Revista Quero Saber (especial) - Incrível História 1

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NO VO

EDIFÍCIOS & LO CAIS

ARMAS & GUERR A

PRÉ-HISTÓRIA

Tratamentos médicos arrepiantes

As pessoas por detrás da lenda

Aparelhos de tortura tétricos

Máquinas voadoras espantosas

MAIS DE

ESPECIAL

700 DIAGRAMAS E IMAGENS

O Exército de Terracota revelado

INCRÍVEL

HISTORIA

tudo o que precisa de saber sobre o mundo que habitámos De que forma Einstein influenciou a ciência?

Descobertas que mudaram o mundo

As armas e a guerra ao longo do tempo

No interior de um castelo japonês

Fique frente a frente com criaturas extintas fantásticas

IN D ÚS TRIA & INVENTOS

FIGU R AS IN FLU ENTES

M U ND O ANTIGO



Bem-vindo à especial

INCRÍVEL

HISTORIA

Como eram as primeiras cidades da antiguidade? O que aconteceu realmente aos dinossáurios? Como evoluiu ao longo dos séculos o secretíssimo trabalho dos espiões? Porque foi o Exército de Terracota encontrado soterrado ao lado do túmulo de um imperador chinês? Esta Quero Saber Especial Incrível História é uma nova edição inteiramente dedicada a responder a todas estas perguntas e muitas mais. Viajamos através dos tempos e celebramos os costumes, tradições e inovações mais intrigantes do passado, que mudaram o mundo para sempre. Atravessamos diferentes épocas e cruzamos continentes, percorrendo uma vasta e eclética gama de tópicos: do mundo antigo, e dos edifícios e locais mais icónicos, às armas e à guerra, passando por invenções magistrais, visionários influentes e predadores pré-históricos. Repleta de factos e números fascinantes, acompanhados por fotografias, diagramas e ilustrações deslumbrantes, folheie a seu bel-prazer e inspire-se à medida que a história ganha vida diante dos seus olhos!



INCRÍVEL

HISTORIA EDITOR Goody S.A. NIF: 505 000 555 Sede Social, Edição, Redação e Publicidade Praça Bernardino Machado, nº 11A, Lumiar 1750-042 Lisboa Tel.: 218 621 530 - Fax: 218 621 540 ACIONISTAS E CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO António Nunes (Presidente) (20%), Alexandre Nunes (20%), Fernando Vasconcelos (20%), Nuno Catarino (20%), Violante Assude (20%) DIRETOR GERAL António Nunes DIRETOR COMERCIAL E DE MARKETING Fernando Vasconcelos DIRETOR ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO Alexandre Nunes LICENCIAMENTO Nuno Catarino CONTABILIDADE Cláudia Pereira APOIO ADMINISTRATIVO Tânia Rodrigues e Mafalda Almeida DIRETORA Rita Hasse Ferreira TRADUÇÃO Rita Hasse Ferreira, Mónica Marques, Rita Santos, Marta Pinho, Maxmedia REDAÇÃO E EDIÇÃO Rita Hasse Ferreira DIREÇÃO DE ARTE Sofia Marques PAGINADOR E ARTE DE CAPA Rodolfo Ramos IMAGENS DE CAPA E CONTRACAPA © Dreamstime, Thinkstock DIRETOR DE PRODUÇÃO Paulo Oliveira PUBLICIDADE Fátima Eiras – Tel.: 218 621 491 Tlm: 937 908 007 E-mail: fatima.eiras@goody.pt COORDENADOR DE CIRCULAÇÃO Carlos Nunes SERVIÇO DE ASSINANTES E LEITORES Gonçalo Galveia – Tel.: 218 621 543 E-mail: assinaturas@goody.pt Site: www.assineagora.pt DISTRIBUIÇÃO VASP – Distribuidora de publicações, SA DISTRIBUIÇÃO DE ASSINATURAS JMToscano Lda. PRÉ-IMPRESSÃO E IMPRESSÃO Ligação Visual Quinta dos Estrangeiros, Zona Industrial Norte, Rua C, Pav. 63 2665-601 Venda do Pinheiro TIRAGEM 4.000 exemplares DEPÓSITO LEGAL Nº316003/10 INSCRIÇÃO NA ERC Nº125951 Por favor recicle esta revista quando terminar de a utilizar

A Quero Saber é propriedade da Goody, S.A. Todos os artigos originais são propriedade da mesma. Os artigos adaptados da revista How It Works são propriedade da Future Publishing, estando a Goody, S.A. autorizada a reproduzi-los em Portugal. É proibida a reprodução total ou parcial de textos, fotografias ou ilustrações da revista Quero Saber para quaisquer fins, incluindo comerciais, sem autorização expressa do Editor.

especial


ESPECIAL INCRÍVEL HISTÓRIA

SUMÁRIO Mundo Antigo 010 Mesopotâmia: os criadores da civilização 016 Como o Vesúvio destruiu Pompeia

Edifícios & Locais

Armas & Guerra 064 Espiões ao longo da história

034 Dez maravilhas do Mundo Antigo

070 O cerco de Tiro

040 Cidades perdidas

072 Aríetes brutais

018 O génio da Grécia Antiga

044 A vida num castelo japonês medieval

073 A metralhadora Vickers

024 A vida depois da morte no Antigo Egito

046 Monumento a Washington

076 A Batalha de Azincourt

030 O Exército de Terracota

047 Moinhos de vento

074 Os mosqueteiros 080 No interior do Projeto Manhattan

048 O Castelo de Edimburgo

084 O Sikorsky MH-60 Black Hawk

O Palácio de Versalhes 050 052 A Catedral de Milão 054 Como foi pintado o teto da Capela Sistina?

Recordes da realeza

056 Massachusetts State House

030

O Exército de Terracota

016 A destruição de Pompeia

006 | Quero Saber

058 A ponte de Brooklin 060 O que correu mal em Chernobyl?

114

074

Conheça os mosqueteiros


138

Os últimos dias dos dinossáurios

Indústria & Inventos

156 Predadores pré-históricos

088 Invenções arrepiantes

114 Realeza recordista

094 Escrita medieval

118 O génio de Da Vinci

094 Aparelhos auditivos

124 Michael Faraday

095 As calças de ganga

126 Isambard Kingdom Brunel

096 O computador Colossus

034 Maravilhas

da antiguidade

Figuras influentes

098 Ferrovias de cremalheira

128 Charles Darwin 130 Os irmãos Wright

100 Descobertas acidentais

132 Guglielmo Marconi

104 Os primeiros frigoríficos

134 Albert Einstein

105 O gramofone 105 Fogo por arco 106 O Mecanismo de Anticítera 107 O corvus 107 Portas automáticas do mundo antigo 108 A evolução do tempo

Pré-história 138 Os últimos dias dos dinossáurios 146 Tudo sobre fósseis 148 A idade do gelo 156 Predadores pré-históricos 162 Datação de ossadas

118

© Alamy; Sol90 Images; Thinkstock

100 Descobertas acidentais

As máquinas de Da Vinci

Quero Saber | 007


MUNDO ANTIGO 010 Mesopotâmia

Descubra a primeira civilização antiga conhecida.

016 Como o Vesúvio

destruiu Pompeia

A destruição de Pompeia

016

Saiba o que aconteceu durante esta erupção cataclísmica.

018 O génio

da Grécia Antiga

Como as invenções, descobertas e cultura desta sociedade notável mudaram o mundo.

024 A vida após a morte no Antigo Egito

Explore os rituais, deuses e demónios do mundo dos mortos.

030 O Exército

de Terracota Conheça os antigos guerreiros da China para a vida após a morte.

Grécia Antiga

018

008 | Quero Saber

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010

Mesopotâmia

030 OdeExército Terracota

Antigo Egito

© Sol90 Images; Remi Jouan; Thinkstock

024

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Quero Saber | 009


MUNDO ANTIGO

MESOPOTÂMIA OS CRIADORES DA CIVILIZAÇÃO Como a sociedade que conhecemos começou numa pequena região do que é hoje o Iraque.

A

SUMÉRIA

antiga região da Mesopotâmia tem fascinado, encantado e impressionado historiadores e cientistas por milhares de anos. A Mesopotâmia não era como a Grécia ou mesmo o Egito, porque não era uma nação unida. Composta por um vasto conjunto de culturas variadas, cidades-estado e crenças, a Mesopotâmia foi uma terra de múltiplos impérios e diversas civilizações. É possivelmente graças a esta variedade que a Mesopotâmia fez nascer o que hoje reconhecemos como civilização. A lista de inovações da Mesopotâmia é infinita e é difícil contemplar como seria a vida moderna

5400 a.C. É fundada a cidade de Eridu, considerada a primera verdadeira cidade do mundo.

010 | Quero Saber

sem elas. A Mesopotâmia albergou as primeiras cidades de sempre, foi lá que se formou a escrita e os mais antigos veículos com rodas foram encontrados nas suas ruínas. Os animais eram domesticados, a humanidade criou laços com a agricultura, foram criadas técnicas inovadoras, havia armas e bebia-se vinho. Os mesopotâmios foram os primeiros a estudar o céu noturno, a seguir a Lua e a declarar que há 60 minutos numa hora e 60 segundos num minuto. A Mesopotâmia era conduzida pela religião e este era um dos poucos aspetos que unia as terras que a compunham. Desta religião surgiram costumes, códigos morais

3600 a.C.

A escrita emerge sob a forma cuneiforme. São usadas canas para fazer marcas em argila húmida.

e hierarquias sociais. Em muitos aspetos, os mesopotâmios estavam à frente do seu tempo, já que as mulheres eram vistas como indivíduos com direitos, livres para possuirem terra, para se divorciarem e para gerir negócios. A versão mesopotâmica da história da Criação declarou que o mundo fora formado quando os deuses derrotaram as forças do caos, e o mesmo podia ser dito da própria formação da Mesopotâmia. Com os seus reis, impostos e comércio, a Mesopotâmia foi um triunfo da capacidade do homem de conquistar e prosperar, e estabeleceu as bases para cidades e impérios sem fim que se lhe seguiram.

3500 a.C.

A religião é referida pela primeira vez na escrita, sob a forma das tábuas cuneiformes sumérias.

2334-2218 a.C.

A Suméria é conquistada por Sargão da Acádia (“o Grande”) e fica sob o domínio do Império Acadiano.

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SABIA QUE… Embora a maior parte da Mesopotâmia partilhasse uma só religião, cada cidade tinha o seu deus padroeiro?

Como era a vida na Mesopotâmia A palavra “Mesopotâmia” significa “entre os rios”, o que literalmente descreve a localização da região. Fica entre os rios Tigre e Eufrates, que hoje fluem entre a atual Turquia, Iraque e Síria. Todas as regiões da Mesopotâmia tinham diferentes geografias, que levaram à variedade dos modos de vida. Estar entre dois rios tinha alguns riscos, porque a terra estava sujeita a frequentes e imprevisíveis inundações que podiam arruinar as plantações. As inundações andavam a par e passo com períodos de seca. No entanto, o enchimento dos rios ajudava a criar um solo muito fértil, que suportava plantas mesmo com pouca chuva, e permitia que os barcos fossem usados como um rápido meio de transporte. Os mesopotâmios tornaram-se agricultores experientes e trocavam as suas colheitas por recursos que não tinham, como madeira, metal e rochas. As pessoas aproveitavam a água abundante para construir canais que suportassem a rede de comércio e conseguiram prosperar mesmo com a falta de recursos naturais em algumas áreas.

NO MAPA

A terra da abundância A geografia única da Mesopotâmia permitiu o nascimento de cidades e civilizações.

União perfeita Juntamente com o Eufrates, o rio Tigre formou o que é conhecido por Crescente Fértil.

A cidade de pedra

Por 50 anos, Nínive foi a maior cidade do mundo.

Co rd ilh eir a

Tig re

Nínive

de

Assur

Centro de comércio

Eu fra te s

A cidade de Assur ficava numa lucrativa rota comercial.

A fonte de vida

O Eufrates é o rio mais longo do oeste asiático, com cerca de 2.800 km de comprimento.

Babilónia A “cidade santa”

A primeira cidade

Mesopotâmia

Za gr os

Uruk

Ur

Uruk foi um local de pioneirismo – escrita, arquitetura e as próprias cidades.

A cidade portuária

“A Mesopotâmia, com os seus reis, impostos e comércio, foi um triunfo da capacidade do homem de conquistar.”

SUMÉRIOS

A Suméria era a região mais a sul da Mesopotâmia, englobando o Iraque e o Kuwait de hoje. Foi habitada pela primeira vez por volta de 4500 a.C., ou até antes. Foi na Suméria que se estabeleceram as primeiras cidades de que há registo, começando por Uruk. Os Sumérios acreditavam que as suas cidades representavam o triunfo dos deuses sobre o caos.

2150-1400 a.C.

A Epopeia de Gilgamesh é escrita. A obra poética é um dos exemplos mais antigos de literatura ocidental ainda existente.

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Três das maiores culturas que nasceram na Mesopotâmia e influenciaram a sociedade.

BABILÓNIOS

Significando “portão dos deuses”, a Babilónia ficava no centro-sul da Mesopotâmia, hoje Iraque. Os primeiros dias da Babilónia são um mistério, perdido no aumento do nível da água do mar, mas a partir de 1792 a.C., o famoso rei Hamurábi tomou o poder e a cidade de Babilónia – construída sobre o rio Eufrates – tornou-se o coração da Mesopotâmia.

2100 a.C. É criada a Lista Real Suméria, que estabelece a ideia de reinado como instituição divina.

1800 a.C.

ASSÍRIOS

Localizada no Próximo Oriente, o antigo reino da Assíria englobava as regiões do Iraque, Síria e Turquia. A Assíria era o motor dos desenvolvimentos tecnológicos, científicos e militares da Mesopotâmia. O Império Assírio expandiu-se para unir a maioria do Médio Oriente, aumentando o seu poder e riqueza e tornando-se uma potência formidável na região.

Todas as cidades da Suméria, e da Mesopotâmia, são unidas por Hamurábi, que declara Babilónia como capital.

1750 a.C.

Uma combinação de invasões, migração e o saque de Ur levam ao fim da civilização suméria.

Quero Saber | 011

© Thinkstock; Look & Learn; CG Textures

Nasce uma civilização


MUNDO ANTIGO

As primeiras cidades do mundo Com uma fonte de alimento confiável, as pessoas juntaram-se na Mesopotâmia e formaram as primeiras cidades. A Mesopotâmia serviu de casa a algumas das primeiras cidades, o que leva a que muitos a associem ao berço da civilização. A origem destas cidades permanece desconhecida, mas existem algumas teorias. Uma sugere que o desenvolvimento e construção de templos criou um local onde as pessoas podiam reunir-se, servindo como ponto de contacto entre diferentes grupos. Outros creem que as pessoas procuravam refúgio dos desastres naturais. Por serem capazes de desenvolver tecnologia para

controlar os rios vizinhos, como diques, os mesopotâmios podiam assegurar boas colheitas. Não tinham a necessidade de ser nómadas e conseguiram estabelecer-se confortavelmente num local. É por esta razão que todas as primeiras cidades foram construídas ao longo dos dois rios principais. O momento em que os Sumérios começaram a formar estas cidades alterou para sempre a história da humanidade. As pessoas deixaram de ser guiadas pela natureza para tentarem controlá-la. Em 4500 a.C., surge a primeira cidade

Caminho processional

O caminho processional era uma estrada que atravessava a cidade e ligava muitos dos edifícios e templos principais da Babilónia.

de que há registo comprovado: Uruk. A única estrutura urbana na época era o templo, que regulava todos os assuntos económicos e sociais. O objetivo central destas primeiras cidades foi ajudar a regular o comércio, visto que o sul da Mesopotâmia dependia de recursos externos. Esta necessidade de comércio e recursos encorajaram a expansão da urbanização. No entanto, a comunicação entre cidades era difícil e cada uma desenvolveu-se numa cidade-estado – o que levou a disputas territoriais e, inevitavelmente, à guerra. Para manter as cidades protegidas, os mesopotâmios construíram fortes e cidades entre muros. A migração para estas cidades aumentou e mais construções foram erguidas. As cidades expandiram-se gradualmente e foram proclamados líderes, que depois começaram a procurar mais comércio e conquistas.

Cidade projetada

As cidades da Mesopotâmia foram das primeiras a envolver planeamento urbanístico e existem indícios de que cidades como a Babilónia foram construídas segundo planos fixos.

Portão multiusos

Os portões na Mesopotâmia não eram apenas para proteção; eram locais sagrados de adoração, onde havia atuações públicas e os reis compareciam.

Níveis de habitação

O portão dos reis

BABILÓNIA

O espantoso Portão de Ishtar foi o oitavo da cidade de Babilónia e também servia de entrada principal. Coberto com ladrilhos vidrados a lápis-lazúli, era uma luz brilhante e cintilante sob a claridade do Sol babilónio. Enviava uma forte mensagem aos inimigos: Babilónia era uma cidade favorecida pelos deuses. Com 12 m de altura, as portas e o teto eram feitos de cedro, enquanto as torres fortificadas laterais, com 15 m de altura, eram revestidas a ladrilhos vidrados, adornados com imagens de animais e flores. O portão foi mandado construir pelo rei Nabucodonosor II, com o objetivo de impressionar não só o seu povo, mas também os deuses.

1894 a.C.

Emerge a primeira dinastia babilónica; esta dinastia amorita forma um pequeno reino que inclui a cidade da Babilónia.

012 | Quero Saber

1792 a.C.

Hamurábi começa o seu reinado da Babilónia, transformando-a de pequena vila em poderosa cidade.

A maioria das cidades tinha edifícios com vários níveis de habitação. Até os pobres tinham três andares de espaço para viver.

Muralhas da Babilónia

As muralhas da cidade eram consideradas inconquistáveis e chegavam aos 27 metros de altura.

1792-1750 a.C. Durante o seu reinado, Hamurábi introduz alguns dos primeiros exemplos de leis, sob a forma do Código de Hamurábi.

1755 a.C.

Hamurábi conquista e unifica a Mesopotâmia sob o seu domínio e a Babilónia torna-se conhecida como cidade santa.

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SABIA QUE… Não existe rasto dos famosos jardins suspensos da Babilónia? Alguns peritos creem que existiram, mas em Nínive.

Templos altaneiros à religião e cada um estava ligado a grandes complexos de templos. Havia uma crença na Mesopotâmia de que os deuses viviam nas montanhas orientais; construir templos altos colocava as pessoas mais próximas dos deuses, ligando o céu à Terra. Um objetivo mais prático para as altas plataformas seria escapar a alguma inundação crescente nas planícies. A estrutura do zigurate, que só era acessível por três escadarias, também garantia que os rituais conduzidos no interior se mantinham secretos e sagrados.

A fachada e escadarias do Zigurate de Ur foram reconstruídas pelo Departamento de Antiguidades do Iraque.

© Thinkstock

Os zigurates eram templos construídos em plataformas altas, com degraus. Embora sejam originários das cidades sumérias de 2000 a.C., gradualmente difundiram-se por toda a Mesopotâmia, incluindo pela Babilónia e pela Assíria. Estas torres piramidais eram sobretudo construídas com tijolos secos ao sol, dispostos em camadas entre juncos. Acredita-se que muitos zigurates tinham um santuário no topo, mas não restam exemplos que o confirmem. Embora não se possa determinar o seu objetivo exato, sabe-se que os zigurates estavam associados

Uma base instável

Os tijolos eram cozidos ao sol, por isso os edifícios eram instáveis e tinham de ser regularmente demolidos e reconstruídos – o que fez aumentar gradualmente o nível de altura das cidades.

Torre de Etemenanki

Jardins suspensos

No centro da vida babilónica estava o zigurate de Etemenanki. Tinha sete andares, media 91 metros de altura e talvez tenha tido acabamentos em ouro e prata.

Possivelmente construídos pelo rei Nabucodonosor II, se realmente existiram, os jardins suspensos foram um fantástico feito de engenharia.

Irrigação

Devido às imprevisíveis inundações do rio, os Babilónios desenvolveram uma complexa rede de portos e canais, bem como represas ao longo da cidade.

Rio Eufrates

O rio atravessava a cidade e era usado por mercadores e artesãos para transportar e comercializar os seus bens na Mesopotâmia.

Aprox. 1750 a.C. Matemáticos babilónios introduzem o conceito de notação posicional nos números. Astrónomos dão nomes aos planetas e constelações.

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1595 a.C.

A Babilónia é saqueada pelo rei hitita Mursilis I, o que marca o início da “idade das trevas” babilónica.

1595–1155 a.C.

A dinastia cassita governa a Babilónia, mudando-lhe o nome para “Kar-Duniash”, mas mantém-se como capital do reino.

1225 a.C.

O soberano assírio TukultiNinurta I destrói os exércitos de Babilónia, saqueia a cidade e torna-se rei.

Quero Saber | 013


MUNDO ANTIGO

Sete formas A criação da escrita como a Mesopotâmia mudou o mundo

ASSÍRIA

A expressão “fundação da civilização” é muitas vezes usada quando se fala da Mesopotâmia. Mas o que significa? A agricultura terá emergido por volta de 10.000 a.C. (achados recentes até apontam para 21.000 a.C.!) e a arte já era produzida desde há muitos milhares de anos. No entanto, a Mesopotâmia transformou esses aspetos da cultura humana na civilização tal como a conhecemos hoje. Movidos por um objetivo comum – encontrar alimento – os mesopotâmios desenvolveram alguns dos primeiros escritos conhecidos pelo Homem. Esta escrita nasceu da necessidade de registar dados sobre as colheitas. Mais tarde, desenvolveu-se para representar ideias mais abstratas. À medida que as pessoas se reuniam, também as práticas espirituais se refinaram e a população começou a partilhar um sistema comum de crença. Uma vez estabelecido, os sacerdotes, que se declaravam capazes de comunicar com os deuses, ocuparam o topo da hierarquia social – e lentamente desenvolveu-se um sistema de classes. Esta ênfase na religião inspirou códigos morais que as pessoas deviam seguir, o que levou a regras formais e, como resultado, punições para quem não obedecesse. A fonte de alimento estável fazia com que os mesopotâmios pudessem dedicar-se a outros aspetos da vida, como a tecnologia e a ciência. Fizeram grandes avanços nas áreas da matemática e da medicina. No entanto, esta estrutura social também revelou os aspetos mais negros da humanidade, como a guerra, a escravidão e a apropriação; e com tantas pessoas juntas, as doenças espalhavam-se rapidamente. À medida que se desenvolvia, a civilização teve inevitavelmente influência noutras culturas. Crê-se que a astronomia babilónica influenciou a Grécia, a Índia e até a China. Os primeiros códigos legais da Mesopotâmia tiveram um profundo efeito nas leis do Próximo Oriente, e a introdução de impostos e de um exército influenciou países do mundo inteiro. Os historiadores ainda estão a explorar o enorme impacto que a Mesopotâmia teve no mundo antigo e naquele em que vivemos hoje.

A escrita começou na Mesopotâmia nos finais do quarto milénio a.C., como forma de registar informação crucial sobre as colheitas e os impostos numa forma pictórica. As primeiras tábuas evoluíram para uma forma de escrita semelhante à que temos hoje. Este sistema de escrita é conhecido por cuneiforme e composto por marcas cunhadas desenhadas no barro. Gradualmente, o número de caracteres da escrita cuneiforme caiu de 1.000 para cerca de 400, o que garantia maior clareza. Em 2500 a.C., a escrita cuneiforme estava suficientemente desenvolvida para representar emoções como o medo e a esperança.

Cuidados de saúde A medicina na Mesopotâmia combinava rituais religiosos e tratamentos físicos. A região tinha médicos específicos com os seus “consultórios”, marquesas e equipamentos, e geralmente dividiam-se em duas categorias – os ashipu, que praticavam medicina religiosa, e os asu, que usavam remédios herbais; geralmente, estes dois tipos de médicos trabalhavam em conjunto para tratar uma maleita. Os ingredientes usados nos vários tratamentos podiam ir da casca de tartaruga e da pele de cobra a figos e sementes. Os médicos registavam os seus métodos de tratamento e diagnóstico em textos médicos como o Tratado sobre Diagnóstico e Prognóstico Médicos.

Obediência Os vestígios do Código de Hamurábi foram descobertos em 1901, em excelentes condições.

2600 a.C. 1813–1776 a.C. 1472 a.C. É fundada a cidade de Ashur, capital da Assíria, juntamente com outras cidades assírias.

014 | Quero Saber

A palavra cuneiforme significa “em forma de cunha”.

Shamshi-Adad I governa a Assíria. Expande o império, salvaguarda as fronteiras da Assíria e forma um poderoso exército.

O reino de Mitani, um poderoso estado do norte da Mesopotâmia, anexa a Assíria, que perde a independência.

Os códigos legais, como os conhecemos hoje, foram criados na Mesopotâmia. Um dos primeiros exemplos de leis mesopotâmicas foi o Código de Hamurábi. O código inclui 282 leis sobre vários assuntos, desde o casamento ao roubo, com extremo detalhe. Por exemplo, se um homem alugasse um barco a um marinheiro que o danificasse, este teria de entregar um barco novo. Embora seja o mais conhecido, o Código de Hamurábi foi precedido por outros códigos legais, como o de Lipit-Ishtar e os escritos pelo rei sumério Ur-Nammu, que descreveu o objetivo das suas leis: proteger os fracos dos poderosos.

1365–1330 a.C. 1244–1208 a.C. Ashur-uballit I derrota os Hurritas de Mitani e, sob a sua liderança, a Assíria desenvolve-se como um império poderoso e em rápida expansão.

Entra em cena o rei-guerreiro, Tukulti-Ninurta I. A Assíria expande-se ao seu expoente máximo e derrota o soberano da Babilónia.

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SABIA QUE… A guerra assíria era brutal; as palavras “Destruí, devastei e queimei com fogo” aparecem em inscrições?

Só os fortes governarão A Mesopotâmia era composta por várias cidadesestado e cada uma tinha os seus líderes e governo, com os reis a administrarem regiões individuais. Isto conduziu a muitas disputas internas entre diferentes soberanos pela terra e pelos recursos. Os primeiros reis eram os comandantes dos exércitos, que depois continuavam a sua liderança nos tempos de paz. Devido à forte ênfase na religião, os reis serviam como sumo sacerdotes e estavam associados à divindade dos deuses, autoproclamando-se seus representantes na Terra. Alguns destes reis, como Sargão, tentaram unificar muitas das cidades-estado sob um só líder e uma só capital.

Um provérbio sumério diz que “O homem é a sombra de Deus, mas o rei é o seu reflexo.”

Dinheiro mesopotâmico Os mesopotâmios usavam anéis de prata milhares de anos antes de serem cunhadas as primeiras moedas. Em cerca de 2500 a.C., o “siclo” de prata tornou-se a moeda da Mesopotâmia, com um mês de trabalho a valer um siclo e um escravo entre dez e 20. Antes disso, eram usadas nas trocas comerciais “fichas” de barro em várias formas e tamanhos. Pelo menos 16 tipos diferentes destas fichas representavam várias coisas, como corda, leite de ovelha, perfume e mel.

Este siclo cartaginês de 310-290 a.C. é similar ao siclo mesopotâmico.

O Estandarte de Ur, um artefacto de cerca de 2600 a.C., representa quadrigas com rodas a serem usadas em batalha.

Os mesopotâmios foram pioneiros no seu conceito de tempo. Foram os primeiros da história registada a usar um sistema numérico de base 60 para o medir – o que levou aos 60 segundos de um minuto e aos 60 minutos de uma hora, tal como usamos hoje. Muitos creem que foi esta base que ajudou os Babilónios a fazer tantos avanços na matemática, já que 60 tem muitos divisores. Usavam ainda um calendário lunar, com 12 meses lunares, com uma média de 29,5 dias por mês, o que deixava de fora cerca de 11 dias/ano, pelo que adicionavam sete meses a cada período de O Jogo Real de Ur, um dos mais antigos do mundo, 19 anos para manter alinhadas as estações. jogava-se com recurso à matemática mesopotâmica.

1000 a.C.

A Assíria estabelece a primeira força montada. Como ainda não havia selas, os guerreiros montavam sem elas.

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668-627 a.C.

Durante o seu reinado, o último rei dos Assírios, Assurbanípal, cria uma enorme livraria, com uma coleção de milhares de tábuas de barro.

Invenção tardia Surpreendentemente, a roda foi inventada num ponto bastante tardio da história da humanidade, com o exemplo mais antigo da Mesopotâmia a datar de 3500 a.C., na Idade do Bronze. É provável que a roda tenha sido desenvolvida individualmente por diferentes culturas na mesma época. Os indícios mostram que os mesopotâmios usaram esta invenção primeiro para a olaria, antes de adaptarem o design para o transporte com carruagens. A roda trouxe de facto vantagens ao transporte, mas demorou muito tempo a tornar-se suficientemente fluida, por isso os trenós continuaram a ser usados a par da roda.

612 a.C.

Muitas cidades assírias, incluindo Ashur e Nínive, são saqueadas e destruídas por uma força combinada de Medos, Persas e Babilónios.

Quero Saber | 015

© Alamy

As bases do tempo


MUNDO ANTIGO

Como o Vesúvio destruiu Pompeia A catastrófica erupção que soterrou uma cidade inteira.

A

o meio-dia de 24 de agosto de 79 d.C., o Monte Vesúvio entrou em erupção, perto da baía de Nápoles, no sul de Itália – naquele que viria a ser um dos mais devastadores desastres naturais dos tempos antigos. As cidades vizinhas de Pompeia e Herculano foram completamente enterradas pelas cinzas e piroclastos expelidos pelo vulcão – o que

ajudou a conservá-las em extraordinário detalhe. Também temos informação pormenorizada sobre a erupção em si, graças a Plínio, o Jovem, que escreveu duas cartas onde detalhava o que viu da casa da sua mãe, no Cabo Miceno. A sua famosa descrição da pluma “em forma de pinha” fez com que este tipo de erupção passasse a chamar-se erupção pliniana.

20 horas de terror O que aconteceu neste dia fatídico?

1

10h, 24 de agosto, 79 d.C.

2

13h, 24 de agosto

Depois de várias pequenas explosões, o Vesúvio entra em erupção, lançando uma grande nuvem de lava e cinzas a mais de 20 km de altura. A nuvem bloqueia o sol, deixando a cidade na escuridão, e violentos tremores de terra fazem ruir os edifícios. As pessoas fogem em direção à costa em busca de refúgio, mas as águas agitadas tornam a fuga por mar impossível.

Nos quatro dias anteriores à erupção, foram sentidos pequenos sismos na cidade de Pompeia. Como isto acontecia todos os anos sem consequências de maior, os habitantes não deram importância. Muitos estavam no fórum público, o coração político, religioso e comercial da cidade.

3

21h, 24 de agosto

Cinzas quentes e pedaços de rocha vulcânica chovem sobre Pompeia, que fica na direção do vento do vulcão. As pessoas ficam presas em casa porque os detritos bloqueiam as portas, e os telhados começam a colapsar sob o peso das cinzas e rochas. Muitas pessoas morrem também devido às emissões de enxofre.

016 | Quero Saber

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SABIA QUE… O desastre do ano 79 foi esquecido durante centenas de anos? Pompeia não foi escavada até 1748.

Nápoles

4

12h, 25 de agosto

A nuvem de cinzas atinge a sua altura máxima de 30 km e depois colapsa, enviando detritos piroclásticos de gás quente e rocha pela encosta nordeste do vulcão abaixo, em direção a Herculano. Com uma velocidade de até 700 km/h e temperaturas superiores a 400 °C, a torrente piroclástica mata instantaneamente toda a gente no seu caminho.

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5

6h, 25 de agosto

Ao amanhecer, a nuvem colapsa pela última vez, enviando mais detritos piroclásticos na direção de Pompeia e matando quem se atravessasse no seu caminho. Quando a erupção termina, Pompeia está soterrada sob 5 metros e Herculano sob 20 m de material vulcânico.

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“ Quando a erupção termina, Pompeia está soterrada sob 5 metros de material vulcânico.”

Anatomia da erupção Explosão inicial Depois de mais de 800 anos de inatividade, a pressão dentro do vulcão torna-se excessiva. A acumulação de gases irrompe pela espessa camada de lava que rompera a cratera e uma coluna de cinzas começa a elevar-se.

Nuvem em expansão O vento sopra a nuvem para sudeste e esta espalha-se por perto de 100 km de largura, de um lado ao outro. As cinzas caem sobre Pompeia a um ritmo de 15 cm por hora ao longo de todo o dia.

Fluxos piroclásticos

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© Sol90

Quando a nuvem de cinzas colapsa, detritos vulcânicos começam a rolar pelas encostas do vulcão em direção a Herculano, que fica a 6 km, e Pompeia, a 10 km de distância. Qualquer pessoa na trajetória do fluxo fica queimada até aos ossos numa questão de segundos.

Quero Saber | 017


MUNDO ANTIGO

O GÉNIO DA

GRÉCIA

ANTIGA

Como as invenções, descobertas e cultura desta civilização notável mudaram o mundo.

A

Grécia Antiga foi crucial para o progresso da cultura e sociedade ocidentais. Com a Europa a entrar na Idade do Ferro, a Grécia era um farol na evolução da civilização antiga. Atenas é amiúde considerada a principal força deste avanço, mas outros estados gregos, como Corinto, Tebas e mesmo a belicosa Esparta também contribuíram. A Grécia Antiga melhorou quase todas as facetas da economia, sociedade, exército e política. A falange grega era uma das formações militares mais temidas do mundo antigo, os teatros gregos exibiam as melhores peças e os atletas competiam no pináculo do desporto antigo: as Olimpíadas. Os arquitetos gregos conceberam algumas das mais requintadas estruturas antigas e filósofos

Principais marcos da Grécia Antiga 018 | Quero Saber

questionavam o mundo de novas formas. As obras de Homero Ilíada e Odisseia eram ímpares no seu tempo. Ao contrário de em civilizações prévias, crê-se que muitos cidadãos da Grécia Antiga fossem instruídos. Centenas de palavras portuguesas têm origem no grego antigo, como “enciclopédia”, “telefone” e “microscópio”. A palavra “democracia” é outra, vinda do grego “demokratía”, que significa “governo popular”. As cidades-estado gregas foram governadas por reis durante grande parte da história desta civilização, mas por um curto período, por volta do século V a.C., Atenas foi uma democracia. O sistema não era idêntico ao atual (mulheres e escravos não podiam votar), mas este desenvolvimento incrivelmente importante

6.000 a.C.

Primeiro povoamento

Primeira atividade neolítica na Grécia, incluindo indícios de agricultura.

2.700 a.C.

moldou a política mundial desde então e todos os que hoje podem votar devem-no aos gregos. As divisões das cidades-estado limitaram os avanços científicos, já que as regiões lutavam amiúde entre si. Unificada sob o reinado de Alexandre, o Grande, em 336 a.C., a Grécia viu o seu comércio florescer e a cultura espalhar-se pelo Mediterrâneo, Ásia Menor e norte de África. Os romanos podem tê-la conquistado, mas ficaram tão impressionados com a cultura e tecnologia que copiaram a engenharia, mitologia, arquitetura e táticas militares gregas. A influência da Grécia Antiga no mundo ocidental é tal que, se tivesse perecido nos muitos conflitos com a Pérsia, a civilização europeia podia ter seguido um rumo muito diferente.

1.500 a.C.

Civilização minoica Era micénica em Creta A Grécia está agora A civilização minoica prospera sob um sistema sem estrutura hierárquica.

na Idade do Bronze e a cultura micénica desenvolve a língua grega.

~ 900 a.C.

Cerâmica

Num estilo clássico e geométrico, surgem as primeiras peças tipicamente gregas.

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SABIA QUE... Platão foi um talentoso lutador, e o seu nome, que significa “ombros largos”, foi-lhe dado pelo seu treinador?

Cidades-estado As regiões mais poderosas e influentes do Classicismo grego.

Olímpia

Delfos

Delfos tinha alguns dos mais importantes templos da Grécia. Diz-se que lá se situaria o oráculo da Pítia, procurada pelos gregos pela sua sabedoria.

O palco dos primeiros Jogos Olímpicos era um local sagrado da Grécia Antiga. Olímpia organizava também os Jogos Heraia, para mulheres, e tinha inúmeros templos dedicados aos culto dos deuses.

Corinto

Conhecido pela sua cerâmica de qualidade, Corinto era um grande centro de comércio e estudos na Grécia Antiga. A cidade-estado tinha a sua própria moeda e ostentava um dos principais tipos de arquitetura clássica.

DELFOS

Tebas

TEBAS CORINTO OLÍMPIA

A cidade-estado mais poderosa antes da ascensão de Atenas e Esparta, Tebas desfrutou de um período de poderio depois de se aliar a Esparta contra Atenas. Na mitologia grega, foi onde nasceu Hércules.

ATENAS

ESPARTA Atenas

Uma das cidades-estado mais ricas e poderosas, Atenas tinha uma marinha forte e a primeira democracia. A sua rivalidade de longa data com Esparta acabou por resultar em guerra.

Esparta

A belicosa Esparta tinha um exército poderoso e ajudou a proteger a Grécia dos persas. Cada cidadão masculino era treinado desde os sete anos para integrar um exército profissional e temido.

Unificação macedónica da Grécia

PERÍODO ARCAICO

~ 800 a.C.

Obras de Homero

O “bardo cego” escreve os poemas Ilíada e Odisseia.

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776 a.C.

Jogos Olímpicos

As primeiras Olimpíadas são um festival dedicado a Zeus. O evento decorre a cada quatro anos, durante séculos.

740 a.C.

Alfabeto grego

Criado a partir da escrita fenícia, surgem evidências do primeiro alfabeto grego.

700 a.C.

Estudos musicais

Esparta e Argos oferecem os primeiros estudos organizados de teoria musical e as primeiras provas musicais documentadas.

© Thinkstock; WIKI; Ilustração por Rebekka Hearl

A Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.) destroçou a Grécia, tendo a hegemonia de Atenas sido quebrada por Esparta e seus aliados. A Grécia permaneceu dividida, enfraquecida e exposta a invasões por conta de uma série de alianças instáveis. Por volta deste período, o poder da Macedónia crescia e o rei Filipe II da Macedónia tirou partido de uma Grécia enfraquecida. O seu exército derrotou uma forte aliança de soldados de Atenas e Tebas, na decisiva Batalha de Queroneia, em 338 a.C.. Esparta não entrou na batalha, mas também viria a ser derrotada. Filipe tornou-se o governante incontestado da Grécia, com o seu assassinato a levar o seu filho, Alexandre III, ao trono. Um líder nato, Alexandre, o Grande (ou Magno), unificou a Grécia e decidiu Os reinados de Filipe e Alexandre uniram a subjugar o Império Aqueménida. Alexandre acabou por liderar um dos impérios mais Grécia e fizeram dela uma potência militar. poderosos do mundo antigo, que se estendia da Grécia, no oeste, à Índia, no leste.

Quero Saber | 019


MUNDO ANTIGO

A Acrópole

Erguendo-se 150 metros acima de Atenas, a Acrópole tem cerca de seis hectares.

A famosa cidadela de Atenas tornou-se um símbolo persistente da arquitetura grega clássica. Muitas das principais cidades gregas eram dominadas por uma acrópole ao centro. Significando “cidade elevada”, a acrópole era uma colina bem defendida, para onde os cidadãos fugiam quando a cidade estava sob ataque. As cidades-estado de Tebas e Corinto tinham ambas uma acrópole, mas a mais famosa destas cidadelas era, sem dúvida, a de Atenas. As estruturas originais foram aperfeiçoadas após a vitória na Batalha de Maratona, em 490 a.C., mas foram destruídas pelas tropas persas de Xerxes quando saquearam Atenas, dez anos depois. Após a derrota persa em Salamina, a cidade usou a sua riqueza para restaurar o esplendor da Acrópole. Vastos projetos de construção tiveram início e a área tornou-se um enorme centro de culto à deusa Atena, a padroeira de Atenas. O maior dos templos era o Pártenon, erguido entre 447 e 432 a.C. Alojava uma magnífica estátua em marfim de Atena e guardava as

reservas de ouro da cidade. A área tornou-se um local de culto e cultura, em vez de mera defesa, com os templos de Atena Niké, Erectéion e Propileus, também construídos num período de 50 anos. Com a ajuda de restauros modernos, o Pártenon ainda hoje se ergue sobre a cidade.

“A área tornou‑se um enorme centro de culto à deusa Atena.”

A Acrópole de Atenas Como grandiosos programas de construção no século V a.C. transformaram a Acrópole numa cidadela florescente.

Atena Niké

O templo continha uma estátua em madeira de Atena segurando um elmo e uma romãzeira, símbolos da guerra e da paz.

Acesso monumental O Propileus era a entrada decorativa do complexo. As suas colunas e coberturas faziam dela uma estrutura imponente.

Entrada da Acrópole

A principal entrada na Acrópole era uma ampla escadaria em pedra que conduzia ao acesso monumental.

Erectéion

Este templo sagrado de Atenas figura na mitologia grega como o local onde Atena e Poseidon discutiram sobre quem deveria controlar a cidade.

Entrada natural

O Propileus foi construído em torno da entrada natural da Acrópole e os cidadãos subiam por uma rampa e degraus de mármore.

625 a.C.

621 a.C.

Avanços na cerâmica

Código de Drácon

Figuras negras popularizam-se na olaria grega, mas dão depois lugar a figuras vermelhas.

020 | Quero Saber

Elaborado por um aristocrata ateniense, tornou-se o primeiro código legislativo escrito da cidade.

594 a.C.

Moedas

Com o florescimento do comércio e da indústria, Atenas adota uma moeda.

508 a.C.

Nasce a democracia

PERÍODO CLÁSSICO

“O Pai da Democracia Ateniense”, Clístenes, introduz um novo sistema político, ante o interesse do público pela política.

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SABIA QUE... Os antigos gregos inventaram a máquina de venda automática? Funcionava com moedas e dispensava água benta.

O Pártenon

O popular general e estadista ateniense Péricles foi a força motriz por detrás da reconstrução da Acrópole, depois de esta ter sido destruída pelos persas. Péricles queria que a cidadela fosse maior e mais majestosa do que nunca antes, tendo recorrido habilmente a tributos pagos à cidade para financiar este empreendimento dispendioso. Muitos dos melhores arquitetos e escultores do mundo antigo, a par de centenas de operários, contribuíram. Péricles é recordado como um herói de Atenas e, pouco depois de ter sucumbido à peste, a cidade perdeu a Guerra do Peloponeso contra Esparta e entrou num período culturalmente negro.

Sob a liderança de Péricles, a cidade entrou numa era de prosperidade.

Santuário de Zeus Polieus Um santuário ao ar livre, perto de um pequeno celeiro, onde bois eram sacrificados a Zeus, uma vez por ano, no ritual anual da Bufonia.

Capacidade do teatro Nas filas de assentos em pedra, 17 mil espetadores podiam apreciar algumas das mais famosas peças gregas.

Pártenon

Teatro de Dionísio

A grandiosa joia da Acrópole foi construída sem betão, sendo segurada por grampos de ferro.

Dedicado ao deus do drama e do vinho, era um dos mais antigos teatros gregos.

As Grandes Panateneias

483 a.C.

Mineração de metais

Atenas estabelece minas de prata, permitindo a Temístocles criar uma frota para derrotar os persas em Salamina.

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468 a.C.

Desenvolvimento do teatro

O dramaturgo Sófocles escreve peças de teatro que se tornam extremamente populares.

447 a.C.

Construir o Pártenon

Começam os trabalhos de construção do Pártenon, um templo dedicado a Atena, a deusa da sabedoria e da guerra.

O pentatlo dos jogos incluía corrida, dardo, disco e salto em comprimento.

420 a.C.

Teoria atómica

O filósofo Demócrito teoriza a hipótese da existência de átomos e diferentes tipos de matéria.

Quero Saber | 021

© Sol90; WIKI; Thinkstock; DK

O mais importante de todos os festivais atenienses eram as Grandes Panateneias. Este rival das Olimpíadas era celebrado a cada quatro anos, por toda a cidade, durante cerca de uma semana, entre julho e agosto. O festival assentava em três tipos de provas – musicais, de ginástica e equestres – e incluía corridas de hoplitas em armadura completa e pancrácio (uma mistura brutal de luta e pugilato). O evento era organizado por dez administradores, chamados atlótetas, e tanto homens como mulheres e crianças competiam nas provas, de atletas profissionais a escravos libertados. Os vencedores recebiam sobretudo valiosas ânforas, que geralmente vendiam por moedas. Os campeões ganhavam tanto dinheiro que podiam fazer carreira da sua participação nestes festivais.


MUNDO ANTIGO

Inovações e invenções

Os antigos gregos conceberam engenhosos mecanismos e sistemas ainda hoje utilizados.

Das Olimpíadas à democracia, a civilização grega teve um enorme impacto sobre o Ocidente. Os babilónios podem ter criado os primeiros mapas, mas os gregos foram pioneiros no estudo da cartografia. O filósofo Anaximandro desenhou o primeiro mapa-múndi, dividido em duas secções: Europa e Ásia. Os gregos revolucionaram ainda a geometria, com o teorema de Pitágoras e o valor refinado de pi. Antes dos gregos, civilizações antigas atribuíam as doenças à fúria dos deuses. Embora os gregos ainda acreditassem no castigo divino, médicos como Hipócrates observavam doentes com problemas clínicos e registavam sinais e sintomas, ajudando a impulsionar a cirurgia, anatomia e saúde pública. Também se assinalaram progressos no conhecimento do mundo natural, sendo as diferenças entre plantas documentadas pela primeira vez. O pensamento grego resultou ainda em invenções como a fivela, as âncoras de metal e a grua. A construção de cidades-estado como Atenas seguia um traçado. Topógrafos projetavam ruas e praças com espaço suficiente para teatros, mercados e templos. Estes foram dos primeiros

casos registados de planeamento urbano, munindo as cidades de espaço e instalações. Múltiplas áreas urbanas baseavam-se no Plano Hipodâmico: uma cidade em grelha retangular – útil no que toca à orientação e à organização das ruas para fins económicos e defensivos. Hoje, a mais óbvia relíquia da Grécia Antiga é, talvez, a sua arquitetura. Colunas jónicas e dóricas ainda hoje são utilizadas em diversos edifícios neoclássicos de todo o mundo, como o Capitólio dos EUA e o Arco do Triunfo. Mesmo após a queda da Grécia Antiga, o seu legado perdurou. O Império Romano foi inspirado na mitologia grega e erigido sobre inúmeros conceitos gregos de geometria, astronomia e cultura.

Uma manivela faz rodar uma câmara em espiral, que recolhe e puxa a água ou cereais para cima.

Inventos que ainda hoje utilizamos, do duche ao despertador.

Despertador

Hodómetro

Este instrumento mecânico media distâncias e foi usado pelos romanos na construção de estradas.

Moinho de água

Formato especial

Uma hélice gira dentro de um cilindro de madeira oco e a rotação cria uma força ascensional.

Academia de Platão

022 | Quero Saber

Usos modernos

Hoje, o sistema é usado em estações de tratamento de águas para bombear esgotos e para recuperar terra abaixo do nível do mar.

Duche

~ 359 a.C.

Invenção da catapulta

Arquimedes concebeu o parafuso para ajudar na irrigação e a remover água de navios gregos.

Com um plano de inclinação de cerca de 45º, é bem mais fácil usar o parafuso do que baldes.

Sem derramar

Os gregos foram os primeiros a utilizar um sistema de água canalizada para tomarem duche.

Platão inaugura o primeiro centro de estudos superiores do Ocidente, dedicado ao ensino de matemática e ciências.

Aplicações

Inclinação

Moía grãos para produzir arroz, farinha, lentilhas e cereais, importantes para alimentar a população.

380 a.C.

A física do parafuso de Arquimedes, uma engenhosa invenção grega para elevar água ou cereais.

Girar a câmara

Outras invenções gregas

Usava um mostrador para indicar as horas e ressoava com a queda de seixos sobre tambores.

O parafuso de Arquimedes

Uma máquina de cerco lançadora de pedras é inventada no século IV a.C. e torna-se uma arma comum em conflitos de grande escala.

O formato contínuo do parafuso retém a água, não permitindo que esta escorra para baixo.

336 a.C.

Alexandre, o Grande

O rei macedónio Alexandre Magno divulga a língua e a cultura gregas pela Ásia, através da expansão de um império formidável.

335 a.C.

Liceu de Aristóteles

PERÍODO O HELEN ÍSTIC

O tutor de Alexandre funda uma escola para rivalizar com a de Platão, onde se ensina física e biologia.

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SABIA QUE... As primeiras Olimpíadas, em 776 a.C., tiveram uma única prova, a dos 200 metros, ganha pelo padeiro Coroebus?

Génios gregos

Conheça alguns dos mais proeminentes pensadores de toda a Grécia Antiga.

O legado da Grécia Antiga hoje, no século XXI.

SÓCRATES

ES HIPÓCRAT

Sócrates foi um famoso filósofo, cujos ensinamentos se focavam em responder a questões, estimular o debate e formar ideias através da conversação. O método socrático ainda hoje é usado por educadores para encorajar o pensamento crítico.

Hipócrates foi um dos primeiros a observar o efeito de doenças sobre o corpo. Separou medicina de religião e, ao registar o que via – quer fosse um rosto pálido ou pele seca –, ajudou a desenvolver métodos para prevenir e curar doenças.

Olimpíadas Dedicadas a Zeus, as primeiras Olimpíadas decorreram em 776 a.C.

Juramento de Hipócrates LES ARISTÓTE

Este juramento sagrado foi redigido por Hipócrates e promete que um médico fará tudo o que puder para ajudar um doente.

O chamado “pai da lógica” redigiu mais de 150 obras e versava sobre filosofia e biologia como nenhum outro. Segundo ele, a existência assentava na conquista da felicidade pessoal.

JÚRI O sistema judicial e o conceito de julgamento foram desenvolvidos em Atenas.

S PITÁGORA O “pai dos números”, Pitágoras é famoso pelo seu teorema epónimo para calcular o comprimento do terceiro lado de um triângulo. Muitas obras foram publicadas em seu nome pelos seus fiéis seguidores.

Um notável matemático, Euclides escreveu 13 livros conhecidos como Os Elementos, que coligiam 300 anos de ideias geométricas. Euclides tornou estes conceitos antigos acessíveis a muitos e tornou-se incrivelmente influente no ensino.

Os gregos foram os primeiros a questionar o mundo continuamente e a criar novos métodos de reflexão científica.

Teatro Dramas, comédias e tragédias eram representadas diante de plateias.

TEORIA DA TERRA ESFÉRICA Pitágoras foi o primeiro a propor que a Terra seria uma esfera, depois de ter observado a Lua redonda.

PLATÃO O professor de Aristóteles foi pupilo de Sócrates e divulgou os ensinamentos do seu mentor. Dá nome à ideia de amor platónico e fundou o primeiro instituto superior do Ocidente.

Democracia Cidadãos de sexo masculino tinham direitos políticos iguais e liberdade de expressão.

Língua O sistema de escrita grego inspirou o alfabeto latino e ainda hoje é utilizado.

“A construção de cidades-estado seguia um traçado.”

~ 300 a.C.

~ 250 a.C.

Avanços matemáticos

Parafuso

O matemático Euclides escreve Os Elementos, uma influente coletânea de 13 manuais de geometria, que incluíam uma demonstração do Teorema de Pitágoras.

Filosofia

O grande polímato grego concebe o Parafuso de Arquimedes, uma das suas muitas invenções.

238 a.C.

Teatro de Siracusa

Um popular teatro grego é significativamente ampliado, tornando-se um dos maiores do mundo antigo.

146 a.C.

Grécia romana

Os romanos invadem a Grécia. Dado o fascínio pela arquitetura grega, cidades tornam-se atrações turísticas e trajes são copiados.

Quero Saber | 023

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EUCLIDES

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O que os gregos nos deixaram


MUNDO ANTIGO

A VIDA DEPOIS DA MORTE NO ANTIGO EGITO Explore os rituais, deuses e demรณnios do mundo dos mortos.

024 | Quero Saber

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SABIA QUE... Durante quase 4.000 anos, a Grande Pirâmide de Giza foi a estrutura criada pelo homem mais alta da Terra?

“ Os egípcios ricos passavam anos a construir túmulos mais elaborados do que as suas próprias casas.” WWW.QUEROSABER.COM.PT

Pirâmides e túmulo Nos primórdios do Reino do Antigo Egito, os faraós e outros membros ricos da sociedade eram enterrados em mastabas. Estes troncos de pirâmides quadrangulares, em pedra ou tijolo, ajudavam a proteger o túmulo de ladrões e animais necrófagos. Mas durante a III Dinastia, um arquiteto chamado Imhotep lembrou-se de empilhar várias mastabas umas por

cima das outras, criando uma estrutura muito mais alta, composta por vários “degraus”. Funcionava como uma escadaria gigantesca, permitindo a ascensão do falecido aos céus. A primeira foi chamada Pirâmide de Djoser e foi erguida por volta de 2.680 a.C.. Ao longo das centenas de anos seguintes, as pirâmides tornaram-se a norma para os enterros faraónicos e os lados tornaram-se lisos,

em vez de escalonados. Reis e rainhas competiam para construir os monumentos mais altos e grandiosos, mas o custo era elevado. Eram precisas enormes quantidades de pedra, já para não falar da mão de obra. As pirâmides eram também alvos fáceis para os ladrões de túmulos. Pela VII Dinastia, era muito mais comum os faraós serem sepultados em tumbas bem enterradas na rocha.

A primeira pirâmide do Egito, construída por ordem do faraó Djoser (Neterket), tem 60 metros de altura.

Néftis Mãe de Anúbis, Néftis protegia os mortos, bem como o faraó reinante.

Livro dos Mortos Com tantos demónios, monstros e guardiões para enfrentar no mundo dos mortos, uma fórmula mágica ou duas eram sempre bem-vindas. O Livro dos Mortos era um texto funerário usado desde o ínicio do Novo Reino (cerca de 1.550 a.C.), que continha fórmulas mágicas para ajudar os falecidos na sua viagem para a vida após a morte. Apenas os ricos detinham uma cópia, que era fornecida

por encomenda, e escrita e ilustrada por inúmeros escribas. O livro era depois colocado no túmulo e algumas passagens eram inscritas nas paredes, sarcófago e amuletos que eram sepultados com a múmia. Cada fórmula tinha a sua finalidade. Algumas ajudavam o defunto a identificar diferentes deuses, outras protegiam-no de forças malignas ou davam-lhe controlo sobre o mundo ao seu redor.

© Thinkstock; WIKI

P

oucas culturas invocam tanta intriga e curiosidade como a dos antigos egípcios. A civilização que se ergueu ao longo das margens do Nilo por volta de 3.000 a.C. estava entre as mais poderosas da Terra. Embora a maior parte do Egito fosse terra deserta inabitável, o rio era uma fonte de vida que nutria o solo e regava as culturas. Fez nascer uma sociedade de agricultores, médicos, construtores e soldados, cujas realizações e invenções eram maiores do que quaisquer outras jamais vistas. Criaram um dos primeiros sistemas de escrita, foram pioneiros na prática da ciência e a sua arte inspirou os mestres do Renascimento. Mas as concretizações pelas quais os antigos egípcios são melhor lembrados são as altaneiras pirâmides e os complexos rituais da mumificação. A morte era uma indústria – e uma indústria próspera. A religião era o pilar sobre o qual esta sociedade foi construída e guiava todos os aspetos da vida. Os egípcios acreditavam em múltiplos deuses, cada um com o seu papel – de Sekhmet, deusa da guerra, a Hapi, deus do Nilo, responsável pelas cheias anuais. Mas talvez o elemento mais importante da religião do Antigo Egito fosse a crença na vida após a morte. Quando alguém morria, cria-se que a sua alma continuava a viver, mas apenas se percorresse com êxito o mundo dos mortos. Primeiro, teria de combater demónios e guardiões, antes de chegar à Sala do Julgamento, onde teria de se mostrar digno da paz eterna. Os que passavam o teste prosseguiam para o Campo dos Juncos – um reflexo paradisíaco da vida na Terra. Os que chumbavam viveriam para sempre no desassossego, retidos num purgatório pior do que a própria morte. Por causa destas crenças, os antigos egípcios passavam a vida inteira a preparar-se para esta viagem pelo mundo dos mortos – o que implicava não só evitar ao máximo o pecado, como garantir que o seu ser físico teria um local de repouso e que seria acompanhado por tudo aquilo de que o espírito precisasse para prosperar no Além. Os egípcios ricos passavam anos a construir túmulos amiúde mais elaborados do que as suas próprias casas e a enchê-los com tesouros inestimáveis. No Antigo Egito, a morte era uma grande aventura.

Fórmula 17 do Livro dos Mortos, que ajuda o falecido a reconhecer o deus Atum.

Quero Saber | 025


MUNDO ANTIGO

Criar uma múmia O processo de embalsamamento era moroso e complexo, mas os antigos egípcos acreditavam que era necessário para a alma sobreviver. A chave para a vida eterna não era apenas a preservação da alma. Os antigos egípcios acreditavam que o espírito tinha de regressar periodicamente ao corpo para sobreviver, pelo que também este tinha de ser mantido intacto. Criam igualmente que o defunto devia assemelhar-se o mais possível ao ser vivo que fora, para que a alma reconhecesse a sua morada física. Inicialmente, faziam-no enterrando os mortos no deserto, onde a areia quente desidratava os corpos e atrasava a decomposição. Com o passar do tempo, desenvolveram um método artificial de preservação que conservaria os restos mortais por milénios – a mumificação. As primeiras múmias remontam a 2.600 a.C., mas só por volta de 1.550 a.C. foi desenvolvido o método de mumificação mais eficaz e bem conhecido. Envolvia a remoção dos órgãos internos do defunto e a desidratação do corpo, que era depois totalmente envolvido com ligaduras de linho. O processo demorava cerca de 70 dias e era extremamente dispendioso, pelo que apenas os muito ricos podiam suportá-lo. As famílias mais pobres usavam outro método de embalsamação, que implicava liquidificar os órgãos com óleo de cedro e drená-los através do reto, antes de colocar o corpo numa substância salina chamada natrão, que ajudaria a secá-lo. Devido ao clima, o embalsamamento era executado assim que possível. O corpo era primeiro levado para um ibu, ou “local de purificação” – por norma, uma tenda perto do Nilo. Aí, era “purificado” com água e vinho de palma, que representava o renascimento do defunto e ajudava a que mantivesse um cheiro doce por mais tempo. O corpo era então levado para o per nefer, outra tenda onde tinha lugar o embalsamamento. Apenas os sacerdotes podiam executar tal procedimento. O sumo sacerdote, o hery seshta, representava Anúbis, deus dos mortos e da embalsamação, e usava amiúde uma máscara de chacal para mostrar a sua importância. O hery seshta era responsável por envolver o corpo com as ligaduras de linho e praticar os ritos religiosos – um elemento do processo de embalsamamento tão vital como a preservação física do corpo. Graças ao engenho dos antigos egípcios, podemos hoje olhar os rostos de homens, mulheres e crianças quase como eram há 3.000 anos.

026 | Quero Saber

Guia para principiantes Os passos básicos para criar uma múmia que durasse para toda a eternidade.

Purificação

Antes de se poder dar início à embalsamação, o corpo era purificado com água do Nilo e vinho de palma.

Passo 1 Lavagem do corpo Lavar o corpo simbolizava o renascimento, já que o defunto passava para a vida seguinte.

Remoção dos órgãos Era efetuada uma incisão no lado esquerdo do corpo, e os pulmões, fígado, intestinos e estômago eram removidos.

Eliminação do cérebro

O cérebro, que não era considerado importante, era retirado com um gancho, pelo nariz, e descartado.

Passo 2 Os gatos eram venerados pelos antigos egípcios, pelo que eram igualmente mumificados quando morriam.

Preservar o coração

O coração era deixado no corpo, já que se acreditava que era o centro da inteligência, e necessário no Além.

Anúbis

O deus chacal era o guardião dos cemitérios e protetor da embalsamação.

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SABIA QUE... Várias múmias de animais provaram ser imitações ocas, vendidas por embalsamadores por bom dinheiro?

Passo 5 Ligaduras

Ligaduras de linho eram usadas para envolver todo o corpo, usando-se resina líquida como cola.

Óleos

A pele era toda untada com óleos para que mantivesse a elasticidade.

Maat

Enquanto deusa da verdade e da justiça, o papel de Maat era determinar se as almas eram dignas da vida após a morte.

Passo 4

Orações

Um sacerdote dizia orações e fórmulas mágicas sobre o defunto para ajudar a afastar os maus espíritos.

Enchimento

Armazenagem

O corpo era lavado e o natrão removido. Depois, era enchido com serradura, especiarias e linho.

Os órgãos removidos eram lavados e envolvidos em natrão antes de serem colocados em vasos canópicos.

© Thinkstock; WIKI; Ilustração por Nicholas Forder

Passo 3

Deixar a secar Salgar o interior

O corpo era enchido com natrão – um tipo de sal –, que absorvia qualquer humidade remanescente.

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De seguida, o corpo era totalmente coberto com natrão e deixado a secar durante 40 dias. Esta múmia, exposta no Louvre, pertence a um homem que viveu no período ptolomaico (305-30 a.C.).


MUNDO ANTIGO

Funeral e enterro

Osíris

Osíris, representado como um faraó mumificado, era o deus do Além.

Os egípcios deixavam este mundo com todos os confortos do lar. Muito antes da sua morte, os egípcios abastados construíam os seus túmulos e enchiam-nos com tudo aquilo de que poderiam necessitar no Além. Com mesas e cadeiras, carruagens, joias e até animais de estimação mumificados, podiam garantir que o seu espírito não precisaria de mais nada. A alimentação era tão importante na vida após a morte como na terrena, pelo que quantidades copiosas de vinho, fruta e cereais eram também enterradas com o defunto. Até carne era incluída, amiúde salgada ou mesmo mumificada para evitar que apodrecesse. Na pior das hipóteses, pintavam alimentos nas paredes – os antigos egípcios acreditavam que, no reino dos mortos, as pinturas eram tão comestíveis como os produtos físicos.

Também colocados nas tumbas eram os shabtis, pequenas figuras amiúde em barro, pedra ou madeira, que atuariam como criados no Além. Alguns defuntos eram enterrados com apenas um ou dois, enquanto outros, como o faraó Taharka, eram sepultados com mais de um milhar. Os egípcios mais pobres tinham túmulos menos elaborados e os que estavam no fundo da pirâmide social eram simplesmente enrolados em tecido e enterrados no deserto com objetos do dia a dia como potes e talvez algum tipo de arma. Todos, porém, ricos ou pobres, tinham direito a uma cerimónia, tida como necessária para que o espírito passasse para o mundo dos mortos. Os mais ricos tinham um funeral sofisticado,

Um funeral digno de um faraó

Máscara funerária

Estas despedidas elaboradas preparavam o corpo para as terras dos vivos e dos mortos.

Uma “caixa cartonada” pintada era fixada à múmia e depois colocada num suhet (ataúde antropomófico).

No túmulo, um sacerdote realizava a cerimónia da Abertura da Boca, para que o defunto pudesse respirar e falar no Além.

Uma máscara funerária similar ao rosto do defunto garante que o espírito conseguirá reconhecer o corpo.

Cortejo fúnebre

Ataúde

Abertura da Boca

em que o corpo do defunto era transportado para o sepulcro acompanhado por um cortejo de carpideiras e dançarinas. Duas mulheres em particular tinham a função de carpir de forma manifesta. Segundo a religião do Antigo Egito, quanto maior a exibição de pesar, melhor se saíria a alma na Sala do Julgamento. Já no túmulo, um sacerdote realizava a “Abertura da Boca”: a múmia era colocada de pé e uma lâmina cerimonial era pressionada contra a boca, para permitir que respirasse, falasse e comesse no Além. A ação era repetida nos olhos e membros, para que o espírito pudesse ver e mover-se. O ataúde era colocado num sarcófago, as oferendas depositadas, as orações ditas e o túmulo selado.

Sarcófago

Um cortejo fúnebre transporta o ataúde e os bens a enterrar para o túmulo. As carpideiras são pagas para chorar o defunto bem alto durante o percurso.

O ataúde era colocado num sarcófago – uma caixa de alabastro concebida para fornecer proteção extra.

O punhal de meteorito de Tutankhamon Em junho de 2016, uma equipa de investigadores anunciou que um punhal encontrado no túmulo de Tutankhamon por Howard Carter parecia ter sido produzido com ferro proveniente de um meteorito. A lâmina intrigava os arqueólogos

028 | Quero Saber

há décadas, já que os objetos em ferro eram raros no Antigo Egito e o metal não enferrujara. Foi usado um espetrómetro de fluorescência de raios X para descobrir a composição química. O alto conteúdo de níquel e a presença

de cobalto “sugerem vivamente uma origem extraterrestre” e níveis similares foram na realidade encontrados num meteorito que caiu 240 km a oeste de Alexandria, antes ou durante a época de Tutankhamon.

Selados com magia

O sarcófago e o túmulo eram selados e o sacerdote proferia uma fórmula mágica para protegê-los, conhecida como “a maldição dos faraós”.

Crê-se que a lâmina de ferro (à direita) foi criada com material de um meteorito.

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SABIA QUE... O túmulo de Tutankhamon continha as múmias das suas filhas gémeas nadas-mortas?

Anúbis

O deus da embalsamação assistia à cerimónia e guiava as almas bem-sucedidas até ao Além.

Balança equilibrada Se o coração se equilibrasse na balança face à pena, a alma do defunto podia prosseguir para o Além.

Osíris

A cerimónia tinha lugar perante Osíris, deus dos mortos e da vida após a morte, e um tribunal de 42 divindades.

Coração

A pena da verdade

Se o coração acusasse o peso da prática do mal, era devorado por Ammut, demónio feminino parte crocodilo.

O peso do coração era comparado com o da pena da deusa Maat, que representava a verdade e a justiça.

Viagem para o Além Assegurar um lugar nos céus era mais fácil de dizer do que de fazer.

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colocadas, para que passasse esta fase do teste mesmo sem estar totalmente inocente. A seguir, o espírito podia prosseguir para a pesagem do coração. Esta cerimónia era supervisionada por Osíris, o deus principal do mundo dos mortos. Os egípcios criam que o coração continha o registo de todas as ações do defunto em vida, pelo que o seu peso era comparado com o da pena da deusa Maat, para determinar quão virtuoso tinha sido. Se a Ísis Juntamente balança ficasse equilibrada, o com a sua irmã espírito era acolhido no Além Néftis, protegia por Osíris. Se o coração pesasse os mortos e era a deusa das mais do que a pena, era atirado crianças. ao demónio Ammut e a alma era condenada à escuridão e a uma eternidade de desassossego. É claro que os defuntos podiam sempre confiar no seu fiel livro para ajudá-los. Uma simples recitação da fórmula 30B podia ajudar a impedir que o coração denunciasse um passado suspeito. Os que tinham a sorte de garantir um lugar no Além experimentariam a magnificência do Campo dos Juncos. Os mortos tinham direito a uma talhão de terra para cultivar, ajudados pelos shabtis com que foram enterrados, e podiam aspirar a um futuro de paz eterna.

Os egípcios eram enterrados com todos os seus bens terrenos, incluindo camas e carruagens!

No mundo dos mortos, o espírito tinha de combater serpentes gigantes e outros monstros.

Quero Saber | 029

© Alamy; WIKI; Thinkstock

Nenhuma quantia de dinheiro gasta em túmulos ou tempo despendido a memorizar fórmulas mágicas podiam garantir a um antigo egípcio um lugar no Além. Primeiro, a alma tinha de consquistar os obstáculos e demónios do mundo dos mortos e depois enfrentar o juízo dos deuses na cerimónia da pesagem do coração. Apenas as almas mais meritórias podiam prosseguir para o Campo dos Juncos, onde viveriam uma existência de prazer para toda a eternidade. Os antigos egípcios acreditavam que, quando uma pessoa era enterrada, o espírito separava-se do corpo e descia ao mundo dos mortos (Duat). Aí, tinha de ultrapassar 12 “portões”, cada um guardado por uma divindade diferente, que o espírito tinha de reconhecer e nomear. Pode parecer fácil, mas também havia monstros, demónios e lagos de fogo para enfrentar. O Livro dos Mortos fornecia uma lista de fórmulas mágicas para ajudar o espírito a ultrapassar estes obstáculos. Se tivesse êxito, a alma chegava à Sala do Julgamento, onde tinha de provar o seu valor frente a 42 divindades. O Livro dos Mortos ajudava também o espírito a responder acertadamente às perguntas


MUNDO ANTIGO

O Exército de Terracota

O mausoléu

O túmulo do primeiro imperador jaz sob uma enorme elevação de terreno, a cerca de 1,5 km das covas do Exército de Terracota.

Conheça os antigos guerreiros da China para a vida após a morte.

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Zhengzhuang Mu

Mu

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Túmulos de artesãos

Zhaobeihu

Cova 3

Covas estáveis

Shangjiaocun

Cova 3

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50

Esta cova em forma de U é a mais pequena, contendo menos de cem soldados, quatro cavalos e um carro triunfal.

Sítio de Yuchi Aves de bronze e músicos de terracota

Estr ada

Elevação tumular

N

época, o imperador estava obcecado com a vida após a morte. Cria que o outro mundo espelhava este, pelo que encomendou um exército de guerreiros de barro em tamanho real para ajudá-lo a manter o seu domínio. As covas foram escavadas e bases de barro para cada figura produzidas. Todas as partes dos corpos foram criadas separadamente e cozidas num forno antes de serem reunidas, num dos primeiros exemplos de utilização da linha de montagem. Uma vez terminado, cada guerreiro era de novo cozido a 1.000 ºC para endurecer a estrutura final.

0

oitava maravilha do Mundo Antigo foi encontrada por acaso. Em 1974, em Xi’an, China, um grupo de agricultores cavava quando descobriu uma cavidade com milhares de guerreiros em tamanho real. O Exército de Terracota faz parte de um enorme mausoléu, erigido para escoltar o primeiro imperador da China no além. Há mais de dois mil anos, Qin Shi Huang tinha unido os sete estados em conflito na nação única da China, que recebeu o nome do seu reino. A paz resultante significava que o seu vasto exército já não tinha serventia, pelo que o encarregou de construir o seu elaborado túmulo. Tal como toda a sociedade chinesa da

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Cova 2

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Covas dos guerreiros Cova 1 de terracota

Cova 2

Com cerca de 80 carros triunfais e uma seleção de armamento, contém ainda 160 arqueiros ajoelhados.

Os guerreiros pintados Milhares de soldados de barro guardam o túmulo do primeiro imperador desde o século III a.C..

Formar um exército

Cova 1

Com mais de seis mil estátuas em formação de combate e um dos generais do exército, é a maior das três covas.

1 Recolher o barro Com a cova escavada, o barro era recolhido localmente e inserido em bases às quais os soldados seriam fixados.

2 Criar os elementos

Os braços, mãos, tronco, pernas e cabeça do soldado eram criados com recurso a vários moldes.

030 | Quero Saber

3 Montagem e escultura

As diferentes secções eram cozidas e combinadas para formar o soldado de barro. Depois, eram adicionados os traços faciais individuais.

4 Cozer o barro

Após a montagem, o soldado era de novo cozido, para endurecer o barro.

5 Pintura

Os soldados terminados eram pintados com cores vivas, já que a sua manufatura era dispendiosa, logo, eram símbolos de luxo.

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SABIA QUE… Das 7.000 a 8.000 figuras do Exército de Terracota encontradas enterradas e partidas, só mil foram restauradas?

General

Apenas alguns generais foram encontrados, estrategicamente posicionados ao longo da cova, como estariam no campo de batalha.

Oficial

Estas figuras de oficiais são mais detalhadas do que as que representam a infantaria, apresentando armaduras complexas.

Infantaria

Embora feitos de barro, os soldados de infantaria exibem armas de bronze reais, incluindo alabardas, lanças, arcos e bestas.

Posições de combate

O exército foi disposto na formação militar típica da época, com a infantaria na frente, apoiada por unidades de lanceiros por sua vez apoiados pela cavalaria, e todos flanqueados por arqueiros.

Configuração das covas

As covas tinham vários metros de profundidade e eram cobertas com mais de seis mil vigas de madeira, com 500 kg cada.

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© Sol90

Unidade de cavalaria

Uma unidade na segunda cova é liderada por seis carros triunfais intricadamente esculpidos e contém mais de cem cavalos e cavaleiros.

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EDIFÍCIOS & LOCAIS 034 10 maravilhas

do Mundo Antigo

Veja como foram erguidas algumas das maiores criações humanas da história.

040 Cidades perdidas Explore as povoações esquecidas que desapareceram por centenas de anos.

044 A vida num castelo japonês medieval Em paz ou em guerra, a vida da população protegida pelo castelo era difícil.

046 Monumento

a Washington

No interior do icónico obelisco de mármore da capital norte-americana.

047 Moinhos de vento

Como estas construções aproveitam a energia eólica.

048 O Castelo

de Edimburgo

A história de uma das fortalezas mais icónicas da Escócia.

050 O Palácio

de Versalhes

A construção de uma habitação grandiosa digna do “Rei Sol”.

052 A Catedral de Milão Visite esta espetacular obra-prima gótica italiana.

054 O teto

da Capela Sistina

As ferramentas e técnicas por detrás deste majestoso trabalho renascentista.

056 Massachusetts State House

O edifício mais icónico de Boston tem simbolismo a condizer com o seu fausto.

058 A Ponte de Brooklin Descubra um dos monumentos mais conhecidos de Nova Iorque.

060 O que correu mal em Chernobyl?

Saiba como uma reação fora de controlo levou ao pior acidente nuclear de sempre.

058 AdePonte Brooklin

0032 032 | Quero Saber


Dez maravilhas do Mundo Antigo

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O teto da Capela Sistina

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Cidades perdidas

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A Catedral de Milão

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© Thinkstock; Shutterstock

No interior de um castelo japonês

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EDIFÍCIOS & LOCAIS

10 MARAVILHAS DO MUNDO ANTIGO Faça um passeio por algumas das maiores criações humanas da história e descubra como foram erguidas.

As Pirâmides e a Esfinge de Giza

As pirâmides foram es construídas por milhar alizados de operários especi ade que viviam numa cid próxima.

O mistério do monumental feito de engenharia do Antigo Egito.

Construídas entre 2589 e 2504 a.C., as três pirâmides de Giza serviram de túmulos extravagantes para antigos faraós egípcios, suficientemente grandes para alojar tudo o que precisariam no Além. A maior, erigida para o faraó Quéops, é composta por 6,5 milhões de toneladas de pedra – alguns blocos pesam nove toneladas cada.

034 | Quero Saber

Porém, ninguém sabe ao certo como foram lá colocados. Uma teoria diz que foi usado um sistema de trenós, rolos e alavancas para arrastar os blocos por uma rampa, que crescia em altura à medida que a construção avançava. A Esfinge, próxima das pirâmides, foi esculpida do substrato rochoso calcário do planalto de Giza.

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SABIA QUE... A Grande Pirâmide de Giza esteve outrora revestida por calcário branco brilhante?

A Grande Muralha da China Mão de obra incrível e materiais originais ajudaram a erguer esta longa muralha. Embora as primeiras secções das muralhas fronteiriças tenham sido construídas no século VIII a.C., só em 220 a.C. o imperador Qin ordenou que fossem unidas como barreira protetora. Destacou 300.000 soldados e muitos mais camponeses e prisioneiros para a construção da muralha, com pedra, solo, madeira e até arroz glutinoso para ajudar a segurar os diferentes blocos. Os materiais foram transportados para o local manualmente ou com carrinhos de mão, cordas e animais.

O Farol de Alexandria

A conceção e destruição do primeiro e mais famoso farol do mundo. Perante a necessidade de um método para guiar navios mercantes até ao movimentado porto de Alexandria, o rei egípcio Ptolomeu I Sóter ordenou a construção de um farol, por volta de 280 a.C.. Projetado pelo arquiteto grego Sóstrato de Cnido, tinha três níveis, construídos em pedra de cor clara e reforçados com chumbo fundido. O nível inferior suportava uma estrutura com oito lados, no topo da qual assentava uma secção cilíndrica que continha um espelho curvo, que refletia a luz de uma fogueira, criando um feixe. Crê-se que o farol tinha 135 metros de altura, mas foi reduzido a escombros por dois sismos no século XIV.

O farol precisou de 12 anos e uma quantidade considerável de trabalho escravo para ser construído.

Jardins Suspensos da Babilónia Um altaneiro oásis verde com um nome algo enganador.

21.196,18 km Comprimento da Grande Muralha

Equivalente a cinco vezes a largura dos EUA.

100

milhões de ton.

14

de tijolo, pedra e lama foram usadas na construção.

metros

A secção mais alta equivale à altura de três autocarros.

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“Há descrições vívidas dos jardins mas não foram encontrados vestígios.”

Nínive ficou mais tarde conhecida como Nova Babilónia, o que pode explicar a confusão sobre a localização exata dos jardins.

Quero Saber | 035

© Thinkstock; Alamy

Cerca de 400.000 operários morreram durante a construção da Grande Muralha.

De acordo com fontes antigas, o rei babilónio Nabucodonosor II mandou construir um luxuriante jardim suspenso para a esposa, em 600 a.C., porque Amitis tinha saudades da bela vegetação da sua nativa Média. Mas embora existam descrições vívidas dos jardins, não foram encontrados vestígios físicos, pelo que muitos creem que nunca existiram. Pesquisas mais recentes sugerem que os jardins podiam não estar sequer na Babilónia e teriam sido mandados construir um século antes, na cidade de Nínive, pelo rei Senaqueribe. Crê-se que foram plantados numa série de “terraços” e que um parafuso de Arquimedes foi usado para irrigá-los com 300 toneladas de água por dia.


EDIFÍCIOS & LOCAIS

O Coliseu de Roma

Inventos e planos engenhosos tornaram possível o maior anfiteatro do mundo. Em 80 a.C., ao fim de menos de dez anos de construção, o enorme recinto de entretenimento de Roma estava concluído. Um feito de engenharia inovador, o Anfiteatro Flaviano seria o palco de sangrentas batalhas entre gladiadores, reconstituições e execuções durante quatro séculos. O projeto

com quatro níveis de múltiplos arcos abobadados garantia suporte abundante sem juntar peso excessivo e podia ser construído por mais de 100.000 escravos em secções simples normalizadas. O recém-inventado betão adicionava robustez, permitindo sentar mais de 50.000 em simultâneo.

Toldos

Postes de madeira suportavam toldos que protegiam o público do sol.

Lugares sentados Os assentos “por camadas” e a disposição elíptica garantiam que toda a gente tinha uma boa visão da arena.

Controlo de multidões Quase 80 entradas arqueadas separadas permitiam à multidão entrar e sair com facilidade.

Substrutura

Animais, gladiadores e cenários eram içados para a arena a partir da substrutura.

Petra

Arrozais de Banaue

Uma “cidade rosa” única esculpida da rocha do deserto jordano. Meia construída e meia esculpida a partir do arenito rosa que inspira o seu epíteto colorido, Petra foi fundada como capital da Nabateia, em 400 a.C.. Enquanto centro mercantil concorrido, chegou a ter cerca de 20.000 habitantes, mas o acesso à água era difícil no meio do deserto. Os nabateus resolveram o problema construindo um elaborado sistema de gestão da água, com cisternas, reservatórios e diques que conservavam as chuvas sazonais. Esculpiam edifícios diretamente nas falésias, escavando degraus na rocha circundante para terem plataformas seguras onde trabalhar, e alinhavam monumentos importantes com o nascer do sol no solstício de inverno.

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Com 43 m de altura, a fachada do templo de Al Khazneh (“O Tesouro”) escondia o túmulo de um rei.

Uma escadaria de campos de arroz erguida à mão. Há mais de 2000 anos, o povo indígena de Ifugao, nas Filipinas, inventou um método engenhoso para cultivar em terreno íngreme. Sem ferramentas, esculpiram uma série de socalcos na encosta da montanha, delimitados por muros de lama e pedra. Trouxeram então água das florestas no topo da montanha, inundando os campos para que o arroz pudesse crescer. Este método de cultivo e sustentação dos socalcos foi entretanto passado através das gerações e ainda é praticado na atualidade. Os socalcos de arroz situam-se nas Cordilheiras das Filipinas.

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SABIA QUE... Se fossem dispostos em fila, os socalcos de Banaue dariam meia volta à Terra?

Machu Picchu

Machu Picchu inclui palácios, praças, templos, casas e um sistema de irrigação.

A engenharia extraordinária da célebre cidade perdida dos Incas.

Machu Picchu, que significa “velha montanha” na língua indígena quíchua, fica 2430 metros acima do nível do mar, nos Andes peruanos. Redescoberta recentemente, em 1911, a cidade foi erguida pelos Incas no século XV e abandonada um século depois quando o império foi conquistado pelos espanhóis. Como os Incas não tinham escrita, não existem registos sobre o objetivo do local, mas muitos arqueólogos creem que era uma propriedade real usada pelos líderes. Nas encostas íngremes, os 200 edifícios foram construídos usando uma técnica de pedra seca sem argamassa. Blocos de granito foram cortados com precisão e cuidadosamente encaixados como um puzzle, deixando fendas tão pequenas que nem uma lâmina conseguia penetrá-las.

“Machu Picchu fica 2430 metros acima do nível do mar, nos Andes peruanos.”

As estátuas da ilha da Páscoa As cabeças de pedra gigantes que exigiram muito trabalho pesado.

No meio do oceano Pacífico, quase 900 estátuas enormes chamadas Moai podem ser vistas ao redor da ilha chilena de Rapa Nui, o nome original dado à ilha da Páscoa pelos colonos polinésios. Foram erigidas pelos polinésios algures entre os séculos XII e XVII e acredita-se

que representam os antepassados mortos destes povos. Apesar de serem esculpidas numa rocha leve e porosa chamada tufo vulcânico, formada por cinza vulcânica compactada, cada uma pesa várias toneladas e não se sabe ao certo como foram ali colocadas.

© Thinkstock

As Moai surgem em muitos estágios diferentes de conclusão.

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Quero Saber | 037


EDIFÍCIOS & LOCAIS

Stonehenge

O monumento completo

Um monumento pré-histórico que nos ajuda a desvendar os segredos do passado. Em Wiltshire, Inglaterra, ergue-se uma das criações humanas mais icónicas e antigas do mundo. Construído ao longo de milhares de anos, Stonehenge é o único círculo de menires sobrevivente do seu género e tornou-se um sítio de imensa importância arqueológica. Embora tenha revelado muito sobre determinadas práticas do passado, a estrutura megalítica permanece envolta em mistério, sobretudo porque ainda não sabemos ao certo para que foi construída. A teoria mais popular sugere que era um templo pré-histórico, já que as pedras estão precisamente alinhadas com os movimentos do Sol através do céu, o que tem um significado religioso especial. O que sabemos é que a construção teve início em 3100 a.C., quando um grande fosso circular foi escavado com ferramentas feitas de chifres de veado. Por volta dessa época, o local era usado para enterros; de facto, é o maior cemitério do Neolítico final no Reino Unido. Em 2500 a.C., as pedras foram erguidas, esculpidas e alisadas com percutores de pedra de Sarsen e sílex; uns séculos depois, foram reposicionadas na localização final. Ao longo dos anos, muitas tombaram ou foram removidas, deixando Stonehenge no seu estado atual.

“Pedra azul”

As pedras mais pequenas viajaram mais de 250 km por rio, das colinas de Preseli, no sudoeste do País de Gales, e ganham um tom azul quando estão molhadas.

Descubra qual poderia ser o aspeto de Stonehenge em 2200 a.C..

“Super-henge” Em 2015, cientistas encontraram o que pensavam ser outro monumento de pedra, cinco vezes maior do que Stonehenge, soterrado a menos de três quilómetros do icónico círculo. Batizado como “super-henge”, foi detetado com radares de penetração do solo e acreditava-se que tinha mais de cem monólitos. Todavia, quando foi conduzida uma escavação, os arqueólogos descobriram uma série de covas profundas onde outrora se encontravam grandes postes de madeira. O sítio era originariamente habitado pelas pessoas que construíram Stonehenge e os postes foram erguidos quando partiram, talvez como memorial. Mais tarde foram removidos e as covas enchidas com cré e cobertas com terra.

Trílitos

Estes grandes “arcos” eram criados encaixando uma pedra atravessada em cima de duas pedras verticais, através de entalhes e “respigas”.

O “super-henge” tinha postes de madeira e não pedras massivas, como se cria anteriormente.

038 | Quero Saber

Pedra de Sarsen

Estes grandes blocos de arenito vieram de Marlborough Downs, a 32 km de distância, e pesam em média 25 toneladas cada.

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SABIA QUE... Em 1915, Cecil Chubb foi a um leilão comprar cadeiras mas comprou antes Stonehenge, por £ 6600?

Su

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Alinhamento

O eixo principal das pedras está alinhado com o nascer do sol do solstício de verão e o pôr do sol do solstício de inverno.

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Lunastício

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Nascer do sol no 5 solstício de inverno

Pôr do sol no solstício de verão

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“É o único círculo de menires sobrevivente do seu género.”

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A montagem de Stonehenge Como a estrutura pode ter sido erigida com ferramentas primitivas.

Transporte

As pedras foram arrastadas até ao local sobre rolos e trenós, e algumas vieram de jangada pelo rio Avon.

Posicionamento

As pedras foram colocadas em grandes buracos com os lados inclinados, e alinhadas com estacas de madeira na parte de trás.

Pedra do Altar

Exclusiva deste sítio, é constituída por arenito vermelho antigo e veio de Senni Beds, no País de Gales.

Erguer as pedras

Cordas, uma armação em A de madeira e força braçal foram usadas para endireitar as pedras; os buracos foram enchidos com cascalho.

Colocar os lintéis

Plataformas de madeira serviram para elevar os lintéis horizontais, antes de serem colocados sobre as pedras verticais.

Lintéis

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© Sol90; LBI ArchPro

As pedras horizontais em cima do anel exterior foram cuidadosamente encaixadas com juntas macho e fêmea.

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EDIFÍCIOS & LOCAIS

CIDADES PERDIDAS As povoações esquecidas que desapareceram por centenas de anos.

Q

uando um império tomba, o seu legado vai por vezes consigo, perdido nas areias do tempo. Ao longo da história, várias foram as povoações a perecer, quer sob sismos devastadores, quer à mercê de forças invasoras ou do declínio de recursos naturais. Algumas cidades antigas, como Roma e Atenas, são continuamente habitadas desde a sua fundação, mantendo-se algumas das suas estruturas icónicas, como o Coliseu e o

Pártenon, ainda de pé. Outras cidades, porém, não foram tão bem preservadas. Inúmeras civilizações antigas ficaram anos fora dos livros de história, depois de perdidas em incêndios ou soterradas por areia. Da Era dos Descobrimentos em diante, aventureiros exploraram quase todos os recantos da Terra e localizaram cidades outrora consideradas lendárias. Estes povoados expõem o mundo antigo e a tecnologia moderna ajudou-nos a

identificar a era em que atingiram o seu auge. Os vestígios de cidades antigas encontram-se espalhados pelo globo, com as suas ruínas a permitirem-nos espreitar o passado e compreender como diferentes civilizações viviam e funcionavam. Muitos destes locais estão agora protegidos, para evitar que se percam para sempre. Nunca se sabe: podem até existir mais cidades perdidas à espera de serem descobertas.

Ayutthaya, Tailândia A ilha metrópole que foi uma das cidades mais magníficas da Ásia. A cidade de Ayutthaya foi a segunda capital do Reino do Sião, tendo conquistado proeminência após a queda de Angkor, a capital do Império Khmer. Tendo atingido o seu auge entre os séculos XIV e XVIII, era conhecida pela sua arquitetura esplêndida, que incluía torres imponentes denominadas Prang e grandiosos templos budistas. Com uma população de cerca de um milhão, a cidade construiu a sua riqueza através da guerra, comércio e impostos. Concebida

040 | Quero Saber

em grelha e erigida sobre tês rios, os seus habitantes podiam deslocar-se ao longo de canais, com um sistema hidráulico a controlar o caudal das águas. Cobiçada por potências rivais, a cidade era protegida por portões, fortes e torres, resistindo também a ataques navais graças às fortes correntes do Golfo do Sião. Ainda assim, em 1767, Ayutthaya caiu às mãos dos birmaneses, após anos de cerco. Os seus templos e palácios foram incendiados e a cidade pilhada.

Situada no sudeste asiático, Ayutthaya escapou aos conflitos entre potências asiáticas, árabes e europeias.

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SABIA QUE... Em 1250 d.C., Cahokia Mounds era maior do que Londres, Inglaterra, com cerca de 20 mil habitantes?

Cahokia Mounds

Outras cidades perdidas

A capital de uma esquecida civilização nativa norte-americana.

Aterros antigos Cahokia Mounds tinha algumas das maiores elevações artificiais a norte do México.

ao certo. A maioria dos habitantes de Cahokia Mounds desapareceu no século XIV, tendo a área sido posteriormente ocupada pela cultura Oneota e pela tribo ameríndia Illiniwek. À chegada de Cristóvão Colombo ao Novo Mundo, já a cidade fazia parte do passado.

Persépolis

Protegida por uma cordilheira montanhosa, Persépolis, no atual Irão, tornar-se-ia a capital do Império Aqueménida. © Cahokia Mounds State Historic Site/ William R. Iseminger

Erguida a partir de uma amálgama de povoações menores instaladas na área em 700 d.C., em 1050 Cahokia Mounds era uma das maiores cidades da América do Norte. Situada no atual Illinois, era o centro de uma antiga cultura mississipiana, com uma abundância de milho a oferecer à população uma fonte fiável de alimento, mantida em celeiros espalhados pela cidade. Cahokia Mounds deve o seu nome, em parte, a Monks Mound, o centro da cidade e o maior montículo artificial na América do Norte. Conforme a cidade prosperava, cresciam também as suas defesas. Ao longo de cem anos, quatro paliçadas de madeira, suportadas por trincheiras profundas, foram sequencialmente construídas, para repelir ataques. Apesar destas fortes defesas, não foram ainda descobertos indícios concretos de forças invasoras, e valas comuns de vítimas de sacrifícios ritualísticos sugerem que a cidade era habitada por uma sociedade violenta nos seus primórdios. A população da cidade entrou em declínio no século XIII, possivelmente por culpa de doenças, de mudanças políticas ou climáticas, ou de um decréscimo de recursos, embora não se saiba

Vulci

Um dos centros da civilização etrusca, esta antiga cultura italiana prosperou antes do domínio da Roma Antiga.

A cidade conteve, em tempos, cerca de 120 montículos de terra, cobrindo uma área superior a 1.600 hectares.

Domicílio da elite

O chefe da civilização governava do topo de Monks Mound, que se elevava a 30 m de altura.

Aterros

Cerca de 15 milhões de m³ de terra foram deslocados para criar os montículos.

Construções de estacas e colmo Edifícios cerimoniais construídos no topo de vários dos montículos albergavam membros da elite.

Machu Picchu

É provável que este famoso povoado peruano tenha sido um local sagrado abandonado após o colapso do Império Inca.

Mohenjo-daro

Sacrifícios humanos

Valas comuns descobertas num dos montículos indicam a possível realização de sacrifícios humanos na cidade.

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Empréstimo de terras

Os montículos foram erguidos com terra escavada com utensílios de madeira e pedra, e transportada em cestos até aos locais de aterro.

Esta cidade antiga, no atual Paquistão, tinha complexos sistemas de drenagem e uma piscina estanque, sugerindo a importância da limpeza.

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© Shutterstock; WIKI/ Rjdeadly; Thinkstock; Ilustração por Adam Marckiewicz

Hattusa

Situada na atual Turquia, Hattusa foi uma cidade influente no segundo milénio a.C.. Erigida numa colina, era a capital do Império Hitita.


EDIFÍCIOS & LOCAIS

A Veneza do Novo Mundo

Tenochtitlán era o centro do Império Asteca e dispunha de uma vasta riqueza.

Palácio

Havia construções impressionantes, incluindo o palácio do imperador Montezuma, composto por múltiplos edifícios interligados e até mesmo um zoo.

Templo Mayor

O centro da cidade era um complexo murado com mais de 70 edifícios e uma enorme pirâmide dedicada ao deus da guerra, Huitzilopochtli, e ao deus da chuva, Tlaloc.

Mercado

Cerca de 60 mil visitantes diários comercializavam ouro, prata, bronze e até ossos e penas nos vibrantes mercados.

Chinampa

Uma série de jardins flutuantes no lago de Texcoco ladeavam a cidade e representavam uma fonte de alimento.

Casas de habitação

Nesta cidade com mais de 200 mil habitantes, as classes baixas viviam em pequenas casas de um piso.

Deslocações

A rede de transportes da cidade incluía ruas e canais para viajar por terra ou por água.

Tenochtitlán

A sumptuosa capital do Império Asteca assente num lago. Tenochtitlán foi o centro da cultura asteca e uma das cidades mais impressionantes da história. Fundada no século XIV, a cidade utilizava um intricado sistema de canais e passagens. Um aqueduto em pedra aproveitava a água do lago para ajudar a abastecer a população. No cerne da cidade jazia a dupla pirâmide Templo Mayor,

onde corações humanos seriam arrancados durante sacrifícios humanos conduzidos para honrar e apaziguar os deuses. Conquistadores espanhóis avistaram a cidade em 1519. Liderados por Hernán Cortés, os europeus sedentos de ouro usaram uma vasta força para capturar a cidade, massacrando a sua população.

romana escondida Timgad Asobcidade as areias do Sara.

Redescoberta em 1881, Timgad é por vezes referida como a Pompeia do norte de África.

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No século I d.C., o Império Romano estava a alargar o seu vasto domínio, expandindo-se para sul, em direção a África. Timgad era uma das muitas cidades romanas em África, situada na atual Argélia. A sua construção foi ordenada pelo imperador Trajano, num planalto junto aos Montes Aurès. A colónia militar fortificada ajudava a defender de ataques dos povos berberes locais e acolhia veteranos da Terceira Legião.

Majestosos edifícios de pedra erguiam-se pela cidade, incluindo templos, um fórum, mercados, 14 banhos públicos e um teatro com capacidade para 3.500 espetadores. Timgad depressa ultrapassou as suas muralhas, tendo o quádruplo do tamanho aquando da sua queda. A par do Império Romano ocidental, a cidade entrou em declínio no século V, sendo saqueada pelos Vândalos em 430 d.C.. O declínio foi total após uma invasão árabe no século VIII.

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SABIA QUE... Na mitologia grega, Teseu matou o Minotauro com uma espada e libertou o povo de Cnossos?

Cidades lendárias

Thonis-Heracleion

Esta cidade costeira foi outrora um próspero centro de comércio, no antigo Mediterrâneo. Em tempos considerada uma mera lenda, uma descoberta recente trouxe luz à história da cidade. Thonis-Heracleion parece ter sido um importante ponto da rota do ouro e do bronze entre o Egito e a Grécia, tendo provavelmente perecido há cerca de 1.400 anos, devido à subida do nível do mar. O local agora submerso exibe inúmeras ruínas, como estátuas colossais.

Cnossos

A gloriosa capital da Creta minoica que se perdeu em circunstâncias misteriosas. Remontando ao terceiro milénio a.C., Cnossos é uma das cidades mais antigas da Europa. Os Minoicos exerciam uma forte influência sobre o comércio ao longo do Mar Egeu e eram um povo hábil, que produzia cerâmica e utilizava a escrita hieroglífica. No centro de Cnossos erguia-se um enorme palácio, com muralhas espessas e um sistema de drenagem, construído tanto por ostentação como para

Muitos dos artefactos e tesouros de Heracleion foram encontrados 50 metros debaixo de água, no Delta do Nilo.

defesa. Na mitologia grega, o palácio era o lar do Rei Minos, que mantinha o Minotauro preso num labirinto no interior do palácio. A civilização minoica foi seriamente afetada por um desastre natural, em 1450 a.C., e, depois, pela invasão dos Micénicos. À exceção do palácio, a cidade de Cnossos perdeu-se, mas as influências da cultura minoica ainda hoje são visíveis nos primórdios da Grécia Antiga.

Atlântida

A lendária cidade-ilha seria uma sociedade utópica, antes de ficar submersa no Oceano Atlântico.

Shambhala

A teoria de um reino perdido nos Himalaias ganhou popularidade no século XVI. Crê-se que seria um local de sabedoria.

El Dorado

Mitos de uma cidade de ouro levaram aventureiros europeus a embrenharem-se na América do Sul em busca de riqueza.

Cidade Perdida de Z

Crente da sua existência no interior da Amazónia, o explorador britânico Percy Harrison Fawcett desapareceu ao tentar achar a misteriosa cidade.

Agarta

Em 1900, uma equipa de 32 arqueólogos liderada por Arthur Evans deu início às escavações em Cnossos.

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Esta mítica cidade subterrânea situar-se-ia no centro da Terra, sendo acessível apenas através de entradas ocultas na superfície do planeta.

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© Getty; Shutterstock; WIKI

As ruínas do palácio de Cnossos ainda hoje podem ser vistas.


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m castelo medieval japonês era não só o centro geográfico do território de um governante, mas também a sua estrutura mais importante. A população dependia da proteção do castelo quando a guerra começava; durante os tempos de paz, trabalhava para mantê-lo, cultivava alimentos para o exército ou combatia em campanhas distantes. A população estava sujeita a regras restritas; se um homem estava a combater numa campanha, a sua mulher era obrigada a trabalhar em reparações no castelo caso este fosse danificado pelo mau tempo. As necessidades do daimyo (o soberano) eram sempre prioritárias. Se uma só pessoa não completasse a sua tarefa, era imposta uma punição a todo o grupo. Quando a guerra começava, a vida quotidiana da guarnição e da população em geral mudava drasticamente, já que o castelo era rapidamente convertido num quartel militar ativo. Todo o pessoal disponível era imediatamente recrutado para reforçar a segurança do castelo, tipicamente rebocando de novo as paredes, construindo paliçadas extra (cercas defensivas de estacas de madeira) ou aprofundando o fosso que rodeava as muralhas. Se perdessem a batalha, todas as pessoas no castelo corriam o risco de serem executadas.

U

Em paz ou em guerra, a vida da população protegida pelo castelo era difícil.

A vida num castelo japonês medieval

A principal torre de vigia do castelo de Azuchi tinha uma impressionante altura de sete andares; crê-se ter sido a maior contrução de madeira do mundo na época em que foi erigida.

Torre de menagem principal

O castelo de Azuchi foi construído a grande altitude, para proporcionar uma boa visibilidade da aproximação de um inimigo, mas a maioria dos castelos japoneses era construída na base de uma montanha, rodeados por vegetação densa.

Nova localização

Pensa-se que os gabletes ornamentais eram uma característica proeminente na fachada exterior do castelo e que eram mais elaborados do que os seus contemporâneos.

Gabletes

Este tipo de telhado elegante com uma estrutura inclinada e gabletes é conhecido por irimoya. Os lados inclinados terminam com uma ligeira reviravolta.

Telhado de quatro águas

Castelos históricos, como o de Matsumoto, aqui mostrado, estão listados como Tesouros Nacionais no Japão.

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Quero Saber | 045

© Osprey Publishing

Toyotomi Hideyoshi foi um samurai, general e político altamente influente do período Sengoku, tendo liderado o governo de 1583 a 1598. Trabalhou para unificar grande parte do Japão, conquistando muitas áreas e unindo-as sob o seu comando. É conhecido por muitos legados culturais, incluindo a sua governação, que ilegalizou o uso de armas por não samurais e impôs uma rígida estrutura de classes. Conduziu também levantamentos demográficos muito completos, ordenando aos cidadãos que permanecessem nas suas localizações a menos que tivessem permissão oficial para sair – o que abriu caminho à tributação sistemática. Além disso, mandou construir o castelo de Osaca, o maior do seu tempo e um dos mais impressionantes alguma vez erigidos no Japão.

O segundo grande unificador do Japão

Similares em forma e função aos balestreiros europeus, projéteis eram disparados das seteiras do castelo em caso de ataque.

Seteiras

O castelo demorou apenas três anos e meio a construir, mas foi reduzido a cinzas menos de três anos depois, durante uma batalha.

Construção rápida

Ao contrário dos anteriores castelos japoneses, que eram escuros e ominosos, o de Azuchi estava decorado de forma luxuosa, para impressionar e intimidar os rivais do proprietário.

Interior sumptuoso

Com mais de 6,4 m de espessura, as muralhas do castelo eram feitas de enormes blocos de granito encaixados sem argamassa.

Muralhas formidáveis

Fazer frente a um ataque inimigo podia durar meses, o que significava que as reservas de alimentos e água tinham de ser armazenadas no interior do castelo, caso ocorresse uma situação de cerco. Colheitas inteiras eram amiúde mantidas intramuros, garantindo que a população tinha sempre comida suficiente caso repentinamente não fosse possível sair do castelo. Nalgumas províncias, os alimentos não podiam ser transportados sem o selo do hojo (líder), por isso era muito importante guardar as reservas em localizações apropriadas. No castelo de Kumamoto, raízes secas de legumes eram guardadas em tapetes, providenciando uma reserva de alimentos de emergência.

Como sobreviver a um cerco

SABIA QUE… As paredes de madeira do castelo eram revestidas com reboco à prova de fogo?


EDIFÍCIOS & LOCAIS

Monumento a Washington

Thomas Lincoln Casey assumiu a liderança do projeto em 1878 e supervisionou a conclusão do monumento.

Exploramos o interior do icónico obelisco de mármore da capital norte-americana que celebra os feitos do primeiro presidente da nação.

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rguendo-se sobre a capital dos EUA, o Monumento a Washington é uma lembrança constante do legado do “pai fundador” George Washington. Enquanto primeiro presidente da nação, é umas das figuras mais importantes na história do país. O monumento com 169 metros de altura foi projetado por Robert Mills, com a forma de um obelisco do Antigo Egito. Começou por ser um projeto privado, financiado pela Washington National Monument Society (WNMS), com Mills a contribuir com o design escolhido. Uma multidão de cerca de 20 mil pessoas reuniu-se para assistir à colocação da primeira pedra, a 4 de julho de 1848. Todavia, depressa surgiram problemas. Em 1854, a WNMS foi declarada falida e, um ano depois, Mills faleceu. A construção parou durante a Guerra Civil Americana e só se reiniciou em 1876 – o Congresso assumiu o controlo e tudo começou a correr melhor. O monumento ficou concluído em 1884 e abriu ao público quatro anos depois. O monumento fica a sul da Casa Branca e a oeste do edifício do Capitólio.

Alumínio

O monumento é encimado por uma extremidade em alumínio, montada originariamente para funcionar como para-raios.

No interior do monumento Visite uma das estruturas mais icónicas da capital dos EUA.

Construção

Nas últimas fases da construção, um elevador movido a vapor transportava pedras através do andaime onde os operários trabalhavam.

Mármore

Foi utilizado mármore de três pedreiras diferentes na construção, deixando uma divisão visível entre tons.

© Ilustração por Adrian Mann; WIKI

Em 1888, foi instalado um elevador a vapor, capaz de levar os visitantes até à varanda de observação em 12 minutos. O primeiro elevador elétrico foi adicionado em 1901 e já foi atualizado várias vezes.

Escadaria em ferro

No interior do obelisco existe uma escadaria em espiral com 50 patamares e 897 degraus, que demora cerca de 20 minutos a subir.

Dimensões

Dez vezes maior em altura do que em largura, o monumento mede 169 m de cima a baixo, em vez dos originariamente planeados 182 m.

Fundações Pedras comemorativas

A revestir as paredes da escadaria estão 193 pedras comemorativas oferecidas por cidades e cidadãos de todo o mundo.

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Elevador a vapor

Já com a construção a meio foi adicionado betão às fundações do monumento porque o material original utilizado era demasiado fraco.


XxxxxxLorem ipsum dolor sit consectetur xxxxxxx DID YOU SABIA QUE... KNOW? Antes da invenção do moinho deamet, vento, moer milho,adipiscing bombearelit. água e cortar madeira eram atividades manuais?

Moinhos de vento

Descubra como estas construções nos ajudaram a explorar a energia eólica ao longo da história.

C

rê-se que o moinho de vento foi inventado há cerca de 1.500 anos. Os historiadores não sabem ao certo onde terá surgido o primeiro, mas julga-se que tenha sido na antiga China ou na antiga Pérsia. Os primeiros mecanismos recorriam a mós movidas por velas que rodavam sobre um eixo para bombear água ou moer cereais. Tornaram-se parte integral da antiga agricultura e eram também utilizados em serrações e para ajudar com irrigações e drenagens. Os primeiros moinhos de vento rodavam num eixo vertical mas versões posteriores giravam na horizontal, num processo mais eficiente. Modelos ulteriores tinham ainda mecanismos para voltar automaticamente as velas principais na direção do vento. Para lidar com velocidades de vento variáveis, os moinhos modernos usam controlos especiais para desviar o mecanismo do vento, caso as rajadas sejam demasiado fortes para as velas. Antes da invenção dos moinhos de vento, moer milho, bombear água e cortar madeira eram tarefas manuais. Os moinhos vieram acelerar e aumentar muito a eficiência do processo, com um impacto drástico na agricultura e economia mundiais.

No interior de um moinho de colmo

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Como um moinho de vento usa energia eólica para moer grãos.

1. Capelo

O capelo do moinho (teto) gira consoante a direção do vento, aumentando a velocidade da rotação.

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2. Velas

As velas gradeadas movem-se no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio, fazendo o mecanismo interno girar na direção oposta.

3. Roda principal

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As velas apanham o vento e fazem rodar o eixo horizontal, que, por sua vez, faz girar a roda dentada maior, ou roda motriz.

4. Casal de mós

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O movimento da roda motriz faz girar um eixo vertical, que aciona uma mó.

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5. Inserção do grão

O grão é fornecido às duas mós através de uma tremonha. Uma mó é estática, enquanto a outra gira.

6. De grão a farinha

O piso inferior, ou loja, é onde a farinha, a cevada ou a aveia são recolhidas.

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Porque caíram em desuso? O uso de moinhos de vento diminuiu no mundo moderno, devido à introdução do vapor como fonte de energia durante a Revolução Industrial e, posteriormente, à banalização da eletricidade. Hoje, os moinhos de vento tradicionais são listados como património ou são simples ruínas. Ao invés de moerem grão, os moinhos de vento atuais assumem a forma de turbinas eólicas e são uma das principais fontes de energia renovável do mundo. Mais: as bombas eólicas existem desde tempos antigos e continuam a ser vulgarmente utilizadas para drenar terrenos pantanosos e para obter água subterrânea em zonas onde a água potável escasseia.

© Ilustração por Rebekka Hearl; Thinkstock; Getty

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EDIFÍCIOS & LOCAIS

O Castelo de Edimburgo Cenário de inúmeros cercos, o Castelo de Edimburgo continua a erguer-se majestoso como símbolo de poderio militar. Grande Salão

A

ltaneiro no topo de Castle Rock (vulcão extinto com 700 milhões de anos), o Castelo de Edimburgo é uma das fortalezas mais icónicas do mundo e a segunda atração turística mais visitada da Escócia. Outrora o local de uma fortificação conhecida como o “Castelo das Donzelas”, o edifício que se mantém hoje em Castle Rock foi construído no século XII por ordem de David, príncipe de Cumbria, mais tarde rei da Escócia, de 1124 a 1153. Mais de 131 metros acima do nível do mar, protegido por muralhas e penhascos a pique, o castelo só podia ser atacado pelo lado leste. Apesar de ser um obstáculo impressionante, os inimigos sabiam que controlar o castelo significava controlar a cidade. Cenário de múltiplos combates sangrentos, a primeira grande batalha travada no Castelo de Edimburgo desenrolou-se em 1296, após a invasão da Escócia por Eduardo I de Inglaterra em março desse ano – que desencadeou a I Guerra de Independência da Escócia. Depois de três dias de bombardeamentos, a guarnição no interior do castelo rendeu-se, mas o domínio inglês sobre

A Pedra de Scone

Também conhecida como Pedra do Destino, este bloco de arenito vermelho com 66 cm de comprimento e cerca de 152 kg serviu de “trono” a inúmeros monarcas ao longo dos séculos. Originária, crê-se, da Irlanda, a pedra foi transportada da Escócia para Inglaterra em 1296 para ser colocada no trono do rei Eduardo I. Permaneceu em Inglaterra durante cerca de 654 anos, até à sua remoção ilegal por quatro estudantes escoceses em 1950. Na tentativa de devolvê-la à Escócia, os jovens partiram acidentalmente a pedra em duas. Foi encontrada em 1951 e finalmente restituída à sua pátria. Hoje patente na Sala da Coroa do Castelo de Edimburgo, só sairá da Escócia quando houver outra coroação real.

esta posição estrategicamente vital seria tudo menos consistente nos séculos que se seguiram. Após as Guerras de Independência da Escócia, o rei David II da Escócia, filho do temível guerreiro Roberto de Bruce (Robert the Bruce), teve de enfrentar os danos infligidos no castelo durante o conflito. Ansioso por reparar os estragos na fortaleza, David II supervisionou um período de restauração que incluiu as obras iniciais para construir a torre de David, mais tarde substituída pela Bateria da Meia Lua (Half Moon Battery). Nos anos seguintes, o Castelo de Edimburgo foi palco de novas tentativas por parte dos ingleses e dos escoceses para garantir o controlo do forte, e sofreu os danos que estes confrontos brutais causavam com frequência. Utilizado sobretudo para receber prisioneiros de guerra capturados durante as muitas campanhas inglesas no estrangeiro nos séculos XVIII e XIX, o castelo tornou-se monumento nacional em 1814. Com mais de um milhão de visitantes por ano, é hoje crucial para o setor turístico de mais de € 1800 milhões da cidade.

Construído durante o reinado de Jaime IV da Escócia, crê-se que foi usado pelo parlamento escocês.

Memorial da Guerra Nacional Erigido para homenagear as baixas escocesas na I Guerra Mundial, abriu ao público em 1927. A entrada é grátis.

Palácio Real

Outrora usado como aposentos reais pela Casa de Stuart, aloja hoje a Pedra do Destino.

Para lá da muralha

De canhões a joias da coroa, o Castelo de Edimburgo é o lar de grande parte da história da Escócia. Diante do portão do castelo encontra-se uma estátua de William Wallace, líder crucial nas Guerras de Independência da Escócia.

Bateria da Meia Lua

Construída sobre os escombros da torre de David, foi concluída em 1588. Era enorme para a época.

“Controlar o castelo significava controlar a cidade.”

A Pedra de Scone embutida no Trono da Coroação, em Westminster, Londres, em 1855.

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SABIA QUE... Considera-se que, para os estudantes da Universidade de Edimburgo, atravessar o portão do castelo dá azar?

Capela de Santa Margarida

O edifício mais antigo de Edimburgo remonta ao início do século XII e foi mandado erigir por David I da Escócia em honra da sua mãe.

Mons Meg

One O’Clock Gun

Construído na atual Bélgica em 1449, este canhão de seis toneladas foi disparado pela última vez em 1681, para saudar a chegada do então futuro rei Jaime VII da Escócia e II de Inglaterra.

Torre de Argyle

Com 70 degraus, era a ligação original entre as secções central e superior do castelo.

Sobre o portão com grade de ferro, esta torre foi construída entre 1886 e 1887, e batizada em honra do 9º conde de Argyll.

Apesar da sua origem real, a Capela de Santa Margarida foi usada como paiol de pólvora no século XVI.

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Cemitério de cães

Este pequeno terreno é usado desde a era vitoriana para sepultar cães ao serviço do exército.

Thomas Randolph, o conquistador Nascido em 1278, Thomas Randolph, 1º conde de Moray, era sobrinho de Roberto de Bruce e figura chave das Guerras de Independência da Escócia. Apoiante da rebelião do tio em 1306, foi preso pelos ingleses após a batalha de Methven, nesse mesmo ano, e combateu pelo rei Eduardo I de Inglaterra até ser recapturado pelos escoceses, em 1308. Nomeado conde de Moray em 1312, Randolph recompensou a benevolência do tio em 1314, quando liderou um grupo de 20 homens num assalto audacioso para retomar o Castelo de Edimburgo. Escalando as aparentemente intransponíveis muralhas, o ousado plano de Randolph funcionou, apanhando os ingleses de surpresa. Com o castelo reconquistado, Randolph continuou a combater corajosamente, participando na vitória esmagadora sobre os ingleses em Bannockburn, três meses depois.

Inscrição comemorativa do assalto de Randolph. A data está incorreta devido à alteração do calendário.

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© WIKI/ Ad Meskens; Ilustração por Adrian Mann

Escadaria de Lang

Outrora um canhão de 18 libras, este morteiro de 25 libras é hoje disparado todos os dias exatamente às 13h, exceto aos domingos, Sexta-feira Santa e Dia de Natal.


EDIFÍCIOS & LOCAIS

O Palácio

de Versalhes Foram precisos 50 anos e milhares de operários para construir um palácio digno do “Rei Sol”.

É

um nome que evoca imagens de opulência e grandeza mas a história do Palácio de Versalhes não é de modo algum “áurea”. Lar dos reis de França por mais de um século, começou por ser um pavilhão de caça numa aldeia próxima de Paris. Sob Luís XIV, o cognominado Rei Sol – porque o reino orbitava em torno do monarca –, tornou-se um dos maiores palácios do mundo. Em 1668, Luís XIV ordenou ao seu arquiteto Louis Le Vau que construísse os “grandes apartamentos” do rei e da rainha, e a fachada em pedra com vista para o jardim, conhecida como Le Vau Envelope. Em vez de seguir a tradição francesa dos telhados em ardósia, Le Vau

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inspirou-se na arquitetura italiana e criou um telhado plano escondido por uma balaustrada. Durante a expansão, ministros tentaram minimizar os custos usando materiais de construção franceses – até nacionalizaram uma fábrica de tapeçarias – mas foram os operários que pagaram o derradeiro preço. Mais de 36.000 homens e 6.000 cavalos trabalharam de manhã à noite para erguer o edifício de 500 metros de comprimento. Os operários recebiam apenas seis soldos por dia – o equivalente a uma pequena porção de manteiga – e as condições eram tão más que foram construídos três hospitais para lidar com o número de lesões. A situação piorou no verão

Todos os dias às 10h, a corte assistia à missa do rei na Capela Real.

de 1668 com uma queda de detritos que esmagou meia dúzia de homens. Mais: quando a mãe de uma das vítimas se aproximou para reclamar o corpo do filho junto do rei, foi encarcerada. Surpreendentemente, Versalhes já foi comparado a uma prisão – uma “gaiola dourada” que mantinha centenas de nobres e cortesãs cativos à mercê do rei. O palácio era o cenário de festas magníficas e faustosas, e de muitos casos amorosos, mas o que fora outrora um humilde pavilhão de caça viria a ser também o pano de fundo para alguns dos momentos mais decisivos da história – da unificação da Alemanha em 1871 à assinatura do Tratado de Versalhes, em 1919. WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... Não havia casas de banho no Palácio de Versalhes até 1768? Até aí, os resíduos eram atirados pela janela! Antecâmara

Os cortesãos aguardavam aqui antes de serem admitidos no quarto real para vestir o rei. A entrada era protegida por um guarda suíço.

Galeria dos Espelhos Os espelhos eram dos artigos mais caros no século XVII; um total de 17 revestem a galeria com um pé direito de 12 metros, estendendo-se do chão ao teto.

Ostentação Estas sete divisões foram luxuosamente decoradas ao estilo dos palácios italianos para impressionar os visitantes.

Grande apartamento da rainha

Era aqui que a rainha dormia e tinham lugar os partos públicos. Estava em simetria com a câmara do rei.

Capela real

Grande apartamento do rei

Projeto grandioso

Em 1701, Luís XIV mudou o seu quarto de dormir para um salão com vista para o nascer do Sol. Foi lá que morreu, em 1715, ao fim de mais de 72 anos no trono – o reinado mais longo na história da Europa.

O palácio de Luís XIV tinha divisões para mais de 600 dos seus amigos mais próximos.

“Mais de 36.000 homens e 6.000 cavalos trabalharam de manhã à noite para erguer o edifício.”

A missa era celebrada diariamente às 10h, mas Luís XIV só usou esta capela durante cinco anos, já que guerras no estrangeiro atrasaram a sua conclusão.

Aposentos dos cortesãos Existiam cerca de 350 divisões no interior do palácio para cortesãos e cortesãs/ damas da corte, de diferentes dimensões consoante o estatuto de que gozavam junto do rei.

Ópera Real

Quando foi concluída, em 1770, era o maior teatro de ópera na Europa. Porém, requeria 3.000 velas para as noites de estreia e raramente era utilizada devido aos custos.

Os jardins de Versalhes demoraram 40 anos a ser concluídos e Luís XIV valorizava-os tanto como o palácio.

© WIKI

Um dia na vida do rei

A rotina de Luís XIV era tão meticulosa e exigente como o monarca.

10h: Missa

À medida que o rei se encaminha para a Capela Real, um séquito alinha-se na Galeria dos Espelhos. Há quem tente sussurrar-lhe pedidos ou passar-lhe bilhetes.

7h30: Receção real ao levantar

Um médico, uma aia e um punhado de nobres privilegiados acorrem à alcova real para cumprimentar e vestir o rei. Lavam-no e fazem-lhe a barba dia sim, dia não.

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13h: Almoço

O rei almoça no quarto, normalmente na companhia de cortesãos e daqueles que eram suficientemente privilegiados para serem convidados para os aposentos privados do rei.

11h: Reunião do conselho real

No seu “apartamento”, o rei trata de assuntos domésticos e religiosos, bem como de estado. É aconselhado por até seis ministros.

18h: Entretenimento no interior

O filho de Luís XIV era amiúde incumbido de organizar o entretenimento da noite, enquanto o rei assinava as “pilhas” de cartas preparadas pelo seu secretário.

14h: Atividades vespertinas

Tem início uma tarde passada a caçar nos bosques circundantes ou a passear pelos jardins do palácio, consoante a disposição do rei nesse dia.

22h: A grande ceia pública

O rei e a sua família tomavam a sua refeição, observados por tantas pessoas quantas coubessem na antecâmara do apartamento do rei.

23h30: Recolher

Depois de passar algum tempo com a família e amigos íntimos no seu quarto, outra cerimónia pública tem lugar quando o rei se deita.

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EDIFÍCIOS & LOCAIS

Catedral de Milão

Pináculos

Os 135 pináculos são uma característica típica da arquitetura gótica e simbolizam o desejo de alcançar os céus.

Esta espetacular obra-prima gótica italiana levou quase seis séculos a ser concluída.

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o coração de Milão fica a quinta maior igreja cristã do mundo. Chamada Duomo di Milano em italiano, foi encomendada pelo arcebispo Antonio da Saluzzo em 1386, para substituir a antiga Basílica de Santa Maria Maior. A nova catedral era para ser construída em alvenaria de terracota mas o senhor de Milão, Gian Galeazzo Visconti, decidiu que o mármore rosa de Candoglia criaria um efeito mais grandioso. Arquitetos, escultores e operários viajaram de toda a Europa para trabalhar no projeto e uma rede de canais foi escavada para transportar o mármore das pedreiras de Candoglia até ao local da construção. Em 1560, grande parte da nave estava concluída e o primeiro pináculo tinha sido esculpido, mas a chegada de um novo arcebispo alterou os planos. Influenciado pela Reforma Católica, Carlo Borromeo e o seu arquiteto, Pellegrino Pellegrini, optaram por refrear o estilo gótico, em favor do renascentista, enquanto continuavam a desenvolver o interior e projetavam uma nova fachada. Porém, quando o arquiteto Carlo Buzzi assumiu o comando da obra, no século XVII, regressou ao estilo gótico, e adicionou o icónico pináculo principal e a Madonnina. O edifício tinha então uns impressionantes 108,5 m de altura, mas a fachada ainda era a da basílica original. Questões políticas e falta de financiamento tinham parado o projeto, pelo que coube a Napoleão Bonaparte, prestes a tornar-se governante de Itália, ordenar a conclusão da nova fachada, em 1805. Bombardeamentos aliados durante a II Guerra Mundial causaram ainda mais atrasos mas, em 1965, os retoques finais foram finalmente adicionados. 78 arquitetos diferentes trabalharam na catedral ao longo de seis séculos.

A Madonnina

Obras de restauro

Desde que a catedral foi concluída, a renovação tem sido constante. Primeiro, o pináculo principal tornou-se instável e teve de ser remontado numa plataforma de betão e reforçado com aço inoxidável; nos últimos 20 anos, 25 outros pináculos exigiram uma atenção similar. Vários dos pilares interiores também foram reparados devido à instabilidade causada por abatimentos e, em 1972, o restauro da fachada começou a reparar os danos causados pelo smog e excrementos de pombos. Com o mármore limpo, foi aplicado um revestimento impermeável e instalados dissuasores elétricos para os pombos, mas um novo período de restauro foi necessário em 2003. Varrimento a laser foi usado para identificar as áreas de deterioração e um projeto de cinco anos foi lançado para substituir ornamentos e blocos de mármore.

Lâmpada vermelha

Acima do altar, uma luz vermelha assinala o local onde um dos cravos da crucificação de Jesus foi alegadamente colocado.

A estátua de cobre dourada da Virgem Maria foi esculpida por Guiseppe Bini e assinala o ponto mais alto da catedral.

A estátua da Madonnina tem 4,16 m de altura e foi dourada com 6750 folhas de ouro.

Interior

Cinco naves amplas estão separadas por 52 colunas, cada uma com quase 25 m de altura e decoradas com estátuas.

Candelabro de Trivulzio

Este candelabro de bronze com 5 m de altura é o maior do seu género e tem sete braços decorados com vinhas e dragões.

Vitrais

As janelas exibem uma mistura de vitrais historiados do século XV e vidro esmaltado do século XIX.

© Alamy; Thinkstock

Terraços

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SABIA QUE... Nas vésperas da II GM, a Madonnina foi coberta com tecido para escondê-la dos bombardeiros inimigos?

Estátuas

Terraços

A catedral está decorada com 3400 estátuas e para cima de 700 figuras nos altos-relevos em mármore – mais do que em qualquer outro edifício no mundo.

Daqui é possível ver os pináculos de perto e apreciar uma vista deslumbrante de Milão e dos Alpes.

O órgão do Duomo

Fachada

Napoleão Bonaparte ordenou a conclusão da fachada na véspera da sua coroação como rei de Itália, em 1805.

© Alamy; Thinkstock

O magnífico órgão da catedral de Milão é um dos maiores do mundo e foi construído em 1938 por duas das famílias mais influentes de fabricantes de órgãos do século XX: a empresa Mascioni, de Cuvio (Varese), e a Tamburini, de Crema. É o segundo na Europa em número de tubos, com um total de 15.800, variando entre mais de nove metros e apenas alguns centímetros de comprimento. Quando foi instalado, consistia em sete órgãos separados, espalhados pela catedral. Em meados da década de 1960 foi desmontado enquanto a catedral era restaurada e, em 1986, foi inaugurado na sua nova posição, atrás de grandes vidros acima das sacristias.

Portas

As cinco portas foram produzidas entre 1840 e 1965, e estão decoradas com entalhes intricados e relevos em bronze.

Pináculos

Portas

Fachada

Estátuas


EDIFÍCIOS & LOCAIS

Como foi o teto da Capela Sistina pintado?

O teto da Capela Sistina, hoje, pós-restauro. Em termos de cor, está muito similar a como terá parecido quando foi originalmente pintado.

Explore as ferramentas e técnicas por detrás da obra-prima renascentista de Miguel Ângelo.

A

o pintar o teto da Capela Sistina no início do século XVI, Miguel Ângelo teve de superar vários obstáculos. O primeiro prende-se diretamente com as características físicas do teto, que se trata de uma abóbada de berço, ou seja, uma superfície curva. Para dificultar ainda mais a tarefa, essa abóbada de berço é intersetada por abóbadas menores sobre as janelas. Assim, não existem quaisquer superfícies planas, exceto em torno das janelas, onde o artista também pintou uma série de lunetas em forma de meia‑lua. Como tal, mesmo antes de pegar num pincel, Miguel Ângelo teve de determinar primeiro como desenhar figuras humanas realistas na devida proporção e em movimento nessas superfícies irregulares. A sua capacidade de o fazer é testemunho do seu imenso talento artístico. Outro grande desafio na pintura do teto da Capela Sistina foi chegar lá, aos seus 20 metros acima do solo. Felizmente, uma campanha de preservação começada na década de 1980 revelou o método usado por Miguel Ângelo para chegar a tais alturas: construiu um complexo andaime. Este consistia numa ponte de vigas trianguladas que se estendia pela abóbada e movia sobre carris que estavam a um ângulo de 90 graus em relação às paredes. Isto permitiu a Miguel Ângelo aceder a todas as áreas do teto, já que o andaime podia deslocar-se pelos carris – cobria apenas um quarto da abóbada de cada vez, poise era precisa luz ambiente das janelas para pintar. Curiosamente, os orifícios que suportaram esta estrutura ainda hoje podem ser vistos nas paredes. O terceiro problema que Miguel Ângelo teve de resolver foi como traçar as linhas de esboço para o teto todo. Fê-lo dividindo a abóbada em várias unidades, esticando fios cobertos de giz de uma ponta à outra da capela (com ajuda de assistentes), antes de os estalar contra o estuque preparado. Ao fazê-lo, estabeleceu a estrutura linear de toda a arquitetura, que é

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consistente em todo o teto. O último grande obstáculo a enfrentar foi a mera escala do projeto, que, incrivelmente, demorou apenas quatro anos a completar. Pintar o teto era uma enorme empreitada logística, por isso Miguel Ângelo pediu ajuda a alguns dos seus amigos, de Florença a Roma. Além de pintarem alguns dos elementos recorrentes, como colunas e estátuas, estes assistentes ajudaram-no a construir o andaime, misturar/preparar o estuque, fabricar algumas das tintas, aparar os pincéis e desenhar versões de tamanho integral em papel para serem transferidas para a abóbada. Este último processo implicava pressionar o esboço em papel contra o teto, furá-lo com pequenos orifícios ao longo dos contornos e depois cobri-lo com pó de giz preto para produzir um contorno pontilhado no estuque. O famoso quarto tramo do teto da Capela Sistina, mostrando a criação do homem.

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SABIA QUE... Miguel Ângelo foi um de muitos Mestres a pintar a Capela Sistina; outros incluem Botticelli e Pinturicchio?

Entrevista William Wallace

Um perito em Miguel Ângelo fala-nos da obra mais famosa do artista.

Quero Saber (QS): Como é que Miguel Ângelo acabou a pintar o teto da Capela Sistina? William Wallace (WW): Miguel Ângelo aceitou o projeto relutantemente, pois o teto já tinha sido pintado. Era uma abóbada azul com estrelas, o que era a decoração convencional dos céus. Quando Miguel Ângelo se encontrou com o Papa para falar disso, inicialmente havia uma ideia da empreitada muito mais limitada de pintar os 12 Apóstolos. Mas, como era típico de Miguel Ângelo, ele tendia a expandir e engrandecer à medida que trabalhava, conduzindo à [obra-prima] que vemos hoje.

QS: Quais são as vantagens do fresco? WW: O fresco é um meio muito exigente que requer oito horas de trabalho diárias, em que duas são de preparação, três de pintura no estuque húmido e outras duas de pintura no estuque seco. A principal vantagem do fresco é que, como se pinta sobre o estuque húmido, quando a tinta seca, transforma-se em carbonato de cálcio – torna-se parte do estuque. O fresco é extraordinariamente durável; [é por isso que] temos frescos do Antigo Egito e de Pompeia que estão perfeitamente intactos. O livro de William Wallace Michelangelo: The Artist, The Man, And His Times está à venda, editado pela Cambridge University Press.

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© Joe Angeles; Cambridge University Press/William Wallace

QS: Quanta ajuda teve o artista? WW: Temos os nomes de, pelo menos, 13 pessoas que auxiliaram Miguel Ângelo. Em tempos, nunca se imaginara que ele tivera assistentes; pensava-se nele como o solitário que não se dava com ninguém, mas seria impossível pintar algo tão monumental sozinho. A verdade é que ele pintou a maioria e todas as figuras importantes, mas os assistentes [terão tratado dos aspetos mais monótonos, como a arquitetura].


EDIFÍCIOS & LOCAIS

Massachusetts State House

O edifício mais icónico de Boston tem simbolismo a condizer com o seu fausto.

A

pós o fim da Guerra da Independência, em 1783, os ainda jovens Estados Unidos da América lutavam por definir a sua identidade nacional. Uma das formas de o conseguir foi através da construção de estruturas grandiosas e simbólicas, como o edifício do capitólio de Boston, a Massachusetts State House. O edifício foi ideia do arquiteto Charles Bulfinch, que foi buscar muita da sua inspiração a dois anos de viagens pela Europa. A construção arrancou em 1795, com os patriotas Samuel Adams e Paul Revere a lançarem a primeira pedra no topo da Beacon Hill – local outrora pertencente a John Hancock, o primeiro governador eleito do Massachusetts. Concluída 1798, tornou-se imediatamente um ponto de referência, destacando-se acima da cidade baixa e comprovando o epitáfio de John Winthrop de “cidade no topo da colina.” A cúpula da State House é talvez a secção do seu exterior que mais mudou ao longo dos anos. Construída originalmente em madeira, foi revestida a cobre no início do século XIX e depois a ouro, em 1874. Durante a II Guerra Mundial foi pintada de cor escura, como proteção contra a possibilidade de ataques aéreos durante apagões. O teto voltaria a ser dourado em 1997. Sobre a cúpula está uma pinha de madeira, que simboliza a importância económica e cultural da indústria da madeira na história do estado. Atualmente, ainda funciona como capitólio do estado, alojando o Senado e a Câmara dos Representantes. Suspenso na galeria, bem à vista dos Representantes, está uma das maiores atrações culturais de Boston: o Sacred Cod (“Bacalhau Sagrado”), que simboliza a importância local da indústria da pesca do bacalhau para a prosperidade. Se acrescentarmos as inúmeras obras de arte e o tesouro guardados nos confins do edifício, é legítimo dizer que a sua história é longa e de grande peso.

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Sala Grande

O mais recente acrescento ao edifício, a sua construção terminou em 1990.

Janela da Escadaria Principal Contém os vários selos do estado do Massachusetts ao longo dos anos.

Câmara dos Representantes

Fica no terceiro piso e alberga o famoso “Bacalhau Sagrado”.

Sala das Bandeiras

Esta sala homenageia os soldados do Massachusetts e contém mais de 400 bandeiras.

A Biblioteca Estadual do Massachusetts é tão imponente por dentro como por fora.


SABIA QUE... A Massachusetts State House aparece em inúmeras cenas do filme de Scorsese The Departed: Entre Inimigos?

No interior...

Um guia para as características mais relevantes da Massachusetts State House.

Pinha

Situada no topo da cúpula, simboliza a importância da indústria da madeira para a história da cidade.

Inspirações arquitetónicas

Cúpula

Originalmente era de madeira, mas depois foi revestida a cobre e, mais tarde, a ouro.

Sala de Receções do Senado

Aqui, retratos de ex-presidentes do Senado decoram as paredes.

Durante as suas viagens, Charles Bulfinch inspirou-se em vários estilos, que se fundiram para criar um edifício com um estilo próprio. Um dos que se nota de forma mais clara é de natureza palladiana, inspirado nos temas presentes na obra do arquiteto italiano Andrea Palladio (1508-80) – sobretudo o tipo de simbolismo da arquitetura grega. Um exemplo famoso é patente na Somerset House, em Londres (acima); a parte central da State House exibe as semelhanças mais óbvias com a arquitetura palladiana. Para além disso, a obra de Bulfinch evocava os estilos neoclássicos representados, por exemplo, pelo arquiteto escocês Robert Adam (1728-92), embora numa versão que evocava temas mais próximos. Foi utilizada madeira para as colunas da colunata, bem como para partes da escadaria e das bandas decorativas das colunas.

Câmara do Senado

Sala das Enfermeiras Gabinetes executivos

Inclui o gabinete do governador, a sala do conselho e a sala do governo.

Deve o nome à presença da estátua de uma enfermeira do exército – a primeira em honra das mulheres do Norte após a Guerra Civil.

O “Bacalhau Sagrado” Quando o famoso Sacred Cod da State House foi roubado, em 1933, Boston ficou em alvoroço e o caso até foi notícia nacional. Tal era o significado simbólico deste memorial à importância da pesca do bacalhau-do-Atlântico para a cidade que alguns dos membros da Câmara dos Representantes argumentaram que seria sacrilégio

continuar a trabalhar sem o célebre peixe a “observá-los”. O Sacred Cod foi recuperado (apenas com pequenos danos) pelo diretor da polícia de Harvard Yard, Charles Apted, e o roubo atribuído ao staff do The Harvard Lampoon, publicação humorística da Universidade de Harvard – mas ninguém foi punido.

© Thinkstock

Logo abaixo da cúpula, aloja os 40 senadores.

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EDIFÍCIOS & LOCAIS

A Ponte de Brooklyn

Um dos monumentos mais conhecidos de Nova Iorque, a Ponte de Brooklyn foi a primeira ponte suspensa por cabos de aço.

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onstruída entre 1869 e 1883, a Ponte de Brooklyn liga Brooklyn a Manhattan, atravessando o rio East, na cidade de Nova Iorque (EUA). Concebida pelo imigrante alemão John Augustus Roebling, foram o filho, Washington Roebling, e a nora, Emily, quem acompanhou a maior parte da construção depois da morte inesperada de John, poucos meses antes do início da obra. A ponte assenta em dois elementos principais. Em primeiro lugar, as duas ancoragens posicionadas em ambas as margens do rio, entre as quais se encontram duas torres (ou pilares) com cerca de 84 m de altura. Feitas em calcário, granito e cimento, as torres – concebidas no estilo arquitetónico neogótico – assentam em alicerces de betão com 13,4 m e 23,8 m de profundidade nas margens de Brooklyn e de Manhattan, respetivamente. Em segundo lugar, a própria ponte é feita em ferro e cabos de aço, com uma camada de asfalto no tabuleiro principal. Com 26 m de largura e 1.825 m de comprimento, a Ponte de Brooklyn era a ponte suspensa mais longa do mundo quando foi construída, e deteve o título durante mais de 20 anos. O projeto de Roebling inclui muitas redundâncias, como um sistema de suporte diagonal entre os cabos e treliças de reforço, que tornam a ponte muito segura; na verdade, mesmo que um dos sistemas principais de suporte falhe por completo, a ponte irá arquear-se, em vez de cair completamente. Mais curioso ainda, a ponte tem um abrigo nuclear numa das ancoragens. Não sendo usado, foi esquecido, e depois redescoberto em 2006, com provisões da época da Guerra Fria. Considerada Marco Histórico Nacional em 1964, desde a década de 1980 que a ponte é iluminada com projetores à noite, para destacar as suas características arquitetónicas distintas. Inicialmente concebida para oferecer passagem a veículos motorizados, comboios, elétricos, bicicletas e peões, desde a década de 1950 que a ponte dá passagem apenas a carros, ciclistas e peões. É atravessada diariamente por mais de 120 mil veículos, quatro mil peões e 3.100 ciclistas.

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Suspensores sob tensão

As duas forças opostas – os cabos e o tabuleiro da ponte – em equilíbrio produzem tensão nos suspensores.

Torres sob compressão O peso das enormes torres de alvenaria produz compressão para baixo.

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SABIA QUE... Em 1884, o artista PT Barnum exibiu 21 elefantes na Ponte de Brooklyn, provando a sua estabilidade?

As origens das pontes suspensas Numa ponte suspensa, o tabuleiro – a parte que suporta a carga – está pendurado por baixo de cabos de suspensão em suspensores verticais que suportam o peso. Crê-se que as pontes com este design foram inventadas no Tibete, no século XV, mas apenas no século XIX foram construídas em larga escala. Os materiais utilizados na construção da Ponte de Brooklyn eram provenientes dos EUA. Os blocos de granito foram extraídos de uma pedreira no Maine e enviados para Nova Iorque de barco. Os cabos de aço foram produzidos em fábricas locais, enquanto o pigmento utilizado na tinta vermelha que originalmente cobria a ponte veio das minas de Rawlins, no Wyoming. As técnicas de design e construção empregues na Ponte de Brooklyn pouco mudaram no último século. Apesar de hoje haver pelo menos 18 pontes suspensas mais longas do que a Ponte de Brooklyn, são basicamente todas iguais – à exceção dos materiais, que, hoje, vêm de todo o mundo, em vez de serem fornecidos localmente.

A Ponte de Brooklyn em construção, em finais do século XIX.

Carga viva

O peso do trânsito que atravessa a ponte, assim como fatores ambientais normais, como o vento e a chuva.

Impacto cultural Desde a sua conclusão, a Ponte de Brooklyn inspirou muitos artistas. O poeta modernista americano Hart Crane, por exemplo, publicou a famosa ode To Brooklyn Bridge, em 1930. Considerada um prodígio do seu tempo, houve uma afluência em massa para a inauguração da estrutura, com um espetacular fogo de artifício e uma regata, em 1883 – celebração repetida no centésimo aniversário. Muitas pessoas saltaram da ponte, como manobra publicitária ou tentativa de suicídio, enquanto outros ali se casaram. Em 1919, o bombardeiro Caproni, na altura o maior avião do mundo, passou sob o tabuleiro; e em 2003, a ponte terá sido um potencial alvo de um plano de ataque terrorista da Al-Qaeda. A Ponte de Brooklyn já apareceu em muitos filmes de Hollywood, como Eu Sou a Lenda, O Cavaleiro das Trevas Renasce ou Godzilla; recentemente, surgiu em O Grande Gatsby.

Cabos sob tensão

As duas forças opostas – a ancoragem e o peso do tabuleiro via suspensores – criam tensão nos cabos.

Carga inoperante Carga dinâmica

O peso da própria ponte – todos os componentes de pedra e metal.

© Getty; Thinkstock

Fatores ambientais fora da norma, como rajadas súbitas de vento ou sismos, etc.

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EDIFÍCIOS & LOCAIS

O que correu mal em Chernobyl? Saiba como uma reação fora de controlo levou ao pior acidente nuclear de sempre.

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a madrugada de 26 de abril de 1986, engenheiros da central nuclear de Chernobyl iniciaram um teste que levaria ao pior desastre nuclear da história. A central, situada cerca de 100 km a norte de Kiev, na Ucrânia, fora terminada em 1983. Três anos depois, foi lançado um teste no reator 4 para ver por quanto tempo as turbinas continuariam a produzir energia caso esta fosse cortada. O primeiro erro fatal dos técnicos nesse dia foi desligar os sistemas de segurança. Teriam afetado a experiência, que envolvia colocar o reator a funcionar a baixa energia, mas o ato impediu que os operários percebessem a situação horrível em que haveriam de ser colocados. A fissão nuclear é regulada por barras de controlo, que, uma vez inseridas no núcleo do reator, absorvem os neutrões e abrandam a produção. A ideia era baixar muitas das barras para reduzir a produção de energia e ver o que acontecia; mas baixaram demasiadas e o débito energético desceu a um ritmo muito elevado. As barras foram depois subidas para aumentar a produção, regressando a um débito de cerca de 12%. Contudo, as barras foram subidas demasiado e muito rapidamente; houve uma sobrecarga perigosa, o reator sobreaqueceu e a água do sistema de arrefecimento – incapaz de lidar com as súbitas necessidades – transformou‑se em vapor. O botão de emergência foi pressionado e as barras começaram a baixar, mas tal originou ainda mais reações rápidas no núcleo. Nas primeiras horas de 26 de abril, o teto do reator explodiu e material radioativo começou a sair para a atmosfera. O incêndio levou nove dias a apagar e a radioatividade teve consequências de grande alcance, não só para a saúde pública como políticas.

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Chernobyl

Poeira radioativa

O local em volta de Chernobyl ainda hoje está isolado.

O acidente e a explosão foram um choque, mas o pior ainda estava para vir, sob a forma da radiação que se espalhou e dos problemas de saúde que afetaram muitas áreas da Europa. Houve 31 mortes imediatas, 28 das quais resultado direto do envenenamento por radiação, dentro e à volta do local da central. As piores consequências centraram‑se à volta de Chernobyl, mas foram detetados níveis altos de radiação em países como a Suécia, o Reino Unido ou até Portugal. O cancro da tiroide, causado pela inalação de ar contaminado, decuplicou em adolescentes na Bielorrússia desde 1986; os casos nos adultos também aumentaram. Em crianças até aos 14 anos também cresceram, mas o número desceu entretanto dado que muitas já nasceram depois do desastre. O impacto do ar contaminado também afetou os animais, as colheitas e o fornecimento de água, e os efeitos ainda hoje se fazem sentir amplamente. Os níveis de radiação em redor de Chernobyl vão permanecer muito elevados durante milénios.

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SABIA QUE... Pelo menos 30 das 50 barras tinham de estar inseridas para haver segurança? Aquando da explosão, eram seis.

Contagem decrescente para o desastre Veja como ocorreu o pior acidente nuclear de que há registo. 1 Interruptores de segurança

São desligados para que a experiência decorra sem intervenções.

6 Sobrecarga

3

A energia sobe para cem vezes acima do normal. Pastilhas de urânio começam a danificar o sistema.

2 Barras descidas

3 Barras subidas

As barras de controlo são descidas para reduzir o débito de energia, que cai demasiado, depressa demais.

As barras são subidas para retomar o funcionamento, aumentando rapidamente a produção energética.

7 Explosão

8 Fuga de radiação

O reator não consegue conter a pressão acumulada e, poucos minutos depois, explode, destruindo o seu topo.

Radiação nuclear escapa para a atmosfera e o vento espalha‑a por quase toda a Europa continental.

4 Água quente

5 Emergência

A água para arrefecimento sobreaquece e torna‑se vapor, sem arrefecer o reator.

9 Limpeza

Pressionar o botão de emergência baixa de novo as barras, mas estas expulsam a água restante.

10

Helicópteros debatem‑se para apagar o terrível incêndio no reator e limitar a radiação emitida.

Sarcófago

É construída velozmente uma cobertura em betão, colocada sobre o reator para limitar a libertação de radiação de Chernobyl.

1

6

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8

9 2

4 10

Mikhail Gorbachev, secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética e presidente do soviete supremo aquando do acidente nuclear de Chernobyl, alegou que este foi um fator crucial na extinção da URSS. A resposta do governo ao desastre foi tentar encobri‑lo tanto quanto possível, quase sem anúncios oficiais e sem avisos aos residentes das áreas circundantes em relação aos perigos do envenenamento por radiação. Só quando uma nuvem radioativa passou por cima da Suécia é que a notícia correu o mundo.

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Furiosos com a falta de informação e proteção recebidas, especialmente perante a promessa de Gorbachev de uma nova era de claridade e honestidade política, os cidadãos insurgiram-se contra o sistema político. O público perdeu a fé no governo e este, por sua vez, perdeu o controlo sobre o público. Cinco anos depois, a União Soviética foi dissolvida e Gorbachev terá afirmado: “O acidente nuclear em Chernobyl […] foi talvez a verdadeira causa do desmoronamento da União Soviética.”

Impacto do acidente

Quantas pessoas foram diretamente afetadas?

55 mil

6,4% morreram devido à radiação

150 mil

17,4% ficaram incapacitadas

655 mil

76,2% foram submetidas a supervisão médica

Quero Saber | 061

© Corbis; Thinkstock

O papel na queda da URSS


ARMAS & GUERRA 064 Espiões ao longo

074 Os mosqueteiros

As origens desta popular unidade militar que protegia soberanos queridos, da França à Índia.

da história

Os segredos da espionagem através do tempo.

070 O cerco de Tiro

076 A Batalha

de Azincourt

Investigue a épica conquista de Alexandre Magno.

080 No interior do

Projeto Manhattan

073 A metralhadora

Como e porque nasceu a arma mais poderosa que o mundo já vira?

Vickers

Espreite o interior do cano desta arma britânica letal.

Aríetes brutais

O conflito mais famoso da Guerra dos Cem Anos foi um dos mais sangrentos e brutais da História.

072 Aríetes brutais

Como eram construídas e usadas estas potentes armas de cerco?

072

084 O Sikorsky MH-60 Black Hawk

Como é que este helicóptero incrível revolucionou a guerra aérea?

074

Conheça os mosqueteiros

084

O MH-60 Black Hawk

062 | Quero Saber


O cerco de Tiro

070

Espiões ao longo da história

© Alamy; Science Photo Library; Thinkstock

076 A Batalha de Azincourt

064

Quero Saber | 063


ARMAS & GUERRA

ESPIÕES

AO LONGO DA HISTÓRIA Os segredos da espionagem através do tempo.

A

obtenção de informação confidencial, de documentos secretos a táticas militares, tem sido valiosíssima para soberanos, impérios e governos ao longo da história. A recolha secreta de informação sobre inimigos, e até mesmo aliados, conferiu às nações vantagens militares, políticas e económicas. A espionagem é a recolha de informação secreta, e os métodos utilizados mudaram muito com a evolução tecnológica. Na Roma Antiga, as cartas podiam ser intercetadas a caminho do seu destinatário. Para evitar que espiões inimigos lessem as suas comunicações militares secretas, Júlio César criou uma das primeiras cifras – um código utilizado para ocultar mensagens. No século XX, a espionagem foi especialmente importante durante as duas guerras mundiais, com nações a implementarem vastas redes de informação secreta, para se manterem um passo

064 | Quero Saber

à frente do inimigo. Crê-se que a descodificação das “indecifráveis” máquinas Enigma dos nazis (utilizadas para codificar mensagens) tenha ajudado a encurtar a Segunda Guerra Mundial em vários anos, poupando inúmeras vidas. Durante a Guerra Fria, com a ameaça de guerra nuclear entre os EUA e a União Soviética, dados secretos estratégicos foram vitais e afetaram táticas de ambos os lados. Para obterem informações, os espiões ocultavam gadgets em objetos comuns, de câmaras em botões de casacos a microfones em solas de sapatos. Ainda hoje, as operações de contraespionagem são incrivelmente importantes. Serviços de segurança de todo o mundo trabalham para proteger os seus cidadãos de ameaças a interesses nacionais, conduzindo operações de contraterrorismo e combatendo o cibercrime. WWW.HOWITWORKSDAILY.COM


SABIA QUE... Júlio César criou uma das primeiras cifras – um código utilizado para ocultar mensagens?

Quando o nível da água descia e deixava à vista na coluna a mensagem pretendida, o remetente baixava a sua tocha.

Telégrafo hidráulico Como enviavam os gregos antigos mensagens militares secretas entre cidades?

Como civilizações antigas obtinham informações secretas.

5 Descodificar a mensagem

Ao ver o sinal do remetente baixar, o recetor parava o fluxo de água da sua vasilha e lia a mensagem pretendida na coluna.

2 Sinal de fogo

O remetente ateava a sua tocha e abria a torneira da vasilha de água ao mesmo tempo, para que a coluna das mensagens começasse a afundar.

1 Vasilha de água

Cada mensageiro tinha uma coluna idêntica a flutuar num recipiente com água. A coluna dividia-se em segmentos, cada um representando uma mensagem predeterminada.

Espionagem à antiga

3 Intervir

O recetor também ateava a sua tocha e abria a torneira da sua vasilha, afundando assim ambas as colunas em simultâneo.

“Escutar conversas, intercetar mensagens e observar movimentos inimigos eram os principais métodos para reunir informações.”

Nas primeiras cidades da Antiga Mesopotâmia e do Egito Antigo, espiar era uma forma eficaz de reis e faraós vigiarem a população, bem como de descobrirem fraquezas inimigas. Os antigos egípcios recorriam a espiões da corte para encontrarem súbditos desleais, tendo ainda sido dos primeiros a desenvolver venenos para sabotagens ou assassinatos. Sem gadgets de espionagem ao seu dispor, escutar conversas, intercetar comunicações e observar movimentos inimigos eram os principais métodos utilizados para reunir informações úteis. Técnicas engenhosas foram desenvolvidas para assegurar que mensagens escritas permaneciam secretas, incluindo códigos e tintas especiais. Os antigos gregos dominavam a espionagem e o subterfúgio. O lendário conto do cavalo de Troia tornou-se símbolo das suas táticas militares astutas e enganosas. Desenvolveram ainda eficazes métodos de transmissão de mensagens importantes entre cidades, como um sinal de fogo conhecido como telégrafo hidráulico. Outra tática utilizada pelos gregos para evitar a interceção de comunicações passava por entalhar mensagens importantes em madeira e depois cobri-la com cera. A tábua de madeira era então enviada para um aliado, que derretia a cera para ler a mensagem. Um método mais macabro consistia em escrever no exterior de uma bexiga animal inchada, antes de a esvaziar e colocar num frasco. O documento podia então ser transportado às escondidas até ser aberto, insuflado e lido.

Os speculatores

de Júlio César

Rede mongol de espiões

A República Romana foi um período de fragmentação e rebeldia, não sendo fácil manter o poder. Muitos governantes contratavam guarda-costas, mas Júlio César percebeu a importância da vigilância secreta e utilizava espiões, ou “especuladores”, para obter informações sobre possíveis revoltas. Esta rede de reconhecimento mantinha César ao corrente dos acontecimentos nacionais e internacionais. Certas fontes sugerem Nem mesmo os “especuladores” de que César estaria a par do conluio do César evitaram o seu assassinato. Senado Romano para o assassinar.

Unidos sob a liderança de Gengis Khan, os mongóis eram uma das forças militares mais temidas dos séculos XII e XIII, à medida que avançavam tumultuosamente pela Ásia. Contudo, este poderoso exército deve o seu êxito a uma vasta rede de informação. Gengis Khan obtinha informações a partir de mercadores que conheciam bem as áreas que desejava conquistar. Estas informações permitiram aos mongóis identificar pontos fracos Informações de espiões ajudaram em territórios inimigos. os mongóis em novas conquistas.

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4 Baixar a tocha


ARMAS & GUERRA

Espionagem isabelina A última monarca Tudor criou uma rede de serviços secretos que a ajudou a manter-se no trono.

A rede de espiões isabelina reuniu informações sobre os preparativos da Armada espanhola.

Enquanto rainha protestante e sem herdeiros, Isabel I via o seu reinado ameaçado por aqueles que preferiam a católica Maria Stuart, rainha da Escócia. Correndo o risco de assassinato, a rainha estabeleceu uma rede de espiões que a protegia de dissidentes e desvendava conluios estrangeiros. O dirigente dos serviços secretos isabelinos era Francis Walsingham, um advogado protestante. Os espiões contratados eram das mentes mais brilhantes do país; académicos, cientistas e linguistas eram incumbidos de proteger a vulnerável monarquia. Progressos tecnológicos também ajudaram a rede de informação. Tinta invisível feita a partir de leite ou sumo de limão foi, então, utilizada pela primeira vez, permitindo que mensagens secretas fossem reveladas ao aquecer o papel sobre uma vela. A criptografia tornou-se mais elaborada, tendo a rede de espiões de ser capaz de escrever e de decifrar diferentes códigos. Várias conspirações para destronar ou assassinar a rainha foram desvendadas durante o seu reinado. A informação reunida pelos serviços secretos isabelinos terá, muito provavelmente, salvado a sua vida em diversas ocasiões. Por exemplo, após o seu aprisionamento, Maria Stuart manteve contacto com o mundo exterior, enviando mensagens codificadas aos seus aliados escondidas em barris de cerveja. Mal sabia ela que os barris provinham de um agente duplo ao serviço de Walsingham, que decifrou as mensagens e provou o seu envolvimento numa trama para matar Isabel. Os envolvidos, incluindo Maria, rapidamente foram detidos, julgados e executados por traição. Maria Stuart enviava mensagens secretas aos seus aliados utilizando estas cifras, mas os espiões de Walsingam decifraram-nas.

Espião-mor isabelino A encabeçar a rede de espionagem isabelina estava o secretário de estado Francis Walsingham. Com ameaças provenientes da Espanha católica, o protestante devoto Walsingham erigiu uma rede de espiões por toda a Europa – incluindo informadores em prisões e agentes duplos – com o intuito de reunir informações sobre as atividades dos católicos, bem como informações políticas e económicas. Para garantir a máxima eficácia dos seus agentes, Walsingham criou uma escola de espiões para treinar novos recrutas. Esta rede provou o seu valor para a segurança nacional ao deslindar várias tramas contra a rainha e ao fornecer informações sobre a armada espanhola nas vésperas da tentativa de invasão em 1588.

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Walsingham recebia £ 2.000 ao ano para executar as suas funções.

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SABIA QUE... Até 1943, o “Bombe” decifrou 84 mil mensagens da Enigma por mês?

Guerras mundiais Como táticas de espionagem foram usadas para tentar vencer a I e a II grandes guerras.

A Primeira Guerra Mundial pode ser recordada sobretudo como um conflito de trincheiras, mas, para lá das frentes, os espiões tiveram um papel crucial. Uma das mais bem-sucedidas redes de espiões de então dava pelo nome de código “La Dame Blanche”. Com mais de mil membros, a organização trabalhava para os britânicos, conduzindo valiosas missões de reconhecimento na Bélgica ocupada pelos alemães, espiando comboios, estradas e aeródromos. Os progressos aeronáuticos no início do século XX tornaram o reconhecimento aéreo crucial na guerra. Aviões alemães e franceses captavam fotos aéreas para estudar os movimentos das tropas. As forças secretas alemãs foram vitais para que as suas divisões avançassem na Frente Oriental. Ao obterem documentos secretos e intercetarem mensagens de rádio, as forças descobriam os planos russos.

Quando a Segunda Guerra Mundial começou, a espionagem era ainda parte instrumental do conflito. O serviço de informação militar alemão Abwehr foi especialmente eficaz durante a ocupação dos Países Baixos. O grupo capturou 52 agentes dos Aliados e 350 combatentes da Resistência – alguns mal aterravam de paraquedas. Ainda crentes de estarem a abastecer os seus aliados holandeses, os britânicos forneceram involuntariamente aos alemães 570 caixotes de armamento e munições. As famosas máquinas Enigma dos nazis foram usadas para salvaguardar as mensagens do seu exército. Para enviar um sinal, um operador digitava a mensagem e, depois, codificava-a usando uma série de rotores e transformando-a numa salgalhada de letras. Para descodificar a mensagem original na sua própria máquina, o recetor teria de saber os parâmetros exatos

A máquina Enigma

Circuitos

Os contactos de cada rotor estavam ligados, mas os cabos entre eles estavam trocados.

O que tornava as mensagens do dispositivo de encriptação nazi tão difíceis de decifrar?

Na parte frontal da máquina Enigma, um quadro de ligações permitia trocar pares de letras, aumentando o nível de encriptação.

utilizados pelo emissor. Estes eram alterados com frequência e uma típica máquina Enigma do exército podia ter mais de 150 milhões de biliões de parâmetros diferentes, sendo o código considerado impossível de decifrar. Porém, os britânicos acabaram por decifrá-lo, após equipas de matemáticos e descodificadores de Bletchley Park terem concebido um computador eletromecânico batizado Bombe, capaz de determinar os parâmetros das máquinas com base numa mensagem codificada intercetada. Segundo alguns historiadores, as informações obtidas pelos Aliados ao decifraram o código terão encurtado a guerra em dois anos.

“Uma típica máquina Enigma do exército podia ter mais de 150 milhões de biliões de parâmetros.” Espiões de guerra Os agentes duplos que passavam informações aos adversários.

Howard Burnham

Guias

Números ou letras neste aro serviam de guias para aplicar os parâmetros desejados.

Burnham, agente de informação do governo francês na Primeira Guerra Mundial, escondia equipamento de espionagem na sua perna de pau.

Contactos

Um cabo ia de cada tecla do teclado até um dos 26 contactos no rotor.

Mata Hari

A dançarina holandesa espiava para os alemães, até ser apanhada pelos franceses e condenada a fuzilamento em 1917.

Virginia Hall

Esta espia dos EUA durante a Segunda Guerra Mundial deu apoio, informação e treino a combatentes da Resistência e aos Aliados na França ocupada.

Substituição

Os cabos trocados alteravam as letras inseridas e as debitadas entre rotores.

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Número de rotores

Quantos mais rotores a máquina tivesse, mais eram os parâmetros possíveis.

Parâmetros

Os rotores podiam ser movidos manualmente para alterar os parâmetros.

A viver no Havai durante a II Guerra Mundial, o espião japonês passou informações ao seu país antes do ataque surpresa a Pearl Harbour.

Quero Saber | 067

© Look & Learn; WIKI

Takeo Yoshikawa


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Durante a Guerra Fria Após a Segunda Guerra Mundial, relações azedas alteraram a espionagem. Uma luta de décadas pelo poder entre EUA e URSS teve início após a queda do Terceiro Reich. As nações defendiam ideologias opostas – capitalismo versus comunismo – e desconfiavam das intenções uma da outra. A tensão aumentou com a entrada de ambas as potências numa corrida ao armamento e com a ameaça de uma devastadora guerra nuclear. A espionagem foi um dos principais métodos utilizados para tentar quebrar o bloqueio. Cada uma das superpotências estava determinada a levar a melhor, espalhando espiões por todo o mundo para obter informações sobre o inimigo. Uma das mais infames redes de espiões por detrás da Cortina de Ferro era o Ministério para a Segurança do Estado, conhecido como Stasi. A atuar em Berlim Oriental, a organização usava métodos brutais para monitorizar as atividades dos cidadãos na capital da Alemanha de Leste. Soldados da Stasi alvejavam cidadãos que saíssem da linha ou tentassem fugir para o ocidente.

“O Blackbird voava a uma velocidade mais de três vezes superior à do som.” Após a II Guerra Mundial, os EUA criaram os projetos Shamrock e Minaret, operações de espionagem para monitorizar toda a informação telegráfica que entrasse e saísse do país. Não obstante, vários foram os espiões a trabalhar nos EUA para os soviéticos que reuniram informações sobre armas nucleares, ações militares e novas tecnologias. O reconhecimento aéreo continuou a ser crucial em operações secretas. A CIA localizou mísseis balísticos soviéticos utilizando satélites espiões ao abrigo do Programa Corona. Após um piloto da CIA ser abatido ao sobrevoar a URSS num avião espião U-2, em 1960, os EUA consideraram demasiado arriscado continuar a usar estas aeronaves. Em resposta, foi criado o recordista SR-71 Blackbird, que voava a uma velocidade mais de três vezes superior à do som e atingia altitude suficiente para evitar a deteção por radar. O jato de reconhecimento tinha até uma tinta preta especial que absorvia ondas de radar.

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O avião espião SR-71 Blackbird podia atingir velocidades supersónicas para escapar a mísseis.

Equipamento de espionagem Descubra segredos inimigos, com estes dispositivos engenhosos.

Escutas em árvores

Armações venenosas

Equipamento de escuta incorporado em troncos artificiais interceta sinais de comunicação próximos.

Se for apanhado, ingerir a cápsula de cianeto escondida nos seus óculos impedi-lo-á de revelar segredos sob tortura.

Transmissor no sapato Com um dispositivo oculto na sola do sapato, pode gravar conversas em segredo.

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SABIA QUE... A sede do MI5, Thames House, contém 5 km de uma miniferrovia usada para transportar documentos em papel?

SER ESPIÃO NA GUERRA FRIA Tem o que é preciso para se infiltrar e descobrir segredos soviéticos?

1 Treino na CIA

Apenas os melhores recrutas são selecionados para serem agentes. Um curso intensivo, com tarefas físicas e mentais, revela quem está apto a ser um espião.

2 A vida de um espião

Para evitar despertar suspeitas, uma personagem e enquadramento credíveis são criados. Os melhores agentes parecem ter vidas absolutamente comuns.

O “Programa dos Ilegais” Em 2010, dez agentes russos foram detidos nos EUA. O interrogatório do FBI revelou que estavam nos EUA há anos, como “agentes adormecidos” – espiões que nem sempre estavam ativos mas residiam nos EUA, caso fossem precisos. Conhecidos como “Ilegais”, alguns destes espiões faziam-se passar por cidadãos norte-americanos, com nomes e passados falsos, detendo empregos normais. Haviam sido instruídos para estabelecer contacto com académicos e obter informações secretas que pudessem reportar à Rússia. Todos foram acusados de conspiração para agir como agente de um governo estrangeiro e foram entregues à custódia russa, numa troca de prisioneiros. Anna Chapman foi presa depois de uma operação do FBI a ter exposto como “agente adormecida”.

Espiões

procuram-se Como atuam as agências secretas na era da Internet.

3 Recolha de dados

4 Capacidade de descodificação

Os melhores espiões são bons descodificadores. Os agentes secretos soviéticos encriptam as mensagens, que têm de ser decifradas para revelar planos secretos.

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O principal objetivo é determinar as intenções da URSS em relação aos EUA. A informação obtida pode conferir uma enorme vantagem aos norte-americanos.

A maioria de nós partilha a sua vida com amigos e familiares nas redes sociais, o que cria problemas a potenciais espiões. As agências secretas esforçam-se por atuar eficazmente numa era em que identidades e histórias de vida são difíceis de falsificar. A maioria das pessoas deixa rastos da sua vida real online, sendo que software de reconhecimento facial pode recorrer a esses rastos para ligar um agente infiltrado à sua verdadeira identidade. Para tentar combatê-lo, os serviços secretos externos britânicos (SIS ou MI6) pretendem contratar quase mil novos funcionários até 2020. “A revolução da informação altera profundamente o nosso cenário de atuação. Dentro de cinco anos, haverá dois tipos de serviços secretos – os que entendem isto e prosperaram, e os que não”, defendeu o diretor do SIS, Alex Younger, em comunicado.

5 Quebrar a moral

A personagem do agente permite-lhe espalhar rumores para lá das linhas inimigas e inventar notícias falsas para desestabilizar cidadãos e lideranças.

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6 Evitar, ao máximo, ser capturado

Vauxhall Cross, em Londres, tem sido a sede do SIS (MI6) desde 1994.

Se o agente for apanhado, é o fim. A espionagem durante a Guerra Fria é uma ofensa séria, acarretando o risco de uma longa pena de prisão ou execução.

How It Works | 069


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O cerco de Tiro

Descubra como o avanço implacável de Alexandre Magno foi travado pela defesa determinada de uma cidade-estado.

D

ois anos após a conquista do império as negociações falhadas, preparou o ataque. A cidade era claramente inexpugnável pelos persa, em 332 a.C., o exército macedónio métodos de assalto tradicionais, pelo que enfrentou um dos seus maiores desafios Alexandre procurou estratégias alternativas. até então. À medida que Alexandre Magno Foi decidido que uma frota era afinal necessária avançava pela Fenícia, muitas cidades, e o rei enviou emissários para reunir uma. incluindo Biblos, Berytos (Beirute) e Sídon Os assaltos navais e a construção de uma renderam-se de imediato. Mas a cidade murada passagem em pedra, ou “molhe”, de Tiro, importante base naval persa, recusou a exigência de Alexandre de realizar um sacrifício no templo de Melqart – e o rei da Macedónia respondeu com um cerco à cidade. Tiro situava-se numa ilha a cerca de 1 km da costa e era rodeada por uma muralha espessa com 40 metros de altura. Todavia, tendo derrotado repetidamente o rei persa Dário III no campo de batalha, Alexandre estava confiante, mesmo com uma pequena força naval ao seu dispor. Os tírios favoreciam a neutralidade e, seguros dentro da sua cidade murada, não queriam ser arrastados para a guerra sangrenta da Macedónia contra o império aqueménida. Ultrapassar as ameias Furioso, Alexandre Bombardeamento pesado de exigiu a rendição catapultas faz ruir uma secção mas os tírios da muralha e a infantaria avança. recusaram; com todas

Anatomia de um cerco Como o exército de Alexandre venceu as formidáveis defesas de Tiro.

provaram ser demasiado para a cidade e as muralhas foram finalmente penetradas. Na brutal batalha que se seguiu, 10.000 residentes foram executados e outros 30.000 vendidos como escravos. A vitória demorou seis meses e demonstrou ser mais um exemplo das táticas militares implacáveis mas eficazes de Alexandre.

Evacuação de Tiro

Pressentindo o assalto, as mulheres e crianças da cidade são evacuadas para uma colónia na ilha de Cartago.

Torres de cerco em chamas

Torres de cerco com 45 metros de altura aproximam-se da muralha mas navios tírios avançam para a baía e disparam as suas armas de cerco, incendiando-as.

Molhe

Pilhando pedra e madeira das ruínas da antiga Tiro, engenheiros erguem uma passagem estreita sobre as águas pouco profundas.

Início da batalha

O molhe com 60 metros de largura funciona como ponte, colocando soldados e armas de cerco em linha de vista com as ameias.

“Os tírios não queriam ser arrastados para a guerra contra o império aqueménida.” 070 | Quero Saber

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SABIA QUE... Em criança, Alexandre Magno foi ensinado por Aristóteles, o famoso filósofo grego?

Alexandre, o faraó

Alexandria floresceu como cidade portuária, tomando o lugar de Tiro enquanto centro mercantil na região.

Tiro foi o último reduto persa na Fenícia a cair – e o caminho para o Egito abriu-se para Alexandre Magno. O jovem rei macedónio crescera com os relatos do esplendor do Antigo Egito e, depois de ver a Grande Pirâmide com os próprios olhos, navegou pelo Nilo abaixo até Mênfis. Os egípcios viram Alexandre como o seu salvador, que os libertou do domínio persa após séculos de repressão. Após a sua chegada, Alexandre foi declarado faraó e começou a adorar os deuses egípcios como formas de Zeus. Foi durante esta conquista que começou a ver-se seriamente como um semideus, à medida que o seu ego se impunha. Após fundar a cidade de Alexandria – e de batizá-la com o seu nome –, deixou o Egito em 331 a.C. e triunfou de forma decisiva sobre Dário e os persas na batalha de Gaugamela. Tendo sido declarado “Rei dos Quatro Cantos do Mundo”, Alexandre prosseguiu as suas conquistas, dirigindo-se para leste para tomar o Irão oriental e o norte da Índia. Morreu de paludismo em 323 a.C., com apenas 32 anos de idade.

Última posição

As últimas defesas tírias reúnem-se no norte da cidade mas são impotentes para travar os macedónios.

Vitória de Alexandre

O rei e respetiva família são poupados, tal como todos os que procuram refúgio nos templos. Mas Tiro pertence agora a Alexandre.

Bloqueio portuário

As defesas de Tiro lançam projéteis contra os soldados, matando muitos e abrandando o avanço macedónio.

Os tírios recusam desistir Pedregulhos lançados ao mar impedem os navios de chegar às muralhas e areia ardente é lançada sobre a infantaria.

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© DK Images; WIKI; Thinkstock

Forte resistência

Forçado a retirar, Alexandre muda de tática e convoca uma flotilha para bloquear os dois portos de Tiro, cercando a cidade.

Quero Saber | 071


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Aríetes brutais

Como eram construídas e usadas estas potentes armas de cerco?

O

s aríetes eram das máquinas de guerra mais comuns desde a antiguidade até à Idade Média, dando muitas vezes às forças ofensivas acesso à fortaleza ou cidade fortificada do inimigo. Um aríete típico consistia numa estrutura retangular com rodas a partir da qual um grande tronco de árvore era pendurado com cordas ou correntes. O tronco suspenso era então embalado para trás e para a frente dentro da estrutura até balançar com muita força. Ao colocá-lo frente a um obstáculo como um portão ou muralha, o aríete podia transferir muita energia para o alvo, destruindo muitas vezes a defesa. Contudo, para um aríete ganhar velocidade, era necessária uma equipa de soldados para o colocar em posição e controlar o seu movimento oscilatório – o que é difícil quando se está a ser alvo de armas de arremesso. Os aríetes incluíam por isso frequentemente coberturas de madeira triangulares revestidas com peles de animais molhadas. Este “escudo” protegia os soldados de ataques de projéteis diretos e também do fogo, apagando quaisquer setas em chamas. A era do aríete terminou muito graças à proliferação da pólvora e dos explosivos na Baixa Idade Média, com os soldados sapadores a usarem estes dispositivos incendiários para derrubar portões e muralhas mais depressa.

Teto

Uma placa de madeira coberta com peles de animais molhadas protegia os soldados de projéteis e também extinguia as setas em chamas.

Correntes

Devido ao imenso peso do tronco, corda espessa ou grandes correntes de metal eram tipicamente usadas para suportar a maioria da carga.

Cabeça

A extremidade do aríete podia ser talhada para ficar pontiaguda e era então revestida a aço – o que evitava que o tronco fendesse quando era batido contra portas ou muralhas.

Pegas

Aparafusadas à parte lateral do tronco, as pegas de metal permitiam direcionar melhor o aríete e aumentar o seu balanço. (Nos aríetes “portáteis” também eram usadas alças.)

Que outras armas eram usadas na guerra de cerco? Trabuco

Balista

Máquina de guerra capaz de lançar projéteis grandes contra alvos distantes, a balista era uma opção excelente para perturbar colunas de infantaria. Desenvolvida pelos antigos gregos, funcionava com molas de torção e enormes espigões de madeira impelidos a alta velocidade quando libertados a grandes distâncias. Foi reduzida ao longo dos séculos até se tornar manual.

Torre

Uma arma de cerco simples mas muito eficaz se usada corretamente, era literalmente uma torre de madeira móvel sobre rodas, que permitia às tropas escalarem muralhas inimigas com alguma segurança. Depois de subirem pela cavidade interna protegida, os soldados saíam com o descer de uma pequena ponte levadiça, carregando sobre as ameias inimigas.

© Thinkstock

Uma das armas de cerco mais úteis alguma vez criada, o trabuco tipo catapulta permitia que um exército bombardeasse as muralhas e edifícios interiores de uma cidade com enormes pedras, bolas de terra em chamas e até animais mortos (espalhando doenças e o pânico entre os habitantes). Mas os trabucos exigiam uma grande equipa para funcionarem eficazmente.

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SABIA QUE... A Vickers era bastante pesada e exigia uma equipa de seis homens para funcionar?

Gatilho de polegar

O artilheiro segurava nos dois punhos de madeira do tipo “pá de jardim” (“spade grips”) e deprimia o gatilho com o polegar. Se mantivesse o gatilho em baixo, a arma disparava até as munições se esgotarem.

Preparar, apontar, fogo!

Mira traseira

As miras da arma podiam ser graduadas até vários milhares de metros, com um alcance máximo de 4,1 km em disparos indiretos.

Uma engenharia inteligente evitava avarias ou mau funcionamento no calor da batalha.

Parafuso de enchimento da camisa de arrefecimento a água

Bloco de alimentação

Mira

Cano

Coronha do tipo “pá de jardim” Camisa de arrefecimento a água

Uma camisa de arrefecimento cheia de água era enrolada à volta do cano. Durante o disparo, a água evaporava, arrefecendo-o.

Alavanca de carregamento

Tripé

Boca

Uma melhoria face à metralhadora Maxim original, este dispositivo cónico aproveitava os gases que saíam pela boca, o que ajudava ao ciclo de ação da arma.

A alavanca de carregamento tinha de ser puxada atrás pelo artilheiro para carregar as primeiras munições, preparando a arma para o disparo. Depois, carregava-se e recarregava-se automaticamente.

Mola do carregador

Esta mola robusta era totalmente ajustável. Ao alterar a sua tensão, a cadência de disparo da arma podia ser aumentada ou diminuída.

Cinta de 250 munições

As munições de calibre .303 (7,7 mm) eram as usadas por norma durante a I Guerra Mundial.

A metralhadora Vickers

A

metralhadora Vickers obliterava campos de batalha, despachando mais de 450 munições por minuto. Entrou ao serviço a tempo de ser utilizada durante a I Guerra Mundial e serviu o exército britânico por mais de 50 anos. A chave do design era o facto de utilizar o poder da explosão do cartucho para recarregar e reengatilhar a arma após cada disparo. Ficou conhecido como um sistema de recuo, já que a força dos projéteis para a frente produzia uma força oposta – o recuo. A força gerada empurrava a culatra e o cano para trás, enquanto estavam engatados. Uma pequena lingueta metálica destravava então ambos os mecanismos quando

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se moviam para trás, antes de a mola voltar a empurrar o cano para a frente. O movimento retrógrado também ejetava o invólucro usado e um novo cartucho era carregado de modo automático, a partir da cinta de munições. Se o gatilho ainda estivesse em baixo, todo o ciclo recomeçava e outro tiro era disparado quase de imediato. Embora a Vickers fosse bastante pesada e exigisse uma equipa de seis homens para funcionar, era extremamente fiável. Estima-se que, durante um ataque britânico em 1916, dez Vickers dispararam mais de um milhão de munições em apenas 12 horas.

Homens do 5º Batalhão de Paraquedistas (escocês), 2ª Brigada de Paraquedistas, disparam uma Vickers de um telhado em Atenas, em 1944.

© WIKI

Espreite o interior do cano desta arma britânica letal.

Quero Saber | 073


ARMAS & GUERRA

Os mosqueteiros

Uma das unidades militares mais populares durante séculos, os mosqueteiros combatiam e protegiam soberanos queridos, da França à Índia.

O

s mosqueteiros eram uma versão inicial de soldados, armados com mosquetes. Eram uma ponte entre a infantaria tradicional – que lutava a pé e, tipicamente, corpo a corpo, com espadas – e os dragões, um tipo de cavalaria leve com armas de longo alcance. Esta posição garantia-lhes um nível de versatilidade e flexibilidade muito valioso no campo de batalha, tanto que as unidades de mosqueteiros estavam geralmente reservadas para a proteção da nobreza ou, em muitas nações ocidentais, da realeza. Apesar de, enquanto corpo, os mosqueteiros serem mais antigos (ver “A origem do mosqueteiro”), não surgiram na Europa até ao século XVI, com o conceito apenas a “pegar” em larga escala no início do século XVII. Apesar de esta época ter sido dominada pelos

Gravura prussiana de um mosqueteiro francês (à direita) do reinado de Luís XIV (1643-1715).

mosqueteiros franceses da Maison du Roi (a Casa Real do Rei da França) – nos quais se baseia a obra de Dumas Os Três Mosqueteiros –, a Espanha, Inglaterra, Rússia, Suécia, Polónia e até a Índia criaram unidades de mosqueteiros próprias neste período, que partiam para o campo de batalha com frequência. Os mosqueteiros, como unidade militar comum, desapareceram gradualmente em meados do século XIX, pois os avanços nas armas de fogo tornaram o mosquete obsoleto. Com a introdução da espingarda, que tinha mais alcance e velocidade, a unidade de atiradores pôde emergir, eliminando a necessidade dos mosqueteiros a cavalo – o que, juntamente com o declínio de muitas dinastias europeias, como o Antigo Regime francês, pôs um fim permanente a todas as unidades de mosqueteiros.

Como disparar um mosquete

1

Transporte

Ao marchar para a posição devida, o mosquete deve ser levado ao ombro, com o apoio seguro na mão.

2

Preparar

Quando é ordenado o disparo, o mosquete é colocado na diagonal e enchido com pólvora, depois uma bucha e a seguir uma bala, imobilizada por outra bucha.

3

Rastilho

Finalmente deitava-se pólvora na escorva e colocava-se a mecha, incendiada por uma pederneira.

4

Disparar

O mosquete era endireitado com o apoio sempre seguro e depois colocado no braço de suporte, apontado e disparado.

5

Retirar

O mosquete era retirado do apoio e segurado ao lado do mosqueteiro, que retirava então a mecha e aguardava novas instruções.

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SABIA QUE... Os Mosqueteiros do Rei combatiam tanto a pé como a cavalo?

O uniforme de um mosqueteiro Eis o equipamento essencial utilizado pelo famoso capitão dos Mosqueteiros do Rei, o conde d’Artagnan.

Chapéu

No Ocidente, os mosqueteiros começaram por usar chapéus decorativos simples, mas no início do século XIX estes evoluíram para elmos de metal – também decorados, muitas vezes com grandes plumas.

Bandoleira

Estes cintos com bolsos, bolsas ou sacos para munições eram um acessório comum dos mosqueteiros, para que estivessem sempre bem abastecidos no campo de batalha. Amarravam-se à volta da cintura ou do tórax.

Túnica

Muito mais elaboradas do que as da infantaria normal, as túnicas dos mosqueteiros e, mais tarde, as couraças, favoreciam a liberdade de movimentos sobre a proteção.

Mosquete

Capa

Saco de viagem

Como os mosqueteiros viajavam durante boa parte do seu serviço militar, cada um tinha o seu saco de viagem, onde guardava provisões e objetos pessoais.

Característica associada a versões mais anteriores dos mosqueteiros, a capa oferecia alguma proteção contra os elementos durante as viagens.

A origem do mosqueteiro Ao contrário dos mosqueteiros da Maison du Roi – a Casa Real francesa –, fundados em 1622 durante o reinado de Luís XIII, já existiam mosqueteiros no outro lado do mundo, na China, desde o século XIV. Na verdade, durante a Dinastia Ming (1368-1644), nenhum exército nacional estava completo sem várias divisões de mosqueteiros, com os soldados armados com mosquetes de mecha. Textos antigos indicam que estes mosqueteiros disparavam em linhas e, tipicamente, ajoelhados. Este desenvolvimento do conceito de mosqueteiros na China adveio da sua invenção e aperfeiçoamento da pólvora, com o mosquete a revolucionar as formas tradicionais de combate.

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Espada

Dado que os mosqueteiros eram treinados para combater a cavalo, como os dragões, e a pé, como a infantaria, tinham também uma espada, para lutas corpo a corpo.

Botas

As botas eram um elemento importante do uniforme de um mosqueteiro, tanto para comunicar a sua posição prestigiada, como para fornecer um bom apoio, tanto no solo como a cavalo (algumas tinham esporas).

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© Ian Jackson

Principal arma do mosqueteiro, o mosquete era fatal, mas incómodo de utilizar. O carregamento lento permitia apenas três disparos por minuto, no máximo.


ARMAS & GUERRA

Batalha de Azincourt O conflito mais famoso da Guerra dos Cem Anos, a Batalha de Azincourt foi uma das mais sangrentas e brutais da História.

A

Batalha de Azincourt é uma das batalhas mais famosas da Europa, ecoando ao longo dos séculos em registos históricos, canções e até representações em palco e em filme. A batalha em si fez parte da Guerra dos Cem Anos, um conjunto de conflitos que durou mais de um século (1337-1453) entre os reinos de Inglaterra e França, pelo controlo do trono francês. Os dois pretendentes ao trono eram a Casa de Valois, uma família nobre francesa da dinastia capetiana, que reivindicava o trono segundo a Lei Sálica, e a Casa da família Plantageneta, Angevina, que baseava a sua pretensão no casamento ancestral de Eduardo II de Inglaterra com Isabela de França. Estas

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contestadas pretensões levaram a uma série de batalhas brutais ao longo dos séculos XIV e XV, culminando na horrível Batalha de Azincourt, travada entre os reis Henrique V e Carlos VI, a 25 de outubro de 1415. A batalha em si foi uma enorme vitória inglesa sobre um exército francês em vantagem numérica – ver “Mapa da batalha” para um resumo completo – assente numa série de erros táticos dos franceses, comandados pelo Condestável Charles d’Albret, e uma série de jogadas táticas de mestre do rei Henrique V. Azincourt ficou na História francesa como uma das derrotas mais desastrosas, com cerca de oito mil soldados franceses mortos e centenas de feridos ou prisioneiros.

Por outro lado, as baixas inglesas foram de poucas centenas. Curiosamente, apesar de o conflito ter resultado numa tão óbvia e celebrada vitória inglesa, a batalha é atualmente lembrada pela sua representação vívida dos pontos de vista e consequências polarizadas geradas pela guerra em geral (para a visão de William Shakespeare sobre o conflito, veja a caixa “O virar da maré” na página 80). Existem várias razões para as opiniões serem tão divididas. A primeira deve-se à simples magnitude do número de vítimas e da forma como morreram. Os relatos falam de homens decapitados, cortados ao meio, com ossos desfeitos, esmagados, sufocados e com alguns dos principais órgãos retalhados

por setas. A batalha foi, sem dúvida, uma das mais sangrentas carnificinas jamais testemunhadas. A segunda razão, e provavelmente a mais pungente, é o facto de, apesar de Henrique ter ganho a batalha sendo mais tarde nomeado regente e herdeiro do trono francês – algo que perseguira toda a sua vida adulta –, faleceu antes de ser coroado, e os seus sucessores rapidamente perderam o trono e grande parte do território que ele tinha conquistado em França durante a sua campanha. Por último, apesar de as ações de Henrique terem sido, na altura, aceites como justificadas por cronistas franceses e ingleses, foram fortemente criticadas mais tarde, a nível moral e ético. Foi contestado não só o seu WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... O ator Kenneth Branagh representou Henrique V na adaptação de 1989 da peça de Shakespeare ao cinema?

© Alamy

Azincourt, atualmente. Seiscentos anos após a famosa batalha, o terreno continua a ser de campos lavrados, fator que muito contribuiu para a vitória inglesa.

Um embate de reis A Quero Saber coloca frente a frente os monarcas inglês e francês em contenda.

A linha da frente inglesa reúne-se na manhã de 25 outubro de 1415, dia da Batalha de Azincourt.

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Rei Carlos VI

direito a invadir, como também a decisão de executar quase todos os prisioneiros franceses capturados na batalha, que, apesar dos números incertos, ter‑se‑ão aproximado de, ou excedido, um milhar. De facto, as baixas francesas em Azincourt obliteraram largamente a sua aristocracia, com centenas de nobres (incluindo três duques, oito condes e um visconde), cavaleiros e até um arcebispo mortos no combate. Nesta edição, a Quero Saber examina os principais acontecimentos da batalha, analisa o contexto envolvente, destaca os intervenientes-chave e explora as ramificações que Azincourt teve nas esferas económica, social e política da Europa na Idade Média Tardia e nos tempos seguintes. WWW.QUEROSABER.COM.PT

Rei Henrique V

46

Idade (em Azincourt)

29

1368

Ano de nascimento

1386

Casa de Valois

Linhagem

Casa de Lancaster

4

Filhos

1

Católica

Religião

Católica

1380-1422

Reinado

1413-1422

Carlos V

Antecessor

Henrique IV

1422, em Paris

Morte

1422, no Bosque de Vincennes

Contexto: Com os cognomes de Bem-Amado e Louco, o rei Carlos VI governou a França por 42 anos, apesar de sucumbir frequentemente a ataques de doença mental (ver a caixa “O rei louco”, na página 81). Foi o primeiro filho do rei Carlos V e Joana de Bourbon. O seu reinado caracterizou-se por ceder território a poderes estrangeiros e criar lutas de poder na aristocracia francesa.

Contexto: O último dos grandes reis guerreiros da Idade Média, Henrique V reinou em Inglaterra durante nove anos e, nesse tempo, conseguiu expandir significativamente o seu império. O seu reinado foi caracterizado por conquistas militares e forte apoio político e financeiro do parlamento inglês e dos barões do país. Contudo, deixou Inglaterra em más condições financeiras.

Quero Saber | 77


ARMAS & GUERRA

MAPA DA BATALHA A Quero Saber localiza no mapa os principais eventos, táticas e o terreno deste famoso conflito. Contextualmente, os dois lados abordaram a Batalha de Azincourt de direções distintas – tanto literal como metaforicamente. Henrique estava em campanha em França desde 13 de agosto de 1415, tendo sitiado e conquistado a cidade portuária de Harfleur e percorrido centenas de quilómetros ao longo da Normandia. Assim, as forças inglesas estavam cansadas de lutar e marchar, faltava alimento e as doenças grassavam. Do outro lado, os franceses reuniram um grande exército durante a tomada de Henrique a Harfleur, em Rouen, tendo-se movimentado para bloquear a travessia do Rio Somme por parte de Henrique, na sua marcha para norte até ao reduto inglês de Calais. As forças francesas estavam menos cansadas, eram em maior número – com muitos nobres e soldados – e mais bem equipadas. Estes fatores fizeram com que acreditassem, compreensivelmente, que em caso de batalha certamente ganhariam. Após inicialmente ter sido impedido de atravessar o rio Somme, Henrique conseguiu por fim fazê-lo a sul de Péronne, em Béthencourt e Voyennes, e

continuou a sua marcha para norte. As forças francesas continuaram a perseguir os ingleses até 24 de outubro, quando os encontraram em Azincourt. Os franceses, contudo, não enfrentaram logo os ingleses, por estarem à espera da chegada de tropas de apoio adicionais. Assim, o primeiro dia decorreu sem incidentes, fazendo de 25 de outubro um dos dias mais famosos da história militar da Europa. Para um relato golpe a golpe da batalha, leia o nosso guia cronológico dos principais eventos, que podem ser seguidos diretamente no mapa da batalha.

Guia das unidades Franceses

Estandarte: Armas do reino de França

Ingleses

Homens (estimativa): 12.000 a 36.000

Homens (estimativa): 6.000 a 9.000

Arqueiros e infantaria: Azul n Cavalaria: Azul e branco n n Condestável Charles d’Albret: Azul escuro n Duque de Alençon: Roxo n Duque de Bar: Turquesa n Conde Fauconberg: Ciano n Conde Dammartin: Prateado n

O virar da maré

A reconstituição em drama da Batalha de Azincourt em Henrique V transmite mensagens contraditórias. A peça Henrique V de William Shakespeare (c. 1599) interessa pelos ambíguos pontos de vista polarizados da batalha, Henrique e a guerra em geral. Por um lado, o autor parece louvar a conquista militar e justificar a campanha de Henrique – sobretudo no famoso discurso do Dia de São Crispim, quando motiva os seus homens. Por outro lado, a peça mostra os horrores da guerra e acaba com um aviso de que, apesar de a vitória de Henrique lhe ter dado o trono francês, a longo prazo, o seu filho perdeu-o e a batalha foi, historicamente, muito inconsequente.

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Estandarte: Reais armas de Inglaterra Arqueiros: Triângulo vermelho ▲ Infantaria: Rosa n Cavalaria: Vermelho e branco n n Rei Henrique V: Castanho‑avermelhado n Duque de York: Laranja n Sir Thomas Erpingham: Verde n Barão Thomas de Camoys: Amarelo n

Guia da batalha passo a passo

Como é que Henrique V levou os ingleses à vitória?

1

Henrique avança para a linha da frente francesa, ordenando aos arqueiros para subirem a muralha defensiva de lanças no campo de batalha. Os franceses, desprevenidos, não conseguem atacar antes de ela ser restabelecida. Os arqueiros de arco longo, ao centro da primeira linha, começam a alvejar os franceses.

2

Enquanto a primeira linha francesa tenta organizar-se rapidamente para

um ataque frontal, Henrique ordena às brigadas de flanco dos arqueiros de arco longo para avançarem no terreno, entre as árvores, à direita e à esquerda, até poderem disparar dos dois flancos para o centro da tropas francesas. Como os arqueiros da frente, erigem muralhas.

3

O Condestável D’Albret ordena à linha da frente francesa para carregar sobre a inglesa. Recebem-na várias vagas de flechas que vitimam WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... Além de famoso pela sua mestria militar, Henrique V era também considerado um diplomata político astuto?

O que correu mal para os franceses Com base nas lições da História militar, avaliamos onde falhou a estratégia de Charles d’Albret e como os franceses podiam ter ganho a batalha. A boa utilização do posicionamento tático por Henrique e a má utilização do Condestável D’Albret foram essenciais para a vitória de Henrique. D’Albret, com uma força maior e menos cansada, teria ganho a batalha com alguns ajustes‑chave. Em primeiro lugar, se D’Albret tivesse atacado as forças de Henrique num terreno mais aberto, teria podido usar melhor a sua grande seleção de cavalaria, que, durante o confronto, não pôde flanquear as forças inglesas e foi forçada a atacar de frente. Em segundo lugar, D’Albret subestimou grandemente o dano que poderia ser infligido pelos arqueiros de arco longo ingleses – à altura, os melhores arqueiros do mundo. Assim, a cavalaria e a infantaria francesas foram continuamente alvejadas frontal e lateralmente

Nesse momento, os dois flancos de arqueiros ingleses largam as armas à distância e correm para a segunda linha francesa pela esquerda e pela direita.

muitos cavaleiros e soldados de infantaria enquanto cobrem o centro do campo de batalha. Nos flancos, os arqueiros ingleses atingem a linha da frente francesa de ambos os lados.

4

D’Albret e um número limitado da linha da frente francesa alcançam a muralha de lanças inglesa e iniciam o combate corpo a corpo, fazendo-a recuar. Os arqueiros de arco longo recuam e Henrique ordena à infantaria para avançar em direção aos franceses.

5

Começa a feroz luta corpo a corpo no campo de batalha, com sulcos de lama e ensopado. A combinação da lama densa e armaduras pesadas dos cavaleiros franceses faz com que milhares se atolem e fiquem exaustos, com as forças inglesas mais leves a funcionarem com mais eficácia.

6

D’Albret é subitamente morto no meio do confronto, caindo na lama. Entretanto, a segunda linha francesa avança para o centro da batalha, congestionando-a ainda mais. WWW.QUEROSABER.COM.PT

7

O Duque de York é morto por um golpe e perde-se no mar de soldados. Além disso, o irmão de Henrique – Humphrey, Duque de Gloucester – é ferido por um golpe na virilha. Henrique vai rapidamente para a sua posição e defende-o com o seu séquito pessoal – consegue-o, embora sofra um golpe na cabeça que lhe remove parte da coroa.

8

O Duque de Bar é morto quando as suas forças diminuem devido aos ingleses que os rodeiam. Vendo o desastre que se desenrola perante os seus olhos, o Duque de Alençon tenta alcançar os ingleses com um aviso de rendição. Contudo, uma flecha atinge-o na cabeça antes de o conseguir.

pelas unidades bem posicionadas de Henrique, dizimando as tropas antes de estas alcançarem sequer a linha da frente inglesa. Novamente, um terreno mais aberto evitaria isto. Em terceiro lugar, as forças de D’Albret – sobretudo os cavaleiros nobres do exército francês – possuíam armadura pesada. Apesar de esse equipamento proporcionar um maior grau de proteção no combate corpo a corpo, limitou gravemente o movimento e agilidade, algo que se tornaria fatal no campo de batalha central, movimentado e lamacento. Os relatos indicam que o terreno ficou tão difícil e encharcado que, quando os cavaleiros eram derrubados, a dificuldade em erguer-se era grande, quanto mais enfrentar as tropas inglesas, com armaduras mais leves e mais ágeis.

O rei louco

O rei Carlos VI não esteve em Azincourt por a corte o considerar instável, mas sê-lo-ia? O reinado de Carlos VI foi manchado por uma aparente doença mental, que se manifestou numa série de sintomas, desde acreditar que era feito de vidro até à completa paranoia e episódios violentos. Um destes episódios mais notáveis ocorreu durante uma marcha até à Bretanha, desde Paris, para castigar alguém que Carlos VI entendia ser um potencial assassino. Após ter sido avisado por um leproso que passava que devia regressar por ter sido traído, terá alegadamente gritado: “Avante contra os traidores! Querem entregar‑me ao inimigo!” E começou a ferir e matar vários dos seus guardas pessoais (ver imagem abaixo). Após ser finalmente puxado do cavalo, Carlos entrou em coma. Assim, e em particular no fim do seu reinado, ficou sobretudo confinado à sua residência em Paris e – por isso – não liderou as suas forças na Batalha de Azincourt.

9

A terceira linha de forças francesas hesita, no exterior da batalha, sem saber se deve combater. Henrique crê que o farão e, dado o grande número de presos franceses não agrilhoados na primeira e segunda vagas, ordena a execução de todos, exceto os de classe mais alta, evitando o rearmamento em massa e a derrota dos ingleses exaustos.

10

Vendo as vastas baixas e execuções, a terceira linha francesa, liderada pelos Condes Fauconberg e Dammartin, retira para a retaguarda, abandonando o campo de batalha. Henrique ganha a batalha e ordena uma contagem dos mortos, que revela cerca de oito mil baixas nas tropas francesas face a 450 do lado inglês.

Quero Saber | 79


ARMAS & GUERRA

No interior do Projeto Manhattan Em 1945, os EUA lançaram a arma mais poderosa que o mundo já vira.

A

palavra átomo significa “indivisível” mas, em 1938, cientistas alemães conseguiram o impensável. Dividiram um átomo, desencadeando um período intensivo de pesquisas que mudaria o mundo para sempre. A divisão do átomo, ou fissão nuclear, foi atingida bombardeando urânio com neutrões. À medida que as partículas colidiam com os átomos, os núcleos “separavam-se”, criando elementos mais leves e libertando mais neutrões no processo. Se estes neutrões pudessem ser aproveitados, podiam ser usados para dividir ainda mais átomos de urânio, iniciando uma reação em cadeia que podia tornar-se suficientemente poderosa para ser usada como arma. E, com o despontar da II Guerra Mundial, os físicos temiam que os Nazis fizessem isso mesmo.

080 | Quero Saber

Vários cientistas tinham fugido ao fascismo na Europa e chegado aos EUA, entre eles Leo Szilard, Albert Einstein e Enrico Fermi. Szilard queria avisar o presidente norte-americano sobre a descoberta, mas era um investigador júnior e precisava de um cientista mais sénior que o apoiasse, pelo que pediu ao colega Edward Teller que o levasse até Einstein, que então alertou o presidente Theodore Roosevelt. Roosevelt criou um comité consultivo sobre o urânio mas só em 1941 teve consciência do que podia estar em causa. Nesse ano, o Japão atacou Pearl Harbour, matando mais de 2000 soldados norte-americanos numa brutal emboscada aérea. Com sede em Nova Iorque e sob o nome Projeto Manhattan, o tenente-general Leslie R. Groves assumiu o controlo da pesquisa atómica. A equipa recebeu apenas $ 6000 para investigar a

guerra nuclear e o eminente físico Enrico Fermi começou a trabalhar na primeira fase. Ninguém acreditou que teriam sucesso. Fermi fugira de Itália ao deslocar-se à Suécia para receber o prémio Nobel; ao invés de regressar a casa, refugiou-se nos EUA com a esposa. Com o início do Projeto Manhattan, concentrou os seus esforços em conseguir uma reação nuclear em cadeia funcional e, com a ajuda de Szilard, construiu o primeiro reator nuclear do mundo, num court de squash sob o estádio da Universidade de Chicago. Para manter uma reação nuclear em cadeia, tinham de abrandar os neutrões, para que colidissem com mais núcleos de urânio e os dividissem. Alcançaram-no incorporando esferas de urânio em várias camadas de grafite. Finalmente, em 1942, conseguiram obter a reação WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... Mais de 20 vencedores do prémio Nobel estiveram envolvidos no Projeto Manhattan, incluindo Niels Bohr? mais de 1150 calutrões. Não havia tempo para testar a tecnologia em pequena escala e, quando ligaram a Y-12 pela primeira vez, os ímanes arrancaram alegadamente os pregos das paredes! Já em pleno funcionamento, a central atraiu 75.000 operários e, no final da guerra, Oak Ridge era a quinta maior cidade do Tennessee. Só os calutrões não chegavam para produzir urânio suficiente para construir uma bomba e os cientistas do Projeto Manhattan usaram um segundo método de enriquecimento para gerar mais combustível. A difusão gasosa, desenvolvida na década de 1940 no Reino Unido, combinava urânio com flúor, criando hexafluoreto de urânio. Este gás atravessava então uma barreira cheia de orifícios microscópicos – à justa para deixar passar as moléculas. As moléculas com o isótopo urânio-235 passavam em média um pouco mais depressa, permitindo a respetiva recolha. 300.000 m2 da barreira foram erguidos na central K25, no Tennessee, em 1943. No seu auge, a produção de combustível nuclear para o programa consumia um décimo da energia produzida nos EUA. Em dois anos, o Projeto Manhattan tornara-se um dos maiores O minério de urânio tem de ser altamente processado para extrair o isótopo certo necessário para criar uma bomba.

A 16 de julho de 1945, o mundo mudou para sempre. Na Experiência Trinity, uma bomba de 20 quilotoneladas batizada “The Gadget” foi detonada no deserto de Jornada del Muerto, no Novo México, lançando uma vasta nuvem de cogumelo para a atmosfera e transformando o solo abaixo em vidro. Baseava-se no mesmo design da Fat Man, a bomba que seria detonada sobre Nagasáqui. Continha plutónio encapsulado em explosivos, que se comprimia quando ativado, iniciando uma reação nuclear em cadeia. Ninguém sabia o que iria acontecer quando a bomba fosse detonada, pelo que foram colocados soldados nas cidades vizinhas para ajudar numa possível evacuação. Mas o teste foi considerado um sucesso e, menos de um mês depois, as bombas foram lançadas sobre o Japão.

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Leo Szilard

Natural da Hungria, o físico era amigo próximo de Einstein e foi o catalisador do Projeto Manhattan. Acabou por liderar uma petição contra o uso da bomba sobre cidades.

Robert Oppenheimer

Físico teórico e diretor da equipa de 3000 cientistas em Los Alamos, opôs-se mais tarde ao desenvolvimento da bomba de hidrogénio.

Enrico Fermi

Vencedor de um Nobel em 1938 pelo seu trabalho sobre a radioatividade, este físico italiano liderou o início do Projeto Manhattan. Construiu o primeiro reator nuclear do mundo.

Otto Hahn

O químico alemão Hahn descobriu a fissão nuclear, o que lhe valeu um prémio Nobel. Não fez parte do Projeto Manhattan, mas a sua ciência constituiu a base para a bomba.

Edward Teller

O húngaro-americano Teller liderou uma equipa na divisão de física teórica em Los Alamos. Forte apoiante das armas nucleares, ficou conhecido como “o pai da bomba de hidrogénio”.

“ Não havia tempo para testar a tecnologia em pequena escala.”

A 1.ª bomba atómica

As mentes por detrás da bomba

A Experiência Trinity abalou cidades por todo o estado.

Hans Bethe

Vencedor de um Nobel, dirigia a física teórica em Los Alamos. Trabalhou com Teller na bomba de hidrogénio mas mais tarde fez campanha pelo desarmamento nuclear.

Seth Neddermeyer

Neddermeyer era um físico norte-americano e foi o cérebro por detrás da configuração implosiva da bomba atómica Fat Man, lançada sobre a cidade japonesa de Nagasáqui.

James Chadwick

Chadwick era um físico inglês, vencedor de um Nobel pela descoberta do neutrão. Liderou a missão britânica de colaboração com o Projeto Manhattan.

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em cadeia e o governo norte-americano começou a investir dinheiro na pesquisa. O exército comprou terrenos no deserto em Los Alamos, no Novo México, sob o pretexto de precisar de um novo centro de treinos em demolições. As instalações foram colocadas sob o comando do físico Robert Oppenheimer e a equipa começou a calcular quanto combustível seria necessário para construir uma bomba. O minério de urânio contém diferentes isótopos do elemento radioativo; os átomos destas variantes têm números distintos de neutrões. A maioria do urânio existe sob a forma de urânio-238 mas, para construir uma bomba, os cientistas precisavam de urânio-235, pelo que era necessário um meio de separá-los. Os cálculos sobre a quantidade de combustível precisa pouco mais eram do que estimativas, mas quando Oppenheimer e a equipa pediram 200 kg de urânio (dez vezes mais do que aquele que acabaram por utilizar), Roosevelt aprovou $ 500 milhões de financiamento extra. Os primeiros dispositivos de separação para criar combustível de urânio foram concebidos por Ernest Lawrence, em Berkeley, na Califórnia. Chamados calutrões, eram espectrómetros de massa “ampliados”, que enviam átomos através de um íman. O urânio-235 é apenas ligeiramente mais leve do que o urânio-238 e, quanto mais leve for um átomo, mais o íman curva a sua trajetória, permitindo a separação. O processo era meticulosamente lento; cada calutrão só produzia 10 g de urânio-235 por dia. Construíram então a central de enriquecimento de urânio Y-12, em Oak Ridge, no Tennessee, com


ARMAS & GUERRA empreendimentos científicos de sempre, abrangendo várias cidades e empregando dezenas de milhares de pessoas, dos setores militar, científico e governamental. Mas os cientistas ainda não sabiam se as bombas iriam funcionar. Criar urânio que bastasse para apenas uma bomba já era suficientemente desafiante, pelo que não sobraria combustível para um teste; mas em 1941 o plutónio foi descoberto. Este elemento sintético radioativo podia ser produzido irradiando urânio em reatores nucleares e

potencialmente alimentar uma segunda bomba. Cientistas em Chicago conceberam reatores para gerar plutónio e mais de 60.000 operários foram encarregues da construção de uma nova central no deserto, em Hanford, Washington. Para a bomba de urânio, mais tarde batizada Little Boy, os cientistas basearam o design numa arma, disparando um pedaço de urânio contra outro para iniciar a reação em cadeia; para a bomba de plutónio, criaram uma camada exterior de explosivos que seriam detonados em torno de um núcleo de plutónio. As ondas de choque

fariam colidir os átomos de plutónio, desencadeando a reação em cadeia. A 12 de abril de 1945, Roosevelt morreu e, um mês depois, as forças nazis renderam-se, mas o Japão recusava-se a pôr fim à guerra – e o projeto dos EUA para desenvolver a bomba atómica prosseguiu. O presidente Truman tomou a decisão de lançar as bombas a 1 de junho e, em julho, realizou-se o primeiro teste em solo norte-americano, com a detonação de uma réplica da bomba de plutónio (Fat Man), que libertou o equivalente a 20.000 toneladas de TNT

A Little Boy

A bomba lançada sobre Hiroxima era uma arma de fissão de tipo balístico.

Neutrão

Quando um neutrão colide com um átomo de urânio-235, o átomo divide-se em dois.

Fissão

Quando o átomo de urânio se divide, liberta mais neutrões.

Detonador

Explosivos foram colocados atrás do projétil de urânio para dispará-lo pelo “cano da arma”.

Tentativa de travar a bomba “Bala” de urânio “Cano da arma”

O projétil de urânio seguia a alta velocidade até ao alvo de urânio, desencadeando a reação nuclear em cadeia.

Uma bala de urânio-235 com 26 kg estava acoplada a um detonador.

Reação em cadeia

Os neutrões atingem mais átomos de urânio, iniciando a reação em cadeia que alimenta a bomba.

Antena de radar

Refletor de neutrões Os componentes radioativos estavam encerrados num recipiente que refletia os neutrões, ajudando a manter a reação.

O físico e inventor Leo Szilard tinha sido o catalisador para o arranque do Projeto Manhattan mas, em 1945, Szilard e muitos outros cientistas estavam seriamente preocupados com as bombas que tinham ajudado a criar. Szilard redigiu uma petição dirigida ao presidente dos EUA, que dizia: “As bombas atómicas são sobretudo um meio para a aniquilação implacável de cidades... uma nação que estabelecer o precedente de usar estas recém-libertadas forças da natureza para efeitos de destruição pode ter de assumir a responsabilidade de abrir as portas a uma era de devastação numa escala inimaginável.” A petição foi subscrita por 70 cientistas do Projeto Manhattan mas, em abril de 1945, Roosevelt morreu. Szilard não sabia como fazer chegar a mensagem ao novo presidente e Truman nunca a viu antes de as bombas caírem.

A bomba estava equipada com um altímetro e uma antena, permitindo que fosse detonada à altitude certa.

Alvo de urânio O primeiro reator nuclear, em construção num court de squash em Chicago.

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Um gerador de neutrões estava encerrado numa esfera de urânio-235 com 36 kg.

Leo Szilard com Albert Einstein, antes do início do Projeto Manhattan.

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SABIA QUE... Oito prémios Nobel da Paz foram atribuídos desde 1959 a esforços pelo desarmamento nuclear?

ANTES

DEPOIS

Nagasáqui antes e depois da detonação da bomba atómica.

– um valor no topo das estimativas e que fundiu a areia do deserto, transformando-a em vidro. A 6 de agosto de 1945, Paul Tibbets embarcou no Enola Gay, batizado em homenagem à sua mãe, e sobrevoou Hiroxima com a Little Boy. 120.000 pessoas e mais de $ 2000 milhões foram precisos para criar as bombas atómicas e, em pouco tempo, 90% da cidade estava arrasada e cerca de 150.000 pessoas seriam mortas pela explosão ou pela radiação. Três dias depois, a Fat Man foi detonada sobre Nagasáqui, matando mais 75.000. O Japão rendeu-se a 15 de agosto de 1945. Oppenheimer, que liderou o Projeto Manhattan, afirmou: “Sabíamos que o mundo não seria o mesmo. Algumas pessoas riram, outras choraram, a maioria ficou em silêncio. Recordei uma passagem da escritura hindu Bhagavad-Gita. Vishnu tenta persuadir o príncipe a cumprir o seu dever e, para impressioná-lo, assume a sua forma com muitos braços e diz ‘Agora tornei-me a Morte, o destruidor dos mundos’. Suponho que todos pensámos isso, de uma forma ou de outra.”

“Sabíamos que o mundo não seria o mesmo.” – Robert Oppenheimer

Mais de dez por cento da energia mundial é hoje nuclear.

Grande plano dos tubos que levavam o urânio para o reator de Hanford.

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Após o fim da II Guerra Mundial, os EUA continuaram a conduzir testes nucleares. O mundo nunca vira uma arma capaz de uma destruição tão rápida e total, e, com a aurora da era atómica, vários países juntaram-se à corrida ao armamento nuclear, armazenando armas para dissuadir ataques de outras potências nucleares. A URSS, usando informação fornecida pelo espião Klaus Fuchs, testou a sua bomba atómica pela primeira vez em 1949, no Cazaquistão. O Reino Unido detonou a Hurricane em 1952, a França fez o mesmo com a Gerboise Bleue em 1960 e a China efetuou o primeiro teste em 1964.

Os EUA também se apressaram a desenvolver a bomba de hidrogénio, que detonaram em 1952 no oceano Pacífico, vaporizando totalmente a ilha de Elugelab. Utilizando mais informação de Fuchs, os soviéticos conceberam a sua versão, culminando numa explosão de 58 Mt em 1961. Em 1968, os EUA, a URSS e o Reino Unido acordaram um tratado de não proliferação, para limitar a disseminação das armas nucleares. Promoveram também a partilha de tecnologia nuclear pacífica a nível mundial, contribuindo para que a energia e a medicina nucleares chegassem a tantas pessoas quanto possível.

Quero Saber | 083

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O legado do Projeto Manhattan


ARMAS & GUERRA

Sikorsky MH-60 Black Hawk Concebido para operações especiais em ambientes hostis, este novo tipo de máquina de guerra foi construído para um novo tipo de campo de batalha.

D

os céus caóticos sobre a Somália durante a Batalha de Mogadíscio, em 1993, à operação secreta para eliminar Osama Bin Laden em 2011, os helicópteros Black Hawk estão entre as ferramentas mais letais e eficazes acessíveis a qualquer força militar moderna. Após as experiências na Guerra do Vietname nas décadas de 1960 e 70, as forças armadas dos EUA sabiam quão essencial era ter helicópteros multifunções robustos disponíveis. Não só eram úteis para transportar rapidamente os soldados de e para a frente de batalha, como podiam lá permanecer e fornecer apoio direto. Mas os helicópteros Huey existentes estavam desatualizados. Duas empresas norte-americanas, a Boeing Vertol e a Sikorsky, enfrentaram-se com os seus projetos concorrentes para um novo helicóptero de combate, com a segunda a conseguir finalmente o contrato, com o seu protótipo S-70. Desde que começou a voar, em 1974, um grande número de variantes foram produzidas, cada uma com o seu papel específico a desempenhar numa zona de combate. Diz-se, por exemplo, que a versão secreta “MH-X”, usada durante a missão para assassinar o líder da Al-Qaeda, estava equipada com tecnologia furtiva que a tornava praticamente indetetável por radar. A variante MH-60 aqui mostrada foi desenvolvida a partir do Black Hawk standard, o UH-60, para utilização em operações especiais. A autonomia efetiva foi grandemente aumentada, com a adição de um depósito de combustível mais eficiente, a instalação de sistemas para o reabastecimento aéreo e a melhoria da sobrevida global da aeronave. Foi durante uma operação especial que estes recursos foram submetidos ao teste definitivo – num incidente que ficou conhecido como “Black Hawk Down”.

084 | Quero Saber

O Black Hawk pode transportar vários tipos de armas e leva amiúde um artilheiro na porta para proteção em ambientes hostis.

No interior de um Black Hawk

A tecnologia de topo por detrás de uma máquina militar chamada MH-60.

Metralhadoras

Duas M134 Miniguns de alimentação elétrica, capazes de disparar, combinadas, 12 mil munições por minuto, podem ser montadas na aeronave.

“Os helicópteros Black Hawk estão entre as ferramentas mais letais e eficazes acessíveis a qualquer força militar moderna.”

Extras opcionais

Os Black Hawks podem ser equipados com mísseis antitanque Hellfire e lança‑mísseis, bem como depósitos de combustível adicionais, para missões de longo curso.

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SABIA QUE… O helicóptero presidencial dos EUA é uma variante do Black Hawk, o VH-60, conhecida como White Hawk?

A Batalha de Mogadíscio Motores gémeos

Dois motores General Electric garantem uma potência de eixo combinada de 3.988 cv, permitindo que o helicóptero atinja uma velocidade máxima de 280 km/h.

A 3 de outubro de 1993, uma missão de forças especiais dos EUA voou para Mogadíscio, capital da Somália, para capturar dois dos principais tenentes do autoproclamado futuro presidente Aidid. “Picaram” sobre a base do alvo com uma formação de helicópteros, com MH-60 Black Hawks a pairar acima para fornecer suporte. Quando duas destas aeronaves ficaram debaixo de fogo, despenharam-se no labirinto de ruas e ruelas de Mogadíscio. Aquilo que era suposto ser uma operação fácil depressa se transformou em caos, à medida que os soldados tentavam atravessar as ruas para alcançar os helicópteros abatidos e respetivos tripulantes. A batalha que se seguiu ficou conhecida como “Black Hawk Down”, graças ao livro de 1999 com o mesmo nome, adaptado ao cinema em 2001 por Ridley Scott.

Um Black Hawk sobrevoa Mogadíscio durante a “Operação Restaurar a Esperança”, um ano antes da Batalha de Mogadíscio.

A utilização de tecnologia de visão noturna (infravermelhos) permite aos pilotos conduzirem, em segurança, operações especiais em escuridão total.

Características de segurança

O depósito de combustível, trem de aterragem e fuselagem são todos reforçados para proteger a tripulação em caso de acidente. Até os assentos dos pilotos são concebidos para absorver e anular qualquer impacto crítico.

Radar

Para além de GPS, o MH-60 está equipado com radar multimodo capaz de monitorizar o terreno abaixo, mesmo com condições atmosféricas adversas.

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Visão noturna

Uma câmara de vídeo FLIR (forward looking infrared, ou câmara de infravermelhos virada para a frente) capta o ambiente circundante e transmite-o ao piloto, permitindo o voo seguro em escuridão total.

© Alamy; WIKI

Passageiros

Até 18 tripulantes podem ser transportados na parte de trás da aeronave, que tem uma autonomia operacional de mais de 2.200 km.

Quero Saber | 085


Escrita medieval

094

INDÚSTRIA & INVENTOS 088 Invenções

A origem das calças de ganga

arrepiantes

Criações tétricas com um lado escuro...

095

094 Escrita medieval Como criar uma pena.

094 Aparelhos auditivos Das cornetas acústicas do século XIX aos microchips.

095 As calças de ganga

Um clássico criado por dois imigrantes visionários.

096 O Colossus

O primeiro computador digital programável.

098 Ferrovias

de cremalheira

Um sistema único para subir encostas íngremes.

100 Heureca!

Dez descobertas acidentais que mudaram o mundo.

104 Os primeiros frigoríficos

Explore este eletrodoméstico revolucionário.

105 O gramofone

O som dentro de casa.

105 Fogo por arco

Fazer lume com fricção.

106 O Mecanismo de Anticítera

Este dispositivo antigo localizava com precisão estrelas e planetas.

107 O corvus

A “prancha” romana para a guerra naval.

088

Invenções arrepiantes 086 | Quero Saber

107 Portas automáticas Conheça o “autómato” de Herão de Alexandria.

108 Medir o tempo

Do simples relógio de sol ao preciso relógio atómico.

A evolução do tempo

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O computador Colossus

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100

Descobertas acidentais

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Ferrovias de cremalheira

Aparelhos auditivos

Š Alamy; Thinkstock

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Quero Saber | 087


INDÚSTRIA & INVENTOS

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As invencoesntes a i p e r r a da historia s i a m a roda à World Wide Web, o homem já criou alguns inventos verdadeiramente inovadores. Porém, ao longo da história, os inventores também utilizaram o seu engenho de formas horripilantes, criando equipamentos causadores de um sofrimento inimaginável. No passado, se cometesse um crime terrível, aguardava-o um castigo muito pior do que uma longa pena de prisão. Desde ferver pessoas vivas até serrá-las ao meio, os métodos de execução eram amiúde desenvolvidos para serem o mais cruéis possível. Estes eventos macabros eram

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por norma efetuados em público, para dissuadir as pessoas de seguirem as pisadas do acusado. Mesmo que não fosse condenado à morte, existiam vários modos sinistros de torturá-lo. Tipicamente usado para conseguir uma confissão ou informação sobre cúmplices, a tortura era popular na era medieval, com os gritos das vítimas a ecoarem das masmorras de castelos por toda a Europa. A guerra também inspirou uma vasta seleção de inovações horríficas. Enquanto armas de fogo e bombas eram concebidas para matar de forma

instantânea, as armas químicas podiam arrastar a morte por vários dias agonizantes – entretanto foram oficialmente proibidas. Também temos a sorte de alguns dispositivos médicos terem caído em desuso... Apesar de concebidos com boas intenções, muitos procedimentos medievais eram de revirar o estômago, tornando uma visita ao médico um autêntico suplício. Por isso, enquanto conduz o seu automóvel ou consulta a Web no smartphone, dê graças pelo facto de as inovações que usa não serem tão macabras quanto estas... WWW.QUEROSABER.COM.PT

© Corbis; Look & Learn

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Desde dispositivos de tortura brutais a tratamentos médicos bizarros, estes inventos tétricos revelam um lado mais escuro da inovação...


SABIA QUE… A última execução na guilhotina em França aconteceu há menos de 40 anos, em 1977?

5 Ouvir o touro a rugir

1 Através do alçapão A vítima era colocada dentro do touro de bronze oco através de um alçapão no dorso ou de lado.

Os clamores das vítimas saíam pelas narinas do touro, soando como o rugido do animal.

o r u o T de e z n o r B

4 Alterar os gritos

Uma série de tubos na cabeça do touro amplificava e distorcia os gritos das vítimas.

O calor do fogo transformava o touro num forno, “assando” lentamente o condenado no interior.

s os grito r a m r o Transf ribundos no dos moda besta. rugido

2 Acender o lume A porta era fechada e uma fogueira era acesa sob a barriga do touro.

ou de Fálaris, também servia de instrumento musical, convertendo os gritos desesperados das vítimas naquilo que Périlo descrevia como “o mais tenro, patético e melodioso dos mugidos”. Desconfiado das alegações do inventor, Fálaris ordenou a Périlo que entrasse no touro e

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Um dos métodos mais brutais de execução já criados tinha a forma de uma estátua oca de um touro. Inventado na Grécia Antiga por Périlo de Atenas, que trabalhava o bronze, foi uma oferenda a um tirano cruel chamado Fálaris de Agrigento. Além de assar criminosos vivos, o Touro de Bronze,

Crucificacao Imaginada há mais de 2.500 anos como punição para os crimes mais graves, a crucificação matava as vítimas de uma forma horrivelmente dolorosa e prolongada. Com os pulsos e os pés pregados ou firmemente amarrados a uma cruz, e as pernas partidas pelos carrascos para tentar acelerar a morte, o peso da vítima era transferido para os braços – puxando gradualmente ombros e cotovelos para fora das articulações, e deixando o tórax a aguentar o peso. Apesar de a inalação ainda ser possível, exalar seria difícil e a vítima acabava por sufocar devido à falta de oxigénio. Este processo excruciante podia demorar 24 horas. A crucificação conduzia à asfixia e falência múltipla de órgãos.

Ilustração por Tom Connell / Art Agency

3 Fogo lento

demonstrasse as ditas capacidades musicais. Assim que entrou, Fálaris fechou a porta e acendeu uma fogueira sob o touro, levando Périlo a gritar a sério! Mas ao invés de deixá-lo morrer às mãos da sua própria criação, Fálaris mandou remover Périlo... e atirá-lo de uma falésia.

Luís XVI e Maria Antonieta foram ambos executados em público utilizando a guilhotina.

Guilhotina Embora os métodos de decapitação já existissem há séculos, em 1789, o médico francês Joseph Guillotin propôs um dispositivo alegadamente muito mais eficiente e humano de degolação. Quando o carrasco libertava a corda que mantinha presa a lâmina com contrapeso da guilhotina, esta caía sobre o pescoço da vítima, matando-a numa fração de segundo. O sistema ajudava a eliminar o erro humano comum nas decapitações com machado ou espada, que por vezes exigiam que o carrasco desferisse múltiplos golpes de modo a remover por completo a cabeça. Apesar de rápidas, as execuções na guilhotina eram eventos públicos populares durante a Revolução Francesa e os carrascos considerados celebridades nacionais.

Cadeira eletrica A eletrocussão foi introduzida como meio mais rápido e supostamente menos doloroso de execução, face à forca, na década de 1880. Quando o condenado era levado para a cadeira elétrica, era amarrado pela cintura, braços e pernas, e a cabeça e uma das barrigas das pernas eram rapadas, para reduzir a resistência à eletricidade. Uma esponja humedecida era então colocada sobre a cabeça e um elétrodo com a forma de calota craniana era fixado no topo. Outro elétrodo era colocado na perna rapada e depois a energia era ligada – 2.000 volts a atravessar o corpo, paralisando o sistema respiratório e provocando uma paragem cardíaca. A eletrocussão ainda é utilizada como método de execução nalguns estados dos EUA.

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No e d r o i r inte amara uma cura de tortos

Muitos prisioneiros diziam qualquer coisa para acabar com o sofrimento. 1

anism e infligiam c e m s O ores qu aterrad aginável. dor inim A tortura é utilizada como método de punição e interrogatório há séculos; os antigos gregos e romanos torturavam os criminosos com regularidade como parte do seu sistema de justiça. Todavia, na Idade Média, a tortura tinha-se tornado particularmente prevalente, sobretudo como resposta a crimes de traição. Se tivesse sido desleal ao seu soberano e ao país, toda uma pletora de dispositivos de tortura horrendos o aguardava. A tortura era por norma aplicada de forma secreta; a maioria dos castelos medievais tinha masmorras subterrâneas onde estes atos hediondos tinham lugar. Uma grande dose de engenho e capacidade artística era colocada no desenvolvimento de instrumentos que infligiriam a máxima quantidade de dor. Muitas vezes, a mera ameaça de utilização era suficiente para levar a pessoa a confessar, enquanto outros cediam rapidamente depois de ver o instrumento utilizado noutro prisioneiro. Alguns instrumentos de tortura eram concebidos apenas para infligir dor, mas outros resultavam numa morte lenta e arrastada que prolongava o sofrimento da vítima até ao último estertor. Mesmo que um prisioneiro tivesse a sorte de sobreviver à tortura, ficava por norma gravemente desfigurado e tinha de ser carregado para o julgamento por já não conseguir andar sozinho. A partir de meados do século XVII, a tortura tornou-se muito menos comum devido à especulação sobre a sua eficácia. Muitos prisioneiros diziam qualquer coisa para pôr fim ao sofrimento, o que produzia amiúde informação imprecisa e falsas confissões. Só em 1948 a Assembleia-geral da ONU adotou a Declaração Universal dos Direitos do Homem, banindo a tortura.

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1 Roda de despedacamento Com os membros da vítima amarrados aos raios desta grande roda de madeira, a roda era girada lentamente. Enquanto rodava, o carrasco desferia golpes nos braços e pernas do prisioneiro com um martelo de ferro, fraturando os ossos um a um. Se sobrevivesse, era colocado no topo de um mastro, para ser bicado por aves até morrer de desidratação, o que podia levar vários dias.

2 Cavalete Com as mãos e pés amarrados a cilindros em cada extremidade do cavalete, ou potro, a vítima era sujeita a um intenso interrogatório. Se não confessasse os seus crimes ou fornecesse a informação pretendida, era acionada uma manivela para girar os cilindros, o que puxava as cordas, esticando gradualmente o corpo da vítima e causando dor intensa, e, por fim, deslocando-lhe os membros.

3 Dama de ferro Uma série de espigões projetava‑se do interior desta câmara de ferro. Com a vítima lá dentro, a porta era fechada lentamente, levando os espigões estrategicamente posicionados a perfurarem o corpo – mas não eram suficientemente longos para serem fatais instantaneamente, pelo que a vítima esvaía-se em sangue até morrer.

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SABIA QUE… Guy Fawkes foi torturado durante três dias após a sua tentativa falhada de explodir o Parlamento britânico em 1605?

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4 Emaga-cabecas Com o queixo da vítima sobre a barra de baixo e a cabeça sob a calota metálica, o carrasco girava lentamente o parafuso para as aproximar, apenas parando se a vítima fornecesse as respostas desejadas. À medida que a cabeça era esmagada, os dentes estilhaçavam-se para dentro dos maxilares e os olhos saíam das órbitas.

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5 Anjinhos Usados como castigo ou método de extração de informação, os dedos da vítima, polegares ou dedos dos pés eram colocados entre duas barras metálicas horizontais. Quando o parafuso era girado, as duas barras eram apertadas, esmagando os dedos. Alguns anjinhos tinham até espigões de metal nas barras para aumentar a dor.

6 Pera da angustia

7 Garfo dos Hereges

8 Aspersorio de chumbo

Este instrumento era inserido num dos orifícios da vítima, como a boca. Quando a chave ou manivela eram rodadas, as “pétalas” da extremidade em forma de pera abriam-se lentamente, mutilando dolorosamente as entranhas da vítima, sem causar a morte.

Por norma reservada aos blasfemos, esta vara de metal com dois dentes em cada ponta era amarrada a uma faixa de couro em torno do pescoço da vítima. Uma extremidade perfurava o queixo e a outra o esterno, causando imensa dor caso tentasse mover a maxila ou pescoço e basicamente impossibilitando a fala.

Concebido falaciosamente para parecer um aspersório de água benta, este dispositivo era enchido com chumbo fundido, ácido, ou água ou óleo a ferver. A longa pega era abanada para aspergir o corpo da vítima com uma dessas substâncias – o que causava queimaduras horríveis e era potencialmente letal.

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as que em. c i d é m ue b icas As prát mais mal do q faziam Hoje, quando nos sentimos mal, podemos dirigir-nos a um hospital e receber tratamentos testados e comprovados, administrados por um médico com anos de formação. Tomamos amiúde a medicina moderna como garantida, mas os nossos antepassados, ao longo da história, não tiveram a mesma sorte no que toca a cuidados de saúde. Na Europa medieval, por exemplo, a falta de higiene e as condições de vida imundas tornavam a doença muito comum. Porém, com pouco conhecimento da anatomia humana, muitas doenças eram atribuídas à feitiçaria, demónios, à vontade de deus ou até às posições dos corpos celestes. A trepanação, que implicava abrir um buraco no crânio do doente, era um tratamento popular prescrito para que os maus espíritos encurralados causadores da doença escapassem... Outros acreditavam que as doenças eram geradas pelo desequilíbrio dos fluidos corporais, pelo que as sangrias – drenar o sangue de uma dada parte do corpo – eram vistas como a solução para restaurar o normal funcionamento. Os “médicos” que realizavam estes procedimentos eram muitas vezes monges, com um conhecimento médico básico, ou barbeiros e talhantes – que simplesmente tinham as ferramentas necessárias. Os utensílios muito raramente eram esterilizados; pouco se sabia sobre a contaminação e os procedimentos eram realizados sem anestesia. Não admira que as pessoas adiassem os tratamentos o mais possível!

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Tratamentos tetricos Instrumentos e procedimentos médicos horripilantes do passado.

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a n i c i Med avel r e s i m

Trepanacao Usada para tratar:

Cefaleias, apoplexias, distúrbios mentais

A trepanação é uma das práticas cirúrgicas mais antigas, com vestígios a datarem de tempos pré-históricos. Implica perfurar um orifício no crânio, para aliviar a pressão.

Chave de Garengeot Usada para tratar:

Dor de dentes

Para remover um dente estragado, a extremidade em garra da chave de Garengeot era fixada em torno do dente e depois todo o dispositivo era rodado como uma chave numa fechadura para extraí-lo.

Sanguessugas artificiais Usadas para tratar:

Várias infeções e doenças

Utilizadas em sangrias, um tratamento popular para uma vasta gama de problemas, estes dispositivos imitavam a ação das sanguessugas reais, com lâminas rotativas que cortavam a pele enquanto um vácuo no cilindro sugava o sangue.

Litotomo Usado para tratar:

Cálculos urinários

Com o doente acordado, o litótomo era inserido pela uretra acima até à bexiga para apanhar pequenos cálculos urinários ou cortar os maiores, para serem depois expelidos naturalmente.

Osteotomo Usado para tratar:

Infeções nos braços ou pernas

Em vez de abater árvores, esta “motosserra” primitiva era utilizada para amputar membros. Ao contrário do escopro e martelo, o osteótomo com manivela de dar à mão conseguia cortar (serrar) ossos sem os lascar.

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SABIA QUE… Soldados da I Guerra Mundial descreveram o cheiro do gás de cloro como uma combinação de pimenta e ananás?

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s uímica q s a m r sa orrida àconflito. c a o m o Co a face d u o d u m

CI2 Cloro

Com a aparência de uma nuvem verde pálida com um odor intenso a lixívia, o gás de cloro reage com a água nos pulmões, formando ácido clorídrico. O ácido causa lesões no tecido pulmonar, gerando tosse, vómitos e, por fim, a morte.

A 22 de abril de 1915, a Alemanha chocou o mundo ao lançar o primeiro ataque de larga escala com gás numa guerra. Após esperarem várias semanas até que o vento soprasse na direção certa, os soldados alemães libertaram nuvens de gás de cloro perto das trincheiras inimigas em Ypres, asfixiando as incautas tropas aliadas. Embora a Convenção de Haia de 1899 proibisse a utilização de armas venenosas, a Alemanha justificou as suas ações argumentando que a França já quebrara a proibição ao lançar granadas de gás lacrimogéneo em 1914. O ataque com gás de cloro iniciou uma corrida às armas químicas e, no final da

COCl2 Fosgénio

I Guerra, cerca de 50 químicos diferentes tinham sido usados no campo de batalha. Os mais prevalentes foram o cloro, o fosgénio e o gás mostarda, que resultariam em mortes lentas e dolorosas em caso de exposição a quantidades suficientemente grandes. Por fim, máscaras de gás foram desenvolvidas, mas substâncias como o gás mostarda ainda podiam provocar bolhas horríveis quando em contacto com a pele. Entre as armas químicas mais devastadoras estão os agentes nervosos como o sarin, que atacam o sistema nervoso. Mesmo pequenas concentrações podem ser fatais, matando em minutos.

C4H8Cl2S C4H10FO2P

Este gás incolor com um odor bafiento reage com proteínas nos alvéolos pulmonares, o que leva ao surgimento de fluidos nos pulmões e, por fim, à asfixia; mas os sintomas podem levar 48 horas a manifestar-se.

Gás mostarda

Com cheiro a alho, rábano ou enxofre, as nuvens amarelas-acastanhadas do gás mostarda causam queimaduras químicas na pele, olhos e trato respiratório, conduzindo a grandes bolhas, cegueira temporária e falta de ar.

Sarin

Incolor, inodoro e insípido, este gás bloqueia a normal comunicação entre os nervos. Os sinais nervosos ficam “fixados” e os músculos não conseguem relaxar – o que pode conduzir a espasmos, paralisia e asfixia.

O Protocolo de Genebra No final da I Guerra Mundial, mais de 125 mil toneladas de gás venenoso tinham sido utilizadas em combate. Embora tenham sido responsáveis por menos de um por cento de todas as fatalidades da guerra, o terror psicológico infligido nos soldados era imenso. A 17 de junho de 1925, sete anos após o fim da guerra, o Protocolo de Genebra foi introduzido, proibindo a utilização de armas químicas e biológicas. Já foi subscrito por 138 estados.

O napalm é um líquido inflamável com uma consistência similar à de um gel, o que lhe permite aderir facilmente a superfícies. Numa bomba, é combinado com gasolina ou combustível para aviões para explodir no impacto, capaz de arder a mais de 2,760 graus Celsius. Mesmo o mais leve contacto com a pele pode causar queimaduras graves e até morte por asfixia. Uma vez inflamado, o napalm gera monóxido de carbono e remove oxigénio do ar, sufocando quem estiver nas proximidades.

Fogo grego Desenvolvido pelos gregos bizantinos no século VII, o fogo grego era uma arma incendiária, um líquido inflamável que podia arder na água, o que o tornava particularmente eficaz na guerra naval. Este fogo líquido era vaporizado sobre o inimigo utilizando lança-chamas primitivos ou lançado em granadas primitivas, criando um incêndio violento que apenas podia ser extinto com areia, vinagre ou urina. Os ingredientes são um mistério, mas cientistas creem que podia conter petróleo, enxofre e alcatrão vegetal.

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© Alamy; SPL; WIKI; Dreamstime

Napalm

Trinta e oito estados subscreveram originalmente o Protocolo de Genebra para banir o uso de armas químicas. Os fogos de napalm queimam oxigénio no ar, transformando o dióxido de carbono em monóxido de carbono.

O fogo grego era o napalm do seu tempo, mas os seus ingredientes permanecem um mistério.


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Utensílio de escrita medieval Porque é que utilizámos penas para escrever durante mais de 1300 anos?

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ntes da invenção da caneta, a maior parte das pessoas escrevia com penas. Eram penas arrancadas a aves, por norma gansos. As penas de cisne eram muito procuradas, mas as de ganso, corvo, coruja e peru eram mais fáceis de conseguir.

As penas eram fáceis de obter, confortáveis de segurar e aguçadas a tal ponto que, quem escrevia, conseguia desenhar todas as curvas e linhas delicadas de uma caligrafia elegante. O primeiro registo da sua utilização data de cerca do séc. VI, por monges europeus, substituindo as canas que usavam até então.

As penas eram arrancadas, enterradas em areia quente para endurecerem, tornadas ocas e cheias com tinta. O processo era moroso e as penas tinham de ser reenchidas e remoldadas regularmente, mas foram o principal utensílio de escrita até a caneta de metal se tornar popular, em meados do século XIX.

Como criar uma pena

Recue no tempo até à Idade Média e escreva com um destes utensílios de origem aviária.

Prepare a pena

Procure, junto a um rio ou lago, uma pena que possa ter sido largada por um cisne ou ganso. O ideal é ter cerca de 15 cm de comprimento e estar inteira. Com um x-ato, apare muito cuidadosamente a penugem na extremidade pontiaguda. Já deverá conseguir segurar o tubo/cálamo sem tocar em penas. Mergulhe a pena numa taça de água e deixe-a ensopar durante a noite.

Aparelhos auditivos

Endurecer e moldar

Aqueça areia no forno a 175 °C e enterre nela a pena – use luvas para não se queimar. Espere que a areia arrefeça e retire a pena endurecida. A cerca de 2,5 cm acima da ponta, corte a um ângulo de 45 graus até ao bico da pena. Faça um corte pequeno e plano no lado oposto. Deverá ficar com duas pontas afiadas no bico, que tem de juntar.

Remate final

Apare o bico para ficar macio e deverá ficar com a pena afiada até à ponta. Mergulhe-a na tinta e ela deverá absorver o líquido de escrita. Deve ter suficiente para escrever algumas linhas; depende se juntou muito as pontas do bico. Quanto mais apertadas estiverem, mais tinta retêm. Retire-as da tinta e comece a escrever como um copista medieval!

Os primeiros aparelhos auditivos eram tudo menos discretos.

Das cornetas acústicas do século XIX aos microchips.

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© Thinkstock; Ed Crooks; Getty

mbora possam parecer saídas de desenhos animados, as cornetas acústicas eram frequentemente utilizadas no início do século XIX. O primeiro tipo de aparelho auditivo tinha uma área grande que amplificava o som e era inserido no ouvido. As cornetas acústicas eram feitas de metal, prata, madeira ou chifres de animais, e eram muito volumosas. Contudo, com a sua utilização cada vez mais generalizada, passaram a ser desmontáveis, para caberem nos bolsos e serem removidas sempre que necessário. As cornetas acústicas eram tão populares que até as parteiras usavam um instrumento similar para ouvirem os ventres das grávidas. WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... A Levi’s (Levi Strauss & Co) foi fundada em maio de 1853, por Levi Strauss, em São Francisco, Califórnia?

A ganga através das décadas Rockabilly

Como se alterou o estilo das calças ao longo dos anos? 1950

De cintura descaída

1960 À boca de sino

1970 Pré-lavada IMAGEM PRINCIPAL: lenhadores no Oregon, EUA, com calças de ganga da Levi’s, em 1880. EM BAIXO: um anúncio de 1874 dirigido à classe operária.

As calças de ganga

De cintura subida

1980

A história “arrebitada” de dois imigrantes visionários que criaram um clássico.

seu fornecedor de tecidos, Levi Strauss. Natural da Baviera, Strauss também viajara para os EUA em busca de fortuna e viu potencial na criação de Davis. Os dois receberam uma patente em 1873 e depressa as calças de ganga eram usadas em fábricas, quintas e minas por todo o país. O índigo foi escolhido para tingir as calças por ser escuro (escondia as nódoas), não penetrar nas fibras do tecido – e porque era barato. Quando a patente expirou, em 1908, dezenas de imitações inundaram o mercado; nas décadas seguintes, eram usadas por homens e mulheres de todas as classes. Os adolescentes começaram a chamar-lhes jeans em vez de “jardineiras” e os fabricantes adotaram oficialmente o termo na década de 1960. Hoje, a sua popularidade é tão duradoura como o modelo original rebitado.

1990 Skinny

2000 Jeggings

2010

5 factos fascinantes “Denim jeans” é uma expressão errónea

No final do século XVIII eram produzidos os tecidos de algodão denim e jean. O denim, originário de Nimes, França, era mais durável e espesso do que o jean, usado para fabricar calças de trabalho em Génova, Itália.

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Quase foram banidas

As calças de ganga ganharam uma aura de rebeldia depois de surgirem em filmes como Fúria de Viver. As escolas começaram a bani-las e a Levi’s lançou uma campanha com um jovem aprumado de calças de ganga e o slogan “Right for school” (certas para a escola).

Levi não era o nome verdadeiro

Batizado Löb Strauß, Levi Strauss alterou o seu nome (tal como o seu futuro parceiro de negócios, Jacob Davis) após emigrar para os EUA, onde fundou uma loja grossista de produtos secos, em São Francisco.

Ganga ou sarja?

Quando Strauss e Davis começaram a produzir as suas icónicas calças em massa, fabricaram dois tipos: umas em ganga azul e as outras em sarja castanha – um tecido de algodão resistente semelhante às lonas usadas para cobrir os vagões de carga.

Duradouras

O acervo da Levi Strauss & Co inclui dois pares de calças de ganga que remontam ao final da década de 1870 ou início da de 1880; crê-se que são as mais antigas que existem. Só duas pessoas sabem o código do cofre à prova de fogo que as protege.

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© Ilustração por Jo Smolaga; Getty; Alamy

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s calças de ganga são uma peça de vestuário essencial em todo o mundo, mas as suas origens são humildes. No final do século XIX, a corrida ao ouro estava ao rubro nos EUA e Jacob Davis, imigrante letão, trabalhava como alfaiate no Nevada. Vendia roupa a mineiros e operários locais, que precisavam de materiais fortes e duradouros para o seu trabalho. Foi aí que Davis descobriu o “seu” ouro. Ao fixar pequenos rebites de cobre nas áreas sujeitas a maior tensão, como os bolsos, criou um modelo muito mais resistente. Estas novas calças robustas chamaram a atenção do público e as “jardineiras pela cintura” de Davis tornaram-se tão populares que tentou obter uma patente para proteger a ideia. Mas uma patente exigia dinheiro, pelo que pediu ajuda ao


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O computador Colossus

Como o primeiro computador digital programável ajudou a pôr fim à II Guerra Mundial.

O

Colossus foi um computador utilizado pelos serviços secretos britânicos durante a II Guerra Mundial, para analisar e descodificar ordens e mensagens de teleimpressores cifradas com máquinas de codificação Lorenz SZ40/42 pelo Alto Comando nazi. O conteúdo das mensagens era precioso para os Aliados, pois incluía amiúde ordens cruciais para os generais alemães, incluindo sobre os movimentos de tropas e táticas. Antes de os alemães usarem a Lorenz, os Aliados já tinham descodificado o sistema de cifra da Enigma e, durante anos, conseguiram interpretar mensagens graças à máquina eletromecânica Bombe, de Alan Turing. Mas a Lorenz era muito mais complexa e o modelo SZ40/42 codificava uma mensagem combinando os seus carateres com um fluxo de carateres aleatórios ou pseudo-aleatórios, gerado por 12 engrenagens, cada uma com um número diferente de cames. Assim, sem conhecer os carateres aleatórios – as posições das

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engrenagens –, a descodificação era impossível. O Colossus resolveu este problema ao encontrar as configurações do fluxo de carateres aleatórios da Lorenz – em vez de decifrar a mensagem em si, o que era efetuado manualmente por criptógrafos. No processo computorizado, o Colossus analisava os carateres codificados da mensagem e processava uma estatística com base numa função lógica programável (como se um caráter individual é verdadeiro ou falso). Ao analisar um texto cifrado desta forma várias vezes, era possível determinar a posição inicial das 12 engrenagens e estabelecer o fluxo aleatório. Historicamente, o Colossus revelou-se um gigantesco sucesso, com os Aliados a decifrar muitas mensagens que alteraram a guerra em 1944 e 1945, e as informações secretas geradas a serem usadas para contrariar os movimentos dos nazis na Europa. Após a guerra, os avanços tecnológicos trazidos pelo Colossus também fizeram da Grã-Bretanha um centro pioneiro na ciência informática.

Uma reconstrução colossal Quando Bletchley Park foi transformado em museu, uma equipa de engenheiros chefiada pelo engenheiro elétrico Tony Sale construiu uma réplica operacional do Colossus Mark 2, em 2007. Infelizmente, não foi tão fácil como as seis décadas de evolução tecnológica após a guerra poderiam fazer crer, já que muitas maquetes e hardware original foram destruídos após o conflito, deixando pouca informação aos responsáveis pela reconstrução. Felizmente, contudo, após uma campanha de investigação, muitos dos blocos de notas originais da equipa de Bletchley foram adquiridos e, compilados, forneceram um volume de informação incrível. Assim, utilizando os blocos de notas e consultando vários membros originais da equipa de Bletchley, incluindo o designer do leitor de fita perfurada ótico do Colossus, Arnold Lynch, a reconstrução foi completada com sucesso e encontra-se hoje exatamente na mesma posição do Colossus original em Bletchley Park, onde pode ser usada mais uma vez para decifrar códigos.

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SABIA QUE… O Colossus só foi dado a conhecer ao público na década de 1970, devido ao Official Secrets Act?

Guia para decifrar códigos

Saiba como funcionava esta máquina descodificadora, passo a passo.

2. Memória

Escultura comemorativa de Flowers, com o filho, à esquerda.

Tommy Flowers Thomas (Tommy) Flowers foi o engenheiro britânico responsável pela conceção e construção do Colossus. Após formar-se na Universidade de Londers em engenharia elétrica, Flowers entrou para o ramo de telecomunicações dos Correios, onde explorou a utilização da eletrónica para centrais telefónicas. Graças ao seu trabalho, Flowers foi convidado para ajudar o perito em decifração de códigos Alan Turing a construir uma máquina para automatizar parte da criptoanálise da máquina Lorenz – um codificador de alto nível utilizado para comunicar ordens importantes do Alto Comando nazi. Em 1943, Flowers já tinha construído o Colossus e, pouco depois, recebeu fundos para criar uma segunda versão melhorada, que começou a funcionar em junho de 1944. Apesar da sua ajuda vital à vitória aliada, Flowers não pôde falar do seu trabalho durante décadas, obrigado que estava ao dever de sigilo.

Os carateres inseridos eram guardados no banco de memória do Colossus para serem analisados.

4. Carateres verdadeiros/falsos

1. Fita perfurada

As mensagens codificadas do inimigo teleimpressas capturadas – transmitidas como sinais de rádio – eram perfuradas em fita de papel e inseridas no Colossus a cinco mil carateres por segundo.

Uma série de tubos de vácuo internos, tiratrons (câmaras cheias de gás) e fotomultiplicadores liam o código de forma ótica antes de aplicar a função lógica programada a cada caráter. A máquina podia então indicar os carateres verdadeiros e falsos.

5. Resultado

Ao analisar desta forma o código várias vezes, era possível determinar a "verdadeira" posição de cada caráter, revelando assim as posições originais da máquina de criptografia. Este "padrão verdadeiro" podia então ser usado pelos criptógrafos para decifrar a mensagem manualmente.

3. Interface

Um operador utilizava o painel de ligações, fichas e comutadores de programa do Colossus para configurar o circuito da máquina para uma análise estatística específica.

Em 1993, Bletchley Park reabriu como museu dedicado aos decifradores de códigos.

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Bletchley Park foi o principal centro britânico de descodificação durante a II Guerra Mundial. Situado em Milton Keynes, Buckinghamshire, Inglaterra, era uma base aliada ultrassecreta de comunicações, com uma diversificada equipa de engenheiros, eletricistas e matemáticos a trabalhar manualmente – e mais tarde com a ajuda de máquinas descodificadoras –, para decifrar códigos inimigos que disfarçavam ordens e comunicados privados. Entre os muitos descodificadores, ou criptoanalistas, que trabalhavam em Bletchley, Alan Turing é o mais famoso; o seu trabalho na decifração dos sistemas de codificação das máquinas Enigma e Lorenz valeu-lhe o apelido de "Pai da Ciência Computacional". De facto, o trabalho de Turing, Flowers e da restante equipa de Bletchley foi crucial para a vitória dos Aliados em 1945 e há até quem especule que a informação secreta por eles recolhida – com o nome de código Ultra – poderá ter encurtado a guerra em quatro anos. Hoje Bletchley Park é gerido pela Bletchley Park Trust (BPT), que mantém a propriedade como museu e atração turística, com milhares de visitantes por ano. Entre as várias atividades da BPT conta-se a reconstrução de muitas das máquinas que ajudaram a decifrar os códigos das forças do Eixo Nazi-Fascista – a que nos referimos em detalhe na caixa "Uma reconstrução colossal".

Após a guerra, Alan Turing contribuiu para a evolução do nosso conhecimento sobre computadores e inteligência artificial.

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© Getty; Alamy; BT

Bletchley e a guerra


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Ferrovias de cremalheira

Como é que estes sistemas de trânsito únicos ajudavam locomotivas pesadas a subir encostas mais íngremes que nunca?

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ma ferrovia de cremalheira empregava um carril/trilho dentado. A adição deste, que geralmente se situava ao centro, entre os outros dois carris, permitia às locomotivas percorrer inclinações superiores a sete por cento, que ainda hoje é o limite máximo para as normais ferrovias assentes na adesão. Crucial ao funcionamento deste sistema era a engrenagem dos carretes da locomotiva na cremalheira da ferrovia. Assim, a cremalheira e os carretes eram, essencialmente, uma forma de converter a energia rotativa gerada pelo sistema motopropulsor da locomotiva em movimento linear na cremalheira. Como tanto a cremalheira como os carretes tinham dentes, o sistema era também uma forma extra de adesão aos carris, com a engrenagem a segurar o veículo quando este não estava em movimento. Uma vez que a principal

fonte de energia era tradicionalmente o vapor, as locomotivas tinham de ser ajustadas consideravelmente para que os sistemas de cremalheira funcionassem. Esta modificação ia da parte inferior da carroçaria da locomotiva (para instalar os carretes) à inclinação da caldeira, cabina e superstrutura. A inclinação era necessária pois as caldeiras dos motores a vapor têm de ter sempre água a cobrir os tubos e a fornalha, para manter a estabilidade – algo que é quase impossível de garantir se o veículo não estiver nivelado. Como tal, estas locomotivas inclinavam-se em direção ao carril para contrariar o declive do terreno. Hoje, apesar de raros, os sistemas de cremalheira ainda são usados em todo o mundo, apesar de com um misto de motores a vapor e locomotivas a diesel/ elétricas. Um dos mais famosos é o da Mount Washington Cog Railway, em New Hampshire, EUA, que aqui analisamos.

O sistema em detalhe Perceba a anatomia de uma locomotiva de cremalheira com a nossa ilustração.

Cabina

Atrás do motor e da carruagem está a cabina. Daqui, o maquinista controla a caldeira a vapor e a engrenagem dos carretes.

Rodas

As rodas funcionam como as de um comboio normal, correndo pelos carris de cada lado do trilho central. Ferrovia de cremalheira com um sistema Strub na região rural de Itália, 1920.

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SABIA QUE… A Mount Washington Cog Railway foi a primeira ferrovia de cremalheira de montanha do mundo? Abriu em 1869.

Os sistemas mais antigos usavam motores a vapor para mover os carretes. Tal como a cabina, o motor está inclinado para a frente para se manter nivelado em andamento.

Amortecedor

Ao contrário dos normais sistemas de adesão, os de cremalheira não prendem normalmente a carruagem à locomotiva com um sistema de ligação/engate. A carruagem é empurrada com os amortecedores da locomotiva.

Carruagem

Os passageiros sentam-se numa carruagem de madeira coberta. Dada a lentidão do sistema, janelas maiores eram amiúde instaladas para vistas panorâmicas.

Evolução do sistema

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Marsh

Celebrizado pela Mount Washington Cog Railway, o sistema Marsh – inventado por Sylvester Marsh em 1861 – usava os dentes dos carretes da locomotiva como roletes, dispostos em travessas entre dois carris de ferro forjado em forma de L.

2 Carril

De cada lado da cremalheira há carris normais para as rodas da carruagem e locomotiva. Estes permitem a troca de linhas e acesso a plataformas mecânicas para rotações de 360º.

Uma montanhista mecânica Cremalheira

No centro da linha está a cremalheira, um carril dentado no qual encaixam os carretes da locomotiva. Esta engrenagem entre carretes e cremalheira ajuda o comboio a manter uma boa aderência até em terreno íngreme.

Carretes

Montados na parte inferior da carroçaria estão vários carretes circulares dentados. Quando rodam, acionados pelo motor, os dentes encaixam nos encaixes da cremalheira, ajudando a puxar o comboio.

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A Mount Washington Cog Railway, em New Hampshire, EUA, foi a primeira ferrovia de cremalheira usada para subir uma montanha. Completado por Sylvester Marsh em 1869, este é o segundo sistema de cremalheira mais íngreme do mundo, com uma inclinação máxima de 37,4%. A ferrovia percorre 4,8 km pela encosta oeste do Monte Washington acima, começando 820 metros acima do nível do mar e culminando pouco antes do cume, a 1.917 metros de altitude. A locomotiva sobe a 4,5 km/h e desce a 7,4 km/h. Apesar de ter sido construída há 144 anos, esta ferrovia de cremalheira permanece totalmente funcional.

Riggenbach

O sistema de 1863 criado por Niklaus Riggenbach usava uma cremalheira em escada feita de placas de aço ligadas por hastes regularmente espaçadas. Embora eficaz, a cremalheira em escada fixa era algo complicada e cara de construir, pelo que muito poucos exemplos sobrevivem.

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Abt

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Locher

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Strub

Carl Roman Abt melhorou o sistema Riggenbach em 1882 usando várias barras sólidas com dentes verticais, que eram centralmente montadas entre os carris. Isto garantia que os dentes dos carretes estavam sempre em contacto com a cremalheira. O sistema de 1889 de Eduard Locher tinha dentes nas laterais dos carris e não no topo, que eram engatados por duas rodas dentadas na locomotiva. Este sistema podia ser usado em declives maiores que os anteriores. Inventado por Emil Strub em 1896, o sistema Strub utilizava um carril laminado de fundo liso com dentes no topo a espaços de 100 mm. Pinças de segurança na locomotiva prendiam a parte inferior da cabeça para evitar descarrilamentos.

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Motor


INDÚSTRIA & INVENTOS

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s i a t n e d i c a s descobdearrtaam o mundo que mu

N

ão é segredo que as melhores ideias surgem com frequência quando menos esperamos. Para alguns, pode acontecer durante a viagem de regresso a casa, enquanto outros podem ter o seu “momento heureca” a meio da noite ou na casa de banho. O matemático da Antiga Grécia Arquimedes encontra-se no último grupo, ao ter famosamente percebido como calcular o volume de objetos irregulares quando tomava banho. Ao entrar na banheira, o nível da água subiu, ocorrendo-lhe que o volume da água deslocada deveria ser igual ao do seu corpo.

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Como conseguiu manter a reputação após correr nu pelas ruas a gritar “Heureca!”, não sabemos! Mas não são apenas as ideias que podem surgir por acaso. Embora a maioria das grandes descobertas da história tenha sido feita após anos de investigação meticulosa, outras ocorreram por mera casualidade. Veja-se o humilde gelado de água. Quiçá uma invenção salva-vidas durante os quentes meses de verão, foi originalmente o resultado de uma tentativa falhada de produzir refrigerante. Em 1905, um rapaz de 11 anos chamado Frank Epperson tentava criar uma bebida doce, mas deixou-a

ao relento durante a noite, com a vara de mistura dentro do copo. Era pleno inverno e a bebida congelou – de manhã, pôde apreciar uma guloseima gelada num pau. Dezoito anos depois, percebeu as possibilidades comerciais da sua invenção fortuita e começou a vendê-la nas praias da Califórnia. Sejam o resultado de um derramamento desastrado ou de um laboratório contaminado, as descobertas acidentais podem estar apenas à distância de um cientista trapalhão, desde que consiga perceber o potencial. A celebração nudista, naturalmente, é opcional. WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE… Os polímeros são compostos por longas cadeias de moléculas muito similares, o que os torna fortes mas flexíveis?

Penicilina

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Uma experiência contaminada é o pior pesadelo de qualquer cientista mas, no caso do biólogo Alexander Fleming, seria a sua principal obra. Ao estudar o vírus Influenza, Fleming deixou acidentalmente uma placa de Petri fora da incubadora quando foi de férias. No regresso, descobriu que a placa, na qual crescia uma cultura de estafilococos, começara a ganhar bolor. Quando examinou mais de perto a placa, reparou num anel em torno do bolor, onde não ocorrera crescimento bacteriano. O “suco de bolor”, como lhe chamou, era, na realidade, penicilina, produzida pelo bolor Penicillium notatum (P. chrysogenum) que contaminara a placa, e que Fleming descobriu depois ser capaz de matar vários tipos de bactérias. Foram outros dois cientistas, Florey e Chain, que transformaram a penicilina em fármaco mas, sem Fleming, os antibióticos podiam nunca ter sido inventados.

Inibidores da síntese proteica Impedem as bactérias de produzir proteínas, pelo que não conseguem crescer.

Antibióticos como a penicilina impedem as bactérias de desenvolver e regenerar as suas paredes celulares.

Como atuam os antibióticos Os antibióticos são nocivos para as bactérias de várias formas; eis algumas das mais comuns.

Inibidores

Substrato

A polimixina e a daptomicina perturbam a membrana celular, o que permite que moléculas vitais escapem das céliulas bacterianas.

Enzima Produto

AUTOR DA DESCOBERTA

Alexander Fleming

Nascido na Escócia em 1881, Fleming estudou no hospital de St. Mary, em Londres, onde concluiu um bacharelato em medicina. A sua descoberta acidental da penicilina valeu-lhe um prémio Nobel, que partilhou com Ernst Boris Chain e Howard Walter Florey.

Inibidores da parede celular

ADN/ ARN

As quinolonas impedem a replicação do ADN bacteriano e a rifampicina trava a criação de ARN. São ambas letais para a célula.

Inibidores do ácido fólico

As sulfonamidas e a trimetoprima impedem as bactérias de produzir ácido fólico, de que precisam para criar ADN.

Plástico (baquelite)

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No século XIX, os cientistas tentaram desesperadamente resolver o mistério dos polímeros – moléculas muito grandes que podem ser expandidas e moldadas. Em 1870, um inventor norte-americano alterou um polímero existente na Natureza, a celulose, para criar um novo material incrível chamado celuloide, que podia ser moldado quando aquecido. Seriam precisos mais 40 anos para que o primeiro plástico inteiramente sintético fosse inventado. O autor da descoberta, Leo Baekeland, realizava experiências com resinas sintéticas. Após aquecer o líquido, AUTOR DA DESCOBERTA descobriu que este produzia uma matéria solidificada, insolúvel em solventes e que não amolecia quando Químico belga bascido em 1863, aquecida. Chamou-lhe bakelite Baekeland trocou a pátria por Nova Iorque aos 23 anos. Foi aí (baquelite) – e passou rapidamente que inventou o papel fotográfico a ser usada na produção de itens Velox, que permitia a revelação diversos, de artigos domésticos a joias. sob luz artificial, antes de se virar para os plásticos.

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Leo Baekeland

A baquelite era usada no fabrico de caixas de telefones por ser um material não condutor e resistente ao calor.

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INDÚSTRIA & INVENTOS

Micro-ondas

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No interior de um micro-ondas

Descubra os elementos que compõem estes fornos rápidos.

Não só o micro-ondas foi descoberto por acaso, como o autor da invenção não chegou a terminar o secundário. Aos 12 anos, Percy Spencer abandonou a escola para trabalhar numa fábrica de canilhas, sendo mais tarde contratado para instalar eletricidade numa fábrica de papel próxima. Na década de 1920, começou a trabalhar como engenheiro para a Raytheon, a empresa que viria a melhorar a tecnologia de radar para as forças aliadas na II Guerra Mundial. Um dia, frente a um radar de magnetrão ativo, notou que o chocolate que tinha no bolso derretera. Começou a testar os efeitos dos magnetrões noutros alimentos e inventou o primeiro micro-ondas, ligando um gerador de 4 campos eletromagnéticos de alta densidade a uma caixa de metal fechada. O forno foi um sucesso e, em 1945, a empresa submeteu o pedido de patente para o primeiro micro-ondas comercial.

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AUTOR DA DESCOBERTA

Percy Spencer

1 Magnetrão

Nascido em 1893, perdeu o pai com 18 meses de idade e a mãe deixou-o aos cuidados dos tios. Apesar das origens difíceis, tornar-se-ia um engenheiro e físico autodidata afamado.

Quando liga o micro-ondas, o magnetrão converte a eletricidade da tomada em micro-ondas de alta energia.

2 Guia de ondas

Estas ondas são disparadas para o compartimento dos alimentos através de um canal chamado guia de ondas.

3 Prato giratório

A comida roda num prato giratório, para que cozinhe/ aqueça de modo uniforme.

Adoçante artificial

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O primeiro adoçante artificial, a sacarina, foi descoberto por um químico russo chamado Constantin Fahlberg. Ao efetuar experiências com conservantes, e enquanto comia um pãozinho, notou que este tinha sido adoçado pela substância que tinha nas mãos. Voltou ao laboratório e reconstituiu os seus passos até ser capaz de sintetizar o adoçante em massa.

AUTOR DA DESCOBERTA Constantin Fahlberg

Foi inicialmente contratado para analisar a pureza do açúcar.

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Supercola

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Esta substância superadesiva foi descoberta por acaso – duas vezes! O químico Harry Coover tentava criar miras de plástico transparente para a II Guerra Mundial quando uma das fórmulas que testou gerou uma cola de ligação extremamente rápida. Para as miras, era inútil, e esqueceu-a; passados quase dez anos, deparou-se de novo com ela quando desenvolvia canópias resistentes ao calor para aviões a jato. Desta vez percebeu o potencial e o produto foi colocado no mercado.

Trabalhou como químico para a Eastman Kodak.

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As micro-ondas ressaltam das paredes metálicas refletoras, para que atinjam a comida a partir de ângulos diferentes.

Quando penetram os alimentos, as micro-ondas fazem com que as moléculas no interior vibrem mais depressa, o que rapidamente aquece a comida.

Aço inoxidável

AUTOR DA DESCOBERTA Harry Coover

A sacarina ficou popular na II Guerra Mundial, quando o açúcar começou a rarear.

4 Paredes metálicas

5 Moléculas vibrantes

Coca-Cola

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Após ser ferido na Guerra Civil Americana, o farmacêutico John Pemberton ficou viciado em morfina. Em busca de uma alternativa, em 1886 começou a efetuar experiências com coca – a planta de onde deriva a cocaína. Acabou por cozinhar um líquido aromático cor de caramelo, que combinou com água gaseificada e colocou à venda por cinco cêntimos o copo. O refrigerante, batizado Coca-Cola, tornar-se-ia a quarta marca mais valiosa do mundo.

AUTOR DA DESCOBERTA John Pemberton

Estabeleceu-se na distribuição grossista farmacêutica.

O aço é forjado há milénios, mas só em 1913 um metalúrgico chamado Harry Brearley descobriu uma forma de impedi-lo de enferrujar. Encarregado de encontrar um metal resistente à erosão para prolongar a durabilidade dos canos das armas, diz a lenda que, tentativa falhada após tentativa falhada, a pilha de sucata foi aumentando, até que Brearley reparou que um dos pedaços não enferrujara como os outros. Tinha inventado o aço inoxidável e depressa viu o seu potencial para a indústria dos talheres.

AUTOR DA DESCOBERTA Harry Brearley Era investigador principal na Firth Brown em 1908.

O pináculo do edifício Chrysler, em Nova Iorque, está revestido com aço inoxidável.

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SABIA QUE… Os raios X só suscitaram preocupação quando o assistente de Thomas Edison morreu de cancro da pele, em 1904?

Pacemaker

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Os pacemakers existem sob uma forma muito rudimentar desde o século XIX, quando se descobriu que impulsos elétricos podiam ser usados para provocar o batimento cardíaco. Os dispositivos, porém, eram grandes e volumosos, e tinham de ser ligados à corrente, colocando o doente em risco de eletrocussão. Só em 1960 surgiram os

AUTOR DA DESCOBERTA

Wilson Greatbatch

O engenheiro e inventor norte-americano nasceu em Nova Iorque, em 1919, e combateu na II Guerra Mundial, antes de concluir a licenciatura em engenharia elétrica. À data da sua morte, em 2011, detinha mais de 325 patentes.

Como funciona um pacemaker Descubra como este incrível pedaço de tecnologia mantém o coração a bater.

Sensores

Os elétrodos detetam a atividade elétrica do coração e enviam estes dados ao gerador de impulsos.

Teflon

pacemakers implantáveis a pilhas, inventados quatro anos antes. O engenheiro elétrico Wilson Greatbatch trabalhava num dispositivo de registo do ritmo cardíaco quando adicionou uma resistência de dimensão errada aos circuitos. Descobriu que, em vez de registar, o dispositivo produzia impulsos elétricos. Percebeu rapidamente que podia ser utilizado para regular a atividade elétrica do coração e garantir um ritmo constante. Durante os dois anos que se seguiram, conseguiu miniaturizar o aparelho e protegê-lo dos fluidos corporais. O primeiro doente, um homem de 77 anos, sobreviveu mais 18 meses.

Composição

Um pacemaker é composto por uma pilha, um gerador e um conjunto de fios com sensores (elétrodos) nas extremidades.

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O material antiaderente que reveste as frigideiras foi inadvertidamente inventado por Roy Plunkett, quando tentava sintetizar uma alternativa não tóxica a compostos como o anidrido sulfuroso e o amoníaco, usados como refrigerantes, efetuando experiências com tetrafluoretileno (TFE). Após armazenar o gás em cilindros, abriu um e descobriu que tinha polimerizado, fomando um pó branco ceroso de baixa aderência e com um ponto de fusão muito elevado. Três anos depois, a substância, batizada Teflon, foi patenteada.

AUTOR DA DESCOBERTA Roy Plunkett

Plunkett recebeu a medalha John Scott para o “conforto da humanidade”.

Proteger a frigideira Camada a camada, veja o que torna as frigideiras modernas tão práticas. Camada superior Impede a adesão dos alimentos à frigideira, para que se soltem e que o utensílio seja mais fácil de limpar.

“Primário”

O revestimento primário torna a frigideira mais resistente à abrasão, melhorando a durabilidade.

Terminal único

Os pacemakers de terminal único transmitem por norma os impulsos do gerador para o ventrículo direito (a câmara inferior direita do coração).

FRIGIDEIRA

Camada intermédia A camada intermédia robusta proporciona resistência ao desgaste e a riscos.

Base

A base rígida é por • A unique topcoat - for easy food release and easy cleanup • A tough midcoat - for excellent to scratches and abrasions norma em resistance alumínio • A rugged primer - for long-lasting durability ou aço inoxidável.

Raios X

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Terminal duplo Os pacemakers de terminal duplo transmitem os impulsos para o ventrículo e a aurícula direitos, coordenando as contrações.

Ao investigar os efeitos dos PAN tubos de raios catódicos, o físico alemão Wilhelm Röentgen efetuou uma descoberta curiosa. Em 1895, eliminou o ar do interior de um tubo e encheu-o com gás, antes de fazer passar uma corrente elétrica através dele. Embora coberto com papel negro, reparou que um ecrã a alguns metros de distância era iluminado pelos raios invisíveis, a que chamou X, indicando o desconhecido. Descobriu-se mais tarde que atravessavam tecido humano, permitindo obter uma imagem dos ossos.

AUTOR DA DESCOBERTA Wilhelm Röentgen

Impulsos elétricos Quando o batimento cardíaco é anormal, o gerador envia impulsos elétricos para regulá-lo.

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Filho único de um comerciante de tecidos, nasceu em 1845 e estudou engenharia mecânica.

Röentgen tirou esta radiografia da mão esquerda da sua esposa.

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Top coat Reinforced mid coat Patented reinforced primer


INDÚSTRIA & INVENTOS

Como funcionavam os primeiros frigoríficos? Hoje amplamente dados como garantidos, estes eletrodomésticos revolucionários eram um luxo.

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a década de 1920, uma empresa de refrigeração elétrica dominava o mercado: a Kelvinator. O seu combinado caixa de frio/compressor em madeira custava $ 714 (hoje quase $ 9.800/€ 7.400) – muito fora do alcance da família média. Assim, com o objetivo de trazer frigoríficos mais acessíveis às massas, a General Electric investiu $ 18 milhões para produzir o GE “Monitor-top”. Eram assim chamados porque o armário era todo em aço e o condensador estava selado numa estrutura cilíndrica no topo, o que o fazia parecer a torre de um navio de guerra blindado do século XIX – o USS Monitor.

Estas unidades de refrigeração funcionavam sob os mesmos princípios dos frigoríficos modernos. Ao usar um compressor, um refrigerante em circulação era transformado de vapor em líquido e arrefecido quase até à temperatura ambiente sob pressão, antes de ser recolocado em circulação. A mudança súbita de pressão levava o refrigerante a transformar-se novamente em vapor, extraindo calor do ar no interior do armário e, logo, arrefecendo-o. Vários modelos do Monitor-top foram fabricados, incluindo unidades de duas e três portas, mas o mais popular era o de uma porta, originalmente vendido por $ 300, em 1927.

O interior de um Monitor-top A QS realça os principais componentes dos primeiros frigoríficos comerciais.

Tubos de troca de calor

Origens tóxicas

Hoje, o gás inerte tetrafluoroetano R134a é muito usado em frigoríficos e congeladores, mas nos anos de 1920 eram usados refrigerantes como dióxido de enxofre, formiato de metilo e cloreto de metileno. Estes são bastante tóxicos: o dióxido de enxofre causa queimaduras de contacto e pode afetar a visão; o formiato de metilo é altamente inflamável; e o cloreto de metileno ou clorometano pode causar tonturas, náuseas e até ataques em altas concentrações. Estes refrigerantes químicos foram substituídos por fréon, um gás que, apesar de relativamente inócuo, foi banido na produção de novos frigoríficos em 1990, por preocupação com o efeito dos CFC na camada de ozono. Os modelos Monitor-top são hoje colecionáveis, com o corpo em aço a permitir que muitos resistissem quase um século. Geralmente são convertidos, com a remoção dos gases perigosos e instalação de um compressor moderno mais ecológico.

Vapor refrigerante

O líquido refrigerante fresco é passado por uma válvula e expande-se de volta a um estado gasoso parcial, absorvendo calor do ar no armário no processo.

O refrigerante líquido, quente da compressão, é passado por uma série de tubos e arrefecido até à temperatura ambiente.

Compressor

Empurra o refrigerante pela unidade e comprime o vapor de refrigeração.

Refrigerante líquido

© Getty

O compressor aplica pressão ao gás de formiato de metilo no Monitor-top, o que o transforma num líquido.

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SABIA QUE… A pintura His Master’s Voice, em que o cão Nipper escuta um gramofone, apresentava inicialmente um fonógrafo?

Como funcionava o gramofone? A invenção que trouxe o som para dentro de casa.

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Campânula

Amplifica e projeta o som da agulha (estilete). Uma bola ou tecido eram colocados dentro da campânula para reduzir o volume de som.

o século XIX, houve uma competição feroz na Europa e nos EUA para criar máquinas que conseguissem gravar e reproduzir música e sons. Já em 1857, o fonautógrafo, criado por Édouard-Léon Scott de Martinville, usava um diafragma ligado a uma cerda que respondia a vibrações de som. Estas vibrações eram decalcadas para uma folha de papel revestida a fuligem, que estava enrolada num cilindro rotativo. Este aparelho, contudo, não reproduzia a gravação. Em 1877, o fonógrafo de Thomas Edison seguiu um princípio semelhante ao do fonautógrafo, mas utilizando folha de estanho enrolada à volta de um cilindro estriado e já com uma campânula. As vibrações da agulha ligada ao diafragma criavam sulcos na folha; para os reproduzir, eram percorridos de novo pela agulha. Cilindros de cera permitiam que as gravações fossem reproduzidas mais do que uma vez. Dez anos depois, Emil Berliner apresentou o gramofone, que usava discos com estrias em espiral para gravar e reproduzir o som. Também tinha campânula e agulha mas, ao contrário Braço de suporte do sistema de cilindros, a gravação original podia Suporta a pesada campânula. ser facilmente copiada para um molde e produzida em série. O gramofone dominou o mercado nos anos 20, sendo depois substituído pelo gira-discos.

Captador sonoro A agulha no captador de som era feita de cobre ou aço. Está ligada a um diafragma que envia as vibrações do som para a campânula.

Anatomia do gramofone

Fogo por arco

Um instrumento primitivo que faz fogo por fricção.

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© Science Photo Library

fogo por fricção com arco consegue-se pressionando o apoio no topo da broca com uma mão, enquanto se move o arco na horizontal, para a frente e para trás, com a outra mão. Dessa forma, a broca roda suficientemente depressa para criar fricção e calor na tábua de madeira. A serradura quente produzida cai pela ranhura lateral e inflama folhas secas – ou outro material de acendalha. Depois de aceso, o material que está a arder pode ser removido e utilizado noutro local. Os antigos egípcios usavam a fricção com arco desde 3.000 a.C., com a corda do arco enrolada várias vezes na broca para fazer furos em madeira e pedra, em vez de fogo. A utilização do instrumento por carpinteiros é retratada no túmulo da quinta dinastia de um oficial importante chamado Ti, em Sakara.

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O cão de trenó Chris escuta gramofone no acampamento da expedição Terra Nova, em 1911.

Prato

É rodado a uma velocidade constante por um mecanismo de corda. A velocidade mais comum era 78 rpm.

Eixo

O furo no centro do disco é colocado sobre um eixo, que impede que o disco saia do prato enquanto está a rodar.

Apoio

Em pedra, osso ou madeira dura, o ponto de apoio deve ser liso para não fazer bolhas e ajustar-se à palma da mão de forma confortável.

Elementos do sistema

Broca

Peça de madeira fina, cilíndrica, encaixada no apoio para a mão. Quanto mais grossa, mais lenta.

Corda

Está presa às duas extremidades do arco e enrolada na broca.

Arco

Pode ser em madeira leve, com cerca de 70 cm ou 90 cm de comprimento. Deve ter uma ligeira curva e não ser demasiado pesado.

Placa base

Tábua lisa com (pelo menos) um entalhe com um pequeno corte lateral em V. Deve ser colocada numa base seca para a proteger do solo húmido.

Quero Saber | 105


INDÚSTRIA & INVENTOS

O Mecanismo de Anticítera Um dispositivo científico antigo que calculava com precisão a localização de estrelas e planetas.

O

Mecanismo de Anticítera era o instrumento astronómico mais avançado da antiguidade. Montado pelos gregos antigos, ou talvez pelos babilónios, esteve desaparecido durante 2000 anos, até ser recuperado dos destroços de um navio ao largo da ilha grega de Anticítera em 1901. Após um estudo meticuloso, cientistas e historiadores declararam que a massa distorcida de bronze era um computador analógico, capaz de determinar as posições de planetas e a ocorrência de eclipses. Exibe com precisão as fases da Lua e a localização no céu dos cinco planetas conhecidos na época (Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno).

Inicialmente contido numa caixa de madeira, só cerca de 40% do artefacto original sobrevive; demasiado delicado para ser examinado à mão, foram usados raios X e TAC para revelar o seu funcionamento. No interior, engrenagens de bronze interligadas estão dispostas com precisão e cortadas à medida de forma a fazerem girar mostradores rotativos e ponteiros. A máquina testemunha o impressionante conhecimento astronómico dos gregos e data de 205 a.C. – a data mais antiga nas inscrições. É o primeiro invento que conhecemos concebido para mostrar a disposição de todos os corpos celestes conhecidos a qualquer momento e era provavelmente usado para fins educativos e científicos.

Os 82 fragmentos rem anescentes encontram-se no Museu Nacional de Arqueologia de Atenas , na Grécia.

Como pode ter funcionado

Com base nos vestígios descobertos, é possível supor como seriam os mecanismos internos.

Precisão

O mostrador maior na parte da frente do mecanismo exibia os dias do ano. Ao rodar a manivela que aciona o mecanismo, era possível saber a localização do Sol e da Lua em qualquer dia específico, e prever a ocorrência de eclipses.

Engrenagem primária

O mecanismo era ativado pela engrenagem primária, que rodava as restantes engrenagens. Uma rotação completa equivale à passagem de um ano.

Ciclo das olimpíadas

Na parte de trás da máquina, o mostrador metónico indicava as datas dos jogos pan-helénicos, olímpicos, nemeus, ístmicos e píticos.

Trem de engrenagens metónico

Esta secção era usada para calcular os meses no antigo sistema metónico (que seguia um ciclo de 235 meses lunares), exibindo-os num mostrador na parte de trás da máquina.

Trem de engrenagens lunar

Inscrições

Ponteiros

As inscrições mostravam as horas a que certas estrelas “nasciam” e se “punham” no céu ao longo do ano.

O mostrador interno exibia os 12 signos do zodíaco, permitindo prever as fases da Lua.

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Legenda: Trem de engrenagens lunar Trem de engrenagens dos eclipses Trem de engrenagens metónico

Trem de engrenagens dos eclipses O trem de engrenagens lunar calculava o mês no Ciclo de Saros, um período de 223 meses lunares entre eclipses recorrentes.

Mostrador do Ciclo de Saros

As inscrições aqui eram usadas para prever eclipses solares e lunares.

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© Ilustração por Adrian Mann; Alamy

Este segmento servia para calcular as fases lunares, mostrando-as na parte da frente do mecanismo.


SABIA QUE… Uma tática comum na guerra naval consistia em abrir uma brecha no navio inimigo com o esporão e afundá-lo?

O corvus Q

uando os Cartagineses se aproximaram da frota romana perto de Milas (Mylae) em 260 a.C., viram um objeto estranho afixado à proa dos navios inimigos. Os marinheiros ficaram surpresos, mas como tinham barcos mais rápidos e bem construídos, avançaram com confiança. O que se seguiu seria recordado como uma grande vitória para os Romanos e um fiasco para os adversários. Uma tática comum na guerra naval antiga consistia em abrir uma brecha no navio inimigo com o esporão e afundá-lo, mas os Romanos sabiam que seriam superados numa típica batalha naval. Em vez disso, favoreciam a abordagem com os seus soldados superiores, e por isso inventaram o corvus, que utilizaram em Milas. Quando o navio inimigo se aproximava, baixavam a nova “prancha” até ao convés, fixando-a e permitindo que os marinheiros romanos tomassem a embarcação adversária.

A “prancha” de abordagem tinha 1,2 m de largura e 10,9 m de comprimento, com parapeitos à altura dos joelhos de cada lado.

À abordagem!

Como os Romanos levaram o combate corpo a corpo para as batalhas navais.

Manobrável

Antes da batalha, o corvus era mantido na vertical por roldanas, podendo ser baixado tanto a bombordo como a estibordo.

O “bico”

Corvus significa corvo em latim. O espigão de metal tinha a forma do bico da ave, o que deu o nome ao dispositivo.

Um inventor brilhante chamado Herão de Alexandria concebeu as primeiras portas automáticas!

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Quando o corvus era largado, o pesado espigão de metal perfurava o convés inimigo, fixando os dois navios.

Marinheiros fortemente armados usavam o corvus para abordar o navio inimigo e tomá-lo.

Portas automáticas do mundo antigo uando os fiéis se reuniam num templo do mundo antigo, contemplavam uma visão tão espetacular que parecia provar a existência dos deuses. A congregação observava enquanto um sacerdote do templo se mantinha ao lado de umas grandes portas de entrada e acendia uma grande fogueira para dar início ao ritual. Fazia então uma oferenda sobre as chamas e, ao fim de algum tempo, as portas eram abertas, aparentemente pelos próprios deuses. Mas o que à multidão parecia intervenção divina era na realidade um mecanismo avançado a funcionar sob o templo. Fora concebido por Herão de Alexandria, um inventor famoso cujos conhecimentos de física ultrapassavam largamente os dos seus contemporâneos. Herão compreendia que o ar podia ser “empurrado” e “puxado”, e foi ao explorar este saber que criou uma das maiores ilusões de poder no mundo antigo.

Fixação

Abordagem

Oferenda aceite

Veios que controlavam as dobradiças das portas eram rodados por cordas fixadas ao balde, abrindo as portas.

O autómato de Herão

Explore a mecânica que criou uma ilusão de magia.

Estratagema Esfera de água

A expansão provocava um aumento da pressão do ar, forçando a água a sair da esfera.

A chama ritualista gerava calor, que expandia o ar na câmara abaixo.

Ganhar peso

Quando água suficiente entrava no balde, este começava a descer.

© Getty; Alamy

A invenção que virou o jogo a favor dos Romanos na sua primeira guerra naval.

“Passadiço”

Massa em deslocação A água deslocada seguia por um tubo até um balde fixado a um contrapeso.

Quero Saber | 107


INDÚSTRIA & INVENTOS

A EVOLUÇÃO DO TEMPO Como a medição do tempo evoluiu do simples relógio de sol até ao incrivelmente preciso relógio atómico.

M

esmo antes da meia-noite de 31 de dezembro de 2016, o mundo ganhou um segundo extra para compensar o abrandamento gradual da rotação da Terra. Os relógios atómicos modernos são demasiado precisos, face à inconsistente velocidade de rotação da Terra, funcionando ao mesmo ritmo durante milhões de anos. Para garantir que o tempo padrão continua a corresponder aos relógios atómicos – que fornecem uma escala temporal estável – 26 segundos bissextos foram adicionados desde 1972. Hoje conseguimos medir o tempo facilmente e com grande precisão mas nem sempre foi assim. A princípio, a única forma de fazê-lo era

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detetar o Sol no céu – os relógios de sol foram os primeiros a surgir, em civilizações antigas como o Egito, China e Grécia. Com a mudança das estações a alterar a quantidade de horas de luz, o sistema tinha falhas e foram inventados vários métodos para tentar medir melhor o tempo. Para além de dispositivos, era também necessário um sistema numérico definido para medir o tempo. Os números usados para calcular o tempo foram primeiro teorizados pelos antigos sumérios, que criaram o sistema sexagesimal. Diz-se que se baseava na contagem pelos dedos, usando o polegar de uma mão para contar as três articulações de cada um dos outros quatro dedos, até 12. Usando os cinco

dedos da outra mão para calcular as contagens de 12, este sistema permitia contar até 60 com ambas as mãos. E como 60 é divisível por vários números menores, era perfeito. Outro número usado e considerado importante pelas antigas civilizações era o 12: o número de ciclos lunares por ano. Este número é importante na medição do tempo, encontrando-se no dia e na noite, divididos em dois períodos de 12 horas, e nos 12 meses. Assim nasceu a ideia estandardizada do tempo, que foi unanimemente adotada (tirando a tentativa francesa de criar um dia de dez horas, com cem minutos cada, no final do século XVIII). Mas este foi apenas o começo. WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... “Calendário” provém de calare, latim para “proclamar”, porque o pontífice romano anunciava os dias de lua nova?

Os mecanismos simples mas eficazes que usavam o Sol para ajudar a determinar a hora do dia. Os primeiros relógios eram varas que mediam o comprimento de uma sombra para dar uma ideia aproximada das horas. Tornaram-se depois mais elaborados e foram até desenvolvidos de forma a apontarem para o polo mais próximo, para maior precisão. Dividiam o dia em horas, mas não eram suficientemente sofisticados: eram inúteis de noite ou com tempo nublado! Os egípcios melhoraram o relógio de sol com a invenção do merkhet, por volta de 600 a.C., que podia ser usado de noite. Alinhado com a Estrela Polar, o tempo era medido conforme estrelas conhecidas atravessavam a linha.

Em forma de T

O avançado relógio de sol criado pelos antigos egípcios para avaliar a passagem do tempo de forma mais precisa.

Movimento aparente do Sol

De manhã à tarde

Sombras com diferentes comprimentos são criadas à medida que vemos o Sol deslocar-se de leste para oeste.

As horas da manhã surgem num dos lados do relógio enquanto as sombras das horas da tarde são exibidas no outro.

Contar as horas

Barra em forma de T

O relógio de sol em forma de T usa marcações para dividir o dia em horas, mas não tem em conta a mudança das estações.

A barra no topo divide o dia em 12 partes, em linha com o sistema duodecimal.

História do calendário Os meses e anos foram idealizados depois de antigas civilizações contemplarem as estrelas. A Lua tem um ciclo com perto de 30 dias de nova a cheia e vice-versa, o que ajudou a conceber a ideia do mês e foi o primeiro método que usámos para medir o tempo sem recorrer ao Sol. Outros marcadores de tempo iniciais foram o início de uma estação das chuvas ou o surgimento da estrela Sírio, que no Antigo Egito coincidia com a inundação anual do Nilo. O passo seguinte foi o calendário juliano. Inventado pelos romanos, baseava-se na órbita da Terra em torno do Sol e ajudou a estabelecer a ideia de ano – e assim nasceu o calendário cristão. Mas não foram seguidos por todas as sociedades; tanto o calendário islâmico como o judaico continuam a basear-se no movimento aparente da Lua e o antigo calendário maia tinha 18 meses de 20 dias e um mês com cinco dias. O calendário gregoriano substituiu o juliano a partir do século XVI e é hoje o calendário civil mais usado a nível mundial.

“ Os franceses tentaram criar um dia com dez horas de cem minutos cada no final do século XVIII.” WWW.QUEROSABER.COM.PT

O despertador de Platão O primeiro despertador da história terá sido inventado pelo famoso filósofo grego.

1. Início do processo

1 2

Primeiro, verte-se para o pote superior uma quantidade de água definida, que escorre através do sistema.

2. Atingir um nível definido

De água

O primeiro relógio de água de sempre foi encontrado no túmulo de um antigo faraó egípcio e crê-se que remonta a 1.500 a.C.. Os relógios eram recipientes de barro cilíndricos ou em forma de taça que funcionavam medindo níveis de água. Existiam dois modelos: um de influxo, que media a água que saía, e outro de vazão, que calculava a água que ficava. As medições das horas eram marcadas nos recipientes. Se o nível da água demorasse uma hora a baixar um centímetro, então se descesse 2 cm era porque tinham passado duas horas – e por aí fora. A desvantagem era que não funcionavam com muito frio, já que a água congelava, e exigiam supervisão, pois era necessário um fluxo constante de água.

3

Quando a água atinge um dado nível, é extraída para o terceiro pote.

3. Soar a hora

O rápido afluxo de água empurra ar para dentro do terceiro recipiente, que – através de uma abertura estreita – faz soar um apito.

4. Água excedente O pote inferior recolhe a água excedentária, que pode ser reutilizada para o despertar seguinte.

4 A Torre dos Ventos, que remonta à Grécia Antiga, tinha um relógio de sol e outro de água – uma clepsidra – para contar o tempo.

Quero Saber | 109

© Thinkstock; WIKI

Relógios de sol


INDÚSTRIA & INVENTOS

Mecânicos

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Como os relógios de corda e pêndulo se disseminaram e ajudaram a mudar a sociedade.

Os primeiros relógios mecânicos tinham apenas um ponteiro mas eram muito mais fiáveis do que os modelos anteriores. O sistema de escape que utilizavam poderá ter sido inventado na China, em 1275. O processo básico usava molas ou pesos para acionar uma roda dentada. Podia dessincronizar-se até cinco minutos por dia e foi substituído pelo relógio de pêndulo – desenvolvido por Christiaan Huygens, inspirado pela descoberta de Galileu de que um pêndulo oscila a um determinado ritmo consoante o seu comprimento, completando cada oscilação no mesmo período de tempo aproximado. Uma das maiores conquistas do relógio mecânico foi levar o conceito de tempo a quase todos os setores da sociedade, e não apenas a alguns eleitos. No século XIV, mostradores de relógios tinham surgido em torres de igrejas e catedrais por toda a Europa e as pessoas podiam finalmente estabelecer horários de refeições, de trabalho e de dormir.

1. Tiquetaque

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O sistema de escape alterna com a oscilação do pêndulo. As varas vertical e horizontal (balanço) produzem um movimento de vaivém.

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2. Contar os segundos

Uma roda dentada faz girar a engrenagem, que por sua vez move os ponteiros a um ritmo constante. Cada tiquetaque representa um segundo.

3. Peso

Um peso “alimenta” o mecanismo. Quando cai, desloca o ponteiro dos segundos pelo mostrador. Tem de ser subido manualmente com regularidade para manter o relógio a funcionar.

4. Pêndulo

O pêndulo controla a cadência do relógio mecânico, com base no seu movimento oscilante regular.

“ O relógio mecânico levou o conceito de tempo a quase todos os setores da sociedade.”

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5. Conversão de energia

O pêndulo converte energia potencial em cinética e vice-versa à medida que oscila, garantindo a manutenção de um movimento constante.

6. Mecanismo complementar

O sistema de escape também ajuda o pêndulo a funcionar. O mecanismo ajuda a manter a oscilação do pêndulo de forma a que não seja abrandada pelo atrito ou resistência do ar.

De bolso e de pulso

4 5

Os primeiros relógios que podiam ser levados e usados em qualquer lugar. À medida que o relógio mecânico ficava mais compacto, os mecanismos de mola tornaram-se suficientemente pequenos para o advento do relógio “portátil”. O primeiro relógio de bolso foi inventado em 1509 por Peter Henlein, que criou um modelo que não precisava de pêndulos nem pesos. Com um mecanismo de mola, ficou conhecido como “Ovo de Nuremberga”. Era muito pesado mas rapidamente se tornou popular.

Relógios atómicos

Após o sucesso do relógio de quartzo, parecia que já não havia muitas melhorias a fazer. Foi então que surgiu o relógio atómico. Criado inicialmente em 1955, três grandes tipos foram produzidos desde então: de césio, hidrogénio e de rubídio. A definição moderna de um segundo baseia-se no relógio atómico de césio. Os eletrões em torno de um núcleo “orbitam” em níveis de energia definidos mas, quando absorvem ou libertam energia, podem “saltar”

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O grande avanço seguinte surgiu quando Christiaan Huygens modificou o design de modo a incluir um ponteiro dos minutos. Foram também adicionadas mais rodas no interior, para que não fosse preciso dar corda tantas vezes. O relógio de bolso melhorado depressa se tornou essencial, usado por maquinistas para manter os comboios pontuais e por generais do exército para sincronizar ordens e missões.

para um nível de energia adjacente. São usados lasers para fazer com que os eletrões de um átomo de césio se movam entre níveis de energia específicos, para que a radiação emitida tenha sempre a mesma frequência – que pode ser medida. O resultado é incrivelmente preciso: os melhores só “perdem” um segundo em mais de 50 milhões de anos. O relógio atómico está na base do GPS, da orientação e navegação espacial, e da sincronização da Internet.

O relógio de pulso foi inventado em 1868 pela empresa suíça Patek Philippe. De início só era popular entre as mulheres da nobreza já que os homens preferiam o relógio de bolso, mas tudo mudou com a I Guerra Mundial. Os soldados começaram a usar relógios de pulso para ajudar a articular o fogo de barragem com o avanço da infantaria. E as imagens das tropas a usarem-nos rapidamente ajudaram a popularizá-los.


SABIA QUE... Quando circum-navegou o mundo em 1522, Fernão de Magalhães tinha 18 ampulhetas a bordo para contar o tempo?

Como cristais minúsculos ajudaram a tornar os relógios mais precisos.

Talvez o maior salto na tecnologia de medição do tempo tenha surgido na segunda metade do século XX, com o advento do relógio de quartzo. Os cristais de quartzo têm propriedades piezoelétricas: conseguem gerar uma corrente elétrica quando pressionados e também vibram quando são atravessados por uma corrente – propriedades exploradas para criar os relógios de quartzo. Construído em 1927 por Warren Marrison e J. W. Horton dos Bell Labs em Nova Jérsia, EUA, o relógio de quartzo funcionava com uma bateria que alimentava um cristal

com eletricidade, que acionava um mostrador tradicional ou um ecrã digital LED. Estes novos relógios não precisavam de corda nem dependiam da gravidade para funcionarem corretamente. O sinal emitido pelo oscilador de cristal era regulado para uma frequência muito precisa – e o relógio de quartzo depressa se revelou ser pelo menos uma ordem de magnitude mais preciso do que o seu antecessor mecânico. Com uma grande eficiência energética e muito fiável, foi um ponto de viragem na evolução do relógio mecânico e é hoje o relógio mais usado do mundo.

Saber as horas no mar Em 1714, o governo britânico aprovou o Longitude Act, que oferecia 20.000 libras a quem inventasse um relógio que funcionasse no mar. Conhecer as posições dos seus navios era muito importante para as nações marítimas e a hora do dia era um fator relevante para o cálculo da longitude. Uma medição do tempo precisa era difícil no mar já que as mudanças de temperatura, a humididade e o movimento do navio impediam os relógios de pêndulo de funcionar devidamente. O “H4” de John Harrison liderou o caminho e foi o primeiro cronómetro marítimo com uma mola e um mecanismo de balanço capazes de resistir aos problemas que afetavam os relógios de pêndulo. A hora local era determinada pela posição do Sol e depois comparada com a hora do cronómetro, que fora sincronizada com a hora local de um dado ponto de referência, como o início da viagem do navio. Com este sistema, os marinheiros podiam calcular a diferença horária e, logo, saber com precisão onde se encontravam.

Como as vibrações de um cristal ajudam a alimentar a maioria dos relógios modernos.

O cristal está ligado ao circuito por elétrodos e a bateria envia uma corrente para alimentar o relógio.

Placa de circuitos O dispositivo está dividido em dois minicircuitos: um para fornecer eletricidade ao quartzo e outro para regular a tensão de saída.

Oscilador de quartzo

O quartzo ressoa 32.768 vezes por segundo e é muito mais preciso do que os pêndulos e rodas de balanço do passado.

Engrenagens

Engrenagens giram os três ponteiros; nos relógios digitais, é usado um microchip para dividir as oscilações em horas, minutos e segundos precisos.

Regular o relógio

O motor utiliza impulsos elétricos criados pelo microprocessador para acionar as engrenagens que controlam os ponteiros.

Hora local determinada pelo ângulo do Sol

15°

30°

Hora local durante a viagem

Concebeu o primeiro relógio “portátil”. Os seus modelos em latão eram tão populares que foi convidado a criar um mostrador para um castelo alemão.

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O cientista holandês patenteou o primeiro relógio de pêndulo em 1656, baseado na teoria do movimento pendular de Galileu.

Cronómetro do navio sincronizado com a hora do local de referência

1 hora = 15° de longitude Cronómetro do navio durante a viagem

Eis os inventores dos dispositvos de medição do tempo que hoje tomamos como certos.

Christiaan Huygens 1629-1695

Cada circuito tem um processador que reduz a oscilação do quartzo para uma vibração por segundo – soada a cada “tique”.

Hora de um local de referência

“Pais” do tempo

Peter Henlein 1480-1542

Microprocessador

Eli Terry 1772-1852

Montou uma empresa relojoeira no Connecticut, que ajudou à produção em massa de relógios de prateleira em madeira para o povo dos EUA.

Louis Essen 1908-1997

Foi um físico talentoso que ajudou a criar alguns dos primeiros relógios atómicos do mundo e a desenvolver a ideia do segundo padrão.

© Thinkstock; WIKI; SPL; Alamy; Ilustração por Neo Phoenix

De quartzo

No interior...

Bateria


FIGURAS INFLUENTES 114 Realeza recordista Os monarcas mais ricos, sangrentos e longevos.

118 Leonardo da Vinci

O polímata da Renascença era muito mais do que apenas um pintor.

124 Michael Faraday

O cientista responsável pela indução eletromagnética e que inspirou Albert Einstein.

126 Isambard

Kingdom Brunel

Um dos maiores engenheiros de sempre que revolucionou os transportes.

128 Charles Darwin

O pai da biologia evolutiva é o naturalista mais famoso de sempre e um dos nomes mais influentes da ciência moderna – mas porquê?

130 Os irmãos Wright

A dupla que alterou o curso da história da aviação.

132 Guglielmo Marconi O pai da rádio inaugurou a era das telecomunicações sem fios.

134 Albert Einstein

Cientista pioneiro da sua época, Einstein é considerado o físico mais influente de todos os tempos.

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Realeza recordista

Charles Darwin

Os irmãos Wright 112 | Quero Saber

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Albert Einstein

Michael Faraday

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Guglielmo Marconi Leonardo da Vinci Š Alamy; Shutterstock

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Isambard Kingdom Brunel Quero Saber | 113


FIGURAS INFLUENTES

REALEZA recordista

Eis os monarcas mais ricos, sangrentos e longevos. Descubra quem teve mais esposas, mais riqueza e mais herdeiros.

114 | Quero Saber

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SABIA QUE... Maria da Escócia foi o monarca britânico mais jovem de sempre, tendo subido ao trono com 6 dias de idade?

“De acordo com a Forbes, Reinado mais longo a fortuna de Bhumibol Sobhuza II Adulyadej 1899–1982 / Suazilândia totalizava € 25 mil milhões.”

A rainha Isabel II tornou-se a monarca britânica com o reinado mais longo em 2015, batendo o recorde estabelecido pela trisavó, a rainha Vitória. Mas ainda está longe dos soberanos mais longevos a nível mundial. Na Europa, por exemplo, Luís XIV (séculos XVII-XVIII) governou a França durante mais de 72 anos. Mas o reinado mais longo “verificável” da história pertence a Sobhuza II, chefe supremo e rei da Suazilândia, que assumiu o cargo com apenas quatro meses de idade e permaneceu no trono durante 82 anos. Há relatos de reinados mais extensos mas é difícil confirmá-los. Crê-se que o antigo faraó egípcio Pepi II ascendeu ao trono com seis anos de idade em 2281 a.C., governando por 94 anos, e que Min Hti, rei de Arracão (hoje parte de Myanmar/ Birmânia), reinou de 1279 a 1374 – um total de 95 anos.

Reinado mais curto

Sultão Khalid bin Barghash

O mais rico Rei Bhumibol Adulyadej 1946–2016 / Tailândia

E

m 2012, o detentor do recorde do Guinness para o monarca mais rico era o rei Bhumibol Adulyadej, ou Rama IX, nono monarca da dinastia Chakri da Tailândia. De acordo com a Forbes, a sua fortuna totalizava € 25 mil milhões, incluindo o maior diamante lapidado do mundo, o Jubileu Dourado, com 545 quilates. Adulyadej faleceu em 2016, mas nenhum outro monarca do mundo se acerca da sua riqueza. O mais próximo é Hassanal Bolkiah, sultão do Brunei, que valia alegadamente € 16.500 milhões em 2011.

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Há dois recordes do Guinness para o reinado mais curto de sempre, cada um com menos de meia hora. Luís António, duque de Angoulême era o príncipe herdeiro de França quando Carlos X abdicou após a Revolução de Julho de 1830. Depressa abdicou também, deixando o trono a Henrique, conde de Chambord, antes de fugir para o Reino Unido. O “nosso” princípe Luís Filipe de Portugal também perdeu o trono numa revolução: o pai, o rei D. Carlos I, foi assassinado no Regicídio de 1908 e o príncipe acabaria por morrer 20 minutos depois. Nenhum destes dois príncipes teve tempo para governar. O reinado mais curto de um monarca governante pertence ao sultão Khalid bin Barghash, que ficou apenas dois dias no trono de Zanzibar. Os britânicos enviaram navios de guerra para cercar o seu palácio, derrotando-o na guerra mais curta da história, a Guerra Anglo-Zanzibari, que durou uma hora.

Quero Saber | 115

© Getty

25–27 agosto 1896 / Zanzibar


FIGURAS INFLUENTES

Mais herdeiros Rei Abdelaziz Ibn Saud

A mais viajada

1932–1953 / Arábia Saudita Ibn Saud fundou a Arábia Saudita em 1932 e teve 45 filhos, de quem todos os reis sauditas descendem. O número de filhas não é conhecido, mas a família real saudita tem atualmente mais de 15.000 membros. O filho mais velho de Abdelaziz Ibn Saud, o rei Saud, teve 52 filhos e 54 filhas.

Rainha Isabel II

1952–presente / Reino Unido e Commonwealth Os monarcas modernos dominam em matéria de viagens globais e a rainha Isabel II de Inglaterra já visitou mais países do que qualquer outro membro da realeza. Desde que subiu ao trono, acumulou mais de 1,6 milhões de quilómetros, apesar de não ter passporte! Até 2012, Isabel II efetuou visitas de estado a 116 países diferentes, incluindo às 53 nações da Commonwealth, e, em 2016, totalizava 256 viagens oficiais. Mas alguns locais permanecem interditos. A rainha não visitou Israel, o Egito, a Argentina ou a Grécia, pátria do príncipe Filipe, seu esposo.

O mais mortífero Nurhaci, o imperador Tianming 1616–1626 / Liaoning, China

Nurhaci, o imperador Tianming, encabeçou o derrube da dinastia Ming. Era o líder do povo manchu do Norte da China, farto da fome, da escassez de prata e do aumento de impostos no início do século XVII. Nurhaci emitiu uma declaração de guerra conhecida como “as sete queixas/ ofensas” e o resultado foi um dos conflitos mais sangrentos na história registada. A dinastia Ming foi substituída pela dinastia Qing e, no processo, estima-se que 25 milhões perderam a vida. Na batalha de Yangzhou, liderada pelo filho de Nurachi, o príncipe Dodo, morreram 800.000 pessoas.

ACIMA: Isabel II durante uma visita a Hong Kong, em 1975, À DIREITA: A rainha e o marido, príncipe Filipe, no Canadá, em julho de 1970.

Rosto em mais moedas Rainha Isabel II

1952–presente / Reino Unido e Commonwealth A rainha Isabel II surge em moedas de mais de 35 países e territórios, incluindo Austrália, Baamas, Belize, Bermudas, Canadá, Ilhas Caimão, Chipre, Domínica, Malvinas, Fiji, Gibraltar, Guernsey, Hong Kong, Jamaica, Nova Zelândia, Nigéria, Papua-Nova Guiné, Maurícia, Rodésia (Zimbabwe), Seicheles, África do Sul, Santa Helena e Reino Unido.

116 | Quero Saber

O retrato de Isabel II surge em notas bancárias por todo o mundo.

Mais esposas Rei Ibrahim Njoya 1886–1933 / Bamum (hoje noroeste dos Camarões) Henrique VIII de Inglaterra é famoso por ter tido seis mulheres mas nem se aproxima do recorde em matéria de esposas reais. Ibn Saud, da Arábia Saudita, teve alegamente 30; Sobhuza II (Suazilândia) terá tido mais de cem; e Ibrahim Njoya, do Bamum, teve mais de 600. WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... A boda de Guilherme de Inglaterra e da princesa Catarina bateu o recorde para o evento mais visto em direto?

Casamento mais longo Takahito de Mikasa Este recorde muito disputado é detido por Takahito, príncipe de Mikasa, do Japão. Casou com Yuriko, princesa de Mikasa, em 1941, e permaneceram juntos

1941–2016 / Japão

durante 75 anos, até à morte de Takahito, em 2016. Isabel II de Inglaterra e o príncipe Filipe fizeram 70 anos de casados a 20 de novembro de 2017. Takahito serviu na China durante a II Guerra Mundial, tornando-se um crítico severo do exército imperial japonês.

“ O império da rainha Vitória foi o maior da história.”

Maior império Rainha Vitória

O Império Britânico tem origem no século XVI mas foi no reinado da rainha Vitória que atingiu o seu auge. O império de Alexandrina Vitória foi o maior da história, abarcando mais de um quinto do planeta. A concorrência com outras nações europeias motivou a formação das colónias britânicas, que negociavam tabaco, açúcar, chá, seda, algodão, índigo e escravos por todo o mundo. As primeiras foram fundadas no séc. XVII na América do Norte, seguidas pela Jamaica, em 1655, e pelo Noroeste do Canadá, em 1670. Em 1661, os britânicos começaram a estabelecer-se em África, povoando uma ilha no rio Gâmbia; em 1788 começou a colonização da Austrália. No início do reinado de Vitória já havia colónias na África do Sul e, durante o seu governo, a Nova Zelândia e o Egito foram adicionados ao vasto império mercantil. Em 1877, Vitória tornou-se imperatriz da Índia. WWW.QUEROSABER.COM.PT

© Getty; WIKI/ Bundesarchiv, Bild 105-DOA0909/ Walther Dobbertin/ CC-BY-SA 3.0

1837–1901 / Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda, Índia


FIGURAS INFLUENTES

EXPLORE O GÉNIO DE

DA VINCI Muito mais do que apenas um pintor, o famoso polímata da Renascença inventou uma profusão de máquinas espantosas.

L

eonardo di ser Piero da Vinci foi o epítome de um homem do Renascimento. Célebre como artista, era também um cientista e engenheiro brilhante. Para lá das suas famosas pinturas, como A Última Ceia e A Gioconda (Mona Lisa), os diários de Da Vinci revelam vários estudos e observações, da anatomia à astronomia, e da paleontologia à filosofia. A Renascença foi um período de renovação cultural, iniciado na península italiana, no século XIV, conforme a Idade Média chegava ao fim. Da Vinci nasceu em 1452, num mundo já mais tolerante a novas ideias. Um ano depois, a capital do Império Bizantino, Constantinopla (Istambul), caiu nas mãos dos otomanos. À medida que cientistas e artistas talentosos fugiam do Bósforo devastado pela guerra em busca de segurança nas cidades-estados italianas, a região tornou-se um centro de aprendizagem; e uma das cidades onde se fixaram foi Florença.

118 | Quero Saber

Aí, eram encorajados a estudar e a inventar pela família governante Medici, que financiava de bom grado centros de aprendizagem por toda a cidade. Uma revolução intelectual e cultural teve início; novas ideias tecnológicas e científicas disseminaram-se com a ajuda da então recém-inventada prensa de tipos móveis, à medida que a Europa começava a alcançar os académicos do mundo islâmico. É provável que os inventos e criações de outros homens da Renascença como Mariano di Jacopo (Taccola) e Filippo Brunelleschi tenham influenciado Da Vinci, que se deleitou com a ideia do humanismo renascentista, que encorajava a aprendizagem e assentava em métodos de pensamento crítico que tinham estagnado na era medieval. As obras mais famosas de Da Vinci são as suas pinturas, mas também foi um engenheiro e inventor criativo e talentoso. A redescoberta dos seus códices no século XIX revelou planos para

um vasto conjunto de engenhos, de aparelhos hidráulicos a armas de guerra. As suas ideias foram influenciadas pela antiguidade clássica e observações do mundo natural. Uma carapaça de tartaruga, por exemplo, inspirou um carro de combate, enquanto o estudo de aves, morcegos, peixes-voadores e até plantas contribuiu para os projetos de várias máquinas voadoras. As ideias eram ambiciosas mas alicerçadas em cálculos lógicos baseados em teorias científicas e princípios matemáticos. Na sua maioria, estes projetos apenas foram travados pelos limites tecnológicos da época. Embora muitos dos manuscritos de Da Vinci tenham sido inadvertidamente destruídos após a sua morte, mais de 5000 páginas dos seus diários ainda existem, dando-nos um vislumbre da mente de um homem à frente do seu tempo. Leonardo da Vinci pode ter morrido há 498 anos, mas o legado da sua criatividade e inovação perdura. WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... Da Vinci escreveu sobre o “parafuso aéreo” 450 anos antes de o primeiro helicóptero, o VS-300, levantar voo?

MÁQUINAS VOADORAS Parafuso aéreo Uma ideia ambiciosa que inspirou o helicóptero. Escrevinhando no seu caderno de apontamentos por volta de 1489, Da Vinci imaginou um engenho em forma de espiral capaz de levantar voo. Talvez alimentado por manivelas acionadas por quatro pessoas, os escritos sugerem que o “parafuso aéreo” poderia erguer-se no ar rodando depressa em torno de um eixo central. Da Vinci acreditava que o ar podia ser comprimido, logo, tal como um parafuso perfura um material subjacente, o seu engenho poderia “penetrar” o ar acima, elevando a máquina do solo. Só que os materiais suficientemente fortes e leves para que o engenho funcionasse não estavam disponíveis na época. Além disso, não teria voado por muito tempo: uma vez no ar, o parafuso perderia a estrutura de suporte contra a qual exercer pressão de forma a continuar a girar. Pode nunca ter levantado voo, mas o inovador “parafuso” de Da Vinci foi o primeiro a explorar o potencial de uma espiral rotativa para voar.

Da Vinci sonhou com mecanismos que permitiriam ao homem alcançar os céus. Ideia de peso

As notas de Da Vinci especificam também a utilização de cabos de ferro com cerca de 5 cm de diêmetro – prevê-se que o engenho pesaria até uma tonelada.

Materiais

Os apontamentos de Da Vinci mencionam que a secção da hélice podia ser feita de linho tratado com goma, ajudando a reduzir a porosidade do tecido e a torná-lo mais aerodinâmico.

Plataforma

Quatro homens deslocar-se-iam em torno da base, fazendo pressão com os pés contra a plataforma para girar as manivelas, fazendo rodar o resto do mecanismo.

SERÁ QUE RESULTA?

“ As obras mais famosas de Da Vinci são as suas pinturas, mas também foi um engenheiro e inventor criativo e talentoso.”

Embora pareça o protótipo de um helicóptero, o invento de Da Vinci seria incapaz de levantar voo, em parte devido à relação peso/ potência demasiado baixa. Um obstáculo encontrado neste estudo foi calcular como produzir velocidades suficientemente elevadas para gerar a sustentação necessária.

Estrutura

Da Vinci pretendia que a máquina fosse construída num material leve e durável, como o pinho.

Ornitóptero Entusiasmado pelo voo das aves, Da Vinci criou alguns desenhos inventivos de asas mecânicas.

Controlo

O piloto usaria um sistema de roldanas e pedais para abrir e fechar as asas curvas rápida e repetidamente.

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Da Vinci observou aves e outros animais em voo e ficou obcecado com o conceito de um engenho que permitisse ao homem fazer o mesmo. Uma das suas ideias era um ornitóptero, alimentado pelo bater de asas mecânicas. Da Vinci escreveu mais de 35.000 palavras sobre e desenhou 500 esboços de máquinas voadoras. Percebia que as aves dependiam tanto da SERÁ QUE sustentação como da propulsão para manterem RESULTA? o voo, e que se equilibravam tanto com as asas Já foram construídos como com a cauda. Insinuou a ideia da gravidade ornitópteros com asas e compreendeu que as máquinas voadoras batentes, tanto tripulados tinham de ser tão leves quanto possível. como não. Podem Os seus esboços demonstram conhecimentos funcionar com a ajuda de aerodinâmica, mostrando como o fluxo de ar de um motor. podia ser otimizado e como as aeronaves produzem atrito. O único inconveniente era o corpo humano, incapaz de alcançar o voo sozinho e insuficientemente musculoso para alimentar um engenho mecânico voador. Quero Saber | 119

© Shutterstock

Descolagem?


FIGURAS INFLUENTES

DE GUERRA MÁQUINAS Da Vinci imaginou diversos dispositivos militares que podiam ter revolucionado o campo de batalha.

Carro de combate A conceção de Da Vinci pode ser considerada um antepassado distante dos tanques da I Guerra Mundial.

Torreta

Os homens no interior acederiam provavelmente à torreta através de uma escada e usá-la-iam para observar o campo de batalha e transmitir táticas a aliados.

Incorporando projetos anteriores para armamento blindado, o sistema de canhões de Da Vinci inspirado na carapaça de uma tartaruga poderia deslocar-se sobre terreno plano e seria movido por uma equipa de oito homens. Bois e cavalos foram inicialmente considerados, mas o espaço no interior do carro era limitado. A tripulação seria protegida por um revestimento robusto inclinado e uma torreta no topo seria usada como posto de observação para ajudar a orientar os condutores. O carro de combate era uma boa ideia no papel, mas nunca teria funcionado. Tal como no “parafuso aéreo”, o corpo humano simplesmente não possui o poder muscular necessário para movê-lo; e as rodas estreitas tê-lo-iam enterrado facilmente na lama.

“ As ideias eram ambiciosas mas alicerçadas em cálculos lógicos baseados em teorias científicas.” Blindagem

O design inclinado proposto por Da Vinci era talvez superior à blindagem dos tanques da I Guerra, já que o ângulo de 45 graus ajudaria a defletir o impacto dos projéteis inimigos.

Sistema motopropulsor

Da Vinci recomendou que o carro fosse manobrado por uma equipa de oito homens, que acionariam manivelas para girar as rodas.

SERÁ QUE RESULTA? Canhões

Dispostos a espaços regulares em torno da circunferência do carro, poderiam disparar em qualquer direção.

120 | Quero Saber

Se a ilustração de Da Vinci fosse seguida, os eixos rodariam as rodas em direções opostas, impedindo o carro de se mover. Crê-se que este foi um erro deliberado, caso o seu design caísse em mãos inimigas.

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SABIA QUE... Bill Gates comprou um dos cadernos de Da Vinci por $ 30,8 milhões, o que o tornou o livro mais caro de sempre?

Chuva de metal

Uma vez disparadas, as balas de canhão separavam-se em vários pedaços, lançando estilhaços de metal letais sobre a infantaria inimiga.

A bombarda

Outra arma que Da Vinci reproduz nos seus cadernos é uma bombarda capaz de lançar munições de fragmentação.

Rodas

Apesar da inclusão de tachas nas rodas para melhorar a tração, é provável que o carro se atolasse em terreno lamacento e irregular.

Metralhadora Uma arma de canos múltiplos capaz de disparar projéteis de fogo rápido contra hordas de soldados inimigos. Os canhões eram importantes na artilharia renascentista. Da Vinci pretendia adicionar manobrabilidade e poder de fogo extra com o seu conceito de uma “máquina de guerra” de canos múltiplos, capaz de disparar uma dúzia de balas de canhão de uma só vez. Com rodas laterais, o “canhão” portátil de carregar pela boca tinha um corpo rotativo, com até três filas de armas giratórias; uma podia disparar enquanto as outras duas arrefeciam e eram recarregadas. O coice seria violento, pelo que a máquina estava equipada com um anteparo de suporte, que mantinha o corpo principal no lugar. Num dos esboços, os canos surgem dispostos em leque, para um alcance superior.

Coice

O canhão seria colocado numa estrutura de madeira para mantê-lo no lugar. Embora fosse pesado, disparar com precisão não seria difícil.

Balista Um canhão para eliminar alvos específicos no campo de batalha.

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Proteção

Um resguardo de madeira inclinado protegeria os operadores do canhão. © Sol90

A balista era um engenho de artilharia já existente mas, tal como em muitas outras criações, Da Vinci desenvolveu a ideia. A sua versão podia disparar em várias direções, tanto na horizontal como na vertical. Um arco elevatório movia a “balista” para cima e para baixo; quando a altura desejada era atingida, era mantida no lugar por uma cavilha cilíndrica. Podia então ser apontada para a esquerda e para a direita, disparando balas de canhão de ferro ou pedra, e até setas com pontas metálicas.

Quero Saber | 121


FIGURAS INFLUENTES

S HIDRÁULICAS MÁQUINA Os cadernos de Da Vinci apresentam várias ideias para engenhos complexos mas funcionais alimentados pela água.

Barco com rodas de pás Este veículo de movimento recíproco era um avanço enorme face ao barco a remos da época. Na ausência de motores de combustão interna, os barcos e navios no século XV eram movidos pelo vento ou por remos. Escrevendo entre 1487 e 1489, Da Vinci concluiu que um mecanismo baseado em pás que utilizasse o movimento recíproco ou alternado (movimento de vaivém repetitivo) seria muito mais eficaz. Ao substituir os remos por rodas de pás, seria mais fácil para o barco navegar contra a corrente. O barco com rodas de pás não foi uma ideia original de Da Vinci; os inventores italianos Taccola e Francesco di Giorgio tinham ambos abordado o conceito, mas esta era a proposta mais

realista e viável até então. Os operadores pressionariam pedais alternadamente, que acionavam um sistema de movimento recíproco, que, por sua vez, era transformado em movimento rotativo para girar as rodas de pás e impelir o barco para a frente. O princípio era o oposto ao de um moinho de água, com a máquina a mover a água em vez de a água a mover a máquina.

1 Pedal

O mecanismo arranca com o operador a pressionar um dos dois pedais.

“É provável que os inventos de outros homens da Renascença tenham influenciado Da Vinci.”

2 Motor

O movimento recíproco produzido pelo pedal é transformado em movimento rotativo por uma série de manivelas, molas e engrenagens.

3 Pás

O movimento rotativo produzido pelo motor gira as rodas de pás para impelir o barco para a frente.

© Ilustrações por Adrian Mann; Pexel; Pixabay; Shutterstock

4 Movimento alternado Os operadores pressionam alternadamente os pedais esquerdo e direito, para manter as rodas de pás a girar.

SERÁ QUE RESULTA? Utilizando motores a vapor ao invés da força humana, a roda de pás foi mais tarde amplamente usada em todo o mundo, de forma mais célebre nos barcos do rio Mississípi (EUA).

122 | Quero Saber

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SABIA QUE... Da Vinci era fascinado pela água e usou 64 palavras diferentes nos seus cadernos para explicar o seu movimento?

Serrar

Tronco

A serra automática corta “para cima e para baixo”, num movimento recíproco linear. A linha de corte é mantida pelo sistema de roldanas, para criar toros de igual tamanho.

A madeira é colocada num suporte que a conduz à lâmina da serra para ser cortada.

Conversão energética

O movimento rotativo é convertido em linear por uma roda de roquete, em que uma alavanca articulada move uma roda dentada numa única direção, mantendo uma velocidade constante.

INVENÇÕES DE DA VINCI USADAS HOJE Rolamentos de esferas

Vista primeiro num desenho de 1497, a ideia baseou-se em antigos rolos egípcios usados para transportar enormes blocos de pedra rampa acima na construção das pirâmides.

Casco duplo

Da Vinci sugeriu que um casco duplo impediria os navios de se afundarem se o primeiro fosse perfurado pelo aríete de um navio inimigo – uma arma comum nas batalhas navais.

Paraquedas

Da Vinci imaginou esta combinação de tecido de linho e varas de madeira 300 anos antes do primeiro teste a um paraquedas. O seu design foi testado em 2005 e funcionou.

Roda d’água

Um canal de água corrente aciona uma roda d’água, que alimenta a máquina via movimento rotativo.

Robô

Roldanas

Serra mecânica

Um sistema de roldanas move gradualmente o suporte da madeira à medida que é cortada.

Outro invento hidráulico, concebido para cortar madeira depressa e de modo eficaz. Descrita por volta de 1478, a serra mecânica de Da Vinci era um dispositivo de corte rápido, que utilizava a energia de um moinho de água para cortar os troncos. A madeira seria então usada na construção, sobretudo em tempos de guerra, servindo para erigir rapidamente pontes militares – que eram fáceis de transportar e podiam ser montadas depressa sobre um curso de água para permitir a travessia das tropas. O mecanismo era relativamente simples: um canal de água corrente fazia girar um moinho, cujo movimento rotativo era transformado em movimento alternado (recíproco) linear para acionar o movimento de vaivém (para cima e para baixo) da serra. O sistema alimentava também roldanas e manivelas que mantinham o tronco em movimento, em direção à serra. Tal como o barco com rodas de pás, a serra mecânica já fora idealizada mas não com este nível de pormenor. Mais uma vez, Da Vinci agarrou num conceito inteligente e melhorou-o.

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SERÁ QUE RESULTA? A serra mecânica foi uma das conceções menos inovadoras mas mais viáveis de Da Vinci. O sistema de corte automático funciona sob os mesmos princípios de um típico moinho de água.

Com um sistema de roldanas, pesos e engrenagens, o robô de Da Vinci era uma armadura móvel capaz de mexer os membros, virar a cabeça, sentar-se e pôr-se de pé.

Ar condicionado Quando instado a ajudar a ventilar um boudoir, Da Vinci criou uma ventoinha movida a água, em 1500, que pode ser vista como precursora das modernas soluções de arrefecimento.

Quero Saber | 123


FIGURAS INFLUENTES

Michael Faraday M Conheça melhor o cientista responsável pela indução eletromagnética e que inspirou Albert Einstein. Faraday era químico e físico, e investigou os gases liquefeitos, o vidro ótico e a eletrólise.

“ Faraday adorava ler e construiu o seu caminho através dos livros que encadernava, desenvolvendo um ávido interesse por química, eletricidade e magnetismo.”

Vida e obra

Alguns acontecimentos importantes da carreira eletrizante de Michael Faraday no século XIX.

124 | Quero Saber

1791

Michael Faraday nasce no Surrey, Reino Unido, filho de James Faraday e Margaret Hastwell.

1805

Começa a trabalhar como aprendiz de encadernador. Durante este período, desenvolve o interesse por ciência.

1813

ichael Faraday nasceu em Inglaterra, em 1791, no seio de uma família pobre, sem recursos financeiros para a sua educação. Poucos adivinhariam que acabaria por fazer avançar enormemente o nosso conhecimento sobre a eletricidade e outras áreas. Aprendeu a ler e escrever na catequese e tornou-se aprendiz de encadernador na adolescência. Faraday adorava ler e construiu o seu caminho através dos livros que encadernava, desenvolvendo um ávido interesse por química, eletricidade e magnetismo. A sua recém‑descoberta predileção pela ciência levou-o a uma série de quatro palestras do químico Humphry Davy, onde tirou imensas notas, na esperança de arranjar emprego na Royal Institution. A sua persistência acabou por compensar e conseguiu trabalho como assistente de laboratório de Davy. Faraday trabalhou vários anos para Davy e, neste período, ambos viajaram pela Europa. Com Davy, Faraday efetuou várias descobertas no campo da química, incluindo quando isolou pela primeira vez o benzeno, em 1825. Também produziu dois novos compostos químicos: o hexacloroetano, que hoje constitui a base das granadas fumígenas militares, e o tetracloroetileno, amplamente utilizado na limpeza a seco ainda hoje. As maiores descobertas de Faraday, contudo, não foram na química, mas na física. Em 1820, Hans Christian Oersted descobriu que uma corrente elétrica podia produzir um campo magnético. Faraday estava convencido que o oposto também seria verdade e iniciou o seu trabalho mais influente, em indução eletromagnética. O seu primeiro achado aconteceu pouco depois, quando mostrou que, enrolando duas bobinas de fio de cobre isolado de cada lado de um anel de ferro macio, uma corrente podia ser transferida de uma bobina para a outra, num processo chamado indutância mútua. Desejoso de aprofundar a sua investigação, Faraday continuou a pesquisar as propriedades eletromagnéticas dos materiais, o que conduziu ao seu maior feito, em 1831: a descoberta da indução eletromagnética (ver “A grande ideia”).

Trabalha como assistente de Humphry Davy, efetuando vários avanços na área da química.

1821

Faraday descobre o princípio por detrás do motor elétrico, usando a ideia da rotação eletromagnética.

1824

É eleito membro da Royal Society.

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SABIA QUE... Faraday aprendeu a ler e escrever na catequese e tornou-se aprendiz de encadernador na adolescência?

Michael Faraday trabalhou na Royal Institution em Londres, onde desenvolveu as suas teorias em física e química.

Faraday recusou o título de cavaleiro e a presidência da Royal Society duas vezes.

Cinco factos: Faraday

1

Prolífico

2

Nanopartículas

3

Modesto

4

Licões de Natal

5

Concorrência

Michael Faraday desenvolveu uma primeira versão do bico de Bunsen e descobriu as leis da eletrólise.

A grande ideia

1825

Faraday é nomeado diretor do laboratório da Royal Institution, iniciando a série de “Lições de Natal”.

1831

Descobre o princípio da indução eletromagnética e inventa o gerador eletromagnético.

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Recusou ser armado cavaleiro pela rainha Vitória, e ser presidente da Royal Society por duas vezes. Faraday fundou as Lições de Natal da Royal Institution (RI). Até hoje, demonstrações divertidas de ciência são transmitidas no Natal pela RI.

O padre italiano Francesco Zantedeschi e o cientista norte-americano Joseph Henry também estavam a trabalhar sobre indução eletromagnética. Ainda se discute qual deles terá tido a ideia primeiro.

1858

Faraday muda‑se para Hampton Court, uma atribuição da rainha Vitória pelos seus serviços à ciência.

1867

Morre aos 75 anos, em Hampton Court. É sepultado no Cemitério de Highgate.

© Corbis

O trabalho de Faraday em eletromagnetismo suscitou o interesse de outros cientistas e matemáticos. William Thomson escreveu-lhe a sugerir que era matematicamente possível os ímanes alterarem o plano da luz polarizada. Há muito que o próprio Faraday estava interessado nesta ideia, conduzindo experiências para mostrar como a luz e os campos magnéticos interagem. Foi um dos primeiros passos para percebermos que a luz visível é, na verdade, radiação eletromagnética. Mais para o fim da sua vida, a saúde de Faraday piorou, mas o cientista continuou a dar aulas na Royal Institution. Os seus contributos científicos foram reconhecidos pela família real e, em 1858, Faraday mudou-se para uma casa em Hampton Court, concedida pela rainha Vitória. Faleceu em 1867 e, tendo previamente recusado um túmulo na Abadia de Westminster, foi sepultado no Cemitério de Highgate.

Faraday foi um prolífero cientista, mas é célebre sobretudo pelo seu trabalho sobre a indução eletromagnética. A Lei de Faraday estipula que uma mudança no ambiente magnético junto a uma bobina de fio metálico induzirá uma tensão na bobina. Faraday desenvolveu um disco de cobre rotativo, que gira ao lado de um campo magnético estático (fornecido por um íman em barra). Enquanto o disco roda através do campo magnético, gera-se uma diferença de potencial entre o centro e o rebordo do disco, criando uma corrente direta estável. O disco era ineficaz, mas foi a base para o desenvolvimento de indutores, transformadores, motores elétricos e geradores.

Faraday foi o primeiro a falar das propriedades das nanopartículas, notando que os coloides de ouro (partículas de ouro submicrométricas dispersas num líquido) têm propriedades diferentes do ouro sólido.

Quero Saber | 125


FIGURAS INFLUENTES

Isambard Kingdom Brunel Embora nem sempre bem-sucedido, Brunel inovou os meios de transporte e é agora recordado como um dos melhores engenheiros de todos os tempos. Isambard Kingdom Brunel revolucionou os caminhos de ferro e os navios, a nível global.

“ O SS Great Britain lançou as bases de uma nova era nas viagens transatlânticas.”

Vida e obra Brunel deixou a sua marca na história – mas quais foram os momentos decisivos?

126 | Quero Saber

1806

Isambard Kingdom Brunel nasce em Portsmouth, RU, filho do engenheiro civil francês Marc Isambard Brunel e Sophia Kingdom.

1827

Brunel é nomeado engenheiro residente no projeto do túnel do Tamisa, em Londres, assumindo o lugar do pai.

A

pesar de ser uma era de progresso, a Revolução Industrial foi também uma época de tentativa e erro. Os que lideraram os avanços tecnológicos tentavam dar passos, alguns fracassados, outros sucessos incríveis. Um dos inovadores desta época foi Isambard Kingdom Brunel, nascido no início do século XIX. O seu pai, Marc, era um engenheiro civil francês que o encorajou a aprender aritmética, desenho à escala e geometria. Aos 16 anos, tornou-se aprendiz de relojoeiro. Em 1824, Marc foi nomeado engenheiro chefe de um projeto para construir um túnel sob o rio Tamisa, no Reino Unido (RU). Contratou o filho como assistente – que, mais tarde, chegou a engenheiro residente. O projeto sofreu várias inundações e dificuldades financeiras. A determinada altura, as operações foram suspensas por vários anos e o túnel coberto com tijolos. Abriu em 1843 e ainda hoje é utilizado como parte do metro de superfície London Overground. O projeto tornou o jovem Brunel um engenheiro qualificado. Em 1830, participou numa competição para conceber uma ponte que atravessasse o rio Avon, em Bristol (RU), e apesar de ter sido inicialmente rejeitado, conseguiu persuadir o júri a nomeá-lo engenheiro projetista. O trabalho na ponte suspensa de Clifton (RU) começou em junho de 1831, mas apenas quatro meses depois os tumultos de Queen Square afastaram os investidores. Mais uma vez, o projeto não foi bem sucedido. Em 1833, Brunel era o engenheiro chefe da via-férrea Great Western Railway que ligaria Londres a Bristol. Foi nessa altura que desenvolveu um dos conceitos mais polémicos

1830

Entra numa competição para conceber uma ponte sobre o rio Avon (RU), conseguindo o primeiro lugar.

1831

Começa o trabalho na ponte suspensa de Clifton mas dificuldades financeiras deixam o projeto num impasse.

1833

Brunel torna-se engenheiro chefe da Great Western Railway, onde cria uma via-férrea mais larga.

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SABIA QUE... Isambard Kingdom Brunel é considerado uma das figuras mais engenhosas e prolíficas da história da engenharia?

A ponte suspensa de Clifton Que tipo de engenharia garantiu a sobrevivência da ponte até hoje?

Vão

Na altura da sua construção, o vão de 214 m sobre o rio Avon era o mais longo do mundo.

As duas torres de 26 m de altura são diferentes: a torre Clifton tem recortes laterais enquanto a torre Leigh tem abóbodas.

1 Correntes

A ponte tem três correntes de ferro forjado fixadas a túneis 18 m abaixo do solo.

Fundações

Os pilares com arenito vermelho têm câmaras abauladas, com mais de 11 m de altura, que reduziram o custo da construção.

Tabuleiro

O tabuleiro é composto por barrotes de madeira com 13 cm de espessura sobrepostos por conjuntos de tábuas com 5 cm de profundidade.

A grande ideia A ponte suspensa de Clifton, em Bristol, estende-se por 214 m, entre duas torres de 26,2 metros de altura, o que a tornava, na época, a ponte mais longa do mundo. No seu projeto de correntes e tirantes, Brunel fez um cálculo quase perfeito do peso mínimo necessário para fornecer a máxima força. Os pilares têm câmaras e túneis, alguns com 11 m de altura, o que reduziu o custo da construção sem comprometer a resistência.

da sua carreira – utilizar uma via (distância entre as linhas férreas) com 2,1 metros de largura em vez do standard com 1,4 m. Brunel acreditava que tal permitiria ao comboio velocidades superiores, bem como viagens mais estáveis e confortáveis. Até ao fim da vida, a eficiência deste conceito foi contestada. Mas ninguém conseguiu refutar a eficácia do seu navio a vapor Great Western que transportava passageiros de Bristol a Nova Iorque (EUA). Pensava-se que o navio não seria capaz de transportar combustível suficiente para a viagem e ainda ter espaço para a carga. No entanto, concluiu a primeira viagem em 15 dias, restando-lhe ainda um terço do carvão. Brunel foi também um defensor dos navios movidos a hélice e integrou um propulsor

1838

O navio a vapor Great Western conclui a viagem de Bristol a Nova Iorque em apenas 15 dias.

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O túnel do Tamisa é aberto ao público e o navio movido a hélice SS Great Britain é lançado à água.

Durante a adolescência, Brunel frequentou a escola em França, mas a sua inscrição na ilustre escola de engenharia francesa École Polytechnique foi rejeitada porque era considerado “estrangeiro”.

2

Festa no rio

Em 1827, depois de várias inundações, Brunel realizou um banquete dentro do túnel do Tamisa para convencer as pessoas de que era perfeitamente seguro.

3

Vencer a competição

4

Moeda ao ar

5

A senhora da lâmpada

O projeto de Brunel para a ponte de Clifton foi inicialmente rejeitado pelo juiz Thomas Telford, que deu preferência ao seu próprio projeto.

no seu segundo navio, o SS Great Britain. Considerado um navio de longo curso, era construído em metal, alimentado por um motor e não por vento, e impulsionado por uma hélice em vez de uma roda de pás. Na realidade, este navio lançou as bases de uma nova era nas viagens transatlânticas. A vida pessoal de Brunel foi igualmente agitada. Muitos afirmam que o stress provocado pelos caminhos de ferro Great Western Railway provocou a sua morte prematura em 1859. Pouco depois do falecimento, todas as vias-férreas regressaram à largura padrão de 1,4 metros. Também as fundações para completar a ponte de Clifton foram levantadas, tendo esta sido inaugurada cinco anos após a morte de Brunel e sendo ainda utilizada nos dias de hoje.

1843

Ligação francesa

1852

O conceito de Brunel para a estação de Paddington é construído.

Em 1843, enquanto fazia um truque de magia para os filhos, uma moeda ficou alojada na sua traqueia. Para removê-la, Brunel foi preso a uma prancha de cabeça para baixo.

Em 1855, concebeu a pedido de Florence Nightingale o projeto para um novo hospital que viria a substituir a unidade hospitalar do exército britânico em Scutari, Turquia.

1859

Brunel morre a 15 de setembro, dez dias depois de sofrer um AVC.

1864

A ponte suspensa de Clifton é concluída e utilizada pelo Instituto do Engenheiros Civis como homenagem a Brunel.

Quero Saber | 127

© Alamy; National Maritime Museum; Thinkstock

Torres

Cinco factos: Brunel


FIGURAS INFLUENTES

Charles Darwin

Pai da biologia evolutiva, Darwin é o naturalista mais famoso de sempre e um dos nomes mais influentes da ciência moderna – mas porquê? Ao publicar as suas ideias, Darwin foi atacado pela Igreja, mas entretanto foi-lhe dada razão.

A grande ideia Mecanismo-chave da evolução, a seleção natural descreve como os traços biológicos se tornam mais ou menos comuns através da sua reprodução numa mesma população. Com a reprodução seletiva de alterações no fundo genético, uma espécie adapta-se de forma gradual e não aleatória a fatores ambientais alheios ao seu controlo, aumentando as hipóteses de sobrevivência.

Vida e obra

Famoso por descrever a evolução da humanidade, traçamos a evolução do próprio Darwin durante o séc. XIX.

128 | Quero Saber

1809

Charles Darwin nasce em Shrewsbury, Inglaterra. Os seus pais são Robert (acima) e Susannah Darwin.

1818

Em junho, Darwin vai para a Shrewsbury School como aluno interno, onde estuda durante sete anos.

1825

Darwin inscreve-se em medicina na Universidade de Edimburgo com o irmão mais velho Erasmus.

C

harles Robert Darwin foi um naturalista inglês célebre pelas suas teorias da evolução e da seleção natural, ambas introduzidas no seu trabalho seminal A Origem das Espécies. O livro foi tão criticado como aclamado por vários grupos sociais na altura da publicação. A polémica inicial surgiu devido ao aparente ataque a grande parte da sagrada escritura, mas viria a tornar-se uma das obras mais influentes para a sociedade ocidental, originando o campo dos estudos evolutivos. Embora A Origem das Espécies tenha sido publicado em 1859, Darwin começou a divisar a evolução através da seleção natural pouco depois de uma volta ao mundo iniciada em 1831. O naturalista embarcou nesta viagem para expandir o seu interesse recente por história natural, passando o tempo a recolher espécimes e a analisar muitas espécies interessantes – quando não sofria de enjoo. Durante a expedição no HMS Beagle, recolheu 5.436 ossos, peles e carcaças de várias criaturas. As suas experiências e descobertas levaram-no a questionar muitas das crenças aceites sobre a origem da vida. Em 1838 estabeleceu a sua teoria da seleção natural – ver caixa “A grande ideia”. Durante os 20 anos seguintes, refinou-a, até receber uma carta do colega naturalista britânico Alfred Russel Wallace, que esboçava ideias muito semelhantes às suas. Darwin ficou espantado por partilharem as mesmas teorias. Os trabalhos de ambos acabariam por ser apresentados em conjunto em 1858 na Sociedade Lineana, em Londres, mas sem grande impacto. Darwin granjeava um status social e científico que Wallace não tinha. Incitado pelo seu amigo advogado e geólogo Charles Lyell, publicou então A Origem das Espécies, no ano seguinte – e ficou para a história como o pai da biologia evolutiva.

1827

É aceite no Christ’s College, Cambridge, para estudar teologia e não ciências.

1831

Aceita uma oferta para ir em viagem no HMS Beagle, que zarpa a 27 de dezembro.

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SABIA QUE... Charles Darwin e Alfred Russel Wallace formularam ambos a teoria da seleção natural de forma independente?

Embora haja quem ache que a importância dos tentilhões das Galápagos para as teorias de Darwin foi exagerada, pesquisas mais recentes indicam que são um bom exemplo de microevolução.

Cinco factos:

Charles Darwin

1Pai de família

Darwin teve dez filhos, embora dois tenham morrido na infância. Três tornaram-se membros da Royal Society.

2 Rosto de nota

Talvez o habitante mais famoso das Galápagos, a tartaruga gigante.

Este foi um momento decisivo para Darwin – e para a ciência em geral. Até certo ponto, era uma compilação de ideias já debatidas por outros biólogos, mas nunca provadas. Apesar de Darwin não fornecer provas concretas da evolução, a clareza e a lógica do trabalho levaram a que, no final da década de 1870, a comunidade científica e a sociedade em geral tivessem aceite a teoria. Darwin deu seguimento à obra em 1871 com A Origem do Homem (e Seleção em Relação ao Sexo), onde aplicou a sua própria teoria

evolutiva especificamente à evolução do ser humano a partir dos símios. O livro foi incrivelmente popular desde o início, com uma segunda edição encomendada três semanas depois do lançamento. Três meses após a publicação, tinham sido vendidas 4.500 cópias – uma prova da sua fama crescente. Darwin morreu a 19 de abril de 1882 de doença cardíaca e, após um pedido dos colegas, teve um funeral de estado na Abadia de Westminster, sendo enterrado ao lado dos cientistas John Herschel e Isaac Newton.

“ (A publicação de A Origem das Espécies) foi um momento decisivo para Darwin – e para a ciência.”

Darwin é celebrado no Reino Unido com o seu retrato impresso nas notas de £ 10, juntamente com um colibri e o navio HMS Beagle.

3 Escola de pensamento

A escola que Charles Darwin frequentou em criança, a Shrewsbury School, ainda existe, mas não no mesmo edifício, agora uma biblioteca.

4 Nomes científicos Devido às grandes conquistas de Darwin no campo da história natural, até à data, mais de 120 espécies e nove géneros diferentes têm um nome em sua honra.

5 Marinheiro de água doce

O HMS Beagle levou cinco anos a circum-navegar o mundo, mas Darwin só passou 18 meses a bordo. Desde o dia em que zarpou, foi atormentado por terríveis enjoos.

1836

Desembarca em Inglaterra a 2 de outubro e regressa a casa, em Shrewsbury.

1839

Casa-se com Emma Wedgwood e nasce o primeiro de dez filhos.

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1858

Recebe uma carta de Alfred Russel Wallace, com quem partilha muitas ideias sobre a seleção natural.

1859

Publica A Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural, ou a Preservação de Raças Favorecidas na Luta pela Vida.

1864

Recebe a medalha Copley, o maior louvor da Royal Society Morre aos 73 anos e é britânica. sepultado em Westminster.

1882

Quero Saber | 129

© Mike Cornwell

O HMS Beagle esteve apenas cinco semanas nas Ilhas Galápagos, mas foi o suficiente para a pesquisa de Darwin.


FIGURAS INFLUENTES

Os irmãos Wright

Esta dupla teve um papel crucial na evolução do voo a motor e alterou radicalmente o curso da história da aviação.

Wilbur (à direita) e Orville no Encontro de Aviação em Belmont Park, Nova Iorque, em 1910.

A grande ideia Antes do voo de sucesso dos irmãos Wright (abaixo), muitos outros cientistas e engenheiros haviam sonhado e, com diferentes graus de sucesso, tentado construir máquinas que, além de desafiarem a gravidade, o fizessem de forma controlada. Os seus desaires fizeram um método de voo não dirigível parecer uma mera fantasia, com materiais, aerodinâmica e fontes de energia a parecerem obstáculos intransponíveis. Testemunho da perícia dos irmãos Wright é o facto de, com a sua aeronave, terem resolvido cada uma destas questões, conseguindo em anos o que inúmeras mentes não conseguiram em séculos. Exemplos incluem o teste de centenas de designs de asas num túnel de vento à medida para determinar que forma oferecia maior sustentação, a conceção e construção de um motor de combustão interna de quatro cilindros que foi adaptado para viagens aéreas e a perceção de que pás de hélice podiam ser entendidas como asas rotativas.

Subir e subir Os principais marcos até à descolagem do Wright Flyer.

130 | Quero Saber

1867 1869 Nasce Wilbur, com Orville a chegar quatro anos depois.

W

ilbur e Orville Wright são dois dos mais famosos pioneiros da aviação que, através de várias experiências em finais do século XIX/ princípios do século XX, criaram a primeira aeronave mais pesada que o ar, a motor e controlável. Chamado Wright Flyer, o avião foi o culminar de mais de uma década de pesquisa e testes que viu os irmãos progredirem de papagaios feitos à medida para planadores e, por fim, para aviões a motor. Juntos, estes irmãos talentosos são considerados responsáveis pelo lançamento da era do voo a motor. Wilbur e Orville Wright eram filhos de Milton Wright, um pastor ordenado da Igreja dos Irmãos Unidos em Cristo, e de Susan Catherine Koerner Wright. A família viveu em diversos locais dos EUA, incluindo Richmond, Indiana; Cedar Rapids, Iowa; e Dayton, Ohio – este último pela maioria das vidas dos irmãos. Orville mais tarde explicou que o seu pai os encorajara a ambos desde tenra idade a “perseguir interesses intelectuais e a investigar o que quer que suscitasse curiosidade”. Este encorajamento conduziu Orville e Wilbur a um diverso leque de interesses e competências, incluindo impressão, bicicletas – que o par vendeu e reparou por vários anos – e a construção de inúmeras máquinas de madeira e metal. Ambos engenheiros e inventores, tornaram-se conhecidos pela sua aplicação académica e prática da engenharia moderna, com Wilbur, em particular, a passar muito

A família Wright muda-se para Dayton, Ohio, devido a compromissos profissionais do pai.

1892

Os irmãos abrem uma oficina de reparação de bicicletas. Poucos anos depois, já as constroem.

tempo em bibliotecas públicas e na do seu pai. Um dos seus heróis foi o pioneiro da planação alemão Otto Lilienthal, que, até à sua morte em 1896, construiu e pilotou várias aeronaves com diferentes graus de sucesso. A sua morte – devida à queda de um planador – desencadeou o interesse dos irmãos pelo voo, tendo estes escrito ao Instituto Smithsonian a pedir sugestões sobre outros manuscritos aeronáuticos. Uma das recomendações do museu foi o engenheiro Octave Chanute, uma autoridade da aviação e engenharia civil da época. Com a ajuda de Chanute, os Wright começaram a conduzir várias experiências aeronáuticas. Crucial para a sua abordagem foi o foco no controlo da aeronave, desenvolvendo designs prévios que só conseguiam voar em linha reta ao introduzirem uma torção helicoidal através das asas em cada direção. Os irmãos testaram esta configuração em 1899 e, depois de descobrirem que permitia o controlo preciso de um papagaio, começaram a trabalhar num modelo à escala real: o primeiro Wright Glider. Este foi testado em outubro de 1900, em Kitty Hawk, Carolina do Norte, onde, embora tenha descolado do solo, produziu resultados dececionantes. Os irmãos Wright refinaram o seu planador e testaram-no em 1901, e novamente em outubro de 1902, após passarem o verão a efetuar uma vasta bateria de testes a designs de asas mais eficientes. Este terceiro modelo foi uma vitória, com o planador a portar-se exatamente como

1900

Anos de pesquisa levam os irmãos a testar o Wright Glider (à direita), um biplano sem motor com um leme de profundidade à frente para controlo longitudinal.

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SABIA QUE... O pioneiro da aviação Otto Lilienthal, conhecido como “homem voador”, inspirou os irmãos Wilbur e Orville?

O Wright Flyer em foco

Hélice

Duas grandes hélices eram acionadas por uma roda dentada para corrente, oferecendo ao Flyer uma pequena quantidade de propulsão.

Veja de perto o pináculo das carreiras de aviação dos irmãos Wright.

Cinco factos:

Wright

1

Não universitários

Wilbur e Orville foram os únicos membros da família Wright a não frequentar a universidade. Orville passou os anos a aprender o ofício de impressor, enquanto Wilbur ajudava na igreja local.

2

Solteiros

Nenhum dos irmãos Wright casou. Wilbur é recordado como tendo dito que “não tinha tempo para uma esposa e um avião”.

Um sistema elevador à frente, em madeira de abeto, gerava sustentação extra na descolagem.

Motor

O Flyer usava um motor de êmbolo de quatro cilindros arrefecido a água feito por medida; este era capaz de produzir cerca de 9 kW (12 cv).

previsto. O par – que pilotava o planador à vez – acumulou quase mil voos entre si, num período de dois meses, cobrindo distâncias em Kitty Hawk de até 190 metros. Percebendo que haviam resolvido os problemas de aerodinâmica e controlo com que todos os seus antecessores se tinham debatido, os irmãos voltaram atenções para uma fonte de energia para o planador. Em 1903, construíram o seu próprio motor de combustão interna de quatro cilindros e voltaram a Kitty Hawk para o testar. Infelizmente, a primeira tentativa acabou com o motor a parar durante a descolagem e a frente do avião a ficar danificada. Após algumas reparações, contudo, o segundo voo foi um sucesso retumbante. Descolando às 10h35 de 17 de dezembro de 1903, o Wright Flyer voou 36 metros, depois 53 metros, seguidos de 60 metros e, por fim, 259,7 metros. Esta série de voos prenunciou uma nova era da aviação e impeliu os irmãos Wright e o seu avião para a fama mundial.

1903

Pilotam com sucesso o Wright Flyer em voo sustentado em Kitty Hawk, Carolina do Norte. O seu quarto voo cobre 259,7 metros em apenas 59 segundos.

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1909

A Wright Company vende o primeiro avião militar de sempre, o Wright Military Flyer (à direita), ao US Army Signal Corps.

Asa

Cabos ligados à zona onde ficava o piloto puxavam as asas quando o leme do avião era ajustado.

O Memorial Nacional aos irmãos Wright situa-se em Kill Devil Hills, Carolina do Norte – perto de Kitty Hawk.

“ Ambos engenheiros e inventores, tornaram-se conhecidos pela sua aplicação académica e prática da engenharia moderna.”

3

Brincadeira

4

Luminares

5

De hobby a negócio

Nos seus últimos anos de vida, os irmãos Wright atribuíram o seu fascínio por máquinas voadoras a um pequeno helicóptero de brincar que o seu pai trouxera das suas viagens. Ambos os irmãos catalogaram amplamente as suas experiências de aviação, conduzindo à conferência de Wilbur Wright na prestigiada Western Society of Engineers em Chicago, em 1901. A palestra intitulava-se “Some Aeronautical Experiments”.

Em 1909, foi erigida a Wright Company, com Wilbur como presidente e Orville como um dos dois vice‑presidentes. A fábrica da empresa situava‑se em Dayton e o seu campo de voo na vizinha Pradaria Huffman.

1915

Orville termina a liderança da Wright Company Wilbur morre vendendo as de febre tifoide suas ações a 30 de maio, a um grupo aos 45 anos. de financeiros.

1912

1948 1920

Orville junta-se ao conselho do National Advisory Committee for Aeronautics – um precursor da NASA.

Orville sofre um ataque cardíaco a 27 de janeiro e morre três dias depois em Dayton, aos 76 anos.

Quero Saber | 131

© Thinkstock; Getty

Leme de profundidade


FIGURAS INFLUENTES

Guglielmo Marconi

Por vezes chamado o pai da rádio, o prático sistema de telegrafia deste engenhoso inventor levou à utilização generalizada das comunicações sem fios.

G

Marconi desenvolveu o seu equipamento de rádio no sótão da casa dos pais, em Itália, com a ajuda do mordomo, Mignani.

“ A sala Marconi a bordo do Titanic e os seus dois telegrafistas transmitiram os sinais de rádio provavelmente mais famosos de sempre.”

Vida e obra Sintonize alguns dos maiores eventos da vida deste astuto pioneiro italiano da rádio.

132 | Quero Saber

1874

Guglielmo Marconi nasce em Bolonha, filho de Giuseppe Marconi e da irlandesa-escocesa Annie Jameson.

1894

Desenvolve um método de transmissão de mensagens telegráficas sem fios, usando ondas de rádio.

1896

Vai para Londres, onde obtém o apoio do engenheiro-chefe do Serviço Postal, William Preece.

uglielmo Giovanni Maria Marconi foi um inventor italiano muito respeitado, pioneiro nos avanços das comunicações sem fios e da transmissão de rádio a longa distância. Apesar de por vezes lhe ser atribuída a invenção da rádio, Marconi era sobretudo um empresário astuto que se baseou em trabalhos de outros cientistas, os combinou e desenvolveu para criar um método comercialmente viável de comunicações de longa distância. O seu interesse na eletricidade e na física começou numa idade precoce e foi inspirado pelo trabalho de cientistas como James Clerk Maxwell, Heinrich Hertz e Nikola Tesla, entre outros. Em 1894, Marconi leu a obra do físico alemão Hertz, que desenvolvera um equipamento para enviar e detetar ondas eletromagnéticas a curtas distâncias. Marconi viu o potencial para a transmissão de informação por ondas de rádio e decidiu-se a criar um sistema de distância mais longa para substituir a telegrafia com fios. Marconi começou as suas experiências na propriedade do seu pai e, com a ajuda do seu mordomo, Mignani, construiu equipamentos no sótão. Em breve transmitia ondas de rádio a curtas distâncias, por isso levou as experiências para o exterior para desenvolver mais a tecnologia. Descobriu que aumentar o comprimento das antenas – e dispondo-as na vertical – aumentava tanto o alcance da transmissão que podia enviar e receber sinais a distâncias de cerca de 2,4 km. Foi nesta altura que Marconi começou a visionar as potenciais aplicações comerciais das suas experiências. Mas Itália já tinha um sistema de telegrafia bem estabelecido, com redes de cabos que atravessavam o país,

1899

1900

Faz a primeira ligação sem fios entre a Grã-Bretanha e França, de Wimereux, França, para um farol em Dover, Inglaterra.

Obtém a patente n.º 7777, “Melhorias em Aparelhos para Telegrafia sem Fios”, de modo a proteger os seus desenvolvimentos tecnológicos.

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SABIA QUE... Marconi foi inspirado pelo trabalho de cientistas como James Clerk Maxwell, Heinrich Hertz e Nikola Tesla?

Cinco factos:

Guglielmo Marconi

Engenheiros do Serviço Postal de Cardiff (País de Gales) inspecionam os aparelhos de rádio de Marconi antes da primeira transmissão de sinais de rádio sobre mar aberto.

1

Ligações à realeza

Marconi instalou equipamento de rádio no iate real da rainha Vitória para que esta pudesse comunicar com o Príncipe de Gales (Eduardo VII).

2

Marconi não tinha qualificações formais, mas tinha um grande interesse em física. A pedido da mãe, foi orientado pelo professor de física Augusto Righi, que lhe deu a conhecer as ondas de rádio.

A grande ideia

3

Marconi combinou e alterou as invenções de outros cientistas para criar equipamento que transmitisse ondas de rádio a longas distâncias. Usou um transmissor de faísca para gerar ondas eletromagnéticas de radiofrequência e um recetor coesor para as detetar. Uma tecla de telégrafo permitia enviar ondas de rádio por impulsos, gerando código Morse. Marconi descobriu que a distância máxima da transmissão de ondas de rádio variava diretamente com o quadrado da altura da antena de transmissão – por isso antenas verticais altas eram a solução.

1901

Transmite com sucesso a letra “S” em código Morse, por 3.380 km sobre o oceano Atlântico, para a Terra Nova.

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A primeira transmissão sobre mar aberto foi enviada pelo canal de Bristol e percorreu uma distância de 6,4 km. Dizia “Estão preparados?”.

Com a evolução da tecnologia, foram instaladas “salas Marconi” nos navios, que continham um conjunto de equipamentos de telegrafia sem fios que permitia a comunicação com terra assim como com outras embarcações. A sala Marconi a bordo do Titanic e os seus dois telegrafistas transmitiram os sinais de rádio provavelmente mais famosos de sempre: “CQD, CQD SOS Posição do Titanic 41.44 N 50.24 W. Necessária assistência imediata. Venham depressa. Batemos num icebergue. A afundar.” Marconi morreu em Roma, em 1937, com 63 anos. Teve um funeral de estado e, em tributo à sua contribuição imensa para a comunicação sem fios, todas as estações de rádio do mundo fizeram dois minutos de silêncio.

1909

Recebe o Prémio Nobel da Física – juntamente com Karl Ferdinand Braun – pela contribuição para a telegrafia sem fios.

1912

O transmissor de Marconi é usado no resgate de vítimas do Titanic e envia sinais de socorro deste para o RMS Carpathia.

Estão preparados?

4

Morse a alta velocidade

Para trabalhar como operador na Wireless Telegraph Company de Marconi tinha de se ser capaz de enviar e receber código Morse a uma velocidade de 25 palavras por minuto.

5

Escapar por um triz

Foi oferecida a Marconi uma passagem gratuita no Titanic, mas ele decidiu viajar para a América três dias antes, no RMS Lusitania, porque tinha papelada para tratar...

1914

Junta-se ao esforço de guerra italiano na I Guerra Mundial, ficando encarregue do serviço de rádio militar.

1937

Morre aos 63 anos. Recebe um funeral de estado em Itália e as estações de rádio fazem dois minutos de silêncio em sua honra.

Quero Saber | 133

© Corbis; Jza84; Oast House Archive; Cardiff Council Flat Holm Project

e os seus pedidos de financiamento foram recusados. Sem se deixar vencer, Marconi viajou para o Reino Unido. A Grã-Bretanha tinha uma poderosa Marinha Real e era o maior império comercial do mundo – a ideia de Marconi era que podiam utilizar o seu trabalho nas comunicações marítimas. Marconi obteve o apoio do engenheiro-chefe do Serviço Postal Britânico e, com a sua ajuda, demonstrou ao governo britânico a sua tecnologia. Durante os seus primeiros anos em Inglaterra, melhorou gradualmente a distância da comunicação por rádio – primeiro em terra e depois no mar. O seu trabalho entusiasmou a comunidade internacional e montaram-se estações em França para a primeira transmissão de rádio sobre o Canal da Mancha.

Instruído, mas sem qualificações


FIGURAS INFLUENTES

Einstein renunciou à cidadania alemã em 1896 para evitar o serviço militar.

Albert Einstein Cientista pioneiro da sua época, Einstein é considerado o físico mais influente de sempre.

A

E = mc2

© Roland zh

Esta equação diz que o aumento na massa relativista de um corpo advém da energia do seu movimento quando dividido pela velocidade da luz ao quadrado. Mostra que massa e energia são uma só entidade física e que se transformam diretamente uma na outra.

© Massimo Catarinella

lbert Einstein nasceu a 14 de março de 1879, em Ulm, Alemanha, e é considerado o físico mais influente do século XX, tendo formulado as teorias da relatividade geral e especial, que ainda hoje sustentam grande parte da física e da astrofísica. Em 1921, foi-lhe concedido o prémio Nobel da Física pela sua explicação do efeito fotoelétrico – um processo pelo qual as partículas eletricamente carregadas são libertadas por uma substância quando expostas a radiação eletromagnética. O primeiro contacto de Einstein com a ciência deu-se era ainda rapaz, instigado pela curiosidade suscitada pela bússola do pai. Confuso pelas forças invisíveis que pareciam atuar sobre a agulha da bússola, passou os primeiros anos fascinado por tais forças. Encorajado pela leitura dos trabalhos de Aaron Bernstein, que o apresentaram aos conceitos de eletricidade e luz, Einstein dedicou os primeiros anos da adolescência à natureza da luz, tendo escrito uma obra científica intitulada The Investigation Of The State Of Aether In Magnetic Fields. Apesar da grande paixão pelas ciências, Einstein teve uma educação atribulada. Era frequente faltar às aulas na Escola Politécnica Federal na Suíça, e os problemas nos negócios do pai perturbavam ainda mais a situação, obrigando a várias mudanças de casa. Einstein acabou por ser obrigado a aceitar um cargo no instituto de patentes suíço, em Berna, um papel bastante menos prestigioso que o desejado doutoramento. Retrospetivamente, contudo, a posição no instituto de patentes era ideal, pois deixava-lhe bastante tempo para teorizar as propriedades e natureza da luz.

Vida e obra

1879

Einstein nasce a 14 de março, em Ulm, Alemanha.

Traçamos o fenomenal percurso de Albert Einstein até se tornar o físico mais influente da história.

134 | Quero Saber

1896

1906

1908

Após renunciar à Torna-se professor cidadania do reino alemão Einstein recebe um doutoramento na Universidade de Württemberg para da Universidade de Zurique. de Berna. evitar o serviço militar, Einstein inscreve-se num curso de quatro anos de ensino de matemática O chamado annus mirabilis (ano milagroso) é o mais produtivo e física, em Zurique. de Einstein, que lançou nesta altura quatro obras pioneiras sobre o efeito fotoelétrico, o movimento browniano, a relatividade especial e a equivalência da matéria e da energia.

1905

1911

Com a família, Einstein muda-se para Praga, onde se torna professor na Universidade Karl-Ferdinand.

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SABIA QUE... Einstein foi casado duas vezes, e teve dois filhos e uma filha, que terá morrido com pouco mais de um ano?

Cinco factos: Einstein

1 Einstein a receber os seus documentos de cidadania norte-americana, em 1940.

Segundo se diz, Einstein raramente falava em criança e quando o fazia era muito lentamente, aspeto que terá mantido até aos nove anos.

A antiga casa de verão de Einstein na Alemanha foi confiscada pelos nazis e é atualmente alvo de uma batalha legal pela sua posse.

Subitamente, em 1905, Einstein fez uma descoberta que deu início ao chamado “ano milagroso”, em que publicou quatro obras: a primeira sobre o efeito fotoelétrico, a segunda sobre a existência dos átomos, a terceira uma introdução à teoria matemática da relatividade especial e a quarta sobre a teoria da relatividade. Esta última foi publicada quase como uma reflexão posterior, apesar de conter a equação pela qual é conhecido: E = mc2. A princípio, a comunidade científica ignorou o trabalho de Einstein – que, no entanto, captou a atenção do maior cientista da época: Max Planck, fundador da teoria dos quanta. Graças a Planck, Einstein tornou-se um membro respeitado da comunidade internacional, comparecendo nas prestigiosas conferências Solvay e recebendo posições importantes nas mais influentes universidades europeias. Depois de completa a teoria da relatividade geral em novembro de 1915, o trabalho de Einstein foi interrompido pela I Guerra Mundial. Sempre pacifista, Einstein era contra a guerra e defendia frequentemente a sua posição. Após a guerra, viajou pelo mundo, mas a sua estadia longe da Europa cedo se tornou permanente, tendo fugido da Alemanha nazi em 1933. Einstein instalou-se nos EUA e recebeu a cidadania

2

norte-americana em 1940. Na América, apesar de não estar totalmente convencido da possibilidade de uma bomba atómica, encorajou o governo dos EUA – tendo mesmo escrito ao presidente Roosevelt – a pesquisar as reações nucleares em cadeia usando urânio, em reação aos avanços alemães nesse campo. Não trabalhou diretamente no projeto de construção da bomba, apesar de esta se ter baseado no seu trabalho. Segundo foi noticiado, Einstein estaria de férias quando a primeira bomba atómica caiu em Hiroshima, no Japão. As consequências da bomba levaram-no a realizar conferências e campanhas antinucleares para o resto da vida. Nos seus últimos anos, Albert Einstein foi pioneiro de inúmeras teorias, incluindo sobre buracos de verme, modelos multidimensionais e a possibilidade das viagens no tempo, para além de iniciar a teoria de campo unificado – uma teoria abrangente que unificaria as forças do Universo e a física num só contexto. Mas a teoria nunca ficou completa, tendo Einstein falecido de um aneurisma aórtico em 1955. Ainda assim, o seu legado sobrevive até aos dias de hoje, sendo várias das suas suposições ratificadas e desenvolvidas pela atual geração de cientistas.

“ Em 1905, Einstein fez uma descoberta que deu início ao chamado ‘ano milagroso’.”

1915

Einstein completa a teoria geral da relatividade.

1912

Após um único ano em Praga, Einstein volta à Suíça para ocupar o cargo de professor catedrático no Instituto Federal de Tecnologia suíço de Zurique.

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1921 1919

Um eclipse solar oferece provas observáveis de que a sua teoria da relatividade geral está correta, fazendo dele uma celebridade.

Einstein ganha o Nobel da Física pelo seu trabalho no efeito fotoelétrico, 16 anos após a publicação, em 1905.

Pouco falador

Inspiração

O interesse de Einstein pela ciência terá começado pela bússola do pai. Aos cinco anos, pensou que devia haver uma força no espaço aparentemente vazio a atuar sobre a agulha.

3

Escolaridade

4

Pacifista nuclear

5

Dois cérebros

Einstein não teve notas excelentes na escola e não conseguiu entrar logo na universidade. Em vez disso, foi trabalhar para o instituto suíço de patentes. Einstein era pacifista e, embora a princípio apoiasse o uso de armas atómicas dissuasoras, mais tarde promoveu o desarmamento nuclear e a paz mundial.

Após a sua morte, em 1955, o cérebro de Einstein foi retirado para preservação por Thomas Stoltz Harvey, para tentar descobrir a origem da sua inteligência.

1933

Einstein foge da Alemanha nazi com a família e instala-se nos EUA, onde ocupa um cargo no Institute of Advanced Study, na Universidade de Princeton.

1955 1939

Aos 76 anos, falece de insuficiência cardíaca, no Princeton Hospital.

Temendo que os nazis criassem a primeira bomba atómica, Einstein escreve ao presidente norte-americano Roosevelt, pedindo que este crie um programa de pesquisa nuclear.

Quero Saber | 135


159

Crocodilo colossal

PRÉ-HISTÓRIA 138

Os dias do fim

Como desapareceu um grupo inteiro de répteis gigantes?

146 Fósseis

Descubra formas de vida com milhares de milhões de anos.

148 A idade do gelo

Explore o mundo perdido e as criaturas da Terra gelada.

156 Predadores

pré-históricos

As enormes criaturas antigas que dominavam o planeta.

162 Datar ossadas

Como se atribui uma idade a um esqueleto de dinossáurio?

148

A idade do gelo

136 | Quero Saber

Os últimos dias dos dinossáurios

138


Monstros marinhos

Š Alamy; SPL; Thinkstock; Mariana Ruiz; DIBGD

158

FĂłsseis

146

153

Urso-de-cara-achatada Superlibelinha

161

Quero Saber | 137


PRÉ-HISTÓRIA

OS S O M I ÚLT

S A I D

DOS

U Á S S O N DI 138 | Quero Saber

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SABIA QUE... Alguns cientistas propuseram outra teoria para a extinção K-T – um período de vulcanismo prolongado?

E

S O RI

po u r g m u ue q é o m o C is e t p é r e inteiro d apareceu des s e t n a g i g ra? r e T a d e da fac

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m 1677, o naturalista inglês Robert Plot encontrou um osso da coxa pertencente a um animal com uma vez e meia a sua altura. Pensou que o colossal fémur era de um gigante. Desde então, ossos enormes surgiram em rochas por todo o mundo, mas as criaturas às quais pertenciam já não existem. Dos iguanodontes munidos de espigões nos polegares que habitaram a atual Inglaterra aos microraptors com penas da China e ao icónico tiranossáurio dos hoje EUA, os dinossáurios dominavam o planeta mas, há 66-64 milhões de anos, desapareceram totalmente. A chamada extinção K-T marca a transição entre os períodos Cretácico e Terciário da história geológica. Durante esta era catastrófica, extinguiram-se quase três quartos da vida na Terra. Amonites e belemnites desapareceram dos oceanos, tal como dezenas de espécies de nanoplâncton, dois grupos inteiros de bivalves e muitos dos parentes dos modernos ouriços-do-mar, estrelas-do-mar, ofiuroides e pepinos-do-mar. O predador de topo oceânico, o mosassáurio, também se extinguiu. Os alados pterossáurios deixaram de percorrer os céus e as plantas com flor morreram aos milhares, deixando uma paisagem dominada por fetos. Em 1980, o físico norte-americano vencedor de um Nobel Luis Alvarez e o seu filho Walter repararam em algo invulgar no registo geológico. Por volta da altura da extinção K-T, havia uma faixa do metal de transição branco e quebradiço irídio. Geralmente mais raro do que o ouro, “picos” deste elemento invulgar surgiam em mais de cem locais por todo o globo. A explicação mais provável era o impacto de um asteroide. O irídio pode ser raro no nosso planeta mas é comum em rochas espaciais. Se um asteroide tivesse colidido com a Terra, podia ter enviado o metal para a atmosfera. Quando a poeira assentasse, formaria uma faixa nas rochas, assinalando o momento do impacto. Ao nível desta faixa há também vestígios de quartzo de impacto/chocado – uma rocha com características microscópicas distintivas que se formam sob intensa pressão. Há também esferas de vidro, geradas quando rocha fundida é ejetada para a atmosfera e solidifica antes de regressar ao solo. E vastas quantidades de fuligem, que sugerem enormes incêndios florestais causados por detritos em chamas de um impacto extraterreste. Os vestígios do asteroide são mais abundantes na América do Norte. No Haiti, há uma espessa faixa de argila repleta de esferas de vidro e, no Golfo do México, rochas tombadas sugerem um enorme tsunâmi, que pode ter sido causado pela colisão de um asteroide. Para provocar este nível de destruição, o asteroide teria de ter mais de 10 km de largura e de se deslocar suficientemente depressa para

Quero Saber | 139


PRÉ-HISTÓRIA abrir um “buraco” com 100 km de diâmetro na superfície do planeta. Devia ter deixado uma enorme cratera, mas o local do impacto não fora encontrado e nem todos estavam convencidos pela teoria. A Terra já estava a passar por uma crise climática; a temperatura do mar oscilava e o nível da água subia e retrocedia. Além disso, os asteroides não são a única fonte de irídio e os impactos extraterrestres não são os únicos a lançar cinza para a atmosfera. Até o quartzo de impacto e as esferas de vidro podem ser gerados de outra forma que não por um asteroide. Todos estes aspetos podem ser explicados por vulcões e, por volta da época da extinção dos dinossáurios, houve algumas erupções monumentais. Nesse tempo, a Índia era uma ilha sobre um ponto quente vulcânico. Bolhas de rocha quente ascendiam do manto da Terra, que, ao contrário da crusta, contém elevados níveis de irídio. O magma jorrava à superfície, depositando mais de um milhão de metros cúbicos de rocha nova e formando vastas planícies de lava hoje conhecidas como traps do Decão. Cinza, enxofre e metal ter-se-ão elevado na atmosfera, potencialmente bloqueando a luz solar. Ambos os lados usam os mesmos indícios para a sua explicação daquilo que originou a extinção dos dinossáurios e, sem uma cratera de impacto real, a hipótese de Alvarez tinha algumas lacunas; mas em 1990, o geocientista Alan Hildebrand encontrou uma “prova” conclusiva. Soterrada num mar pouco profundo ao largo do México estava uma cratera com 180 km de diâmetro, com uma gravidade estranha e um campo magnético invulgar. Continha rocha ígnea, quartzo de impacto, esferas de vidro e brechas – estruturas de rocha esmagada unida por cimento mineral. Pareciam os detritos do impacto de um asteroide. Pela forma da cratera, parece que o asteroide caiu “na diagonal”, largando detritos na direção da América do Norte. A rocha terá sido fraturada por vibrações extremas, disparando detritos fundidos para a atmosfera, e o choque térmico terá sido tão intenso que tudo nas imediações da zona de impacto terá sido totalmente obliterado. O que se seguiu terá sido um sismo de uma magnitude sem igual na história registada. Vastos tsunâmis terão varrido os oceanos e detritos da zona de impacto terão sido ejetados com tanta força que alguns escaparam à atmosfera; quando regressaram, terão ardido, fazendo chover fogo sobre o solo. Plantas e animais na área circundante terão morrido de imediato ou numa questão de dias. Mais tarde, à medida que fragmentos de cinza, enxofre e fuligem das florestas a arder obstruíam o ar, o mundo terá mergulhado num crepúsculo perpétuo durante semanas ou até meses.

140 | Quero Saber

O asteroide atingiu um mar pouco profundo ao largo da costa do México.

Crateras com “anéis de picos” Tsunâmi

Material ejetado

Crusta superior Crusta inferior

1. Impacto

Ondas acústicas fragmentam as rochas, a estrutura enfraquece e começam a comportar-se como água. O material flui para os lados, ejetado pelo rebordo da cratera.

2. Levantamento

A rocha fragmentada flui como uma gota de água que atinge uma poça. O rebordo da cratera colapsa, cai para o centro e é projetado sob a forma de um jato.

Jato

3. Colapso

Uma enorme quantidade de rocha aflui ao jato central, que se torna instável, colapsando de novo e formando um anel de picos, que assenta no interior da bacia da cratera.

Perda do pico central

Anel de picos

Picos internos

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SABIA QUE... Os dinossáurios surgiram após a extinção do Pérmico-Triásico, há cerca de 248 milhões de anos?

Uma extinção em números

O impacto arremessou esferas de vidro fundido para a atmosfera.

10 km DIMENSÃO DO ASTEROIDE

180 km DIÂMETRO DA CRATERA DE CHICXULUB

65-66 milhões NÚMERO DE ANOS PASSADOS DESDE O IMPACTO

11

O asteroide caiu num mar pouco profundo, originando uma onda gigantesca.

MAGNITUDE DO SISMO QUE TERÁ ABALADO A TERRA APÓS O IMPACTO

MAIORES SISMOS

REGISTADOS COMPARADOS 9,5, VALDIVIA, CHILE, 1990 9,2, BAÍA DO PRÍNCIPE WILLIAM, ALASCA, 1964 9,1, SUMATRA, INDONÉSIA, 2004 9,1, SENDAI, JAPÃO, 2011 9,0, KAMCHATKA, RÚSSIA, 1952

70 % PROPORÇÃO ESTIMADA DE ESPÉCIES DIZIMADAS PELO IMPACTO

10 graus

AUMENTO DA TEMPERATURA GLOBAL APÓS O IMPACTO

milhões de megatoneladas FORÇA EXPLOSIVA DO IMPACTO Vidro e rochas choveram do céu sobre o que é hoje a América do Norte.

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Quero Saber | 141

© SPL; Pixabay; Getty

100


PRÉ-HISTÓRIA

O impacto Pouco depois da colisão do asteroide, o mundo mudou completamente.

Dilúvio

Ondas com até 300 m de altura varrem o planeta.

Bola de fogo

Tudo num raio de 1000 km do impacto é consumido pelas chamas.

Aquecimento global Milhares de milhões de toneladas de dióxido e monóxido de carbono são libertadas pelo impacto. À medida que o céu limpa, o mundo aquece.

Chuva de rocha Rocha do impacto chove da atmosfera, alguma fundida, alguma em chamas.

Abalo

Um sismo de magnitude 11 abala a Terra, irradiando da zona do impacto.

Escuridão

Cinza e poeira no ar escurecem o céu, gerando um crepúsculo que dura meses.

Chuva ácida

A água faz cair partículas de cinza e enxofre do céu sob a forma de chuva ácida.

142 | Quero Saber

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SABIA QUE... Tal como crocodilos e tubarões, o ornitorrinco também sobreviveu à extinção K-T?

Este “inverno de impacto” terá afetado destes gases de estufa terão gerado um fortemente a fotossíntese, dizimando o plâncton aquecimento global desenfreado. Como disse nos mares e as plantas em terra. Com o fundo Hildebrand aquando da descoberta, “o impacto da cadeia alimentar a desaparecer, ecossistemas de Chicxulub, tendo presumivelmente gerado a inteiros terão começado a sentir a pressão. maior cratera de impacto da Terra, teria causado A poeira caía do céu como chuva ácida, mas uma extinção em massa.” Mas mesmo com a cratera identificada, alguns a provação ainda não terminara. A cratera de ainda tinham dúvidas. O registo fóssil mais Chicxulub, como ficou conhecida, fica mesmo no meio de uma camada de rocha carbonatada com completo vem da América do Norte mas, mesmo assim, é difícil criar uma cronologia exata. Rocha 3 km de espessura. Atua como armazenamento sólido para gases com efeito de estufa como o CO2 tão antiga não pode ser datada por carbono, pelo e, quando atingida, pode ter feito disparar que não é fácil dizer se os dinossáurios morreram as temperaturas. Quando o ar todos de uma vez ou se a extinção começou finalmente a limpar, foi gradual. E nem todas as Incineração milhares de milhões de toneladas Tudo na área circundante fica espécies foram preservadas, pelo

que é difícil reconstituir o ecossistema com detalhe suficiente para perceber o que o fez colapsar. São precisas condições específicas para preservar os ossos de animais mortos e muitos desapareceram sem deixar rasto. Embora existam indícios sólidos de que um asteroide caiu em Chicxulub, é difícil confirmar se matou os dinossáurios. Alguns cientistas defendem que o impacto ocorreu cerca de 300.000 anos antes da extinção em massa, já que parte dos vestígios fósseis se encontram em camadas de sedimento acima da linha de impacto. É possível que este sedimento tenha sido depositado sobre a rocha por tsunâmis gerados pelo asteroide, mas também é possível

Trevas

Os detritos bloqueiam a luz solar, mergulhando a Terra num longo período de escuridão.

“O mundo terá mergulhado num crepúsculo perpétuo durante semanas ou até meses.” Ressurgimento

Quando a poeira assenta, sementes e esporos sobreviventes começam a crescer e os animais emergem.

A diferença que um momento faz A cratera de Chicxulub situa-se ao largo do México, num mar pouco profundo onde o sedimento esteve outrora repleto de carbono e enxofre. Quando o asteroide colidiu, esta rocha foi disparada para a atmosfera. Cem mil milhões de toneladas de partículas de sulfato e carbono – sob a forma de dióxido de carbono, monóxido de carbono e metano – entraram na atmosfera. O sulfato começou por refletir a luz, arrefecendo o planeta, mas quando caiu do céu sob a forma de chuva ácida, o carbono transformou a atmosfera numa estufa e as temperaturas globais dispararam. Porém, um documentário da BBC revelou recentemente que, se o impacto tivesse ocorrido uns segundos depois, a rocha provavelmente teria assentado no fundo do oceano. A superfície teria sido varrida na mesma por tsunâmis, mas o enxofre e gases de estufa letais podiam nunca ter chegado à atmosfera e os dinossáurios podiam ter sido poupados.

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Se o asteroide tivesse caído no oceano profundo, os dinossáurios podiam ter sobrevivido.

Quero Saber | 143

© SPL; Alamy; Ilustração por The Art Agency/ Barry Croucher

carbonizado por uma enorme bola de fogo.


PRÉ-HISTÓRIA A plataforma que o sedimento tenha assentado gradualmente e que a extinção dos dinossáurios não tenha sido tão rápida como poderíamos pensar. Há indícios de animais soterrados na rocha macia e erosão que parece ter sido criada por água corrente. Para investigar mais a fundo o papel de Chicxulub nos últimos dias dos dinossáurios, cientistas têm estado a perfurar o que resta da zona de impacto. Chicxulub é a maior cratera de impacto na Terra. O asteroide que a gerou era tão grande que criou um distintivo anel de rocha fundida e fragmentada no interior do rebordo da cratera – o chamado “anel de picos”. Desde o impacto, a cratera está soterrada sob 17 metros de água e 500 metros de calcário. Entre 2001 e 2002, o Programa Internacional de Perfuração Continental investigou a estrutura, revelando a chamada “rocha fundida de impacto”, provavelmente produzida a partir de fragmentos de rocha estilhaçada, ejetada e depois unida quando a cratera se formou. As perfurações revelaram também indícios de atividade hidrotermal causada pelo enorme impacto, sugerindo que vapor foi emitido para a cratera durante mais de um milhão de anos após a colisão do asteroide. Em 2016, usando uma broca de diamante, os cientistas voltaram a perfurar a estrutura, desta vez visando o anel de picos, para descobrir como se formou e o que aconteceu a seguir. Uma descoberta surpreendente foi a presença de granito rosa nas amostras recolhidas. Esta rocha devia encontrar-se a uma profundidade de 7600 metros, mas foi encontrada a 760 metros – evidência do choque intenso que abalou e enrugou a Terra subjacente. Ainda subsistem muitas perguntas sem resposta sobre a extinção dos dinossáurios e a realidade é que nunca saberemos a verdade sobre o que aconteceu ao certo. Crê-se que a cratera de Chicxulub originou um dos eventos de extinção mais devastadores de todos os tempos, mas os indícios que estão a ser recolhidos sugerem que os impactos também podem alimentar a vida, além de a destruir.

Uma broca de diamante foi suportada por três pilares, assentes a 65 m de profundidade no leito marinho.

150 m

300 m

Sedimento

450 m

Para alcançar a cratera de impacto, a broca teve de atravessar mais de 450 m de sedimento, depositado desde a colisão.

600 m

Máximo térmico

750 m

A 550 m, a rocha remonta à 55 milhões de anos. A Terra era mais quente, revelando vestígios de eflorescências de algas.

Recuperação 900 m

1050 m

Anel de picos

1200 m

1350 m

144 | Quero Saber

EM BUSCA DE PISTAS Cientistas estão a recolher amostras de rocha da cratera de Chicxulub para tentar responder às maiores questões sobre a Terra.

A broca atingiu o anel de picos em 2016. Continha granito sobre quartzo de impacto, apoiando a teoria da formação do anel.

As linhas de falha neste grão de quartzo de impacto são causadas por uma pressão intensa.

PERFURAR

1500 m

Entre os 550 e os 610 m, a rocha mostra o regresso da vida após o impacto, incluindo calcário repleto de fósseis.

Zona de impacto

A secção entre os 610 e os 800 m representa o chamado ground zero, repleto de quartzo de impacto e depósitos arenosos deixados pelos colossais tsunâmis.

A plataforma de perfuração está elevada sobre o mar para criar uma base estável.


SABIA QUE... Em 1824, William Buckland foi a primeira pessoa a descrever um dinossáurio quando batizou o megalossáurio?

“ Ainda subsistem muitas perguntas sem resposta sobre a extinção dos dinossáurios.”

Abrir caminho aos mamíferos A extinção K-T devastou a Terra mas, sem ela, não estaríamos aqui. Enquanto os animais terrestres dominantes tentavam sobreviver num mundo carbonizado, enegrecido por enxofre e fuligem, e aquecido por gases de estufa, pequenos mamíferos protegeram-se nas suas tocas. Muitas aves, répteis e anfíbios também foram poupados, salvos pelo seu diminuto tamanho corporal e pela dieta flexível, amiúde à base de insetos. Algumas espécies de água doce também se deram bem; a sua cadeia alimentar inclui detritos, nutrientes libertados por decomposição, que afluem a riachos e lagos, proporcionando uma fonte estável de alimento. À medida que a Terra começou a recuperar, lacunas na cadeia alimentar foram preenchidas por estes animais e os sobreviventes tomaram o lugar dos dinossáurios. Com o tempo, deram origem à grande variedade de espécies que conhecemos hoje.

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Extinções em massa A extinção K-T não foi a primeira e não será a última.

Há 66 MA Cretácico-Terciário

70% das espécies foram dizimadas, incluindo dinossáurios, amonites e pterossáurios.

Há 248 MA* Pérmico

Também conhecido como Grande Morte, este evento devastador matou 96% de todas as espécies.

Há 443 MA Ordovícico-Silúrico 85% da vida desapareceu, a maioria no mar.

Há 359 MA Devónico superior 75% de todas as espécies sucumbiram, incluindo recifes e criaturas de mares rasos.

Há 200 MA Triásico-Jurássico

Metade de todas as espécies morreram, incluindo números significativos de animais marinhos.

*MA = milhões de anos

Pequenos animais, incluindo mamíferos, sobreviveram à extinção K-T.

© USGS; SPL; Ilustração por The Art Agency/ Nick Sellers

A extinção K-T abriu caminho à ascensão dos mamíferos; a expedição de perfuração mais recente revelou uma vasta rede de canais que se encheram de água quente após o impacto. De início, seriam demasiado quentes até para as formas de vida mais resistentes; mas à medida que arrefeceram, vida microscópica pode ter prosperado nas fendas húmidas e quentes, alimentada por minerais. As implicações para a origem de todos os seres vivos são empolgantes. Embora a vida já estivesse firmemente estabelecida quando o asteroide de Chicxulub chegou, a cratera dá-nos um vislumbre do tipo de condições que podem ter existido na antiga Terra sem vida. Charles Darwin pensava que a vida podia ter começado numa “pequena lagoa quente”, onde minerais se misturaram com a água e moléculas orgânicas. Os asteroides estão repletos de compostos orgânicos que podem ter fornecido os ingredientes para o início da química da vida; se tiverem gerado nichos quentes e húmidos, ricos em minerais, quando colidiram com a Terra, podem ser os “progenitores” das pequenas lagoas de Darwin. Neste momento, a OSIRIS-REx, da NASA, está a caminho do asteroide Bennu (que pode colidir com a Terra no século XXII), em busca de pistas sobre o possível papel dos asteroides na origem da vida na Terra, milhares de milhões de anos antes dos dinossáurios. Embora seja improvável que descubramos como morreram exatamente, a sua extinção pode ajudar a esclarecer uma questão ainda maior – como surgiram?

Quero Saber | 145


PRÉ-HISTÓRIA

Fósseis

Descubra formas de vida que existiram há milhões ou milhares de milhões de anos, antes de serem transformadas em pedra.

A

extinção é um facto da vida que dita o fim de muitas espécies. Mas morto não significa esquecido. Os vestígios podem ter permanecido escondidos por milhões ou até milhares de milhões de anos mas, no século V a.C., o filósofo grego Xenófanes descobriu fósseis de criaturas marinhas e reconheceu o que eram. Veremos como ocorre exatamente mas, no essencial, um fóssil foi um organismo vivo que petrificou após a morte. E estes registos podem ensinar-nos muito. Ao encontrar fósseis

marinhos em terra, por exemplo, Xenófanes pôde afirmar com confiança que o mar outrora cobrira o que era então terra seca. Ao longo dos anos, os fósseis ensinaram-nos muito sobre a história da Terra, e as descobertas prosseguem. Achados recentes que remontam à origem do planeta, quando a Terra era presumivelmente inóspita, alimentam a especulação sobre a hipótese de a vida ter surgido em Marte por volta da mesma altura.

A formação dos fósseis

© Alamy; WIKI; Ilustração por Art The Agency/ Tom Connell; M. Dodd & D Papineau, UCL

Como um organismo vivo pode ser transformado em pedra e preservado durante milhões de anos.

Quando falamos de fósseis, muitas pessoas pensam de imediato em dinossáurios. Estes répteis gigantes podem ter deixado alguns dos fósseis maiores e mais impressionantes, mas estão longe de ser os mais antigos e não detêm o monopólio da espetacularidade. O mundo dos fósseis é muito variado, abarcando maravilhas como as trilobites – crustáceos que percorriam o leito de mares tropicais –, madeira petrificada de cores vivas de florestas há muito perdidas no Arizona, e coprólitos – excrementos fossilizados.

Enterramento

A proteção dos restos mortais é ajudada pelo enterramento rápido, talvez graças a sedimentos transportados por uma enxurrada.

Decomposição Morte

São precisas condições específicas para que a fossilização ocorra; depois de mortos, a maioria dos organismos decompõe-se totalmente.

146 | Quero Saber

Ausência de necrófagos Para que os restos mortais sejam fossilizados não podem ser destruídos por necrófagos.

Os tecidos moles decompõem-se quase sempre, restando apenas material mais duro, como os ossos, para a fossilização, embora criaturas com exosqueletos possam fossilizar totalmente.

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SABIA QUE... Pequenas criaturas como insetos podem ser encontradas preservadas em âmbar (resina fóssil)?

Top cinco de descobertas fósseis Os mais antigos

Cientistas da UCL descobriram os fósseis mais antigos, no Canadá. As estruturas tubulares têm cerca de 3770 milhões de anos e formaram-se em torno de fontes hidrotermais.

Enterramento profundo Com o tempo, eventos geológicos depositam mais sedimentos e os vestígios ficam enterrados a profundidades cada vez maiores.

O maior

Ossos fossilizados encontrados na Argentina pertencem ao maior dinossáurio conhecido. O titanossáurio tinha quase 40 m de comprimento, 20 m de altura e pesava 70 toneladas.

Os mais pequenos

Nem todos os fósseis são enormes; alguns exigem um microscópio para serem vistos. Os quitinozoários, microfósseis marinhos, podem ter apenas 0,05 mm de comprimento.

Os mais raros

O tecido mole decompõe-se geralmente antes de fossilizar, pelo que os fósseis de criaturas sem partes duras são raros. Mas cientistas de Berlim descobriram recentemente fósseis de polvos.

Árvore genealógica

Fósseis de hominíneos como a célebre Lucy permitiram aos cientistas estudar a evolução humana. Estes achados ajudaram a lançar luz sobre os nossos antepassados.

Exposição

Embora se formem a grande profundidade, os fósseis podem ser expostos por processos geológicos como a erosão ou a orogénese.

Descoberta Litificação

A compactação consolida o material sedimentar através de um processo chamado litificação. Os vestígios biológicos ficam encerrados em rocha sólida.

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Permineralização

Água repleta de minerais infiltra-se na rocha, preenchendo poros no material biológico com os minerais e, ao fazê-lo, transformando-os em rocha.

Uma vez expostos, os fósseis podem ser descobertos por paleontólogos, que os extraem cuidadosamente da rocha circundante.

Quero Saber | 147


PRÉ-HISTÓRIA

Descubra o mundo e as criaturas da Terra gelada.

N

a maior parte da história da Terra, o planeta estava isento de gelo, mesmo nos polos. No entanto, nos últimos 2.400 milhões de anos, a Terra tem-se deslocado ciclicamente entre eras glaciais. A cada conjunto de milhões de anos, as temperaturas caem a pique e áreas enormes no globo ficam presas em mantos de gelo. Estes períodos glaciais começam gradualmente. A neve cai no inverno, não derrete no verão e criam-se camadas, umas por cima das outras. A superfície branca reflete a luz do Sol para o espaço e o ciclo gelado tem início. Nos polos formam-se glaciares enormes, que se deslocam em direção ao equador e a água da Terra fica presa no movimento lento do gelo. À medida que se desloca, esculpe marcas enormes na paisagem. Quando a água da Terra congela, o nível do mar desce, revelando solo antes escondido pelos oceanos. Os ventos e correntes mudam de direção e mesmo os locais não abrangidos pelo gelo sofrem alterações climáticas significativas. Até agora aconteceram, pelo menos, cinco eras glaciais, a primeira das quais transformou todo o planeta numa “bola de neve”. No entanto, nestes períodos de frio extremo, aconteceram ocasionais ondas de calor. Em cada idade do gelo, a Terra tem períodos glaciais durante dezenas de milhares de anos, seguidos do degelo temporário para depois regressar novamente à glaciação. À medida que os glaciares se fundem, a água corre pelo solo,

148 | Quero Saber

preenchendo vales e criando novas marcas na paisagem. O nível do mar sobe e o vento e as correntes mudam. Na verdade, neste momento estamos a meio de uma idade do gelo – mas vivemos um degelo temporário que teve início há cerca de 11 mil anos. Estes períodos são conhecidos como “interglaciais” e não sabemos exatamente quanto tempo duram. A Antártida e a Gronelândia continuam cobertas por mantos de gelo, aprisionando 75 por cento da água doce e, quando estas camadas derreterem, será o fim da atual idade de gelo. Até lá, junte-se a nós nesta viagem pelas eras glaciais da Terra.

“ Nos polos formam-se glaciares que se deslocam em direção ao equador.” WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... Há 52-57 milhões de anos, a Terra era tão quente que havia árvores no Ártico e na Antártida?

PONTO DE PARTIDA

A temperatura da Terra depende do local onde está situada nos ciclos de Milankovitch. O Sol aquece o planeta, mas o calor que recebemos varia ao longo dos anos e até milénios Isto acontece porque a órbita da Terra, a inclinação e o eixo do ângulo flutuam em três padrões diferentes, ou ciclos de Milankovitch. O primeiro ciclo é designado por excentricidade. A Terra move-se à volta do Sol numa órbita elíptica, aproximando-se para depois afastar-se. Mas a forma desta órbita muda, tornando-se mais

alongada (ou “excêntrica”) e circular, num período que pode durar, pelo menos, 100.000 anos. O segundo ciclo, ou obliquidade, refere-se à inclinação da Terra em relação ao plano da sua órbita, que varia entre 22,1 e 24,5 graus, ao longo de 40 mil anos. Quanto maior a inclinação, mais rigorosas são as estações do ano. Por fim, enquanto faz a rotação, a Terra oscila, tal como um pião quando fica lento. Esta oscilação é designada

Era glacial: em resumo

Precessão

Conjugam-se vários fatores para a Terra “gelar”.

A Terra oscila, durante a rotação, levando 26 mil anos a completar uma oscilação completa.

Obliquidade

O eixo da Terra inclina-se para a frente e para trás durante um período de 40 mil anos.

Excentricidade

Luz do sol

A órbita da Terra à volta do Sol torna-se mais circular e depois mais alongada num ciclo de 100 mil anos.

por precessão e um ciclo tem 26 mil anos. A quantidade de energia solar que chega ao planeta depende do ciclo de Milankovitch em que a Terra estiver. Às vezes, quando o planeta recebe menos energia, as temperaturas do verão são mais baixas e uma era glacial pode ter início. Mas o destino do planeta também depende da posição dos continentes, circulação oceânica e composição da atmosfera.

A quantidade de luz solar que a Terra recebe depende da inclinação do seu eixo, da estação do ano e da excentricidade da sua órbita.

Quando a água da Terra congela, o nível do mar desce, revelando o solo antes submerso.

Nebulosidade

Frio contínuo

O gelo reflete 80 por cento da luz solar que recebe, mantendo as temperaturas baixas.

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Reflexo

Sob as nuvens, a luz solar pode ser refletida de volta para a Terra, conservando aí algum calor.

Efeito de estufa

Gelo a fundir

Se o gelo começar a fundir, diminui a quantidade de luz refletida e aumenta a nebulosidade.

Solo

O solo exposto absorve a luz solar, contribuindo para o calor.

O dióxido de carbono é um gás de efeito de estufa que torna a atmosfera mais quente. Está preso no gelo, mas quando este se funde, é libertado.

Quero Saber | 149

© Alamy; Ilustração por Nicholas Forder

Partículas na atmosfera, onde se incluem nuvens ou poeira vulcânica, podem bloquear a entrada da luz solar.


PRÉ-HISTÓRIA

A ÚLTIMA ERA GLACIAL

Como era o mundo no auge da última idade do gelo? Manto de gelo da Cordilheira

Um segundo manto de gelo, mais pequeno, cobriu periodicamente o noroeste da América do Norte.

A mér ic a do Nor te

Atualmente, o manto de gelo da Gronelândia é o maior no Hemisfério Norte e contém oito por cento da água doce da Terra.

Manto de gelo Laurentide

Oceano Pacífico

t ic o t lân no A

Este manto de gelo começou no Canadá e, gradualmente, deslocou-se para o nordeste dos EUA.

Ocea

Manto de gelo da Gronelândia

A mér ic a do Su l

Indícios geológicos Os mantos de gelo são camadas de gelo e neve que se acumulam ao longo dos anos. À medida que se formam mais camadas, as anteriores ficam mais compactadas. Perfurar os glaciares permite aos investigadores recolher amostras de gelo que contêm informação sobre a era glacial e o clima que se vivia na altura em que a camada foi formada, sendo possível fazer o registo de centenas de milhares de anos. Para saber mais, podem ser retiradas amostras de sedimentos dos oceanos que fornecem dados sobre a Terra de há milhares de anos. Recentemente, os cientistas usaram radares no gelo para detetarem camadas por baixo da superfície do manto de gelo da Gronelândia.

Manto de gelo da Patagónia

Holocénico Última Era Glacial Eemiano

O manto de gelo da Gronelândia tem indícios da última era glacial e do período de aquecimento que a precedeu.

150 | Quero Saber

Manto de gelo Antártico

A maioria da terra do Hemisfério Sul mantém-se isenta de gelo, mas formou-se um manto na América do Sul.

O gelo antártico é relativamente recente, tendo surgido na última era glacial. É, neste momento, o maior manto de gelo na Terra.

HÁ 3.000 MILHÕES

O gelo da Terra através dos tempos A nossa paisagem mudou drasticamente nos últimos 2.400 milhões de anos.

2.400 -2.100 MILHÕES

1

Neve na Terra

Na primeira era glacial, designada por Huroniana, o nosso planeta estava gelado.

1

850-630 MILHÕES

2

Lama na Terra

Durante o período Criogeniano, uma faixa do oceano líquido permaneceu no equador.

HÁ 2.000 MILHÕES

460-430 MILHÕES

3

Extinção em massa

No período andino-sariano aconteceu a segunda maior extinção em massa da história.

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SABIA QUE... Dez por cento da superfície da Terra está coberta por glaciares que retêm 75% da água doce do planeta?

“Quando a água da Terra congela, o nível do mar desce, revelando o solo antes escondido pelos oceanos.” Eu ropa Ásia

Manto de gelo Siberiano

Um manto de gelo com 1 km de espessura que se prolonga para o Oceano Ártico, deixando marcas no fundo do mar.

Á f r ic a

Mar Amarelo

Atualmente rico em fauna, o Mar Amarelo não tinha água na última era glacial.

Golfo Pérsico

Este mar pouco profundo secou quando o nível da água desceu mais de cem metros.

Manto de gelo Escandinavo

A maior parte do norte da Europa está revestido de gelo, cobrindo tudo desde o Reino Unido até à zona ocidental da Rússia.

Oceano Índico

Austrália

Pontes terrestres

ida HÁ 1.000 MILHÕES

360-260 MILHÕES

4

A chegada das plantas

As plantas absorvem dióxido de carbono do ar originando a era glacial Karoo.

20 MILHÕES

5

A Antártida

É nesta altura que começa a formar-se o manto de gelo da Antártida.

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2

2.500 MILHÕES

6

Era Quaternária

A última vaga de frio começou muito recentemente e ainda decorre nos dias de hoje.

3

11 MIL ANOS

7

Período interglacial

Estamos a meio de uma curta paragem na atual era glacial.

HÁ 100 MILHÕES

4

Atualmente, o Estreito de Bering está cheio de água.

5

HÁ 10 MILHÕES

7 6

8 HOJE

9 1.300-1.800 ANOS

8

Período glacial curto

Na história recente, a Terra sofreu uma queda acentuada da temperatura.

O FUTURO…

9

A próxima era glacial

A atividade humana está a aquecer o planeta e a data da próxima era glacial é incerta.

Quero Saber | 151

© SPL; Dreamstime

A ntár t

Quando a água da Terra congela formando glaciares, o nível do mar desce, expondo solo antes escondido pelas ondas. Estas “pontes terrestres” ligam ilhas e continentes, permitindo aos animais deslocarem-se. A mais conhecida é a Ponte Terrestre de Bering que, ao conectar a Sibéria ao Alasca, liga a Ásia à América do Norte. Esta ponte fornece um caminho protegido que, em tempos primordiais, levou os seres humanos até às Américas. No passado, terra firme ligava a Europa ao Reino Unido e as ilhas do arquipélago indonésio estavam também ligadas, assim como a Austrália à Nova Guiné.


PRÉ-HISTÓRIA

OS SOBREVIVENTES Conheça as criaturas que conquistaram a vastidão gelada. Antes do fim da última era glacial, a Terra era habitada por mamíferos maravilhosos. Os alimentos eram abundantes e, por isso, os animais eram enormes; e, quanto maiores eram, mais protegidos estavam contra o frio. Nem todos habitavam as zonas mais frias do planeta; muitos, como a preguiça-gigante e o tigre-dentes-de-sabre, preferiam regiões mais quentes, a sul. Também existiam sobreviventes ao gelo, onde se incluem o mamute-lanoso, o boi-almiscarado e o lobo pré-histórico. Os seus corpos robustos evitavam a perda de calor pela pele, devido às camadas de gordura e pelo que forneciam um isolamento eficaz. Mas quando as temperaturas desceram, iniciou-se a luta entre estes animais. Durante os períodos interglaciais, os glaciares fundiram-se e o nível do mar subiu; os vales inundaram e surgiram lagos. As correntes marítimas mudaram de direção, assim como os ventos. E, como se isso não bastasse, no fim desta era, os seres humanos começaram a percorrer a terra com lanças. Os nossos antepassados competiram com predadores de topo e caçaram alguns dos maiores animais. Os mamutes e os mastodontes eram espécies importantes no ecossistema, tão grandes e numerosos que as suas atividades criavam nichos vitais para a sobrevivência de outros animais. Mas há cerca de 50.000 anos, a megafauna da era glacial começou a extinguir-se e, pela altura em que os glaciares começaram a afastar-se, pelo menos 177 espécies de grandes mamíferos estavam já extintas.

Tigre-dentes-de-sabre

Os caninos do tigre-dentes-de-sabre tinham 15 cm.

152 | Quero Saber

“ No fim da era glacial, os seres humanos começaram a percorrer a terra com lanças.”

Existiam três espécies de tigres-dentes-de-sabre e encontravam-se todas nas Américas. Em tamanho, eram semelhantes aos atuais leões, mas com pernas mais curtas e dentes maiores. Os seus caninos curvos tinham 15 cm de comprimento e as bocas abriam quase o dobro das dos gatos do nosso tempo. Surpreendentemente, porém, a força da dentada está longe da dos atuais leões. E embora sejam chamados de tigres, a cor e o padrão do seu pelo não são conhecidos, além de que não têm relação com os tigres de hoje.

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SABIA QUE... Uma defesa de mastodonte fossilizada foi encontrada por um agricultor em 1705 e pesava 2 kg? Ele trocou-a por rum!

Mamute-lanoso

Estes animais tinham pelo denso e camadas de gordura isoladora. Ao contrário das orelhas grandes dos atuais elefantes que refrescam o corpo, os mamutes tinham orelhas pequenas para conservar o calor e mesmo o sangue estava adaptado ao frio. A sua hemoglobina – molécula que transporta o oxigénio pelo sangue – funcionava num intervalo de temperaturas maior do que a dos elefantes, permitindo que o oxigénio chegasse às extremidades, mesmo sob frio glacial.

Lobo pré-histórico Estes lobos eram maiores do que os seus atuais homólogos, com pernas mais curtas, cabeças mais largas e cérebros mais pequenos. Enquanto o lobo-cinzento usa a sua velocidade e trabalho em equipa para capturar as presas, pensa-se que estes caçadores da neve preferiam táticas de emboscada. O lobo-cinzento coexistiu com este caçador temível mas, há 10.000 anos, o lobo pré-histórico desapareceu, juntamente com o dentes-de-sabre e o leão-americano.

Preguiça-gigante O megatério, ou preguiça-gigante, era do tamanho do atual bisonte. Vivia em savanas, florestas e pradarias da América do Norte, subsistindo com uma dieta herbívora. Tinha pelo comprido, mandíbulas enormes e patas fortes, que usava para escavar e alcançar folhas nos galhos.

Urso-de-cara-achatada Pensa-se que tenham sido os mais rápidos dos ursos, com as suas patas viradas para a frente que lhes permitiam atingir velocidades na ordem dos 64 km/h. Crê-se que o seu focinho achatado os ajudava a ter o máximo de quantidade de ar nos pulmões na hora de perseguir as presas.

Outras criaturas “geladas” Castor-gigante

Estes roedores eram do tamanho de ursos, mas os seus dentes eram diferentes dos dos atuais castores. Não existem indícios de que construíssem diques.

Cavalo “glacial”

Há 11.000 anos, os cavalos estavam extintos nas Américas, mas conseguiram sobreviver na Euroásia e em África. Os atuais cavalos das Américas – e burros – são descendentes destes sobreviventes.

Boi-almiscarado

Durante a última era glacial, estes animais corpulentos quase ficaram extintos devido à caça e ao clima quente. Atualmente, o Canadá ainda conta com a presença do boi-almiscarado, mas em número reduzido.

Leão-americano

Maiores do que os atuais leões e com pernas mais longas, competiam com o tigre-dentes-de-sabre e com o urso-de-cara-achatada pelas presas.

Mastodonte

Parente do mamute e semelhante a um elefante, tinha uma tromba longa e pelo comprido. Alguns ossos fossilizados exibem indícios de tuberculose, o que pode ser uma das causa para a extinção.

Gliptodontídeos Estas criaturas bizarras eram do tamanho de um carro e os mais robustos pesavam mais de uma tonelada. Parentes do atual tatu, tinham exosqueletos protetores, feitos de placas de osso designadas por

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osteodermos e uma cauda temível. Enquanto os tatus têm “armaduras” flexíveis, os gliptodontídeos tinham ossos fundidos na carapaça que os transformavam em “tanques” móveis.

Com pernas altas, estavam adaptados para andar por terrenos pantanosos. Tinham chifres complexos e focinhos semelhantes aos dos alces atuais.

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© Alamy; SPL

Alce


PRÉ-HISTÓRIA

VIVER NUM MUNDO GELADO Como é que os seres humanos sobreviveram à era glacial? Os primeiros homens começaram a explorar a Europa, Ásia e a América do Norte no último período da era glacial estabelecido há 110.000 anos – este período é, frequentemente, designado por “a idade do gelo”. Embora muitos seres humanos vivessem no sul, suficientemente longe para escapar ao avanço do gelo, alguns tiveram de enfrentar a descida da temperatura. Tinham três opções: migrar, adaptar-se ou morrer. Os seres humanos não estavam sozinhos nesta luta. Outras espécies hominídeas, como a de Neandertal, também tentavam enfrentar o frio. Eram mais entroncados do que o Homo sapiens, com antebraços e pernas mais curtas, o que terá ajudado a conservar o calor do corpo. O Homem de Neandertal contruíu abrigos, utilizando a pele dos animais como cobertores e mantendo-se quente com fogueiras alimentadas a madeira. Em condições amenas, caçava veados e, quando arrefeceu, passou a caçar renas. Por fim, quando o solo congelou, deslocou-se para sul à procura de um clima mais quente. No entanto, os homens tinham algo que o Neandertal não tinha: tecnologia avançada e comunicações sofisticadas. Deslocaram-se para sul para fugir ao frio, mas alguns continuaram expostos às temperaturas geladas e a enfrentar ambientes desafiantes. Aprenderam a queimar

ossos quando a madeira era escassa, construíram abrigos mais complexos e faziam trocas comerciais ao longo de grandes distâncias, o que fez crescer a sua rede social. Os homens uniram-se e usavam ferramentas afiadas para caçar animais grandes, como os mamutes e mastodontes, garantindo um maior retorno de calorias pelo esforço. E quando a carne estava consumida, faziam agulhas e com a pele confecionavam roupas ajustadas ao corpo. No auge glacial, há 20.000 anos, o Neandertal estava extinto, mas a inteligência e o engenho do homem ajudou-o a combater o frio.

Segredos da sobrevivência

“Os seres humanos deslocaram-se para sul para fugir ao frio.”

Quanto maior... Animais enormes, como os mamutes e mastondontes, forneciam um grande número de calorias aos caçadores.

Peles

As peles dos animais eram retiradas e transformadas em roupa recorrendo a agulhas primitivas.

Pensamento inteligente e tecnologia permitiram ao homem sobreviver.

Caçadores-recoletores

Os seres humanos da era glacial eram caçadores-coletores que recolhiam plantas comestíveis e caçavam animais pela carne e pele.

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Ferramentas primitivas

A pedra podia ser lascada para ter ponta afiada, permitindo aos caçadores trabalhar a pele dos animais.

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SABIA QUE... Os homens da era glacial escavavam pergelissolo para construir “caves de gelo” para guardar os alimentos?

O FIM DA ERA GLACIAL O que causou o degelo da Terra?

Usar a paisagem

Áreas protegidas em terras baixas ofereciam alguma proteção contra o frio.

Há 19.000 anos

A afluência de água fria no Atlântico afetou as correntes, desacelerando o fluxo de água quente que se movia para cima, a partir do sul. Sem terem para onde ir, as correntes quentes ficaram no Hemisfério Sul, aquecendo os oceanos e fundindo o gelo.

Migração

Deslocarem-se para sul e fixarem-se em áreas isentas de gelo terá ajudado os seres humanos a sobreviver ao auge do frio.

O impacte dos seres humanos pode afetar as previsões.

Há 17.500 anos

O fluxo das correntes afetou o vento e, com a perturbação do norte, este foi para baixo. À medida que os glaciares do sul se fundiam, mais água era libertada para os oceanos e surgiu o dióxido de carbono – um gás com efeito de estufa que ajudou a reter o calor.

Comércio

Grupos diferentes faziam trocas comerciais ao longo de grandes distâncias, o que ajudou a maximizar o uso de diferentes ambientes.

Tecnicamente, ainda estamos a meio de uma era glacial. O período frio em que se assistiu à ascensão e queda dos mamutes-lanosos ainda não terminou. Estamos num período interglacial e, se a história se repetir, vai durar mais cerca de 15.000 a 20.000 anos. Já passaram 11.000 anos, mas se estamos prestes a ter outra onda de frio é matéria de debate. No final do século XVII, aconteceu um período glacial curto, durante o qual os rios congelaram e os campos de gelo não derreteram no verão. Acredita-se que tenha sido causado por um período designado por Mínimo de Maunder. A mudança do campo magnético do Sol produz manchas que, regra geral, aumentam e diminuem num padrão que se repete a cada 11 anos, mas, durante o período glacial curto, este ciclo parou. Durante 70 anos, registaram-se apenas 50 manchas, quando aconteciam perto de 50.000. Em 2008, as manchas desapareceram novamente e quando, por fim, regressaram em 2014, eram mais fracas do que em qualquer outro momento da história. No entanto, desde o século XVII, o homem tem estado a expandir-se e a industrializar e, pelo menos em parte graças a nós, as temperaturas globais têm subido. Se tal terá algum efeito sobre o ciclo da era glacial é algo que ainda não sabemos. Crê-se que o período glacial curto tenha inspirado o Natal com neve.

Abrigo

Alguns abrigos tinham lareiras no interior para fornecer calor extra.

Comunidade

Símbolos e comunicação permitiram que os homens, em conjunto, planeassem o futuro.

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Fogo

Em alguns locais, a madeira era escassa e por isso os homens queimavam ossos.

Quero Saber | 155

© Thinkstock; Ilustração por Jo Smolaga

Há 20.000 anos

No final da era glacial, a Terra inclinou a sua órbita, apontando o Hemisfério Norte para o Sol. Com mais luz e calor a incidir sobre a superfície gelada, o manto de gelo começou finalmente a fundir-se e a água encheu o Oceano Atlântico.

O inverno está a chegar?


PRÉ-HISTÓRIA

Predadores pré-históricos

Conheça as enormes criaturas antigas que controlavam a terra, dominavam os oceanos e aterrorizavam os céus.

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SABIA QUE... O espinossáurio tinha o centro de gravidade avançado? É possível que em terra andasse sobre as quatro patas.

Dentes afiados

Com dentes similares a agulhas, segurava facilmente presas escorregadias, como peixes.

DIMENSÃO COMPARADA

Megavarano VARANUS PRISCUS

Vela

Uma coluna vertebral flexível com articulações esferoides permitia-lhe arquear o dorso, talvez para impressionar parceiros ou intimidar rivais.

Pescoço flexível

O pescoço longo e móvel permitia-lhe atacar rapidamente para apanhar as presas.

Colosso

Nadador

TITANOBOA

DIMENSÃO COMPARADA

HÁ 112-97 MA*

Afasta-te, T. rex: o lagarto espinho era o verdadeiro rei. om quase três andares de altura e mais comprido do que um autocarro, o espinossáurio foi o maior dinossáurio carnívoro à face da Terra. O “lagarto espinho” habitava as planícies costeiras e pântanos do Norte de África, no Cretáceo médio. Ao contrário do T. rex, não tinha dentes serrilhados – não eram usados para rasgar carne; os dentes cónicos, maxilas possantes

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Serpente titânica

e focinho longo eram mais adequados para abocanhar grandes peixes. Crê-se que foi o primeiro dinossáurio a nadar e que passava muito tempo na água, onde podia apanhar criaturas aquáticas com as garras afiadas. Há indícios que sugerem que as aberturas do focinho e as cavidades cranianas faziam parte de um sistema de deteção de pressão para sentir o movimento dos peixes mesmo em águas turvas. O traço definidor deste carnívoro gigante era a “vela” dorsal com 1,5 m de altura, formada por longas espinhas vertebrais. Podia servir para atrair parceiros ou intimidar rivais, ajudar a regular a temperatura ou até suportar uma “bossa” de gordura armazenada, acumulada em tempos de abundância alimentar.

HÁ 60-58 MA

Podendo atingir 15 metros de comprimento, a titanoboa era um dos maiores animais terrestres após a extinção dos dinossáurios. Estas serpentes colossais habitavam as selvas da América do Sul, engolindo tartarugas e crocodilos duma só vez. Podiam caçar em terra e na água, deslizando ou nadando até à presa sem serem detetadas e saltando subitamente para cravar as possantes mandíbulas em torno da traqueia da vítima.

DIMENSÃO COMPARADA

Aves aterradoras PHORUSRHACIDAE

HÁ 62-2 MA

Estes predadores da América do Sul pré-histórica pertencentes à família Phorusrhacidae, conhecidos como “aves do terror”, podiam alcançar três metros de altura. A sua arma principal era o bico adunco afiado, que atingia as presas do alto como uma picareta. As patas destas aves eram incrivelmente fortes e podem ter sido usadas para matar, pontapeando repetidamente a presa ou atirando-a violentamente para a carne ficar mais tenra. *MA: milhões de anos

Quero Saber | 157

© Alamy; SPL

Estava adaptado a uma vida semiaquática, com patas achatadas e garras largas para se impulsionar através da água.

Carnívoro cretáceo colossal

C

Este lagarto-monitor gigante da Austrália oriental, também chamado Megalania, foi o maior lagarto terrestre de todos os tempos. Podia atingir mais de cinco metros de comprimento e pesar 600 kg. Tinha dentes e garras muito afiados, perfeitos para perfurar as vítimas. Este grande lagarto compensava a falta de velocidade aguardando imóvel para emboscar as presas e localizava carne putrefacta graças ao seu excelente olfato.

DIMENSÃO COMPARADA

Algumas estimativas sugerem que o espinossáurio podia ultrapassar 15 m de comprimento; se tinha algum predador, este pensaria duas vezes antes de abordar tamanho colosso.

ESPINOSSÁURIO

HÁ 1,8 MA-40.000 A


PRÉ-HISTÓRIA

Monstros marinhos

Olfato apurado

Mordida firme

A água era canalizada através das narinas do réptil, que conseguia assim detetar as presas mesmo em águas escuras ou turvas.

Os grandes e poderosos músculos das mandíbulas do Liopleurodon ajudavam-no a segurar as presas que tentassem libertar-se.

À espreita nas profundezas dos mares pré-históricos havia toda uma multidão de gigantes aquáticos mortíferos.

Dentes aterradores

Os dentes similares a agulhas tinham cerca de 10 cm de comprimento, ideais para perfurar a carne das presas.

Um pliossáurio possante O que tornava o Liopleurodon um carnívoro jurássico tão formidável?

Tamanho intimidante

É difícil estimar com precisão o comprimento do Liopleurodon devido ao registo fóssil incompleto, mas alguns pliossáurios podem ter atingido 15 a 18 metros.

Nadador forte

Longas barbatanas a fazer lembrar remos ajudavam-no a impulsionar-se através da água e a acelerar para emboscar as presas.

DIMENSÃO COMPARADA

Caçador oceânico majestoso LIOPLEURODON

HÁ 160-155 MILHÕES DE ANOS

Um predador feroz com uma mordida capaz de esmagar ossos. O Liopleurodon está entre os predadores mais poderosos que já habitaram a Terra, com uma mordida quiçá ainda mais forte do que a do imponente T. rex. Pertencia a um grupo de répteis marinhos chamados pliossáurios – criaturas grandes com pescoços curtos.

158 | Quero Saber

Alimentava-se sobretudo de peixe e lulas, mas às vezes procurava presas muito maiores. Enormes marcas de dentadas encontradas em fósseis de plesiossáurios sugerem que eram vítimas das mandíbulas massivas do Liopleurodon, repletas de dentes afiados.

Os cientistas estimam até que este carnívoro era suficientemente forte para partir um carro ao meio com uma dentada! O Liopleurodon podia também ter a zona ventral pálida para se manter camuflado das presas abaixo, permitindo-lhe atacar de emboscada apesar do seu tamanho. WWW.QUEROSABER.COM.PT


SABIA QUE... Acreditou-se outrora que os dentes do megalodonte eram línguas de dragão petrificadas?

Proteção

Uma camada espessa de gordura pode ter oferecido ao Livyatan alguma proteção contra a mordida do megalodonte.

DIMENSÃO COMPARADA

Mais de 200 milhões de anos antes de os primeiros dinossáurios surgirem, o Pentecopterus era um importante predador do Paleozoico. Podia atingir 1,8 m de comprimento e usava as enormes patas para agarrar as presas. Os juvenis viviam no leito marinho enquanto os adultos residiam sobretudo em águas rasas para evitar predadores maiores. Este artrópode gigante tinha também cílios que o ajudavam a detetar o movimento das presas.

Oculto nos mares cretáceos, o Machimosaurus era um crocodilomorfo colossal, com perto de dez metros de comprimento – quase o dobro dos seus parentes modernos maiores. Os dentes eram sobretudo adequados para esmagar conchas e ossos, ao invés de cortar carne. A principal tática do Machimosaurus era esconder-se em águas rasas e, sem aviso prévio, fechar a boca em torno de tartarugas e peixes. Uma vez presa nas mandíbulas, a vítima não conseguia escapar.

As maxilas do megalodonte poderiam esmagar facilmente o crânio de uma baleia, com uma força de mordida superior a 182.200 newtons – dez vezes acima da do tubarão-branco.

Tubarão Leviatão da vida real agigantado LIVYATAN

HÁ 13-12 MA

Um “cachalote” letal com uma mordida fenomenal.

Réptil marinho alfa HÁ 80-66 MA

O massivo mosassáurio era um lagarto aquático gigante e um predador dominante nos oceanos do Cretáceo. Alguns alcançavam 15 metros de comprimento ou mais e tinham longas caudas possantes para se impulsionarem através da água. Predavam répteis, peixes, tubarões e bivalves, partindo as conchas duras com as mandíbulas fortes. Enquanto ser aeróbio, não conseguia mergulhar por longos períodos, pelo que estava limitado a caçar próximo da superfície. WWW.QUEROSABER.COM.PT

Amante do calor

O megalodonte só sobrevivia em águas quentes e ter-se-ia debatido com uma descida da temperatura.

O Livyatan (hebreu para “leviatão”) tinha o tamanho aproximado do cachalote moderno mas era um caçador muito mais formidável. Com 50 toneladas, provavelmente competia com DIMENSÃO COMPARADA o megalodonte por alimento, caçando cetáceos menores, como golfinhos, e peixes grandes. Os seus dentes são talvez os maiores de qualquer animal, com mais de 30 cm de comprimento, e a força da sua mordida rivalizava com a do megalodonte.

MOSASSÁURIO

Pelos fósseis, o Livyatan parece anatomicamente similar ao cachalote moderno, pelo que pode ter usado a ecolocalização para encontrar presas.

DIMENSÃO COMPARADA

MEGALODONTE

HÁ 28-1,6 MA

O colossal seláquio que coloca o tubarão-branco a um canto. Este enorme tubarão com 75 toneladas era tão grande que podia facilmente caçar baleias. Com até 20 metros de comprimento e a boca repleta de dentes tão grandes como a mão humana, acabava facilmente com golfinhos, baleias, focas, lulas e outros tubarões, sendo capaz de partir ao meio a carapaça de uma tartaruga. Estima-se que tinha uma das mordidas mais fortes de sempre do reino animal – seria capaz de esmagar um carro pequeno.

DIMENSÃO COMPARADA

Quero Saber | 159

© SPL; Getty; WIKI/ DiBgd; Shutterstock

HÁ 130 MA

Semelhanças

Grande dentada

DIMENSÃO COMPARADA

MACHIMOSAURUS

Um corpo forte e hidrodinâmico ajudava o megalodonte a emboscar as presas.

O Livyatan era ligeiramente menor do que o megalodonte mas era, ainda assim, um inimigo formidável, com mandíbulas colossais repletas de dentes enormes.

HÁ 467 MA

Crocodilo imenso

Quem sairia vitorioso entre estes dois golias pré-históricos?

Músculos poderosos

O tamanho não é tudo

Escorpião gigante PENTECOPTERUS

Megalodonte vs. Livyatan


PRÉ-HISTÓRIA

Gigantes dos céus Os enormes predadores alados que traziam a morte das alturas. Bomba aérea

Impacto mortífero

A águia-de-haast podia atacar do alto a uma velocidade estimada de 80 km/hora.

Ganhando velocidade com a descida, uma águia de 13 kg podia derrubar presas maiores, como a moa.

Rapina “jumbo” ÁGUIA-DE-HAAST

Garras

Estas águias usavam uma pata para segurar a presa enquanto a outra esmagava o pescoço ou a cabeça.

A águia-de-haast (Harpagornis moorei) foi levada à extinção pela competição com o ser humano pela moa, a sua presa preferida.

HÁ 1,8 MA-1.400 A

Com garras do tamanho das de um tigre, estas águias monstruosas caçavam herbívoros indefesos na Ilha Sul da Nova Zelândia. Precipitando-se sobre as presas a velocidades de até 80 km/hora, derrubavam-nas com a mera força do impacto. A sua presa favorita era a enorme ave não voadora moa, que podia pesar até 250 kg. Face à dimensão do corpo, a envergadura de três metros da águia-de-haast era modesta, o que significa que matava as moas no solo, ao invés de as apanhar e erguer. As garras extremamente afiadas podiam incapacitar a presa rapidamente, através de golpes fatais na cabeça ou no pescoço.

Pterossáurio colossal QUETZALCOATLUS NORTHROPI

HÁ 70-65 MA

O Quetzalcoatlus northropi é a maior espécie conhecida de pterossáurio, répteis voadores que coabitaram com os dinossáurios. Com uma envergadura de 10 m ou mais, tinha o tamanho aproximado de uma avioneta. O bico sem dentes sugere que caçava presas pequenas que não exigiam mastigação, como dinossáurios bebés, e possivelmente também era necrófago. Crê-se que andava no solo, devido às patas pequenas e almofadadas, adequadas à deslocação em terreno firme. A ser verdade, poderia caçar como a cegonha moderna, apanhando presas pequenas com o bico.

Em terra e no ar

As enormes asas ajudavam-no a planar, enquanto as patas compactas favoreciam uma deslocação rápida no solo.

Bico afiado

Usando o bico pontiagudo, o Quetzalcoatlus conseguia apanhar pequenos dinossáurios.

Asas enormes

As asas do Quetzalcoatlus estendiam-se dos alongados quartos dedos até ao topo das pernas.

O Quetzalcoatlus tinha uma crista no topo da cabeça, possivelmente de cores vivas, para atrair parceiros.

160 | Quero Saber

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SABIA QUE... Um dos maiores dinossáurios já descobertos é um titanossáurio com 37 m de comprimento e 70 toneladas?

Planadora

ARGENTAVIS

HÁ 6 MILHÕES DE ANOS

As grandes asas permitiam-lhe aproveitar as correntes atmosféricas e de ar ascendente para planar.

Ainda maior do que a águia-de-haast, a Argentavis magnificens foi uma das maiores aves que já habitou a Terra. A envergadura de sete metros significava que estava mais apta a planar do que a bater as asas e usava as correntes atmosféricas para se manter no ar. A dimensão massiva da Argentavis magnificens impossibilitava uma descolagem em corrida, pelo que a ave contava com a altura para levantar voo, tirando partido de encostas e ventos frontais, como um piloto de asa-delta. Usava as garras afiadas e o bico adunco para atacar as presas, planando sobre vastas áreas de terra em busca de vítimas. Também pode ter sido necrófaga, com o seu tamanho intimidante a afastar outros caçadores, para conseguir alimentar-se das carcaças.

Superinseto MEGANEURA

Levantar voo

Para levantar voo, corria encosta abaixo e saltava para o ar.

Necrófaga

A dimensão imponente da ave permitia-lhe afugentar outros predadores das suas próprias presas.

Porque eram estes animais tão grandes?

A envergadura de 75 cm da Meganeura é superior à de uma pega.

HÁ 300 MA

Um dos maiores insetos que já existiu, a Meganeura era parecida com a libelinha moderna, da qual é parente. Este inseto pré-histórico beneficiava de uma percentagem de oxigénio na atmosfera mais elavada no período em que viveu, o que lhe permitiu alcançar e manter o seu tamanho impressionante. Usava os enormes olhos para localizar presas como pequenos anfíbios e outros insetos, que apanhava com as patas em pleno voo.

Envergadura recordista A dimensão gigante destas criaturas aladas.

Argentavis 7m Águia-de-haast

2,5 m Quetzalcoatlus

Meganeura

10 m 75 cm

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Aceitava-se outrora que o tamanho dos animais pré-históricos era resultado da regra de Cope. Batizada em honra do paleontólogo norte-americano Edward Drinker Cope, a regra diz que o gigantismo dos dinossáurios se deve à noção de que os animais evoluem naturalmente para se tornarem maiores. Quando ocorre uma extinção em massa, novos animais menores substituem os maiores extintos, e o processo recomeça. Como “só” passaram 66 milhões de anos desde a extinção em massa do Cretáceo, e 12.000 anos desde a última era glacial, os animais são hoje mais pequenos porque ainda não tiveram tempo de evoluir e voltar a atingir dimensões tão grandes. Outra teoria sugere que fatores ambientais, como níveis mais elevados de oxigénio e temperaturas mais altas, podem ter desempenhado um papel significativo no gigantismo. Os répteis de sangue frio beneficiaram do clima quente, que proporcionava uma digestão, circulação e respiração mais eficientes, além de vegetação abundante para consumir. Estudos mais recentes e descobertas de fósseis, contudo, lançaram dúvidas sobre ambas as teses. Algumas criaturas parecem ter evoluído de forma a tornarem-se mais pequenas com o tempo, e não maiores, e muitos animais de diferentes dimensões coexistiram. Uma explicação para o facto de os dinossáurios em particular serem tipicamente grandes reside nas semelhanças fisiológicas com as aves. Os seus ossos tinham bolsas de ar, o que tornava leves mesmo as espécies maiores, para que não colapsassem sob o peso dos próprios corpos. Mas nem todas as maiores criaturas eram pré-históricas. O animal mais pesado de sempre ainda está vivo: a baleia-azul. Os animais marinhos podem atingir proporções épicas graças à força ascensional da água, que suporta a sua massa considerável e permite corpos muito maiores do que em terra.

Quero Saber | 161

© SPL; Thinkstock; WIKI/ Johnson Mortimer

A maior ave


PRÉ-HISTÓRIA

Como datar dinossáurios

Um dos fósseis mais importantes jamais descobertos, o Archaeopteryx preenche a lacuna evolutiva entre dinossáurios e aves.

A ciência por detrás da datação de fósseis.

I

dentificar a idade de ossos de dinossáurio é complicado. Utiliza-se muito uma técnica chamada datação radiométrica, que determina a idade das rochas em torno do fóssil. É medido o número de neutrões dos núcleos dos isótopos da rocha; se houver mais neutrões radioativos instáveis do que estáveis, o elemento é mais jovem, pois não teve tanto tempo para perder partículas e tornar-se estável. A quantidade restante de isótopos instáveis diz-nos a idade. As formas de isótopo ideais para encontrar e utilizar são o urânio-238 e o urânio-235, pois têm uma meia-vida radioativa mais longa,

logo, permitem datar fósseis muito antigos. A rocha imediatamente acima e abaixo do fóssil é testada, para se poder estimar a idade do dinossáurio. Os peritos descrevem o processo como uma espécie de “relógio natural”. Outro processo utilizado é a estratigrafia paleomagnética. O campo magnético da Terra já inverteu os polos imensas vezes, por isso, avaliar as propriedades magnéticas dos óxidos de ferro pode restringir os achados. Essencialmente, funcionam como pequenas bússolas. As atuais técnicas só conseguem restringir a idade até uma estimativa dentro de dez mil anos, mas com

milhões de anos de história em jogo, não deixa de ser muito impressionante. Uma descoberta de 2005 abalou o mundo da paleontologia, quando tecido mole terá sido encontrado no interior de um fóssil de T. rex. Pensava-se que o período Mesozoico era antigo de mais para os tecidos moles sobreviverem, mas o ferro presente no corpo preservou o formaldeído do tecido, com ligações cruzadas de aminoácidos que o tornaram mais resistente à decomposição.

Qual a diferença entre um paleontólogo e um arqueólogo? Parece uma pergunta anedótica, mas existe uma distinção crucial. Existe alguma confusão entre estas duas áreas de estudo, pois estão intimamente ligadas e muitas vezes sobrepõem-se. A paleontologia concentra-se sobretudo em fósseis de plantas e animais, e a arqueologia mais nas civilizações humanas de outrora, com base em vestígios e monumentos. Os arqueólogos não têm nada a ver com fósseis. Pode dizer-se que a paleontologia se baseia na geologia e a arqueologia tem mais a ver com a antropologia cultural.

“Sue” é um dos esqueletos de Tyrannosaurus rex mais bem preservados. Está no Museu Field de História Natural, em Chicago (EUA).

Saiba mais A History Of Life In 100 Fossils, livro de Paul Taylor e Aaron O’Dea (€ 18,13 em www.bertrand.pt), descreve a importância dos fósseis para ilustrar a evolução da vida na Terra.

162 | Quero Saber

“ Uma descoberta de 2005 abalou o mundo da paleontologia, quando tecido mole terá sido encontrado no interior de um fóssil de T. rex.”

© Thinkstock; Dreamstime

Um fóssil como este seria de grande interesse para um paleontólogo, mas não tanto para um arqueólogo.



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