Jornal do Colégio Nº580

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Jornal do Colégio SEGUNDA QUINZENA DE OUTUBRO DE 2014 – NÚMERO 580

ENTREVISTA

Nas duas primeiras provas ele conseguiu “um estrondoso zero”. A história de sucessos que marca a trajetória acadêmica e profissional de Victor Martins Maimone tem no início um zero em duas provas ao entrar no Colégio Etapa. Ele, que foi aprovado direto para o curso de Direito da São Francisco, onde se formou, voltou a prestar Fuvest e hoje está concluindo o curso de Economia na FEA. Nas duas áreas de formação – Direito e Economia – passou por muitos estágios. Nos seus planos estão a pós-graduação e uma carreira como consultor.

Victor Martins Maimone

JC – Como foi a escolha da carreira? Victor – Eu escolhi Direito porque me dava um leque muito maior de opções no futuro. Não necessariamente eu precisaria advogar, poderia trabalhar em áreas diversas. A escolha aconteceu em definitivo no 3o ano.

Em 2004, ao concluir o Ensino Médio, você prestou algum outro vestibular além da Fuvest? Não, meu foco era estudar na USP.

Como conheceu o colégio? Conheci através de um grande amigo de infância, dois anos mais velho do que eu. Ele veio estudar no Etapa no colegial, recomendou, falou inclusive que seria bom que eu entrasse um ano antes. Entrei na 8a série.

“Como, não tem prova? Não tenho o que fazer à tarde, vou ficar aqui sentado, conhecendo pessoas?”. Era essa mais ou menos a realidade.

Nesse início de curso você chegou a ter alguma dúvida sobre a carreira que escolheu? Na São Francisco você vê pessoas que não têm nenhuma dúvida e pessoas que questionam. Eu estava no meio-termo. Existiam sinais de que eu tinha interesse por outra área: minha matéria preferida no 1o ano era Fundamentos de Economia. No 2o ano era Direito Empresarial. Mas adiei a decisão.

Hoje você está na Economia da USP. Quando se forma? Vou me formar na FEA no ano que vem, depois de 10 longos anos de USP.

Como foi sua adaptação ao colégio?

Você faz o curso à noite?

A minha adaptação foi até engraçada. Até então eu não tinha Biologia, Física e Química como matérias separadas. Minha primeira prova de Química foi um estrondoso zero. A minha primeira prova de Matemática foi outro. Aí comecei a entrar na realidade. Tirando esses dois episódios, me adaptei muito bem.

Faço.

E seu início na São Francisco? Foi outro choque. Estava acostumado com o Etapa, em que você está constantemente se preparando. Quando entrei na faculdade era como se tirasse um pouco o pé do acelerador: ENTREVISTA

Carreira – Direito/Economia

Você vê Economia como complemento de sua graduação em Direito? Você pode argumentar tanto que sim como que não. Depende de como você usa. Na minha turma, estudando Economia, entraram pessoas formadas em Direito, formadas em Física. Eu trago para o mundo de Economia muito de capacidade argumentativa, de análise de relações de poder, que você vê a fundo no Direito e não tão profundamente na Economia. Eu consigo fazer as coisas se complementarem.

ENTRE PARÊNTESIS

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Os mágicos

ESPECIAL

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Canguru de Matemática

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CONTO

Vestida de preto – Mário de Andrade

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ENTREVISTA

Na São Francisco, o que você estudou em cada ano? o

Como se preparou para seu vestibular da FEA?

No 1 ano o foco é muito em Direito Privado. A gente via Fundamentos do Direito Civil, Direito Romano, Teoria Geral do Estado. No 2o ano as coisas ficaram mais técnicas. Entraram Processos, Direito Penal, Direito Empresarial. No 3o, 4o ano, Processo Penal, Direito Tributário. Na minha época, no 5o ano você podia definir sua grade, escolhia as matérias que ia cursar. Podia escolher Direito Civil, Direito Penal, Direito Empresarial ou podia fazer área livre. Eu escolhi Direito Penal. Minha monografia é em Direito Penal, estudei os efeitos de lesão corporal no esporte.

Eu procurei acompanhar o calendário do cursinho. A partir de maio peguei meu material do Etapa e comecei a me preparar, fui fazendo exercícios, baixando provas na Internet. Toda noite eu estudava, como se estivesse no curso. Algumas coisas com as quais eu não tinha contato, Biologia, Química, Física, tive de estudar mais. Mas coisas que eu via todo dia, Português, Matemática, História, Geografia, acabaram voltando mais rápido. Era inevitável lembrar das coisas do colégio. Deu para fazer as provas da Fuvest muito tranquilo.

Você começou a estagiar em que ano?

Como foi sua adaptação na FEA?

Meu primeiro estágio foi em 2006, no segundo semestre do 2o ano da faculdade, em um escritório que trabalhava basicamente com Direito Empresarial e Societário.

Lembrou um pouco minha adaptação no colégio. Tive de correr atrás, me dedicar. Exigiu uma dedicação bem parecida com a do colégio, chegar em casa e estudar, fazer exercício. Na verdade, comecei na FEA já sentindo que o curso ia me exigir muito mais dedicação do que antes. Para poder estudar eu me desliguei da Deloitte, e no segundo semestre de 2011 só fiz a FEA. Em 2012 eu só estudei também, para conseguir de fato aprender o que estava sendo ensinado.

Como foi esse estágio? Aprendi bastante em seis meses de estágio. Tive um panorama geral do que era Direito Societário, que é basicamente como se comporta uma empresa, que tipos de mecanismos fazem com que a empresa ande ou não, quem toma as decisões, por quê.

E depois, fez outros estágios? No meu 3o ano comecei a fazer estágio em Direito Penal, num escritório pequeno. Ia ao fórum criminal. A principal coisa que essa experiência me trouxe foi o respeito ao processo de julgamento. Por mais que tudo indique que a pessoa é culpada, ela tem direito a um julgamento justo. Essa foi a primeira coisa que aprendi. Mais para frente, no início do 4o ano, fui estagiar no escritório Joyce Roysen Advogados. Continuei no Direito Penal, mas Direito Penal empresarial, basicamente crimes de colarinho branco, desvio de dinheiro, evasão de impostos, coisas do gênero. Foi bem legal ter contato com duas áreas diferentes do mesmo ramo de Direito.

Ficou quanto tempo nesse estágio? Seis meses também. Para finalizar, em agosto de 2009, decidi que minha carreira precisava mudar. Meus estágios tinham sido muito construtivos, mas resolvi que não ia advogar e que iria para o mundo empresarial. Para isso precisava de uma porta de entrada, que foi justamente o Direito Tributário. Em meados de 2009 entrei como consultor tributário na Deloitte.

Você ainda não tinha concluído o curso de Direito? Concluí meu curso de Direito no final de 2009. E já engatei minha carreira como consultor tributário. Na virada de 2010 consegui me dedicar, me destacar, tive uma promoção diferenciada, foi bem bacana. E, no final de 2010, prestei Fuvest e entrei na FEA, no curso de Economia.

Você acha que poderia ter entrado direto na FEA, em vez de fazer Direito? Ou ter feito a São Francisco antes foi importante para você ter a visão que tem hoje? Amadureci muito durante meus anos na São Francisco e sem dúvida o meu aproveitamento na Economia hoje tem tudo a ver com esse amadurecimento.

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E depois, voltou a procurar estágio? No final de 2012 eu consegui passar no programa de trainee da Ambev, mais de 77 mil inscritos, 50 vagas. Um processo de seleção bastante exigente. Ter passado foi sensacional. Em 2013 tranquei a FEA e fiquei como trainee da Ambev o ano inteiro.

Por que você trancou o curso na FEA? Para ser trainee da Ambev precisava ter mobilidade. Nos dois primeiros meses do ano a gente teve treinamento corporativo em São Paulo e depois fui alocado em Curitiba, para trabalhar 2013 inteiro.

O que você fazia em Curitiba? O programa de trainee da Ambev é muito bacana. Você precisa toda hora fazer alguma coisa, nada fica para depois, nada fica para os outros. É você fazendo sua parte, entregando seu resultado. Fui direto para a área de vendas. Tinha contato com o dia a dia do vendedor que ia ao bar, via o estoque, negociava preço direto com o dono do bar. Eu tinha experiência em escritório de advocacia, consultoria tributária, todo mundo de terno, todo mundo bonitinho. De repente você vai para a rua, em cima da moto, suando, querendo vender um pouco mais para bater sua meta. É outro mundo.

Mas depois desse tempo em Curitiba você voltou para a FEA. Como foi esse processo de mudança? Fazia parte do plano de carreira na Ambev assumir determinadas áreas comerciais. Para o meu plano de carreira a próxima área comercial seria também no Paraná. Ficaria lá o ano de 2014. Profissionalmente seria sensacional. O ruim é que eu não tinha me formado na FEA. Falei: “Preciso abraçar de novo a decisão que eu tomei lá atrás, de fazer Economia.”

Aí você deixou a Ambev? Foi uma das coisas mais difíceis que já fiz, sair da Ambev, sair de uma coisa pela qual eu tinha lutado bastante, para retomar

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ENTREVISTA

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essa outra coisa pela qual eu também tinha lutado, que era o curso de Economia. No final de 2013 eu saí da Ambev e voltei para a FEA.

junto com Econometria. O campo da Microeconomia basicamente analisa interações entre pessoas e empresas. Gosto muito de estudar essa interação entre agentes.

Fale sobre seu curso de Economia na FEA. Como ele se desenvolve?

Como você conseguiu a vaga na Roland Berger?

A FEA apresenta um curso muito completo e bem dividido em termos de matérias. O 1o ano de Economia é básico, dá as ferramentas para o aluno conseguir levar o curso. Tem Introdução à Economia, começa a ter contato com teorias econômicas, modelos econômicos. A gente recebe uma base muito forte em Matemática, tem Cálculo 1 e 2 para poder ter Estatística 1 e 2 posteriormente. E complementa o 1o ano com Contabilidade. No 2o ano começam matérias que realmente formam o economista: Microeconomia e Macroeconomia. São as principais matérias do 2o ano e junto com Estatística formam o tripé do curso. No 3o ano, já com uma boa base de Teoria Microeconômica e Teoria Macroeconômica, você vai aprender a mexer com isso. Eles pegam todo o conteúdo de Estatística e ensinam como mexer com teoria usando dados – numa matéria chamada Econometria, que é dada em três semestres e acaba só no 4o ano. No 4o ano você pega matérias optativas que vão complementar as duas grandes teorias que você teve. Você pode pegar, por exemplo, Teoria dos Jogos. O 4o ano você monta, faz o ajuste fino do tipo de carreira que quer.

Você pretende entrar em outra empresa antes de se formar, fazer novo estágio? Em janeiro eu vou começar um estágio numa consultoria estratégica, a Roland Berger. Volto para o mundo da consultoria com outro enfoque, que basicamente é aquilo que gosto de fazer: produzir conhecimento, estudar, entender as coisas que estão acontecendo, propor soluções, propor pensamentos alternativos. É justamente o que me faz pensar que depois de terminar o curso na FEA eu devo partir para uma pós-graduação.

Você pensa em fazer a pós-graduação onde? Eu gostaria que a minha pós-graduação fosse fora do Brasil. Acho que a USP me deu uma bagagem acadêmica muito forte, muita sólida para que eu consiga pleitear uma vaga numa universidade top do mundo. Nos Estados Unidos ou na Europa.

Quando você pretende começar a pós-graduação? No máximo um ano depois de me formar. Ficar muito tempo longe da faculdade, entre a graduação e a pós, pode ser prejudicial. Quero voltar o quanto antes.

Você tem ideia da área? Meu interesse por Economia, em termos de pesquisa e produção acadêmica, é mais para o campo da Microeconomia,

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Eles fazem o processo seletivo no primeiro semestre para o ano seguinte. Um processo muito exigente. Como a consultoria exige um conhecimento maior do que uma empresa normal de mercado, o foco do processo seletivo é mais técnico do que em outros processos.

A formação em Direito e Economia está adequada para suas atividades profissionais? O que a faculdade de Direito me deu e uso muito hoje é a capacidade de argumentação, capacidade analítica, capacidade de convencimento. São habilidades pessoais que eu ganhei na São Francisco. Economia, por outro lado, me dá a formação técnica que eu uso no meu dia a dia. Nos processos seletivos das consultorias eu usei claramente conceitos de Contabilidade, Economia e Administração que a FEA me deu.

Voltando ao colégio, que lembranças você tem dessa época? As principais lembranças são os professores e os colegas. Os professores foram marcantes – lembro das aulas deles até hoje.

Qual foi a importância desse período na sua vida? Acho que o Etapa me preparou para o mundo real, me ensinou a ter foco, que as coisas precisam ser feitas por você. Todo o contexto que o Etapa me deu, de poder fazer as coisas, ir atrás das coisas, eu usei muito na Ambev. E para entrar nas consultorias usei muita Trigonometria. Nessas seleções cai muita Matemática, muita coisa que a gente aprende no colégio, nem tanto na faculdade.

Que dicas você dá a quem vai prestar vestibular no fim deste ano? Diria para encarar o vestibular como uma maratona. O vestibular não é um tiro de 100 metros. Não é: “Hoje estudei 8 horas, beleza, amanhã vou dormir o dia inteiro”. Não é assim que funciona. A preparação para o vestibular tem que ser uma coisa constante. Se você conseguir manter o foco, superar os tropeços, sejam grandes ou pequenos, o resultado é a aprovação.

O que mais você quer dizer para os nossos alunos? Minha mensagem é: aproveitem a estrutura que o Etapa dá. Com o tempo tive contatos com outras realidades e pude perceber que a estrutura do Etapa é sem igual. Aproveitem a estrutura do colégio, pois vai fazer uma diferença incrível tanto no vestibular quanto mais para frente.

Jornal do Colégio ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343

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CONTO

Vestida de preto Mário de Andrade anto andam agora preocupados em definir o conto que não sei bem si o que vou contar é conto ou não, sei que é verdade. Minha impressão é que tenho amado sempre... Depois do amor grande por mim que brotou aos três anos e durou até os cinco mais ou menos, logo o meu amor se dirigiu para uma espécie de prima longínqua que frequentava a nossa casa. Como se vê, jamais sofri do complexo de Édipo, graças a Deus. Toda a minha vida, mamãe e eu fomos muito bons amigos, sem nada de amores perigosos. Maria foi o meu primeiro amor. Não havia nada entre nós, está claro, ela como eu nos seus cinco anos apenas, mas não sei que divina melancolia nos tomava, si acaso nos achávamos juntos e sozinhos. A voz baixava de tom, e principalmente as palavras é que se tornavam mais raras, muito simples. Uma ternura imensa, firme e reconhecida, não exigindo nenhum gesto. Aquilo aliás durava pouco, porque logo a criançada chegava. Mas tínhamos então uma raiva impensada dos manos e dos primos, sempre exteriorizada em palavras ou modos de irritação. Amor apenas sensível naquele instinto de estarmos sós. E só mais tarde, já pelos nove ou dez anos, é que lhe dei nosso único beijo, foi maravilhoso. Si a criançada estava toda junta naquela casa sem jardim da Tia Velha, era fatal brincarmos de família, porque assim Tia Velha evitava correrias e estragos. Brinquedo aliás que nos interessava muito, apesar da idade já avançada para ele. Mas é que na casa de Tia Velha tinha muitos quartos, de forma que casávamos rápido, só de boca, sem nenhum daqueles cerimoniais de mentira que dantes nos interessavam tanto, e cada par fugia logo, indo viver no seu quarto. Os milhores interesses infantis do brinquedo, fazer comidinha, amamentar bonecas, pagar visitas, isso nós deixávamos com generosidade apressada para os menores. Íamos para os nossos quartos e ficávamos vivendo lá. O que os outros faziam, não sei. Eu, isto é, eu com Maria, não fazíamos nada. Eu adorava principalmente era ficar assim sozinho com ela, sabendo várias safadezas já mas sem tentar nenhuma. Havia, não havia não, mas sempre como que havia um perigo iminente que ajuntava o seu crime à intimidade daquela solidão. Era suavíssimo e assustador. Maria fez uns gestos, disse algumas palavras. Era o aniversário de alguém, não lembro mais, o quarto em que estávamos fora convertido em dispensa, cômodas e armários cheinhos de pratos de doces para o chá que vinha logo. Mas quem se lembrasse de tocar naqueles doces, no geral secos, fáceis de disfarçar qualquer roubo! estávamos longe disso. O que nos deliciava era mesmo a grave solidão. Nisto os olhos de Maria caíram sobre o travesseiro sem fronha que estava sobre uma cesta de roupa suja a um

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canto. E a minha esposa teve uma invenção que eu também estava longe de não ter. Desde a entrada no quarto eu concentrara todos os meus instintos na existência daquele travesseiro, o travesseiro cresceu como um danado dentro de mim e virou crime. Crime não, “pecado” que é como se dizia naqueles tempos cristãos... E por causa disto eu conseguira não pensar até ali, no travesseiro. – Já é tarde, vamos dormir – Maria falou. Fiquei estarrecido, olhando com uns fabulosos olhos de imploração para o travesseiro quentinho, mas quem disse travesseiro ter piedade de mim. Maria, essa estava simples de mais para me olhar e surpreender os efeitos do convite: olhou em torno e afinal, vasculhando na cesta de roupa suja, tirou de lá uma toalha de banho muito quentinha que estendeu sobre o assoalho. Pôs o travesseiro no lugar da cabeceira, cerrou as venezianas da janela sobre a tarde, e depois deitou, arranjando o vestido pra não amassar. Mas eu é que nunca havia de pôr a cabeça naquele restico de travesseiro que ela deixou pra mim, me dando as costas. Restico sim, apesar do travesseiro ser grande. Mas imaginem numa cabeleira explodindo, os famosos cabelos assustados de Maria, citação obrigatória e orgulho de família. Tia Velha, muito ciumenta por causa duma neta preferida que ela imaginava deusa, era a única a pôr defeito nos cabelos de Maria. – Você não vem dormir também? – ela perguntou com fragor, interrompendo o meu silêncio trágico. – Já vou – que eu disse – estou conferindo a conta do armazém. Fui me aproximando incomparavelmente sem vontade, sentei no chão tomando cuidado em siquer tocar no vestido, puxa! também o vestido dela estava completamente assustado, que dificuldade! Pus a cara no travesseiro sem a menor intenção de. Mas os cabelos de Maria, assim era pior, tocavam de leve no meu nariz, eu podia espirrar, marido não espirra. Senti, pressenti que espirrar seria muito ridículo, havia de ser um espirrão enorme, os outros escutavam lá da sala de visita longínqua, e daí é que o nosso segredo se desvendava todinho. Fui afundando o rosto naquela cabeleira e veio a noite, sinão os cabelos (mas juro que eram cabelos macios) me machucavam os olhos. Depois que não vi nada, ficou fácil continuar enterrando a cara, a cara toda, a alma, a vida, naqueles cabelos, que maravilha! até que o meu nariz tocou num pescocinho roliço. Então fui empurrando os meus lábios, tinha uns bonitos lábios grossos, nem eram lábios, era beiço, minha boca foi ficando encanudada até que encontrou o pescocinho roliço. Será que ela dorme de verdade?... Me ajeitei muito sem-cerimônia, mulherzinha! e então beijei. Quem falou que este mundo é ruim! só

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CONTO recordar... Beijei Maria, rapazes! eu nem sabia beijar, está claro, só beijava mamãe, boca fazendo bulha, contacto sem nenhum calor sensual. Maria, só um leve entregar-se, uma levíssima inclinação pra trás me fez sentir que Maria estava comigo em nosso amor. Nada mais houve. Não, nada mais houve. Durasse aquilo uma noite grande, nada mais haveria porque é engraçado como a perfeição fixa a gente. O beijo me deixara completamente puro, sem minhas curiosidades nem desejos de mais nada, adeus pecado e adeus escuridão! Se fizera em meu cérebro uma enorme luz branca, meu ombro bem que doía no chão, mas a luz era violentamente branca, proibindo pensar, imaginar, agir. Beijando. Tia Velha, nunca eu gostei de Tia Velha, abriu a porta com um espanto barulhento. Percebi muito bem, pelos olhos dela, que o que estávamos fazendo era completamente feio. – Levantem!... Vou contar pra sua mãe, Juca! Mas eu, levantando com a lealdade mais cínica deste mundo! – Tia Velha me dá um doce? Tia Velha – eu sempre detestei Tia Velha, o tipo da bondade Berlitz, injusta, sem método – pois Tia Velha teve a malvadeza de escorrer por mim todo um olhar que só alguns anos mais tarde pude compreender inteiramente. Naquele instante, eu estava só pensando em disfarçar, fingindo uma inocência que poucos segundos antes era real. – Vamos! saiam do quarto! Fomos saindo muito mudos, numa bruta vergonha, acompanhados de Tia Velha e os pratos que ela viera buscar para a mesa de chá. O estranhíssimo é que principiou, nesse acordar à força provocado por Tia Velha, uma indiferença inexplicável de Maria por mim. Mais que indiferença, frieza viva, quase antipatia. Nesse mesmo chá inda achou jeito de me maltratar diante de todos, fiquei zonzo. Dez, treze, quatorze anos... Quinze anos. Foi então o insulto que julguei definitivo. Eu estava fazendo um ginásio sem gosto, muito arrastado, cheio de revoltas íntimas, detestava estudar! Só no desenho e nas composições de português tirava as milhores notas. Vivia nisso: dez nestas matérias, um, zero em todas as outras. E todos os anos era aquela já esperada fatalidade: uma, duas bombas (principalmente em matemáticas) que eu tomava apenas o cuidado de apagar nos exames de segunda época. Gostar, eu continuava gostando muito de Maria, cada vez mais, conscientemente agora. Mas tinha uma quase certeza que ela não podia gostar de mim, quem gostava de mim!... Minha mãe... Sim, mamãe gostava de mim, mas naquele tempo eu chegava a imaginar que era só por obrigação. Papai, esse foi sempre insuportável, incapaz duma carícia. Como incapaz de uma repreensão também. Nem mesmo comigo, a tara da família, ele jamais ralhou. Mas isto é caso pra outro dia. O certo é que, decidido

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em minha desesperada revolta contra o mundo que me rodeava, sentindo um orgulho de mim que jamais buscava esclarecer, tão absurdo o pressentia, o certo é que eu já principiava me aceitando por um caso perdido, que não adiantava milhorar. Esse ano até fora uma bomba só. Eu entrava na aula do professor particular, quando enxerguei a saparia na varanda e Maria entre os demais. Passei bastante encabulado, todos em férias, e os livros que eu trazia na mão me denunciando, lembrando a bomba, me achincalhando em minha imperfeição de caso perdido. Esbocei um gesto falsamente alegre de bom-dia, e fui no escritório pegado, esconder os livros na escrivaninha de meu pai. Ia já voltar para o meio de todos, mas Matilde, a peste, a implicante, a deusa estúpida que Tia Velha perdia com suas preferências: – Não caso com bombeado – ela respondeu imediato, numa voz tão feia, mas tão feia, que parei estarrecido. Era a decisão final, não tinha dúvida nenhuma. Maria não gostava mais de mim. Bobo de assim parado, sem fazer um gesto, mal podendo respirar. Aliás um caso recente vinha se ajuntar ao insulto pra decidir de minha sorte. Nós seríamos até pobretões, comparando com a família de Maria, gente que até viajava na Europa. Pois pouco antes, os pais tinham feito um papel bem indecente, se opondo ao casamento duma filha com um rapaz diz-que pobre mas ótimo. Houvera rompimento de amizade, mal-estar na parentagem toda, o caso virara escândalo mastigado e remastigado nos comentários de hora de jantar. Tudo por causa do dinheiro. Si eu insistisse em gostar de Maria, casar não casava mesmo, que a família dela não havia de me querer. Me passou pela cabeça comprar um bilhete de loteria. “Não caso com bombeado”... Fui abraçando os livros de mansinho, acariciei-os junto ao rosto, pousei a minha boca numa capa, suja de pó suado, retirei a boca sem desgosto, Naquele instante eu não sabia, hoje sei: era o segundo beijo que eu dava em Maria, último beijo, beijo de despedida, que o cheiro desagradável do papelão confirmou. Estava tudo acabado entre nós dois. Não tive coragem pra voltar à varanda e conversar com... os outros. Estava com uma raiva desprezadora de todos, principalmente de Matilde. Não, me parecia que já não tinha raiva de ninguém, não valia a pena, nem de Matilde, o insulto partira dela, fora por causa dela, mas eu não tinha raiva dela não, só tristeza, só vazio, não sei... creio que uma vontade de ajoelhar. Ajoelhar sem mais nada, ajoelhar ali junto da escrivaninha e ficar assim, ajoelhar. Afinal das contas eu era um perdido mesmo, Maria tinha razão, tinha razão, tinha razão, que tristeza!... Foi o fim? Agora é que vem o mais esquisito de tudo, ajuntando anos pulados. Acho que até não consigo contar bem claro tudo o que sucedeu. Vamos por ordem: Pus tal firmeza em não amar Maria mais, que nem meus pensamentos me traíram. De resto a mocidade raiava e eu tinha tudo a aprender. Foi espantoso o que se passou em mim. Sem abandonar meu jeito de “perdido“, o cultivando

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CONTO

mesmo, ginásio acabado, eu principiara gostando de estudar. Me batera, súbito, aquela vontade irritada de saber, me tornara estudiosíssimo. Era mesmo uma impaciência raivosa, que me fazia devorar bibliotecas, sem nenhuma orientação. Mas brilhava, fazia conferências empoladas em sociedadinhas de rapazes, tinha ideias que assustavam todo o mundo. E todos principiavam maldando que eu era muito inteligente mas perigoso. Maria, por seu lado, parecia uma doida. Namorava com Deus e todo o mundo, aos vinte anos fica noiva de um rapaz bastante rico, noivado que durou três meses e se desfez de repente, pra dias depois ela ficar noiva de outro, um diplomata riquíssimo, casar em duas semanas com alegria desmedida, rindo muito no altar e partir em busca duma embaixada europeia, com o secretário chique seu marido. Às vezes meio tonto com estes acontecimentos fortes, acompanhados meio de longe, eu me recordava do passado, mas era só pra sorrir da nossa infantilidade e devorar numa tarde um livro incompreensível de filosofia. De mais a mais, havia a Rose pra de-noite, e uma linda namoradinha oficial, a Violeta. Meus amigos me chamavam de “jardineiro“, e eu punha na coincidência daquelas duas flores uma força de destinação fatalizada. Tamanha mesmo que topando numa livraria com The Gardener de Tagore, comprei o livro e comecei estudando o inglês com loucura. Mário de Andrade conta num dos seus livros que estudou o alemão por causa duma emboaba tordilha... eu também: meu inglês nasceu duma Violeta e duma Rose. Não, nasceu de Maria. Foi quando uns cinco anos depois, Maria estava pra voltar pela primeira vez ao Brasil, a mãe dela, queixosa de tamanha ausência, conversando com mamãe na minha frente, arrancou naquele jeito de gorda desabrida: – Pois é, Maria gostou tanto de você, você não quis!... e agora ela vive longe de nós. Pela terceira vez fiquei estarrecido neste conto. Percebi tudo num tiro de canhão. Percebi ela doidejando, noivando com um, casando com outro, se atordoando com dinheiro e brilho. Percebi que eu fora uma besta, sim agora que principiava sendo alguém, estudando por mim fora dos ginásios, vibrando em versos que muita gente já considerava. E percebi horrorizado, que Rose! nem Violeta, nem nada! era Maria que eu amava como louco! Maria é que amara sempre, como louco: oh como eu vinha sofrendo a vida inteira, desgraçadíssimo, aprendendo a vencer só de raiva, me impondo ao mundo por despique, me superiorizando em mim só por vingança de desesperado. Como é que eu pudera me imaginar feliz, pior: ser feliz, sofrendo daquele jeito! Eu? eu não! era Maria, era exclusivamente Maria toda aquela superioridade que estava aparecendo em mim... E tudo aquilo era uma desgraça muito cachorra mesmo. Pois não andavam falando muito de Maria? Contavam que pintava o sete, ficara célebre com as extravagâncias e aventuras. Estivera pouco antes às portas do divórcio, com um caso

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escandaloso por demais, com um pintor de nomeada que só pintava efeitos de luz. Maria falada, Maria bêbada, Maria passada de mão em mão, Maria pintada nua... Se dera como que uma transposição de destinos... E tive um pensamento que ao menos me salvou no instante: si o que tinha de útil agora em mim era Maria, si ela estava se transformando no Juca imperfeitíssimo que eu fora, si eu era apenas uma projeção dela, como ela agora apenas uma projeção de mim, si nos trocáramos por um estúpido engano de amor: mas ao menos que eu ficasse bem ruim, mas bem ruim mesmo outra vez, pra me igualar a ela de novo. Foi a razão da briga com Violeta, impiedosa, e a farra dessa noite – bebedeira tamanha que acabei ficando desacordado, numa série de vertigens, com médico, escândalo, e choro largo de mamãe com minha irmã. Bom, tinha que visitar Maria, está claro, éramos “gente grande“ agora. Quando soube que ela devia ir a um banquete, pensei comigo: “ótimo, vou hoje logo depois de jantar, não encontro ela e deixo o cartão“. Mas fui cedo demais. Cheguei na casa dos pais dela, seriam nove horas, todos aqueles requififes de gente ricaça, criado que leva cartão numa salva de prata, etc. Os da casa estavam ainda jantando. Me introduziram na saletinha da esquerda, uma espécie de luís-quinze muito sem-vergonha, dourado por inteiro, dando pro hol central. Que fizesse o favor de esperar, já vinham. Contemplando a gravura cor-de-rosa, senti de sopetão que tinha mais alguém na saleta, virei. Maria estava na porta, olhando pra mim, se rindo, toda vestida de preto. Olhem: eu sei que a gente exagera em amor, não insisto. Mas si eu já tive a sensação da vontade de Deus, foi ver Maria assim, toda de preto vestida, fantasticamente mulher. Meu corpo soluçou todinho e tornei a ficar estarrecido. – Ao menos diga boa-noite, Juca... “Boa-noite, Maria, eu vou-me embora...“ meu desejo era fugir, era ficar e ela ficar mas, sim, sem que nos tocássemos sequer. Eu sei, eu juro que sei que ela estava se entregando a mim, me prometendo tudo, me cedendo tudo quanto eu queria, naquele se deixar olhar, sorrindo leve, mãos unidas caindo na frente do corpo, toda vestida de preto. Um segundo, me passou na visão devorá-la numa hora estilhaçada de quarto de hotel, foi horrível. Porém, não havia dúvida: Maria despertava em mim os instintos da perfeição. Balbuciei afinal um boa-noite muito indiferente, e as vozes amontoadas vinham do hol, dos outros que chegavam. Foi este o primeiro dos quatro amores eternos que fazem de minha vida uma grave condensação interior. Sou falsamente um solitário. Quatro amores me acompanham, cuidam de mim, vêm conversar comigo. Nunca mais vi Maria, que ficou pelas Europas, divorciada afinal, hoje dizem que vivendo com um austríaco interessado em feiras internacionais. Um aventureiro qualquer. Mas dentro de mim, Maria... bom: acho que vou falar banalidade. Extraído de: Contos novos.

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Os mágicos Um indivíduo encontrou três mágicos. Ao primeiro ele propôs: “Se você duplicar o dinheiro que eu tenho comigo, eu lhe dou R$ 100,00”. O mágico o fez e ganhou R$ 100,00. Com os outros dois mágicos tudo se passou do mesmo modo. Ao fim das três operações, o indivíduo notou que estava sem dinheiro. Quanto tinha no início do processo?

RESPOSTA Quando encontrou o primeiro mágico, o indivíduo, que tinha x reais, acabou ficando com 2x – 100 reais. Depois de encontrar o segundo mágico, ficou com 2(2x –100) – 100 reais. Com o terceiro mágico, acabou ficando sem nada, isto é: 2[2(2x –100) – 100] – 100  0. Resolvendo a equação, temos: x  R$ 87,50.

ESPECIAL

Canguru de Matemática Evento visa mostrar que a disciplina pode ser interessante e divertida

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Olimpíada Internacional de Matemática (IMO) é a mais antiga olimpíada científica. Nela, os melhores estudantes de cada país precisam resolver problemas extremamente difíceis. Com a finalidade de despertar o interesse dos jovens pela disciplina, há também um outro importante evento do gênero: o Canguru de Matemática. Mas, ao contrário do que ocorre na IMO, todos os estudantes regularmente matriculados em escolas públicas ou particulares com idade entre 7 e 18 anos podem participar.

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Dependendo da categoria etária, são 24 ou 30 questões de múltipla escolha com uma complexidade menor. A ideia do concurso é quebrar o estigma que rodeia a Matemática e mostrar que ela pode ser interessante e divertida. Em 2014, aconteceu a sexta edição do Canguru no Brasil. A cada ano, o número de inscritos tem aumentado – foram 332 escolas em 2013 e 580 em 2014. Os alunos do Colégio Etapa participaram da última edição e tiveram um ótimo resultado, conquistando 142 medalhas.

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ESPECIAL

AGENDA CULTURAL São Paulo – Clube de Cinema (quintas, das 19h10 às 21h35, sala 65) 16.10 – Fausto (Aleksander Sokurov: 2011) 23.10 – Nosferatu (F.W.Murnau: 1922) & Nosferatu (Werner Herzog: 1979) São Paulo – Clube do Livro (mensal, das 19h10 às 21h35, sala 65) 21.10 – Hamlet (William Shakespeare – tradução sugerida: Millôr Fernandes – L&PM) Valinhos – Clube de Cinema (sextas, das 14h05 às 15h45) 17.10 – Doutor fantástico (Stanley Kubrick: 1964) 24.10 – Star Wars: episódios IV-V-VI (George Lucas: 1977-1980-1983)

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Fique ligado: todas as terças-feiras acontecem as Palestras de Profissões para os alunos de 2o e 3o anos do Ensino Médio!

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