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Bernardo Souto
OPINIÃO Bernardo Souto | Consultor Jurídico de Meio Ambiente da Fecombustíveis
Ao emitir uma licença, até onde pode ir o órgão ambiental?
Sem dúvida alguma a pandemia acelerou o uso intensivo da tecnologia. Tal fato imprimiu agilidade aos processos de licenciamento ambiental. Isso não é uma unanimidade, pois o Brasil é um país grande e cada estado e município tem a sua peculiaridade. Entretanto, se de um lado a tecnologia facilitou os processos, de outro acirrou os desentendimentos. A falta de contato e a ausência de diálogo entre o empreendedor e órgão licenciador tem gerado muitos transtornos, para todos os envolvidos, na exata medida em que se exige da empresa licenciada muito mais do que seria devido, considerando a finalidade última do licenciamento ambiental.
Então, como funciona o processo de licenciamento ambiental? Para que ele existe? Breve e objetivamente, o licenciamento ambiental existe para controlar os impactos ambientais negativos. E, neste sentido, pode-se dizer que licenciar e controlar. O controle ambiental está no cerne do processo de licenciamento, que segue a seguinte ideia: primeiro apura-se os aspectos ambientais, para cada um deles aponta-se o respectivo impacto (que pode ser positivo ou negativo) e, para cada impacto, impõe-se o correspondente controle. E, por fim, esses controles estão apresentados nas condicionantes das licenças ambientais.
Então, as condicionantes nada mais são, ou deveriam ser, do que medidas de controle ambiental, relacionadas intimamente aos impactos ambientais negativos, decorrentes exclusivamente da atividade a ser licenciada. Dessa forma, a condicio-
nante deve guardar uma ligação íntima com
o impacto ambiental (efetivo ou potencial) que a atividade desempenha. Deve, ainda, ser proporcional a esse impacto. Toda condicionante deve vir acompanhada de fundamentação técnica, que demonstre os dois elementos acima, uma vez que a administração se submete aos princípios do art. 37, caput, da CR/88.
O empresário ou seu advogado, ao questionar determinada exigência ambiental, deve investigar se estão presentes esses três elementos acima destacados. Por exemplo, a caixa separadora de água e óleo gera efluentes, que podem impactar o meio ambiente. Logo, é razoável exigir o seu monitoramento. A mesma lógica vale para, por exemplo, o teste de estanqueidade, como medida preventiva de detecção de vazamentos.
Situação completamente diferente é pedir para uma empresa que existe há mais de 50 anos no mesmo local e que está em processo de renovação de sua licença de operação que implante rede pública de coleta de esgoto. Detalhe, no local em que a empresa funciona, não existe rede coletora de esgoto e executar essa obra demanda implantar a rede com mais de 2 km de extensão, em terreno público. Neste caso particular, o poder público desbordou de sua função, pois, além de ser desproporcional ao impacto, a legislação admite a solução individual de saneamento, conforme preconizado na Lei 11.445/2007, modificada pela Lei 14.026/2020. Em outras palavras, sob o pálio da regularização ambiental de uma única empresa, o poder público está exigindo que o particular execute a rede pública de esgotamento de praticamente um bairro inteiro.
É impressionante a quantidade de exigências ambientais que ultimamente estão sendo postas nos mesmos níveis da situação acima, sem qualquer relação com impactos das atividades normais de um posto revendedor. Não é função do licenciamento ambiental resolver todas as mazelas derivadas da omissão de outras obrigações públicas, tal como reparar passeios, doar placas de trânsito, plantar árvores, apresentar projetos paisagísticos e outras medidas que não se relacionam em nada, nem mesmo indiretamente, com os impactos a serem controlados pelo particular.
E, o empresário, sempre que se deparar com esse tipo de situação, deve fazer essas três perguntas: essa exigência relaciona-se com a minha atividade? É uma exigência proporcional ao impacto causado? E, por fim, o analista ambiental fundamentou essa exigência? São essas as “ferramentas” que podem auxiliar contra as medidas descabidas, que muitas vezes estão inseridas nas licenças ambientais.