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EDUCAÇÃO RURAL Á EDUCAÇÃO DO CAMPO: BREVE ANALISE A PARTIR DA REGIAO SUDOESTE DO PARANÁ Carla Cattelan1 João Paulo Danieli2 Resumo: O presente artigo faz uma breve análise histórica do processo de criação das Escolas Rurais no sudoeste do Paraná, pós desmembrar de Clevelândia, bem como estas escolas se desenvolveram mediante a luta pela posse de terra e o processo de modernização da agricultura. Perpassando pelas principais discussões a cerca da educação do campo, com fins específicos de valorização da identidade do homem do campo. Tenta-se relacionar a educação rural especifica desta época histórica as discussões que se desenvolveram para se chegar à educação do campo e para o homem do campo. Palavras chave: Educação rural, nuclearização, modernização da agricultura e educação do campo.

Introdução O estudo objetiva reconstituir brevemente a trajetória da educação rural do Sudoeste do Paraná, mediante a instituição dos municípios desmembrados de Clevelândia, a partir do ano de 1951. Analisando a organização educacional diante de um contexto de luta e apropriação do espaço territorial feito pelos posseiros e apoiados pela CANGO (Colônia Agrícola General Osório)3 no intuito de colonizar a região. Perpassando a luta dos posseiros na intitulada “Revolta dos Colonos” e a construção das escolas neste contexto, o apoio da população e as ideias progressivas do homem do campo para a instrução elementar dos seus filhos. A agricultura até então de subsistência, tomou outra direção, quando efetivamente se incorpora a modernização, o Governo oferecia aos agricultores “pacotes agrícolas” que idealizavam uma agricultura já aos moldes da industrialização. Com estes “pacotes” direcionados a modernização da agricultura, o Governo favorece os grandes proprietários de terras que se instalaram nestas regiões. Os pequenos agricultores que até então, viviam da agricultura de subsistência, investiram em maquinários e insumos e acabaram endividados, empenhorando suas terras aos bancos. Com a industrialização crescente, o homem do campo, sem condições de competir com os grandes proprietários de terra, na maioria das vezes vinha para os centros urbanos em busca de melhores condições de vida, vendendo sua mão de obra para empresas que se instalavam na região, garantindo o sustento de sua família. 1

Mestranda do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE - Francisco Beltrão). Especialista em Filosofia e sociologia pela FACEL/FAMPER (2011). Graduada em Pedagogia pela UNIOESTE (2009). E-mail: cahhh_cahhh@hotmail.com. 2 Mestrando do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação pela Universidade Estadual de Maringá – UEM. Especialista em Filosofia e sociologia pela FACEL/FAMPER (2011). Graduado em Filosofia pelo Instituto Filosofico Berathier – IFIBE (Passo Fundo 2004). E-mail: joaopaulojb@gmail.com. 3 Em 1943 o Presidente Getulio Vargas cria a Cango intitulada General Osório, através do decreto nº 12417.


O êxodo rural era crescente na região e com o êxodo rural acarreta o fechamento de algumas escolas multisseriadas por falta de alunos e professores, outras, porém foram nuclearizadas à escolas mais próximas, ou seja, os alunos transferidos a uma escola já incorporada ao sistema seriado de ensino. Devido à passagem de uma agricultura de subsistência para uma agricultura de acumulação do capital e industrialização da região, se exige um sistema de ensino especifico para atender as reais necessidades emergentes na sociedade em desenvolvimento econômico, do qual acelerou o processo de nuclearização das escolas rurais multisseriadas, por não atenderem as necessidades especificas da mão de obra profissional e industrial. Incorpora assim, as escolas rurais, o ensino seriado e a centralidade deste ensino em núcleos, onde o município os pudesse manter. Em meio a este processo, no final da década de 1990 surge as discussões desenvolvidas pelos movimentos sociais ligado ao campo a fim de valorizar a identidade do trabalhador do campo e construir uma educação que viesse ao encontro de sua própria realidade, por meio do projeto “por uma da Educação do Campo. Breve histórico da construção educacional no Sudoeste do Paraná O processo de construção histórica educacional do Sudoeste do Paraná vem diretamente ligado ao processo de ocupação territorial e a luta dos posseiros pelo sustento de suas famílias. Migrantes vindos, principalmente dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, procuravam um lugar que desce condições para atender as necessidades básicas de suas famílias. Através da política de “desinchaço” dos centros urbanos, o presidente Getúlio Vargas, em 1943 inicia a política da “Marcha para o Oeste”, com intuito de colonizar o interior do Brasil. Cria neste mesmo ano a CANGO na região do Sudoeste, que foi uma das principais responsáveis pela colonização da região, pois dispunha de lotes de terras gratuitos as famílias migrantes, além disso, disponibilizava sementes e ferramentas para o plantio e agricultura, mais tarde a CANGO cria os primeiros hospitais e as primeiras escolas. A Colônia agrícola General Osório (CANGO) mantinham em funcionamento regular, na área afeta a sua administração, algumas escolas isoladas, atendendo, embora precariamente, á demanda da população rural cadastrada em seu escritório (MARTINS, 1989, p.193.

Com a crescente colonização, surge à necessidade de educar os filhos dos posseiros, e esta necessidade emergente é uma necessidade básica, própria do homem do campo. Como o Estado e nem tanto o município tinham condições financeiras para a construção destas “casas


escolares”, a comunidade muitas vezes se reunia e construía a escola. Nas palavras do prefeito em exercício, de Francisco Beltrão, no ano de 1953, Rubens da Silva Martins, coloca: a exígua arrecadação municipal e o alto custo dos materiais de construção inviabilizavam, em 1953, qualquer projeto de obras públicas, forçando-me a recorrer à comunidade para, num mutirão sem precedentes, edificar as primeiras casas escolares do Município. Praticava-se, portanto, já naquela época, o que nos dias atuais se convenciono chamar de democracia participativa; só que a participação popular ultrapassava a prerrogativa de opinar e escolher, constituindo também em trabalhar e contribuir materialmente para o bem comum. O povo escolhia em assembléias a céu aberto, os locais onde deveriam ser construídas as escolas públicas, e se organizava em grupos aos quais se atribuíam incumbências especificas: fornecimento de cepos de madeira de lei, de tabuas e de caibros; mão de obra especializada e braçal. O comercio e a indústria forneciam, geralmente, a madeira beneficiada, as ferragens e asseguravam os fretes; o Município contribuía com o material de cobertura (telhas, vindas de longa distancia), esquadrias e o “papo” do prefeito (MARTINS, 1989, p.199).

As chamadas escolas rurais eram basicamente padronizadas, obedecendo a dois padrões, as que comportavam um espaço para a morada do professor e outra que dispunha apenas da sala de aula, banheiros e cozinha. As classes eram multisseriada, ou seja, classes que comportavam de 1º a 4º ano em uma única sala e com o mesmo professor. Mesmo a escola não organizada diretamente para uma educação íntegra do homem do campo, mantinha sua função formadora, alfabetizadora e aproximando o homem do ambiente letrado. Em meio a luta pela posse de terra, a educação foi se desenvolvendo, enraizada a moldes revolucionários desenvolvidos pelo homem do campo, em defesa de suas terras e de sua família em meio as injustiças promovidas pela CITLA4 (Clevelândia Industrial Territorial Ltda) e pelo Governo de Moises Lupion, que se posicionara contra os posseiros, devida sua ligação direta com a CITLA. Esta luta contra a ideologia da classe burguesa age intrinsecamente ligada ao sistema educacional rural, onde as crianças traziam experiências concretas para a sala de aula. O sistema educacional rural era contraditório, se por um lado alfabetizava os filhos dos agricultores ensinando o básico, por outro não incorporava questões puramente rurais, especificas do campo. Modernização da Agricultura e o processo de nuclearização das Escolas Rurais Com a permanência do homem no campo, o Governo Federal intensifica programas e pacotes agrícolas de “apoio” a agricultura, buscando instaurar uma nova fase da agricultura brasileira e na região Sudoeste do Paraná. Esta ação do governo vai mudar radicalmente as bases

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A entrada da Clevelândia Industrial territorial Ltda (CITLA) na transação comercial das terras do Sudoeste do Paraná efetuou-se em 26 de julho de 1950. Nesta data José Rupp cedeu seu credito à CITLA. Portanto, de julho de 1950 o Poder Público deveria pagar a indenização não mais a José Rupp, e sim à CITLA (Lazier, p.48, 1998).


da produção e o manejo do trabalho agrícola, que antes era basicamente de subsistência, agora passa a desenvolver com conotação comercial e industrial. Dentro da perspectiva do desenvolvimento econômico, no processo de Industrialização brasileira, o campo também foi incluído como prioridade a partir do programa “Revolução Verde”. Segundo Duarte, A “Revolução Verde” foi um mecanismo determinante de inserção do campo brasileiro na lógica do capital industrial e bancário nacional e internacional, e acontece à medida em que o Estado Nacional cria condições para a mudança das bases tecnológicas da agricultura brasileira (propaganda, crédito, assistência técnica, armazenamento, comercialização e industrialização), forçando-a inserir-se subalternamente na dinâmica do mercado, tanto quanto ao processo produtivo quanto em relação aos insumos industriais utilizados na produção (2003, p.18).

O programa Extensão Rural5 executado pela ACARPA (Associação de Crédito Rural do Paraná, depois EMATER) no estado do Paraná foi o órgão responsável para executar no Estado e na região Sudoeste os pacotes educacionais de ordem técnica, para ajudar os agricultores no processo de modernização da agricultura. Exemplo disso, em meados de 1968, a ACARPA fazia relatórios, levantava dados e diagnósticos da agricultura da região Sudoeste e depois levava para o setor educacional do estado6 (DUARTE, 2003, p. 44). A industrialização estava se desenvolvendo em toda a região, a construção de fábricas necessitava mão de obra adequada e qualificada, o sistema multisseriado desenvolvido nas escolas rurais, já não atendia o pretendido pela industrialização regional. Mediante este processo tomam-se algumas medidas para o “fortalecimento” e centralização da educação, a nuclearização. As escolas multisseriadas rurais foram fechadas e nuclearizadas a escolas mais próximas, passando a incorporar um sistema seriado de ensino, com matérias especificas na grade curricular. Os municípios passaram a disponibilizar transporte escolar para estes alunos freqüentarem a escola seriada. Enquanto a lei de diretrizes e bases de 1961 nº 4024 garantia o direito a educação, e com a educação garantida em lei caberia ao Estado e a União tornar esta educação acessível, houve um crescente aumento na construção de escolas rurais, fez com que a educação chegasse a praticamente todos os segmentos rurais. Porém com a LDB nº 5692 de 1971, esta passa a

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Segundo Leite, terminada a II Guerra Mundial, a Política externa dos Estados Unidos (EUA), criou a CBAR (comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações Rurais). O objetivo era implantar projetos educacionais na zona rural e o desenvolvimento das comunidades campestres; através de centros de treinamentos (para professores, que depois repassariam as técnicas aos rurícolas), realização de semanas ruralistas (debates, encontros, dia de campo, etc) (1999, p. 31-32). Um dos objetivos da extensão rural era levar a modernização/ou o pacote de industrialização para o meio rural. 6 Segundo Duarte, este trabalho da ACARPA tinha outra finalidade, era analisar a viabilidade da modernização da agricultura da região (2003, p. 45).


priorizar o ensino técnico e a extensão da educação para incorporar moldes da educação tecnicista, assim observasse uma diminuição na criação de escolas na zona rural. A luta dos Movimentos Sociais pela garantia da Educação do Campo A partir deste contexto contraditório do qual a educação rural vinha se desenvolvendo, uma educação escolar adequada ás exigências da cultura urbana-industrial, os movimentos sociais ligado ao campo, começam a pensar uma educação do campo e as possibilidades de manter os trabalhadores no campo. A educação rural no Brasil7 desde as primeiras leis, programas e projetos sempre foi pensadas a partir das referencias da cidade, ou como um mecanismo de suporte para uma sociedade desigual. Ela nunca foi pensada para a classe interessada, para os trabalhadores do campo. Por isso, que os movimentos sociais ligado ao campo reivindicaram, a partir de suas lutas uma educação que seja pensada para os trabalhadores do campo e construída a partir de suas realidade, a do campo. As primeiras discussões sobre a educação do campo aconteceram em 1997 no I encontro nacional de educadores e educadoras da reforma agrária (ENERA), em Brasília. Desde encontro se propôs para o próximo ano em 1998 a I Conferência Nacional “Por uma Educação Básica do Campo”. Antes da Conferência Nacional, aconteceu as Conferências Estaduais. Na Região sudoeste vamos ter a I Conferência Regional de Educação do Campo, em setembro de 2001 em Dois Vizinhos8. Tendo como grandes objetivos,

Tornar visível as questões relativas a Educação do Campo e sua implicação para o desenvolvimento Regional, possibilitando a reflexão do que é o campo, qual o projeto de Desenvolvimento do campo e onde a dimensão da Educação se coloca neste projeto; afirmar politicamente um espaço regional que tenha condições (fundamentos, conhecimentos, inserções nas praticas) para abrigar, dar fluxo e encaminhamento a questões da educação do campo na região, compondo um coletivo – Articulação Regional – que encaminhe as questões do desenvolvimento e Educação, a partir das organizações e espaços existentes na região (CADERNO nº 1, 2002, p.06).

O projeto por uma Educação do Campo, luta dos movimentos sociais na busca de construir uma educação voltada para os trabalhadores do campo, é um novo momento histórico que marca a educação brasileira, é “o nascimento de um projeto de educação protagonizada pelos 7

Contrapondo-se ao rural como negação histórica dos sujeitos que vivem do trabalho da/com a terra, esses movimentos ressignificam a si mesmos, enquanto sujeitos políticos coletivos, e à sua educação, negando o rural e assumindo o campo como espaço histórico da disputa pela terra e pela educação (RIBEIRO, 2009, p. 39). 8 A I Conferência de Educação do Campo no Sudoeste aconteceu dentro de uma proposta Regional de introduzir o debate, “Educação e Desenvolvimento”. Teve como referencia as ações desenvolvidas pelas Casas Familiares Rurais, a Formação de Monitores (trabalho realizado pela ASSESOAR e os STRs), Escola Comunitária de Agricultores – ECAs (ASSESOAR), e o Programa de Formação de Professores do Projeto Vida na Roça em Jacutinga, distrito de Francisco Beltrão.


trabalhadores e trabalhadoras do campo e suas organizações sociais” (ARROYO, CALDART, MOLINA, 2009, p. 07) Os movimentos sociais populares rurais/do campo que, nas suas lutas, propõem-se a romper com século de políticas de expropriação/proletarização e dominação do campesinato brasileiro, inserem a educação do campo em projeto popular de sociedade, no qual a emancipação humana é o horizonte para o qual se orienta a sua caminhada (RIBEIRO, 2009 p. 189).

Os trabalhadores do campo têm o direito de ser educado no lugar onde vive. Eles têm direito a uma educação pensada dede seu lugar e com a participação vinculada a sua cultura e as suas necessidades humanas e sociais. E a Educação do Campo consegue afirmar-se para os povos do campo, como uma relação de pertença de algum lugar. È a partir dessa pertença que o ser humano elabora a sua consciência e o seu existir neste mundo. Portanto, a construção de uma Educação do Campo reivindicada pelos movimentos sociais deve passar no campo das políticas públicas, “porque esta é a única maneira de universalizar o acesso de todo o povo do campo à educação” (PARANÁ In.: CALDART, 2008, p. 27). Pois o povo tem o direito de ter sua educação, “No: o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada a sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais” (CALDART, 2002, p. 25-26). Considerações finais Procurou-se fazer uma breve análise histórica da Educação Rural e da Educação do Campo no sudoeste do Paraná até se chegar as primeiras discussões da incorporação de uma escola que de fato atendesse aos fins específicos do campo e propusesse um currículo para esta prática de valorização da identidade do homem do campo, sem que a escola deixasse de cumprir sua função primordial, que é transmitir o conhecimento acumulado historicamente, através de uma prática pedagógica condizente com este homem. O fato é que, alguns determinantes históricos contribuíram dialeticamente para este processo de ruptura com a ideologia proposta pela classe dominante, fez com que a escola, com o passar do tempo e mediada pelas discussões dos movimentos sociais, tomasse caráter mais autônomo, no que se refere a Educação do Campo, destinada ao homem do campo, porém sem ser diferente e sem perder a sua função especifica enquanto escola.


Referências Bibliográficas

ARROYO, M. G. CALDART, R. S. MOLINA, M C (Orgs). Por uma Educação do Campo. 4ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. CADERNOS: Educação e Desenvolvimento. Nº 1 – I Conferencia Regional de Educação do Campo. Sudoeste do Paraná. Dois Vizinhos: ASSESOAR, Novembro de 2002. CALDART, CERIOLI e KOLLING (orgs). Educação do campo: identidade e políticas públicas. Coleção “Por uma educação do campo”, nº 4. Brasília, DF: articulação nacional “Por uma Educação do Campo”, 2002. DUARTE, Valdir P. Escolas Publicas no campo: problemáticas e perspectivas. Francisco Beltrão – PR: Grafit, 2003. LAZIER, Hermógenes. Análise Histórica da Posse da Terra no Sudoeste Paranaense. 3ª ed., Francisco Beltrão: Grafit, 1998. LEITE, Sergio C. Escola Rural: urbanização e políticas educacionais. Coleção questões da nossa época. Nº 70. São Paulo, SP: Cortez, 1999. MARTINS, Rubens S. Entre jagunços e posseiros. 1ª ed. Curitiba: 1986. PARANÁ. Diretrizes Curriculares da Educação do Campo. Secretaria de Estado da Educação - SEED. – Curitiba: SEED-PR, 2006. RIBEIRO, Marlene. Movimento camponês: trabalho e educação.1ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010.


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