Jornal do Vestibulando Nº1474

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Jornal do Vestibulando

ENSINO, INFORMAÇÃO E CULTURA

JORNAL ETAPA – 2014 • DE 05/06 A 18/06

ENTREVISTA

“Eu falo que o segredo para passar é ter bom humor e calma.” Luciana da Silva Leite fez dois anos de cursinho. Na primeira tentativa quase chegou lá. Este ano, entrou na São Francisco, realizando seu sonho de poder cursar Direito na USP. Nessa entrevista ela fala de sua ligação com a faculdade, que diz ser linda, tanto que é conhecida como “Gloriosa”.

Luciana da Silva Leite Em 2013: Etapa Em 2014: Direito-USP

JV – Luciana, desde quando você queria seguir Direito? Luciana – Desde a 8ª série eu tinha dúvida entre Jornalismo e Direito. Inicialmente decidi que faria Jornalismo e depois aprimoraria minha formação fazendo Direito. Antes de começar a fazer o cursinho no Etapa, pesquisei o mercado de trabalho e vi que o campo de Direito é bem maior. E também meu pai estava fazendo Direito. No começo deste ano ele passou na OAB, foi muito legal.

Seu pai deu uma força a você? Ele nem sabia. Direito foi me cativando aos poucos. Meu pai chegava todo animado falando sobre o que via no curso, me deixando superinteressada. Então entrei no Etapa já decidida a fazer Direito na São Francisco.

O seu pai trabalhava em quê? Ele já tinha feito Administração e trabalhava no INSS. Há cinco anos decidiu fazer Direito porque estava para se aposentar e não queria ficar em casa sem fazer nada. Ele sempre gostou de Direito, só não cursou porque na época não teve oportunidade.

Na Fuvest 2013 você foi para a 2ª fase?

Como foi sua volta ao cursinho no ano passado? Comecei meio triste, não vou negar. Estava com um pouco de vergonha, achava que iam me julgar aqui por não ter entrado. Mas foi o contrário. Os professores deram a maior força, falaram que estávamos cer-

ENTREVISTA

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CONTO

A cartomante – Machado de Assis

Consegui. Eu falo que o segredo para passar é ter bom humor e calma. Foi uma coisa que aprendi, que eu não tinha no primeiro ano no cursinho. Eu queria fazer tudo, mas não tinha como. No segundo ano eu já tinha essa consciência, não fazia nada além do meu limite.

Como era sua rotina? Acordava às 4 e meia e saía de casa às 5 e meia, para pegar o metrô Itaquera às 6 horas. Meu pai me levava até o metrô. Daí eu chegava no Etapa. Depois das aulas eu voltava para casa, chegava às 2 horas. Era meio diferente o meu dia, almoçava e dormia até às 6 horas, acordava superdisposta e estudava até meia-noite ou mais. Eu rendia bem nesse período. No final, teve dias em que eu virava a noite e só dormia à tarde. Estudava das 6, 7 horas da noite até entrar no curso na manhã seguinte. Ninguém acreditava, mas consegui manter esse ritmo.

Eu procurava estudar a matéria do dia e fazer os exercícios testes. Os escritos eu fazia mais os das matérias prioritárias para Direito: História, Geografia e Matemática. Nas demais matérias eu tentava fazer todos os testes. Os escritos eu fazia os da Fuvest, que era o meu foco. No fim do ano eu selecionava os da Fuvest e, depois de terminar todos, fazia os da Unesp e os do Mackenzie. Dava prioridade às questões dos vestibulares que eu ia prestar.

ARTIGO Pesquisa identifica gene associado ao ganho de peso

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Arco-da-velha

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Castro Alves

No primeiro simulado eu fui superbem. Comecei com A, aí fui baixando para B e C mais. Tive um ou dois C menos. O C mais estava bom ainda, porque poucas pessoas estavam à minha frente. Era isso que eu mais observava. Por isso eu mantive o mesmo ritmo o ano inteiro.

Qual foi a importância do simulado para você no vestibular? O tempo. Nossa, foi muito importante. Às vezes eu perdia a noção de tempo e aí faltavam cinco questões, que eu até sabia, mas tinha de chutar no simulado. Eu passei a controlar mais o tempo e no meio do ano já estava conseguindo fazer tudo e também voltar àquelas questões que eu não tinha conseguido resolver na primeira tentativa, ou que tinha pulado por não saber.

Como você fazia esse controle do tempo? Eu sempre fiz as questões na ordem. Mas sempre tem aquela que você acha que sabe e quer tentar fazer até o fim. E aí perde muito tempo. Isso é que eu fui aprendendo nos simulados. Tem questão que você pode até saber, mas se vai demorar ou não sabe direito, é melhor deixar por último. É o que os professores falam, mas no começo você não acredita.

Como você fazia quando surgiam dúvidas durante seu estudo? Eu acessava o Plantão Virtual e sanava as dúvidas. Se não conseguia, então ia ao Plantão de Dúvidas, o que era mais raro. Procurava o Plantão geralmente para Redação. Usei bastante, o ano inteiro.

O tráfico negreiro

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SERVIÇO DE VESTIBULAR

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POIS É, POESIA

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Nos simulados, quais eram seus resultados?

ARTIGO

SOBRE AS PALAVRAS

ENTRE PARÊNTESIS

Quem é quem?

Você conseguiu manter esse ânimo ao longo do ano?

Você estudava a matéria do dia?

Fiz 60 pontos na 1ª fase, a nota de corte foi 57. Fui para a 2ª fase mas, no final, não fui aprovada.

Luciana da Silva Leite

tos em não desistir. Aquilo me animou muito, me deu forças para continuar. Os professores foram muito importantes no ano passado. Muito mesmo.

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Inscrições

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ENTREVISTA

Como você treinava Redação? Eu fazia as que eram pedidas em aula. Quando surgia um tema que eu achava importante, fazia também e levava para o Plantão.

Dava uma média de quantas redações, contando as dos simulados e as propostas no Fique Esperto? Por mês, duas ou três redações. No final do ano, eu tentava fazer uma por semana.

Quais foram as dificuldades que você enfrentou no ano passado?

A nota de corte de Direito foi 57. Como viu seu desempenho? Eu esperava mais. Nos simulados da Fuvest eu acertava 65 questões. Acertei 67 no último, então estava esperando uma coisa mais ou menos assim. Só que eu fui pesquisar e todo mundo falava que a prova estava um pouco mais difícil. Tem um grupo de verteranos na rede social, que eu fui ver, e falavam que quem tinha passado da 1ª fase no corte estava lá dentro. Isso foi me deixando mais tranquila e me deu força para ralar para a 2ª fase.

Qual matéria é mais difícil? Acho que é Economia Política. Tem de ler muito, muito. E é mais história, e uma história que não tem a ver com Direito.

O que você destaca da São Francisco, tanto da parte humana quanto de infraestrutura? A faculdade é perfeita, é linda, tanto que é chamada de “Gloriosa”. Na parte humana tem muitos grupos de pesquisa e extensão que atendem a comunidade. Essa parte é muito legal.

Na 2ª fase, quais foram suas notas?

Você participa de algum desses grupos?

No primeiro dia, Português e Redação, tirei 75 na Redação. Achei o máximo, no ano anterior eu tinha ido muito mal. Na média, fiquei com 58,75 na prova.

No segundo dia, na prova geral, como foi?

Ainda não, mas pretendo entrar para um que cuida da diversidade sexual. Os grupos de extensão em saúde são muito importantes, todo mundo fala, os professores incentivam bastante a gente a participar.

Mais difícil que no ano anterior. Tirei 62,5 e fiquei satisfeita porque tinha umas questões muito difíceis e eu consegui fazer algumas.

Você tem ideia da área que vai seguir no Direito?

No começo do ano. Eu lembrava de muita coisa, então foi bem mais tranquilo.

No terceiro dia, prova das matérias prioritárias, qual foi sua nota?

Ainda é cedo. É um curso muito amplo para você tomar uma decisão no primeiro semestre, no primeiro ano.

Você leu os livros indicados pela Fuvest como obrigatórios?

Foi a minha maior nota, 64,58. História e Geografia eu achei muito tranquilo. Matemática eu achei muito mais difícil, mas todo mundo achou.

A pressão que eu mesma fazia em mim.

Teve uma época mais pesada para você? Um mês antes da Revisão eu comecei a ficar mais tensa. Estava cansada, física e emocionalmente, mas foi a época em que eu estudei mais. Consegui levar.

E qual foi a época mais tranquila?

Li as obras no metrô, enquanto estava vindo para o Etapa. Tinha muito tempo. A única que não li foi Sentimento do mundo, do Carlos Drummond de Andrade, mas assisti à palestra. Fui a todas as palestras.

Para você, qual foi a importância das palestras? As palestras foram muito importantes para entender todas as obras, me ajudaram a ter noção do contexto histórico, das relações entre os personagens.

O que você fez nas férias de julho? Eu peguei a primeira semana para estudar. Por dia, não chegava a cinco horas de estudo. Na segunda semana, eu viajei. Fui renovar as baterias.

Quando queria dar uma relaxada, o que você fazia? Eu saía com meus amigos. Tinha gente que já estava na faculdade, eles iam à minha casa, eu os visitava. É importante sair um pouco às vezes, ir ao cinema, tirar um dia sem ter de fazer nada.

Na escala de zero a 1 000, qual foi sua pontuação na Fuvest? 639,6.

Como ficou sabendo de sua aprovação para a São Francisco?

O que você pode dizer a quem vai prestar vestibular este ano e, se não estiver tão bem, o que fazer para melhorar o desempenho? Você tem de manter o controle, a calma, ter jogo de cintura e fazer aquilo que é sua prioridade. Quer prestar Fuvest, faça os exercícios da Fuvest. Também é muito importante fazer provas anteriores, eu fazia às vezes em casa. É isso, dar prioridade àquilo que você quer prestar.

Minhas amigas me convenceram a vir aqui. Quando vi meu nome na lista eu fiquei em choque, parada, até que olhei para uma das amigas e comecei a gritar, abraçar, a chorar. Fui ver meu nome na lista três vezes, eu não estava acreditando que tinha passado. Liguei para meu pai, minha mãe, todo mundo chorando. Foi emocionante.

Há muitos que estão tentando de novo. O que você pode dizer a eles?

Você conhecia a São Francisco?

Hoje, você acha que está diferente, de alguma forma, de quando veio para o cursinho?

Não, conheci no dia da matrícula. Meu pai e meu irmão foram comigo, passaram o dia inteiro comigo.

O que você lembra desse dia? Tive certeza de que estava lá com a bateria tocando nas arcadas e eles cantando as músicas da faculdade, todo mundo pulando de alegria.

Não pode desistir dos seus sonhos. É muito recompensador ver o nome na lista, mesmo depois de duas, três tentativas. O que importa é sua vontade. Se você quer aquilo, não pode desistir no meio do caminho. Tem de ter muita força e correr atrás.

Muito. Ganhei uma maturidade enorme. Você começa a se virar sozinha, o que você vai estudar, fazer, se vai abrir mão de alguma coisa. Você ganha essa noção, essa perspectiva da maturidade, responsabilidade. Melhorei muito nesse aspecto.

Você tem saudade de alguma coisa de seu tempo no cursinho?

Você interrompeu alguma atividade para se preparar para os vestibulares?

Neste primeiro semestre, quais matérias você tem?

Eu fazia curso de inglês, parei no segundo ano do cursinho.

São sete matérias: Teoria Geral de Direito Penal, Direito Romano, Direito Constitucional, Introdução ao Estudo de Direito, Direito Privado, Teoria Geral do Estado e Economia Política.

Eu tenho saudade da convivência com as pessoas que se tornaram minhas amigas. Fiz muitos amigos. Também tenho muita saudade dos professores e das aulas animadas, era impossível não aprender com eles.

De qual você está gostando mais?

O que você tira de lição desse tempo aqui?

Eu adoro Direito Penal e Privado Penal porque é uma coisa de atualidade, então, por mais que no início seja mais história é uma história que tem a ver com a atualidade. E Privado porque é a única matéria, de todas por enquanto, em que a gente já mexe com o Código. Meu sonho é ter o Vade Mecum, ter o Código na mão, mexer com as leis em si, então eu gosto bastante.

É difícil para todo mundo, mas acho que você tem de manter a tranquilidade na medida do possível.

No ano passado, em qual vestibular você achava que tinha mais chance de ser aprovada? Meu foco era a Fuvest. Eu queria a São Francisco mesmo, desde o começo, e não iria para as outras. Até já tinha feito prova de bolsa para ir ao terceiro ano no cursinho. Eu não ia abandonar esse sonho assim.

Quantos pontos você fez na 1ª fase da Fuvest? Fiz 63 pontos.

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O que você diria para encerrar? Entrar em uma faculdade pública não é fácil, mas você não pode desistir. Tem de ter força de vontade e saber usar o tempo para estudar e descansar. No final dá certo.

Jornal ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343


CONTO

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A cartomante Machado de Assis amlet observa a Horácio que há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia. Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma cartomante; a diferença é que o fazia por outras palavras. – Ria, ria. Os homens são assim; não acreditam em nada. Pois saiba que fui, e que ela adivinhou o motivo da consulta, antes mesmo que eu lhe dissesse o que era. Apenas começou a botar as cartas, disse-me: “A senhora gosta de uma pessoa...”. Confessei que sim, e então ela continuou a botar as cartas, combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você me esquecesse, mas que não era verdade... – Errou! Interrompeu Camilo, rindo. – Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já lhe disse. Não ria de mim, não ria... Camilo pegou-lhe nas mãos, e olhou para ela sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, que os seus sustos pareciam de criança; em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor cartomante era ele mesmo. Depois, repreendeu-a; disse-lhe que era imprudente andar por essas casas. Vilela podia sabê-lo, e depois... – Qual saber! tive muita cautela, ao entrar na casa. – Onde é a casa? – Aqui perto, na Rua da Guarda Velha; não passava ninguém nessa ocasião. Descansa; eu não sou maluca. Camilo riu outra vez: – Tu crês deveras nessas coisas? perguntou-lhe. Foi então que ela, sem saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita coisa misteriosa e verdadeira neste mundo. Se ele não acreditava, paciência; mas o certo é que a cartomante adivinhara tudo. Que mais? A prova é que ela agora estava tranquila e satisfeita. Cuido que ele ia falar, mas reprimiu-se. Não queria arrancar-lhe as ilusões. Também ele, em criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices, que a mãe lhe incutiu e que aos vinte anos desapareceram. No dia em que deixou cair toda esta vegetação parasita, e ficou só o tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os ensinos, envolveu-os na mesma dúvida, e logo depois em uma só negação total.

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Camilo não acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento; limitava-se a negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda afirmar, e ele não formulava a incredulidade; diante do mistério, contentou-se em levantar os ombros, e foi andando. Separaram-se contentes, ele ainda mais que ela. Rita estava certa de ser amada; Camilo, não só o estava, mas via-a estremecer e arriscar-se por ele, correr às cartomantes, e, por mais que a repreendesse, não podia deixar de sentir-se lisonjeado. A casa do encontro era na antiga Rua dos Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita. Esta desceu pela Rua das Mangueiras, na direção de Botafogo, onde residia; Camilo desceu pela da Guarda Velha, olhando de passagem para a casa da cartomante. Vilela, Camilo e Rita, três nomes, uma aventura e nenhuma explicação das origens. Vamos a ela. Os dois primeiros eram amigos de infância. Vilela seguiu a carreira de magistrado. Camilo entrou no funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria vê-lo médico; mas o pai morreu, e Camilo preferiu não ser nada, até que a mãe lhe arranjou um emprego público. No princípio de 1869, voltou Vilela da província, onde casara com uma dama formosa e tonta; abandonou a magistratura e veio abrir banca de advogado. Camilo arranjou-lhe casa para os lados de Botafogo, e foi a bordo recebê-lo. – É o senhor? exclamou Rita, estendendo-lhe a mão. Não imagina como meu marido é seu amigo; falava sempre do senhor. Camilo e Vilela olharam-se com ternura. Eram amigos deveras. Depois, Camilo confessou de si para si que a mulher do Vilela não desmentia as cartas do marido. Realmente, era graciosa e viva nos gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era um pouco mais velha que ambos: contava trinta anos, Vilela vinte e nove e Camilo vinte e seis. Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais velho que a mulher, enquanto Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe tanto a ação do tempo, como os óculos de cristal, que a natureza põe no berço de alguns para adiantar os anos. Nem experiência, nem intuição. Uniram-se os três. Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe de Camilo, e nesse desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou do enterro, dos sufrágios e

do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e ninguém o faria melhor. Como daí chegaram ao amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar as horas ao lado dela; era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era mulher e bonita. Odor di femmina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para incorporá-lo em si próprio. Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios. Camilo ensinou-lhe as damas e o xadrez e jogavam às noites; – ela mal – ele, para lhe ser agradável, pouco menos mal. Até aí as coisas. Agora a ação da pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez os dele, que os consultavam antes de o fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas. Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente, e de Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele pôde ler no próprio coração; não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho. Palavras vulgares; mas há vulgaridades sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira vez passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim são as coisas que o cercam. Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado. Vexame, sustos, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura; mas a batalha foi curta e a vitória delirante. Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do outro. A confiança e estima de Vilela continuavam a ser as mesmas. Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de todos. Camilo teve medo, e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as visitas à casa de Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que o motivo era uma paixão frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências prolongaram-se, e as visitas cessaram inteiramente. Pode ser que entrasse também nisso um pouco de amor-próprio, uma


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CONTO

intenção de diminuir os obséquios do marido, para tomar menos dura a aleivosia do ato. Foi por esse tempo que Rita, desconfiada e medrosa, correu à cartomante para consultá-la sobre a verdadeira causa do procedimento de Camilo. Vimos que a cartomante restituiu-lhe a confiança, e que o rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez. Correram ainda algumas semanas. Camilo recebeu mais duas ou três cartas anônimas, tão apaixonadas, que não podiam ser advertência da virtude, mas despeito de algum pretendente; tal foi a opinião de Rita, que, por outras palavras mal compostas, formulou este pensamento: – a virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo e pródigo. Nem por isso Camilo ficou mais sossegado; temia que o anônimo fosse ter com Vilela, e a catástrofe viria então sem remédio. Rita concordou que era possível. – Bem, disse ela; eu levo os sobrescritos para comparar a letra com as das cartas que lá aparecerem; se alguma for igual, guardo-a e rasgo-a... Nenhuma apareceu; mas daí a algum tempo Vilela começou a mostrar-se sombrio, falando pouco, como desconfiado. Rita deu-se pressa em dizê-lo ao outro, e sobre isso deliberaram. A opinião dela é que Camilo devia tornar à casa deles, tatear o marido, e pode ser até que lhe ouvisse a confidência de algum negócio particular. Camilo divergia; aparecer depois de tantos meses era confirmar a suspeita ou denúncia. Mais valia acautelarem-se, sacrificando-se por algumas semanas. Combinaram os meios de se corresponderem, em caso de necessidade, e separaram-se com lágrimas. No dia seguinte, estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela; “Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora.” Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, advertiu que teria sido mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava matéria especial, e a letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou todas essas coisas com a notícia da véspera. – Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora, – repetia ele com os olhos no papel. Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e lacrimosa. Vilela indignado, pegando da pena e escrevendo o bilhete, certo de que ele acudiria, e esperando-o para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo: depois sorriu amarelo, e em todo caso repugnavalhe a ideia de recuar, e foi andando. De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia

achar algum recado de Rita, que lhe explicasse tudo. Não achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a ideia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser que Vilela conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente, apenas com um pretexto fútil, viria confirmar o resto. Camilo ia andando inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam decoradas, diante dos olhos, fixas; ou então, – o que era ainda pior, – eram-lhe murmuradas ao ouvido, com a própria voz de Vilela. “Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora.” Ditas assim, pela voz do outro, tinham um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já, para quê? Era perto de uma hora da tarde. A comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou o que se iria passar, que chegou a crê-lo e vê-lo. Positivamente, tinha medo. Entrou a cogitar em ir armado, considerando que, se nada houvesse, nada perdia, e a precaução era útil. Logo depois rejeitava a ideia, vexado de si mesmo, e seguia, picando o passo, na direção do Largo da Carioca, para entrar num tílburi. Chegou, entrou e mandou seguir a trote largo. “Quanto antes, melhor, pensou ele; não posso estar assim...” Mas o mesmo trote do cavalo veio agravar-lhe a comoção. O tempo voava, e ele não tardaria a entestar com o perigo. Quase no fim da Rua da Guarda Velha, o tílburi teve de parar; a rua estava atravancada com uma carroça, que caíra. Camilo, em si mesmo, estimou o obstáculo, e esperou. No fim de cinco minutos, reparou que ao lado, à esquerda, ao pé do tílburi, ficava a casa da cartomante, a quem Rita consultara uma vez, e nunca ele desejou tanto crer na lição das cartas. Olhou, viu as janelas fechadas, quando todas as outras estavam abertas e pejadas de curiosos do incidente da rua. Dir-se-ia a morada do indiferente Destino. Camilo reclinou-se no tílburi, para não ver nada. A agitação dele era grande, extraordinária, e do fundo das camadas morais emergiam alguns fantasmas de outro tempo, as velhas crenças, as superstições antigas. O cocheiro propôs-lhe voltar a primeira travessa, e ir por outro caminho; ele respondeu que não, que esperasse. E inclinava-se para fitar a casa... Depois fez um gesto incrédulo: era a ideia de ouvir a cartomante, que lhe passava ao longe, muito longe, com vastas asas cinzentas; desapareceu, reapareceu, e tomou a esvair-se no cérebro; mas daí a pouco moveu outra vez as asas, mais perto, fazendo uns giros concêntricos... Na rua, gritavam os homens, safando a carroça:

– Anda! agora! empurra! vá! vá! Daí a pouco estaria removido o obstáculo. Camilo fechava os olhos, pensava em outras coisas; mas a voz do marido sussurrava-lhe às orelhas as palavras da carta: “Vem, já, já...” E ele via as contorções do drama e tremia. A casa olhava para ele. As pernas queriam descer e entrar... Camilo achou-se diante de um longo véu opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas coisas. A voz da mãe repetia-lhe uma porção de casos extraordinários; e a mesma frase do príncipe de Dinamarca reboava-lhe dentro: “Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a filosofia...” Que perdia ele, se...? Deu por si na calçada, ao pé da porta; disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o corrimão pegajoso; mas ele não viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve ideia de descer; mas era tarde, a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas, três pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. Camilo disse que ia consultá-la, ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio. A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as costas para a janela, de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas. Enquanto as baralhava, rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo dos olhos. Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com grandes olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a mesa, e disse-lhe: – Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto... Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo. – E quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma coisa ou não... – A mim e a ela, explicou vivamente ele. A cartomante não sorriu; disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os maços, uma, duas, três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela, curioso e ansioso. – As cartas dizem-me...


CONTO Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo. Não obstante, era indispensável muita cautela; ferviam invejas e despeitos. Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza de Rita... Camilo estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na gaveta. – A senhora restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a mão por cima da mesa e apertando a da cartomante. Esta levantou-se, rindo. – Vá, disse ela; vá, ragazzo innamorato... E de pé, com o dedo indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como se fosse a mão da própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda, sobre a qual estava um prato com passas, tirou um cacho destas, começou a despencá-las e comê-las, mostrando duas fileiras de dentes que desmentiam as unhas. Nessa mesma ação comum, a mulher tinha um ar particular. Camilo, ansioso por sair, não sabia como pagasse; ignorava o preço. – Passas custam dinheiro, disse ele afinal, tirando a carteira. Quantas quer mandar buscar? – Pergunte ao seu coração, respondeu ela. Camilo tirou uma nota de dez mil-réis, e deu-lha. Os olhos da cartomante fuzilaram. O preço usual era dois mil-réis. – Vejo bem que o senhor gosta muito dela... E faz bem; ela gosta muito do senhor. Vá, vá, tranquilo. Olhe a escada, é escura; ponha o chapéu... A cartomante tinha já guardado a nota na algibeira, e descia com ele, falando,

com um leve sotaque. Camilo despediu-se dela embaixo, e desceu a escada que levava à rua, enquanto a cartomante, alegre com a paga, tomava acima, cantarolando uma barcarola. Camilo achou o tílburi esperando; a rua estava livre. Entrou e seguiu a trote largo. Tudo lhe parecia agora melhor, as outras coisas traziam outro aspecto, o céu estava límpido e as caras joviais. Chegou a rir dos seus receios, que chamou pueris; recordou os termos da carta de Vilela e reconheceu que eram íntimos e familiares. Onde é que ele lhe descobrira a ameaça? Advertiu também que eram urgentes, e que fizera mal em demorar-se tanto; podia ser algum negócio grave e gravíssimo. – Vamos, vamos depressa, repetia ele ao cocheiro. E consigo, para explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer coisa; parece que formou também o plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta com os planos, reboavam-lhe na alma as palavras da cartomante. Em verdade, ela adivinhara o objeto da consulta, o estado dele, a existência de um terceiro; por que não adivinharia o resto? O presente que se ignora vale o futuro. Era assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do rapaz iam tornando ao de cima, e o mistério empolgava-o com as unhas de ferro. Às vezes queria rir, e ria de si mesmo, algo vexado; mas a mulher, as cartas, as palavras secas e afirmativas, a exortação: – Vá, vá, ragazzo innamorato; e no fim, ao longe, a barcarola da despedida, lenta e graciosa, tais eram os elementos recen-

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tes, que formavam, com os antigos, uma fé nova e vivaz. A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, longo, longo, interminável. Daí a pouco chegou à casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e entrou. A casa estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra, e mal teve tempo de bater, a porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela. – Desculpa, não pude vir mais cedo; que há? Vilela não lhe respondeu; tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal, e foram para uma saleta interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror: – ao fundo sobre o canapé, estava Rita morta e ensanguentada. Vilela pegou-o pela gola, e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão. Machado de Assis é considerado um dos maiores, se não o maior escritor brasileiro. Sua vasta obra, abrangendo todos os gêneros literários, dá-nos um exemplo de uma criação literária consciente. Observador arguto, crítico severo, recompõe, em seus livros, a vida e a sociedade carioca do século XIX. O conto publicado é considerado um dos mais ontológicos do grande escritor, notando-se uma das constantes problemáticas do autor, que é o estudo das diferentes facetas da alma humana. Extraído de: Várias histórias.

(ENTRE PARÊNTESIS)

Quem é quem? Amélia, que está sentada de costas para Maria, está à esquerda de Rosa. Helena não está tomando chá. Maria está à esquerda da moça que está de costas para Rosa. Pergunta-se: a) Quem está sentada na mesa indicada pelo número 1? b) Qual moça ainda não está tomando chá? c) Quem se senta na mesa número 3? d) O garçom está na direção de qual das moças? e) Qual moça não foi citada nos itens anteriores?

RESPOSTA Amélia está na mesa 1 ou na mesa 4. Se Amélia está na mesa 1, então Maria está na mesa 2 e Rosa, na mesa 3. Neste caso, Helena está na mesa 4, o que é absurdo, pois sabe-se que Helena não está tomando chá. Logo, Amélia está na mesa 4. Assim, Maria está na mesa 3; Rosa, na mesa 2 e Helena, na mesa 1. a) Helena b) Rosa c) Maria d) Rosa e) Amélia


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ARTIGO

Pesquisa identifica gene associado ao ganho de peso Maria Guimarães

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inúmeros estudos anteriores que examinaram o genoma inteiro em busca de genes que afetam características específicas: mais importante do que as porções dos genes que contêm o código para alguma proteína são as regiões antigamente conhecidas como DNA-lixo por não ter função conhecida. Hoje se sabe que elas atuam na regulação de outros genes, e é o que o grupo de Chicago e colaboradores mostram no caso específico da obesidade. O feito raro do trabalho é desvendar os mecanismos pelos quais o gene está associado ao Nata-Lia/Shutterstock

a busca por culpados pelo excesso de peso, um gene conhecido como FTO ganhou destaque nos últimos anos. Mais especificamente, alterações numa região sem função conhecida, já que não participa da produção da proteína codificada por aquele gene. Um artigo publicado em 12/3 no site da revista Nature, porém, desvia o foco e explica por que não se conseguia estabelecer uma conexão entre mutações nessa região, um íntron, e a função do FTO. “Estávamos procurando os efeitos no gene errado”, diz o geneticista brasileiro Marcelo Nóbrega, da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos. O estudo coordenado por ele mostrou que alterações na parte não codificante do FTO na verdade afeta o funcionamento de outro gene bem distante na fita do DNA, chamado de IRX3. No material genético, este assume agora o topo do pódio como o maior responsável pelo ganho de peso. Mas não adianta jogar toda a culpa nele como justificativa para comer grandes quantidades de doces e deixar de fazer exercícios. “O efeito dessas variantes genéticas no peso são modestos: se você as tiver, é cerca de 3 quilogramas mais gordo do que se não as tiver”, explica Nóbrega. Segundo ele, duas em cada três pessoas têm pelo menos uma cópia dessa alteração em seu gene FTO, e uma em cada seis tem ambas as cópias alteradas, aumentando o risco de ganho excessivo de peso. O trabalho do laboratório de Nóbrega se baseia na noção que emergiu de

Gene chamado de IRX3 poderia ser o maior responsável pelo ganho de peso.

efeito, o que depende de procedimentos experimentais complexos. Para isso, eles usaram abordagens múltiplas. Encontraram a interação entre o funcionamento do FTO e do IRX3 em embriões de camundongo e de peixe-paulistinha, o zebrafish, no cérebro de camundongos adultos e em células humanas, um indício de que do ponto de vista evolutivo a relação entre esses genes é antiga. Em 153 amostras de células cerebrais humanas, os pesquisadores mostraram que a expressão do

IRX3 de fato afeta a produção de substâncias associadas à obesidade, ao contrário do que observaram para o FTO. Por fim, produziram camundongos com defeito no IRX3 e observaram que eles são mais magros do que os normais, caracterizados por um metabolismo mais rápido e um acúmulo menor de gordura. Eles na verdade tendem a produzir um tipo de gordura não associado ao sobrepeso, a marrom. Os resultados são um passo na compreensão da influência genética sobre a tendência a ganhar peso, mas Nóbrega é realista quanto à possibilidade de se desenvolver novos medicamentos emagrecedores com base em suas descobertas. “No momento não tem nenhuma e é possível que continue a não ter”, afirma. “Tendo dito isso, é exatamente o que estamos agora investigando e investindo.” Um aspecto importante do trabalho é dar um exemplo de como investigar associações entre o genoma e determinadas características. “Acreditamos que há um número grande de histórias parecidas com a do FTO-IRX3, em que uma avaliação mais cuidadosa acabará por revelar que o gene-alvo das variantes associadas a um traço não era o que a comunidade acreditava”, diz Nóbrega. Estudos desse tipo ajudam cada vez mais a entender a complexidade dos sistemas de regulação embutidos no material genético. Extraído de: Revista Pesquisa Fapesp, mar./2014.

SOBRE AS PALAVRAS

Arco-da-velha Arco-da-velha e arco-celeste são nomes menos populares do arco-íris. Segundo alguns linguistas, a expressão é uma referência à faixa multicolorida que apareceu no céu logo após o dilúvio bíblico, sendo sinal de que a aliança entre Deus e os homens não havia sido quebrada. Com o passar do tempo, a expressão ampliaria seu sentido, sendo usada para indicar qualquer coisa fantástica, incrível, maravilhosa. Outros estudiosos acreditam que a expressão nasceu a partir de ilustrações medievais que mostravam velhas senhoras, possivelmente bruxas, sentadas sobre o arco-íris. Segundo a superstição popular dos séculos XIII a XVIII, as bruxas faziam do arco um meio de transporte para roubar ouro de um lugar e depositar em outro. Acredita-se que, por causa disso, no final do arco-íris existia um pote de ouro.


POIS É, POESIA

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Castro Alves (1847-1871) Adormecida Ses longs cheveux épars Ia couvrent tout entière La croix de son collier repose dans sa main, Comme pour témoigner qu’elle a fait sa prière. Et qu’elle va Ia faire en s’évelliant demain. (A. de Musset)

Uma noite, eu me lembro... Ela dormia Numa rede encostada molemente... Quase aberto o roupão... solto o cabelo E o pé descalço do tapete rente. ‘Stava aberta a janela. Um cheiro agreste Exalavam as silvas da campina... E ao longe, num pedaço do horizonte, Via-se a noite plácida e divina. De um jasmineiro os galhos encurvados, Indiscretos entravam pela sala, E de leve oscilando ao tom das auras, Iam na face trêmulos – beijá-la. Era um quadro celeste!... A cada afago Mesmo em sonhos a moça estremecia... Quando ela serenava... a flor beijava-a... Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia... Dir-se-ia que naquele doce instante Brincavam duas cândidas crianças... A brisa, que agitava as folhas verdes, Fazia-lhe ondear as negras tranças! E o ramo ora chegava ora afastava-se... Mas quando a via despeitada a meio, P’ra não zangá-la... sacudia alegre Uma chuva de pétalas no seio... Eu, fitando esta cena, repetia Naquela noite lânguida e sentida: “Ó flor! – tu és a virgem das campinas! Virgem! – tu és a flor da minha vida!...” S. Paulo, novembro de 1868.

O fantasma e a canção Orgulho! desce os olhos dos céus sobre ti mesmo, e vê como os nomes mais poderosos vão se refugiar numa canção. (Byron)

– Quem bate? – “A noite é sombria!” – Quem bate? – “É rijo o tufão!... Não ouvis? a ventania

Ladra à lua como um cão.” – Quem bate? – “O nome qu’importa? Chamo-me dor... abre a porta! Chamo-me frio... abre o lar! Dá-me pão... chamo-me fome! Necessidade é o meu nome!” – Mendigo! podes passar! “Mulher, se eu falar, prometes A porta abrir-me?” – Talvez. – “Olha... Nas cãs deste velho Verás fanados lauréis. Há no meu crânio enrugado O fundo sulco traçado Pela c’roa imperial. Foragido, errante espectro, Meu cajado – já foi cetro! Meus trapos – manto real!”

As almas angustiadas, Como águias desaninhadas, Gemendo voam no ar. E enchem de vagos lamentos As vagas negras dos ventos, Os ventos do negro mar!” “Bati a todas as portas Nem uma só me acolheu!...” – “Entra! – : Uma voz argentina Dentro do lar respondeu. – “Entra, pois! Sombra exilada, Entra! O verso – é uma pousada Aos reis que perdidos vão. A estrofe – é a púrpura extrema, Último trono – é o poema! Último asilo – a Canção!...” Bahia, 13 de dezembro de 1869.

– Senhor, minha casa é pobre... Ide bater a um solar! – “De lá venho... O Rei-fantasma Baniram do próprio lar. Nas largas escadarias, Nas vetustas galerias, Os pajens e as cortesãs Cantavam!... Reinava a orgia!... Festa! Festa! E ninguém via O Rei coberto de cãs!” – Fantasmas! Aos grandes, que tombam, É palácio o mausoléu! – “Silêncio! De longe eu venho... Também meu túmulo morreu. O séc’lo – traça que medra Nos livros feitos de pedra – Rói o mármore, cruel. O tempo – Átila terrível Quebra co’a pata invisível Sarcófago e capitel. “Desgraça então para o espectro, Quer seja Homero ou Solon, Se, medindo a treva imensa Vai bater ao Panteon... O motim – Nero profano – No ventre da cova insano Mergulha os dedos cruéis. Da guerra nos paroxismos Se abismam mesmo os abismos E o morto morre outra vez! “Então, nas sombras infindas, S’esbarram em confusão Os fantasmas sem abrigo Nem no espaço, nem no chão...

Os três amores

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Minh’alma é como a fronte sonhadora Do louco bardo, que Ferrara chora... Sou Tasso!... a primavera de teus risos De minha vida as solidões enflora... Longe de ti eu bebo os teus perfumes, Sigo na terra de teu passo os lumes... – Tu és Eleonora... II Meu coração desmaia pensativo, Cismando em tua rosa predileta. Sou teu pálido amante vaporoso, Sou teu Romeu... teu lânguido poeta!... Sonho-te às vezes virgem... seminua... Roubo-te um casto beijo à luz da lua... – E tu és Julieta... III Na volúpia das noites andaluzas O sangue ardente em minhas veias rola... Sou D. Juan!... Donzelas amorosas, Vós conhecei-me os trenos na viola! Sobre o leito do amor teu seio brilha... Eu morro, se desfaço-te a mantilha... Tu és – Júlia, a Espanhola!... Recife, setembro de 1866. Extraído de: “Espumas flutuantes”. Obras completas. Ed. Nova Aguilar, 1976.


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ARTIGO

O tráfico negreiro André Kédros

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s descobrimentos portugueses e o impulso que o Infante D. Henrique, o Navegador (1394-1460), deu às expedições negreiras estiveram na origem da introdução, desde o inicio do século XV, tanto em Portugal quanto na Espanha, de numerosos escravos negros originários da costa ocidental da África. Mas foi a descoberta do Novo Mundo que estimulou possantemente o tráfico de negros. A partir de São Domingos (Hispaniola), a conquista espanhola ganhou Porto Rico, Jamaica e Cuba. Os primeiros escravos desembarcados nas Caraíbas vinham da Espanha ou de Portugal. Entretanto, os escravos eram logo expedidos diretamente da costa da Guiné. Eram destinados às plantações e às minas de cobre. O rei da Espanha outorgou, em 12 de fevereiro de 1528, a primeira licença (asiento) para o comércio regular de escravos a dois profissionais alemães, Heinrich Ehinger e Hieronimus Sayler, agentes dos Welser, banqueiros que, com os Fugger, dominavam as finanças espanholas. Em seguida, outros asientos autorizaram traficantes portugueses ou espanhóis a transportar escravos para as Caraíbas, a partir dos seguintes pontos: Sevilha, Lisboa, ilhas Canárias, ilhas de Cabo Verde, São Tomé, Angola, São Jorge de Mina. Este tráfico “legal” não impediu ingleses e holandeses de entregar clandestinamente escravos negros aos colonos espanhóis de São Domingos e outras áreas, em troca de ouro, açúcar e couro. O monopólio espanhol foi decididamente vencido após a derrota da Invencível Armada, em 1588, e a ocupação da Jamaica pelos ingleses. Sir Francis Drake e Sir John Hawkins, os principais artesãos do desastre marítimo espanhol, transformaram-se também nos pilares da Company of Royal Adventures, fundada com autorização e participação financeira da rainha Elisabeth (1533-1603), e que praticará o tráfico dos negros na costa africana, do Senegal até o rio Gâmbia. Mais corsários e piratas que traficantes, esses aventureiros de alta linhagem fizeram da ilha Tortuga, nas Caraíbas, seu refúgio favorito. Os holandeses que, a partir do final do século XVI, tinham reconquistado a sua independência e arrancado dos portugueses alguns dos pontos de apoio na costa africana lançaram-se ao comércio de escravos em grande escala.

(1) Produtos das colônias. (2) Mercadorias para trocar por escravos. (3) Escravos. (4) Tabaco para trocar por escravos.

Enfim, sob a autoridade de Richelieu, mas sobretudo sob a de Colbert, depois que ocuparam Tortuga e São Domingos, os franceses conseguiram a sua parte nesse comércio internacional muito especial. Depois dos armadores de Le Havre, os'de Dieppe, de Rouen, de Saint-Malo e, mais tarde, de Bordéus compraram escravos no Senegal, em Cabo Verde e em outros lugares, para revendê-los, sempre como os seus concorrentes ingleses, holandeses e portugueses, nos portos das Antilhas, da Guiana, da América do Norte, da Venezuela, do Brasil, etc. Com efeito, após ter quase exterminado os índios aborígines e levando em conta também as taxas de mortalidade elevadas que reinavam entre os escravos negros importados, as colônias das ilhas e do continente americano se encontravam permanentemente com falta de mão de obra. De 1666 a 1800, foram conduzidos para as colônias do Novo Mundo mais de 10 milhões de escravos negros. A rota triangular dos negreiros era, então, a seguinte: partiam dos portos europeus com navios carregados de mercadorias de pacotilha*, adquiriam, nos mercados de escravos da costa africana (mais frequentemente por meio da troca), os escravos negros que transportavam e revendiam ao Novo Mundo com um lucro considerável; retornavam em seguida aos seus portos de origem com os navios carregados de preciosos gêneros coloniais: ouro, açúcar, tabaco, algodão, couro, etc. Vários autores puderam assim afirmar que o florescimento não só do comércio internacional, mas também da industrialização dos países da Europa Ocidental (onde se fabricavam, por exemplo, barras de ferro e peças de algodão destinadas à troca negreira), foi devido, em grande parte, ao tráfico dos negros. Na Europa e na Ásia, criou-se o hábito, desde a Antiguidade, de não mais exterminar os prisioneiros, mas de fazer deles, frequentemente, escravos. Isso era válido também, numa escala relativamente reduzida, para a África. Assim, nas guerras entre as tribos, os prisioneiros, submetidos a uma condição servil, eram mais ou menos integrados à comunidade que os acolhia. Mas o tráfico atlântico inverteu os dados do problema. Estimulados pelo atrativo do ganho, os numerosos chefes de tribo ou de aldeia que partilharam os despojos do grande império africano songai (do início do século XV ao final do século XVI) dedicaram-se a guerrear-se uns aos outros incessantemente, com o único objetivo de arranjar cativos, que vendiam em seguida nos grandes mercados de escravos de Segu, do Bambarena, do Khasso e do Bambuk. De lá, mercadores indígenas que os europeus chamavam de “corretores” (principalmente os sarakolé, os mandinga e os haússas) os conduziam para as feitorias europeias da costa, infligindo-lhes, no decorrer da viagem, privações e tratamentos cruéis destinados a matar neles qualquer veleidade de revolta. Com medo das feras, as caravanas que deviam reunir-se aos franceses só tomavam o caminho do Galam na proximidade das chuvas; as que se dirigiam para os ingleses só se punham em movimento pela Gâmbia quando os rios estavam vadeáveis e o mato destruído pelo fogo. A ilha de Gorée foi durante muito tempo um dos mais importantes “campos de triagem” dos escravos encaminhados por essas caravanas.

As vítimas acorrentadas. Intenso até a derrocada (em 1592) do império songai, o tráfico praticado pelos árabes, e mais geralmente pelos muçulmanos, tornou-se mais fraco no início do século XVII, para ser retomado vigorosamente a seguir. As caravanas tomavam como carga os escravos na região que se estende do país dos haússas ao lago Chade, depois subiam para o norte por Zinder e Agades. A partir do Fezzan, os tuaregues as conduziam para Tripolitânia e Ghadamés. De lá, as caravanas se separavam para se dirigir para Marrocos e Tunísia. Os escravos negros atravessavam, a pé, 3 000 km de deserto. De Túnis, assim como de Trípoli, eram enviados ao Levante e vendidos pela quarta ou quinta vez. Ao leste, os principais centros de tráfico eram Mombaça, Zanzibar, Kilwa e Bagamoyo. A partir desses centros, os mercadores árabes se internavam pelo continente africano até o Congo e mesmo até Angola. Enquanto, sob o efeito das revoltas de escravos (como em São Domingos) e das leis que visavam a abolição da escravatura, o tráfico praticado pelos europeus tendia, no decorrer do século XIX, a se enfraquecer ou a se tornar clandestino, ganhava em importância em regiões do leste africano. Considera-se hoje que a escravidão, no sentido próprio da palavra, está universalmente abolida. Em todo o caso, está universalmente condenada. A maioria das nações africanas atingiu a independência. Mas imagina-se que elas conservam marcas terríveis que lhes infligiram as feridas, cuja cicatrização só pode ser longa e difícil. Traduzido por Eliane Zagury.

André Kédros é um escritor grego que escreve em francês. Publicou uma dezena de romances que foram traduzidos para diversas línguas e é autor de A resistência grega. Sob o pseudônimo de André Massepain já escreveu vários livros para crianças, que, traduzidos para muitas línguas, lhe valeram uma série de prêmios. (*) pacotilha: artigo mal-acabado, grosseiro. Extraído de: O Correio da Unesco.

SERVIÇO DE VESTIBULAR Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) Período de inscrição: até 16 de junho de 2014. Somente via Internet. Endereço da faculdade: Rua Marquês de São Vicente, 225 – CEP 22451-900 – Gávea – Rio de Janeiro – RJ – Fone: (21) 3527-1001. Requisito: taxa de R$ 150,00. Cursos e vagas: consultar site www.puc-rio.br Exame: dia 6 de julho de 2014.


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