SISTEMA CONSTRUTIVO EM PRÉ-FABRICADOS PARA HABITAÇÕES FELIPE LEALDINI RIGHI
SISTEMA CONSTRUTIVO EM PRÉ-FABRICADOS PARA HABITAÇÕES Felipe Lealdini Righi Trabalho Final de Graduação (TFG) apresentado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
Participantes da banca: Orientadora Anália Amorim Convidados José Eduardo Baravelli Luis Octavio de Faria e Silva
FAU-USP Fevereiro de 2019
AGRADECIMENTOS
À Anália Amorim, pela orientação, pela ajuda com o direcionamento do trabalho e pelo incentivo a seguir em frente. Aos professores convidados para a banca, José Eduardo Baravell e Luis Octavio de Faria e Silva, pela disponibilidade e pela contribuição ao trabalho. À minha mãe, Clara, por toda a ajuda, e também ao meu irmão, Caio, meu pai, Carlos, minhas avós Maria e Nilce e meu tio Maurício, por todo o apoio e carinho. Aos orientadores metodológicos, Nilton Ricoy, Alessandra Prata, João Carlos Cesar e Sheila Ornstein, pelas referências que ajudaram a moldar esse trabalho e pelo acompanhamento ao longo do ano.
Aos amigos que contribuíram com a confecção do trabalho. À Bia Mello, pelas inúmeras ajudas com os desenhos e com o texto, pela companhia e pelo apoio emocional nos momentos difíceis; à Lila, pelo tratamento das imagens e por sempre acreditar em mim; ao Nicolas, pelas fotos lindas do modelo e pela amizade com a qual sempre posso contar; à Sofia, pelos desenhos técnicos e por me inspirar a fazer sempre o melhor; ao Bibo, pela ajuda com a finalização das plantas e por todas as aventuras; ao Léo, por ceder os desenhos e fotos da Casa de Ubatuba e pela parceria em todos os momentos; ao Parabéns pelos conselhos para o projeto gráfico, e por tudo que me ensina; à Laura pelas referências, pelo material de pesquisa e pelas conversas em que
dividimos nossas aflições. Esse trabalho não seria possível sem vocês. Aos colegas da Revista Contraste, por todo o aprendizado e por tudo que conseguimos conquistar; ao pessoal da atlética, velhos e novos, pelos desafios que enfrentamos juntos e pelo acolhimento; ao time de basquete, por todos esses anos de treinos e jogos que me fizeram evoluir em aspectos que vão muito além do esporte e pelas amizades criadas; aos professores e alunos da monitoria de PEF, por me ensinarem a ensinar e a aprender ensinando, sobretudo ao professor Henrique Lindenberg. Aos Vicetrecos, ao Buzz e ao Faugurinhas, grupos de amigos queridos que fiz e com os quais dividi meu tempo de FAU, as pessoas que fazem tudo isso valer a pena.
SUMÁRIO 1. Introdução 8 2. O Repertório Estrutural de Jean Prouvé 12 3. Estudos de Caso 20 3.1. A Casa Tropical 20 3.2 A Casa dos Dias Melhores 26 4. Conceituação: A Teoria da Coordenação Modular
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5. O Sistema Construtivo: Proposta do Conjunto
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6. Subsistemas e Possibilidades de Variação 45 6.1. Núcleo 47 6.2. Piso 50 6.3. Fechamento 54 6.4. Cobertura 59 7. Casas 62 7.1. A Casa Mínima 64 7.2. A Casa da Praia 90 8. Bibliografia 104
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INTRODUÇÃO
Neste trabalho, pretende-se discutir as possibilidades de produção de habitações unifamiliares através do emprego da pré-fabricação, na busca por um sistema construtivo universal, a partir do qual seria possível criar inúmeras composições diferentes, e produzir modelos diversificados de edificações. Mais do que chegar num resultado concreto e numa proposta definitiva, o que se busca aqui é explorar as diversas possibilidades do que pode ser construído com um sistema que impõe regras necessárias para garantir a estabilidade estrutural e estanqueidade das edificações, mas que permite liberdade de composição dentro dessas regras. Ao invés de tentar chegar em dimensionamentos precisos, foi priorizada a variação, a pluralidade de soluções e a tentativa
de possibilitar o emprego de diversos materiais. Isso se reflete na priorização do desenho à mão livre e das perspectivas às plantas e cortes bidimensionais, mas que não por isso deixam de seguir a lógica construtiva, desrespeitam as características de cada material ou são falhas em sua concepção estrutural. As casas propostas aqui também não têm a pretensão de serem respostas definitivas, e nem esgotam todas as possibilidades do que se discute neste trabalho, mas servem para testar o sistema proposto e validá-lo, além de funcionarem como exemplos do que pode ser criado. O trabalho se estrutura através de análises projetuais da obra de Jean Prouvé e de um embasamento teórico sobre coordenação modular. Em seguida, discute o sistema proposto e suas alternativas e possibilidades de variação, terminando com o projeto de duas casas: uma mínima, que representa a unidade básica do sistema, e dialoga com as casas de Prouvé, pensadas como maneiras de resolver o problema social da habitação1; e uma maior, que explora as possibilidades de composição e associação dos módulos estruturais, e desafia o sistema com uma complexidade maior.
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JUSTIFICATIVA O resultado apresentado aqui vem de um processo de estudo que passou por grandes mudanças ao longo do ano de TFG. Ele começou com a ideia de trabalhar a relação entre arquitetura e engenharia, ou arquitetura e estrutura, pois, tendo feito o programa de dupla formação FAU-POLI, achou-se necessário tentar incorporar algo do que foi aprendido na Escola Politécnica num trabalho de projeto arquitetônico. Os estudos começam com os arquitetos e engenheiros que trabalham a forma arquitetônica em conjunto com a concepção estrutural. Nomes como Dieste, Candela, Niemeyer e Gaudí, que usam cascas, cúpulas, curvas catenárias e parabolóides hiperbólicas, guiaram tais pesquisas iniciais. Para eles, a estética vem da eficiência estrutural de suas formas, criando estruturas esbeltas e econômicas no emprego dos materiais. Por outro lado, esses arquitetos, por mais que atinjam uma otimização estrutural através da forma, raramente se preocupam com uma otimização nos canteiros de obras ou nos processos construtivos que envolvem essas estruturas. Muitas fôrmas, geralmente de madeira, são descartadas após serem usadas uma única vez,
1: É necessário ressaltar que o projeto dessa casa foi pensado a partir de uma vontade de trabalhar a questão estrutural e construtiva, e a problemática central não é a produção de HIS. A casa mínima é pensada como uma sugestão do que poderia vir a ser um projeto de HIS, pois entende-se que este é um problema de enorme importância, mas é preciso frisar que ela não surge acompanhada de um estudo sobre política habitacional de fato, nem se pretende enquadrar em qualquer programa social como o MCMV. Acredita-se que isso seria possível com o sistema proposto, mas requeriria estudos posteriores e com esse foco específico.
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escoramentos em excesso, necessidade de maquinário pesado e situações que colocam os trabalhadores em risco são apenas alguns dos exemplos.
Fig. 1. Primeiros estudos. Módulo do exhibition building de Pier Luigi Nervi.
Com isso, percebe-se que quando pensamos em trabalhar a arquitetura em conjunto com sua construção, não nos basta pensar na estrutura mas também nos processos construtivos da obra.
2. PROUVÉ. Conversas com Jean Prouvé, p. 46.
A partir daí, inicia–se a busca por outros nomes, como Nervi, Lelé, e Prouvé, que colocam essas questões como problemática central em suas obras. A relação da construtibilidade com a arquitetura por meio de elementos pré-fabricados fica evidente na obra de Nervi, que usa os pré fabricados como módulos com dimensões palpáveis para suas grandes estruturas. Também muito presentes na de Lelé,
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que ainda apresenta uma preocupação especial com as questões humanas e sociais dentro do canteiro de um modo que se reflete no resultado arquitetônico. Esses dois arquitetos foram referência para o trabalho, sobretudo no uso da argamassa armada ou ferrocimento. Com essa mudança de foco, escolhe-se Prouvé como principal objeto de estudo. Pelo fato do autor ser um construtor, que enxerga a arquitetura como algo a ser industrializado, ele pensa em como construir em primeiro lugar, usando sistemas estruturais interessantes e de maneira apropriada, mas sem abrir mão da qualidade arquitetônica. Prouvé acredita que o arquiteto deve saber como construir, como os elementos são produzidos na indústria e como esses elementos serão montados nos canteiros, estando presente e coordenando todos os processos. A noção de conjunto e unidade estrutural apresentada por Prouvé é de extrema importância. Seus elementos são sempre pensados em conjunto e devem funcionar juntos. Não se pode encará-los como peças avulsas e os componentes devem ser coerentes entre si. Sua preocupação em simplificar e reduzir o número de
processos também é fundamental, assim como reduzir ao mínimo a quantidade de operações no local da obra, fazendo com que cada peça venha o mais pronta possível da indústria, e pensando no tamanho dos componentes, ao mesmo tempo grandes o suficiente para reduzir ao máximo sua quantidade e pequenos o suficiente para serem carregados pelos operários ou pelo maquinário disponível. Minhas casas são muito simples, porque acredito que só se pode fazer a industrialização com um mínimo de peças. Se houver peças demais, não funciona. Parafusos, cavilhas e pinos são acessórios a proscrever. Quando há cinco mil pinos numa casa, é preciso serrar cinco mil pinos(...)As casas haviam sido concebidas para serem construídas com elementos fáceis de montar sem andaimes As peças mais pesadas exigiam apenas dois homens para o transporte, nada mais.2
O REPERTÓRIO ESTRUTURAL DE JEAN PROUVÉ
Em seu livro Arquitetura para a indústria, Jean Prouvé apresenta seu alfabeto das estruturas, no qual elenca o seu repertório de sistemas estruturais utilizados ao longo de sua obra. Começamos o trabalho investigando esse repertório, numa tentativa de compreender como o autor pensa a arquitetura e seus processos construtivos. Isso foi buscado através da leitura e análise projetual das obras classificadas pelo autor em cada uma das categorias desse alfabeto, investigando o conceito principal de cada uma. Tentou-se entender quais aspectos fundamentais caracterizam cada uma dessas categorias e o que as diferencia e também que tipos da variação podem existir dentro de um mesmo “tipo” estrutural. Ao longo da análise de diferentes obras, o
interesse principal recaiu sobre as casas pré-fabricadas, pelo modo como seus processos construtivos são muito claros e didáticos. A escala do operário dentro da obra é visível e a concepção estrutural fica aparente, de modo que se pode entender facilmente as funções de cada elemento. Enquanto alguns dos sistemas do alfabeto, como o stool e o grid variável, são interessantes pelo modo como Prouvé usa a pré-fabricação, pensa o processo construtivo e usa materiais específicos para criar estruturas leves e muito rapidamente construídas, seus sistemas estruturais em si são comuns (viga-pilar e cogumelo, respectivamente) e não apresentam grandes novidades em como obter rigidez e estabilidade. O centro de exibições de Grenoble é um exemplo
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de como ele consegue a economia do material através da boa concepção e da pré fabricação das peças: “Ela é exemplar do ponto de vista da utilização do metal e do pouco de aço que foi empregado, da pequena quantidade de peças fabricadas, e do partido que se podia tirar dessa economia.(...) Não é tridimensional, mas bidimensional.”3
Por outro lado, há ainda outra parte de sistemas que são interessantes, mas tem pouca expressividade na obra e pouca variação, como o propped, H, Vaulted, e plástico, o que limita um pouco a análise possível.
Fig. 2.1.1, 2.1.2 e 2.1.3. Centro de exposições de Grenoble e desenhos analíticos. 3. PROUVÉ. conversas com Jean Prouvé, p. 73.
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Com isso, chega-se aos três tipos de sistemas que merecem aprofundamento: pórtico(jointed) frames, casca(Shell) e núcleo(centre core). Focando nas casas unifamiliares, podemos analisar as variadas obras que fazem parte deles e compreender como se estabilizam, quais elementos, apoios e tipos de apoio garantem o equilíbrio nessas casas; quais são os esforços e como caminham as forças na casa pronta e durante seu erguimento e qual a função de cada peça. Tipo pórtico: infra estrutura com vigas longitudinais e transversais, travadas por lajes ou placas de piso metálico garantem estabilidade no plano horizontal. O pórtico, com dois apoios, em sua largura tem um braço de alavanca que garante a estabilidade no plano transversal e o encaixe com as vigas de piso necessita de alguma profundidade para que ele não tombe para o outro lado. Os pórticos, e as paredes externas transversais se solidarizam através da viga de cumeeira, criando pórticos maiores no sentido longitudinal, travando também esse plano. As paredes externas longitudinais, com vigas de borda, recebem a carga da cobertura, composta por peças que se apoiam nelas e na viga de cumeeira.
Fig. 2.2.1. e 2.2.2. Modelos unifilares bi dimensional e tridimensional da casa pórtico
Fig. 2.3. Detalhe do encaixe do pórtico na viga de piso
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Variações: As casas pórtico podem diversificar na quantidade de pórticos alinhados ao longo de seu comprimento, de modo que essa dimensão pode variar e ser aumentada com a adição sucessiva de mais pórticos. Sua largura pode apenas variar com a rigidez do pórtico e das paredes externas. Materiais: Apesar das casas pórtico geralmente terem toda sua estrutura de peças metálicas, esse sistema também foi usado em estruturas de concreto em obras de maior escala. A plasticidade do concreto permite que todos os encaixes necessários sejam moldados no próprio elemento e geralmente seu próprio peso garante que suas peças só precisem ser apoiadas umas nas outras, (fotos e desenhos do pórtico de concreto) enquanto no metal são necessários parafusos e travamentos. Fig. 2.4.1 e 2.4.2. Componente e conjunto de estrutura pórtico em concreto. Fig. 2.5.1, 2.5.1 e 2.5.3. Peças, encaixe e erguimento de viga .
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Tipo casca: estrutura funciona apenas em um plano. Uma das paredes é engastada e mais rígida. As cascas e peças de cobertura apoiam-se nessa parede e em outra parede mais leve. A estabilidade da casa vem da parede engasta que garante sozinha o equilíbrio do sistema. Variações - Como a estrutura se resolve em um só plano, seu comprimento pode variar indefinidamente com a associação sucessiva de painéis. Também é possível associar várias cascas na transversal, trocando a parede engastada por uma malha viga-pilar, fazendo o que Prouvé chama de sistema Shed.(foto fábrica de papel e desenho comparativo shell e shed)
Fig. 2.6.1. e 2.6.2. Modelos unifilares bi dimensional e tridimensional da casa pó
Materiais: Mistura entre materiais leves, como metais e madeira para as cascas e paredes apoiadas, e concreto ou pedra para a parede engastada garantem a possibilidade de aberturas nos elementos mais leves.
Fig. 2.7. Estudo de componente casca, dividido em dois para que possa ser facilmente carregado pelos operários sem a necessidade de maquinário.
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Fig. 2.8. Exemplo de estrutura Shed Fig. 2.9.1,2.9.2 e 2.9.3. Estudo de modulos de estruturas casca e shed e investigação das suas relações.
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Tipo núcleo: um núcleo rígido e com dimensões suficientes para assegurar um braço de alavanca tanto no comprimento quanto na largura garante sua estabilidade, assim como a da viga de cumeeira biapoiada nele. Paredes externas certificam o travamento global da estrutura e servem de apoio para as placas de cobertura, assim como a viga de cumeeira. Variações: Associação de mais de um núcleo permite a expansão de estrutura em qualquer um dos planos. Prouvé realiza isso usando armários estruturais como núcleos secundários associados ao núcleo principal, que é o bloco hidráulico da residência(Fig. 2.11).
Fig. 2.10.1. e 2.10.2. Modelos unifilares bi dimensional e tridimensional da casa núcleo.
Materiais: poucas variações construídas usam núcleo e vigas metálicas e permitem que os painéis das paredes externas sejam de materiais leves. No entanto, os núcleos também poderiam ser de concreto, assim como é a laje de piso: “Havíamos imaginado fachadas perfuradas com aberturas extremamente variadas, aberturas mais baixas, mais altas, de modo que dentro de certos quartos a janela ficasse à altura da cabeça quando se está deitado na cama. (...)o bloco hidráulico só não foi moldado em concreto porque não tínhamos a forma.”4
4. Prouvé, sobre a Casa Alba. Idem, p. 48.
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Além do sistema estrutural, as casas também variam em como elas trabalham a pré-fabricação e o processo construtivo. Pensando nisso, avançamos para um estudo mais aprofundado de duas casas, uma pórtico e uma núcleo, por serem os dois tipos que têm maior possibilidade de variação. A Casa Tropical, do tipo pórtico, é totalmente composta por elementos pré-fabricados e feita inteiramente de alumínio, focada na montagem rápida e que não precisa de nenhum maquinário. A Casa dos Dias Melhores, do tipo núcleo, mistura componentes pré-fabricados como peças moldadas in loco, emprega materiais diferentes e requer o uso de um guindaste. Apesar dessas diferenças, será visto como as duas fazem sentido em seus contextos e como são pensadas de maneira racionalizada. Fig. 2.11. Desenho de Prouvé sobre possibilidade de expansão de casa núcleo com a associação de armários estruturais. Fig. 2.12. Croqui da casa Alba.
ESTUDOS DE CASO
A CASA TROPICAL, 1949 As casas tropicais foram inicialmente erguidas em Brazzaville, no Congo, em 1949, como um projeto que buscava pensar em uma habitação que pudesse ser rapidamente construída, em escala industrial, montada por poucas pessoas, sem a necessidade de equipamentos e cujos componentes fossem fáceis de se transportar. Ela foi inteiramente feita com peças de alumínio e aço, de modo que todo seu processo de montagem envolve apenas encaixes e parafusos. Em 2005, um exemplar foi reerguido na universidade de Yale e, na ocasião, a casa foi erguida em 10 dias de trabalho com apenas 4 trabalhadores que nunca a haviam montado antes, mostrando como seus processos são fáceis e didáticos.
A numeração segue a ordem em que as peças são montadas e naturalmente começa do piso e vai até a cobertura e placas de vedação. Essas placas, porém, não funcionam apenas como vedação, mas também como travamentos e enrijecedores para o conjunto da estrutura. Apesar da estabilidade dos pórticos (estrutura isostática) em um plano e das vigas no outro, ainda existiriam deformações, devido aos perfis delgados do alumínio. Os painéis, como o X de uma treliça, travam o plano em que essas deformações ocorreriam. Aqui fica evidente como a estrutura pode ser mais eficiente e econômica quando todos os seus componentes trabalham em conjunto. Através desse estudo fica claro que cada peça tem várias funções e não há diferenciação entre peças de estrutura e peças utilitárias: as vigas 3B e 10, por
exemplo, apresentam trilho que além de servir de encaixe para os painéis verticais também permite que os painéis corram, criando as portas. As Hastes 6 são pilares e também elementos de fachada dos brises. Painéis e forros fazem vedação e isolamento térmicos e servem de rigidez, assim como as telhas. A redução do número de processos e encaixes é feita de modo que as peças são tão grandes quanto possível de serem transportadas de caminhão e carregadas por uma ou duas pessoas. Como efeito disso, quase todas as peças têm tamanhos e pesos próximos entre si. Com exceção de duas peças de união 5A e 6A, não existem peças pequenas: tudo o que pode vir agrupado e soldado de fábrica vem pronto e na obra é feito o menor número possível de conexões.
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A CASA DOS DIAS MELHORES, 1956 Também conhecida como Casa do Abade Pierre, a Casa dos Dias Melhores foi encomendada a Prouvé pelo sacerdote que acreditava que a crise habitacional resultante do fim da Segunda Guerra só poderia ser resolvida com a industrialização da construção. A casa deveria ser barata e se encaixar no padrão F3 de habitação, ou seja, ter cerca de 50m2. A casa toda foi projetada e construída em cerca de seis semanas. A montagem, feita em frente à mídia para chamar atenção à questão social, foi feita pelos próprios projetistas, e durou apenas 7 horas. O piso é feito de concreto moldado in loco, concretado junto a peças pré-fabricadas, também de concreto, formando uma laje abaulada, como uma bacia. No interior da casa, essa laje formava uma banqueta
em torno de toda a casa e, do lado de fora, toda a parte baixa era enterrada, rodeada por um talude de terra, que garantia isolamento térmico. Toda a estrutura das paredes e cobertura é feita com painéis de madeira, com exceção de dois perfis metálicos que percorrem todo o perímetro da casa. Um deles se encaixa numa pequena elevação presente nas banquetas de concreto e faz a conexão com os painéis da parede. O outro, analogamente, faz a conexão dos painéis com a cobertura, funcionando como uma viga ou anel de borda. Entre si, os painéis são conectados por intermédio de um perfil metálico vertical. O núcleo metálico é colocado no interior e nele se apoia uma viga também metálica. Os painéis de cobertura são
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apoiados nessa viga e nos perfis metálicos perimetrais. O núcleo metálico é a única peça que precisa ser içada com ajuda de maquinário, enquanto as outras são dimensionadas para poderem ser carregadas manualmente. A princípio, pode parecer ilógico ter de usar um guindaste para erguer apenas uma peça, no entanto deve-se pensar que a casa foi pensada para uma produção em larga escala, de modo que faria sentido usar o guindaste para rapidamente posicionar diversos núcleos em um só dia, e então montar as casas a partir disso. Como pode ser visto, comparando as duas casas analisadas, não existe uma resposta única para como se construir, e não necessariamente tudo precisa ser pré-fabricado. Como os diferentes casos mostram, é muito mais importante
considerar fatores como tempo, operações, disponibilidade de equipamentos e materiais para a definição do conjunto e dos elementos construtivos.
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Fig. 3.2.1. Estrutura e componentes da cobertura, apoio dos painéis na viga central e perfis perimentrais Fig. 3.2.2. Análise da fachada. painel parede é estruturado pelo elementos metalicos que criam uma moldura para ele. Fig. 3.2.3. Corte esquemático analisando encaixes e relação da edificação com o solo Fig. 3.2.4. isométrico mostrando os componentes da casa e seu conjunto.
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Fig. 3.2.5. Detalhe da banqueta e sua saliência que conecta com o perfil metálico. Fig. 3.2.6. Conexão das paredes externas com a cobertura, através do perfil metálico perimetral. Fig. 3.2.7. encaixe do núcleo com a viga central.
CONCEITUAÇÃO: A TEORIA DA COORDENAÇÃO MODULAR Além dos estudos projetuais, também se buscou embasamento teórico para auxiliar no desenvolvimento da etapa propositiva. Apesar do que se pôde aprender com Prouvé, cada uma de suas casas tem um sistema próprio, específico para aquele contexto, vãos e materiais. Entendeu-se que a leitura de estudos que abordam a pré-fabricação de maneira mais genérica seriam positivos na hora de elaborar um sistema que precisa atender possibilidades de variação e criar composições diferentes.
de projeto e são mencionados durante o seu desenvolvimento, considerou-se necessário apresentar aqui ao menos alguns mais importantes.
Para isso, estudou-se e Teoria da Coordenação modular, através do autor Teodoro Rosso. De fato, muitos conceitos apresentados pelo autor foram utilizados durante o desenvolvimento do sistema e subsistemas. Tendo em vista que esses conceitos permeiam o raciocínio
O primeiro é o de industrialização aberta, a ideia de que a industrialização de um sistema e seus componentes não sejam restritos a uma empresa ou um caso específico, mas que se deve criar regras, normatizações e padronizações e através disso possibilitar que diferentes
“A industrialização aberta ou por componentes se propõe a eliminar os principais inconvenientes assinalados, mediante a produção em escala de componentes pré-fabricados permitindo a variedade da edificação/ produto final através da permutabilidade dos produtos intermediários e da variedade se seu repertório”.¹
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indústrias possam criar componentes que sejam compatíveis entre si. Entendese que se existe a intenção de criar um sistema construtivo global, ele precisaria se enquadrar dentro da industrialização aberta. Assim, o mais importante não é chegar ao desenho definitivo de cada elemento, mas sim estabelecer seus subsistemas e elementos e como eles se combinam entre si, para que posteriormente outros agentes possam produzir as peças explorando inúmeras variações. Para que isso seja possível, é preciso garantir a possibilidade de permutabilidade entre essas peças: “Permutabilidade ou intercambialidade é uma propriedade que permite utilizar componentes diferentes numa mesma posição ou componentes iguais em posições diferentes. Ao substituirmos um componente por outro diferente devemos ter certeza não apenas que o desempenho individual seja idêntico mas também que a qualificação do espaço não seja alterada.(...) É oportuno observar entretanto que a permutabilidade deve ser procurada no âmbito de cada família de componentes que podem ser considerados subsistemas de um sistema maior constituído da edificação.”² A permutabilidade é a qualidade do sistema que permitiria o uso de diferentes materiais e que possibilitaria a customização de casas de mesmo modelo. Ela deve ser buscada, visto que através dela seria possível fazer com que a construção fosse viável em qualquer ambiente, adaptando o sistema para usar os elementos disponíveis naquele contexto. Isso seria possibilitado pela definição do modo como os elementos e
subsistemas interagem entre si, através da padronização dos seus encaixes: “Entretanto ao contorno, cada componente pode ser associado a outros que desempenham funções diferentes, pertencentes a subsistemas diferentes. Chamamos a essa propriedade de correlação e é estabelecida definindo-se as condições de reciprocidade, as quais devem ser identificadas organizando os componentes em subsistemas no âmbito de cada um, relevando as interfaces de acordo com todas as alternativas possíveis de posicionamento.”³ “A compatibilidade associativa ou mecânica é conseguida através da normalização das juntas. É notório que aumentando o tamanho dos componentes, diminui o número e a extensão das juntas, mas aumenta sua complexidade. Em tese, para a padronização das juntas podem ser sugeridas várias alternativas, a saber: Padronização do contorno mediante um quadro de seção constante e junta universal, sem funções mecânicas, passível de incorporação em qualquer tipo ou família de componentes; Utilização de adaptador ou acessório (curinga) funcionando como terceiro componente ou componente complementar para a compatibilização de juntas diferentes; Concepção de perfis complexos, visando permitir várias combinações; Concepção para cada componente de várias faces potenciais de associação.” 4 5. ROSSO, Teoria e prática da coordenação modular, p. 8. 6. Idem, p. 10. 7. Idem, p. 11. 8. Idem, p. 9.
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O conceito de correlação é importante pois se faz pensar não apenas na ideia óbvia de que os elementos diferentes devem se associar entre si, mas em como isso é feito e quais deles de fato se associam ou não. Dependendo do desenho dos subsistemas, pode-se tentar priorizar que cada elemento se encaixe a um mínimo de outros elementos para simplificá-los, ao passo que em momentos pode ser preferível que um elemento se apoie em mais peças, por razões estruturais, ou ainda que seja possível apoiar um componente em componentes variados, dependendo da configuração desejada. Além disso, pensar essas interfaces considerando todas as alternativas possíveis de posicionamento é fundamental para que o sistema global de fato proporcione diversas possibilidades de composição.
A definição exata de quais multi-módulos seriam usados, por sua vez, foi feita utilizando os conceitos de módulo função, módulo forma e módulo objeto: “Se em cada ambiente o homem realiza uma ou mais atividades, o espaço que o define deve ser o mínimo necessário e suficiente para a perfeita realização dessas atividades. Chamamos de estudo da disposição física à definição desse espaço. Se quisermos quantificar e medir esse espaço podemos recorrer a uma unidade de medida à qual podemos chamar de módulo. (...)Posto que esse módulo mede o espaço unitário alocado a uma atividade o chamaremos de módulo-função.” 6
Os conceitos da coordenação modular também foram utilizados para definir as dimensões e modulações do sistema, estabelecendo medidas padrão através do módulo básico e seus multi-módulos:
“O envoltório desse espaço também deve ser geometricamente e fisicamente definido. Chamamos de dimensionamento a essa definição e o espaço comprometido deve ser o mínimo suficiente para abranger completamente o invólucro e permitir que este desempenhe todas as funções previstas. Por analogia também podemos nesse caso utilizar para o dimensionamento uma unidade de medida que também chamamos de módulo, mas a distinguimos do anterior com o atributo “forma”. “No ato da compatibilização estabelece-se a congruência entre os dois módulos (...) e resulta uma terceira categoria de módulo que chamamos de módulo objeto.” 7
“Esta distância é o decímetro.(...) Seu símbolo universal vai ser a letra M.(..)Alguns chamam de módulo básico.(...) De nossa parte, sugerimos a série 3M, 6M, 9M, 12M, 15M(...). O uso destes multi-módulos, embora não seja imprescindível, encerra duas vantagens: facilita o projeto nas suas diferentes fases e efetua uma seleção de medidas dos componentes.” 5
A partir da investigação do módulo função para atividades da habitação, foi possível obter medidas que serviram de parâmetro para todo o sistema proposto. No entanto, quando se analisa cada componente individualmente, vemos que eles não podem sempre ter as medidas exatas dos multi-módulos . Ao passo que os conceitos de
A padronização das juntas também é essencial para que a correlação possa ocorrer adequadamente, e as diferentes alternativas elencadas por Rosso são exploradas nos subsistemas propostos.
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módulo função, forma e objeto possibilitam o dimensionamento do conjunto, utilizou-se os conceitos de medida modular e medida coordenada para dimensionar os componentes.
(figura 4.1.)exemplo de medidas coordenadas e modulares. No primeiro caso, em que os painéis de vedação se encaixam diretamente, a medida coordenada é maior que a modular. No segundo, em que os painéis são unidos através de um terceiro componente, a coordenada é menor que a modular.
“[medida modular] É a medida igual a um módulo ou a um múltiplo de módulo.(...) Por razões construtivas ou funcionais pode acontecer que um componente tenha uma medida não modular, embora ele possa ser contido num espaço modular. É o caso por exemplo de tijolos que são agrupados em conjuntos de dois ou três para ocupar um espaço modular. Pode acontecer que pelas mesmas razões um componente exceda o espaço modular teórico que lhe é reservado. Nos dois casos as medidas não modulares são classificadas de coordenadas.” 8
9. Idem, p. 24. 10. Idem, p. 3. 11. Idem, p. 5. 12. Idem, p. 30-31. (figura 4.1.)
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Por fim, fica a questão de como posicionar esses elementos com suas medidas coordenadas na malha modular criada para o sistema completo. Os conceitos relacionados à locação foram fundamentais para solucionar isso, pois quando se tem diversos componentes e suas interações, é preciso decidir como eles se posicionam em relação aos seus eixos: os estruturais, sobre os quais ficam as vigas e pilares, e os modulados, que não necessariamente estão na mesma posição dos estruturais. “Fundamentalmente temos quatro opções principais de locação em relação à quadrícula modular de referência: locação pelo eixo modular, locação pela faixa ou zona modular, locação assimétrica, locação lateral.
No primeiro caso, também definido como posição simétrica, o eixo de simetria do componente coincide com a linha da quadrícula modular de referência. No segundo caso, o componente é locado entre duas linhas da quadrícula modular de referência com as faces coincidindo com essas linhas. No terceiro caso o componente está locado pelo eixo modular, ou linha de quadrícula modular de referência, mas esta não coincide com o eixo de simetria do componente. A excentricidade é geralmente sub-modular. A locação lateral representa um caso particular de locação pela faixa, apenas verificandose a coincidência de uma das faces do componente com a linha modular. A outra face fica compreendida na faixa a uma distância da outra linha geralmente sub modular, dependendo da espessura do componente.” 9 De fato, todas essas formas de locação foram usadas em algum momento no desenvolvimento da proposta. Esse trabalho de conceituação permitiu que a etapa de desenvolvimento do sistema fosse mais clara e ajudou a orientar e justificar algumas decisões tomadas.
13. Idem, p. 48 Figura 4.2. Corte esquemático. Nesse exemplo, a viga central e a da esquerda estão locadas de maneira assimétrica, a laje da esquerda está locada por faixa modular, a laje da direita, viga da direita e painéisparede estão em locação lateral e os pilares estão locados pelo eixo modular.
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O SISTEMA CONSTRUTIVO: PROPOSTA DO CONJUNTO CONCEPÇÃO ESTRUTURAL “ Para mim, é sempre necessário propor um conjunto e não um pedaço (...) A minha ideia é que se devia propor coisas completas, do mesmo modo que um fabricante de geladeiras ou de automóveis fabrica um objeto completo. Todos os elementos que o constituem são, em princípio, coerentes entre si, se harmonizam, se ajustam. É daí que se deve partir para criar variações. (...)Eu apenas soube como fazer variações, e sabia fazê-las porque tinha compreendido a questão, o que levava a uma variedade muito grande. Unidade estrutural e variação dos elementos.” ¹
1. PROUVÉ. Conversas com Jean Prouvé, p. 38.
O sistema proposto parte de uma concepção estrutural inspirada pelas casas pórtico e núcleo. A partir da concepção estrutural, cria-se o conjunto, e depois se definem os subsistemas e componentes. O conceito do sistema é reunir as áreas molhadas em um bloco hidráulico e usálo como núcleo estrutural. Esse bloco é apoiado numa estrutura de piso, e nele se apoia a estrutura da cobertura. As paredes externas da casa servem como fechamento e também ajudam a receber a carga da cobertura.
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Semelhante aos das casas de Prouvé, o núcleo é estável em si. Se tiver comprimento suficiente nos dois sentidos, possibilita que vigas se apoiem em duas de suas extremidades, criando o braço de alavanca resistente e garantindo a estabilidade da estrutura. O módulo estrutural básico seria o núcleo com duas vigas. (fig. 5.1.1.) Apenas com esses elementos já seria possível colocar uma cobertura apoiada nas vigas e definir uma estrutura mínima. Nesse caso, as vigas estariam em balanço, de modo que sofreriam com um grande momento fletor negativo(fig. 5.2.1), intensificado pelo fato de que o balanço verdadeiro a ser considerado seria a diagonal do núcleo ao ponto mais distante das duas vigas. Para obter uma estrutura mais eficiente, são necessárias associações. A primeira possibilidade seria apenas adicionar as paredes. (fig. 5.1.2) Essa conformação já aumenta a possibilidade de vão pois, como as vigas passam a apoiar também nas paredes, suas condições de contorno passam a ser do tipo apoio-engaste, o que diminui muito o valor absoluto do momento fletor por trabalhar tanto o negativo quanto o positivo.(fig. 5.2.2) As paredes passam a receber também a carga da cobertura, e a estrutura começa a trabalhar como uma retícula, de modo que pode-se pensar os vãos das vigas se tornam os vãos verdadeiros da estrutura, e não há mais preocupação com as diagonais.
acima, fig 5.1.1. e fig 5.2.1., abaixo fig 5.1.2. e fig 5.2.2.
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Se o núcleo for muito linear e tiver apenas uma dimensão suficiente para apoiar uma viga em dois ponto, de modo que uma viga apoiada na sua transversal não consiga se estabilizar, ele precisa necessariamente se associar a outra estrutura. Isso pode ser feito com outro núcleo, fechando um pórtico nesse plano (fig. 5.1.3.), criando a outra possibilidade de módulo estrutural básico, com vigas também em balanço nas extremidades, ou apenas uma viga biapoiada entre os núcleos (fig. 5.2.3). Outra possibilidade seria associar um núcleo delgado às paredes(fig 5.1.4.) para estabilizar seu plano transversal, deixando a viga nesse plano como um apoio-engaste e passando a trabalhar também como uma malha. (fig diagramas de momento 5.2.1. 5.2.2. e 5.2.3). A partir desses módulos estruturais, considerando que eles já são estáveis individualmente, é possível fazer qualquer combinação, agrupandoos até se conseguir a forma desejada para a edificação. fig. 5.3 - exemplo de possibilidade de composição.
acima, figura 5.3..
acima, figura 5.1.3..
acima, figura 5.2.3..
acima, figura 5.1.4..
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Para a estrutura da cobertura, podemos usar painéis que trabalham em uma ou duas direções. Como serão usados painéis pré-fabricados para a cobertura, pode-se considerar que eles são suficientemente rígidos para vencer seu maior vão sem precisar de vigas secundárias. Desse modo, no caso de usarmos painéis que trabalham em uma direção, poderíamos remover as vigas em uma direção, considerando que elas estão sendo substituídas pelos painéis, e manter apenas uma que passa a ser uma viga de cumeeira. fig 5.4 - lajes de cobertura substituem a viga transversal. Assim, podemos compor as casas, considerando uma estrutura mais linear com um telhado de duas águas, fig. 5.5.1 ou uma mais quadrada, usando painéis que se apoiam nos dois sentidos como abóbadas de aresta ou domus. fig 5.5.2 (figuras. 5.5.1 e 5.5.2 - exemplos de composição com cobertura em um e dois sentidos.)
acima, figura 5.4..
abaixo, figuras 5.5.1. e 5.5.2, respectivamente
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abaixo, figuras 5.6..
MEDIDAS E MODULAÇÃO Para definir as dimensões e a modulação do sistema, pensou-se em criar módulos função que compreendessem os equipamentos que seriam ligados a esse núcleo estrutural, como pias, bacias sanitárias, tanques e chuveiros; e o espaço necessário para uma pessoas utilizálos(figs. 5.6). Para isso, foi utilizado multimódulo de 3M, ou seja 30cm.
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Definidas essas medidas, criou-se um série de possibilidades de blocos hidráulicos que poderiam ser compostos com elas. Ao invés de definir apenas um bloco como módulo objeto, a composição final do núcleo foi deixada em aberto,
entendendo-se que vários modelos de núcleo podem ser produzidos e que ele pode variar, desde que suas dimensões respeitem essa modulação 3M, sem deixar de ser compatível com o sistema. (fig. 5.7)
acima, figuras 5.7..
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Em seguida, definiu-se os subsistemas, sendo eles o núcleo, o de piso, o fechamento e a cobertura. Definiu-se um multi-módulo maior de 12M (1,20m) para modulação de painéis de fechamento, piso e cobertura, que se tornou também a modulação estrutural do sistema. Por fim, foram definidos os componentes de cada subsistema, e as correlações entre eles. Tentou-se minimizar as interações entre subsistemas diferentes, para facilitar as juntas. O subsistema de piso, por exemplo, só tem interface com o de fechamento pelas vigas de borda. Desse modo, as lajes de piso são locadas pela faixa modular, para garantir que o espaço interno da casa seja de fato o da modulação estrutural, os painéis e pilaretes (se forem usados) do fechamento são locados na lateral da faixa modular, sempre para fora da modulação, e as vigas de borda, com isso, tem uma locação assimétrica. De maneira semelhante, o núcleo interage com o piso através das lajes, sendo locado sobre o eixo modular, para garantir a congruência entre a modulação das peças e a da estrutura, e com a cobertura pelas vigas centrais (de cumeeira). Assim, as conexões entre subsistemas são padronizadas, mas podem variar entre peças de cada subsistema. Desse modo, os subsistemas são compatíveis em conjunto, mas também tem certa autonomia para modificações e variações dentro deles, sem interferir na permutabilidade entre diferentes modelos de cada subsistema.
Vale ressaltar que não foi projetado um subsistema específico para vedações e divisória internas. No entanto, como a estrutura não depende de paredes internas, e o fechamento fica todo para fora do eixo modulado, seria possível colocar qualquer tipo de parede, divisória ou mobiliário sem nenhuma interferência do sistema estrutural.
PRÉ-FABRICAÇÃO E RACIONALIZAÇÃO Inicialmente, a proposta era não apenas criar um sistema que possibilitasse diferentes composições, mas que também fosse completamente composto por elementos pré-fabricados. Logo, percebese que existem alguns problemas inerentes a essa proposta, tanto estruturais e construtivos, quanto de viabilidade econômica. Do ponto de vista estrutural, o problema é conciliar a possibilidade de diferentes vãos com uma quantidade limitada e pré estabelecida de elementos. Não há problemas, por exemplo, em fazer uma viga pré-fabricada para um vão específico, mas como dimensioná-la sem saber qual será o vão final?
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Para solucionar isso seria possível ter um catálogo de vigas com diferentes vãos dentro da modulação do sistema (“viga 1M” com vão de 1.20m, “viga 2M” com vão de 2.40m, etc…), cobrindo todas as possibilidades de vãos e sendo cada uma dimensionada corretamente para vencer esse vão específico, mas isso implicaria em produzir uma grande variedade de elementos, ainda mais considerando que para um mesmo vão podem existir vigas diferentes dependendo das suas condições de apoio (apoio-apoio, engasteengaste, apoio-engaste). Outra possibilidade seria criar um módulo de viga com dimensão igual à modulação do sistema, e associá-los entre si até que se obtenha uma viga do vão desejado. Essa solução é mais simples do ponto de vista de variedade de peças produzidas, pois seriam necessárias apenas algumas poucas peças diferentes (meio do vão, apoio e engaste), mas apresenta outros problemas: do ponto de vista construtivo, isso implicaria em mais processos durantes a obra para juntar cada um dos módulos; e do ponto de vista estrutural esses módulos teriam de ser dimensionados para garantir um grande vão com um número máximo de peças, e a estrutura estaria automaticamente superdimensionada para qualquer vão menor.
acima, exemplos de vigas préfabricadas para diferentes vãos.
acima, viga formada por módulos associados entre si.
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Por mais que estas soluções funcionem, fica claro que outras alternativas, como comprar perfis comerciais corretamente dimensionados para cada vão e apenas adaptá-los para se encaixarem corretamente ao sistema com alguns cortes ou soldas, são mais práticas e economicamente muito mais viáveis, mesmo que envolvam alguns processos a mais dentro da obra.(imagem questão 1 e questão 4 -com uma viga I e perfis canaleta soldados é possível criar uma viga com encaixe padronizado para o sistema.) Não só isso, mas o que de fato é mais viável ou não, também depende das condições particulares de cada obra, assim como das condições globais de como o sistema está sendo produzido. Particularmente, uma obra pode ter pouco espaço para realizar operações de corte e solda, o que tornaria a opção das vigas pré fabricadas mais atraente. Outra, poderia ser de difícil acesso para veículos grandes, o que tornaria a solução modulada mais vantajosa pelo tamanho menor das peças. Outra ainda poderia ter um solo muito mole e apresentar dificuldades de fazer fundações, o que imporia a solução mais leve independente de sua praticidade. Num contexto maior, seria necessário considerar as condições em que o sistema seria produzido e em que escala ele seria implantado. Seguindo no mesmo exemplo anterior, a alternativa do catálogo de vigas faz bastante sentido se as peças forem produzidas em larga escala, de modo que mesmo com uma grande variação, todas elas sejam usadas diversas vezes
com uma viga I e perfis canaleta soldados é possível criar uma viga com encaixe padronizado para o sistema.
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em um número grande de obras variadas. Por outro lado, se o sistema for usado para produzir um único modelo de casa (como num programa de habitação social, por exemplo), mesmo que em grandes quantidades, seria mais vantajoso abandonar as variedades e produzir apenas as vigas com os vãos específicos para esse modelo. Ainda, se o sistema for usado em quantidades menores e em modelos diferentes, faria sentido produzir industrialmente apenas as peças que tem menos variação (como painéis, lajes e núcleos) e deixar que as peças como vigas sejam produzidas caso-a-caso, a partir de componentes comerciais. Com isso esclarecido, e sem a intenção de escolher apenas um contexto, a etapa a seguir apresenta peças e versões dos componentes de cada subsistema, tentando sugerir alternativas que façam sentido para as diferentes situações de obras e de condições de produção do sistema construtivo.
modelos permutáveis de pilar. O de 4 aberturas funciona em qualquer situação mas é mais complexo que o de quina. Em que situações vale a pena produzir apenas o primeiro, e em quais vale a pena produzir pilares diferentes para cada possibilidade de uso?
Tentou-se pensar em peças mais genéricas, que pudessem ser usadas em diferentes situações e em peças específicas, entendendo que as específicas seriam mais simples, mas exigiriam uma variedade maior de peças. Além disso, tentou-se possibilitar o uso de diversos materiais. Considerando que diferentes contextos terão disponibilidades diferentes de cada material, buscou-se padronizar encaixes de modo a permitir a permutabilidade entre eles.
abaixo, imagem dos encaixes.
SUBSISTEMAS E POSSIBILIDADES DE VARIAÇÃO
Aqui apresentam-se os subsistemas, seus componentes e exploram-se as suas possibilidades de variação. Os desenhos apresentados são parte dos estudos feitos para as diferentes soluções e não buscam apresentar-se como definitivos.
NÚCLEO O núcleo é composto pelo bloco hidráulico e, quando houver, por elementos de encaixe com o piso e com as vigas. O modo como o núcleo se encaixa no piso pode variar de acordo com as possibilidades de relação entre o solo e a estrutura. Considerando que abaixo do piso do núcleo deve haver um compartimento para a tubulação de esgoto, ele pode se apoiar diretamente no solo ou apenas nas vigas do piso, caso em que seria necessária uma viga secundária. Além disso, a forma do núcleo deve prever também um apoio para as lajes de ajuste, que pode ser um recorte em sua geometria ou a viga secundária. É interessante também que a estrutura do núcleo seja planejada para suportar uma caixa d’água. Fig. 6.1.1. Seção de um bloco hidráulico em que se pode ver a caixa d’água e compartimento para tubulação. Nesse exemplo, e peça encosta diretamente no chão e e existe um recorte onde se apoia e laje de ajuste. O encaixe com a superestrutura é feito através de um elemento soldado na viga. Fig. 6.1.2 .Versão com núcleo e laje de ajuste apoiados em viga secundária.
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Dependendo do material da viga e do núcleo, o modo como eles se encaixam também pode variar, podendo ou não fazer uso de um terceiro componente.
Fig. 6.2. interferência entre bloco hidráulico genérico e painél de fechamento.
Fig. 6.3. Diferentes possibilidades de encaixes entre viga da superestrutura e parede do núcleo. Variações com materiais diferentes.
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Como o núcleo tem função estrutural e correlação com as vigas, é importante que a locação de suas paredes seja sobre o eixo estrutural. Um núcleo genérico teria todas as suas paredes sobre o eixo, com possibilidades de encaixe e dimensionadas para suportar vigas, para permitir que elas possam se apoiar em qualquer posição. Isso traz dois problemas: em nenhum momento todas as paredes servirão de apoio, pois no máximo duas vigas se apoiam no mesmo núcleo, de modo que ele sempre estará superdimensionado. Além disso, é impossível posicionar um núcleo genérico na extremidade de uma casa, pois haverá interferência entre ele e o painel de fechamento. Desse modo, vale a pena pensar um núcleo que só possue uma ou duas paredes com possibilidade de encaixe com vigas e locadas sobre o eixo, enquanto as outras podem ser mais finas e locadas lateralmente ao eixo, do lado de dentro do núcleo. A princípio, imagina-se o núcleo sendo de concreto ou argamassa armada, mas também seria possível fazê-lo com estrutura metálica ou até de madeira.
Fig 6.4. Esquema de um núcleo genérico, com quatro possibilidades de enciaxe, um núcleo com duas possibilidddes de encaixe e um com apenas um possibilidade e suas locações em relação aos eixos.
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PISO A estrutura do piso é composta pelos pilares, vigas e lajes de piso. As vigas podem ser intermediárias, quando estão no meio do piso e apoiam lajes dos dois lados, ou de borda, quando apoiam laje de um lado e o fechamento de outro. Entende-se que os pilares se encaixam na fundação podendo ser soldados, concretados ou parafusados, dependendo do material escolhido para o pilar e para fundação. Nele são apoiadas as vigas e também os pilaretes de esquina do fechamento quando eles existirem. Fig. 6.5. Estudos de encaixe entre pilar e viga de piso, com ponto de encaixe para os painéis de fechamento, para viga intermediária e de borda. Fig. 6.6. Estudo de viga intermediária e de viga, em corte. Fig. 6.7. Pilar e viga em concreto e metal. Estudo para padronizar encaixes em materiais diferentes para obter permutabilidades entre eles.
As vigas podem ter uma estrutura com um eixo principal e outro secundário, ou podem funcionar sem hierarquia. Se considerarmos as lajes suficientemente estruturadas em si para vencer seu vão maior, geralmente de 2,40m, 3,60m ou 4,80m, tem-se que as vigas secundárias raramente serão necessárias. De modo geral, assume-se aqui que as lajes são de argamassa armada e são suficientemente rígidas. No entanto, poderiam ser usadas lajes de chapas metálicas ou outros materiais em que uma estrutura com vigas secundárias fosse necessária e fizesse sentido.
Fig. 6.8.7.1. Viga em argamassa armada de lelé. Se estruturam sem precisas de uma viga longitudinal ao vão. A arquitetura de Lelé, p. 87 Fig. 6.7.2. Desenho de estrutura de piso da cas 6x6 de Prouvé. Uso de viga secundaria para apoiar lajes. Complete Work, p. 48.
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No mais, e estrutura com vigas secundárias simplifica os encaixes, pois permite que cada componente só se relacione com um ou dois outros, enquanto na estrutura sem hierarquia temos mais correlações. Por outro lado, o sistema sem hierarquia tem menor quantidade de peças diferentes. Outra possibilidade seria pensar no uso conjunto de elementos pré fabricados com concreto moldado in loco, através de um componente que funciona simultaneamente como viga de borda e fundação radier e também serve de forma para a concretagem da laje. (Fig. 6.9) `
Fig. 6.8.1 e 6.8.2. estudos comparativos da correlação de peças num subsistema com e sem vigas secundárias, respectuvamente. Fig. 6.9. Estudo de sistema para piso que mistura elemento pré-fabricado para viga e radier e concreto moldado in loco para laje.
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Fig. 6.10.1. e 6.10.2. Estudos de apoio e locação de viga de argamassa armada. Fig. 6.10.3. Seções das possibilidades de vigas. Fig. 6.11. Estudo de sistema de piso sem vigas secundárias. Estudo de pilar capaz de receber vigas em diferentes posições em diferentes materiais.
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FECHAMENTO O fechamento pode ser composto somente pelos painéis ou pelos painéis somados aos pilaretes de união. No primeiro caso, o encaixe se dá diretamente entre um painel e outro, o que resulta numa medida coordenada maior do que a modular. Isso gera interferência nos cantos, que precisarão de peças específicas para essa situação. (Fig, 6.12.1.) No segundo caso, a distância coordenada torna-se menor que a modular. Logo, não há interferência nos cantos, entretanto necessita-se de mais peças. (Fig. 6.12.2.)
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Fig. 6.12.1 e 6.12.2. ao lado: Encaixes de canto em painéis sem e com elemento de conexão. Fig. 6.13. ao lado: Detalhe de encaixe de painéis sem elemento de conexão. Fig. 6.14. Estudos de encaixe sem elemento de conexão em concreto. Estudos de encaixes com elemento de conxão interno ao painel em concrto e em metal. Possibilidade de encaixe de canto se precisar de nenhuma peça específica.
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É interessante que exista variação entre os tipos de painéis, podendo existir aberturas ou funções embutidas, tais como armários, bancadas ou tomadas. Apesar de tal variação, os encaixes se mantêm padronizados, afinal se relacionam com outros subsistemas, o piso e a cobertura, por meio de suas respectivas vigas de borda. Essa relação é solucionada por uma moldura universal, que garante a variabilidade do restante do painel .
Fig, 6.15. Estudo de painel com moldura metálica universal que pode ser composto com uma face interna e uma externa, para possibilitar o máximo de variações. Fig. 6.16.1. Exemplos de possibilidades para a face interna do painel. Fig. 6.16.2. Exemplos de possibilidades para a face externa do painel.
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Foi decidido que os painéis são locados na lateral externa do eixo modular, de modo que não tenham correlação com as lajes de piso. Isso permite que as lajes tenham sempre a medida modulada, sem variações específicas nas bordas ou nos cantos das paredes. Dessa forma, também não existem interferências no posicionamento das vedações internas ou do mobiliário. Fig, 6.17. 1. Seção de painel com moldura metalica universal, locado de modo a não ultrapassar o eixo modular em nenhum ponto. Fig. 6.17.2. Detalhe do encaixe do painel e pilarete de conexão na viga de piso. Todas essas conexõex devem ser padronizadas. Fig . 6.17..3. Seção de painel com pilarete de conexão mais complexo, feito com perfil extrudado ao invés de chapa dobrada, garantindo que não há pontes termicas entre oos componentes.
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Fig. 6.18. Estudo de encaixe entre painel de fechamento e vigas . Fig. 6.19.1. Detalhe do encaixe do painel de fechamento com viga de borda de piso. Fig 6.19.2. Detalhe de conexão de canto dos painéis, através de elemento de conexão de esquina.
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COBERTURA Composta por vigas centrais, vigas de borda e painéis de cobertura. dependendo da inclinação escolhida para a cobertura, a viga central pode ser de cumeeira, criando um telhado de duas águas, ou uma viga calha, possibilitando e coleta de água pluvial dentro do núcleo. Para isso, no primeiro caso, a viga central tem que ser mais alta que as de borda, e no segundo, mais baixa. É importante então que as vigas sejam dimensionadas em conjunto. Mas o dimensionamento do conjunto pode variar livremente de acordo com as necessidades estruturais dos vãos materiais. É interessante, entretanto, que esse dimensionamento varie apenas na vertical, enquanto a medida horizontal das vigas se mantenha padronizada, para facilitar o encaixe com os painéis de cobertura. Fig. 6.20.1. Seção esquemática de cobertura com viga de calha. Fig. 6.20.1. Seção esquemática de cobertura com viga de cumeeira, Fig. 6.21. Estudos de possibilidades de painéis e vigas de cobertura explorando materiais diferente e definindo medidas que devem ser padronizadas.
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Esses painéis se apoiam nas vigas, podendo ser opacos, ter aberturas zenitais ou aberturas tipo shed. Os painéis são definidos por dimensões moduladas, mas sempre terão dimensões coordenadas maiores, pois precisam, em um sentido, de sobreposição entre eles para garantir estanqueidade; e no outro, de um comprimento adicional de beiral. Também existe a possibilidade de placas de cobertura que funcionam em duas direções, como domus ou cúpulas. com pla
Fig. 6.22. Estudos de possibilidades de variação dos painéis de cobertura, tanto em material quanto em tipos de aberturas. Fig. 6.23.1. Croqui do funcionamento da cobertura em uma direção. Fig. 6.23.1. Croqui do funcionamento da cobertura em duas direções.
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Fig. 6.24. Esquema do funcionamento e da coleta de água da cobertura com domus. Fig. 6.25.1 Estudo de funcionamento da cobertura e dos encaixes das peças. Fig. 6.25.1 Detalhe da peça de cumeeira, que garante estanqueidade à cobertura, Fig. 6.25.1 Detalhe da peça de cumeeira, mostrando como fazer a junção com a viga.
CASAS PROPOSTAS
A CASA MÍNIMA
A decisão de projetar uma casa mínima vem de dois motivos simultâneos: Por um lado, imaginar o que seria uma versão “unitária” do sistema proposto – sua unidade básica. É um primeiro teste, usando apenas um núcleo, uma viga que sai dele e um telhado simples de duas águas. O sistema do piso também é composto por um grid básico, com apenas quatro vigas de borda e uma única viga intermediária para os apoios das lajes. Resumidamente, o objetivo é observar como o sistema funciona, de fato, em uma experiência de projeto. Por outro lado, fazer um diálogo com as casas de Prouvé, que são pensadas como alternativas para a construção de habitação social ou são partes de programas habitacionais. Apesar de
não entrar em questões como custos e possibilidades de produção em larga escala, que seriam necessárias para fazer uma proposta efetiva nesse campo, podese ao menos imaginar um cenário em que a Casa Mínima seria produzida em algum programa social de habitação. Assim, partimos desse pretexto para escolher quais peças e subsistemas utilizar. Imagina-se, então, que a casa seria amplamente reproduzida, e sempre com a mesma estrutura. Podemos, assim, descartar o uso de peças que permitam variabilidade de usos, o que também possibilita que, as peças escolhidas sejam mais simples e consequentemente mais baratas. As vigas de piso e cobertura já podem vir com dimensões definidas, os podem ter apenas os encaixes pré-definidos, assim como os núcleos e as vigas de cumeeira.
No entanto, justamente pela grande quantidades de casas construídas, seria interessante possibilitar alguma variação, para que os moradores não sintam que estão perdendo sua individualidade ao morar todos em casas idênticas, e tenham a oportunidade de personalizálas de alguma forma. Isso pode ser feito permitindo que os painéis e placas usados tenham formas e funções diferentes: para o fechamento, é possível variar entre painéis externos fechados, janelas, portas de correr e até acabamentos de materiais diferentes. Para os painéis internos, possibilitar bancadas, armários e banquetas, que poderiam ser escolhidos por cada morador. Para isso, estabelecemos os painéis com molduras metálicas padronizadas. Para a cobertura, seria possível oferecer também painéis variáveis, permitindo sheds e zenitais.
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O PROJETO DA CASA não possui nem banheiros nem cozinha, e julgou-se que não seria possível fazer, nessas dimensões, um bom projeto que incluísse banheiro, cozinha e lavanderia. Desse modo as dimensões de 7,2 x 7,2m foram escolhidas.
Fig. 7.1.1. Montagem da Casa Standard 8x8. Complete works, V. 3, p. 50
Além da Casa dos Dias Melhores, esse projeto também usa as Casas Standard de Prouvé como referência, principalmente para definir as dimensões da casa. (planta casa 8x8 e cwv3p50) Foram usadas como parâmetro as casas 6x6 e 8x8. Com a modulação do sistema de 1,20m, seria possível fazer uma casa com 6x6m. No entanto, a casa standard 6x6
Foram propostas 2 versões da casa: uma com um núcleo com banheiro de 120x240cm (Casa 1)e outra com o banheiro de 150x240cm. (Casa 2) Cada uma é apresentada com 2 opções de layout interno, para ilustrar que a composição dos ambientes pode variar: Proposta 1.1: Possui dois quartos com boa metragem , a lavanderia é um corredor comprido, pensando em um boa área para estender roupa. A sala, de 3,6 x 3,6m, tem um tamanho decente, mas não é muito espaçosa. Proposta 1.2: Sugestão para uma casa com quintal. Em relação à proposta anterior, diminui-se a lavanderia, que passa a ser um anexo da cozinha. Em compensação, a sala fica com um tamanho generoso. Sugere-se que essa seja uma casa com quintal pois seria necessária uma área externa para estender roupas.
Fig. 7.1.2. Planta da casa Standard 8x8. Escala 1:100
Proposta 2.1: Lavanderia perde um pouco de área para que o banheiro possa ter dimensões melhores, mais fica num formato mais quadrado, o que cria um ambiente com mais possibilidade de usos, ao invés de ser apenas um espaço de varal. Proposta 2.2: Semelhante à casa 2.1, mas tirase um pouco da área da lavanderia para que os quartos tenham mais espaço de armários
Foi feita também uma proposta de casa com 7,2 x 6,0 m, como uma tentativa de casa ainda menor.(Casa 3) A sala e um dos quartos perdem área e a lavanderia tem a mesma composição da casa 1.2, de modo que ela também precisaria de um quintal.
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ISOMÉTRICO DO SISTEMA Os desenhos apresentados mostram a geometria genérica dos componentes, exploram algumas sugestões de como eles poderiam ser compostos com diferentes materiais e define como eles se conectam aos demais componentes, assim como sua locação em relação ao eixo modular. 1 - Pilar de esquina - 4 unidades. 2 - Pilar Intermediário - 2 unidades. 3 - Vigas de piso de borda- 4 unidades de 7,2o m de vão. Poderiam ser 8 peças de 3,60 m, emendadas no canteiro para formar as vigas, para facilitar o transporte das peças 4 - Viga intermediária - 1 unidade. de 7,2om ou duas peças de 360 associadas. Serve de apoio para as lajes de piso. 5 - Painéis de fechamento. - 24 unidades com variados tipos. 6 - Pilaretes de encaixe dos painéis - 20 unidades e; 6A - pilaretes de esquina - 4 unidades. 7 - Lajes de concreto ou argamassa de 120x360 cm - 11 unidades para casa 1 ou 10 para casa 2.
7A - Laje de 120 x 120cm para ajuste do núcleo -1 unidade (casa 1) ou; 120 x 210 cm - 2 unidades (casa 2). 8 - Núcleo de 120 x 240cm (casa1) ou 150 x 240cm (casa2) e 3m de altura. Pode vir apoiado no chão e servir de apoio também para o 7A, ou ser biapoiado nas vigas. No caso, seria necessária uma viga secundária 8A. 1 unidade 9 - Viga de borda cobertura transversina -2 unidades 10 -Viga de borda cobertura longarina - 2 unidades 11 -Viga de cumeeira longarina - 1 unidade. Possibilidade de variação para ser viga calha. 12- Forro - painel de 120x360cm. Quantidade variável, dependendo da escolha de quais ambientes terão forro ou não 13- Placa de cobertura - 120x360cm. Pode ser fechada, shed ou zenital. Inclinação depende da escolha do conjunto das vigas 9, 10 e 11. - 12 unidades.
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PLANTA CASA 1.1.
ESCALA 1:50
A
B
B
A
PLANTA CASA 1.2.
ESCALA 1:50
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PLANTA CASA 2.1.
ESCALA 1:50
PLANTA CASA 2.2.
ESCALA 1:50
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PLANTA CASA 3.
ESCALA 1:50
PLANTA ESQUEMÁTICA PAINÉIS DE COBERTURA CASAS 1 E 2 ESCALA 1:50
LEGENDA: 1) PAINEL FECHADO DE 120X360cm 2) PAINEL COM ABERTURA SHED OU ZENITAL DE 120X360cm
PLANTA ESQUEMÁTICA PAINÉIS DE COBERTURA CASA 3 ESCALA 1:50
LEGENDA: 1) PAINEL FECHADO DE 120X360cm 2) PAINEL COM ABERTURA SHED OU ZENITAL DE 120X360cm
PLANTA ESQUEMÁTICA LAJES DE PISO CASAS 1 ESCALA 1:50
LEGENDA: 1) LAJES DE 120 X 360cm 2) LAJES DE 120X120cm
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PLANTA ESQUEMÁTICA LAJES DE PISO CASA2 ESCALA 1:50
LEGENDA: 1) LAJES DE 120 X 360cm 2)- LAJES DE 120X210cm
PLANTA ESQUEMÁTICA LAJES DE PISO CASA3 ESCALA 1:50
LEGENDA: 1) LAJES DE 120 X 360cm 2) LAJES DE 120X120cm
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CORTE AA
ESCALA 1:50
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CORTE BB - CASA 1
ESCALA 1:50
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CORTE BB - CASA 2
ESCALA 1:50
MONTAGEM DA CASA 1
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ISOMÉTRICO - HIDRÁULICA
BANHEIRO 120 X 240cm
SEM ESCALA
BANHEIRO 150 X 240cm
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A CASA DA PRAIA
Para o último projeto, decidiu-se adaptar o projeto de uma casa existente para o sistema proposto. Isso foi feito pois considerou-se que seria um desafio maior do que criar uma casa já pensando no sistema estrutural, pois haveria uma inclinação a projetar apenas situações em que já se sabe que o sistema funcionará sem problemas. E encontrar logo esses problemas é importante para garantir a universalidade da proposta. A casa original escolhida é uma casa de praia, construída em 1976 em Ubatuba, pelo arquiteto Domingos Theodoro Azevedo Netto. A escolha de uma casa de praia foi feita pois ela apresenta um conceito diferente das habitações que foram estudadas até agora, e testa novas possibilidades do sistema. Além disso, sua planta tem características propícias para
testar as possibilidades de associação de mais de um núcleo, pois possui diversas áreas molhadas em partes diferentes da casa. Não só isso, mas a planta em U oferece uma forma não tão simples. Para o projeto da estrutura no sistema proposto, dividiu-se a casa em 3 blocos: O primeiro, composto pelas salas e cozinha, adota o esquema de dois núcleos delgados associados a uma viga longitudinal. Para isso, criou-se um bloco hidráulico para a cozinha, que teve sua orientação invertida para otimização da estrutura e porque a parede estrutural do núcleo não pode ser a mesma da parede externa. O outro núcleo foi criado colocando-se um armário entre a sala de jantar e a de estar. Desse modo, estrutura-se uma área de 4x10 módulos, ou seja, 4,80 x 12m. Para o piso, lajes internas de 120 x 360 m se apoiam em vigas longitudinais. Uma terceira viga faz o apoio das lajes externas - duas de 240 x 118cm e duas de 360 x 118cm apoiadas na transversal. Esse ajuste nas lajes externas precisa ser feito pois os painéis de fechamento ficam para fora do eixo da modulação, e a espessura do encaixe viga-painel (estimado em 2cm) precisa ser descontado para não interferir na modulação do resto da edificação. Considerou-se que esse ajuste faria sentido pois ele teria de acontecer sempre, em todas as lajes externas, já que elas necessariamente ficam adjacentes a painéis de fechamento, então poderiam ser sempre produzidas com as dimensões nM x nM-2 cm. Essa decisão foi tomada pois ela possibilita deixar um balanço nesta área externa sem precisar de pilaretes de fechamento.14
Fig. 7.2.1. e 7.2.2. Fotos da casa original. Por Léo Schurmann. 14. ver figura 4.2.
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O segundo bloco compreende a lavanderia, a ducha, o quarto e banheiro de empregada , um banheiro social e o salão aberto. Os banheiros se alinham, de modo que foram criados os blocos hidráulicos sem precisar de alterações no desenho original da casa, e eles se solidarizam com uma viga longitudinal de cumeeira, estruturando uma área de 5 x 5 módulos(6,0 x 6,0 m). Nesse caso, os painéis de cobertura precisam se apoiar em vigas de borda, com um vão de 240 cm do lado dos serviços e 360 cm no salão aberto. Com isso, é necessário colocar os pilaretes do fechamento na face externa do salão aberto, mas eles poderiam ser dimensionados para garantir a sustentação da viga de borda sem a necessidade de painéis de fechamento, mantendo o ambiente aberto. As lajes do salão aberto, então, também seriam de 120 x 360 cm, como as lajes internas do primeiro bloco, e as dos serviços seriam de 120 x 240 cm. O terceiro bloco, em que ficam os quartos, têm basicamente a mesma estrutura do primeiro, só que espelhada, com a única diferença que os núcleos são um armário e um banheiro. Na interação entre esses blocos, entretanto, cria-se um problema de sobreposição entre o banheiro do bloco 2 e os painéis de fechamento dos quartos. Isso ocorre pois a parede do banheiro estaria interagindo com a face externa do painel de fechamento e essa correlação não é possível. Mesmo que se considere que essa parede do núcleo não é estrutural e
Fig. 7.2.3. Planta da casa original. Levantamento por Léo Schurmann. Fig. 7.2.4. Foto da casa original. Por Léo Schurmann
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poderia estar locada na lateral do eixo, o painel de fechamento também é locado lateralmente. Isso pode ser resolvido trocando o painel da porta do quarto por um de fechamento feito sob medida considerando um ajuste dimensional, mas ainda assim a parede do núcleo ficaria em contato com a viga de borda que não poderia ser apoiada nos pilaretes. Deste modo seria necessário criar alguma peça de ajuste especificamente para essa situação, para fazer a viga de borda se apoiar na parede do núcleo. Apesar de ser uma solução possível, e pensando também que a criação das lajes externas com medidas não-modulares não é ideal, é possível propor outra solução. Seria possível mudar a estruturação do piso de fechamento nos blocos 1 e 3 para remover os balanços, e fazer toda a parede dos quartos e das salas que dão para o pátio com uma vedação comum. Para isso, seria necessário colocar pilaretes nas extremidades dos blocos inteiros. Fica clara a dificuldade de trabalhar com a adaptação de uma casa existente. Nesse exercício, tentou-se manter a arquitetura mais próxima possível da casa original, com o propósito de ver quais problemas surgiriam. Além do problema maior do encontro do núcleo com a face externa do fechamento, o bloco hidráulico da ducha, tanques e banheiros de serviço é extremamente específico para esse projeto e seria ingênuo assumir que ele faria parte de qualquer catálogo de blocos produzidos em larga escala. Por outro lado, seria possível compô-lo com um bloco de ducha+tanques, que poderia facilmente ser usado amplamente em uma região de
praia, e um banheiro normal, com algumas adaptações no projeto arquitetônico. Apesar de ser provado aqui que é possível adaptar a planta existente para o sistema pré-fabricado com apenas alguns ajustes, fica evidente que faria mais sentido projetar a casa já pensando nas peças disponíveis e nas particularidades do sistema. Acredita-se que seria possível fazer uma casa com as mesmas dimensões e mesmas qualidades espaciais com menos necessidades de ajustes e menor variedade de elementos se a casa fosse pensada desde o começo dentro do sistema proposto.
ESCALA 1:100
PLANTA - SOLUÇÃO 1 A
B
C
C
A
B
PLANTA ESQUEMÁTICA DE COOBERTURA - SOLUÇÃO 1
LEGENDA: 1- painel 120x240 cm opaco, biapoiado 2 - painel 120x240 cm opaco, com balanço de 1,20m 3 - painel 120x240 cm opaco ou com abertura zenital ou shed, biapoiado 4 - painel 120x240 cm opaco, biapoiado
ESCALA 1:100
PLANTA ESQUEMÁTICA DE PISO - SOLUÇÃO 1
LEGENDA: 1 - laje 120x360 cm 2 - laje 120x240 cm 3 - laje 118x360 cm 4 - laje 118x240 cm
ESCALA 1:100
5 - laje 120x360 cm com recorte para encaixe do núcleo 6 - laje 120x90 cm 7 - laje 90x240 cm 8 - laje 120x120 cm
A - viga de borda normal B - viga de borda com apoio para laje externa C - viga intermediária
PLANTA - SOLUÇÃO 2
ESCALA 1:100
PLANTA ESQUEMÁTICA DE COOBERTURA - SOLUÇÃO 2
ESCALA 1:100
LEGENDA: 1- painel 120 x 240cm opaco, biapoiado 2 - painel 120 x 360cm opaco, biapoiado 3 - painel 120 x 240cm opaco ou com abertura zenital ou shed, biapoiado
PLANTA ESQUEMÁTICA DE PISO - SOLUÇÃO 2
ESCALA 1:100
LEGENDA: 1 - laje 120x240cm 2 - laje 120x360cm 3 - laje 120x120cm 4 - laje 90x240cm 5 - laje 90x120cm
A - Viga de borda B - Viga intermediária
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CORTE AA
ESCALA 1:75
CORTE BB
ESCALA 1:75
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CORTE CC
ESCALA 1:100
BIBLIOGRAFIA CLAYSSEN, Dominique. Jean Prouvé: l'idée constructive. Paris, Dunod, 1983. ENJOLRAS,Christian. PROUVÉ, Jean. Jean Prouvé: les maisons de Meudon, 19491999; suivi de "Il faut des maisons usinées", conférence de Jean Prouvé, 1946. 1ère éd. Paris, La Villette, c2003, Ecole d'architecture de Paris-Belleville. FABER, Colin. Candela, the shell builder. New York, Reinhold Pub. Corp, 1963. HUBER, Benedikt(ed). Jean prouve: Une architecture par l'industrie. Zurich, Artemis,1971. PROUVÉ, Jean. LAVALOU, Armelle. Conversas com Jean Prouvé. Barcelona, Gustavo Gili, 2005. PROUVÉ, Jean. ALLÉGRET, Laurence (ed). VAUDOU, Valérie (ed). Jean Prouvé et Paris. Paris, Editions du Pavillon de l'Arsenal, 2001, Picard. 367 p.. Catalog of a centenary exhibition held at Pavillon de l'Arsenal, May-Aug. 2001. NERVI, Pier Luigi. EINAUDI, Robert. Aesthetics and technology in building. Cambridge, Harvard Univ. Press, 1966. 1v. NERVI, Pier Luigi. Costruire correttamente: carratteristiche e possibilità delle strutture cementizie armate. 2.ed. riv. ed ampliata. Milano, Hoepli, 1965. SULZER, Peter. SULZER-KLEINEMEIER, Erika. Jean Prouvé: oeuvre complète = complete works. Basel, Birkhäuser, c1999 Boston. TORROJA Miret, Eduardo. Razon y ser de los tipos estructurales. Madrid, Itc, 19-?. SEGAWA, Hugo. “Lelé: tecnologia com sentido social”. in: “Räume bilden: formar espaços, espaços que formam: espaços de transição e arquitetura do programa de equipamentos (edifícios) públicos de educação, cultura, esportes e lazer”. p.130-185. São Paulo. FAUUSP, 2017.
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