Jornal do Colegio - 614

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Jornal do Colégio JORNAL DO COLÉGIO ETAPA  –  2016  •  DE 09/09 A 22/09

ENTREVISTA

“Farmácia é um curso muito abrangente”. Rodrigo Yuji Kuninari entrou no curso de Farmácia-Bioquímica na USP com a intenção de ser perito criminal. Ele se forma em meados do ano que vem. Enquanto aguarda abertura de concurso público para perito, pretende fazer residência em Toxicologia Clínica em Campinas. Além de seus planos, aqui ele conta como é o curso que está completando e suas várias áreas de atuação profissional.

Rodrigo Yuji Kuninari

JC – Como você chegou à escolha de Farmácia-Bioquímica como carreira? Rodrigo – Eu queria alguma coisa ligada a raciocínio lógico, investigação de polícia. Aqui no Etapa eu comecei a pesquisar e vi que perícia criminal caía perfeitamente para mim. Conversando com amigos, eles me aconselharam a fazer Biomedicina para poder prestar concurso público e ser perito. Passei em Biomedicina na Unifesp, só que no período de reforço antes da 2a fase da Fuvest eu consultei um professor de Química e ele me disse que seria melhor fazer Farmácia, porque se eu desistisse de ser perito teria outras possibilidades profissionais. Decidi que seria Farmácia e fui para a USP.

logia é preciso entender Química Farmacêutica, para entender Química Farmacêutica é preciso entender Química Orgânica. Tem também Física, Cálculo; são todas matérias de base do 1o ano. No 2o ano começa Bioquímica e aí tem matérias de Biologia. Você vai juntando a Química com a Biologia, só que ainda no início tem o básico de Bioquímica, o básico de Biologia Celular, o básico de Biologia Tecidual. Quando comecei a ter Biologia e Anatomia eu me interessei mais. Tem Biologia Molecular também, mas é tudo a parte básica. Quem entra no diurno tem tudo isso no 1o ano. É um ritmo mais intenso. Em média, a gente tem no noturno de 20 a 27 créditos por semestre. No diurno é de 30 a 40 créditos.

Passado o ciclo básico, o curso fica mais prático?

Eu passei no noturno, que tem duração de seis anos. O diurno é em cinco.

Quando você já teve o básico da Química e da Biologia começa a ver Hematologia e sistema imunológico, juntando os dois sempre. Começa a ver Fisiopatologia e aí ficou superinteressante para mim. Você ainda vai ter matérias da Química voltada para Farmácia: a Química Farmacêutica. Depois tem o integrado, com três matérias juntas: Química Farmacêutica, Farmacodinâmica e Fisiopatologia.

Como é o curso noturno?

Como foi seu início na faculdade?

O ciclo básico ocupa os dois primeiros anos praticamente inteiros. A gente tem muita Química. Para você entender Farmaco-

Foi tão diferente quanto o início aqui no Etapa. Lá você estuda por você mesmo, se não quiser ir às aulas não precisa, mas

Além da Fuvest, quais vestibulares você prestou? Prestei Unicamp, também para Farmácia, e Unifesp, para Biomedicina.

Na USP, você entrou no curso diurno ou noturno?

ENTREVISTA

Carreira – Farmácia-Bioquímica

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CONTO

Conjugo vobis – Artur Azevedo

Chato de galocha

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ARTIGO Encontrada no Brasil bactéria resistente a um dos mais poderosos antibióticos

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ESPECIAL Feira Etapa de Universidades Internacionais

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ARTIGO

ENTRE PARÊNTESIS

Cavaleiros e patifes

SOBRE AS PALAVRAS

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O suicídio de Vargas


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ENTREVISTA

tem que entender a matéria e tirar nota. Eu procurei manter o mesmo esquema daqui, de absorver o máximo na aula para não ter que estudar muito depois.

Além das aulas, você participou de outras atividades na faculdade? Fiz parte da Atlética, como atleta. No primeiro ano eu comecei com polo aquático. Foram quatro anos fazendo polo aquático. No ano seguinte comecei a jogar xadrez. Nunca tinha jogado, hoje dou aula de xadrez na faculdade. Dou aula de xadrez japonês também, que é chamado de Shogui. E dou aula de Go, outro jogo de tabuleiro.

Você chegou a ter alguma dúvida sobre a escolha do curso? Não. Minha dúvida foi sobre o caminho para atingir o meu objetivo de carreira. Ser perito criminal nunca saiu da minha cabeça, mas não sabia se continuar em Farmácia seria o melhor caminho. Com essa dúvida, em 2012 eu tranquei o curso. Nos primeiros dois anos é o ciclo básico e eu não estava gostando. Além disso, conheci pessoas que tinham o mesmo objetivo que eu e falavam que era um caminho longo, que tem de esperar abrir concurso, que não é frequente e é difícil. Então, seria melhor eu seguir uma carreira paralela, que estaria mais perto, vamos dizer assim.

Com o curso trancado, o que você fez em 2012? Ainda pensando em ser policial, comecei a fazer o cursinho para prestar Barro Branco [Academia de Polícia Militar]. Entrei aqui nas Turmas de Maio e fiz o cursinho até o meio do segundo semestre. Depois parei. Esse ano foi um período ruim, mas com um lado bom porque pude fazer tudo o que não fazia antes por falta de tempo. Por exemplo, eu queria aprender a tocar violino. Comecei a tocar violino em 2012 e toco até hoje. Eu queria treinar mais xadrez, aí comecei a estudar por conta. Polo aquático já não dava para treinar por conta porque eu teria que ir lá para os treinos, mas na natação eu continuei forte. Além de natação, sempre ouvi falar do karate kyokushin que tem na São Joaquim, ao lado de uma unidade do Etapa, e comecei a fazer. Adorei. Fiz um ano de caratê, só não continuei porque meus horários estavam muito bagunçados. Mas caratê é uma das coisas que eu nunca mais vou parar, igual violino e xadrez.

Depois dessa pausa, o que levou você a voltar para Farmácia? Justamente voltar ao meu objetivo inicial. Pensei: “Eu quero perícia, então preciso voltar para a faculdade”. Só que ainda sem saber se iria gostar. Mas se continuasse na dúvida eu não iria sair do lugar. Voltei ao curso em 2013 e acho que me encontrei, porque amadureci muito naquele ano em que tranquei o curso e passei a ver com outros olhos as coisas, comecei a entender melhor que os primeiros anos da faculdade não refletem a faculdade inteira.

Você fez Iniciação Científica? Eu fiz uma parcial numa área de que não gostei, área de plantas. E fiz outra completa, na área de Toxicologia. Foi do meio do ano passado até o meio deste ano. Minha orientadora era

uma doutoranda de Portugal que fez Ciências Forenses como graduação e veio para cá fazer doutorado. Ela estava detectando cocaína e crack em cabelo e sangue. Ela então deixou a análise pelo cabelo comigo e ficou com análise pelo sangue. Esse foi o meu projeto de Iniciação Científica. Também vou usar esse projeto no meu TCC.

Você chegou a estagiar? Fiz dois estágios. Em 2011, no 2o ano, fiz numa empresa dentro da Faculdade de Farmácia mesmo, que se chama ConFar. É um laboratório que faz teste de controle de qualidade de medicamentos. Eu entrei no meio do primeiro semestre de 2011 e saí quase no final do segundo semestre.

O que você fazia na prática? Primeiro é sempre o básico, eu tinha que conferir o peso dos medicamentos seguindo todos os protocolos, os Pop’s – Procedimento Operacional Padrão. Tinha que ver dureza e a chamada friabilidade. A gente tira o medicamento da embalagem e coloca numas “rodas-gigantes” de plástico que ficam rodando e batendo o medicamento para ver se quebra. Isso é friabilidade.

Então, friabilidade é o nível de resistência a impactos? Isso, exatamente. Tem o teste de dureza, em que você comprime o medicamento para saber a força necessária para trincar – e tem que estar dentro dos parâmetros. Tem dissolução com ácido clorídrico em uma máquina que simula o organismo, a gente põe o medicamento e fica girando, tem que ver se o tempo está o.k. Tem teste de doseamento de HPLC [Cromatógrafo Líquido de Alta Pressão]. Por exemplo, se um medicamento deve ter 25 mg de paracetamol, a máquina confere a dosagem. Esses são os testes mais básicos de controle químico. De todas as áreas que você pode seguir na Farmácia, controle de qualidade é o mais repetitivo de todos.

O outro estágio, onde foi? Lá é obrigatório fazer dois estágios e um é de Atenção Farmacêutica, que é cuidar do paciente. Tem a opção de fazer estágio de Fármaco-Vigilância no Hospital Universitário.

Como é a Fármaco-Vigilância? A Fármaco-Vigilância detecta as reações adversas que um medicamento pode estar causando nas pessoas. Por exemplo, se a pessoa ficou com coceira depois de tomar um antibiótico, então é um efeito adverso. A Fármaco-Vigilância pesquisa se foi o medicamento mesmo a causa e analisa o período desse efeito.

Você ficou quanto tempo nesse estágio? Esse estágio demanda 180 horas, então eu fiquei um mês e meio, quase dois meses.

Qual é a sua preocupação agora? A minha maior preocupação é manter o ritmo, me formar e estudar para a prova de residência que pretendo fazer em Campinas, no Centro de Controle de Intoxicação. Na faculdade eu gostei bastante de Toxicologia, inclusive tem uma op-


ENTREVISTA tativa que estou fazendo que se chama Toxicologia Forense; tudo a ver com o meu objetivo.

Depois de formado, quais são seus planos a curto prazo? Quando eu me formar pretendo encaminhar a residência e estudar para eventuais concursos que apareçam. A residência dura dois anos. Se não aparecer nada de concursos eu engataria uma pós-graduação. Tem áreas no mercado que valorizam uma pós-graduação, como pesquisa médica, indústria, hospitais. Veria essa parte paralela, ainda esperando abrir concurso para perito criminal.

Há previsão de abertura de concurso para perito? Este ano está em vias de abrir.

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atuar em qualquer setor de alimentos, pode atuar em assuntos regulatórios de qualquer setor: plantas, medicamentos, alimentos.

Voltando ao colégio, quais são suas lembranças? Conforme o tempo passa, você ganha novas responsabilidades e vê que o passado era mais tranquilo do que agora. Então é exatamente isso que acontece, eu venho aqui e lembro que só tinha que me preocupar em fazer prova – tudo bem que era muita prova! –, porém era só essa a minha preocupação. Eu gostava daqui. Sim, o estudo é mais intenso, mas eu acho que tem que aproveitar. Hoje, além da graduação, tenho que olhar para outros lados para ir caminhando.

Você tem amigos da época do colégio?

Como está o mercado de trabalho na área de Farmácia-Bioquímica? Independente da crise, a indústria farmacêutica está crescendo bastante. Eu vejo as empresas contratando ainda. Então, na área da indústria está o.k. Porém na parte de pesquisa está tendo bastante problema, o governo não está liberando recursos.

Quais são as áreas de atuação do farmacêutico? A maior parte das pessoas entram em Farmácia hoje pensando na indústria. Eu sou bastante curioso, então gostaria de, se possível, entrar em alguma indústria para ver como é. Mas está difícil as empresas contratarem alunos dos últimos anos; elas contratam mais ou menos no meio do curso, porque dá tempo de analisar o perfil da pessoa para ver se vão efetivá-la. Além das indústrias tem a parte de Botânica, Farmacognosia, que é o efeito medicinal das plantas. Além disso a gente pode

Eu fiz amigos para a vida toda aqui.

Que dicas você pode dar a quem está pensando em prestar Farmácia? Farmácia é um curso muito abrangente, inclusive sua grade é generalista, tem de tudo um pouco. Bem abrangente. Se você tem afinidade com a área, principalmente com Química e Biologia, o curso de Farmácia é o ideal.

O que mais você quer dizer para o pessoal que vai ler essa entrevista? Bom, acho que não foge muito do que todos falam. Você tem que aproveitar essa época. Por mais que pareça haver pouco tempo, por mais que você tenha que estudar para ter bom rendimento, você ainda tem tempo para socializar, ler, sair, fazer esporte. No futuro você vai agradecer por adquirir bons hábitos.

(ENTRE PARÊNTESIS)

Cavaleiros e patifes Em uma ilha, todos os habitantes são necessariamente cavaleiros ou patifes. Cavaleiros sempre dizem a verdade e patifes sempre mentem. 1. Suponha que você deparou com duas pessoas, A e B, uma das quais é um cavaleiro e outra um patife, não necessariamente nessa ordem. A faz a seguinte declaração: “Pelo menos um de nós é um cavaleiro”. O que são A e B? 2. Agora suponha que você encontrou três pessoas, C, D e E e que a classificação “mesmo tipo” é usada para duas pessoas que são ambos cavaleiros ou ambos patifes. C faz a seguinte declaração: “D é um patife”. Em seguida, D faz a seguinte declaração “C e E são do mesmo tipo”. O que é E?

RESPOSTA 1. Como sabemos de antemão que uma das pessoas é um cavaleiro e outra um patife, a declaração de A é verdadeira. A portanto é um cavaleiro e B um patife. Se A fosse um patife, não poderia proferir uma sentença verdadeira. 2. E é necessariamente um patife. Supondo que C seja um cavaleiro, temos que D é um patife e sua declaração é falsa. Assim, C e E não são do mesmo tipo. Como havíamos suposto que C fosse um cavaleiro, nesse caso E seria um patife. Agora, supondo que C seja um patife, temos que sua declaração é falsa e portanto D é um cavaleiro. Assim, a afirmação de D seria verdadeira: C e E são do mesmo tipo, e E também seria um patife nesse caso.


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CONTO

Conjugo vobis Artur Azevedo

A

formosa Angelina, filha do Seabra, tinha um namorado misterioso, que via passar todas as tardes por baixo das suas janelas. Era um bonito rapaz, dos seus trinta anos, esbelto, elegante, sempre muito bem trajado, sobrecasaca, chapéu alto, botinas de bico finas, bengala de castão de prata, pincenez de ouro. Limitava-se a cumprimentá-la sorrindo. Ela sorria também, para animá-lo, mas, qual!, o moço parecia de uma timidez invencível, e o romance não passava do primeiro capítulo. – Com certeza um rapaz bem colocado, pensava Angelina, mas o diabo é que não se explica, e não hei de ser eu a primeira a chegar à fala! Afinal, um dia, passando, como de costume, ele atirou para dentro do corredor da moça um bilhete em que estavam estas palavras: “Amo-a, e desejava saber se sou correspondido”. No dia seguinte ele apanhou a resposta, que ela atirou à rua: “Não posso dizer que o amo, porque não o conheço, mas simpatizo muito com a sua pessoa. Diga-me quem é”.

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Nessa mesma tarde, por uma dessas fatalidades a que estão sujeitos os corações humanos, o Seabra, pai de Angelina, entrou em casa como uma bomba, esbaforido, carregado com muitos embrulhos, suando por todos os poros, e intimou a esposa e a filha (eram toda a sua família) a fazerem as malas, porque no dia seguinte, às 5 horas da manhã, partiam para Caxambu. – Mas isto assim de repente! – protestou a velha. – Vai ser uma atrapalhação! – Não quero saber de nada! O médico disse-me que, se eu não partisse imediatamente para Caxambu, era um homem morto! Eu devia até seguir pelo noturno! Estou com uma congestão de fígado em perspectiva! Angelina ficou desesperada por não ter meios de prevenir o moço e lá partiu para Caxambu com o coração amargurado.

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Não a lastimem compadecidas leitoras: com 10 dias de Caxambu Angelina tinha se esquecido completamente do namorado. Isso não foi devido aos efeitos das águas, que não servem para o coração como servem para o fígado, mas à presença de um rapaz que estava hospedado no mesmo hotel que a família Seabra e, em correção e elegância, nada ficava a dever ao outro.

Era um médico do Rio de Janeiro, recentemente formado, moço de talento e de futuro, que, de mais a mais, tinha fortuna própria. O Seabra, que estava satisfeito da vida, porque o seu fígado melhorava a olhos vistos, acolheu com entusiasmo a ideia de um casamento entre Angelina e o jovem doutor, e era o primeiro a meter-lhe a filha à cara. Em conclusão, o casamento foi tratado lá mesmo, sob o formoso e poético céu do sul de Minas, para realizar-se, o mais breve possível, na Capital Federal.

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Regressando das águas, onde se demorou um mês, Angelina viu passar o primeiro namorado, que olhou para ela com uma expressão de surpresa e de alegria, mas a moça fechou o semblante. O semblante e a janela. E, para nunca mais ver passar o importuno, deixou dali em diante de debruçar-se no peitoril.

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No dia do casamento, os noivos, as famílias dos noivos, as testemunhas e os convidados lá foram para a pretoria. – Tenham a bondade de esperar – disse-lhes o escrivão. – O doutor não tarda aí. Sentaram-se todos em silêncio, e pouco depois o pretor fazia a sua entrada solene. Angelina, ao vê-lo, tornou-se lívida e esteve a ponto de perder os sentidos. Ele estava atônito e surpreso. Era o primeiro namorado. O mísero disfarçou como pôde a comoção, e resignou-se ao destino singular que o escolhia, a ele, para unir a outro à mulher que o seu coração desejava.

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Quando todos os estranhos se retiraram, ficando na sala da pretoria apenas o juiz e o escrivão, este perguntou àquele: – Que foi isso, doutor? O senhor sofreu qualquer abalo! Não parecia o mesmo! Que lhe sucedeu? O moço confiou-lhe tudo. O escrivão, que era um velhote retrógrado e carola, ponderou: – Ora, aí está um fato que só se pode dar no casamento civil; no religioso é impossível. Domínio público.

SOBRE AS PALAVRAS

Chato de galocha A galocha era um tipo de calçado de borracha colocado por cima dos sapatos para reforçá-los e protegê-los da chuva e da lama. Por isso, há uma hipótese de que a expressão tenha vindo da habilidade de reforçar o calçado. Ou seja, o chato de galocha seria um chato resistente e insistente.


ARTIGO

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O suicídio de Vargas A morte de Getúlio Vargas assinala o fim de um ciclo histórico da política brasileira. Presidente e ditador, de 1930 a 1945, Vargas voltara ao poder, em 1950, para um novo mandato, que seria marcado pela intranquilidade, por conspirações, por escândalos também. Estes acabariam por afogá-lo no que ele próprio chamava “um mar de lama”, descoberto nos porões do Palácio do Catete. Porões em que reinava o “tenente” Gregório, chefe da guarda pessoal de Getúlio. Abalada a confiança no governo, o presidente foi coagido a renunciar. Negou-se a sair sem honra. Hélio Silva conta aqui os acontecimentos da tensa noite de 24 de agosto de 1954 e o seu trágico desfecho.

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oi há anos, mas o tempo não conta. O dia 24 de agosto de 1954 é uma data ímpar, assinalando o mais trágico desfecho da vida de um presidente da República. Esse presidente chamava-se Getúlio Dornelles Vargas. Chegara à chefia da nação, na crista da única revolução vitoriosa da velha República, a 24 de outubro de 1930. Duas vezes, foi eleito presidente constitucional: em 1934, pela Assembleia Nacional Constituinte; em 1950, pela maioria do povo, em sufrágio direto. Por largo período, deteve em suas mãos o poder ditatorial. E envelhecera. Ou melhor, amadurecera no exílio em sua própria terra, na estância de Santos Reis, onde vivera a infância e se preparara para a nova, segunda e última presidência.

Dos maiores da nossa história O mês de agosto não fora favorável a Vargas. O processo revolucionário brasileiro, que o trouxera na crista da sua onda, 24 anos atrás, novamente o elevava acima de todos, em uma evidência perigosa. Porque não são os homens que fazem os acontecimentos. Nem mesmo esses, como Vargas, que escrevem a história, antes que ela os descreva, porque nela deixam a marca indelével. Na verdade, Vargas é um dos maiores personagens da história brasileira. O gênio político que lidera todas as correntes, durante 20 anos. Mesmo aquelas que se lhe opõem e, contudo, sofrem a pressão de sua vontade. Em agosto de 1954 será Vargas a grande figura e os acontecimentos gravitarão em torno dele, numa constelação. A segunda presidência Vargas é o período mais importante de seu longo domínio da política brasileira. Sua intuição prodigiosa, a acuidade que o fez se antecipar aos fatos, tantas vezes, tinha preparado o solitário de Itu para afirmar a linha nacionalista, exatamente quando o nacionalismo começava a aparecer no cenário mundial. As circunstâncias em que se desenvolve a crise do mundo moderno e, dentro dela, a revolução brasileira, merecem um estudo mais profundo. A conduta dos militares na política brasileira, a formação de duas correntes, no seio do Exército, a partir da Segunda Guerra Mundial, estão a reclamar uma análise que remonte ao Primeiro Cinco de Julho e alcance março de 64, através dos golpes e contragolpes de 45, 54, 55, 61. A Guerra Fria, a bipolarização econômica e o choque dos dois imperialismos, russo e norte-americano, também apresentam conotações importantes com o que aconteceu no Palácio do Catete, na manhã de 24 de agosto de 1954. Desta vez, porém, será o fato, apenas o fato, em sua grandiosidade de tragédia grega, para evidenciar que em todas as fases da história, na sucessão das teorias e nos choques dos interesses, há um valor constante, um só, sem o qual os acontecimentos não teriam repercussão, efeitos, reflexos, consequências – o homem. Na manhã de 23 de agosto reuniam-se vários chefes militares no Palácio da Guerra. O Brasil vivia a grande crise. Um incidente

lamentável, cruel, brutal, consequente ao tom virulento de uma campanha política, fizera abater, à entrada de um prédio na Rua Toneleros, o major da Aeronáutica Rubens Florentino Vaz, que acompanhava o político Carlos Lacerda em sua campanha de exaltada oposição ao governo. Essa campanha, nos jornais e nos comícios era, ao mesmo tempo, causa e efeito. Todo o antigetulismo, inclusive as correntes militares que haviam atuado em 45 e 50, insurgiam-se contra Vargas, que representava a outra tendência. Em termos de sociologia, Vargas era a revolução. E, contra a revolução, a maneira acelerada por que ela se apresentava, o advento da sociedade de massa, erguia-se e aguerria-se o status quo, a sociedade conservadora, a economia organizada, as Forças Armadas mantenedoras da ordem, que se sentiam ameaçadas. No austero e grandioso salão do Palácio da Guerra discutem os generais. É curioso examinar as coleções e os jornais daquela época. Vargas, que abrira os portões do Palácio do Catete à mais ampla devassa dos oficiais da Aeronáutica, não exercera pressão sobre


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ARTIGO

o noticiário. Poucas vezes, na história do Brasil, encontramos o relato completo dos acontecimentos estampados nos jornais do dia, vibrando na linguagem em que cada qual defendia sua posição política. A reunião no Ministério da Guerra foi amplamente noticiada. Os repórteres anotaram a presença do marechal Mascarenhas de Morais e os generais Canrobert Pereira da Costa, Álvaro Fiuza de Castro, Francisco Gil de Castelo Branco, Ângelo Mendes de Morais, Odylio Denys, Olímpio Falconiere, Otávio Saldanha Maza, Tristão de Alencar Araripe, Edgard Amaral, Juarez Távora, Alcides Gonçalves Etchegoyen, Cyro do Espírito Santo Cardoso, Otávio da Silva Paranhos, Floriano de Lima Brayner, Lamartine Pais Leme, Danton Teixeira, Inácio Veríssimo, José A. de Magalhães, J. Daudr Fabrício, Gastão da Cunha, Emílio Ribas, Nestor Soto de Oliveira, Sagadas Viana, Nélson de Melo, José Machado Lopes, Nilo Sucupira, Jandyr Galvão, Rômulo Colônia, Osvaldo de Araújo Mota, Nestor Penha Brasil, Castelo Branco, Nelson Rebelo Queiroz, Pery Constant Beviláqua, Oscar Rosa, Nilo Guerreiro Lima, Eduardo de Carvalho Chaves, Morais Âncora, Floriano Keller, João Batista Rangel, Areia Pimentel, Coelho dos Reis, Correia Lima, Inimá Siqueira, Amaury Kruel, Augusto Magessi, Vítor Cruz, Gélio A. Lima, Sena Dias, Mendes da Fonseca, Paulo Cruz, Altair de Queiroz, José Maurício, Inad Carvalho Turbert, José Vieira Peixoto, Achiles Gallotti, Artur Luiz de Alcântara, Valdemar Rocha, Leônidas Amaro, Manoel dos Santos, Benedito Rodrigues, João Teles Vilas Boas e Almiro Pedro Vieira. Divergiam as opiniões. Por isso foi assentada a ida do Ministro da Guerra, general Zenóbio da Costa, em companhia do marechal Mascarenhas de Morais, ao Palácio do Catete, a fim de que os dois expusessem a Vargas a real situação das Forças Armadas. Deviam propor a renúncia do presidente, a licença ou o afastamento para uma viagem ao estrangeiro.

Zenóbio: “Ele não voltará” Depois que regressou do Catete, o general Zenóbio reuniu, de novo, os generais que haviam participado do primeiro encontro, a fim de dar conhecimento aos seus camaradas de que o presidente da República havia tomado a deliberação de se afastar do governo por meio de uma licença. A solução não agradou aos generais. Houve quem dissesse que o afastamento de Vargas, por licença, não era solução. Ele voltaria mais prestigiado. Ao que o general Zenóbio declarou: “Posso garantir que ele não voltará”. O manifesto dos generais só foi publicado seis anos depois, no dia 7 de setembro de 1960, na última página do Correio da Manhã. Em seu depoimento, prestado ao jornalista Raul Giudicelli, de Fatos e Fotos, Alzira Vargas do Amaral Peixoto declarou que obteve uma cópia, mas não tinha as assinaturas, o que dificultava a avaliação de seu potencial, na deflagração de um movimento. “Considerando que o inquérito policial-militar em andamento na Base Aérea do Galeão já apurou, indiscutivelmente, que foi a guarda pessoal do presidente da República, sob a chefia de Gregório Fortunato, homem de sua absoluta confiança, que planejou e preparou dentro do palácio presidencial, e fez executar, o atentado em que foi assassinado o major-aviador Rubens Florentino Vaz; considerando que, depois de haver o presidente da República assegurado à nação que o crime seria apurado e os culpados entregues à Justiça, elementos de sua imediata confiança, ainda dentro do palácio presidencial, alertaram os criminosos e lhes forneceram meios necessários à fuga, inclusive vultosa quantia em dinheiro; considerando que é assim duvidoso que se possa chegar à punição de todos os culpados; considerando que as diligências do inquérito trouxeram à luz farta documentação em que se demonstra a corrupção criminosa nos círculos mais chegados ao presidente da

República; considerando que tais fatos comprometem a autoridade moral indispensável ao presidente da República para o exercício do seu mandato; considerando, enfim, que a perduração da atual crise político-militar está trazendo ao país irreparáveis prejuízos em sua situação econômica e poderá culminar em graves comoções internas, em face da intranquilidade geral e da repulsa e indignação de que se acham possuídas todas as classes sociais do país; os abaixo-assinados, oficiais generais do Exército, conscientes de seus deveres e responsabilidades perante à nação, honrando compromissos públicos e livremente assumidos, e solidarizando-se com o pensamento dos camaradas da Aeronáutica e da Marinha, declaram julgar, em consciência, como melhor caminho para tranquilizar o povo e manter unidas as Forças Armadas, a renúncia do atual presidente da República, processando-se a sua substituição de acordo com os preceitos constitucionais. Rio, 22 de agosto de 1954. (ass.) general Álvaro Fiuza de Castro; general Canrobert Pereira da Costa; general Nicanor Guimarães de Souza; general Juarez Távora; general Alcides G. Etchegoyen; general Emílio R. Ribas Júnior; general Edgar Amaral; general Altair de Queiroz; general J. Machado Lopes; general Peri Constant Beviláqua; general Humberto Castelo Branco; general Paulo Kruger da Cunha Cruz; general Inácio José Veríssimo; general Barros Falcão; general João Batista Rangel; general Nilo Horácio de Oliveira Sucupira; general Antônio Coelho dos Reis; general Delso Fonseca; general Henrique Lott; general T. de Alencar Araripe; general Nelson Rebelo de Queiroz; general Nestor Souto de Oliveira; general Nilo Augusto Guerreiro Lima; general Penha Brasil e general Jair Dantas Ribeiro.” Eram sombrios os dias que precederam o 24 de agosto. No domingo, 22, o vice-presidente João Café Filho solicitara ser recebido, com urgência, pelo presidente da República. Em seu livro de memórias ele conta os entendimentos com o deputado Gustavo Capanema, líder da maioria, o almirante Aristides Guilhobel, Ministro da Marinha e, posteriormente, com o general Zenóbio da Costa, Ministro da Guerra. Café Filho revela o desacordo existente, face à sua proposta de renúncia coletiva do presidente e do vice-presidente da República. Depois dessa reunião, dirigiu-se ao Palácio do Catete onde foi recebido por Vargas às 16 h. O presidente ouviu suas ponderações e a proposta de um nome como Oswaldo Aranha, José Américo, Álvaro Alberto Mascarenhas de Morais para substituí-lo. A atitude de Café Filho foi considerada, nos círculos mais ligados a Vargas, como a prova evidente de que passara a participar da conjura e o fazia com a cobertura de prestigiosos militares.

Resposta a Café Filho: “Não” Despediram-se. Vargas ficou de dar uma resposta definitiva, sem fixar um prazo. Esta resposta veio, em termos negativos. Segundo o depoimento de Café Filho, Vargas lhe havia dito: “Considerei, com interesse, a sua proposta de nossa dupla renúncia. Reconheço os seus bons propósitos e quero renovar os meus agradecimentos pelo seu gesto de colaboração; mas prefiro resistir no meu posto”. Declarou, ainda, que os ministros militares asseguraram que manteriam a ordem. Ficaria no poder: “Faço questão que o crime de Toneleros seja cabalmente apurado. Não renunciarei de maneira nenhuma. Se tentarem tomar o Catete terão que passar sobre o meu cadáver”. A intenção declarada de resistir até a morte não basta para atribuir a Vargas a intenção preconcebida de suicídio. É verdade que políticos e psicólogos alinharam, desde então, fatos e pronunciamentos tendentes a estabelecer a sequência que conduziria ao gesto extremo e fatal. Um dos elementos é a tão debatida carta-testamento. Outra é uma simples folha de papel de bloco, escrita a lápis, como Vargas costumava fazer.


ARTIGO É sua filha Alzira quem conta que o major Ernani Fitipaldi, da Casa Militar da Presidência, mostrou-lhe a folha de papel onde se lia: “À sanha de meus inimigos deixo o legado de minha morte. Levo o pesar de não ter feito pelos humildes tudo o que desejava”. O papel fora encontrado entre decretos assinados. O major Fitipaldi o recolheu e o entregou, diretamente, a Alzira. Ela o mostrou a seu tio Benjamim e foram os dois ver Vargas, que dormia, tranquilamente, com a porta de seu quarto aberta.

“Daqui só sairei morto”

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do de lá. Os oficiais comandantes de tropa na Vila são do tipo dos que não assinam manifestos políticos sem ordem superior”. A Vila estava sob o comando do general Paquet, e Vargas contava com ele. Também o coronel Orlando Ramagem, que comandava o Batalhão de Guardas, tropa de elite, com um efetivo de três mil homens, aquartelado em São Cristóvão, aguardava ordens para sair em defesa do governo. Mas essa ordem não veio. No Salão de Despachos, Vargas sentou-se à cabeceira da longa mesa, que servira nos banquetes dos condes de Nova Friburgo, primeiros proprietários do palácio. À sua direita sentaram-se Oswaldo Aranha, Apolônio Sales, Epaminondas dos Santos e Aristides Guilhobel; à esquerda, Tancredo Neves, Edgard Santos, Mario Pinotti, Zenóbio da Costa; em frente, Hugo de Faria, José Américo de Almeida, Mascarenhas de Morais e Ernani do Amaral Peixoto. Deixavam de comparecer o Ministro do Exterior, Vicente Ráo, enfermo em São Paulo, e o chefe de Polícia, coronel Paulo Torres, que se achava em seu posto. A reunião tinha outros participantes. Alzira Vargas do Amaral Peixoto forçara a entrada e, com ela, outros familiares. Falaram alguns ministros até que o titular da Guerra se manifestou para dizer que Vargas já não contava com a unanimidade do Exército. Também a Marinha e a Aeronáutica, por seus oficiais generais, se haviam manifestado em oposição.

No dia seguinte, pela manhã, Alzira interpelou-o, entre séria e brincalhona: “Queres me matar do coração, antes do tempo? Ainda não tenho idade para isso”. Vargas não gostou da descoberta. Retomou o papel – que ninguém mais encontrou – e respondeu: “Não é o que tu estás pensando, minha filha. Se eu tivesse certeza de que minha renúncia significaria a paz e tranquilidade para o povo brasileiro e que me permitiriam terminar meus dias com sossego e dignidade, não teria um minuto de hesitação, estou farto e cansado, velho demais para aceitar as iniquidades e injustiças com que procuram ferir-me. Mas, como tenho a certeza de que o que eles querem é me humilhar, não renunciarei. Daqui só sairei morto”. E como sua filha respondesse que estava tudo certo e os seus amigos estavam dispostos a lutar junto com eles, continuou: “Não quero o sacrifício de “São vidas que estão em ninguém; pretendo resistir sozinho para jogo” que minha atitude fique como um proFoi quando Alzira, surgindo entre o testo. Não te preocupes, minha filha, seu pai e Oswaldo Aranha, o interromnão estou pensando em suicídio”. peu: “General Zenóbio, isto aqui não é No dia 23, pela manhã, Alzira recebia uma simples jogada política. São vidas as últimas informações. Diziam-lhe que, que estão em jogo, inclusive a minha e, até o meio-dia, o manifesto contava, por isso, dou-me o direito de falar. Isso apenas, com dez assinaturas e somente não passa de uma conspiração de gabiuma era de comandante de tropa; todas nete, não é um movimento que atinja as demais eram de generais sem comisas Forças Armadas. O senhor sabe, tão são, ou sem comando. Durante todo o bem quanto eu, que na Vila Militar nada dia 23 chegaram notícias do progresso foi alterado desde sua visita hoje à tarde do movimento conspiratório. Tudo fazia e, sem a Vila, pode alguém pretender prever que os acontecimentos culminadar golpes neste país?” Interpelou o Miriam de 24 para 25. No dia 25, porém, nistro da Marinha, almirante Guilhobel: comemorava-se o Dia do Soldado. Tal“Sua tropa embarcada pode fazer alguvez houvesse uma trégua. ma coisa? A única coisa que pode influir, Passava das 23 h; Vargas ainda despaem terra, são os seus fuzileiros navais. chava em seu gabinete, quando Alzira se Mas eles não estão interessados em retirou, rumo a Niterói. Tomou a barca da Carlos Lacerda ferido na ocasião do atentado. marchar contra ou a favor de ninguém. 1 h da manhã. Ao chegar ao Palácio do Só se defenderão se forem atacados em seus quartéis e isto eu Ingá, seu marido, o governador Ernani do Amaral Peixoto, esperavasei do próprio comandante Camargo”. Dirigiu-se ao Ministro da Ae-a para regressarem, imediatamente, ao Rio. Havia recebido um ronáutica, brigadeiro Epaminondas dos Santos: “Onde estão locachamado urgente de Benjamim Vargas. Cerca de 3 h da madrugada lizados os únicos aviões em condições de treinamento e de voo, regressava ao Catete, iluminado e cercado de curiosos, francamennesta cidade? Não é Santa Cruz? A base de Santa Cruz é comante hostis. Fora convocado, extraordinariamente, o ministério. Vargas dada por um ex-ajudante de ordens, o coronel Pamplona. É comconversava com Oswaldo Aranha no terceiro andar. Antes de sair, o posto pelo grupo de caça, o ‘Senta a Pua’, da guerra, e são todos presidente assinou um papel, que estava sobre a sua mesa, dobroufiéis ao governo. Onde, então, está o perigo?” Voltou a dirigir-se -o e o colocou no bolso. Desceram para o Salão de Despachos. ao Ministro da Guerra: “Dos treze generais, porque são somente Prosseguindo em seu depoimento, Alzira informa que o coronel os treze signatários do manifesto, só um tem comando de tropa Manoel Garcia de Souza deu-lhe a relação de 13 signatários do e não é aqui na capital; os outros exercem funções burocráticas. manifesto dos generais acrescentando que, depois de meia-noite, Se o senhor julgar que a simples renúncia do meu pai vai trazer ninguém mais assinou. Adiantou que os generais aguardavam o tranquilidade, progresso e ordem a este país, não se fala mais no resultado da reunião ministerial. Alzira quis saber a posição da Vila assunto. Mas o senhor tem a certeza?” Militar. Ouvira uma declaração, atribuída a Zenóbio, de que vários Em seu depoimento, a filha de Vargas refere-se a um atrito comandantes de corpos, sediados na Vila, haviam assinado. O coentre os ministros da Guerra e da Aeronáutica sobre qual seria ronel Garcia de Souza desmentiu: “Não é verdade. Estou chegan-


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o maior responsável pela situação: o manifesto dos generais ou a chamada República do Galeão? O brigadeiro Epaminondas declarou que bastava mandar prender os dois principais cabeças do movimento, Eduardo Gomes e Juarez Távora, e tudo estaria terminado. Zenóbio, irritado, perguntava: “E por que você não os prende?”. “Porque não disponho de tropa”, respondeu Epaminondas. “Forneça o local para prendê-los que eu vou.” Interpelado, o Ministro da Marinha, almirante Guilhobel disse, duramente: “Presidente, parece que seu destino é ser traí­do por seus chefes militares”. O general Caiado de Castro que, um tanto surdo, em pé, atrás do Ministro da Marinha, tentava acompanhar os debates, levou as sobras. O Ministro da Guerra o interpelava, perguntando por que não ia ele comandar as tropas de defesa. O chefe da Casa Militar, quando entendeu, aceitou o desafio e pediu que lhe dessem tropas. Prosseguindo, Alzira recorda que a voz de Vargas se fez ouvir serena e clara, restabelecendo a ordem. Pela segunda vez, indagou de seus ministros qual era a melhor solução para o Brasil. Uns eram favoráveis a uma reação, mas não diziam de que tipo; outros, simplesmente, respondiam: “O que o presidente resolver nós aceitamos”. Discutia-se, ainda, entre licenciamento provisório ou licença temporária. O presidente retomou a palavra: “Já que meu ministério não chegou a nenhuma conclusão, eu decido. Determino que os ministros militares mantenham a ordem dentro do país. Se a ordem for mantida, eu me afastarei. Entrarei com um pedido de licença. Em caso contrário, os revoltosos encontrarão aqui o meu cadáver”. Levantou-se, desejando boa-noite e subiu para seus aposentos. O ministério continuou reunido para redigir uma nota, a ser divulgada pela imprensa. Meia hora depois, Aranha, Amaral Peixoto e Tancredo subiram com a nota redigida para receber a aprovação do presidente. Como este já se havia recolhido, foi Alzira encarregada de consultá-lo. Encontrou-o, acordado, mas recusou-se a opinar: “Façam o que quiserem; não a quero ler. Já estou dormindo”. Zenóbio voltara ao Ministério da Guerra para reunir os generais e dar-lhes conta do que acontecera. Os outros ministros dispersaram e os familiares de Vargas se acomodaram nos corredores, para a vigília daquela madrugada. Às 6 h da manhã, dois oficiais do Exército se aproximaram de Benjamim Vargas e conferenciaram com ele. Em seguida, Benjamim entrou no quarto do presidente para comunicar que havia sido convocado para depor no Galeão. Getúlio se opôs. Se o quisessem ouvir, que fossem ao Catete. Foi quando seu irmão lhe disse que ele não era mais, de fato, o presidente da República. Os generais haviam deliberado o seu afastamento definitivo. Era a notícia que acabava de receber do general Âncora, transmitindo os resultados da reunião. Vargas pediu que Benjamim chamasse o chefe da Casa Militar, general Caiado de Castro. Depõe, ao repórter Antônio Gemaque, de O Cruzeiro, o velho mordomo do Palácio do Catete, João Zarattini, que viu quando Vargas saiu de seu quarto, em pijama e chinelos, e entrou no seu gabinete. Zarattini levantou-se precipitadamente e Vargas sorriu-lhe, fazendo um gesto amistoso de cumprimento. Depois, sem nada dizer, voltou, sem pressa, para o quarto. Zarattini recorda que ele tinha a mão esquerda no bolso do pijama, onde havia algo de pesado e volumoso.

“Não ouvi o ruído do tiro” Alzira também recorda esse último passeio do pai e estranhou o seu traje, o pijama, os chinelos. Porque “ele era sempre muito cuidadoso em suas aparições em público e os corredores estavam cheios de gente. Não ousei aproximar-me. Ele já me mandara dor-

mir duas vezes e eu não obedecera. Nesse momento, o coronel Garcia de Souza me chamou para falar com os oficiais comandantes das blindadas, pelo telefone. Estavam todos firmes, a postos, esperando ordens. Disse-lhes que aguardassem o final da reunião dos generais e me concedi o prazer de rir, pela primeira vez desde o começo da crise. Não vi quando Benjamim entrou no quarto de meu pai e saiu, precipitadamente. Não ouvi o ruído do tiro seco, que me deixaria órfã. Dois braços envolveram meus ombros e uma voz chegou aos meus ouvidos: ‘Alzira, seu pai...’ Agonizava, quando cheguei. Creio que me reconheceu. Não me peçam que vá além disso. Ainda não posso”. Pela porta, entreaberta, penetraram o filho Lutero, o mordomo João Zarattini, Alzira, Ernani Amaral Peixoto e outras pessoas. Atravessado sobre a cama, com uma perna pendente, Getúlio Vargas agonizava. O laudo da autópsia, tardia, que publicamos, positiva a hipótese do suicídio. É preciso, porém, completá-lo com os esclarecimentos que me prestou, pessoalmente, meu colega, então diretor do Instituto Médico Legal, Dr. Jessé de Paiva. Vargas era um atirador exímio. Sabia qual o ponto mais vulnerável para um tiro no coração. Colocou a ponta do cano do revólver no espaço entre duas costelas, dois dedos abaixo do mamelão esquerdo. Fixou a arma com a mão direita e acionou o gatilho com o polegar da mão esquerda. O relato do acontecimento, assinado por aquela autoridade: “Pouco depois das 8 horas do dia 24 de agosto de 1954, quando eu já tinha conhecimento da trágica morte do presidente da República, Dr. Getúlio Vargas, pelo rádio, e me apressava para sair de casa, rumo ao Instituto Médico Legal, recebi recomendação da chefia de Polícia, no sentido de, o mais urgente possível, comparecer ao Palácio do Catete, para as providências periciais que se impunham. Dirigi-me, então, ao Instituto e, de lá, convoquei imediatamente o Prof. Nílton Salles, chefe do Serviço de Necropsia, o médico legista do dia, Dr. José Alves Assumpção de Menezes, os Drs. Nelson Caparelli e Mário Martins Rodrigues, o auxiliar de autópsia, José Francisco da Silva e mais o fotógrafo de nossa instituição, Sr. Ismar de Carvalho e Mello. Lá chegamos por volta das 10 horas, depois de vencer inúmeras dificuldades, face à massa humana que existia fora e no interior do palácio presidencial a embaraçar o nosso caminho. Quando conseguimos chegar ao quarto do infortunado presidente, que também estava literalmente cheio de pessoas amigas, deparamos com o presidente que, já vestido, jazia inerte sobre o seu leito e, nos primeiros contatos havidos com o diretor do Instituto de Criminalística, Dr. Antônio Carlos Villanova e o perito criminal Carlos Éboli, também presentes, sentimos a natural tendência dos familiares, no sentido de que a perícia se resumisse em simples inspeção cadavérica. Conhecendo a nossa responsabilidade no histórico momento que vivíamos, procurei o então chefe de polícia, coronel Paulo Torres, e lhe fiz sentir a conveniência de se fazer cumprir a legislação penal vigente em caso de morte violenta, como fora a do extinto presidente, para que a verdade médico-legal fosse retratada e a história não viesse a ser deturpada, em relação à causa jurídica da morte, ocasião em que recebemos, do sr. cel. chefe de polícia, carta branca relativamente ao cumprimento de todos os requisitos legais atinentes ao caso em lide. Para facilitar as nossas atribuições, resolvemos conversar a respeito com nosso ilustre colega, filho do saudoso presidente, Lutero Vargas, a quem apelamos no sentido de facilitar a iniciativa que se fazia indispensável, no que fomos atendidos, embora com apreciável e natural retardamento, em virtude da prolongada permanência de pessoas amigas, que não se queriam afastar do leito mortuário.


ARTIGO Afinal, depois das 14 horas iniciamos a competente perícia que se limitou a uma meticulosa inspeção externa do cadáver, quando logo pudemos verificar as tatuagens de pólvora constatadas nos dedos das mãos do periciado, notadamente no dedo médio da mão esquerda e em torno do ferimento de entrada do projétil, localizado na região precordial, próximo ao mamelão esquerdo, que por sua vez estava para dentro de rasgão estrelado, circundado por zona de esfumaçamento situado no bolso dos disparos de arma de fogo encostada, a traduzir, por si só a figura do suicídio. Em seguida, procedeu-se à incisão torácica indispensável à retratação do trajeto do projétil, verificando-se que o mesmo transfixara os órgãos do tórax, da frente para trás e da esquerda para a direita e um pouco para baixo, localizando-se na massa muscular da parede torácica posterior. O referido projétil foi retirado e confrontado com os demais, contidos no cilindro da arma funesta, quando pôde ser constatada a perfeita semelhança dos mesmos. Em face dos elementos técnicos recolhidos, foi firmado pelo Dr. Nílton Salles, o atestado de causa-mortis correspondente como sendo: ‘Ferimento penetrante da região precordial, por projétil de arma de fogo, com lesões de órgãos torácicos e hemorragia interna’. Por fim, atendendo-se a desejo da família, procedeu-se ao embalsamento do corpo, de forma a permitir que o seu sepultamento viesse a ser realizado dias depois, em São Borja.” (Ass. Dr. Jessé de Paiva.)

A Carta-testamento

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Acredito na autenticidade dessa carta, embora dela não conclua a premeditação do ato trágico. Vargas minutara os seus principais trechos, estruturando a peça que, possivelmente, José Maciel Júnior redigiu, sob sua aprovação. Mandou datilografá-la. Uma das vias, assinada, ele entregou, em envelope fechado, a João Goulart, que deveria partir para o Sul. Este detalhe explica a razão do documento. Quando da deposição de 29 de outubro de 1945, Vargas redigiu um manifesto, cuja primitiva redação foi atenuada, a conselho do então chefe de polícia, capitão João Alberto. Também a segunda versão ficou retida, na fonte. Nenhum manifesto foi divulgado, explicando a atitude de Vargas. Em agosto de 1954, o presidente admitiu a deposição, a que resistiria, com o sacrifício da própria vida. Daí a ideia de um manifesto cuja divulgação seria assegurada no Rio Grande do Sul, no Uruguai e na Argentina por intermédio de Goulart, que tinha ligações pessoais para bem se desempenhar dessa missão. Outra cópia foi colocada, por ele, depois de deliberado o suicídio, na mesa de cabeceira, onde foi recolhida por seu genro, governador do Rio de Janeiro, Ernani do Amaral Peixoto. Uma terceira cópia, sem assinatura, achava-se no cofre, juntamente com o texto manuscrito. Depois da reunião ministerial, quando Alzira foi dar-lhe boa-noite, Getúlio mostrou-lhe a chave do cofre, confidenciando-lhe: “Se me acontecer alguma coisa, aí dentro estão alguns valores e papéis importantes. Um de vocês dois (estavam presentes Alzira e Benjamim) deve retirá-los; os valores são para a Darcy e os papéis, da Alzira”. A chave foi encontrada debaixo de seu corpo; caíra do bolso do pijama.

Vinte anos depois do suicídio de Vargas, ainda se discute a Carta-testamento, espalhada pelo país inteiro e perpetuada, em uma placa de bronze, em uma praça em Porto Alegre.

(Texto de Hélio Silva.) Extraído de: revista História, ago./1974.

Carta-testamento “M

ais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coor­ denaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário-mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobras. Mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobras foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente. Assumi o governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores de trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia a ponto de sermos obrigados a ceder.

Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser o meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História.”


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Encontrada no Brasil bactéria resistente a um dos mais poderosos antibióticos Diego Freire

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ecentemente descoberto na China e também encontrado em países da Europa, da Ásia e da África, o gene mcr-1, que causa resistência a uma classe de antibióticos utilizados justamente para tratar infecções por bactérias multirresistentes, foi identificado pela primeira vez no Brasil em cepas da bactéria Escherichia coli isoladas de animais de produção. Os pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) responsáveis pela identificação da bactéria também reportaram o primeiro caso de infecção humana no Brasil, em um hospital de alta complexidade em Natal (RN), por uma cepa da bactéria portadora do gene e resistente a Colistina (polimixina E), um dos mais poderosos antibióticos, considerados como último recurso no tratamento de infecções produzidas por bactérias que não respondem a outras drogas. “A aparição desse gene no Brasil pode contribuir para o surgimento de bactérias totalmente resistentes aos antibióticos, com risco de enfrentarmos uma situação similar ao que foi a era pré-antibiótica, quando doenças comuns, como uma infecção urinária ou um ferimento profundo na pele, levavam facilmente a óbito”, alerta Nilton Lincopan, responsável pela pesquisa Monitoramento de bactérias Gram-negativas multirresistentes de importância médica (humana e veterinária): impacto clínico/ambiental e desenvolvimento de alternativas terapêuticas e produtos de inovação tecnológica, realizada com apoio da FAPESP. Os resultados da pesquisa foram publicados nas revistas científicas Eurosurveillance, do European Centre for Disease Prevention and Control, e Antimicrobial Agents and Chemotherapy, da American Society for Microbiology.

Superbactéria Descoberta em 1949, a produção de Colistina foi descontinua­ da entre a década de 1970 e o ano 2000 por sua elevada toxicidade, ficando o antibiótico restrito ao uso veterinário. No início do século, entretanto, com a emergência de bactérias produtoras de enzimas responsáveis por provocar resistência a praticamente todos os antibióticos beta-lactâmicos, como as penicilinas, a Colistina voltou a ser utilizada como última alternativa terapêutica no tratamento de infecções produzidas por microrganismos multirresistentes, principalmente associadas a surtos de infecção hospitalar. Por muito tempo, conta Lincopan, a comunidade científica internacional acreditou que o desenvolvimento da resistência bacteriana a Colistina seria um processo difícil. “Porém, ao final do ano passado, um artigo alarmante foi publicado na revista Lancet

Infectious Diseases, em que pesquisadores chineses descreveram a identificação de um novo gene (o mcr-1) que confere resistência contra polimixina E e polimixina B.” Ainda mais preocupante, de acordo com o pesquisador, foi a descoberta de que o gene é facilmente transferível de uma espécie bacteriana a outra por meio de plasmídeos, fragmentos de DNA extracromossômicos que podem se replicar autonomamente e que podem ser transferidos entre diferentes espécies bacterianas por conjugação – processo de reprodução das bactérias por meio do qual pedaços de DNA passam diretamente de uma para a outra. O fragmento de DNA transferido se recombina com o material genético da bactéria receptora, produzindo novas combinações genéticas que serão transmitidas às células-filhas na próxima divisão celular. Cepas bacterianas carregando o gene mcr-1 foram encontradas tanto em animais de produção como em seres humanos, levantando suspeitas sobre a existência de uma cadeia na disseminação da resistência à Colistina que começa a partir do uso do antibiótico na alimentação animal, propagando-se para os animais abatidos, os alimentos derivados e o ambiente. Diante da ameaça de que muitas infecções poderiam se tornar intratáveis, um alerta mundial foi emitido no início do ano pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês), agência do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos. Segundo Lincopan, papers de pesquisadores de diferentes países reportaram em seguida a identificação do gene mcr-1 em cepas de bactérias clinicamente importantes, como Escherichia coli, Salmonella spp. e Klebsiella pneumoniae. “O aspecto mais assustador sobre o gene é a facilidade com que ele é transferido entre diferentes espécies bacterianas. Consequentemente, algumas bactérias hospitalares têm alinhado este gene junto a outros de resistência a antibióticos, favorecendo que a espécie bacteriana receptora fique resistente a praticamente a totalidade dos medicamentos. Assim, se um paciente estiver gravemente infectado, por exemplo, por uma E. coli, não haverá nada que se possa fazer”, diz o pesquisador.

Urgência epidemiológica De acordo com Lincopan, suspeita-se que a principal razão para o surgimento e a propagação do mcr-1 seja o uso exacerbado de Colistina na produção agropecuária, como promotora de crescimento. Entretanto, a presença do gene também foi descrita em amostras de animais domésticos, alimentos e am-


ARTIGO bientes aquáticos, evidenciando a disseminação para diversos ecossistemas. “No Brasil, no início deste ano, nosso grupo de pesquisa identificou pela primeira vez a presença do gene mcr-1 em animais de produção das regiões Sudeste (São Paulo e Minas Gerais) e Sul (Paraná e Santa Catarina), o que deve ser considerado uma urgência epidemiológica e um alerta para as implicações no agronegócio, visto que o país é um grande produtor e exportador de produtos de origem animal.” Para os pesquisadores, os órgãos reguladores do setor deveriam reavaliar o uso de antibióticos como a Colistina. “O impacto real da resistência bacteriana no Brasil também precisa ser avaliado pelo poder público e pela comunidade científica. Além disso, devemos privilegiar a educação sobre o uso racional de antibacterianos. Clinicamente, muitos estudos e reuniões científicas têm alertado que bactérias multirresistentes estão adquirin-

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do um caráter de endemicidade em centros hospitalares, sendo frequentemente associadas a altas taxas de falha terapêutica e subsequente morbimortalidade”, conta Miriam Fernandes, aluna de doutorado da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e primeira autora dos artigos publicados. “Estes esforços poderiam evitar uma situação irreversível”. Um plano de ação global contra o risco do colapso dos antibióticos, avalia Lincopan, deve incluir “o uso racional desses fármacos na saúde humana e animal, o reforço da vigilância epidemiológica e o estímulo de pesquisas na área, a educação da população e dos profissionais da saúde humana e veterinária, assim como fazendeiros e produtores, sobre o uso adequado de antibióticos e o desenvolvimento de novos compostos e ferramentas de diagnóstico”. Extraído de: Agência FAPESP – Divulgando a cultura científica, ago./2016.

ESPECIAL

Feira Etapa de Universidades Internacionais Evento reuniu representantes de faculdades internacionais para falar sobre processo de admissão, programa de bolsa de estudos, entre outros.

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omo ingressar em instituições de ensino fora do país? Pensando nisso, o Colégio Etapa – que nos últimos dois anos soma mais de 190 aprovações no exterior – promoveu a 1a edição da Feira Etapa de Universidades Internacionais. O evento gratuito, além de contar com a presença de alunos e pais, também foi aberto ao público em geral. Nos dois dias – 26 de agosto, na unidade de Valinhos, e 27, em São Paulo – a feira recebeu mais de 500 inscritos e reuniu 36 instituições de ensino de países como Estados Unidos, Austrália, Inglaterra, França, Portugal, Japão, Itália, entre outros. “Muitos alunos nos procuraram para saber sobre os programas de bolsa de estudo e o processo para fazer faculdade no Canadá. Foi muito bom ter esse contato direto com eles”, disse Tally Kirschner, representante regional da University of British Columbia (UBC). Representantes das instituições responderam as dúvidas dos estudantes, informando sobre processos de admissão, programas de bolsa de estudos, opções de cursos, acomodações e grade curricular. Uma oportunidade para os jovens que planejam estudar no exterior ou que queriam avaliar essa possibilidade. Durante o evento, os visitantes também tiveram a oportunidade de participar de palestras com representantes do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD), Education in Ireland (Irlanda), Nuffic Neso Brazil (Holanda), Campus France Brasil (França), British Council (Inglaterra) e Education USA (Estados

Unidos da América). Também marcaram presença membros do Consulado Geral do Canadá e o cônsul do Japão Tomohiro Yanagisawa. O sonho de Bruna Marin, 16 anos, é cursar Direito no Japão. Acompanhada pelo pai Marco Aurélio Marin, ela foi à feira em busca de mais informações e ficou satisfeita. Durante a palestra, o cônsul japonês falou sobre o processo seletivo que oferece bolsas de estudo para graduação e pesquisa de 100%


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ESPECIAL

para alunos estrangeiros estudarem no Japão. “Durante a entrevista para a bolsa de estudos sempre perguntamos por que o jovem quer estudar no Japão. O objetivo de estudar lá tem que estar muito claro”, afirmou Tomohiro Yanagisawa. Com 80 nacionalidades diferentes e diploma reconhecido pela União Europeia, a Universidade de Coimbra era uma das instituições também presentes e já tem um gabinete exclusivo para atender os alunos brasileiros, o que chamou a atenção de Sibely Coelho, mãe de Victor Coelho, aluno do Curso Etapa, que sonha estudar Medicina Veterinária na Flórida. Ele foi à feira conhecer

outras opções de faculdades: “O processo seletivo das universidades fora do país é muito complexo e o Etapa nos ajuda a entender a seleção e chegar lá. Essa feira é muito esclarecedora até para cogitar novas possibilidades”, disse Sibely Coelho. Opinião compartilhada pelo aluno Bruno Momesso, 3a série do Ensino Médio do Colégio Etapa: “Eu sinto que estou conhecendo melhor as universidades, porque vai além de uma pesquisa vaga na internet. Aqui você entende o que é a universidade e o que é importante na hora do processo de seleção”.

AGENDA CULTURAL

São Paulo – Clube de Cinema (quintas, das 19 h às 21 h, sala 65) 15.09 – 2001 – Uma odisseia no espaço (Stanley Kubrick: 1968) 22.09 – Dívida de sangue (Elliot Silverstein: 1965) São Paulo – Clube de Debate (quinzenal, das 19 h às 21h50min, sala 87) 19.09 – “Arte, consumo e sociedade” São Paulo – Clube do Livro (terça, das 19 h às 21 h, sala 65) 13.09 – Taxidermia (Flávia Côrtes) Valinhos – Clube de Cinema (sextas, das 14h05min às 16h05min, sala 209) 09.09 – Labirinto de mentiras (Giulio Ricciarelli: 2014) 16.09 – O regresso (Alejandro González Iñárritu: 2016) 23.09 – Os oito odiados (Quentin Tarantino: 2016) Valinhos – Clube de Debate (quinzenal, das 14h05min às 17h45min, sala 214) 22.09 – “Arte, consumo e sociedade” Valinhos – Clube do Livro (terça, das 14h05min às 15h45min, sala 209) 13.09 – Viagens de Gulliver: Primeira parte – Viagem a Lillipute (Jonathan Swift)

Jornal do Colégio

Jornal do Colégio ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343


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