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Jornal do Vestibulando
ENSINO, INFORMAÇÃO E CULTURA
JORNAL ETAPA – 2014 • DE 30/10 A 12/11
ENTREVISTA
“Não imaginava 96 pontos nas prioritárias. Não ia tão bem assim nos simulados.”
Lucas Oliveira Tecchio Em 2013: Etapa Em 2014: Engenharia de Produção – Poli/USP
JV – Fale sobre a escolha da sua carreira. Lucas – Sempre tendi para Engenharia. No ano passado me decidi por Engenharia de Produção. As palestras do Etapa me ajudaram a pensar nisso. Vi que Produção é mais ampla, conciliando Humanas com Exatas.
Além da Fuvest, você prestou outros vestibulares? Prestei Unicamp para Engenharia Mecânica. E fiz o Enem.
Como você veio estudar aqui? Tinha dois amigos que fizeram o Colégio Etapa e que passaram na Poli. Eles me falaram para estudar no cursinho. Foi assim que me interessei e decidi fazer, ver se conseguia conciliar colégio com cursinho. Foi dando certo e eu continuei.
Desde o início do cursinho você conseguiu estudar tudo? No primeiro mês precisei ir com mais calma. Vinha a todas as aulas, mas na primeira apostila fiquei mais na parte daqueles exercícios básicos de Exatas. Só consegui acelerar o processo mais tarde quando, no meio do ano, eu passei a ver no colégio o que já tinha visto no cursinho. Então o cursinho passou o colégio. Deu para me dedicar mais ao cursinho e melhorei cada vez mais.
ENTREVISTA
Lucas Oliveira Tecchio
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Como era sua rotina de estudos? De manhã eu ia ao colégio, depois vinha para o cursinho e chegava em casa às 7 e meia da noite. Ficava até 9 e meia estudando. Não vou dizer que gostava dessa rotina, porque era muito intensa, mas eu gostava de estudar, principalmente Física, Química, Matemática. Também Biologia, de que sempre gostei muito.
No fim de semana, como era? No sábado eu estudava as matérias do cursinho. Lembro de dois ou três sábados em que fiquei das 10 e meia da manhã até 10 e meia da noite só na apostila. No domingo, se faltava alguma coisa para o Etapa, eu fazia primeiro e depois fazia lição e trabalho do colégio. Essa rotina foi principalmente no 2o semestre.
Como você ia nos simulados? Ficava entre C menos e C mais. Passado o 1o semestre, comecei a estudar mais. Então cheguei a ter mais B. Faixa A, só consegui nos simulados de Revisão.
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Você teve de abrir mão de alguma atividade para se preparar para os vestibulares? Deixei de sair com meus amigos, deixei muitas vezes de almoçar em família no domingo. No Natal e no Ano Novo fiquei estudando até 9 e meia da noite. No dia seguinte continuei estudando.
O que você fez nas duas semanas de férias no meio do ano? Como eu queria engrenar no segundo semestre, tentei descansar. Separei uns três dias para estudar, mas bem leve, umas quatro horas por dia.
Qual a época mais puxada para você? No final do ano, próximo da 2a fase, eu estava bastante cansado, mas tinha muito exercício para fazer.
Na 1a fase da Fuvest, quantos pontos você fez? Acertei 72. Depois, com a anulação de uma questão,fui para 73.
Como você fazia quando tinha dúvida nos exercícios?
Para a 2a fase, como você organizou seus estudos?
Eu via as soluções no site do curso. Aquelas resoluções escritas eram sensacionais e me ajudavam em tudo que eu precisava. Hoje isso faz falta na universidade.
Quando acabei a apostila de Revisão Final, aproveitei para rever matérias e resolver vestibulares anteriores da Fuvest. A parte de Exatas eu fiz desde 2007. E olhei os te-
ARTIGO Pesquisa analisa registro espontâneo feito por crianças
ENTRE PARÊNTESIS
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POIS É, POESIA
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Clara dos Anjos – Lima Barreto
Lucas Oliveira Tecchio fez o cursinho junto com o colegial. Entrou na Poli no curso de Engenharia de Produção, numa classificação excelente, superior a de 94% dos aprovados. Entrou também na Unicamp. Aqui ele conta como se preparou no cursinho, fala de seus resultados nas provas e da nova grade curricular na Poli. E diz como se sentiu ao ver o nome nas listas: “Passar é espetacular... uma sensação incrível”.
Seleta modernista
O tabuleiro
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mas de umas 10 redações. Eu procurava ver como raciocinar sobre aqueles temas.
Na 2a fase, quais foram suas notas? No primeiro dia, na prova de Português e Redação, tirei 67. Na Redação fiquei com 72,5. No segundo dia, na prova geral, tirei 78. No terceiro dia, das matérias prioritárias da carreira, tirei 96.
Nessas notas, alguma surpresa? Não imaginava 96 pontos nas prioritárias. Não ia tão bem assim nos simulados. A nota de Português também me surpreendeu. Para passar, eu tinha como meta me diferenciar em alguma coisa, tentando ir bem na prova de Português.
Na escala de zero a 1 000, qual foi sua pontuação na Fuvest? 800.
E sua classificação? 48o [classificação superior a de 94% dos 750 aprovados na Poli].
Na Unicamp, você foi aprovado? Fui.
Qual foi sua classificação na Unicamp? 40o e pouco.
Como soube de sua aprovação na Fuvest? Meus amigos vinham para cá para ver a lista e eu vim também. Foi bem legal.
O que sentiu quando viu seu nome na lista? Passar é espetacular. Foi uma sensação incrível. Era um sonho que eu conseguia realizar.
Você já conhecia a Poli? Eu tinha ido à USP uma vez, em uma feira de profissões, e tinha passado pela Poli com meus amigos. Deu para conhecer o prédio do Biênio, que é o principal.
E no dia da matrícula como foi a recepção? Foi bem divertido, com um trote tranquilo.
Quais as matérias iniciais da Poli? Temos dois anos e meio de matérias mais gerais. Cálculo, Álgebra Linear, Física, Mecânica – que é Física mais prática – e Introdução a Ciências dos Materiais. Na nova estrutura curricular, desde o início já vão entrar matérias específicas da Produção. No primeiro semestre tive Economia
e no segundo semestre tenho Laboratório de Sistema de Informação. As duas são matérias da Produção, só que Economia é dada para a maioria dos cursos e Sistema de Informação é só Produção. No semestre que vem vou ter Automação e Controle, só da Produção.
ria, mas quero depois ir para outra área. Tenho paixão por games. E gostaria de trabalhar com a parte criativa dos games. Pensar o ambiente, os personagens. Tem Engenharia nisso.
De qual matéria você está gostando mais até agora?
Acho legal o que tenho na Poli, mas sinto falta de Humanas. Muita falta. Antes nem gostava tanto de Humanas, mas hoje percebo que eu gosto igualmente de Humanas e Exatas. Adoraria estudar agora Geografia e História. Sinto bastante falta.
Cálculo é o mais próximo que eu chego a ter da Matemática do colegial que era muito legal. Eu antes não gostava de Funções, mas em Cálculo ficou uma coisa natural. E você vê Geometria, fica muito legal. Sempre gostei bastante de Física, mas é bem mais difícil que antes, bem mais teórica. E tem algumas matérias muito teóricas, como Álgebra Linear. Mas podem ajudar no futuro. Gostei muito de Ciências dos Materiais porque lembra Física misturada com Química.
Quais são as matérias mais difíceis neste semestre? Mecânica está difícil, mas dá para levar. Tem umas que vão ser bem piores. Cálculo Numérico, muito difícil, que normalmente era dada no 2o semestre, na nova estrutura curricular passou para o 5o semestre. Física está difícil, mas está dando para levar. Algumas que eu imaginava difíceis, como Cálculo, não são tão difíceis assim. Quando entrei lá, todo mundo falava que Cálculo é terrível, é impossível. Não é assim.
Você está participando de alguma atividade extracurricular? Agora não. Pretendo participar no próximo semestre. Tem a Poli Júnior, que é meio uma inserção no mercado. Uma empresa feita pelos estudantes da Poli, que gerenciam projetos de pessoal de fora da Poli. E no primeiro semestre do ano que vem pretendo fazer uma monitoria.
Em qual matéria? Geometria e Produção Gráfica. Mexe com dispositivo que você consegue modelar. Você consegue desenhar uma esfera e mexer com ela. É um projeto em que você modela tudo em software e no final faz uma máquina.
Você tem interesse na área acadêmica, ou em alguma outra área? Não penso em seguir pela carreira acadêmica. Eu gosto bastante de Engenha-
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Você gosta dessa parte criativa. Você sente falta de algo nessa parte?
Agora é época de revisão. Como foi para você esta fase de cursinho? Agora, na Revisão, vem o momento certo para engrenar 100%. Revi e entendi muita coisa que eu não tinha entendido e cai em todo vestibular. Mesmo na Revisão comecei entender funções, mas então passei a fazer exercícios e fluiu. E até hoje isso é fundamental em Cálculo.
O que você diria a quem está indo para um novo vestibular depois de não ter conseguido no ano passado? O importante é se dedicar nestes últimos meses e engrenar muito. É o gás final.
Você se sente diferente de quando entrou no cursinho? O vestibular mudou um pouco o meu pensamento. Percebo que me esforçando o vestibular deixou de parecer muito difícil. Não podia imaginar que iria conseguir a classificação que atingi na Fuvest. Se não tivesse estudado nesses últimos meses, não ia chegar nesse resultado.
Você sente falta de alguma coisa que tinha aqui no ano passado? Sinto falta das aulas que eram muito boas, com professores muito didáticos. Agora o professor chega na sala, mal dá bom dia e já começa a escrever na lousa, sem aquela didática. E sinto falta das resoluções que tinha no site, quando não conseguia resolver um exercício. Dava para entender plenamente. Falta isso agora.
O que a experiência do ano passado ensinou a você? Que vale a pena o esforço. O seu esforço é fundamental para fazer você chegar onde quer. É importante lidar com esse tempo de sonhos e lutas de uma forma agradável.
Jornal ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343
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Clara dos Anjos Lima Barreto carteiro Joaquim dos Anjos não era homem de serestas e serenatas, mas gostava de violão e de modinhas. Ele mesmo tocava flauta, instrumento que já foi muito estimado, não o sendo tanto atualmente como outrora. Acreditava-se até músico, pois compunha valsas, tangos e acompanhamentos para modinhas. Aprendera a “artinha” musical na terra de seu nascimento, nos arredores de Diamantina, e a sabia de cor e salteado; mas não saíra daí. Pouco ambicioso em música, ele o era também nas demais manifestações de sua vida. Empregado de um advogado famoso, sempre quisera obter um modesto emprego público que lhe desse direito à aposentadoria e ao montepio, para a mulher e a filha. Conseguira aquele de carteiro, havia quinze para vinte anos, com o qual estava muito contente, apesar de ser trabalhoso e o ordenado ser exíguo. Logo que foi nomeado, tratou de vender as terras que tinha no local de seu nascimento e adquirir aquela casita de subúrbio, por preço módico, mas, mesmo assim, o dinheiro não chegara e o resto pagou ele em prestações. Agora, e mesmo há vários anos, estava de plena posse dela. Era simples a casa. Tinha dois quartos, um que dava para a sala de visitas e outro, para a de jantar. Correspondendo a um terço da largura total da casa, havia, nos fundos, um puxadito que era a cozinha. Fora do corpo da casa um barracão para banheiro, tanque, etc.; e o quintal era de superfície razoável, onde cresciam goiabeiras maltratadas e um grande tamarineiro copado. A rua desenvolvia-se no plano e, quando chovia, encharcava que nem um pântano; entretanto, era povoada e dela se descortinava um lindo panorama de montanhas que pareciam cercá-la de todos os lados, embora a grande distância. Tinha boas casas a rua. Havia até uma grande chácara de outros tempos com aquela casa característica decorada de azulejos até à metade do pé direito, um tanto feia, é fato, sem garridice1, mas casando-se perfeitamente com as anosas mangueiras, com as robustas jaqueiras e com todas aquelas grandes e velhas árvores que, talvez, os que as plantaram, não tivessem visto frutificar. Por aqueles tempos, nessa chácara, se haviam estabelecido os “bíblia”2. Os seus cânticos, aos sábados, quase de hora em hora, enchiam a redondeza. O povo não os via com hostilidade, mesmo alguns humildes homens e pobres raparigas simpatizavam com eles, porque, justificavam, não eram como os padres que, para tudo, querem dinheiro. Chefiava os protestantes, um americano, Mr. Sharp, homem tenaz e cheio de uma eloquência bíblica que devia ser magnífica em inglês; mas que no seu duvidoso portu-
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guês, se fazia simplesmente pitoresca. Era Sharp daquela raça curiosa de yankees que, de quando em quando, à luz da interpretação de um ou mais versículos da Bíblia, fundam seitas cristãs, propagam-nas, encontram adeptos logo, os quais não sabem bem porque foram para a nova e qual a diferença que há entre esta e a de que vieram. Fazia prosélitos3 e, quando se tratava de iniciar uma turma, os noviços dormiam em barracas de campanha, erguidas no eirado4 da chácara ou entre as suas velhas árvores maltratadas e desprezadas. As cerimônias preparatórias duravam uma semana, cheia de cânticos divinos; e a velha propriedade, com as suas barracas e salmodias5, adquiria um aspecto esquisito de convento ao ar livre de mistura com um certo ar de acampamento militar. Da redondeza, poucos eram os adeptos ortodoxos; entretanto, muitos lá iam por mera curiosidade ou para deliciar-se com a oratória de Mister Sharp. Iam sem nenhuma repugnância, pois é próprio do nosso pequeno povo fazer um extravagante amálgama6 de religiões e crenças de toda a sorte, e socorrer-se desta ou daquela, conforme os transes de sua existência. Se se trata de afastar atraso de vida, apela para a feitiçaria; se se trata de curar uma moléstia tenaz e resistente, procura o espírita; mas, não falem à nossa gente humilde em deixar de batizar o filho pelo sacerdote católico, porque não há quem não se zangue: meu filho ficar pagão! Deus me defenda! Joaquim não fazia exceção desta regra e sua mulher, a Engrácia, ainda menos. Eram casados há quase vinte anos, mas só tinham uma filha, a Clara. O carteiro era pardo-claro, mas com cabelo ruim, como se diz; a mulher, porém, apesar de mais escura, tinha o cabelo liso. Na tez, a filha puxava o pai; e no cabelo, à mãe. Na estatura, ficara entre os dois. Joaquim era alto, bem alto, acima da média, ombros quadrados; a mãe, não sendo muito baixa, não alcançava a média, possuindo uma fisionomia miúda, mas regular, o que não acontecia com o marido que tinha o nariz grosso, quase chato. A filha, a Clara, tinha ficado em tudo entre os dois; média deles, era bem a filha de ambos. Habituada às musicatas do pai, crescera cheia de vapores das modinhas e enfumaçara a sua pequena alma de rapariga pobre com os dengues e a melancolia dos descantes7 e cantarolas. Com dezessete anos, tanto o pai como a mãe tinham por ela grandes desvelos e cuidados. Mais depressa ia Engrácia à venda de seu Nascimento, buscar isto, ou aquilo do que ela. Não que a venda do seu Nascimento fosse lugar de badernas; ao contrário: as pessoas que lá faziam “ponto” eram de todo respeito.
O Alípio, uma delas, era um tipo curioso de rapaz, que, conquanto pobre, não deixava de ser respeitador e bem-comportado. Tinha um aspecto de galo de briga; entretanto, estava longe de possuir a ferocidade repugnante desses galos malaios de apostas, não possuindo – é preciso saber – nenhuma. Um outro que aparecia sempre lá, era um inglês, Mr. Persons, desenhista de uma grande oficina mecânica das imediações. Quando saía do trabalho, passava na venda, lá se sentava naqueles característicos tamboretes de abrir e fechar, e deixava-se ficar até ao anoitecer bebericando ou lendo os jornais do Sr. Nascimento. Silencioso, quase taciturno, pouco conversava e implicava muito com quem o tratava por “seu mister”. Havia lá também o filósofo Menezes, um velho hidrópico8, que se tinha na conta de sábio, mas que não passava de um simples dentista clandestino e dizia tolices sobre todas as coisas. Era um velho branco, simpático com um todo de imperador romano, barbas alvas e abundantes. Aparecia, às vezes, o J. Amarante, um poeta, verdadeiramente poeta, que tivera o seu momento de celebridade em todo o Brasil, se ainda não a tem; mas que, naquela época, devido ao álcool e a desgostos íntimos, era uma triste ruína de homem, apesar dos seus dez volumes de versos, dez sucessos, com os quais todos ganharam dinheiro menos ele. Amnésico, semi-imbecilizado, não seguia uma conversa com tino e falava desconexamente. O subúrbio não sabia bem quem ele era; chamava-o muito simplesmente – o poeta. Um outro frequentador da venda era o velho Valentim, um português dos seus sessenta anos e pouco, que tinha o corpo curvado para diante, débito ao hábito contraído no seu ofício de chacareiro que já devia exercer há mais de quarenta. Contava “casos” e anedotas de sua terra, pontilhando tudo de rifões9 portugueses do mais saboroso pitoresco. Apesar de ser assim decente, Clara não ia à venda; mas o pai, em alguns domingos, permitia que fosse com as amigas ao cinema do Meyer ou Engenho de Dentro, enquanto ele e alguns amigos ficavam em casa tocando violão, cantando modinhas e bebericando parati10. Pela manhã, logo nas primeiras horas, os companheiros apareciam, tomavam café, iam em seguida para o quintal, para debaixo do tamarineiro, jogar bisca11, com o litro de cachaça ao lado; e aí sem dar uma vista d’olhos sobre as montanhas circundantes, nuas e empedrouçadas, deixavam-se ficar até à hora do “ajantarado” que a mulher e a filha preparavam. Só depois deste, é que as cantorias começavam.
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Certo dia, um dos companheiros dominicais do Joaquim pediu-lhe licença para trazer, no dia do aniversário dele, que estava próximo, um rapaz de sua amizade, o Júlio Costa, que era um exímio cantor de modinhas. Acedeu. Veio o dia da festa e o famoso trovador apareceu. Branco, sardento, insignificante, de rosto e de corpo, não tinha as tais melenas12 denunciadoras, nem outro qualquer traço de capadócio13. Vestia-se seriamente, com um apuro muito suburbano, sob a tesoura de alfaiate de quarta ordem. A única pelintragem14 adequada ao seu mister que apresentava, consistia em trazer o cabelo repartido no alto da cabeça, dividido muito exatamente pelo meio. Acompanhava-o o violão. A sua entrada foi um sucesso. Todas as moças das mais diferentes cores que, aí, a pobreza harmonizava e esbatia, logo o admiraram. Nem César Bórgia, entrando mascarado, num baile à fantasia dado por seu pai, no Vaticano, causaria tanta emoção. Afirmavam umas para as outras. – É ele! É ele, sim! Os rapazes, porém, não ficaram muito contentes com isso; e, entre eles, puseram-se a contar histórias escabrosas da vida galante do cantor de modinhas. Apresentado aos donos da casa e à filha, ninguém notou o olhar guloso que deitou para os seios empinados de Clara. O baile começou com a música de um “terno” de flauta, cavaquinho e violão. A polca era a dança preferida e quase todos dançavam-na com requebros próprios de samba. Num intervalo Joaquim convidou: – Por que não canta, seu Júlio? – Estou sem voz, respondeu ele. Até ali, ele tinha tomado parte no “terno”; e, repinicando as cordas, não deixava de devorar com os olhos os bamboleios de quadris de Clarinha, quando dançava. Vendo que seu pai convidara o rapaz, animou-se a fazê-lo também: – Por que não canta, seu Júlio? Dizem que o senhor canta tão bem... Esse – tão bem – foi alongado maciamente. O cantador acudiu logo: – Qual, minha senhora! São bondades dos camaradas... Consertou a “pastinha”15 com as duas mãos, enquanto Clara dizia: – Cante! Vá! – Já que a senhora manda, disse ele, vou cantar. Com todo o dengue, agarrou o violão, fez estalar as cordas e anunciou: – Amor e sonho. E começou, com uma voz muito alta, quase berrando, a modinha, para depois arrastá-la num tom mais baixo, cheio de mágoa e langor16, sibilando os ss, carregando os rr, das metáforas horrendas de que estava cheia a cantoria. A coisa era, porém, sincera; e mesmo as comparações estrambólicas17 levantavam nos singelos cérebros das ouvintes largas perspectivas de sonhos, erguiam desejos, despertavam anseios e visões douradas. Acabou. Os aplausos foram entusiásticos e só Clarinha não aplaudiu,
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porque, tendo sonhado durante toda a modinha, ficara ainda embevecida quando ela acabou... Dias depois, vindo à janela por acaso – era de tarde – sem grande surpresa, como se já o esperasse, Clara recebeu o cumprimento do cantor magoado. Não pôs malícia na coisa, tanto assim que disse candidamente à mãe: – Mamãe, sabe quem passou aí? – Quem? – Seu Júlio. – Que Júlio? – Aquele que cantou nos “anos”18 de papai. A vida da casa, após a festança de aniversário do Joaquim, continuou a ser a mesma. Nos domingos, aquelas partidas de bisca com o Eleutério, servente da Biblioteca, e com o Augusto, guarda municipal, acompanhadas de copitos de cachaça, e o violão, à tarde. Não tardou que se viesse agregar um novo comensal: era o Júlio Costa, o famoso modinheiro suburbano, amigo íntimo do Augusto e seu professor de trovas. Júlio quase nunca jantava, pois tinha quase sempre convites em todos os quatro pontos cardeais daquelas paragens. Tomava parte nas partidas de bisca, de parceirada, e pouco bebia. Apesar de não demorar-se pela tarde adentro, pôde ir cercando a rapariga, a Clara, cujos seios empinados, volumosos e redondos fascinavam-no extraordinariamente e excitavam a sua gula carnal insaciável. Em começo foram só olhares que a moça, com os seus úmidos olhos negros, grandes, quase cobrindo toda a esclerótica19, correspondia a furto e com medo; depois, foram pequenas frases, galanteios, trocados às escondidas, para, afinal, vir a fatídica carta. Ela recebeu-a, meteu-a no seio e, ao deitar-se, leu-a sob a luz da vela, medrosa e palpitante. A carta era a coisa mais fantástica, no que diz respeito à ortografia e à sintaxe, que se pode imaginar; tinha, porém, uma virtude: não era copiada do “Secretário dos Amantes”, era original. Contudo a missiva fez estremecer toda a natureza virgem de Clara que, com a sua leitura, sentiu haver nela surgido alguma coisa de novo, de estranho, até aí nunca sentida. Dormiu mal. Não sabia bem o que fazer: se responder, se devolver. Viu o olhar severo do pai; as recriminações da mãe. Ela, porém, precisava casar-se. Não havia de ser toda a vida assim como um cão sem dono... Os pais viriam a morrer e ela não podia ficar pelo mundo desamparada... Uma dúvida lhe veio; ele era branco; ela, mulata... Mas que tinha isso? Tinham-se visto tantos casos... Lembrou-se de alguns... Por que não havia de ser? Ele falava com tanta paixão... Ofegava, suspirava, chorava; e os seus seios duros estouravam de virgindade e de ansiedade de amar... Responderia; e assim fez, no dia seguinte. As visitas de Costa tornaram-se mais demoradas e as cartas mais constantes. A mãe desconfiou e perguntou à filha: – Você está namorando seu Júlio, Clarinha?
– Eu, mamãe! Nem penso nisso... – Está, sim! Então, não vejo? A menina pôs-se a chorar; a mãe não falou mais nisso; e Clara, logo que pôde, mandou pelo Aristides, um molecote da vizinhança, uma carta ao modinheiro, relatando o fato. Júlio morava na estação próxima e a situação de sua família era bem superior à da sua namorada. O seu pai tinha um emprego regular na Prefeitura e era, em tudo, diferente do filho. Sisudo, grave, sério, ia até à imponência grotesca do bom funcionário; e não seria capaz de admitir que a namorada do filho dançasse na sua sala. Sua mulher não tinha o ar solene do marido, era, porém, relaxada de modos e hábitos. Comia com a mão, andava descalça, catava intrigas e “novidades” da vizinhança; mas tinha, apesar disso, uma pretensão íntima de ser grande coisa, de uma grande família. Além do Júlio, tinha três filhas, uma das quais já era adjunta municipal; e, das outras duas, uma estava na Escola Normal e a mais moça cursava o Instituto de Música. Tiravam muito o pai, no gênio sobranceiro20, no orgulho fofo da família; e tinham ambição de casamentos doutorais. Mercedes, Adelaide e Maria Eugênia, eram esses os seus nomes, não suportariam de nenhuma forma Clara, como cunhada, embora desprezassem soberanamente o irmão pelos seus maus costumes, pelo seu violão, pelos seus plebeus galos de briga e pela sua ignorância crassa21. Pequenas burguesas, sem nenhuma fortuna, mas, devido à situação do pai e terem frequentado escolas de certa importância, elas não admitiriam para Clara, senão um destino: o de criada de servir. Entretanto, Clara era doce e meiga; inocente e boa, podia-se dizer que era muito superior ao irmão delas pelo sentimento, ficando talvez acima dele, pela instrução, conquanto fosse rudimentar, como não podia deixar de ser, dada a sua condição de rapariga pobríssima. Júlio era quase analfabeto e não tinha poder de atenção suficiente, para ler o entrecho de uma fita de cinematógrafo. Muito estúpido, a sua vida mental se cifrava na composição de modinhas delambidas22, recheadas das mais estranhas imagens que a sua imaginação erótica, sufocada pelas conveniências, criava, tendo sempre perante seus olhos o ato sexual. Mais de uma vez, ele se vira a braços com a polícia por causa de defloramentos e seduções de menores. O pai, desde a segunda, recusara intervir; mas a mãe, D. Ignez, a custo de rogos, de choro, de apelo – para a pureza de sangue da família, conseguira que o marido, o capitão Bandeira, procurasse influenciar, a fim de evitar que o filho casasse com uma negrinha de dezesseis anos, a quem o Júlio tinha feito mal. Apesar de não ser totalmente má, os seus preconceitos junto à estreiteza da sua inteligência, não permitiram ao seu coração que agasalhasse ou protegesse o seu infeliz
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CONTO neto. Sem nenhum remorso, deixou-o por aí, à toa, pelo mundo... O pai, desgostoso com o filho, largara-o de mão; e quase não se viam. Júlio vivia no porão da casa ou nos fundos da chácara onde tinha gaiolas de galos de briga, o bicho mais hediondo, mais repugnantemente feroz que é dado a olhos humanos ver. Era a sua indústria e o seu comércio, esse negócio de galos e as suas brigas em rinhadeiros23. Barganhava-os24, vendia-os, chocava as galinhas, apostava nas rinhas; e com o resultado disso e com alguns cobres que a mãe lhe dava, vivia e obtinha dinheiro para vestir-se. Era o tipo completo do vagabundo doméstico, como há milhares nos subúrbios e em outros bairros do Rio de Janeiro. A mãe, sempre temendo que se repetissem os seus ajustes de contas com a polícia, esforçava-se sempre por estar ao corrente dos seus amores. Veio a saber do seu último com Clara e repreendeu-o nos termos mais desabridos25. Ouviu-a o filho respeitosamente, sem dizer uma palavra; mas, julgou de boa política relatar, a seu modo, por carta, tudo à namorada. Assim escreveu: “Queridinha confesso-te que ontem quando recebi a tua carta minha mãe viu e fiquei tão louco que confessei tudo a mamãe que lhe amava muito e fazia por você as maiores violências, ficaram todos contra mim, é a razão por que previno-te que não ligues ao que lhe disserem, por isso peço-te que preze bem o meu sofrimento. Pense bem e veja se estás resolvida a fazer o que lhe pedi na última cartinha. Saudades e mais saudades deste infeliz que tanto lhe adora e não é correspondido. O teu Júlio.”
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Clara já estava habituada com a redação e ortografia do seu namorado, mas, apesar de escrever muito melhor, a sua instrução era insuficiente para desprezar um galanteador tão analfabeto. Ainda por cima, a sua fascinação pelo modinheiro e a sua obsessão pelo casamento tiravam-lhe toda a capacidade crítica que pudesse ter. A carta produziu o efeito esperado por Júlio. Choro, palpitações, anseios vagos, esperanças nevoentas, vislumbres de céus desconhecidos e encantados – tudo isso aquela carta lhe trouxe, além do halo de dedicação e amor por ela com que Clara fez resplandecer, na imaginação, as pastinhas do violeiro. Daí a dias, fez o prometido, isto é, deixou a janela do quarto aberta para que ele entrasse no aposento. Repetiu a façanha quase todas as noites seguintes, sem que ele se demorasse muito no quarto. Nos domingos, aparecia, cantava e semelhava que entre ambos não havia nada. Um belo dia, Clara sentiu alguma coisa de estranho no ventre. Comunicou ao namorado. Qual! Não era nada, disse ele. Era, sim; era o filho. Ela chorou, ele acalmou-a, prometendo casamento. O ventre crescia, crescia... O cantador de modinhas foi fugindo, deixou de aparecer amiúde; e Clara chorava. Ainda não lhe tinham percebido a gravidez. A mãe, porém, com auxílio de certas intimidades próprias de mãe para filha, desconfiou e pô-la em confissão. Clara não pôde esconder, disse tudo; e aquelas duas humildes mulheres choraram abraçadas diante do irremediável... A filha teve uma ideia: – Mamãe, antes da senhora dizer a papai, deixa-me ir até à casa dele, para falar com sua mãe?
A velha meditou e aceitou o alvitre26: – Vai! Clara vestiu-se rapidamente e foi. Recebida com altaneira27 por uma das filhas, disse que queria falar à mãe do Júlio. Recebeu-a esta rispidamente; mas a rapariga, com toda a coragem e com sangue-frio difícil de crer, confessou-lhe tudo, o seu erro e a sua desdita. – Mas, o que é que você quer que eu faça? – Que ele se case comigo, fez Clara num só hausto28. – Ora, esta! Você não se enxerga! Você não vê mesmo que meu filho não é para se casar com gente da laia de você! Ele não amarrou você, ele não amordaçou você... Váse embora, rapariga! Ora já se viu! Vá! Clara saiu sem dizer nada, reprimindo as lágrimas, para que na rua não lhe descobrisse a vergonha. Então, ela? Então, ela não se podia casar com aquele calaceiro29, sem nenhum título, sem nenhuma qualidade superior? Por quê? Viu bem a sua condição na sociedade, o seu estado de inferioridade permanente, sem poder aspirar a coisa mais simples que todas as moças aspiram. Para que seriam aqueles cuidados todos de seus pais? Foram inúteis e contraproducentes, pois evitaram que ela conhecesse bem justamente a sua condição e os limites das suas aspirações sentimentais... Voltou para casa depressa. Chegou; o pai ainda não viera. Foi ao encontro da mãe. Não lhe disse nada; abraçou-a, chorando. A mãe também chorou e, quando Clara parou de falar, entre soluços, disse: – Mamãe, eu não sou nada nesta vida.
(12) cabelos longos e soltos. (13) impostor, trapaceiro. (14) qualidade de pelintra (malvestido), no texto indica modo de trajar. (15) penteado em que os cabelos são puxados sobre o rosto ou testa, formando uma onda. (16) o mesmo que languidez. (17) o mesmo que estrambóticas, esquisitas, estranhas, extravagantes. (18) (fig.) aniversário. (19) membrana branca e fibrosa que reveste os globos oculares e, em sentido posterior, se continua com a bainha externa do nervo óptico.
(20) orgulhoso, arrogante, soberbo. (21) grossa, rude. (22) o mesmo que deslambidas, sem expressão, chochas. (23) lugar onde se promovem brigas de galo. (24) do verbo barganhar, trocar, negociar. (25) rudes, grosseiros. (26) lembrança, sugestão, proposta. (27) altivez, soberba. (28) gole, sorvo; no texto, fôlego. (29) preguiçoso, vadio.
VOCABULÁRIO (1) (fig.) elegância. (2) (pop.) protestante. (3) indivíduos convertidos a uma doutrina, ideia ou sistema; adeptos. (4) terraço. (5) modos de cantar ou recitar salmos. (6) (fig.) reunião. (7) cantigas populares acompanhadas de um instrumento. (8) aquele que tem acumulação anormal de líquido seroso em tecido ou cavidade do corpo. (9) provérbios. (10) (pop.) cachaça. (11) denominação de vários jogos de cartas.
Crítica Lima Barreto é, entre nós, na verdade, o tipo perfeito do analista social, mas um analista que combate, que não ficou como Machado de Assis, por exemplo, no círculo de uma timidez intelectual esquiva ao julgamento. Ele não se limita a mostrar todos os fundos da cena, o que vai pelos bastidores da nossa vida; toma partido, assinala os atores que falam a linguagem da verdade, mostra o que há de falso, de mentiroso na linguagem dos outros (...) não tem as delicadezas, as intenções filosóficas de Machado de Assis, veladas pelo sorriso do cético. Antes é um forte, arremete, chicoteia os vendilhões da dignidade nacional. A sua ironia não traz o sombreado pudor da de Stone, é ríspida como a de Swift, ainda mais real, porém, porque não se vale da fantasia, fá-la sentir-se na vida mesma que nos rodeia. Jackson de Figueiredo
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ARTIGO
Pesquisa analisa registro espontâneo feito por crianças Diego Freire
esquisadores do Instituto de Biociências de Rio Claro da Universidade Estadual Paulista (Unesp) têm utilizado fotos e vídeos produzidos por crianças para propor novas reflexões sobre o desenvolvimento infantil. O resultado pode ser conferido no curta-metragem “O que pode a imagem?”, que apresenta análises dos pesquisadores sobre os registros. A iniciativa fez parte da pesquisa “Infância, pesquisa e experiência: reflexões e olhares para o desenvolvimento infantil a partir de produções imagéticas de professores e crianças”, coordenada por César Donizetti Pereira Leite, professor adjunto da Unesp, e realizada com apoio da FAPESP. O trabalho prático foi realizado em uma creche da rede pública de Rio Claro. As visitas à creche ocorreram uma vez por semana, com duração média de 2 horas, ao longo de sete meses do ano letivo de 2012. As 45 crianças envolvidas na experiência produziram mais de 3.500 fotos digitais e 10 horas de filmagens. Foram oferecidos a meninos e meninas de um a três anos de idade equipamentos de gravação digital: câmeras fotográficas e de vídeo e tablets. Houve o envolvimento dos professores, mas sem qualquer orientação que pudesse influenciar a espontaneidade do manuseio. O objetivo, de acordo com Leite, foi descobrir novas percepções sobre o universo infantil por meio do registro espontâneo feito pelas crianças. “A maneira como as gravações foram feitas possibilitou reflexões importantes sobre os modos como o corpo e a memória criam e orientam sentidos”, disse. Isso porque os equipamentos acabavam sendo usados não como câmeras, mas como brinquedos ou extensões do próprio corpo, levando a um registro muito próximo da maneira como as crianças veem os objetos e as pessoas que as cercam no dia a dia. “As imagens produzidas abrem uma perspectiva de olhar, do ponto de vista da criança, detalhes nunca percebidos, como botões de camisas, a sujeira no nariz, a baba, além de minúcias dos movimentos, com os olhares rápidos,
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desfocados, os cortes bruscos e as pausas longas”, disse Leite. Para o pesquisador, a experiência sugere uma inversão no olhar do profissional que trabalha com crianças. “Em vez de oferecer técnicas, conhecimentos, teorias e sentidos para educar nosso olhar sobre as crianças, os vídeos lançam o corpo em uma aventura”, disse.
Imagens captadas em câmeras e tablets por crianças de até 3 anos inspiram reflexões sobre educação e viram curta-metragem produzido por pesquisadores da Unesp.
A pesquisa analisou a percepção dos professores sobre os vídeos. Para Leite, há uma “ditadura dos sentidos e da cognição” que as gravações desafiam. “Para os adultos, todas as imagens, por mais borradas, por mais vertiginosas que sejam, precisam dizer algo, precisam fechar em um sentido final”, disse. Segundo o pesquisador, os professores tendem a associar as imagens produzidas com maior nitidez ou clareza, mesmo que casualmente, às crianças tidas por eles como mais inteligentes ou espertas, assim como os registros mais caóticos foram atribuídos às que apresentam maior dificuldade no universo escolar. “Um entendimento que reflete nossa falta, muitas vezes, de sensibilidade em perceber o mundo com os olhos das crianças”, avaliou.
Novas abordagens Entre as possibilidades de abordagens para a educação infantil que a experiência inspirou está uma nova visão de passagem do tempo. “Nossos currículos, práticas educativas e modos de pensar e viver a educação estão pautados em um tempo cronológico, presente nas teorias de desenvolvimento humano no campo da Psicologia – as ideias de
fases, períodos, estágios ou ainda a ideia de que evoluímos, tudo isso se organiza em uma esfera de uma modalidade de tempo: o tempo cronológico e linear. Com as imagens nos vemos em outro deslocamento”, observou Leite. Para o pesquisador, as imagens rápidas, disformes e confusas captadas pelas crianças sugerem uma ideia não linear de tempo, o “tempo kairológico” – em referência a “kairós”, do grego antigo, que significa “momento oportuno”. “Trata-se do tempo da oportunidade, quando estamos completamente absorvidos pelo momento presente”, disse Leite. Essa noção de tempo, segundo o pesquisador, é fundamental ao entendimento do universo da criança no processo de desenvolvimento infantil. É importante também outra noção de tempo relacionada à intensidade do momento, não à sua duração. “Esse é o tempo aiônico, da experiência. Uma brincadeira, por mais banal que pareça a um adulto, pode tomar toda a concentração de uma criança. E, naquele momento em que nada a distrai, ela vivencia mais essa dimensão do tempo, que precisa ser considerada no processo de educação”, disse. O curta-metragem produzido com as gravações das crianças é um desdobramento de experiências que vêm sendo realizadas desde 2010 na rede pública de ensino de Rio Claro e que já resultaram em possibilidades de políticas educacionais para o município, de acordo com Leite. O projeto “Ação, câmera, luz: entre imagens e olhares – experiência de infância e montagens”, também conduzido com o apoio da FAPESP, levou a Secretaria de Educação de Rio Claro a criar um grupo de estudos sobre o tema composto por professores, diretores e coordenadores de escolas de educação infantil. Há ainda um projeto com a prefeitura para a formação docente orientada pela temática da imagem e do cinema na educação. Na Unesp, as experiências deram origem ao Laboratório de Estudos e Pesquisa da Imagem, Experiência e Criação (Imago). Extraído de: Agência FAPESP – Divulgando a cultura científica, jul./2014.
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POIS É, POESIA
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Seleta modernista Poemas da amiga a Jorge de Lima
I
A tarde se deitava nos meus olhos E a fuga da hora me entregava abril, Um sabor familiar de até-logo criava Um ar, e, não sei por que, te percebi. Voltei-me em flor. Mas era apenas tua [lembrança. Estavas longe, doce amiga; e só vi no [perfil da cidade O arcanjo forte do arranha-céu cor-de-rosa Mexendo asas azuis dentro da tarde. II Se acaso a gente se beijasse uma vez só... Ontem você estava tão linda Que o meu corpo chegou. Sei que era um riacho e duas horas de [sede, Me debrucei, não bebi. Mas estou até agora desse jeito, Olhando quatro ou cinco borboletas [amarelas, Dessas comuns, brincabrincando no ar. Sinto um rumor... III Agora é abril, oh minha doce amiga, Te reclinaste sobre mim, como a verdade, Fui virar, fundeei o rosto no teu corpo. Nos dominamos pondo tudo no lugar. O céu voltou a ser por sobre a terra, As laranjeiras ergueram-se todas de-pé E nelas fizemos cantar um primeiro sabiá. Mas a paisagem logo foi-se embora Batendo a porta, escandalizadíssima. 1929/1930. Mário de Andrade.
Canção
... de árvores indevassáveis de alma escusa sem pássaros Sem fonte matutina Chão tramado de saudades À eterna espera da brisa, Sem carinhos... como me alegrarei? Na solidão solitude, Na solidão entrei. Era uma esperança alada,
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Não foi hoje mas será amanhã, Há-de ter algum caminho Raio de sol promessa olhar As noites graves do amor O luar a aurora o amor... que sei! Na solidão solitude, Na solidão entrei, Na solidão perdi-me...
Com os gregos e com os troianos Com o padre e com o sacristão Com o leproso de Pouso Alto Depois comigo Te esperarei com mafuás novenas [cavalhadas comerei terra e direi coisas [de uma ternura tão simples Que tu desfalecerás
O agouro chegou. Estoura No coração devastado O riso da mãe-da-lua, Não tive um dia! uma ilusão não tive! Ternuras que não me viestes Beijos que não me esperastes Ombros de amigos fiéis Nem uma flor apanhei.
Procurem por toda parte Pura ou degradada até a última baixeza Eu quero a estrela da manhã
Na solidão solitude, Na solidão entrei, Na solidão perdi-me, Nunca me alegrarei.
Os profetas do Aleijadinho Monumentalizam a paisagem As cúpulas brancas dos Passos E os cocares revirados das palmeiras São degraus da arte de meu país Onde ninguém mais subiu Bíblia de pedra-sabão Banhada no ouro das minas
Rio de Janeiro, 22.12.1940. Mário de Andrade.
Estrela da manhã
Manuel Bandeira.
Ocaso
No anfiteatro de montanhas
Oswald de Andrade.
E u quero a estrela da manhã Onde está a estrela da manhã? Meus amigos meus inimigos Procurem a estrela da manhã Ela desapareceu ia nua Desapareceu com quem? Procurem por toda parte Digam que sou um homem sem orgulho Um homem que aceita tudo Que me importa? Eu quero a estrela da manhã Três dias e três noites Fui assassino e suicida Ladrão, pulha, falsário Virgem mal-sexuada Atribuladora dos aflitos Girafa de duas cabeças Pecai por todos pecai com todos Pecai com os malandros Pecai com os sargentos Pecai com os fuzileiros navais Pecai de todas as maneiras
Fotógrafo ambulante
Fixador de corações Debaixo de blusas Álbum de dedicatórias Maquereau Tua objetiva pisca-pisca Namora Os sorrisos contidos És a glória Oferenda de poesia às dúzias Tripeça nos logradouros públicos Bicho debaixo da árvore Canhão silencioso do sol Oswald de Andrade.
Noturno
L á fora o luar continua E o trem divide o Brasil Como num meridiano Oswald de Andrade. Extraído de: Mário da Silva Brito, Poesia do Modernismo.
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(ENTRE PARÊNTESIS)
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O tabuleiro É dado um tabuleiro quadrado 4 × 4. Quer-se ir do quadrado esquerdo superior para o quadrado direito inferior. Os movimentos permitidos são os mostrados a seguir. De quantas maneiras isso é possível?
RESPOSTA
Vamos indicar os movimentos permitidos por ( ), V ( ) e D ( ). Alguns caminhos possíveis são: HVVHVH, VDHHV e HDVD, apresentados nas figuras a seguir:
Qualquer sequência com 3 símbolos H e 3 símbolos V dá uma solução do problema. 6! Há 20 percursos dessa forma. 3! 3! Qualquer sequência com 2 símbolos H, 2 símbolos V e 1 símbolo D dá uma solução. 5! 30 percursos dessa forma. Há 2! 2! 1! Qualquer sequência com 1 símbolo H, 1 símbolo V e 2 símbolos D dá uma solução.
4! Há 12 percursos dessa forma. 2! 1! 1! Há também um único percurso constituído por uma sequência de 3 símbolos D. Número total de percursos: 20 30 12 1 63.
SERVIÇO DE VESTIBULAR Universidade de Caxias do Sul (UCS) Período de inscrição: até 18 de novembro de 2014. Somente via internet. Endereço da faculdade: Rua Francisco Getúlio Vargas, 1 130 – Petrópolis – Caxias do Sul – RS – CEP: 95070-560 – Fone: (54) 3218-2100. Requisito: taxa de R$ 60,00. Cursos e vagas: consultar site www.ucs.br Exame: dia 7 de dezembro de 2014.
Universidade Presbiteriana Mackenzie (Mack) Período de inscrição: até 20 de novembro de 2014. Somente via internet. Endereço da faculdade: Rua da Consolação, 930 – Consolação – São Paulo – SP – CEP: 01302-907 – Fone: (11) 2114-8000. Requisito: taxa de R$ 85,00. Cursos e vagas: consultar site www.mackenzie.br Exame: dia 2 de dezembro de 2014.
Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-SP) Período de inscrição: até 13 de novembro de 2014. Somente via internet. Endereço da faculdade: Rua Dr. Álvaro Alvim, 123 – Vila Mariana – São Paulo – SP – CEP: 04018-010 Fone: (11) 5085-4600. Requisito: taxa de R$ 167,00. Cursos e vagas: consultar site www.espm.br/vestibular-sp Exame: dia 16 de novembro de 2014.
Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-RJ) Período de inscrição: até 12 de novembro de 2014. Somente via internet. Endereço da
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faculdade: Rua do Rosário, 90 – Centro – Rio de Janeiro – RJ – CEP: 20041-002 – Fone: (21) 2216-2002. Requisito: taxa de R$ 120,00. Cursos e vagas: consultar site www.espm.br/vestibular Exame: dia 16 de novembro de 2014.
Instituto Mauá de Tecnologia (IMT) Período de inscrição: até 10 de novembro de 2014. Somente via internet. Endereço da faculdade: Praça Mauá 1 – São Caetano do Sul – SP – CEP: 09580-900 – Fone: (11) 4239-3000 / 0800-019-31-00. Requisito: taxa de R$ 70,00. Cursos e vagas: consultar site www.maua.br Exame: dia 15 de novembro de 2014.
Fundação Educacional Inaciana “Pe. Saboia de Medeiros” (FEI) Período de inscrição: até 28 de novembro de 2014. Pessoalmente ou via internet. Endereço da faculdade: Av. Humberto de Alencar Castelo Branco, 3 972 – Assunção – São Bernardo do Campo – SP – CEP: 09850-901 – Fone: (11) 4353-2900. Requisito: taxa de R$ 110,00. Cursos e vagas: consultar site www.fei.edu.br Exames: dias 6 e 7 de dezembro de 2014.
Faculdade de Tecnologia do Estado de São Paulo (Fatec) Período de inscrição: até 10 de novembro de 2014. Somente via internet. Endereço da faculdade: Praça Coronel Fernando Prestes, 30 – Bom Retiro – São Paulo – SP – CEP: 01124-060 – Fone: (11) 3322-2200.
Requisito: taxa de R$ 70,00. Cursos e vagas: consultar site www.vestibularfatec.com.br Exame: dia 14 de dezembro de 2014.
Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ) Período de inscrição: até 7 de novembro de 2014. Somente via internet. Endereço da faculdade: Rua Francisco Telles, 250 – Vl. Arens – Jundiaí – SP – CEP: 13202-550 – Fone: (11) 4587-1095. Requisito: taxa de R$ 165,00. Cursos e vagas: consultar site www.vunesp.com.br Exames: dias 16 e 17 de dezembro de 2014.
Escola Superior de Engenharia e Gestão (Eseg) Período de inscrição: até 31 de outubro de 2014. Somente via internet. Endereço da faculdade: Rua Vergueiro, 1 951 – Vila Mariana – São Paulo – SP – CEP: 04101-000 – Fone: 0800-723-23-33. Requisito: taxa de R$ 45,00. Cursos e vagas: consultar site www.eseg.edu.br Exame: dia 1o de novembro de 2014.
Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) Período de inscrição: até 13 de novembro de 2014. Pessoalmente ou via internet. Endereço da faculdade: Av. Independência, 2 293 – Bairro Universitário – Santa Cruz do Sul – RS – CEP: 96815-900 – Fone: (51) 3717-7300. Requisito: taxa de R$ 70,00. Cursos e vagas: consultar site www.unisc.br Exame: dia 22 de novembro de 2014.
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