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Conto do Falo
from Falo Magazine #32
Praia Grande
Ele seguiu caminhando pela areia, para trás ficaram a música e as risadas dos bares cheios, à frente apenas o rumor das ondas distantes e o piscar das estrelas em uma noite sem lua, nos dedos um resto de um baseado que logo se acaba. Passadas as dunas, finalmente ele avista o mar; à direita e à esquerda a praia se estende até o infinito, talvez dê para seguir para um dos lados e chegar ao Pólo Norte ou ao Pólo Sul, ele pensa nas mal estudadas aulas de geografia e no professor careca que contava histórias fascinantes sobre o mundo; escolhe um lado. O lado que ele conhece bem. No mar, longe, as luzes dos barcos de pescadores. É noite de pesca das lulas, elas vêm ansiosas aos milhares, encantadas pelas luzes fortes dos barcos e se enlaçam, aprisionadas nas redes. Na areia deserta, aos poucos ele consegue perceber um ou outro vulto, espalhados, um ou outro vulto com uma brasa entre os dedos, um cigarro ou um baseado, talvez uma lata de cerveja já quente pela espera. Ele está com sede. Pensa nas lulas, encantadas pelas luzes, e ele também está encantado pela brasa de cigarros ou baseados nas mãos dos vultos. Não vai até eles, se mantém à distância. Sente sede, vontade de fumar, mas não se move, olha para o mar, para os barcos. Do mais escuro alguém se aproxima, uma voz rouca pergunta se ele tem fogo. Acende o baseado que o outro trouxe, fumam juntos, mijam, riem, logo estarão aos beijos e abraços e carícias sem nome, depois o gozo sem dono, como se a lua que finalmente se levanta sobre as nuvens não fosse a promessa de um novo mundo sobre a praia onde aportam os barcos. Ele sabe que se for até um dos barcos, nem precisa entrar muito fundo no mar, no raso mesmo onde batem as ondas, e se ele ajudar os pescadores a puxar as redes carregadas, depois ganha algumas lulas ainda vivas e brilhando como membros recém amputados de tritões, ganha o que dá para levar e chegar em casa onde todos já devem estar acordando, o sol nascendo, ele feliz com a vida e com o resultado da pescaria, basta temperar com limão e sal e pronto.
Conto inédito do escritor e artista visual Jozias Benedicto.