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Jornal do Vestibulando
ENSINO, INFORMAÇÃO E CULTURA
JORNAL ETAPA – 2014 • DE 07/08 A 20/08
ENTREVISTA
“Depois do cursinho quase dobrou a nota de Redação.” Rodolfo Mario Martins fez o Extensivo à tarde, junto com o colégio, e entrou na Poli, onde pretende se formar em Engenharia Civil. Ele conta que tinha deficiências em muitas matérias e no cursinho melhorou em todas: “Foi um ano de muita dedicação, muito esforço, muito trabalho, mas a recompensa superou todo o esforço”.
Rodolfo Mario Martins Em 2013: Etapa Em 2014: Engenharia Civil – Poli
JV – Quando você escolheu Engenharia como carreira, especialmente a Civil?
para vestibular, mas já tinha uma base. Em Física eu tinha deficiências em partes.
Nos fins de semana, como era seu ritmo de estudo?
Rodolfo – Antes do Ensino Médio eu já preferia a área de Exatas, Matemática, Física, e pensava em seguir alguma Engenharia. Mas só no 1o ano fui querer Civil. Teve um projeto lá na escola de construir uma casa sustentável de garrafa PET. Eu gostei do método de construção e comecei a me interessar mais pela Civil.
Você estudava a matéria do dia?
Sábado e domingo eu acordava cedo para tentar colocar tudo em dia. De manhã era só estudo. Sábado à tarde eu fazia simulado. Domingo eu saía com minha namorada, com os amigos, mas nada que prejudicasse os estudos.
Além da Fuvest, você prestou quais vestibulares? Prestei a Unicamp, também para Engenharia Civil, e o Enem, pelo qual manifestei interesse na UFRJ. Fui aprovado em todos.
Quais eram suas expectativas quando você começou o cursinho? Eu queria entrar na Poli e tinha esperança de que daria. Se não conseguisse passar, faria mais um ano de cursinho.
Você fazia o colégio de manhã e o cursinho à tarde, sobrando pouco tempo para estudar. Como era seu método de estudo? Eu procurava focar nas minhas maiores deficiências.
E quais eram essas deficiências? Em Química, principalmente, eu tinha uma base muito fraca. Também em Geografia que no colégio não tive muito bem. De um modo geral eu tinha deficiências nas matérias de Exatas porque minha escola não se voltava para o vestibular. Não tinha aquele jeito de resolver o exercício, um pensamento mais profundo que você tem de ter na hora em que vai estudar para o vestibular.
Geralmente não. Estudava as matérias de dias anteriores para ficar na memória, para não ter aquele problema de ter aula, estudar, não ver mais e esquecer. Mas não consegui manter o ritmo de resolver na semana as matérias da semana anterior. Foi virando uma bola de neve.
E como você fazia? Eu tentava resolver, se não conseguisse deixava para trás. Procurei pegar na Revisão as matérias que deixei.
Normalmente você estudava no Etapa ou em sua casa? Preferia estudar em casa.
Se surgia uma dúvida, o que você fazia? Se tivesse uma dúvida dava uma olhada na Internet, pesquisava nas resoluções do Etapa no site.
Que matérias você consultava mais no Plantão Virtual?
A causa secreta – Machado de Assis
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Como os simulados ajudavam você?
Sim, para a 2a fase. Eu estava lá toda hora pedindo para o plantonista corrigir, ver onde eu estava errando. O Plantão de Redação foi muito importante. Ajudou muito.
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Eu usei o Plantão de Dúvidas mais para a 2 fase, no fim do ano, quando passei a estudar mais aqui.
Sim. Eu vinha de manhã para o Etapa, podia tirar as dúvidas.
CONTO
Desde o começo do ano era C mais, os da Fuvest na faixa de 70. Mais para o fim do ano comecei a cair nos simulados. Cheguei a 64, acho, foi um dos piores. Mas sempre acima da nota de corte de 2013.
Você chegou a consultar o Plantão de Dúvidas?
Tinha uma base em História e Literatura. Em Matemática eu não tinha o jeito de resolver exercício
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Nos simulados, qual era o seu desempenho?
Os simulados servem para você praticar como vai fazer na hora, pegar o jeito de resolver rápido a questão. É uma forma de estudar também, você vê onde está com a maior deficiência. Eles ajudam bastante nisso.
Quando já tinham terminado as aulas do Ensino Médio?
Rodolfo Mario Martins
Em todas as matérias eu tive uma grande melhora. Eu fiz Fuvest como treineiro no 2o ano. Se você pegar o resultado, a diferença é um absurdo. Em Redação eu tirei 35. E depois eu tirei 69. Depois do cursinho quase dobrou a nota de Redação.
As de Exatas, para ver a resolução. As dúvidas que eu tinha em Geografia e História eu olhava nas apostilas. Quando estava em dúvida na resolução de um exercício de Matemática, acessava o Plantão Virtual para ver como tinha sido resolvido. Dava para me virar bem, porque é bem explicado.
Em quais matérias você tinha uma base melhor?
ENTREVISTA
Você sentiu que avançou mais em quais matérias?
ENTRE PARÊNTESIS
Casais ARTIGO
Portinari – O pintor lírico do Brasil
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Você usou o Plantão de Redação?
Você assistiu às palestras sobre os livros? Como não tinha muito tempo, assisti a todas pelo EAD, nos fins de semana.
ESPECIAL
Música brasileira Olimpíadas do conhecimento
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ENTREVISTA
2 Como as palestras ajudaram?
Sem as palestras eu não conseguiria imaginar o que o autor estava pensando. É na palestra e no livro de resumos que você vai ver. E é o que o vestibular vai cobrar.
O que você fez durante as duas semanas de férias, em julho? Na primeira semana de férias eu estudei pesado tudo que eu tinha deixado de lado no primeiro semestre. Na segunda semana eu relaxei. Fui para a praia.
O que você deixou de fazer durante o ano para se preparar melhor para os vestibulares?
fazia a aula à tarde. Só que comecei a ver que, por mais que a aula seja muito boa, eles ajudam você a resolver, eu preferia estudar sozinho. Estudava bastante em casa, de manhã até a noite. Vinha para o Etapa corrigir Redação e quando surgia alguma dúvida que eu não conseguia desfazer olhando a resolução on-line. Para a 2a fase estudei a maior parte do tempo em casa mesmo.
No primeiro dia da 2a fase, prova de Português e Redação, qual foi sua nota? Fiquei com 68 na Redação e 64 de média final.
No segundo dia, na prova geral, quanto você tirou?
No colegial eu era do grêmio da escola, no 3o ano nem tentei entrar. Também jogava basquete na escola, parei.
Foi o meu melhor dia, tirei 71.
Qual foi a principal dificuldade que você enfrentou no ano passado?
Fiquei com 65.
A falta de tempo. Não tinha tempo para deixar as apostilas em dia, às vezes não tinha tempo para estudar direito para a escola.
No terceiro dia, na prova de Matemática, Física e Química, como você se saiu? Na escala de zero a 1 000, qual foi a sua pontuação? 700,5.
O que você fez?
Na carreira, como você se classificou?
O principal foi dormir menos. Eu chegava em casa às 6, 7 horas e estudava até 11 da noite. Sábado e domingo eu acordava cedo para colocar em dia tudo o que eu precisava.
Qual foi sua classificação na Unicamp?
Você conseguiu se acostumar com esse ritmo? Eu me acostumei. Até hoje estou fazendo isso. Na Poli você tem de continuar com o ritmo pesado de estudo.
Fuvest, Unicamp e Enem, em qual você achava que tinha mais chance de passar? Eu não saí muito confiante da Fuvest e da Unicamp. Do Enem eu saí confiante porque na parte de Exatas tinha ido muito bem. Na hora em que vi a nota de Redação e a nota das Exatas eu soube que já tinha meio caminho andado em qualquer carreira de Engenharia. A Unicamp foi a que menos achei que tinha passado.
Quantos pontos você fez na 1a fase da Fuvest? Fiz 73, contando com aquele ponto anulado que eles deram para todo mundo.
O corte de Engenharia foi 60. Você ficou 13 pontos acima. Achou que estava bem? Não estava muito animado, mas estava pelo menos aliviado por não começar atrás a 2a fase. a
Para a 2 fase mudou alguma coisa no seu método de estudo? Mudou. Passei a fazer só as questões escritas de todas as matérias. Comecei a revisar muitas coisas de Geografia e Química. Algumas vezes até deixei um pouco para trás o que eu precisava mesmo, Matemática, Física e Português, matérias que estudei durante o ano e que já tinha uma base.
Nessa fase, você vinha mais cedo para o Etapa? No começo eu vinha de manhã. Estudava na Sala de Estudos com a ajuda dos plantonistas,
550o. Na Unicamp fiquei em 26o, de 90.
Como você foi no Enem? Acho que minha média no Enem ficou em 790.
No dia da lista da Fuvest, onde você estava quando ficou sabendo que tinha sido aprovado? Minha família me incentivou a vir ao Etapa. Vim com minha irmã e meu cunhado. Aqui a emoção é muito maior. Na hora em que vê seu nome, você não acredita. Você tem de ver mais vezes, você chora, você grita, você pula, não sabe o que fazer. Um dia muito bom mesmo. É a melhor sensação que existe, no final de tudo você conseguiu chegar onde queria. Não tem nada melhor.
Você acha que tem algum segredo para entrar na Poli? O segredo para entrar, não só na Poli, mas em qualquer faculdade, é você se dedicar o máximo possível. E não largar mão de nenhuma disciplina que você pense que não está ligada diretamente ao seu curso. Isso faz muita diferença. No meu caso, fez. Em Português eu fiquei bem à frente, o que compensou meu desempenho ruim no terceiro dia.
Você já conhecia a Poli? Nunca tinha visitado. Só fui conhecer no dia da matrícula.
Que matérias você teve no primeiro semestre? Tive Cálculo e Álgebra Linear, Física 1, Introdução à Engenharia Civil e Ambiental, Geomática, que é uma matéria específica do curso de Engenharia Civil, Desenho Geométrico, Laboratório de Química e Computação.
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De qual matéria você gostou mais? Gostei mais de Álgebra Linear. É a matéria em que fui melhor, tive mais facilidade em pegar. Mas todas são bem puxadas. Tem de estudar bastante.
Mas qual é realmente a mais difícil? A mais difícil é Cálculo. Não tem como. É a matéria que tem mais gente sofrendo para conseguir passar.
Você já chegou a participar de alguma atividade na Poli? Tem muita coisa para fazer lá, muito grupo de extensão, muita modalidade esportiva, mas no primeiro semestre não comecei nada porque estava trabalhando e não tinha tempo para fazer nenhum grupo de extensão.
Em que você trabalhou? Dava aula de inglês à noite. Para começar já a me sustentar.
Do que você gostou mais na Poli? Gostei mais da estrutura que ela tem. É muito desenvolvida.
Da parte humana, o que você destaca? Eles são muito receptivos. Eles realmente acolhem bem quem entra.
Hoje, qual é sua motivação para seguir na Poli? Minha motivação é ser um engenheiro bem-sucedido. O principal mesmo é seguir na carreira.
Você já sabe qual é a área que vai seguir? Eu sempre quis fazer Civil, mas depois que eu entrei comecei a gostar bastante também de Engenharia Ambiental. Ainda é cedo para dizer, porque a gente teve muito pouca matéria específica, mas penso em seguir em Engenharia Civil com alguma coisa de Ambiental. No final do ano eles separam, 130 vão para Civil, 50 para Ambiental. Eu ainda estou pensando. Mas, se for para Civil, com a nova grade horária eu posso pegar bastante matéria da Ambiental.
O que você diria para a pessoa que vai prestar vestibular se preparar da melhor maneira possível neste segundo semestre? Meu conselho é estudar, que a hora é agora, se esforçar o máximo que puder. Vale muito a pena quando você vê seu nome lá.
Como ficou marcado para você o ano passado? Foi um ano de muita dedicação, muito esforço, muito trabalho, mas a recompensa superou todo o esforço.
Você acha que está diferente hoje de quando começou no Etapa no ano passado? Sim. O Etapa me ajudou, meu método de estudo na Poli é bem parecido com o do cursinho, bem diferente do que eu tinha no colégio. Aqui eu aprendi que você tem que achar horário para estudar a todo momento e sempre tentar manter o estudo em dia. Isso me ajudou demais.
O que você tira de lição dessa experiência? Tudo é possível se a gente se esforçar.
Jornal ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343
CONTO
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A causa secreta Machado de Assis
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arcia, em pé, mirava e estalava as unhas; Fortunato, na cadeira de balanço, olhava para o teto; Maria Luísa, perto da janela, concluía um trabalho de agulha. Havia já cinco minutos que nenhum deles dizia nada. Tinham falado do dia, que estivera excelente – de Catumbi, onde morava o casal Fortunato, e de uma casa de saúde, que adiante se explicará. Como os três personagens aqui presentes estão agora mortos e enterrados, tempo é de contar a história sem rebuço. Tinham falado também de outra coisa, além daquelas três, coisa tão feia e grave, que não lhes deixou muito gosto para tratar do dia, do bairro e da casa de saúde. Toda a conversação a este respeito foi constrangida. Agora mesmo, os dedos de Maria Luísa parecem ainda trêmulos, ao passo que há no rosto de Garcia uma expressão de severidade, que lhe não é habitual. Em verdade, o que se passou foi de tal natureza, que para fazê-lo entender, é preciso remontar a origem da situação. Garcia tinha-se formado em medicina, no ano anterior, 1861. No de 1860, estando ainda na Escola, encontrou-se com Fortunato pela primeira vez, à porta da Santa Casa; entrava, quando o outro saía. Fez-lhe impressão a figura; mas, ainda assim, tê-la-ia esquecido, se não fosse o segundo encontro, poucos dias depois. Morava na rua de D. Manuel. Uma de suas raras distrações era ir ao teatro de S. Januário, que ficava perto, entre essa rua e a praia; ia uma ou duas vezes por mês, e nunca achava acima de quarenta pessoas. Só os mais intrépidos ousavam estender os passos até aquele recanto da cidade. Uma noite, estando nas cadeiras, apareceu ali Fortunato, e sentou-se ao pé dele. A peça era um dramalhão, cosido a facadas, ouriçado de imprecações e remorsos; mas Fortunato ouviu-a com singular interesse. Nos lances dolorosos, a atenção dele redobrava, os olhos iam avidamente de um personagem a outro, a tal ponto que o estudante suspeitou haver na peça reminiscências pessoais do vizinho. No fim do drama, veio uma farsa; mas Fortunato não esperou por ela e saiu; Garcia saiu atrás dele. Fortunato foi pelo beco do Cotovelo, Rua de S. José, até o Largo da Carioca. Ia devagar, cabisbaixo, parando às vezes, para dar uma bengalada em algum cão que dormia; o cão ficava ganindo e ele ia andando. No Largo da Carioca entrou num tílburi, e seguiu para os lados da praça da Constituição. Garcia voltou para casa sem saber mais nada. Decorreram algumas semanas. Uma noite, eram nove horas, estava em casa, quando ouviu rumor de vozes na escada; desceu logo do sótão, onde morava, ao pri-
meiro andar, onde vivia um empregado do arsenal de guerra. Era este, que alguns homens conduziam, escada acima, ensanguentado. O preto que o servia acudiu a abrir a porta; o homem gemia, as vozes eram confusas, a luz pouca. Deposto o ferido na cama, Garcia disse que era preciso chamar um médico. – Já aí vem um, acudiu alguém. Garcia olhou: era o próprio homem da Santa Casa e do teatro. Imaginou que seria parente ou amigo do ferido; mas rejeitou a suposição, desde que lhe ouvira perguntar se este tinha família ou pessoa próxima. Disse-lhe o preto que não, e ele assumiu a direção do serviço, pediu às pessoas estranhas que se retirassem, pagou aos carregadores, e deu as primeiras ordens. Sabendo que o Garcia era vizinho e estudante de medicina, pediu-lhe que ficasse para ajudar o médico. Em seguida contou o que se passara. – Foi uma malta de capoeiras. Eu vinha do quartel de Moura, onde fui visitar um primo, quando ouvi um barulho muito grande, e logo depois um ajuntamento. Parece que eles feriram também a um sujeito que passava, e que entrou por um daqueles becos; mas eu só vi a este senhor, que atravessava a rua no momento em que um dos capoeiras, roçando por ele, meteu-lhe o punhal. Não caiu logo; disse onde morava, e, como era a dois passos, achei melhor trazê-lo. – Conhecia-o antes? perguntou Garcia. – Não, nunca o vi. Quem é? – É um bom homem, empregado no arsenal de guerra. Chama-se Gouveia. – Não sei quem é. Médico e subdelegado vieram daí a pouco; fez-se o curativo, e tomaram-se as informações. O desconhecido declarou cha mar-se Fortunato Gomes da Silveira, ser capitalista, solteiro, morador em Catumbi. A ferida foi reconhecida grave. Durante o curativo, ajudado pelo estudante, Fortunato serviu de criado, segurando a bacia, a vela, os panos, sem perturbar nada, olhando friamente para o ferido, que gemia muito. No fim, entendeu-se particularmente com o médico, acompanhou-o até o patamar da escada, e reiterou ao subdelegado a declaração de estar pronto a auxiliar as pesquisas da polícia. Os dois saíram, ele e o estudante ficaram no quarto. Garcia estava atônito. Olhou para ele, viu-o sentar-se tranquilamente, estirar as pernas, meter as mãos nas algibeiras das calças, e fitar os olhos no ferido. Os olhos eram claros, cor de chumbo, moviam-se devagar, e tinham a expressão dura, seca e fria. Cara magra e pálida; uma tira estreita de barba, por baixo do queixo, e de uma têmpora a outra, curta, ruiva e rara. Teria
quarenta anos. De quando em quando, voltava-se para o estudante, e perguntava alguma coisa acerca do ferido; mas tornava logo a olhar para ele, enquanto o rapaz lhe dava a resposta. A sensação que o estudante recebia era de repulsa ao mesmo tempo que de curiosidade; não podia negar que estava assistindo a um ato de rara dedicação, e se era desinteressado como parecia, não havia mais que aceitar o coração humano como um poço de mistérios. Fortunato saiu pouco antes de uma hora; voltou nos dias seguintes, mas a cura fez-se depressa, e, antes de concluída, desapareceu sem dizer ao obsequiado onde morava. Foi o estudante que lhe deu as indicações do nome, rua e número. – Vou agradecer-lhe a esmola que me fez, logo que possa sair, disse o convalescente. Correu a Catumbi daí a seis dias. Fortunato recebeu-o constrangido, ouviu impaciente as palavras de agradecimento, deu-lhe uma resposta enfastiada e acabou batendo com as borlas do chambre no joelho. Gouveia, defronte dele, sentado e calado, alisava o chapéu com os dedos, levantando os olhos de quando em quando, sem achar mais nada que dizer. No fim de dez minutos, pediu licença para sair, e saiu. – Cuidado com os capoeiras! disse-lhe o dono da casa, rindo-se. O pobre-diabo saiu de lá mortificado, humilhado, mastigando a custo o desdém, forcejando por esquecê-lo, explicá-lo ou perdoá-lo, para que no coração só ficasse a memória do benefício; mas o esforço era vão. O ressentimento, hóspede novo e exclusivo, entrou e pôs fora o benefício, de tal modo que o desgraçado não teve mais que trepar à cabeça e refugiar-se ali como uma simples ideia. Foi assim que o próprio benfeitor insinuou a este homem o sentimento da ingratidão. Tudo isso assombrou o Garcia. Este moço possuía, em gérmen, a faculdade de decifrar os homens, de decompor os caracteres, tinha o amor da análise, e sentia o regalo, que dizia ser supremo, de penetrar muitas camadas morais, até apalpar o segredo de um organismo. Picado de curiosidade, lembrou-se de ir ter com o homem de Catumbi, mas advertiu que nem recebera dele o oferecimento formal da casa. Quando menos, era-lhe preciso um pretexto, e não achou nenhum. Tempos depois, estando já formado, e morando na rua de Mata-Cavalos, perto da do Conde, encontrou Fortunato em uma gôndola, encontrou-o ainda outras vezes, e a frequência trouxe a familiaridade. Um dia Fortunato convidou-o a ir visitá-lo ali perto, em Catumbi.
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CONTO
– Sabe que estou casado? – Não sabia. – Casei-me há quatro meses, podia dizer quatro dias. Vá jantar conosco domingo. – Domingo? – Não esteja forjando desculpas; não admito desculpas. Vá domingo. Garcia foi lá domingo. Fortunato deu-lhe um bom jantar, bons charutos e boa palestra, em companhia da senhora, que era interessante. A figura dele não mudara; os olhos eram as mesmas chapas de estanho, duras e frias; as outras feições não eram mais atraentes que dantes. Os obséquios, porém, se não resgatavam a natureza, davam alguma compensação, e não era pouco. Maria Luísa é que possuía ambos os feitiços, pessoa e modos. Era esbelta, airosa, olhos meigos e submissos; tinha vinte e cinco anos e parecia não passar de dezenove. Garcia, à segunda vez que lá foi, percebeu que entre eles havia alguma dissonância de caracteres, pouca ou nenhuma afinidade moral, e da parte da mulher para com o marido uns modos que transcendiam o respeito e confinavam na resignação e no temor. Um dia, estando os três juntos, perguntou Garcia a Maria Luísa se tivera notícia das circunstâncias em que ele conhecera o marido. – Não, respondeu a moça. – Vai ouvir uma ação bonita. – Não vale a pena, interrompeu Fortunato. – A senhora vai ver se vale a pena, insistiu o médico. Contou o caso da rua de D. Manuel. A moça ouviu-o espantada. Insensivelmente estendeu a mão e apertou o pulso ao marido, risonha e agradecida, como se acabasse de descobrir-lhe o coração. Fortunato sacudia os ombros, mas não ouvia com indiferença. No fim contou ele próprio a visita que o ferido lhe fez, com todos os pormenores da figura, dos gestos, das palavras atadas, dos silêncios, em suma, um estúrdio. E ria muito ao contá-la. Não era o riso da dobrez. A dobrez é evasiva e oblíqua; o riso dele era jovial e franco. – Singular homem! pensou Garcia. Maria Luísa ficou desconsolada com a zombaria do marido; mas o médico restituiu-lhe a satisfação anterior, voltando a referir a dedicação deste e as suas raras qualidades de enfermeiro; tão bom enfermeiro, concluiu ele, que, se algum dia fundar uma casa de saúde, irei convidá-lo. – Valeu? perguntou Fortunato. – Valeu o quê? – Vamos fundar uma casa de saúde? – Não valeu nada; estou brincando. – Podia-se fazer alguma coisa; e para o senhor, que começa a clínica, acho que seria bem bom. Tenho justamente uma casa que vai vagar, e serve. Garcia recusou nesse e no dia seguinte; mas a ideia tinha-se metido na cabeça ao outro, e não foi possível recuar mais. Na verdade, era uma boa estreia para ele, e po-
dia vir a ser um bom negócio para ambos. Aceitou finalmente daí a dias, e foi uma desilusão para Maria Luísa. Criatura nervosa e frágil, padecia só com a ideia de que o marido tivesse de viver em contato com enfermidades humanas, mas não ousou opor-se-lhe, e curvou a cabeça. O plano fez-se e cumpriu-se depressa. Verdade é que Fortunato não curou de mais nada, nem então, nem depois. Aberta a casa, foi ele o próprio administrador e chefe de enfermeiros, examinava tudo, ordenava tudo, compras e caldos, drogas e contas. Garcia pôde então observar que a dedicação ao ferido da rua de D. Manuel não era um caso fortuito, mas assentava na própria natureza deste homem. Via-o servir como nenhum dos fâmulos. Não recuava diante de nada, não conhecia moléstia aflitiva ou repelente, e estava sempre pronto para tudo, a qualquer hora do dia ou da noite. Toda a gente pasmava e aplaudia. Fortunato estudava, acompanhava as operações, e nenhum outro curava os cáusticos. – Tenho muita fé nos cáusticos, dizia ele. A comunhão dos interesses apertou os laços da intimidade. Garcia tornou-se familiar na casa; ali jantava quase todos os dias, ali observava a pessoa e a vida de Maria Luísa, cuja solidão moral era evidente. E a solidão como que lhe duplicava o encanto. Garcia começou a sentir que alguma coisa o agitava, quando ela aparecia, quando falava, quando trabalhava, calada, ao canto da janela, ou tocava ao piano umas músicas tristes. Manso e manso, entrou-lhe o amor no coração. Quando deu por ele, quis expeli-lo, para que entre ele e Fortunato não houvesse outro laço que o da amizade; mas não pôde. Pôde apenas trancá-lo; Maria Luísa compreendeu ambas as coisas, a afeição e o silêncio, mas não se deu por achada. No começo de outubro, deu-se um incidente que desvendou ainda mais aos olhos do médico a situação da moça. Fortunato metera-se a estudar anatomia e fisiologia, e ocupava-se nas horas vagas em rasgar e envenenar gatos e cães. Como os guinchos dos animais atordoavam os doentes, mudou o laboratório para casa, e a mulher, compleição nervosa, teve de os sofrer. Um dia, porém, não podendo mais, foi ter com o médico e pediu-lhe que, como coisa sua, alcançasse do marido a cessação de tais experiências. – Mas a senhora mesma... Maria Luísa acudiu, sorrindo: – Ele naturalmente achará que sou criança. O que eu queria é que o senhor, como médico, lhe dissesse que isso me faz mal; e creia que faz... Garcia alcançou prontamente que o outro acabasse com tais estudos. Se os foi fazer em outra parte, ninguém o soube, mas pode ser que sim. Maria Luísa agradeceu ao médico, tanto por ela como pelos animais, que não podia ver padecer. Tossia de quando em quando; Garcia perguntou-lhe se tinha alguma coisa, ela respondeu que nada.
– Deixe ver o pulso. – Não tenho nada. Não deu o pulso, e retirou-se. Garcia ficou apreensivo. Cuidava, ao contrário, que ela podia ter alguma coisa, que era preciso observá-la e avisar o marido em tempo. Dois dias depois – exatamente o dia em que os vemos agora – Garcia foi lá jantar. Na sala disseram-lhe que Fortunato estava no gabinete, e ele caminhou para ali; ia chegando à porta, no momento em que Maria Luísa saía aflita. – Que é? perguntou-lhe. – O rato! o rato! exclamou a moça sufocada e afastando-se. Garcia lembrou-se que, na véspera, ouvira ao Fortunato queixar-se de um rato, que lhe levara um papel importante; mas estava longe de esperar o que viu. Viu Fortunato sentado à mesa, que havia no centro do gabinete, e sobre a qual pusera um prato com espírito de vinho. O líquido flamejava. Entre o polegar e o índice da mão esquerda segurava um barbante, de cuja ponta pendia o rato atado pela cauda. Na direita tinha uma tesoura. No momento em que o Garcia entrou, Fortunato cortava ao rato uma das patas; em seguida, desceu o infeliz até a chama, rápido, para não matá-lo, e dispôs-se a fazer o mesmo à terceira, pois já lhe havia cortado a primeira. Garcia estacou horrorizado. – Mate-o logo! disse-lhe. – Já vai. E com um sorriso único, reflexo de alma satisfeita, alguma coisa que traduzia a delícia íntima das sensações supremas, Fortunato cortou a terceira pata ao rato, e fez pela terceira vez o mesmo movimento até a chama. O miserável estorcia-se, guinchando, ensanguentado, chamuscado, e não acabava de morrer. Garcia desviou os olhos, depois voltou-os novamente, e estendeu a mão para impedir que o suplício continuasse, mas não chegou a fazê-lo, porque o diabo do homem impunha medo, com toda aquela serenidade radiosa da fisionomia. Faltava cortar a última pata; Fortunato cortou-a muito devagar, acompanhando a tesoura com os olhos; a pata caiu, e ele ficou olhando para o rato meio cadáver. Ao descê-lo pela quarta vez, até a chama, deu ainda mais rapidez ao gesto, para salvar, se pudesse, alguns farrapos de vida. Garcia, defronte, conseguira dominar a repugnância do espetáculo para fixar a cara do homem. Nem raiva, nem ódio; tão somente um vasto prazer, quieto e profundo, como daria a outro a audição de uma bela sonata ou a vista de uma estátua divina, alguma coisa parecida com a pura sensação estética. Pareceu-lhe, e era verdade, que Fortunato havia-o inteiramente esquecido. Isto posto, não estaria fingindo, e devia ser aquilo mesmo. A chama ia morrendo, o rato podia ser que tivesse ainda um resíduo de vida, sombra de sombra; Fortunato aproveitou-o para cortar-lhe o focinho e pela última vez chegar a carne ao fogo. Afinal
CONTO deixou cair o cadáver no prato, e arredou de si toda essa mistura de chamusco e sangue. Ao levantar-se deu com o médico e teve um sobressalto. Então, mostrou-se enraivecido contra o animal, que lhe comera o papel; mas a cólera evidentemente era fingida. – Castiga sem raiva, pensou o médico, pela necessidade de achar uma sensação de prazer, que só a dor alheia lhe pode dar: é o segredo deste homem. Fortunato encareceu a importância do papel, a perda que lhe trazia, perda de tempo, é certo, mas o tempo agora era-lhe preciosíssimo. Garcia ouvia só, sem dizer nada, nem lhe dar crédito. Relembrava os atos dele, graves e leves, achava a mesma explicação para todos. Era a mesma troca das teclas da sensibilidade, um diletantismo sui generis, uma redução de Calígula. Quando Maria Luísa voltou ao gabinete, daí a pouco, o marido foi ter com ela, rindo, pegou-lhe nas mãos e falou-lhe mansamente: – Fracalhona! E voltando-se para o médico: – Há de crer que quase desmaiou? Maria Luísa defendeu-se a medo, disse que era nervosa e mulher; depois foi sentar-se à janela com as suas lãs e agulhas, e os dedos ainda trêmulos, tal qual a vimos no começo desta história. Hão de lembrar-se que, depois de terem falado de outras coisas, ficaram calados os três, o marido sentado e olhando para o teto, o médico estalando as unhas. Pouco depois foram jantar; mas o jantar não foi alegre. Maria Luísa cismava e tossia; o médico indagava de si mesmo se ela não estaria exposta a algum excesso na companhia de tal homem. Era apenas possível; mas o amor trocou-lhe a possibilidade em certeza; tremeu por ela e cuidou de os vigiar. Ela tossia, tossia, e não se passou muito tempo que a moléstia não tirasse a máscara. Era a tísica, velha dama insaciável, que chupa a vida toda, até deixar um ba-
gaço de ossos. Fortunato recebeu a notícia como um golpe; amava deveras a mulher, a seu modo, estava acostumado com ela, custava-lhe perdê-la. Não poupou esforços, médicos, remédios, ares, todos os recursos e todos os paliativos. Mas foi tudo vão. A doença era mortal. Nos últimos dias, em presença dos tormentos supremos da moça, a índole do marido subjugou qualquer outra afeição. Não a deixou mais; fitou o olho baço e frio naquela decomposição lenta e dolorosa da vida, bebeu uma a uma as aflições da bela criatura, agora magra e transparente, devorada de febre e minada de morte. Egoísmo aspérrimo, faminto de sensações, não lhe perdoou um só minuto de agonia, nem lhos pagou com uma só lágrima, pública ou íntima. Só quando ela expirou, é que ele ficou aturdido. Voltando a si, viu que estava outra vez só. De noite, indo repousar uma parenta de Maria Luísa, que a ajudara a morrer, ficaram na sala Fortunato e Garcia, velando o cadáver, ambos pensativos; mas o próprio marido estava fatigado, o médico disse-lhe que repousasse um pouco. – Vá descansar, passe pelo sono uma hora ou duas: eu irei depois. Fortunato saiu, foi deitar-se no sofá da saleta contígua, e adormeceu logo. Vinte minutos depois acordou, quis dormir outra vez, cochilou alguns minutos, até que se levantou e voltou à sala. Caminhava nas pontas dos pés para não acordar a parenta, que dormia perto. Chegando à porta, estacou assombrado. Garcia tinha-se chegado ao cadáver, levantara o lenço e contemplara por alguns instantes as feições defuntas. Depois, como se a morte espiritualizasse tudo, inclinou-se e beijou-a na testa. Foi nesse momento que Fortunato chegou à porta. Estacou assombrado; não podia ser o beijo da amizade, podia ser o epílogo de um livro adúltero. Não tinha ciúmes, note-se; a natureza com-
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pô-lo de maneira que lhe não deu ciúmes nem inveja, mas dera-lhe vaidade, que não é menos cativa ao ressentimento. Olhou assombrado, mordendo os beiços. Entretanto, Garcia inclinou-se ainda para beijar outra vez o cadáver; mas então não pôde mais. O beijo rebentou em soluços, e os olhos não puderam conter as lágrimas, que vieram em borbotões, lágrimas de amor calado, e irremediável desespero. Fortunato, à porta, onde ficara, saboreou tranquilo essa explosão de dor moral que foi longa, muito longa, deliciosamente longa. Extraído de: Onze contos de Machado de Assis, Ed. Núcleo, 1992.
VOCABULÁRIO algibeiras: bolsos. borbotões: jorros, jatos impetuosos. borlas do chambre: penduricalho do roupão. Calígula: imperador romano, nasceu no ano 12 da Era Cristã. Reinou de 37 a 41; para alguns, foi a personificação da incompetência e da crueldade. Costumava dizer aos seus súditos: “Que me odeiem, mas que me temam!”. cáusticos: queimados, feridos. compleição: temperamento, constituição física. espírito de vinho: produto alcoólico resultante da destilação do vinho. estúrdio: extravagância, esquisitice. fâmulos: criados, servidores. intrépidos: corajosos, audazes. malta de capoeiras: bando de negros que assalta e produz desordens. sui generis: expressão latina, significa o que não tem semelhança com nenhum outro; sem igual. tílburi: carro de duas rodas e dois assentos, sem boleia, com capota, e puxado por um só animal. tísica: tuberculose pulmonar.
(ENTRE PARÊNTESIS)
Casais Apenas 5 casais participam de uma reunião. Após os cumprimentos, João pergunta a cada um dos outros nove participantes: “Quantos apertos de mão você deu?”, e obtém todas as nove respostas possíveis: 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8. Qual foi a resposta da esposa de João? (Obs.: obviamente ninguém apertou a mão do próprio cônjuge.)
RESPOSTA Vamos chamar as pessoas de “0”, “1”, “2”, ..., “8”, de acordo com o número de apertos de mão dados. A pessoa “8” apertou a mão de todos, salvo a do seu cônjuge. Isto significa que todos, salvo o cônjuge de “8”, deram pelo menos um aperto de mão. Logo, o cônjuge de “8” é “0”. A pessoa “7” apertou a mão de todos, salvo a do seu cônjuge e a de “0”. Isto significa que todos, salvo o cônjuge de “7” e “0”, deram pelo menos dois apertos de mão. Logo, o cônjuge de “7” é “1”. Continuando com o mesmo raciocínio, vemos que o cônjuge de “6” é “2” e de “5” é “3”. Sobram: o João, a esposa do João e a resposta “4”. A esposa de João respondeu “4”.
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ARTIGO
Portinari O pintor lírico do Brasil Antonio Callado
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ascido em 1903, pobre, filho de imigrantes italianos empregados na lavoura de café de São Paulo, Portinari ganhou em 1928 um prêmio de viagem de pintura que o levou à Europa. Como uma esponja, um mata-borrão, ou uma câmara aberta, absorveu, sugou impressões nos grandes museus e exposições, registrou imagens. De regresso ao seu país no ano de 1935, não só já via despontar sua fama no Brasil como igualmente nos EUA, onde sua grande tela Café teve menção honrosa no Carnegie Internacional. E em 1940 teve, dedicado à sua pintura, um livro publicado pela The University of Chicago Press, intitulado Portinari – his life and art. Esse livro, com muitas reproduções em preto e branco e algumas em cor, mostra como, tão cedo em sua carreira, o pintor já surge em sua plena pujança, com painéis de cunho social e religioso e retratos de suntuoso acabamento. No entanto, fascinante de ver nesse livro é como já então Portinari era aclamado por ninguém menos que o pintor, ilustrador e escritor norte-americano Rockwell Kent. Kent é o autor da introdução a Portinari – his life and art, e até hoje dá gosto o calor com que ele (nascido em 1882) saudava seu jovem colega do sul do continente. É quase impossível destacar no comovido hino com que Rockwell Kent saúda Portinari esse ou aquele trecho. Em lugar de colher frases, aqui e ali, prefiro reproduzir um trecho completo, que dá uma visão central, ainda válida, de uma arte que então apenas começava. Escreve Rockwell Kent: “O mundo de Portinari: conforme, compelidos por ele, imaginariamente nos movemos deslumbrados – com medo, talvez – mas com a mesma aceitação dos seus elementos macabros com que os nossos inconscientes acolhem os sonhos mais fantásticos que nos perturbam o sono, chegamos gradativamente à percepção de que não se trata de pura imaginação, mas sim
de uma recriação intensa, fantástica, do mundo que Portinari conhece, sua terra nativa, o Brasil. Disso as suas outras pinturas são a prova. Nelas vemos a paisagem, pisamos o chão; vemos os seus trabalhadores e a sua pobreza – não lamentada, apenas contada. E contada com amor. Não amor pela pobreza e pela labuta incansável, mas amor pela mulher, pelo homem e pela criança – que, rico ou pobre, para ele deve ser amado. Pinta-os fielmente. ‘Bem-aventurados os humildes’, parecia ser a expressão vinda do seu coração. E se as condições de vida na sua terra brasileira nos parecessem não ser uma grande herança, pela sua própria bondade eles fariam a vida valer a pena. Trabalham; casam e criam famílias; seus filhos brincam. E da sua felicidade, da felicidade de crianças despreocupadas na sua brincadeira, não há pinturas mais eloquentes no tesouro da arte.”
Cabeça de cangaceiro (década de 1940).
Isto escrevia Rockwell Kent em 1940 sobre o grande pintor brasileiro. Hoje, pego a Enciclopédia Britânica que possuo (edição 1972) e procuro, na letra P, o verbete Portinari. Não existe. No texto do verbete dedicado ao Brasil há exatamente duas linhas sobre ele. Quanto a Rockwell Kent, tem ele um excelente verbete próprio de mais de 20 linhas e – homenagem rara – a reprodução de um quadro seu, The trapper, que se encontra no Whitney Museum of American Art.
Ora, comparados os dois nomes, o que se vê é que enquanto Kent conquistou um lugar simpático na arte e na cultura norte-americana, não existe termo de comparação com o lugar que ocupa Portinari na pintura e na cultura do Brasil e da América Latina. A homenagem que lhe prestou Kent em 1940 foi simplesmente profética. A arte de Portinari só fez crescer, desenvolver-se até o fim da sua vida. No Brasil, até o dia de hoje, não surgiu artista que fosse de longe comparável como pintor a Cândido Portinari. Na primeira metade do século, dois artistas brasileiros, a partir, cada um, de sua forma de arte, não só enriqueceram a cultura brasileira como a projetaram decisivamente no estrangeiro: Portinari, e, na música, Villa-Lobos. Se acrescentarmos a seus nomes o de Oscar Niemeyer, teremos delimitado a área em que a cultura do Brasil foi de tal modo ampliada em sua sensibilidade que passou a influenciar também a sensibilidade de outros povos. Portinari é naturalmente aquele que mais ilustra, diretamente, o fenômeno brasileiro, e falo em ilustrar no sentido plástico de descrever um país mediante figuras. Por uma questão pessoal, de gosto, alguém poderá achar que outros pintores brasileiros significam mais, como pintores, do que Portinari. Mas ninguém negaria a Portinari sua absoluta primazia como o pintor do Brasil inteiro. O monumental legado da obra portinaresca está sendo, peça a peça, recenseado, fotografado, arquivado pelo Projeto Portinari. Por aí pode-se ter a ideia do majestoso conjunto dessa obra composta de mais de 4 mil trabalhos, a mostrarem o Portinari da pintura de cunho social – camponeses de São Paulo, retirantes do Nordeste pobre do Brasil, vaqueiros, operários, músicos populares – o Portinari pintor sacro, o Portinari pintor de temas históricos e o Portinari retratista. Em cada um desses gêneros que enumeramos, Portinari deixou obras-
ARTIGO -primas, quadros irretocáveis, murais que, sozinhos, fariam a glória de pintores menos fecundos. Nos EUA, os dois gigantescos painéis portinarescos, o da Guerra e o da Paz, instalados no vestíbulo das Nações Unidas, marcam a presença de sua grande arte em Nova Iorque. A partir desses painéis, do livro que a Universidade de Chicago publicou e dos belos volumes publicados na Itália por Eugenio Luraghi sobre a obra de Portinari – inclusive um dedicado à visita que o pintor fez a Israel, com os lindos quadros que resultaram da viagem – qualquer cultor das artes, em qualquer país do mundo, pode entrar em contato com o gênio deste brasileiro, fundamental como intérprete da cultura do seu país. Aqui, na sua terra, o nome, o renome do pintor só tem feito crescer desde sua morte em fevereiro de 1962. Desde 1923, as notas de jornal, os ensaios, os estudos sobre Portinari foram
se avolumando, e, durante anos a fio, a imprensa internacional se ocupou desse gênio maior da pintura brasileira. E se, como vimos pelo chocante exemplo da Enciclopédia Britânica, vigem os critérios de indiferença diante do Terceiro Mundo, no Brasil o prestígio de Portinari prossegue de vento em popa. Nos leilões de arte, tela de Cândido Portinari lidera sempre os lances. Tela dele que colecionadores ou marchands brasileiros encontrem no estrangeiro em geral volta ao Brasil. Qualquer que seja o preço cobrado por obra de Portinari lá fora, aqui no Brasil será certamente mais alto. Portinari é o pintor brasileiro por excelência e dificilmente surgirá um outro tão íntimo nosso, como espírito de nossa história, ou de nossa religião, do povo brasileiro em geral. Na pintura talvez seja mais fácil do que em qualquer outra manifestação artística provar que as grandes obras
de hoje serão nossa própria substância psicológica de amanhã. Cândido Portinari foi o pintor que com mais segurança andou forjando, em seus quadros e seus murais, a consciência do povo brasileiro. Seu êxito em vida e sua glória póstuma derivam exatamente daí, de ter dado a um povo os instrumentos da visão. Antonio Carlos Callado, romancista e dramaturgo. Suas principais obras são: A madona de cedro (1957), Quarup (1957), Bar Don Juan (1971), Reflexos do baile (1976), A expedição Montaigne (1982). Escreveu também uma das biografias mais completas e confiáveis de Cândido Portinari. Em 1983, recebeu o Prêmio Goethe de Literatura, e em 1994 tomou posse na Academia Brasileira de Letras. Morreu aos 80 anos em 28 de janeiro de 1997.
ESPECIAL
Música brasileira 8a edição do Festival Etapa de Música de Arte acontecerá em agosto
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esde 2007, artistas consagrados O Fema, que acontece sempre no nacional e internacionalmente se Teatro Etapa, na unidade do Colégio em apresentam em um evento que Valinhos, já se tornou uma tradição, pois também abre espaço para os talentos da todos os anos contribui com a cultura da nova geração. O Festival Etapa de Música região metropolitana de Campinas. Com de Arte procura difundir o que de melhor esse festival, o Etapa pretende trazer a se faz no país na área instrumental, erudibeleza da grande música aos muitos que ta e popular. A cada edição, a programajá a apreciam e a tantos outros que esção busca equilibrar tipos diferentes de peramos que passem a apreciá-la. Não sons e estilos. deixe de prestigiar! Este ano, o evento aconPROGRAMAÇÃO tecerá em dois finais de semana de agosto, entre os 22/ago. Sexta, 20 h João Donato e Trio dias 22 e 31, e contará com Marco Pereira & Toninho 23/ago. Sábado, 20 h a participação de grandes Ferragutti músicos. João Donato e Trio, 24/ago. Domingo*, 19 h Rosa Passos e Trio Marco Pereira & Toninho Villa-Lobos Superstar Ferragutti, Rosa Passos e 29/ago. Sexta, 20 h (Pau Brasil & Ensemble SP) Trio, Villa-Lobos Superstar (Pau Brasil & Ensemble SP), Trio Corrente e Swami Jr. Trio serão as atrações, mostrando um pouco da pluralidade de ritmos e escolas musicais.
30/ago.
Sábado, 20 h
Trio Corrente
31/ago.
Domingo*, 19 h
Swami Jr. Trio
(*) Aos domingos, as apresentações serão gratuitas.
Para mais informações acesse: www.etapa.com.br/festival
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Extraído de: O Correio da Unesco.
ESPECIAL
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Olimpíadas do conhecimento Alunos do Colégio Etapa tiveram resultados expressivos
O
colégio é a época em que os alunos entram em contato com os mais diversos setores do conhecimento, de forma que possam descobrir que carreira desejam seguir no futuro. Uma maneira de colocar isso em prática é por meio das competições culturais. Além de proporcionar um maior conhecimento acadêmico, elas visam incentivar interesses e a troca de experiências. Durante o mês de julho, aconteceram várias olimpíadas e os alunos do Etapa tiveram desempenhos muito expressivos. Veja a seguir um panorama dos resultados. Olimpíada Internacional de Matemática (IMO)
Representantes brasileiros na IMO, entre eles três alunos do Colégio Etapa.
Olimpíada de Matemática da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Uma das competições mais tradicionais é a IMO, existente desde 1959, quando contou com a participação de apenas sete países. 55 anos depois, mais de 500 estudantes de 103 países estiveram presentes na edição de 2014, na África do Sul. A delegação brasileira incluiu três alunos do Colégio Etapa. Nas provas, os jovens tiveram que resolver problemas de áreas da Matemática, como álgebra, combinatória, geometria e teoria dos números. Em um ótimo desempenho, Murilo Corato Zanarella e Rodrigo Sanches Angelo conquistaram medalhas de prata, enquanto Alexandre Perozim de Faveri levou o bronze.
Olimpíada Internacional de Informática (IOI)
A 4a edição da Olimpíada de Matemática da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa aconteceu em Angola e contou com a participação de delegações de seis países. Este ano o lema foi “Com o conhecimento da Matemática compreendemos melhor o mundo globalizado”, e o Brasil conquistou uma medalha de ouro e três de prata. A de ouro foi mérito do nosso aluno André Hisatsuga.
A IOI é uma das mais reconhecidas competições de Ciência da Computação e teve sua primeira edição em 1989, na Bulgária. Este ano, o evento aconteceu em Taiwan. A IOI é organizada anualmente e os estudantes competem resolvendo problemas de natureza algorítmica. Em 2014, a delegação brasileira conquistou quatro medalhas: três de prata e uma de bronze. Duas pratas foram de Mateus Bezrutchka e Arthur Nascimento, enquanto o bronze foi mérito de Michel Zelazny – todos alunos do Colégio Etapa.
Olimpíadas de Linguística
Olimpíada Internacional de Física (IPhO)
Em abril, aconteceu a segunda fase da Olimpíada Brasileira de Linguística (OBL), que contou com a participação de 12 alunos do Colégio Etapa. Todos receberam medalhas – entre elas, duas de ouro. Gabriel Diniz foi, inclusive, o primeiro colocado da competição. Ele também fez parte da equipe da 12a Olimpíada Internacional de Linguística (IOL), na qual foi o único brasileiro premiado, conquistando uma menção honrosa.
Em mais uma conquista brasileira, a equipe ficou com 5 medalhas de bronze na IPhO, que aconteceu no Cazaquistão. O nosso aluno Daniel Mitsutani foi o melhor brasileiro na competição e, entre a pontuação que dá direito aos bronzes, ele foi o quarto melhor colocado. A história da IPhO começou em 1967, na Polônia. Na ocasião, o evento contou com a participação de cinco países. Em 2014, na sua 45a edição, 86 países foram representados por seus estudantes, que competiram resolvendo problemas teóricos e experimentais.