Bruno Rossi Doná* A POSSIBILIDADE JURÍDICA DE ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOS ThE lEGAl PoSSiBiliTy oF ADoPTion By hoMoSExUAl CoUPlES lA PoSiBiliDADE JURíDiCA DE ADoPCión PoR PAREJAS hoMoAFETiVAS
Resumo: O presente estudo tem como escopo primordial fazer uma análise sobre a possibilidade jurídica e a viabilidade social da adoção de crianças e adolescentes por casais homoafetivos. Nessa esteira, as fontes de pesquisa utilizadas foram basicamente as obras listadas nas referências e jurisprudências dos tribunais pátrios, sobretudo os recentes posicionamentos firmados pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça. Desse modo, fez-se um estudo doutrinário e jurisprudencial, com amparo no ordenamento jurídico pátrio, sobre a possibilidade ou não de casais homoafetivos poderem adotar, chegando-se a conclusão, ao final do trabalho, de que referida medida é possível e socialmente recomendável. Abstract: This article has the main goal of making an analysis of the legal possibility and social viability of the adoption of children and adolescents by homosexual couples. On this way, the research sources used were basically the works listed in the references and court decisions of their ancestors, especially recent placements signed by the Superior Court. Thus, it has been done a study of doctrine and jurisprudence, in reliance on the national legal system, about whether or not homosexual couples are able to adopt, reaching completion at the end of the work, that this measure is possible and socially recommended.
* Especializado em Direito Civil e Processual Civil pela UCDB/CPC Marcato. Especializando Legal Law Master em Direito Empresarial pela FGV/MMurad. Bacharel em Direito pela UFES. Assessor Jurídico na Procuradoria Criminal do MP-ES.
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Resumen: El presente estudio busca hacer un análisis sobre la posibilidad jurídica y la viabilidad social de adopción de niños y adolescentes por parejas homoafectivas. En ese sentido, las fuentes de investigación utilizadas fueron básicamente las obras listadas en las referencias y jurisprudencias de tribunales pátrios, especialmente los recientes posicionamientos firmados por el Colendo Superior Tribunal de Justicia. De esa manera, se hizo un estudio doctrinario y jurisprudencial, con base en el ordenamiento jurídico pátrio, sobre la posibilidad o no de parejas homoafectivas puedan adoptar, llegándose a la conclusión, al final de este trabajo, de que referida medida es posible y socialmente recomendable. Palavras-chaves: Adoção, Possibilidade jurídica, Casais homoafetivos. Keywords: Adoption, Legal Possibility, Homosexual Couples. Palabras clave: Adopción, Posibilidad jurídica, Parejas homoafectivas.
INTRODUÇÃO A possibilidade jurídica de adoção por casais homoafetivos é um tema bastante atual, polêmico e de grande repercussão social, tendo sido alvo de vários estudos dirigidos por parte dos estudiosos pátrios, não havendo, portanto, que se falar em posicionamento pacificado sobre tal temática. Desse modo, o presente estudo pretende analisar referido tema, de modo a enfocar os estudos doutrinários, nos posicionamentos jurisprudenciais e no ordenamento jurídico pátrio pertinentes ao assunto, a fim de se chegar a uma conclusão pela possibilidade ou impossibilidade de haver a adoção em comento. 280
Conforme mencionado anteriormente, referido tema é bastante polêmico, pois não envolve apenas discussões sobre os contornos jurídicos que permeiam o tema, mas também questões filosóficas e religiosas, que não serão aprofundadas no estudo em tela. Assim, diante da grande repercussão jurídica e dos efeitos práticos que tal tema reflete, se passa agora a analisá-lo mais detidamente. ASPECTOS GERAIS DA FAMÍLIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO A família é um dos institutos mais tradicionais da história da humanidade, sendo um dos pontos fundamentais de qualquer corpo social. Em termos conceituais, interessante se revela a lição de Arx Tourino (1995, p. 41), para quem o conceito de família pode ser analisado sob duas acepções: ampla e restrita. no primeiro sentido, a família é o conjunto de todas as pessoas, ligadas pelos laços do parentesco, com descendência comum, englobando, também, os afins – tios, primos, sobrinhos e outros. É a família distinguida pelo sobrenome: família Santos, Silva, Costa, Guimarães e por aí afora, neste grande país. Esse é o mais amplo sentido da palavra. na acepção restrita, família abrange os pais e os filhos, um dos pais e os filhos, o homem e a mulher em união estável, ou apenas irmãos... É na acepção stricto sensu que mais se utiliza o termo família, principalmente do ângulo o jus positum...
Já no tocante à proteção legislativa, a família ganhou importante destaque na Constituição da República Federativa do Brasil (CF) de 1988, estando regulada no Capítulo Vii de tal corpo normativo. Com efeito, o art. 227 da Carta Magna estatui que “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, ou seja, nota-se que a família é tratada como um dos alicerces do meio social, o que revela sua grande importância. 281
há de se destacar também que o novo Código Civil de 2002, a exemplo do código anterior, possui livro exclusivo para tratar do Direito de Família, o que mais uma vez demonstra a grandeza de tal instituto. Retornando à análise da família na Constituição Federal (CF), vislumbra-se claramente que esta elenca a existência de três modelos/espécies de entidades familiares, quais sejam: - a constituída pelo casamento civil ou religioso com efeitos civis (Art. 226, §§ 1º e 2º); - a constituída pela união estável entre o homem e a mulher, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento (Art. 226, § 3º); - a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, chamada de família monoparental (Art. 226, § 4º).
Aqui, analisaremos um pouco mais detidamente o instituto da união estável, que interessa diretamente ao estudo que ora se pretende fazer. União Estável: conceito e regulamentação Conforme breve exposição anterior, o art. 226, § 3º, da CF, prevê expressamente o instituto da união estável, afirmando que o mesmo é caracterizado como espécie de entidade familiar. Pode-se conceituar a união estável, em apertada síntese, como sendo a união prolongada entre o homem e a mulher, sem que haja casamento entre ambos. Pois bem, desde o advento da CF de 1988, que previu expressamente a união estável, passaram-se vários anos sem que tenha havido regulamentação específica de tal instituto, eis que a lei Maior apenas concebeu a existência do mesmo, deixando a cargo do legislador infraconstitucional a posterior regulamentação. nesse passo, somente em 1994 surgiu a primeira lei que tratou do assunto, qual seja, lei n. 8.971. Referida lei conceituou como “companheiros” a mulher e o homem que mantinham união comprovada, na qualidade de solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, por mais de cinco anos, ou com prole. 282
Embora tal lei tenha sido uma inovação na regulamentação da união estável, sobretudo por disciplinar o direito a alimentos e à sucessão, deixou muito a desejar, sobretudo em razão do tímido tratamento dispensado a referido instituto. Diante das várias críticas, em 1996 foi promulgada a lei n. 9.278, que também tratou do assunto, trazendo significativas mudanças, tais como alteração do conceito e omissão em relação aos requisitos de natureza pessoal, tempo mínimo de convivência e existência de prole. nessa toada, o art. 1º conceituou a união estável como sendo “a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família”. Trouxe também disposições em relação ao direito sucessório e alimentos. Todavia, ambas as leis supra elencadas foram revogadas com o advento do Código Civil de 2002 (CC), que passou a tratar do assunto em título próprio (Título iii), situado dentro do livro de Direito da Família, mais precisamente nos artigos 1.723 a 1.727. no intuito de melhor analisar o instituto ora em cotejo, necessário se faz transcrever abaixo o artigo do Código Civil que conceitua a união estável: Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
nota-se assim que o Código Civil elenca cinco requisitos básicos para que haja a caracterização da união estável, chamando a atenção a diversidade de sexos, ou seja, pelo teor literal da lei a união estável só poderia ser reconhecida, em tese, entre homem e mulher. União estável homoafetiva Conforme visto anteriormente, o art. 1.723 do Código Civil de 2002, amparado pela CF de 1988, elenca a diversidade de sexo 283
como um dos requisitos impostos para que haja a caracterização da união estável. lastreada em tal dispositivo, bem como no § 3º do art. 226 da CF, grande parte da doutrina pátria entende como sendo possível o reconhecimento de união estável apenas entre homem e mulher, o que consequentemente exclui a possibilidade de reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo. À guisa de exemplificação, esse é o posicionamento de Álvaro Villaça Azevedo (2003, p. 203), para quem Desde que foram conferidos efeitos ao concubinato, até o advento da Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal, sempre a Jurisprudência brasileira teve em mira o par andrógino, o homem e a mulher. Com a Constituição Federal, de 5-10-1988, ficou bem claro esse posicionamento, de só reconhecer, como entidade familiar, a união estável entre o homem e a mulher, conforme o claríssimo enunciado do § 3º do seu art. 226.
Todavia, esse posicionamento não pode prosperar, consoante o que será adiante esposado. Com efeito, os dispositivos transcritos limitam-se a estabelecer a possibilidade de união estável entre pessoas de sexo diferentes que preencham as condições impostas pela lei, que são, basicamente, convivência pública, duradoura e contínua. Todavia, os dispositivos comentados não criam nenhuma restrição à eventual união entre duas mulheres ou dois homens. nesse passo, calha ressaltar que o objetivo da lei é o de conferir aos companheiros direitos e deveres elencados no ordenamento jurídico, não havendo qualquer proibição expressa no sentido de que esses efeitos não alcançam uniões entre pessoas do mesmo sexo. Verifica-se, assim, que o legislador não se valeu de expressão restritiva que pudesse ensejar a vedação expressa da união entre pessoas do mesmo sexo, razão pela qual se pode afirmar tranquilamente que tal matéria ainda não foi expressamente regulamentada. Diante de tal circunstância, conclui-se que existe lacuna na legislação. Como se sabe, a lacuna existe na lei, e não no ordenamento jurídico, razão pela qual é possível a integração mediante
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o uso da analogia, objetivando alcançar casos não expressamente contemplados, mas cuja essência coincida com outros versados pelo legislador. nesse diapasão, vale colacionar a doutrina de Caio Mário da Silva Pereira (2004, p. 72), para quem A analogia consiste no processo lógico pelo qual o aplicador do direito estende o preceito legal aos casos não diretamente compreendidos em seu dispositivo. Pesquisa a vontade da lei, para leva-lás às hipóteses que a literalidade de seu texto não havia mencionado.
Vale ressaltar ainda que o julgador não pode eximir-se de prestar a jurisdição sob o argumento de que não há previsão legal sobre uma determinada matéria. Versando acerca da prestação jurisdicional, aduz com a habitual proficiência Maria Berenice Dias (2003, p. 11-12) que “A falta de previsão específica nos regramentos legislativos não pode servir de justificativa para negar prestação jurisdicional ou ser invocada como motivo para deixar de reconhecer a existência de direito merecedor de tutela”. Destarte, a analogia, prevista no art. 4º da lei de introdução ao Código Civil, se revela como um importante mecanismo que o julgador pode se utilizar para integrar a norma jurídica nos casos de omissão. necessário se faz aguçar que no Colendo Superior Tribunal de Justiça já há precedentes em que, embora não se tenha reconhecido expressamente a união estável homoafetiva, considerou-a análoga à união entre pessoas de sexos diferentes, surtindo os devidos efeitos jurídicos. observe a seguir trecho do REsp 1.026.981/RJ: Direito civil. Previdência privada. Benefícios. Complementação. Pensão post mortem. União entre pessoas do mesmo sexo. Princípios fundamentais. Emprego de analogia para suprir lacuna legislativa. necessidade de demonstração inequívoca da presença dos elementos essenciais à caracterização da união estável, com a evidente exceção da diversidade de sexos. igualdade de condições entre beneficiários.
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[...] Especificamente quanto ao tema em foco, é de ser atribuída normatividade idêntica à da união estável ao relacionamento afetivo entre pessoas do mesmo sexo, com os efeitos jurídicos daí derivados, evitando-se que, por conta do preconceito, sejam suprimidos direitos fundamentais das pessoas envolvidas. - o manejo da analogia frente à lacuna da lei é perfeitamente aceitável para alavancar, como entidade familiar, na mais pura acepção da igualdade jurídica, as uniões de afeto entre pessoas do mesmo sexo. Para ensejar o reconhecimento, como entidades familiares, de referidas uniões patenteadas pela vida social entre parceiros homossexuais, é de rigor a demonstração inequívoca da presença dos elementos essenciais à caracterização da união estável, coma a evidente exceção da diversidade de sexos. - Demonstrada a convivência, entre duas pessoas do mesmo sexo, pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família, haverá, por conseqüência, o reconhecimento de tal união como entidade familiar, com a respectiva atribuição dos efeitos jurídicos dela advindos. [...] (REsp 1.026.981/RJ, Rel. Ministra nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 04/02/2010, DJ de 23/02/2010)
Ademais, no julgamento do REsp 820.475/RJ, DJ de 11/05/2009, o STJ entendeu pela possibilidade jurídica do pedido de declaração de união estável formulado por casal homossexual, o que só reforça a plena possibilidade de se aplicar analogicamente às uniões entre pessoas do mesmo sexo o regramento existente da união estável, eis que são situações completamente análogas. o Supremo Tribunal Federal, por intermédio do Ministro Celso de Mello, quando da análise do pleito formulado na MC na ADin 3.300/DF, DJ de 09/02/2006, se manifestou no sentido de que há “necessidade de se atribuir verdadeiro estatuto de cidadania às uniões homoafetivas.”. Por fim, perfeitamente possível nos afigura a possibilidade de reconhecimento da união estável homoafetiva, ou, ao menos, a aplicação analógica do regramento da união estável à mesma.
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ADOÇÃO Conceito e características gerais Antes de adentrarmos na análise dos requisitos legais da adoção, imperioso se faz tecermos breve análise conceitual do termo. Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2006, p. 328), “Adoção é o ato jurídico solene pelo qual alguém recebe em sua família, na qualidade de filho, pessoa a ela estranha”. Pois bem, no ordenamento jurídico pátrio, a Constituição Federal de 1988 deu grande destaque aos direitos das crianças e adolescentes, destacando ao lado deles o instituto da adoção, consoante pode ser observado da leitura do art. 227, caput, e de seu § 5º, verbis: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. [...] § 5º - A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros.
no plano infraconstitucional, ficou a cargo do Estatuto da Criança e do Adolescente -ECA- (lei n. 8.069/1990), juntamente com o Código Civil, disciplinar a adoção no Brasil. Sob o aspecto social, a adoção cumpre importante papel, pois faz com que crianças e adolescentes que não possuam família, quer seja porque foram abandonados por seus pais ou porque estes morreram, quer seja por algum outro motivo, sejam adotadas e inseridas em novas famílias, onde terão todo o apoio e afeto necessário para se desenvolver adequadamente no meio social. 287
Ademais, a adoção faz com que o adotando tenha sua dignidade plenamente atendida e respeitada, o que constitui um dos fundamentos primordiais da República Federativa do Brasil (art. 1º, iii, da CF), bem como ajuda a construir uma sociedade mais justa e solidária, além de diminuir a pobreza e promover o bem dos mesmos, sendo estes objetivos da República em que vivemos (art. 3º, i, iii e iV, da CF). Conclui-se, assim, que a adoção é um instituto que traz grandes vantagens para a sociedade brasileira, pois faz com que crianças e adolescentes que geralmente estão à margem da sociedade, sejam inseridas em novas famílias, e, com isso, passem a ter melhores condições de desenvolvimento e crescimento como seres humanos. Requisitos básicos para a adoção Visto em linhas gerais o que é o instituto da adoção, bem como sua importância na sociedade como um todo, passa-se agora a analisar quais são os requisitos básicos impostos pelo ordenamento jurídico para que esta se concretize. Conforme brevemente exposto alhures, o ECA disciplina, dentre outros institutos, quais são os requisitos para que haja o deferimento de um pedido de adoção de uma criança ou adolescente. importante ressaltar que vários dispositivos do ECA foram recentemente alterados pela lei n. 12.010/2009, sendo ainda que tal lei revogou a maioria dos dispositivos do Código Civil de 2002 que tratavam da adoção. nessa toada, o art. 42 do ECA elenca os requisitos necessários para que possa haver a adoção, razão pela qual se torna imprescindível sua transcrição na íntegra, verbis: Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil. (Redação dada pela lei n. 12.010, de 2009) Vigência § 1º não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.
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§ 2º Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. (Redação dada pela lei n. 12.010, de 2009) Vigência § 3º o adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando. § 4º os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão. (Redação dada pela lei n. 12.010, de 2009) Vigência § 5º nos casos do § 4º deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. (Redação dada pela lei n. 12.010, de 2009) Vigência § 6º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.(incluído pela lei n. 12.010, de 2009) Vigência
Da análise do dispositivo anteriormente transcrito, verificase que, basicamente, pode adotar a pessoa que tenha mais de 18 (dezoito) anos, não seja ascendente ou irmão do adotando e seja pelo menos 16 (dezesseis) anos mais velho que este. no caso de haver adoção conjunta, os adotantes devem ser casados civilmente ou manter união estável. Analisados os requisitos primordiais para que haja a adoção, passa-se a seguir a analisar o objeto principal do presente estudo, qual seja, se é possível ou não a adoção por casais homoafetivos. Da possibilidade jurídica de adoção por casais homoafetivos Chega-se agora ao ponto crucial do presente artigo, qual seja, analisar, sobretudo à luz do ordenamento jurídico pátrio, se é possível ou não um casal homossexual praticar a adoção. 289
nesse passo, há de se dizer que a corrente predominantemente majoritária entende ser impossível tal ato jurídico de adoção por casais homoafetivos, sustentando para tanto que, para haver adoção conjunta, é imprescindível que as partes sejam casadas ou estejam em união estável, a teor do que dispõe o art. 42, § 2º do ECA. Assim, como o art. 226, § 3º da CF, estabelece que a união estável se constitui entre homem e mulher, tal corrente afirma que não é possível o reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo, o que por via reflexa acarreta na impossibilidade de adoção por parte das mesmas. Todavia, referido posicionamento não parece ser o mais adequado, eis que, consoante visto alhures, não há no ordenamento jurídico nacional nenhuma lei ou dispositivo que vede expressamente a adoção por casais homoafetivos. no mesmo sentido entende Sylvia Mendonça do Amaral (2003, p. 79). nessa toada, há de ser feita aplicação analógica do instituto da união estável às uniões homoafetivas, desde que estas possuam os mesmos requisitos exigidos para que haja a caracterização da união estável convencional, com exceção, é claro, da diversidade de sexos. Ademais calha registrar que no direito privado há de ser observado o princípio da legalidade, que para os particulares significa poder fazer tudo o que quiserem, desde que não seja expressamente vedado por lei, sendo que, como visto, a adoção por casais homoafetivos não é taxativamente vedada pelo ordenamento jurídico pátrio, razão pela qual não pode ser proibida. Ainda na seara ora enfocada, calha registrar que não se mostra sustentável a proibição da adoção de crianças e adolescentes por casais homoafetivos só pelo fato de não haver diversidade de sexo entre os adotantes, pois tal posicionamento seria no mínimo preconceituoso, ferindo frontalmente o art. 3º, iV, da Carta Magna nacional, além de penalizar a liberdade de orientação sexual das pessoas, o que via de consequência abalroaria dois dos maiores princípios constitucionais, quais sejam, o da igualdade e o da dignidade da pessoa humana. Assim, o caminho mais razoável que se afigura é o de se permitir a adoção por casais homoafetivos, que vivam em estado 290
similar à união estável convencional, e desde que tal medida seja adotada visando atingir o melhor interesse do menor adotado. Referido posicionamento tem sido acolhido pelos Tribunais mais consentâneos com as novas formatações dos núcleos familiares. Veja a seguir aresto oriundo do Tribunal de Justiça do Mato Grosso: APElAÇÃo CíVEl. ADoÇÃo PoR CASAl FoRMADo PoR PESSoAS Do MESMo SExo. PoSSiBiliDADE. RECURSo PRoViDo. A omissão legal não significa inexistência de direito, tampouco quer dizer que as uniões homoafetivas não merecem a tutela jurídica adequada, inclusive no que tange ao direito de adotar, motivo pelo qual não há que se falar em impossibilidade jurídica do pedido de adoção. A homossexualidade é um fato social que se perpetua através dos séculos, não mais podendo o judiciário se olvidar de emprestar a tutela jurisdicional a uniões que, enlaçadas pelo afeto, assumem feição de família, de modo que a marginalização das relações homoafetivas constitui afronta aos direitos humanos por ser forma de privação do direito à vida, violando os princípios da dignidade da pessoa humana. Sendo possível conceder aos casais formados por pessoas do mesmo sexo tratamento igualitário ao conferido às uniões estáveis entre heterossexuais, não há que se falar em impossibilidade de adoção por casais homossexuais, ainda mais quando nem o ECA tampouco o Código Civil trazem qualquer restrição quanto ao sexo, ao estado civil ou à orientação sexual do adotante. Assim, na ausência de impedimentos, deve prevalecer o princípio consagrado pelo referido estatuto, que admite a adoção quando se funda em motivos legítimos e apresenta reais vantagens ao adotando. (TJMT; APl 78200/2009; Tangará da Serra; Segunda Câmara Cível; Relª Desª Maria helena Gargaglione Póvoas; Julg. 28/04/2010; DJMT 07/06/2010; p. 13)
Ainda nesse contexto, importantíssimo ressaltar que recentemente a 4ª Turma do STJ julgou o REsp n. 889.852 – RS, publicado no Diário de Justiça do dia 10/08/2010, entendendo, à unanimidade, pela possibilidade de adoção de crianças por parte de uma mulher que vivia em união homoafetiva com sua companheira. nota-se assim que, embora tal caso tenha uma marcante particularidade, qual seja, a de que as crianças adotadas já haviam 291
sido adotadas anteriormente pela companheira da adotante, podese afirmar que se trata do primeiro precedente do STJ sinalizando pela possibilidade de adoção de crianças por casais homoafetivos. Devido à grande magnitude do mencionado decisum, necessário se faz transcrevê-lo integralmente: DiREiTo CiVil. FAMíliA. ADoÇÃo DE MEnoRES PoR CASAl hoMoSSExUAl. SiTUAÇÃo JÁ ConSoliDADA. ESTABiliDADE DA FAMíliA. PRESEnÇA DE FoRTES VínCUloS AFETiVoS EnTRE oS MEnoRES E A REQUEREnTE. iMPRESCinDiBiliDADE DA PREVAlÊnCiA DoS inTERESSES DoS MEnoRES. RElATóRio DA ASSiSTEnTE SoCiAl FAVoRÁVEl Ao PEDiDo. REAiS VAnTAGEnS PARA oS ADoTAnDoS. ARTiGoS 1º DA lEi 12.010/09 E 43 Do ESTATUTo DA CRiAnÇA E Do ADolESCEnTE. DEFERiMEnTo DA MEDiDA. 1. A questão diz respeito à possibilidade de adoção de crianças por parte de requerente que vive em união homoafetiva com companheira que antes já adotara os mesmos filhos, circunstância a particularizar o caso em julgamento. 2. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da informação, sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturais e as relativas aos costumes, onde a sociedade transforma-se velozmente, a interpretação da lei deve levar em conta, sempre que possível, os postulados maiores do direito universal. 3. o artigo 1º da lei 12.010/09 prevê a "garantia do direito à convivência familiar a todas e crianças e adolescentes". Por sua vez, o artigo 43 do ECA estabelece que "a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundarse em motivos legítimos". 4. Mister observar a imprescindibilidade da prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque está em jogo o próprio direito de filiação, do qual decorrem as mais diversas consequências que refletem por toda a vida de qualquer indivíduo. 5. A matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por casais homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de verificar qual é a melhor solução a ser dada para a proteção dos direitos das crianças, pois são questões indissociáveis entre si. 6. os diversos e respeitados estudos especializados sobre o
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tema, fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade de Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia Americana de Pediatria), "não indicam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores". 7. Existência de consistente relatório social elaborado por assistente social favorável ao pedido da requerente, ante a constatação da estabilidade da família. Acórdão que se posiciona a favor do pedido, bem como parecer do Ministério Público Federal pelo acolhimento da tese autoral. 8. É incontroverso que existem fortes vínculos afetivos entre a recorrida e os menores – sendo a afetividade o aspecto preponderante a ser sopesado numa situação como a que ora se coloca em julgamento. 9. Se os estudos científicos não sinalizam qualquer prejuízo de qualquer natureza para as crianças, se elas vêm sendo criadas com amor e se cabe ao Estado, ao mesmo tempo, assegurar seus direitos, o deferimento da adoção é medida que se impõe. 10. o Judiciário não pode fechar os olhos para a realidade fenomênica. Vale dizer, no plano da “realidade”, são ambas, a requerente e sua companheira, responsáveis pela criação e educação dos dois infantes, de modo que a elas, solidariamente, compete a responsabilidade. 11. não se pode olvidar que se trata de situação fática consolidada, pois as crianças já chamam as duas mulheres de mães e são cuidadas por ambas como filhos. Existe dupla maternidade desde o nascimento das crianças, e não houve qualquer prejuízo em suas criações. 12. Com o deferimento da adoção, fica preservado o direito de convívio dos filhos com a requerente no caso de separação ou falecimento de sua companheira. Asseguram-se os direitos relativos a alimentos e sucessão, viabilizando-se, ainda, a inclusão dos adotandos em convênios de saúde da requerente e no ensino básico e superior, por ela ser professora universitária. 13. A adoção, antes de mais nada, representa um ato de amor, desprendimento. Quando efetivada com o objetivo de atender aos interesses do menor, é um gesto de humanidade. hipótese em que ainda se foi além, pretendendo-se a adoção de dois menores, irmãos biológicos, quando, segundo dados do Conselho nacional de Justiça, que criou, em 29 de abril de 2008, o Cadastro
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nacional de Adoção, 86% das pessoas que desejavam adotar limitavam sua intenção a apenas uma criança. 14. Por qualquer ângulo que se analise a questão, seja em relação à situação fática consolidada, seja no tocante à expressa previsão legal de primazia à proteção integral das crianças, chega-se à conclusão de que, no caso dos autos, há mais do que reais vantagens para os adotandos, conforme preceitua o artigo 43 do ECA. na verdade, ocorrerá verdadeiro prejuízo aos menores caso não deferida a medida. 15. Recurso especial improvido.
Forçoso se faz observar que o STJ adotou o mesmo posicionamento por nós defendido, qual seja, de que deve-se aplicar analogicamente às uniões homoafetivas o mesmo tratamento legal das uniões estáveis. Trilhando novamente tal entendimento, em fevereiro deste ano foi publicado acórdão do STJ mantendo decisão proveniente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que havia deferido a uma mulher a adoção unilateral de criança menor de idade que era filha biológica de sua companheira, com quem mantinha união estável. observe o julgado: CiVil. PRoCESSUAl CiVil. RECURSo ESPECiAl. UniÃo hoMoAFETiVA. PEDiDo DE ADoÇÃo UnilATERAl. PoSSiBiliDADE. AnÁliSE SoBRE A ExiSTÊnCiA DE VAnTAGEnS PARA A ADoTAnDA. i. Recurso Especial calcado em pedido de adoção unilateral de menor, deduzido pela companheira da mãe biológica da adotanda, no qual se afirma que a criança é fruto de planejamento do casal, que já vivia em união estável, e acordaram na inseminação artificial heteróloga, por doador desconhecido, em C.C.V. ii. Debate que tem raiz em pedido de adoção unilateral - que ocorre dentro de uma relação familiar qualquer, onde preexista um vínculo biológico, e o adotante queira se somar ao ascendente biológico nos cuidados com a criança -, mas que se aplica também à adoção conjunta - onde não existe nenhum vínculo biológico entre os adotantes e o adotado. iii. A plena equiparação das uniões estáveis homoafetivas, às uniões estáveis heteroafetivas, afirmada pelo STF (ADi 4277/DF, Rel. Min. Ayres Britto), trouxe como corolário, a extensão automática àquelas, das prerrogativas já outorgadas
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aos companheiros dentro de uma união estável tradicional, o que torna o pedido de adoção por casal homoafetivo, legalmente viável. lV. Se determinada situação é possível ao extrato heterossexual da população brasileira, também o é à fração homossexual, assexual ou transexual, e todos os demais grupos representativos de minorias de qualquer natureza que são abraçados, em igualdade de condições, pelos mesmos direitos e se submetem, de igual forma, às restrições ou exigências da mesma lei, que deve, em homenagem ao princípio da igualdade, resguardar-se de quaisquer conteúdos discriminatórios. V. Apesar de evidente a possibilidade jurídica do pedido, o pedido de adoção ainda se submete à norma-princípio fixada no art. 43 do ECA, segundo a qual "a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando". Vi. Estudos feitos no âmbito da Psicologia afirmam que pesquisas "[...] têm demonstrado que os filhos de pais ou mães homossexuais não apresentam comprometimento e problemas em seu desenvolvimento psicossocial quando comparados com filhos de pais e mães heterossexuais. o ambiente familiar sustentado pelas famílias homo e heterossexuais para o bom desenvolvimento psicossocial das crianças parece ser o mesmo". (FARiAS, Mariana de oliveira e MAiA, Ana Cláudia Bortolozzi in: Adoção por homossexuais: a família homoparental sob o olhar da Psicologia jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, pp. 75/76). Vii. o avanço na percepção e alcance dos direitos da personalidade, em linha inclusiva, que equipara, em status jurídico, grupos minoritários como os de orientação homoafetiva - ou aqueles que têm disforia de gênero - aos heterossexuais, traz como corolário necessário a adequação de todo o ordenamento infraconstitucional para possibilitar, de um lado, o mais amplo sistema de proteção ao menor - aqui traduzido pela ampliação do leque de possibilidades à adoção - e, de outro, a extirpação dos últimos resquícios de preconceito jurídico - tirado da conclusão de que casais homoafetivos gozam dos mesmos direitos e deveres daqueles heteroafetivos. Vii. A confluência de elementos técnicos e fáticos, tirados da i) óbvia cidadania integral dos adotantes; ii) da ausência de prejuízo comprovado para os adotados e; iii) da evidente necessidade de se aumentar, e não restringir, a base daqueles que desejam adotar, em virtude da existência de milhares de crianças que longe de quererem discutir a orientação sexual de seus pais, anseiam apenas por um lar, reafirmam o posicionamento adotado pelo Tribunal de origem, quanto à
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possibilidade jurídica e conveniência do deferimento do pleito de adoção unilateral. Recurso Especial nÃo PRoViDo. (STJ; REsp 1.281.093; Proc. 2011/0201685-2; SP; Terceira Turma; Relª Minª nancy Andrighi; Julg. 18/12/2012; DJE 04/02/2013)
De outra banda, outro importante aspecto sobre a temática posta merece ser analisado, qual seja, a viabilidade psicológica da educação pelo casal homoafetivo. isso se dá porque há muitas indagações e posicionamentos leigos no que pertine à criação e à adoção pelo casal homoafetivo, no sentido de que a orientação afetivo-sexual dos adotantes poderia interferir no desenvolvimento da afetividade dos filhos, como se, pela convivência, esses estivessem propensos a se tornarem homossexuais. Também há considerações acerca dos possíveis prejuízos oriundos da falta dos dois referenciais básicos na educação do menor, quais sejam, o paterno e o materno. Pois bem, com relação à inconveniência de crianças serem adotadas por casais homossexuais, o ministro relator do REsp n. 889.852, luis Felipe Salomão, fez questão de ressaltar algumas informações que foram colhidas no acórdão recorrido, dados esses que por sua vez se originaram de estudos feitos por entidades estrangeiras, tais como Universidade de Virgínia, Universidade de Valência e Academia Americana de Pediatria, quais sejam: - ser pai ou ser mãe não está tanto no fato de gerar, quanto na circunstância de amar e servir; - nem sempre, na definição dos papéis maternos e paternos, há coincidência do sexo biológico com o sexo social; - o papel de pai nem sempre é exercido por um indivíduo do sexo masculino; - os comportamentos de crianças criadas em lares homossexuais não variam fundamentalmente daqueles da população em geral; - as crianças que crescem em uma família de lésbicas não apresentam necessariamente problemas ligados a isso na idade adulta; - não há dados que permitam afirmar que as lésbicas e os gays não são pais adequados ou mesmo que o desenvolvimento psicossocial dos filhos de gays e lésbicas seja comprometido sob qualquer aspecto em relação aos filhos de pais heterossexuais;
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- educar e criar os filhos de forma saudável o realizam semelhantemente os pais homossexuais e os heterossexuais; - a criança que cresce com 1 ou 2 pais gays ou lésbicas se desenvolve tão bem sob os aspectos emocional, cognitivo, social e do funcionamento sexual quanto a criança cujos pais são heterossexuais.
Depreende-se assim que não há nenhum dado concreto que possa inferir que haverá prejuízos psíquicossociais às crianças adotadas por casais homoafetivos, sendo tais considerações quase sempre reveladas na prática em posicionamentos preconceituosos por parcela da população, opiniões estas muitas vezes lastreadas em ideais e convicções filosófico-religiosas, sem o mínimo cunho científico, o que traz barreiras na análise da questão. Conforme alhures mencionado, sob o aspecto social referida medida também se revela de grandiosa valia, pois a adoção por casais homoafetivos faz com que o campo da adoção se alargue, ou seja, mais pessoas se habilitem como adotantes, o que consequentemente fará com que um número maior de crianças e adolescentes sejam adotadas, passando assim a ter efetivamente uma família, podendo se desenvolver adequadamente como cidadãos. Para encerrar a análise do tema em comento, imperioso se faz analisar a seguir a preciosa lição de Enézio de Deus Silva Júnior (2007, p. 85), que afirma: Sustentar a impossibilidade jurídica do pedido de adoção formulado por um casal homossexual, na perspectiva apresentada por esta pesquisa doutrinária e frente ao ordenamento jurídico pátrio, é desconsiderar o poder jurisdicional de o magistrado realizar uma interpretação eficaz, sintonizada com a realidade fática, de acordo com os fins sociais aos quais a lei se dirige (liCC, art. 5º), através do recurso analógico. Defender, outrossim, tal impossibilidade, sem contextualizar a legislação pátria com as aberturas doutrinárias e jurisprudenciais progressivas – em matéria de Direito de Família, por exemplo – pode, além de se apresentar como postura hermética e literal limitante, esconder discriminação voltada para a sexualidade das pessoas que, juntas, candidatam-se à adoção, por se amarem e desejarem exercitar os sentimentos de maternidade/paternidade.
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Por fim, ante tudo o que foi aqui posto e analisado, conclui-se pela possibilidade jurídica de adoção por casais homoafetivos, eis que não há nenhuma vedação legal expressa quanto a tal possibilidade, sendo ainda tal medida socialmente adequada, à medida que faz com que mais menores sejam inseridos em famílias nas quais poderão se desenvolver plenamente. CONCLUSÃO Conforme examinado, a possibilidade jurídica de adoção por casais homossexuais é um tema recente e bastante polêmico, pois não envolve apenas discussões jurídicas, mas também questões filosóficas, morais, religiosas, sociais, ou seja, é um tema multidisciplinar. nesse passo, verificou-se que não há no ordenamento jurídico brasileiro nenhum dispositivo que vede expressamente a adoção por parte de pessoas do mesmo sexo, ocasião em que firmamos o posicionamento de que deve ser aplicado às uniões homoafetivas o mesmo tratamento jurídico dispensado às uniões estáveis, por meio do instituto da analogia. Viu-se também que não há nenhum estudo científico que ateste que a adoção por casais homoafetivos influencie na personalidade e no desenvolvimento psíquico-afetivo dos adotandos, sendo, na prática, tais ideias frutos de pensamentos preconceituosos de parte da sociedade. Ademais, constatou-se que caso se possibilite a adoção por casais homoafetivos, referida medida trará grandes benefícios sociais, eis que possibilitará que mais crianças e adolescentes que estejam em abrigos e orfanatos, às margens da sociedade, sejam adotados, inseridos em verdadeiras famílias, nas quais poderão se desenvolver plenamente, tendo uma adequada formação e inserção na sociedade. Assim, conclui-se que o posicionamento mais razoável a ser adotado é aquele que entende pela possibilidade de adoção por casais homoafetivos, por ser medida de verdadeira justiça social e atendimento ao princípio da dignidade da pessoa humana, tanto sob o ponto de vista do adotando quanto do adotante.
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