Rúbian Corrêa Coutinho* CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER CONSTRUCTION OF NATIONAL POLICIES TO FIGHT DOMESTIC VIOLENCE AGAINST WOMEN LA CONSTRUCCIÓN DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EL AFRONTAMIENTO DE LA VIOLENCIA DOMÉSTICA Y FAMILIAR CONTRA LA MUJER
Resumo: O presente artigo aborda sobre as políticas públicas no enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher no contexto atual, como é gestada, a importância e dificuldades em participar deste processo, quais os principais atores que devem participar deste processo de elaboração das políticas públicas nesta temática. Apresenta ainda, quais os obstáculos para a implementação dessas políticas e como alcançar as metas estabelecidas nos objetivos estratégicos do Plano Plurianual do Governo que visam a redução da violência contra as mulheres. Os Pactos Nacional e Estadual são instrumentos fundamentais para a implementação da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher. Abstract: The present article approaches public policies which stand up against domestic and familiar violence against women in the current context, how this type of violence is promoted, the importance and difficulties in taking part in the process, and the main actors who must participate in the process of elaboration of public policies regarding the theme. It also presents the obstacles for the implementation of those policies and how the goals established in the strategic objectives in the MultiYear Government Plan, which aim at reducing violence against
* Especialista em Atendimento Sistêmico à Família e Redes Sociais pela PROPE/PUC-GO. Especialista em Políticas Públicas pela UFG. Promotora de Justiça do MP-GO. Titular da Promotoria de Justiça dos Direitos da Mulher de Goiânia-GO.
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women, can be achieved. The National and State Pacts are fundamental instruments for the implementation of National Policies to Fight Violence against Women. Resumen: Este artículo discute las políticas públicas para hacer frente a la violencia doméstica y familiar contra la mujer en el contexto actual, cómo se gesta, la importancia y las dificultades en participar en ese proceso, cuáles son los principales actores que deben participar en ese proceso de elaboración de políticas públicas en ese tema. También se presentan, aún, los obstáculos a la aplicación de esas políticas y cómo lograr las metas establecidas en los objetivos estratégicos del Plan Plurianual del Gobierno, que buscan reducir la violencia contra las mujeres. Los pactos nacionales y estatales son instrumentos clave para la implementación de la Política Nacional de Afrontamiento de la Violencia contra la Mujer. Palavras-chave: políticas públicas; política nacional; enfrentamento à violência contra a mulher; pacto nacional; Lei Maria da Penha. Keywords: public policies; national policies; fight domestic violence against women; national pact; Maria da Penha Law. Palabras clave: políticas públicas; política nacional; afrontamiento de la violencia contra la mujer; pacto nacional; Ley Maria da Penha.
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INTRODUÇÃO A mulher que sofre qualquer tipo de violência no âmbito doméstico ou familiar, necessita ter ao seu alcance todo aparato social e jurídico para que se sinta protegida o suficiente, a ponto de romper com o ciclo ou a situação de violência a que foi submetida. Barsterd ressalta que a Recomendação n. 19 da Cedaw, em 1992, sobre a violência contra as mulheres, reconheceu que essa violência é uma grave forma de discriminação que reflete e perpetua a subordinação das mulheres e que, para a sua superação, nas esferas pública e privada, exige-se a atuação dos estados membros, por meio de medidas legislativas e políticas sociais1. Apesar de a sociedade moderna romper com as formas tradicionais de sua organização, permitindo uma melhoria na condição das mulheres e respeito aos seus direitos, adverte Cyrino que “ainda persistem na contemporaneidade, relações hierárquicas entre os gêneros em que os homens assumem, na vida social, as posições dominantes e mais valorizadas” 2. Temos, então, que são importantes os estudos que venham a desmistificar o trabalho doméstico, os cuidados com filhos e outros entes da família como atividades exclusivamente femininas, pois darão suporte à quebra de paradigmas plantados pelo patriarcalismo, que são os causadores dos mais variados tipos de violências contra a mulher. Além da violência doméstica ou familiar a que a mulher foi submetida, acresce-se a violência institucional, com aparatos de atenção e proteção públicos e sociais deficitários. Assim, a mulher sente-se desprotegida, desacreditada por prestadores de serviços com pouca qualificação, e sua situação de perigo permanece por longo períodos. Esclarece Presser que “entender a Rota Critica nas suas peculiaridades locais implica conhecer os fatores que impulsionam as mulheres a buscar ajuda, bem como as dificuldades para levar adiante tal decisão”3. 1 BARSTED, L. L. Uma vida sem violência: o desafio das mulheres. Rio de Janeiro, out.2006. Disponível em: <http://www.direitos.org.br>. Acesso em: 10 mar. 2010. p. 57. 2 CYRINO, R. Trabalho, temporalidade e representações sociais de gênero: uma análise da articulação entre trabalhado doméstico e assalariado. Sociologias, n. 21, jun. 2006. p. 67. 3 PRESSER, A. D.; MENEGHEL, S. N.; HENNINGTON, Élida A. Mulheres enfrentando as
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No Brasil, a Lei n. 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do artigo 225 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, apresenta respostas efetivas de políticas públicas voltadas para prevenção, atenção, proteção e punição. A superação da situação de violência está intrinsecamente ligada ao envolvimento efetivo do Governo Federal, que deve liberar recursos para que a Secretaria de Políticas para Mulheres possa articular e coordenar o Plano Nacional de Políticas para Mulheres e desenvolver as ações previstas no Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres. Diante da complexidade do fenômeno da violência doméstica e familiar contra a mulher, a Secretaria de Políticas para Mulheres deverá construir de forma integrada programas e projetos com os diversos ministérios e secretarias a serem realizados pelos Estados. Nesse contexto, para uma melhor atuação, é preciso que a sociedade civil compreenda e participe efetivamente de todas as fases de formação de políticas públicas, mencionadas neste artigo, que ocorrem desde o momento em que uma determinada demanda passa a compor a agenda do governo, sua discussão, elaboração, implementação, avaliação e fiscalização dos órgãos dos governos federal, estadual e municipal, dentre outros parceiros, visando aprimorar e fortalecer os serviços da rede de atendimento às mulheres em situação de violência e a efetividade da Lei Maria da Penha. Sendo assim, o presente artigo objetiva abordar o conceito de políticas públicas, sua construção, articulação e implementação, por meio do Plano Nacional de Políticas para Mulheres e dos pactos nacional e estadual como uma política de enfrentamento à violência contra as mulheres, que envolve os governos federal, estadual e municipal. Por último, o monitoramento e avaliação dessas políticas e o seu alcance para a prevenção e rompimento do ciclo da violência contra a mulher. violências: a voz dos operadores sociais. Saúde soc., v. 17, n. 03, set. 2008, p. 126-137. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?cript=sci_arttext&pid=S0104-12902008000300013 &In>. Acesso em: 9 mar. 2010. p. 130.
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ENTENDENDO POLÍTICAS PÚBLICAS Nada nos é mais alheio que o que tem importância pública (Arendt)
O desafio de se encontrarem mecanismos que possam minimizar as questões que envolvem a violência doméstica e familiar contra a mulher é muito grande, pois não basta estabelecer uma legislação coibitiva da violência, torna-se necessária uma gama imensa de ações articuladas do governo com a sociedade, sendo que o entendimento sobre a configuração das políticas públicas e as regras que regem suas decisões, elaboração e implementação, são de fundamental importância para o alcance de um resultado mais profícuo. Sobre o conceito de políticas públicas temos o ensinamento de Silva: Por políticas públicas explica-se, de forma simplista, as ações que um governo faz. Para Rua (1998), uma política pública é o resultado de uma decisão política tomada sobre alternativas de políticas para atender a uma determinada demanda. Apresenta uma característica central por ser revestida de autoridade soberana do Poder Público. Rabelo (2001) entende serem as políticas públicas a forma que governos encontraram para resolver problemas políticos.4
O processo de desenvolvimento da política pública referente ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher seguiu, conforme indica Souza “o ciclo constituído dos seguintes estágios: definição de agenda, identificação de alternativas, avaliação das opções, seleção das opções, implementação e avaliação”5. Por ser complexo o fenômeno da violência contra a mulher, a elaboração de política pública apresentou uma trajetória de longo percurso como foi até o presente momento, com alguns avanços e retrocessos, inação e ação por parte dos policymakers. Essas dificuldades naturais já são previstas por ocasião da implementação, 4 SILVA, E. B. da S. Avaliação de políticas públicas: desafios e tendências. In: RABELO, Francisco Chagas E.; BERNARDES, G. D. (Org.). Políticas públicas e sociedade civil. Goiânia: Cânone Editorial, 2004. p. 16. 5 SOUZA, C. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, Porto Alegre, n. 16, p. 20-45, dez.2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-45222006000200003&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 17 jun. 2009. p. 29.
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tendo em vista que enfoca a questão de gênero, que indica a necessidade de uma mudança de comportamento e de paradigmas arraigados nas relações humanas. CONSTRUÇÃO E ARTICULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS O processo de gestação de políticas públicas para a grande maioria da população brasileira ainda parece estar envolta em uma névoa espessa, quase intransponível, com mecanismos de formulação e elaboração de difícil compreensão. Para entender melhor essa situação, vez que há muito saímos de um governo ditatorial e há mais de vinte anos retornamos à democracia que se pretende participativa, recorremos à explicação de Bandeira e Vasconcelos: o que fica evidente é a falta de transparência nas decisões, nas proposições e formulações de políticas públicas como elemento constitutivo do cenário governamental. O processo de eleição de prioridades encontra-se atrelado a esses jogos e dinâmicas de bastidores, oriundos de interesses privados, pessoais ou muito pouco político-institucionais. Podem estar eivados de elementos corporativistas, clientelistas e populistas que prevalecem sobre os conteúdos sociopolíticos.6
No processo de elaboração de políticas públicas, Bandeira e Vasconcelos observam que o Poder Executivo é composto por ministérios, que possuem um quadro de agentes institucionais, os quais são os principais responsáveis em apontar as diretrizes nas políticas públicas, materializando as metas da administração presidencial7. Para Bandeira e Vasconcelos, os agentes institucionais são de diversas categorias, mas destacam-se três: o subcorpo burocrático, equipe de técnicos ou experts e o grupo de funcionários lobistas8. Os primeiros são chamados de burocratas, pois tratam BANDEIRA, L.; VASCONCELOS, M. Equidade de gênero e políticas públicas. Cadernos Agende, Brasília: AGENDE, v. 3, 2002. 7 BANDEIRA; VASCONCELOS, 2002, p. 38. 8 BANDEIRA; VASCONCELOS, 2002, p. 38. 6
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da rotina burocrática, de recebimento e envio de documentação, são em maior número e possuem baixa escolaridade, porém, podem travar o andamento de propostas, desviando ou perdendo a documentação, e, ainda, são também detentores de informações privilegiadas, vez que estão em contato por meio de documentos com decisões importantes que circulam em suas mãos. Quanto aos do segundo grupo, esclarecem ainda Bandeira e Vasconcelos, que fazem parte do quadro técnico altamente qualificado, são técnicos em planejamento, profissionais liberais diversos, agentes institucionais que exercem cargo de confiança, são denominados de pensadores, conhecem e sabem lidar com maestria com o aparato governamental e os jogos de poder existentes na máquina estatal. São atores importantes na elaboração do conteúdo das políticas públicas, apontam as prioridades e são responsáveis pela interpretação e implementação das mesmas9. De acordo com Bandeira e Vasconcelos: “também são denominados de gestores, aqueles que gestam, que procriam, metaforicamente, as políticas públicas. São os pensadores”10. Por último, os funcionários lobistas ou circulantes são movidos por interesses, sejam públicos ou privados, fazem contatos e mediações, tentam manter controle sobre a mídia e suas ações, são sempre direcionadas em favor do governo/Estado, possuem peso político e de pressão diferenciados. Concluem Bandeira e Vasconcelos, que os agentes institucionais têm papel de extrema importância para criação e implementação de políticas públicas, os poderes de cada um poderão decidir e influenciar na escolha e nos rumos de uma política pública11. Apesar dessa estrutura administrativa apresentar-se pouco permeável, explica Sell que, com a democratização, o Estado Brasileiro (principalmente no nível municipal e, também, nas outras esferas) criou vários tipos de conselhos, fóruns ou outras instâncias nas quais os movimentos sociais são convidados a participar na formulação de políticas públicas12. BANDEIRA; VASCONCELOS, 2002, p . 38. BANDEIRA; VASCONCELOS, 2002, p. 40. 11 BANDEIRA; VASCONCELOS, 2002, p. 39. 12 SELL, C. E. Introdução à sociologia política: política e sociedade na modernidade tardia, Petrópolis, RJ: Vozes, 2006. p. 200. 9
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Os conselhos se transformaram em um formato institucional, que, segundo Primo, dão vida aos artigos da Constituição Federal que estabelecem a participação da comunidade (inciso III, art. 198) na assistência social, como, por exemplo, a participação da sociedade por meio de organizações representativas e na formulação de políticas públicas e fiscalização das ações em todos os níveis de governo, vinculados ao repasse de recursos do governo federal para os governos estaduais e municipais13. O movimento feminista e de mulheres, aproveitando o cenário de democracia participativa, mantém diálogo com o Estado colaborando na formulação de políticas públicas que venham a dar um bom atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, como também mantém estratégias de conscientização e mobilização da sociedade como fator de pressão nos governos. Ressaltam Camurça e Oliveira que atualmente a institucionalização da proposta de políticas para mulheres permitiu uma grande ocupação das mulheres nos espaços na gestão pública, por meio de participação de conselhos de direitos da mulher, na direção de organismos de políticas para mulheres instituídos nos poderes executivos municipal, estadual e federal, ou, ainda, atuando na disputa de orientação destas políticas por ocasião das Conferências ou Audiências Públicas14. No enfrentamento à violência contra a mulher, mesmo havendo possibilidades de participação democrática na gestão pública, ainda não se alcançou uma participação plena, desprovida de quaisquer interesses ilegítimos. Um dos fatores de preocupação é a existência nos âmbitos estadual e municipal de conselhos com pouca força interventiva, porque estes não atuarão e nem terão poder de influir ou implementar ação do governo do qual faz parte, talvez proveniente de sua composição com elementos de confiança do próprio governo 13 PRIMO, R. I. de O. Universalização do saneamento, privatização e mecanismos de controle social. In: RABELO, F. C. E.; BERNARDES, G. D. (Org.). Políticas Públicas e sociedade civil. Goiânia: Cânone Editorial, 2004. p. 174. 14 CAMURÇA, S.; OLIVEIRA, G. C. de. Contradições que enfrentamos na implementação de políticas para mulheres. In: Articulando a luta feminista nas políticas públicas: desafios para a ação do movimento na implementação das políticas. Brasília: Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), dez. 2009. p. 12.
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que o instituiu, facilitando a manipulação e controle pelo governo. Destaca Filho que “a maioria dos Conselhos, hoje, sofre de uma certa apatia, ou, quando muito, apenas corrobora e ratifica decisões encaminhadas pelos representantes do setor público”15. Filho apresenta como possibilidade de superação desse entrave a existência de outros atores sociais que têm disputado a participação na arena de poder, como, por exemplo, as inúmeras organizações não governamentais envolvidas nesse processo, propositoras ou parceiras do setor público para a implementação de políticas públicas16. Afirma Filho que também o setor de comunicação tem papel preponderante, vez que dá publicidade às reivindicações de diversos segmentos da sociedade, permitem maior amplitude de conhecimento, informação, fomentando a consciência crítica com relação à realidade, e propiciam a construção e articulação de políticas públicas no enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher17. PLANO NACIONAL DE POLÍTICAS PARA MULHERES O desenvolvimento atual de políticas públicas que venham a erradicar a violência doméstica e familiar contra as mulheres no Brasil é fruto de uma construção realizada ao longo dos anos, segundo Gonçalves18. Em muitas ocasiões, foi pautada pelo diálogo da sociedade civil organizada com as representações governamentais estaduais e federais, com a perspectiva de respeitar os preceitos estabelecidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, nos acordos internacionais firmados, como a Convenção do Belém do Pará de 1994 e legislação pátria. FILHO, R. de O. M. Fundamentos para a criação do conselho de políticas públicas. In: RABELO, F. C. E.; BERNARDES, G. D. (Org.). Políticas públicas e sociedade civil. Goiânia: Cânone Editorial, 2004. p. 79. 16 FILHO, 2004, p. 80. 17 FILHO, 2004, p. 80. 18 GONÇALVES, A. P. S. Secretaria Especial de Politicas para Mulheres: um instrumento indispensável para o empoderamento das mulheres em situação de violência. In: CAMPOS, A. H.; COSTA, L. R. D (Coord.). Sistema de justiça, direitos humanos e violência no âmbito familiar. Curitiba: Editora Juruá, 2011. p. 79. 15
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O governo brasileiro criou, em 1º de Janeiro de 2003, a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM/PR), com status de ministério. O surgimento da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres ocorreu como necessidade de se dar uma resposta à sociedade que há muito esperava por ações do governo que resgatassem a cidadania das brasileiras19. A partir da I Conferência Nacional de Políticas para Mulheres, realizada em 15 julho de 2004, que mobilizou cerca de 120 mil mulheres vindas de todas as partes do Brasil, surgiu o I Plano Nacional de Políticas para Mulheres, que apresenta 199 ações, distribuídas em 26 prioridades definidas, tendo como uma das linhas de ação o enfrentamento à violência contra as mulheres20. A Política Nacional para as Mulheres, desenvolvida pela Secretaria Especial de Políticas para Mulheres21, orienta-se pelos seguintes pontos fundamentais: igualdade e respeito à diversidade, equidade, autonomia das mulheres, laicidade do Estado, universalidade das políticas, justiça social, transparência dos atos públicos e participação e controle social. O Plano Nacional é voltado para o desenvolvimento de um conjunto de ações, a serem realizadas em todos os Estados e Distrito Federal, visando ao enfrentamento a todas as formas de violência contra as mulheres. Essa resposta do Estado aos “inputs” da sociedade, segundo Rua, provém de uma política pública que compreende um conjunto de procedimentos destinados à satisfação das demandas dos atores sociais ou das reivindicações formuladas pelos próprios agentes do sistema político22. O II Plano Nacional, lançado em agosto de 2007, ampliou e aprofundou o campo de atuação do governo federal visando
BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Não à violência contra a mulher fazendo escola. 2. ed. Brasília: SPM - Rede de Desenvolvimento Humano (REDEH), 2006. p. 16. 20 BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para Mulheres. In: CONFERÊNCIA NACIONAL DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES, 1, 2004, Brasília. Anais. Brasília: SPM, 2004. p. 9. 21 BRASIL. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. II Plano Nacional de Políticas para Mulheres. Brasília: SPM, 2008. p. 27. 22 RUA, M. das G. Análise de políticas públicas: conceitos básicos. In: RUA, Maria das Graças; CARVALHO, M. I. V. de (Org.). O estudo da política: tópicos selecionados. Brasília: Paralelo 15, 1998. p. 232. 19
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eliminar a discriminação contra as mulheres, com destaque aos segmentos de mulheres em situação de vulnerabilidade, com observância à ampliação da perspectiva de gênero e raça/etnia nas ações desenvolvidas pelo Estado23. Atualmente, a SPM lançou o III Plano Nacional de Políticas para Mulheres, período 2013-2015, fruto da 3ª Conferência Nacional de Políticas para Mulheres, realizada em dezembro de 2011, com 200 mil participantes em todo o país e 2.125 delegadas, reafirmando os princípios orientadores da Política Nacional para as Mulheres que são: autonomia das mulheres para toda dimensão da vida, busca da igualdade efetiva entre mulheres e homens em todos os âmbitos, respeito à diversidade, combater a todas as formas de discriminação, caráter laico do Estado, universalidade dos serviços e benefícios ofertados pelo Estado, participação ativa das mulheres em todas as fases de implementação de políticas públicas e transversalidade como princípio orientador de todas as políticas públicas24. O PACTO NACIONAL: UMA POLÍTICA PÚBLICA DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES A despeito da instabilidade e fluidez das estruturas institucionais e dos padrões político-administrativos do Brasil, segundo Frey, caraterística de países em desenvolvimento, com democracias do tipo “delegativo”, enfoca-se no presente trabalho a policy analysis pela ótica do grande avanço que a temática da violência contra mulher alcançou, com transformações relevantes dos arranjos institucionais em todos os níveis de atuação estatal25. Assim, de acordo com Rua: (…) uma dada situação pode perdurar durante muito tempo, incomodando
BRASIL, SPM, 2008, p. 21. BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Plano Nacional de Políticas para Mulheres. Brasília: SPM, 2013. p. 9. 25 FREY, K. Políticas Públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e políticas públicas, Brasília, n. 21, jun./2000. p. 246. 23 24
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grupos e gerando insatisfações sem, entretanto, chegar a mobilizar as autoridades governamentais. Nesse caso, trata-se de um “estado de coisas” - algo que incomoda, prejudica, gera insatisfação para muitos indivíduos, mas não chega a constituir um item da agenda governamental, ou seja, não se encontra entre as prioridades dos tomadores de decisão.Quando esse estado de coisas passa a preocupar as autoridades e se torna uma prioridade na agenda governamental, então torna-se um “problema politico26.
A situação de violência contra a mulher tornou-se um problema político conforme demonstrado, tornou-se um input, pois conseguiu ser item prioritário na agenda governamental, uma vez que apresentou como característica descrita por Rua a mobilização de ação política e uma situação de crise27. Uma das fontes propulsoras foi a Lei n. 9.099/95 que na pretensão de alcançar maior celeridade processual, estabeleceu penas alternativas para crimes de menor potencial ofensivo e rito processual simplificado, o que no decorrer dos anos levou a umabanalização da violência doméstica do homem contra a mulher, resultado da política do Estado mínimo intervencionista neoliberal. O Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, que surgiu em 17 de agosto de 2007, foi uma importante ação governamental na direção da consolidação da Política Nacional, tendo como seu principal objetivo enfrentar todas as formas de violência contra as mulheres, dentro de uma perspectiva de gênero e de uma visão integral do fenômeno28. Esse fato gerou a priorização dessa temática na agenda social do governo brasileiro, pois, além da inclusão na agenda, foi assegurado para o Plano Plurianual 2008- 2011 R$1 bilhão, destinados às ações de enfrentamento à violência a serem executadas nos diversos ministérios e secretarias especiais, sob a coordenação da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres29. Conforme o Balanço de ações 2006-2007, realizado pela Secretaria Especial de Políticas para Mulheres, o Pacto consolida a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, aprofunda a implementação da Lei Maria da Penha, RUA, 1998, p. 236. RUA, 1998, p. 236. 28 BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Enfrentamento à violência contra a mulher. Balanço de Ações 2006-2007. Brasília: SPM, 2007. p. 8. 26 27
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fortalece o combate à exploração sexual de meninas e adolescentes e ao tráfico de mulheres, promove os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e os direitos humanos das mulheres em situação de prisão30. O Pacto reforça a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, pois trabalha todas as diretrizes da Política, principalmente o fortalecimento dos serviços da Rede de Atendimento às Mulheres em Situação de Violência e a implementação da Lei Maria da Penha. O Pacto tem como objetivos: - reduzir os índices de violência contra as mulheres; - promover uma mudança cultural a partir da disseminação de atitudes igualitárias e valores éticos; - garantir e proteger os direitos das mulheres em situação de violência, com atenção especial às mulheres negras, indígenas e àquelas que vivem no campo e nas florestas. As estratégias de ação constantes no Pacto são as seguintes: - criar condições de diálogo com as redes de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra as mulheres de todas as idades; - mapear a rede de equipamentos sociais de atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar; - articular os gestores de políticas públicas governamentais e sociais para o cumprimento das leis que dispõem sobre a temática; - mobilizar os segmentos sociais para o apoio a determinados projetos de leis que tratem de implementação de políticas públicas de equidade de gênero e defesa dos direitos da mulher; - socializar com os sistemas organizados envolvidos com a temática as informações e instrumentos de coleta de dados, a exemplo da base de dados já iniciada pela equipe do Ministério Público de Goiás, com vistas a obter uma sistematização mais completa e coerente com os pressupostos da Política Nacional para as Mulheres; 29
BRASIL, SPM, 2007, p. 8.
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(Pacto Nacional - Construção do Sistema Nacional de Dados e Estatísticas sobre a Violência contra as Mulheres); - atuar nas áreas de: pesquisa, estudos, fomento, monitoramento, fiscalização e avaliação das políticas públicas; - colaborar como aglutinador com os movimentos de mulheres dispondo-se a um processo de construção coletiva de proposições e efetivação de políticas públicas para o enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher na perspectiva da prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher nos moldes da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher - Convenção de Belém do Pará, em 1994; - elaborar mediante consultoria de instituições de Ensino e Pesquisas especializadas na temática, de material pedagógico e formas de divulgação. O Pacto propõe trabalhar com todas as diretrizes da política nas instâncias federais, contando com a parceria do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), do Ministério Público, do Poder Judiciário, de organismos internacionais, dos governos estaduais e municipais, dentre outros parceiros e visa aprimorar e fortalecer os serviços da rede de atendimento às mulheres em situação de violência e a implementação da Lei Maria da Penha. A Lei Maria da Penha confere ao Estado a obrigação de atuar e apresenta um conjunto de propostas que podem produzir importantes impactos sociais para o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra as mulheres, através de respostas efetivas por meio de políticas públicas voltadas para: a) prevenção, por meio de campanhas, cursos, palestras e material de divulgação em todos os meios de comunicação entre outros; b) atenção, que ocorrerá com o atendimento e orientação dos Centros de Referência de Atendimento à Mulher e a rede de apoio, como organizações não governamentais etc.; c) proteção, que será com medidas protetivas aplicadas pelo Judiciário, acolhimento em casas abrigo e de passagem; d) punição, aplicação de penalidades ao agressor; e) reeducação, sendo esta voltada também ao agressor para evitar a reincidência. 22
Ressalte-se que o modelo de arenas sociais também é aplicável às soluções da questão da violência doméstica e familiar contra as mulheres no Brasil, uma vez que os denominados por Souza de empreendedores políticos ou de políticas públicas31, conseguiram chamar a atenção dos policymakers, utilizando-se dos mais variados métodos para cooptar o interesse dos decisores e formuladores de políticas públicas como foi mencionado alhures em nosso trabalho. Afirma Silva que: a inclusão da sociedade civil nesses espaços públicos tem uma função preponderante no desenho das políticas por participar da discussão que elucida os critérios que fundamentam determinada política, contribuindo desta forma para a análise política da política pública, bem como para a promoção de uma maior transparência das ações do Estado32.
Assim, através de uma concepção mais abrangente que considere sociedade civil e Estado como parceiros na discussão de prioridades e na elaboração de políticas públicas, é provável que se tenham maiores chances de se institucionalizar a avaliação de políticas públicas como mecanismo estratégico e imprescindível não só para dar transparência a ações públicas, mas também para melhorar a gestão das políticas e a ação do Estado. No ano de 2009, o Estado de Goiás reforçou a adesão às diretrizes estabelecidas no Pacto Nacional pelo Enfrentamento da Violência contra as Mulheres, firmando um acordo de cooperação com a União por intermédio da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres da Presidência da República, para desenvolvimento e execução de ações integradas e solidárias a serem implementadas nos municípios do Estado. Pacto Estadual O Estado de Goiás alinhado às diretrizes do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres criou, em 1º de junho de 2007, a Secretaria Estadual de Políticas para Mulheres e Promoção da 30 31
BRASIL, SPM, 2007, p. 27. SOUZA, 2006, p. 32.
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Igualdade Racial, que adotou o nome SEMIRA33, que tem a obrigação e meta de implementar a política pública estabelecida no Plano Plurianual do Governo Federal. Nesse contexto, a SEMIRA articulou, em 8 de março de 2010, a assinatura de um protocolo de intenções objetivando firmar convênio de cooperação técnica para a gestão dos organismos sociais especializados de atendimento à mulher, dentre eles as delegacias especializadas de atendimento à mulher (DEAM) e os núcleos especializados de atendimento à mulher (NEAM), celebrados entre o Governo do Estado de Goiás e vários municípios: Águas Lindas, Anápolis, Anicuns, Aparecida de Goiânia, Cachoeira Alta, Caldas Novas, Catalão, Cavalcante, Ceres, Cidade Ocidental, Formosa, Goianésia, Goiânia, Goiás, Iaciara, Iporá, Itapuranga, Itumbiara, Jataí, Luziânia, Minaçu, Mineiros, Morrinhos, Novo Gama, Planaltina, Porangatu, Rio Verde, Santa Helena, Santo Antônio do Descoberto, Senador Canedo, Trindade, Uruaçu e Valparaíso. Para Costa, “uma política eficiente de combate e prevenção à violência deve buscar ampliar as portas de entrada que permitam fortalecer a autonomia das mulheres para dar fim ao conflito”34. Logo, conclui-se, então, que tanto o Estado de Goiás, como também em outros estados, é necessária a existência de equipamentos públicos e integrados em uma grande rede, no sentido de facilitar as ações e as trajetórias das mulheres na busca de alternativas para superação da situação de violência. O MONITORAMENTO E A AVALIAÇÃO O monitoramento e avaliação dos programas e das políticas públicas, segundo Cavenaghi, são os instrumentos mais adequados para buscar as respostas sobre a eficácia e efetividade SILVA, 2004, p. 19. SEMIRA ADAMU - Nigeriana que aos 20 anos recusou-se a casar com um homem de 65 anos, fugiu para Bélgica em 25 de março de 1998 e morreu em 22 de setembro do mesmo ano, vítima de violência praticada por policiais no Centro Fechado destinado aos estrangeiros ilegais. 34 COSTA, M. L. da; GODINHO, T. O desafio de construir redes de atenção às mulheres 32 33
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das ações e intervenções voltadas a diminuir as desigualdades sociais35. Monitoramento é o acompanhamento do processo de instalação da Lei Maria da Penha e leis correlatas à implementação de políticas públicas previstas nos acordos e convenções nacionais e internacionais das quais o Brasil é signatário e que estão estabelecidos nos II e III Planos Nacionais de Políticas para Mulheres. O monitoramento busca saber se o programa foi bem desenhado, desde o início até sua continuidade e se de forma satisfatória ao longo do tempo, bem como se o gerente e gestores dos programas devem tomar novas medidas ou propor mudanças de cursos para que o programa seja efetivo e que os recursos empregados sejam utilizados de forma eficiente. Por exemplo: 1) O programa está implementado a contento (a partir do desenho delineado)?; 2) Há diferenças na implementação dos programas em diferentes localidades?; 3) O programa beneficiou o público-alvo e está bem focado?; 4) Há que custo a implementação e o atendimento do público-alvo foram alcançados? Os custos da implementação compensam?; 5) O programa alcançou a eficácia, eficiência, relevância, efetividade?; 6) Houve responsabilidade no uso de recursos públicos dos planejadores e gestores?; 7) Houve anteriormente monitoramento do processo de instalação da Lei36. Já a avaliação busca obter no programa avaliado, os aspectos vinculados à implementação da Lei e o impacto da Lei na redução da violência contra as mulheres. Procura saber se as pessoas conhecem e como percebem a Lei. A verificação do impacto dar-se-á necessariamente pela comparação de dados sistematizados a partir de uma base de dados, por exemplo, com a base de casos cadastrados pelo Ministério Público de Goiás, que será alimentada ao longo do tempo de implementação da Lei ou pela Secretaria Especial de Políticas para Mulheres por intermédio do atendimento do Disque 180 e outras formas de pesquisas realizadas por órgãos e institutos diversos37. em situação de violência. Cadernos AGENDE, Brasília, 2006. p. 52. 35 CAVENAGHI, S. Gênero e raça no ciclo orçamentário e controle social das políticas públicas. Indicadores de gênero e de raça no PPA 2008-2011. Brasília: Centro Feminista de Estudos e Assessoria - CEFEMEA, 2007. p. 11. 36 CAVENAGHI, 2007, p. 23.
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Para Cavenaghi, a avaliação será embasada em metodologia de pesquisa científica, tendo como objeto de estudo e pesquisa a violência de gênero, doméstica e familiar contra a mulher38. Para tanto, requer conhecimento das características da população, desde o inicio da implementação do programa, além de planejamento e avaliação mediante análise dos impactos causados na população usuária. A avaliação deve ocorrer em períodos predeterminados ao longo do programa e, quanto ao alcance dos objetivos, deve ser feito um estudo comparativo para que aconteça o desenvolvimento do programa, se for estendido para outras regiões. Para Trevisan e Bellen, a avaliação deverá proporcionar uma informação crível e útil para permitir a incorporação da experiência adquirida no processo de tomada de decisão39. Ela enfoca o cumprimento de um plano e análise do atingimento de objetivos, supondo que o plano e os objetivos correspondentes têm um valor já conhecido e aceito em si. Os resultados da avaliação, de acordo com Trevisan e Bellen, podem favorecer não só a correção de curso no desenvolvimento de políticas públicas, mas também apontar para uma maior estruturação e sistematização dos programas, devendo o controle social existir nesse processo para implementar e, se for o caso, redefinir políticas públicas, evitando danos que uma política equivocada possa acarretar40. Alcançar a inclusão social e a redução das desigualdades, especificamente no que se refere à violência de gênero, como pretende o governo e por constar em sua agenda, já traz um alento e também confere a nós, mulheres brasileiras, goianas e goianienses, a responsabilidade de colaborar e acompanhar a aplicação dos recursos públicos alocados para implementação de políticas públicas em todos os níveis (federal, estadual e municipal).
CAVENAGHI, 2007, p. 75. CAVENAGHI, 2007, p. 75. 39 TREVISAN, A. P.; BELLEN, H. M. V. Avaliação de politicas públicas: uma revisão teórica de um campo em construção. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 42, n.3, maio/jun. 2008. p. 548. 37 38
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CONCLUSÃO A história da construção de políticas públicas, que visam alcançar a superação da situação de violência contra a mulher no Brasil, é resultado do trabalho intenso realizado pelo movimento feminista e de mulheres brasileiras, que, por meio de manifestações de rua e espaço na mídia, deram visibilidade às mais variadas formas de violências praticadas contra as mulheres, principalmente, quando ocorre no âmbito doméstico. Esse exercício de cidadania direcionado ao enfrentamento à violência contra a mulher, aproveitando a abertura democrática, a partir de 1985, e depois com a Constituição da República de 1988, conseguiu a inclusão dessa temática na agenda de governo, atrelando as discussões em busca de uma maior equidade de gênero e observância aos direitos humanos, culminando, em 2003, com a criação da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres da Presidência da República (SPM/PR), com status de ministério. É fato que a participação da sociedade civil nos espaços públicos de discussão a respeito dos problemas sociais emergentes e os critérios de elaboração de políticas públicas correspondentes, carece de maior democratização no processo de tomada de decisão e transparência às ações e programas governamentais. Entretanto, percebemos que as conferências nacionais de políticas para as mulheres abriram um diálogo mais próximo com o Estado e propiciaram a elaboração de planos nacionais de políticas para mulheres, que estabeleceram as diretrizes e eixos de atuação estratégicos a serem implementados de forma articulada pela Secretaria Especial de Políticas para Mulheres com os ministérios, secretarias, diversos níveis de governos e poderes, diferentes segmentos da sociedade e envolvimento dos estados membros e municípios. Nesse contexto, após décadas de luta, surgiu, em 7 de agosto de 2006, a Lei n. 11.340, denominada Lei Maria da Penha, com participação da sociedade no seu processo de elaboração, que prevê políticas públicas integradas para prevenção e enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher, a serem implementadas pelos estados e municípios, consolidadas no Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher. 27
A efetividade da Lei n. 11.340/06, será alcançada se a Administração Pública de forma articulada conseguir realizar os objetivos expostos no Pacto Nacional, por meio de políticas públicas que viabilizem à mulher em situação de violência doméstica o rompimento do ciclo da violência, com o acolhimento, a proteção e o seu encaminhamento, se estiver em situação de vulnerabilidade social, aos serviços públicos especializados nessa área. A vontade política em propiciar a inclusão social e a redução das desigualdades de gênero e da violência doméstica e familiar contra a mulher, como consta na agenda do governo, já traz um alento. Além disso, confere a nós, brasileiras, goianas e goianienses a responsabilidade em colaborar nesse processo, participando das arenas sociais para a elaboração, como também monitorando e avaliando as políticas públicas voltadas para as mulheres nos diversos setores, principalmente, no que se refere ao enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARENDT, H. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1983. BANDEIRA, L.; VASCONCELOS, M. Equidade de gênero e políticas públicas. Cadernos Agende, Brasília: AGENDE, v. 3, 2002. BARSTED, L. L. Uma vida sem violência: o desafio das mulheres. Rio de Janeiro, out.2006. Disponível em: <http://www.direitos. org.br>. Acesso em: 10 mar. 2010. BLAY, E. A. Violência contra a mulher e políticas públicas. Estudos Avançados, São Paulo, v. 17, n. 49, 2003. BOBBIO, N. A sociedade civil no Estado, Governo e sociedade: para uma teoria geral de política. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995. BRASIL, Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil/Decreto-Lei/Del2848.htm>. Acesso em: 20 jul. 2009. 28
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