Caderno de Educação / Centro de Comunicação da FaE/CBH/UEMG. - v. 1, n. 1, 1995 - . Belo Horizonte: Centro de Comunicação da FaE/CBH/UEMG, 1995v. ; 15,2 cm. Quadrimestral (1995 - 2002) Semestral (a partir de 2003) ISSN 1519-7395 1. Educação. I. Universidade do Estado de Minas Gerais. Faculdade de Educação. Centro de Comunicação. CDD: 370
ISSN 1519-7395
Editora da Universidade do Estado de Minas Gerais Barbacena 2013
CADERNO DE EDUCAÇÃO – N. 47– 2013 ISSN 1519-7395 Publicação semestral do Centro de Comunicação da FaE/CBH/UEMG Rua Paraíba, 29 –7º andar – sala 704 – Belo Horizonte - MG CEP. 30.130-140 –Tel: (31) 3239-5912 cenc.uemg@gmail.com caderno.faeuemg@gmail.com Universidade do Estado de Minas Gerais Reitor: Dijon Moraes Júnior Vice-Reitora: Santuza Abras Faculdade de Educação Diretora: Fátima Silva Risério Vice-Diretora: Kátia Gardênia Henrique da Rocha Campelo Centro de Comunicação - CenC Coordenadora:Lavínia Rosa Rodrigues EXPEDIENTE Conselho Editorial Lavínia Rosa Rodrigues (Editora), Maria da Consolação Rocha, Antônio Rodrigues Franco, Iracema Campos Cusati, Ofélia de Souza Vieira, Lázaro Eustáquio Simin, Vanda Lúcia Praxedes, Vera Lúcia Nogueira. Revisor Antônio Rodrigues Franco Secretaria Iara Ferreira Capa Rachel Sager Boldt Projeto gráfico e diagramação Marco Aurélio Costa Santiago Apoio Fundação Renato Azeredo Linha editorial: O Caderno de Educação é um periódico científico semestral que publica dossiês, artigos e trabalhos de docentes, especialistas e discentes relacionados com a área educação em diálogo com outros campos do saber, sobretudo aqueles ligados à escola pública. É uma publicação da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais - FaE/UEMG.
Sumário Editorial
7
A corporeidade da criança na Educação Infantil Corporeality in early childhood education Vânia Cristina Regufe Teixeira, Luiz Felix Ribeiro, Liliana Borges
11
Propaganda e infância Advertisement and childhood Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
23
A coordenação da Educação Infantil no município de Belo Horizonte Pedagogical coordination in childhood education in the municipality of Belo Horizonte Michele Cristina Pereira dos Santos, Maria Odília Figueiredo De Simoni
37
Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos Orality Studies: A contribution to the cognitive development of six-year-old children Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende, Luciana Alves de Araújo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio, Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França
47
Sumário As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural Contributions of arts education - dance and music - to the formation of the critical sociocultural individual Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
59
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA Schooling and labor market: The expectations of the subjects enrolled in Youth and Adult Education Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva, Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira, Enelice Gomes Miconi
75
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte Knowing the Pedagogical Intervention Project – PIP implemented by the Municipality of Belo Horizonte Keli Amorim Manini de Paula, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira, Pâmela Tamires Santos Queiroz, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Maria Aparecida Benedito de Faria, Renata Schettino Canelas
89
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno Irlen Syndrome: a multidisciplinary approach for students with learning difficulties Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Carolina Lais Nogueira de Oliveira, Patrícia Couto Moreno Moraes, Alice Lopes Colares, Márcia Moreira Veiga
103
Editorial Prezado(a) leitor(a), Este Caderno de Educação apresenta artigos produzidos por estudantes concluintes do Curso de Pedagogia da FaE-UEMG, em co-autoria com os professores que os orientaram. Nesta nova fase, o Caderno de Educação abre espaço para a divulgação de artigos produzidos a partir das monografias de estudantes da Graduação e da Pós-Graduação, e para a publicação de ensaios, resultados de pesquisa, relatos de experiência, resenhas de livros, entrevistas, entre outras modalidades de produção acadêmica. Os três primeiros textos são resultantes dos trabalhos finais de alunas(os) que cursaram o Ciclo de Formação Complementar Docência para a Educação Infantil, no 1º semestre do ano de 2010 e abordam temas que permeiam a atual discussão sobre a EDUCAÇÃO INFANTIL. A turma contou com a atuação docente de equipe composta pelas professoras Giselle Laguardia Valente, Liliana Borges, Lucileide Malaguth Colares Novais, Márcia Moreira Veiga, Maria Odília Figueiredo De Simoni, Mirtes da Piedade Chagas e Souza e Vera Lúcia de Oliveira Machado. O primeiro artigo A Corporeidade da Criança na Educação Infantil de Luiz Felix Ribeiro, Vânia Cristina Regufe Teixeira e Liliana Borges discorre sobre a corporeidade da criança e os espaços/tempos de uma escola infantil, a partir do resultado de uma pesquisa de campo realizada em uma escola de educação infantil da rede particular de ensino de Belo Horizonte. De acordo com o observado, em relação ao corpo da criança e à constituição dos diferentes espaços, perceberam que esses eram organizados para serem ocupados de maneira a estabelecer a rotina escolar, com regras de controle do movimento e das brincadeiras das crianças. Em Propaganda e infância Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula
7
Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes e Márcia Moreira Veiga a partir da concepção de que a criança como um ser social, produto e produtor de cultura, discutem os efeitos que as propagandas podem causar no desenvolvimento da criança, levando-se em consideração as mudanças na estrutura familiar e no modo de vida de uma sociedade tida como pós-moderna. Analisam os efeitos do contato precoce com o consumo no desenvolvimento infantil, bem como a influência das propagandas nos modos de vida e de consumo das crianças. O artigo A coordenação da Educação Infantil no município de Belo Horizonte de Michele Cristina Pereira dos Santos e de Maria Odília Figueiredo De Simoni apresenta um estudo sobre a atuação do Coordenador Pedagógico da Educação Infantil em Belo Horizonte, inventariando as dificuldades que esse profissional encontra ao exercer suas atribuições. Na pesquisa de campo, optou-se por coletar dados em Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEI’s), da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte e entrevistar quatro Coordenadoras Pedagógicas, em exercício, em três Unidades de diferentes regiões. No artigo Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende, Luciana Alves de Araujo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio e Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França abordam a relação entre o trabalho docente que envolve práticas com a oralidade e sua contribuição para o desenvolvimento cognitivo de crianças discentes do 1º ano do Ensino Fundamental. Investigaram as ações individuais e coletivas, a construção de conhecimentos, procurando perceber e analisar as formas de expressão da oralidade por parte das crianças, assim como o trabalho docente com a oralidade O artigo As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural de Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro,Thamy Caroline de Souza e Darsoni de Oliveira Caligiorne procura despertar o olhar do professor para a
8
importância da disciplina de Artes - Dança e Música - na formação do sujeito crítico sociocultural. Para tanto, apresentam-se os contextos históricos que mais influenciaram para a desvalorização desta área de conhecimento nas escolas brasileiras, a fim de resgatá-la desse lugar, bem como as contribuições da Dança e da Música, tais como consciência corporal, autenticidade, criatividade, criticidade, afetividade, socialização na educação desse sujeito. Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA, artigo de autoria de Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva, Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira e Enelice Gomes Miconi procura identificar e compreender as expectativas dos sujeitos da EJA matriculados regularmente em instituições ligadas ao sistema municipal de ensino. O trabalho de campo, as observações realizadas em estabelecimentos educacionais e conversas informais com alunos e professores possibilitaram identificar os principais anseios dos sujeitos da EJA: alcançar melhores oportunidades de trabalho e a conclusão dos estudos. Conhecendo o projeto de intervenção pedagógica da rede municipal de educação de Belo Horizonte, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Keli Amorim Manini de Paula, Maria Aparecida Benedito de Faria, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira, Pâmela Tamires Santos Queiroz e Renata Schettino Canelas analisou o Projeto de Intervenção Pedagógica - PIP, implantado pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte com o objetivo de combater os altos índices de defasagem escolar diagnosticados em alunos do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Educação, trazendo reflexões acerca da importância do aprimoramento das políticas públicas que visam a solucionar os problemas de aprendizagem nos processos de escolarização. Encerra-se esta edição com o artigo Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno de Alice Lopes Colares, Carolina Laís Nogueira de Oliveira, Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Patrícia Couto Moreno Moraes e Márcia Moreira Veiga. Desconhecida do público em geral, a Síndrome de Irlen trata-se de um distúrbio visuoperceptual que afeta cerca de 10 a 14% da população mundial, e é responsável por muitos casos de
9
dificuldades de aprendizagem. A pesquisa permite afirmar que é indispensável o trabalho multidisciplinar junto aos alunos que são diagnosticados com a síndrome de Irlen, sendo necessário que cada profissional, das áreas da saúde e da educação, atue com suas próprias estratégias e perspectivas específicas como complementares no tratamento dado ao aluno afetado pela síndrome. Desejamos a todos(as) uma boa leitura! Lavínia Rosa Rodrigues – Editora Professora da Faculdade de Educação - UEMG
10
A corporeidade da criança na Educação Infantil Vânia Cristina Regufe Teixeira1 Luiz Felix Ribeiro2 Liliana Borges3 Resumo Este artigo discorre sobre a corporeidade da criança e os espaços/tempos de uma escola infantil, a partir do resultado de uma pesquisa de campo realizada em uma escola de educação infantil da rede particular de ensino de Belo Horizonte. O objetivo foi investigar a r elação entre a corporeidade da criança e os espaços/tempos de uma escola infantil. Foram observadas quatro salas de aula, compostas por crianças de 4 meses a 5 anos de idade. De acordo como observado, em relação ao corpo da criança e à constituição dos diferentes espaços, percebemos que esses eram organizados para serem ocupados de maneira a estabelecer a rotina escolar. Dentro de cada espaço, existiam regras de comportamento específicas que, na maioria das vezes, consistiam em ficar o mais quieto possível, assentado ou um atrás do outro, dificultando, assim, o movimento que ficava restrito ao momento do parquinho. Além disso, também as brincadeiras quase sempre eram usadas para controlar o movimento das crianças. De acordo com a literatura consultada e as observações feitas in loco, percebemos a urgência de repensar a educação infantil enquanto espaço de desenvolvimento pleno da corporeidade do sujeito autônomo. Palavras-chave: Educação Infantil, rotina escolar, corporeidade
Corporeality in early childhood education Abstract This article discusses the child’s corporeality and the spaces/times of an infantile school, from a field research conducted in an early childhood education school from the Belo Horizonte education private network. The objective was to investigate the relationship between the child’s corporealityand the spaces/times of an infantile school.Four classrooms composed of children from 4 months old to five years old were observed.According to the observed, it was noted that, in relation to the child’sbody and the establishment of different spaces, these were arranged to be occupied in order to establish the school routine.Within each space, specific rules of behavior existed that, 1 Graduada em Pedagogia pela FaE/UEMG. 2 Graduado em Pedagogia pela FaE/UEMG. 3 Mestre em Educação pela UFMG, Professora da FaE/UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
11
Vânia Cristina Regufe Teixeira, Luiz Felix Ribeiro, Liliana Borges
for the most part, were to stand still aspossible, or seated or one behind the other,thus hindering the movement that was restricted to the time of playground.In addition, the games were also often used to control the movement of children. According to the literature and the observations made in loco, we realized the importance of rethinking early childhood education as space for full development of theautonomous subject. Keywords: Early Childhood Education, school routine,corporeality
Introdução Na educação infantil, refletir sobre o movimento é reconhecer que é,especialmente, a partir dele que a criança se relaciona com o espaço ao seu redor, atribuindo sentidos e significados às suas ações no decorrer do processo de crescimento. Nóbrega (2005) esclarece que essa é uma condição humana:[...] a corporeidade é compreendida como a condição do ser humano, sua presença corporal no mundo, um corpo vivo que cria linguagem e se expressapelo movimento, com diferentes sentidos e significados. (NÓBREGA, 2005, p.80). Segundo Polak (1997), a corporeidade é entendida: [...] como mais que a materialidade do corpo, que osomatório de suas partes; é o contido em todas as dimensões humanas; não é algo objetivo, pronto e acabado, mas processo contínuo de redefinições; é o resgate do corpo, é o deixar ferir, falar, viver, escutar, permitir ao corpo ser o ator, é o existir, é a minha, a sua, é a nossa história (POLAK, 1997, p.37).
Outros autores não trazem a definição clara do que entendem por corporeidade, mas dialogam com o termo. Pesquisas, como as de Vaz (2005), Carvalho (2006) e Camargo (2007), demonstram que deve existir uma preocupação para que o ambiente da educação infantil não seja um espaço que enquadre as crianças dentro de normas rígidas que visam a moldá-las com a limitação dos movimentos corporais. Na mesma perspectiva, e de acordo com as legislações vigentes, a educação infantil constitui-se em um espaço educacional que não tem o compromisso com a aprendizagem formal, mas deve seguir as orientações que constam no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil4, que 4 Documento do Ministério da Educação e Cultura (MEC), que se constitui em um conjunto de referências e orientações pedagógicasque visam a contribuir com a implementação de práticas educativas de qualidade que possam promover e ampliar as condições necessárias para o exercício
12
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
A corporeidade da criança na Educação Infantil
define como objetivo fundamental dessa modalidade de ensino a construção da autonomia e a socialização da criança dezero a seis anos (BRASIL, 1998). Diante disso, essa pesquisa teve como objetivo investigar a maneira comoos professores lidam com a corporeidade das criança sem uma escola de educação infantil, enfatizando como são organizados os espaços físicos, como os professores exercem suas práticas pedagógicas em relação ao movimento e como essas práticas interferem na construção do sujeito-criança.Trata-se de uma pesquisa qualitativa5, em uma perspectiva etnográfica, realizada em uma escola de educação infantil da rede particular de Belo Horizonte/MG, aqui denominada de “Jardim de Infância”6, localizada no bairro Sagrada Família, e que atende a quarenta e cincoalunos, sendo uma sala do berçário (4 meses a 2 anos) com seis alunos, três salas da educação infantil, com dez alunos cada, e uma sala do ensino fundamental com nove alunos. Os dados coletados foram registrados em um caderno de campo durante o período de realização do estágio supervisionado, requisito obrigatório para a conclusão do Ciclo de Formação Complementar – Docência na Educação Infantil, ofertado pela Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais, em um período de 20 dias letivos consecutivos, de 26 de março a 03 de maio de 2010, perfazendo um total de 100 horas/aula. Os dados foram organizados, observando-se os espaços e tempos em que o movimento ganhava destaque dentro da rotina escolar. Em um primeiro relato, serão apresentadas a organização dos espaços físicos da instituição e as possibilidades de movimento nos mesmos. Em seguida, como os espaços eram utilizados dentro da rotina, o que era permitido e proibido em cada lugar e como as crianças os ocupavam, por vezes, dando um novo significado ao mesmo. Por último, uma análise de como da cidadania das crianças brasileiras. Sua função é contribuir com as políticas e programas de educaçãoinfantil, socializando informações, discussões e pesquisas, subsidiando o trabalho educativo de técnicos, professores e demais profissionais da educação infantil. 5 O estudo foi desenvolvido diante da realidade, não possuindo um planejamento ou um projeto anterior à prática, sendo construído junto com os participantes (objeto da pesquisa), conforme sugerem Lakatos e Marconi(1991). 6 Nome fictício, utilizado neste trabalho, a fim de manter o anonimato da escola investigada Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
13
Vânia Cristina Regufe Teixeira, Luiz Felix Ribeiro, Liliana Borges
as brincadeiras eram propostas dentro rotina da escola. Os referenciais teóricos utilizados priorizaram as discussões sobre a disciplinarização do corpo nas instituições modernas e as relaçõesde poder, tendo Foucault (2005) como teórico norteador das análises.
O controle do movimento na Educação Infantil Segundo Foucault (2005),os ambientes não sãoapenasespaços ocasionais onde as pessoas permanecem, mas também são pensados e projetados para exercerfunções específicas. Nesse sentido, refletirsobre os espaços educativos implica discutir em que medida somos educados por tudo o que nos rodeia:pela arquitetura das construções, pelos espaços destinados às práticas corporais e pelas formas específicas de educação. Sendo assim, podemos ponderar que o enquadramento do corpo acontece em todo momento, ultrapassando a prática pedagógica do professor, pois ela éreflexo da maneira como os espaços são constituídos, como o tempo é organizado e também dos tipos de relações que podem ser estabelecidas em cada ambiente (SOARES, 2006). De acordo com Ratto, citado por Carvalho (2006, p. 11), a rotina escolar é estabelecida como estratégia para disciplinar os corpose ordenar os movimentos. Dessa maneira, dentro do universo escolar, “o tempo cronológico, que estabelece o horário das brincadeiras, regulamenta o início e o final das propostas e o espaço físico estabelece os limites de dentro e fora (sala de aula/pátio/praça),os deslocamentos das crianças, a disposição dos brinquedos”. A arquitetura da escola pesquisada é similar à das várias outras visitadas nos estágios realizados durante o curso de graduação em Pedagogia, funcionando em uma casa de dois andares, adaptada para atender uma escola infantil, com os quartos preparados para receber as crianças da creche (4 meses a 2 anos) e as dos 1°, 2° e 3° períodos (3 a 5 anos).O arranjo do ambiente escolar dá a ideia da utilidade de cada espaço: o refeitório, utilizado não só pra fazer as refeições, como também para as aulas em que há projeções de vídeos; as salas de aula, para asatividades escolares; o parquinho, para brincar, sendo
14
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
A corporeidade da criança na Educação Infantil
o lugar mais espaçoso da escola; a brinquedoteca, espaço amplo com muitos brinquedos, utilizada para que as crianças brinquem em horários diferentes dos reservados ao parquinho; a biblioteca, com um acervo bastante satisfatório, usada para “contação de estórias”; por fim, os corredores como espaços de passagem, nos quais as crianças sempre andavam em fila e “sem correr”, conforme veremos adiante. Essa separação dos espaços está dentro do conceito de disciplina, mencionado por Foucault (2005), que rege o funcionamento de algumas instituições modernas como fábricas, hospitais, prisões e escolas, demonstrando que o modo de fixação dos corpos nesses espaços é similar em todas essas instituições.Sendo assim, a disciplina pode ser entendida como um modo de exercer poder que surge e se desenvolve na modernidade, incumbindo-se de distribuir os sujeitos nos espaços. Nas escolas infantis, técnicas como a formação de filas, as rodas, os cantinhos, os refeitórios ea separação dos alunos por séries são utilizadas com a intenção de conter a liberdade dos movimentos das crianças.Na escola “Jardim da Infância”, foram observados esses procedimentos de disciplinamento dos corpos:os alunos ocupavam os ambientesde acordo com a intenção do professor; em alguns locais, que só serviam como passagem, as crianças atravessavam, na maioria das vezes, ordenadamente em fila; havia alguns lugares, tais como asala da diretoria, a secretaria e o almoxarifado, aos quais as crianças não tinham acesso. No universo pesquisado, as salas de aula eram arrumadas, a cada dia, de maneira diferente, sendo adaptadas de acordo com as atividades do dia, sempre privilegiando a relação da criança com o espaço. Entretanto, os horários das atividades eram estabelecidos para que cadaturma ocupasse umlugar determinado durante um tempo pré-estabelecido, possibilitando, assim, a fixaçãode tempo para cada atividade: o momento do parquinho, da merenda, da brinquedoteca, da biblioteca e outros. O tempo em cada ambiente era organizadode forma que as turmas percorressem todos os espaços sem,no entanto, se relacionar umas com as outras.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
15
Vânia Cristina Regufe Teixeira, Luiz Felix Ribeiro, Liliana Borges
No período em que foi feita a coleta de dados, presenciamos momentos em que essa predeterminação de tempo e espaço era rompida com atividades que fugiam da rotina da escola como, por exemplo, uma excursão ao Museu dos Brinquedos e uma festa de aniversário de um dos alunos, que foi comemorada por toda a escola. Salientamos, entretanto, que até mesmo na festa de aniversário, as crianças só podiam se levantar das cadeirinhas no momento em que eram chamadas para entregar os presentes. De modo geral, então, os espaços na escola eram normatizados através dos diferentes comportamentos corporais que eram exigidos dascrianças, pelas professoras. Em certos momentos, a professora escolhia duas crianças para “pegar pela mão” e, imediatamente, as outras levantavam e formavam fila. Nesse momento, se as crianças fizessem algum tipo de “bagunça”, a professora pedia para que todas voltassem aos seus lugares e refizessem uma fila “organizada”. E assim era feito: elas assentavam, levantavam e formavam uma nova fila. Nos momentos em que a professora levava as crianças até o banheiro para lavar as mãos e escovar os dentes, as próprias crianças iam até o local onde estavam as mochilas e pegavam o seu material de uso pessoal. Então, a professora pedia: “quem for terminando de lavar as mãos e escovar os dentes, guarde seu material na mochila e se assente nos banquinhos para aguardar os coleguinhas terminarem”.Mais uma vez, os movimentos das crianças eram controlados com a finalidade de manter a ordem. O transitar pelos corredores, em fila, era um ato normal naquela instituiçãoe cabiaà criança se “enquadrar” nessa norma, havendo, assim, um constante esforço dasprofessoras para que isto acontecesse. Por vezes, quando as crianças resistiam, empurrando umas às outras e não se comportando de acordo com as normas, eram “castigadas”, como no relato acima, em que elas tiveram que voltar e fazer a fila novamente. Para Foucault (2005), a penalidade relativa a essas pequenas infrações irá permitir que, pouco a pouco, os comportamentos e atos se padronizem. Apesar dea punição fazer parte da sanção normatizadora, segundo esse mesmo autor, nãoé somente ela que atua nos corpos: a gratificação dos atos também acaba
16
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
A corporeidade da criança na Educação Infantil
assumindo e servindo-se da mesma função. Assim, na tentativa de controlar os movimentos das crianças dentro do que era permitido em cada espaço, a professora, muitas vezes, usava também a premiação quando elogiava o silêncio e o bom comportamento dos alunos.Isto nos faz refletir sobre como o sistema de punição e prêmio está relacionado com as manifestações corporais das crianças, mostrando que o corpo está sendo contido e seus movimentos controlados. Essas intervenções apresentam-se como uma tentativa de normatização das condutas, revelando para as crianças, desde muito cedo, a noção de que movimento é sinônimo de indisciplina. Em certo momento, durante a observação, a professora do 1° período, que ia para o parquinho com seus alunos, percebeu uma movimentação entre eles que se empurravam e riam achando graça em desorganizar a fila. Diante do desalinhamento da fila, a professora disse às crianças: “todos de volta à sala para que refaçam a fila em silêncio, senão hoje não iremos ao parquinho!”. É por meio desse mecanismo de controle que o corpo da criança, na educação infantil, vai se constituindo e ganhando contornos de corpo escolar, na medida em que ele é classificado como indisciplinado e que precisa aprender a esperar sentado e a andar em fila. Contudo, os momentos de empurrões na fila, as manifestações de carinho, as brincadeiras de empurra-empurra ou mesmo o não permanecer na fila apresentam-se como pontos de conflito e resistência das crianças frente ao disciplinamento, mostrando que, apesar do poder disciplinar que se dirige e age no corpo, este não acontece com passividade. A resistência dos alunos também foi observada no momento do parquinho, embora nesse ambiente as regras fossem mais flexíveis, podendo a criança ali correr, subir, pular e gritar. Não obstante, nesse espaço, as crianças continuavam a ser vigiadas pelo olhar controlador do adulto. Por outro lado, observando e refletindo sobre as atuações de controlesobre os corpos das crianças diante da dinamicidade do momento do parquinho, percebíamos o quanto era difícil uma ação diferente das utilizadas pelas professoras. Sendo assim, na maioria das vezes, o controle do movimento
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
17
Vânia Cristina Regufe Teixeira, Luiz Felix Ribeiro, Liliana Borges
da criança parecia ser a única forma que as professoras encontravam para conseguir êxito em todas as cobranças que recaem sobre elas. Além do parquinho, no contexto investigado, percebeu-se que as crianças vivenciavam uma prática cotidiana de imposição de limites em seus movimentos, o que fazia com que não parecessem ser as mesmas quando estavam na sala de aula, quietas e passivas, e quando estavam no parquinho, inquietas e ativas.Na escola “Jardim da Infância” havia momentos em que as crianças brincavam semintervenção da professora e, em outros, as brincadeiras eram orientadas. Assim, com o decorrer das observações, na busca de interpretar o que esses momentos significavam, começamos a refletir sobre a intencionalidade da professora ao permitir o movimento do corpo das crianças. Da mesma forma, com as músicas, que sempre eram cantadas pela professora no momento em queas crianças esperavam a outra turma terminar a refeição para entrar no refeitório. Ou seja, o uso da música, nesse contexto, também funcionava como uma forma de controlar os movimentos das crianças.
Considerações Finais Na análise do movimento da criança na escola “Jardim da Infância” percebeu-se que há uma organização do espaço e uma determinação normativa que tentam controlar o movimento na rotina escolar. Isto sugere estar arraigada a ideia de que movimento é sinônimo de desordem,o que legitima as tentativas de colocar o sujeito-criança dentro de um padrão escolar, desde a educação infantil. No entanto, o poder de controle sobre as crianças não as encontra de forma passiva, pois elas resistem a esse controle, como pode ser observado nos momentos em que se movimentam para sair das filas, em que se empurram mutuamente ou cochicham com os coleguinhas, quando levantam a todo o momento das cadeiras, dando as mais variadas desculpas (fazer ponta nos lápis, ir ao banheiro, conversar com coleguinhas que estão em outra mesa) ou, ainda, na hora do parquinho, quando correm e gritam, numa demonstração
18
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
A corporeidade da criança na Educação Infantil
de felicidade pelos momentos de liberdade que estão tendo a oportunidade de vivenciar. Entretanto, ficou notório o esforço das professoras para normatizar as condutas corporais das crianças, inculcando desde cedo que lugar de desordem (movimento) é só na hora do parquinho e que, nos outros espaços, a ordem deve ser mantida. Se na educação infantil não deve haverá preocupaçãocom a aprendizagemde conteúdos formais, por que então a preocupação tão grande de ensinar às crianças o controle do corpo? Dentro do nosso universo de pesquisa, até mesmo as brincadeiras foram usadas como forma de controlar o corpo, uma vez que todas tinham um caráter de movimentos controlados.Acreditamos que controlar o movimento do aluno não é a única forma dele aprender a se organizar e conviver socialmente com outras crianças, como podemos verificar no uso da fila, que nos faz refletir sobre até que ponto ela possibilita que a criança se organize ao invés de ser organizada pelo adulto. Essa prática nos alerta para o fato de que com essas atitudes os professores possam estar incentivando a heteronomia, em detrimento da autonomia. Entretanto, concordamos que a organização em fila, por exemplo, pode ser necessária em alguns momentos, como no caso da hora da entrada, pois quem chega mais cedo tem o direito de entrar primeiro. Porém, em outros momentos, a fila deixa de ser um meio para o cumprimento de direitos para exercer a função disciplinadora. De acordo com Prodócimo e Recco (2008), o uso indiscriminado da fila toma do aluno o direito de aprender a se autoorganizare rouba-lhe a possibilidade de se movimentar livremente. Não podemos negar que a organização de rotinas é necessária para exercer uma ação pedagógica, o que supõe uma intencionalidade para que a criança aprenda. Porém, na educação infantil, o foco deveria ser a criança e o cumprimento da rotina deveria atender às necessidades dela. Assim, devemos repensar uma rotina que seja flexível e permita que a criança aprenda a se organizar, sem perder o direito de movimentar-se e expressar-se com o seu corpo. Analisando as observações que fizemos na escola infantil “Jardim da Infância”
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
19
Vânia Cristina Regufe Teixeira, Luiz Felix Ribeiro, Liliana Borges
e confrontando-as com os teóricos consultados, percebemos a urgência de se repensar uma escola infantil que não seja disciplinadora de corpos, com a intenção de preparar futuros adultos disciplinados e cumpridores de regras ditadas por uma sociedade castradora. Precisamos sim, pensar uma educação infantil que prepare a criança para a autonomia, tendo a liberdade de lidar com o seu corpo. Nesse contexto, o professor da educação infantil deveráentendere respeitar a corporeidade das crianças e as mensagens que elas enviam através de seus movimentos. Dessa maneira, o professor exercerá a função complexa de mediador diante dos diferentes espaços e tempos experimentados na escola. Para tanto, será preciso contemplar, em sua prática de ensino, as múltiplas linguagens pertencentes ao universo infantil, ampliando as possibilidades de ação da criança.
Referências BRASIL. Congresso Nacional. Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394. htm>. Acesso em: 29 abr. 2010. BRASIL. Ministério da Educaçãoe do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. CAMARGO, A. M. A sala de aula e cotidiano escolar. In: CAMARGO, A. M.; MARIGUELA, M. (Orgs.). Cotidiano escolar, emergência e invenção. Piracicaba: Jacintha, 2007. CARVALHO, R. S. Educação Infantil: práticas escolares e disciplinamento dos corpos. In:REUNIÃO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓSGRADUAÇÃO E PESQUISA EM EDUCAÇÃO -ANPED, 7, 2006, Rio de Janeiro. Educação, cultura e conhecimento na contemporaneidade: desafios e compromissos na educação de crianças de 0 a 6 anos.Caxambu, janeiro, 2006.
20
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
A corporeidade da criança na Educação Infantil
FOUCAULT, M. Vigiar e punir: história da violência nas prisões.13. ed. Petrópolis: Vozes,2005. LAKATOS, E.M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de metodologia científica. 3.ed. SãoPaulo: Atlas, 1991. NÓBREGA, Terezinha Petruciada. Corporeidade e Educação Física: do corpo- objeto ao corpo-sujeito. 2.ed. Natal: Editora da UFRN, 2005. POLAK, Y.N.S. O corpo como mediador da relação homem/mundo. Texto e Contexto em Enfermagem, Florianópolis, 6(3), p. 29-43, 1997. PRODÓCIMO, E.; RECCO, K. V. Recreio escolar: uma análise qualitativa sobre aagressividade entre estudantes do ensino fundamental I.In:CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO – EDUCERE EDIÇÃO INTERNACIONAL, 8, 2008, Curitiba. Anais... Curitiba: Champagnat, 2008. SAYÃO, D. T. Corpo e movimento: alguns desafios para educação infantil. Zero a Seis, Florianópolis,n.5, jan./jul. 2002. Disponível em:<http://www.ced. ufsc.br>. Acesso em: 19 mar. 2010. SOARES, C. L. Práticas corporais: invenção de pedagogias. In: SILVA, A. M.; DAMIANI, I. A. (Orgs.). Práticas corporais: construindo outros saberes em educação física. Florianópolis: Nauemblu Ciência & Arte, 2006. VAZ, A. F. Corpos, saberes e infância: um inventário para estudos sobre a educação do corpo em ambientes educacionais de 0 a 6 anos. Revista Brasileirade Ciências do Esporte, Campinas, São Paulo, 2005.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 11-21
21
22
Propaganda e infância Elaine Alves Belchior1 Janaína Magnólia de Paula Ribeiro2 Juliana de Pinho Pinto3 Rosemeire da Silva Gomes4 Márcia Moreira Veiga5 Resumo Considerando a criança como um ser social, produto e produtora de cultura, este artigo discorre sobre os efeitos que as propagandas podem causar no desenvolvimento da criança, levando-se em consideração as mudanças na estrutura familiar e no modo de vida de uma sociedade tida como pós-moderna. A criança será situada no universo televisivo a partir de seu novo lugar no mercado capitalista: cliente que opina, exige e consome. A criança não apenas influencia os pais na hora das compras como é também uma consumidora ativa. Serão analisados os efeitos desse contato precoce com o consumo no desenvolvimento infantil, bem como a influência das propagandas nos modos de vida e de consumo das crianças. Palavras-chave: propaganda, infância, televisão
Advertisement and childhood Abstract Considering the child as a social being, product and producer of culture, this paper discusses the effects that advertisements can cause the development of the child, taking into consideration the changes in family structure and in the way of life of a society seen as postmodern. The child will be located in the television universe from his new place in the capitalist market: a customer, who opines, requires and consumes. The child not only influences the parents at the time of purchase, it is also an active consumer. The effects of this early contact with the consumption in child development and the influence of advertisements in lifestyle and consumption of children will be analyzed. Keywords: advertisement, infancy, television 1 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 2 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 3 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 4 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 5 Psicóloga Clínica e Educacional, Mestre em Educação pela UFMG. Professora da FaE/UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
23
Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
Introdução Este trabalho discorre sobre a influência que as propagandas exercem na infância. Nosso principal objetivo é analisar de que maneira os conteúdos das propagandas modificam o cotidiano e o comportamento da criança. Iniciaremos contextualizando a sociedade atual, tida como pós-moderna, para entender a lógica que hoje motiva as pessoas ao consumo exagerado, ao individualismo, ao culto do lazer e do corpo. Nesse sentido, será dada ênfase à evolução dos meios tecnológicos e ao acesso indiscriminado de crianças a todos os tipos de informações e imagens, fornecidas não apenas pela internet, mas especialmente pela televisão, um dos meios de comunicação de massa mais acessíveis à população. Para contextualizar a criança no universo televisivo, será utilizada a definição de criança de acordo com a Organização das Nações Unidas (1989) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990). Será discutida também a questão da televisão contribuir com o mercado capitalista, uma vez que, por meio dos processos de marketing, as propagandas criam no expectador o desejo de adquirir determinados produtos. Somente a partir das décadas de 70 e 80 é que a publicidade se voltou para o público infantil. Até então, as propagandas, em sua maioria, eram destinadas somente aos adultos. A criança passou, então, a ser vista como cliente que opina, exige e consome. Na lógica capitalista, a criança encontra lugar na economia como consumidora ativa, estando agora na mira da indústria do consumo. A prática consumista é típica de uma sociedade pós-moderna, que é fortemente influenciada pela publicidade. A linguagem imperativa e os demais significados implícitos nas propagandas têm apenas uma intenção: promover o consumo de produtos e serviços. No contexto de expansão do mercado infantil e do uso das propagandas, analisaremos o efeito que estas podem causar no desenvolvimento infantil, buscando identificar aspectos positivos e/ou negativos da televisão no desenvolvimento da criança.
24
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
Propaganda e infância
Contextualizando a problemática da criança frente à televisão Pode-se perceber que o modo de vida da sociedade mudou muito nos últimos tempos, especialmente após a Revolução Industrial. Segundo alguns autores, estaríamos vivendo na era pós-moderna, caracterizada por grandes avanços tecnológicos. Ferreira (2001) afirma que os mesmos surgiram simbolicamente no dia 6 de agosto de 1945, momento em que a bomba atômica explodiu em Hiroshima. O que se percebe nos dias de hoje é que o mundo e as formas de pensamento têm sido ditados pela linguagem dos meios de comunicação. Segundo Ferreira (2001, p. 36), a pós-modernidade “é também um mundo super-recriado pelos signos”. Os indivíduos passaram a se comportar de forma individualista e consumista. O seu dia-a-dia é marcado pela sedução, busca de lazer e de prazer, bens de consumo e cultivo ao corpo. Outros autores, como Giddens (1991), não compartilham desse pensamento. Acreditam que os acontecimentos da atualidade são consequências da modernidade. Esta, por sua vez, historicamente começa com a expansão marítima na descoberta das Américas pelos europeus, porém teve sua caracterização maior a partir do Iluminismo e da Revolução Industrial, nos séculos XVIII e XIX. Para os autores que defendem a tese de que há uma condição pós-moderna, o atual ambiente significa basicamente a interposição dos meios tecnológicos de comunicação na relação do homem com o mundo: Eles não nos informam sobre o mundo; eles o refazem à sua maneira, hiper- realizam o mundo, transformando-o num espetáculo. Uma reportagem a cores sobre os retirantes do Nordeste deve primeiro nos seduzir e fascinar para depois nos indignar. Caso contrário, mudamos de canal. Não reagimos fora do espetáculo. (FERREIRA, 2001, p.13).
Essa nova concepção de sociedade atua amplamente nas áreas de lazer e consumo, em detrimento do trabalho e produção tão incentivados no passado. A partir da evolução tecnológica, houve um grande movimento que proporciona uma centralidade no lar, gerando um processo de
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
25
Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
individualização. Hoje, é possível fazer compras pelo telefone (teleshopping), realizar transações bancárias (telebanking) e até estudar por meio das diversas formas de educação a distância, pois, através do computador e da televisão, é possível entrar no mundo das informações. Essa sociedade passou a operar por um sistema de espaço-tempo totalmente novo, pois, a partir da revolução tecnológica, a barreira entre eles tornou-se algo ultrapassado, ou seja, a informação na atualidade é transmitida em tempo real. De acordo com Ferreira (2001), os hábitos mudaram. Não existe mais a necessidade de sair de casa para se obter serviços, porque a realidade parece caber dentro da virtualidade de uma tela de computador ou de televisão. O isolamento produzido pela pós-modernidade está encontrando suporte na tecnologia, que facilita a “autossuficiência” de cada um, criando uma ilha cercada de indiferença. Os valores da vida e da espontaneidade passam a ser mais valorizados do que os valores supervisionados pela razão. O homem então vive em busca de emoções e sensações. As danças mais antigas comparadas com as mais modernas são um exemplo desse fato. Antigamente, o dançarino seguia normas que regulamentavam as posições; hoje, o que importa é se soltar e deixar-se levar pelo momento e pela música. Existem muitas críticas relacionadas ao uso indiscriminado dos meios de comunicação. Uma delas é a formulada por Postman, citado por Viotti (1995), que alerta para o fato de que a mídia acelera inadequadamente o desenvolvimento das crianças e jovens, fazendo com que elas se comportem como adultos. No que se refere à televisão, esse autor diz que ela não tem praticamente nenhum efeito educativo, já que a TV faz com que o telespectador perca a habilidade de imaginar e criar, vivendo num estágio de semiconsciência. A televisão surgiu em 1884 na Alemanha e, desde então, foi um dos meios de comunicação de massa que mais se expandiu no mundo, sendo acessível praticamente a todas as pessoas. Com as transformações sociais decorrentes da urbanização e industrialização, as áreas de lazer e recreação foram diminuindo; além disso, a ausência dos pais e as mudanças ocorridas na estrutura familiar - mães que trabalham, pais separados, mães e pais solteiros,
26
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
Propaganda e infância
entre outros - levaram as crianças a passar mais tempo frente à TV. Vários estudos alertam para o poder da televisão enquanto veículo de aprendizagem e de socialização, atuando como instrumento ideológico de uma sociedade altamente capitalista. De acordo com o Painel de Televisão do Ibope, o Brasil detém o primeiro lugar no ranking dos países onde as crianças ficam mais tempo diante do televisor (CAMPOS, 2008). Antes de atingir a idade adulta, muitas delas terão gasto mais tempo assistindo à televisão do que estando nas escolas ou envolvidas em qualquer outra atividade, exceto o sono. O que se pode constatar por meio dos estudos de Postman, citado por Viotti (1995), é que muitos pais não colocam nenhum tipo de restrição quanto ao tempo e à programação que os filhos veem, tampouco acompanham ou analisam criticamente com os filhos o conteúdo dos programas vistos. A televisão tornou-se praticamente um “membro” da família, predispondo a criança a pensar e agir da maneira pretendida pelos anunciantes, principalmente em relação ao consumo de brinquedos e alimentos. As propagandas levam os filhos a pressionar os pais no sentido de adquirir os objetos e principalmente os brinquedos anunciados e, quando não são atendidos, eles podem ficar frustrados e magoados, criando um sentimento indesejável nas relações familiares. Algumas vezes, mesmo a criança adquirindo o tão desejado brinquedo, ela ainda pode ficar frustrada, uma vez que, para ela, o objeto adquirido difere muito do apresentado na propaganda. Por muito tempo, a publicidade na televisão tinha como principal objetivo vender produtos, mas, hoje, percebe-se que a TV apresenta modelos de comportamento que precisam ser seguidos para que as pessoas se integrem e se sintam valorizadas socialmente. Nesse sentido, a televisão tem influenciado muito o comportamento infantil, afetando especialmente o lúdico, o jogo simbólico, seja pela incorporação de objetos na brincadeira, pela imitação de apresentadores e personagens ou, ainda, pela aquisição de comportamentos agressivos que afastam os colegas, dificultando o brincar cooperativo e social. O grande tempo que as crianças passam assistindo à TV também faz com
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
27
Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
que diminua a ocorrência de outras brincadeiras, como pular corda, jogar bolinha de gude, brincar de amarelinha e tantas outras que favorecem a socialização e o desenvolvimento das mesmas. Dessa forma, os pais precisam estar mais atentos aos hábitos dos filhos, controlar a quantidade e a qualidade dos conteúdos dos programas assistidos e analisar criticamente o que está sendo visto.
A criança no universo televisivo Para se definir a trajetória da criança no universo televisivo, faz-se necessário definir o que é criança. A Organização das Nações Unidas (1989), na Convenção sobre os Direitos da Criança, define criança como qualquer pessoa menor de 18 anos, salvo se as leis nacionais determinarem que a maioridade se atinja mais cedo. Já segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), considera-se criança o sujeito cuja faixa etária está compreendida do nascimento até os 11 anos incompletos. No universo televisivo, as empresas que medem a audiência, como o IBOPE6, o Datafolha e a MultiFocus, bem como as emissoras de televisão, consideram que a idade de quatro anos marca o início da “vida do telespectador”. A faixa etária de quatro anos tem características muito significativas, pois, nessa fase a criança tende a estar auto centrada, isto é, em movimento egocêntrico em que vê as coisas sob sua própria perspectiva e não imagina que haja outro ponto de vista, mesmo que este se faça presente. Além disso, a criança atribui significado próprio que combine com o repertório que ela possui, não por ser teimosa ou por não ter compreendido, mas porque a sua visão e a sua interpretação imperam. Nessa fase, também, a criança começa a fazer importantes distinções no mundo a sua volta, passando a perceber o mundo além do núcleo familiar, sendo ainda nesse período que se estabelecem as regras sociais e a- ventura pelo mundo externo (social). 6 Dados do Painel Nacional de Televisão do IBOPE. O Painel Nacional de Televisão (PNT) foi lançado em 1996 para atender a uma demanda do mercado que buscava a média da audiência de TV em todo Brasil para melhor planejar as campanhas publicitárias de âmbito nacional. Na medição de audiência de TV são utilizadas as seguintes faixas etárias: 04 a 07 anos; 08 a 11 anos; 12 a 17 anos; 18 a 24 anos; 25 a 34 anos; 35 a 49 anos; 50 anos ou mais. Disponível em: <http:// www.ibope.com.br>. Acesso em: 15 abr. 2010.
28
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
Propaganda e infância
Como o lúdico traz importantes representações na vida da criança, faz parte de seu cotidiano atribuir vida a seres e objetos inanimados, sendo que os desenhos animados fazem muitas vezes associações que contribuem para essa construção. A televisão utiliza determinados conhecimentos sobre o funcionamento do lúdico infantil para o sucesso de desenhos e programas infantis. Em contato com o meio social, a criança passa a ter acesso a uma série de novas informações, sendo que isto facilita a idealização de modelos e de fantasias ligadas a inúmeros fatores materiais e sociais. A televisão apresenta tantas variáveis, que a fantasia e as trocas simbólicas podem ser potencializadas. A televisão pode transformar o lúdico e o imaginário em concreto, além de reproduzir o mundo adulto em miniatura para as crianças, sendo que isto contribui para que as representações dos objetos, dos valores e do mundo transitem rapidamente do virtual para o real e vice-versa.
Conteúdo das propagandas e os efeitos dessa mídia Dado o fato de a televisão ter se tornado um veículo de comunicação de massa, a propaganda televisiva é um grande meio de interação com o público. Tem narrativa compacta e resumida que conta uma mensagem ou uma história e seduz as pessoas que assistem. A propaganda é um modo de apresentar uma informação que visa a influenciar, com fins ideológicos, políticos ou comerciais, as emoções, atitudes, opiniões e ações de um determinado público alvo: A propaganda ideológica envolve um processo complexo, com termos e fases distintas. O “emissor”, grupo que pretende promover a difusão de determinadas ideias, ao visar a outros com interesses diversos, realiza a “elaboração” de sua ideologia para que as ideias nela contidas pareçam corresponder àqueles interesses. Feito isso, procede a um trabalho de “codificação” pelo qual transforma as ideias em mensagens que atraiam a atenção e sejam facilmente compreensíveis e memorizáveis. Através do “controle ideológico”, o emissor manipula todas as formas de produção e difusão de ideias, garantindo a exclusividade na emissão das suas próprias. Procura, dessa forma, evitar a possibilidade de que os receptores venham a receber, ou mesmo produzir, outra ideologia que os oriente contra os interesses do emissor. A partir daí, as mensagens são emitidas através da “difusão”, que procura atingir o mais rapidamente possível um maior número de pessoas. (GARCIA, 1999, p.17). Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
29
Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
As propagandas utilizam-se também do conjunto de valores e desejos mais atuais de uma determinada sociedade. Apontam, com precisão, os objetos de desejo de compra do receptor, mesmo que esse objeto não seja aquilo de que ele necessita naquele momento. De acordo com Mininni (2008), as propagandas, a partir da metade do século XX, tornaram-se cada vez mais persuasivas, uma vez que utilizam pessoas que podem dar credibilidade e respeitabilidade às mesmas. Esse autor destaca algumas características das propagandas: 1. A atenção: as mensagens devem superar o limiar da relevância cognitiva para as pessoas, para que lhes possam causar transformações. 2. A compreensão e assimilação: as mensagens devem ser analisadas em suas estruturas de significado e ser rememoradas na situação pertinente. 3. O incentivo: as mensagens devem ser aceitas não apenas como válidas em sua pretensão de verdade, mas também como idôneas para alcançar seu objetivo e adequar-se aos interesses das pessoas. (MININNI, 2008, p. 76, grifo nosso).
Padrões e modelos de identificação de atitudes, valores, procedimentos e comportamentos são gerados pelos meios de comunicação. Nessa perspectiva, se estabelece a comunicação persuasiva, que precisa de portadores ditos honestos, participantes ativos, desprendidos, confiáveis e outros. A sociedade atual se baseia no consumo. As crianças e adolescentes são pressionados, desde pequenos, a comprar. Assim, Educada para o consumo, a criança constrói valores a partir de modelos que lhes são apresentados por uma sociedade que, atualmente, só valoriza aquele que tem poder de compra, assim como exclui quem não tem acesso aos bens de consumo. A criança é, desde cedo, tratada como consumidor. (OLMOS apud BOCK, 2009, p. 233).
O universo televisivo colabora com a lógica de mercado e estimula a atividade de consumo, uma vez que direciona o padrão social. Predomina, assim, a cultura do lucro em detrimento da cultura do lazer, transformando o espectador de cidadão em consumidor. Para tanto, a propaganda torna-se um
30
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
Propaganda e infância
meio de divulgação das campanhas publicitárias dirigidas às crianças, pois, de acordo com Garcia (1999), esta agrega som, imagem e movimento, o que confere um caráter real à propaganda levando a criança a se envolver com o produto e a intensificar as relações de desejo. Além disso, destaca-se o caráter persuasivo que a propaganda possui, pois as crianças, muitas vezes, passam a desejar aquilo de que nem estão precisando, mas são envolvidas de tal forma por essa mídia que querem consumir tudo o que a propaganda lhes oferece para sua faixa etária.
A criança no mundo das propagandas Segundo Filho, citado por Pacheco (1998), os processos de marketing são formados para o aumento das vendas, satisfazendo as necessidades e os desejos do consumidor e as peculiaridades do público alvo. Sendo assim, no mercado infantil, que é um dos mais importantes na comercialização de produtos no Brasil, o marketing está voltado para sensibilizar o público de até quatorze anos para alcançar fins mais eficientes de modo a convencer esse público, que é um grande potencial quantitativo de mercado. Como prova desse grande potencial quantitativo, tem-se: a inauguração, na cidade de São Paulo, em 1995, do primeiro shopping destinado totalmente às crianças – o Kids; a criação, por outro shopping paulista, do Market Place e do Fantasy Place, parque de diversões com três mil metros quadrados; o uso de carrinhos de supermercado com tamanho apropriado para crianças pelo grupo Pão de Açúcar; o uso de estratégias para atrair os pequenos consumidores pela Pizza Hut; o lançamento do primeiro iogurte para as crianças pela Danone; a decisão, por parte das empresas de vestuário e calçados, de investir mais nos produtos mirins; o investimento, por parte das empresas de brinquedos, no binômio brinquedoinformática, elegendo produtos dedicados às crianças de até três anos. Filho, citado por Pacheco (1998), também alega que a televisão é o meio de comunicação mais preferido pelas crianças. Esse fato nos leva a questionar se o problema é realmente a televisão ou a sociedade que a valoriza exageradamente. Os programas mais assistidos pelas crianças não são os infantis. Isso tem feito com que os publicitários comecem a analisar se o
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
31
Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
melhor horário para a veiculação de anúncios para o público infantil seja realmente o diurno. Para as crianças, tanto a TV como as mensagens publicitárias servem como meios de diversão e distração. As crianças valorizam mais a mensagem que o produto em si; elas gostam de comerciais alegres, com ideias simples e claras. A propaganda mistura apelos lógicos e emocionais, informação e argumentação, medo e inveja, fascínio pelo novo e necessidade de segurança. Além de muitos outros elementos, ela tenta causar nos consumidores, através da persuasão, comportamentos que favoreçam o anunciante que a utiliza. Segundo o mesmo autor, citado por Pacheco (1998), a agressividade que as empresas têm investido para conquistar o público mirim e os efeitos publicitários gerados na sociedade têm sido motivo de preocupação. Dessa forma, o Código de Auto-Regulamentação Publicitária (CONAR) e alguns dispositivos legais no país contêm normas para proteger as crianças, mas muitas decisões ainda precisam ser tomadas para a solução dessa situação. De acordo com Filho, o CONAR contém dispositivos como: No anúncio dirigido à criança e ao jovem: dar-se-á sempre atenção especial às características psicológicas da audiência-alvo; respeitarse-á especialmente a ingenuidade e a credulidade, a inexperiência e o sentimento de lealdade dos menores; não se ofenderá moralmente o menor; não se admitirá que o anúncio torne implícita uma inferioridade do menor, caso este não consuma o produto oferecido; não se permitirá que a influência do menor, estimulada pelo anúncio, leve-o a constranger seus responsáveis, ou importunar terceiros, ou o arraste a uma posição socialmente condenável; o uso de menores em anúncios obedecerá sempre a cuidados especiais que evitem distorções psicológicas nos modelos e impeçam a promoção de comportamentos socialmente condenáveis. Qualquer situação publicitária que envolva a presença de menores deve ter a segurança como primeira preocupação e as boas maneiras como segunda preocupação. (FILHO apud PACHECO, 1998, p.142-143).
Para Filho, citado por Pacheco (1998), a criança tem sido mais valorizada e tem conseguido mais liberdade de decisão nas últimas décadas. Além disso, a utilização das crianças em anúncios para adultos tem se tornado comum, pois, para os publicitários, os apelos se tornam mais eficientes e emocionais, o
32
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
Propaganda e infância
que causa impacto. Ainda segundo esse autor, esses anúncios têm sido lesivos ao público infantil, principalmente aos de idade inferior, uma vez que, para eles, tudo é novidade, é encantador. Há uma relação direta entre o que é mostrado no vídeo e certos distúrbios infantis, como: as crianças tendem a adquirir os mesmos hábitos mostrados no vídeo; tendem a apresentar mais ansiedade quando desejam algum produto; desenvolvem vontade por adquirir produtos sem refletir sobre a sua real necessidade. Entretanto, não se deve criticar só a atuação publicitária, mas também a maneira como os próprios meios de comunicação estão elaborando as programações que atingem as crianças, fazendo com que elas queiram consumir o que está exposto nos programas de televisão.
A influência da televisão na formação das crianças A importância da televisão na formação de crianças e adolescente não se situa mais no campo da mera suposição, sendo tema de inúmeros trabalhos, pesquisas e estudos. Controvérsias existem, mas não se pode ignorar que a mídia eletrônica tem, por força e poder da imagem, a capacidade de inculcar ideias, modas, tendências, pensamentos, valores e atitudes. De acordo com Zagury (2004), a televisão, por si só, não pode ser definida como boa ou má, mas o teor de seu conteúdo pode determinar essa condição. A violência e a desestruturação social e familiar crescentes na sociedade não podem ser atribuídas unicamente à mídia televisiva, mas não se pode negar o impacto da televisão no cotidiano da população. Estudos mostram a relação social entre o nível socioeconômico e o número de horas de exposição à TV, demonstrando que crianças com menor poder aquisitivo têm na televisão muitas vezes a única forma de diversão. A qualidade e o conteúdo do programa podem definir os benefícios e os malefícios possíveis de se desenvolverem através de propagandas, novelas e programas de televisão. Entre os malefícios podem ser citados: sedentarismo, obesidade, falta de moderação alimentar, redução de contatos interpessoais, redução de tempo de sono, redução de tempo de estudo, redução de comunicação
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
33
Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
interfamiliar. Infelizmente, existem consequências ainda mais graves ao se analisar profundamente o conteúdo dos comerciais: correlação com o uso do tabaco, início precoce da vida sexual, aumento da violência, apresentação estereotipada de mulheres, idosos, homossexuais, e minorias de forma geral, estímulos exacerbados de consumo, valor vinculado ao ter, além de formas ilícitas de adquirir bens materiais, fama e poder. Não obstante, a televisão pode, por meio de bons programas direcionados ao público infantil, tornar-se fonte de crescimento intelectual e pessoal. Entre as potencialidades que podem ser desenvolvidas destacam-se: aumento das habilidades cognitivas, incremento de conhecimentos acadêmicos com o enriquecimento de áreas como história, artes, música, literatura, etc., inserção de temas de interesse público, discussão de temas e questões sociais e políticas que desenvolvem o pensamento crítico e divergente, aumento da conscientização sobre diversos assuntos em diferentes enfoques. Podemos dizer que o mal ou o bem, que a mídia televisiva acarreta, deriva da qualidade e do conteúdo dos programas, mas não apenas disso. Um dos maiores problemas reside no fato de que as crianças ficam expostas a essa mídia sem supervisão e orientação, e isto as impede de ter uma visão analítica e crítica que as auxilie a pensar e analisar aquilo a que assistem.
Considerações finais A nova estrutura familiar do mundo pós-moderno possibilita um maior contato das crianças com o universo televiso. Esse contato traz uma série de novas informações que influenciam as crianças a reproduzir várias atitudes dos personagens de desenhos, filmes e propagandas. O universo televisivo, por meio das sutilezas existentes na programação, atua como agente modelador, pois estimula a atividade de consumo, direciona padrões sociais e comportamentais. Os apelos utilizados pela mídia, fazendo com que predomine a cultura do lucro em detrimento da cultura do lazer, influenciam e modificam as formas de pensar e agir de crianças e jovens, transformando o cidadão em voraz consumidor.
34
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
Propaganda e infância
A criança, na lógica capitalista e consumista, torna-se um cliente. Ocorre, então, uma expansão do mercado infantil. Os meios de comunicação, que ditam as formas de pensamento do mundo moderno, possuem tecnologias cada vez mais avançadas para tentar manter a hegemonia do mundo capitalista, em que o consumismo é a base de manutenção desse sistema. A televisão reproduz o mundo adulto para as crianças, além de transformar o lúdico e o imaginário em concreto. Padrões, modelos de atitudes e valores são gerados pelos meios de comunicação. Assim, o universo televisivo direciona o padrão social. A propaganda interage com o público através de uma narrativa compacta que seduz as pessoas. As crianças são influenciadas pelas propagandas televisas, que são persuasivas através de sons, imagens e movimentos que condicionam a infância para o consumo. A escola deve dialogar com o cotidiano do educando para mediar e auxiliar as construções e leituras de mundo que possam vir a ser feitas através da informação que recebe todos os dias. Discutir os temas e mensagens transmitidos pela mídia televisiva e ajudar na percepção dos aspectos positivos e negativos das abordagens de cada assunto deve fazer parte da prática do educador. Essa atitude auxilia na formação de mentes críticas, capazes de verificar e não aceitar tudo o que lhes é oferecido, fator relevante na construção de cidadãos transformadores e conscientes.
Referências BOCK, Ana Mercês Bahia (Org.). Mídia e psicologia: produção de subjetividade e coletividade. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2009. BRASIL. Lei n. 8069 de 13 de julho de 1990. Contém o Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L8069.htm>. Acesso em: 12 maio 2010. CAMPOS, Bruna Sawa. Crianças e consumo, uma relação delicada. 2008. Disponível em:<http://www.peabirus.com.br/redes/form/post?pub_ id=7202>. Acesso em: 12 abr. 2010.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
35
Elaine Alves Belchior, Janaína Magnólia de Paula Ribeiro, Juliana de Pinho Pinto, Rosemeire da Silva Gomes, Márcia Moreira Veiga
FERREIRA, Jair. O que é pós-moderno. São Paulo: Brasiliense, 2001. GARCIA, Nélson Jahr. Propaganda: ideologia e manipulação. Brasil: Rocket Edition,1999. GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: UNESP, 1991. MININNI, Guiseppe. Psicologia, cultura da mídia. São Paulo: Edições SESC, 2008. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Direitos humanos e serviço social: manual para escolas e profissionais de serviço social, 1989. Disponível em:<http:// www.gddc.pt/direitoshumanos/temas-dh/pdfs/HRSocialWorkscannado.pdf >. Acesso em: 12 maio 2010. PACHECO, Elza Dias (Org). Televisão, criança, imaginário e educação. Campinas: Papirus,1998. VIOTTI, Frederico Romani. Origem e fundamentos da mística pós-moderna. 1995. Dissertação (Mestrado em Ciências Políticas) - Universidade de Brasília, Brasília. Disponível em: <http://www.angelfire.com/id/viotti>. Acesso em: 15 nov. 2010. ZAGURY, Tânia. Os direitos dos pais: construindo cidadãos em tempos de crise. Rio de Janeiro: Record, 2004.
36
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 23-36
A coordenação da Educação Infantil no município de Belo Horizonte1 Michele Cristina Pereira dos Santos1 Maria Odília Figueiredo De Simoni2 Resumo Este artigo apresenta um estudo sobre a atuação do Coordenador Pedagógico da Educação Infantil em Belo Horizonte. O objetivo foi investigar a atuação desse profissional, inventariando as dificuldades que ele encontra ao exercer suas atribuições. A metodologia utilizada foi pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo. Foram estudados autores que abordam a temática da Educação Infantil e do Coordenador Pedagógico, e documentos e leis sobre essa etapa de ensino. Na pesquisa de campo, optou-se por coletar dados em Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEI’s), da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte. Foram entrevistadas quatro Coordenadoras Pedagógicas, em exercício, em três Unidades de diferentes regiões da cidade de Belo Horizonte. Palavras-chave: Educação Infantil, coordenador pedagógico, atuação do coordenador pedagógico
Pedagogical coordination in childhood education in the municipality of Belo Horizonte Abstract This article presents a study on the performance of the pedagogical coordinator of the early childhood education in Belo Horizonte. The objective was to investigate the performance of this professional, inventorying the difficulties he encounters in the exercise of his function. The methodology used was bibliographic research and field research. Authors who examine the themes of early childhood education and pedagogical coordinator were studied, and were also studied documents and laws relating to this stage of education. In the field research, it was decided to collect data in Municipal Units for Early Childhood Education (UMEI’s) of Belo Horizonte Public School System. Four pedagogical coordinators in exercise in three Units from different regions of Belo Horizonte were interviewed. 1 Este texto é parte da monografia, que apresentei como trabalho de conclusão de graduação em pedagogia na Faculdade de Educação da UEMG, em julho de 2010, com o título “Passado e presente da Educação Infantil brasileira: análise da atuação do Coordenador Pedagógico em UMEI’s de Belo Horizonte”, orientada pela Profa. Maria Odília Figueiredo De Simoni. 2 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 3 Pedagoga, Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ. Professora da FaE/UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
37
Michele Cristina Pereira dos Santos, Maria Odília Figueiredo De Simoni
Keywords: Early Childhood Education, pedagogical coordinator, performance of the pedagogical coordinator
Introdução O presente artigo apresenta a atuação do Coordenador Pedagógico da Educação Infantil em Belo Horizonte. A metodologia utilizada foi de caráter qualitativo quanto à abordagem, adotando-se como procedimentos técnicos a pesquisa bibliográfica feita com base em autores, documentos e leis que abordam a Educação Infantil e a pesquisa de campo, envolvendo a realização de entrevistas com os Coordenadores Pedagogicos de três Unidades Municipais de Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte (UMEI’s), durante o mês de março de 2010, localizadas em regiões diferentes do município. A primeira instituição, localizada na região do Barreiro, é designada UMEI A; a coordenadora pedagógica entrevistada é designada CP‘A’ (Coordenadora Pedagógica ‘A’). Formada em Letras pela UNICOR – Betim, trabalha há cinco anos na UMEI A e exerce a função de coordenadora desde fevereiro de 2009. A segunda instituição, situada na região leste de Belo Horizonte, é designada UMEI B, e a coordenadora designada CP‘B’ (Coordenadora Pedagógica ‘B’). Também formada em Letras, trabalha na UMEI B há cinco anos e exerce a coordenação pedagógica desde junho de 2009. A terceira instituição, situada na região oeste, é designada UMEI C. Nessa foram entrevistadas duas coordenadoras, identificadas como CP‘C1’(Coordenadora Pedagógica ‘C1’) e CP‘C2’ (Coordenadora Pedagógica ‘C2’). A CP‘C1’ é formada em Pedagogia pelo Unicentro Newton Paiva e pós-graduada em Psicopedagogia pelo CEPEMG e está na coordenação há quatro anos; a CP‘C2’ é formada em Pedagogia pela Universidade do Norte do Paraná e pós-graduanda em Educação Infantil pela UFMG; é coordenadora na UMEI há três anos.
O coordenador pedagógico no município de Belo Horizonte O Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa (XIMENES, 2000, p. 256) define a palavra coordenar como “dispor segundo certa ordem e método;
38
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
A coordenação da Educação Infantil no município de Belo Horizonte
organizar”, o que permite dizer que o ato de coordenar está atrelado ao de organizar, sem que se possa definir exatamente o que realmente é coordenar um trabalho. Dessa forma, buscando compreender o que possa ser a função de coordenador e a relevância do seu trabalho, parte-se de uma análise sobre o que vem a ser o trabalho do coordenador pedagógico que atua na Educação Infantil do município de Belo Horizonte. Ao analisar os significados da palavra coordenar, Souza (2008) argumenta que, Essas definições relativas ao significado da palavra coordenar, embora aparentemente simples, possibilitam-nos depreender alguns significados explícitos do ato de coordenar: só há necessidade de coordenar quando temos mais de um elemento, seja material ou humano. Assim, no caso do coordenador pedagógico, ele estará permanentemente em relação com grupos. Logo, pode-se dizer que o ato de coordenar implica, necessariamente, lidar com grupos (SOUZA, 2008, p. 94).
Portanto, faz parte do cotidiano do coordenador pedagógico lidar com grupos diversificados, que envolvem desde a Secretaria de Educação até a comunidade local, incluindo diretoria, professores, pais, alunos, funcionários técnico-administrativos e de serviços gerais. Pode-se dizer que a coordenação pedagógica de estabelecimentos de Educação Infantil exerce influência para o desenvolvimento do trabalho ali realizado. Além disso, a visão dessas instituições, não apenas como ambientes de funções assistencialistas, mas também educativas, salienta a importância de formas eficazes de estruturação do seu trabalho. Sobre a coordenação de creches comunitárias no município de Belo Horizonte, Silva (1997) afirma que: Embora muitas das dificuldades vivenciadas pelas creches sejam geradas pela falta de recursos financeiros para a manutenção do trabalho, bem como para a contratação de um quadro mais estável de educadoras, acreditamos que algumas questões possam ser melhor equacionadas através de um bom planejamento interno e com a definição clara do trabalho a ser desenvolvido pelos membros da equipe. A coordenação de uma creche pode desempenhar um papel muito importante neste sentido, junto com o grupo, proporcionando condições mais satisfatórias de um funcionamento institucional (SILVA, 1997, p. 67-68). Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
39
Michele Cristina Pereira dos Santos, Maria Odília Figueiredo De Simoni
Pode-se, então, dizer que a coordenação pedagógica das instituições de Educação Infantil tem relevância na organização, no desenvolvimento do trabalho e no planejamento das atividades em equipe realizadas nessas instituições. Além disso, o coordenador pedagógico é o profissional responsável pela formação em serviço dos demais profissionais da escola, sobretudo dos professores. Com relação a esse aspecto, Almeida e Placco (2008) assim se expressam: O trabalho do coordenador pedagógico é fundamentalmente um trabalho de formação continuada em serviço: favorecer a tomada de consciência dos professores sobre suas ações e o conhecimento sobre o meio em que atuam e assim promover o desenvolvimento profissional dos professores. (ALMEIDA; PLACCO, 2008, p.25).
Concordam com essa afirmativa as coordenadoras da UMEI C, quando relatam que “um dos nossos maiores desafios é a realização de atividades de formação com os profissionais em exercício, pois as demandas diárias encurtam o tempo”. Outro ponto a ser observado, como se depreende do relato acima, diz respeito às exigências do trabalho de coordenação e à intensidade do mesmo. Conforme Silva (1997), Reconhecemos que as exigências para o trabalho de coordenação são múltiplas. Além da orientação do projeto educativo e dos aspectos administrativos relacionados à prestação de contas aos órgãos públicos e organizações não governamentais que contribuem com recursos financeiros para o trabalho, a coordenação vê-se imersa em um grande número de demandas que surgem de todos os lados: da diretoria, da equipe de educadores, das famílias, da comunidade, das instituições de assessoria, das instituições de financiamento, dentre outras. (SILVA, 1997, p. 68-69).
Percebe-se, portanto, que as atividades desenvolvidas pela coordenação em instituições de Educação Infantil são muitas. Daí a relevância da sintonia e harmonização entre o coordenador e os demais funcionários da escola, sobretudo professores, importantes para o andamento do trabalho.
40
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
A coordenação da Educação Infantil no município de Belo Horizonte
Voltando à origem da palavra, descobrimos que coordenar significa ordenar junto/com o outro. Em nosso caso específico, precisamos estar atentos à função social da creche para podermos clarear o papel e as atribuições daquele que coordena o trabalho, ou seja, daquele que organiza o trabalho institucional, levando em consideração todos os sujeitos envolvidos no processo (SILVA, 1997, p. 73).
Espera-se, assim, que a coordenação reconheça e valorize o trabalho feito pelos membros da equipe, pois a atuação de cada um pode contribuir para o desempenho da coordenação pedagógica. Além disso, a integração e a comunicação na equipe é que podem ajudar na adoção de medidas inovadoras para as instituições a partir do trabalho do coordenador: Só quando existe uma real comunicação e integração entre os atores do processo educativo há possibilidades de emergência de uma nova prática docente, na qual movimentos de consciência e de compromisso se instalam e se ampliam ao lado de uma nova forma de gestão e uma nova prática docente (ALMEIDA; PLACCO, 2008, p.53).
Nas entrevistas realizadas, nota-se que a relação entre o grupo pode ser um fator importante que contribui com o trabalho do coordenador, porque juntos eles planejam um propósito ou uma ação de melhoria/mudança. Segundo a coordenadora da UMEI B, A relação do grupo é o fator mais importante que contribui com meu trabalho, porque estamos juntas para construir um propósito; então, as professoras me ajudam muito, ninguém fica martelando sobre o que devo fazer, na verdade é uma construção em equipe (CP ‘B’)
Segundo Souza (2008), porém, [...] não é possível esperar que todos pensem igual, que passem a ter a mesma crença do grupo da escola, de que concordem e desenvolvam as mesmas praticas em sala de aula. Cada professor é único, com experiências sui generis, com crenças e valores que o constituem, e é com essa identidade que desenvolverá sua ação pedagógica (SOUZA, 2008, p. 98-99).
A coordenação dessa etapa da Educação Básica pode enfrentar também Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
41
Michele Cristina Pereira dos Santos, Maria Odília Figueiredo De Simoni
outras dificuldades, como a falta de experiência na função. De acordo com Silva (1997), Deve-se considerar ainda que, ao assumir o cargo de coordenação, a educadora responsável nem sempre conta com experiências anteriores de desempenho dessa função, nem com uma orientação para estruturar e organizar seu trabalho Silva (1997, p.69).
Acresce-se ainda à coordenação de instituições de Educação Infantil a amplitude de suas atribuições. Entre essas atribuições podem-se destacar, de acordo com o documento Estruturação do trabalho escolar na RME, da Secretaria Municipal de Educação do Município de Belo Horizonte, as seguintes: [...] desenvolver suas funções realizando o trabalho de acordo com as diretrizes estabelecidas pela SMED (Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte); zelar pelo atendimento de qualidade às crianças atendidas, garantindo a indissociabilidade das ações de cuidados e educação; apresentar e discutir com as famílias as questões referentes aos aspectos pedagógicos e de desenvolvimento dos alunos. (BELO HORIZONTE, 2006).
Percebe-se, na fala das coordenadoras entrevistadas, que o excesso de atividades e a escassez de tempo se constituem como significativos empecilhos no trabalho de formação continuada dos profissionais em exercício. Duas coordenadoras, formadas em Letras, ponderam que a sua formação acadêmica também não contribuiu para a realização do seu trabalho. A coordenadora da UMEI B afirmou que: Minha formação não me ajudou praticamente em nada! A formação de Letras me deu subsídios para trabalhar na área de Língua Portuguesa dentro da sala de aula. Em termos de organização, o curso não auxiliou. Eu estou pesquisando, conversando com outros coordenadores para aprender a prática tentando mediar as situações para dar um suporte ao grupo (CP ‘B’).
Enquanto que a coordenadora da UMEI A se posicionou da seguinte forma, A minha formação específica não contribuiu para a minha atuação na coordenação. Mas o currículo do meu curso contou com algumas
42
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
A coordenação da Educação Infantil no município de Belo Horizonte
questões dentro da didática, que estão dentro da área educacional; portanto, algumas disciplinas vieram a contemplar dentro do contexto da instituição escolar, mas a minha formação específica não (CP ‘A’).
Em relação à rotina diária do coordenador pedagógico, pode-se dizer que, na maioria das vezes, ele foge das suas reais atribuições, o que pode levar até mesmo a frustrações no que se refere a essa função: O cotidiano do coordenador pedagógico ou pedagógico-educacional é marcado por experiências e eventos que o levam, com frequência, a uma atuação desordenada, ansiosa, imediatista e reacional, às vezes até frenética [...]. Nesse contexto, suas intencionalidades e seus propósitos são frustrados e suas circunstâncias o fazem responder à situação do momento, “apagando incêndios” em vez de construir e reconstruir esse cotidiano, com vistas à construção coletiva do projeto político pedagógico da escola (ALMEIDA; PLACCO, 2008, p.24).
Nesse contexto, tem-se um coordenador pedagógico que, ao mesmo tempo em que espera poder cumprir com o seu trabalho de acordo com suas atribuições, tem que lidar com situações inesperadas que podem ocorrer no seu cotidiano. Situações que, algumas vezes, terão, como possíveis soluções, alternativas muito além do cotidiano escolar, da experiência e da formação desses profissionais. Nesse sentido, pode-se dizer que o trabalho da coordenação está atrelado às decisões estabelecidas pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, a qual, além de estar direcionando esse trabalho para garantir atendimento de qualidade às crianças pequenas, propõe para as instituições de Educação Infantil o estabelecimento de uma parceria entre família e escola. Além disso, o trabalho da coordenação pedagógica é de extrema relevância para que uma ação coletiva seja feita na escola. Para tanto, a escolha do coordenador pedagógico, que acontece por meio de votação, é um fator importante para o bom desempenho das ações nas instituições de Educação Infantil. O coordenador de UMEI é um professor que, geralmente, já está há algum tempo trabalhando na instituição. A sua escolha ocorre através de votação feita Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
43
Michele Cristina Pereira dos Santos, Maria Odília Figueiredo De Simoni
pelo grupo de professores. Conforme o documento Estruturação do trabalho escolar na RME, são exigidas desse profissional algumas características específicas para o exercício da função: Ser um bom ouvinte e implicar o coletivo no encaminhamento das proposições pedagógicas e de gestão escolar; ser um bom mediador, produzir bem em equipe, distribuir tarefas, ter habilidade de escutar o grupo e conciliar opiniões divergentes e convergentes apontando caminhos, apresentando propostas, aceitando opiniões, acompanhando ações, avaliando conjuntamente, registrando o processo e produtos finais, convidando o grupo a revisitar os registros; argumentar, enfrentar situações de conflito, mostrando disponibilidade para mudanças e situações novas; ter habilidade para planejar e articular o trabalho desenvolvido dentro e fora da escola proporcionando a integração com outros espaços socioculturais e promovendo a relação escola/comunidade; investir na própria formação e visualizar as necessidades de formação de seu grupo de trabalho. (BELO HORIZONTE, 2006).
Assim, pode-se dizer que a função de coordenador pedagógico não é apenas fundamental para o desenvolvimento da instituição, como também é complexa por exigir do profissional que a exerça com um denso conjunto de habilidades.
Considerações finais Durante a pesquisa, percebemos que a tarefa do Coordenador Pedagógico é altamente complexa, repleta de permanentes contradições e conflitos. Esperase que o coordenador tenha conhecimento profundo da comunidade escolar e da instituição em que trabalha, para selecionar o que contribui para aumentar ou minimizar os conflitos na escola e para poder, junto com o grupo, chegar a soluções que permitam o crescimento de todos os envolvidos no processo educativo. Foi possível perceber também que os atuais coordenadores pedagógicos da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte, com raras exceções, tiveram certa formação para exercer tal função, uma vez que se formaram professores em diversas áreas do conhecimento, participaram de uma eleição dentro da escola e encontram-se submersos nas urgências do cotidiano da escola.
44
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
A coordenação da Educação Infantil no município de Belo Horizonte
Os coordenadores percebem a necessidade de trabalhar de forma coletiva, de priorizar a organização e o planejamento do trabalho e, ainda, de investir na formação continuada dos professores e dos demais profissionais da escola. Na maioria das vezes, porém, devido à escassez de tempo e à falta de uma formação específica para o exercício da função, o trabalho se concentra no atendimento das demandas da direção da escola. As coordenadoras pedagógicas afirmaram que uma das maiores dificuldades enfrentadas é a formação continuada dos professores. Pois, embora reconheçam que um trabalho de capacitação docente deva ser planejado e realizado de forma gradual, contínua e persistente, admitem não ter condições administrativas para tal fim, devido à escassez de tempo para a sua realização. Algumas coordenadoras também afirmaram que sua formação não possibilitou o conhecimento de muitos teóricos educacionais, o que lhes dificulta assessorar os professores quanto aos métodos e técnicas de ensino adequados para as várias situações de ensino-aprendizagem. Pode-se perceber que a formação em Pedagogia auxilia no desenvolvimento das atividades do coordenador pedagógico, pois possibilita ao profissional não só o domínio de métodos e técnicas de ensino, como também a gestão de todos os processos educativos. Devemos considerar também que, muitas vezes, o coordenador não tem experiências anteriores nessa função, pois geralmente ele é um professor da própria UMEI que foi eleito, sem nenhuma orientação prévia quanto à estruturação e organização do seu trabalho. Por isto, muitas dessas profissionais podem se sentir incapazes de realizar todas as suas funções, o que pode levar à vulnerabilidade perante o grupo. Esperamos que esse trabalho tenha contribuído para o conhecimento de algumas funções e desafios enfrentados pelos coordenadores pedagógicos. Almejamos também que instigue novas pesquisas em torno desse profissional tão importante dentro da escola, mas ainda pouco referenciado pelas pesquisas educacionais.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
45
Michele Cristina Pereira dos Santos, Maria Odília Figueiredo De Simoni
Referências ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (Orgs.). O coordenador pedagógico e o cotidiano da escola. 5. ed. São Paulo: Loyola, 2008. BELO HORIZONTE. Secretaria Municipal de Educação. Estruturação do trabalho escolar na RME: a organização do trabalho coletivo por ciclos de formação. Belo Horizonte, 2006. SILVA, Isa T. F. Rodrigues. Coordenação administrativa e pedagógica: um desafio para as creches comunitárias. In: SILVA, Isa T. F Rodrigues (Org). Creches comunitárias: histórias e cotidiano. Belo Horizonte: AMEPPE, 1997. SOUZA, Vera Lúcia Trevisan de. O coordenador pedagógico e o atendimento à diversidade. In: ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (Orgs.). O coordenador pedagógico e o cotidiano da escola. 5. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2008. XIMENES, Sérgio. Minidicionário Ediouro da Língua Portuguesa. 2. ed. São Paulo: Ediouro, 2000.
46
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 37-46
Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos Adriana Vieira da Silva1 Ana Paula de Almeida Gonçalves2 Elizabeth Seabra Resende3 Luciana Alves de Araújo4 Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio5 Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França6 Resumo Este artigo pretende discutir a relação entre o trabalho docente que envolve práticas com a oralidade e sua contribuição para o desenvolvimento cognitivo de crianças discentes do 1º ano do Ensino Fundamental. Através de um estudo de caso em uma escola municipal de Belo Horizonte, buscou-se investigar, por meio de metodologia com abordagem mista, as ações individuais e coletivas, a construção de conhecimentos, propondo perceber e analisar as formas de expressão da oralidade por parte das crianças, assim como o trabalho docente com a oralidade, de forma a analisar as práticas educativas com intuito de identificar nessas práticas quais contemplam a oralidade; e desse modo perceber como as professoras articulam a oralidade à cognição das crianças. Correlato, pôde-se concluir que a oralidade contribui para o desenvolvimento cognitivo das crianças de seis anos. Palavras-chave: Oralidade, cognição, prática docente
Orality Studies: A contribution to the cognitive development of six-year-old children Abstract This article intends to discuss the relationship between the teaching job which involves practice with speaking and its contribution to the cognitive development of children 1 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 2 Graduada em pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 3 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 4 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 5 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 6 Pedagoga, Mestre em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG. Professora da FaE/UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
47
Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende Luciana Alves de Araújo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio, Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França
first-year students of the elementary school. Through a case study in a municipal school of Belo Horizonte, sought to investigate, through the methodology with mixed approach, individual and collective actions, building knowledge, proposing understand and analyse the forms of expression of orality for children, as well as the teaching work with orality in order to analyze educational practices in order to identify those practices which include orality; and thereby understand how teachers articulate orality to cognition of children. Correlated, it might be concluded that the orality contributes to the cognitive development of children of six years. Keywords: Orality, cognition, teaching practice
Introdução Esta pesquisa trata de um estudo sobre a oralidade e sua contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos e se processou em três momentos. No primeiro, iniciou-se a pesquisa exploratória sobre bibliografias que versam sobre o tema. No segundo, objetivou-se investigar o processo de aquisição das habilidades cognitivas na infância (seis anos) e as formas como a criança lida com suas tarefas de desenvolvimento, buscando estabelecer uma relação entre o desenvolvimento do pensamento e o domínio da oralidade, para assim, entender como se dá a capacidade de percepção da criança como indivíduo único, com seus próprios traços, gostos, aversões e suas próprias ideias, além de também conhecer estratégias de aprendizagem que contribuem para a sua formação, enquanto sujeito histórico dotado de oralidade. Por último, no estudo de caso propriamente dito, procurou-se verificar a apropriação ou não da concepção de oralidade assumida pela escola e pelas professoras7 bem como o espaço ocupado por ela na rotina escolar. Para isso, as pesquisadoras propuseram: (1) investigar o espaço destinado à oralidade no Projeto Político Pedagógico (PPP) da instituição; (2) analisar as práticas educativas dos docentes, com o intuito de identificar quais delas contemplavam a oralidade; (3) verificar a forma com que os professores articulavam a oralidade e a cognição das crianças. 7 Optou-se, aqui, por usar o feminino, ao invés do masculino genérico, para designar as professoras, pois elas representam a totalidade nesta pesquisa.
48
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos
Desse modo as questões-chave que norteiam esta pesquisa são as seguintes: quais são as formas ou recursos que possibilitam o desenvolvimento da oralidade no processo de ensino-aprendizagem? Quais atividades são desenvolvidas na escola para que a expressão oral aconteça de forma satisfatória visando ao pleno desenvolvimento da criança? Como se apresenta no cotidiano da escola o desenvolvimento da expressão oral em crianças de seis (6) anos? E, ainda, a Escola tem oferecido possibilidade para o desenvolvimento adequado da oralidade no processo de formação dessas crianças? As possíveisrespostas a estas e a outras questões constituem-se o foco deste estudo. Para Marcuschi (2004, p.25), A oralidade seria uma prática social interativa para fins comunicativos que se apresenta sob variadas formas ou gêneros textuais fundados na realidade sonora; ela vai desde uma realização mais informal a mais formal nos mais variados contextos de uso.
Este estudo optou por priorizar o aspecto comunicativo relacionado ao caráter social da linguagem, que possibilita aos sujeitos falar, ouvir, manifestar sentimentos ou ideias, pois a competência linguística é um aspecto fundamental, mas insuficiente, da competência comunicativa, visto que falar é algo mais do que ter capacidade para formular frases. Desse modo, precisa-se dar significado a uma situação interativa, o que implica em uma diversidade linguística e variações sistemáticas introduzidas pelos indivíduos no uso da linguagem (MARCUSCHI, 2004). De acordo com Batista et al.(2005), o desenvolvimento da oralidade inclui não apenas a capacidade de falar, mas também a de ouvir com compreensão. Batista entende que a capacidade de falar é fundamental para que o cidadão participe plenamente da sociedade, de modo que saiba ouvir e entender os jornais da TV e do rádio, as entrevistas e declarações de políticos e governantes, as demandas e explicações dos companheiros e superiores de trabalho. Busatto (2010) expõe a importância do desenvolvimento da oralidade ao afirmar que o exercício da fala capacita o aluno a argumentar, a predicar, ou Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
49
Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende Luciana Alves de Araújo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio, Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França
seja, a ser mais questionador e participativo, o que, por sua vez, refletirá em sua postura no exercício da cidadania. Para muitas pessoas, linguagem seria sinônimo de falar e de entender o que os outros dizem. Vygotsky (1991) entende a linguagem como uma representação interna da realidade construída, que utiliza um meio de comunicação compartilhado socialmente, ou seja, o indivíduo que desenvolve a linguagem codifica e absorve uma variedade de aspectos da realidade, tornando-se capaz de representar para outros indivíduos informações relacionadas a objetos, pessoas, ações, qualidades e relaçõesdesvinculados do momento que se vive. Assim, com base na relevância expressa por Marcuschi (2004), Busatto (2010), Batista et al (2005), Vygotsky (1991), dentre outros, é que se propôs este estudo observando o aspecto comunicativo relacionado ao caráter social da linguagem, que possibilita aos sujeitos falar, ouvir, manifestar sentimentos ou ideias.
Aspectos teóricos Optou-se por analisar a oralidade em turmas de 1º ano do Ensino Fundamental, pois nesta etapa de ensino os alunos, em sua maioria, iniciam o processo de alfabetização e letramento. O que por consequência, cria a hipótese de que os eixos da leitura e aquisição do sistema de escrita serão priorizados em detrimento do eixo da oralidade. Na perspectiva de Busatto (2010), a oralidade tem como função dar autonomia a criança de modo que ela saiba se posicionar diante do mundo de forma segura e confiante. Para que dessa forma a criança se torne capaz de se apropriar de sua fala e fazer análise crítica do que ouve e das informações que recebe. [...] Levar a oralidade para o contexto escolar implica estimular o aluno a se expressar, a buscar os sentidos para as coisas que o cercam e para a sua vida [...] (BUSATTO, 2010, p.8). Essa citação conduz à percepção de que, para Busatto, a oralidade no contexto escolar se constitui também como desafio e
50
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos
responsabilidade que a escola deve assumir para alcançar o desenvolvimento do aprendiz. A autora também afirma que a oralidade funciona como um elo entre o indivíduo e seus ancestrais, permitindo que a criança conheça sua cultura e compreenda as situações ao seu redor por meio da relação social e cultural existente na fala e nas suas variações orais. De acordo com Marcuschi (2010), o conceito de oralidade estaria relacionado ao uso social da fala, tratando oralidade e escrita como modalidades da linguagem, utilizadas para a comunicação. Tal conceito envolve aspectos deste estudo, ao refletir sobre o desenvolvimento das crianças em relação à capacidade de argumentação, diálogo e questionamento nas diferentes situações sociais do uso da fala no ambiente escolar. Alguns autores classificam a oralidade em dois níveis: primário e secundário. O primeiro nível refere-se à oralidade adquirida por meio do contato do indivíduo com o seu semelhante. Já o segundo trata da oralidade influenciada pelas tecnologias desenvolvidas pela sociedade em que o indivíduo encontrase inserido. Para Lévy (1993), “oralidade primária remete ao papel da palavra antes que uma sociedade tenha adotado a escrita. [...] a palavra tem como função básica a gestão da memória social, e não apenas a livre expressão das pessoas ou a comunicação prática” (LÉVY, 1993, p.77). Na contemporaneidade, a preocupação que perpassa a investigação desta pesquisa é o lugar que a oralidade ocupa na sociedade escolarizada, pois a mesma advém de uma cultura distinta da escolarização, que muitas vezes, privilegia a escrita. Nas sociedades que fazem uso da escrita, a relação com a oralidade é de suporte e mídia da escrita, logo o papel da oralidade é posto em segundo plano, apenas para dar voz ao impresso.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
51
Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende Luciana Alves de Araújo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio, Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França
Ong (1998), em sua obra Oralidade e Cultura Escrita, ao se referir às décadas de 1980 e 1990, apresenta uma visão etnocêntrica e grafocêntrica da escrita em relação à oralidade, elegendo os grupos minoritários conhecedores e usuários da escrita como mais poderosos e importantes do que aqueles usuários primordiais da cultura oral. Nas sociedades primárias, educavam-se os mais novos, por meio da oralidade, para o enfrentamento dos perigos e situações cotidianas; os pertencentes a essas sociedades assimilavam o aprendizado pela escuta atenta e pelos exemplos vivenciados pelos membros mais velhos. Com o advento da escrita e da escolarização, a relação do indivíduo com a oralidade foi se modificando pelo uso da comunicação através da escrita numa velocidade crescente, alterando as relações e as maneiras de se ver e de se conceber o mundo. Segundo Ong (1998), a oralidade praticada no contexto escolar seria a oralidade secundária, pois precisa se afirmar e sobreviver às inúmeras tecnologias criadas pela contemporaneidade para comunicação e armazenamento de conhecimentos. Assim, para Ong, a oralidade estaria associada à escrita, como segue: Primária por oposição à “oralidade secundária” da atual cultura de alta tecnologia, na qual uma nova oralidade é alimentada pelo telefone, pelo rádio, pela televisão ou por outros dispositivos eletrônicos, cuja existência e funcionamento dependem da escrita e da impressão. Atualmente, a cultura oral primária, no sentido restrito, praticamente não existe, uma vez que todas as culturas têm conhecimento da escrita e sofreram alguns de seus efeitos. Contudo, em diferentes graus, muitas culturas e subculturas, até mesmo num meio de alta tecnologia, preservam muito da estrutura mental da oralidade primária (ONG, 1998, p.19).
A disseminação desse pensamento etnocêntrico durante muito tempo imperou na educação e nos discursos elitistas de pequenos grupos da sociedade, justificando políticas sectárias de subordinação de conhecimentos e classificando a maior parcela da população de não sabedores e incapazes de aprender. Esse pensamento colaborou para a criação de diferentes
52
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos
estabelecimentos de ensino e de propostas educacionais para atender aos “detentores do conhecimento”. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCN) concebem a língua como Um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmas (BRASIL, 1997, p.22).
Os PCN de Língua Portuguesa evidenciam a importância da aquisição da linguagem como mediadora do conhecimento de mundo, dos costumes de um povo, da interação entre as pessoas e para a socialização de experiências. Assim, a oralidade vista sob o prisma da escolarização poderia ser concebida como capacidade, competência comunicativa e atitude a ser desenvolvida na criança para que ela consiga diferenciar e utilizar a língua nos diferentes contextos e situações apresentados (MARCUSHI, 2010, p.22). Na abordagem feita por Vygotsky (1991) sobre o desenvolvimento da fala, os aspectos motores e verbais do comportamento estão misturados. A fala envolve os elementos referenciais, a conversação orientada pelo objeto, as expressões emocionais e outros tipos de fala social. Se a criança está cercada por adultos na família, a fala começa a adquirir traços demonstrativos, e ela começa a indicar o que está fazendo e de que está precisando. Com o passar do tempo, a fala deixa de ser um meio para dirigir o comportamento dos outros e vai adquirindo a função de auto direção. Conforme o autor, fala e ação desenvolvem-se independentes uma da outra, e em determinado momento do desenvolvimento convergem; esse é o momento de maior significado no curso do desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas puramente humanas de inteligência. Forma-se, então, um amálgama entre fala e ação; inicialmente a fala acompanha as ações e, posteriormente, as dirige, determina e domina seu curso, com função planejadora. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
53
Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende Luciana Alves de Araújo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio, Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França
Perspectiva metodológica Este trabalho configura-se como um estudo de caso, valendo-se da abordagem mista, qualitativa e quantitativa, pois a pesquisa teve como intenção ouvir, observar e coletar dados por meio de questionários semiestruturados. Para tanto, optou-se por selecionar como sujeitos da pesquisa as professoras e os alunos do 1º ano do Ensino Fundamental.Incluem-se as professoras regentes e as professoras de disciplina especializada. André e Lüdke (1986) consideram a abordagem qualitativa ou naturalística como aquela que se “desenvolve numa situação natural”, ou seja, no próprio local da pesquisa; neste caso, a própria escola. Com o intuito de investigar o espaço que a oralidade tem ocupado no Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola ou na Proposta Pedagógica, é que se propôs analisar se o trabalho com a oralidade é contemplado pela proposta. Trata-se de análise documental, por serem considerados fontes importantes para a pesquisa. André e Lüdke (1986) ressaltam a relevância da análise documental e afirmam que qualquer material escrito, que possa ser utilizado como fonte de informação, pode ser considerado um documento. O PPP, documento que se configura como identidade da escola, definindo princípios, valores ideológicos e pedagógicos que sustentam a ação educativa e que se constitui como referencial para a atuação coordenada dos membros da comunidade escolar e do entorno, consiste em documento importante para a pesquisa. Entretanto a escola não o disponibilizou para análise. Como a participação é voluntária, e nem todas as docentes puderam participar, como o tempo disponível para o trabalho monográfico é curto e o acesso ao PPP não foi possível, seria interessante retornar a campo em busca de novos dados que enriqueçam ainda mais a pesquisa.
Discussão e análise dos resultados Para preservar a identidade da escola optou-se por designá-la, Escola X. Foram convidados a participar voluntariamente da pesquisa e responder ao
54
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos
questionário as 12 professoras do 1º ano do Ensino Fundamental; apenas 03 se dispuseram a participar, apesar da contextualização da importância da pesquisa e exposição das contribuições para a academia. As professoras participantes foram designadas: P1, P2 e P3. Todas são formadas em curso de nível superior; duas possuem curso de especialização e possuem cerca de 10 anos de experiência na docência. Ao serem questionadas sobre a concepção de oralidade existente no currículo da escola, as professoras apontaram que a concepção refere-se à “linguagem oral” e à “comunicação verbal”. Afirmaram ainda que o trabalho com a oralidade é possível e que contribui para o desenvolvimento cognitivo da criança, pois, conhecendo as formas de comunicação existentes, a criança poderá comunicar-se com segurança. As respostas das professoras participantes da pesquisa dialogam com Marcuschi (2010), pois o mesmo apresenta a escola como a instituição ideal para trabalhar a oralidade e a fala das crianças, primeiramente fazendo com que essas reconheçam sua própria linguagem e em seguida apropriem-se da língua padrão de prestígio para conviver em sociedade. As professoras relataram não fazer planejamento das aulas que envolvem oralidade, apesar de alegarem realizar atividades que a contemplem, como conversas diárias, conto e reconto, jogos, cantigas, parlendas, trava línguas, declamação de poesias e debates. Além de considerarem as falas espontâneas e os relatos de experiências como próprios do trabalho com a oralidade. P1 e P2 alegaram ainda não encontrar empecilhos para trabalhar a oralidade. Já P3 disse encontrar dificuldades devido à “falta de conhecimento suficiente para trabalhar a oralidade em todas as suas possibilidades”. A prática observada em sala de aula mostrou que além das professoras priorizarem atividades que privilegiam os sons das letras, elas também priorizavam a participação ativa das crianças na correção dos exercícios ao questionaremnas sobre como elas chegaram à determinada conclusão, possibilitando assim
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
55
Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende Luciana Alves de Araújo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio, Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França
o estabelecimento de relações entre objetos, fatos, pessoas e a verbalização de suas descobertas. Prática que, além de contribuir para o desenvolvimento do pensamento lógico, também amplia a capacidade de fala da criança. Duas turmas de 1º ano, 39 alunos, responderam ao questionário proposto. Mais de 85% (34 de 39) das crianças fizeram a educação infantil, seja em escola pública ou privada. Apenas cinco crianças não frequentaram a escola no ano de 2012. Por se encontrarem no início do processo de Alfabetização e Letramento fezse necessária a intervenção das pesquisadoras uma vez que os alunos, nessa faixa etária, conhecem mais pela vivência do que pelo conceito. Algumas das crianças ainda apresentaram dificuldades com relação à coordenação motora. Nas questões de identificação do sujeito, constatou-se que elas tinham dificuldades em diferenciar o gênero feminino do masculino ao marcarem nas figuras apresentadas no questionário e demonstraram dificuldades na aquisição do conceito de número e de quantidade, pois ora necessitavam contar nos dedos e em objetos para fazer a correspondência com a escrita dos traços, ora direcionavam perguntas para as pesquisadoras no intuito de obter o nome do número, para depois escolherem o algarismo que correspondesse à sua idade. Dentre os gêneros cantigas de roda, parlendas, contos, recontos, trava línguas, rimas, rodas de conversa/debates/discussão, teatro/dramatizações, pode-se verificar, por meio das respostas das crianças, que rodas de conversa/debates/ discussão são os gêneros mais trabalhados. Foi possível constatar ainda,de acordo com 22 alunos, que os gêneros entrevista e rádio nunca são trabalhados em sala de aula.
Considerações finais A presente pesquisa reafirmou a importância do trabalho com a oralidade na prática docente para o desenvolvimento da criança, pois, através da investigação das práticas dos professores e da observação das atitudes das
56
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
Estudos sobre oralidade: contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos
crianças, foi possível perceber o desafio que deve ser superado junto às docentes no que concerne ao planejamento de atividades que contemplem a oralidade no trabalho com crianças de seis anos. Evidenciou-se ainda a hierarquização de conteúdos, pois nas turmas do 1º ano do 1º ciclo foi notória a ênfase na escrita, na coordenação motora fina e no reconhecimento das letras e dos números, o que, por sua vez, vai ao encontro do pensamento de Leal e Góes (2012, p.7): “a oralidade é o eixo menos prestigiado na cultura escolar da Educação Básica e nas práticas de ensino de todos os níveis de escolaridade”. Talvez isso se deva ao fato da concepção errônea, principalmente por parte dos professores, de que a escrita é superior à oralidade, não entendendo essas duas modalidades da língua como dois processos imprescindíveis na sociedade atual. Desse modo, o ambiente escolar necessita se constituir como espaço propício às práticas de oralidade, promovendo o desenvolvimento do sujeito e estimulando sua autonomia para transitar em espaços variados, tanto os espontâneos quanto os mais formais, tendo propriedade de seu discurso. Em face desta perspectiva e de modo a oferecer condições para que esta realidade aconteça, seria de extrema importância o reconhecimento da necessidade de que o professor se capacite cada vez mais, como forma de ampliar seus conhecimentos e recursos, visando ao desenvolvimento de atividades interativas em sala de aula. Além de incluir a oralidade em seus planejamentos diários, pois esta se configuracomo eixo de igual importância para o desenvolvimento cognitivo da criança, junto a outros eixos de ensino, como o da escrita e da leitura, por exemplo. A presente pesquisa não esgota as possibilidades de se explorar o tema da oralidade. Por ser um campo vasto e complexo, este estudo optou por analisar a oralidade sob o olhar da prática docente, ressaltando elementos da comunicação e cognição. A investigação desse recorte possibilitou o reconhecimento deste e de outros olhares a serem desenvolvidos em pesquisas futuras.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
57
Adriana Vieira da Silva, Ana Paula de Almeida Gonçalves, Elizabeth Seabra Resende Luciana Alves de Araújo, Maria de Lourdes do Amaral Bonifácio, Juliana Danielle dos Reis Pereira da Silva França
Referências AMARAL, Maria de Lourdes et al; PEREIRA, J. D. R (orientadora). Estudos sobre oralidade: contribuição para desenvolvimento cognitivo da criança de seis anos. Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2013. 65p. (Monografia). BATISTA, Antônio Augusto Gomes. Capacidades da alfabetização / Antônio Augusto Gomes Batista et al. – Belo Horizonte: Ceale/FAE/UFMG, 2005. 96p. – (Coleção Instrumentos da Alfabetização; 2). BELO HORIZONTE. Secretaria Municipal de Educação. Desafios da Formação. Proposições Curriculares Ensino Fundamental: Língua Portuguesa – Belo Horizonte, 2010. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa – Brasília, 1997. BUSATTO, Cléo. Práticas de oralidade na sala de aula. São Paulo: Editora Cortez, 2010 (Oficinas aprender fazendo). LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na eradainformática. Rio de Janeiro: Editora 34, 1993. LÜDKE, Menga e ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. MARCUSHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita: Atividades de Retextualização. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2010. ONG, Walter J. Oralidade e cultura escrita: A tecnologização da palavra – São Paulo: Campinas, 1998. VYGOSTKY, L, S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
58
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 47-58
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural Renatha de carvalho Maia1 Gabriela Carolina Rosa2 Miriam Cely Caetano de Castro3 Thamy Caroline de Souza4 Darsoni de Oliveira Caligiorne5 Resumo Este artigo tem como objetivo despertar o olhar do professor para a importância da disciplina de Artes - Dança e Música - na formação do sujeito crítico sociocultural. Para tanto, apresentam-se os contextos históricos que mais influenciaram para a desvalorização desta área de conhecimento nas escolas brasileiras, a fim de resgatá-la desse lugar, bem como as contribuições da Dança e da Música, tais como consciência corporal, autenticidade, criatividade, criticidade, afetividade, socialização na educação desse sujeito. Considerando o professor como principal agente mediador do processo ensino-aprendizagem, buscou-se também apontar os principais aspectos e conceitos que devem constituir a formação deste profissional para a Arte/Educação. A fundamentação teórica deste trabalho baseia-se nas pesquisas de Ana Mae Barbosa (2008, 2010), Isabel Marques (2011), Luciana Del Ben (2003), Joseph Kinzer (2010), Fonterrada (2011) e Patrícia Stokoe (1987), dentre outros teóricos da arte e da arte/educação. Palavras-chave: Arte/Educação,dança,música, professor
Contributions of arts education - dance and music - to the formation of the critical sociocultural individual Abstract This article has the goal of raising the teacher’s attention to the importance of the discipline of Arts – Music and Dance – in the formation of the critical sociocultural individual. To 1 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 2 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 3 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 4 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 5 Pedagoga, Mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina.Professora da FaE/UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
59
Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
accomplish this goal, the paper presents the historical contexts that have most conducted to the depreciation of this knowledge area in Brazilian schools, for rescuing it from that place, as the contributions of Dance and Music, such as corporal awareness, authenticity, creativity, criticism, affectivity, and socialization in this individual’s education. Considering the teacher as the main mediator agent on the process of teaching-learning, this study has searched to indicate the main aspects and concepts that must compose the development of this professional for the Art/Education field. The theoretical justification of this paper is based on the works by Ana Mae Barbosa (2008, 2010), Isabel Marques (2011), Luciana Del Ben (2003),), Joseph Kinzer (2010), Fonterrada (2011) e Patrícia Stokoe (1987), among other theorists in the field of Art and Art/Education. Keywords: Art/Education, dance, music, teacher
Introdução Durante o processo de escrita do trabalho de conclusão de curso, sentimo-nos extremamente instigadas a pesquisar os motivos causadores de processos tão negativos na área do conhecimento da Arte, nas escolas brasileiras, bem como a investigar quão rico pode ser um trabalho de qualidade em Arte, que seja contextualizado, prazeroso, criativo e significativo, na escola de ensino básico. Despertar o olhar do educador para a importância da Arte, Dança e Música, na formação escolar do sujeito sociocultural, foi colocado como objetivo mais abrangente do estudo monográfico. A partir desse objetivo, delinearam-se os seguintes objetivos específicos: analisar a arte no contexto histórico nacional; descrever as contribuições da Dança e da Música na formação do sujeito sociocultural e apresentar a Arte como área de conhecimento na formação do educador. Por meio de pesquisa bibliográfica desenvolvemos uma análise da Arte, no contexto nacional, e apontamos como a metanarrativa iluminista influenciou e/ou influencia o campo da Arte no contexto escolar. Apresentamos também as potencialidades desenvolvidas a partir da prática da Dança e da Música e a importância da Arte na formação do sujeito crítico sociocultural. Evidenciamos ainda a importância da formação do professor para a Arte, sendo esse professor um sujeito sociocultural, crítico, que influencia ativamente na transformação da escola, da educação e da sociedade.
60
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural
O lugar da arte na atualidade: uma reflexão O ensino de Arte no Brasil, de acordo com Barbosa (2008), foi marcado pela influência do Iluminismo nas escolas. Essa influência foi marcada a partir da implantação da primeira escola de Artes do Brasil, denominada Academia Imperial de Belas-Artes, fundada pela “Missão Francesa”. Os membros da escola apresentavam orientação neoclássica e não consideravam o Barroco Brasileiro como Arte: Este processo de interrupção da tradição da arte colonial, que já era uma arte brasileira e popular, acentuou o afastamento entre a massa e a arte, concorrendo para isto também uma variante de ordem psicossocial, ou seja, o fato de que a “emotividade” e o “sensualismo” do mestiço brasileiro encontravam no barroco formas mais próprias de expressão, suscetíveis de autenticidade (BARBOSA, 2008, p. 20).
Dessa forma, a Arte foi se distanciando da população e se tornando privilégio de poucos e para os talentosos, a partir da imposição do Neoclassicismo. Essa imposição deu forças para o preconceito de que a Arte é algo supérfluo, um acessório da cultura, como acontece, nos dias atuais, em nossa sociedade. Em 1816, foi criado um Decreto, que estabelece o ensino de Arte no Brasil, caracterizando “[...] a Arte como um acessório, um instrumento para modernização de outros setores e não como uma atividade com importância em si mesma.” (BARBOSA, 2008, p.21). Barbosa (2008) afirma aindaque a desvalorização da Arte se deu também pela supervalorização das atividades literárias. O preconceito contra as artes manuais pode ter uma raiz mais antiga, vindo desde a colonização: Duas têm sido as principais causas que muito têm concorrido para o vergonhoso atraso em que se acham entre nós as artes industriais; a primeira provém da falta de vulgarização do desenho, a segunda desse cancro social que se chama escravidão. O homem livre, ignorante em matéria de arte, vendo-a exercida pelo escravo, não professa porque teme nivelar-se com ele, e o escravo, mais ignorante ainda, tendo à arte o mesmo horror que vota a todo trabalho, de que tira proveito por alheio usufruto, não procura engrandecer-se, aperfeiçoando-a (FERREIRA apud BARBOSA, 2008, p. 27). Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
61
Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
O ensino de Arte nas escolas de educação básica, no início do século XX, teve, então, o Desenho como seu principal elemento, sendo esse, por sua vez, visto e defendido como outra forma de escrever, como uma capacidade natural dos homens, ou, pelo menos, acessível a todos e não um dom. A justificativa que Barbosa (2008) dá a esse fato é de que: Plasmados na excessiva literariedade dos jesuítas, nada mais natural para os brasileiros que vencer o preconceito contra o ensino de Arte, reduzindo-o ao ensino do Desenho e procurando valorizá-lo pela sua equivalência funcional com o escrever (BARBOSA, 2008, p. 34).
Pouco tempo depois, o ensino de Artes, representado pelo Desenho, deixa-se influenciar por duas grandes correntes, nessas primeiras duas décadas do século XX: o Liberalismo e o Positivismo. Este defende que a “[...] ciência deve voltarse única e exclusivamente para o cognoscível, excluindo, assim, a essência (o absoluto) dos objetos de investigação do cientista para ater-se às relações (ao relativo) existentes entre os fenômenos estudados” (RIBEIRO, 1994, p.10). A importância do Desenho, para as duas correntes,coloca-se de forma distinta, pois, se, por um lado, os positivistas viam no desenho uma iniciação do sujeito para a linguagem e formação científica, por outro, o liberalismo via-o como uma linguagem técnica, um caminho para a fecundação do trabalho. Contudo, o desenho geométrico era a gramática comum às duas formas de pensamento, “[...] ambas as correntes concebiam o desenho como uma forma de linguagem” (BARBOSA, 2008, p.80).
Um Plié-semibreve Ao pensar Dança e Música na escola, precisamos saber que dança “[...] é expressar emoções por meio do corpo. É esculpir no ar figuras harmoniosas que nascem de um pulsar da música” (BARRETO, 2008, p. 125) e que a dança, pode ser “[...] uma das manifestações da cultura corporal dos diferentes grupos sociais que está intimamente associada ao desenvolvimento das capacidades expressivas das crianças” (BRASIL, 1998, p. 30). E a música como uma “[...] linguagem que se traduz em formas sonoras capazes
62
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural
de expressar e comunicar sensações, sentimentos e pensamentos, por meio da organização e relacionamento expressivo entre som e silêncio” (BRASIL, 1998, p.45). Com esses conceitos é possível perceber que tanto a Dança quanto a Música contribuem para a formação do sujeito crítico sociocultural. Para trabalhar a Dança na escola, teremos como base de estudo a expressão corporal, por ser a técnica que mais se adequa ao que consideramos ser necessário e importante no trabalho corporal com crianças. A expressão corporal na Dança possibilitará ao sujeito novas formas de expressão e comunicação, levando à descoberta da sua própria linguagem corporal. A Música, por sua vez, não precisa que sejam escolhidas técnicas ou áreas, a priori, pois na escola trabalha-se a musicalização, que, segundo Bréscia, citado por Godoy e outros (2009): [...] a musicalização é um processo de construção do conhecimento, que tem como objetivo despertar e desenvolver o gosto musical, favorecendo o desenvolvimento da sensibilidade, criatividade, senso rítmico, do prazer de ouvir música, da imaginação, memória, concentração, atenção, autodisciplina, do respeito ao próximo, da socialização e afetividade, também contribuindo para uma efetiva consciência corporal e de movimentação (BRÉSCIA apud GODOY et al., 2009, p. 5195).
Para dançar, para movimentar o corpo, não é necessário um aprendizado prévio, basta simplesmente sentir a batida da música pulsando em todas as partes do corpo. Pois, segundo Martha Graham (1995), toda dança é uma espécie de roteiro febril, um gráfico do coração. Sendo assim, percebemos que a Dança não trabalha somente o corpo, mas também a mente e o espírito, de forma que Isadora Duncan acreditava que o corpo deve se tornar translúcido, sendo apenas o intérprete da alma e do espírito; a dança é o resultado de um movimento interno. Da mesma forma, Luciana Del Ben (2002, p. 33) advoga que a música é realizada de forma a “[...] acessar, expressar e desenvolver a alma, a psique, a sensibilidade, os afetos, sentimentos e emoções humanas”, revelando também que: Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
63
Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
A relação da música com os sentimentos, as emoções ou a sensibilidade humana parece sugerir que os significados, propósitos e valores da vivência e da aprendizagem musicais, bem como os conteúdos envolvidos, são experienciados e interpretados somente a partir de uma base individual e subjetiva, sem considerar aspectos coletivos e intersubjetivos (ver Bowman, 1998, p.72). Parecem depender, exclusivamente, daquilo que é particular ao aluno como individuo único (DELBEN, 2003, p. 34).
Ao relatarmos todo o potencial que a Dança e a Música apresentam para a formação do sujeito, é preciso mostrar a forma mais adequada. A primeira atividade a ser realizada nas aulas de dança deve ser direcionada para o despertar dos sentidos, podendo assim possibilitar a experienciação da vida na sua plenitude de sensações. “Atividades como o banho e a massagem são oportunidades privilegiadas de explorar o próprio corpo, assim como de experimentar diferentes sensações, inclusive junto com outras crianças” (RCNEI, 1998, p. 30). Podemos também trabalhar com “[...] o uso de tecidos de diferentes texturas e pesos, ou matérias de temperaturas diferentes”,em brincadeiras de esconder sob um pano grosso ou fazer cabanas, labirintos e túneis com tecidos tipo filó (RCNEI, 1998, p. 30). Atualmente, com a velocidade em que acontecem as coisas em nossas vidas, estamos nos distanciando do sentir e tornando-nos cada vez mais analfabetos do sentimento, sendo que “analfabetos do sentir são aqueles que não sabem exprimir por palavras, gestos ou atitudes, suas emoções, vivendo num mar de conflitos por não identificarem corretamente seus sentimentos e emoções, e torná-los distintos” (HAMMED, 2000). Segundo Ostrower (1977), “a sensibilidade é uma porta de entrada das sensações”, que representa uma abertura constante ao mundo e nos liga de modo imediato ao acontecer em torno de nós. Senão sentimos, não dançamos de forma plena, e, sim, realizamos o movimento pelo movimento. Nas aulas de dança, é preciso que as atividades despertem nossa sensibilidade e nos ensinem a lidar com nossas sensações e emoções. “As mímicas faciais e gestos possuem um papel importante na expressão de sentimentos e em
64
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural
sua comunicação” (BRASIL, 1998, p. 31), pois, “[...] a externalização de sentimentos, emoções e estados íntimos poderá encontrar na expressividade do corpo um recurso privilegiado” (BRASIL, 1998, p. 31). A dança possibilita um “[...] movimentar-se, no qual as crianças expressam sentimentos, emoções e pensamentos, ampliando as possibilidades do uso significativo de gestos e posturas corporais” (BRASIL, 1998, p.15). A dança “[...] é uma linguagem por meio da qual o indivíduo pode sentir-se, perceberse, conhecer-se e manifestar-se. É um aprendizado em si mesmo: o que o indivíduo sente, o que quer dizer, e como quer dizê-lo” (STOKOE, 1987, p.17). A criatividade aparece como uma potencialidade, despertada e trabalhada a partir das atividades citadas anteriormente, por meio da expressão corporal. Segundo FaygaOstrower (1977), a criatividade é um potencial inerente ao homem e uma de suas necessidades. O criar só pode ser visto, em um sentido global, como um agir integrado em um viver humano, de forma que criar e viver se interligam. A autora ainda afirma que o ato criador abrange a capacidade de compreender; a qual, por sua vez, abrange a de relacionar, ordenar, configurar e significar. A expressão corporal, segundo Stokoe (1987), é manifestada em quatro (4) níveis fundamentais: o da pessoa em relação a si mesma; o da pessoa em relação às outras pessoas; o da pessoa em relação a outros seres vivos e o da pessoa em relação aos objetos. Esses níveis são inerentes ao ato criativo, pois quando criamos, estabelecemos relações com algo ou com alguém, e surge, assim, a necessidade de conhecer e pesquisar sobre aquilo com oque iremos estabelecer um processo criativo. Esse processo de pesquisa nos faz retornar ao início do texto, quando falamos do contato das crianças com diferentes texturas. As atividades de contato com diferentes texturas já realizam a pesquisa, que resultará depois no trabalho de relação com o outro. A primeira experiência que a criança deve ter é com ela mesma,conhecer-se a si mesma, reconhecer-se para que depois possa se relacionar com o mundo externo.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
65
Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
O processo criativo está diretamente ligado à capacidade de interiorização no processo de aprendizagem. Segundo Joseph (2007), cada ato criativo é uma unidade de inspiração e expiração. E assim, ao fazermos Arte, estamos em contato com nossa doçura, com nossos anseios, com o poder de nossos intentos e com a profundeza de nosso bem querer. Para Ostrower (1977), os processos de criação interligam-se intimamente com nosso sensível. A expressão corporal “[...] engloba a sensibilização e a conscientização de nós mesmos tanto para nossas posturas, atitudes, gestos e ações cotidianas, como para nossas necessidades de exprimir-comunicar-criar-compartilhar e interagir na sociedade em que vivemos” (STOKOE, 1987, p. 15). Ao dançar, o sujeito aprimora todas as potencialidades apontadas anteriormente, tornando-se mais autônomo, mais crítico, capaz de enxergar as belezas ocultadas pela rapidez da modernidade, sendo, pois, mais ativo, feliz e mais pleno em seu existir. Victório (2011, p. 19) afirma que ensinar música nas escolas significa ensinar o indivíduo a construir sua “autonomia de criador e intérprete de sua trama musical inserido na grande sinfonia da vida”. Além disso, “[...] o aprendizado de música, além de favorecer o desenvolvimento afetivo da criança, amplia a atividade cerebral, melhora o desempenho escolar dos alunos e contribui para integrar socialmente o indivíduo” (BRÉSCIA apud CHIARELLI, 2005). O ensino de Música envolve tanto a prática musical quanto a “[...] educação dos sentimentos, da emoção, do raciocínio” (SEKEFF, 2001, p. 329, grifo do autor). Carlos Kater (2011) explicita que a música é responsável, também, pelo [...] cultivo da sensibilidade, criatividade, escuta, percepção, atenção, imaginativo, liberdade de experimentar, coragem do risco, respeito pelo novo e pelo diferente, pelo que é próprio a cada um e também ao “outro”, construção do conhecimento com autonomia, responsabilidade individual e integração no coletivo (KATER, 2012, p. 42).
Quanto aos métodos de ensino de Música, não escolhemos um método específico, pois cada um tem sua singularidade e é trabalhado dependendo do objetivo pretendido. Segundo Gainza (1977), o ensino de música acontece de forma espiralada, apresentando três fases: a sincrética, a analítica e a sintética.
66
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural
A primeira, é a fase da experimentação; a segunda,é a da organização, na qual são apresentados os dados e regras a serem apreendidos; e a terceira, a do produto final, no qual são apresentados os resultados da integração de todos os conhecimentos. Essas fases são formas de organizar o processo de ensinoaprendizagem, quanto à formação do sujeito crítico sociocultural, isto é, quanto a gênero, cultura e sexualidade. Dessa mesma forma, Swanwick (1994) trabalha um método espiral de ensino, mas dividido em blocos: “material, expressão, forma e valor” (FONTERRADA, 2008). A ideia principal desse método é que as crianças passem por todos os blocos e experimentem as propostas e/ou atividades, passando do nível intuitivo para o nível analítico. O nível intuitivo, segundo Swanwick (1994), está ligado à estética, à imaginação, às impressões, às “coisas” individuais, ao “romântico”, ao subjetivo, à aparência, à integração, à criação, ao jogo e à assimilação. Já o analítico está relacionado ao artístico, ao intelecto, às concepções, aos relacionamentos, ao “clássico”, ao objetivo, às formas, à separação, à tradição, à imitação e à acomodação. Dalcroze (1965), pensando no ensino sistemático de Música, desenvolveu seus estudos, baseando-os no movimento corporal e no desenvolvimento da habilidade da escuta. De acordo com Fonterrada (2008), Dalcroze (1965) trabalhava a “escuta ativa, a sensibilidade motora, o sentido rítmico e a expressão”, incentivando também “[...] movimentos básicos como andar, correr, saltar, arrastar-se, deslocar-se em diferentes direções, utilizando-se de diferentes saltos, livremente ou seguindo um determinado ritmo” (FONTERRADA, 2008, p. 135). Edgar Willems propunha um ideal democrático para o ensino de Música, preparando auditivamente as camadas populares, como evidencia Fonterrada (2008) que “[...] ensinar a ouvir, então é ensinar a receber impressões sonoras”. A sensorialidade auditiva tem, assim, sua importância na base material sobre a qual se assenta a música. Já Carl Orff baseava seus estudos na improvisação, no ritmo e no movimento, trazendo atividades de eco, pergunta e resposta, improvisando a partir do Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
67
Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
que foi estimulado auditivamente. Acreditava que seus estudos ajudariam no desenvolvimento da fala, da dança e do movimento. Os métodos citados são trabalhados em escolas, nos dias atuais, e estão referenciados nos documentos oficiais sobre Proposições Curriculares para o Ensino Fundamental e a Educação Infantil (BRASIL, 1998; 2001)
Arte, artista, professor Pensando no ensino de Arte – Dança e Música – como proposto neste texto, o professor que vai ministrar essas disciplinas é um sujeito sociocultural, pois a docência é uma categoria social e o professor um sujeito sociocultural, pois, vivencia em seu cotidiano outras práticas em espaços sociais. Segundo Teixeira (1996), o professor como sujeito sociocultural é constituído por alguns fatores específicos, que fazem parte da sua relação profissional e que influenciam sua formação como sujeito sociocultural. A autora revela, também, que a relação professor-educando é uma relação de troca de conhecimento e experiências, porque o ensino é um processo em que tanto o professor quanto o educando ensinam e aprendem. Isso acontece porque os saberes do contexto social, das formas, da cultura, estão presentes na constituição desses indivíduos. As relações pedagógicas também apresentam envolvimento humano e afetivo, gerado pelo convívio próximo e frequente, que acontece na escola, nas rotinas de encontros diários. No processo de formação acadêmica do professor, a educação em Arte é um elemento que consideramos importante, pois, A educação em arte propicia o desenvolvimento do pensamento artístico, que caracteriza um modo particular de dar sentido às experiências das pessoas: por meio dele, o aluno amplia a sensibilidade, a percepção, a reflexão e a imaginação. Aprender arte envolve, basicamente, fazer trabalhos artísticos, apreciar e refletir sobre eles. Envolve, também, conhecer, apreciar e refletir sobre as formas da
68
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural
natureza e sobre as produções artísticas individuais e coletivas de distintas culturas e épocas. (BRASIL, 2001, p.15).
Para ensinar Arte é preciso conhecimento concreto do processo de criação e ter vivência criativa. “A Arte pode ser ensinada, mas há um modo específico de ensiná-la, pois, como objeto educacional, ela é difícil de ser comunicada, transmitida” (ALMEIDA, 2009, p. 87). Segundo Almeida, a dificuldade no ensino de Arte está na “[...] impossibilidade de se organizar o conhecimento artístico de forma cumulativa e generalizada, pois essas características são incompatíveis com o processo criativo” (ALMEIDA, 2009, p. 92). O ensino de Arte pode ser prazeroso, mas somente para quem consegue fazer dele uma experiência criativa. O ensino deve ser entendido como orientação para incentivar o educando a buscar seu caminho. Apenas o ensino criador, que forneça a integração entre a aprendizagem racional e estética dos alunos, poderá contribuir para o exercício conjunto complementar da razão e do sonho, no qual conhecer é também maravilhar-se, divertir-se, brincar com o desconhecido, arriscar hipóteses ousadas, trabalhar duro, esforçar-se e alegrar-se com descobertas (BRASIL, 2001, p. 35).
Sendo assim, o professor deve dar aos educandos a possibilidade de vivenciar certas experiências do trabalho de criação. Eles são indivíduos diferentes e precisam de atenção individual, para que o professor os conheça e os estimule. A Arte é um processo contínuo e cotidiano que envolve a pesquisa, o duvidar, o buscar, o experimentar, o explorar materiais, ideias e possibilidades, o conquistar a autoconfiança, a coragem de ir até o desconhecido. Sua função é “[...] refinar os sentidos e alargar a imaginação [...] para potencializar a cognição” (BARBOSA, 2010, p. 12). O ser humano que não conhece arte tem uma experiência de aprendizagem limitada, escapa-lhe a dimensão do sonho, da força comunicativa dos objetivos à sua volta, da sonoridade instigante da poesia, das criações musicais, das cores e formas, dos gestos e luzes que buscam o sentido da vida (BRASIL, 2001, p.21).
Consideramos que a arte “[...] é o caminho para recuperar o que há de Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
69
Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
humano no ser humano” (BARBOSA, 2009, p. 21), uma vez que, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais, a arte utiliza os sentidos “[...] como porta de entrada para uma compreensão mais significativa das questões sociais” (BRASIL, 2001, p. 20). A educação em arte tem o objetivo de “[...] aprofundar o campo da imaginação e do papel que pode ter na criação de significados pessoais e na transmissão da cultura” (EFLAND, 2010, p. 341), amplia a sensibilidade, reflexão e percepção do educando, “[...] tanto ao realizar formas artísticas, quanto na ação de apreciar e conhecer as formas produzidas por ele e pelos colegas, pela natureza e nas diferentes culturas” (BRASIL, 2001, p. 19). A educação em arte proporciona também o “[...] desenvolvimento do pensamento artístico e da percepção estética, que caracteriza um modo próprio de ordenar e dar sentido à experiência humana” (BRASIL, 2001, p. 19). A Arte/Educação, segundo Barbosa (2009), é o trabalho consciente de mediar a relação entre a Arte e o público, diminuindo a distância entre a Arte e a Educação. Ela é importante instrumento para a identificação cultural e o desenvolvimento do indivíduo. Ana Mae Barbosa adaptou a abordagem metodológica de ensino de Arte de um projeto desenvolvido nos Estados Unidos, a Discipline Based Art Education (DBAE), dos estudos ingleses Basic Design Movimente as Escuelasal Aire Libre do México, para o que denominou Abordagem Triangular. A Metodologia Triangular também é conhecida como o método de Arte-educação ressignificada, uma vez que ela é baseada no DBAE e tem como síntese a ação educativa que exige pensar e repensar o cotidiano da escola e a função social da mesma em busca da democratização dos saberes, contra todas as formas de distribuição desigual dos bens materiais e simbólicos (culturais). Esse posicionamento concebe a Arte-educação como expressão e relação emocional, priorizando a originalidade dentre os processos mentais envolvidos na criatividade (BACARIN, 2005, p. 114).
A Abordagem Triangular aparece como a direção pedagógico-artística proposta pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para a área de Arte.
70
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural
Os PCN apresentam o conjunto de conteúdos de Arte, em um contexto de ensino e aprendizagem, articulados a três eixos norteadores, desenvolvidos a partir da Metodologia Triangular: a produção, a fruição e a reflexão (BRASIL, 2001).Por meio da Metodologia Triangular, o professor pode mediar a relação entre o sujeito e a arte, respeitando tanto o conhecimento que está sendo transmitido como o conhecimento anterior do educando, dando a ele a possibilidade de ampliar sua visão de mundo e contribuindo para seu processo de identificação cultural.
Conclusão Sabendo que a Dança e a Música trabalham não somente o corpo, mas também a mente e o espírito, por meio das múltiplas práticas e metodologias, evidenciadas neste artigo, podemos perceber que essas duas áreas de conhecimento conseguem alcançar dificuldades ímpares, tais como, as dificuldades de concentração, de aprendizagem e de relacionamento com o outro e consigo mesmo. Pelo despertar da sensibilidade, da afetividade e da criatividade, pode-se trabalhar de maneira lúdica, autônoma e prazerosa. Deveria ser natural que a Arte ocupasse lugar de destaque no contexto escolar, uma vez que é justamente aí que ela vem sendo posta em uma espera de menor importância, mesmo com a Lei 9.394/96, que no artigo 26 torna obrigatório o ensino de Arte na Educação Básica, e com a Lei 11.769/08, que dispõe sobre a obrigatoriedade do ensino de Música, também, na Educação Básica.
Referências BARBOSA, Ana Mae. Arte e educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2008. 137p. BARRETO, Debora. Dança: ensino, sentidos e possibilidades na escola. 3.ed. Autores Associados, 2008. 170 p. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: arte. 3. ed. Brasília: MEC/SEF,
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
71
Renatha de Carvalho Maia, Gabriela Carolina Rosa, Miriam Cely Caetano de Castro, Thamy Caroline de Souza, Darsoni de Oliveira Caligiorne
2001. 130p. ______. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. CHIARELLI, Lígia Karina Meneghetti; BARRETO, Sidirley de Jesus. A importância damusicalização na Educação Infantil e no Ensino Fundamental: a música como meio dedesenvolver a inteligência e a integração do ser. RevistaRecre@rte, s.l., n. 3, jun. 2005. Disponível em: <http://www.iacat.com/revista/recrearte/recrearte03/ musicoterapia.htm>. Acessoem: 09 jun. 2013. DALCROZE, Émile Jaques-. Le rythme, La musique et l’èducation. Lausanne: FoetishFrères, 1965. 178p. DEL BEN, Luciana. Avaliação da aprendizagem musical dos alunos:reflexões a partir das concepções de três professoras de música do Ensino Fundamental. In: HENTSCHKE, Liane; SOUZA, Jusamara (Orgs.). Avaliação em música: reflexões e práticas. São Paulo: Moderna, 2003. p. 29-40. EFLAND, Arthur D. Imaginação na cognição: o propósito da arte.In: BARBOSA, Ana Mae (Org.). Arte/educação contemporânea: consonâncias internacionais. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2010. p. 318-344. FONTERRADA, Marisa Trench de Oliveira. De tramas e fios: um ensaio sobre música eeducação. 2. ed. São Paulo: UNESP; Rio de Janeiro: Funarte, 2008. 364p. GAINZA, Violeta Hemsy de. Fundamentos, materiales y técnicas de la educacíon musical. Buenos Aires: Ricordi Americana, 1977. 88p. GODOY, Shirley Alves et al. Oficina de sensibilização musical:uma experiência dosprofessores da educação hospitalar de Londrina. In: IX CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO – EDUCERE – III ENCONTRO SUL
72
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
As contribuições do ensino de arte: dança e música na formação do sujeito crítico sociocultural
BRASILEIRO DE PSICOPEDAGOGIA. 2009, Curitiba. Políticas e práticas educativas: desafios da aprendizagem. Curitiba, 2009. p. 5191-5203. KATER, Carlos. “Por que música na Escola?”: algumas reflexões. In: JORDÃO, Gisele; ALLUCCI, Renata R.; MOLINA, Sérgio; TERAHATA, Adriana Moritello (coords.). A música na escola. Ministério da Cultura e Vale. São Paulo: Allucci & Associados Comunicações, 2012. p. 42-45. OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Rio de Janeiro: Vozes, 1977. 187p. RIBEIRO JÚNIOR, João. O que é o positivismo. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Coleção Primeiros Passos, 72). 78p. STOKOE, Patrícia. Expressão corporal na pré-escola. Tradução de Beatriz A. Canabrava. São Paulo: Summus, 1987. 148p. SWANWICK, Keith. Musical Knowledge: intuition, analysis and music education. London: Routledge, 1994. 208p. TEIXEIRA, Inês de Castro. Os professores como sujeitos socioculturais. In: DAYRELL, Juarez. (Org.). Múltiplos olhares sobre educação e cultura. 2. ed. Belo Horizonte: UFMG, 2001. p. 179-194. VICTÓRIO, Márcia. O Bê-a-bá do Dó-Ré-Mi: Reflexões e práticas sobre a Educação Musical nas escolas de Ensino Básico. Rio de Janeiro: Wak, 2011. 89p. WILLEMS, E. L’oreillemusicale: lapreparationauditive de l’enfant. 5.ed. Fribourg: Pro Musica, 1985. 142p.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 59-73
73
74
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA Elaine Pereira Lopes1 Marilene Sandra Guedes Silva2 Renata Faria de Oliveira3 Zilda Pinto de Oliveira4 Enelice Gomes Miconi5 Resumo O presente artigo busca identificar e compreender as expectativas dos sujeitos da EJA matriculados regularmente em instituições ligadas ao sistema municipal de ensino. Com o objetivo de dimensionar as características e expectativas do educando da EJA sobre sua formação, foram consultados diversos autores para situarmos a EJA dentro de um contexto histórico e suas transformações dentro do sistema educacional brasileiro. Constatando a diversidade de sujeitos presentes nesta modalidade de ensino, como metodologia foi elaborada uma pesquisa quantitativa e qualitativa do tipo exploratória, que proporcionou a análise dos dados. A aplicação de um questionário semiestruturado durante o trabalho de campo, as observações realizadas em estabelecimentos educacionais e conversas informais com alunos e professores possibilitaram identificar que alcançar melhores oportunidades de trabalho e a conclusão dos estudos são os principais anseios dos sujeitos da EJA. Palavras-chave: EJA, educação, trabalho, formação
Schooling and labor market: The expectations of the subjects enrolled in Youth and Adult Education Abstract This article seeks to identify and understand the expectations of the subjects enrolled in Youth and Adult Education (EJA) institutions linked to the municipal education system. With the objective to evaluate the characteristics and expectations of the EJA 1 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 2 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 3 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 4 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 5 Pedagoga, Graduada em Ciências Sociais pela UFMG, Especialista em Metodologia do Ensino Fundamental e Médio pela UEMG, Especialista em Urbanismo pela UFMG. Professora da FaE/ UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
75
Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira, Enelice Gomes Miconi
student about his schooling, many authors were consulted to situate EJA within a historical context and its transformations in the Brazilian educational system. Noting the diversity of subjects present in this type of education, methodology was developed as a quantitative and qualitative exploratory research, which provided the data analysis. The application of a semi-structured questionnaire during the field work, the observations made in educational establishments and the informal conversations with students and teachers allowed identifying achieve better work opportunities and the completion of the studies are the main concerns of the EJA subjects. Keywords: Youth and Adult Education (EJA), education, work, schooling
Introdução Segundo Freire (1996, p.14), “Formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas”. Com relação à Educação de Jovens e Adultos (EJA) pode-se afirmar, portanto, que não basta apenas desenvolver capacidades intelectuais necessárias à execução de tarefas comprometidas com o trabalho, é preciso contribuir para a construção de um ser com autonomia moral, posicionamento ético e dotado de consciência crítica. Ao longo do curso de Pedagogia da FaE/UEMG, as observações, realizadas durante os períodos de estágios curriculares, nos instigaram a ampliar a visão para além do universo da escola regular. O contato com alunos da modalidade de ensino denominada Educação de Jovens e Adultos – EJA –, em especial com aqueles que estudam no período noturno, despertou em nós grande interesse em construir nosso trabalho de conclusão do curso, realizando uma pesquisa sobre a relação desses sujeitos com o mundo do trabalho. A monografia que deu origem a este artigo foi desenvolvida ao longo de três semestres e foi apresentada em junho de 2013. O interesse pela Educação de Jovens e Adultos, por questões ligadas ao mercado de trabalho e à educação como elemento primordial para a busca de melhores condições de acesso e crescimento dentro desse mercado, foi motivo fortemente presente para a realização da pesquisa. Na perspectiva de coletar dados e informações dos sujeitos da EJA, enquanto cidadãos participantes do processo de transformação social e buscando sempre melhores condições
76
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA
de vida e inserção no mercado de trabalho, realizamos uma pesquisa no ambiente natural, onde esses indivíduos estão inseridos e que faz parte de sua rotina diária, isto é, a escola e a sala de aula. Foram identificados diversos motivos que podem justificar o retorno desses jovens e adultos à sala de aula, estando os mesmos relacionados à expectativa de conseguir a certificação escolar ou até de poder se inserir e permanecer no mercado de trabalho, dentre outros. Nesse contexto, torna-se importante conhecer bem as intenções, as perspectivas, as expectativas e o sentido atribuído por esses jovens e adultos à formação e à conclusão dos estudos na EJA. Assim, temos como objetivo adquirir maior compreensão da Educação de Jovens e Adultos e dos procedimentos para a formação, inserção no contexto sociocultural e econômico e qualificação desses sujeitos para o mercado de trabalho, dando-lhes capacidade de crescimento pessoal e profissional. Para esclarecer a questão central, apresentamos inicialmente alguns elementos que situam, dentro de um contexto histórico, a política, a economia e o mercado de trabalho, desde o Brasil colônia até os dias atuais, caracterizando a mão-de-obra do trabalhador e sua inserção no mercado de trabalho, abordando também a conceituação histórica da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, a trajetória da mesma e a luta para inserir nas políticas públicas a EJA como modalidade de ensino.
Educação de Jovens e Adultos: os sujeitos e suas expectativas O acesso à educação ocorreu a princípio por interesse das elites, pois assim os analfabetos aprenderiam a ler para poder ter o direito ao voto (Lei Saraiva/1885). Posteriormente, a partir de 1930, outro fator importante está ligado a uma grande expansão das indústrias, que para levar adiante o seu rápido desenvolvimento tecnológico, exigiam da população melhor qualificação de mão-de-obra, tendo como requisito mínimo necessário o domínio da leitura e da escrita por parte dos trabalhadores. Mas o interesse em criar escolas que fossem destinadas a jovens e adultos trabalhadores que, por algum motivo, não puderam frequentar ou concluir os estudos na idade
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
77
Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira, Enelice Gomes Miconi
própria, só começou a surgir com maior força a partir da Segunda Guerra Mundial, precisamente a partir de 1945. Nesse momento os trabalhadores participavam muito mais dos movimentos sociais e das greves em busca de novas condições de trabalho, e foi, a partir desse mesmo ano, 1945, que muitas leis trabalhistas foram criadas. Vanilda Paiva, Leôncio Soares, Maria das Neves Medeiros, Sérgio Haddad, Paulo Freire, entre outros, contribuíram para a nossa compreensão e sustentação teórica da história da EJA no Brasil. No decorrer do histórico da educação de jovens e adultos no Brasil, desde o tempo do império até os dias atuais, políticas e programas foram criados pelo governo com o intuito de reverter a situação do analfabetismo no país. Entre os principais programas e ações do governo, podemos destacar a campanha para o ensino supletivo CEAA (Campanha de Educação de adolescentes e adultos), na década de 30; a Campanha Nacional de Educação Rural, de1952, e a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo, de1958, ambas (a de 1952 e a de 1958) com o intuito de transformação social nos âmbitos educacionais e ligadas ao desenvolvimento comunitário. Na década de 60, os principais movimentos para a erradicação do analfabetismo são o Movimento de Educação de Base, criado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Movimento de Cultura Popular (MCP), implantado por Paulo Freire Com o regime de repressão militar, todos os projetos e campanhas foram extintos e substituídos pelo MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização, um projeto de proporção nacional. Vale ressaltar que as leis puderam contribuir para que a educação dos jovens e adultos se constituísse em direito, conforme estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB 5692/71 e na Constituição Federal de 1988, cujo artigo 208 declara que é dever do Estado a garantia de ensino público e gratuito nos níveis fundamental e médio, inclusive para os que não tiveram acesso ao ensino em idade própria, favorecendo então aos sujeitos da EJA. Apesar das idas e vindas dos projetos e políticas para a EJA, é importante
78
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA
salientar que as leis que asseguram a Educação pública, como direito dos cidadãos e dever do Estado, foram conquistadas ao longo de anos de resistência à ditadura e na redemocratização, incluído o momento atual. Os principais projetos da década de 90 são: o Programa de alfabetização Solidária (PAS), o Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador¬ (PLANFOR) e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA). Em 2003, foi implantado pelo governo Lula, que também o ampliou, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF). Esse Fundo tem como função a redistribuição de recursos destinados à Educação Básica, e é atualmente denominado Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização do Magistério (FUNDEB). Está em vigor e atende à Educação Básica, desde a creche até o ensino médio. No governo Lula, os programas criados para a EJA são: o Programa Brasil Alfabetizado (PBA) e o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Jovens e Adultos (PROEJA). Atualmente, pela presidenta Dilma Roussef, foi acrescido à lista de programas o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC). Ao refletirmos sobre a trajetória das políticas e lutas pela conscientização da importância da educação para jovens e adultos, percebemos que a conscientização ocorreu tanto por parte da população ao entender a EJA como direito, quanto por parte do governo ao implementar ações que colocam em prática o que determinam as leis. Identificamos uma mudança na formatação e no conceito da Educação de Jovens e Adultos, que deixou de ser vista na perspectiva das campanhas assistencialistas e não governamentais, e passou a assumir o status de direito adquirido. Percebemos que o Estado gradualmente abandona a função reparadora na formação de jovens e adultos no Brasil e busca, por meio da implementação de políticas públicas que atendam à demanda do país, garantir o acesso à educação como direito de todo cidadão. Neste sentido, os documentos de maior relevância são a Constituição Federal
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
79
Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira, Enelice Gomes Miconi
e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira. Através do referencial teórico e da pesquisa de campo, identificamos os diversos sujeitos da educação de jovens e adultos que representam e constituem a diversidade da sociedade brasileira. Conhecemos mais a fundo as desigualdades sociais e educacionais, os desafios cotidianos enfrentados por homens e mulheres e a necessidade de formas apropriadas para que os mesmos tenham acesso à educação. A EJA apresenta sujeitos com diferenças geracionais, ou seja, jovens, adultos e idosos. No campo da educação, essa diversidade de idade presente na sala de aula tem relação principalmente com a convivência, expectativas, objetivos e com a integração dos sujeitos. A forma de vida, as experiências, o cotidiano e o conhecimento de cada um articulam-se nas aprendizagens desse público. A presença de jovens que não completaram a escolaridade por evasão, exclusão ou por repetência se faz marcante na EJA, atualmente. A grande demanda de jovens pela EJA decorre principalmente da necessidade de atender às exigências do mundo contemporâneo e à intenção de ingressar no mercado de trabalho. O idoso que antes era considerado inútil, deslocado, devido a sua condição de inativo, parte para o retorno à sala de aula, com capacidade de produção. Para os idosos, a EJA apresenta-se não somente como possibilidade de escolarização, mas também de convivência e socialização, visto que a educação é um dos meios para vencer os desafios impostos aos idosos pela idade e pela sociedade, propiciando-lhes conhecimentos e oportunidade para buscar bem-estar físico e emocional. Na EJA, as relações de gênero e educação constituem-se em espaço de discussão que permite esclarecimentos da igualdade de direitos entre homens e mulheres, na perspectiva de mudar de uma concepção alienada para uma relação de valorização do sujeito-mulher, de mudança da concepção de uma sociedade de oprimidos para uma sociedade de iguais, de consciência crítica, e de mudança do conhecimento do papel da mulher na sociedade. A decisão de voltar a estudar na idade adulta não é uma opção simples para a mulher,
80
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA
constitui uma luta contra valores culturais enraizados na sociedade desde os primórdios da humanidade. A EJA, para as mulheres, traz novas perspectivas, e a busca da escolarização acontece em prol de futuras melhorias nas condições de trabalho. Elas vêm criando estratégias para conciliar trabalho e família e sobressair tanto nos espaços educativos como no lar, onde muitas vezes estão exercendo as funções de chefe da família. A crise econômica faz com que as mulheres busquem fora de casa o sustento da família; fator que muitas vezes vem contribuindo para o aumento do número de mulheres na escola. Consideramos que a investigação sobre os anseios dos alunos dessa modalidade de ensino constitui assunto de grande interesse para os profissionais da área de educação em geral, da pedagogia empresarial, para gestores das políticas públicas, para os profissionais da área de Recursos Humanos e para os administradores de empresas.
Metodologia Para o levantamento de dados, utilizamos como metodologia uma abordagem quantitativa e qualitativa do tipo exploratória, com a aplicação de questionário semiestruturado de dezoito (18) questões fechadas e duas (2) abertas. As informações obtidas através de ampla pesquisa bibliográfica foram analisadas e a partir das mesmas elaborou-se uma síntese e um roteiro de trabalho que se desenvolveu em etapas articuladas, da seguinte forma: selecionados, como foco deste trabalho, estudantes no período noturno em turmas intermediárias e de conclusão do ensino fundamental, vinculados à rede municipal de ensino; leitura de livros e artigos que pudessem contribuir para a construção da pesquisa; elaboração de questionário com o intuito de coletar dados dos sujeitos para posterior interpretação e análise; conversas informais com os sujeitos alunos de EJA, professores e coordenadores; aplicação do questionário em duas instituições distintas; tabulação e análise dos dados obtidos com a aplicação do questionário. Especificamente como locais de investigação e coleta de dados, selecionamos
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
81
Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira, Enelice Gomes Miconi
uma escola da rede pública de Belo Horizonte, onde o questionário foi aplicado a treze alunos (Turma 1) que estudam em uma sala classificada como sendo do nível intermediário do ensino fundamental. O mesmo questionário foi também aplicado a vinte e três alunos (Turma 2), esses já cursando, em outro local, a conclusão do ensino fundamental. Essa turma está localizada em uma organização não governamental, que oferece parte de seu espaço para que seja oferecida esta modalidade de ensino à comunidade. Ambas as instituições atendem populações que buscam encontrar na EJA uma forma de obter a conclusão da escolarização interrompida ou iniciada tardiamente. Segundo Bogdan (1994, p.75), “os procedimentos adotados devem respeitar uma ética específica aos projetos de investigação com sujeitos humanos, onde os mesmos devem ser tratados respeitosamente e tendo sua identidade preservada.” Assim, o questionário foi elaborado exclusivamente para a coleta de informações, não tendo como objetivo revelar a identidade dos sujeitos que responderam as questões, mas apenas para se fazer o levantamento dos dados que foram analisados.
Análise de dados A comparação entre os dados aponta, em alguns casos, uma grande semelhança entre as turmas e, em outros, grandes diferenças. Mesmo não apresentando números sobre as relações étnicas dentro da EJA, foi visível a grande presença de pessoas negras em ambas as salas de aula visitadas. Ressaltamos que o levantamento de dados, que considerem a cor ou raça dos indivíduos, tem contribuído para revelar as desigualdades raciais no País, pois segundo o IBGE (2009): Em 2008, no que diz respeito à média de anos de estudo da população de 15 anos e mais, as pessoas de cor branca apresentavam uma vantagem de quase dois anos (8,3 anos de estudos) em relação a pretos e pardos (6,7 e 6,5 anos), diferença que vem se mantendo constante ao longo dos anos se comparada com as informações das pesquisas anteriores.
Em nosso estudo foi possivel observar que a quantidade de homens e
82
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA
mulheres, mesmo com a variação do numero de alunos nas turmas, indica que a proporção de estudantes do sexo masculino em relação ao sexo feminino é praticamente a mesma. Fica clara a predominância de mulheres nas turmas pesquisadas: 92%, na turma 1 e 91%, na turma 2. Considerados os jovens, adultos e idosos, quanto à idade, na turma 1, mais da metade são jovens: até 17 anos (31%), de 24 a 30 anos (23%). Na turma 2, a faixa etária é mais elevada, os adultos são predominantes e representam 43% do total. O principal motivo de abandono dos estudos está relacionado ao trabalho. Nas duas turmas, esta foi a alternativa mais assinalada: totalizando 31%, na turma 1, e 70%, na turma 2. Quando questionados sobre o motivo de retorno a escola, houve grande diferença entre as respostas das turmas 1 e 2. Na turma 1, a maioria dos alunos deseja apenas a conclusão dos estudos; na turma 2, a maioria (66%) busca terminar os estudos com o objetivo de conseguir melhores oportunidades de emprego. Nessa mesma turma, 22% dos alunos marcaram duas dentre as opções apresentadas: 18% desejam conseguir melhores oportunidades de emprego e também a conclusão dos estudos; 4%, porque receberam incentivo da família e também para conseguir melhores oportunidades de emprego.
Considerações finais A Educação de Jovens e Adultos tem uma trajetória marcada pelo direito negado ao longo da história da educação no Brasil. Com o levantamento de dados foi possível perceber que a oferta da modalidade de ensino EJA vem acrescentar e impactar a formação desses sujeitos, elevando a educação no nível fundamental. Nos relatos dos sujeitos, percebemos grande determinação pessoal para retornar aos estudos, principalmente por parte dos adultos que enfrentam questões sociais, familiares e o cansaço da jornada diária de trabalho
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
83
Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira, Enelice Gomes Miconi
antes de chegarem à sala de aula. Para as mulheres que ainda assumem as responsabilidades domésticas e o cuidado dos filhos, o peso desse retorno é ainda maior. Elas enfrentam os desafios e reconhecem a importância da escola nesse processo de mudança de paradigmas e ainda deixam claro, em suas falas, o valor que a conclusão dos estudos representa para elas: a realização de sonhos, respeito, valorização e prestígio na família e na sociedade e sucesso na carreira profissional. Essa observação possibilitou compreender como: O processo educativo pode atuar na construção das relações sociais de gênero, na (re)produção das desigualdades e como se articulam, na prática escolar, as hierarquias não só de gênero, como também de classe, raça, e etnia. (NOGUEIRA, 2006, p.75)
Ficou evidente a importância da figura do professor não só como intermediário na construção do conhecimento, mas como articulador das relações sociais que acontecem no ambiente escolar. Relações essas que vão além do processo de ensino e aprendizagem, pois ao proporcionar o espaço para a fala, estimulavam o conhecimento do outro e também o autoconhecimento, que é fundamental para que essa caminhada alcance resultado positivo. Verificamos que a afetividade entre alunos e professores apresenta-se como instrumento facilitador do fazer pedagógico. Cabe salientar que os conhecimentos e experiências adquiridos por esses sujeitos ao longo da vida são de grande valor, pois trazem a marca de sua presença em um lugar social específico e são os fundamentos que compõem suas personalidades; essas vivências consideradas tão importantes e que também irão influenciar na sua formação escolar, durante o processo de enturmação não são obervadas com a devida relevância que merecem. Os jovens e adultos que abandonaram a escola, voltaram às instituições buscando concluir seus estudos às vezes com a simples intenção de se formarem e adquirir o diploma ou ainda para obter instrumentos que possibilitem buscar melhor posição profissional, mas ainda existem os que, juntamente com a conquista de melhores oportunidades no mercado de trabalhos, querem conquistar também realização pessoal, sentindo-se pessoas
84
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA
mais felizes e realizadas, conforme foi constatado na apuração dos dados. Comprovando também que o retorno à escola é determinado, na maioria das vezes, pelo mesmo motivo que levou esses jovens e adultos a abandonarem o processo de formação escolar, ou seja, o trabalho. Em relação ao gênero, constatou-se que o número de mulheres é predominante. O reconhecimento dos direitos da mulher contribuiu para maior afirmação dela diante da família e da sociedade, almejando a superação dos obstáculos familiares e sociais e a conquista de um espaço onde possa ser valorizada como sujeito. As diversidades etária e geracional ficam claras, evidenciando na pesquisa situações opostas em relação a idades. Encontramos uma turma com predominância de adultos e a outra com a presença de um número maior de jovens, evidenciando uma mudança nesta modalidade de ensino. A juvenalização, ou seja, a presença de pessoas com idades de até 23 anos na EJA, está ligada aos processos de exclusão por evasão ou por repetência durante o processo escolar ou ainda pelo ingresso precoce no mundo do trabalho. Observamos também divergências e tensões entre essas gerações, o que esperamos se torne outro objeto de pesquisa. Está intrínseco na fala desses sujeitos que a escola representa um lugar que pode proporcionar a realização de sonhos, às vezes guardados e cultivados por muito tempo. Ao se referirem à escola, esta representa um espaço de imenso valor. Dessa forma, não é demais reafirmar que a instituição tem um papel fundamental na vida deles. Apontar os conflitos, as tensões, as dificuldades e os limites não significa deixar de perceber o caráter essencial desse espaço escolar. Ao contrário, é acreditar nas pessoas que fazem esse espaço; acreditar na construção em conjunto de uma educação que propicie a todos o direito à cidadania. O sujeito, que retorna à escola e nela permanece, deve receber da instituição não apenas os conteúdos necessários para ser capaz de garantir a certificação, exigida para suprir as exigências do mercado de trabalho, mas também ter condições de desenvolver as capacidades inerentes a cada indivíduo e indispensáveis à sua formação humana. Por meio de uma proposta humanista e cidadã, a EJA deve constituir-se como busca de uma educação
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
85
Elaine Pereira Lopes, Marilene Sandra Guedes Silva Renata Faria de Oliveira, Zilda Pinto de Oliveira, Enelice Gomes Miconi
mais completa voltada para a conscientização do valor que o trabalho tem na vida das pessoas e também na convicção de que cada indivíduo é um sujeito produtor de saberes. Destacamos também, a partir da pesquisa, a necessidade da transformação da escola para se adequar à realidade do aluno trabalhador da EJA, assim como a importância do professor com a formação adequada pra atuar na EJA. Percebemos, na prática, a amplitude do espaço escolar na vida dos alunos e a diversidade de público que busca a EJA, diversidade esta que foi se modificando com o passar do tempo. Assim, destacamos a necessidade de novas pesquisas sobre essa temática e também do aprofundamento nas informações sobre os sujeitos da Educação de Jovens e Adultos, pois professores ou alunos, homens ou mulheres, trabalhadores ou aposentados, cada categoria apresenta particularidades que merecem ser investigadas para que, cada vez mais, possamos construir um país mais justo com oportunidade para todos.
Referências BOGDAN, Roberto C.; BIKLEN, Sari Knopp. Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto, 1994. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 23. ed. São Paulo : Paz e Terra, 1996. HADDAD, Sérgio. PIERRO, Maria Clara Di. Escolarização de Jovens e Adultos. Revista Brasileira de Educação. São Paulo, nº. 14, p. 108-130, mai./ jun./jul./ago. 2000. IBGE. Sintese de Indicadores Sociais: Uma analise das condições de vida da população brasileira. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2009. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/ condicaodevida/indicadoresminimos/sinteseindicsociais2009/indic_ sociais2009.pdf> Acesso em 19/06/2013.
86
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
Formação e mercado de trabalho: as expectativas dos sujeitos da EJA
MEDEIROS, Maria das Neves. A educação de Jovens e Adultos como expressão da educação popular: a contribuição do pensamento de Paulo Freire. Recife. V Colóquio Internacional Paulo Freire, 2005. NOGUEIRA, Vera Lúcia. Educação de Jovens e Adultos e Gênero: um diálogo imprescindível à elaboração de políticas públicas educacionais destinadas às mulheres das camadas polulares. In: SOARES, Leôncio. (Org.). Aprendendo com a Diferença: estudos e pesquisa em Educação de Jovens e Adultos. 2. ed. São Paulo: Autêntica, 2006. PAIVA, Vanilda Pereira. Educação popular e educação de adultos. São Paulo: Loyola, 1987. NOVASKI, Augusto J.C. Sala de aula: uma aprendizagem do humano. In: MORAIS, Regis de (org.) Sala de aula: que espaço é esse? 6. Ed. Campinas: Papirus, 1993. REIS, Linda G. Produção de Monografia: da teoria a prática. 2. ed. Brasília: Senac DF, 2008. SOARES, Leôncio; VENANCIO, Ana Rosa. Tensões, contradições e avanços: a educação de jovens e adultos em uma escola municipal de Belo Horizonte. Educ. rev. [online]. 2007, n.29, pp. 141-156. ISSN 0104-4060. Disponível em : <http:// www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-40602007000100010&script=sci_ arttext > Acesso 14 Abr. 2013
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 75-87
87
88
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte Keli Amorim Manini de Paula1 Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira2 Pâmela Tamires Santos Queiroz3 Cíntia Maria dos Santos Carvalho4 Maria Aparecida Benedito de Faria5 Renata Schettino Canelas6 Resumo O presente artigo analisa o Projeto de Intervenção Pedagógica - PIP, implantado pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte com o objetivo de combater os altos índices de defasagem escolar, diagnosticados em alunos do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Educação. Pretendeu-se, com este artigo, contribuir para reflexões acerca da importância do aprimoramento das políticas públicas que visam a solucionar os problemas de aprendizagem nos processos de escolarização, possibilitando o sucesso na trajetória de alunos que estejam em situação de atraso escolar, levando-se em consideração que o aprender é resultado de uma série de fatores que se relacionam e contribuem ou não para o desenvolvimento satisfatório do aluno. Palavras-chave: defasagem escolar, intervenção pedagógica, processos de escolarização
Knowing the Pedagogical Intervention Project – PIP implemented by the Municipality of Belo Horizonte
Abstract
This article presents the Pedagogical Intervention Project - PIP, implemented by the Municipality of Belo Horizonte in order to combat the high rates of school delay 1 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 2 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 3 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 4 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 5 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG 6 Doutora em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da UFMG, Mestre em Psicologia Social pela UFMG. Professora da FaE/UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
89
Keli Amorim Manini de Paula, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira , Pâmela Tamires Santos Queiroz, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Maria Aparecida Benedito de Faria, Renata Schettino Canelas
presented by elementary school students from the Municipal Education Network. It is intended with this article, to contribute to the raising of reflections on the importance of improving public policies to solve the problems of learning in the schooling process, enabling the successful trajectory of students who are in a situation of slow learning, leading into account that learning is the result of a number of factors that relate and contribute or not to the satisfactory development of the student. Keywords: school delay, pedagogical Intervention, schooling processes
Introdução O presente artigo foi elaborado a partir da monografia apresentada para obtenção do grau de licenciatura em Pedagogia, cujo título é “Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte – PIP”. A pesquisa foi fundamentada no estudo de casos e na literatura que aborda diversos problemas ocorridos no processo de escolarização, perpassando pelas políticas de aceleração da aprendizagem, notadamente nas escolas da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte – RME/BH, e tem como objetivo apresentar o Projeto de Intervenção Pedagógica – PIP, desenvolvido nas escolas, como ação efetiva do Município de Belo Horizonte para enfrentamento dos altos níveis de defasagem da aprendizagem escolar, diagnosticados em alunos do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Educação. Sob a coordenação da Secretaria Municipal de Educação – SMED, o Projeto de Intervenção Pedagógica tem o intuito de auxiliar na superação das dificuldades e promover o avanço no processo de escolarização e integração dos alunos junto às turmas regulares. Seu funcionamento, nas escolas da RME/BH, foi investigado especialmente em sua articulação com os demais segmentos da escola e com as famílias dos alunos. Procurou-se ainda, com essa pesquisa, conhecer os critérios utilizados para o diagnóstico e seleção dos alunos participantes do Projeto, o acompanhamento destes durante e após o período de intervenção, bem como avaliar a importância da atuação dos professores interventores no sucesso do processo de escolarização.
90
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte
1 Fundamentação A educação brasileira tem como desafios garantir o êxito na alfabetização das crianças e propor ações efetivas de melhorias da qualidade do ensino público. O Programa de Governo, Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa – PNAIC, alerta para o fato de muitas crianças brasileiras concluírem o ciclo destinado à sua alfabetização sem que estejam plenamente alfabetizadas, o que compromete seriamente seu rendimento. De acordo com as diretrizes de orientação do PNAIC, Estar alfabetizado significa ser capaz de interagir por meio de textos escritos em diferentes situações. Significa ler e produzir textos para atender a diferentes propósitos. A criança alfabetizada compreende o sistema alfabético de escrita, sendo capaz de ler e escrever, com autonomia, textos de circulação social que tratem de temáticas familiares ao aprendiz (PNAIC, p. 17).
No entanto, para que se tenha um processo de ensino-aprendizagem eficaz, é de suma importância que se perceba e valorize as capacidades de aprendizagem do indivíduo, motivando-o e não apenas evidenciando suas dificuldades e/ou limitações. Segundo Sampaio (2000), alguns fatores como a entrada tardia na escola, as repetências, as evasões, a falta de acompanhamento da família, o despreparo dos professores e a falta de manutenção dos prédios escolares, entre outras coisas, podem influenciar negativamente no desenvolvimento dos alunos. Muitas vezes, o fracasso do educando é o reflexo do fracasso do sistema de ensino que precisa ser reformulado, de modo a criar um ambiente que valorize as capacidades inerentes ao aluno e possibilite o desenvolvimento de suas habilidades. Segundo Dorneles (2000, p.28), “A escola que pode enfrentar o fracasso escolar prevenindo-o é uma escola voltada para a diversidade, voltada para o respeito ao particular de cada um, voltada à igualdade entre os diferentes (...).” Lages (2001, p. 10) afirma ainda que durante muito tempo “as razões para Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
91
Keli Amorim Manini de Paula, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira , Pâmela Tamires Santos Queiroz, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Maria Aparecida Benedito de Faria, Renata Schettino Canelas
as dificuldades de obtenção de êxito escolar, por parte dos alunos das camadas desfavorecidas, eram colocadas no próprio aluno ou em sua família.” Contudo, Paiva (1998, p. 98), citada por Sampaio (2000, p.60), defende que: Não se trata de culpabilizar o aluno como fez parte da tradição, nem culpabilizar o professor, como tem estado na moda desde os anos 80, mas de entender a reprovação e repetência como fenômenos decorrentes de um conjunto de contradições que envolvem pais, professores e alunos num contexto de universalização e massificação do atendimento, que não foram acompanhados dos recursos necessários para que se construísse uma escola de boa qualidade.
Ainda sobre essa questão, Dorneles (1997, p. 256), citada por Enricone (2002), apresenta algumas abordagens, como a psicologicista, a biologicista, a culturalista e a antropológica, utilizadas para explicar os processos seletivos que ocorrem dentro das escolas e que têm como pressupostos a capacidade de aprendizagem, as disfunções biológicas, o ambiente cultural e as relações da criança na sociedade, respectivamente. Essas abordagens possibilitam uma análise das situações de desigualdade uma vez que permitem que o sistema educacional reconsidere seus métodos de ensino com base na percepção do aluno, como sua individualidade. Ressalte-se que é preciso considerar a criança como sujeito capaz de atuar sobre o meio no qual está inserido, porém dentro de um ritmo e tempo próprios, evitando assim, fomentar processos excludentes dentro da escola. Para tanto, Sassaki (1997) aponta que são indicadas práticas educativas inclusivas que transformem a escola e o sistema de ensino, de modo que sejam reconhecidas e respondidas as diversas necessidades dos alunos. Assim, o simples acesso à escola não é fator determinante de inclusão social. Segundo Sampaio (2000, p.61), o que muitas vezes acontece é que as situações de exclusão se traduzem, no interior das escolas, em estratégias de discriminação, rotulação e baixa expectativa em relação ao aluno em situação de desvantagem, o que faz com que este desenvolva a sensação de fracasso, baixa autoestima, rebeldia, desmotivação e acabe abandonando a escola. Ou seja, o próprio ambiente escolar, ao mesmo tempo em que pode ser fator de
92
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte
inclusão, pode também contribuir para excluir pelo não reconhecimento da individualidade do aluno. Diante dessas questões, e considerando a importância do desenvolvimento de projetos e programas de aceleração da aprendizagem que atuem nas necessidades educativas de cada estudante, o Projeto de Intervenção Pedagógica da RME de Belo Horizonte - PIP surge como parte das transformações educacionais e sociais, com estratégias metodológicas bem definidas e focadas nos desafios a serem enfrentados, a fim de consolidar as capacidades e habilidades adquiridas ao longo do processo de escolarização.
2 O Projeto de Intervenção Pedagógica – PIP O PIP foi implantado a partir da demanda das escolas da RME/BH e está inserido no Programa Metas e Resultados da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, sendo a Educação uma de suas áreas de competência, por meio do Projeto Sustentador “Melhoria de Qualidade da Educação”. O PIP se destina ao atendimento dos estudantes da RME/BH e sua organização está fundamentada nas Proposições Curriculares para o Ensino Fundamental, elaboradas pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte – SMED/BH, em 2010. Em conformidade com o Programa Metas e Resultados, o PIP propicia a formação continuada dos professores e os capacita para intervirem nas dificuldades apresentadas pelos alunos quanto à aquisição e consolidação de conceitos e habilidades nos processos de aprendizagem da Língua Portuguesa e da Matemática, buscando assim alcançar os objetivos propostos.
2.1 Objetivos do PIP O PIP tem como objetivos auxiliar no desenvolvimento integral do aluno por meio de estratégias que minimizem as dificuldades apresentadas por ele no decorrer do processo de aprendizagem da Língua Portuguesa e dos Cálculos básicos da Matemática, bem como proporcionar a consolidação das habilidades básicas necessárias para o domínio dessas disciplinas de forma autônoma.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
93
Keli Amorim Manini de Paula, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira , Pâmela Tamires Santos Queiroz, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Maria Aparecida Benedito de Faria, Renata Schettino Canelas
2.2 Desenvolvimento De acordo com o documento “Projeto de Intervenção Pedagógica: Diretrizes Para o Funcionamento em 2012” (SMED, 2012), a seleção dos alunos a serem atendidos pelo Projeto é feita, inicialmente, a partir do resultado de avaliações internas e externas (Provinha Brasil, PROALFA e Avalia BH). Aqueles que apresentam dificuldades de desenvolvimento das habilidades nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática são encaminhados aos professores interventores, com quem fazem uma avaliação diagnóstica para a confirmação ou não de sua situação, e posterior inclusão no Projeto, se for o caso. A partir das constatações pertinentes à situação do aluno, as famílias são convocadas para acompanhar o andamento dos trabalhos de reforço escolar em parceria com as escolas, para verificação do desenvolvimento do Projeto e, principalmente, para apoiar e garantir o êxito dos alunos. Após esse processo, os alunos são selecionados e organizados em subgrupos para atendimento, preferencialmente no contra turno, por professores especialmente treinados e acompanhados para essa função. Cada subgrupo de alunos é composto de 08 a 12 alunos que são atendidos em quatro dias por semana e em módulos diários com duração de 1h, pelo período de um ano ou no mínimo por um semestre. O PIP possui uma matriz de ensino própria, organizada para estudantes a partir do 3º ano do 1º ciclo, que por meio da avaliação prévia tenham sido diagnosticados como indivíduos que apresentam dificuldades no desenvolvimento das habilidades de leitura, escrita e/ou de cálculos básicos da matemática. Essa avaliação, além de selecionar o público a ser atendido pelo PIP e diagnosticar as habilidades e capacidades que precisam ser trabalhadas, possibilita o planejamento do trabalho pedagógico, uma vez que por meio dela é possível visualizar o nível de dificuldade apresentado pelo aluno. Inferimos que o êxito do PIP depende também do preparo, da motivação e do compromisso dos professores interventores, a quem é oferecida formação continuada a cada três semanas, bem como material de apoio, subsídios teóricos e orientação para a organização das aulas, assegurando as condições necessárias
94
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte
para que eles desempenhem seu trabalho com competência e entusiasmo. Outra possibilidade dos encontros de formação é a troca de experiências e vivências entre os professores. A formação precisa garantir ainda o aprofundamento dos conhecimentos sobre alfabetização na perspectiva da interdisciplinaridade e da inclusão, como princípio fundamental do processo educativo. Como parte do funcionamento do Projeto de Intervenção Pedagógica, há uma articulação deste com o Programa Escola Integrada - PEI, que pretende abarcar os diferentes projetos de inclusão social desenvolvidos pelo Município, dentre eles o PIP. Essa articulação possibilita a ampliação da carga horária dos estudantes e contribui para a melhoria da qualidade da educação através da ampliação da jornada escolar e segundo as dimensões afetiva, ética, estética, social, cultural, política e cognitiva.
3 Análise dos dados Para se proceder ao levantamento dos dados sobre o funcionamento do Projeto de Intervenção Pedagógica na RME/BH, foram realizadas entrevistas com roteiro prévio semiestruturado, numa abordagem fundamentalmente qualitativa, incluindo relatos informais da Coordenadora Geral do PIP e de dez professores interventores de Língua Portuguesa e Matemática, de seis Regionais do Município de Belo Horizonte.
3.1 Implantação do PIP De acordo com as informações obtidas nas entrevistas, constatou-se que o início do projeto remonta a 2006, quando a Secretaria Municipal de Educação realizou uma pesquisa, na RME/BH, a fim de diagnosticar a real situação das escolas quanto ao quantitativo de alunos que se encontravam com defasagem na aprendizagem e quanto aos níveis de dificuldade apresentados por eles. Como resultado dessa pesquisa, verificou-se que boa parte dos alunos não dominava a leitura e consequentemente a interpretação de textos; bem como não conseguiam resolver cálculos básicos de matemática. Percebeu-se,
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
95
Keli Amorim Manini de Paula, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira , Pâmela Tamires Santos Queiroz, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Maria Aparecida Benedito de Faria, Renata Schettino Canelas
então, a necessidade de implementação de um projeto de intervenção que propiciasse o desenvolvimento integral do aluno e que garantisse um tempo a mais de estudos, a fim de se recuperar o atraso escolar. Em 2007, deu-se início à implantação do PIP na RME/BH, com a designação de professores para atuação junto aos alunos não alfabetizados. Porém, nesse primeiro ano de funcionamento, o Projeto não apresentou os resultados esperados, sendo apontadas várias dificuldades e limitações para o desenvolvimento dos trabalhos, tais como a falta de espaço físico adequado, grupos de atendimento com número excessivo de alunos, entre outras. Devido a esses fatores, em 2008 foram elaboradas as Diretrizes para as condições de funcionamento do PIP. Tais diretrizes são revistas anualmente, visando ao avanço nos estudos através de metodologias adequadas, por meio da assessoria de profissional habilitado e da utilização de material didático compatível com a realidade dos alunos. A partir de 2009, o PIP passou a fazer parte do programa de Governo, BH Metas e Resultados, através do Projeto Sustentador “Melhoria de Qualidade da Educação”. Hoje, cada escola possui um ou dois professores interventores nas disciplinas de Língua Portuguesa ou Matemática. A Tab.1 apresenta o panorama atual sobre o número de professores e estudantes do PIP, segundo dados obtidos junto à Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte Tabela 1 - Número de professores e estudantes do PIP – Setembro 2013 Disciplina PIP-Língua Portuguesa PIP-Matemática
Professores (as)
Estudantes
285 160
11315 6635 Fonte: GEBAS/SMED
96
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte
3.2 Os Professores Interventores O PIP é desenvolvido com a colaboração de professores das diversas disciplinas. Esses passam por formações quinzenais, para conhecimento e aperfeiçoamento das metodologias do Projeto. Nas entrevistas com os professores, buscou-se conhecer as questões relativas ao trabalho pedagógico, à relação professor-aluno e ao envolvimento da comunidade escolar, da família e dos próprios alunos atendidos pelo Projeto. Os professores afirmaram que, apesar da ocorrência de fatores externos e internos que influenciam negativamente no desenvolvimento dos trabalhos, o PIP é um instrumento relevante e de extrema importância no auxílio às dificuldades apresentadas pelos alunos. Ressaltou-se ainda a importância do acompanhamento das famílias como forma de apoio e incentivo ao desenvolvimento dos trabalhos realizados com os educandos. Também o suporte dado aos professores pela Secretaria Municipal de Educação é tido como fundamental, uma vez que, por meio de formação continuada, são trocadas experiências, orientações e material de apoio, o que viabiliza o bom andamento do Projeto nas escolas. A formação continuada auxilia o professor na elaboração das ações referentes ao planejamento do trabalho pedagógico específico para cada nível de dificuldade apresentada pelos alunos.
3.3 Os Alunos Segundo os entrevistados, o aluno atendido no Projeto de Intervenção Pedagógico da RME/BH é, basicamente, aquele que apresenta dificuldade em acompanhar a turma nas atividades regulares, em sala de aula. Para esse aluno, é oferecido atendimento individualizado, de acordo com o nível de dificuldade diagnosticado por meio de avaliação prévia. Nas entrevistas, verificou-se que, através da observação em sala de aula, o professor consegue perceber o desenvolvimento do aluno e, após o resultado das avaliações diagnósticas, pode confirmar se o aluno necessita realmente de Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
97
Keli Amorim Manini de Paula, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira , Pâmela Tamires Santos Queiroz, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Maria Aparecida Benedito de Faria, Renata Schettino Canelas
reforço em seu processo de alfabetização. Quanto ao progresso do aluno atendido no PIP, observou-se que esse é registrado em relatórios mensais e analisado por meio de avaliações orientadas pela Secretaria Municipal de Educação. Após avaliação diagnóstica, que permite a inserção do aluno no Projeto, são realizadas outras duas avaliações, sendo uma intermediária e outra final, que servem como parâmetro para a visualização dos progressos feitos pelo aluno ao longo do processo de intervenção. As condições, para que o aluno seja considerado alfabetizado e apto a retornar para a classe regular, dependem do resultado da avaliação final. Isso só acontece se o aluno demonstra compreensão e clareza de ideias na resolução das atividades propostas pelo professor interventor e pelo professor regente da turma regular.
4 Considerações finais Este estudo possibilitou conhecer o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte – PIP, que se apresenta como um eficaz instrumento de auxílio na alfabetização de alunos com defasagem de aprendizagem. Constatou-se que a eficácia do PIP deve-se, em grande parte, à contribuição do professor interventor que, por meio da orientação e apoio da Secretaria Municipal de Educação, atua ativamente na formação do aluno com defasagem de aprendizagem. Concluiu-se que o PIP, cujo foco principal está no desenvolvimento integral do aluno, tem sua atuação pensada a partir do esforço conjunto do sistema de ensino e das famílias, para que se cumpram suas metas de melhoria na educação, de acordo com as diferenças e especificidades de cada educando. Sousa (1999, p.85) afirma que Alunos submetidos a processos de exclusão e que apresentam uma imagem negativa de si tendem a melhorar o rendimento escolar e desenvolver visões mais positivas a respeito das próprias
98
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte
possibilidades, quando seu desempenho escolar é valorizado com processos de ensino adequado.
Ressalte-se que a efetiva participação dos educadores, dos familiares e do próprio educando, em parceria com o poder público, contribui para a superação dos desafios na construção de novas configurações educativas, que culminem com o direito integral à educação de qualidade a partir da inserção de novas estratégias que levem ao reconhecimento das diversidades e desigualdades culturais, sociais, políticas e econômicas. Em consonância com os dados obtidos, os gestores do Projeto percebem a fundamental importância de que todos os envolvidos no processo educativo estejam atentos às dificuldades e limitações apresentadas pelos alunos e busquem ajudá-los na superação dessas dificuldades, para que sua passagem pelo processo educativo se dê de maneira adequada à sua formação como sujeitos capazes de refletir e atuar na sociedade de forma crítica e construtiva. Reconhecer, pois, a dificuldade do aluno é considerar sua individualidade, sendo esse o primeiro passo para a formação de cidadãos plenamente alfabetizados e em condições de assumir o seu papel dentro da sociedade.
Referências CARVALHO, Cíntia M. Santos et al. Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte – PIP, 2013. Monografia Apresentada ao Curso de Pedagogia. Universidade do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG. DORNELES, Beatriz Vargas. As Várias Faces do Caleidoscópio: Anotações Sobre o Fracasso Escolar. In: Pátio Revista Pedagógica, nº 11, Porto Alegre, Artmed, 2000. DORNELES, Beatriz Vargas. Mecanismos Seletivos da Escola Pública: Um Estudo Etnográfico. In: RUBINSTEIN, Edith (org.) Psicopedagogia. Porto Alegre, Artmed, 2000. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
99
Keli Amorim Manini de Paula, Nilcimare Gonçalves Boari Ferreira , Pâmela Tamires Santos Queiroz, Cíntia Maria dos Santos Carvalho, Maria Aparecida Benedito de Faria, Renata Schettino Canelas
ENRICONE, Jaqueline R. Bianchi. Fracasso Escolar e Cidadania: O Entrelaçamento da Escola Que Temos e da Cidade Que Queremos. MesaRedonda, nº 70 – Eixo temático 2 – Didática, Currículo e Processos de Escolarização. Última atualização 2002. LAGES, Elizabeth Dias Munaier. Família e Escola na Configuração de Percursos Escolares de Alunos de Turmas de Aceleração de Aprendizagem. 2001. Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado de Educação. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Minas Gerais. PNAIC – Pacto Nacional Pela Alfabetização na Idade Certa. Disponível em <http://pacto.mec.gov.br/images/pdf/pacto_livreto.pdf>. Acesso em 13/03/2014. PAIVA, Vanilda et al. Revolução Educacional e Contradições da Massificação do Ensino. In: SAMPAIO, Maria das Mercês Ferreira. Revista Em Aberto, Brasília, v. 17, n. 71, p. 57-73, jan. 2000. SAMPAIO, Maria das Mercês Ferreira. Aceleração de Estudos: uma intervenção pedagógica. In: Revista Em Aberto, Brasília, v. 17, n. 71, p. 57-73, jan. 2000. SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997. SOUSA, Clarilza Prado de. Limites e Possibilidades dos Programas de Aceleração de Aprendizagem. Cadernos de Pesquisa, nº 108, p. 81-99, novembro/1999. SMED - Programa Metas e Resultados da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Disponível em <https://bhmetaseresultados.pbh.gov.br/>. Acesso em 22/05/2012. SMED - Secretaria Municipal de Educação. Escola Integrada. Disponível
100 Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
Conhecendo o Projeto de Intervenção Pedagógica da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte
em <Intranet.educacao.pbh/programa-projeto/escola-integrada>. Acesso 04/06/2012. SMED - Secretaria Municipal de Educação. Gerência de Educação Básica – GEBAS/SMED. Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. SMED - Secretaria Municipal de Educação. Projeto de Intervenção Pedagógica: Diretrizes para o Funcionamento em 2012. Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. SMED - Secretaria Municipal de Educação. Proposições Curriculares para o Ensino Fundamental: Introdução - Desafios da Formação. Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, 2010.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 89-101
101
102
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno Juliana Grazielle Pinto Camponêz1 Carolina Lais Nogueira de Oliveira2 Patrícia Couto Moreno Moraes3 Alice Lopes Colares4 Márcia Moreira Veiga5 Resumo Este artigo baseia-se numa pesquisa sobre a Síndrome de Irlen, que teve o objetivo de aumentar a conscientização sobre o tema e incentivar novos estudos sobre este distúrbio. Desconhecida do público em geral, a Síndrome de Irlen afeta largamente a população e é responsável por muitos casos de dificuldades de aprendizagem. Os fatos apresentados foram embasados em pesquisa bibliográfica e na análise de dados das entrevistas feitas com profissionais da educação e da saúde, que exercem seu trabalho frente a alunos com essa síndrome. Esta pesquisa faz afirmar que é indispensável o trabalho multidisciplinar junto a alunos com a Síndrome de Irlen, sendo necessário que cada profissional, das áreas da saúde e da educação, atue com suas próprias estratégias e perspectivas específicas como complementares no tratamento dado ao aluno afetado pela síndrome. Atuando assim, é possível proporcionar a esse aluno subsídios que lhe ofereçam uma educação de qualidade e lhe proporcionem destreza durante o processo de ensino-aprendizagem. Palavras-chave: Síndrome de Irlen, distúrbio neurovisual, ação multidisciplinar, dificuldades de aprendizagem
Irlen Syndrome: a multidisciplinary approach for students with learning difficulties Abstract This article is based on a research about Irlen Syndrome, which had the objective to raise awareness to the topic and to encourage new studies on this disturbance. 1 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 2 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 3 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 4 Graduada em Pedagogia pela FaE/CBH/UEMG. 5 Psicóloga Clínica e Educacional, Mestre em Educação pela UFMG. Professora da FaE/UEMG. Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
103
Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Carolina Lais Nogueira de Oliveira, Patrícia Couto Moreno Moraes, Alice Lopes Colares, Márcia Moreira Veiga
Unfamiliar to the general public, it largely affects the population and is responsible for many cases of learning difficulties. The facts presented are based on literature and on the analysis of data from interviews with health and education professionals active in their work with students with Irlen Syndrome. This research does state that a multidisciplinary approach becomes indispensable in such case, making it necessary that each professional, particularly from health and education fields, to act on his own specific strategies and perspectives as a complement to the treatment given to the student affected by the syndrome. In doing so, it is possible to provide subsidies to such a student in order to offer an education with enough quality and dexterity throughout the course of the teaching-learning process. Keywords: Irlen Syndrome, neurovisual disorder, multidisciplinary action, learning difficulties
Introdução A síndrome de Irlen é uma alteração visuoperceptual que se manifesta com fotossensibilidade, desfocamento à leitura, restrição do campo periférico, dificuldades de adaptação a contrastes, dificuldades de manter a atenção visual e cefaléias frequentes. Foi descoberta nos Estados Unidos pela Dra. Helen Irlen e, recentemente, tem sido estudada e diagnosticada, no Brasil, pela Dra. Márcia Guimarães, médica oftalmologista do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães, sediado em Belo Horizonte - MG. A pesquisa sobre a síndrome de Irlen é relevante pelo fato de a doença ser pouco conhecida no meio educacional, apesar de ser encontrada em todas as etnias e grupos sociais. Como essa síndrome afeta diretamente a aprendizagem do aluno, faz-se necessário conhecê-la e tratá-la, a fim de minimizar os históricos de fracasso escolar, ainda presentes no cotidiano da escola. O objetivo dessa pesquisa é mostrar que crianças, que apresentam dificuldades de aprendizagem, podem ter distúrbios e necessidades especiais difíceis de identificar, sendo necessária, nesses casos, a sensibilidade do professor em sala de aula, em parceria com os profissionais da saúde e da educação, para observar o comportamento, os sintomas e as limitações desses alunos. Como a Síndrome de Irlen atinge de 12% a 14% da população mundial, é indispensável que haja estudos específicos sobre esse distúrbio e que sejam
104 Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno
formadas equipes multidisciplinares capacitadas para rastrear e diagnosticar os alunos com a síndrome. Neste artigo será possível notar que a repercussão do assunto ainda é insuficiente, assim como é insuficiente a quantidade de profissionais capacitados, e pequeno o número de pessoas com Irlen que foram diagnosticadas e que estão em tratamento.
1 A Síndrome de Irlen: definição e características A síndrome de Irlen está associada a alterações no córtex visual e déficits do sistema magnocelular, o qual desempenha papel crucial na leitura, ajudando os olhos a se posicionarem adequadamente sobre cada letra e determinar a sua ordem. Nos indivíduos que possuem a síndrome, esse controle dos olhos é menos eficiente e muitas vezes se queixam de que as letras andam, fogem e mudam de lugar quando tentam ler. É uma síndrome de caráter familiar, sendo um ou ambos os pais também portadores da síndrome, em grau e intensidade variáveis. Suas manifestações são mais evidentes em momentos de maior demanda de atenção visual, em atividades que envolvem leitura por tempo prolongado. A síndrome de Irlen possui cinco subgrupos, sendo que um indivíduo pode apresentar sintomas que abranjam uma ou mais das seguintes áreas: a) sensibilidade à luz: a luminosidade causa cansaço sensorial, resultando em distorções, irritabilidade e outros sintomas físicos; b) acomodação: as páginas brancas ficam brilhantes e parecem competir com a impressão, que acaba sendo anulada. Isso resulta em diversas distorções, causando desconforto; c) distorções: as letras, palavras, números ou notas musicais perdem a clareza e a estabilidade. As distorções incluem vibração, pulsação, movimento ou borramento, podendo afetar a eficiência de leitura e compreensão; d) cognição restrita: incapacidade de ver letras, palavras, números ou notas musicais agrupados, podendo variar entre ver grupos de palavras ou perceber uma letra por vez. Pode afetar a capacidade de identificar letras corretamente, de manter a fixação, aumentar a velocidade de leitura ou passar os olhos pelo texto;
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
105
Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Carolina Lais Nogueira de Oliveira, Patrícia Couto Moreno Moraes, Alice Lopes Colares, Márcia Moreira Veiga
e) má percepção: há perda de claridade, estabilidade e dimensão dos objetos. Afeta a capacidade de seguir objetos em movimento. As dificuldades podem causar problemas com degraus, escada rolante, prática de esportes e condução de veículos. A fotossensibilidade causa distorções durante o processo de leitura e escrita. Por causa dessas distorções, o aluno com a síndrome costuma apresentar dificuldades de concentração e, consequentemente, dificuldades de aprendizagem, além de enfrentar outras dificuldades também no âmbito social e rotineiro. A síndrome de Irlen e a dislexia possuem sintomas parecidos, que acabam afetando o processo de aprendizagem da mesma maneira. Porém, são distúrbios de percepção visual diferentes. Existem alguns aspectos significativos que possibilitam a realização de um diagnóstico diferencial. Muitos sintomas apresentados pela dislexia, como alterações na percepção auditiva, escrita invertida e espelhada, pronúncia incorreta, dificuldade de aquisição da fala e escrita e déficits na compreensão de ordens verbais, não estão relacionados à Síndrome de Irlen. Do mesmo modo, a grande sensibilidade à luz não é comum nos casos dos indivíduos que possuem apenas a dislexia. Quando um indivíduo possui os dois distúrbios, o que é comum, isto é considerado uma comorbidade, e quando possui somente a síndrome de Irlen, é considerado um diagnóstico. De acordo com a Dr. Márcia Guimarães, “como os sintomas são semelhantes, o diagnóstico diferencial é indispensável para que a conduta ideal seja adotada o mais precocemente possível, uma vez que a intervenção gera benefícios nas outras áreas de processamento, como as áreas auditiva, motora e cognitiva.” A identificação da síndrome de Irlen é feita por profissionais da saúde e educação, capacitados e habilitados pelo Hospital de Olhos para realizar esse diagnóstico por meio do teste de rastreamento ou screening, que consiste em hiperexcitar o cérebro, causando grande estresse visual durante atividades propostas de leitura. No entanto, somente um oftalmologista especializado pode dar o diagnóstico. Após o teste, é possível verificar os benefícios pela
106 Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno
interposição de uma ou mais transparências coloridas, denominadas overlays, selecionadas por cada indivíduo. A overlay pode ser usada sobre o texto durante a leitura ou sobre a tela do computador, obtendo benefícios imediatos no conforto visual. Nos casos mais severos, os filtros são adaptados aos óculos, com ou sem grau, e devem ser usados em tempo integral. O alcance de ação do filtro é muito mais amplo do que o das overlays.
2 A escola diante de alunos com Síndrome de Irlen A escola vem se aperfeiçoando no atendimento às necessidades educacionais dos alunos, buscando cumprir sua função principal que é lidar com crianças e adolescentes que aprendem. No caso de alunos que apresentam dificuldade de aprendizagem, a dificuldade pedagógica logo vem à tona, requerendo muitas vezes a intervenção de profissionais especializados. Há um leque extenso de questões envolvidas no fracasso escolar, e de forma comum encontra-se a dificuldade de aprendizagem. Essa deve ser entendida como resultado de articulação de diferentes fatores, dentre eles a estrutura familiar, o sistema educacional e o contexto da criança. Além disso, a dificuldade de aprendizagem também deve ser compreendida nas múltiplas relações que ocorrem entre professor e aluno. A síndrome de Irlen é um tema que vem sendo cada vez mais disseminado na literatura, discutido em congressos e seminários por todo o Brasil, e nele muitas áreas do conhecimento estão envolvidas. Há uma discussão multidisciplinar em busca de respostas e alternativas possíveis que melhorem esse quadro, pois a realidade educacional brasileira exige urgência de ação. O aluno com síndrome de Irlen apresenta dificuldades de aprendizagem que não estão relacionadas ao seu grau de inteligência e sim às distorções visuais que o impedem de se apropriar dos processos de leitura e escrita com facilidade e clareza. Por isso, essa síndrome começa a se manifestar quando a criança realiza atividades escolares, sobretudo durante a etapa de alfabetização. O professor é um dos primeiros a identificar a síndrome e este ‘diagnóstico
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
107
Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Carolina Lais Nogueira de Oliveira, Patrícia Couto Moreno Moraes, Alice Lopes Colares, Márcia Moreira Veiga
prévio’ é de grande importância para o sucesso escolar da criança, uma vez que o educador pode tomar iniciativas e deixar que o próprio aluno apropriese de suas adaptações, contribuindo para o seu bom desempenho durante as atividades de leitura. Essas adaptações podem ser, por exemplo: observar a melhor posição de assento para o estudante de acordo com o fluxo luminoso da sala de aula, e permitir que o aluno se utilize de chapéus e viseiras. A síndrome de Irlen não é rara, e a possibilidade de todas as escolas terem pelo menos um aluno com esse distúrbio é grande. Portanto, é necessário que estejam atentas, capacitando seus profissionais e orientando pais e alunos para que os casos da síndrome sejam identificados rapidamente e as ações devidas sejam tomadas. Entender a realidade da criança que apresenta dificuldade de aprendizagem é algo importante dentro do âmbito escolar, pois é nele que esse processo é constantemente vivenciado. Boa parcela dos profissionais que lidam com o processo de ensino-aprendizagem depara-se com o desafio de como superar tais questões, já que essas não podem ser resolvidas em curto prazo e de forma técnica. Por isso, é necessário o trabalho de uma equipe multidisciplinar. Embora questões, como metodologia, currículo, qualificação profissional e questões relacionadas aos aspectos biológico, psicológico, cognitivo ou social sejam frequentemente apontadas como possíveis causas para essa problemática, a ‘culpa’ ainda é atribuída, na maior parte das vezes, aos alunos. Mesmo sabendo que grande parte da responsabilidade do ensino cabe ao professor, verifica-se que o processo de construção de conhecimento também requer esforços da criança, da família e de toda a equipe da escola.
3 A Síndrome de Irlen sob o olhar dos sujeitos investigados O presente trabalho foi estruturado e desenvolvido como uma pesquisa qualitativa de cunho teórico-empírico. A análise teórico-empírica propõe uma “interpretação de dados primários em torno do tema, com apoio bibliográfico” (TACHIZAWA, 1999, p. 41). Os procedimentos adotados nessa
108 Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno
metodologia foram entrevistas realizadas com diversos profissionais e pesquisa bibliográfica, caracterizando uma investigação desta natureza. As entrevistas com profissionais serviram como instrumento valioso para o enriquecimento do trabalho, já que o tema tratado não possui ampla fonte teórica. Essa estratégia permitiu que fossem tomados dados de profissionais das áreas da saúde e da educação: médicos e psicopedagogos que desenvolvem trabalho diretamente ligado à síndrome de Irlen. As entrevistas com profissionais que atuam na escola envolveram assistentes de apoio ao Programa Saúde na Escola (PSE), gerenciado pela Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte (SMED/PBH) e professores da rede municipal de ensino de Belo Horizonte, que possuem algum entendimento acerca do assunto, pois têm contato com pessoas com Irlen, dentro do espaço escolar. O questionário foi composto de perguntas organizadas em quatro categorias de análise: informação e formação profissional, diagnóstico, intervenção educacional e profissional, dificuldades encontradas. A partir destas categorias, os dados foram analisados, tendo como base, o referencial teórico da pesquisa.
a) Informação e formação profissional Para o desenvolvimento desse trabalho, foi necessário saber como se dá a repercussão desse assunto nas áreas da saúde e da educação. Sabe-se, portanto, que o tema ainda não é bem aceito pelos profissionais da saúde, sendo que muitos acreditam que há controvérsias. Da mesma maneira, na educação muitos profissionais ainda não aceitam a síndrome de Irlen e o assunto ainda é pouco explorado. Constatou-se que apenas as especialistas que trabalham especificamente com a síndrome de Irlen possuem capacitação adequada para tal. Dentro das escolas visitadas, nenhum professor é capacitado para realizar o acompanhamento e o diagnóstico desses casos; apenas as assistentes de apoio ao PSE são capacitadas. Verifica-se, então, que há uma carência na formação de uma equipe para este trabalho, que deveria ser multidisciplinar.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
109
Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Carolina Lais Nogueira de Oliveira, Patrícia Couto Moreno Moraes, Alice Lopes Colares, Márcia Moreira Veiga
b) Diagnóstico O diagnóstico da síndrome de Irlen ocorre através do Teste de Rastreamento (IRPS), executado por um examinador capacitado pelo Hospital de Olhos. Um questionário é previamente aplicado ao paciente. O teste consiste em causar stress visual durante uma atividade de leitura, enquanto as reações e falas são observadas. Poucos profissionais da escola conhecem este processo. Para que não haja equívocos no diagnóstico da síndrome, faz-se necessária a realização de diagnóstico diferencial. Nenhuma das profissionais da escola sabia como é feito o diagnóstico diferencial, e poucas especialistas souberam explicar como ele é realizado, assim como estabelecer a diferença entre a dislexia e a síndrome de Irlen. A literatura sugere que estes são distúrbios diferentes e que, às vezes, podem estar associados em uma mesma pessoa, apresentando comorbidade, e que a fotossensibilidade é o único sintoma presente apenas na síndrome de Irlen. Portanto, o diagnóstico diferencial nestes casos é uma tarefa complexa, que requer profissionais especializados para realizá-lo.
c) Intervenção educacional e profissional Cada especialista exerce uma determinada função frente à pessoa com síndrome de Irlen. Nas escolas municipais de Belo Horizonte, assistentes do Programa Saúde na Escola (PSE) são responsáveis por rastrear a síndrome, fazer o pedido das overlays ao Hospital de Olhos, e orientar os pais e os professores do aluno com síndrome de Irlen. Os professores devem seguir as orientações das assistentes e procurar estratégias que facilitem o aprendizado e a adaptação desse aluno em sala de aula. Além disso, cabe também ao professor estar atento aos demais alunos e às suas dificuldades com leitura e escrita, observando os comportamentos e sintomas que apresentam, facilitando o processo de identificação de novos casos da síndrome na escola.
110 Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno
Os psicopedagogos, com formação adequada, têm o papel de acompanhar pacientes em fase escolar com dificuldade de aprendizagem, devido à presença do distúrbio visual, como também acompanhar o tratamento e o progresso da pessoa com Irlen depois do diagnóstico. O médico, devidamente capacitado, é responsável por dar o diagnóstico definitivo em casos mais severos, extrapolando o exame feito pelo oftalmologista, estudando o nível neurológico, para saber como essa informação visual está sendo trabalhada pelo cérebro, já que essas pessoas com a síndrome de Irlen têm dificuldade com a matéria prima do sentido da visão que é a luz. As overlays e os óculos com filtros são utilizados no tratamento da síndrome. De acordo com as entrevistadas, o preço dos óculos é alto, já o preço das overlays é mais acessível. O cuidado com esses dois recursos deve ser redobrado para que a durabilidade seja estendida. Apesar de os dois métodos serem eficazes, os óculos atendem a outras necessidades além das atividades de leitura e escrita, como dirigir, por exemplo. É importante lembrar que esses dois instrumentos devem ser trocados de tempos em tempos, já que a eficácia deles diminui, devido à acomodação cerebral. Com o objetivo de amenizar as dificuldades encontradas no processo de ensino-aprendizagem do aluno com síndrome de Irlen, foram dadas diversas recomendações aos mesmos, tais como: cobrar o uso das lâminas, respeitar as necessidades específicas de cada pessoa com Irlen, trocar a folha branca pela reciclada, o quadro branco pelo negro, deixar que usem borracha sempre que precisarem, disponibilizar tempo maior para realização de atividades, principalmente as que envolvem leitura e escrita, aumentar o espaço entre as linhas e o tamanho das letras, usar lápis mais forte, evitar cadernos com enfeites em volta, espaçar mais o texto, dentre outras. É necessário também que os professores observem as adaptações que podem proporcionar o melhor conforto para a criança durante as atividades escolares, observando sempre a luminosidade de cada ponto da sala, o melhor posicionamento do aluno e sempre perguntando a ele se precisa mudar ou manter alguma coisa, deixando que ele utilize suas próprias estratégias para
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
111
Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Carolina Lais Nogueira de Oliveira, Patrícia Couto Moreno Moraes, Alice Lopes Colares, Márcia Moreira Veiga
chegar ao conforto visual, como por exemplo, permitir o uso do boné. Adotar estratégias diferenciadas de avaliação, sem muita escrita; avaliação feita oralmente, essa foi outra adaptação sugerida pelos sujeitos da pesquisa.
d) Dificuldades encontradas Quando um aluno passa pelo processo de rastreamento e se descobre que ele tem a síndrome de Irlen, os profissionais da escola passam a enfrentar algumas dificuldades, tais como, o perigo de confundir o distúrbio com outro parecido, a falta de formação e orientação para lidar com esse aluno, a demora na entrega das overlays, a falta de espaço adequado para a realização do rastreamento e a falta de credibilidade e aceitação da síndrome por parte de muitos professores, que acabam não dando importância às necessidades especiais do aluno com Irlen. Os especialistas também costumam encontrar em suas respectivas áreas de atuação algumas dificuldades ao lidar com a pessoa com a síndrome. Em alguns relatos, percebe-se que não há dificuldade no tratamento da síndrome, mas como costuma ser identificada tardiamente, a criança apresenta problemas de aprendizagem associados à mesma. Outras dificuldades enfrentadas pelas especialistas são: a falta de aceitação e de credibilidade da parte dos oftalmologistas acerca do assunto, a falta de credibilidade dos pais desses alunos e a falta de unidade entre os diversos profissionais, pois o trabalho multidisciplinar realizado a tempo com o aluno com Irlen é essencial. Muitas famílias, por falta de conhecimento acerca da síndrome, também dificultam a aprendizagem das crianças, sem cobrar o uso e o cuidado com a overlay ou não fornecendo o apoio de que necessitam. Os alunos com esse distúrbio visual também costumam lidar com outras dificuldades que lhes são impostas. A maior dificuldade que enfrentam é durante as atividades de leitura e escrita. Também apresentam grande agitação e desconcentração. Em casos moderados e severos podem apresentar dificuldades espaciais, tais como subir e descer escadas ou jogar bola. Quanto
112 Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno
à questão social, essas crianças costumam ser aceitas pelas demais, mas muitas ainda têm vergonha de usar a lâmina em sala de aula. Mesmo aceitando o aluno com síndrome de Irlen, os demais colegas se sentem incomodados com a sua agitação durante as aulas. Quando não conhecem essa doença, professores e alunos acabam rotulando o aluno com Irlen como burro ou indisciplinado. É importante lembrar que todas essas dificuldades impostas à pessoa portadora de Irlen não se restringem apenas ao período escolar, mas se estendem por sua vida adulta, apresentando-se no âmbito social e familiar, na vida acadêmica e na carreira profissional.
4 Conclusão A síndrome de Irlen, recentemente descoberta e de grande incidência na população mundial, é um distúrbio visual pouco conhecido no Brasil. Trata-se de um distúrbio visual que prejudica um percentual considerável de pessoas, cerca de 10 a 14% da população mundial, prejudicando seu desempenho no trabalho, na escola e na universidade. Merece atenção maior por parte dos profissionais da saúde e da educação no que se refere à sua atuação frente aos alunos com essa síndrome. No que concerne à atuação dos profissionais da educação, é importante que conheçam a síndrome de Irlen, para que os sujeitos acometidos por essa doença possam ter direito ao apoio especializado durante o processo de ensino e aprendizagem, tendo acesso ao atendimento multidisciplinar. Assim, as informações e orientações fornecidas às escolas por esses profissionais pode tornar possível a conquista de um acompanhamento escolar adequado, recebendo o aluno com síndrome de Irlen os insumos necessários para sanar as dificuldades encontradas na aprendizagem. Sabe-se que a conscientização e o respeito às diferenças são as principais maneiras de incluir as pessoas na sociedade e que a escola é o espaço fundamental na formação de cidadãos. Por isso, a escola deve tomar iniciativas, por menores que sejam, para proporcionar melhor aprendizado,
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
113
Juliana Grazielle Pinto Camponêz, Carolina Lais Nogueira de Oliveira, Patrícia Couto Moreno Moraes, Alice Lopes Colares, Márcia Moreira Veiga
satisfação, bem estar e elevar a autoestima das pessoas com Irlen. O professor tem um papel relevante na identificação e acompanhamento dos alunos que apresentam a síndrome de Irlen, fornecendo o apoio pedagógico de que necessitam para prosseguir sem atropelos em sua trajetória escolar, minimizando assim os problemas de aprendizagem associados à síndrome. É necessário dar continuidade às pesquisas sobre a síndrome de Irlen, a fim de ampliar os estudos acerca do assunto. É importante incentivar os professores a conhecerem a síndrome, através de cursos e palestras, para que eles possam ter uma formação específica sobre o tema. É preciso também que haja mais publicações no país que abordem o assunto, e que se torne mais acessível a produção nessa área, produção que ainda é escassa, sobretudo no que concerne à área educacional. Fazem-se necessários mais estudos e pesquisas, tornando essa deficiência mais conhecida, principalmente no meio acadêmico e entre os profissionais da educação. Mas, para isso é preciso que haja primeiramente uma interação entre as áreas da saúde e da educação, para que juntas possam incentivar e fornecer um maior conhecimento a todos os profissionais, minimizando assim as dificuldades escolares encontradas pela pessoa com síndrome de Irlen.
Referências GUIMARÃES, M. (2009). Distúrbios de aprendizado relacionados à visão. Revista Fundação Guimarães Rosa, Belo Horizonte, nº 4, p. 16-19, 2009. GUIMARÃES, Márcia. Síndrome de Irlen. Disponível em: http://www. dislexiadeleitura.com.br/downloads/artigo.dra.marcia.revista.sindrome.pdf. Acesso em 7 de novembro de 2012. IRLEN, Helen L. Escala Perceptual de Leitura Irlen (EPLI) - Manual de Tarefas. 1987-2009. Traduzido e publicado por Dra. Márcia Reis Guimarães e Ortopedista Mabel Moreira Gomes. Revisão em março de 2010 pela Equipe do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães.
114 Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
Síndrome de Irlen: atuação multidisciplinar diante das dificuldades de aprendizagem do aluno
KAPPES, Dany; FRANZEN, Gilson; TEIXEIRA, Glades; GUIMARÃES, Vanessa. Dislexia: As muitas faces de um problema de linguagem. Disponível em: HTTP://www.profala.com/artdislexia18.htm. Acesso em: 15 de março de 2012. TACHIZAWA,Takeshy. Monografia de análise teórico-empírica. In: TACHIZAWA, Takeshy, MENDES, Gildásio. Como fazer monografia na prática. 12. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.
Caderno de Educação - n. 47 - Junho 2013 - p. 103-115
115
Caderno de Educação - Diretrizes para autores Linha editorial O Caderno de Educação é um periódico científico, com o objetivo de publicar artigos, a partir de reflexões sobre a educação em diálogo com outros campos do saber, sobretudo aqueles ligados à escola pública. É uma publicação da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais - FaE/UEMG. As propostas para publicação devem ser originais, não tendo sido publicadas em qualquer outro veículo do país e devem ser classificadas em uma das seguintes modalidades: • Artigos derivados de trabalhos monográficos produzidos por estudantes de graduação em Pedagogia da FaE-UEMG • Artigos derivados de trabalhos monográficos produzidos por estudantes de Pos-graduação lato sensu da FaE-UEMG • Ensaios: estudos teóricos, com análises de conceitos; • Resultados de pesquisa: texto baseado em dados de pesquisa; • Estudos bibliográficos: análise crítica e abrangente da literatura sobre tema definido; • Relatos de Experiência; • Resenhas de livros da área educacional publicados há menos de três anos; • Ponto de Vista (entrevista) A publicação é disponibilizada em versão impressa e divulgada também na página da Faculdade de Educação: fae.uemg.br Processo de avaliação dos artigos Os textos recebidos serão apreciados inicialmente pela Comissão Editorial e os que estiverem de acordo com as normas do Caderno de Educação serão encaminhados aos membros do Conselho Editorial ou para pesquisadores de diferentes instituições de ensino e pesquisa, por eles indicados como pareceristas ad hoc, em função da competência no tema/assunto do artigo avaliado, garantindo-se o processo duplo cego.
116
Após o processo de avaliação, os autores são notificados. Os artigos aprovados incondicionalmente são diretamente enviados para publicação. Caso o texto dependa de modificações, as alterações propostas são enviadas aos autores, que decidem se concordam em empreendê-las, de acordo com as sugestões do conselheiro ou parecerista ad hoc, no prazo a ser definido pelo editor. As modificações introduzidas no texto deverão ser grifadas para efeito de verificação pelo editor. Apresentação dos manuscritos Ao enviar o texto para o Caderno de Educação, o autor compromete-se a não encaminhá- lo para outro(s) veículo(s) de publicação pelo prazo de seis meses, a contar da data do envio. Aceitam-se artigos em português e espanhol. As propostas devem ser submetidas via internet, pelo endereço: caderno.faeuemg@gmail.com O texto deverá seguir as normas da Associação Brasileira de normas Técnicas (ABNT) e apresentar as seguintes características: a) Artigo/ Ensaio/ Estudo Bibliográfico: entre 4000 e 6000 palavras; b) Resultado de pesquisa: entre 4000 e 6000 palavras; c) Relato de experiência: entre 3000 e 4000 palavras; d) Resenha: entre 1200 e 2000 palavras; e) Entrevista: entre 2500 e 4000 palavras; f) Título: com, o máximo, 20 palavras, no idioma do artigo e em inglês g) Resumo: com, o mínimo de 100 palavras e, no máximo, 150 palavras no idioma do artigo e em inglês. h) Apenas para submissão de artigo: de três a cinco palavras-chaves no idioma do artigo e em inglês. i) As notas de rodapé: devem ser usadas somente quando estritamente necessário para algum esclarecimento. j) Ilustrações: tabelas, quadros e gráficos devem ser inseridos no texto com títulos e legendas em acordo com a ABNT.
117