UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE HUMANIDADES, ARTES E CIÊNCIAS PROGRAMA MULTIDISCIPLINAR DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CULTURA E SOCIEDADE
FERNANDO CUNHA KRUM
PRÁTICAS TRANSVERSAIS EM ARTEMÍDIA: UMA ANÁLISE DA COLABORAÇÃO A PARTIR DE EVENTOS DE CULTURA DIGITAL NO BRASIL
Salvador 2013
FERNANDO CUNHA KRUM
PRÁTICAS TRANSVERSAIS EM ARTEMÍDIA: UMA ANÁLISE DA COLABORAÇÃO A PARTIR DE EVENTOS DE CULTURA DIGITAL NO BRASIL
Dissertação apresentada ao Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Messias Guimarães Bandeira. Salvador 2013
Sistema de Bibliotecas da UFBA Krum, Fernando Cunha. Práticas transversais em artemídia: uma análise da colaboração a partir de eventos de cultura digital no Brasil / por Fernando Cunha Krum. - 2013. 91 f.: il. Inclui anexos. Orientador: Prof. Dr. Messias Guimarães Bandeira. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos, Salvador, 2013. 1. Arte e tecnologia. 2. Artemídia. 3. Arte digital. 4. Cultura. 5. Abordagem interdisciplinar do conhecimento. I. Bandeira, Messias Guimarães. II. Universidade Federal da Bahia. Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos. III. Título.
CDD - 700.105 CDU - 7.01: 6
Aos meus pais, com amor e gratid達o.
AGRADECIMENTOS
O desenvolvimento deste trabalho, tanto no que engloba esta redação quanto às experiências dos últimos três anos, não teria sido possível sem o apoio de algumas pessoas. Agradeço aos meus pais, Solano e Myrian, e à minha irmã, Christiane, pelo apoio incondicional, pela paciência e confiança durante todo este percurso e os tantos outros que já trilhei. A Bruno, Thayná e Figo pela acolhida em Salvador, pela parceria e compreensão. A Dani e Alessia pelo convívio, conselhos e apoio. Aos amigos que conheci em Salvador, especialmente, Clarinha, Jarbas, Diego, Ícaro, Felipe e Anamil, os quais me ajudaram a expandir meus pensamentos e a ver a realidade de outra forma. Ao professor, Messias Bandeira, por acolher e incentivar esta pesquisa com todas as dificuldades que surgiram ao longo do caminho. Obrigado pela confiança! À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), cujo apoio financeiro possibilitou a dedicação exclusiva a este projeto.
RESUMO Esta investigação se propõe a compreender as práticas em artemídia, através da reflexão sobre eventos de cultura digital vivenciados em diferentes ambientes de produção artística. Recorremos ao estudo da artemídia – a qual faz uso de ferramentas tecnológicas como matéria-prima para a elaboração de obras – no sentido de esquadrinhar as realidades afetadas pelas chamadas “novas tecnologias”. O desenvolvimento de tais obras envolve encontros entre indivíduos com conhecimentos complementares, os quais se relacionam de forma colaborativa num processo de compartilhamento de experiências. Assim, este trabalho busca circunstanciar as estratégias e práticas inter-multi-transdisciplinares, a partir da análise de cinco eventos de cultura digital no Brasil, a saber: “Narrativas digitais para a participação comunitária na gestão de ecossistemas costeiros”, “Laboratório de arte interativa: artes e interfaces”, “Introdução à Computação Física com Arduino e Pure Data”, “Instalações interativas da mostra Toque para Mover Sentidos” e “Hacklab Interfaces Físicas e controladores DIY aplicados a performances sonoras e audiovisuais, utilizando ferramentas livres”. Palavras-chave: artemídia; colaboração; cultura digital; interatividade; transdisciplinaridade.
ABSTRACT
This research aims to understand the practices in media art through the reflection on digital culture events experienced in different environments of artistic production. We resorted to the study of media art – which makes use of technological tools as raw material for the production of artworks – to scrutinize those realities affected by the so-called "new technologies". The development of such artworks involves encounters between individuals with complementary skills that relate collaboratively in a process of sharing experiences. Thus, this work aims to detail the strategies and inter-multi-disciplinary practices through the analysis of five events of digital culture in Brazil, namely: “Narrativas digitais para a participação comunitária na gestão de ecossistemas costeiros”, “Laboratório de arte interativa: artes e interfaces”, “Introdução à Computação Física com Arduino e Pure Data”, “Instalações interativas da mostra Toque para Mover Sentidos” and “Hacklab Interfaces Físicas e controladores DIY aplicados à performances sonoras e audiovisuais utilizando ferramentas livres”. Keywords: media arts; collaboration; digital culture; interactivity; transdisciplinarity.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Magnet TV (1965) de Nam June Paik. ................................................................... 16 Figura 2 – A Cave do EVL(Electronic View Laboratory) da Universidade de Illinois, Chicago........................................................................................................................ 18 Figura 3 – Precision Optics, de Duchamp (1920). ................................................................. 19 Figura 4 – Robert Rauschenberg e Billy Klüver com a obra Oracle (1963) (Fonte: Robert Rauschenberg – Oracle | Paulspen. .................................................................. 23 Figura 5 – E.A.T. em estande de divulgação na reunião anual (1967) da IEEE, (Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos, tradução nossa). .................................... 24 Figura 6 – Aparelho cinecromático #1 Azul e Roxo em Primeiro Movimento (1949). .......... 27 Figura 7 – Primeiro mouse conectado à estação de trabalho de Engelbart, 1966, Stanford Research Institute (SRI). ............................................................................................ 34 Figura 8 – ReConstitution 2012 – Sosolimited (2012). Captura de tela do sistema. ............... 42 Figura 9 - Representação gráfica da lógica do terceiro incluído. ............................................ 45 Figura 10 – Capa e sexta página do primeiro número do People’s Computer Company, (out. 1972).. ............................................................................................................. 50 Figura 11 – Terminal do Community Memory do lado de fora da Leopold’s Records, Berkeley, Califórnia, 1975........................................................................................................ 51 Figura 12 - Wau Holland, co-fundador do CCC, operando um modem de acoplador acústico em uma cabine telefônica. ......................................................................... 53 Figura 13 - Referência de um sensor de gás, gerada por um aluno do workshop. .................. 57 Figura 14 – Oficina do grupo LabOCA e Jorge Crowe durante o FILE 2010, São Paulo .... 57 Figura 15 – Telemediações Open Lab: experimentações com medidas elétricas em organismos vivos. ..................................................................................................................... 59 Figura 16 – Etapa de testes do Projeto Hexapod, no makerspace Artisan’s Asylum. ............. 61 Figura 17 – Detalhes sobre conversão analógico/digital, Oficina de áudio digital, Garapuá, abr. 2010.................................................................................................................... 65 Figura 18 – Trabalho em grupo, discutindo os lugares a serem visitados, Garapuá, abr. 2010.................................................................................................................... 66 Figura 19 – Mapeamento GPS da rota de coleta de marisco, Garapuá, abr. 2010. ................. 67 Figura 20 – Processo de desenvolvimento da instalação “XOX – The Vending Body Machine”. Salvador, jun. 2011. ............................................................................................... 69 Figura 21 – Trabalho em equipe durante os experimentos do workshop,
Porto Alegre, dez. 2011. ........................................................................................................... 71 Figura 22 – Projeto “Interart”: montagem da estrutura e em funcionamento na mostra. ........ 73 Figura 23 –Projeto “Po-Imagem”: filmagens e montagem da instalação................................ 73 Figura 24 –Projeto “Sucata”: filmagens de entrevistas e game em funcionamento na mostra................................................................................................................................... 73 Figura 25 – Projeto “Na linha do Subúrbio”: filmagem de conteúdo, adaptação de uma máquina de fliperama, desenvolvimento do mapa e totem em funcionamento........................ 74 Figura 26 – Projeto “Sem Limites”: filmagem de conteúdo nas calçadas da cidade, montagem dos sensores na cadeira de rodas, ajustes finais e jogo em funcionamento. .......... 75 Figura 27 – Protótipo do instrumento desenvolvido durante o encontro. Detalhe dos dois potenciômetros e botão tipo switch localizados na tampa da lata, Salvador, fev. 2013. .......... 78 Figura 28 – Detalhe dos quatro LDR’s localizados no corpo da lata, Salvador, fev. 2013..... 78 Figura 29 – Testes do protótipo do instrumento, Salvador, fev. 2013. ................................... 78 Figura 30 - Detalhe do cabeamento de setup de um sintetizador Moog. ................................ 88 Figura 31 – Captura de tela de um programa simples que realiza a função soma para exemplificar as diferenças entre as entradas “quentes” e entradas “frias” do sistema. ............ 89 Figura 32 –Vista superior da placa Arduino Uno. ................................................................... 90 Figura 33 – Dois shields de extensão conectados à uma placa Arduino. ................................ 91
SUMÁRIO Apresentação ........................................................................................................................... 12 1. Introdução: A artemídia e suas interações ....................................................................... 16 1.1 UM POSSÍVEL PERCURSO QUE NOS CONDUZ À ARTEMÍDIA ................................. 17 1.1.1 Klüver e sua contribuição à artemídia .................................................................................. 20 1.1.2 O movimento da artemídia no Brasil .................................................................................... 26 1.2 SOBRE INTERFACES E INTERATIVIDADE ..................................................................... 28 1.2.1 Mapas de bits, janelas e desktops ......................................................................................... 32 1.2.2 Algumas possibilidades de interação .................................................................................... 36
2. Multi, Inter, Transdisciplinaridade e seus desdobramentos em artemídia .................. 38 2.1 IDENTIFICANDO OS PREFIXOS MULTI, INTER E TRANS NAS DISCIPLINAS ...... 38 2.1.1 O Multidisciplinar................................................................................................................. 40 2.1.2 O Interdisciplinar .................................................................................................................. 41 2.1.3 O Transdisciplinar ................................................................................................................ 43 2.2 HACKLABS, MEDIALABS E MAKERSPACES: ESPAÇOS DE COLABORAÇÃO ......... 47 2.2.1 Hacklabs – laboratórios hacker ............................................................................................ 47 2.2.2 Medialabs – laboratórios de mídia ....................................................................................... 54 2.2.3 Makerspaces – espaços de criação ....................................................................................... 59 3.1 NARRATIVAS DIGITAIS / CAIRU (BA) .............................................................................. 64 3.2 LABORATÓRIO DE ARTE INTERATIVA: ARTE E INTERFACES / UFBA, SALVADOR (BA) ............................................................................................................................ 67 3.3 WORKSHOP INTRODUÇÃO À COMPUTAÇÃO FÍSICA COM ARDUINO E PURE DATA / NÓS COWORKING, PORTO ALEGRE (RS) ................................................................. 70 3.4 INSTALAÇÕES INTERATIVAS DA MOSTRA TOQUE PARA MOVER SENTIDOS / OIKABUM! ESCOLA DE ARTE E TECNOLOGIA, SALVADOR (BA) ................................ 71 3.5 HACKLAB: INTERFACES FÍSICAS E CONTROLADORES DIY APLICADOS À PERFORMANCES SONORAS E AUDIOVISUAIS, UTILIZANDO FERRAMENTAS LIVRES / FESTIVAL DIGITALIA, SALVADOR (BA) ............................................................. 76
Considerações finais ............................................................................................................... 80 Anexos ...................................................................................................................................... 87 Anexo 1: Panorama de Pure Data ......................................................................................... 88 Anexo 2: Panorama de Arduino ............................................................................................ 90
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APRESENTAÇÃO Vivemos um momento de convergência. As culturas se tornaram mais permeáveis, possibilitando a busca por infiltrações que em outras épocas não eram possíveis ou, ao menos, imagináveis. O intercâmbio acelerado de informações, promovido pelo avanço das redes telemáticas, possibilita um diálogo intercultural frutífero, na medida em que o objeto da comunicação, o próprio conteúdo, consegue transpassar barreiras como a das terminologias, dos nichos, das classificações e também da própria linguagem e seus respectivos “sotaques”1. Portanto, quando somos capazes de compartilhar conteúdo, transformando-o em algo compreensível aos demais, estamos criando pontes entre os conhecimentos e as novas possibilidades que daí emergem. Acredito que, quando submetidos a um problema comum, podemos vislumbrar soluções de diferentes pontos de vista, e o exercício da comunicação exige a prática de uma linguagem comum que utilize as analogias necessárias para atingir o objetivo de fazer-se entender. Sendo Engenheiro Eletricista, graduado em 2005, pela Universidade Federal de Santa Maria, algumas experiências vivenciadas em minha trajetória acadêmica e pós-acadêmica motivaram-me a buscar este Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da Universidade Federal da Bahia. Durante os primeiros anos da graduação, participei de um grupo de pesquisa2 como bolsista de iniciação científica, trabalhando em conjunto com colegas da graduação e da pósgraduação em projetos de eletrônica de potência, participando de congressos e apresentando artigos científicos. Durante esta época, acompanhei uma iniciativa de retomada do movimento cineclubista da cidade, através do Cineclube Porão da TV OVO3 (2001). Em 2002, fui bolsista do Centro de Processamento de Dados da UFSM, em um departamento de desenvolvimento de páginas web e, no mesmo ano, participei de um curso de extensão em cinema digital promovido pela Faculdade de Comunicação da mesma Universidade (2002). No ano seguinte, interrompi, durante um ano, o Curso de Engenharia e fiz um intercâmbio cultural em Londres, onde estudei, trabalhei e fiz provas de proficiência na língua inglesa. Após retornar ao Brasil e graduar-me em Engenharia Elétrica, cursei 1
Por “sotaques”, me refiro aos pormenores de cada linguagem, cultura ou conhecimento; poderia, também, ser comparado ao timbre da voz de um discurso: a forma nesse caso é menos importante do que seu significado. 2 GEPOC – Grupo de Eletrônica de Potência e Controle. Disponível em: <http://www.ufsm.br/gepocufsm/>. Acesso em: 16 mar. 2013. 3 A TV OVO (Oficina de Vídeo Oeste) é uma organização sem fins lucrativos que atua em diversas frentes, principalmente, no ensino da linguagem audiovisual a jovens da periferia da cidade de Santa Maria, RS. O projeto teve início no ano de 1996, na região oeste, dando o nome à organização. Disponível em: <http://tvovo.org>. Acesso em: 16 mar. 2013.
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disciplinas relacionadas à realidade virtual, à computação gráfica e à inteligência artificial da Pós-Graduação do Instituto de Informática da UFRGS (2006), na cidade de Porto Alegre. Nesta época, após ter submetido um portfólio para seleção em uma escola de fotografia de Madri, estive durante dois anos (2007-2008) vivendo naquela cidade, onde trabalhei com fotografia still4, como operador de controle de câmera em estúdios de gravação de televisão, ou dando aulas particulares de técnicas de edição de imagem. Foi em 2008, que tive, pela primeira vez, contato com a programação de interatividade, através do software livre Pure Data. Após retornar ao Brasil (2009), participei de uma oficina sobre o tema em Santa Maria e no ano seguinte (2010), fui trabalhar em um projeto de arte interativa em Salvador, com a intenção de estudar a arte eletrônica no Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação. Portanto, o ciclo apresentado nos parágrafos anteriores conforma uma trajetória que concilia interesses distintos que, em um primeiro momento, parece ser divergente, mas, que ao longo do caminho, provara ser complementar e convergente no contexto da artemídia. A possibilidade de conexão entre estes conhecimentos, num processo de trabalho e aprendizado coletivo, com uma abordagem experimental de criação, foi o que estimulou o desenvolvimento desta investigação. Sendo assim, compreender as práticas em artemídia através da reflexão sobre eventos de cultura digital vivenciados em diferentes espaços constitui o principal objetivo deste trabalho. Portanto, um questionamento central baliza nossa investigação: em que medida nos apropriamos dos recursos tecnológicos no âmbito da arte, conferindo-lhe práticas transversais em nossos expedientes de produção? A artemídia é um gênero artístico que faz uso expressivo de mediação tecnológica. Para Arlindo Machado (2007, p. 8), “se toda a arte é feita com os meios de seu tempo, as artes midiáticas representam a expressão mais avançada da criação artística atual”. O que constitui uma afirmação contundente, arriscada, haja vista a grande diversidade de possibilidades de expressão artística na contemporaneidade. No entanto, a artemídia possibilita que questionemos nossa relação com a ampla gama de dispositivos que atualmente nos cerca. É preciso assumir uma posição questionadora e de apropriação tecnológica, descobrimento e lucidez, quando somos incentivados de tantas formas a embarcar em uma jornada embalada por ondas de consumismo, centralização de poder e, por que não, euforia. Para aquele autor, hoje, torna-se difícil a tarefa de distinguir a contribuição original de um criador a qual pode 4
Alguns trabalhos estão disponíveis em <http://ferkrum.com/old/portfolio/elarriero/index.html> e <http://ferkrum.com/old/portfolio/mensajedenavidad/index.html>. Acesso em: 16 mar. 2013.
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ser considerada como “mera demonstração das virtudes de um programa” (MACHADO, 2007, p. 37). Acredito que, de fato, trata-se de uma tarefa complicada, porém só teremos maior capacidade de julgamento no momento em que pudermos identificar ambas as partes da equação: tanto a “contribuição do criador” quanto as “virtudes do programa” que, a propósito, também é escrito por um “criador”, humano, que desenvolveu tais rotinas de instruções para uma máquina igualmente projetada por uma pessoa. A transgressão de seu uso e os questionamentos levantados é que poderão elevar seu status de mercadoria para o que será chamado de “obra de arte”. É justamente a identificação ou o reconhecimento destes criadores que deve ser trazido para debate, quando os instrumentos de expressão são reinventados constantemente, produzidos e recombinados coletivamente. O autor norte-americano Steven Johnson (2001) faz uma provocação ao comparar a contribuição de James Joyce e a sua obra Ulisses, de 1922, com a invenção dos tipos móveis de Gutenberg, os quais deram origem à imprensa, em 1453. Para Johnson, ambos foram artistas, ambos foram criadores que revolucionaram nossa maneira de ver o mundo: “Joyce escreveu software para um hardware originalmente materializado por Gutenberg” (JOHNSON, 2001, p. 14). Gutenberg, por sua vez, agiu criativamente, remodelando a forma de escrita, adaptando-a através dos tipos móveis. Portanto, a arte e a tecnologia vivem um processo de retroalimentação há bastante tempo, com a diferença de que, agora, as revoluções midiáticas acontecem com tal frequência que uma mesma geração pode vivenciar seus efeitos, tornando a experiência da adaptação muito mais intensa. Johnson (2001) prossegue, afirmando que O livro reinou como o meio de comunicação de massa preferido por vários séculos; os jornais tiveram cerca de 200 anos para inovar; até o cinema deu as cartas durante 30 anos antes de ser rapidamente sucedido pelo rádio, depois pela televisão, depois pelo computador pessoal. A cada inovação, o hiato que mantinha o passado à distância ficou menor, mais atenuado. [...] A explosão de tipos de meios de comunicação no século XX nos permite, pela primeira vez, apreender a relação entre a forma e o conteúdo, entre o meio e a mensagem, entre a engenharia e a arte. Um mundo governado, exclusivamente, por um único meio de comunicação é um mundo governado por si mesmo. Não se pode avaliar a influência de uma mídia quando não se tem com que compará-la (JOHNSON, 2001, p. 15).
Para o desenvolvimento desta pesquisa, analiso cinco experiências em artemídia realizadas em contextos diferentes nos quais os participantes aportam seus conhecimentos ao longo das atividades. Os grupos (tanto os facilitadores das atividades, quanto os participantes) são compostos por pessoas com formações variadas, levantando questões de apropriação tecnológica e trabalho colaborativo. Para tanto, este trabalho está dividido em cinco partes,
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contando com esta apresentação. O primeiro capítulo traz um histórico do desenvolvimento da artemídia, a evolução dos primeiros experimentos realizados em regime de colaboração entre engenheiros e artistas, o movimento da artemídia no Brasil e detalhes sobre o desenvolvimento das interfaces homem-máquina, listando algumas possibilidades de interação atuais. O segundo capítulo promove um levantamento das metodologias multi, inter e transdisciplinares as quais tratam das interações entre áreas distintas, suas semelhanças, características e exemplos, passando, em seguida, para os espaços de colaboração atuais dos hacklabs, medialabs e makerspaces. Já o terceiro capítulo descreve e analisa as experiências práticas em artemídia as quais ocorreram durante os últimos três anos. O quarto e último capítulo traça as considerações finais e propostas futuras decorrentes deste trabalho.
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1. INTRODUÇÃO: A ARTEMÍDIA E SUAS INTERAÇÕES Este capítulo trará um levantamento histórico dos movimentos e protagonistas que contribuíram para o desenvolvimento da artemídia. Ao tratar-se de um meio artístico fundamentalmente multidisciplinar e intimamente ligado aos avanços tecnológicos também serão pautados os conceitos de interface e de interatividade e sua relação com a cultura na contemporaneidade. O significado de arte tem sua origem no grego tekhnè, “um conceito filosófico que visa a descrever as artes práticas, o saber fazer humano em oposição a outro conceito chave, a phusis ou o princípio de geração das coisas naturais” (LEMOS, 2008, p. 26). A arte sempre foi produzida com os meios de seu tempo, buscando novas formas de expressão, utilizando as ferramentas disponíveis, de maneira criativa e transgressora. Nas artes midiáticas, os artistas ressignificam o uso clássico das máquinas semióticas, levando-as a operarem de forma não projetada originalmente (MACHADO, 2007). Esta apropriação vem de encontro à filosofia da caixa preta, de Vilém Flusser (1998), quando os objetos técnicos são confinados em uma “caixa opaca”, na qual não se pode vislumbrar seu interior, conhecendo-se somente seu comportamento mediante a aplicação de um estímulo externo e verificação de suas respectivas reações. Somos cada vez mais operários destas máquinas, tornamo-nos usuários de um programa prescrito que delimita um campo de ação e que pode nos levar a uma padronização estética e a uma consequente homogeneização de discurso. Quando Nam June Paik (1965) intervém no fluxo “natural” dos elétrons em uma televisão, com o auxílio de ímãs poderosos (obra Magnet TV, 1965, Figura 1, abaixo), o artista está intervindo em seu sistema, chamando o público para refletir e questionar o seu funcionamento. Figura 1 - Magnet TV (1965) de Nam June Paik
Disponível em: <http://www.medienkunstnetz.de/works/magnet-tv/>. Acesso em 23 nov. 2012.
Arte eletrônica, arte-comunicação, poéticas tecnológicas e arte interativa são expressões artísticas que consideramos contempladas pela artemídia e, portanto, a partir de
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agora, iremos utilizar esta denominação quando nos referirmos à arte produzida através dos meios tecnológicos e digitais. Entendemos igualmente a urgência das devidas classificações e das especificidades de cada prática, no entanto, o uso de um termo mais abrangente nos parece mais adequado para o escopo deste trabalho. 1.1 Um possível percurso que nos conduz à artemídia Seguindo uma linha histórica, Richard Wagner, compositor de ópera alemão do século XIX, introduz o conceito de “obra de arte total” na obra The Art-work of the Future (1849), na qual propõe um sistema teórico-prático para integrar as artes. Wagner definiu o conceito como uma nova forma interdisciplinar, ao integrar todas as artes em uma única forma de expressão. Com a ópera The Ring (1876), Wagner previa uma experiência mais potente e completa da obra de arte, idealizando a unificação da música, dança, poesia e artes visuais para obter o poder expressivo que desejava para transformar a música dramática em um instrumento capaz de tocar a cultura alemã. A primeira performance de The Ring ocorreu em 1876, no teatro Festpialhaus, localizado na cidade de Bayreuth, Alemanha, e especialmente construído sob a supervisão do artista, para proporcionar uma experiência sensorial: Wagner foi o primeiro a diminuir a intensidade da luz no teatro, criou fosso para orquestra e revitalizou a disposição dos assentos inspirados no anfiteatro grego para trazer o foco do público para o palco (PACKER, 2001). Foi o primeiro passo em direção às obras imersivas de artemídia que conhecemos na atualidade. Tratando-se de imersão, pode-se recuar ainda mais, trazendo as pinturas nas cavernas da região da Dordonha, sul da França, datadas de 15000 A.C., recentemente gravadas pelo diretor alemão Werner Herzog, em seu documentário A Caverna dos Sonhos Perdidos5 (HERZOG, 2010). O professor Randall Packer, da Universidade de Berkeley, Califórnia, chama atenção para a experiência multissensorial experimentada pelos frequentadores da caverna em seus rituais, em uma mistura sinestésica de luz, sombra, cantos e odores, naquele que seria talvez “o meio artístico mais antigo da humanidade: a instalação site-specific”6 (PACKER, 1999, p. 11, tradução nossa). Ironicamente, aproximadamente 17 mil anos depois, o homem foi capaz de simular tal ambiente, usando areia (silício), álgebra e eletricidade – 5
“Cave of Forgotten Dreams”, título original. Fonte: “Cave of Forgotten Dreams – IMDb”. Disponível em: < http://www.imdb.com/title/tt1664894/>. Acesso em 11 nov. 2012.
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“[...] what is perhaps humanity’s oldest artistic medium, the site-specific installation”. Tradução nossa.
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numa maneira simples de chamar atenção para alguns dos elementos básicos que constituem nossos computadores. A este ambiente imersivo deu-se o nome de CAVE (acrônimo para Cave Automatic Virtual Environment7), criado em 1992, na Universidade de Illinois, Chicago, como resposta a um desafio posto pela conferência especializada SIGGRAPH8, do mesmo ano. Este mecanismo permite a visualização simultânea de várias telas projetadas nas paredes de um cubo, criando um ambiente imersivo para o usuário. Figura 2 – A Cave do EVL(Electronic View Laboratory) da Universidade de Illinois, Chicago.
Disponível em: Wikipédia. Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/File:CAVE_Crayoland.jpg>. Acesso em: 08 nov. 2012.
Os artistas do século XX seguiram buscando maneiras de integrar disciplinas, tradicionalmente separadas, em obras únicas. Somente com esta integração seriam capazes de capturar a velocidade, a energia e as contradições da vida contemporânea. Com as obras Bicycle Wheel (1913) e Precision Optics (1920, ilustrada na Figura 3 a seguir) de Marcel Duchamp, Kinetic Construction (1920) de Naum Gabo e Light-Space Modulator (1923-30) de László Moholy-Nagy, teve início a experimentação, através do movimento das formas visuais, jogando com o espaço e o tempo (SHANKEN, 2003). As ideias de Moholy-Nagy sobre o museu da Bauhaus (1929) mudavam a relação entre obra e público: o então professor da escola alemã propunha novos meios dinâmicos de 7
“Caverna Ambiente Virtual Automático”, tradução nossa. A sigla é recursiva e repete a palavra “caverna” em seu significado. Também, rende homenagem à Caverna de Platão. Este ambiente utiliza-se de vários projetores multimídia simultaneamente para criar uma experiência imersiva, circundando o usuário com imagens projetadas e sincronizadas, utilizando softwares especiais. Fonte: Wikipédia, disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Cave_automatic_virtual_environment>. Acesso em: 9 nov. 2012.
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“Special Interest Group on Graphics and Interactive Techniques”, ou “Grupo de Interesse Especial em Técnicas Gráficas e Interativas”, tradução nossa.
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luz mecanizada, cenografia, filme e som eletrônico que dissolveriam a dita “quarta parede” que separa o palco do público. Segundo Moholy-Nagy (1924) É hora de produzir um tipo de atividade de palco que não mais permitirá as massas a serem espectadores silenciosos, que não somente os excitem internamente mas irá permiti-los a tomar parte e participar – de fato permiti-los a fundirem-se com a ação no palco no pico do êxtase catártico (MOHOLY-NAGY, 1942, s\p).9
Figura 3 – Precision Optics, de Duchamp (1920).
Disponível em: Abcgallery.com. Disponível em: <http://www.abcgallery.com/D/duchamp/duchamp30.html>. Acesso em: 04 nov. 2012.
No final dos anos 40, através de uma série de eventos que combinam performance colaborativa e uso de técnicas de indeterminação e operações do acaso10, o compositor americano John Cage contribuiu para aproximar o público da obra de arte, compartilhando a responsabilidade do artista no resultado do trabalho. As operações do acaso11 citadas são resultado do encontro do artista com a filosofia indiana e o budismo zen. Através do livro “I Ching” – um clássico da literatura chinesa que usa um sistema de símbolos para identificar a ordem em operações de chance –, Cage passou a produzir suas composições, trazendo questões ao livro e usando seu sistema para codificar suas respostas em notação musical. O trabalho de Cage influenciou uma nova geração de artistas, dentre eles, o coreano Nam June Paik, ao criar uma série de técnicas não-tradicionais de performance, gerando 9
“It is time to produce a kind of stage activity which will no longer permit the masses to be silent spectators, which will not only excite them inwardly but will let them take hold and participate—actually allow them to fuse with the action on the stage at the peak of cathartic ecstasy.” Tradução nossa.
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“Indeterminacy and chance operations.” Tradução nossa.
Operações do acaso são operações que dão resultados aleatórios, como por exemplo o jogo “cara ou coroa” com uma moeda.
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gêneros como o happening, o electronic theater, a performance art e as instalações interativas. Ainda nos anos 1960, o teórico das artes e das mídias Peter Weibel salienta a proximidade da arte cinética12 e da op art13 com a arte algorítmica, baseada em regras, como possuidoras de “atributos de dependência do observador, interatividade e virtualidade” (WEIBEL, 2009, p. 91). Neste mesmo período, o movimento Fluxus substituía os objetos da pintura ou escultura integralmente por instruções de ação, constituindo um passo a passo que exigia a participação ativa do público. A arte cinética, combinando o movimento gerado por motores elétricos, criava volumes virtuais, ilusões óticas. Neste caso, “o movimento real e a luz real se tornaram mídia de arte” (WEIBEL, 2009, p. 96). Neste contexto, os artistas buscam cada vez mais integrar a tecnologia a seus trabalhos e foi com a aproximação de Billy Klüver, cientista da Bell Labs, que a colaboração entre artistas e engenheiros se deu efetivamente. 1.1.1 Klüver e sua contribuição à artemídia Johan Wilhelm Klüver foi um engenheiro eletricista nascido em Mônaco (1927) e crescido na Suécia. Graduou-se no Royal Institute of Technology de Estocolmo (1951) e quando, ainda dentro da academia, interessou-se por cinema, tendo ingressado na Film Society localizada na faculdade de humanidades da Universidade de Estocolmo, “um ato sem precedentes para um estudante de engenharia” (MILLER, 1998, p. 3). Seu interesse em unir ciência e filme o levou a produzir um curta-metragem de animação educativo sobre a movimentação dos elétrons no campo eletromagnético14. Posteriormente, trabalhou com o cientista e navegador Jacques Cousteau, criando uma das primeiras câmeras de televisão à prova d’água, auxiliando-o numa expedição que investigaria um náufrago a dois mil metros de profundidade, nas proximidades de Marselha, França. Posteriormente, Klüver viajou aos Estados Unidos (1954), onde, nos primeiros anos, prosseguiu seus estudos15 e, logo após, mudou-se para Nova Iorque, onde começou a trabalhar na companhia Bell Telephone Laboratories, em Nova Jersey. Nesta época, o engenheiro foi convidado pelo artista cinético suíço Jean Tinguely (com quem havia feito amizade quando 12
Como a obra Precision Optics, de Duchamp mostrada anteriormente. “Optical art” do inglês, ou “arte ótica”, tradução nossa. 14 Klüver apresentou o conceito de filmes educacionais de alto nível para a Enciclopédia Britânica, que não soube o que fazer com o material, já que nenhum filme com tal conhecimento havia sido feito anteriormente (MILLER, 1998). 15 Klüver cursou PhD em Engenharia Elétrica na Universidade de Berkeley, Califórnia, em 1957. 13
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morou em Paris, em 1953) para construir uma escultura mecânica que deveria se autodestruir ao final de uma performance de 27 minutos. A obra Homage to New York (1960), composta por pedaços de cadeiras velhas, bicicletas e sucata, foi apresentada no jardim do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova Iorque) e teve grande repercussão na mídia. Desta experiência, Klüver (apud MILLER, 1998, p. 24) comentou (sobre a colaboração com artistas): "Eu sabia que eu poderia resolver os problemas, se eu tomasse um dia para isto, mas a cortina tinha que subir. Os artistas ainda reclamam que os engenheiros nunca aprendem que a cortina deve subir".16 Este evento trouxe novas demandas para Klüver, dentre elas, a obra Oracle (19631965, montagem ilustrada na
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“I knew that I could solve the problems, if I took a day, but the curtain had to go up. Artists still complain that engineers never learn that the curtain must go up.” Tradução nossa.
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Figura 4, a seguir) do artista norte-americano Robert Rauschenberg, que buscava a criação de um “ambiente interativo onde a temperatura, som, cheiro, luzes, etc., mudariam na medida que o visitante se movimentasse” (KLÜVER apud MILLER, 1998, p. 23, tradução nossa). Estes requisitos não eram possíveis com a tecnologia disponível nos anos sessenta, então, o conceito foi adaptado para um ambiente sonoro, constituído de cinco esculturas feitas com objetos que Rauschenberg havia encontrado nas ruas. Como o artista não queria nenhum cabo conectando os objetos, o som era enviado do painel de controle para cada escultura, através de ondas de rádio AM. O espectadores podiam variar o volume e a sintonia de cada rádio, usando o painel de controle.
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Figura 4 – Robert Rauschenberg e Billy Klüver com a obra Oracle (1963)
Disponível em:: Robert Rauschenberg – Oracle | Paulspen. Disponível em: <http://paulspen.com/the-engineer-as-catalyst-billy-kluver-on-working-with-artists/figure-2/>. Acesso em 10 nov. 2012.
No ano de 1966, Klüver foi convidado por uma sociedade musical de Estocolmo para organizar uma mostra que representaria a cena norte-americana em um festival de arte e tecnologia na capital Sueca. Com auxílio de Rauschenberg, foram convidados outros artistas que estavam envolvidos com os happenings daquele momento, em Nova Iorque. Finalmente, a participação americana no festival foi cancelada, entretanto, desta preparação, surgiu a oportunidade de exibir as performances no 69th Regiment Armory, em Manhattan. Assim, com a colaboração de cerca de 30 engenheiros da Bell Laboratories e 10 artistas – Alex Hay, David Tudor, Deborah Hay, John Cage, Lucinda Childs, Öyvind Fahlström, Robert Rauschenberg, Robert Whitman, Steve Paxton e Yvonne Rainer – a exibição 9 Evenings: Theatre and Engineering ocorreu de 13 a 23 de outubro de 1966 (BONIN, 2006). As obras exibidas apresentavam uma diversidade incrível e os dispositivos criados para solucionar as demandas das obras poderiam figurar como uma “cronologia de conquistas da engenharia”17 (MILLER, 1998, p. 25). Klüver (apud Hertz, 1995) comentou, em uma entrevista concedida em 1992, que Através do contato com a arte] o engenheiro expande sua visão e se envolve com problemas que não são os mesmos tipos de problemas racionais que aparecem em sua rotina diária. E o engenheiro se compromete porque torna-se um problema
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“A chronology of engineering achievement.” Tradução nossa. As obras contaram com televisão infravermelha para Rauschenberg, acesso direto a sons de NY para Cage, um ambiente sonoro para o coreógrafo Steve Paxton, flocos de neve que ascendiam no espaço para Oyvind Fahlström e um sistema de controle proporcional para David Tudor, no qual podia controlar luzes e sons com o movimento de uma lanterna apontada para um painel de controle com foto-células (MILLER, 1998).
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tecnológico fascinante que ninguém mais haveria levantado. (KLÜVER apud 18 HERTZ, 1995, s\p)
A exposição 9 Evenings contou com cerca de dez mil visitantes e o entusiasmo gerado entre os envolvidos culminou na posterior formação do Experiments in Art and Technology19 (E.A.T.), em dezembro de 1966, por Billy Klüver, Robert Rauschenberg, Fred Waldhauer e Robert Whitman. O E.A.T. é uma organização sem fins lucrativos que tem como objetivo principal promover a colaboração entre artistas e engenheiros. Nos primeiros três anos, o projeto já contava com 2 mil artistas e 2 mil engenheiros dispostos a trabalharem juntos espalhados pelo país. Além de oferecer o programa de serviços técnicos, o E.A.T. conduzia projetos próprios, como por exemplo, o grandioso Pepsi Pavilion na Expo ’7020 em Osaka, Japão (1969-1970). Figura 5 – E.A.T. em estande de divulgação na reunião anual (1967) da IEEE (Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos, tradução nossa) Fonte: Media Art Net.
Disponível em:< http://www.medienkunstnetz.de/artist/eat/biography/?desc=full> Acesso em: 15 nov. 2012.
À medida que as tecnologias de hardware, comunicações, processamento de dados e a instrumentação de comando e controle se desenvolviam, no início da década de 1970, o E.A.T. identificou a importância da contribuição efetiva de artistas em áreas de 18
“The engineer expands his vision and gets involved with problems which are not the kind of rational problems that come up in his daily routine. […]And the engineer becomes committed because it becomes a fascinating technological problem that nobody else would have raised.” Tradução nossa. 19 “Experimentos em Arte e Tecnologia”, tradução nossa. 20 O Pepsi Pavilion foi organizado e administrado pelo E.A.T., contando, inicialmente, com a participação de um núcleo de quatro artistas: David Tudor, Forrest Myers, Robert Breer e Robert Whitman. À medida que o projeto foi sendo desenvolvido, outros artistas foram sendo chamados para contribuir com o andamento da exibição, somando vinte artistas e cinquenta engenheiros e cientistas (VASULKA, 1992).
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desenvolvimento de tecnologia, gerando uma série de projetos interdisciplinares que estendiam as atividades dos artistas na sociedade. Projects Outside Art: Rooftop Gardening (1969-1971) dialogava com sustentabilidade e biologia, produzindo um telhado verde em parceria com um laboratório da Universidade do Arizona; o projeto Children and Communication (1971), em colaboração com especialistas da Universidade de Nova Iorque, trazia experiências com comunicação, utilizando 14 linhas telefônicas dedicadas e dispositivos, tais como máquinas de fax e telex para crianças de 6 a 14 anos de idade comunicarem-se entre si, unindo dois pontos separados da cidade. Já o projeto Telex: Q&A (1971) expandiu esta experiência a outro nível: fazendo parte da exposição Utopia & Visions 1871 – 1981 ocorrida no museu Moderna Museet (Estocolmo, Suécia), o público foi convidado a enviar questões sobre o ano de 1981, conectando o museu sueco à base americana do E.A.T., em Nova Iorque, ao Instituto de Design de Ahmedabad (Índia) e também a um espaço público localizado no Sony Building, de Tóquio. Mais de 400 mensagens foram enviadas e respondidas durante o mês da exposição21. Estes projetos reforçam o entendimento de Klüver e Rauschenberg de que a relação entre arte e engenharia deve ser a de colaboração e de troca. Em uma palestra, Klüver (apud Miller, 1998) afirmou que [...] um engenheiro deveria ser somente outra ferramenta para o artista. Mas Bob [Rauschenberg] muito especificamente disse, ‘Não! Deve ser uma colaboração.’ Eu imediatamente entendi o que Bob estava dizendo. A colaboração um-a-um entre pessoas de campos diferentes sempre guarda a possibilidade de produzir algo novo e diferente que nenhum deles poderia ter feito sozinho (KLÜVER apud MILLER, 1998, p.28)22.
Atualmente, encontramos o trânsito entre diferentes áreas menos “congestionado”. As informações trafegam com mais facilidade e as trocas já ocorrem com maior naturalidade. Antes de prosseguir, é necessário apontar para o percurso do desenvolvimento das artes midiáticas no Brasil.
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Fonte: SNAC. Experiments in Art and Technology (Organization). Disponível em: <http://socialarchive.iath.virginia.edu/xtf/view?docId=experiments-in-art-and-technology-organization-cr.xml>. Acesso em: 17 nov. 2012.
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“[...] an engineer should be just another tool for the artist. But Bob [Rauschenberg] very specifically said, ‘No! It has to be a collaboration.’ I immediately understood what Bob was saying. The one-to-one collaboration between two people from different fields always holds the possibility of producing something new and different that neither of them could have done alone.” Tradução nossa.
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1.1.2 O movimento da artemídia no Brasil O movimento das artes midiáticas do Brasil se deu paralelamente ao movimento mundial, guardadas as devidas dimensões e particularidades históricas de cada espaço. Segundo o pesquisador Arlindo Machado, o contexto brasileiro estava “em sintonia e sincronia com o que estava sendo produzido fora do Brasil, o que dava aos brasileiros uma condição de atualidade, quando não até mesmo precocidade em alguns casos específicos” (MACHADO, 2007, p. 50). No contexto brasileiro, a figura de Abraham Palatnik foi decisiva na inserção do país no campo da arte tecnológica. Palatnik nasceu em Natal, Rio Grande do Norte, em 1928, filho de uma família de judeus-russos que se instalou na cidade, em 1912. Com a idade de 4 anos, viajou com os pais à Palestina onde realizou seus estudos primários, secundários e, posteriormente, no campo da mecânica e da física, especializando-se em motores de explosão. Nesta época, frequentou, simultaneamente, um ateliê livre de arte no qual teve aulas de desenho com modelos vivos, pintura e estética. Retornou ao Brasil em 1948, instalando-se no Rio de Janeiro, onde conheceu o critico de arte Mário Pedrosa, na época, “um dos mais importantes intelectuais brasileiros, dividindo suas ações entre a arte e a política” (MORAIS, 1999, p. 52.). Através de Almir Mavignier, Palatnik conheceu o Hospital Psiquiátrico do Engenho de Dentro (onde Almir atuava como orientador do ateliê de pintura), e sua experiência foi arrebatadora: “me vi diante de gente que nunca havia estudado, que não passara por nenhum tipo de aula, produzindo obras de linguagem complexa e profunda” (PALATNIK apud MORAIS, 1999, s\p). Esta experiência somada às conversações com Pedrosa levaram o artista a abandonar a pintura, decidindo buscar uma técnica diferente, apoiada nas conquistas tecnológico-científicas e que “poderia trazer para a arte pictórica a possibilidade da luz e do movimento no tempo e no espaço.” (PALATNIK apud MORAIS, 1999, p. 53.). Entre 1949 e 1950, o artista cinético Abraham Palatnik criou seu primeiro "aparelho cinecromático" denominado Azul e Roxo em Primeiro Movimento, fundando a “vertente tecnológica da arte brasileira” (MORAIS, 1999, p. 53.). O aparelho substituía as tintas por motores, lâmpadas, lentes e um prisma para usar a refração da luz como pigmento, na qual 101 focos de luz de diferentes intensidades movimentavam-se no espaço.
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Figura 6 – Aparelho cinecromático #1 Azul e Roxo em Primeiro Movimento (1949)
Disponível em: < http://cdn2.tecnoartenews.com/wp-content/uploads/2012/10/abraham-palatinik-nara-roesler02-200x300.jpeg>. Acesso em: 15 nov. 2012.
Palatnik (1940 apud ZANINI, 1997), questionava: Por que nos sujeitarmos eternamente ao instrumental clássico: tinta, pincel, cavalete? Não haverá algo mais que isso? Se a ciência nos permite projetar o caleidoscópio no espaço, dando-lhe uma sabedoria plástica consciente, devido principalmente à movimentação ordenada dos corpos e a cor luminosa, pura, obtida através da refração da luz pelo prisma, por que deverá ela ficar de lado? (PALATNIK apud ZANINI, 1997, p. 234).
A obra foi exposta na I Bienal de São Paulo, em 1951, porém havia sido cortada pelo júri nacional, com o argumento de não enquadrar-se em nenhuma das categorias regimentais. No entanto, a obra finalmente foi exposta em uma sala que havia sido reservada aos integrantes da delegação japonesa que não puderam comparecer. Azul e Roxo em Primeiro Movimento recebeu menção honrosa após ser reconhecida por um júri internacional. Seus aparelhos cinecromáticos foram expostos outras vezes na Bienal de São Paulo e também em mostras coletivas e individuais no exterior. Palatnik deu início, a partir de 1964, a uma pesquisa com “objetos cinéticos” feitos de hastes ou fios metálicos com discos de madeira em suas extremidades pintados de várias cores, acionados por motores ou, em alguns casos, eletroímãs. O artista seguiu esta pesquisa criando, em 1965, um objeto lúdico no qual o “espectador-participante” usa os polos de ímãs para atrair ou repelir formas geométricas que constituem fragmentos de uma estrutura maior (MORAIS, 2012, p. 54). No final da década de sessenta, o Brasil vivenciou a discussão aberta pela poesia concreta, tendo criado um dos primeiros exemplos de poesia gerada em computador, por Erthos Albino de Souza (MACHADO, 2007, p.51), poeta, artista gráfico e engenheiro. Erthos
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foi autor e editor da revista baiana Código23 e é reconhecido por ter desenvolvido técnicas de dessemantização de textos, “por meio da introdução em seus corpos de taxas controladas de ruídos, de modo a fazer degenerar mensagens previamente construídas” (ERTHOS, 2006, p. 45). Em 1969, em parceria com o físico e engenheiro Giorgio Moscati, Waldemar Cordeiro24 desenvolveu a obra As derivadas de uma imagem, inaugurando as experimentações em computer art no país (ARANTES, 2005). As obras nacionais, em oposição ao que vinha sendo feito mundialmente, se destacavam pelo viés político, uma vez que o país passava por uma vida política marcada pela ditadura militar. Cordeiro também foi responsável pela exibição Arteônica – O Uso Criativo dos Meios Eletrônicos em Arte, em 1971, na FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), dando especial ênfase ao potencial democratizador das artes telemáticas, que dentre outras características, permite eliminar a necessidade do deslocamento físico dos fruidores, fazendo uso dos meios eletrônicos de comunicação. Nota-se, portanto, que houve um desenvolvimento paralelo no Brasil com relação ao andamento das artes num contexto mundial. As primeiras infiltrações de outros elementos nas obras artísticas também foram feitas através da arte cinética, arte ótica e, posteriormente, as experimentações mais profundas de computer art e arte eletrônica se deram mediante a colaboração entre indivíduos de áreas complementares (engenheiros e artistas). É interessante frisar que esta troca estabelecida entre profissionais de áreas diferentes se dá através de uma linguagem, um elemento tradutor que possibilita a comunicação entre as duas partes. Este elemento pode ser entendido como uma interface. Veremos que este termo também se aplica a outras áreas e podemos traçar paralelos entre estas. 1.2 Sobre interfaces e interatividade Em linhas gerais, as interfaces são superfícies que delimitam dois sistemas distintos, podendo ser físicos, químicos ou sociais. Costuma-se utilizar o termo para sistemas 23
A revista Código foi uma das mais importantes revistas brasileiras de poesia de vanguarda e teve sua primeira edição em 1974. 24 Artista nascido em 1925, em Roma, veio para o Brasil, em 1946, instalando-se em São Paulo onde trabalhou como jornalista. Em 1952, ao lado de outros artistas, fundou o Grupo Ruptura e lançou um manifesto com o objetivo de romper com a arte figurativa. A partir da década de 60, afastou-se do rigor concretista e começou a criar usando objetos do cotidiano e sucata. Realiza as primeiras pesquisas com o uso do computador nas artes visuais a partir do final da década de 60. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural Artes Visuais. Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_verbete=3529>. Acesso em: 20 fev. 2012.
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informáticos, nos quais o usuário faz uso de determinado sistema operacional através de uma interface projetada para tal. Neste contexto, teclado e mouse constituem interfaces físicas que transformam a manipulação do usuário em impulsos elétricos que são codificados e interpretados pelo sistema. Da mesma forma, as interfaces gráficas de usuário (GUI25) mapeiam graficamente os monitores de trabalho, representando, virtualmente, objetos familiares ao operador, facilitando o uso de certas aplicações como, por exemplo, os processadores de texto que utilizam a metáfora da folha de papel para a digitação, como nas antigas máquinas de datilografar. As interfaces representam dispositivos que compatibilizam a troca de informação ao criar uma padronização na comunicação entre dois sistemas. Ao relacionar esta ideia com as trocas que encontramos em uma sociedade heterogênea e complexa, podemos manter a mesma terminologia: as interfaces também podem compatibilizar a troca de informação entre grupos sociais distintos e, seguramente, também servem não para “padronizar”, mas para criar “analogias” entre diferentes sistemas sociais. Em se tratando de analogias, cabe lembrar o que o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos (1987) comenta sobre emigração de teorias, segundo ele, A ciência do paradigma emergente, sendo [...] assumidamente analógica, é, também, assumidamente tradutora, ou seja, incentiva os conceitos e as teorias desenvolvidos localmente a emigrarem para outros lugares cognitivos, de modo a poderem ser utilizados fora do seu contexto de origem (SANTOS, 1987, p. 18).
Através da tradução dos conceitos, criam-se interfaces entre ideias, entre campos do conhecimento que são complementares e que, muitas vezes, compartilham desafios semelhantes. Acreditamos que o trabalho em regime associativo/colaborativo, quando faz uso consciente das analogias necessárias para a tradução efetiva de conceitos, possibilita um crescimento significativo para ambos os lados daquela "superfície delimitadora" citada anteriormente, tornando-a porosa, suscetível à infiltrações, emissora e receptora de informações. O autor norte-americano Steven Johnson na apresentação da versão brasileira de seu livro “Cultura da interface: como o computador transforma nossa maneira de criar e comunicar”26 identifica a interface como “[...] todo o mundo imaginário de alavancas, canos, 25
“Graphical User Interface”, tradução nossa. “Interface Culture: How New Technology Transforms the Way we Create and Communicate ”, título original do livro, publicado pela primeira vez em 1997.
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caldeiras, insetos e pessoas conectados – amarrados entre si pelas regras que governam este pequeno mundo, isso, para mim, é uma interface em seu modo de arte elevada” (JOHNSON, 2001, p. 11). O autor salienta a abrangência da interface em nossa sociedade, na qual ela de fato está em toda parte e serve como intermediador de nossa relação diária com nosso entorno, composto por todos seus elementos, tanto técnicos quanto sociais. Este trabalho irá enfatizar a interatividade homem-tecnologia, quando a entendemos como uma “atividade tecno-social presente em todas as etapas da civilização” (LEMOS, 2008, p. 112). O pesquisador brasileiro André Lemos (2008) usa a televisão como exemplo para identificar diferentes níveis de interação, iniciando pela “interação nível 0”, com a televisão transmitida em preto e branco, com poucos canais e controle somente do acionamento do aparelho, volume, brilho e contraste. A seguir, passa-se ao “nível 1” com a TV a cores e uma grade mais ampla de canais, permitindo uma maior autonomia da telespectação, quando o usuário pode zappear27 entre um programa e outro – o que o autor comenta ser o antecessor da navegação contemporânea na web. A “interação nível 2” acontece quando o telespectador se apropria do “objeto TV”, ao acoplar videocâmaras ou consoles de videojogos, instituindo uma temporalidade própria, independente da programação destas. O “nível 3” se dá quando elementos de interatividade digital interferem no conteúdo das emissões televisivas através de telefones, faxes ou correio eletrônico. Finalmente, a chamada “interação nível 4” é aquela na qual, através das redes telemáticas, o telespectador pode escolher ângulos e câmeras de transmissão, interferindo no conteúdo informativo recebido em tempo real.28 Notamos que atualmente existe uma crescente aproximação do espectador à produção de conteúdo, quando ele é incentivado a opinar durante o andamento da programação, o que cria uma via de diálogo entre as partes, porém isto se dá de forma parcial, quando as emissoras, na realidade, têm o poder de filtrar e selecionar o que é inserido em seus programas. O que vemos com mais frequência são mensagens enviadas pelo público a programas de auditório ou a transmissões de partidas desportivas nas quais os torcedores dão 27
Termo oriundo do inglês zapping que resume o ato de navegar pelos canais de televisão em busca de algo de interesse do telespectador. Fonte: Wikipédia, disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Zapping>. Acesso em: 11 dez 2012. 28 É importante observar que a “interação nível 4” se trata de uma possibilidade de escolha refinada oferecida ao usuário: sua ação reflete unicamente no conteúdo que está sendo reproduzido individualmente em seu televisor. É diferente do que acontece na “interação nível 3”, quando o espectador interage com o programa, usando o telefone, por exemplo, sendo que o resultado é transmitido abertamente a todos os espectadores. No Brasil, a Rede Globo de tevê aberta fez sua primeira experiência com um programa dito “interativo” de teledramaturgia, em 1992, através do “Você Decide”. Nele, os telespectadores eram convocados a participar, decidindo o rumo de histórias polêmicas mediante votação telefônica. Trata-se de uma interação branda, na qual os usuários são incentivados a escolher entre poucas opções já pré-determinadas e prégravadas pela emissora. A interatividade serve muito mais a título de marketing do que de um ponto de vista funcional. Disponível em: <http://memoriaglobo.globo.com/TVGlobo/Comunicacao/Institucional/memoriaglobo/CDA/Pop/tvg_cmp_memoriaglobo_p op_descricao_subtema/0,35985,22913,00.html>. Acesso em: 11 dez 2012.
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suas opiniões sobre o andamento dos jogos. Trata-se de uma interatividade limitada. Tal limitação não parece ser um problema para a maior parte dos telespectadores que, muitas vezes, é absorvida pelas programações de tal forma que não se incomoda, nem mesmo, com a cobrança pela participação, como a que ocorre no caso das votações realizadas por telefone, debitadas diretamente na conta dos usuários. Este fenômeno é o que Lemos (2012) afirma ser o da transição a um modelo “pósmassivo” de comunicação, no qual “todos têm o direito de fala” e o agenciamento29 torna-se pulverizado, não centralizado (LEMOS, 2012, p. 113). De fato, com a disseminação das redes, os usuários encontram mais espaço para expressar seus pontos de vista e algumas ferramentas permitem uma maior repercussão das opiniões individuais30. Porém não se trata de um direito de fala igualitário a “todos”, visto que estas tecnologias ainda não são acessíveis a uma grande parcela da população e o controle imposto pelas mídias de massa agora não se encontra somente na figura da televisão, mas, também, nas redes sociais online, nas ferramentas de busca, nos portais de notícias, embarcados no leiaute destes serviços. Existe uma hierarquia impressa nas páginas de internet que são exibidas em janelas que dispõem as informações “mais relevantes” no topo e o restante da informação é lida mediante a rolagem de cima para baixo. A maior parte dos serviços online que utilizamos é “gratuita”, mas coletam os dados dos usuários como forma de pagamento, contabilizando um grande fluxo de acesso, o que é revertido, posteriormente, em moeda de troca na venda de espaço publicitário, ou seja, todos são “livres para falar” nos espaços concedidos por serviços que lucram com estes diálogos. O papel das interfaces neste cenário é o da tradução, conversão, garantia de acessibilidade, integração de sistemas e emprego de analogias e metáforas do mundo real que são usadas para dar sentido a códigos que são intangíveis, necessitam ser interpretados e não existem fisicamente (embora sejam armazenados isso, sim, em suportes físicos31). Estas 29
Agenciamento é a pauta proposta pelos meios de massa para <http://andrelemos.info/2012/05/movimentos-sociais-2-0/>. Acesso em: 12 dez 2012.
discussão
do
público.
Fonte:
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As redes sociais se tornaram uma forma conexão entre as empresas e seus consumidores. Quando certa companhia abre oficialmente uma conta no Twitter (Disponível em: <http://www.twitter.com>. Acesso em: 12 dez. 2012), por exemplo, está assumindo uma responsabilidade por aquilo que circula ao redor de sua marca e deve estar a par das discussões que envolvem o seu perfil. Dessa forma, consumidores que se sentem enganados por determinado serviço podem demandar soluções abertamente nestas redes, citando o perfil oficial de tal empresa em suas mensagens. Estas ações, quando não são respondidas prontamente, podem tomar maiores proporções quando outros usuários se identificam com a causa e realimentam a discussão.
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As informações que guardamos, recuperamos e manipulamos podem ser armazenadas em diversos suportes como: fitas magnéticas, cartões perfurados, discos rígidos, discos óticos (CDs) ou memórias estáticas (como os pendrives, por exemplo). Atualmente, existe, também, o conceito de armazenamento na “nuvem”, na qual a informação do usuário não é guardada localmente, mas em servidores distantes que são acessados via rede. Este armazenamento utiliza os mesmos suportes citados
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traduções/conversões vêm sendo feitas há um certo tempo, quando, por exemplo, exploramos o espaço eletromagnético para a transmissão de ondas de rádio para a comunicação32 (HUGHES, 1879), ou excitamos uma barra de ferro com um campo magnético análogo ao áudio capturado por um microfone33, constituindo o princípio de gravação de áudio em fitas magnéticas (popularmente conhecidas como “fitas cassete”). Estamos imersos em um mundo de radiações eletromagnéticas no qual somente temos acesso nato a uma estreita faixa de frequência a qual chamamos de “luz visível”34 e que captamos com nossos olhos. A grande porção restante do espectro operacionalizamos seu uso através de instrumentos que convertem sinais em informações compreensíveis aos nossos sentidos35. Estas conversões acontecem constantemente na informática desde sua criação. Traremos a seguir dos aspectos evolutivos que aproximaram os computadores da vida cotidiana, através do desenvolvimento das interfaces gráficas de usuário, juntamente com o surgimento da microeletrônica, na segunda metade da década de 1970 (LEMOS, 2008). 1.2.1 Mapas de bits, janelas e desktops O desenvolvimento da computação foi impulsionado pela corrida armamentista, quando as primeiras unidades eram utilizadas para fazer cálculos de balística ou criptografar mensagens enviadas em campos de batalha. Os computadores, nesta época, eram equipamentos volumosos, consumiam muita energia elétrica e requeriam um conhecimento profundo do operador para sua manipulação. O ciberativista londrino Richard Barbrook ressalta em seu livro “Futuros Imaginários” (2008) a relação direta das investigações no campo do cálculo eletrônico com as demandas impostas pela guerra. As descobertas patrocinadas pelo Estado para manter a segurança nacional eram posteriormente transformadas em produtos destinados ao cidadão/consumidor anteriormente e esta opção somente é praticável quando é possível trabalhar com um fluxo de dados (velocidade, taxa de transferência) mínimo aceitável para a aplicação em questão. 32 Descoberto pelo galês David Edward Hughes em 1879. Fonte: Wikipedia, disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/David_Edward_Hughes>. Acesso em: 12 dez 2012. 33 Teoria descrita por Oberlin Smith em 1878, porém o protótipo foi criado e patenteado pelo dinamarquês Valdemar Poulsen em 1899. Fonte: The History of Magnetic Recording. Disponível em: <http://www.h2g2.com/approved_entry/A3224936>. Acesso em: 12 dez 2012. 34 Frequências de 400 a 790 THz (Terahertz), aproximadamente. (Fonte: Visible Spectrum. Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Visible_spectrum>. Acesso em: 12 dez 2012). 35 O exame laboratorial de ressonância magnética, por exemplo, permite gerar uma representação visual de um órgão humano bombardeado por frequências eletromagnéticas da ordem dos Megahertz (Mhz). Este exemplo busca clarificar a importância das conversões, transformações de base, escalonamento de sinais para a análise humana. Atualmente, com o desenvolvimento da informática, é possível a manipulação de grandes quantidades de dados, proporcionando novos pontos de vista que facilitam a geração de diagnósticos, não somente médicos, mas também evolutivos, de identificação de tendências, correlações entre variáveis em diversas áreas.
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comum, tentando justificar os enormes investimentos gastos nestas pesquisas. Segundo Barbrook, (2008, p. 68), “[...] reatores nucleares eram geradores de eletricidade barata, e não fábricas de bombas atômicas. Foguetes eram construídos para levar heróicos astronautas para o espaço, não para lançar ogivas nucleares em cidades russas”. Ao término da Segunda Guerra Mundial, o engenheiro norte-americano Vannevar Bush36 descreve em seu artigo As We May Think37 (publicado na revista The Atlantic Monthly, em julho de 1945), um sistema que funcionaria como um “expansor” ou “indexador” de memória, facilitando o inter-relacionamento de informações, através de “trilhas”38 que seriam seguidas, criadas e compartilhadas pelos leitores. Batizado de “Memex”, o sistema eletromecânico faria uso de microfilmagens para armazenar a informação miniaturizada, a qual seria posteriormente recuperada através de sistemas óticos que recriariam a imagem em uma tela. Segundo Bush (1945), este aparelho estaria aproximando-se do funcionamento da mente humana, por associação entre eventos, pois, O homem não pode esperar duplicar artificialmente seus processos mentais por completo, mas ele, certamente, é capaz de aprender com ele. [...] poderia ser possível vencer a mente no que concerne a permanência e clareza dos itens recuperados do armazenamento39 (BUSH, 1945, p. 57.).
O artigo de Bush inspirou muitos cientistas na época, dentre eles Douglas Engelbart, então técnico de radar da marinha americana. Baseado nas ideias de Bush, Engelbart publicou, em 1962, o artigo Aumentando o Intelecto Humano: uma Estrutura Conceitual40” no qual inclui uma atualização do Memex, na forma de um sistema chamado NLS (oN-Line System), capaz de fazer referências cruzadas de artigos científicos para serem compartilhados por pesquisadores à distância, divisão tela entre usuários remotos, entre outros. Engelbart acreditava em uma conexão homem-máquina que permitisse o acesso imediato à informação, o que o levou a desenvolver a primeira interface gráfica, através do mapeamento de bits e o protótipo do mouse. 36
Vannevar Bush esteve envolvido nas pesquisas que levaram ao desenvolvimento do primeiro computador analógico na década de 1930. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi nomeado pelo presidente Franklin Roosevelt, diretor do Office of Scientific Research and Development (OSRD) – a agência responsável pelas pesquisas científicas com propósitos militares durante o período da guerra, incluindo o desenvolvimento da bomba atômica. 37 “Como nós podemos pensar”. Tradução nossa. 38 “Trails”. Tradução nossa. Estas trilhas podem ser compreendidas como uma primeira aproximação do que viria a ser posteriormente a estrutura do hipertexto da World Wide Web, na qual palavras-chave são pontos de vínculo com outros temas em comum. 39 “Man cannot hope fully to duplicate his mental process artificially, but he certainly ought to be able to learn from it. [...] it should be possible to beat the mind decisively in regard to the permanence and clarity of the items resurrected from storage.” Tradução nossa. 40 “Augmenting the Human Intellect: a Conceptual Framework”. Tradução nossa.
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Figura 7 – Primeiro mouse conectado à estação de trabalho de Engelbart, 1966, Stanford Research Institute (SRI)
Disponível em: <http://dougengelbart.org/site/images/img0023.jpg>. Acesso em: 20 dez 2012.
Ao contrário do que Ivan Sutherland havia feito com seu programa Sketchpad (1963), no qual o usuário podia desenhar na tela usando uma caneta especial (light pen), Engelbart mapeou o próprio espaço informacional, usando representações gráficas na tela do computador que, a partir de agora, passou a ser pensada como uma matriz de pixels, um espaço bidimensional, uma janela, a ser explorada pelo usuário. A “tela preta” de até então passou a imprimir objetos familiares ao usuário, que “navega” entre eles, usando um dispositivo apontador (o mouse), introduzindo o princípio da manipulação direta. A manipulação direta possibilitou o envolvimento maior do usuário com o sistema quando, usando o exemplo do mouse, o movimento do objeto no espaço físico real é totalmente análogo àquele executado no espaço virtual. Steven Johnson (2001, p. 30), afirma que o “mouse de Engelbart fazia o papel de representante do usuário no espaço de dados” (grifo nosso). A partir desse momento, passamos a trabalhar imersos no espaço de dados, pensando-o como um ambiente a ser explorado, não como uma prótese que unicamente amplia nossos sentidos. Engelbart demonstrou os avanços de sua pesquisa nos laboratórios do SRI41 na conferência Fall Joint Computer Conference, em São Francisco, 1968. A navegação no espaço delimitado pelas janelas concebidas por Engelbart foi aprimorada anos mais tarde (1972), por Alan Kay, nos laboratórios PARC42, da Xerox, em Palo Alto, Califórnia. As janelas com informação competiam entre si e rapidamente acumulavam-se na tela. Kay inseriu uma “terceira dimensão” naquele ambiente 41
“Stanford Research Institute”, ou Instituto de Pesquisa de Stanford, tradução nossa.
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“Palo Alto Research Center”, ou Centro de Pesquisa de Palo Alto, tradução nossa.
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bidimensional, permitindo que algumas janelas ficassem sobrepostas umas sobre as outras. Era a metáfora do desktop, ou “tampo de mesa”, no qual os diversos elementos estavam dispostos e podiam ser manipulados à vontade, como em uma mesa de escritório, com seus papéis acumulados e ordenados, conforme o gosto do usuário. A Xerox usou estas técnicas em um sistema operacional experimental chamado Smalltalk, introduzindo a interface gráfica de usuário (GUI) no ALTO (1973), o primeiro computador pessoal conectado a uma rede local (Ethernet) (PACKER, 1999). A partir desse momento, é dado início a uma série de lançamentos de computadores pessoais que incorporam a metáfora do desktop, agregando novas funcionalidades, assim como sucessivas brigas judiciais entre fabricantes devido às violações dos direitos autorais e aos registros de patentes – que não são relevantes para o seguimento deste trabalho. Nesse ponto, é importante notarmos o papel das interfaces na disseminação do uso dos computadores em nossa sociedade. Além de tratar-se de uma máquina técnica, uma “calculadora refinada”, o computador é capaz de organizar informações, administrar grandes bases de dados e, quando associado em rede, abre inúmeras possibilidades de trocas entre usuários, criando uma via livre de tráfego de informação. Com o uso das metáforas citadas anteriormente, os designers de interface mapeiam o espaço informacional em formas reconhecíveis pelo usuário “comum”, que já acostumou-se com certas convenções estabelecidas. Segundo Johnson (2001), existe um compromisso entre a inovação e a previsibilidade no desenho de interfaces: “Nunca obrigue um usuário a aprender a fazer a mesma coisa duas vezes” (JOHNSON, 2001, p. 207). Trata-se de um exagero, mas compreende-se o motivo de tal afirmação, quando a facilidade de uso é um ponto crucial no projeto de uma interface bem-sucedida. Atualmente, com a evolução das mídias digitais, a convergência midiática e o acesso disseminado às redes telemáticas de comunicação, as interfaces gráficas de usuário são nosso ponto de contato com um mundo codificado. Para Giselle Beiguelman (2006), a interface não é apenas uma membrana que separa o espaço do ciberespaço; “A interface é uma espuma que agrega a relação num espaço informacional” (BEIGUELMAN apud DIMANTAS, 2006, p.60). Quando entendemos as interfaces como nossas intermediárias no trato com nossas ferramentas de trabalho, por exemplo, nos damos conta que elas também influenciam intrinsecamente nossas ações, criando um hall extenso, porém limitado de possibilidades de atuação. Daí a importância de estarmos atentos às possibilidades de cada meio e adotarmos uma postura crítica em relação ao que nos é oferecido. Este é um dos papéis fundamentais da
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arte: questionar criativamente. Embora tenhamos trazido a evolução das interfaces num tópico separado da artemídia, ambas evoluíram simultaneamente e se retroalimentam continuamente. No cenário atual de criações artísticas estimuladas pelas trocas interdisciplinares potencializadas pelas redes, trazemos, no próximo tópico, uma listagem de tipos de interação proposta por Joshua Noble em seu livro Programming Interactivity43 (2009). 1.2.2 Algumas possibilidades de interação Dentre as diversas possibilidades de desenho de interação, Noble (2009) lista tipos relevantes de interação, lembrando que não se trata de uma categorização, uma vez que grande parte destes é híbrida, com muitos pontos de contato entre si: •
Manipulação física é aquela na qual a interação se dá através da mudança de estado de um botão, sliders ou knobs. O controle de volume é um exemplo prático deste caso.
•
Entrada usando código é dada através de comandos inseridos através de um teclado conectado ao sistema. O autor cita o uso de hot-keys, ou teclas de atalho, como exemplo de entrada usando código. Acredito que as hot-keys estariam melhor classificadas como manipulação física, quando executam determinada tarefa mediante uma mudança de estado ou uma combinação de teclas. Parece-me mais adequada a técnica do live-coding, na qual o usuário efetivamente interfere na execução do sistema, mediante a edição ou adição de novos trechos de código no programa durante sua execução.
•
Manipulação com mouse ocorre através das ações de clique duplo e clique e arraste, comuns aos usuários de sistemas informáticos atualmente.
•
Presença, localização e imagem é o tipo de interação que acontece a partir da posição do fruidor no espaço. Pode ser feita a partir de sensores de peso, movimento, calor ou som.
•
Interfaces táteis e de multitoque são usadas a partir do reconhecimento do toque em uma superfície sensível. As ações comuns são o toque simples, duplo, toque e arraste, uso de mais de um dedo para expandir, contrair ou rotacionar algum objeto.
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Programando Interatividade. Tradução nossa.
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•
Gesto é usado através do reconhecimento de um padrão pré-determinado. O gesto pode ser capturado por uma tela multitoque ou uma câmera, por exemplo.
•
Voz e reconhecimento de fala é uma modalidade usada para ativar alguma ação, de acordo com algumas características do som (amplitude e frequência). Em casos mais avançados, alguns sistemas identificam padrões de áudio (reconhecimento de fala), permitindo uma interação expandida com o sistema.
Esta lista aponta algumas possibilidades de interação com ferramentas disponíveis atualmente. Sabemos, no entanto, que a todo momento novas técnicas são criadas e a transformação do uso programado a alguns objetos também faz parte do movimento da artemídia. Devemos lembrar que a interatividade é "prevista ou programada" pelo artista. Portanto, o fruidor/usuário dispõe de um cardápio de escolhas pré-definidas; a interação é limitada por aquilo que foi delineado pelo artista, salvo naquelas instalações nas quais o comportamento é generativo, levando em conta elementos de aleatoriedade que criam novas possibilidades à medida que o trabalho se desenvolve. As artes midiáticas mantêm um diálogo constante com as tecnologias contemporâneas e sua natureza multidisciplinar requer o envolvimento de várias pessoas em seu desenvolvimento. É similar à produção audiovisual, na qual diversos especialistas encarregam-se de um determinado tema para que o trabalho como um todo seja produzido harmonicamente. Na artemídia, esta integração entre conhecimentos é ainda mais íntima, quando as obras questionam o próprio sistema em que estão inseridas e o processo criativo é também considerado parte tão relevante quanto a obra “acabada”. Quando comparamos a produção contemporânea das artes midiáticas àquelas que aconteceram no final dos anos sessenta – como as experiências realizadas pelo E.A.T (citadas no item 1.1.1 deste trabalho) – notamos que os trinta anos que separam uma experiência da outra estão marcados, principalmente, pela aceleração das trocas de conhecimento proporcionadas pelas redes de informação e a chamada cultura livre. Todo este contexto traz a necessidade de pensarmos no entrelaçamento de culturas e disciplinas que ocorre nas práticas de criação coletiva em artemídia, dando especial ênfase às ideias de multi, inter e transdisciplinaridade.
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2. MULTI, INTER, TRANSDISCIPLINARIDADE E SEUS DESDOBRAMENTOS EM ARTEMÍDIA O presente capítulo analisará as definições de multi, inter e transdisciplinaridade e suas relações com o contexto das produções coletivas em artemídia. Com a disseminação atual do conhecimento através das interconexões possíveis das redes de comunicação, estas práticas encontraram uma via livre para progressão, dando início a novas experimentações de criação coletiva. Associada a estas práticas, abordaremos a ideia dos hacklabs, medialabs e hackerspaces como espaços para encontros livre-associativos, nos quais troca-se conhecimento, principalmente, em torno da tecnologia, linguagens de programação, ciência e arte digital, mas, também, com relação à utilização do espaço público, meio-ambiente e políticas públicas. Estes espaços constituem ambientes de permutas multidisciplinares desde sua gênese, quando os envolvidos nas atividades colaboram voluntariamente, assumindo, muitas vezes, a própria manutenção destes espaços. 2.1 Identificando os prefixos multi, inter e trans nas disciplinas Antes de chegarmos aos conceitos de multi, inter e trans relacionados às disciplinas, é importante traçarmos um breve histórico da evolução do conhecimento até sua estratificação em áreas com a multiplicação das especialidades separadas em disciplinas de fato. Conforme aponta o filósofo brasileiro Ivan Domingues, na introdução de seu livro “Conhecimento e transdisciplinaridade II: aspectos metodológicos” (2005), na Antiguidade, o conhecimento era único, enciclopédico, numa época em que a quantidade de livros existente chegava a algumas centenas de exemplares somente. O intelectual de então era representado por Aristóteles que “dominava virtualmente todo o saber de sua época” (DOMINGUES, 2005, p. 27), quando ele próprio era dono da maior biblioteca existente naquele período. Deve-se notar aqui que o autor adota uma perspectiva ocidental, eurocêntrica, que descarta qualquer outro conhecimento não ortodoxo, como aquele repassado através da oralidade, por exemplo. O conhecimento estava armazenado em um montante palpável e humanamente “digerível” por uma única pessoa. Aristóteles, já nessa época, empregava uma organização do
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conhecimento em três grupos distintos: as ciências práticas, as ciências poéticas e as ciências teoréticas, o que consistia em uma forma inicial de compartimentalização do saber. A seguir, Domingues (2005) complementa que, na Idade Média, o número de livros cresceu, chegando aos 1338 exemplares na biblioteca da universidade de Paris-Sorbonne, a maior da França, na época. Em seguida, durante o Renascimento, a figura do intelectual multifacetado era incorporada pelo italiano Leonardo da Vinci (1452-1519) que versava sobre ciência, arte, anatomia e matemática e é considerado um dos grandes gênios da humanidade. Da Vinci foi responsável por inúmeras invenções, incluindo máquinas de voar, pontes levadiças, esboços detalhados da anatomia humana e de animais, assim como suas mundialmente conhecidas pinturas, como a Mona Lisa (La Gioconda, pintada entre 1503 e 150644) e a Última Ceia (L'Ultima Cena, pintada entre 1495 e 149845).46 Posteriormente, Descartes propõe o método analítico, que separa o sujeito (reservado à filosofia, à meditação interior) do objeto (a coisa entendida). Nele, o filósofo propõe a estratificação de problemas complexos em elementos menores, a fim de compreender o comportamento do todo a partir das propriedades das partes. A razão passa a ocupar o centro do universo, superando a estrutura “onto-teológica (explicações de ordem divina) para uma estrutura onto-antropológica (razão científica)” (LEMOS, 2008, p. 45). Finalmente, com a chamada modernidade tardia, dos séculos XIX e XX, houve uma explosão no acervo das bibliotecas, saltando para os milhões de volumes, juntamente com a divisão do conhecimento em múltiplas disciplinas, tornando “simplesmente impossível alguém dominar o conhecimento em extensão e profundidade, qualquer que seja a área do conhecimento” (DOMINGUES, 2005, p. 28). Com isso, surge a necessidade da instauração de uma inteligência distribuída, na qual o conhecimento poderá ser expandido mediante a cooperação entre especialistas, entendendo que a soma de indivíduos poderá finalmente “sintetizar o conhecimento de Leonardo”47. 44
Fonte: Mona Lisa Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Mona_Lisa>. Acesso em: 8 jan. 2013. Fonte: The Last Supper (Leonardo da Vinci) Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/The_Last_Supper_(Leonardo_da_Vinci)>. Acesso em: 8 jan. 2013. 46 A amplitude e profundidade dos interesses de Da Vinci, especialmente, o trânsito entre as artes, ciências e tecnologia inspirou a criação das publicações periódicas Leonardo, iniciadas em Paris, em 1968, pelo artista cinético e cientista espacial norte-americano Frank Malina. Malina vislumbrou a necessidade de um canal de comunicação internacional onde artistas que faziam uso da ciência e tecnologia em seus trabalhos pudessem dialogar. Após a morte de Frank, em 1981, seu filho, Roger Malina, levou o periódico a São Francisco, Califórnia (EUA), criando a organização sem fins lucrativos Leonardo/The International Society for the Arts, Sciences and Technology (Leonardo/ISAST). Além do periódico, existe a série de livros Leonardo Books, publicados pela editora MIT Press. (Disponível em: <http://leonardo.info/isast/leostory.html>. Acesso em: 09 jan. 2013). 47 Em referência ao subtítulo “Como sintetizar Leonardo” do artigo “Práticas colaborativas transdisciplinares em ciberarte: da multimídia às instalações em software art” (DOMINGUES; REATEGUI, 2009, p. 273). 45
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Ainda, existe a ideia de conhecimento avançado, tratada no livro A república dos saberes: arte, ciência, universidade e outras fronteiras, em 2008, organizado por Carlos Brandão. Segundo o autor, o conhecimento avançado é aquele “que se encontra nas fronteiras do saber em suas várias áreas e campos disciplinares” (BRANDÃO, 2008, p. 19, grifo nosso) e a hiperespecialização, embora possa dificultar a visão ampla de certos temas, é responsável por estender sua abrangência, levando o conhecimento disciplinar a “tocar as fronteiras de outras especialidades e criar corredores de comunicação entre ambos, transferir métodos e criar novas disciplinas, novas artes, ciências e tecnologias.” (BRANDÃO, 2008, p. 20). É justamente nos espaços entre as disciplinas que se acomodarão as metodologias multi, inter e transdisciplinares, quando se cruzam os olhares especializados em torno de um objetivo comum. A seguir, veremos suas semelhanças e particularidades, iniciando pela multidisciplinaridade. 2.1.1 O Multidisciplinar A metodologia multidisciplinar, também chamada de pluridisciplinar, promove o encontro entre disciplinas ao redor de um mesmo tema, porém mantém suas metodologias intactas. Cada especialista contribui em sua respectiva área sem interferir nos métodos vizinhos (DOMINGUES, 2005). Podemos citar como exemplo o desenvolvimento do Projeto Manhattan, responsável pela criação da “Bomba A” na Segunda Guerra Mundial (DOMINGUES, 2005, p. 23). Nele, uma equipe de físicos, matemáticos, químicos, engenheiros e militares atuaram para criar o artefato, reservando as metodologias particulares de cada equipe. Não houve, nesse caso, uma fusão metodológica entre as disciplinas, mas sim, uma coordenação entre as equipes para que o projeto fosse bem sucedido e ocorresse com segurança total. O contexto da guerra imprimiu um ritmo intenso de trabalho, quando a Alemanha e a Rússia também corriam para desenvolver sua versão do armamento. Voltando-nos ao contexto da artemídia, podemos citar as experimentações de Billy Klüver e Jean Tinguely como as precursoras da multidisciplinaridade no campo das artes, quando ambos desenvolveram, em regime de colaboração, a obra "Homage to New York", em 1960. Alguns anos mais tarde, Klüver, juntamente com Robert Rauschenberg, Fred
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Waldhauer e Robert Whitman, fundaram o conhecido Experiments in Art and Technology48 “formalizando” os encontros multidisciplinares entre engenheiros e artistas na década de 1960. Ambos exemplos, portanto, retratam as trocas entre áreas distintas, as quais podem ser extremamente especializadas, porém não compartilham metodologias, mantendo-se imunes ao contato mais íntimo. Vejamos a seguir como se dão as trocas interdisciplinares. 2.1.2 O Interdisciplinar A metodologia interdisciplinar, assim como a multidisciplinar, aproxima áreas diversas, a fim de resolver problemas específicos, com a diferença de haver um compartilhamento de metodologias e a formação de novas disciplinas, a partir da fusão entre as envolvidas na cooperação (DOMINGUES, 2005). Como exemplo, podemos citar a união da biologia, com a engenharia, a física e a informática para o estudo de dados biológicos, tais como as cadeias de DNA. Usando a metodologia da informática, criou-se a bioinformática: disciplina responsável pelo armazenamento, busca e análise de dados biológicos que facilitam o desenvolvimento de novos medicamentos. O compartilhamento metodológico da interdisciplinaridade pode dar-se de várias formas, podendo ser múltiplo e compartilhado entre todas as disciplinas envolvidas na pesquisa, propondo pontos de contato entre as ciências. As artes midiáticas, quando desenvolvidas coletivamente, podem constituir experiências interdisciplinares, no momento em que se estabelece o compartilhamento metodológico entre as áreas envolvidas no desenvolvimento de determinada obra ou instalação. A obra ReConstitution (2012), desenvolvida pelo coletivo norte-americano Sosolimited, consiste em um sistema de análise de discurso, que permite a criação de estatísticas e visualização de dados em tempo real49, através do reconhecimento de palavraschave que são filtradas, comparadas e exibidas, à medida que um diálogo qualquer acontece, 48
“Homage to New York” e “Experiments in Art and Technology” foram abordados no item 1.1.1 deste trabalho, respectivamente.
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Nota-se uma tendência atual do emprego da expressão “tempo real” em diversos contextos como sinônimo de “ao vivo”, de atualização constante, dinâmica, ou simplesmente, como estratégia de marketing. Uma busca pelo termo no Google retorna resultados como “Alagoas em Tempo Real – O portal líder em notícias de Alagoas”, “Tempo Real Eventos” ou “Tempo Real - Negócios imobiliários” além de diversos portais de notícias e esportes (busca realizada em 18 fev. 2013). O termo é originalmente vinculado à ciência da computação e delimita a situação na qual uma determinada instrução deve satisfazer um requisito de tempo. Como exemplo, podemos citar uma aplicação de videoconferência. Neste caso, existe um fluxo constante de dados que transita de um ponto ao outro com um tempo limite de entrega, caso contrário, parte do fluxo deverá ser descartado, para que o restante do fluxo permaneça dentro dos limites impostos pela aplicação.
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neste caso, os debates presidenciais estadunidenses do ano de 2012. Para desenvolver o projeto, o coletivo trabalhou em colaboração com James Pennebaker, psicólogo e autor do livro The secret life of pronouns50 e Cindy Chung, pesquisadora da Universidade de Austin, Texas, na área de análise textual, além Tim Branyen, desenvolvedor de software51. Figura 8 – ReConstitution 2012 – Sosolimited (2012). Captura de tela do sistema
Disponível em: <http://thecreatorsproject.com/gallery/sosolimited/>. Acesso: 15 jan. 2013.
O projeto inverte a posição do público normalmente estudado por grandes empresas que criam estratégias de marketing baseadas em seu histórico de compras, traçando perfis detalhados dos consumidores, ou, ainda, usando o caso das campanhas eleitorais, revelam a receptividade em determinada região ou grupo social de tal campanha, usando pesquisas de intenção de voto. Na obra ReConstitution (2012), o público é dotado de uma ferramenta de análise que empodera o cidadão comum com a capacidade principal da "comparação", trazendo
dados
que,
de
outra
forma,
seriam
imperceptíveis.
Além
disso,
o
usuário/fruidor/eleitor ao deparar-se com tal tecnologia em funcionamento diante de si, é convidado a refletir sobre as questões de privacidade e de rastreamento de informação que vivemos atualmente, quando confiamos nossos dados pessoais a tantos serviços “gratuitos”52 na era da informação. 50
“A vida secreta dos pronomes”. Tradução nossa. Fonte: ReConstitution 2012. Disponível em: <http://www.recon12.com/index.html>. Acesso em: 15 jan.2013. 52 Tais serviços gratuitos são as ferramentas de busca, indexadores de páginas web, servidores de correio eletrônico, redes sociais, dentre outros. Costumamos questionar qual a forma de ingresso destes produtos, uma vez que o usuário, geralmente, não paga pelo seu uso. Na realidade, existem diversas formas de monetização, sendo uma das mais conhecidas a venda de espaço publicitário personalizado. O Gmail, ferramenta gratuita de correio eletrônico da Google, imprimi anúncios relacionados ao conteúdo das mensagens trocadas entre seus usuários. Ou seja, se o usuário envia um convite a um colega para uma partida de tênis, por exemplo, ao lado desta mensagem o destinatário poderá receber ofertas de lojas desportivas de sua região, espaços para a prática do esporte, ou venda de ingressos para o campeonato regional. Portanto, a informação que trocamos nestes serviços são utilizadas de muitas formas, detectando tendências de mercado, podendo ser até mesmo 51
43
Muitas vezes, é difícil de identificar a diferença entre um projeto multi e um projeto interdisciplinar. Sabemos que para haver a interdisciplinaridade é necessário o compartilhamento de metodologias que, no exemplo trazido anteriormente, acreditamos ser a metodologia da informática (por meio da criação do software que coordena a geração das estatísticas), do "desenho de interfaces e ergonomia" (que determina a forma como as informações serão exibidas na tela e como os usuários podem manipular cada modo de exibição) e a metodologia da psicologia (através das análises textuais, que indicam o comportamento de cada personagem). Já a “nova disciplina”, criada a partir da fusão das áreas envolvidas, é a própria obra, híbrida em si mesma, que entrelaça as diversas informações e que pode ser manipulada livremente pelo usuário, através de seu navegador web. Esta obra apresentou uma forma criativa de uso da tecnologia para abordar um tema importante como o da privacidade, usando como pano de fundo uma das eleições presidenciais mais relevantes da atualidade. O entrelaçamento interdisciplinar permite um envolvimento profundo entre as áreas, atingindo resultados que não seriam possíveis individualmente. Portanto, consideramos que esta iniciativa adotou uma metodologia interdisciplinar. A seguir, veremos como se dá a metodologia transdisciplinar. 2.1.3 O Transdisciplinar A metodologia transdisciplinar, como as metodologias vistas anteriormente, ocupa os interstícios entre as disciplinas, colocando-as em contato. No entanto, aqui, existe o “compartilhamento de metodologias unificadoras, construídas mediante a articulação de métodos oriundos de várias áreas do conhecimento” (DOMINGUES, 2005, p. 25) e a ocupação dos espaços indefinidos entre as disciplinas se dá de tal forma que novas disciplinas podem ser criadas ou não. O transdisciplinar caracteriza-se pelo “movimento, o indefinido e o inconcluso do conhecimento e da pesquisa” (DOMINGUES, 2005, p. 25). O termo transdisciplinar foi utilizado pela primeira vez por Jean Piaget no workshop Interdisciplinarity – Teaching and Research Problems in Universities53, em 1970, quando discutindo com Erich Jantsch e André Lichnerowicz, em um evento organizado pela OECD54, vendidas, quando não infringirem os termos de privacidade de cada serviço.(Fonte: Will Social Networks on the Web Ever Make Money? Disponível em: <http://www.forbes.com/2009/02/19/facebook-myspace-twitter-linkedin-opinionscontributors_zuckerberg_internet.html>. Acesso em: 15 jan. 2013). 53 Interdisciplinaridade –Os Problemas de Pesquisa e Educação nas Universidades. Tradução nossa. 54
“Organization for Economic Cooperation and Development”, Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento. Tradução nossa.
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em colaboração com o Ministério de Educação Francês e a Universidade de Nice. Na ocasião, Piaget citou a, Esperança de ver um estágio superior ao da interdisciplinaridade que seria ‘transdisciplinar’, ou seja, que não estará limitado a reconhecer as interações e\ou reciprocidades entre as pesquisas especializadas, mas que irá localizar estas ligações dentro de um sistema total sem fronteiras estáveis entre as disciplinas55 (PIAGET, 1972, p. 144 apud NICOLESCU, 2008, p. 1, grifo nosso).
Segundo o físico teórico romeno Basarab Nicolescu, Piaget se contradiz quando usa a expressão sistema total, que remete à criação de uma super ou hiperdisciplina, enquanto que a ideia da transdisciplinaridade é justamente extravasar as fronteiras disciplinares, em um sistema aberto. É importante salientar que a transdisciplinaridade não exclui a disciplinaridade. Existe uma relação de complementaridade entre as abordagens multi, inter (consideradas disciplinares) e a transdisciplinar. Com a finalidade de instrumentalizar a metodologia transdisciplinar, Nicolescu (2008) propõe uma metodologia embasada em três axiomas: o axioma ontológico (relativo aos níveis de realidade do sujeito e aos níveis de realidade do objeto), o axioma lógico (garante que a passagem de um nível de realidade a outro se dá a partir da lógica do “terceiro incluído”) e o axioma epistemológico (leva em conta a totalidade dos níveis de realidade, em que um nível existe somente devido à existência simultânea dos demais níveis como um todo). O axioma ontológico trata dos níveis de realidade, a partir de uma abordagem da física quântica, quando um conjunto de sistemas não varia quando imerso em certo conjunto de leis, porém apresenta um comportamento diferente quando submetido a outro grupo de regras. Portanto, existem dois níveis de realidades diferentes no momento em que ocorre uma descontinuidade ao passar-se de uma realidade à outra. Este entendimento abre portas a um novo princípio de relatividade, vindo da pluralidade complexa e da unidade aberta nesta abordagem: “nenhum nível de Realidade constitui um lugar privilegiado de onde é possível entender todos os outros níveis de Realidade” (NICOLESCU, 2008, p. 7). Não se trata de uma abordagem hierárquica. Os espaços entre um nível de realidade e outro são chamados de “zonas de não-resistência” e fazem o papel do “terceiro incluído” entre o objeto transdisciplinar e o sujeito transdisciplinar. Portanto, a existência do terceiro incluído na figura das “zonas de não-resistência” permite fugir da lógica clássica binária, que não tolera 55
“[…] we hope to see succeeding to the stage of Interdisciplinarity relations a superior stage, which should be ‘transdisciplinary’, i.e. which will not be limited to recognize the interactions and or reciprocities between the specialized researches, but which will locate these links inside a total system without stable boundaries between the disciplines”. Tradução nossa.
45
contradições do “sim” e do “não”, da existência única do “A e não-A”, permitindo agora a existência simultânea de “T” (o Terceiro incluído). A figura abaixo representa graficamente a existência de uma terceira possibilidade “T” no momento em que existem outros níveis de realidade (representados por NR1 e NR2). Figura 9 - Representação gráfica da lógica do terceiro incluído T
Não-‐A
NR1
A
NR2
NICOLESCU (2008, p. 10)
A metodologia de Nicolescu está de acordo com a teoria da complexidade de Edgard Morin, quando diz que a “complexidade horizontal se refere a um único nível de realidade enquanto que a complexidade vertical se refere à múltiplos níveis de realidade”56 (NICOLESCU, 2008, p. 11). Para Ivan Domingues (2005), não existem exemplos de experiências transdisciplinares ainda, “trata-se de uma utopia” (DOMINGUES, 2005, p. 25). O mais próximo que houve, segundo o autor, até hoje, foi a experiência da escola portuguesa de Sagres, na época das descobertas, quando equipes de cartógrafos, engenheiros, matemáticos, astrônomos e carpinteiros trabalhavam em conjunto para construir embarcações capazes de vencer os desafios da navegação exploratória em mar aberto, incentivados por um rei visionário, Dom Manuel. Era um momento de frouxidão disciplinar, com o emprego de um saber global, agregador. A escola propriamente dita não existia fisicamente, tampouco seus professores ou alunos: a escola se dava no trânsito entre a corte real e o cais do porto. Trazendo a metodologia transdisciplinar ao contexto da artemídia, vemos uma crescente mobilidade dos criadores em diversas áreas do conhecimento e igualmente oriundos de diversas formações, produzindo obras em regime associativo, transitando por aquelas 56
“[…] the horizontal complexity, which refers to a single level of reality and vertical complexity, which refers to several levels of Reality.” Tradução nossa.
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“zonas de não-resistência” citadas anteriormente. Os múltiplos níveis de realidade se encontram quando os sujeitos envolvidos permitem infiltrações em suas realidades e tratam das descontinuidades sem preconceitos. Nicolescu (2008, p. 14) afirma que “nossos preconceitos são frutíferos: é precisamente a fusão dos preconceitos que nos leva à verdade”57. É uma visão curiosa que adota um caminho integrador que finalmente faz emergir a “verdade” ao unificar preconceitos individuais. Tais “preconceitos” são aqueles préconcebidos pelos interlocutores de um diálogo entre sujeitos de formações ou níveis de realidade diferentes. Conforme visto anteriormente, a artemídia envolve a participação ativa de profissionais com capacidades complementares, passando pela experiência multidisciplinar do E.A.T. de Billy Klüver e Rauschenberg, na década de 1960, seguindo pela experiência interdisciplinar do projeto ReConstitution (2012) do coletivo norte-americano Sosolimited. Acreditamos que as experiências de desenvolvimento de obras de artemídia em um contexto colaborativo aberto constituem uma experiência transdisciplinar, quando há espaço para o diálogo aberto, com trocas de metodologias entre os envolvidos, em que as possibilidades de interação são regadas pelos diversos níveis de realidade que convivem em um mesmo espaço, em busca de um ponto em comum. Para a pesquisadora Diana Domingues (2009, p. 273), “[...]quando as disciplinas investigam as mesmas questões, todas as ciências se tornam uma única ciência”. Esta “integração entre ciências” através das trocas entre artistas e cientistas foi institucionalizada, de certo modo, com a criação dos Medialabs, tendo como antecedente o Media Laboratory do MIT58, fundado por Nicholas Negroponte, em 1985. Alguns anos mais tarde (1993), o laboratório PARC59 de pesquisas da Xerox abriu um programa de residências artísticas dentro de suas instalações, o PAIR (Parc Artist in Residence) que contava com artistas que trocavam experiências diretamente com os cientistas dentro dos laboratórios da companhia. Segundo o pesquisador Stephen Wilson (2005, p. 238), da Universidade do Estado de São Francisco60 (EUA), "[...] as artes podem funcionar como uma zona de pesquisa independente. [...] Elas poderiam muito bem valorizar a pesquisa segundo critérios bem diferentes dos mundos comercial e científico". O pesquisador acrescenta que, 57
“Our prejudices are fruitful: it is precisely the fusion of prejudices which opens towards truth.” Tradução nossa. “Massachusetts Institute of Technology”. Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Tradução nossa. 59 “Palo Alto Research Center”. Centro de Pesquisa de Palo Alto. Tradução nossa. 60 “San Francisco State University”. Tradução nossa. 58
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Os artistas podem ampliar o processo de pesquisa de muitas maneiras. Eles podem definir novos tipos de questões de pesquisa, fornecer interpretações não-ortodoxas dos resultados, assinalar oportunidades de desenvolvimento perdidas, explorar e articular implicações de amplo alcance da pesquisa, representar perspectivas de usuários potenciais e ajudar a comunicar as descobertas das pesquisas de maneiras eficazes e provocantes (WILSON, 2005, p. 239).
Atualmente, os hacklabs, os medialabs e os makerspaces são alguns exemplos de espaços nos quais tais encontros entre arte, ciência e tecnologia acontecem. Veremos a seguir, mais detalhes sobre estes. 2.2 Hacklabs, Medialabs e Makerspaces: espaços de colaboração Os Hacklabs, os Medialabs e os Makerspaces são algumas denominações de espaços de trabalho coletivo, que facilitam a colaboração entre os frequentadores na realização de projetos, sejam eles individuais ou coletivos. Embora todos dialoguem com as ideias de compartilhamento de conhecimento, existem algumas diferenças entre cada prática. A seguir, veremos detalhes de cada um acompanhados de exemplos. 2.2.1 Hacklabs – laboratórios hacker Os hacklabs podem ser traduzidos como “laboratórios hacker”. Para compreendermos tais laboratórios, precisamos aproximar alguns pontos relevantes da evolução da computação e de sua relação com os desenvolvedores e a sociedade, partindo dos laboratórios acadêmicos até o contexto atual. O termo hacker, de acordo com a Wikipedia, denomina aquele indivíduo que “acessa a um sistema de computadores passando por seu sistema de segurança”61 ou “alguém que cria customizações
inovadoras
ou
combinações
entre
eletrônicos
e
equipamentos
de
computação”62 ou, ainda, “alguém que combina excelência, brincadeira, inteligência e exploração na realização de suas atividades.”63 A palavra também é utilizada como verbo: “hackear” significa encontrar uma saída rápida para um problema, fazer uma “gambiarra” para que algo funcione, nem sempre de forma elegante, mas não menos eficiente. O que se 61
“[...] someone who accesses a computer system by circumventing its security system.” Tradução nossa. (Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Hacker>. Acesso em: 20 fev. 2013). 62 “[…] who makes innovative customizations or combinations of retail electronic and computer equipment.” Tradução nossa. Ibidem. 63 “[…] who combines excellence, playfulness, cleverness and exploration in performed activities. “Tradução nossa. Ibidem.
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torna relevante aqui é a chamada “ética hacker”, na qual constam elementos fundantes para aquilo que hoje conhecemos como cultura livre. Segundo o jornalista Steven Levy, em seu livro Hackers – Heroes of the Computer Revolution64 (1984), o embrião da cultura hacker teve início no final da década de 1950, nos laboratórios do MIT, quando a organização de estudantes Tech Model Railroad Club65 (TMRC) fazia experimentos com automação de cruzamentos de maquetes de linhas de trem, usando uma série de relés de telefonia, entre outros equipamentos. Posteriormente, este grupo passou a programar o TX-0, um dos primeiros computadores transistorizados do mundo, localizado no Research Laboratory of Electronics66 (RLE) do instituto, usando, principalmente, os horários noturnos disponíveis para desenvolver suas pesquisas. As jornadas de trabalho eram muito longas e existia um clima de devoção em torno das atividades. Conforme aponta Levy (1984), não houve um momento específico em que os participantes desse movimento redigiram um manifesto, ou tentaram atrair novos membros. A ética hacker reunia a “filosofia do compartilhamento, abertura, descentralização e ‘mão na massa’ de qualquer modo para evoluir as máquinas e melhorar o mundo”67 (LEVY, 1984, p. 4). Os softwares desenvolvidos pelos hackers eram compartilhados entre a comunidade de usuários (naquele momento, a maioria vinculados a instituições de ensino superior), afinal, segundo a ética hacker, a informação deveria ser livre. Portanto, quando uma equipe de desenvolvedores do MIT portou o código assembler68 do TX-0 para o PDP-1 (uma migração de uma ferramenta de uma plataforma para outra), a Digital Equipment Corporation (DEC), fabricante do PDP-1, pediu aos desenvolvedores uma cópia do programa para que este pudesse ser distribuído aos outros usuários do sistema. Para os programadores, isto foi uma honra e a questão de royalties nunca foi trazida à tona: “quando você escrevia um bom programa você estava construindo uma comunidade, não produzindo um produto” (LEVY, 1984, p. 47). Com o desenvolvimento de suas atividades concentradas, principalmente, nos laboratórios de pesquisa das universidades e com recursos vindos do ministério de defesa 64
Hackers – Heróis da revolução dos computadores. Tradução nossa. Clube de Ferromodelismo Tecnológico. Tradução nossa. 66 Laboratório de Pesquisa em Eletrônica. Tradução nossa. 67 “[…] philosophy of sharing, openness, decentralization, and getting your hands on machines at any cost to improve machines, and to improve the world.” Tradução nossa. 68 O “assembler” é o programa que transforma o código fonte de um programa para os opcodes, que são as instruções em linguagem de máquina para a operação do processador. 65
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norte-americano, como o departamento ARPA69, algumas organizações antiguerra acreditavam que o movimento hacker estava sendo manipulado pelo governo para construir tecnologias para novos armamentos. No final dos anos 1960, muitos jovens associavam os computadores às máquinas de controle que seriam usadas contra os pobres e indefesos. Levy (1984) traz um exemplo clássico no qual um consumidor reclama do erro no valor de uma conta para pagar e o funcionário responde prontamente que foi “o computador que fez”, e somente um esforço “muito grande” conseguiria corrigir aquele engano; algo que vemos, ainda hoje, quando operamos máquinas em nossos empreendimentos e em alguns casos nos tornamos reféns de seu funcionamento. Além disso, tal devoção dos hackers por suas atividades os envolvia em um mundo paralelo, no qual seus habitantes conviviam entre si, conversando em uma linguagem própria e fria. Levy (1984) cita o professor Joseph Weizenbaum, que comenta em seu livro Computer Power and Human Reason – From Judgment to Calculation (1976), sobre a forma de trabalho dos “programadores compulsivos”: Eles trabalham até quase cair, vinte, trinta horas de cada vez. Sua comida, se eles providenciam, é trazida até eles: café, Coca-Cola, sanduíches. Se possível, eles dormem em camas próximo às impressoras. Suas roupas amarrotadas, suas faces não lavadas e não barbeadas, e seus cabelos despenteados comprovam que estão abstraídos de seus corpos e do mundo onde se movem (WEIZENBAUM apud LEVY, 1984, p. 113)70.
Weizenbaum traça, dessa forma, um contraponto sobre o envolvimento extremo dos seres humanos com a tecnologia computacional. Entre 1964 e 1966, o professor desenvolveu o software de inteligência artificial “ELIZA”, que dialogava com o usuário, interpretando o papel de um terapeuta. O envolvimento emocional de certos “pacientes” com o software levou o cientista a escrever o livro, no qual trata das diferenças entre as máquinas e os humanos, decisões e escolhas. Segundo o autor, somente os humanos têm a capacidade de escolher: uma ação que leva em conta julgamento, emoções, parâmetros os quais não são calculáveis pelos computadores71. Na década de 1970, surgiram iniciativas de popularizar o uso dos computadores na sociedade, tal como o People’s Computer Company (PCC), idealizado por Robert Albrecht, 69
“Advanced Research Projects Agency”, ou Agência de Projetos de Pesquisa Avançados. Tradução nossa. “They work until they nearly drop, twenty, thirty hours at a time. Their food, if they arrange it, is brought to them: coffee, Cokes, sandwiches. If possible, they sleep on cots near the printouts. Their rumpled clothes, their unwashed and unshaven faces, and their uncombed hair all testify that they are oblivious to their bodies and to the world in which they move.” Tradução nossa. 71 Fonte: Computer Power and Human Reason. Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Computer_Power_and_Human_Reason>. Acesso em: 21 fev. 2013. 70
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que editava um periódico de mesmo nome e que tratava sobre o poder dos computadores e seu uso de forma pessoal, individual e criativa. O projeto também levava as máquinas às escolas americanas, aproximando as crianças ao mundo da computação: Albrecht havia fechado um acordo com a DEC, que lhe ofereceu um minicomputador PDP-8 e um par de terminais em troca da redação do livro My Computer Likes Me72 para a empresa. Figura 10 – Capa e sexta página do primeiro número do People’s Computer Company, (out. 1972)
Disponível em: <http://www.digibarn.com/collections/newsletters/peoples-computer/peoples-1972oct/index.html>. Acesso em: 26 fev. 2013.
Já o projeto Community Memory, criado por Lee Falsenstein, Efrem Lipkin e Mark Szpakowski, em 1973, foi o primeiro BBS73 público, localizado diante da loja de discos Leopold’s Records, em Berkeley (EUA), na qual as pessoas adicionavam mensagens sobre diversos temas que podiam ser buscadas posteriormente pelos usuários. Esta iniciativa possibilitou o primeiro contato com os computadores para muitas pessoas e estava em sintonia com o movimento de contracultura da época: antiguerra, ecológico, de baixo custo, decentralizado e de tecnologia amigável74. Segundo Falsenstein, houve uma aceitação acima
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Meu Computador Gosta de Mim. Tradução nossa. “Bulleting Board System” é um sistema em rede para exibição de mensagens, onde os usuários podem adicionar, ler e editar as informações a partir de um terminal remoto. 74 Fonte: Community Memory. Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Community_Memory>. Acesso em: 25 fev. 2013. 73
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da esperada por parte dos usuários, quando se davam conta de que não existia nenhum intermediário entre eles e a máquina75. Figura 11 – Terminal do Community Memory do lado de fora da Leopold’s Records, Berkeley, Califórnia, 1975
Lee Felsenstein. Disponível em: <http://www.computerhistory.org/revolution/the-web/20/377/2046>. Acesso em 25 fev. 2013.
O uso da linguagem de programação BASIC76 foi responsável por disseminar o uso dos computadores a não-cientistas, por se tratar de um conjunto de instruções que se aproximavam à língua inglesa, tornando-a mais compreensível para o público geral. É importante lembrar que, nesta época, os computadores não tinham uma interface gráfica77 e precisavam ser programados para serem utilizados. Portanto, existiam revistas especializadas que traziam listagens de programas que deviam ser escritos em BASIC, para então serem executados pela máquina. Alguns hackers mais ortodoxos, da “primeira geração” do final da década de 1950, não aceitavam o uso de tais linguagens, porque sua “estrutura limitada não encorajava o acesso máximo à máquina e diminuía o poder dos programadores”78 (LEVY, 1984, p. 139). As iniciativas trazidas anteriormente deram início a um movimento de aproximação amistosa entre os computadores e o público geral. Com o surgimento dos microprocessadores, alguns engenheiros passaram a projetar os primeiros microcomputadores, que utilizariam aqueles componentes como unidade central de processamento (CPU), com um preço muito 75
Lee Falsenstein: The First Community Memory. Disponível em: <http://www.computerhistory.org/revolution/theweb/20/377/2328>. Acesso em: 26 fev. 2013. 76 “Beginner’s All-purpose Symbolic Instruction Code”, ou Códigos de Instrução Simbólicos de Propósito Geral para Iniciantes. Tradução nossa. (Fonte: BASIC. Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/BASIC>. Acesso em: 25 fev. 2013). 77 Comentado no capítulo 1.2 deste trabalho. 78 “its limited structure did not encourage maximum access to the machine and decreased a programmer's power”. Tradução nossa.
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inferior ao dos computadores da época. Foram iniciativas de pequenas empresas como a MITS79, localizada na cidade de Albuquerque, no Novo México (EUA), que produziu o ALTAIR 8800 (1975), o qual funcionava com o chip 8080 da Intel. O lançamento deste microcomputador abriu o mercado para outras empresas que passaram a produzir expansões de hardware para esta plataforma, como placas de memória e dispositivos entrada e saída. Estas ações foram impulsionadas pelo surgimento do Homebrew Computer Club (HCC), um grupo de amadores que se encontravam periodicamente e estavam desenvolvendo seus próprios computadores e periféricos os quais tinham interesse em trocar informações sobre o tema entre pessoas com interesses semelhantes. A primeira reunião aconteceu em março de 1975 (LEVY, 1984). Estes encontros ainda não haviam sido chamados de hacklabs, porém envolviam a ética hacker de compartilhamento de informação, de colaboração e “mão na massa”80. Os membros do grupo compartilhavam o entusiasmo pela tecnologia, com um certo caráter libertário, de trazer a tecnologia ao alcance de todos81. Os primeiros hacklabs surgiram junto ao movimento mídia ativista e de squatters82 na Europa, dando suporte às atividades destes centros, criando infraestrutura e usando a tecnologia como meio de expressão. O Chaos Computer Club (CCC), por exemplo, fundado em 1981, é um exemplo vinculado ao Komumne I, um centro ocupado autônomo de Berlim. Em 1984, a agência de telecomunicações alemã Deutsche Bundenpost detinha o monopólio da telefonia do país e cobrava preços altíssimos por um modem83. Além disso, conectar um modem sem o selo oficial da companhia à rede telefônica tornou-se um crime que poderia levar a até cinco anos de prisão. Os hackers do CCC resolveram criar um modem próprio para acessar o serviço BTX (um aparelho que combinava o telefone a um televisor e um teclado, criando uma rede básica de computadores). Tal sistema oferecia a possibilidade de realizar a transferência de pequenas quantias de dinheiro, para efetuar doações ou contratar alguns serviços com o valor máximo de 9,99 Marcos alemães. Os membros do CCC foram capazes de descobrir a senha do banco de Hamburgo e realizaram várias doações do banco 79
“Model Instrumentation Telemetry Systems”, ou Sistemas Telemétricos de Instrumentação Modelo. Tradução nossa. O MITS começou suas atividades criando luzes “traçantes” para hobbistas que criavam foguetes caseiros, que permitiam que a trajetória dos foguetes fossem fotografadas, passando para a produção de calculadoras digitais posteriormente. 80 “Hands-on”. Tradução nossa. 81 Este tom político era muito enfatizado por Fred Moore, um dos idealizadores do HCC, embora o grupo tivesse uma forte tendência focar-se nos desafios técnicos (LEVY, 1984). 82 Os squatters são denominados aqueles indivíduos que ocupam áreas ou alguma edificação abandonada ou desocupada. No Brasil, podemos identificar as favelas ou o movimento sem-terra como um movimento de squatters, por exemplo. (Squatting. Disponível em: < http://en.wikipedia.org/wiki/Squatting >. Acesso em: 22 fev. 2013). 83 Modem (MOdulador-DEmodulador) é um equipamento usado para modular e demodular um sinal analógico para codificar informação digital em um tráfego de informações entre dois pontos. Quando o acesso à Internet era predominantemente feito através de conexão discada, os computadores obrigatoriamente efetuavam a conexão, utilizando um Modem.(Fonte: Modem. Disponível em: < http://en.wikipedia.org/wiki/Modem >. Acesso em: 23 fev. 2013).
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para a conta do clube no valor de 9,99 cada uma, somando 134 mil Marcos. No dia seguinte, o grupo devolveu o dinheiro diante da imprensa, alertando sobre os problemas de segurança do sistema. Tal feito chamou a atenção do público para a palavra “hacker”, que não carregou nenhum tom negativo, uma vez que serviu para mostrar a vulnerabilidade do sistema84. Figura 122 - Wau Holland, cofundador do CCC, operando um modem de acoplador acústico em uma cabine telefônica
Tim Pritlove. Disponível em: < http://www.nycresistor.com/index.php?s=ccc%20history > Acesso em: 23 fev. 2013
Atualmente, os termos hacklabs e hackerspaces são utilizados como sinônimos; no entanto, os últimos são espaços que funcionam, geralmente, dentro de alguma instituição, ou na configuração de um clube onde os membros arcam com uma taxa para custear seus gastos mensais, o que acaba dando um sentido diferente àquela “liberdade” relacionada à gênese dos hacklabs, que tinha um viés mais político e anárquico, constantemente, localizados em centros sociais ocupados, autônomos, mantidos por voluntários e provendo acesso livre aos computadores e à internet (YUILL, 2008). Sabemos que atualmente o acesso à tecnologia computacional ainda é deficiente em nosso país e que precisamos dar condições para que a informação seja distribuída mais uniformemente entre todos. Porém, também, é sabido que encontramos com cada vez mais frequência pontos de acesso a computadores conectados à internet, as chamadas lan-houses ou cybercafés, onde podem-se realizar as mais diversas operações, desde o pagamento de contas e consulta de informações legais até votações online incentivadas pela mídia de massa, gerando ainda mais tráfego ao redor das mesmas opiniões, porém, desta vez, com um tom de 84
Disponível em: <http://hackerspaces.org/static/The_Beginning.zip>. Acesso em: 23 fev. 2013.
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“liberdade” pois, ao invés de escolher o conteúdo com o controle remoto, agora, a ação pode ser feita também com o teclado do computador. Portanto, talvez o foco da questão já não seja mais o acesso, mas sim o "conteúdo". Não podemos desperdiçar o potencial de uma mídia interativa, um instrumento que pode “tocar muitas notas”, mas que insiste em um único estilo, tendo um comportamento de mídia de massa, com um emissor e muitos receptores. A “ética hacker”, comentada ao longo das últimas páginas, pode muito bem ser aplicada no dia a dia, mesmo longe dos computadores: na colaboração interpessoal, no compartilhamento de informação que, muitas vezes, fica “criptografada” para uma certa fatia da população, na forma de burocracia intrincada no espírito “mão na massa” de buscar soluções e atacar as dificuldades da forma que for possível, além da devoção por algo que acreditamos, buscando criar um mundo melhor. Ao traçar uma evolução do movimento hacker, identificamos alguns padrões que parecem acontecer ciclicamente. Inicialmente, existiu o desafio técnico de ampliar as funções de uma máquina que teria uso estritamente científico e militar a outras frentes, tornando-a mais acessível e compartilhando as conquistas com o restante da comunidade. Logo após, houve uma busca por aproximar tais máquinas ao público geral, através de terminais disponibilizados em lugares “comuns”, dotados de aplicações sociais, como trocas e consultas de mensagens. A seguir, houve um movimento pela distribuição massiva dos terminais e a simplificação de sua linguagem, ou seja, notamos a existência de fluxos de disseminação de tecnologia e abertura de conhecimento promovidos pelo movimento hacker. Atualmente, o movimento é o de "conscientização" e de "empoderamento", uma vez que os computadores já são realidade para uma grande fatia da população e atingimos um nível de uso passivo da ferramenta, quando somos cada vez mais usuários, consumidores de tecnologia, incentivados a comprar para poder usufruir dos recursos mais modernos. A artemídia contribui para questionar esta prática, ao fazer uso destas ferramentas técnicas de forma criativa, exercitando o diálogo entre desenvolvedores de áreas diferentes, buscando uma compreensão que deve envolver, sobretudo, respeito. Vejamos a seguir o caso dos medialabs. 2.2.2 Medialabs – laboratórios de mídia Os Medialabs, em sua tradução literal, significa “laboratórios de mídia”. Estes laboratórios são espaços de investigação que tratam das formas de comunicação relacionadas com as novas mídias, abertos a experimentações relacionadas à cultura livre, à arte, aos
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espaço urbano, à cultura digital, à multimídia, entre outros. Geralmente, são espaços que praticam a autogestão, podendo estar vinculados a órgãos públicos (como o caso do Medialab Prado, de Madri, que funciona com investimento do setor das artes da prefeitura da cidade85), ou instituições de ensino (como o MIT Media Lab, citado anteriormente, que opera, atualmente, com cifras anuais de aproximadamente 35 milhões de dólares, patrocinados por diversas empresas de alta tecnologia, compondo um cenário de pesquisa singular e, deve-se dizer, com um viés notoriamente comercial86). Tais ambientes são caracterizados pela forma de trabalho distribuído, que prioriza a "prática" sobre a teoria e pelo fluxo de informação entre os participantes que misturam, constantemente, as posições de aluno X professor, a ponto de dissolver estas barreiras. Além disso, o movimento DIY87 (faça você mesmo) aliado às possibilidades de intercâmbio das redes sociais online especializadas88 permite o aprendizado e a troca de informação entre seus membros. A lógica do software livre é empregada em grande parte dos projetos, através da prática do compartilhamento de resultados e publicação de documentação detalhada do processo de criação de cada caso. Ao realimentar esta rede, outras ideias são desenvolvidas, baseando-se naqueles resultados obtidos anteriormente, num espírito de evolução do que já foi feito e que pode ser conduzido a outros níveis de desenvolvimento. Diversos centros e instituições de ensino de artemídia adotam essas metodologias em suas atividades. O espaço Eyebeam – Art + Technology Center, localizado na cidade de Nova Iorque, é uma instituição sem fins lucrativos, que oferece residências artísticas e laboratórios com ferramentas para a pesquisa e experimentação no campo das novas mídias e das chamadas “novas tecnologias”. Conforme mencionado em sua página oficial, o centro Eyebeam, [...] desafia a convenção, celebra o hack, educa a próxima geração, encoraja a colaboração, oferece gratuitamente suas contribuições para a comunidade e convida
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Qué es – Medialab-Prado Madrid. Disponível em: <http://medialab-prado.es/article/que_es>. Acesso em 21 jan. 2013. Fonte: Quick Facts | MIT Media Lab. Disponível em: <http://www.media.mit.edu/about>. Acesso em: 21 jan. 2013. 87 “Do-it-Yourself”. Tradução nossa. O termo está relacionado ao movimento punk de contracultura nascido no final da década de 1960, quando os grupos musicais produziam suas próprias gravações, distribuíam seus discos e editavam fanzines para divulgação de seus trabalhos independentemente do ecossistema musical existente. 88 No Brasil, existe a comunidade online “Laboratório de Garagem” (Disponível em: <http://labdegaragem.com>. Acesso em 21 jan. 2013), uma das maiores do ramo no país, onde os usuários trocam informações gratuitamente nos fóruns de discussões e são convidados a adquirir os componentes e kits de desenvolvimento necessários para seus projetos na loja online do grupo. É uma prática comum adotada por outros empreendimentos online, tais como os norte-americanos Sparkfun (Disponível em: <https://www.sparkfun.com>. Acesso em 21 jan. 2013) e Adafruit Industries (Disponível em: <http://www.adafruit.com>. Acesso em 21 jan. 2013). 86
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o público a compartilhar em um espírito de abertura: código aberto, conteúdo aberto e distribuição aberta (EYEBEAM, 1997, s\p).89
Já o programa ITP90, da Universidade de Nova Iorque91, começou em 1971, a partir da criação do Alternate Media Center92 (AMC), por George Stoney e Red Burns, com o intuito de explorar novas formas de comunicação e expressão. Atualmente, o curso conta com professores de diversas formações, com especial ênfase no desenvolvimento de interfaces físicas, linguagens de programação, animação e vídeo. Em muitas disciplinas, os estudantes devem publicar relatórios em seus websites pessoais ou nas páginas dos cursos, que transformam-se em repositórios de referência93 para a comunidade de pesquisadores da área. Podemos citar como exemplo a página do Sensor Workshop94 do ITP, na qual a turma atual (em andamento) é responsável pela manutenção das informações existentes, que são revisitadas e incrementadas pelos próprios alunos. É um método interessante, pois reúne a informação em um único lugar, proporcionando a interconexão entre os alunos de diferentes períodos, seguindo a “fórmula” da produção de conhecimento em regime de colaboração praticada em rede na atualidade. Além disso, a possibilidade de revisar o trabalho realizado por colegas numa plataforma aberta, distribui a função de correção, num sistema que busca a homeostase – algo que pode-se comprovar em sistemas globais como a Wikipedia95. A figura a seguir mostra um exemplo de uma das páginas editadas por um dos alunos que, nesse caso, traz dados sobre o funcionamento e os usos de sensores de gás. As informações podem ser editadas por todos, criando um histórico evolutivo de atualizações.
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“[…] challenges convention, celebrates the hack, educates the next generation, encourages collaboration, freely offers its contributions to the community, and invites the public to share in a spirit of openness: open source, open content and open distribution.” Tradução nossa. (Fonte: About | devbeam.org. Disponível em: <http://www.eyebeam.org/about>. Acesso em 26 jan. 2013). 90 “Interactive Telecommunications Program”, ou Programa de Telecomunicações Interativas. Tradução nossa. (Fonte: <http://itp.nyu.edu/sigs/program/history/>. Acesso em 29 jan. 2013). 91 “NYU”, ou “New York University”. Tradução nossa. 92 Centro de Mídia Alternativo. Tradução nossa. 93 Podemos considerar a Internet como o grande repositório agregador de informações da contemporaneidade, quando as ferramentas de busca (como Google, ou Yahoo!) são capazes de retornar praticamente qualquer conteúdo presente em suas páginas em frações de segundo. Além disso, existem serviços que facilitam a organização de informação e que são mantidos por comunidades, como o caso das páginas Wiki, com o maior exemplo da Wikipedia (Disponível em: <http://www.wikipedia.org>. Acesso em: 29 jan. 2013), ou ainda, no campo do desenvolvimento de software livre, a comunidade Github (Disponível em: <https://github.com>. Acesso em: 29 jan. 2013), no qual vários programadores mantêm o código-fonte de seus trabalhos disponíveis para serem consultados, analisados e alterados pela comunidade. 94 Workshop de Sensores. Tradução nossa. (Disponível em: <http://itp.nyu.edu/physcomp/sensors/>. Acesso em: 30 jan. 2013). 95 Disponível em: <http://www.wikipedia.org>. Acesso em: 31 jan. 2013.
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Figura 13 - Referência de um sensor de gás, gerada por um aluno do workshop
.
Disponível em: < http://itp.nyu.edu/physcomp/sensors/Reports/GasSensors>. Acesso: 30 jan. 2013.
No Brasil, existem grupos voltados para a investigação e ensino de artemídia, que atuam tanto na esfera acadêmica, quanto através de coletivos independentes ou com investimento de setores públicos. O grupo LabOCA (Laboratório de Computação e Artes), por exemplo, “é um projeto de laboratórios nômades com o objetivo de ensinar e pesquisar sobre o uso da ciência da computação para fins artísticos”96 criado por Jarbas Jácome, Ricardo Brasileiro e Jerônimo Júnior, no ano de 2010. Esta iniciativa independente possibilita que os integrantes produzam obras coletivamente a cada encontro, priorizando a prática sobre a teoria em um espírito de "apropriação tecnológica". Os participantes dos workshops mantêm-se em contato, posteriormente, através de um grupo de discussões, no qual diversos tópicos seguem em debate após os encontros presenciais. Figura 14 – Oficina do grupo LabOCA e Jorge Crowe durante o FILE 2010, São Paulo
Disponível em: < http://flic.kr/p/8oZ6MU >. Acesso em: 6 mar. 2013.
96
Disponível em: <http://olaboca.wordpress.com>. Acesso em: 29 jan. 2013.
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Dentro da esfera pública, podemos citar o laboratório LABMIS, vinculado ao Museu da Imagem e do Som da cidade de São Paulo e que promove a “colaboração coletiva, compartilhando o espírito de criação e distribuição livres da cultura digital”97, além de lançar editais públicos convocando artistas para desenvolver seus trabalhos na estrutura do laboratório, em um programa de residência artística. Os artistas residentes contam com acompanhamento teórico e prático durante o desenvolvimento de suas obras. Na academia, podemos apontar o grupo NANO (Núcleo de Arte e Novos Organismos), que atua no âmbito da graduação e do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Escola de Belas Artes da UFRJ, produzindo pesquisas na intersecção entre arte, tecnologia e ciências, buscando “consolidar um espaço transdisciplinar para a reflexão e fomento de novos modelos cognitivos com base na prática e trocas dialógicas com foco nas artes assistidas pelas tecnologias da comunicação/informação”98. Tais pesquisas fazem uso de metodologias de diversas disciplinas, de acordo com a demanda de cada trabalho artístico em criação. Um dos projetos desenvolvidos se chama “Telebiosfera. Experimento entre arte, natureza e telemática”99, no qual o grupo propõe a conexão telemática entre dois pequenos terrários em que as plantas devem transmitir informações de seu microecossistema entre si. Entre os pontos metodológicos listados no projeto constam “encontros transdisciplinares”, nos quais artistas e pesquisadores são convidados a trocar experiências em debates abertos ao público, buscando dar visibilidade às práticas experimentais que conduzem à produção de conhecimento científico e o entrecruzamento de áreas do saber. O processo de pesquisa é documentado e colocado à disposição da comunidade para consulta.
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LABMIS | MIS – Museu da Imagem e do Som de São Paulo. Disponível em: <http://www.mis-sp.org.br/labmis>. Acesso em :31 jan. 2013. 98 Fonte: Sobre | NANO. Disponível em: <http://www.nano.eba.ufrj.br/nano/>. Acesso em: 31 jan. 2013. 99 Telebiosfera. Experimento entre arte, natureza e telemática. Disponível em: <http://www.nano.eba.ufrj.br/2013/01/telebiosfera-experimento-entre-arte-natureza-e-telematica/>. Acesso em: 19 fev. 2013.
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Figura 15 – Telemediações Open Lab: experimentações com medidas elétricas em organismos vivos
Disponível em: <http://www.nano.eba.ufrj.br/2011/04/telemediacoes-open-lab/>. Acesso em: 20 mar. 2013.
Os exemplos trazidos anteriormente ilustram exemplos de laboratórios de mídia independentes, laboratórios vinculados a órgãos públicos e laboratórios baseados em estruturas acadêmicas, dentro de universidades. Os makerspaces também constituem espaços de trabalho coletivo e associativo; vejamos a seguir suas características. 2.2.3 Makerspaces – espaços de criação Os makerspaces100, ou fablabs101, como também são chamados, são espaços de trabalho coletivo que funcionam, geralmente, através do pagamento de uma taxa, mensal ou diária, onde os membros compartilham ferramentas, tecnologias e conhecimento para produção de protótipos de ideias e produtos. O termo também é usado como sinônimo dos hackerspaces e de fato coloca em prática a ética hacker de compartilhamento de informação, conhecimento livre e “mão na massa”, porém com uma maior ênfase na criação de objetos físicos, do que software. Segundo Chris Anderson, autor do livro Makers: The New Industrial Revolution102 (2012), somos todos makers desde a infância: “Se você gosta de cozinhar, você é um maker de cozinha e seu fogão é sua bancada [...]. Se você gosta de plantar, você é um maker de jardins.”103 (ANDERSON, 2012, p. 13). Com a prática do compartilhamento da era web, 100
Espaços de criação. Tradução nossa. Laboratórios de fabricação. Tradução nossa. 102 Makers: A Nova Revolução Industrial. Tradução nossa. “Makers” significa “fabricantes” ou “criadores”. 103 “If you love to cook, you’re a kitchen Maker and your stove is your workbench […]. If you love to plant, you’re a garden Maker.” Tradução nossa. 101
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muitos criadores passaram a publicar seus avanços na forma de “receitas passo a passo”104 textuais ou através de vídeos explicativos. Dessa forma, muitos projetos passaram a ser desenvolvidos coletivamente, aprimorados, conectando seus criadores virtualmente. Os makerspaces aproximaram os criadores “fisicamente” em um mesmo local. Nestes espaços, os frequentadores podem utilizar ferramentas de desenho assistido por computador (CAD105), máquina de corte laser ou as impressoras 3D, por exemplo. Os objetos devem ser previamente projetados em um software específico para, então, serem enviados para fabricação. No entanto, o principal elemento dos makerspaces é o componente humano: sem a possibilidade de aprendizado coletivo, estes projetos não passariam unicamente de ideias e é justamente no contato interpessoal que a inovação acontece. Os makerspaces contam com atividades de formação para capacitar seus membros a usar as ferramentas que o espaço dispõe, mas, também, mantêm sua programação aberta a propostas sugeridas pelos próprios usuários, que oferecem oficinas e encontros acessíveis àqueles que estiverem interessados em aprender determinado tema. O Artisan’s Asylum106, por exemplo, é um dos maiores makerspaces da costa leste dos Estados Unidos, uma organização sem fins lucrativos que “promove o ensino, aprendizado e prática de artesanato de todas variedades”107 e pretende, conforme cita em sua página na web, ajudar as pessoas a se sustentarem, a partir de suas criações108 (os workshops que acontecem no espaço podem ser gratuitos ou pagos e funcionam mediante a inscrição antecipada em um sistema online até esgotar o limite de vagas).
104
Também, conhecidos como “how-to’s”. “Computer Aided Design”. Tradução nossa. 106 Asilo do Artesão. Tradução nossa. O espaço fica localizado na cidade de Somerville, no estado de Massachusetts, EUA. 107 “[…] promote the teaching, learning and practicing of craft of all varieties.” Tradução nossa. (Fonte: About Artisan’s Asylum Inc. Disponível em: <http://artisansasylum.com/?page_id=215>. Acesso em: 1 mar. 2013.) 108 Fonte: <http://artisansasylum.com/?page_id=677>. Acesso em: 2 mar. 2013. 105
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Figura 16 – Etapa de testes do Projeto Hexapod, no makerspace Artisan’s Asylum
Chris Devers. Disponível em: < http://flic.kr/p/bYsz3b >. Acesso em: 6 mar. 2013.
Quando falamos do componente social dos makerspaces, queremos salientar a importância das trocas de informação, dos encontros interculturais, da possibilidade de aprendizado coletivo e de choques de ideias que não aconteceriam em outras circunstâncias. Quando um mesmo espaço engloba ferramentas que podem ser aplicadas em áreas tão diversas quanto o desenvolvimento de circuitos eletrônicos, projetos de joias, móveis, roupas ou peças para bicicletas, eventualmente, surgirão colaborações entre pessoas de áreas diversas, com resultados únicos e imprevisíveis. Além disso, os projetos que seguem a cartilha do compartilhamento de informações, de “código aberto”, tendem a ter um crescimento acelerado pela contribuição coletiva da comunidade. Chris Anderson (2012) afirma que vivemos, atualmente, a terceira revolução industrial, quando conseguimos combinar a produção de manufatura digital com a manufatura pessoal, quando os produtos são desenhados digitalmente e podemos escolher sua saída entre “local” (imprimir na impressora 3D caseira) ou “global” (quando enviamos a um centro com capacidade de imprimir o produto em grande escala). A revolução do movimento maker e das ferramentas de prototipagem disponibilizadas em centros coletivos como os makerspaces é comparável ao desenvolvimento dos microcomputadores na metade da década de 1980, quando a tecnologia passou a ser acessível mais amplamente ao cidadão comum. A ética hacker de conhecimento livre permanece latente no movimento de software livre e agora também com o conceito de hardware livre. Dessa forma, novos modelos de negócio vêm sendo colocados em prática, sendo que a propriedade intelectual não é cobrada e é permitido o compartilhamento da informação, gerando outras fontes de ingresso, como o oferecimento de treinamento, suporte e mão de obra especializada, dentre outros.
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A empresa de software norte-americana Red Hat, por exemplo, está fundada na venda de assinaturas de distribuições do sistema operacional de código-aberto LINUX, oferecendo suporte técnico ilimitado e atualizações contínuas do sistema, enquanto conta com uma grande comunidade de desenvolvedores voluntários que constantemente aportam melhorias ao seu produto: uma inversão curiosa no modelo de negócios. Outro exemplo é a plataforma de prototipagem de circuitos eletrônicos Arduino (mais detalhes no Anexo 2 deste trabalho) produzida oficialmente na Itália. A companhia mantém o código-fonte de seu produto aberto para que os usuários estudem, façam alterações e compartilhem os resultados com a comunidade. Além disso, a licença permite a exploração comercial do hardware, que será compatível com a plataforma, porém deve utilizar outro nome. A possibilidade de consultar bibliotecas de conhecimento coletivo, representadas não somente pelos verbetes da Wikipedia, mas também por repositórios de código-fonte de software livre (como o Github109 ou o SourceForge110), de hardware livre (como o Open Hardware Repository111), ou ainda, de “objetos livres” (como o Thingiverse112), estimula o processo de criação dos desenvolvedores e realimenta a comunidade. Dessa forma, uma nova economia se desvela com um forte vínculo social entre os usuários, que agora integram-se mais intimamente às ferramentas que utilizam, podendo personalizá-las para que funcionem da maneira que desejarem.
109
O Github funciona como uma rede social para desenvolvimento de software. Os usuários podem criar comunidades de desenvolvedores, trabalhando simultaneamente em um mesmo projeto, com o controle de diferentes versões do mesmo documento. Dessa forma, é possível voltar a estágios anteriores do desenvolvimento (fazer uma navegação na linha do tempo) para estudar o código ou criar algo diferente a partir daquela ideia. Disponível em: <https://github.com>. Acesso em: 5 mar. 2013.
110 111
Disponível em: <http://sourceforge.net>. Acesso em: 5 mar. 2013.
O site lista vários esquemáticos de projetos <http://www.ohwr.org>. Acesso em: 5 mar. 2013.
112
avançados
de
dispositivos
eletrônicos.
Disponível
em:
O sistema possibilita o compartilhamento de objetos que podem ser impressos nas impressoras 3D. O serviço é vinculado à empresa americana Makerbot, que produz uma das impressoras 3D mais utilizadas, atualmente. Disponível em: < http://www.thingiverse.com/>. Acesso em: 5 mar. 2013.
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3. PRÁTICAS TRANSDISCIPLINARES EM ARTEMÍDIA Este capítulo traz a descrição e a análise de cinco experiências de trabalho coletivo relacionado à artemídia desenvolvida ao longo dos últimos três anos. Foram atividades práticas de ensino e produção colaborativa, utilizando tanto software quanto hardware livre, no formato de oficinas, hacklabs, projeto de instalações interativas e interfaces físicas, dentre outros. Tais eventos foram selecionados por compor uma amostragem abrangente de experiências em artemídia, em circunstâncias variadas. O projeto Narrativas Digitais foi escolhido por empregar uma equipe numerosa de pesquisadores, com formações e nacionalidades diversas aplicadas a um grupo de jovens de uma comunidade de pescadores da Bahia. O “Laboratório de arte interativa: arte e interfaces” foi selecionado por ser uma atividade vinculada a uma estrutura oficial de um curso inovador no contexto do ensino superior brasileiro (os Bacharelados Interdisciplinares da UFBA), reunindo estudantes cursando ênfases diversas como Artes, Humanidades, Saúde e Ciência e Tecnologia. Já o Workshop Introdução à Computação Física com Arduino e Pure Data foi abordado por trazer uma experiência de ensino de artemídia, através de uma iniciativa independente em um espaço de coworking – que se relaciona com a forma de trabalho dos makerspaces (abordados no item 2.2.3 deste trabalho). A experiência “Instalações interativas da mostra Toque para Mover Sentidos” foi incluída na análise por se tratar de uma experiência em artemídia com um fôlego maior, contando com oficinas e desenvolvimento de cinco instalações interativas com grupos de alunos de dezesseis a dezenove anos de idade, alunos de escolas públicas. Finalmente, a experiência “Hacklab Interfaces Físicas e controladores DIY aplicados a performances sonoras e audiovisuais, utilizando ferramentas livres” foi abordada por trazer uma experiência de hacklab (abordados no item 2.2.1 deste trabalho), utilizando ferramentas de software e hardware livre vinculada a um festival de cultura digital na cidade de Salvador. Quando consideramos tais práticas como atividades transdisciplinares, levamos em conta os axiomas propostos por Nicolescu (abordados no item 2.1.3 deste trabalho) nos quais o físico cita a existência de diferentes níveis de realidade, da inexistência de hierarquia e da lógica do “terceiro incluído”. Acredito que quando existem encontros interculturais entre pessoas com históricos diferentes, é necessário estabelecer um “protocolo de comunicação” (tomando a expressão emprestada das telecomunicações) que garanta a transmissão de informação, usando as analogias necessárias, que possibilitem um diálogo livre de preconceitos e que permitam a “emigração de teorias” (SANTOS, 1987, p.18), de uma área do
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saber para outra. Segundo Paulo Freire, “educar-se é impregnar de sentido cada ato cotidiano”, portanto, se não tivermos a sensatez de transformar nosso conhecimento em algo que faça alguma conexão com o universo de nosso interlocutor, não estaremos comunicandonos com sucesso. As atividades de trabalho coletivo em torno da artemídia possibilitam trocas entre indivíduos com backgrounds diferentes e, quando as ferramentas de desenvolvimento se tornam acessíveis a mais pessoas, as possibilidades de criação se ampliam e novas percepções são lançadas sobre lugares já visitados. Sabemos que se, por exemplo, fizermos a experiência de uma saída fotográfica em grupo a um espaço comum, ainda, que tenhamos o mesmo equipamento, teremos imagens diferentes, maneiras individuais de contar histórias e enquadrar percepções. Acredito que com a artemídia acontece algo parecido e aí reside o grande crescimento: quando, a partir do diálogo entre pessoas com especialidades diferentes, é possível rever seus conceitos com outros olhos, podendo chegar a conclusões que antes não eram trazidas a primeiro plano. Vimos relatos, neste sentido, quando houve colaboração entre Billy Klüver e Robert Rauschenberg, quando começaram a trabalhar juntos no E.A.T., na metade da década de 1960 (visto no item 1.1.1 deste trabalho). Dessa forma, vejamos, a seguir, como se deram tais experiências, dando início pelas oficinas de Narrativas Digitais. 3.1 Narrativas Digitais / Cairu (BA)
O projeto “Narrativas digitais para a participação comunitária na gestão de ecossistemas costeiros” foi uma atividade de extensão executada em colaboração entre a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade de Coruña (UDC, Espanha), realizada na vila de Garapuá, no município de Cairu (Bahia, Brasil) e, posteriormente, na cidade de Aguiño (Galícia, Espanha), coordenada pelos professores Juan Freire (UDC / Espanha) e Karla Brunet (UFBA / Brasil), durante o ano de 2010. O objetivo da atividade foi proporcionar experiências de desenvolvimento de suas próprias narrativas através dos meios digitais, buscando o fortalecimento de sua “identidade individual e coletiva da comunidade, gerando mecanismos de coesão comunitária e "empoderamento" de grupos de usuários para uma participação mais ativa nos processos de
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cogestão”113. Para isso, foram desenvolvidas oficinas de mapeamento com GPS114, fotografia, vídeo e áudio com alunos da Casa Familiar do Mar115, trazendo aspectos teóricos de cada tema, desde a lembrança da existência dos satélites orbitando ao redor da Terra, passando por linguagem de câmera e enquadramento até o funcionamento do áudio digital, sua conversão e possibilidades de edição e tratamento. Todas as atividades geraram relatórios detalhados listando o material utilizado, o desenvolvimento do trabalho de campo e a metodologia empregada que foram publicados no website do projeto, juntamente com os slides das apresentações das oficinas116. A atividade desenvolvida em Garapuá contou com uma equipe de professores e alunos das duas universidades, compondo um grupo com formações diversas, entre engenheiros, oceanógrafos, zoólogos e jornalistas. Durante os três dias de ações, acompanhamos os jovens no mapeamento dos espaços da comunidade, lugares de trabalho e lazer, conversando com os moradores e documentando histórias que sobrevivem ao tempo, principalmente, através da oralidade. O grupo total de alunos foi separado em quatro frentes de trabalho, cada uma abordando uma das linguagens, sendo que as saídas de campo eram mistas (com um integrante de cada linguagem) para que o material produzido fosse completo: incluindo fotografias, vídeos, áudios e a trajetória criada pelo GPS. Figura 17 – Detalhes sobre conversão analógico/digital, Oficina de áudio digital, Garapuá, abr. 2010
.
113
Fonte: Sobre Narrativas Digitais – BR. Disponível em: <http://ecoarte.info/narrativas/sobre-narrativas-br/>. Acesso em: 9 mar. 2013. 114 “Global Positioning System”, ou “Sistema de Posicionamento Global”, tradução nossa. 115 Iniciativa patrocinada pela Fundação Odebrecht, beneficia jovens de 15 a 25 anos de idade, mesclando períodos de uma semana de aulas teóricas e práticas, em regime integral dentro do projeto, com duas semanas de aplicação de conhecimentos na propriedade familiar. Disponível em: <http://www.fundacaoodebrecht.org.br/Sala-de-Imprensa/Noticia/145/CasaFamiliar-do-Mar-inaugura-Infocentro#.UTv2laVcC6E>. Acesso em: 9 mar. 2013. 116 As apresentações estão disponíveis em postagens no website do projeto: Apresentação da oficina de áudio <http://ecoarte.info/narrativas/2010/05/apresentacao-da-oficina-de-audio/>, Apresentação das oficinas de imagem digital <http://ecoarte.info/narrativas/2010/05/apresentacao-das-oficinas-de-imagem-digital-fotografia-e-video/> e Apresentação da oficina de GPS e Geolocalização <http://ecoarte.info/narrativas/2010/05/apresentacao-oficina-gps-geolocalizacao/>. Acesso em: 9 mar. 2013.
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Figura 18 – Trabalho em grupo, discutindo os lugares a serem visitados, Garapuá, abr. 2010.
Considero esta experiência como uma prática transdisciplinar em artemídia, pois durante o processo de desenvolvimento do trabalho, houve diversas trocas entre os facilitadores das atividades e os alunos. Segundo os relatos de alguns jovens, gravados em vídeo, A equipe, apesar de estar ensinando, também se entrosou com a gente. [...] Você troca experiência. Vocês aprenderam com a gente, a gente aprendeu com vocês [...] Foi uma coisa participativa, porque todos participaram, trocaram opiniões, nos ajudaram no que a gente não sabia e a gente ajudou eles também da mesma forma. [...] A gente foi as primeiras pessoas que fizeram mapas aqui da nossa comunidade. Isso foi muito marcante pra mim.117
O conhecimento que estava sendo criado ali, não teria sentido algum se não pudesse ser aplicado às nossas realidades e, neste ponto, as oficinas aceleram o processo, pois o tempo de transformar a teoria em prática tende a ser bastante curto, quando comparado a outros casos. Como aponta Duarte Fernández118, antropólogo espanhol que participou das atividades em Garapuá, À medida que os jovens iniciaram o trabalho de campo in situ, começaram a perceber em melhor grau aquilo que se pretendia e como deveria se desenvolver. A comunicação e informação se tornaram mais fluidas, e com isso gerou-se uma maior transparência, participação e interação social (FERNÁNDEZ, 2011, s\p).119
117
Trecho transcrito do vídeo “nd garapua569”, [4’50”-6’10”]. Disponível em: <https://vimeo.com/11159402>. Acesso em: 28 mar. 2013. 118 Antropólogo da Universidade de Coruña (Disponível em: <http://www.udc.es>. Acesso em 28 mar. 2013). 119 “A medida que los jóvenes iniciaron el trabajo de campo “in situ”, comenzaron a percibir en mayor grado aquello qué se pretendía y cómo se debería desarrollar. La comunicación e información se tornaron más fluidas, y con ello se generó una mayor transparencia, participación e interacción social”. Tradução nossa. Disponível em: <http://ecoarte.info/narrativas/2011/01/evaluacion-del-taller-de-narrativas-digitales-de-garapua/>. Acesso em: 29 mar. 2013.
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Houve uma experiência especialmente marcante durante os dias de trabalho, quando acompanhamos um grupo de pescadores até o mangue onde é feita a coleta de mariscos. Nesta ocasião, atravessamos um longo trecho com a água acima do nível da cintura, para compreender o funcionamento de um ecossistema vivo, usando a interface do corpo e seus cinco sentidos. Figura 19 – Mapeamento GPS da rota de coleta de marisco, Garapuá, abr. 2010.
Através do projeto de artemídia Narrativas Digitais, foi possível reunir profissionais de áreas diferentes em torno de um tema comum: a criação de um relato de seu entorno, produzido e narrado pelos próprios moradores daquela região. Pôde-se observar o êxito da experiência ao manter as atividades conectadas à realidade local, com uma abordagem prática. O encontro entre "níveis de realidades" distintos permitiu o compartilhamento de vivências e metodologias de trabalho durante o andamento do projeto. Verificou-se um certo desinteresse por parte dos participantes quando houve uma apresentação expositiva inicial, provocado, provavelmente, pelos jovens que não conseguiram relacionar a teoria com o que seria realizado posteriormente. No momento em que foi dado início às saídas de campo, o grupo se mostrou mais motivado. Esta falta de atenção inicial poderia ser minimizada, adotando uma dinâmica de grupo, para desinibir os presentes. 3.2 Laboratório de arte interativa: arte e interfaces / UFBA, Salvador (BA) Durante o primeiro semestre de 2011, participei de atividades desenvolvidas na disciplina “HACB12 – Laboratório de arte interativa: artes e interfaces” junto ao professor Cristiano Figueiró do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos
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(IHAC) da UFBA. O curso abordou o estudo das técnicas e dispositivos para o desenvolvimento de interfaces físicas no contexto da arte interativa, utilizando a plataforma de prototipagem eletrônica de código aberto Arduino120 e o ambiente gráfico de programação em tempo real Pure Data121, também, software livre. A disciplina é ofertada como um crédito optativo dentro do currículo dos Bacharelados Interdisciplinares122 (BIs) da universidade, com ênfases em Artes, Humanidades, Saúde e Ciência e Tecnologia, constituindo, portanto, um grupo bastante diverso de alunos. Ao longo das 68 horas-aula, foram abordados conceitos básicos de eletrônica, apresentando diferentes tipos de sensores e exemplos de obras interativas que fazem uso destes componentes em seu funcionamento. Os encontros sempre aconteceram envolvendo a teoria e a prática, com o acompanhamento dos alunos utilizando os computadores portáteis cedidos pelo instituto. Como forma de avaliação, os alunos formaram grupos para produzir uma instalação interativa ou uma performance, usando os conhecimentos abordados em sala de aula, com temática de livre escolha. O desenvolvimento de tais trabalhos foi realizado a partir da metade do curso em diante, ocupando o período das aulas para a pesquisa e produção das peças. Dentre os projetos apresentados, destacou-se um protótipo idealizado por um dos grupos (composto por uma aluna cursando a ênfase em Saúde e um aluno cursando a ênfase em Artes), no qual foi usado um aparelho terapêutico de eletroestimulação controlado por um sistema projetado para coletar moedas. O projeto XOX – The Vending Body Machine relacionou as máquinas de venda automatizadas ao corpo humano, criando uma conexão de submissão e ironia do corpo ao capital. A instalação permite uma “conexão elétrica” entre o público e o corpo do performer, que recebe uma descarga elétrica que contrai seus músculos, provocando um movimento involuntário, no momento em que o visitante alimenta a máquina com uma moeda de um real. A ideia surgiu unindo os interesses dos dois integrantes do grupo, que foram garimpando soluções no decorrer dos encontros semanais. A seguir, algumas imagens do desenvolvimento do trabalho.
120
Disponível em: <http://arduino.cc>. Acesso em: 10 mar. 2013. Disponível em: <http://puredata.info>. Acesso em: 10 mar. 2013. 122 O Bacharelado Interdisciplinar é um curso novo oferecido pela UFBA desde o ano de 2009, com duração de três anos e uma formação inter, multi e transdisciplinar, que busca a integração dos conhecimentos tradicionalmente agrupados por matérias isoladas. O curso foi criado como uma primeira etapa de estudos universitários, em que após sua conclusão, o aluno pode optar pelo ingresso em um curso de progressão linear (o aluno conta com uma reserva de 20% das vagas anuais de cada curso) ou uma pós-graduação, desde que atenda aos requisitos de seleção. (O que é Bacharelado Interdisciplinar? Disponível em: <http://www.ihac.ufba.br/portugues/?page_id=5626>. Acesso em 17 mar. 2013.) 121
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Figura 20 – Processo de desenvolvimento da instalação XOX – The Vending Body Machine. Salvador, jun. 2011.
A experiência de ensino em artemídia dentro do contexto acadêmico dos Bacharelados Interdisciplinares foi desafiadora, pois encontramos alunos com interesses diversificados (pela própria estrutura mista do curso), assim como diferentes níveis de conhecimento prévio, portanto, os primeiros encontros foram mais expositivos, incorporando, gradualmente, atividades mais práticas. Quando os encontros passaram a tratar, principalmente, do desenvolvimento dos projetos em sala de aula, o trabalho configurou-se de forma mais dinâmica, com atendimentos específicos para cada projeto. Os grupos puderam trocar informações entre si, solucionando problemas semelhantes. O maior obstáculo encontrado nesta atividade foi manter a atenção e a motivação do grupo inteiro durante todo o andamento das atividades expositivas, visto que alguns alunos estavam vendo certas partes do trabalho pela segunda vez, enquanto que outros não demonstravam interesse em certos pontos do conteúdo. No momento em que passou-se à parte prática de desenvolvimento das obras, com a separação da turma em grupos menores, houve divisões de tarefas internas em cada grupo e o trabalho funcionou de forma mais orgânica.
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3.3 Workshop Introdução à Computação Física com Arduino e Pure Data / Nós Coworking, Porto Alegre (RS) O workshop Introdução à Computação Física com Arduino e Pure Data123 foi uma iniciativa de ensino de artemídia organizada em parceria com o professor Tiago R. C. Lopes, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) e com patrocínio da mesma universidade. As atividades foram realizadas nos dias 19 e 20 de dezembro de 2011 no Nós Coworking124 de Porto Alegre (RS), um espaço que oferece estrutura física, tecnológica e de serviços para profissionais que queiram usar suas dependências para desenvolver suas atividades – um modelo muito parecido com o dos makerspaces, debatidos no item 2.2.3 deste trabalho. O workshop contou com seis horas totais, divididas em dois encontros de três horas cada e houve uma chamada aberta aos interessados que, mediante o pagamento da inscrição, receberam um kit básico com a placa de desenvolvimento Arduino, componentes eletrônicos, cabos de conexão e uma matriz de contato para montagem dos protótipos durante o andamento das atividades. O grupo contou com 21 participantes no total, dentre eles, vários professores do curso de Jogos Digitais da UNISINOS, assim como estudantes de Comunicação, Engenharia Elétrica, Ciência da Computação, programadores e analistas de sistemas. O grupo acompanhou a montagem dos experimentos propostos e trouxe contribuições em tópicos que não estavam previstos como, por exemplo, um protótipo com um protocolo próprio para transmissão de dados sem fio entre duas placas Arduino, desenvolvido por um dos alunos. Portanto, a lógica dos hacklabs ocorreu em parte nesta experiência, quando alguns envolvidos na atividade compartilharam seus conhecimentos, possibilitando diferentes infiltrações no aprendizado dos demais. Notamos que a estrutura dos workshops tem um caráter mais unilateral, quando o condutor da atividade deve conduzir os demais, através dos tópicos propostos pela oficina. No entanto, a própria disposição do grupo no espaço (a forma com que as mesas cadeiras são arranjadas no ambiente) contribui para maior interação entre os participantes. No caso desta atividade, houve contribuições dos colegas entre si, embora a duração total não tenha sido muito extensa, contando com dois encontros de quatro horas.
123
Disponível em: <http://ferkrum.com/arduino-poa/>. Acesso em: 18 mar. 2013.
124
Disponível em: <http://www.noscoworking.com.br>. Acesso em: 18 mar. 2013.
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Figura 21 – Trabalho em equipe durante os experimentos do workshop, Porto Alegre, dez. 2011.
3.4 Instalações interativas da mostra Toque para Mover Sentidos / Oikabum! Escola de Arte e Tecnologia, Salvador (BA) A Oikabum! Escola de Arte e Tecnologia de Salvador é um programa do instituto Oi Futuro, em parceria com a Cipó Comunicação Interativa125, voltado para jovens de comunidades populares de dezesseis a dezenove anos de idade, estudantes de escolas públicas. Cada turma de oitenta jovens participa de um ciclo de dezoito meses no qual recebe formação em linguagens multimídia, com cursos gratuitos de Vídeo, Design Gráfico, Computação Gráfica e Fotografia, assim como “conteúdos transversais importantes para o aprendizado do jovem: Ser e Conviver, Oficina da Palavra, Arte e Tecnologia, Design Sonoro e Comunicação Digital” (CIPÓ COMUNICAÇÃO INTERATIVA)126. No início de junho de 2011, a escola lançou um edital interno voltado à arte interativa. Os alunos participaram de uma série de atividades as quais deram embasamento ao edital
125
Disponível em: <http://cipo.org.br/>. Acesso em: 18 mar. 2013.
126
Disponível em: <http://cipo.org.br/portal/#>. Acesso em: 18 mar. 2013.
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iniciado por um seminário de arte e tecnologia127, quando os jovens tiveram um primeiro contato com vários tópicos relacionados à arte e à tecnologia, como instalações interativas, vídeo-arte, performance e tecnologia, web art, intervenções urbanas, dentre outros. Após esta etapa, os jovens participaram de uma oficina de redação de projetos para, então, submeter o documento à avaliação e posterior divulgação dos selecionados. Os cinco projetos escolhidos receberam uma quantia em dinheiro para produção das obras, envolvendo contratação de serviços, transporte e alimentação que foram totalmente gerenciados por cada equipe. Participei da fase de desenvolvimento dos projetos junto à colega Silvana Rezende128, acompanhando os jovens no planejamento da interatividade, passando, posteriormente, a uma oficina prática de programação com Pure Data (totalizando quarenta horas divididas em duas semanas de aula). Decidimos construir ao longo destes encontros um módulo de programação que seria comum a todos os projetos: um player de áudio e vídeo, o nosso “videocassete digital caseiro”. Foi uma escolha estratégica, já que os alunos estão familiarizados com programas que trabalham com imagens, sejam elas na forma de fotografias, vídeos, ilustrações ou animações. Assim, quando partimos de uma tela em branco e passamos a conectar os blocos de funções uns aos outros129, produzindo resultados imediatos, os alunos puderam ter noção do funcionamento dos softwares que utilizam diariamente e das possibilidades que residem na "desconstrução" de ferramentas para o uso personalizado, de acordo com suas necessidades. Os projetos propostos pelos alunos envolveram naturalmente questões político-sociais como meio ambiente (projeto Sucata), acessibilidade (projeto Sem Limites), valorização da cultura local (projeto Na linha do Subúrbio), artistas invisíveis (projeto Interart) e questões pessoais dos jovens, num formato misto de poesia e música (projeto Po-Imagem). Participamos ativamente do processo de desenvolvimento e montagem das obras as quais foram expostas na mostra Toque para Mover Sentidos130, inaugurada no dia três de maio de 2012. A seguir, algumas imagens das cinco instalações interativas.
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Apresentei a palestra “Mobilidade, Arte e Celular” durante o seminário. O conteúdo está disponível em: < http://ferkrum.com/blog/2011/06/03/mobilidade-arte-e-celular-no-seminario-de-arte-e-tecnologia-oi-kabum-salvador/>. Acesso em: 18 mar. 2013. 128 Artista, videasta e aluna do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da UFBA. Disponível em: <http://silvanarezende.wordpress.com/about/>. Acesso em: 18 mar. 2013. 129 O Pure Data é um ambiente de programação gráfica, no qual blocos de funções são conectados entre si, seguindo um fluxo de dados. Cada bloco possui entradas (inputs) e saídas (outputs), o que torna a lógica de trabalho visualmente mais atrativa do que linguagens de programação de linhas de código (escritas). 130 Mais detalhes sobre o processo de desenvolvimento de cada obra está disponível em: <http://ferkrum.com/blog/2012/06/16/toque-para-mover-sentidos-obras-e-processo-de-trabalho/>. Acesso em: 18 mar. 2013.
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Figura 22 – Projeto Interart: montagem da estrutura e em funcionamento na mostra. Os visitantes desenham em um tablet e as ilustrações são publicadas na página do projeto.
Figura 23 –Projeto Po-Imagem: filmagens e montagem da instalação. O público fica rodeado por quatro projeções simultâneas com histórias que se complementam.
Figura 24 –Projeto Sucata: filmagens de entrevistas e game em funcionamento na mostra. O objetivo dos visitantes é descartar os objetos nas lixeiras certas usando uma luva.
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Figura 25 – Projeto Na linha do Subúrbio: filmagem de conteúdo, adaptação de uma máquina de fliperama, desenvolvimento do mapa e totem em funcionamento. O usuário navega no mapa do subúrbio ferroviário, vendo fotografias e vídeos de cada local.
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Figura 26 – Projeto Sem Limites: filmagem de conteúdo nas calçadas da cidade, montagem dos sensores na cadeira de rodas, ajustes finais e jogo em funcionamento. O usuário deve sentar na cadeira de rodas para controlar o jogo, enfrentando os obstáculos da cidade até chegar em casa com segurança.
Durante o desenvolvimento da oficina de programação, naturalmente, alguns jovens se identificaram mais com a linguagem do que outros. Segundo a aluna Marina Lima, coidealizadora do projeto Po-Imagem, Essa parte de lidar com a programação foi muito complicada para mim, pela minha impaciência de ver tantos códigos na minha frente, aos quais não sou nem um pouco chegada. Mas todo o processo da oficina me fez compreender que a arte e a tecnologia estão muito interligadas. Ter idéias, capturar imagens, editá-las, pensar as formas de projeção e imaginar as pessoas interagindo com a obra, como quase parte do cenário, tudo isto é arte e tecnologia (LIMA, 2012, p. 24).131
Para os jovens Jadilson Oliveira e Isabela Cristina, da obra Sem Limites, Tivemos algumas oficinas, uma delas a de programação, que foi bem instrutiva. No começo, parecia ser algo estressante, mas foi muito legal trabalhar com uma área vasta como esta, sem contar o resultado final de ver aquelas conexões chegarem a um resultado. Foi bem incrível, porém, a grande questão é ter paciência e fazer uma seqüência de testes até dar tudo certo. No final, não foi difícil lidar com esta nova
131
Relato da aluna no Catálogo da exposição Toque para Mover Sentidos (2012, p. 24, Disponível em: <http://issuu.com/cipo.comunicacaointerativa/docs/toqueparamoversentidos>. Acesso em: 20 mar. 2013).
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linguagem, apesar de o tempo sempre nos atropelar e gerar pressão psicológica, o que geralmente faz o trabalho empacar (OLIVEIRA; CRISTINA, 2012, p. 27).132
Já para o aluno José Roberto Brito, idealizador do projeto Sucata, "De tudo, o que mais me instigou foi compreender que o computador precisa de comandos para elaborar uma ação: que a idéia é sempre mais importante que as ferramentas!" (BRITO, 2012, p. 27)133 A possibilidade de participar de um projeto com um fôlego maior permitiu o acompanhamento da evolução do desenvolvimento de cada instalação, desde a geração da ideia, passando pelo desenho de interatividade, até o produto final. Durante o processo, ficou claro que o desenvolvimento de tais obras não segue uma linha pré-estabelecida, quando cada detalhe deve ser tomado individualmente e solucionado, de acordo com suas exigências específicas. A experiência, como um todo, trouxe um aprendizado muito grande à equipe, por ser uma linguagem (a da interatividade) ainda não trabalhada dentro da escola. A experiência de optar pelo uso de software livre nas instalações também trouxe questões como apropriação tecnológica, busca por soluções criativas para as dificuldades encontradas e livre disseminação do conhecimento para debate durante o período em que a exposição esteve aberta ao público, possibilitando a estes alunos agregar experiências, conhecimentos novos ao currículo escolar. 3.5 Hacklab: Interfaces Físicas e controladores DIY aplicados à performances sonoras e audiovisuais, utilizando ferramentas livres / Festival Digitalia, Salvador (BA)
Durante a segunda edição do Digitalia - Congresso e Festival Internacional de Música e Cultura Digital134, realizado de 1o a 5 de fevereiro de 2013, em Salvador, participei da atividade “Hacklab Interfaces Físicas e controladores DIY aplicados à performances sonoras e audiovisuais, utilizando ferramentas livres”, juntamente aos colegas Cristiano Figueiró e Bruno Rohde. Ao longo das oito horas, divididas em dois encontros, apresentamos os conceitos básicos de trabalho com a plataforma de prototipagem Arduino, partindo do conceito de hardware livre, suas possibilidades e restrições de uso, passando pela conexão de componentes eletrônicos simples para criação de interfaces físicas, trabalhando em conjunto com o software Pure Data para manipulação dos dados em tempo-real. 132
Relato dos alunos (Ibidem, p. 27). Relato do aluno (Ibidem, p. 39). 134 Disponível em: <http://digitalia.com.br>. Acesso em: 18 mar. 2013. 133
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A atividade teve chamada aberta e contou com cinco participantes, a maior parte deles com experiência prévia com programas de performance audiovisual, porém sem haver trabalhado com as ferramentas abordadas no encontro. Com estas características, foi possível imprimir um bom ritmo de trabalho para o tempo reduzido que dispúnhamos. Consideramos a atividade como um hacklab por contarmos com uma metodologia aberta, de apropriação tecnológica, por ser uma experiência prioritariamente hands-on, mão na massa, trazendo a ideia de compartilhamento de informação. Foi desenvolvido um protótipo usando como suporte uma lata metálica na qual os componentes eletrônicos foram afixados, respeitando certo grau135 de ergonomia para o usuário. Como não dispúnhamos de muito tempo, a ideia foi produzir uma interface simples que pudesse operar com variações graduais (analógicas, possibilitam uma variação “linear” entre mínimo, desligado e máximo, ligado) e de interrupção (digitais, ligadas ou desligadas). Para tanto, utilizamos as seis entradas analógicas do Arduino conectadas aos resistores variáveis: dois potenciômetros (variam a resistência quando rotacionados, como um botão de volume, por exemplo) e 4 LDR’s136 (resistores que variam com a luminosidade); e uma entrada digital: utilizando um botão tipo switch. O instrumento desenvolvido, quando conectado ao Pure Data, pode controlar os parâmetros que desejarmos, sejam eles de imagem (como saturação, contraste e ganho) ou de áudio (como valores de frequências responsáveis por sínteses sonoras ou amplitudes de onda)137. A oficina cobriu uma ampla gama de objetos e funcionalidades das ferramentas livres trazidas para trabalho (Arduino e Pure Data) e o número enxuto de participantes possibilitou espaço suficiente para todos se expressarem, trazendo experiências pessoais para debate entre os presentes.
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Não houve nenhum tipo de medida de dimensões físicas nesta etapa. A abordagem foi intuitiva, de acordo com os gestos idealizados pelo grupo na etapa de projeto. 136 “Light dependent resistors”. Tradução nossa. 137 O funcionamento do protótipo está disponível em: <http://youtu.be/7l0EWorDknQ> e <http://youtu.be/w-ib_iI1sTI>. Mais detalhes sobre o desenvolvimento da oficina está disponível em: <http://ferkrum.com/blog/2013/02/03/hacklab-nodigitalia-2013/>. Acesso em: 18 mar. 2013.
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Figura 27 – Protótipo do instrumento desenvolvido durante o encontro. Detalhe dos dois potenciômetros e botão tipo switch localizados na tampa da lata, Salvador, fev. 2013.
Figura 28 – Detalhe dos quatro LDR’s localizados no corpo da lata, Salvador, fev. 2013.
Figura 29 – Testes do protótipo do instrumento, Salvador, fev. 2013.
A artemídia proporcionou um entrelaçamento de conhecimentos em torno de um tema comum, no caso, as performances sonoras e audiovisuais. Quando trabalhamos com softwares que envolvem a programação para o desenvolvimento de tais atividades, passamos a operar
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com uma gama muito mais ampla de controle sobre o processo e sobre a própria estética do que é produzido. No momento em que a ferramenta passa a ser reconfigurável, ela pode criar objetos únicos, com comportamentos singulares, removendo a existência de amarras impostas por uma arquitetura fechada. É como se, por exemplo, um violonista se tornasse luthier138, podendo reconstruir seu instrumento a cada música, não se restringindo a uma única escala ou a uma única técnica para expressar-se. Além disso, deve-se salientar que os hacklabs, em geral, têm uma função ativadora muito importante, pois o estudo e as descobertas em cada uma das linguagens se dão através das (inúmeras) consultas às comunidades de usuários, na forma de listas de discussão ou, principalmente, em páginas de projetos individuais documentados por seus desenvolvedores. O usuário se torna “desenvolvedor”, não somente quando realiza alterações no software, mas também quando descreve suas produções, publica seus avanços em um blog pessoal, fazendo circular a informação, realimentando o sistema.
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Profissional especializado na construção e no reparo de instrumentos de corda com caixa de ressonância. Luthier. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Luthier>. Acesso em: 24 mar. 2013.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho buscou promover reflexões sobre as práticas de artemídia na contemporaneidade, no momento em que as capacidades se combinam para produzir sentido e o processo de desenvolvimento das obras se torna tão valioso quanto o resultado. Comentouse também sobre o entrelaçamento de disciplinas e o trânsito em seus limites, suas fronteiras. Além disso, ao incorporar o uso das mídias técnicas de forma criativa, a artemídia possibilita uma visão crítica da realidade em que estamos inseridos, cadenciada pelo ritmo da evolução tecnológica e com um forte apelo comercial. Conforme visto ao longo deste trabalho, o nascimento da informática esteve intimamente relacionado à corrida armamentista, recebendo elevados investimentos governamentais em equipamentos e aplicações de segurança. Aos poucos, estas tecnologias foram sendo experimentadas em outros setores, através de iniciativas como, por exemplo, o projeto Community Memory (1973) o qual levava terminais a espaços públicos para o uso da população, ou, posteriormente, o movimento de organizações de hobbistas como o Homebrew Computer Club que impulsionou o desenvolvimento dos microcomputadores na metade dos anos 1970. Por outro lado, ainda nos anos 1960, artistas e engenheiros estavam produzindo as primeiras obras em regime de colaboração, criando experimentos híbridos que envolviam elementos eletrônicos em sua produção, como aqueles presentes na exposição 9 Evenings: Theatre and Engineering (1966), que atraiu cerca de dez mil visitantes durante seu período de exibição, em Nova Iorque. O desenvolvimento da computação pessoal incorporou uma série de avanços que facilitaram o acesso à máquina, simplificando sua operação, passando de uma tecnologia de uso restrito a especialistas a algo acessível a uma fatia cada vez maior da população. Neste percurso, houve um período em que a restrição de memória dos terminais obrigava os usuários a digitarem as linhas de código dos programas para, finalmente, serem executados pela máquina, ou seja, quando o usuário queria executar um programa de controle de estoque, por exemplo, ele precisava alimentar a máquina com as instruções de funcionamento da aplicação antes de realizar qualquer outra operação. O código-fonte, portanto, era um código-aberto e, muitas vezes, intercambiado através de revistas especializadas que traziam centenas de aplicações listadas em suas páginas, como um livro de receitas. O usuário, como um chefe de cozinha, seguia os passos listados no código-aberto e, combinando os ingredientes certos, era capaz de produzir os “pratos” listados no livro de receitas. Assim, o usuário mais curioso tinha a liberdade de produzir seus
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“banquetes” personalizados, tomando um tempero emprestado de cada receita que havia aprendido durante o uso do equipamento. Era um processo trabalhoso, mas que aproximava os usuários das rotinas necessárias para execução daquelas aplicações, através de uma linguagem considerada simples, o BASIC. A evolução do hardware finalmente possibilitou o armazenamento e a recuperação daquelas rotinas, economizando ao usuário a ocupação da digitação do código-fonte, empregando seu tempo, principalmente, com o uso dos softwares. A partir deste momento, mais camadas de abstração foram criadas entre o usuário e o código, que passou a ser empacotado no formato de softwares proprietários e vendidos da mesma forma que os periféricos de extensão dos microcomputadores (como as placas de vídeo, memórias etc.). A seguir, o avanço das interfaces gráficas de usuário, com o emprego das metáforas do “escritório” e das janelas de programas, trouxe uma maior imersão do usuário no sistema, que agora passa a utilizar os recursos já delineados pelos inúmeros programas desenvolvidos pelas empresas produtoras de software. O “usuário-cidadão-comum” é, finalmente, convidado a usar o sistema, percorrendo as estradas (o software) pavimentadas pelos desenvolvedores. Seguindo a metáfora das rodovias, os usuários, de posse de um meio de transporte (o hardware, o computador ou seus assemelhados, na forma dos atuais smartphones e tablets), pagam pelo direito de usar as estradas que os conectam a seus destinos cotidianos. A artemídia, por sua vez, quando faz uso de tais “meios de transporte” como forma de expressão, questiona tanto o funcionamento de tais veículos, quanto o destino e o material com que as estradas são construídas. O teórico de mídia norte-americano Douglas Rushkoff traz uma reflexão interessante em seu livro “As 10 questões essenciais da era digital: programe seu futuro para não ser programado por ele” (2012), de uma forma bastante provocadora. Rushkoff comenta que, historicamente, a cada criação de um novo meio, uma pequena elite tem acesso a este, deixando o restante da população subordinada ao mero consumo: a invenção do alfabeto não criou uma sociedade de leitores, mas de ouvintes; posteriormente, a invenção da imprensa não levou a uma sociedade de escritores, mas de leitores e, finalmente, com a criação dos computadores e das redes, a sociedade pôde, finalmente, "escrever", alimentando redes sociais, websites e blogs (RUSHKOFF, 2012). O usuário torna-se “produtor de conteúdo”, gerando outra espécie de audiência, dessa vez, ainda mais facilmente mensurável139, em troca
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Aqui me refiro à facilidade de medir o tráfego detalhado de usuários nas páginas web, quando comparado aos medidores de audiência dos meios de massa, como a televisão, por exemplo.
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da exposição difusa de conteúdo publicitário em sua jornada pelo ciberespaço. O gratuito das redes é, portanto, pago de outras formas140. Na atualidade, um dos papéis significativos da artemídia é apontar novos usos para as mídias contemporâneas, criando diferentes vias de acesso e conexões entre diferentes pensamentos e disciplinas, atingindo um público mais amplo. Aqueles movimentos que promoveram a disseminação dos computadores na sociedade, na década de 1970, reverberam hoje através dos ecossistemas de desenvolvimento de software e hardware livre, com suas comunidades de desenvolvedores e usuários que compartilham soluções através das redes, possibilitando avanços significativos em suas diferentes áreas de atuação. Aquelas primeiras experiências de colaboração entre engenheiros e artistas evoluíram a um panorama mais integrado, à medida que as ferramentas de trabalho se tornaram mais acessíveis e existe uma cultura de colaboração mais avançada. As práticas em artemídia vivenciadas e descritas neste trabalho trouxeram experiências com um viés, sobretudo, formativo em diferentes contextos, contemplando atividades desenvolvidas em comunidades de pescadores em parceria com pesquisadores de outros países; práticas de laboratório de artemídia dentro da academia; iniciativas independentes de ensino em espaços de coworking; desenvolvimento de oficinas e projetos de instalações interativas com jovens de comunidades populares e, finalmente, desenvolvimento de interfaces para controle de performances audiovisuais dentro de um evento de cultura digital. Nota-se, através das experiências trabalhadas, que um dos desafios reside na relação entre os diferentes níveis de conhecimento entre os participantes: nem sempre as pessoas estão dispostas a trabalhar novamente um conceito que já dominam. Por isso, se torna importante estabelecer uma relação de trocas e independência no grupo no qual podem existir aprendizados paralelos, diminuindo o caráter unilateral de passagem de informação. Isto ocorreu na experiência dos Laboratórios de Arte Interativa (UFBA, cap. 3.3). Além disso, quando utilizamos ferramentas técnicas, trazendo conceitos de lógica, eletricidade e programação, aproximamo-nos das ciências exatas, porém com uma abordagem que fomentou interligações com outras áreas como, por exemplo, o caso do uso combinado de GPSs, gravadores de áudio e câmeras de vídeo para contar a história de uma comunidade, ou a criação de uma performance artística, utilizando um equipamento fisioterapêutico de eletroestimulação, ou ainda, a denúncia dos problemas de acessibilidade de nossas cidades, 140
Comento sobre os serviços gratuitos da Internet na nota de rodapé #52, na página 42 deste trabalho.
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usando uma cadeira de rodas como joystick em um game educativo. A abertura de um canal de comunicação entre as partes envolvidas se tornou vital nestas experiências, estimulando a hibridação entre os conhecimentos, incorporando o erro no processo de aprendizado, fomentando a participação durante os encontros. Permanece o desafio de compreendermos a tecnologia como um meio e não como um fim neste cenário. Em muitos casos, o discurso pode adquirir um teor demasiadamente tecnicista, carregando uma visão redentora dos novos meios sobre outras técnicas. Nestes casos, a artemídia pode servir como uma ferramenta para lançarmos um olhar crítico sobre nosso entorno.
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ANEXOS
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Anexo 1: Panorama de Pure Data
O software “Pure Data” (Pd) é um ambiente gráfico de programação em tempo-real, de código aberto e multiplataforma141, desenvolvido pelo americano Miller Smith Puckette, durante os anos 1990, para criação de música interativa. O programa está baseado na linguagem “MAX” desenvolvida pelo próprio Puckette, na década de 1980, enquanto trabalhou no IRCAM de Paris e que foi, posteriormente, licenciada pelo instituto francês à empresa americana Opcode Systems, com fins comerciais. O software MAX/MSP finalmente passou a ser comercializado pela empresa Cycling ’74, fundada por David Zicarelli, em 1997, como um software proprietário142. O núcleo do projeto Pure Data é escrito e mantido por Miller e inclui o trabalho de muitos desenvolvedores, tornando o pacote um esforço de uma comunidade inteira. Sua interface gráfica faz uso da metáfora dos sintetizadores de áudio analógicos nos quais os diversos cabos de conexão (patch-cords) interligam os módulos de filtros e efeitos sequencialmente como o que vemos na figura abaixo. Diversas extensões e bibliotecas são escritas para o programa e são distribuídas no pacote “Pure Data Extended”. Figura 30 - Detalhe do cabeamento de setup de um sintetizador Moog.
Disponível em: <http://sprott.physics.wisc.edu/Pickover/pc/moogrc1.jpg>. Acesso em: 20 mar. 2013.
141
O programa funciona nas plataformas Mac, PC e Linux e o código-fonte pode ser compilado para outros sistemas operacionais. Disponível em: <http://puredata.info/downloads/pd-extended>. Acesso em: 20 mar. 2013.
142
Max (software). Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Max_(software)>. Acesso em: 20 mar. 2013.
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Os objetos gráficos que interligam o fluxo de informação dentro do ambiente de programação do Pure Data trazem entradas e saídas, com pontos que podem ser selecionados pelo cursor do mouse para criar a conexão apropriada para cada função. A figura abaixo traz um exemplo que demonstra como se dá o processo de programação com alguns objetos inseridos em um documento. Figura 31 – Captura de tela de um programa simples que realiza a função soma para exemplificar as diferenças entre as entradas “quentes” e entradas “frias” do sistema.
O exemplo acima traz o processo de soma de dois números, o qual é, constantemente, realizado, enquanto o programa estiver aberto. Neste caso, o argumento da “função soma” é enviado ao bloco que retorna o número imediatamente na saída. A mesma lógica acontece quando se trabalha com áudio ou vídeo, afinal, o programa processa blocos de informação em “tempo-real” e imprime o resultado imediatamente, podendo o resultado ser um número, uma síntese sonora executada na placa de som do computador ou uma sequência de imagens exibidas no monitor ou em um projetor. A ideia de conexão de blocos gráficos possibilita uma abordagem visual mais atrativa ao usuário iniciante, que pode compreender como se dá o funcionamento, ligando os blocos uns aos outros e verificando os resultados imediatamente. Trata-se de uma ferramenta interessante e muito poderosa para aproximar a lógica de programação de usuários com pouca ou nenhuma experiência com computadores143. 143
Mais referências sobre a linguagem, disponíveis em <http://flossmanuals.net/pure-data/>. Acesso em: 20 mar. 2013.
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Anexo 2: Panorama de Arduino O Arduino é uma plataforma de prototipagem de circuitos eletrônicos criados na cidade de Ivrea, na Itália, a partir de um trabalho desenvolvido no Interaction Design Institute Ivrea pelo estudante colombiano Hernando Barragán144, em 2005. A ideia original era construir uma ferramenta de desenvolvimento de projetos de interatividade que fosse mais econômica do que as disponíveis naquele momento. O projeto incorporou a mesma sintaxe de programação da linguagem Processing e foi desenvolvido com código-aberto, para que todos pudessem contribuir com seu desenvolvimento. Figura 32 –Vista superior da placa Arduino Uno.
Disponível em: <http://arduino.cc/en/Main/ArduinoBoardUno>. Acesso em 25 mar. 2013.)
A placa foi desenvolvida utilizando o microcontrolador ATmega328 de 8-bits da fabricante Atmel e contém 14 entradas ou saídas digitais (6 saídas configuráveis como PWM) e 6 entradas analógicas. Existem diversas extensões145 (ou shields) que podem ser conectadas à plataforma, agregando outras funcionalidades como conexão com cartão de memória, GPS, Bluetooth etc. Os protótipos são criados usando um ambiente de desenvolvimento que funciona em diversos sistemas operacionais e contêm milhares de exemplos documentados no pacote o qual pode ser descarregado do website146 do projeto. O projeto Arduino facilitou o acesso de desenvolvimento de interfaces físicas ao criar uma plataforma que reúne uma comunidade numerosa de desenvolvedores e usuários que 144
Barragán desenvolveu a plataforma Wiring (http://wiring.org.co), que buscava ser o equivalente à linguagem Processing, porém aplicada ao hardware. 145 Disponível em: <http://arduino.cc/en/Main/Products>. Acesso em: 25 mar. 2013. 146 Disponível em: <http://arduino.cc/en/Main/Software>. Acesso em: 25 mar. 2013.
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documentam e compartilham seus projetos. Atualmente, encontram-se diversas aplicações que utilizam a tecnologia, como instalações interativas, automação residencial ou projetos de quadricópteros147 de código-aberto. O hardware é distribuído mediante a licença Creative Commons Share-Alike, que permite compartilhar o esquemático da placa, porém resguarda o uso do nome “Arduino” para a fabricante italiana. Existem diversas variantes do produto que são compatíveis entre si e utilizam o mesmo software para programação. Abaixo, um exemplo de uma placa com duas extensões (shields) conectadas ao Arduino. Figura 33 – Dois shields de extensão conectados à uma placa Arduino
Disponível em: Disponível em:< http://en.wikipedia.org/wiki/File:Arduino_Protoboard_Shields.jpg>. Acesso em 25 mar. 2013.)
147
Projeto ArduPilot. Disponível em: <http://www.diydrones.com/notes/ArduPilot>. Acesso em 25 mar. 2013.