Fábrica! #1

O que rolava durante a produção do zine:

Depeche Mode Speak & Spell 1981

Fugazi Repeater 1990

Lush Spooky 1992

My Bloody Valentine Isn't Anything 1988

Foi, me desculpe a contemporaneidade, destrinchando o YouTube em parceria com os artistas similares do LastFM que eu pirei. Eu tava tranquilo. Os 5 segundos que me deram para poder assistir os vídeos correram certeiros, fluindo gentilmente, e eu sem nem mesmo esbravejar por ser obrigado a assistir uma propaganda. Foi quando soou os acordes iniciais.

Jeopardy. The Sound. PUTA QUE PARIU, QUE PORRA É ESSA? – pensei em letras garrafais, e entrei em estado catatônico, de êxtase puro, piração extasiada. Onde andei estes últimos 32 anos que ainda desconhecia tal banda? Três deles com certeza não foi andando, entram pra minha idade negativa, que ainda está por vir. O que é essa composição? Essa melodia? Essa letra? Claro que não é nada único ou original, sei que existem pencas de bandas do estilo, da mesma época, inclusive. Mas algo mudou, lá dentro de mim, depois de ouvir esse som. E depois disso conhecer o álbum, Jeopardy (em português “perigo”, “risco”), cria do genial Adrian Borland, 1980. Mesmo ano do Closer e da morte de Ian Curtis. Um ano central que definiu pra mim a década + 2 da música boa: 1974 até 1986. Sei que vão torcer o nariz, mas fodam­se. Depois de tanto tempo tentando bolar um zine bacana, eis que uma banda e a música (sempre ela) me dão a direção pra saber o que fazer. Esse é meu parto. E o parto de cada colaborador. Que aliás, precisamos cada vez mais (mande mail para eduverme@gmail.com se quiser ajudar ou comentar as matérias!). A intenção do zine é, principalmente, trazer informação e novas bandas pros seus ouvidos. Todo o trabalho contemporâneo de destrinchamento das mídias sociais está resumidamente aqui, em suas mãos, pra você não correr o risco de passar a vida sem ouvir pedradas como Jeopardy.

Um abraço a todos.

Verme.

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Electricity - Orchestral Manoeuvres in the Dark Lado B: "Almost" Lançado: 21 de maio de 1979 Compositores: Paul Humphreys, Andy McCluskey Produção: Martin Zero

Electricity foi o single­debut do OMD, grupo de new wave/synthpop da década de 80 capitaneado por Andy McCluskey (vocal, baixo) e Paul Humphreys (teclados, vocal). Ainda que o álbum e a versão clássica da música só tenha sido lançada em 1980 pela DinDisc, a versão primordial, de 1979, lançada pela Factory Records soa extremamente superior, seja pela crueza da timbragem, seja pelo fato dessa versão ter sido produzida pelo Martin Zero, produtor de, entre muitas outras bandas, Joy Division, New Order e The Durutti Column.

Segundo consta, a música surgiu inspirada em "Radioactivity", dos Kraftwerk, e percebe­se claramente a influência. A música também abriu caminho para que o OMD registrasse seu álbum por uma pequena gravadora independente, a já citada Dindisc, subsidiária da Virgin. O single caiu nas mãos de Gary Numan, que na época ainda trabalhava em uma loja de discos, e que acabou os convidando para abrirem seus shows na tour de 1979.

"Electricity" já havia sido registrada em uma demo em 1978, ao lado das músicas "Julia's Song" e "The Misunderstanding", gravadas no Open Eye estúdio quando a banda ainda se chamando "The Id". Em 2002 a Engine Records reeditou essa demo em forma de um EP. Pra quem quiser conferir o som, acesse nossa página no face: facebook.com/fabricazine

“INDEPENDENTE NÃO QUER DIZER QUE VOCÊ TOCA PUNK, OU HARDCORE, OU SE TEM CABELO COMPRIDO. INDEPENDENTE É UMA POSTURA.” Texto e Imagens: Bruna de Bem

Não é todo o dia que a capital ganha espaço para uma verdadeira aula sobre o underground.

O cenário independente e o famoso Do it Yourself foram os temas da palestra ­ misturada com uma workshop ­ ministrada pelo baterista Mauricio Alves, o Boka, do Ratos de Porão. O evento ocorreu no Entrebar, no dia 18 de setembro.

Boka falou sobre sua trajetória no movimento, desde que começou a tocar aos 16 com uma bateria emprestada, até os dias de hoje, estando há 25 anos no RxDxP e desde 1997 sendo o proprietário da Peculio Discos, selo de bandas de som pesado.

“Independente é ter vontade, arregaçar as mangas, contar com a colaboração dos amigos. É saber que todo lugar precisa ter sua cena fortalecida para ajudar o outro, para as outras gerações, para não morrer nunca”, resumiu Boka. E foi exatamente dessa forma que a palestra/workshop passou por POA, com toda a organização feita por pessoas que ainda acreditam e, que fazem com que a força do underground continue.

Adrian Borland

Vocalista e guitarrista do The Outsiders (1975 - 1979).

Vocalista e guitarrista da banda The Sound (1979 - 1987).

Após o fim da banda em 1987, segue carreira solo.

Data do suicídio: 26 de Abril de 1999.

Motivo: depressão Esse cara é o que se pode chamar de fodidamente injustiçado.

Membro fundador e principal cabeça do The Outsiders, primeira banda punk a gravar um álbum e lançá­lo por um selo próprio (“Calling On Youth”, 1976) e dono de uma das bandas mais incisivas da década de 80, o The Sound, Borland foi uma espécie de "mentor" para as posteriores bandas que surgiriam na cena pós­punk do começo dos anos 80. Mesmo quando o Sound acaba em 1987, consegue estabelecer uma coesa carreira solo, que totalizou cinco álbuns. Apesar de tudo isso, Borland jamais obteve seu devido reconhecimento (sempre foi muito aclamado pela crítica, mas completamente desprezado pelo público). Com sua personalidade soturna, agoniantemente depressiva, ele conviveu durante anos com sua depressão. Sua mãe diz que a música era uma espécie de terapia pra ele. Porém, em 1999, ao perder a luta para os sintomas de um transtorno esquizoafetivo e após três tentativas falhas de suicídio, Borland se jogou nos trilhos da estação de Wimbledon, deixando a vida e entrando para a história da música.

Analisando suas letras, sempre encharcadas de uma poesia taciturna e sombria, já se percebiam sérios transtornos. Só no primeiro disco do The Sound (“Jeopardy”, 1980, mesmo ano do “Closer” e do suicídio de Ian Curtis, um dos grandes ídolos de Borland) pode­se perceber uma avalanche de temas pesados: a falta de amor próprio ("I Can't Escape Myself"), a necessidade de companhia ("Hour Of Need"), a dificuldade de se expressar ("Words Fail Me"), a desilusão com o mundo ("Missiles") e até mesmo o flerte com o suicídio ("Unwritten Law").

Não tinha como escapar do destino, e logo Borland se tornou alcoólatra. Em maio de 1999 ele escreve uma carta aberta para seus fãs, onde se mostrava feliz e ansioso pelo lançamento de seu novo trabalho, ainda em produção, o "500 Miles Of Desert".

Também fazia planos de um sexto álbum. Porém, logo após as gravações das vozes e da guitarra guia para o "500 Miles...", sua disposição se alterou. Afundado numa crise existencial, Borland escreveu uma carta para sua mãe, onde dizia ter medo de ser internado em um hospital psiquiátrico, e, após isso, visitou uma ex­namorada, onde, pensando alto, disse que, mesmo em meio à tantos problemas, "há sempre a linha ferroviária". Seu estado de saúde piorou, e sua ex, preocupada, acionou a emergência, porém Borland some, e é relatado como "pessoa de alto risco desaparecida". Na noite do dia 24 de abril, Borland entra na delegacia de Kennington onde afirma estar sendo perseguido.

Acabou sendo deixado na casa da sua mãe pelas 03h15min, e os policiais descreveram seu estado de espírito como "lúcido".

Na noite do dia 25 Borland fugiu para a estação de Wimbledon, e nas primeiras horas do dia 26 alguns passageiros horrorizados assistiram aquele rapaz de 41 anos se atirando sob o trem, provavelmente sem saber que ali, aos pedaços e banhado em sangue, jazia um dos músicos mais influentes do pós­punk e do rock oitentista.

20 de abril de 1999

06 de dezembro de 1957

Isn't she lovely?

Eu tento ser tão irônico quanto dizem qu'eu sou, mas não adianta, não há como vencer essa queda de braço com “Deus” nesse quesito – ou o que vocês chamam “vida”, ou até de “acaso”.

Saindo da estação, centro. Aproveitar o início de tarde livre para uma caminhada sem rumo pela Capital da Província é a meta. Sempre com o mp3. Björk, Stevie Wonder.

Mastodon. “All Is Full of Love.” Nova casa, velho trampo. Ideias de sempre com novas execuções. Pulmão a pleno respirando aquela convidativa tarde primaveril e o novo mundo que se abria.

De repente aquela cara e jeitinho [meio torto] de andar. Inconfundíveis – quadris e pernas, a saia lhe faz bem. Inconscientemente o velho bobo dispara. Justo em uma estação, justo quando eu quase tinha jogado todas aquelas dores de estômago no quarto dos fundos das lembranças. Eu, baixando o volume do mp3 que me grita “no escape/ trapped in time space”. “Divinations.” Olhares se cruzam, mãos estendidas. Cumprimentamo­nos.

“Como vão as coisas?”, ela pergunta.

Esse tipo de indagação sempre me atiça, dá aquela vontade de começar a desfiar um rosário, conjecturas, falsos planos, pensamentos vagos e aleatórios. TODA a vez que alguém pergunta isso é assim. Alguns milésimos se passam, sigo firme ou me afundo?

Respiro, penso. Ela nunca compreendeu a ironia como modo default de raciocínio – represá­la, pra mim, é mais perigoso que prender espirro tentando ficar de olhos abertos simultaneamente –, o que enrolaria mais a situação.

“Tudo certinho”, respondo, optando pela saída mais ordinária.

Ela vai além, eu com defesa a pleno busco ser diplomático. Quer saber das trivialidades: com o que tenho trabalhado, se [ainda] estudo, o que tenho feito. Comenta que ouvi as músicas da banda e gostou.

“Mas morrer numa graninha indo em algum show, pra incentivar a banda, nada?”, rebato.

Cambaleante e ainda assim um business man – por necessidade, não por opção.

“Não tenho saído muito”, replica.

“Indo pra lá?”, aponta ela para o lado esquerdo. O meu lado esquerdo.

“Aham.”

Andamos. Lado a lado, como em verões passados em parques derrubados ou invernos de noites besuntadas. Glândulas sudoríparas trabalhando a pleno, meu desodorante já sente os efeitos do encontro casual.

“Indo fazer o quê?”, segue ela com o interrogatório.

“Nada” – entrego, com essa maldita mania de não inventar mentiras – “só tentando manter os pés e as pernas sob pressão, talvez achar umas bergamotas e um muro, o Sol já tá posto, né”.

“Tou indo na biblioteca, vem comigo, a gente coloca a conversa em dia.”

Por que todo aquele interesse agora, tardio? Há algum tempo eu desistira dela – coisa qu'ela soubera muito bem – pela não­reciprocidade. Belezza, the show must go on, mas é incrível como as pessoas não percebem a repercussão dos próprios atos. Ou fingem. Não há como deixar que certos movimentos passem impunes, oras, mesmo querendo fazer vista grossa e seguir.

Um milhão de assuntos aleatórios se seguem, encadeados. Tento me policiar, ser mais frio, mas a conexão é incondicional. A afeição se dá pelas ligações de pensamento, essas adivinhações toscas. Óbvio que atração física – e alguma incitação a pseudo violência – também é necessária, mas pros infernos quem diz que “os opostos se atraem”. A mina mais gostosa do mundo pode me broxar fácil s'eu tiver que explicar um jogo de palavras duas vezes. Não era esse o caso. Mesmo. Passo a interagir com a queridinha sob o viés da Moral Inferior, ao invés Superior, que me guiava até então – afinal, todo mundo sabe, um cara é movido por duas cabeças e ambas [geralmente] não atuam de forma simultânea.

“Um grandioso acervo de vinte livros e ceva barata, que tal? Muito melhor pra papear, não te cobro empréstimo e tu conhece meu QG”, cravei com algum veneno.

“A ceva eu aceito, sim, mas tenho que pegar um livro de [insira aqui qualquer tema estapafúrdio]. A gente passa na biblioteca rapidinho, no mercado e vai lá, pode ser?”, rebateu já condicionando. Incrível que elas têm de, sorrateira e indiretamente, direcionar as coisas. Assenti.

Hall de entrada da biblioteca. Identificação, “proibido entrar com volumes”, o escambau. Ela vai adiante, eu fico esperando por ali mesmo. Vejo ela subindo as escadas. A saia lhe faz bem. Possuído pela Moral Superior começo a gastar fósforo em uma ideia. Devo ou não devo? Paro de pensar, paro de esperar. Deixo os pés me levarem à rua, sou aficionado pelo por do Sol. Lhufas pr'aquelas pernocas e aquela cabecinha. Ela pode ser adorável, mas o xeque­mate era meu. t_ks

Q UE M CO LA B O RO U NA E DI ÇÃ O Nº 1 DO F Á B RI CA !

Thiago Kitter e sua extrema boa vontade para terminar seu conto, muito foda, aliás.

Bruna de Bem, me dando dicas de beleza e sempre disposta a ajudar.

Shiva Golmohamadi, menina iraniana que produz artes graficas de altíssimo nível. É dela a ilustração que fecha o zine, na página seguinte.

Juan Primon, fez o logo do zine de graça, além de ser um grande amigo.

E por fim eu, Eduardo Verme, editor e masoquista.