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Jornal do Vestibulando
ENSINO, INFORMAÇÃO E CULTURA
JORNAL ETAPA – 2015 • DE 12/11 A 25/11
ESPECIAL
Começa o vestibular da Unicamp, consolidando as mudanças
Minerva Studio/Shutterstock
No dia 22 de novembro a Unicamp inicia o vestibular 2016 aplicando novamente o formato iniciado no ano passado, que terminou a tradição da Redação na 1a fase. O novo formato deixou a 1a fase da Unicamp muito parecida com a da Fuvest: prova única de Conhecimentos Gerais com 90 questões de múltipla escolha.
Na Unicamp em torno de 78 mil candidatos estão disputando pouco mais de 3 mil vagas. São 3 320 vagas de cursos para 77 760 inscritos. Na 1a fase, que será realizada no dia 22 de novembro, o candidato terá até 5 horas para resolver a prova. A última prova aplicada pela Unicamp teve 14 questões de Língua Portuguesa e Literaturas de Língua Portuguesa,
ESPECIAL Começa o vestibular da Unicamp, consolidando as mudanças
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CONTO
O macaco azul – Aluísio Azevedo
14 questões de Matemática, 10 de Física, 10 de Química, 10 de Biologia, 9 de História, 9 de Geografia, 8 de Inglês, 1 de Filosofia, 1 de Sociologia e 4 questões interdisciplinares. A Unicamp adota um formato diferente da maioria das provas de múltipla escolha – que apresentam cinco alternativas em cada questão. Na sua 1a fase, a Unicamp reduziu as alter-
ARTIGO O Papel do Imigrante na Evolução do Brasil
ENTRE PARÊNTESIS
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POIS É, POESIA
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Álvares de Azevedo (1831-1852)
nativas a quatro: “a”, “b”, “c” e “d”. Segundo a coordenação do exame, essa mudança foi adotada após uma pesquisa da universidade ter mostrado que “a adição de uma quinta alternativa mais atrapalha do que ajuda a avaliação, devido ao maior tempo de leitura e possibilidade de ocorrência de alguma confusão por parte do candidato”.
A lebre e o porco-espinho
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SERVIÇO DE VESTIBULAR
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Inscrições
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ESPECIAL
A convocação para a 2a fase é realizada em proporções diferentes. Em praticamente todos os cursos, o limite máximo é de 6 candidatos convocados para cada vaga. A exceção são os cursos de Arquitetura e Urbanismo que terá para a 2a fase 8 convocados para cada vaga e Medicina com esse limite subindo para 10 candidatos para cada vaga. Ao todo, no ano passado, foram chamados para as provas da 2a fase 15 444 candidatos – um número que serve de referência para termos ideia de quantos serão convocados este ano. Na 2a fase, que será realizada nos dias 17, 18 e 19 de janeiro de 2016, as provas são idênticas para todos os candidatos, independentemente das carreiras escolhidas. Nisso a Unicamp não segue a Fuvest, que no terceiro dia da 2a fase aplica diferentes provas conforme as carreiras escolhidas. Cada prova da Unicamp é composta de seis questões por matéria. As questões têm dois itens, valendo cada um 2 pontos – num total de 4 pontos por questão. Na prova de Redação são dois textos, cada um valendo 24 pontos. No primeiro dia da 2a fase, além dos dois textos da Redação, entram as questões de Língua Portuguesa e Literaturas de Língua Portuguesa. No segundo dia a prova traz questões de Matemática, História e Geografia. No terceiro dia, questões de Física, Química e Biologia. Na 2a fase, todas as provas têm duração máxima de quatro horas.
Você sabia que a Unicamp já teve uma 1a fase bem diferente? Os primeiros 10 vestibulares da Unicamp, entre 1977 e 1986, foram feitos pela Fuvest. A partir de 1987 a Unicamp passou a aplicar exame próprio. Conservou da Fuvest o esquema de duas fases – que mantém até hoje. A maior diferença do vestibular da Unicamp estava na 1a fase, que também fazia uma pré-seleção, mas não tinha nenhum teste. Era formada por uma prova de Conhecimentos Gerais com 12 questões de respostas dissertativas e uma prova de Redação. A 2a fase era como a da Fuvest, várias provas com questões dissertativas sobre todas as matérias. A partir de 2011 a Unicamp abandonou seu grande diferencial em relação à Fuvest, retirando as questões dissertativas da 1a fase. As 12 questões de respostas dissertativas foram substituídas por 48 testes de múltipla escolha. Ficaram 12 testes de Matemática, 18 testes de Ciências Humanas e Artes e 18 testes de Ciências da Natureza. Mais uma Redação, que deixou de ser baseada numa prova temática (como ocorria até 2010). Com a mudança aumentou muito a diversidade dos conteúdos abordados. Pouca coisa faltava para os vestibulares da 1a fase da Unicamp e da Fuvest serem feitos de uma mesma maneira – o que aconteceu finalmente no último vestibular.
Redação – a correção está sendo aprimorada Uma das mais propagadas diferenças entre a 1a fase da Fuvest e a da Unicamp estava na Redação. Era um diferencial exibido com des-
taque pela Unicamp. Depois de muita discussão interna, a Unicamp acabou optando por abandonar o modelo original. No último vestibular, ao transferir a Redação para a 2a fase, a Unicamp alterou um aspecto importantíssimo no processo de correção. O total de redações a serem corrigidas ficou muito menor, fato que, segundo os formuladores da prova, permitiu aprimorar a correção. Foi uma mudança enorme. Se no vestibular de 2014 foram corrigidas as redações de 70 mil provas na 1a fase, no último vestibular a correção foi feita em apenas 15 mil provas na 2a fase.
A 1a fase mais exigente é a da Fuvest ou a da Unicamp? Durante muito tempo se atribuía uma maior dificuldade à 1a fase da Unicamp, pelo fato de ter questões dissertativas e Redação. Esse mito morreu com o fim do modelo antigo do vestibular da Unicamp. Mas, vale a pena – ainda agora – desmontar alguns aspectos daquele mito. A verdadeira dificuldade num vestibular de seleção não está exatamente em ter questões mais fáceis ou mais difíceis. A dificuldade na 1a fase está indicada na proporção de eliminados (os não convocados para a 2a fase). Vejamos essa questão na Unicamp e na Fuvest. No vestibular atual a Fuvest oferece cerca de 10 mil vagas e convocará para a 2a fase no máximo três candidatos por vaga. Isso significa que teremos em torno de 30 mil convocados para os exames finais. Já a Unicamp – vendo os dados do último exame, para cerca de 3 mil vagas, levou cerca de 15 mil candidatos para a 2a fase. Foram convocados cerca de 5 candidatos para cada vaga da Unicamp contra 3 candidatos para cada vaga da Fuvest. Um índice 57% maior na Unicamp do que na Fuvest. Neste aspecto numérico o vestibular da Unicamp é menos restritivo do que o da USP – e era assim também no período em que seu exame de 1a fase tinha redação e 12 questões dissertativas.
Papel do Enem depende da velocidade do MEC Pelas normas oficiais, a nota na parte de Conhecimentos Gerais dos exames de 2014 e 2015 do Enem poderá ser utilizada junto à nota da 1a fase da Unicamp – desde que seu uso esteja autorizado pelo candidato no Formulário de Inscrição. E o candidato nada tem a perder, pois a nota do Enem só será utilizada se resultar numa nota melhor para o candidato. Há um entrave possível no uso do Enem na 1a fase da Unicamp. Se o MEC entregar as notas após 27 de novembro, as notas do Enem não serão consideradas na convocação para a 2a fase. Mesmo nesse caso, elas poderão ser usadas para aumentar a nota da 1a fase no cálculo da nota final do vestibular. Só não será usada de forma alguma a nota do Enem se o MEC disponibilizar o cadastro com as notas após 20 de janeiro de 2016.
Ação afirmativa reforçada A Unicamp oferece bônus nas médias dos candidatos que fizeram todo o Ensino Médio em escolas públicas. Até o último vestibular, o Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social (PAAIS) acrescentava 60 pontos à nota desses candidatos na 2a fase e mais 20 pontos no caso de candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas (segundo a classificação utilizada pelo IBGE) e oriundos de escola pública. Agora, já para a 1a fase do vestibular, esses candidatos têm adicionados 60 pontos à sua nota. E os candidatos que se autodeclararem pretos, pardos ou indígenas terão mais 20 pontos, além dos 60. Os convocados para a 2a fase terão adicionados 90 pontos na Redação e 90 pontos nas provas dissertativas. Os autodeclarados pretos, pardos ou indígenas terão ainda mais 30 pontos na 2a fase, totalizando 120 pontos.
Leituras obrigatórias ampliadas Durante dez anos a Unicamp e a Fuvest apresentaram a mesma lista unificada de nove obras de literatura brasileira e portuguesa como leitura obrigatória dos candidatos. Esse modelo valeu até 2014. Em 2015 a Unicamp tirou três obras da lista comum aos dois vestibulares e acrescentou seis, ficando com uma lista própria de 12 obras. Segundo a coordenação do vestibular da Unicamp, a nova lista (a ser renovada anualmente) “é composta de obras de diferentes gêneros e extensões, podendo incluir romances, coletâneas de poemas e peças teatrais, e também textos curtos, como contos, crônicas, peças de oratória ou de crítica, a fim de levar o vestibulando a ampliar o seu campo de estudos sem sobrecarregá-lo no volume de leituras”. Para o Vestibular de 2016 a Unicamp exigirá a leitura das seguintes obras: • “A hora e vez de Augusto Matraga”, do livro Sagarana – Guimarães Rosa. • “Amor”, do livro Laços de família – Clarice Lispector. • Capitães da Areia – Jorge Amado. • Lisbela e o prisioneiro – Osman Lins. • Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis. • “Negrinha”, do livro Negrinha – Monteiro Lobato. • O cortiço – Aluísio Azevedo. • Sentimento do mundo – Carlos Drummond de Andrade. • Sonetos – Luís de Camões. • Terra sonâmbula – Mia Couto. • Til – José de Alencar. • Viagens na minha terra – Almeida Garrett.
Atenção: Para 2017, eis os 3 novos livros no vestibular Unicamp: • Caminhos cruzados – Erico Verissimo. • Coração, cabeça e estômago – Camilo Castelo Branco. • Poemas negros – Jorge de Lima.
CONTO
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O macaco azul Aluísio Azevedo
O
ntem, mexendo nos meus papéis velhos, encontrei a seguinte carta:
“Caro senhor, Escrevo estas palavras possuído do maior desespero. Cada vez menos esperança tenho de alcançar o meu sonho dourado. – O seu macaco azul não me sai um instante do pensamento! É horrível! Nem um verso! Do amigo infeliz Paulino.” Não parece um disparate este bilhete? Pois não é. Ouçam o caso e verão! Uma noite – isto vai há um bom par de anos – conversava eu com o Artur Barreiros no largo da Mãe do Bispo, a respeito dos últimos versos então publicados pelo conselheiro Otaviano Rosa, quando um sujeito de fraque cor de café com leite veio a pouco e pouco aproximando-se de nós e deixou-se ficar a pequena distância, com a mão no queixo, ouvindo atentamente o que conversávamos. – O Otaviano – sentenciou o Barreiros – o Otaviano faz magníficos versos, lá isso ninguém lhe pode negar! Mas, tem paciência! O Otaviano não é poeta! Eu sustentava precisamente o contrário, afiançando que o aplaudido Otaviano fazia maus versos, tendo aliás uma verdadeira alma de poeta, e poeta inspirado. O Barreiros replicou, acumulando em abono da sua opinião, uma infinidade de argumentos de que já me não lembro. Eu trepliquei firme, citando os alexandrinos errados do conselheiro. O Barreiros não se deu por vencido e exigiu que eu lhe apontasse alguém no Brasil que soubesse arquitetar alexandrinos melhor que S. Ex. Eu respondi com esta frase esmagadora: – Quem? Tu! E acrescentei, dando um piparote na aba do chapéu e segurando o meu contendor com ambas as mãos pela gola do fraque: – Queres que te fale com franqueza?... Isto de fazer versos inspirados e bem feitos; ou, por outra: isto de ser ou não ser poeta, depende única e exclusivamente de uma cousa muito simples... – O que é? – É ter o segredo da poesia! Se o sujeito está senhor do segredo da poesia, faz, brincando, a quantidade de versos que entender, e todos bons, corretos, fáceis, harmoniosos; e, se o sujeito não tem o segredo, escusa de quebrar a cabeça, pode ir cuidar de outro ofício, porque com as musas não arranjará nada que preste! Não és do meu parecer? – Sim, nesse ponto estamos de pleno acordo, conveio o Barreiros. Tudo está em possuir o segredo!... E, tomando uma expressão de orgulho concentrado, rematou, abaixando a cabeça e olhando-me por cima das lunetas: – Segredo, que qualquer um de nós dois conhece melhor que as palmas da própria mão!...
– Segredo que eu me prezo de possuir, como até hoje ninguém o conseguiu – declarei convicto. E com esta frase me despedi e separei-me do Artur. Ele tomou para os lados de Botafogo, onde morava, e eu desci pela rua Guarda Velha. Mal dera sozinho alguns passos, o tal sujeito de fraque cor de café com leite aproximou-se de mim, tocou-me no ombro, e disse-me com suma delicadeza: – Perdão, cavalheiro! Queira desculpar interrompê-lo. Sei que vai estranhar o que lhe vou dizer, mas... – Estou às suas ordens. Pode falar. – É que ainda há pouco, quando o senhor conversava com o seu amigo, afirmou a respeito da poesia certa cousa que muito e muito me interessa... Desejo que ma explique... “Bonito!”, pensei eu. É algum parente ou algum admirador do conselheiro Otaviano, que vem tomar-me uma satisfação. Bem-feito! Quem me manda a mim ter a língua tão comprida?... – Entremos aqui no jardim da fábrica, propôs o meu interlocutor; tomaremos um copo de cerveja enquanto o senhor far-me-á o obséquio de esclarecer o ponto em questão. O tom destas palavras tranquilizou-me em parte. Concordei e fomos assentar-nos em volta de uma mesinha de ferro, defronte de dois chopes, por baixo de um pequeno grupo de palmeiras. – O senhor – principiou o sujeito, depois de tomar dois goles do seu copo – declarou ainda há pouco que possui o segredo da poesia... Não é verdade? Eu olhei para ele muito sério, sem conseguir perceber onde diabo queria o homem chegar. – Não é verdade? – insistiu com empenho. – Nega que ainda há pouco declarou possuir o segredo dos poetas? – Gracejo!... Foi puro gracejo de minha parte... – respondi, sorrindo modestamente. Aquilo foi para mexer com o Barreiros, que – aqui para nós – na prosa é um purista, mas que a respeito de poesia não sabe distinguir um alexandrino de um decassílabo. Tanto ele como eu nunca fizemos versos; creia! – Ó, senhor! Por quem é não negue! Fale com franqueza! – Mas juro-lhe que estou confessando a verdade... – Não seja egoísta! E o homem chegou a sua cadeira para junto de mim e segurou-me uma das mãos. – Diga! – suplicou ele. – Diga por amor de Deus qual é o tal segredo; e conte que, desde esse momento, o senhor terá em mim o seu amigo mais reconhecido e devotado! – Mas, meu caro senhor, juro-lhe que... O tipo interrompeu-me, tapando-me a boca com a mão, e exclamou deveras comovido:
– Ah! Se o senhor soubesse; se o senhor pudesse imaginar quanto tenho até hoje sofrido por causa disto! – Disto o quê? A poesia? – É verdade! Desde que me entendo, procuro a todo o instante fazer versos!... Mas qual! Em vão consumo nessa luta de todos os dias os meus melhores esforços e as minhas mais profundas concentrações!... É inútil! Todavia, creia, senhor, o meu maior desejo, toda a ambição de minha alma, foi sempre, como hoje ainda, compor alguns versos, poucos que fossem, fracos muito embora; mas, com um milhão de raios! que fossem versos! e que rimassem! e que estivessem metrificados! e que dissessem alguma cousa! – E nunca até hoje o conseguiu?... – interroguei, sinceramente pasmo. – Nunca! Nunca! Se o metro não sai mau, é a ideia que não presta; e se a ideia é mais ou menos aceitável, em vão procuro a rima! A rima não chega nem à mão de Deus Padre! Ah! tem sido uma campanha! uma campanha sem tréguas! Não me farto de ler os mestres; sei de cor o compêndio do Castilho; trago na algibeira o Dicionário de consoantes; e não consigo um soneto, uma estrofe, uma quadra! Foi por isso que pensei cá comigo: “Quem sabe se haverá algum mistério, algum segredo, nisto de fazer versos?... algum segredo, de cuja posse dependa em rigor a faculdade de ser poeta?...” Ah! e o que não daria eu para alcançar semelhante segredo?!... Matutava nisto justamente, quando o senhor, conversando com o seu amigo, afirmou que o segredo existe com efeito, e, melhor ainda, que o senhor o possui, podendo por conseguinte transmiti-lo adiante! – Perdão! Perdão! O senhor está enganado, eu... – Oh! não negue! Não negue por quem é! O senhor tem fechada na mão a minha felicidade! Se não quer que eu enlouqueça, confie-me o segredo! Peço-lhe! Suplico-lhe! Dou-lhe em troca a minha vida, se a exige! – Mas, meu Deus! o senhor está completamente iludido!... Não existe semelhante cousa!... Juro-lhe que não existe! – Não seja mau! Não insista em recusar um obséquio que lhe custa tão pouco e que vale tanto para mim! Bem sei que há de prezar muito o seu segredo, mas dou-lhe minha palavra de honra que me conservarei digno dele até a morte! Vamos! declare! fale! diga logo o que é, ou nunca mais o largarei! nunca mais o deixarei tranquilo! Diga ou serei eternamente a sua sombra! – Ora esta! Como quer que lhe diga que não sei de semelhante segredo?! – Não mo negue por tudo o que o seu coração mais ama neste mundo! – O senhor tomou a nuvem por Juno! Não compreendeu o sentido de minhas palavras! – O segredo! O segredo! O segredo! Perdi a paciência. Ergui-me e exclamei disposto a fugir: – Quer saber o que mais?! Vá para o diabo que o carregue!
CONTO
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– Espere, senhor! Espere! Ouça-me por amor de Deus! – Não me aborreça. Ora bolas! – Hei de persegui-lo até alcançar o segredo!
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E, como de fato, o tal sujeito acompanhou-me logo com tamanha insistência, que eu, para ver-me livre dele, prometi-lhe afinal que lhe havia de revelar o mistério. No dia seguinte já lá estava o demônio do homem defronte da minha casa e não me largava a porta. Para o restaurante, para o trabalho, para o teatro, para toda a parte, acompanhava-me aquele implacável fraque cor de café com leite, a pedir-me o segredo por todos os modos, de viva voz, por escrito e até por mímica, de longe. Eu vivia já nervoso, doente com aquela obsessão. Cheguei a pensar em queixar-me à polícia ou empreender uma viagem. Ocorreu-me, porém, uma ideia feliz, e mal a tive disse ao tipo que estava resolvido a confiar-lhe o segredo.
Ele quase perdeu os sentidos de tão contente que ficou. Marcou-me logo uma entrevista em lugar seguro; e, à hora marcada, lá estávamos os dois. – Então que é?... – perguntou-me o monstro, esfregando as mãos. – Uma cousa muito simples – segredei-lhe eu. – Para qualquer pessoa fazer bons versos, seja quem for, basta-lhe o seguinte: Não pensar no macaco azul. Está satisfeito? – Não pensar no...? Macaco azul? O que é macaco azul...? – Pergunta a quem não lhe sabe responder ao certo. Imagine um grande símio azul ferrete, com as pernas e os braços bem compridos, os olhos pequeninos, os dentes muito brancos, e aí tem o senhor o que é o macaco azul. – Mas que há de comum entre esse mono e a poesia?... – Tudo, visto que, enquanto o senhor estiver com a ideia no macaco azul, não pode compor um verso!
– Mas eu nunca pensei em semelhante bicho!... – Parece-lhe; é que às vezes a gente está com ele na cabeça e não dá por isso. – Pois hoje mesmo vou fazer a experiência... Ora quero ver se desta vez... – Faça e verá. No dia seguinte, o pobre homem entrou-me pela casa como um raio. Vinha furioso. – Agora, gritou ele, é que o diabo do bicho não me larga mesmo! É pegar eu na pena, e aí está o maldito a dar-me voltas no miolo! – Tenha paciência! Espere alerta a ocasião em que ele não lhe venha à ideia e aproveite-a logo para escrever seus versos. – Ora! Antes o senhor nunca me falasse no tal bicho! Assim, nem só continuo a não fazer versos, como ainda quebro a cabeça de ver se consigo não pensar no demônio do macaco! E foi nestas circunstâncias que Paulino me escreveu aquela carta. Extraído de: Histórias divertidas.
ARTIGO
O Papel do Imigrante na Evolução do Brasil primeiro recenseamento oficial da população brasileira foi feito durante o Império, em 1872, por ordem de dom Pedro II. O país acabava de sair de uma longa guerra contra o Paraguai e sua população era de 10,112 milhões de habitantes. No final de 1972, isto é, exatamente cem anos depois, 100 milhões de pessoas habitavam o Brasil (segundo estimativas feitas pelo IBGE), como resultado de uma expansão demográfica realmente notável. Para se ter uma ideia precisa da contribuição dada pela imigração estrangeira a este crescimento sem precedentes, deve-se observar toda a evolução demográfica do país ao longo de sua história. A primeira estimativa de importância da população brasileira foi feita por Félix de Contreiras Rodrigues, autor de vários estudos econômicos, que avaliou em 15 000 habitantes a população branca no Brasil em 1550. Nos trinta anos seguintes, com a ocupação de novos territórios, a população cresceu, lentamente, passando a cerca de 57 000 em 1583, segundo estimativa de Pandiá Calógeras (25 000 brancos, 18 000 índios “civilizados” e 14 000 negros “cativos”). No final de seu primeiro século de história, o Brasil apresentava uma população de apenas 100 000 habitantes. Uma das causas desse desenvolvimento populacional relativamente lento foi, sem dúvida, o fato de Portugal, na época, também ser um país pouco povoado. Para termos uma ideia da importância relativa desses números, basta lembrarmo-nos de que, segundo os especialistas, no século XVI, de 2 a 3 milhões de índios povoavam a região correspondente ao atual território
O
brasileiro! Destes, somente uma ínfima minoria havia tido contato com os portugueses. Apenas catorze vilas foram criadas em todo o Brasil naquele século, a maioria delas numa estreita faixa litorânea. São Paulo de Piratininga, por exemplo, era a mais avançada “boca de sertão” do território paulista, pois suas outras vilas quinhentistas encontravam-se no litoral: São Vicente, Santos, Itanhaém e Cananeia. A descoberta de ouro e diamantes pelos bandeirantes provocou enormes modificações na estrutura demográfica do país, com o deslocamento maciço de pessoas de todas as regiões para Minas, Goiás e Mato Grosso. Cerca de um quinto da população participou dessas migrações internas, que levaram o homem branco a povoar, pela primeira vez, o coração da América do Sul, facilitando o contato, a mistura e a fusão de populações até então isoladas. O país possuía cerca de 184 000 habitantes em 1660 e passou, com o impulso recebido durante o ciclo da mineração, a 1,5 milhão em 1750. Haviam sido criadas 38 novas vilas durante o seiscentismo e um número ainda maior no correr do século XVIII. Em 1776, ano da Declaração de Independência das colônias norte-americanas, Adam Smith se referia ao Brasil (em A riqueza das nações) como sendo a colônia da América com população de raça branca mais numerosa, avaliada em 4 milhões pelo conde de Linhares, em 1808. Foi neste ano que se iniciaram as imigrações modernas para o Brasil, a partir do decreto de 25 de novembro, com o qual dom João VI preparara a instalação dos primeiros colonos.
Desde essa data, a entrada de estrangeiros no país torna-se livre, mas a imigração permanece insignificante durante toda a primeira metade do século XIX. Em 1808 chegam 1 500 famílias de açorianos para o Rio Grande do Sul; em 1819 cem famílias suíças do cantão de Friburgo são instaladas na fazenda do Morro Queimado, atual Nova Friburgo, estado do Rio. Foi a primeira colônia de imigrantes não portugueses. Após a Independência, dom Pedro I continua essa política de colonização, trazendo alemães para o Rio Grande do Sul, em 1824, e para o Paraná, em 1827. Em 1828, 140 prussianos são enviados para Pernambuco e, em 1829, é formada a colônia alemã de Santo Amaro, na província de São Paulo. Neste mesmo ano tem início a colonização alemã na província de Santa Catarina, com a fundação da colônia São Pedro Alcântara. O mesmo se dá no Espírito Santo, onde a influência dos alemães deixará profundas marcas. Uma lei de 19 de dezembro de 1830 suprimiu os créditos à colonização, que diminuiu consideravelmente nos anos que se seguiram à abdicação de Pedro I. Seu filho criará, anos depois, novas colônias em diversos pontos do país, mas, no seu conjunto, podemos afirmar que a imigração durante os primeiros cinquenta anos do século passado foi insignificante, não tendo atingido sequer 12 000 imigrantes, na sua maioria suíços e alemães. De fins do século XVIII até 1850, o aumento da população brasileira se deu num ritmo bastante lento, justamente num período em que, no resto do mundo, o crescimento populacional entrava numa fase de grande expansão. O
ARTIGO número de habitantes da Europa quase dobrou nesses cinquenta anos, e o dos Estados Unidos, quase igual ao do Brasil no início do século, já era quatro vezes maior em 1872 (42 milhões). Foram necessários 350 anos para que a população brasileira se elevasse a 7 milhões, tendo sido formada, até essa data, essencialmente pelas contribuições indígena, portuguesa e africana. Em 1850 foi suprimido o tráfico de escravos que, durante três séculos, trouxe para o Brasil cerca de 3,5 milhões de pessoas de várias regiões do continente africano (de acordo com Roberto Simonsen e Maurício Goulart). Nesta época, inicia-se uma nova fase de imigrações que, durante cem anos, trará cerca de 5,5 milhões de imigrantes de diferentes nacionalidades, dos quais, 4 milhões se fixarão definitivamente.
Uma complexa rede de bancos A importância desse movimento populacional não deve ser subestimada nem exagerada. Do ponto de vista puramente quantitativo, a maioria dos autores é unânime em afirmar que, embora o processo imigratório para o Brasil tenha sido importante, o país não pode ser considerado como uma região de grande imigração comparado a outros países de grande imigração. Do ponto de vista qualitativo, porém, os imigrantes trouxeram contribuições cuja importância nem sequer foi avaliada, ainda, em toda sua extensão. Fazendo-se um estudo comparado da imigração intercontinental durante o século XIX e primeira metade do século XX, constata-se que cerca de 56 milhões de imigrantes entraram na América neste período, dos quais 40 milhões nos Estados Unidos. Até a Primeira Guerra Mundial, 60% dos imigrantes iam para os Estados Unidos, 17,5% para a Argentina, 9,7% para o Canadá e apenas 5,7% para o Brasil. Mesmo após 1924, quando o governo americano fechou em parte as portas do país à imigração, a porcentagem dos que entraram no Brasil continuou relativamente baixa (8,5%), enquanto na Argentina ela se elevava a 20,4% e no Canadá, a 11,4%. O fato de o trabalho escravo ter sido mantido no Brasil até 1888, sem dúvida, prejudicou o desenvolvimento da imigração de trabalhadores livres. O governo imperial brasileiro, por outro lado, também dificultou inúmeras vezes o desenvolvimento da imigração para o Brasil ao favorecer o tráfico negreiro. Em 1837, por exemplo, o futuro Marquês de Olinda abandona os primeiros ensaios de colonização feitos por dom Pedro I e adota uma política favorável à escravatura: 400 000 africanos entram em nosso país durante a minoridade de dom Pedro II. Ao lado deste fator, outros, não menos importantes, frearam o desenvolvimento da imigração. Entre eles, a dificuldade de acesso à propriedade da terra, num país onde as grandes explorações agrícolas concentravam-se nas mãos de poucas famílias. Se até 1850 o crescimento de nossa população foi relativamente lento, a partir desta data a situação se modifica radicalmente. O café, que já era cultivado no Brasil desde o século XVIII, entra em rápida expansão a partir da terceira década do século passado. Uma série de circunstâncias favoráveis (preços altos no
mercado mundial; praga nos cafeeiros do Ceilão, nosso principal concorrente; etc.) faz com que sua cultura se estenda rapidamente pela Província do Rio de Janeiro, no início, e de São Paulo, em seguida. Por volta de 1850, as plantações já cobriam quase todo o vale do Paraíba e já avançavam pelo interior, em direção a Campinas, Limeira e Rio Claro. Em 1854 o café já representava 54% do valor total de nossas exportações, passando a 65% em 1885. Nossa balança comercial, deficitária na primeira metade do século, torna-se positiva a partir de 1861, e assim permanece durante várias décadas. Essa expansão do café provoca mudanças consideráveis em todos os setores da vida econômica e social do sudeste brasileiro, proporcionando um desenvolvimento de tipo capitalista, que combinava em si as formas mais primitivas de produção com a última palavra da tecnologia e da ciência da época. As estradas de ferro acompanhavam o avanço dos cafezais. Em 1864 o país possuía apenas 475 quilômetros de vias férreas. Em 1870 elas já se estendiam por 1 000 quilômetros, passando a 9 500 no ano da Proclamação da República. Assim como o trem, também o telégrafo se desenvolveu. A minúscula rede telegráfica de 1864 (187 quilômetros), atingiu os 19 000 em 1889. Na medida em que os vapores de casco de ferro passaram a seguir as rotas marítimas do Atlântico sul, o transporte tornou-se mais barato e regular, e o sistema comercial foi se tornando cada vez mais eficiente. Grandes casas importadoras foram fundadas. Com a instalação dos primeiros cabos submarinos, o número de bancos aumenta consideravelmente. São Paulo e Rio de Janeiro, no final do século, já se achavam envolvidos num emaranhado complexo de bancos ingleses, alemães, franceses, suíços, italianos e americanos. O Brasil passava a viver a era do capital financeiro internacional.
Surge uma nova classe social A rápida expansão do café colocou na ordem do dia a necessidade premente da “importação de braços” para a lavoura. A falta de mão de obra fazia-se sentir desde a supressão do tráfico. Enquanto a colonização tinha sido produto da iniciativa pública, a imigração passa a ser organizada por particulares, com apoio do governo, o que provoca a entrada de 121 000 imigrantes entre 1851 e 1860; 97 000 entre 1861 e 1870; e 219 000 na década seguinte. A partir daí a imigração adquire dimensões consideráveis. Os dados seguintes permitem avaliar sua importância: Período
Entrada de imigrantes
1881 a 1890
530 000
1891 a 1900
1 129 000
1901 a 1910
671 351
1911 a 1920
717 744
1921 a 1930
840 215
A maior densidade foi atingida nos dez anos que se seguiram à abolição da escravidão. Neste período, 1888/1898, 1,264 milhão de imigrantes entrou no país, isto é, cerca da quarta parte do total da imigração durante os 150 anos de independência do Brasil. Durante a Primei-
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ra Guerra Mundial estas entradas diminuíram consideravelmente; os contingentes italiano e, sobretudo, o alemão, foram os mais atingidos. O movimento recomeça, lentamente, por volta de 1920, aumentando de intensidade até a crise econômica mundial de 1929. A partir de 1930 começam as restrições com a nova política de imigração adotada pelo governo Vargas (a qual, apesar de algumas modificações introduzidas em 1945, fez com que a imigração estrangeira fosse reduzida a proporções mínimas até os dias de hoje). É nesta época que se acentuam as migrações internas entre diferentes estados da federação. Assim, pode-se afirmar que os imigrantes estabelecidos no Brasil, a partir de 1850, representam uma contribuição demográfica relativamente importante. Desde 1930, porém, esta contribuição, conforme afirma Paul Hugon, “tornou-se pouco significativa para explicar a extraordinária expansão da população nacional. Esta expansão é quase exclusivamente devida ao movimento natural da população”. Ou seja, é a diferença entre a natalidade e a mortalidade, a balança dos nascimentos e dos óbitos, que explica o crescimento demográfico fabuloso dos últimos anos, assim como suas particularidades e sua intensidade. A contribuição dos imigrantes estrangeiros foi, quantitativamente, um fator secundário dessa expansão, embora de importância transcendental do ponto de vista qualitativo. Como observa o historiador Sérgio Buarque de Hollanda, o emprego de imigrantes europeus na grande lavoura, em lugar de escravos, envolvia uma verdadeira revolução nos métodos de trabalho vigentes no país e, mais que isso, nas concepções predominantes em todo o território do Império acerca do trabalho livre. Um exemplo típico de tais concepções foi o caso dos alemães contratados em 1839 para a construção de pontes e calçadas em Pernambuco: tantas foram as zombarias feitas a esses “escravos brancos” que eles não conseguiram concluir o trabalho iniciado. A colonização havia criado uma nova classe de pequenos médios proprietários agrícolas, principalmente no Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A “importação de braços” para a lavoura do café, por sua vez, criou um proletariado rural importante, a partir de meados do século XIX. Surgiu uma nova classe social, com reivindicações específicas e um comportamento político próprio. É conhecido o caso da primeira greve realizada por esses operários agrícolas, em Limeira, na colônia Ibicaba, de propriedade do senador Vergueiro, em 1856. De onde vinham esses primeiros imigrantes? No início, da Suíça e da Alemanha. Quantitativamente, porém, a imigração germânica é modesta, vindo em quarto lugar, depois da portuguesa, italiana e espanhola. De 1820 a 1968, 225 000 alemães se estabeleceram no Brasil, o que representa 4,6% do total da imigração neste período. É interessante observar que nem todos os suíços e alemães tinham origem camponesa. J. J. Tschudi, em carta enviada ao Correio Mercantil, no dia 25 de outubro de 1858, observa que, de uma lista de 92 futuros lavradores contratados para as fazendas de café, apenas treze já tinham se dedicado anteriormente à agricultura. Dos restantes, 42 eram operários de fábrica, seis sapateiros, qua-
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ARTIGO
Acima, Hospedaria ou Hotel dos Imigrantes, construído durante a administração do conde de Parnaíba, presidente da província de São Paulo, ainda no tempo do Império. Esta Hospedaria, assim como a Agência Oficial de Colonização e Trabalho, era mantida pelo governo brasileiro para dar assistência àqueles que procuravam se fixar em suas terras. Um inspetor, que falava a língua original dos imigrantes, recebia-os quando eles aportavam, oferecendo, em nome do governo, a hospitalidade do Estado, e dirigindo-os depois, às acomodações temporárias.
tro carpinteiros, nove alfaiates, três soldados, dois pedreiros, dois ferreiros, dois vidraceiros, dois tanoeiros, dois músicos ambulantes, um jornaleiro, um confeiteiro, um pintor, um serrador e um mestre-escola. Os portugueses, únicos imigrantes europeus durante a colônia, praticamente deixam de vir para o Brasil nos primeiros quarenta anos que se seguiram à independência. A imigração portuguesa recomeça, porém, a partir de 1853, chegando a ser a mais importante, ao lado da italiana, antes do final do século. Entre 1884 e 1930, 1,204 milhão de portugueses se estabelecem no Brasil, o que representa 29% do total da imigração neste período. Os italianos chegam em grande quantidade a partir da abolição da escravatura. Até essa data já haviam entrado 180 000, mas é nos anos seguintes que esta imigração assume grandes proporções. Entre 1888 e 1898, o movimento foi intenso, com a chegada de 820 000 italianos (em média de 82 000 por ano), o que representa 61% da imigração total naquela década. O movimento decresce um pouco, mas continua importante até a guerra de 1914. Entre 1820 e 1968, 1,211 milhão de italianos aqui se estabeleceram, o que representa 30% do total da imigração. Enquanto os portugueses se estabeleciam em todo o território nacional, os italianos davam preferência aos estados do Sul e do Sudeste. Entre 1887 e 1945, 88% dos italianos que entraram no Brasil se fixaram no estado de São Paulo, espalhando-se por quase todos os seus 270 municípios, exceto dois. A maioria, porém, se concentrava no município da capital, na zona de Piracicaba e de Campinas. Seguem-se as regiões de Marília, Ribeirão Preto e Monte Aprazível. Taquaritinga possuía a porcentagem mais elevada, com 6,3% de italianos no total de sua população; Santo André e São Paulo: 5,7%, cada um. A imigração espanhola é o terceiro grupo, por sua importância quantitativa, representando 12,5% do total da imigração. Entre 1820 e 1968, 694 000 pessoas vieram da Espanha para o Brasil, fixando-se também, de preferência, nos estados de
São Paulo (67,7%), Rio de Janeiro, Minas e Rio Grande do Sul. Em 1908 chega a Santos o navio Kasato Maru, trazendo a bordo 781 imigrantes japoneses. O Japão, nessa época, já era um país de forte emigração. Com o final do feudalismo e o início da era Meiji (1868), o país se industrializara e se modernizara rapidamente, mas o desenvolvimento de sua economia não era suficiente para absorver o excedente de mão de obra, fruto de uma expansão demográfica acentuada. No Brasil, a corrente imigratória japonesa é fraca até 1919, assumindo grande importância entre 1925 e 1935. Do seu início até 1968, 233 487 japoneses entraram no Brasil, o que representa 3,6% do total da imigração. A maioria se estabeleceu no estado de São Paulo (75%) e no Paraná (18%), e, em proporções mais modestas, em Mato Grosso e no Pará. Ao lado desses grupos principais, entraram no Brasil ainda 920 000 pessoas de diferentes nacionalidades no período 1820/1968 (16% da imigração total). A contribuição eslava foi relativamente importante: 109 502 russos, 47 765 poloneses, 23 125 iugoslavos, estabelecidos, principalmente, no Paraná e no Rio Grande do Sul. A Turquia forneceu 78 574 imigrantes (1,9% do total), a Síria 21 488, a Áustria 86 211, a França 34 094, a Hungria 30 132. É possível citar ainda uma infinidade de nacionalidades, cuja contribuição numérica, entretanto, foi insignificante.
Norte-americanos introduzem videiras e o arado Logo após a guerra civil nos Estados Unidos e a abolição da escravidão negra no sul daquele país (1863), vários grupos de imigrantes americanos chegaram ao Brasil em busca de terras e atraídos pelo regime escravista ainda vigente aqui. Inúmeras colônias foram fundadas, com gente vinda do Alabama, Louisiana, Carolina do Sul, Geórgia, Tennessee, Kansas e Texas, antigos fazendeiros ou simples simpatizantes dos confederados. Alguns foram para a região
amazônica (Santarém), outros para o litoral sul (Juquiá, Paranaguá), outros para o Rio, Espírito Santo e Bahia. Um dos pioneiros dessa imigração foi o Dr. James McFadden Gaston, que visitou várias regiões do interior paulista – Itu, Porto Feliz, Itapetininga, Rio Claro (onde recebeu auxílio da família Whitaker), indo estabelecer sua colônia, finalmente, em Xiririca (hoje Eldorado). Todas essas tentativas fracassaram. O único núcleo que se manteve foi o de Santa Bárbara, no interior de São Paulo, que conseguiu atrair para lá os demais imigrantes, cerca de 2 000. Desta data até 1939, cerca de 12 000 americanos se fixaram no Brasil. O núcleo de Santa Bárbara d’Oeste deu origem à Vila Americana hoje simplesmente Americana. Em 1906, quando o secretário de estado americano Elihu Root passou por Vila Americana, encontrou ainda cerca de quinhentos compatriotas e seus filhos paulistas espalhados por 3 léguas da região, cultivando cana-de-açúcar, arroz e principalmente melancia. Foram eles que plantaram as primeiras videiras no estado de São Paulo, segundo F. Goldman, e que difundiram em larga escala o uso do arado. Em fins do século XIX e início do século XX, a imigração de judeus para o Brasil tomou um grande impulso. A maioria deles tinha sido vítima de perseguições na Europa Oriental, iniciadas a partir dos progroms (ou massacres de judeus), que causaram a destruição de comunidades inteiras no sul da Rússia, em 1881. Inúmeras famílias abandonaram aquele país, a Polônia, Ucrânia, Lituânia e Romênia, e emigraram para o Novo Mundo. Com as dificuldades de imigração impostas nos Estados Unidos após a Guerra de 1914/1918, um grande número de judeus vem para o Brasil entre 1920 e 1930. A maior parte dos que se fixaram em São Paulo concentrou-se no bairro do Bom Retiro e dedicou-se ao comércio. Seus descendentes participam hoje ativamente da vida econômica, cultural e política do país. Finalmente, é preciso assinalar que, embora instalados de início nas fazendas de café, os grandes contingentes de italianos, portugueses, espanhóis e alemães passam a viver também nas pequenas e grandes cidades. Artesãos ou comerciantes, contribuíram poderosamente para o processo de urbanização do país. No interior, os italianos dedicavam-se também a atividades industriais, tendo introduzido uma série de pequenas fábricas de tecidos, massas alimentícias, adubo, cola, Repartição, por nacionalidade, dos operários têxteis da cidade de São Paulo, em 1912. Italianos
6 044
Portugueses
824
Sírios
210
Japoneses
13
Brasileiros
1 843
Espanhóis
338
Alemães
50
Outros
862
Total
10 184 Boletim Estadual do Trabalho, 1912.
ARTIGO chapéus, calçado, peneira, pregos, seda natural, grande parte delas originadas do artesanato. Todavia, a grande indústria que o parque de São Paulo apresenta hoje não teve origem artesanal, senão em casos esporádicos, como bem assinala M. Diegues Jr. Os imigrantes que se dedicaram ao comércio e à indústria tinham, em geral, origem pequeno-burguesa. São raríssimos os empresários imigrantes que começaram como operários de fábrica ou mascates (Dante Ramenzoni e Nicolau Scarpa são as úni-
cas exceções de destaque). Giovanni Briccola, a primeira fortuna italiana de São Paulo, enriqueceu como agente do Banco de Nápoles e já era engenheiro quando aqui chegou, em 1885. Francisco Matarazzo já era comerciante na Calábria, antes de imigrar, filho de funcionário público. Os outros, a imensa maioria dos imigrantes que enfrentou a dura travessia do Atlântico sonhando com a fortuna do Novo Mundo, iam, em geral, engrossar as fileiras do proletariado brasileiro em formação e enfren-
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tar as duras condições de trabalho, tanto nas fazendas como nas primeiras indústrias aqui criadas. O relatório oficial, preparado em 1901 por F. Bandeira Jr. sobre a indústria de São Paulo, assinalava a presença nas fábricas, de mão de obra constituída por 90% de operários europeus. Em 1913, os italianos representavam quatro quintos do número total de trabalhadores na construção civil na cidade de São Paulo. Extraído de: História do Século 20, Ed. Abril.
POIS É, POESIA
Álvares de Azevedo (1831-1852) A T...
O Poeta No amor basta uma noite para fazer de um homem um Deus.
Un souvenir heureux est peut-être sur terre Plus vrai que Ie bonheur.
Propércio
A. de Musset
A moroso palor meu rosto inunda,
Mórbida languidez me banha os olhos, Ardem sem sono as pálpebras doridas, Convulsivo tremor meu corpo vibra: Quanto sofro por ti! Nas longas noites Adoeço de amor e de desejos E nos meus sonhos desmaiando passa A imagem voluptuosa da ventura... Eu sinto-a de paixão encher a brisa, Embalsamar a noite e o céu sem nuvens, E ela mesma suave descorando Os alvacentos véus soltar do colo, Cheirosas flores desparzir sorrindo Da mágica cintura. Sinto na fronte pétalas de flores, Sinto-as nos lábios e de amor suspiro. Mas flores e perfumes embriagam, E no fogo da febre, e em meu delírio Embebem na minh’alma enamorada Delicioso veneno. Estrela de mistério! em tua fronte Os céus revela, e mostra-me na terra, Como um anjo que dorme, a tua imagem E teus encantos onde amor estende Nessa morena tez a cor de rosa Meu amor, minha vida, eu sofro tanto! O fogo de teus olhos me fascina, O langor de teus olhos me enlanguece, Cada suspiro que te abala o seio Vem no meu peito enlouquecer minh’alma! Ah! vem, pálida virgem, se tens pena De quem morre por ti, e morre amando, Dá vida em teu alento à minha vida, Une nos lábios meus minh’alma à tua! Eu quero ao pé de ti sentir o mundo Na tu’alma infantil; na tua fronte Beijar a luz de Deus; nos teus suspiros Sentir as virações do paraíso; E a teus pés, de joelhos, crer ainda Que não mente o amor que um anjo inspira, Que eu posso na tu’alma ser ditoso, Beijar-te nos cabelos soluçando E no teu seio ser feliz morrendo! Dezembro, 1851.
E
ra uma noite – eu dormia E nos meus sonhos revia As ilusões que sonhei! E no meu lado senti... Meu Deus! por que não morri? Por que no sono acordei? No meu leito – adormecida Palpitante e abatida, A amante de meu amor! Os cabelos recendendo Nas minhas faces correndo Como o luar numa flor! Senti-lhe o colo cheiroso Arquejando sequioso; E nos lábios, que entr’abria Lânguida respiração, Um sonho do coração Que suspirando morria! Não era um sonho mentido; Meu coração iludido O sentiu e não sonhou: E sentiu que se perdia Numa dor que não sabia... Nem ao menos a beijou! Soluçou o peito ardente Sentiu que a alma demente Lhe desmaiava a tremer: Embriagou-se de enleio, No sono daquele seio Pensou que ele ia morrer! Que divino pensamento, Que vida num só momento Dentro do peito sentiu... Não sei... Dorme no passado Meu pobre sonho dourado... Esperança que mentiu!
Sabem as noites do céu E as luas brancas sem véu As lágrimas que eu chorei! Contem do vale as florinhas Esse amor das noites minhas! Elas sim... eu não direi! E se eu tremendo, senhora, Viesse pálido agora Lembrar-vos o sonho meu, Com a fronte descorada E com a voz sufocada! Dizer-vos baixo – Sou eu! Sou eu! que não esqueci A noite que não dormi, Que não foi uma ilusão! Sou eu que sinto morrer A esperança de viver... Que o sinto no coração! – Riríeis das esperanças, Das minhas loucas lembranças, Que me desmaiam assim? Ou então, de noite, a medo Choraríeis em segredo Uma lágrima por mim?
Soneto
Pálida, à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada, Como a lua por noite embalsamada, Entre as nuvens do amor ela dormia! Era a virgem do mar! na escuma fria Pela maré das águas embalada! Era um anjo entre nuvens d’alvorada Que em sonhos se banhava e se esquecia! Era mais bela! o seio palpitando... Negros olhos as pálpebras abrindo... Formas nuas no leito resvalando... Não te rias de mim, meu anjo lindo! Por ti – as noites eu velei chorando, Por ti – nos sonhos morrerei sorrindo!
Extraído de: Melhores poemas de Lira dos vinte anos, Ed. Núcleo, 1994.
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(ENTRE PARÊNTESIS)
A lebre e o porco-espinho Um amigo de Vítor conta-lhe a seguinte história: – A lebre, que é tida como um animal dos mais velozes, fará uma corrida com um porco-espinho. Como este é dez vezes mais lento que a lebre, receberá uma vantagem considerável: ficar 100 metros adiante. Mesmo assim, a lebre não terá qualquer chance de vencer e isto é fácil de comprovar. No instante em que a lebre chegar ao ponto onde o porco-espinho estava, este estará mais adiante. Quando a lebre chegar a este novo ponto, o outro já estará mais à frente e assim por diante. Dessa forma, a lebre jamais alcançará o porco-espinho ou o ultrapassará. Vítor não aceita este raciocínio. Sua experiência lhe diz que a lebre é muito mais rápida e vencerá. Ele garante que o raciocínio apresentado é falho. Será que ele tem razão? Ou não?
RESPOSTA O sofisma lógico está em que, geralmente, compara-se a velocidade constante das lebres com uma distância que deverá ser continuamente menor. Sabemos que a lebre pode correr dez vezes mais rápido que o porco-espinho. Se ela percorreu os 100 metros de vantagem do porco-espinho, então este percorreu exatamente 10 metros. Assim que estes 10 metros são também percorridos, o porco-espinho estará 1 metro à frente. Assim, a distância de 10 centímetros diminui para 1 centímetro e assim por diante. Se se confrontar, a cada vez, os espaços que ficam, o resultado será: 100 + 10 + 1 + 0,1 + 0,01 + 0,001, etc. É uma série interminável com um intervalo sempre menor e de valor-limite em 112. Se a lebre corre 10 vezes mais rápido que o porco-espinho, atingirá assim, mais cedo, os 112 metros. E, se a diferença da velocidade não é de 1 : 10, como tomamos no problema, adia-se deste modo o valor-limite. Então, a princípio, não muda nada.
SERVIÇO DE VESTIBULAR Universidade Federal de Grande Dourados (UFGD) Período de inscrição: até 17 de novembro de 2015. Somente via internet. Endereço da faculdade: rua João Rosa Góes, 1 761 – Vila Progresso – Dourados – MS – CEP: 79825-070 – Telefone: (67) 3410-2002. Requisito: taxa de R$ 80,00. Cursos e vagas: consultar site www.cs.ufgd.edu.br/vestibular/ Exame: dia 06 de dezembro de 2015. Leituras obrigatórias: • Menino de engenho – José Lins do Rego. • Ficções do interlúdio – Fernando Pessoa. • Lucíola – José de Alencar. • Seminário dos ratos – Lygia Fagundes Telles. • Dois irmãos – Milton Hatoum. • Beijo no asfalto – Nelson Rodrigues.
Leituras obrigatórias: • O cortiço – Aluísio de Azevedo. • Capitães da Areia – Jorge Amado. • A antologia poética – Vinicius de Moraes. • Dom Casmurro – Machado de Assis. • Vidas secas – Graciliano Ramos.
Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-Sul) Período de inscrição: até 02 de dezembro de 2015. Somente via internet. Endereço da faculdade: rua Guilherme Schell, 350 – Santo Antônio – Porto Alegre – RS – CEP: 90640-040 Telefone: (51) 3218-1300. Requisito: taxa de R$ 80,00. Cursos e vagas: consultar site www.espm.br/vestibularsul Exame: 05 de dezembro de 2015.
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Faculdade de Medicina de Marília (Famema)
Período de inscrição: até 03 de dezembro de 2015. Somente via internet. Endereço da faculdade: rua Rangel Pestana, 762 – Piracicaba – SP – CEP: 13400-901 – Telefone: (19) 3124-1515. Requisito: taxa de R$ 80,00. Cursos e vagas: consultar site www.unimep.br/vestibular Exame: dia 06 de dezembro de 2015.
Período de inscrição: até 24 de novembro de 2015. Somente via internet. Endereço da faculdade: av. Monte Carmelo, 800 – Marília – SP – CEP 17519-030 – Telefone: (14) 3402-1744 – Fax: (14) 3413-2594. Requisito: taxa de R$ 150,00. Cursos e vagas: consultar site www.famema.br Exame: dia 22 de dezembro de 2015.
Jornal do Vestibulando
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) Período de inscrição: até 25 de novembro de 2015. Somente via internet. Endereço da faculdade: av. Ipiranga, 6 681 – Partenon – Porto Alegre – RS – CEP: 90619-900 – Telefone: (51) 3320-3557. Requisito: taxa de R$ 100,00. Cursos e vagas: consultar site www.vestibular.pucrs.br/ Exames: dias 05 e 06 de dezembro de 2015.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Período de inscrição: até 19 de novembro de 2015. Somente via internet. Endereço da faculdade: rua Monte Alegre, 984 – Perdizes – São Paulo – SP – CEP: 05014-901 – Telefone: (11) 3670-8000. Requisito: taxa de R$ 150,00. Cursos e vagas: consultar site www.vestibular.pucsp.br Exame: dia 06 de dezembro de 2015. Leituras obrigatórias: • A cidade e as serras – Eça de Queirós. • Memórias de um sargento de milícias – Manuel Antônio de Almeida. • Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis. • Sentimento do mundo – Carlos Drummond de Andrade. • Vidas secas – Graciliano Ramos.
Jornal ETAPA, editado por Etapa Ensino e Cultura REDAÇÃO: Rua Vergueiro, 1 987 – CEP 04101-000 – Paraíso – São Paulo – SP JORNALISTA RESPONSÁVEL: Egle M. Gallian – M.T. 15343