam a liberdade na internet e irritam toda a população de um país é, no mínimo, uma péssima escolha. Os milhões de

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Hangover 2 - É para fazer merdas destas que os estúdios nos querem esmifrar? Para o raio que os parta! (Nota da Redacção)

dólares que gastam em lobbies a tentar instaurar coisas como a SOPA e a PIPA, poderiam ser aplicados na pesquisa de novos meios de distribuição à semelhança do já mencionado. E talvez a questão em que nunca ninguém pensou seja a seguinte: se calhar os filmes são excessivamente caros. Ou melhor, muito mais caros do que aquilo de que necessitam de ser. Depois da SOPA e da PIPA, Hollywood assemelha-se a um dinossauro, tão fora da realidade como alguém que tentasse pôr fim à rádio ou a cassetes de vídeo caseiras. Nesta altura do campeonato há, precisamente, investidores que tentam financiar de forma activa estas empresas de forma a desmantelar a indústria, uma vez que o actual modelo de produção de filmes parece estar desactualizado. A internet tem vindo a produzir vários realizadores talentosos que trabalham com pequenos orçamentos, ansiosos por divulgarem o que fazem. Talvez os actores de topo não precisem de salários multi-milionários, sobretudo se tivermos em conta que existem milhares de amadores a dar no duro apenas para poderem divulgar o seu trabalho. Talvez nem todos os argumentos gráficos precisem de cem a duzentos milhões de dólares de orçamento para que se tornem num filme, quando todos os dias centenas de argumentos originais e criativos são ignorados e deitados para o lixo. Talvez não precisem de ser gastos cem milhões de

dólares extra na promoção e marketing de um filme, numa época em que todas as pessoas ignoram a publicidade e instalam bloqueadores de pop-ups nos seus browsers. A indústria rasteja em direcção a este tipo de práticas e sofre as respectivas consequências. Sim, é verdade que nenhuma medida irá pôr fim à pirataria. Mas é igualmente verdade que nada irá pôr fim às indústrias do filme, da música e dos jogos-de-vídeo. Projectos com orçamentos megalómanos e ideias pagas a preço de ouro serão, talvez, cada vez mais raros. Mas tal efeito poderá ser benéfico em termos criativos para todas estas indústrias. Ameaçarem-nos que a cultura pop vai desaparecer devido à pirataria é, no mínimo, uma parvoíce. Penso que se deve pagar por produtos que o mereçam. Não acredito que a solução esteja em insistir no mesmo modelo de tabelação de preços e de distribuição, como se ainda estivéssemos em 1998. E, acima de tudo, não acredito num modelo de censura à internet para que as grandes companhias, produtoras e editoras possam facturar mais uns quantos milhões e adicioná-los às suas contas bancárias já chorudas. Tratem os clientes com respeito e eles tratar-vos-ão de forma igual. É assim que se combate a pirataria.

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Tradução de Lucinda Luminosa


NOVO ACORDO ORTOGRテ:ICO Wasted Rita 窶「

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A maldição veio do inferno (n.º 1, 1 Março 1976)

Os homens de sangue frio (n.º 2, 15 Março 1976)

...E os ratos possuíram-na (n.º 3, 15 Abril 1976)

A lava sensual (n.º 4, 1 Maio 1976)

Os homens de sangue frio (n.º 2, 15 Março 1976)

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ZAKARELLA, BELA E PERIGOSA Jorge Silva •

...E os ratos possuíram-na (n.º 3, 15 Abril 1976)

Luxúria no fundo do mar (n.º 7, 15 Junho 1976)

A

Revolução de Abril de 74 abriu as portas ao trash erótico e humorístico em Portugal. Em Março de 1976, a editora Portugal Press de Roussado Pinto (Lisboa, 1926-Lisboa, 1985) lança a revista Zakarella, de 36 páginas. Apresentava um sortido de histórias de terror de valor irregular, provenientes da americana Creepy, da editora Warren, com pepitas do calibre de um Frank Frazetta ou de um Esteban Maroto e muito terror pelintra. A justificar o nome, esta versão lusa da americana Vampirella, tinha um conto de Ross Pynn (o mesmo Roussado Pinto). Por ironia do destino, outra consequência de Abril liquidou a revista ao número 28. O Banco de Portugal não autorizou a Portugal Press a pagar em divisas os direitos de publicação das histórias da Warren com a justificada precisão dos dólares para importar bens de primeira necessidade. Zakarella é uma renegada, em fuga de um Inferno terrestre governado por um cruel Satã. Teletrans-

portada directamente para Lisboa, ignorante da malvadez e lascívia lusitanas, a ingénua Zakarella sujeita-se às mais bizarras sevícias sexuais saídas da caneta delirante de Roussado e apimentadas com as carnes voluptuosas, adereços fálicos, monstros infernais e fluidos pútridos do pincel de Carlos Alberto Santos (Lisboa, 1933). Anatomista precioso, o prolífico ilustrador da história heróica de Portugal em coleções de cromos e de infinitas capas para aventuras em cenários de crime, guerra e faroeste da Agência Portuguesa de Revistas, pinta laboriosas composições a guache e tinta da china para esta capitosa morena de curvas estonteantes e indumentária mínima, que tem o feliz poder de regenerar o seu corpo após toda a casta de malandrins e bicharada lho arrancar literalmente aos pedaços. A história acaba invariavelmente numa orgia de sangue e horror, a contento do amo Satã e dos leitores da revista, que ainda hoje suspiram por este pecadilho juvenil.

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Do Vergalho Rios Albertino

Nascida para amar e contar Zita Carícias

Novas crónicas Coriolano Leite

De terras da Índia, Rios Albertino regressa com pimenta e outras especiarias, mas também com um manuscrito narrando as suas aventuras eróticas com as amigáveis nativas. Perdido na Torre do Tombo por 500 anos e agora publicado pela primeira vez.

2.ª edição da há muito esgotada compilação dos contos de Zita Carícias. Uma reedição essencial da literatura porno-radical-feminina-libertária, revista e comentada pela própria, com introdução do amigo de sempre, Eduardo Prado Coelho.

O livro maldito de Coriolano Leite, jornalista, investigador e cronista que desafiou Salazar e enfant terrible renegado por todos os quadrantes políticos após o 25 de Abril, que compila a totalidade das suas crónicas na Cru e outras publicações anarquistas.

A CASA EDITORIAL LEIO TODOS! É UMA SUBSIDIÁRIA EIA! - EDITORES INDEPENDENTES ASSOCIADOS CRU #34 [ 42 ]


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CANTINHO SENTIMENTAL

Valquíria Aragão - Ilustração de Mariana, a Miserável •

13,5 x 10,5 cm grayscale / 300dpi

Cadela com cio, 47 anos Perdoem-me os fiéis leitores da Cru pela inconfissão, mas eu tenho um problema urgente que se tem vindo a agravar nos últimos tempos. Sou casada e tenho uma vida sexual satisfatória, mas sempre que vou na rua e vejo um homem, seja ele quem for, fico excitada e molho as cuecas. O que posso fazer? Cara leitora, Não resolva nada. Isso não é um problema. Essa é apenas a forma da mãe Natureza pôr as mulheres ao serviço dos homens. O resto do mulherio é que tem problemas, minha querida, que não se dão ao desplante e à pouca-vergonha. Se as mulheres molhassem mais as cuecas metade dos problemas

da humanidade já seriam história do passado. Além disso para que serviriam os pensos diários?

Em busca do conhecimento perdido, 23 anos Cara Valquíria, Há já muito que lhe pretendo escrever, mas nunca ganhei a coragem necessária, mas a verdade é que tenho não uma mas muitas questões. Nunca namorei. Os meus pais chegaram a um entendimento com os pais do meu marido ainda eu não tinha nascido. Assim, aos 16 anos deram-me a emancipação pelo casamento. O meu marido, com 72 anos na altura, é que me explicou tudo sobre o prazer. As-

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sim, ele explicou-me que um homem é diferente em quase tudo de uma mulher. Por exemplo, explicou-me ele, a fidelidade não lhe está no sangue, pelo que ainda ontem víamos calmamente televisão enquanto a nossa mulher-a-dias decidiu limpar o pó da prateleira mais baixa da estante. Ele não hesitou e meteu-lhe a mão por debaixo da bata. Fiquei um pouco incomodada pois eu estava ali ao lado e a minha saia era bem mais fácil de levantar. Além disso, já não é a primeira vez que sugere experimentar um ménage a trois com a minha irmã e eu não sei bem o que lhe responder. Em matéria de coisas esquisitas já lhe fiz sexo oral uma vez, mas também não sei se devo repetir. Além disso, já me falaram nos preliminares e eu até aludi ao assunto


na última vez que fizemos o amor, há cerca de 2 minutos atrás, mas ele nem me ouviu. Ora, minha querida, realmente são muitas as questões que me coloca. Tantas que davam para editar um livro. Mas ainda bem, pois são muito comuns as suas dúvidas e está na hora de esclarecer todas as mulheres que, como a nossa fiel leitora, tiveram de aprender pela prática em lugar de andar a ler livros sobre o assunto. O seu marido tem razão em dizer que é diferente, eu diria, em tudo de uma mulher. Por exemplo, ao contrário das mulheres que só têm a capacidade para amar um homem de cada vez, a capacidade de amar de um homem não conhece limites e aumenta quantas mais companheiras ele tiver. Este facto foi já comprovado em inúmeros estudos científicos. Desta forma, quantas mais amantes ele tiver melhor será para si, pois o amor que ele sente por si aumentará. Quanto ao ménage a trois a leitora é verdadeiramente uma mulher de sorte, pois este é o mais claro sinal, eu diria mesmo evidência, de que ele está perdidamente apaixonado por ti. O sentimento que ele nutre por si é tão forte e tão verdadeiro que nunca se consegue saciar. Assim, quem melhor do que a sua irmã, a pessoa no mundo mais parecida consigo (bem, a sua mãe também seria uma possibilidade) para expressar o amor que ele sente por si? Além disso, tem ainda a vantagem adicional de poder estreitar relações familiares. Pode até convidar quiçá as suas primas. E faça sexo oral, por favor. Não há nada que a deva preocupar, pois o esperma tem um sabor delicado, exótico, tem um excelente valor nutritivo com propriedades medicinais únicas e importa realçar que não engorda, pois só contém 10 calorias por litro. Qualquer homem não ignora estes factos, logo é por amor e porque se preocupa genuinamente consigo que lho pede. Finalmente, a velha questão dos preliminares. Teve muita sorte em ele não a ter ouvido ou, por amor, ele fez de conta que não a ouviu. Isso não se pede a um homem, minha querida, nunca. Preliminares ocorrem no desporto (futebol, hóquei, etc.). Ainda estou para descobrir quem se lembrou de misturar desporto com sexo. Fazer preliminares para um homem é doloroso. Se o amasse verdadeiramente não lhe pedia isso. Na verdade, se o amasse não tinha de lhe dar tanto trabalho para ter um or-

gasmo. Deixe de ser egoísta. Depois disto tudo, e dada a avançada idade do seu ditoso marido, aproveite cada dia para satisfazer todas as suas necessidades. Agora está na posse de todos os dados para o fazer ainda mais feliz.

Graxista invisual, 19 anos Valquíria, ajude-me por favor! Tenho 19 anos e gostava muito de dar mais prazer à minha namorada. Sei que estimular o clítoris ajuda a aumentar o prazer, mas não consigo encontrá-lo. O que devo fazer? Caro leitor, Existem lanternas a pilhas para isso mesmo.

Adepta da tecnologia de ponta, 33 anos Costumo masturbar-me com o meu vibrador, mas estou tão habituada a ele que já não me consigo excitar… Gostava de comprar um novo, mas será que não vai acabar por ser igual? Como posso escolher um que me traga novos estímulos? Minha cara, O seu problema não é difícil de resolver, visto existirem à venda inúmeros modelos. Existem inclusivamente alguns com um pequeno acrescento para estimularem aquela coisa pequenina que o João, por esta altura, já deve ter descoberto. Só a aconselho a não se casar, pois o marido tem sempre o mesmo modelo de vibrador, só muda o tamanho e a partir de uma certa idade nem isso muda muito.

Religiosa praticante, 32 anos Querida Valquíria, Sempre fui muito religiosa até porque foi na igreja que encontrei conforto muitas vezes. No entanto, nunca pensei que isto me acontecesse. Faz já dois meses que o nosso velho padre morreu e, a substituí-lo veio um jovem padre, ex-missionário colombiano, mais ou menos da minha idade, por quem me perdi de amores. Confesso-me em todas as oportunidades só para me aproximar dele e respirar o seu cheiro a hóstia consagrada. À noite imagino-

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-me a roçar-lhe a batina ou a lavar os seus pés como se eu fosse a Madalena e ele o Cristo. Será que terei perdão pelos meus pecados? Ó minha amiga, Isso de igreja não é para mim, mas se encontra lá conforto lá isso encontra. Os padres são homens como outros quaisquer. Comece por lhe lavar os pés (cada um tem a sua tara), mas depois suba-lhe pelas pernas acima e depressinha, que o que ele quer sei eu. E dê-lhe forte e feio. Isso resolve logo esses sonhos que lhe tiram o descanso e tenho a certeza que a missa dele fica logo mais arrebitada.

De boca aberta, 27 anos Dona Valquíria, Gosto muito do meu namorado, mas ele tem um aspecto que me deixa preocupada: ele não abre a boca. Isto é, quando fazemos amor ele não faz qualquer barulho, é silencioso. Será que não gosta de fazer amor comigo? Cara leitora, O problema seria se fosse ao contrário, ou seja, se a leitora não lhe abrisse a boquinha, o que, tenho a certeza, não acontece. A leitora procura um companheiro que fale ternamente consigo, como fazem nos filmes, e lhe diga lamechices como “sim, amo-te muito”, “és tão bonita”, “sim, gostei muito, meu amor” blá blá blá. A leitora procura uma grafonola. Deixe-me informá-la desde já que um homem que fala na cama está sempre a mentir ou, na melhor das opções, a dizer meias-verdades. Por isso vai bem servida e console-se que isso é homem de acção.

Pêlos arco-íris, 17 anos Gosto de ter os pêlos púbicos coloridos e já os pintei de várias cores. Acontece que, agora, pintei-os de vermelho, mas como o meu marido é do Porto recusa-se a fazer amor comigo. Minha querida, Só me ocorre uma solução óbvia. Faça amor com um benfiquista ou um filiado do Leixões. Cartas para esta coluna: Dr.ª Valquíria Aragão | crurreio@gmail.com


ALTO! Alto! Lovers & Lollypops

THIS SHOES ARE MADE FOR... KILLING! Luís Manso - Ilustração de Horácio Frutuoso •

Q

ue se lixe se são bons ou não. Isso, na verdade, pouco importa (por acaso, a meu ver, The Shoes são das melhores coisas que têm por aí andado. Franceses, merecem críticas inglesas que os colocam numa nova gaveta rotulada de dark electro-pop). Lançado no início de Março, o vídeo de Time To Dance, é mais que um vídeo, em todos os aspectos. É uma história sangrenta contada ao longo de 8 minutos. O personagem principal é Jake Gyllenhaal (sim, esse que andou embrulhado em tendas e para se abrigar do frio se enrolou numa das histórias gays que marcaram o cinema na última década, no “Segredo de Brokeback Mountain”). É aqui um assassino frio e implacável. O vídeo começa com um dos temas que marcaram a curta carreira dos The Shoes, “America”. Um casal dança. Alguém olha, sem face definida, com vícios assumidos. Numa referência ao que de melhor o cinema tem para nos dar, essa face sem face faz da esgrima o princípio de algo verdadeiramente impressionante. Esta primeira parte do vídeo termina com o essencial para se perceber o que se segue. Pista aberta para “Time to Dance”. O assassino em série, entre momentos de um dia normal, e o que ele, o que o puxa para a libertação de algo que nele lhe corre errandamente no sangue e faz bater um sangue envenenado e alimenta uma alma perdidamente doente. São 8 minutos de violência. De detalhes. De imagens são o que são. E poderia

puxar aqui por Roland Barthes ou Ludwig Wittgenstein para uma análise filosófica e semiótica do que aqui se se passa. Ou ir a Freud, quem sabe. Honestamente, que se lixe. Pouco importa. O vídeo é violento, e pronto. E é impressionante, e pouco mais a acrescentar. Nada de novo, também. Quando na memória temos o trabalho de Romain Gavras. O grego, que assinou vídeos como “Stress”, dos franceses Justice. Ou o também impressionante e chocante (e sei lá mais o quê, que aqui possa ser usado como adjectivo) Born Free, da norte-americana M.I.A. No primeiro, há miúdos a vandalizarem tudo. No segundo, uma tentativa de limpeza de quem é ruivo (um daqueles vídeos com um aviso ao início, para o que se segue). Podemos agora dar um toque meio intelectual ao texto. E aproveitar para dizer que violência vem do latim “violentia”. A força que se usa contra o direito e lei. “Violentus”, o que age com força impetuosa excessiva, exagerada. Pode significar “poder”, “denominação”. E sim, todos os vídeos aqui referidos são violentos. Tecnicamente, artisticamente (entre outros advérbios de modo bem interessantes que aqui podia usar), são apenas vídeos de enorme qualidade que vale a pena ver. E muito têm a dizer acerca dos caminhos que cruzam a música com o cinema, ou o cinema dentro das imagens que contam e mostram a música. The Shoes: Time to Dance MIA: Born Free CRU #34 [ 48 ]

De vez em quando surgem discos destes, que se entranham bem fundo e preenchem o corpo todo de ponta a ponta, objectos sonoros que parecem surgir por criação espontânea. Se bem que as referências sejam evidentes, o órgão hipnótico, os ritmos selvagens, o fuzz e a distorção, descendências directas do melhor e mais obscuro 60’s garage e a gravação crua e directa - raios, sentimo-nos em casa... -, os Alto! são uma banda inteligente pois conseguem escapar à armadilha em que caem outras bandas do género. O que aqui nos apresentam não é um mero exercício de estilo revivalista, mas dez temas intemporais, materializado em forma de disco pela Lovers & Lollypops. Foda-se, e que grande, grande disco! EA

FUCK KNIGHTS The Recorded by Gary Burger from The Monks EP Crustacean Records Gravado por Gary Burger dos The Monks (espere, nunca ouviu falar?... E comprou a Cru? Devia estar distraído, ou então levou-se pela capa, não foi, seu tarado? Pois então vá fazer outra coisa qualquer, que isto aqui não é para si...), este ep dos Fuck Knights é um manual para qualquer aspirante a garage rocker que se preze. Secção rítmica obsessiva, distorção e fuzz alucinantes, melodias incisivas,


vocalizações certeiras e ambiente sonoro assumidamente lo-fi em quatro temas que seguramente estiveram na origem da expressão “vira o disco e toca o mesmo” já que uma audição só não é suficiente para nos satisfazer a alma carente de acção. EO

BLACK BOMBAIM Titans Lovers & Lollypops Dois momentos. Numa noite veraneante minhota qualquer: por motivos obscuros que não vêm ao caso, ouço, ao longe, o débito de napalm sónico dos Black Bombaim. Um dos melhores concertos que não vi, numa estatística com as variantes lonjura/ número de carvalhos que te tapam a vista, grau de acidez dos riffs e massa (em tonelada) das linhas de baixo. No encerramento da (já saudosa) Lost Underground: enquanto chegavam lume aos amplificadores, um disco dos Pentagram tiritava, espasmódico, no escaparate. Os Black Bombaim são isso: os putos que fazem os Pentagram tremelicar. Titans é isso. JO

rate Radio - directório de alguns dos melhores podcasts do género, o Hideout, dirigido pelo incansável Jeff Kooper, tem lançado periodicamente compilações com bandas que são (ou foram) membros da rede. O sétimo volume acaba de ser editado - como os anteriores, apenas em formato digital, de download gratuito para membros activos do Hideout ou $9.99 no itunes para bétinhos (em qual destes grupos se enquadra, leitor?) - e mantém-se fiel aos seus precedentes: uma excelente selecção de bandas e géneros musicais de todo o mundo, embalada com uma ilustração de Balaam Camp. O cuidado aspecto gráfico é, também, uma preocupação desta série: os volumes anteriores foram desenhados por artistas de gabarito internacional como Idon Mine, Shawn Dickinson, Darren Merinuk ou... errrrrr... Esgar Acelerado. De entre as 22 bandas participantes, destaques pessoais para os norte-americanos The Chrome Cranks e The Branded, os austríacos Wild Evel & The Trashbones, os suecos The Get Wets e os canadianos The Gooeys. Mas isso sou eu... Faça o download e escolha as suas. EO

ST.ª APOLÓNIA Ep II DDJRecords Projecto liderado pelo mentor dos Dr. Frankenstein e guitarrista dos Capitão Fantasma e Texabilly Rockers, St.ª Apolónia, musicalmente falando, está bem longe das sonoridades garage-surf e rockabilly a que André Joaquim nos tem habituado. Ao primeiro EP, lançado pela weblabel You’re Not Stealing Records em 2009, sucede-se este EP II com composições mais introspectivas e ambientais. Quatro instrumentais que evocam de forma universal complexos ambientes íntimos. Música visual, portanto, o que explica a utilização total deste disco na banda-sonora do filme “Assim Assim” do realizador Sérgio Graciano, recentemente estreado. Download digital disponível no CDBaby e - pasme-se! - edição física em cassete (sim, leu bem, cassete) limitada a 100 exemplares, apenas através da banda. EA

THE REIGNING SOUND Abdiction... For Your Love Scion A/V

WE LOVE TRASH Best of The GaragePunk Hideout Vol. 7 GRPK Records Yes, we love trash! E também gostamos destas compilações do GaragePunk Hideout, a rede social para fãs de rock ‘n’ roll nas suas variadas vertentes, do garage ao surf e punk blues. Para além de ser a casa-mãe do GaragePunk Pi-

Os The Reigning Sound (banda de Greg Cartwright, ex-Oblivians e ex-Compulsive Gamblers) estão de regresso com Abdiction... For Your Love, mini-LP de 8 temas de descarga gratuita pela Scion A/V (www.scionav.com). O disco segue as pisadas de Love and Curses de 2009. O som está menos cru, mais refinado e adulto. Nada mais natural. Mr. Cartwright e banda já não são adolescentes irascíveis em fúria com o mundo. A raiva e os desesperos de amor continuam presentes, mas de uma forma mais velada e subtil, como só os grandes compositores e intérpretes são capazes. EO CRU #34 [ 49 ]

OS TÁRTAROS S/t Groovie Records Para uma recensão a este LP que compila os 4 ep’s lançados pela banda surf portuense na década de 1960, pedimos à Groovie Records o envio do disco, à cobrança, sem resposta; fomos propositadamente à Louie-Louie da rua do Almada, não tinham; procuramos no rapidshare, népias... Assim é difícil! Fica a capa e se sentirem curiosos, enfim, procurem no YouTube. EA


Madame Lydia - Ilustração de Rosa Feijão AQUÁRIO Jan. 20 – Fev. 18 Podia dizer-te que és imaginativo ou um grande sonhador, mas na verdade és é um grande mentiroso. Olha o nariz! Não é esse, o outro. Cruzes! E um bocadinho lento também. E pára de tirar macacos do nariz. Saturno está na casa da tua mãe. É melhor despachares-te para ires a tempo de os apanhar em flagrante. Quem sabe não cai qualquer coisinha no teu bolso. Chantagem eficaz sempre foi o teu forte! PEIXES Fev. 19 – Mar. 20 O trígono planetário de Marte, Mercúrio e Júpiter permite-me assinalar este mês como muito, muito especial. Assim, irás trabalhar, ver muita televisão e comer várias vezes. Dada a natureza invulgar desta conjunção poderás sentir uma comichão difícil de descrever nas partes baixas e poderá ser difícil para ti resistir à urgência de as coçar, mas não te esqueças que deves fazer isso num sítio privado e de preferência o mais longe possível do local de trabalho, cemitérios e centros comerciais. CARNEIRO Mar. 21 - Abr. 19 Acerca daquela tua ideia – traça um plano geral e deixa quem tem um verdadeiro talento fazer alguma coisa de jeito. Se nasceste por volta do dia 26 (mais dia menos semana) e és do sexo feminino, ou cortaste a pilinha para fazer uma mudança de sexo, eu sei, eu sei, tens boas intenções mas andas a preocupar-te sem razão. Sorri, age com classe e distinção e pede autorização para te levantares da mesa.

dois... gémeos. Mas não é bem isso: esperas muito de volta, mas dás pouco. És forreta, tenho dito. Isso de serem dois na representação simbólica não sei explicar. CARANGUEJO Jun. 21 – Jul. 22 Eu sei. Ninguém te leva a sério. Mas já pensaste que podes fazer gestos expressivos quando falas? E já agora o Pop Latino está fora de moda. Muda a tua música. Lê o jornal por volta do dia treze, altura em que Mercúrio retrógrado permitirá que te depares com um anúncio que irá mudar a tua vida. Começa assim:”Morena, gostosa, gatinha, 23 aninhos, safadinha, sexy e atraente.” LEÃO Jul. 23 – Ago. 22 Está na hora de esbanjares o teu dinheiro. Junta todas as tuas economias e investe em colchas patchwork, pois no próximo ano vão ser a coqueluche. Já a tua saúde está em franco declínio. Afasta-te do Sol durante o dia e da luz emanada por qualquer tipo de ecrã durante a noite. De qualquer forma a tua morte é inevitável e ocorrerá em circunstâncias inexplicáveis, a menos que alguém consiga estabelecer uma relação directa com a jura de sangue que fizeste à tua melhor amiga Emengarda S. (também eu lhe jurei não revelar o seu nome de família neste horóscopo), em 1983.

TOURO Abr. 20 – Mai. 20 Algum bizarro e aberrante acontecimento está traçado para ti que resultará em idas à igreja todos os domingos e em conversas abertas e sinceras com entidades invisíveis. De qualquer forma, gostas genuinamente de trabalhar e fazer horas extraordinárias pro bono. Ao preço que elas agora são pagas está na hora de aderires ao PCP. Eu juntei a Igreja e o PCP no mesmo horóscopo? Está na hora de eu arranjar uma vida, porque por aqui já não me safo.

VIRGEM Ago. 23 – Set. 22 Lembras-te da última vez que foste verdadeiramente feliz? As tuas necessidades emocionais estão satisfeitas? Vénus rege as relações sexuais e as emoções que daí advêm. O amor vai surgir num evento relacionado com cães e dinheiro. Mas aconteça o que acontecer o desfecho já está predestinado e é o mesmo de sempre: o f... da p.... troca-te por outra. (Isto está escrito para gajas. Para os gajos é só inverter os papéis. (Não, não escrevi isto assim só porque sou gaja também. Isto deve-se a Marte em sextil com Vénus. Juro! A sério. Se não acreditas em mim podes ir a este sítio da internet confirmar: www.ohoroscoponaofoinventadopormim.com.)

GÉMEOS Mai. 21 – Jun. 20 Procura na Bíblia a palavra solilóquio e decora o número do versículo. Vai trazer-te muita sorte no totobola. Há quem diga que és bissexual (dás para os dois lados estás a ver?) porque o símbolo dos gémeos são

BALANÇA Set- 23 – Out. 22 É desta! Ouve bem, é desta! Vais fazer a dieta, estás a ouvir bem?, a dieta que te vai fazer perder esses 34 quilitos que tens a mais. Nem mais nem menos. Desde que o Sol pousou na tua quinta casa que o peso

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se vem acumulando. Mas a solução é bem simples: cinco pequenas refeições por dia e ar fresco de sobremesa. Este horóscopo teve o patrocínio da Herbalife, que me deu mais algum que a Vibroplate. Mas quem eu queria era a Depuralina, que ainda não experimentei, mas disseram-me que valia a pena. ESCORPIÃO Out- 23 – Nov. 21 O que mais temias vai finalmente acontecer. É a força do Segredo em acção. O teu gato vai trepar numa árvore, acho que é um salgueiro, mas também pode ser um pessegueiro ou um sobreiro se viveres mais a sul, e não vais poder chamar os bombeiros para o salvar. No entanto, se olhares em frente verás uma drogaria (eu sei, agora há poucas, mas há sempre uma quando é preciso não é verdade?) onde trabalha Mendo Eanes Mansala, o único que poderá salvar o teu gato. Não, não tens nada que me agradecer. Este é um trabalho de amor e um fruto doce da mais pura generosidade do meu coração. SAGITÁRIO Nov. 22 – Dez 21 Está na hora de encontrares o amor. Após uns meses a debater-te com um caso grave de candidíase sistémica, as brincadeiras fofuchas e uns braços gordos cheios de refegos estão aí para te abraçar, apertar bem apertadinho e sufocar. Mas não desistas. Ele ou ela são vizinhos da prima da melhor amiga do parente em 3º grau, que é militar na reserva (espera, que este é o pormenor chave) e casado com a mulher-a-dias da pessoa que há-de ser a tua futura cara-metade. Por isso, sim, o amor está mesmo a bater-te à porta. CAPRICÓRNIO Dez. 22 – Jan. 19 O orgulho é o teu maior defeito. Em breve estarás envolvido num esquema de contrafacção de aguardente de banana da Madeira só para poderes provar a todo o mundo que tal não pode ser feito. O facto de não teres seguido à risca o que estava escrito no horóscopo do último número da CRU fez com que milhares de vidas se tivessem perdido. E tu, só TU, és o único responsável. Infame traidor sem escrúpulos e sem vergonha! Como podes caminhar sobre a Terra e partilhar água não poluída com tantos da tua espécie? Como? Diz-me como?! Os teus números da sorte deste mês são o 12 e o 27.




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