Jornal do Colégio - 604

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Jornal do Colégio JORNAL DO COLÉGIO ETAPA  –  2016  •  DE 04/03 A 17/03

ENTREVISTA

Uma especialização diferenciada na área do Direito Yuri Kuroda Nabeshima entrou em Direito na São Francisco em 2005. Ela hoje está se especializando na área asiática, na qual trabalha atualmente. Na entrevista, ela conta como foi sua trajetória, desde a faculdade aos trabalhos realizados no Japão, para adquirir sua rara e valiosa formação.

Yuri Kuroda Nabeshima

JC – Quando e por que você decidiu fazer Direito? Yuri – Sempre gostei mais da área de Humanas. O que me fez optar por Direito foi a gama de opções que eu teria depois de formada.

Além da Fuvest, você prestou outros vestibulares? Prestei PUC São Paulo e Unesp para Direito, e Unicamp para Letras. Passei na PUC e na Unicamp. Na Unesp fiquei na lista de espera. Na verdade, queria mesmo a São Francisco. Felizmente deu tudo certo.

Quando você entrou no Etapa? Em 2002.

O que motivou você a vir estudar aqui? Foi uma escolha bastante consciente. Visitei o Colégio, vi o cuidado com os alunos e achei o ensino forte.

Como foi a luta para ser aprovada na São Francisco? No 3o ano você teve que abrir mão de alguma atividade, por causa do vestibular? Eu mantive a linha de estudos normal. Acho que os três anos no Colégio Etapa são suficientes para você passar no

ENTREVISTA

Carreira – Direito

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CONTO

A cozinheira – Artur Azevedo

vestibular. É lógico que no segundo semestre eu acabei dedicando mais horas aos estudos.

Você chegou a ter dúvida em relação à carreira? Sempre tive certeza de que era Direito. Eu não via outra possibilidade. Letras, que prestei na Unicamp, é uma opção interessante, mas no Direito você tem mais possibilidades, pode tentar o serviço público ou ser advogada.

Que matérias você teve em cada ano do curso de Direito? No 1o ano tive Direito Romano, Teoria Geral do Direito Privado, Teoria Geral do Estado, Direito Constitucional, Economia Política e Introdução ao Estudo de Direito. No início, as matérias são mais gerais. No 2o ano, já fechando mais um pouco as áreas, você vê Direito Processual, Direito Penal, Direitos Humanos, Direito Comercial, Teoria Geral das Obrigações, Teoria Geral do Processo. No 3o ano tem Direito do Trabalho, Direito Administrativo, Direito Comercial, Direito Internacional, Medicina Forense. No 4o e 5o ano você tem mais possibilidades de optar por outras matérias. No 5o ano eu optei pela grade livre porque tinha interesse em várias áreas e não sabia exatamente em qual área eu gostaria de

ARTIGO Pontas de pedra lascada levantam questões sobre a pré-história brasileira

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ENTRE PARÊNTESIS

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Caiu na Fuvets

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ESPECIAL Alunos conferem resultado da Fuvest no ETAPA

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ENTREVISTA

me especializar. Selecionei matérias de Direito Internacional, Direito Civil, Direito Penal para ver se gostava mais, mas acabei descobrindo que não era muito o que eu gostaria de trabalhar.

Além da preocupação com o Exame da Ordem, no último ano tinha o Trabalho de Conclusão de Curso. Você disse que fez uma comparação entre Direito brasileiro e Direito japonês. Que área do Direito você escolheu?

Além das aulas, de que atividades você participou durante o curso?

Direito Internacional do Trabalho. O tema de minha dissertação foi a Discriminação da Mulher no Mercado de Trabalho. Eu fazia uma comparação entre o Direito brasileiro e o Direito japonês. No arubaito eu percebi que existe uma diferença no tratamento da mulher e do homem no mercado de trabalho. Por exemplo, na mesma atividade, o salário da mulher é inferior ao do homem. Embora na legislação japonesa haja mais proteção para a mulher que na brasileira, na prática, no Brasil você consegue uma maior igualdade. Uma diferença menor entre o homem e a mulher.

Além dos estágios, entre o 1o e o 2o ano, em dezembro, janeiro e fevereiro, fiz arubaito (trabalho temporário no Japão). Minha família é de origem japonesa e eu tinha a curiosidade de conhecer a terra dos meus avós. Como estudante é mais fácil fazer arubaito, você ganha um dinheiro para bancar a viagem e aproveita para conhecer o país nos seus dias de folga.

Você trabalhou onde no Japão? Em uma fábrica de pães em Yokohama. Trabalhei na parte de embalagem. Foi importante como experiência pessoal e me influenciou muito na carreira. Eu criei um vínculo com o Japão e passei a estudar japonês durante a faculdade. Inclusive, por conta do arubaito, no meu TCC fiz uma comparação entre Direito brasileiro e Direito japonês.

Você fez estágios onde durante o curso? A partir do segundo semestre do 2o ano fiz estágio de seis meses em um pequeno escritório de advocacia, nas áreas de Direito Civil e Direito do Trabalho. Eu fazia muitos contratos sociais. No primeiro semestre do 3o ano fui para um escritório maior, no qual também fiquei seis meses. Nele, trabalhei na área empresarial societária. Principalmente constituição de empresas. Era um ritmo de trabalho mais intenso. No 4o ano entrei em um estágio na Procuradoria da Fazenda Nacional onde fiquei cerca de um ano e meio. Basicamente, trabalhava fazendo cobranças. Foi interessante para conhecer uma área diferente, que era o Direito Tributário e Previdenciário. Quando me formei eu estava muito tentada a ir para a área pública.

Qual foi a importância dos estágios para você? Acho que os estágios são importantes para ter uma ideia do Direito na prática e para ver onde você se encaixa melhor, se vai querer fazer uma carreira pública ou uma carreira privada em escritório.

No último ano da faculdade, qual era sua maior preocupação? Era a OAB. Desde o início na faculdade você ouve que é uma prova difícil, que a aprovação é baixa, em torno de 10% ou menos. Na São Francisco a aprovação é maior, em torno de 70%.

Para o exame da OAB você fez alguma preparação específica? A prova da OAB é composta pela 1a fase, de múltipla escolha, que na minha época eram 100 questões – e você tinha que tirar 50 mais 1 para ser aprovado para a 2a fase. Para a 1a fase eu estudei só. Na 2a fase entravam cinco questões dissertativas e uma peça para escrever. Fiz um cursinho durante dois meses, direcionado para a parte dissertativa da prova, que é bem específica. Para a peça, escolhi Direito Tributário por causa do estágio na Procuradoria. Tinha mais segurança nessa área.

Formada, com a carteira da OAB em mãos, o que você decidiu fazer profissionalmente? Quando termina a faculdade você se depara com uma situação estranha. E agora, o que faço? Você tem n opções. Eu sou uma pessoa que não consegue ficar fazendo uma coisa só e comecei o mestrado sobre Direito japonês na São Francisco. Resolvi dar continuidade aos estudos juntamente com a preparação para prestar concurso para o serviço público. Aí recebi convite para trabalhar num escritório novamente e aceitei.

Por que, estando se preparando para concurso na área pública, você voltou a trabalhar em escritório de advocacia? Trabalhando na área privada é muito mais fácil migrar para a área pública, se você tiver interesse. E para os concursos maiores você precisa de um tempo de experiência atuando como advogado para poder prestar prova e ser aprovado. Também porque eu ainda não tinha certeza se realmente queria área pública.

Você trabalhou quanto tempo nesse escritório? Fiquei cerca de um ano, até 2011. No primeiro ano do trabalho já estava no 2o ano de mestrado. Foi nesse período que eu prestei a prova para a bolsa Mext, de pesquisa, que é proporcionada pelo Ministério da Educação, Cultura, Espor-


ENTREVISTA te, Ciência e Tecnologia do Japão. A ideia era complementar minha pesquisa para o mestrado. Como o mestrado era sobre Direito japonês, eu precisava ir ao Japão para efetivamente realizar a pesquisa. Fiquei dois anos no Japão.

Para fazer a pesquisa no Japão você interrompeu o mestrado na São Francisco? Não. O mestrado é em três anos e no primeiro ano eu fiz todos os créditos, já planejando passar os dois últimos anos no Japão. Como eu cobri todos os créditos, só precisava escrever a dissertação. Escrevi no Japão e quando voltei para o Brasil fiz a defesa do mestrado.

Que tese você defendeu no mestrado? Continuou com o tema do TCC? Isso. No TCC eu tinha feito a pesquisa especificamente em relação ao Direito japonês. No mestrado eu fiz Direito comparando Brasil e Japão. Uma questão de fontes. Como o TCC é um trabalho mais simples, você não precisa se aprofundar tanto, eu consegui fazer o trabalho com o material que encontrei no Brasil, com alguns que os colegas me emprestaram. Mas para o mestrado você precisa de uma pesquisa maior. Por isso senti a necessidade de ir procurar no Japão esse material.

Essa pesquisa, você desenvolveu em alguma universi­ dade do Japão? Eu fiquei na Universidade de Tóquio. E durante o tempo de pesquisa, também fiz estágio em um escritório em Tóquio.

Então, você teve a experiência de estagiar em escritórios aqui e no Japão. Os estágios são iguais? O estágio lá é completamente diferente. É feito durante as férias, dura um ou dois meses. Você passa na empresa para aprender como funciona o escritório. Eles tratam você como um aprendiz. É um tratamento um pouco diferente do que a gente tem no Brasil.

Quando você voltou para cá? Voltei em abril de 2014. Voltei, fiz a defesa do meu mestrado e comecei a procurar trabalho novamente. Foi quando vim para a Saeki Advogados, o escritório onde trabalho hoje. Cerca de 90%, 95% dos clientes são empresas japonesas. Inclusive, acabo de voltar de uma viagem a trabalho, na qual, com meus pares aqui do escritório, fizemos visita a clientes japoneses.

Qual é sua área de atuação na Saeki? Trabalho na área de contratos e propriedade intelectual. Propriedade intelectual no Brasil é uma área relativamente nova. É relacionada a marcas e patentes.

Você pretende continuar estudando? Sim, pretendo fazer doutorado, mas hoje eu quero me dedicar mais ao trabalho, até para criar certo amadurecimento.

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Eu acho que experiência de trabalho é importante para começar o doutorado.

O que você planeja para o futuro? Hoje eu acho que realmente me encontrei na carreira. No começo, logo que me formei, tinha muitas dúvidas entre a carreira pública e a privada. Vejo que estou na área que gosto, relacionada ao Japão, e pretendo me especializar cada vez mais nessa área.

Como está o mercado para o advogado? Quando o país está vivendo um bom momento você tem muito trabalho, principalmente na minha área de contratos. Hoje a crise atinge todas as áreas, mas o advogado tem essa vantagem, mesmo numa época de crise ele é necessário numa empresa. Para fazer uma reestruturação na empresa, planejamento tributário. Você precisa de um advogado para se amoldar à realidade. Até no caso extremo de uma liquidação, uma falência, você precisa de advogado. O advogado sempre tem trabalho.

O que você acha que é importante para o advogado, que pode diferenciar um profissional do outro? O diploma é um cartão de visitas, abre as portas quando você vai fazer uma entrevista. Muitas vezes, as pessoas chamam você por causa da faculdade. Mas para crescer na carreira você precisa de mais do que isso. Acho que hoje é muito importante uma segunda língua, uma terceira língua. Na minha área, por exemplo, você tem contatos com empresas de outros países. E é uma coisa cotidiana.

Qual é o melhor perfil para exercer a advocacia? O Direito é uma área tão ampla que aceita uma gama muito grande de qualificações.

Que recordações você guarda da época do Colégio? O Etapa foi muito importante na minha formação. Devo muito ao estudo, à estrutura, ao apoio que tive durante os três anos que estive aí. E lembro muito dos amigos. As amizades que você faz no colégio influenciam muito na vida. Foi uma fase muito legal, principalmente porque foi numa época em que a gente está estudando para o vestibular, uma fase complicada em nossa vida, de muitas dúvidas. Ter amigos como os que tive no colégio me ajudou bastante.

Alguma matéria do Colégio tem ajudado particularmente no dia a dia? Matemática, não tem como fugir. Em Direito Tributário, Contabilidade, você precisa ter uma base maior nessa área.

O que você pode dizer a quem vai prestar Direito este ano? É uma das carreiras mais concorridas da Fuvest, mas se é o que você busca, se você acredita que é o que vai lhe dar satisfação profissional, tem que persistir.


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CONTO

A cozinheira Artur Azevedo I

A

raújo entrou em casa alegre como passarinho. Atravessou o corredor cantarolando a Mascote, penetrou na sala de jantar, e atirou para cima do aparador de vieux-chêne um grande embrulho quadrado; mas, de repente, deixou de cantarolar e ficou muito sério: a mesa não estava posta! Consultou o relógio: era cinco e meia. – Então que é isto? São estas horas e a mesa ainda neste estado! – Maricas! Maricas entrou, arrastando lentamente uma elegante bata de seda. Araújo deu-lhe o beijo conjugal, que há três anos estalava todo dia à mesma hora, invariavelmente – e interpelou-a: – Então, o jantar. – Pois sim, espera por ele! – Alguma novidade? – A Josefa tomou um pileque onça, e foi-se embora sem ao menos deitar as panelas no fogo! Araújo caiu aniquilado na cadeira de balanço. Já tardava! A Josefa servia-os há dois meses, e as outras cozinheiras não tinham lá parado nem oito dias! – Diabo! dizia ele irritadíssimo; diabo! E lembrava-se da terrível estopada que o esperava no dia seguinte: agarrar no Jornal do Comércio, meter-se num tílburi, e subir cinquenta escadas à procura de uma cozinheira! Ainda da última vez tinha sido um verdadeiro inferno! – Papapá! – Quem bate! – Foi aqui que anunciaram uma cozinheira? – Foi, mas já está alugada. – Repetiu-se esta cena um ror de vezes! – Vai a uma agência, aconselhou Maricas. – Ora muito obrigado! – bem sabes o que temos sofrido com as tais agências. Não há nada pior. E enquanto Araújo, muito contrariado, agitava nervosamente a ponta do pé e dava pequenos estalidos de língua, Maricas abria o embrulho que ele ao entrar deixara sobre o aparador... – Oh! como é lindo! exclamou extasiada diante de um magnífico chapéu de palha, com muitas fitas e muitas flores. Há de me ficar muito bem. Decididamente és um homem de gosto! E, sentando-se no colo de Araújo, agradecia-lhe com beijos e carícias o inesperado mimo. Ele deixava-se beijar friamente, repetindo sempre: – Diabo! diabo!... – Não te amofines assim por causa de uma cozinheira. – Dizes isso porque não és tu que vais correr a via sacra à procura de outra. – Se queres, irei; não me custa. – Não! Deus me livre de dar-te essa maçada. Irei eu mesmo.

Ergueram-se ambos. Ele parecia agora mais resignado, e disse: – Ora, adeus! Vamos jantar num hotel! – Apoiado! Em qual há de ser? – No Daury. É o que está mais perto. Ir agora à cidade seria uma grande maçada. – Está dito: vamos ao Daury. – Vai te vestir.

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Às oito horas da noite Araújo e Maricas voltaram do Daury perfeitamente jantados e puseram-se à fresca. Ela mandou iluminar a sala, e foi para o piano assassinar miseravelmente a marcha da Aída; ele, deitado num soberbo divã estofado, saboreando o seu Rondueles, contemplava uma finíssima gravura de Goupil, que enfeitava a parede fronteira, e lembrava-se do dinheirão que gastara para mobiliar a ornar aquele bonito chalé da rua do Matoso. Às dez horas recolheram-se ambos. Largo e sun­tuoso leito de jacarandá e pau-rosa, sob um dossel de seda, entre cortinas de rendas, oferecia-lhes o inefável conchego das suas colchas adamascadas. À primeira pancada da meia-noite, Araújo ergue-se de um salto, obedecendo a um movimento instintivo. Vestiu-se, pôs o chapéu, deu um beijo de despedida em Maricas, que dormia profundamente, e saiu de casa com mil cuidados para não despertá-la. A uns cinquenta passos de distância, dissimulado na sombra, estava um homem cujo vulto se aproximou à medida que o dono da casa se afastava... Quando o som dos passos de Araújo se perdeu de todo no silêncio e ele desapareceu na escuridão da noite, o outro tirou uma chave do bolso, abriu a porta do chalé, e entrou... Na ocasião em que se voltava para fechar a porta, a luz do lampião fronteiro bateu-lhe em cheio no rosto; se alguém houvesse defronte, veria no misterioso noctívago um formoso rapaz de vinte anos. Entretanto, Araújo desceu a rua Matriz e Barros, subiu a de São Cristóvão, e um quarto de hora depois entrava numa casinha de aparência pobre. II Dormiam as crianças, mas dona Ernestina de Araújo ainda estava acordada. O esposo deu-lhe o beijo convencional, um beijo apressado, que tinha uma tradição de quinze anos, e começou a despir-se para deitar-se. Araújo levava grande parte da vida a mudar de roupa. – Venho achar-te acordada: isso é novidade! – É novidade, é. A Jacinta deu-lhe hoje para embebedar-se, e saiu sem aprontar o jantar. Fiquei em casa sozinha com as crianças.


CONTO – Oh, senhor! é sina minha andar atrás de cozinheiras! – Não te aflijas: eu mesma irei amanhã procurar outra. – Naturalmente, pois se não fores, nem eu, que não estou para maçadas! Depois que o marido se deitou, dona Ernestina, timidamente: – E o meu chapéu? perguntou; compraste-o? – Que chapéu? – O chapéu que te pedi. – Ah? já não me lembrava... Daqui a uns dias... Ando muito arrebentado... – É que o outro já está tão velho... – Vai-te arranjando com ele, e tem paciência... Depois, depois... – Bom... quando puderes. E adormeceram. Logo pela manhã a pobre senhora pôs o seu chapéu velho e saiu por um lado, enquanto o seu marido saía por outro, ambos à procura de cozinheira. Os pequenos ficaram na escola. Os rendimentos de Araújo davam-lhe para sustentar aquelas duas casas. Ele almoçava com a mulher e jantava com a amante. Ficava até a meia-noite em casa desta, e entrava de madrugada no lar doméstico. A amante vivia num bonito chalé, a família morava numa velha casinha arruinada e suja. Na casa da mão esquerda havia o luxo, o conforto, o bem-estar; na casa da mão direita reinava a mais severa economia. Ali os guardanapos eram de linho; aqui os lençóis de algodão. Na rua do Matoso havia sempre o supérfluo; na rua de São Cristóvão muitas vezes faltava o necessário. Araújo prontamente arranjou cozinheira para a rua do Matoso, e à meia-noite encontrou a esposa muito satisfeita:

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– Queres saber, Araújo? Dei no vinte! Achei uma excelente cozinheira! – Sério? – Que jantar esplêndido! Há muito tempo não comia tão bem! Esta não me sai mais de casa. Pela manhã, a nova cozinheira veio trazer o café para o patrão, que se achava ainda recolhido, lendo a Gazeta. A senhora estava no banho; os meninos tinham ido para a escola. – Eh! eh! meu amo, é vosmecê que é dono da casa? Araújo levantou os olhos; era a Josefa, a cozinheira que tinha estado em casa de Maricas! – Cala-te, diabo! Não digas que me conheces! – Sim, sinhô. – Com que então tomaste anteontem um pileque onça e nos deixaste sem jantar, hein? – Mentira sé, meu amo; Josefa nunca tomou pileque. Minha ama foi que me botou pra fora! – Oras essa! Por quê? – Ela me xingou pro via das compra, e eu ameacei ela de dizê tudo a vosmecê. – Tudo, o que? – A história do estudante que entra em casa à meia-noite quando vosmecê sai. – Cala-te! disse vivamente Araújo, ouvindo os passos de dona Ernestina, que voltava do banho. O nosso herói prontamente se convenceu que a Josefa lhe havia dito a verdade. Em poucos dias desembaraçou-se da amante, deu melhor casa à mulher e aos filhos, começou a jantar em família, e hoje não sai à noite sem dona Ernestina. Tomou juízo e vergonha. Extraído de: www.dominiopublico.com.br.

ARTIGO

Pontas de pedra lascada levantam questões sobre a pré-história brasileira Peter Moon

O

roteiro consensual da história do povoamento das Américas diz que os primeiros paleoíndios vindos da Ásia cruzaram o estreito de Bering no fim da Idade do Gelo, há mais de 13 mil anos. Nos milênios seguintes, as tribos paleoíndias se espalharam pela América no Norte e, em seguida, pela América do Sul. O estudo de pontas de projéteis em pedra lascada está intimamente ligado à origem das pesquisas sobre o povoamento das Américas.

Tudo começou em 1929, quando pontas de pedra de 13 500 anos foram achadas perto da cidade de Clovis, no Novo México, Estados Unidos. Por mais de meio século, aquelas pontas longilíneas foram brandidas pela arqueologia norte-americana como provas de que a chamada cultura Clovis seria a mais antiga do hemisfério – apesar de indícios crescentes vindos da América do Sul de que aquele não seria o caso.


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ARTIGO

Como ficou constatado nos últimos 20 anos, sítios pré-históricos sul-americanos como Monte Verde, no Chile; El Abra, na Colômbia; Piedra Museo, na Argentina; ou Taima-taima, na Venezuela, foram contemporâneos de Clovis – se não mais antigos. Foram ocupados desde fins do Período Pleistoceno por paleoíndios. Outrossim, as pontas lascadas achadas nestes sítios sul-americanos não só são muito diferentes das de Clovis como são também muito diversas entre si. Quanto tempo foi necessário para que tribos vindas do Norte pudessem se espraiar pela América do Sul ao ponto de as pontas de suas armas se diferenciarem tanto? Essa resposta ainda não existe. Dois estudos recém-publicados sobre as pontas de pedra brasileiras levantam novas dúvidas sobre a diversidade e a antiguidade daqueles instrumentos e das culturas que os produziram. O primeiro estudo sistemático das pontas de pedra no estilo rabo de peixe achadas no Brasil tem coautoria da arqueóloga Mercedes Okumura, do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da Universidade de São Paulo (USP), pesquisadora responsável pelo projeto “Métodos estatísticos aplicados à questão da caracterização de indústrias líticas paleoíndias: estudos de caso no Sudeste e Sul do Brasil”, apoiado pela FAPESP. Okumura, atualmente, está no Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Já o segundo estudo, “A ocupação paleoíndia no estado de São Paulo: uma abordagem geoarqueológica II”, também apoiado pela FAPESP, busca entender a distribuição e o uso das pontas de projéteis em pedras achadas no Sul do Brasil. A autoria é de Okumura e do arqueólogo Astolfo Araujo, do MAE/USP.

Datações diversas As pontas rabo de peixe, que como o próprio nome indica têm este formato, são muito comuns na Argentina e no Uruguai. “No Brasil, os registros são esporádicos. Fizemos uma varredura nos acervos de museus e coleções particulares e reunimos 32 pontas, a maioria do Sul e Sudeste do país, mas também do Mato Grosso e de Goiás. Achamos até duas pontas coletadas na Bahia e no Amazonas,” diz Okumura. “Até pouco tempo era consenso de que as pontas rabo de peixe eram típicas do Uruguai e da Argentina. Hoje se sabe que elas também ocorrem, embora em menor número, no Brasil e em pontos tão ao norte quanto Venezuela e Guiana.” As pontas rabo de peixe aqui do Cone Sul são muito diferentes tanto das pontas de pedra de Monte Verde, no sul do Chile, quanto daquelas da Colômbia e Venezuela, “embora estes sítios sejam todos contemporâneos”, revela Okumura. As pontas sul-americanas igualmente em nada lembram as pontas norte-americanas. É mais um indício

que exclui a hipótese americana da ancestralidade de Clovis com relação às culturas paleoíndias. “O que isso significa?”, questiona-se Okumura. “Será que a diversidade de todas estas pontas não poderia indicar uma antiguidade maior do povoamento da América do Sul?”. Na Argentina, as pontas rabo de peixe têm datações que variam entre 12 900 e 12 300 anos. No Brasil ainda não há datas, ou porque as pontas coletadas foram encontradas na superfície, ou porque simplesmente não se conseguiu datar. As datações em Monte Verde apontam para 13 500 anos, mas já se sabe que aquele sítio era ocupado há pelo menos 18 000 anos. No Brasil, os sítios arqueológicos com datação mais antiga são Santa Elina, no Mato Grosso, com 25 mil anos, e Pedra Furada, no Piauí, com 32 mil – mas ambos os resultados estão longe de serem aceitos consensualmente pela academia. “O mais interessante do nosso artigo é poder apresentar pela primeira vez todo esse material”, diz Okumura. “É um convite aos demais pesquisadores para que comecem a prestar atenção nestas pontas que são encontradas em locais tão distantes quanto o Sul, o Nordeste e a Amazônia. O que isso pode significar em termos de ocupação do território, de migrações, de sistemas de troca?” Um próximo passo da pesquisa será o estudo da origem das rochas usadas nas pontas, a maioria feita de silexito, basalto ou lamito. Outra futura direção é procurar saber de que modo as pontas eram utilizadas: se em lanças, flechas, projéteis ou facas. “As mais compridas e afiadas podem ter sido usadas como dardos ou lanças”, diz Okumura. Com o uso frequente e progressivo desgaste ou quebra, as pontas eram relascadas e reutilizadas em outras funções. “Há pontas que, de tanto ser relascadas, perderam totalmente o formato original e se tornaram toquinhos, que chamamos de raspadores. Nosso estudo suscita muito mais perguntas do que fornece respostas. Infelizmente, esse é o preço do pioneirismo,” diz a arqueóloga.

Tradição Umbu O segundo trabalho faz um levantamento dos projéteis pertencentes à chamada tradição Umbu, “que leva este nome por causa de uma localidade no Rio Grande do Sul onde foram encontrados, nos anos 1970”, explica Araujo. Trata-se do primeiro trabalho sistemático feito com esses materiais brasileiros e que procura entender a sua função e o seu uso. Só foram estudados projéteis oriundos de sítios arqueológicos com datações precisas, todos no Sul do País. “Em todo o Brasil, há somente oito sítios arqueológicos com datações aceitáveis e com um bom número de pontas”, explica Okumura. Os 463 projéteis investigados têm datações que vão desde o início do Holoceno, há 11 mil anos, passando


ARTIGO pelo Holoceno médio, há cerca de 5 mil, até chegar ao Holoceno recente, há apenas 600 anos. O estudo da função dos projéteis indicou que uma porção muito pequena era empregada como flechas. A esmagadora maioria eram dardos de arremesso. “O porquê desta predileção dos povos da tradição Umbu por dardos de arremesso nós não sabemos”, diz Araujo. O que mais chamou a atenção dos pesquisadores foi a relação entre o tamanho das pontas e a sua antiguidade. “Nós tínhamos a expectativa de detectar no estudo o mesmo padrão encontrado na América do Norte, ou seja, quanto mais antigos os sítios arqueológicos, maiores seriam os projéteis, e quão mais recentes, menores”, explica Okumura. Isso tem a ver com o surgimento da tecnologia de arco e flecha na metade do Holoceno e o padrão de substituição dessa tecnologia ao longo do tempo. “Mas o padrão que detectamos foi exatamente o inverso. O que

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se vê são pontas de dardos grandes ocorrendo em toda a amostra e pontas pequenas no sítio mais antigo, de quase 11 mil anos.” Para tentar elucidar a questão, é preciso encontrar novos projéteis em escavações e com boa datação. Uma outra linha de pesquisa seria entender a morfologia dos projéteis, os estudos dos materiais empregados, a análise do seu desgaste e de suas fraturas. “O trabalho foi feito para chamar a atenção para esses projéteis em termos de sua função, de seu uso na Pré-História”, afirma Okumura. “Assim como se deve começar a prestar atenção nas pontas rabo de peixe, nós também apontamos para a necessidade de os arqueólogos começarem a pensar na função dos projéteis da tradição Umbu.” Extraído de: Agência FAPESP – Divulgando a cultura científica, jan./2016.

(ENTRE PARÊNTESIS)

Caiu na Fuvest Cada um dos cartões apresentados tem de um lado um número e do outro uma letra. Alguém afirmou que todos que têm uma vogal numa face têm um número par na outra. Para verificar isso, é suficiente virar todos os cartões? É necessário virar quantos e quais cartões?

A

B

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RESPOSTA A afirmação será falsa somente se houver algum cartão com número ímpar e letra vogal. Caso contrário, será verdadeira. Para verificarmos isso, é, obviamente, suficiente virar todos os cartões, embora não seja necessário. É necessário virar apenas dois cartões: o cartão “A” (verificando se é par ou ímpar o número do verso) e o cartão “3” (verificando se a letra do lado oposto é consoante ou vogal).

ESPECIAL

Alunos conferem resultado da Fuvest no Etapa Primeira chamada da USP e Santa Casa foi divulgada

A

nsiedade e expectativa. São esses os sentimentos que dominaram os vestibulandos no dia 2 de fevereiro às 10 h na quadra do Colégio Etapa. Após um ano inteiro de esforço, dedicação e muitas horas diárias de estudo, chegou o momento em que todo empenho foi recompensado. A Fuvest divulgou a lista de aprovados na primeira chamada do vestibular 2016. Apesar da lista de aprovados estar disponível no site da Fuvest, os estudantes do colégio e do curso foram

convidados a conferirem o resultado conosco. Muitos começaram a chegar a partir das 8 h ao Etapa. Entre eles estava Debora Narumi, que prestou vestibular para o curso de Medicina. Em 2015, ela passou na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mas optou por estudar mais um ano porque o sonho sempre foi estudar na Universidade de São Paulo (USP). “O cursinho é um teste de resistência para o que virá na faculdade. Ele exigiu muito de mim, mas se não fosse por isso, hoje eu não estaria na lista dos aprovados”,


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ESPECIAL

comemorou a jovem. Essa tradição de ver a lista no Etapa é cultivada desde 1978 e, desde então, centenas de alunos vão até o cursinho conferir a lista e fazer festa com seus colegas e professores. Além de o Etapa participar da comemoração dos apro­ vados – e apoiar os estudantes que não estavam com o nome na lista –, as atléticas de algumas faculdades da USP (como a Poli, a Medicina e a São Francisco) também marcaram presença. Eles animaram o evento e recepcionaram os novos bichos. Entre eles estavam os ex-alunos do Colégio Etapa Lucki Li, César Takose, Guilherme Setani e Guilherme Watanabe. Com os rostos pintados e os cabelos amarelos devido uma aposta para ver quem passaria na Fuvest, os amigos prometeram raspar a cabeça juntos assim que saísse o resultado da Escola Politécnica da USP. Depois da

tani, ), Guilherme Se para a direita na da am er ar qu ss es pa a a, (d cki Li do Colégio Etap , se Os amigos Lu ko Ta r sa anabe e Cé Guilherme Wat nica da USP. éc lit Po la co Es

Wellington Vidigal de Araújo foi aprovado em Medicina na USP e, no mesmo dia, também ganhou um Xbox One no sorteio do Etapa.

Jornal do Colégio

comemoração, o próximo passo era raspar a cabeça a fim de pagar a aposta. Também participaram do evento pais e amigos dos alunos. Afinal, é um momento para os futuros universitários compartilharem com os familiares e amigos. Para come­ morar a aprovação em Medicina na USP, Wellington Vidigal de Araújo trouxe o pai, Marcelo Araújo. Emocionado, ele recordou a trajetória do filho ao longo de três anos de estudos: “No primeiro ano que ele tentou e não conseguiu, achei que iria desistir, mas ele respondeu que só existia um tipo de pessoa que não era capaz de passar na USP: aqueles que desistem. Eu não poderia estar mais orgulhoso”. Para completar a festa, o jovem ganhou um videogame Xbox One no sorteio realizado pelo Etapa aos alunos. Além disso, outros estudantes também foram premiados com IPhone 6, Galaxy S6, IPad e IPod Shuffle.

Após muito es forço, dedicaçã o e horas diár Etapa, enfim, ias de estudo comemoram a , os alunos do aprovação na Fuvest.

ora Giovana Ueda comem

cia Bioquímica.

a aprovação em Farmá

Jornal do Colégio ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343


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