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Jornal do Vestibulando
ENSINO, INFORMAÇÃO E CULTURA
JORNAL ETAPA – 2014 • DE 10/04 A 23/04
ENTREVISTA
Trabalhava. Fez o cursinho noturno. Em algumas provas a nota foi baixa. E foi o 62º dos 150 aprovados na FAU! Gabriel de Moura Corrêa fez o cursinho à noite e entrou na FAU-USP. Na carreira, pretende seguir a área de Projetos: “Quero construir uma coisa boa, habitação boa, quero saber projetar, montar um espaço onde as pessoas se sintam bem”.
Gabriel de Moura Corrêa Em 2013: Etapa Em 2014: Arquitetura FAU – USP
JV – Quando você escolheu Arquitetura como carreira? Gabriel – Foi há muito tempo, eu tinha uns 10 anos. Desde criança eu ficava com aqueles bloquinhos de construir e também gostava de desenhar. Depois, teve uma época em que comecei a pensar em ser jornalista. Mas decidi seguir Arquitetura mesmo. Na escola em que fiz o Ensino Médio fiz também curso técnico de Desenho de Construção Civil.
nas aulas. A aula é muito importante. Às vezes o professor dá uma dica que parece minúscula, mas resolve sua vida.
Quais eram as matérias em que você tinha mais dificuldade? Física. A parte de Eletricidade exige muita atenção. Às vezes pensava que não iria conseguir entender. De Química eu gostava muito, mas tinha umas dificuldades.
Além da Fuvest, você prestou quais vestibulares?
Em que matérias você tinha mais base?
Mackenzie, também para Arquitetura. Mais nenhum.
História e Geografia. Achava muito interessante. Inglês também.
Como conheceu o Etapa?
Você estudava no fim de semana?
No 3º ano do Ensino Médio muita gente falava que ia fazer cursinho no Etapa.
Sábado e domingo eu tentava pegar o que o professor tinha falado na semana, dar uma lida pelo menos.
Teve alguma matéria que você passou a gostar mais no cursinho? Gostava de Geografia, menos da Geografia Física. Isso passei a achar muito interessante aqui. Muito legal.
Como você resolvia as dúvidas sobre a matéria ou exercícios? Às vezes eu chegava com folga, dava para ir ao Plantão. Dependia do trânsito. Quando não conseguia chegar mais cedo, nos intervalos entre a saída e a chegada dos professores procurava resolver as dúvidas com o pessoal que estava lá estudando. Eu via quem tinha conseguido fazer o exercício e perguntava como tinha feito.
Em que matérias você ia mais ao Plantão de Dúvidas? Física, na parte de Elétrica.
Você confiava que poderia entrar na USP? Sim. Ia às aulas, fazia os exercícios, escrevia, aquele esforço todo. Comecei no noturno porque estava pensando em trabalhar, arranjar alguma coisa. Em julho veio o emprego.
Onde você foi trabalhar? Num escritório de Engenharia Civil. Foi meu primeiro emprego, legal, divertido, todo o pessoal atuante na área. O serviço começava à 1 hora, terminava às 6. Saía do escritório voando para chegar no cursinho. Chegava às vezes em cima da hora.
Como você estudava? Antes de começar a trabalhar eu chegava em casa, resolvia exercícios, procurava me informar. Depois, com o trabalho, a rotina ficou mais puxada. Eu acordava às 9 horas e estudava de manhã. Dava uma lida principalmente nas matérias em que tinha dificuldade. E prestava muita atenção
CONTO Último beijo de amor – Álvares de Azevedo
Você chegou a utilizar o Plantão Virtual?
Redação foi um peso na consciência. Devo ter feito duas redações. Não conseguia tempo. Aquilo que todo mundo fazia o ano inteiro, sacrificando fins de semana, eu falava: “Como vou passar?”. Eu devia ter feito. Era terrível para mim porque conseguia prestar atenção e fazer as outras matérias. Mas as partes que envolviam Redação, e também os simulados, eram mais pesadas para mim. No cursinho, o pessoal falava sobre as redações que tinham feito e eu ficava escutando a discussão deles. Na aula, prestava atenção no professor, no que era dito e ia agregando ideias.
Sim, mas só para ver as palestras sobre literatura.
Como você fazia isso de agregar as ideias? Você tem um ponto de vista, uma opinião, e tem de se expressar da forma mais clara possível. Tem de ter uma sequência, o que você quer dizer com aquilo. Ficava tentando encontrar isso na aula.
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ARTIGO O papel do imigrante na evolução do Brasil
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Descoberto gene que regula potencial de formação de tumores das células-tronco embrionárias
ENTREVISTA
Gabriel de Moura Corrêa
Como você estudou para Redação?
Você viu então as palestras em casa, no Etapa Online? Eu escutava as palestras sobre os livros no serviço. Isso “salvou a pátria”. O trabalho lá na empresa era tranquilo, dava para acompanhar.
E deu para resolver as questões de literatura no vestibular? No vestibular foi tranquilo. Mas, infelizmente, justamente no Til eu errei a questão. Era sobre a Berta como mulher misto de anjo e demônio. Eu sabia, o professor tinha falado sobre o tema, mas travou.
O que você fez nas férias de julho? Eu tentei recuperar o tempo perdido. Foi um pouco frustrante, não consegui resolver tudo que
ENTRE PARÊNTESIS
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Do baile
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SERVIÇO DE VESTIBULAR
Inscrições
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ENTREVISTA
tinha de resolver. Peguei para copiar as coisas, peguei para ler o que tinha deixado de lado, aprender mesmo naquelas semanas.
Quais atividades você tinha no final de semana? Eu ia para a igreja. Faço isso desde pequeno quando meus pais me levavam. Era uma atividade muito prazerosa para mim. Ia ao cinema e visitava parentes também, minha tia principalmente. Sou filho único e lá tem cinco. Eram estas as minhas atividades para relaxar.
Você achava que tinha mais chances na Fuvest ou no Mackenzie? No Mackenzie. Justamente porque é particular você imagina que o nível do vestibular é mais baixo. Para mim não foi. Não fui bem.
Você iria estudar no Mackenzie? Inicialmente meu plano era permanecer no emprego e conseguir uma bolsa no Mackenzie. O pessoal do serviço me dava muito gás para querer estudar lá. Na FAU o curso é integral, não tem como trabalhar. Depois que vi o resultado do Mackenzie – passei na 4ª lista – pensei: “E agora?”.
Se não passasse na Fuvest, o que você faria? Primeiro ia entrar em desespero. Depois provavelmente ia fazer cursinho de novo.
Durante o ano você tinha mais preocupação com a 1ª ou a 2ª fase da Fuvest? Minha preocupação era ir para a 2ª fase e não morrer na praia. Eu queria muito passar.
No ano anterior você prestou Fuvest também? Prestei. Fiquei 12 pontos abaixo da nota de corte.
Quais épocas foram mais pesadas para você? A época mais pesada foi quando esperava o resultado da 1ª fase. Um período difícil, de incerteza: “Será que deu certo?”.
Quantos pontos você fez na 1ª fase da Fuvest 2014? Eu fiz 54 pontos. Com bônus de escola pública subiu para 60.
A nota de corte para a FAU ficou em 57. O que achou de seu resultado? Ficou satisfeito? Estava inseguro. Conversei com alunos que fizeram 68, 70 pontos. “E agora?”. Como passei quase em cima do corte, tive de correr atrás do tempo perdido.
Para a 2ª fase mudou seu método de estudo? Mudou. Dei ênfase para as matérias em que eu tinha problema. Física, Química, algumas coisas de Matemática, Biologia. No conjunto, acho que dei uma melhorada.
Na 2ª fase, no primeiro dia, qual foi sua nota em Português e Redação?
E seu terceiro dia, das matérias prioritárias para Arquitetura? Tive prova de Física, Geografia e História. Em Física, coisas fundamentais, que eu precisava saber na ponta da língua, eu não esqueci. Fiquei com 35,4 – abaixo da média.
tetura, Relação Homem-Arquitetura-Ambiente, Projetos. As tardes todas são de Projetos.
Dessas matérias, de qual você está gostando mais? História da Arte é fantástica.
E como foi na prova de Habilidades Específicas?
E a mais difícil?
A primeira parte no primeiro dia das provas de Habilidades Específicas era de Geometria. No segundo bloco do primeiro dia era para representar a cidade usando o que quisesse. Depois tinha de pegar o seu desenho e transformá-lo em módulos. Cheguei a me confundir e não fui muito bem. No segundo dia, o tema era expansão.
Geometria Descritiva. Se você não entende uma parte, não entende nada.
Você tirou quanto nas provas de Habilidades Específicas?
Do que você mais gostou até agora na FAU? Aquele prédio é lindo. É incrível. Você fica apaixonado. Tem suas falhas, às vezes chove lá dentro.
E da parte humana?
83. A média foi 47,6.
Os alunos de lá são gente fina, muito simpáticos. Os professores de lá são fantásticos, muito bons.
Na escala de zero a 1 000, qual foi sua pontuação na carreira?
Hoje, qual é sua maior motivação para continuar na Arquitetura?
656,1.
É a realização de um sonho, aquilo que você vê lá na frente. Quero chegar lá. Quero construir uma coisa boa, quero saber projetar, montar um espaço onde as pessoas se sintam bem.
Como você se classificou? A FAU tem 150 vagas. Eu me classifiquei em 62º lugar entre os 403 que foram para a 2ª fase.
Na carreira, qual área você pensa seguir? Como ficou sabendo de sua aprovação na Fuvest? Estava no serviço, atualizando o computador. Quando saiu a lista, vi meu nome lá, dei um grito: “Passei!” Todo mundo: “O que foi?” “Passeeeei”. Foi aquela festa, o pessoal muito legal. Minha mãe, quando soube, deu um grito, meu pai também ficou superfeliz. O legal de ter passado é que é uma conquista para sua vida e todos que estão ao redor compartilham dela. Isso é muito bom.
Você acha que tem algum segredo para entrar na FAU trabalhando durante o dia e se preparando à noite? Eu sempre falo: “Tem que ter fé e ter atitude também”. Por mais que você não tenha tempo e ache que não vai conseguir, deve prestar atenção na aula e fazer o que você pode. Focar e fazer a sua parte. Se puder fazer simulados, melhor ainda, porque você vai ter mais prática. Eu não fiz simulados, quebrei a cara em muita coisa, como dá para perceber. Não ache que você não pode, porque você pode. Você chega lá, sim.
Projetos. Seja de construção de edifício, seja projeto de decoração.
Quais as boas lembranças de sua luta? Foi um ano muito corrido, principalmente no segundo semestre, mas foi um ano excelente. Divertido também. Você vem para o Etapa estudar, mas quando você está cercado de gente legal fica muito mais fácil aprender. Fica muito bom. A galera do ano passado era insuperável, gente muito legal.
Do que você mais gostou no Etapa? Dos professores. Além da galera que estuda com você, os amigos.
Que mudanças de hábito ficaram do ano passado? Principalmente em relação aos estudos. Não dá mais para ficar deixando as coisas para amanhã. Está cansado? Tem compromisso? Senta e faz.
Você tem saudade de alguma coisa?
Seu primeiro contato com a FAU foi no primeiro dia das provas de Habilidades Específicas?
Tenho. Do ambiente muito agradável do Etapa, muito bom mesmo. Os professores, os alunos, um lugar muito bom de estudar.
Há muitos anos eu tinha passado em frente, meu pai tinha me mostrado o prédio. Gostei muito. Depois veio o primeiro dia das provas de Habilidades Específicas e lá dentro é maravilhoso.
O que você tira de lição da experiência de lutar por sua vaga?
A FAU é em período integral e você teve de sair do emprego. Trabalhou até quando?
Tirei 55 em Português. Na Redação, 62,5. Deram para redigir um tema legal sobre idosos. Eu gostei.
Até o começo deste ano, em janeiro. Tem alguns estágios lá. Ainda não sei direito, ainda não estou familiarizado com a FAU, mas falam que fica legal para o 4º ano, você vai ter mais tempo para fazer estágio.
No segundo dia, na prova geral, como foi?
O que você tem de matéria neste semestre?
No segundo dia só deixei uma questão em branco, mas tirei 39 e entrei em crise.
Geometria Descritiva, Geometria Aplicada à Arquitetura, História da Arte, História da Arqui-
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Não se deve desistir. Por mais que você ache que não vai, não desista. Não conseguiu fazer a questão? Bola para frente, tente refazer. Não conseguiu? Vá para a próxima. Vai indo.
Você quer dizer mais alguma coisa para nossos alunos? Só a questão do pessoal da noite. Apesar de tudo, cansaço, sono, fome, é importante continuar. Depois que sai o resultado, vale a pena. Você comemora, vê quem está lá comemorando com você. É muito bom.
Jornal ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343
CONTO
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Último beijo de amor Álvares de Azevedo “Well Juliet! I shall lie with thee to night!”* (Shakespeare, Romeu e Julieta.)
noite ia alta: a orgia findara. Os convivas dormiam repletos, nas trevas. Uma luz raiou súbito pelas fisgas da porta. A porta abriu-se. Entrou uma mulher vestida de negro. Era pálida; e a luz de uma lanterna, que trazia erguida na mão, se derramava macilenta nas faces dela e dava-lhe um brilho singular aos olhos. Talvez que um dia fosse uma beleza típica, uma dessas imagens que fazem descorar de volúpia nos sonhos de mancebo. Mas agora com sua tez lívida, seus olhos acesos, seus lábios roxos, suas mãos de mármore, e a roupagem escura e gotejante da chuva, disséreis antes – o anjo perdido da loucura. A mulher curvou-se: com a lanterna na mão procurava uma por uma entre essas faces dormidas um rosto conhecido. Quando a luz bateu em Arnold, ajoelhou-se. Quis dar-lhe um beijo, alongou os lábios... Mas uma ideia a susteve. Ergueu-se. Quando chegou a Johann, que dormia, um riso embranqueceu-lhe os beiços, o olhar tornou-se-lhe sombrio. Abaixou-se junto dele, depôs a lâmpada no chão. O lume baço da lanterna dando nas roupas dela espalhava sombra sobre Johann. A fronte da mulher pendeu e sua mão pousou na garganta dele. Um soluço rouco e sufocado ofegou daí. A desconhecida levantou-se. Tremia; e ao segurar na lanterna ressoou-lhe na mão um ferro... Era um punhal... Atirou-o ao chão. Viu que tinha as mãos vermelhas, enxugou-as nos longos cabelos de Johann... Voltou a Arnold; sacudiu-o. – Acorda e levanta-te! – Que me queres? – Olha-me... não me conheces? – Tu? e não é um sonho? És tu! oh! deixa que eu te aperte ainda! Cinco anos sem ver-te! Cinco anos! E como mudaste! – Sim, já não sou bela como há cinco anos! É verdade, meu loiro amante! É que a flor da beleza é como todas as flores. Alentai-as ao orvalho da virgindade, ao vento da pureza, e serão belas... Revolvei-as no lodo... e, como os frutos que caem e mergulham nas águas do mar, cobrem-se de um invólucro impuro e salobre! Outrora era Geórgia – a virgem, mas hoje é Giórgia – a prostituta! – Meu Deus! meu Deus! E o moço sumiu a fronte nas mãos.
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– Não me amaldiçoes, não! – Oh! deixa que me lembre: estes cinco anos que passaram foram um sonho. Aquele homem do bilhar, o duelo à queima-roupa, meu acordar num hospital, essa vida devassa onde me lançou a desesperação, isto é um sonho! Oh! lembremo-nos do passado! Quando o inverno escurece o céu, cerremos os olhos; pobres andorinhas moribundas! lembremo-nos da primavera!... – Tuas palavras me doem... É um adeus, é um beijo de adeus e separação que venho pedir-te: na terra nosso leito seria impuro, o mundo manchou nossos corpos. O amor do libertino e da prostituta! Satã riria de nós. É no céu, quando o túmulo nos lavar em seu banho, que se levantará nossa manhã de amor... – Oh! ver-te e para deixar-te ainda uma vez! E não pensaste, Giórgia, que me fora melhor ter morrido devorado pelos cães na rua deserta, donde me levantaram cheio de sangue? Que fora-te melhor assassinar-me no dormir do ébrio, do que apontar-me a estrela errante da ventura e apagar-me a do céu? Não pensaste que, após cinco anos, cinco anos de febre e de insônias, de esperar e desesperar, de vida por ti, de saudades e agonia, fora o inferno ver-te para deixar-te? – Compaixão, Arnold! É preciso que esse adeus seja longo como a vida. Vês, minha sina é negra: nas minhas lembranças há uma nódoa torpe... Hoje! é o leito venal... Amanhã! só espero o leito do túmulo! Arnold! Arnold! – Não me chames Arnold! chama-me Artur, como dantes. Artur! não ouves! Chama-me assim! Há tanto tempo que não ouço me chamarem por esse nome!... Eu era um louco! quis afogar meus pensamentos e vaguei pelas cidades e pelas montanhas, deixando em toda a parte lágrimas... nas cavernas solitárias, nos campos silenciosos e nas mesas molhadas de vinho! Vem, Giórgia! senta-te aqui, senta-te nos meus joelhos, bem conchegada a meu coração... tua cabeça no meu ombro! Vem! um beijo! quero sentir ainda uma vez o perfume que respirava outrora nos teus lábios. Respire-o eu e morra depois!... Cinco anos! oh! tanto tempo a esperar-te, a desejar uma hora no teu seio!... Depois... escuta... tenho tanto a dizer-te! tantas lágrimas a derramar no teu colo! Vem! e dir-te-ei toda a minha história! minhas ilusões de amante e as noites malditas da crápula e o tédio que me inspiravam
aqueles beiços frios das vendidas que me beijavam! Vem! contar-te-ei tudo isso, dir-te-ei como profanei minha alma e meu passado... e choraremos juntos... e nossas lágrimas nos lavarão como a chuva lava as folhas do lodo! – Obrigada, Artur! obrigada! A mulher sufocava-se nas lágrimas, e o mancebo murmurava entre beijos palavras de amor. – Escuta, Artur, eu vinha só dizer-te adeus! da borda do meu túmulo; e depois contente fecharia eu mesma a porta dele... Artur, eu vou morrer! Ambos choravam. – Agora vê, continuou ela. Acompanha-me: vês aquele homem? Arnold tomou a lanterna. – Johann! morto! sangue de Deus! quem o matou? – Giórgia! Era ele um infame. Foi ele quem deixou por morto um mancebo a quem esbofeteara numa casa de jogo. Giórgia – a prostituta! vingou nele Geórgia – a virgem! Esse homem foi quem a desonrou! desonrou-a... a ela que era sua irmã! – Horror! horror! E o moço virou a cara e cobriu-a com as mãos. A mulher ajoelhou-se a seus pés. – E agora adeus! adeus que morro! Não vês que fico lívida, que meus olhos se empanam e tremo... e desfaleço? – Não! eu não partirei. Se eu vivesse amanhã, haveria uma lembrança horrível em meu passado... – E não tens medo? Olha! é a morte que vem! é a vida que crepuscula em minha fronte. Não vês esse arrepio entre minhas sobrancelhas?... – E que me importa o sonho da morte? Meu porvir amanhã seria terrível; e à cabeça apodrecida do cadáver não ressoam lembranças; seus lábios gruda-os a morte; a campa é silenciosa. Morrerei! A mulher recuava... recuava. O moço tomou-a nos braços, pregou os lábios nos dela... Ela deu um grito e caiu-lhe das mãos. Era horrível de ver-se. O moço tomou o punhal, fechou os olhos, apertou-o no peito e caiu sobre ela. Dois gemidos sufocaram-se no estrondo do baque de um corpo... A lâmpada apagou-se. (*) Tradução: “Bem, Julieta! Deitar-me-ei ao teu lado ainda esta noite!” – Romeu e Julieta, ato V, cena I.
Extraído de: Noite na taverna, Ed. Núcleo, 1993.
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ARTIGO
O papel do imigrante na evolução do Brasil Brasil até 1930/Victor Paes
O grande crescimento da população brasileira ocorreu, principalmente, em função de seu aumento natural: a proporção entre nascimentos e óbitos. Apesar da importância numérica secundária, a imigração teve um papel muito destacado na evolução do Brasil no século XX: com ela inicia-se uma nova forma de trabalho livre. primeiro recenseamento oficial da população brasileira foi feito durante o Império, em 1872, por ordem de dom Pedro II. O país acabava de sair de uma longa guerra contra o Paraguai e sua população era de 10,112 milhões de habitantes. No final de 1972, isto é, exatamente cem anos depois, 100 milhões de pessoas habitavam o Brasil (segundo estimativas feitas pelo IBGE), como resultado de uma expansão demográfica realmente notável. Para se ter uma ideia precisa da contribuição dada pela imigração estrangeira a este crescimento sem precedentes, deve-se observar toda a evolução demográfica do país ao longo de sua história. A primeira estimativa de importância da população brasileira foi feita por Félix de Contreiras Rodrigues, autor de vários estudos econômicos, que avaliou em 15 000 habitantes a população branca no Brasil em 1550. Nos trinta anos seguintes, com a ocupação de novos territórios, a população cresceu, lentamente, passando a cerca de 57 000 em 1583, segundo estimativa de Pandiá Calógeras (25 000 brancos, 18 000 índios “civilizados” e 14 000 negros “cativos”). No final de seu primeiro século de história, o Brasil apresentava uma população de apenas 100 000 habitantes. Uma das causas desse desenvolvimento populacional relativamente lento foi, sem dúvida, o fato de Portugal, na época, também ser um país pouco povoado. Para termos uma ideia da importância relativa desses números, basta lembrarmo-nos de que, segundo os especialistas, no século XVI, de 2 a 3 milhões de índios povoavam a região correspondente ao atual território brasileiro! Destes, somente uma ínfima minoria havia tido contato com os portugueses. Apenas catorze vilas foram criadas em todo o Brasil naquele século, a maioria delas numa estreita faixa litorânea. São Paulo de Piratininga, por exemplo, era a mais avançada “boca de sertão” do território paulista, pois suas outras vilas quinhentistas encontravam-se no litoral: São Vicente, Santos, Itanhaém e Cananeia. A descoberta de ouro e diamantes pelos bandeirantes provocou enormes modificações na estrutura demográfica do país, com o deslocamento maciço de pessoas de todas as regiões para Minas, Goiás e Mato Grosso. Cerca de um quinto da população participou dessas migrações internas, que levaram o homem branco a povoar, pela primeira vez, o coração da América do Sul, facilitando o contato, a mistura e a fusão de
O
populações até então isoladas. O país possuía cerca de 184 000 habitantes em 1660 e passou, com o impulso recebido durante o ciclo da mineração, a 1,5 milhão em 1750. Haviam sido criadas 38 novas vilas durante o seiscentismo e um número ainda maior no correr do século XVIII. Em 1776, ano da Declaração de Independência das colônias norte-americanas, Adam Smith se referia ao Brasil (em A riqueza das nações) como sendo a colônia da América com população de raça branca mais numerosa, avaliada em 4 milhões pelo conde de Linhares, em 1808. Foi neste ano que se iniciaram as imigrações modernas para o Brasil, a partir do decreto de 25 de novembro, com o qual dom João VI preparara a instalação dos primeiros colonos. Desde essa data, a entrada de estrangeiros no país torna-se livre, mas a imigração permanece insignificante durante toda a primeira metade do século XIX. Em 1808 chegam 1 500 famílias de açorianos para o Rio Grande do Sul; em 1819 cem famílias suíças do cantão de Friburgo são instaladas na fazenda do Morro Queimado, atual Nova Friburgo, Estado do Rio. Foi a primeira colônia de imigrantes não portugueses. Após a Independência, dom Pedro I continua essa política de colonização, trazendo alemães para o Rio Grande do Sul, em 1824, e para o Paraná, em 1827. Em 1828, 140 prussianos são enviados para Pernambuco e, em 1829, é formada a colônia alemã de Santo Amaro, na província de São Paulo. Neste mesmo ano tem início a colonização alemã na província de Santa Catarina, com a fundação da colônia São Pedro Alcântara. O mesmo se dá no Espírito Santo, onde a influência dos alemães deixará profundas marcas. Uma lei de 19 de dezembro de 1830 suprimiu os créditos à colonização, que diminuiu consideravelmente nos anos que se seguiram à abdicação de Pedro I. Seu filho criará, anos depois, novas colônias em diversos pontos do país, mas, no seu conjunto, podemos afirmar que a imigração durante os primeiros cinquenta anos do século XIX foi insignificante, não tendo atingido sequer 12 000 imigrantes, na sua maioria suíços e alemães. De fins do século XVIII até 1850, o aumento da população brasileira se deu num ritmo bastante lento, justamente num período em que, no resto do mundo, o crescimento populacional entrava numa fase de grande expansão. O número de habitantes da Europa quase dobrou nesses cinquenta anos, e o
dos Estados Unidos, quase igual ao do Brasil no início do século, já era quatro vezes maior em 1872 (42 milhões). Foram necessários 350 anos para que a população brasileira se elevasse a 7 milhões, tendo sido formada, até essa data, essencialmente pelas contribuições indígena, portuguesa e africana. Em 1850 foi suprimido o tráfico de escravos que, durante três séculos, trouxe para o Brasil cerca de 3,5 milhões de pessoas de várias regiões do continente africano (de acordo com Roberto Simonsen e Maurício Goulart). Nesta época, inicia-se uma nova fase de imigrações que, durante cem anos, trará cerca de 5,5 milhões de imigrantes de diferentes nacionalidades, dos quais 4 milhões se fixarão definitivamente.
Uma complexa rede de bancos A importância desse movimento populacional não deve ser subestimada nem exagerada. Do ponto de vista puramente quantitativo, a maioria dos autores é unânime em afirmar que, embora o processo imigratório para o Brasil tenha sido importante, o país não pode ser considerado como uma região de grande imigração comparado a outros países de grande imigração. Do ponto de vista qualitativo, porém, os imigrantes trouxeram contribuições cuja importância nem sequer foi avaliada, ainda, em toda sua extensão. Fazendo-se um estudo comparado da imigração intercontinental durante o século XIX e primeira metade do século XX, constata-se que cerca de 56 milhões de imigrantes entraram na América neste período, dos quais 40 milhões nos Estados Unidos. Até a Primeira Guerra Mundial, 60% dos imigrantes iam para os Estados Unidos, 17,5% para a Argentina, 9,7% para o Canadá e apenas 5,7% para o Brasil. Mesmo após 1924, quando o governo americano fechou em parte as portas do país à imigração, a porcentagem dos que entraram no Brasil continuou relativamente baixa (8,5%), enquanto na Argentina ela se elevava a 20,4% e no Canadá, a 11,4%. O fato de o trabalho escravo ter sido mantido no Brasil até 1888, sem dúvida, prejudicou o desenvolvimento da imigração de trabalhadores livres. O governo imperial brasileiro, por outro lado, também dificultou inúmeras vezes o desenvolvimento da imigração para o Brasil ao favorecer o tráfico negreiro. Em 1837, por exemplo, o futuro Marquês de Olinda abandona os primeiros ensaios de colonização feitos por dom Pedro I e adota uma
ARTIGO política favorável à escravatura: 400 000 africanos entram em nosso país durante a minoridade de dom Pedro II. Ao lado deste fator, outros, não menos importantes, frearam o desenvolvimento da imigração. Entre eles, a dificuldade de acesso à propriedade da terra, num país onde as grandes explorações agrícolas concentravam-se nas mãos de poucas famílias. Se até 1850 o crescimento de nossa população foi relativamente lento, a partir desta data a situação se modifica radicalmente. O café, que já era cultivado no Brasil desde o século XVIII, entra em rápida expansão a partir da terceira década do século XIX. Uma série de circunstâncias favoráveis (preços altos no mercado mundial; praga nos cafeeiros do Ceilão, nosso principal concorrente; etc.) faz com que sua cultura se estenda rapidamente pela Província do Rio de Janeiro, no início, e de São Paulo, em seguida. Por volta de 1850, as plantações já cobriam quase todo o vale do Paraíba e já avançavam pelo interior, em direção a Campinas, Limeira e Rio Claro. Em 1854 o café já representava 54% do valor total de nossas exportações, passando a 65% em 1885. Nossa balança comercial, deficitária na primeira metade do século, torna-se positiva a partir de 1861, e assim permanece durante várias décadas. Essa expansão do café provoca mudanças consideráveis em todos os setores da vida econômica e social do Sudeste brasileiro, proporcionando um desenvolvimento de tipo capitalista, que combinava em si as formas mais primitivas de produção com a última palavra da tecnologia e da ciência da época. As estradas de ferro acompanhavam o avanço dos cafezais. Em 1864 o país possuía apenas 475 quilômetros de vias férreas. Em 1870 elas já se estendiam por 1 000 quilômetros, passando a 9 500 no ano da Proclamação da República. Assim como o trem, também o telégrafo se desenvolveu. A minúscula rede telegráfica de 1864 (187 quilômetros) atingiu os 19 000 em 1889. Na medida em que os vapores de casco de ferro passaram a seguir as rotas marítimas do Atlântico sul, o transporte tornou-se mais barato e regular, e o sistema comercial foi se tornando cada vez mais eficiente. Grandes casas importadoras foram fundadas. Com a instalação dos primeiros cabos submarinos, o número de bancos aumenta consideravelmente. São Paulo e Rio de Janeiro, no final do século, já se achavam envolvidos num emaranhado complexo de bancos ingleses, alemães, franceses, suíços, italianos e americanos. O Brasil passava a viver a era do capital financeiro internacional.
Surge uma nova classe social A rápida expansão do café colocou na ordem do dia a necessidade premente da “importação de braços” para a lavoura. A falta de mão de obra fazia-se sentir desde a supressão do tráfico. Enquanto a colonização tinha sido produto da iniciativa pública, a imigração passa a ser organizada por particulares, com apoio do governo, o que provoca a entrada
de 121 000 imigrantes entre 1851 e 1860; 97 000 entre 1861 e 1870; e 219 000 na década seguinte. A partir daí a imigração adquire dimensões consideráveis. Os dados seguintes permitem avaliar sua importância: Período
Entrada de imigrantes
1881 a 1890 1891 a 1900 1901 a 1910 1911 a 1920 1921 a 1930
530 000 1 129 000 671 351 717 744 840 215
A maior densidade foi atingida nos dez anos que se seguiram à abolição da escravidão. Neste período, 1888/1898, 1,264 milhão de imigrantes entraram no país, isto é, cerca da quarta parte do total da imigração durante os 150 anos de independência do Brasil. Durante a Primeira Guerra Mundial estas entradas diminuíram consideravelmente; os contingentes italiano e, sobretudo, o alemão, foram os mais atingidos. O movimento recomeça, lentamente, por volta de 1920, aumentando de intensidade até a crise econômica mundial de 1929. A partir de 1930 começam as restrições com a nova política de imigração adotada pelo governo Vargas (a qual, apesar de algumas modificações introduzidas em 1945, fez com que a imigração estrangeira fosse reduzida a proporções mínimas até os dias de hoje). É nesta época que se acentuam as migrações internas entre diferentes estados da federação. Assim, pode-se afirmar que os imigrantes estabelecidos no Brasil, a partir de 1850, representam uma contribuição demográfica relativamente importante. Desde 1930, porém, esta contribuição, conforme afirma Paul Hugon, “tornou-se pouco significativa para explicar a extraordinária expansão da população nacional. Esta expansão é quase exclusivamente devida ao movimento natural da população”. Ou seja, é a diferença entre a natalidade e a mortalidade, a balança dos nascimentos e dos óbitos, que explica o crescimento demográfico fabuloso dos últimos anos, assim como suas particularidades e sua intensidade. A contribuição dos imigrantes estrangeiros foi, quantitativamente, um fator secundário dessa expansão, embora de importância transcendental do ponto de vista qualitativo. Como observa o historiador Sérgio Buarque de Hollanda, o emprego de imigrantes europeus na grande lavoura, em lugar de escravos, envolvia uma verdadeira revolução nos métodos de trabalho vigentes no país e, mais que isso, nas concepções predominantes em todo o território do Império acerca do trabalho livre. Um exemplo típico de tais concepções foi o caso dos alemães contratados em 1839 para a construção de pontes e calçadas em Pernambuco: tantas foram as zombarias feitas a esses “escravos brancos” que eles não conseguiram concluir o trabalho iniciado. A colonização havia criado uma nova classe de pequenos e médios proprietários agrícolas, principalmente no Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A “importação de braços” para a la-
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voura do café, por sua vez, criou um proletariado rural importante, a partir de meados do século XIX. Surgiu uma nova classe social, com reivindicações específicas e um comportamento político próprio. É conhecido o caso da primeira greve realizada por esses operários agrícolas, em Limeira, na colônia Ibicaba, de propriedade do senador Vergueiro, em 1856. De onde vinham esses primeiros imigrantes? No início, da Suíça e da Alemanha. Quantitativamente, porém, a imigração germânica é modesta, vindo em quarto lugar, depois da portuguesa, italiana e espanhola. De 1820 a 1968, 225 000 alemães se estabeleceram no Brasil, o que representa 4,6% do total da imigração neste período. É interessante observar que nem todos os suíços e alemães tinham origem camponesa. J. J. Tschudi, em carta enviada ao Correio Mercantil, no dia 25 de outubro de 1858, observa que, de uma lista de 92 futuros lavradores contratados para as fazendas de café, apenas treze já tinham se dedicado anteriormente à agricultura. Dos restantes, 42 eram operários de fábrica, seis sapateiros, quatro carpinteiros, nove alfaiates, três soldados, dois pedreiros, dois ferreiros, dois vidraceiros, dois tanoeiros, dois músicos ambulantes, um jornaleiro, um confeiteiro, um pintor, um serrador e um mestre-escola. Os portugueses, únicos imigrantes europeus durante a colônia, praticamente deixam de vir para o Brasil nos primeiros quarenta anos que se seguiram à independência. A imigração portuguesa recomeça, porém, a partir de 1853, chegando a ser a mais importante, ao lado da italiana, antes do final do século. Entre 1884 e 1930, 1,204 milhão de portugueses se estabelecem no Brasil, o que representa 29% do total da imigração neste período. Os italianos chegam em grande quantidade a partir da abolição da escravatura. Até essa data já haviam entrado 180 000, mas é nos anos seguintes que esta imigração assume grandes proporções. Entre 1888 e 1898, o movimento foi intenso, com a chegada de 820 000 italianos (em média de 82 000 por ano), o que representa 61% da imigração total naquela década. O movimento decresce um pouco, mas continua importante até a guerra de 1914. Entre 1820 e 1968, 1,211 milhão de italianos aqui se estabeleceram, o que representa 30% do total da imigração. Enquanto os portugueses se estabeleciam em todo o território nacional, os italianos davam preferência aos estados do Sul e do Sudeste. Entre 1887 e 1945, 88% dos italianos que entraram no Brasil se fixaram no Estado de São Paulo, espalhando-se por quase todos os seus 270 municípios, exceto dois. A maioria, porém, se concentrava no município da capital, na zona de Piracicaba e de Campinas. Seguem-se as regiões de Marília, Ribeirão Preto e Monte Aprazível. Taquaritinga possuía a porcentagem mais elevada, com 6,3% de italianos no total de sua população; Santo André e São Paulo: 5,7%, cada um. A imigração espanhola é o terceiro grupo, por sua importância quantitativa, representando
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12,5% do total da imigração. Entre 1820 e 1968, 694 000 pessoas vieram da Espanha para o Brasil, fixando-se também, de preferência, nos estados de São Paulo (67,7%), Rio de Janeiro, Minas e Rio Grande do Sul. Em 1908 chega a Santos o navio Kasato-Maru, trazendo a bordo 781 imigrantes japoneses. O Japão, nessa época, já era um país de forte emigração. Com o final do feudalismo e o início da Era Meiji (1868), o país se industrializara e se modernizara rapidamente, mas o desenvolvimento de sua economia não era suficiente para absorver o excedente de mão de obra, fruto de uma expansão demográfica acentuada. No Brasil, a corrente imigratória japonesa é fraca até 1919, assumindo grande importância entre 1925 e 1935. Do seu início até 1968, 233 487 japoneses entraram no Brasil, o que representa 3,6% do total da imigração. A maioria se estabeleceu no Estado de São Paulo (75%) e no Paraná (18%), e, em proporções mais modestas, em Mato Grosso e no Pará. Ao lado desses grupos principais, entraram no Brasil ainda 920 000 pessoas de diferentes nacionalidades no período 1820/1968 (16% da imigração total). A contribuição eslava foi relativamente importante: 109 502 russos, 47 765 poloneses, 23 125 iugoslavos, estabelecidos, principalmente, no Paraná e no Rio Grande do Sul. A Turquia forneceu 78 574 imigrantes (1,9% do total), a Síria 21 488, a Áustria 86 211, a França 34 094, a Hungria 30 132. É possível citar ainda uma infinidade de nacionalidades, cuja contribuição numérica, entretanto, foi insignificante.
Norte-americanos introduzem videiras e o arado Logo após a guerra civil nos Estados Unidos e a abolição da escravidão negra no sul daquele país (1863), vários grupos de imigrantes americanos chegaram ao Brasil em busca de terras e atraídos pelo regime escravista ainda vigente aqui. Inúmeras colônias foram fundadas, com gente vinda do Alabama, Louisiana, Carolina do Sul, Geórgia, Tennessee, Kansas e Texas, antigos fazendeiros ou simples simpatizantes dos confederados. Alguns foram para a região amazônica (Santarém), outros para o litoral sul (Juquiá, Paranaguá), outros para o Rio, Espírito Santo e Bahia. Um dos pioneiros dessa imigração foi o Dr. James McFadden Gaston, que visitou várias regiões do interior paulista – Itu, Porto Feliz, Itapetininga, Rio Claro (onde recebeu auxílio da família Whitaker), indo estabelecer sua colônia, finalmente, em Xiririca (hoje Eldorado). Todas essas tentativas fracassaram. O único núcleo que se manteve foi o de Santa Bárbara, no interior de São Paulo, que conseguiu atrair para lá os demais imigrantes, cerca de 2 000. Desta data até 1939, cerca de 12 000 americanos se fixaram no Brasil. O núcleo de Santa Bárbara d’Oeste deu origem à Vila Americana, hoje simplesmente Americana. Em 1906, quando o secretário de Estado americano Elihu Root passou por Vila Americana, encontrou ainda cerca de quinhentos compatriotas e seus filhos paulistas
espalhados por 3 léguas da região, cultivando cana-de-açúcar, arroz e principalmente melancia. Foram eles que plantaram as primeiras videiras no Estado de São Paulo, segundo F. Goldman, e que difundiram em larga escala o uso do arado. Em fins do século XIX e início do século XX, a imigração de judeus para o Brasil tomou um grande impulso. A maioria deles tinha sido vítima de perseguições na Europa Oriental, iniciadas a partir dos pogroms (ou massacres de judeus), que causaram a destruição de comunidades inteiras no sul da Rússia, em 1881. Inúmeras famílias abandonaram aquele país, a Polônia, Ucrânia, Lituânia e Romênia, e emigraram para o Novo Mundo. Com as dificuldades de imigração impostas nos Estados Unidos após a Guerra de 1914/1918, um grande número de judeus vem para o Brasil entre 1920 e 1930. A maior parte dos que se fixaram em São Paulo concentrou-se no bairro do Bom Retiro e dedicou-se ao comércio. Seus descendentes participam hoje ativamente da vida econômica, cultural e política do país. Finalmente, é preciso assinalar que, embora instalados de início nas fazendas de café, os grandes contingentes de italianos, portugueses, espanhóis e alemães passam a viver também nas pequenas e grandes cidades. Artesãos ou comerciantes contribuíram poderosamente para o processo de urbanização do país. No interior, os italianos dedicavam-se também a atividades industriais, tendo introduzido uma série de pequenas fábricas de tecidos, massas alimentícias, adubo, cola, chapéus, calçados, peneiras, pregos, seda natural, grande parte delas originadas do artesanato. Todavia, a grande indústria que o parque de São Paulo apresenta hoje não teve origem artesanal, senão em casos esporádicos, como bem assinala M. Diegues Jr. Os imigrantes que se dedicaram ao comércio e à indústria ti-
nham, em geral, origem pequeno-burguesa. São raríssimos os empresários imigrantes que começaram como operários de fábrica ou mascates (Dante Ramenzoni e Nicolau Scarpa são as únicas exceções de destaque). Giovanni Briccola, a primeira fortuna italiana de São Paulo, enriqueceu como agente do Banco de Nápoles e já era engenheiro quando aqui chegou, em 1885. Francisco Matarazzo já era comerciante na Calábria, antes de imigrar, filho de funcionário público. Os outros, a imensa maioria dos imigrantes que enfrentou a dura travessia do Atlântico sonhando com a fortuna do Novo Mundo, iam, em geral, engrossar as fileiras do proletariado brasileiro em formação e enfrentar as duras condições de trabalho, tanto nas fazendas como nas primeiras indústrias aqui criadas. O relatório oficial, preparado em 1901 por F. Bandeira Jr. sobre a indústria de São Paulo, assinalava a presença nas fábricas, de mão de obra constituída por 90% de operários europeus. Em 1913, os italianos representavam quatro quintos do número total de trabalhadores na construção civil na cidade de São Paulo.
Repartição, por nacionalidade, dos operários têxteis da cidade de São Paulo, em 1912 Italianos .........................................6 044 Portugueses .....................................824 Sírios .................................................210 Japoneses ..........................................13 Brasileiros ......................................1 843 Espanhóis .........................................338 Alemães .............................................50 Outros ..............................................862 Total ..............................................10 184 Boletim Estadual do Trabalho, 1912. Extraído de: História do século 20, Ed. Abril.
Acima, Hospedaria ou Hotel dos Imigrantes, construído durante a administração do conde de Parnaíba, presidente da província de São Paulo, ainda no tempo do Império. Esta hospedaria, assim como a Agência Oficial de Colonização e Trabalho, era mantida pelo governo brasileiro para dar assistência àqueles que procuravam se fixar em suas terras. Um inspetor, que falava a língua original dos imigrantes, recebia-os quando eles aportavam, oferecendo, em nome do governo, a hospitalidade do Estado, e dirigindo-os, depois, às acomodações temporárias.
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Descoberto gene que regula potencial de formação de tumores das células-tronco embrionárias Karina Toledo
m testes feitos com animais, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) mostraram que o silenciamento específico de um gene – o E2F2 – reduz significativamente o risco de células-tronco embrionárias induzirem a formação de tumores sem diminuir sua pluripotência (capacidade de se diferenciar em qualquer tipo de tecido). A descoberta pode ajudar a superar um dos principais obstáculos para o avanço de terapias à base de células-tronco pluripotentes – consideradas esperança de cura para lesões medulares, degeneração macular e doenças como diabetes, Parkinson, Alzheimer e distrofia muscular. Os resultados do projeto “Fator de transcrição E2F2 e expressão de proto-oncogenes em células-tronco embrionárias humanas”, apoiado pela FAPESP, foram divulgados em janeiro na revista Stem Cells and Development. “Embora ofereçam muitas vantagens, como a grande capacidade de se autorrenovar e de gerar células de qualquer tecido do organismo, as células-tronco embrionárias têm uma desvantagem: o risco de causarem tumores do tipo teratoma”, disse Oswaldo Keith Okamoto, professor do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da USP e coordenador da pesquisa. Esses tumores são formados por uma mistura de diferentes tipos de células das três camadas germinativas: endoderma, mesoderma e ectoderma. “Embora sejam benignos em sua maioria, formas malignas de teratomas também existem. Em conjunto, eles representam um risco aos pacientes e são um empecilho para a realização de testes clínicos”, disse Okamoto. Em artigo publicado em 2007 na revista Biochimica et Biophysica Acta, Okamoto e colaboradores observaram um padrão aberrante na expressão do gene E2F2 em culturas de células-tronco tumorais. “Estávamos estudando amostras de glioblastoma, o tipo mais agressivo de câncer cerebral. Isolamos as células-tronco desses tumores e fizemos uma análise genética para ver quais eram os genes com expressão aberrante nessas células. Elas são muito relevantes do ponto de vista clínico, pois são mais eficientes em gerar tumores e mais resistentes a tratamento com químio e radioterapia”, contou o pesquisador. O grupo observou que, quanto maior era a expressão do E2F2, maior era o grau de agressividade tumoral. “Desconfiamos en-
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tão que também nas células-tronco embrionárias esse gene poderia estar relacionado à tumorigênese”, contou Okamoto. A hipótese foi inicialmente testada in vitro, em culturas de células-tronco embrionárias humanas. O gene E2F2 foi silenciado com auxílio de uma técnica conhecida como RNA de interferência, na qual são usadas pequenas moléculas de RNA não codificadoras de proteínas capazes de se ligar ao RNA-mensageiro de um gene específico e interromper sua expressão. “O silenciamento do E2F2 in vitro inibiu significativamente a proliferação das células-tronco embrionárias e sua capacidade de geração de novas colônias”, contou Okamoto.
Em experimentos com camundongos, silenciamento do gene E2F2 inibiu significativamente a formação de teratomas sem diminuir a pluripotência (colônia de células-tronco embrionárias humanas/IB-USP). O passo seguinte foi testar o efeito do procedimento em camundongos imunossuprimidos. Para isso, os animais foram divididos em dois grupos. Metade foi inoculada com células-tronco embrionárias controles e a outra metade, com as células modificadas. Em avaliação feita 30 dias depois, o grupo que recebeu as células controle havia desenvolvido tumores com volume médio superior a 50 milímetros cúbicos (mm³), enquanto o grupo que recebeu as células com o gene silenciado ainda estava livre de tumor. Em uma segunda avaliação, feita 60 dias após a inoculação, os tumores do grupo que recebeu as células-tronco controles já estavam com mais de 2 mil mm³, enquanto no outro grupo o volume médio foi de apenas 60 mm³. “Acompanhamos os animais por até 90 dias após a inoculação das células-tronco modificadas e observamos que o crescimento do tumor estabilizou”, disse Okamoto. Outra série de experimentos foi então realizada para assegurar que o procedimento
não havia afetado a pluripotência das células-tronco embrionárias. “Estimulamos, in vitro, as células-tronco modificadas a se diferenciarem em células dos três folhetos germinativos e isso ocorreu normalmente. Além disso, elas continuavam expressando os chamados fatores de pluripotência, que incluem proteínas como a Oct4, a Nanog e a Sox2”, contou Okamoto. A análise dos pequenos tumores formados nos camundongos que receberam as células-tronco modificadas também revelou traços típicos de teratoma. “Embora os tumores estivessem subdesenvolvidos por causa do silenciamento do gene E2F2, continham células dos três folhetos germinativos. E a formação de teratoma é indício de pluripotência”, disse o professor do Instituto de Biociências da USP. Segundo ele, o E2F2 é um gene-chave porque, além de regular os chamados oncogenes (genes relacionados ao surgimento de tumores malignos ou benignos), regula também uma série de outros genes envolvidos em processos importantes como proliferação e diferenciação celular, replicação de DNA e morte por apoptose.
Células pluripotentes induzidas Em um futuro próximo, o grupo de Okamoto pretende realizar, no âmbito do Centro de Pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (HUG-CELL), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) da FAPESP, experimentos para confirmar se o silenciamento do gene E2F2 apresenta o mesmo efeito benéfico nas células pluripotentes induzidas (IPS na sigla em inglês). As células IPS podem ser obtidas a partir de células comuns da pele. Para isso, são inseridas na célula adulta certas proteínas – conhecidas como fatores de transcrição – capazes de reprogramar o genoma celular. Esses fatores de transcrição ativam genes relacionados ao estágio embrionário da célula e desligam outros genes que deveriam estar ativos após o amadurecimento. “Acreditamos que o mesmo que observamos em células-tronco embrionárias humanas deve ocorrer nas IPS. Isso seria muito interessante do ponto de vista terapêutico, pois esse tipo de célula pode ser obtida a partir de tecido do próprio paciente a ser tratado. Não oferece, portanto, o mesmo risco de rejeição das células-tronco embrionárias”, disse Okamoto. Extraído de: Agência FAPESP – Divulgando a cultura científica, fev./2014.
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(ENTRE PARÊNTESIS)
Do baile Em um baile há r rapazes e m moças. Um rapaz dança com cinco moças. Um segundo rapaz dança com seis moças e assim sucessivamente. O último rapaz dança com todas as moças. Temos, então: m a) r = RESPOSTA 5 b) r = m − 5 c) r = m − 4 d) r = m e) n.r.a. r = m − 4.
Logo,
r = 1m = 5 r = 2m = 6
Se
· · ·
· · ·
alternativa C
ALGUMAS PALAVRAS SOBRE O “FIQUESPERTO” Quem lê melhor, entende mais rápido e sai na frente! _ O Etapa desenvolveu o projeto “Fiquesperto” (“Fique Esperto” ou FE). _ O FE vem encartado no Jornal do Vestibulando. Serão fornecidas tarefas que envolvem leituras atentas e astúcia para encontrar as sutilezas, os subentendidos, os pressupostos, as ambiguidades de um texto. Corrigir erros encontrados em textos de jornais, revistas e cartazes, fazer redações discutindo temas atuais e interpretar textos para os (e dos) vestibulares são alguns exemplos de exercícios espertíssimos. _ A cada 14 dias há um novo FE com novas tarefas e novas propostas de redação. Os exercícios do FE vão exigir um tempo pequeno, mas serão de extraordinário valor para você. _ Considere o “Fiquesperto” algo especial para dinamizar seus neurônios e alongar suas conexões mentais. _ Um exercício que tem tudo a ver com tudo, principalmente para sedimentar seu conhecimento de forma segura e geral.
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de 2014
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