Jornal do Colegio - 615

Page 1

615

Jornal do Colégio JORNAL DO COLÉGIO ETAPA  –  2016  •  DE 23/09 A 06/10

ENTREVISTA

“Nunca fui uma aluna excelente e não achava que ia passar direto.” Débora Yuri Shigematsu acaba de se formar em Engenharia Civil. Entrou na Poli direto do colégio – mas teve dúvidas sobre a carreira no começo. Pensou em mudar para Administração, mas persistiu e hoje pensa em sua pós-graduação na própria Poli. Trabalha na gestão de obras e pretende ser empreendedora, desenvolvendo negócio próprio. Na entrevista destaca a eficiência como qualidade do engenheiro da Poli.

Débora Yuri Shigematsu

JC – Como foi a escolha da carreira, Engenharia Civil?

No 3o ano o vestibular mudou sua rotina de estudos?

Débora – Eu sempre quis fazer Administração. Engenharia foi mais pela influência dos meus pais e dos amigos. Eles falavam que eu ia bem em Exatas e daria uma boa engenheira. Como tinha afinidade com a área da construção, acabei escolhendo Engenharia Civil.

Não mudei muita coisa na carga horária de estudos. Eu tinha ido bem como treineira no 2o ano e estava um pouco mais tranquila. Mas, como queria prestar Administração também, fiz Reforço para GV. E fiz todos os simulados.

Afinidade com construção por quê?

Claro. Eu nunca fui uma aluna excelente e não achava que ia passar direto.

Meu pai sempre gostou de construir. E ele tem empreendimentos pequenos e eu ia para as obras; gostava de ver as casas. Gosto de Arquitetura também, só que me achava sem um lado criativo, artístico, forte.

Você chegou a considerar a possibilidade de não passar?

Qual seria seu plano se não passasse? Eu ia fazer o cursinho aqui no Etapa. Já estava matriculada.

Além da Fuvest, você prestou quais vestibulares?

Como foi seu início na Poli?

Prestei Unicamp para Engenharia de Alimentos, UFSCar para Engenharia de Produção e GV para Administração de Empresas. Passei direto na Poli, Unicamp e na GV. Na UFSCar fiquei na lista de espera e teria passado, mas não declarei interesse na vaga, já que tinha passado em outras.

Aqui tem todo um método para você seguir. Lá é tudo muito livre e demorei um tempo, quase um semestre, até me acostumar. É um mundo diferente, mas não senti dificuldade. Na verdade, gostei muito dos novos ares.

Por que escolheu a Poli?

Em relação à carreira, você chegou a ter dúvidas quando já estava na Poli?

Pelo nome da Poli, da USP, e pela localização. De onde eu moro é muito fácil chegar lá.

Cheguei a ter dúvidas no ciclo básico, que não tinha matérias de Engenharia. Na estrutura antiga eu não tive nenhuma maté-

ENTREVISTA

Carreira – Engenharia Civil

1

POIS É, POESIA Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa)

3

CONTO Miss Corisco – Antônio de Alcântara Machado

4

ARTIGO Prêmio destaca produção científica em Oncologia

5

ENTRE PARÊNTESIS

Mulheres não revelam idade

7

ESPECIAL Alunos do Etapa participam da Olimpíada Internacional de Linguística

Alunos conquistam medalhas de prata e bronze em olimpíada de História

7 8


2

ENTREVISTA

ria de Engenharia nos primeiros dois anos. Isso mudou. Agora, em novo formato, desde o 1o ano tem introduções; já tem o gostinho de Engenharia.

Como você se saiu nas matérias nessa fase inicial? No primeiro semestre eu fui muito bem. No segundo semestre comecei a patinar. Vi as matérias que tinha e falei: “Isso não vai acabar nunca. Não quero mais”. Muito distante do que eu estava pensando que era Engenharia. Reprovei em muitas matérias. Fiquei um tempo, da metade de 2008 até o começo de 2011, fazendo poucas matérias e estudando outras possibilidades. Cheguei a pensar em ir para a GV ou FEA, mas me mantive no curso.

O que levou você a ficar na Poli? Eu tive uma ideia uma vez de que queria ser empreendedora e percebi que com o que já tinha aprendido, apesar de fazer menos matérias, tomei gosto pela Engenharia Civil. Consegui construir uma perspectiva e continuar na Poli até me formar.

Nesse tempo em que pegou poucas matérias, você fez o quê? Comecei a jogar handebol com o time da faculdade. Dediquei-me bastante a isso. Os treinos eram três vezes por semana. Ia a todos os treinos, a todos os campeonatos. E nas férias entre o 1o e o 2o ano, de 2008 para 2009, fiquei no Novo México durante três meses. Trabalhei numa estação de esqui, na parte da cafeteria. No final viajei um pouquinho.

Isso teve ligação com a Poli? Não. Foi por um programa que se chama Working and Travel. Fiz de novo entre o 3o e o 4o anos, de 2011 para 2012. Nessa segunda vez fui para a Califórnia, também numa cidade com estação de esqui. Trabalhei num mercadinho local.

No biênio, que matérias você teve? Física, Cálculo, Álgebra Linear, Cálculo Numérico, Química Tecnológica, Materiais. No 2o ano você já faz matérias da Grande Área de Engenharia Civil e Ambiental.

Como se desenvolve o curso de Engenharia Civil na Poli? Dentro da Civil tem quatro departamentos: Construção Civil, Transportes, Hidráulica e Estruturas. Você pode escolher. Em Transportes vai construir estradas, aeroportos. Em Hidráulica vai construir barragens, portos. Construção Civil pega toda a parte executiva, vê quais são os processos de construção, controle de qualidade, como construir um edifício, como otimizar a produção de uma obra. E Estruturas trata de tudo que envolve concreto. O curso da Poli é muito forte em concreto, na estrutura de prédios, barragens, pontes. Essas grandes áreas acabam se ligando em algum momento, mas até elas se ligarem tem chão.

No 3o ano, o que você começa a ver nas aulas? Começa a ver os quatro departamentos juntos. No começo parece uma coisa muito independente uma da outra, mas não é assim. No 3o ano é só Estrutura, no 4o só Transporte.

No último ano o que você tem que fazer? O TCC e estágio.

Qual foi o tema de seu TCC? O tema foi “Indicadores de Resíduos de Construção Civil”. Os resíduos, hoje em dia, aqui em São Paulo principalmente, estão custando cada vez mais dentro de uma obra por causa da logística de disposição. Você tem que pagar para levar todos aqueles

quilos de concreto para algum lugar e tem que pagar pelo lugar que os recebe. Essa parte gira 5% de uma obra inteira.

A partir de quando você começou a estagiar? Comecei a estagiar em junho de 2014. Com a crise estava difícil achar estágio. O primeiro que fiz foi numa consultoria que ajuda empresas a obter a certificação ambiental de um prédio. Fiquei quase um ano lá.

O que você fazia nesse trabalho? Eu basicamente ajudava a redigir os relatórios que era preciso fazer e participava da parte executiva das obras. Com o fim de conseguir a certificação, eu visitava as obras e meio que fiscalizava. Apontava que a certificação pede isto e isto, deve ser feito isto e isto. Ia para a obra ver se estavam fazendo as coisas que a gente recomendava. Depois participei de algumas auditorias. A gente, junto com a empresa, passa pela auditoria para conseguir o certificado.

Depois desse estágio, o que você fez? Fui para o emprego em que estou hoje, no qual faço a gestão das obras.

O que você aprendeu nos estágios? Nos primeiros deu para ter uma ideia de como funciona uma empresa. Aprendi a lidar com os clientes, aprendi a lidar com obra, que eu tinha que visitar sempre. Percebi que a Engenharia Civil tem um controle de qualidade meio difícil. Isso você só percebe indo para a obra e trabalhando. Toda a bagagem de obras e de controle de qualidade que eu tinha antes eu trouxe comigo e estou tentando aplicar. Agora, sou eu que faz a obra. Tento aplicar na gestão algumas coisas que aprendi.

Qual é a importância do estágio na formação do engenheiro? Eu acho extremamente importante. Vejo que pelo menos na parte executiva de Engenharia Civil o engenheiro que tem mais prática consegue se sair melhor no começo.

Como avalia sua formação na Poli? O maior mérito que tenho como engenheira formada na Poli é a resiliência. Você é treinada para resolver problemas. Você tenta, se dedica, se não dá certo tenta de outro jeito. Você é treinada para aprender sozinha a se virar, a modelar a realidade e resolver o problema. Acho que o engenheiro da Poli aprende a ser eficiente.

Como está hoje a questão de emprego? Não tenho quase nenhum amigo desempregado. De todos os meus amigos que se formaram antes e mesmo agora comigo, metade das pessoas seguiram outras carreiras, consultorias, bancos de investimentos, e ganham bem, melhor do que o piso salarial do engenheiro. A outra metade, que resolveu ficar na Engenharia, demorou para achar emprego, mas achou.

Além da Engenharia, quais são os campos em que o engenheiro pode atuar? Além de consultoria estratégica e banco, eu vejo que empresas de marca costumam contratar engenheiros para pesquisas de mercado, para a parte analítica. Não importa se engenheiro civil, engenheiro de produção ou engenheiro mecânico, todos têm capacidade analítica.

Você se formou agora no meio do ano na Poli. Pretende continuar estudando, fazer pós-graduação, um MBA? Pretendo. Penso até em dar continuidade ao meu trabalho de formatura na parte de resíduos, acho uma parte interessante.


ENTREVISTA Isso mais para frente; quero esperar um pouco. Mas penso em fazer um mestrado, um doutorado, na própria Poli.

Como você se imagina profissionalmente daqui a 10 anos? Tenho uma queda para ser empreendedora. Sempre fui mais independente; busco resolver as coisas meio que do meu jeito. Percebo que o ambiente empresarial é mais constante. Trabalhando com CLT você tem um emprego meio que garantido e um monte de benefícios. É mais cômodo, eu diria. Como empreendedor você está sujeito a perder, mas, em compensação, se tudo corre bem você é que vai ganhar. Sempre gostei da ideia de fazer o meu negócio e colocar minha ideia, meu projeto em prática. Pretendo ter meu próprio negócio e daqui a 10 anos acho que dá.

3

meta, atingir seu objetivo. Acho que isso foi o principal que o colégio me ensinou. O colégio me deu muita base. Com o jeito como eles ensinam as coisas, acho que consegui ir melhor na faculdade. Eu estava um passinho à frente. Fora que o Etapa fica num lugar ótimo, descobri São Paulo. Sempre fazia atividades culturais, ia para a Casa das Rosas, ia para o Itaú Cultural, via muitos filmes, mostras de cinema. Aproveitei bastante essa parte também.

Que recordações você tem do colégio? Eu lembro dos professores com o maior carinho. São ótimos, excelentes. Lembro dos simulados. E dos amigos. Eu continuo falando com eles. Gosto muito das amizades que fiz aqui.

Em que área?

Que dicas você pode dar a quem vai prestar vestibular no fim do ano?

Não tenho certeza, mas presumo que seja na área em que estou trabalhando agora, imóveis.

Diria para ficar calmo, tranquilo. Você vai ter uma recompensa pelo que estudou.

Como o colégio foi importante para você na Poli?

O que mais você quer dizer para o aluno que está se formando?

O que eu trouxe comigo do colégio foi disciplina. Aprendi que você é capaz de fazer as coisas. Com um plano, com um programa bem feito, com disciplina você consegue cumprir sua

Aproveite esta fase de estudos, que é muito boa. E aproveite o colégio, ele dá muitas ferramentas para você ter sucesso.

POIS É, POESIA

Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa) XXXVIII

B endito seja o mesmo sol de outras terras

Que faz meus irmãos todos os homens Porque todos os homens, um momento no dia, o olham como eu, E nesse puro momento Todo limpo e sensível Regressam lacrimosamente E com um suspiro que mal sentem Ao homem verdadeiro e primitivo Que via o Sol nascer e ainda o não adorava. Porque isso é natural – mais natural Que adorar o ouro e Deus E a arte e a moral...

XXXVI

E há poetas que são artistas

E trabalham nos seus versos Como um carpinteiro nas tábuas!... Que triste não saber florir! Ter que pôr verso sobre verso, como quem constrói um muro E ver se está bem, e tirar se não está!... Quando a única casa artística é a Terra toda Que varia e está sempre bem e é sempre a mesma.

Penso nisto, não como quem pensa, mas como quem respira, E olho para as flores e sorrio... Não sei se elas me compreendem Nem sei eu as compreendo a elas, Mas sei que a verdade está nelas e em mim E na nossa comum divindade De nos deixarmos ir e viver pela Terra E levar ao solo pelas Estações contentes E deixar que o vento cante para adormecermos E não termos sonhos no nosso sono.

VI

Pensar em Deus é desobedecer a Deus,

Porque Deus quis que o não conhecêssemos, Por isso se nos não mostrou... Sejamos simples e calmos, Como os regatos e as árvores, E Deus amar-nos-á fazendo de nós Belos como as árvores e os regatos, E dar-nos-á verdor na sua primavera, E um rio aonde ir ter quando acabemos!... Extraído de: “Poemas completos de Alberto Caeiro”. In: Obra poética. Ed. Aguilar, 1965.


4

CONTO

Miss Corisco Antônio de Alcântara Machado

E

mbora alguns nacionalistas teimassem em chamá-la de senhorita, o título oficial era Miss Corisco. Dez casas no bairro tomavam conta da igreja pobre que primeiro nem caixa de esmolas tinha. Depois compraram uma caixa. Mas nunca viu um tostão porque o dinheiro que havia se gastou todo com ela. Miss Corisco foi eleita pelo sistema de exclusão. A filha do Bentinho era sardenta. A irmã do João tinha um defeito nas cadeiras. Logo de saída a Conceição se impôs: foi aclamada Miss Corisco. Aí deu uma entrevista para o O Cachoeirense. Perguntaram: Qual a maior emoção de sua vida? Respondeu: Três: minha primeira comunhão, uma fita do Rodolfo Valentino que eu vi na capital do meu querido Estado e... não conto porque é segredo. Respeitamos o segredo (escreveu o jornal), pois naturalmente encobria uma linda história de amor. Depois perguntaram: Qual o seu maior desejo? Respondeu: Sempre ver o Brasil na vanguarda de todos os empreendimentos. Resposta admirável (comentou O Cachoeirense) que revela em Miss Corisco uma patriota digna de emparelhar com Clara Camarão, Anita Garibaldi, Dona Margarida de Barros e outras heroínas da nacionalidade. Finalmente perguntaram: O que pensa do amor? Respondeu: O amor, na minha fraca opinião, é uma coisa incompreensível mas que governa o mundo. Palavras (acentuou o órgão) que encerram uma profunda filosofia muito de admirar atentos o sexo e a juventude da encantadora Miss. Miss Corisco foi retratada em várias posições: com um cachorrinho no colo, apanhando rosas no jardim, as costas das mãos sustentando o queixo. Deu também um autógrafo. Papel cor-de-rosa de bordas douradas, risquinhos de lápis para sair bem direitinho e as letras se equilibrando neles. O cunhado ditou. Os representantes de O Cachoeirense se retiraram. Miss Corisco foi varrer a cozinha como era de sua obrigação todos os dias inclusive domingos e feriados e na manhã seguinte tomou a jardineira em companhia do irmão casado para comparecer na cidade perante o júri estadual. O Cine-Teatro Esmeralda estourava de tão cheio. No palco atrás do júri a Corporação Musical C. Gomes-G. Puccini tocava dobrados. De minuto em minuto a assistência entusiasmada erguia vivas ao Brasil e à raça. As candidatas desfilaram vestidas com apurado gosto. Os juízes eram cinco: um brasileiro, dois italianos, um filho de italiano e um português. Predominava neles o espírito nacionalista. Queriam escolher um tipo bem brasileiro. O doutor Noé Cavalheiro desenhou em dois traços incisivos o tipo-padrão: boca grande e olhos ternos. Miss Corisco foi eleita Miss Paraíba do Sul por quatro votos. Ouviu então o primeiro discurso que foi proferido com emoção que lhe embargava a voz e lenço de seda na mão, pelo doutor Noé Cavalheiro, segundo promotor público. Principiou este fazendo o elogio da beleza notadamente da beleza feminina. Falou do culto que na antiga Grécia se votava à formosura física. Acentuou depois a desvantagem de uma mens sana desde que não seja num corpore sano. Disse que a beleza da mulher se tem provocado guerras e catástrofes tem também mais de uma vez contribuído para o progresso geral dos povos, citando vários exemplos históricos. Prosseguiu afirmando que o Brasil

deveu muito do amor que lhe dedicou D. Pedro I à influência benéfica da Marquesa de Santos. Referiu-se à competência do júri, à sua isenção de ânimo e confessou que a única nota dissonante tinha sido ele orador, o que provocou os protestos unânimes da assistência. Perorando entoou um hino inflamado à peregrina formosura de Miss Corisco. Disse então: Unindo à beleza clássica da Vênus de Milo a sedução estonteante da lendária rainha de Nínive, Miss Paraíba do Sul, maior do que Beatriz e mais feliz do que Natércia, conquistou o coração de toda uma região! A Pátria não é somente, como soem pensar certos espíritos imbuídos de materialismo, ou a lei que garante a propriedade privada! A Pátria é mais alguma coisa, alguma coisa de sublime e divino! A Pátria é a estrela que nos contempla do céu e a mulher que nos santifica o lar! A Pátria sois vós, Miss Paraíba do Sul, são os vossos olhos onde se espelham todas as forças viris da nacionalidade! Para nós, patriotas, conscientes e eternos enamorados da Beleza, Miss Paraíba do Sul é neste momento o Brasil! (Aplausos prolongados. O orador é vivamente cumprimentado. Vozes sinceras gritam: Bis! Bis!) Um a um os membros do júri beijaram as mãozinhas róseas e espirituais de Miss Paraíba do Sul enquanto a Corporação Musical C. Gomes-G. Puccini, sob a regência do maestro Pietro Zaccagna, atacava vigorosamente a imortal protofonia do Guarani. Muito vermelha e batendo com ar ingênuo as pálpebras aveludadas, Miss Paraíba do Sul concedeu então as primeiras entrevistas. Externou sua opinião sobre a futura sucessão presidencial, a cultura da laranja, a questão religiosa no México, Mussolini, padre Cícero, a estabilização cambial, Victor Hugo, Coelho Neto, os perfumes nacionais, a sentença que absolveu Febrônio, o diabo. No Grande Hotel Mundial era uma romaria de manhã à noite. Muito afável, Miss Paraíba do Sul recebia toda a gente com um encantador sorriso brincando nos lábios purpurinos. O camareiro do apartamento chegou a declarar quando entrevistado por um jornalista: É de uma amabilidade extraordinária. Recebe todos. Quem bate no quarto entra. Mas o irmão, pelo sim, pelo não, caiu de bofetadas em cima do camareiro. O caso foi parar na polícia onde o prestígio de Miss Paraíba do Sul conseguiu arranjar tudo do melhor modo possível. Puseram à sua disposição um automóvel fechado, uma máquina de escrever portátil e um binóculo de corridas. Todos os dias choviam os presentes. O futuroso arquiteto Barros Jandaia pôs gratuitamente seus serviços profissionais às ordens de Miss Paraíba do Sul. O cabeleireiro não lhe quis cobrar nada e ainda por cima lhe deu vinte vales dando direito a outras tantas lavagens com Pixavon. A Livraria Cosmopolita ofereceu um rico exemplar do Paraíso perdido. E assim por diante. Miss Paraíba do Sul foi recebida em audiência especial pelo presidente do Estado, respondeu com muita graça às perguntas de S. Exa. e distribuiu cigarros Petit Londrinos (ovalados) aos presos da cadeia pública. Visitou também a Câmara Municipal. Aí foi saudada por um vereador que a comparou à mimosa violeta dos nossos vergéis que não só atrai pela beleza como prende pelo seu perfume e conquista pela sua modéstia exemplar. Foram quinze dias bem cheios. Repletos. Não houve um minuto de folga. Miss Paraíba do Sul embora delicadamente


CONTO deixou transparecer que a glória era um fardo pesado demais para seus ombros frágeis. E seguiu de vagão especial para a capital do país. Todas as cidades do percurso enviavam à estação o juiz de direito, o promotor, o delegado, o prefeito, o coletor federal e o sacristão da matriz que se incumbia dos foguetes. O trem apitava, as palmas estalavam com o vivório, o trem seguia. Miss Paraíba do Sul chegou ao Rio com uma dor de cabeça que não aguentava mesmo. Começou a torcida brava. Para disfarçar, festas e mais festas. E sonetos na seção livre dos jornais. E bilhetes de apaixonados anônimos. E baile na torpedeira Paraíba do Sul. E retratos de todo o jeito nas revistas. E chás com as rivais. E tesouradas gostosas nas rivais. E entrevistas, entrevistas, entrevistas. Um repórter mais audacioso penetrou no quarto de Miss Paraíba do Sul e tirou uma fotografia muito original. Com efeito. No dia seguinte o povo carioca abrindo o jornal deu de cara com um pé de sapato enquadrado pela seguinte nota: Enquanto Miss Paraíba do Sul jantava, conseguimos penetrar no seu aposento e cometemos a deliciosa maldade de fotografar um perfumado sapatinho que se encontrava sobre o toucador. Levamos a nossa indiscrição ao ponto de verificarmos o número: era trinta e três e meio! Para encanto dos nossos leitores publicamos um clichê do sapatinho da nova Maria Borralheira da Graça e da Beleza. Coisas assim comovem. Miss Paraíba do Sul deu ao repórter como lembrança o famoso sapatinho. Mesmo porque (observou muito bem o irmão casado) já estava imprestável com a sola até fura não fura. Enorme multidão teve a felicidade de vê-lo exposto na redação do jornal. Não houve um parecer discordante: era de fato um amor de sapatinho. Enfim vieram as provas do concurso. Miss Paraíba do Sul passeou de roupa de banho para os velhos do júri apreciarem bem as formas dela e submeteu-se ao exame antropométrico no Museu Nacional. Sua ficha foi discutida nas sociedades científicas, empolgou a imprensa, provocou desinteligências entre pessoas que se davam desde os bancos escolares. Tudo inútil porém. Miss Paraíba do Sul não foi considerada a mais digna de representar o Brasil no torneio de Galveston. Chorou de verdade. Não se pode negar. Chorou. Mas isso no hotel. Em público não perdeu a linha. Era toda sorriso dian-

5

te de Miss Brasil. Entrevistada, declarou que a escolha do júri tinha sido justa. Admiradores seus protestaram com energia. Um grupo de estudantes deitou manifesto a seu favor. Ela sorria agradecida e dizia coisas amáveis a respeito de Miss Brasil. Foi consagrada a Miss Pindorama, a Miss Terra de Santa Cruz, a Miss Simpatia Verde-Amarela. Todos reconheceram que a vitória moral lhe pertencia. Era um consolo. De volta à capital do seu Estado, no entanto, ela resolveu mudar de atitude. Criticou duramente a decisão do júri. Miss Brasil? Uma beleza sem dúvida. Mas beleza impassível. E que vale a formosura sem a graça? Depois sem gosto algum. Cada vestido que só vendo. Todos de carregação. E era visível nos seus traços a ascendência estrangeira. O Brasil seria representado em Galveston. A raça brasileira não. E por aí foi. Nem os organizadores do concurso escaparam. Amáveis, sim. Porém parciais. Um deles, careca barbado, vivia amolando as candidatas com galanteios muito bobos. Por isso mesmo levou um dia a sua. Uma das concorrentes lhe perguntou: Por que não corta um pedaço da barba e gruda na cabeça para fingir de cabelo? Disse isso sim. Como não. Na cara. Como não. E perto de gente. Ora se. Ele ficou enfiado. Corisco recebeu de luto na alma a sua Vênus. O pai de Miss Paraíba do Sul sacudiu a cabeça murmurando: Que injustiça! Que injustiça! Inutilmente ela e o irmão casado falavam na vitória moral, na simpatia do povo, nos protestos da imprensa. Ela contava: Uma vez quando saía do hotel um popular me disse que eu era a eleita do coração dos brasileiros! Então, papai, que tal? Mas o velho não se convencia. É. Muito bonito. Realmente. Mas os oitenta e quatro contos foi outra que abiscoitou. Aí é que está. Os oitenta e quatro contos foi outra que abiscoitou. Injustiça. Injustiça. O Brasil vai de mal a pior. Mas depois era preciso jurar que não, que o Brasil ia muito bem, que a vitória moral era mais que suficiente, que dinheiro não faz a felicidade de ninguém porque Miss Corisco, Miss Paraíba do Sul, Miss Pindorama, Miss Terra de Santa Cruz, Miss Simpatia Verde-Amarela começava a chorar. Extraído de: Contos de Alcântara Machado.

ARTIGO

Prêmio destaca produção científica em Oncologia Rodrigo de Oliveira Andrade/Pesquisa FAPESP

A

criação de novas estratégias de combate ao câncer é a ganhadora da sétima edição do Prêmio Octávio Frias de Oliveira, concedido em três categorias pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) em parceria com o Grupo Folha. A premiação foi realizada na noite de terça-feira (09/08) no teatro da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) e laureou pesquisadores cujos estudos levaram à

obtenção de uma molécula com atividade antitumoral e anticoagulante e de marcadores biológicos da saliva que podem indicar a evolução de um tipo comum de câncer de boca. Os vencedores na categoria Inovação Tecnológica em Oncologia são pesquisadores do Laboratório de Bioquímica do Instituto Butantan, coordenados por Ana Marisa Chudzinski-Tavassi. Como resultado de uma pesquisa iniciada em 2006, eles obtiveram uma proteína a partir da glândula salivar do carra-


6

ARTIGO

pato-estrela (Amblyomma cajennense) com potencial para se tornar um medicamento antitumoral e anticoagulante. Em testes in vitro, a proteína, chamada Amblyomin-X, inibiu a proliferação de 23 linhagens de células tumorais humanas, sem, no entanto, agir sobre as células sadias. Os pesquisadores verificaram também que a Amblyomin-X, inicialmente caracterizada como anticoagulante, tem afinidade por células tumorais. Uma vez incorporado por elas, reduz a atividade do proteassoma, estrutura responsável pela eliminação de resíduos do metabolismo celular, e das mitocôndrias, responsáveis pela respiração celular. Como resultado, a célula entra em apoptose (morte celular programada) e a proliferação das células tumorais é interrompida. Com seu mecanismo de ação esclarecido, a Amblyomin-X foi submetida a testes pré-clínicos em modelos animais (camundongos e coelhos), os quais indicaram uma toxicidade aceitável. Mais recentemente, foi iniciada a transferência da tecnologia de produção escalonada para uma empresa farmacêutica nacional, a União Química, com a qual trabalha em colaboração neste projeto. A parceria foi concebida no âmbito do Centro de Toxinas, Resposta Imune e Sinalização Celular (CeTICS), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP. O projeto conta ainda com apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Se tudo correr bem, os ensaios clínicos para avaliar a segurança do produto em seres humanos devem começar no primeiro semestre de 2017 envolvendo pacientes de diferentes hospitais”, disse Tavassi, que é a coordenadora de Inovação do CeTICS. A expectativa é que o possível medicamento se mostre eficaz contra o melanoma, o câncer de pâncreas e o renal.

Marcadores para câncer de boca Na categoria Pesquisa em Oncologia foram premiados pesquisadores do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), em Campinas, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas (FOP-Unicamp) e do próprio Icesp. Eles verificaram que proteínas da saliva podem indicar a evolução do carcinoma oral de células escamosas (OSCC), um tipo bastante comum de câncer de boca. Em um estudo publicado em 2015 na revista Scientific Reports, da Nature, o grupo, coordenado por Adriana Franco Paes Leme, do LNBio, comparou as proteínas de amostras de saliva e de vesículas extracelulares salivares de dez indivíduos saudáveis e de 20 com OSCC, com e sem lesão ativa, por meio da técnica de proteômica baseada em espectrometria de massas. A análise mostrou diferenças significativas na composição de proteínas da saliva, permitindo uma classificação dos indivíduos saudáveis e com câncer oral com 90% de acurácia. O estudo fortalece a possibilidade de uso de proteínas da saliva como marcador biológico complementar não invasivo da progressão de tumores de boca. O grupo de pesquisa pretende agora avaliar amostras de saliva, sangue e tecidos de um

número maior de indivíduos saudáveis e com lesões orais, ativas ou não, para validar essa nova abordagem. “A saliva se mostrou uma potencial fonte de marcadores de prognóstico que podem ajudar na decisão do tratamento. Isso é animador porque se trata de um fluido que pode ser obtido sem a necessidade de procedimentos invasivos”, disse Paes Leme.

Menção honrosa O médico baiano Aristides Pereira Maltez Filho ganhou uma menção honrosa pela consolidação de uma das mais antigas instituições de combate ao câncer no país, o Hospital Aristides Maltez (HAM), em Salvador. Formado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) em 1957, Maltez assumiu em 1992 a presidência da Liga Bahiana Contra o Câncer (LBCC), em Salvador, prosseguindo o trabalho do pai, Aristides Maltez, que idealizou um instituto para atender pessoas carentes com câncer. Inaugurado com apenas 15 leitos em 1952, nove anos depois da morte de seu criador o HAM se tornou um dos principais centros de combate ao câncer no Nordeste. Como presidente da LBCC, instituição mantenedora do HAM, Maltez Filho implantou centros de radioterapia, unidades de terapia intensiva, centros de imagem, cuidados paliativos e assistência domiciliar, além de aumentar a capacidade do hospital para 232 leitos, destacando-se na especialização e no aprimoramento de profissionais de saúde e na implantação de campanhas de prevenção de câncer na Bahia. “Atendemos em média 3 500 pessoas por dia, exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde, o SUS”, disse.

Pesquisas premiadas têm apoio da FAPESP Os estudos premiados agora, coordenados por Tavassi e por Paes Leme, têm em comum o fato de contarem com financiamento da FAPESP. Desde que o Prêmio Octávio Frias de Oliveira passou a ser concedido para pesquisas em Oncologia, em todas as edições foram premiados cientistas que contaram com auxílio à pesquisa da FAPESP. Na edição de 2015, por exemplo, o vencedor na categoria Pesquisa em Oncologia foi um estudo coordenado por Dirce Maria Carraro, do A. C. Camargo Cancer Center. No ano anterior, os vencedores foram Luís Carlos de Souza Ferreira e Mariana de Oliveira Diniz, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP. Eduardo Magalhães Rego, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP e do Centro de Terapia Celular (um CEPID da FAPESP), levou a Menção Honrosa. Em 2013, André Luiz Vettore de Oliveira, da Universidade Federal de São Paulo, ganhou em Pesquisa em Oncologia. Iseu Nunes, da Farmabrasilis, e Wagner José Fávaro e Nelson Duran, da Unicamp, foram os premiados em Inovação Tecnológica em Oncologia. Extraído de: Agência FAPESP – Divulgando a cultura científica, ago./2016.


(ENTRE PARÊNTESIS)

7

Mulheres não revelam idade 32

Lina

25

Nélia

30

Zélia

30

Zali

30

Meire

Idade

Nome

Cinco mulheres, sendo três de 30 anos, uma de 25 e uma de 32, foram entrevistadas, e soube-se que: duas são casadas com técnicos em computação, uma com bancário e duas com médicos; RESPOSTA quatro têm três filhos, e uma, dois; Nélia não é a mais velha, e a mais nova não é Zali; a bancária não casou com o bancário, nem é a mais velha, que casou com médico, como a mais nova; Lina tem três filhos e não casou com técnico em computação, exatamente como Zélia, que não é a mais velha; Meire casou com técnico em computação e não tem dois filhos; Zélia não casou com médico, e Zali tem três filhos, cujo pai não é médico. Descubra a idade das mulheres. 3

2

3 3

médico

médico

bancário

técnico em computação técnico em computação

3

Profissão do marido

No de filhos

ESPECIAL

Alunos do Etapa participam da Olimpíada Internacional de Linguística Equipe brasileira competiu com 30 países em Mysore, Índia.

O

Brasil conquistou uma medalha de bronze na 14a Olimpíada Internacional de Linguística (International Linguistics Olympiad – IOL), para estudantes do Ensino Médio, realizada em Mysore, Índia, de 25 a 29 de julho. O aluno Bruno Kenzo Ozaki, da 3a série do Colégio Etapa, foi o estudante

premiado. Completaram a equipe brasileira Davi Kumruian, também na 3a série do Colégio Etapa, Ana Beatriz Rodrigues de Carvalho Nunes, Takerou Hayashi Sato e Yumiko Hayashi Sato. Eles competiram com mais de 40 equipes de 30 países, em dois dias de provas individuais e em grupo sobre áreas


8

ESPECIAL

como linguística, fonética, morfologia e semântica. O Brasil é o único país da América Latina a participar da competição. A primeira Olimpíada de Linguística foi realizada em 1965 em Moscou. Depois expandiu-se por diversos países até

tornar-se uma competição internacional em 2003, quando houve a primeira edição da IOL em Borovets, Bulgária. A 15a Olimpíada Internacional de Linguística está prevista para 29 de julho a 4 de agosto de 2017, em Dublin, Irlanda.

Alunos conquistam medalhas de prata e bronze em olimpíada de História Mais de 30 mil estudantes e professores de todo o país participaram da competição cultural.

A

lunos do Colégio Etapa conquistaram medalhas de prata e bronze na 8a Olimpíada Nacional em História do Brasil, organizada pelo Departamento de História da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Na competição, voltada para estudantes do 8o ano do Ensino Fundamental à 3a série do Ensino Médio, cada equipe é composta por três alunos e um professor orientador. A edição da olimpíada deste ano começou em maio com cinco provas online de testes de múltipla escolha, mesclando questões sobre os períodos da história brasileira e atualidades. Na final, presencial, realizada nos dias 20 e 21 de agosto, em Campinas, São Paulo, 275 equipes, com cerca de mil participantes, responderam a questões dissertativas. A equipe Portugueses Desnudos, formada pelos alunos Bruna Bimbatti Nogueira Cesar, Lívia Maria de Aguiar Graever e Marcos Magalhães, da 3a série do Colégio Etapa, conquistou a medalha de prata e a equipe Intellectum, dos alunos Pedro Henrique Gianjoppe dos Santos, Luiz Felipe Nallin Sabbatini e Gianmarco Galardi de Mello Ribeiro, da 2a série, ganhou medalha de bronze.

Jornal do Colégio

Segundo Thomas Wisiak, coordenador da equipe de História do Colégio Etapa, na competição, o aluno analisa imagens e textos, estabelece relações entre o presente e o passado, reflete sobre questões de atualidade e aprende a trabalhar em grupo.

AGENDA CULTURAL São Paulo – Clube de Cinema (quintas, das 19 h às 21 h, sala 65) 29.09 – Laranja Mecânica (Stanley Kubrick: 1971) 06.10 – Ed Wood (Tim Burton: 1994) São Paulo – Clube de Debate (quinzenal, das 19 h às 21h50min, sala 87) 03.10 – Brasil, uma democracia racial? São Paulo – Clube do Livro (terça, das 19 h às 21 h, sala 65) 08.11 – As ruínas circulares (Jorge Luis Borges) Valinhos – Clube de Cinema (sextas, das 14h05min às 16h05min, sala 209) 23.09 – Os oito odiados (Quentin Tarantino: 2016) 30.09 – Anna Karenina (Joe Wright: 2012) 07.10 – Black Mirror. Episódios: “The National Anthem”; “Fifteen Million Merits” (Otto Bathurst/Euros Lyn: 2013) Valinhos – Clube de Debate (quinzenal, das 14h05min às 17h45min, sala 214) 06.10 – Brasil, uma democracia racial?. Valinhos – Clube do Livro (terças, das 14h05min às 15h45min, sala 209) 27.09 – Sejamos todos feministas (Chimamanda Ngozi Adichie) 04.10 – Casa tomada (Julio Cortázar)

Jornal do Colégio ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.