Revista Cálculo Edição 19

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O AQUECIMENTO GLOBAL É UMA FARSA?

A ESTRANHA

Se robôs fazem arte, é porque ´ somos meio aleatórios

BIOLOGIA DOS

MONSTROS

Luiz Márcio Imenes Quando era criança, este autor decorava as lições, porque não entendia quase nada das aulas Funcionários de Hollywood ampliam gorilas e encolhem homens, mas desconsideram como áreas e volumes variam de jeito desigual e definem da respiração à carga sobre os ossos EDIÇÃO 19 – ANO 2 – 2012 – R$ 10,00

ARQUEOLOGIA DE IDEIAS Veja como, há uns 2.250 anos, Arquimedes calculou o valor de π

ISSN 2179-1384


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TODA ESCOLA PÚBLICA PODE SER UMA BOA ESCOLA O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO OFERECE AOS ESTADOS E

No Brasil, estados e municípios são responsáveis pelo ensino básico, uma atribuição formal

MUNICÍPIOS PROGRAMAS

que faz desses entes federativos

E RECURSOS PARA UMA

parceiros diretos do Ministério

EDUCAÇÃO DE QUALIDADE.

da Educação na aplicação de suas políticas e programas: da

formação de professores à construção de infraestruturas, do livro didático à alimentação escolar, do transporte à biblioteca na escola. Por meio do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o Ministério da Educação oferece aos estados e municípios brasileiros programas que atendem a todas as necessidades e condições para uma educação pública de qualidade. Os recursos federais são repassados aos municípios, que, ao aderirem às ações do PDE, assumem a tarefa de aplicá-los corretamente e de cumprir as metas de qualidade para a educação pública brasileira, medidas pelo Ideb. É assim, com divisão de responsabilidades, que o Brasil está avançando na melhoria da educação básica. Ministério da Educação G O V E R N O

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Conheça melhor os principais programas do PDE, desenvolvidos em parceria com estados e municípios. Para mais informações: www.mec.gov.br

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ínDicE NESTA EDIÇÃO Charretes e carros, penas e canetas

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Com a ideia de equivalência, o matemático pega duas coisas diferentes, acha uma semelhança entre elas, e as declara iguais

Ponha Euclides no seu (alto) devido lugar!

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Imenes diz que, por décadas, a humanidade usou Os Elementos como livro didático, e que esse erro produziu inimigos de matemática

Cadarços para 8.190 pares de sapatos

25

Poucas vezes paramos para pensar como as coisas que crescem exponencialmente crescem a velocidade espantosa

Arquimedes pode ajudá-lo numa ilha deserta

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Caso o leitor precise calcular o valor de π e só tenha nas mãos papel, lápis e umas poucas informações, deve refazer os passos do velho grego

Aquecimento global: o nome de uma diferença

34

A Terra esquenta e esfria há milênios, e por isso alguns veem uma farsa nessa conversa de aquecimento global — mas estão errados

CAPA Um monstro de pernas quebradas

40

Se King Kong fosse apenas um gorila aumentado, seria inofensivo: seus pés doeriam muito, e seus ossos se quebrariam ao primeiro tropeção

O real sentido da palavra “único”

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Depois de umas contas simples, o estudante passará a ver dois triângulos retângulos com outros olhos — eles são únicos mesmo

Essa nossa alma de artista, e de robô

62

Um artista português programou robôs para pintar quadros que passariam por arte moderna — e nos revelou um pouco de nossa alma

SEÇÕES Parênteses

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Cartas dos leitores 15

Arte-Mática 62

Expressão 16

Humor 66

A regrinha 18 Entrevista 20 Passatempo 25 Desafio 60

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Aliffer Fraltino Pereira Dias, Carolina Teodoro Domingues, Lays Mates da Silva, Kelly Marina Werner e Luis Ricardo Batista de Oliveira, alunos da Escola Municipal Cotrisa de Baús, Costa Rica (MS).

TODA ESCOLA PÚBLICA PODE TER TRANSPORTE ESCOLAR. TODA ESCOLA PÚBLICA PODE SER UMA BOA ESCOLA.

Com o programa Caminho da Escola, o Ministério da Educação garante aos estados e municípios os recursos necessários para implantar soluções de transporte escolar para alunos da educação básica, nas Ministério zonas rurais e urbanas do país. Os recursos para a aquisição de da ônibus, Educação

micro-ônibus, barcos e bicicletas podem ser repassados, diretamente G O V E R N O

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ou por financiamento do BNDES, aos estados e municípios que aderirem formalmente ao programa, que é parte integrante do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Com isso, estados e municípios assumem a tarefa de aplicar corretamente os recursos federais e de cumprir as metas estabelecidas para a educação pública brasileira. Até 2011, foram adquiridos mais de 17 mil novos ônibus e barcos, em 3.826 municípios. Para saber se o seu município já participa do programa Caminho da Escola, visite o site www.mec.gov.br/pde.

Conheça melhor este e os demais programas do PDE, desenvolvidos em parceria com estados e municípios. Mais informações: www.mec.gov.br

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m amigo me perguntou se eu tinha entendido “essa coisa toda de limites”. Eu disse que sim, e ele me olhou com admiração, como se eu fosse uma reencarnação de Albert Einstein. Esse olhar me incomoda. Meu amigo me contou que, na faculdade, não tinha entendido direito a ideia de limite e, como consequência, foi mal nos tópicos subsequentes — derivadas e integrais. Usei uma analogia para ajudá-lo a rever sua história: qualquer pessoa consegue construir um muro, por maior que seja, se ela tem o tempo necessário para assentar um tijolo por vez. Sem prática, ela levará um tempão para assentar os primeiros tijolos, mas, à medida que os dias passam, assentará cada tijolo cada vez melhor e mais depressa. Em todo caso, para construir o muro, trabalhará com um único tijolo por vez. Num curso regular de cálculo, o problema é que o professor obriga o aluno a estudar coisas demais em apenas um ano. Então o aluno empilha os tijolos de qualquer jeito, e constrói um muro mambembe. Não tem nada a ver com inteligência. Umas poucas pessoas compreendem bem um assunto complexo como o cálculo em poucos meses, mas a maioria precisa de mais tempo. Traduzindo: se uma pessoa comum sente vontade de conhecer o cálculo em detalhes, não tem escolha senão voltar aos livros e estudá-los de novo, desta vez mais devagar. James Stewart, o autor do livro que uso como referência, explica a ideia de limite em 66 páginas, e pede ao leitor que resolva 489 exercícios sobre limites. Um estudante comum consegue resolver um único exercício por vez, assim como consegue assentar um tijolo ou dar um passo ou subir um degrau. Depois dos 489 exercícios, contudo, ele dominará a matéria; para o leigo, parecerá dotado de habilidades sobrenaturais. É como se o leigo pensasse que aquele estudante construiu seu muro não um tijolo de cada vez, mas dizendo “abracadabra”. Conforme eu me explicava, meu amigo balançava a cabeça para lá e para cá, do tipo “não, não, não”. Ele se irritou comigo; precisei até mudar de assunto. Deve achar mais confortável pensar que os outros, os que aprenderam, são gênios, e ele, que não aprendeu, é uma pessoa como tantas outras. Com esse jeito gostoso de pensar, tiramos de nós a responsabilidade de estudar por nós mesmos, e não nos diminuímos, mas essa versão dos fatos é verdadeira quase nunca.

MÁRCIO SIMÕES editor

Presidente: Edimilson Cardial Diretoria: Carolina Martinez Marcio Cardial Míriam Cordeiro Rita Martinez Rubem Barros

Cálculo

ANO 2  NÚMERO 19 AGOSTO DE 2012 www.editorasegmento.com.br  ISSN: 2179-1384

Diretor Editorial: Rubem Barros Concepção: Luiz Costa Pereira Júnior Editor: Márcio Simões marcios@editorasegmento.com.br Editora Assistente: Mariana Osone Projeto Gráfico, Editoração Eletrônica e Ilustrações: Casa Paulistana Design & Comunicação Milton Rodrigues Alves (Diretor), Cleiton Sá, Henrique Arruda, Simone Zupardo e Thais Ferraz Colaboraram: Francisco Bicudo e Renato Mendes (reportagens); Luiz Roberto Malta (revisão) Processamento de Imagem: Paulo Cesar Salgado Produção Gráfica: Sidney Luiz dos Santos Fotografia: Gustavo Morita Todas as fotos e ilustrações sem atribuição de autoria ou são da iStockPhoto ou são de arquivos pessoais. PUBLICIDADE Gerente Comercial: Marco Antonio Garcia Executiva de Negócios: Telma Araújo Assistente de Marketing: Priscilla Rodrigues Escritórios Regionais Brasília – Edgar Ghorayeb, (61) 4141-6518 | 8343-7135, edgar@editorasegmento.com.br Paraná – Marisa Oliveira, (41) 3027-8490, parana@editorasegmento.com.br Rio de Janeiro – Edson Barbosa, (21) 4103-3868, edson.barbosa@editorasegmento.com.br WEB Gerente de Web: Fabiano Vidal Assistente de Web: Jonatas Moraes Brito Estagiário de Web: Luiz Guilherme Ribeiro MARKETING Diretora: Carolina Martinez Coordenadora: Ana Carolina Madrid Analista: Priscilla Rodrigues Assistente: Claudia Lino Estagiário: Felipe Ramos Eventos: Ana Lúcia Souza OPERAÇÕES Diretora de Operações: Miriam Cordeiro FINANCEIRO Planejamento e RH: Melissa Ramos Contas a Pagar: Simone Melo Faturamento: Weslley Patrik PROJETOS EDUCACIONAIS Diretor: Carlos Eduardo Sanches Distribuição exclusiva para todo o Brasil: Dinap Distribuidora Nacional de Publicações S.A. Rua Dr. Kenkiti Shimomoto, 1678 – Jd. Belmonte Osasco/SP - CEP: 06045-390 Cálculo é uma revista mensal da Editora Segmento. Editora Segmento Rua Cunha Gago, 412 – 1o andar CEP: 05421-001 – São Paulo (SP) Central de atendimento ao assinante De 2a a 6a feira, das 8h30 às 18h Tel.: (11) 3039-5666 / Fax: (11) 3039-5643 e-mail: assinatura@editorasegmento.com.br acesse: www.editorasegmento.com.br www.revistacalculo.com.br

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João Pedro Marques da Rocha, aluno da Escola Estadual de Ensino Médio Itália, Porto Alegre (RS).

TODA ESCOLA PÚBLICA PODE TER UMA BIBLIOTECA. TODA ESCOLA PÚBLICA PODE SER UMA BOA ESCOLA.

Com o Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), o Ministério da Educação fornece obras de literatura e pesquisa, revistas e periódicos para que toda escola pública tenha uma biblioteca para os seus Ministério da

alunos. O programa atende de forma universal e gratuita, Educação em todos os estados do país, às escolas públicas da Geducação O V E R N básica O F E Dcadastradas E R A L no Censo Escolar. Em 2011, mais de 67 mil escolas tiveram as suas

bibliotecas enriquecidas com 10 milhões de obras literárias: um benefício que vem se somar aos 135 milhões de livros didáticos distribuídos anualmente em todo o Brasil pelo Programa Nacional do Livro Didático, que também integra o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Saiba mais sobre os programas do Ministério da Educação no seu município. Visite o site www.mec.gov.br/pde.

Conheça melhor este e os demais programas do PDE, desenvolvidos em parceria com estados e municípios. Mais informações: www.mec.gov.br

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Até cientistas evitam páginas com muitas fórmulas É difícil fazer ciência de boa qualidade sem recorrer à matemática, mas, se um cientista fizer boa ciência, e publicar um artigo cheio de matemática, não será lido. Isso porque até mesmo cientistas têm medo de matemática. Tim Fawcet e Andrew Higginson, professores na Escola de Ciências Biológicas de Bristol (Inglaterra), mediram quantas vezes um artigo científico é mencionado por outros cientistas, e descobriram que, se o artigo contiver em média uma fórmula matemática por página, será citado por 50% menos cientistas, comparado a um artigo de importância equivalente e sem fórmulas. Muitos cientistas, inclusive o famoso físico inglês Stephen Hawking, já desconfiavam que um artigo com muita matemática é menos lido, mas esta foi a primeira vez que alguém fez essa contagem. “É um problema importante”, diz Tim Fawcet. “Quase todas as áreas da ciência dependem das ligações entre

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a teoria, em geral feita com matemática, e o trabalho experimental.” Se um cientista vê matemática num artigo e desiste da leitura, diz Tim, a ciência não avança — pois cientistas deveriam ler os artigos uns dos outros, e repetir as experiências, para ver se acham erros. Só existem dois jeitos de resolver esse problema, dizem Tim e Andrew. Um deles demora muito: todos os países teriam de treinar melhor os estudantes de graduação e de pós-graduação, de modo que leiam artigos científicos sem pular as fórmulas. O outro pode ser adotado sem demora: o autor do artigo deve explicar suas fórmulas com palavras tão cotidianas quanto puder e, se for o caso, deve colocar as fórmulas num apêndice no fim do artigo — ou mesmo num canto qualquer da internet. “Felizmente”, diz Tim, “nossos estudos sugerem que colocar as fórmulas num apêndice ou num website não provoca nenhum efeito negativo sobre o número de citações ao artigo.”


Professora Marcella de Souza Gomes, com os alunos Thiago Sena de Brito, Paula Milene Saboya de Menezes e Karen Utrini Velloso, da Escola Ginásio Carioca Coelho Neto, Rio de Janeiro (RJ).

TODA ESCOLA PÚBLICA PODE TER EQUIPAMENTOS DIGITAIS TODA ESCOLA PÚBLICA PODE SER UMA BOA ESCOLA.

Com o ProInfo, o Ministério da Educação incentiva estados e municípios a avançar no uso pedagógico da informática. O programa leva às escolas Ministério da equipamentos, conteúdos educacionais digitais e formação continuada Educação

para professores e gestores. Até 2011, o GProInfo mais O V E R adquiriu N O F E D E R Ade L 125 mil laboratórios de informática. Para ampliar esta ação, este ano serão entregues mais de 600 mil tablets para professores do ensino médio,

facilitando o acesso ao Portal do Professor, ao portal Domínio Público, entre outros ambientes do conhecimento. Para saber se o seu município já participa do ProInfo e dos demais programas de educação digital, visite o site www.mec.gov.br/pde.

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Se no cinema um grupo assalta bancos para ganhar milhões, na vida real compensa mais trabalhar por seis meses a troco de salário médio — pelo menos no Reino Unido. Barry Reilly, da Universidade de Sussex; e Neil Rickman e Robert Witt, da Universidade de Surrey, analisaram dados da Associação Britânica de Banqueiros e usaram estatística para calcular perdas, ganhos e esforços relacionados com assaltos a banco. Banqueiros não gostam de divulgar informações, mas neste caso abriram exceção e conseguiram publicidade grátis. De acordo com o estudo, quando roubam um banco, os assaltantes levam, em média, 20.331 libras (≈ 65.000 reais), e em um terço dos assaltos não levam nada. Os economistas levaram em conta vários fatores envolvidos num roubo, como mão de obra (número de assaltantes) e despesas com equipamentos (armas, coletes à prova de bala). “O crime é uma atividade econômica como qualquer outra”, escreve Barry Reilly; “então quais são os riscos e as recompensas, em média, de um roubo a banco?” Alguns dados: quando os assaltantes usam armas, o valor esperado do roubo aumenta em 10.300 libras; e quanto maior a gangue, maior a chance do assalto dar certo — para cada membro a mais, o valor esperado aumenta em 9.033 libras. Quanto mais gente para ajudar, contudo, mais gente para dividir a renda. (Exceto, é claro, se o chefe da quadrilha mata seus comparsas, como fez o Curinga no filme Batman, o Cavaleiro das Trevas.) Se a gangue tiver o azar de assaltar um banco que tenha telas de segurança (que sobem em poucos segundos e separam o funcionário e o dinheiro do resto das pessoas), o valor esperado do assalto cai em média 24.463 libras (4.000 a mais do que o rendimento esperado). Os economistas explicam: “Nenhuma tela de segurança faz o assaltante dar ao banco 4.000 libras de seu próprio dinheiro, porém isso mostra como o equipamento é eficiente.” Ainda assim, para o dono do banco, tais telas não compensam. Para instalar uma delas num guichê, ele gasta 4.500 libras. É mais barato ser assaltado. Os pesquisadores também mostram que cada assaltante embolsa em média 12.706 libras, mas corre o risco de ir para a cadeia, ou de morrer. Para o britânico, talvez seja melhor trabalhar em horário

integral e ganhar 26.000 libras por ano. O leitor pode pensar que, se um criminoso roubar vários bancos, poderá acumular os ganhos. Mas há um probleminha de natureza estatística: com quatro assaltos, a probabilidade de ir para a cadeia é de 59%, e com cinco assaltos, é de 67%.

A equação “desanima ladrão” Benefício líquido esperado = v $ q $ R - P (1 - q) Significado

Alguns dados usados no estudo:

R

Rendimento médio por pessoa

12.706,60 libras

v

Probabilidade de dar certo (ou seja, R > 0)

66%

1−q

Probabilidade de ser preso

20%

q

Probabilidade de não ser preso

80%

Para roubar um banco, o assaltante espera benefício líquido positivo. Então, os autores consideram a parte esquerda da equação igual a zero e isolam P para determinar a penalidade. Segundo eles, “ela deve ser suficiente para convencer criminosos de que não vale a pena o esforço”. Com a equação simplificada, eles usam os valores da tabela e chegam a uma penalidade expressa em libras. P=

v$q$R 0, 66 $ 0, 8 $ 12.706.60 = 33.545, 40 libras &P= 0, 2 1-q

Como na prática os assaltantes não pagam multa, mas vão para a cadeia, os economistas consideram a pena o valor que ele deixa de ganhar enquanto está preso. Isso significa três anos de salário mínimo que ele deixa de ganhar. Por coincidência, a pena para esse crime no Reino Unido é de, em média, três anos de prisão.

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Iury Rosa Mapurunga, Andressa Silva Firmino, Jaime Paiva da Frota e Ana Letícia Costa Miranda, alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental de Oiticicas, Viçosa do Ceará (CE).

TODA ESCOLA PÚBLICA PODE TER QUADRAS ESPORTIVAS TODA ESCOLA PÚBLICA PODE SER UMA BOA ESCOLA.

O Ministério da Educação apoia estados e municípios na construção e melhoria de quadras poliesportivas nas escolas públicas Ministérioda da rede Educação de educação básica. Em 2011, o ministério aprovou propostas de G O V E R N O

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financiamento para a construção de 1.564 quadras em 818 municípios. Até 2014, a meta é construir mais de 6 mil quadras cobertas e realizar a cobertura de outras 4 mil quadras. Para ter acesso, as escolas

precisam declarar no Censo Escolar se possuem ou não quadras poliesportivas. Para saber se o seu município já está recebendo estes recursos, visite o site www.mec.gov.br/pde.

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Para que estudar frações? Para ganhar bem Por que os estudantes americanos sabem menos matemática, em média, do que os estudantes chineses, japoneses, finlandeses, holandeses e canadenses? Essa pergunta incomoda cientistas americanos há 30 anos, pois há 30 anos os Estados Unidos tentam melhorar a educação matemática de suas crianças e seus jovens — sem sucesso. (Estudantes americanos vão melhor que brasileiros em testes internacionais, mas vão pior que estudantes de países com boa tradição no ensino de matemática.) Todos acham que há vários motivos, mas haveria um motivo maior do que todos? Sim, há um motivo maior do que todos, dizem oito cientistas de sete universidades grandes, liderados por Robert Siegler, que é professor de ciências da cognição na Universidade Carnegie Mellon. Eis o motivo: os americanos não aprendem frações direito, assim como não aprendem direito a dividir um número por outro. Robert e seus colegas examinaram dois bancos de dados, um dos Estados Unidos e um da Inglaterra, nos quais havia informações sobre 4.300 pessoas, tanto informações sobre quando elas eram crianças quanto informações sobre quando elas estavam entrando na universidade. Usando estatística, Robert quis saber o que diferenciava os que

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iam bem nos estudos de matemática dos que iam mal. Não era a educação dos pais. Não era a renda familiar. Não era a idade do estudante, nem seu sexo, nem seu desempenho em testes de quociente intelectual, nem sua capacidade de interpretar textos, nem sua memória, nem seus conhecimentos de adição, subtração e multiplicação. Do ponto de vista estatístico, a única coisa que sobrou à guisa de causa foi o conhecimento da criança a respeito de frações e divisões. “A mensagem é clara”, diz Robert: “temos de ajudar nossas crianças a compreender as frações e a divisão, o que significa ajudar nossos professores de matemática. Muitos deles não dominam as ideias que servem de base às frações, às razões e às proporções.” Robert diz que, se uma criança entende bem as frações e a divisão aos 10 anos, é muito provável que ela entenderá bem a álgebra do ensino médio, e é muito provável também que ela fique competente o bastante para, na faculdade, estudar algo que exija matemática — como engenharia, economia, física. “Temos de nos concentrar nesse problema agora”, diz Robert, “pois, no mercado de trabalho atual, os melhores salários são pagos às pessoas com melhor domínio de matemática.”


Kaio Vinícios de Souza e a turma da professora Luana de Lima Cavalcanti, da Escola Municipal Dona Brites de Albuquerque, Olinda (PE).

TODA ESCOLA PÚBLICA PODE TER EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL TODA ESCOLA PÚBLICA PODE SER UMA BOA ESCOLA.

Com o programa Mais Educação, o Ministério da Educação apoia estados e municípios na ampliação da jornada escolar e organização curricular, com vistas à implantação do ensino em tempo integral, uma meta Ministério da

definida no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Educação Priorizam-se G O V Ede R Ndesempenho O F E D E R no A L Ideb escolas estaduais e municipais com baixo índice

ou localizadas em áreas de vulnerabilidade social. Elas devem realizar atividades de acompanhamento pedagógico e podem optar por desenvolver

atividades nos campos de esporte e lazer, cultura e artes, educação ambiental, promoção da saúde, educação econômica, entre outros. Com recursos depositados diretamente na conta de cada escola, o ministério beneficiou, em 2011, 3 milhões de alunos em mais de 15 mil escolas. Em 2012, foi superada a meta estipulada de 30 mil escolas. Para saber se o seu município já participa do programa Mais Educação, visite o site www.mec.gov.br/pde. Conheça melhor este e os demais programas do PDE, desenvolvidos em parceria com estados e municípios. Mais informações: www.mec.gov.br

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Na natureza,

é bom ser camarada

Num jardim, as abelhas colhem o néctar das orquídeas, girassóis e tulipas; e as borboletas colhem o néctar das tulipas, margaridas e violetas. Mas o beija-flor só visita as tulipas; se elas desaparecem, o beija-flor talvez suma também. E se o beija-flor desaparece? As tulipas não sentirão tanto sua falta, já que podem contar com abelhas e borboletas. Os biólogos chamam essa camaradagem, em que uma espécie beneficia a outra de alguma forma, de mutualismo, e imaginam uma matriz: no topo de cada coluna, há uma espécie de planta (por exemplo); à esquerda, em cada linha, uma espécie de polinizador (por exemplo). Quanto mais cruzes nessa matriz (indicando que um polinizador presta serviços a várias espécies de plantas em troca de néctar, e que uma planta aceita os serviços de várias espécies de polinizadores; isto é, indicando um alto grau de mutualismo), mais o ecossistema está aninhado, no jargão técnico; quanto menos cruzes (isto é, quanto mais especializada a relação entre uma espécie de planta e uma espécie de polinizador), menos aninhamento. (Aninhamento, em inglês, é nestedness.) Em estudos recentes, pesquisadores usaram matemática para dizer que, quanto maior o grau de aninhamento, mais robusto o ecossistema: quando uma espécie desaparece por algum motivo, as outras espécies sobrevivem sem ela, pois todas mantêm relacionamento com todas. Porém, três matemáticos publicaram um estudo na revista Nature que derrubou essa ideia. Jon Pitchford, da Universidade de York, no Reino Unido; e Alex James e Michael Plank, da Universidade de Canterbury, na Nova Zelândia, assistiram a um seminário em 2011 sobre redes, dinâmica e aninhamento, e tiveram a ideia de analisar um modelo matemático das interações entre plantas e seus polinizadores. Eles observaram 59 matrizes de relacionamento entre espécies reais e perceberam que, quanto mais camaradas uma espécie possui, maior sua chance de sobreviver. Os pesquisadores de fato observaram o aninhamento nas matrizes

ecológicas, porém quando mudavam a entrada dos dados e alteravam essa característica, os níveis de sobrevivência variavam pouco. Eles viram que o simples número de parceiros mutualísticos influenciava muito mais na biodiversidade e estabilidade das espécies. Em outras palavras, não era necessário recorrer a um termo técnico dos sistemas dinâmicos (aninhamento) para explicar essa observação. “Observamos que o aninhamento pode ser apenas uma consequência de características mais simples e mais importantes, como o número de parceiros mutualísticos que uma espécie possui.” Na ciência, é importante quando alguém percebe que pode substituir uma explicação complexa por uma mais simples. Para Jon Pitchford, os especialistas devem pensar se a relação entre aninhamento e sobrevivência é realmente importante. Ao estudar essa relação, eles entenderão melhor como variações no meio ambiente (tipo mudanças climáticas) afetam um ecossistema. Porém, ainda falta muito estudo pela frente e ele tem certeza que os matemáticos podem ajudar na busca de respostas. “Esse assunto trata da estabilidade de sistemas complexos com relação a perturbações externas, uma área da matemática que tem melhorado muito nas últimas décadas”. Jon diz que é um desafio emocionante decidir quais partes da teoria podem ser aplicadas a sistemas reais. “Estamos fazendo um bom progresso, mas ainda não estamos lá.”

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CARTAS DOS LEITORES

“Já li muitos números da Cálculo, e gostaria de contar como vocês têm me ajudado ao fazer esta revista. Depois de repetir cálculo 1, finalmente me dispus a sentar e a estudar; descobri que o único jeito de passar na matéria é arregaçar as mangas e mãos à obra! A dificuldade não é entender o assunto (seja cálculo, seja física), mas entender que, se aquilo é o que desejo estudar, então preciso dar prioridade aos estudos: a parte realmente difícil é reorganizar os hábitos.” Bruno Vidal, estudante de engenharia eletrônica e morador do Méier, bairro do Rio de Janeiro

“Na Cálculo 17, página 14, vocês mostram como calcular o número de grãos de feijão dentro de um pote. Acho que um modelo melhor seria considerar o volume de um paralelepípedo que circunscreva o grão, para assim incluir os espaços vazios. Neste caso, uma garrafa PET de 600 mililitros teria uns 1.060 grãos de feijão.” Heraldo Teixeira, por e-mail

“Sou colecionador da revista, e gostaria de dar uma sugestão: quem sabe vocês pudessem tratar do cálculo diferencial em todas as edições da Cálculo, devido à sua complexidade. Parabéns: adoro a revista!” Lázaro Damasceno Araújo, via Facebook

Resposta do editor: Tratamos de temas relacionados ao cálculo sempre que possível, mas a Cálculo, sendo uma publicação jornalística, jamais poderá substituir um livro didático benfeito — e muito grosso...

Correções na coleção da Cálculo Cálculo 16 — pág. 25

Dissemos que Regina de Lourdes Vaz se graduou na PUC de São Paulo; na verdade, ela se graduou na Universidade de São Paulo, e fez mestrado na PUC. Esse erro foi notado pela própria Regina de Lourdes Vaz

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Cálculo 17 — pág. 19

Na coluna do meio, houve um erro de digitação: em vez de 20 × 30 = 60, queríamos escrever 20 × 3 = 60. Esse erro foi notado primeiro pela leitora Andresa F. Haas, de Carlos Barbosa (RS)


ExPrESSÃO

“EU LI NOS ORIGINAIS DO ARTIGO DE HARDY SOBRE RAMANUJAN: ‘ALGUÉM DISSE QUE CADA INTEIRO POSITIVO ERA UM DE SEUS AMIGOS.’ MINHA REAÇÃO FOI: COMO EU GOSTARIA DE TER DITO ISSO! NA PRÓXIMA PROVA DO ARTIGO, VEIO ASSIM: ‘FOI LITTLEWOOD QUEM DISSE QUE...’” John Edensor Littlewood (1885 -1977), matemático britânico, no livro A Mathematician’s Miscellany. Londres: Methuen, 1953

“UMA VEZ QUE DEI A MESMA AULA VÁRIAS VEZES, NÃO CONSIGO EVITAR A SENSAÇÃO DE QUE OS ALUNOS JÁ DEVERIAM SABER A MATÉRIA” John Edensor Littlewood (1885-1977), matemático britânico, no livro A Mathematician’s Miscellany. Londres: Methuen, 1953

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“HÁ UM TOQUE DE SACERDÓCIO NO MUNDO ACADÊMICO: A IDEIA DE QUE UM PESQUISADOR NÃO DEVERIA SE DISTRAIR COM TAREFAS DO DIA A DIA. EU COSTUMAVA DAR A MIM MESMA GRANDES PERÍODOS DE TEMPO PARA TRABALHAR. AGORA EU PESQUISO ENQUANTO PREPARO SANDUÍCHES DE PASTA DE AMENDOIM E DE GELEIA” Susan Landau, 57 anos, matemática americana, num artigo publicado pela Sociedade Americana de Matemática

“NA MATEMÁTICA, EM VEZ DE SENHORES, SOMOS CRIADOS”

Charles Hermite (1822-1901), matemático francês, citado por Howard Eves no livro Mathematical Circles Squared. Boston: Prindle, Weber & Schmidt, 1972

“ONDE HÁ PROBLEMAS, HÁ VIDA”

Aleksandr A. Zinovyev (1922-2006), matemático russo, no livro The Radiant Future. Nova York: Random House, 1980

“O TEOREMA DO VALOR MÉDIO É A PARTEIRA DO CÁLCULO: NÃO É IMPORTANTE OU CHARMOSO POR SI MESMO, MAS COM FREQUÊNCIA AJUDA A NASCER OUTROS TEOREMAS DE GRANDE VALOR” Dos autores E. Purcell e D. Varberg no livro Calculus with Analytic Geomety. Englewood Cliffs: Prentice Hall, 1987

“QUANDO UM PROFESSOR APRESENTA A MATEMÁTICA DA MANEIRA ADEQUADA, O ALUNO DEVE SENTIR A EMOÇÃO DE ADMIRAR A BELEZA, E NÃO A REPULSA DIANTE DE ALGO FEIO E DESPRAZEROSO” J. W. A. Young, citado por Howard Eves no livro Mathematical Circles Squared. Boston: Prindle, Weber & Schmidt, 1972

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A rEGrInhA

De onde saíram as regras que todo matemático sabe de cor

Diferentes

mas iguais

Uma das ideias essenciais da matemática é a de equivalência, pela qual um matemático pega dois objetos diferentes, acha uma semelhança entre os dois e os declara iguais Na matemática, assim como na vida, há muitas situações nas quais o estudante deve considerar duas coisas diferentes como essencialmente as mesmas. Para entender essa ideia, o estudante (vamos chamá-lo de Andrey) rabisca uma versão bem resumida de um teorema básico na teoria dos números, o teorema da divisão: Teorema. Para todos os números inteiros a e b, com b > 0, existem dois inteiros únicos q e r tais que a = bq + r, sendo que 0 é menor ou igual a r, que por sua vez é menor que b. Quando dividimos a por b, o número q ganha o nome de quociente, e o número r ganha o nome de resto. Andrey testa essa ideia por um tempo, e descobre sozinho

uma pergunta interessante: será possível adaptar o algoritmo da divisão para fazer uma lista completa de todos os números inteiros que, divididos por 7, deem resto igual a 5? Ele escreve uma linha para correlacionar tais números inteiros a e b: a = b$7+5 E então Andrey usa essa linha para compor uma tabela: b

a

−3

−16

−2

−9

−1

−2

0

5

1

12

2

19

3

26

18

Então, −16 = (−3)·7 + 5 e 26 = 3·7 + 5. Feito isso, Andrey passa a brincar com os números da coluna b, mas não acha nenhum padrão digno de nota (exceto que formam uma progressão aritmética de razão igual a 1). Quanto aos números da coluna a, ele acha um padrão interessante: qualquer número da coluna a, menos qualquer número da mesma coluna, resulta num número que é múltiplo de 7. Andrey confere isso várias vezes: - 9 - (- 2) = - 9 + 2 = - 7 = 7 $ (- 1) 5 - 19 = - 14 = 7 $ (- 2) 26 - (- 16) = 26 + 16 = 42 = 7 $ (6)

Essa relação entre os números da coluna a é tão importante que, para matemáticos, ela tem nome próprio e símbolo: o nome é congruência módulo 7, e o símbolo é:


a / a' (mod 7) Andrey lê essa linha assim: a é congruente a a’ módulo 7. Ainda usando os números da coluna a como exemplo, ele escreve a tabela: Notação

- 16 / 5 (mod 7)

26 /- 9 (mod 7)

Pronúncia

Significados

−16 é congruente a 5 módulo 7

−16 − (+5) é divisível por 7; além disso, é possível dividir tanto −16 por 7 quanto 5 por 7 de modo que sobre resto igual a 5.

26 é congruente a −9 módulo 7

26 − (−9) é divisível por 7; além disso, é possível dividir tanto 26 por 7 quanto −9 por 7 de modo que sobre resto igual a 5.

Na matemática, uma relação é mais ou menos como um adjetivo na língua portuguesa: a relação não diz o que uma coisa é, mas diz que característica ela tem. Se duas coisas têm essa mesma característica, então o estudante pode, em determinadas circunstâncias, considerá-las como sendo essencialmente a mesma coisa. Por exemplo: n<5 Isso é uma relação. Todos os números n menores do que 5, como 2, 0 e −30, podem ser considerados “essencialmente os mesmos” nas circunstâncias em que a relação acima for válida. Contudo, quando os matemáticos usam a expressão “relação de equivalência”, querem dizer algo mais específico do que apenas “relação”. Andrey imagina um conjunto A qualquer, cheio de elementos an : A = {..., a−1, a 0, a1, ...}. Se existe uma relação de equivalência ~ no conjunto A (~ é o símbolo

PROPRIEDADES

Se a / b (mod m) e c / d (mod m) , as seguintes propriedades da aritmética módulo m são válidas: (I) a + c / b + d (mod m) (II) a - c / b - d (mod m) (III) ac / bd (mod m)

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genérico para uma relação entre dois elementos quaisquer de um conjunto), então essa relação ~ deve ser reflexiva, simétrica e transitiva. Reflexiva: x ~ x para todo x dentro do conjunto A. Simétrica: se x e y são elementos de A, e x ~ y, então é obrigatório que y ~ x. Transitiva: se x, y e z são elementos de A, de tal modo que x ~ y e y ~ z, então x ~ z. Com umas poucas contas, Andrey nota que todas essas características se aplicam aos elementos da coluna a, lá no começo, o que significa que a congruência módulo 7 é uma relação de equivalência. Na verdade, toda congruência módulo m é uma relação de equivalência, pois é reflexiva, simétrica e transitiva. O matemático britânico Timothy Gowers explica a vantagem de uma congruência módulo m: “Quando nos dedicamos à aritmética módulo m, não queremos distinguir dois números que diferem por um múltiplo de m, mas queremos considerá-los essencialmente os mesmos.” Gowers também explica por que matemáticos profissionais gastam tanto tempo classificando as coisas: “[Os matemáticos] já provaram muitos resultados usando apenas classificações, e alguns desses resultados ninguém sabe como obter de nenhum outro modo.” Aplicações práticas? Todo o sistema de criptografia, que usamos ao realizar transações bancárias via internet, é feito com essa aritmética modular.


EntrEVistA

Didรกtica | Vida de autor | Livros didรกticos | Histรณria

Euclides ensinava para poucos 20


Reportagem: Márcio Simões

Quando era criança, LUIZ MÁRCIO IMENES só conseguia entender pouca coisa de matemática. Mais tarde se transformou em professor e em autor de livros didáticos, e descobriu o porquê: a escola de seu tempo usava Os Elementos, de Euclides, como modelo didático — mas ensinar matemática com esse modelo é aviltar a matemática

S

endo um autor de livros didáticos, Imenes viaja para se encontrar com professores e pais cara a cara, e se corresponde com centenas de pessoas Brasil afora. Adora contar a história desses relacionamentos: vai dizendo os detalhes e fazendo breves pausas para rir de si mesmo e dos outros. (Mas não comete a indiscrição de revelar a identidade de ninguém.) Por exemplo: no livro de quinto ano (quarta série), incluiu um problema assim: Você foi à banca de jornais e comprou a revista X para você e o jornal Y para seu pai, e pagou com uma cédula de 20 reais. Quanto recebeu de troco? O pai de uma menina, morador do Rio de Janeiro, mandou um bilhete todo educado para a editora: “Há um erro nesse problema; minha filha não tem como dar uma resposta, pois faltam dados.” Um funcionário da editora examinou o manual do professor e mandou uma resposta na seguinte linha: “Faltam dados mesmo. O propósito do problema é fazer o aluno perceber que não tem informações suficientes para dar uma resposta precisa. Com a ajuda do professor, ele pode estimar o valor do troco: por exemplo, pode perguntar aos colegas se alguém sabe o preço daquela revista e daquele jornal, ou pode ir a uma banca de jornais para conversar com o jornaleiro. Com essas infor-

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EntrEVistA mações, pode escrever uma resposta do tipo ‘não tenho como dar uma resposta precisa, mas, provavelmente, recebi tantos reais de troco’. Sendo assim, o aluno, por meio desse exercício, aprende que não deve tomar decisões se não tem informações suficientes; aprende também que, se não pode dar uma resposta exata, pode buscar uma resposta aproximada; e explora a ideia de função (o troco é função da soma do preço da revista e do jornal).” A resposta do pai foi ríspida: “Minha filha não está na escola para descobrir erro em livros didáticos; por favor, mandem os dados que estão faltando.” A editora pediu socorro a Imenes. “Tive de escrever uma longa carta a esse pai”, diz Imenes, “mas nunca recebi resposta.” Imenes diz que muitíssimos brasileiros adultos, inclusive pais de crianças em idade escolar e professores de matemática, desejam que seus filhos estudem matemática do jeitinho que eles mesmos estudaram. Mas o jeito antigo de ensinar matemática, diz Imenes, avilta a matemática. “Com frequência, a matemática da escola não faz justiça à matemática. Tudo o que faço nos meus livros, faço não para diminuir a matemática, mas para honrá-la.”

Por que a matemática da escola rebaixa a matemática? Certa vez, numa escola aqui de São Paulo, os pais reclamaram da coleção de matemática. Queriam saber, por exemplo, por que ela não tinha exercícios de fixação, ou por que as crianças não aprendiam tudo de frações no quinto ano [quarta série]. Enfim, queriam saber por que seus filhos não estudavam matemática do jeito que eles mesmos estudaram.

Fui a uma reunião com eles, e comecei pedindo que me contassem histórias de quando eram crianças; por exemplo, que me contassem como tinham sido as aulas sobre frações. Um dos pais se inflamou, e a certa altura deu um soco na mesa: “Fui reprovado na quarta série porque não aprendi nada de frações, e nunca usei isso na minha vida!” [risos] Veja a contradição: o método antigo não funcionou com ele, mas ele queria que a história se repetisse com seus filhos! Antigamente, o que era um problema de matemática? Ele era assim: o problema tem de ser bem formulado, tem de ter todos os dados e tem de ter uma única resposta. Só que isso não é matemática! É só ler a história de qualquer matemático, como a de Paul Erdõs: seu trabalho é lidar com problemas os quais ninguém ainda formulou perfeitamente, ele nunca tem todos os dados, e os problemas podem ter mais de uma resposta ou podem até não ter resposta. Os adultos de hoje sofreram com frações, com geometria, com inequações trigonométricas — mas por que eles sofreram? Porque foi difícil aprender? Nada disso. Eles sofreram porque, apesar de difícil, e apesar do esforço, eles não aprenderam. A matemática do tempo deles não tinha sentido, nem tinha significado. Eles aprenderam um monte de regras sem os porquês. Acho que o ser humano não tolera o que não compreende, e por isso investe tanto tempo e dinheiro em ciência. Então, não quero fazer um curso de matemática moleza; mas, se os alunos vão sofrer para estudar matemática, quero que pelo menos eles sofram para entender, e não para não entender. É assim que organizo minhas coleções.

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Como você aprendeu matemática na escola? Em 1954, eu tinha nove anos, e estudei geometria com o livro do Osvaldo Sangiorgi, que era um livro do tipo Os Elementos, de Euclides. [Imenes vai à biblioteca ligada ao escritório, pega um exemplar do livro e abre numa página.] Veja o título dos capítulos e das seções: “Introdução à Geometria Dedutiva”, “O Grupo das Afirmações Primitivas”, “O Grupo dos Postulados”. O Sangiorgi propõe um teorema e logo em seguida demonstra o teorema, e depois propõe uns exercícios de fixação. E eu, com nove anos, não entendia nada! No quarto ano do ginasial [nono ano do fundamental], tinha prova oral, e o professor me pediu para demonstrar um teorema. Fiquei olhando para ele, porque não sabia nem por onde começar. Até hoje encontro gente da minha idade que odeia a palavra “teorema”. Então, como aluno, eu fazia minhas obrigações e gostava da escola — gostava principalmente do campo de futebol. Mas, até o final do ginásio, a matemática não me seduziu. Fiquei de recuperação em matemática e em canto orfeônico! Quando acabei o ginásio, fui para o Colégio Bandeirantes, não porque eu sabia o que era o Bandeirantes, mas porque um amigo meu tinha ido. (Meu pai sabia, porque ele se desdobrou para pagar as mensalidades.) Nesse primeiro ano do colegial, o famoso professor Carlos Cattony retomava a mesma geometria do último ano do ginásio, mas ele dizia assim: — Olha, sei que vocês não estão entendendo nada. Não tem importância. Continuem decorando que uma hora isso tudo vai fazer sentido. Na próxima aula, vamos ver o teorema tal. Quem quiser vir aqui


na frente para só recitar o teorema, ganha um ponto. Prometo que não vou fazer nenhuma pergunta. Tiro meu chapéu para esse professor: ele foi muito honesto. Ele sabia que a gente não estava entendendo nada, e então não cobrava nada. E era verdade: minhas notas eram baixíssimas. Era um desespero para mim; eu não queria repetir o ano, porque sabia o quanto o Bandeirantes pesava para meu pai. Então aceitei o desafio do professor Cattony: eu decorava os teoremas e ia lá na frente para recitá-los em troca de um ponto. Na escola daquela época, o professor perguntava o que já estava no livro: se eu decorasse, tinha uma chance. Um dia, aconteceu comigo: a ficha caiu. Eu me lembro de dizer: “Ah, então é isso!?” E por que Cattony dos dava aula assim? Provavelmente, porque ele tinha aprendido assim: ele primeiro decorou, e depois a ficha caiu e tudo passou a fazer sentido. O problema é que, para muita gente, a ficha não cai. Esse modelo de ensino parte do pressuposto de que matemática é para poucos. Tanto é que, historicamente, a matemática tem sido usada para alijar [livrar-se de]: alijar o vestibulando da faculdade, alijar o cidadão num concurso público, alijar o candidato num processo de seleção. Por isso, quando me perguntam o que o aluno precisa aprender, sempre respondo: em primeiro lugar, ele precisa aprender a não odiar a matemática. [risos]

Quando você dava aulas, como era o Imenes professor? Entrei numa sala de aula pela primeira vez, na condição de professor, em 1964. Dei aulas no pró-

Bento de Jesus Caraça Matemático português, 1901-1948. Seu livro de 1941, Conceitos Fundamentais da Matemática, influenciou muitos professores de língua portuguesa.

prio Bandeirantes, dei aulas em cursinhos pré-vestibulares, dei aulas em escolas de todo tipo. Acho que todo professor começa a dar aulas do jeito que teve aulas, e comigo não foi diferente: eu começava com uma definição, apresentava um teorema, provava o teorema, resolvia exercícios. Eu queria explicar aos alunos o que ninguém tinha explicado para mim, mas, o tempo inteiro, eu falava e eles ouviam. Eu me esforçava para ser um bom expositor, pois acreditava que, se fosse um bom expositor, os alunos aprenderiam. Os alunos gostavam de mim. A escola fazia pesquisa de opinião, e eu estava sempre entre os professores mais queridos. Mas uma coisa me encafifava: eles diziam que

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eu era um bom professor, mas, apesar disso, não aprendiam tudo o que eu achava que eles deveriam aprender. Percebi que esse problema não era só meu: eu conversava com o Jacubo, com o Trotta, com o Marcelo, e com tantos outros, e os problemas eram semelhantes. [José Jakubovic Jacubo, Fernando Trotta e Marcelo Lellis são professores com os quais Imenes escreveu vários livros.] Nós sempre fomos professores elogiados pelos alunos, mas não podíamos deixar de notar que não havia a contrapartida do aprendizado. Alguma coisa estava errada. Na década de 1970, um grupo de professores de matemática, eu inclusive, combinou de organizar


EntrEVistA todos os anos um colóquio de matemática. No primeiro deles, apareceu um senhor vendendo livros. Ele levava os livros numa malinha, e me deixou examinar um livro chamado Conceitos Fundamentais da Matemática, de um certo Bento de Jesus Caraça, do qual eu nunca tinha ouvido falar. [Imenes se levanta e vai à biblioteca pegar o livro.] Como o livro tinha “matemática” no título, eu abri, e o que me chamou a atenção foi isto [abre o livro e mostra a grande quantidade de texto, comparada à quantidade de fórmulas]. Esse livro me lembrou um livro de história, ou de literatura, e eu não estava acostumado com livros assim. Pois bem: o vendedor de livros era o senhor Cortez, da Livraria Cortez. Ele começou como vendedor ambulante de livros. Comprei o Caraça das mãos dele, e esse livro foi fundamental para mim.

Como o Caraça mudou sua vida? Vou ler um trechinho da introdução [Imenes marca a leitura com gestos de mão]: “A ciência pode ser encarada sob dois aspectos diferentes. Ou se olha para ela como vem exposta nos livros de ensino, como coisa criada, e o aspecto é o de um todo harmonioso, onde os capítulos se encadeiam em ordem, sem contradições. Ou se procura acompanhá-la no seu desenvolvimento progressivo, assistir à maneira como foi sendo elaborada, e o aspecto é totalmente diferente — descobrem-se hesitações, dúvidas, contradições, que só um longo trabalho de reflexão e apuramento consegue eliminar, para que logo surjam outras hesitações, outras dúvidas, outras contradições. [...]

Encarada assim, aparece-nos como um organismo vivo, impregnado de condição humana, com as suas forças e as suas fraquezas e subordinado às grandes necessidades do homem na sua luta pelo entendimento e pela libertação, aparece-nos, enfim, como um grande capítulo da vida humana social.” Isso torpedeava minhas concepções, e me fez procurar muitos outros livros, mas o Caraça nunca perdeu o primeiro lugar. Uma vez, li um texto do professor Manfredo [Manfredo P. do Carmo, do Impa], em que ele dizia algo assim: “Há um grande equívoco no ensino da matemática, que provém da adoção dos livros de Euclides.” Só fui entender isso no mestrado. Antigamente, a humanidade criou e usou matemática para resolver problemas bem práticos: demarcar terras, calcular áreas, calcular volumes. Mas Euclides, em Os Elementos, organizou o conhecimento de sua época de maneira sistemática: partindo de determinadas afirmações básicas e verdadeiras, ele mostrou que podemos chegar a fatos novos, e também verdadeiros, por meio de raciocínio dedutivo. Por exemplo: se já sei que a soma dos ângulos internos de um triângulo qualquer é 180 graus, então demonstro que posso dividir qualquer quadrilátero em dois triângulos; com isso, posso dizer que a soma dos ângulos internos de um quadrilátero qualquer é 360 graus. Os Elementos é uma das grandes obras da humanidade, mas Euclides escreveu esse livro para ajudar as pessoas a estudar matemática? Acho que não. Ele não tinha propósitos didáticos; sua intenção era sistematizar. Mas o fato é que, por muitos séculos, Os Elementos foram usados como modelo de livro didático.

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A partir do Caraça, percebi que o modelo adequado para ensinar matemática é aquele em que o aluno percorre, mais ou menos, os passos históricos da humanidade. O aluno deve partir de atividades mais práticas, que façam sentido para ele, e quando já construiu um pouco de matemática, aí sim uso esse olhar grego e o ajudo a sistematizar o que aprendeu. Essa sistematização é chamada de “formalização local”; ela é a última etapa no estudo de um tópico, e não a primeira. Hoje sei que devemos fazer o aluno perguntar: por que é assim? E devemos ajudá-lo a achar a resposta. Devemos valorizar seus conhecimentos prévios. Devemos ajudá-lo a ver a matemática ligada à língua portuguesa, à sociedade como um todo.

O ensino de matemática está melhorando? Está melhorando. A escola para todos é uma instituição muito nova na história da humanidade — tem uns 200 anos. A verdade é que vimos fazendo uma escola possível — muito chata, mas era o que sabíamos fazer. Está melhorando porque, recentemente, a didática da matemática virou objeto de investigação científica. Há 20 anos, se alguém pedisse à Capes uma bolsa para estudar didática da matemática em Londres, por exemplo, não conseguiria. Hoje consegue. A questão é: não se faz matemática com dogmas, mas com argumentos. Uma coisa é o adulto saber isso. Outra coisa é ensinar isso às crianças, porque elas não são adultos em miniatura. É um baita desafio fazer ao contrário do que vínhamos fazendo: proporcionar conhecimentos de matemática a todos, e não só a uns poucos, e sem aviltar a ciência matemática.


PAssAtEmPo

Potenciação | Algoritmo | Operação inversa

COMO CORTAR UM CADARÇO MAIOR QUE O EVEREST Para resolver um problema grande, primeiro o fabricante de sapatos recorre a um problema simples

U

m pequeno fabricante de sapatos (vamos chamá-lo de Vidal) comprou uma máquina para otimizar o corte de cadarços. O equipamento funciona assim: ele alimenta a máquina com um cordão enorme (como se fosse um cadarço bem comprido), então ela o dobra quantas vezes forem necessárias e o corta ao meio, formando vários cadarços do tamanho que o fabricante quiser. Vidal produziu neste mês 8.190 pares de sapatos, para os quais ele comprou um cordão com 12.285 metros de comprimento — com um cadarço tão grande, poderia medir o monte Everest da base até o topo e ainda sobrariam mais de 3.000 metros. Com o cordão, a máquina fará cadarços de 75 centímetros.

Quantidade de dobras

Nº de cadarços

0

(1 − 1) + 2 = 2

1

(2 − 1) + 2 = 3

2

(4 − 1) + 2 = 5

3

(8 − 1) + 2 = 9

Ao olhar o número de dobras e a quantidade de cadarços, ele percebe um padrão: a quantidade de cadarços (sem contar as pontas) aumenta exponencialmente conforme a máquina dobra o cordão. Então ele chama de d o número de dobras e de c o número de cadarços que sairá da máquina: 2d + 1 = c c = 16.380 2 d = 16.380 - 1 2 d = 16.379 Log2 16.379 = d d = 13, 999...

Vidal sabe que precisa de 16.380 cadarços, mas deve calcular quantas vezes a máquina deve dobrar o cordão original para produzir a quantidade certa. Ele não precisa de nada além da matemática do ensino médio, mas numa primeira tentativa, o problema parece difícil. Então, primeiro ele tenta simplificá-lo: — Se eu precisasse de apenas sete cadarços, como programaria a máquina? Com um cadarço pequeno em mãos, Vidal imagina como a máquina trabalhará: — Se ela cortar o cordão ao meio, sairão dois pedaços, e se ela dobrá-lo e cortá-lo ao meio, sairão três pedaços. Então, se ele pedir para a máquina dobrar o cordão duas vezes, terá cinco pedaços e, caso dobre três vezes, terá nove pedaços. Ou seja, se precisasse de sete pedaços, a máquina teria de dobrar o cordão pelo menos três vezes. Além disso, ele também lembra que ao dobrar o cadarço, sobram sempre duas pontas, que são as extremidades do cordão original, então ele precisa subtrair

Vidal terá de programar a máquina para dobrar o cordão original 14 vezes antes de cortá-lo ao meio, e ela lhe devolverá 16.385 cadarços. Com esse resultado, o fabricante sabe que irão sobrar cinco pedaços, dos quais dois são as pontas que não têm o tamanho necessário para servir num sapato. 214 + 1 = 16.384 + 1 = 16.385 Como a produção da fábrica varia a cada mês, Vidal guarda a fórmula que usou para calcular a quantidade de dobras. Ele sabe que no próximo mês só precisa programar a máquina para um novo número de cadarços. Aliás, mesmo que sua fábrica cresça muito e tenha de produzir quantidades bem maiores, ele ainda poderá usar o mesmo algoritmo sem se preocupar.

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ADAPTADO DE UM PROBLEMA DA 8ª OLIMPÍADA BRASILEIRA DE MATEMÁTICA DAS ESCOLAS PÚBLICAS (OBMEP) PARA 6º E 7º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

um cadarço do total e somar essas duas pontas, que formam dois cadarços distintos: (x − 1) + 2 = x + 1.


DIDÁticA

Aproximação de π | Arquimedes | História | Geometria

Um professor de matemática ensinou seus alunos a aproximar π e descobriu que eram bons em matemática, mas mesmo assim compravam a pizza mais cara

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Reportagem: Mariana Osone

C

ristiano virou professor de matemática quando ainda era estudante de arquitetura na USP. Ele não era matemático, nem arquiteto. Mas as escolas na periferia de São Paulo precisavam de professor, e ele precisava de dinheiro, então foi dar aulas de matemática no ensino fundamental, no médio e no supletivo. “Quando me formei, era mais professor de matemática do que arquiteto, em termos de prática.” Alguns anos depois de se formar em arquitetura, decidiu fazer licenciatura e mestrado em matemática, e por isso escreveu um artigo sobre como alguns de seus alunos conheceram o número π. Tem duas coisas das quais Cristiano gosta muito: história da matemática e suas aplicações práticas. O número π serve para as duas. Em 2003, numa turma de 60 alunos já adultos, no primeiro ano do supletivo, o professor entregou aos alunos régua e barbante, calculadora, e objetos cilíndricos de vários tamanhos. Primeiro, os alunos passaram barbante em volta do objeto; por exemplo, um copo. Depois, mediram com régua o tamanho do barbante e encontraram o perímetro do copo (ou a circunferência). Depois, usaram a régua para medir o diâmetro. Cristiano dizia aos alunos: — Dividam a circunferência pelo diâmetro do copo. Qual resultado encontram? Os números variaram entre 3 e 3,5. Era quase uma reconstituição da história, pois, há muitos séculos, os geômetras também notaram essa razão constante, que independia do tamanho do círculo, mas, assim como os alunos de Cristiano, não a chamavam de π. Depois dos barbantes e dos copos, os alunos verificaram os resultados por meio do processo contrário: o professor lhes mostrou o valor de π com nove casas decimais (3,141592653) e os fez multiplicar o diâmetro por π. Eles chegaram a resultados próximos do comprimento que já tinham medido. Para Cristiano, era uma forma de fazer o aluno visualizar a proporção, para depois formalizá-la. “Depois de descobrir uma razão de valor constante, a gente sistematiza: aqui vocês descobriram o valor que chamamos de pi.” Muito antes que os matemáticos adotassem a letra grega π, Arquimedes demonstrou uma forma rigorosa de calcular o valor aproximado de π, usando polígonos circunscritos a um círculo (desenhados do lado de fora do círculo) e polígonos inscritos (desenhados do lado de dentro). Cristiano usou essa ideia para passar instruções a seus alunos: desenhem um círculo, inscre-

vam nele um quadrado, e então desenhem um quadrado circunscrito a esse mesmo círculo. Depois, eles tinham de duplicar os lados de ambos os quadrados para formar um octógono. Com essa atividade, Cristiano queria mostrar aos alunos que, se dobrassem os lados dos polígonos interno e externo várias vezes, chegariam cada vez mais perto do comprimento da circunferência. Para o professor, por meio dessa experiência, os alunos também conheceram a ideia de integral. “O bacana de métodos como esse é explicar conteúdos que você precisa dar em sala de aula e abrir horizontes para outros que podem servir lá na frente.”

Falta de confiança Em seguida, os alunos usaram os conhecimentos recém-estudados para resolver um problema simples do dia a dia. Leram o enunciado: “Na pizzaria do Mário, uma pizza média com 24 centímetros de diâmetro custa R$ 9,98. Mas Mário garante que o cliente leva vantagem se levar a pizza grande, que tem 32 centímetros e está na promoção por R$ 20,20. Existe mesmo uma vantagem? Se existe, qual é o desconto percentual?” Os alunos tinham o valor de π com nove casas decimais e sabiam usá-la para partir do diâmetro e chegar à área do círculo. Então depois de calcular a área das pizzas, era só dividir o custo pela área para descobrir qual pizza custaria menos por centímetro quadrado ou por metro quadrado. “Eles poderiam resolver o problema de alguma outra forma”, diz Cristiano. “Mas, por causa da atividade anterior, escolheram usar o π.” Cristiano diz que 74% dos alunos fizeram o cálculo corretamente: apesar do que Mário dizia, a pizza maior ficava ≈14% mais cara. Contudo, 58% dos alunos acharam que valia a pena comprar a pizza grande mesmo assim. “Foi a maior lição que eu tive”, diz Cristiano. “O aluno sabia usar π para fazer os cálculos, mas como no texto a pizza maior estava em promoção e, no supermercado, ele vê os produtos maiores em promoção, o aluno se deixou levar por isso.” Para Cristiano, seus alunos foram incapazes de confiar nas próprias contas. E Cristiano notou um fenômeno digno de estudos: quando o aluno descobria que tinha errado o exercício, ele se decepcionava com a matemática. Na verdade, ele deveria se decepcionar com a própria capacidade de interpretar textos, isto é, deveria se decepcionar com o professor de português. Cristiano passou a estudar o problema, para ajudar seus alunos a entender melhor o que leem.

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DIDÁticA

Aproximação de π | Arquimedes | História | Geometria

πN

COMO CALCULAR

Com bons conhecimentos de geometria básica, o aluno só precisa de lápis e papel para refazer os passos de Arquimedes

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Reportagem: Mariana Osone

π NUMA ILHA DESERTA? NESTA ARQUEOLOGIA DE UMA IDEIA, O LEITOR DEVE IMAGINAR OS TRIÂNGULOS DENTRO E FORA DA CIRCUNFERÊNCIA

Q

que Arquimedes fez, versão na qual os alunos possam usar uma calculadora e os botões de seno, cosseno e tangente. Para repetir os passos de Arquimedes, o estudante deve ter noções de desenho geométrico, bissetriz, mediatriz, o que é circunscrição e inscrição, e trigonometria. Além disso, o professor deve ajudar os alunos com as inequações e as relações entre medidas. Se não o aluno vai ficar espantado quando vir que Arquimedes usa para o raio a mesma medida que para o diâmetro. Aline explica: “A relação entre duas coisas é a mesma para o dobro dessas duas coisas.”

uando o navio de Robinson Crusoé naufraga, o personagem vai parar numa ilha deserta e tem de lutar para sobreviver com alguns mantimentos que pegou no navio. Depois de construir uma espécie de cabana, organizar uma rotina para caçar animais e explorar a ilha de vez em quando, ele poderia ter usado matemática para passar o tempo. Poderia seguir o exemplo de Arquimedes, que também viveu numa ilha, e usar o método da exaustão para calcular uma aproximação de π. Crusoé poderia até descobrir mais casas decimais do que o próprio matemático grego. Se um estudante no ensino médio quiser fazer o mesmo, mas no conforto de casa, só precisa de papel, lápis e bons conhecimentos de geometria básica. O que Arquimedes fez para aproximar π não é nada trivial. Para Aline dos Reis Matheus, do Centro de Aperfeiçoamento do Ensino da Matemática (CAEM, localizado na Universidade de São Paulo), o professor teria de mastigar bem o conteúdo do tratado de Arquimedes para apresentá-lo a alunos do ensino médio. “Não é uma questão de raciocínio, é uma questão de ter traquejo com as passagens que ele usa e fôlego para acompanhar. O aluno de ensino médio em geral não tem essa maturidade.” Aline diz que talvez seja mais prático usar uma versão do

Arquimedes e o π

Arquimedes viveu por 75 anos em Siracusa (na Sicília, uma ilha da Itália). Algumas pessoas dizem que ele costumava andar com um pote de areia embaixo do braço para que pudesse desenhar formas geométricas e fazer cálculos — naquela época, 300 a.C., qualquer forma de papel era caríssima. Hoje o aficionado por história da matemática (vamos chamá-lo de Isaac) pode refazer os passos de Arquimedes com maior conforto. Na verdade, Isaac prefere usar também régua e compasso, mas não precisa desenhar nada com perfeição, pois as formas só servem para orientar o pensamento.

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DIDÁticA

Com o compasso em mãos, Isaac desenha a circunferência (ilustração 1) e usa a régua para traçar o diâmetro, que vai do ponto A ao ponto B. Ele chama o centro da circunferência de O. Isaac também usa a régua para traçar a tangente do círculo em A, então ele constrói um triângulo retângulo AOC, com um ângulo de 30º em O (cujo cateto oposto CA é metade do lado de um hexágono), e escreve embaixo do desenho as relações entre as medidas que Arquimedes usou:

OA = 3 265 ; 2 CA 1 153

OD + OA = DE + EA OD + OA = DA & OA EA OA EA 1+ 1 591 1.162 571 OD + OA = OA 8 8 = 2 DA EA 153 153

Isaac usa de novo Pitágoras e encontra a hipotenusa do triângulo AOE: 1 1.172 1 OE 1 8 OE2 2 (1.162 ) 2 + 1532 & OE 2 1.172 & 2 8 EA 8 153

CO = 2 = 306 CA 1 153

Isaac não se pergunta de onde veio essa aproximação da raiz de três, pois sabe que vários historiadores já se fizeram essa pergunta — como Thomas Health, matemático e historiador britânico. Thomas diz que, nos escritos encontrados, não há nenhuma explicação de como Arquimedes chegou às aproximações de qualquer das raízes que usou. Sabendo disso, Isaac pega o compasso de novo, e traça a bissetriz do ângulo AOC, que encontra a tangente AC Ângulo no ponto D. Em seguida, ele usa o teorema da bissetriz interna (veja o AÔC 30º quadro na página 32) para deduzir: CO = OA CO = CD & CD DA OA DA

Isaac também usa uma das propriedades das proporções e a ilustração 1 para fazer as seguintes relações:

Então, ele pensa: “Ora, parece que toda vez que eu traço a bissetriz do triângulo, eu tenho de somar raio e hipotenusa e usar o resultado como um novo valor para o raio no triângulo seguinte.” Isaac sabe que funciona assim por causa das regrinhas de geometria, e que todas as vezes precisa do teorema de Pitágoras para obter a hipotenusa e, de novo, somar com o raio. Então, faz o procedimento mais três vezes e consegue os valores da tabela abaixo: Hipotenusa

OA

Cateto oposto a

CO = 306

OA > 265

CA =

AÔD

15º

OD > 591+1/8

CO + OA > 571

DA =

AÔE

7,5º

OE > 1.172+1/8

OD + OA > 1.162+1/8

EA =

AÔF

3,75º

OF > 2.339+1/4

OE + OA > 2.334+1/4

FA =

AÔG

1,875º

OF + OA > 4.673+1/2

GA =

153

Depois de obter o último valor de OA, Isaac não precisa mais fazer o teorema de Pitágoras. Ele pega o compasso com a abertura do tamanho de um arco de 1,875º para desenhar do outro lado do raio um triângulo igual ao AOG, e chama esse triângulo de AOH. Isaac percebe que se unir AOG e AOH, forma um triângulo GOH cujo ângulo em O é 3,75º. Essa é a medida do ângulo central de um polígono de 96 lados. Dado isso, ele escreve no papel:

CO + OA = CD + DA = CA OA DA DA

Então, ele multiplica os dois lados da igualdade por OA/CA e faz a relação com os valores numéricos que Arquimedes usou. Em vez de usar o símbolo de igual, usa o de maior, pois está lidando com aproximações: CO + OA = OA 306 + 265 = 571 2 CA DA 153 153

1 4.673 OA 2; 2 AG 153

Isaac pensa assim: se tenho um valor aproximado para OA (571) e para DA (153), posso usar o teorema de Pitágoras para descobrir a hipotenusa OD. 1 591 OD 1 8 2 2 2 + OD 2 571 153 & OD 2 591 & 2 DA 8 153

AB = 2 $ OA;

GH = 2 $ AG

Para obter uma relação entre diâmetro e lado do polígono, Isaac manipula os lados da desigualdade para facilitar os cálculos. Tudo que ele faz de um lado, faz também do outro, ou então, tudo que ele faz de um lado só, ele faz na parte de cima e na parte de baixo, para manter a relação equilibrada:

Em seguida, ele traça a bissetriz do ângulo AOD, que encontra a tangente no ponto E, e repete os cálculos:

30


Segundo a professora do CAEM Aline dos Reis Matheus, o professor teria de mastigar muito bem os procedimentos de Arquimedes para que alunos do ensino médio os entendessem

Ilustração 1

Ilustração 2

C

Polígono circunscrito

Polígono inscrito

É assim que o desenho do polígono circunscrito deve se parecer, depois que os cálculos ficarem prontos.

Este é o polígono inscrito, embora o estudante precise de imaginação para ver o polígono.

C

D

D

d

E F G A H

Ilustração 3

0

E F G B

B

0

A

Triângulos semelhantes Em duas figuras semelhantes, o ângulo de um vértice é igual ao ângulo do vértice correspondente na outra figura, e a razão entre lados correspondentes também é igual.

d

c

B

15o

A

d

15o

D

31

A

D

15o

B


DIDÁticA

1 1 1 4.673 4.673 4.673 OA 2 & 2 $ OA 2 2 & AB 2 2 2 AG 153 GH 2 $ AG 153 153

TEOREMA DA BISSETRIZ INTERNA

A bissetriz interna de um triângulo divide o lado oposto ao ângulo em segmentos proporcionais aos lados adjacentes a esse ângulo. No desenho, AB/BD = AC/DC.

Isaac sabe que um polígono regular de 96 lados é formado por 96 triângulos e GH é o lado de um desses triângulos, por isso multiplica GH por 96. Do outro lado da relação, ele faz a mesma coisa: multiplica 153 (lado do triângulo) por 96 para obter o perímetro do polígono. Com esses valores, ele faz a relação entre o perímetro do polígono (P) e o diâmetro da circunferência (AB) e chega a uma aproximação de π. 1 4.673 AB 2; 2 96 $ GH 96 $ 153

P 14.688 1 1 . 3 ou 3, 1428... AB 1 7 4.673 2

Mas Isaac não quer só o limite superior de π, ele também quer calcular uma aproximação de seu limite inferior, e para isso vai precisar do polígono inscrito na circunferência. Então, ele desenha uma semicircunferência, onde traça o diâmetro do ponto A ao ponto B (ilustração 2). Ele também inscreve um ângulo de 30º com vértice em A, e traça a corda desse ângulo até um ponto C na circunferência, por fim, ele une C a B, formando um triângulo retângulo. De novo, ele escreve as medidas que Arquimedes usou para fazer as relações do triângulo: AC = 3 1.351 1 CB 1 780

Com o teorema da bissetriz interna, Isaac deduz a última igualdade acima (AB/Bd) e também escreve o seguinte:

AB = 2 = 1.560 BC 1 780

AB = AC AB + AC = AB + AC = AD & Bd Cd BC BD Bd + Cd

Então, Isaac traça a bissetriz do ângulo de 30º, que encontra a circunferência no ponto D. E chama de d o ponto onde a bissetriz passa pela corda BC. Então, ele une B a D e obtém três triângulos retângulos semelhantes (BAD ~ dAC ~ dBD). Ele os desenha, sem muita precisão, um ao lado do outro para visualizar melhor (ilustração 3) e deduz algumas relações entre eles:

Então, ele usa as aproximações numéricas de Arquimedes para AB, AC e BC e substitui pelos valores numéricos: AD 1.560 + 1.351 = 2.911 1 BD 780 780 Com os valores de AD e BD, Isaac usa o teorema de Pitágoras para calcular o valor da hipotenusa AB:

AD = BD = AC = AB BD Dd Cd Bd

PROPRIEDADE DAS PROPORÇÕES

Numa proporção, a soma dos dois primeiros termos está para o segundo termo, assim como a soma dos dois últimos está para o quarto termo.

a = c a c a b c d a+b = c+d & +1 = +1 & + = + & b d b d b b d d b d

32


Isaac lembra um teorema que diz que um ângulo inscrito numa circunferência é igual à metade da medida do arco correspondente a ele. Ou seja, se o ângulo BÂG mede 1,875º, o ângulo central de seu arco (na circunferência) será 3,75º. Portanto, BG é um lado de um polígono de 96 lados. Então, Isaac calcula a relação entre perímetro do polígono (P) e diâmetro da circunferência (AB):

3 3.013 3 AB 4 AB 1 2.911 + 780 & AB 1 3.013 & 1 4 BD 780 2

2

2

Em seguida, ele traça a bissetriz do ângulo BAD e chama de E o ponto em que ela encontra a circunferência, e une E a B. A partir das mesmas deduções de antes, ele conclui: 3 3 3.013 + 2.911 5.924 AE = AB + AD 4 4 = 1 BE BD 780 780

P 96 $ 66 = 6.336 10 2 23 ou 3, 1408... AB 1 1 71 2.017 2.017 4 4

Para simplificar essa fração, Isaac multiplica numerador e denominador por 4/13.

Por fim, Isaac põe π num sanduíche: 10 1 3 1r13 71 7 Segundo a lenda, Arquimedes enfrentou um soldado romano dizendo, mais ou menos, o seguinte: “Pode me prender, mas não toque nos meus círculos.” O soldado o matou à espada. Se soubesse quanto trabalho aqueles círculos haviam dado, teria levado o protesto do velhote mais na esportiva.

`5.924 3 j $ 4 4 13 = 1.823 4 240 780 $ 13 Dada essa relação AD/BE, Isaac usa Pitágoras para obter AB < 1.838 + 9/11. Então, ele traça a bissetriz do ângulo BAE, que encontra a circunferência no ponto F, e une F a B. 9 9 1.838 + 1.823 3.661 AF = AB + AE 11 11 = 1 240 FB BE 240 Isaac multiplica as duas partes da fração por 11/40, para simplificá-las e chega a 1.007/66. Ele percebe que está fazendo algo parecido com os cálculos do polígono circunscrito, mas agora a hipotenusa é o diâmetro. Então, após traçar a bissetriz, ele tem de somar hipotenusa e cateto adjacente para descobrir um valor para o cateto adjacente do próximo triângulo; e depois usar Pitágoras para descobrir a hipotenusa. Após realizar esses procedimentos quatro vezes, ele obtém os valores da tabela abaixo (alguns valores já estão simplificados): Ângulo

Cateto adjacente

AB (hipotenusa)

Lado do polígono

BÂC

30º

AC <1.351

1.560

BC =

BÂD

15º

AB + AC < 2911

2.911 + 780 < (3.013 + ¾)

BD =

BÂE

7,5º

AB + AD < 1.823

1.8232 + 2402 < (1.838 + 9/11)2

BE =

BÂF

3,75º

AB + AE < 1.007

1.0072 + 662 < (1.009 + 1/6)2

FB =

BÂG

1,875º

AB + AF < 2.016 + 1/6

(2.016 + 1/6)2 + 662 < (2.017 + ¼)2

BG =

780 2

2

2

240

66

33


mEio AmBiEntE

Aplicações da matemática | Climatologia | Política

O nome da

diferença Ao longo dos séculos, o planeta Terra esquentou e esfriou naturalmente, num ciclo, e por isso alguns cientistas dizem que o aquecimento global é uma farsa. Contudo, o nome “aquecimento global” não se refere a esse ciclo natural de esquenta-esfria

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Reportagem: Francisco Bicudo

S

ão Paulo, a terra da garoa, se transformou na terra das tempestades. Uns poucos números mostram isso: em janeiro de 2010, 14.710 raios caíram na cidade, contra os 4.138 raios de janeiro de 2009. (Caíram na cidade é uma expressão imprecisa, pois muitos raios partem do solo em direção às nuvens; sendo assim, em janeiro de 2010 a cidade não só foi atingida por raios, como chicoteou as nuvens com raios...) Com frequência, rajadas de ventos de mais de 100 quilômetros por hora varrem certos bairros, em geral à noitinha. O vento ruge forte, chacoalha janelas, fios e postes, e no dia seguinte, quando amanhece, funcionários da prefeitura têm de recolher árvores caídas, algumas delas imensas. Cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) rodaram simulações por computador e descobriram que, até o final deste século 21, deve dobrar o número de chuvas com potencial para causar enchentes de grandes proporções. Tudo isso é culpa do aquecimento global, dizem uns, que aliás não existe, dizem outros — vamos chamar estes outros de descrentes. Para saber a temperatura da Terra ao longo dos séculos, os cientistas usam indícios indiretos: tabu-

lam o aumento ou a diminuição de uma espécie de planta, por exemplo, contando o número de sementes achadas em escavações arqueológicas; mas, principalmente, contam o número de moléculas dos gases presentes em bolhas de ar presas dentro de geleiras antigas, formadas há séculos. Feito isso, os cientistas montam gráficos para mostrar a variação da temperatura e a concentração na atmosfera do principal gás de efeito estufa, o dióxido de carbono (CO2). O gráfico 1 mostra a temperatura e o CO2 conforme os dados obtidos numa geleira na Antártida. O descrente, ao examinar o gráfico com cuidado, nota o óbvio: a temperatura começa a aumentar e depois disso o dióxido de carbono aumenta também; a temperatura começa a diminuir e depois disso o dióxido de carbono diminui também. Logo, é o aumento de temperatura da Terra que provoca o aumento de CO2, e não o contrário. Em outras palavras, diz o descrente, esses aumentos e diminuições de CO2 fazem parte do ciclo natural da Terra, e não há nada que o homem possa fazer nem para aumentar a temperatura do planeta nem para diminuí-la.

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Gráfico 1

Mudança de temperatura (ºC)

dióxido de carbono

Dióxido de carbono (ppm)

mEio AmBiEntE

temperatura

Milhares de anos até o presente

Gráfico 2

O que acontece nos instantes A A, B B, C C, D e E? E

José Antonio Marengo Orsini, pesquisador do Inpe, fica ressabiado sempre que topa com um descrente, mas respira fundo para manter o tom de voz gentil. “Numa democracia, cada um fala o que quer”, diz Marengo. “As evidências científicas nos dizem que a Terra está esquentando rapidamente e não apenas por um processo natural — o homem é protagonista.” Marengo nasceu no Peru e, ainda no Peru, estudou meteorologia na faculdade e hidrologia no mestrado. Nos Estados Unidos, estudou climatologia no doutorado e no pós-doutorado, e se especializou em modelos matemáticos do clima terrestre. Trabalha no Inpe desde 1995, é membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), e faz parte da Academia Brasileira de Ciências. No Brasil, é talvez o cientista mais bem preparado para discorrer sobre aquecimento global. Ele mesmo reconhece que a Terra esquenta e esfria naturalmente, num ciclo, como mostra

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o gráfico 2 (preparado por Ian Stewart, autor do livro Incríveis Passatempos Matemáticos). De modo geral, a temperatura aumenta por causas naturais, como mostra o ponto A do gráfico (principalmente porque o eixo da Terra oscila, isto é, a Terra se inclina e o Sol passa a iluminá-la de modo diferente). Uns cem anos depois, mais ou menos, o dióxido de carbono passa a aumentar também, como mostra o ponto B. Quando o CO2 começa a aumentar, ele obriga a temperatura a aumentar, que por sua vez obriga o CO2 a aumentar — os dois fenômenos se realimentam por séculos. No ponto C, a temperatura começa a cair, e uns cem anos depois (no ponto D), o CO2 começa a cair também, e a diminuição de um provoca a diminuição do outro. No ponto E, o ciclo recomeça. “A Terra já foi tomada por geleiras e depois por secas”, diz Marengo. “São ciclos que se alternam.” Quando diz isso, Marengo não está dando razão aos descrentes — ao contrário. Quando um cientista como Marengo se refere ao aquecimento global, ele não está falando do ciclo natural de aquecimento e resfriamento da Terra. Antes, está falando apenas da diferença entre as consequências provocadas pelo ciclo natural e as consequências provocadas pelo homem. A tão famosa expressão “aquecimento global” pode ser traduzida para “incremento no aquecimento global provocado por atividades humanas, depois de descontado o aquecimento provocado por ciclos naturais de aquecimento e de resfriamento”.

O homem não cria, mas acelera Essa é uma ideia difícil de entender, e por isso Ian Stewart propõe um modelo matemático bastante simplificado do aquecimento global (pois tais modelos são complicadíssimos, e só funcionam em computadores de grande porte). É um modelo feito de duas equações diferenciais, em que T é temperatura, C é dióxido de carbono e t é tempo. dT = sen (t) + 0, 25C - 0, 01T2 dt dC = 0, 1T - 0, 01C2 dt


O que essas duas fórmulas dizem, em palavras? A temperatura T sobe e desce periodicamente conforme o tempo passa, pois sen(t) é uma função periódica. Qualquer alteração na quantidade de CO2 na atmosfera produz uma alteração proporcional na temperatura (é o termo 0,25C na equação da temperatura), e qualquer alteração na temperatura provoca uma alteração proporcional na quantidade de CO2 (é o termo 0,1T na equação do CO2). (Note que uma fórmula fornece valores para a outra, e vice-versa; as duas se realimentam.) Ian Stewart explica: “Como 0,25 é maior do que 0,1, a temperatura responde mais rápido a mudanças no CO2 do que o contrário.” Explicadas as duas equações, Ian Stewart mostra ao leitor três gráficos. O gráfico 3, o primeiro deles, mostra como temperatura e CO2 sobem e descem sozinhos caso sejam deixados em paz. “As alterações em C ocorrem depois das alterações em T”, diz Ian, “mas esse atraso é consequência de efeitos não lineares do sistema.” Então, esse atraso não reflete atrasos provocados por uma coisa agindo como causa da outra ou uma coisa agindo em consequência da outra. O gráfico 4, o segundo, mostra o que aconteceria se o homem aumentasse a concentração de CO2 na atmosfera, o que acontece no instante t = 25. “Dessa forma”, diz Ian, “estamos nos perguntando que efeito essa elevação do CO2 provoca.” A olho nu, a temperatura continua a funcionar como vinha funcionando. No gráfico 5, Ian mostra apenas a diferença entre o gráfico 3, com o sistema em paz, e o gráfico 4, com um pico de CO2 no instante t = 25. O pico de CO2 realmente faz a temperatura aumentar (em relação ao sistema em paz), e a temperatura continua a crescer mesmo depois que a injeção de CO2 extra já começou a diminuir. Esse gráfico 5 ilustra o que cientistas como Ian Stewart e Marengo chamam de “aquecimento global”. Mas houve um pico de CO2? Como o gráfico 1 mostra, houve. Só em 2011, o homem jogou 31,6 gigatoneladas de CO2 na atmosfera, o que é bastante: equivale à massa da atmosfera dividida por 163.000. O homem joga CO2 extra na atmosfera sempre que queima combustíveis fósseis (ou

Gráfico 3

Como a temperatura (linha preta) e o CO2 (linha cinza) variam ao longo do tempo. Observe que o CO2 aumenta ou diminui depois da temperatura

Gráfico 4

O efeito de um aumento súbito de CO2 (na linha cinza)

Gráfico 5

A diferença entre o nível de CO2 e o nível da temperatura dos gráficos 3 e 4 mostra que a temperatura aumenta depois da injeção de CO2 extra, e que continua a subir mesmo depois que o CO2 já começou a baixar

37


COmPUtAÇÃO

seja, liga o carro, aciona uma usina termoelétrica, fabrica plásticos), sempre que queima plantas (para destruir a floresta, para produzir carvão), sempre que apaga incêndios (vários extintores contêm CO2), sempre que põe bolhinhas dentro do refrigerante — enfim, sempre que vive. Hoje há 400 partes por milhão de CO2 na atmosfera, comparados com 300 ppm nos séculos em que não existiam civilizações industriais. “O homem não cria o aquecimento global”, diz Marengo, “mas ele acelera o aquecimento global.” Entre 1997 e 2011, segundo a Organização Meteorológica Mundial, ocorreram os 13 anos mais quentes da história recente do planeta. Para usar uma analogia, é como se os gases de efeito estufa funcionassem como um cobertor sobre a Terra, e esse ciclo de esquenta e esfria fosse consequência de um termostato ajustado para a espessura do cobertor. Esse sistema tem mantido a temperatura média da atmosfera na superfície do planeta em torno de 15 graus centígrados. Todo santo dia, o homem joga na atmosfera 70 milhões de toneladas de CO2, e está transformando o cobertor num edredom — mas o termostato continua ajustado para um cobertor. “Precisamos aceitar que o clima está mudando por nossa culpa”, diz Marengo, “e precisamos ter a generosidade de nos adaptar por conta das próximas gerações.” Segundo técnicos do IPCC, a temperatura média deve subir, até o ano 2100, de 2 graus a 6 graus centígrados só por conta das atividades humanas (isto é, descontado o aumento devido

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ao ciclo natural de esquenta-esfria). Mesmo que suba só 2 graus, já é bastante. Os cientistas se preocupam com as ilhas Maldivas, no oceano Índico, que talvez fiquem submersas em menos de 100 anos; com secas mais severas na África, o que talvez extinga certas espécies de animais e de plantas e obrigue os humanos a se concentrar em cidades cada vez maiores (e a sofrer com os conflitos típicos de cidades grandes, pobres e superpopulosas); com menos geleiras nos Alpes, o que talvez reduza a quantidade de água potável à disposição dos europeus; com menos geleiras nos polos norte e sul, o que talvez eleve o nível dos oceanos e extinga espécies como a do urso-polar. No Brasil, cientistas como Marengo se preocupam mais com a região amazônica e com o nordeste. Caso a floresta tropical se transforme numa espécie de savana africana, não só várias espécies de animais e de plantas desaparecerão, como choverá menos nas regiões sudeste e sul — e cada chuva ficará mais violenta. “O nordeste brasileiro é candidatíssimo a se transformar num deserto”, diz Marengo. “O que nós do IPCC podemos fazer é chamar a atenção para tais simulações matemáticas. Mas não temos a prerrogativa de implementar políticas públicas. Essa responsabilidade cabe aos governos.”

Empregos e crenças Os governos têm agido de forma ambígua. Eles reservam verba para financiar pesquisas científicas sobre o aquecimento global (verba que tem sido usada para pagar o salário de gente

A expressão “aquecimento global” se refere à média da temperatura do planeta inteiro; em alguns lugares, a temperatura média vai cair, e não aumentar


Mas, depois de anos analisando dados e estudando equações, Marengo diz que aprendeu uma lição: os números são importantes, porém insuficientes. As pessoas querem viver bem, aqui e agora. Além disso, elas tendem a ver o planeta Terra como uma espécie de mãe — essencialmente boa e justa. Como mostraram cientistas da Universidade da Califórnia, qualquer mensagem que diga “o planeta fará mal à humanidade” é recebida com desconfiança. Sendo assim, diz Marengo, o desafio é mais político que científico: como fazer com que povos do mundo inteiro queiram trocar a civilização em que vivem hoje por uma mais sustentável?

Muitas pessoas veem a economia em conflito com a natureza, dizem cientistas da Universidade de Connecticut (EUA). Com taxa de desemprego em 4,5%, elas tendem a acreditar em aquecimento global. Quando a taxa sobe para 10%, elas tendem a tachar o aquecimento global de “farsa”

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Fotos: Gustavo Morita

como Marengo e para comprar e manter computadores de grande porte), organizam grandes encontros anuais de cientistas (um exemplo foi a Rio+20), procuram incentivar meios de vida mais sustentáveis. Ao mesmo tempo, evitam se comprometer com números. Os Estados Unidos e a China, os dois países que mais emitem gases de efeito estufa, não assinaram a primeira versão do protocolo de Kyoto (que outros países, inclusive o Brasil, assinaram em 1997; mais tarde, a China assinou o protocolo, os Estados Unidos continuam sem assiná-lo, e o Canadá, que havia assinado, o abandonou oficialmente). De 2010 a 2011, a China aumentou as emissões de CO2 em 9,3%, e no fundo isso não é apenas culpa dos chineses, pois eles vendem serviços e produtos para quase todos os países do mundo. O problema é que, para reduzir a emissão de gases de efeito estufa, um povo ou reduz o grau de atividade econômica ou inventa uma economia diferente da atual. No primeiro caso, é o mesmo que dizer: o povo tem de fazer voto de pobreza. Pesquisas científicas mostram que um povo tende a acreditar no aquecimento global quando a economia vai bem e há empregos, e tende a refutar o aquecimento global quando a taxa de desemprego bate os 10%. Sendo assim, em épocas de crise, os políticos detestam falar de aquecimento global, pois sabem que essa conversa vai lhes custar votos. Quanto a inventar uma economia diferente, não há referências, pois até hoje nenhum país inventou uma civilização semelhante à nossa que funcionasse sem emitir CO2 e sem fazer negócios com povos que emitem CO2. Este último ponto é importante. Não adianta um povo bater no peito e dizer “nós poluímos pouco”, se o tal peito está vestido com malhas fabricadas na China, e se o tal peito é levado ao cinema quando a cabeça quer ver filmes produzidos nos Estados Unidos. O aquecimento global só pode ser resolvido com ações globais. Marengo vê o problema todo com otimismo. Acha que só o fato de que o homem percebeu a existência desse fenômeno já é um feito intelectual extraordinário — e graças à matemática. “Se não fosse a matemática”, diz Marengo, “estaríamos condenados às trevas. Para entender um fenômeno dessa complexidade, não há como dispensar a matemática e a estatística.”


EsPEciAl

Geometria | Áreas | Volumes | Cinema

ADOSBIMONSTROS OLOGIA

DE FILME B 40


Artigo de: Michael C. LaBarbera

Funcionários de Hollywood estão sempre aumentando algum animal, como um gorila, ou reduzindo algum animal, como um homem, mas não levam em conta como área e volumes variam de modo desigual

Produtores de filmes de monstros sempre gostaram do assunto “tamanho”, especialmente aqueles de meu período favorito, os anos 1950. Quase sempre eles alteravam o cotidiano ao diminuir o tamanho das pessoas ou ao aumentar o tamanho de outros animais (gorilas, formigas, lagartas), e depois brincavam com as consequências. Contudo, do ponto de vista de um biólogo, o modo como Hollywood aborda esse tema tem sido ingênuo. Ninguém pode alterar somente o tamanho de um organismo, pois o tamanho sozinho modifica quase todas as características do organismo. Biólogos obtêm tantas ideias dos estudos sobre os efeitos do tamanho que até batizaram-nos com um nome próprio: alometria. Para estabelecer os fundamentos conceituais da alometria, os biólogos recorreram à geometria. Ao analisar as propriedades geométricas de qualquer objeto (uma esfera, um cubo, um ser humanoide), você logo achará relevante medir o comprimento, a área e o volume do tal objeto. Logo depois, notará que todas as áreas (a área das superfícies, a área das seções transversais) são proporcionais a alguma medida de comprimento elevada ao quadrado, e que todos os volumes são

proporcionais a alguma medida de comprimento elevada ao cubo. Da mesma forma, notará que os comprimentos ou são proporcionais à raiz quadrada de alguma área ou à raiz cúbica de algum volume. Quando você muda o tamanho de um objeto, mas mantém sua forma (isto é, mantém iguais todos os ângulos e todas as razões entre arestas correspondentes), acontece uma coisa muito curiosa. Suponha que você aumente os comprimentos por um fator de 2. Uma área é proporcional a um comprimento ao quadrado, mas o novo comprimento é duas vezes maior que o antigo, então a nova área é proporcional ao quadrado do dobro do comprimento antigo; em outras palavras, a nova área não será o dobro da área antiga, mas o quádruplo da área antiga ([2L]2 = 2L × 2L = 4L2). Da mesma forma, um volume é proporcional a um comprimento ao cubo, então o novo volume não será o dobro do antigo, mas sim proporcional ao cubo do dobro do comprimento antigo, isto é, será oito vezes maior que o volume antigo ([2L]3 = 2L × 2L × 2L = 8L3). Conforme você modifica um tamanho, os volumes mudam mais que as áreas, e as áreas mudam mais que os comprimentos. Biólogos descobriram por que tais fatos geométricos são importantes: certas características de um organismo, correlacionadas entre

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Michael C. LaBarbera é professor no departamento de organismos biológicos e de anatomia da Universidade de Chicago.

No cubo à esquerda, o comprimento da aresta L é igual a 1 e o volume do cubo é igual a 1 (L3). No cubo do meio, L é igual a 2 e o volume é igual a 8 (23). No cubo à direita, L é igual a 3 e o volume do cubo é igual a 27 (33). Quando a aresta de um cubo dobra, seu volume aumenta oito vezes; quando a aresta triplica, seu volume aumenta 27 vezes. Se a aresta L aumenta n vezes, o volume V aumenta por um fator de n3:

L ( V = L3 nL ( V = (nL) 3 = n3 $ L3


EsPEciAl

Area dos objetos

2

1

1

1

4

2 4

2 1

5

3

2 6

8

2

24

6

4

10

8

Em cada exemplo, as dimensões lineares dobram, mas a área de cada exemplo cresce quatro vezes. De modo geral, se uma aresta L aumenta n vezes, a área A do objeto aumenta por um fator de n2:

L ( A = L2 nL ( A = (nL) 2 = n2 $ L2

si, com frequência dependem de aspectos geométricos distintos. Por exemplo, forças físicas.  Um inseto Jesus precisa de pernas longas, e não de pernas grandes, para andar sobre a superfície de uma lagoa — o valor da tensão superficial da água é proporcional ao perímetro molhado (um comprimento).  Lagartixas precisam de pés largos e chatos, cobertos com milhões de cerdas minúsculas, para andar de cabeça para baixo no teto — o valor de uma força adesiva é proporcional à área de contato.  Um pássaro que trombe com o vidro da janela talvez quebre o bico, mas uma mosca será rebatida sem ferimentos — o valor das forças de ação e de reação é proporcional ao volume do animal (caso a densidade permaneça constante). O funcionamento de determinado órgão do corpo também depende de detalhes distintos de sua geometria. Músculos e ossos podem produzir força ou aguentar peso conforme a área de sua seção transversal (quanto mais largo o músculo, mais força produz; quanto mais largo o osso, mais peso aguenta); o peso de um animal, contudo, é proporcional a seu volume.

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Isso tudo vale para correlações fisiológicas. Um mamífero extrai oxigênio do ar com eficiência proporcional à área da superfície dos pulmões. Da mesma forma, ele absorve nutrientes da comida conforme a área dos intestinos, e perde calor (se resfria) conforme a área do corpo. Contudo, a eficiência com a qual deveria absorver oxigênio ou nutrientes e a taxa pela qual gera calor são proporcionais à massa do animal — isto é, ao volume. Se um animal de certo tamanho funciona bem, aumentá-lo ou diminuí-lo fará com que essas funções correlacionadas mudem a taxas distintas, visto que os aspectos geométricos subjacentes mudam a taxas distintas. Produtores de filmes de monstro têm explorado tais relações alométricas, quase sempre com erro, e conhecer as relações verdadeiras obrigará o leitor a ver o filme sob uma nova luz. Vamos começar pequeno e avançar conforme as coisas se agigantam.

No filme O Incrível Homem que Encolheu (1957), o herói se expõe sem querer a lixo tóxico radioativo, e passa a encolher cada vez mais. Ele perde a família e os amigos, e tem de se defender do gato da casa e de se virar num mundo de coisas monstruosamente grandes. Para comer, ele procura migalhas; para beber, gotas d’água. Numa cena famosa, o herói se defende de uma aranha com uma agulha de costura, que ele mal consegue levantar. Pare o projetor! É hora de um pouco de análise.


Quando o incrível homem que encolheu para de encolher, está com uma polegada de altura [2,54 centímetros], ou seja, suas dimensões lineares diminuíram por um fator de 70. Sendo assim, a área da superfície de seu corpo, pela qual ele perde calor, diminuiu por um fator de 70 × 70, ou diminuiu 4.900 vezes; porém a massa de seu corpo, que gera calor, diminuiu por um fator de 70 × 70 × 70, ou diminuiu 343.000 vezes. Ele terá muita dificuldade para manter a temperatura do corpo (embora suas roupas tenham encolhido também), a não ser que seu metabolismo aumente drasticamente. Por sorte, a área de seus pulmões diminuiu só 4.900 vezes, então ele consegue todo o oxigênio de que precisa para aumentar o metabolismo, mas terá de dar ao corpo mais combustível; como um musaranho, todo dia terá de comer o equivalente a seu próprio peso apenas para se manter vivo. Ele não poderá mais dormir: terá de comer 24 horas por dia, pois, caso contrário, corre o risco de morrer de fome antes de acordar pela manhã. (A não ser que seu corpo aprenda a realizar o truque dos beija-flores, cujo corpo baixa sozinho a temperatura durante o sono.) Visto que a área da superfície do corpo ficou relativamente maior (comparada com o volume), ele perderá água a velocidade proporcionalmente maior, então terá de beber muita água. No filme, o herói bebe água só uma vez: mergulha as mãos numa poça d’água e beberica das mãos fechadas em concha. A cena não chama a atenção, porque é comum, mas está errada para as dimensões do homem: com aquele tamanho, a tensão superficial da água fica comparável à força da gravidade. Ele teria de imergir sua mão na poça para retirá-la revestida de uma gota do tamanho de sua cabeça. Quando pusesse seus lábios na gota e fizesse menção de sugar e engolir, a tensão superficial obrigaria a gota a descer inteira pela garganta, quer ele planejasse isso ou não. Quanto à batalha com a aranha, é de fato desigual, mas não do jeito que os produtores fizeram parecer. É verdade que a aranha tem um temível par de presas ve-

À primeira vista, a aranha parece ter a vantagem. Mas o incrível homem que encolheu, com seu tamanho reduzido, deve ter ficado com o metabolismo superacelerado, o que o deixou mais rápido e mais forte — em termos relativos, 70 vezes mais forte do que era com o tamanho normal.

nenosas, e a vantagem de vestir seu esqueleto do lado de fora, como uma armadura. O herói, contudo, por conta da taxa de metabolismo acelerada, deveria pular pelo ambiente como um ratinho dopado com estimulantes. Ele levantaria a agulha sem esforço, e a manejaria como um espadachim, pois sua força relativa aumentou por um fator de 70: a força que um músculo produz é proporcional à área de seu corte transversal (comprimento ao quadrado), enquanto a massa do corpo é proporcional ao volume (comprimento ao cubo). Um animal pode gerar força, em relação a seu corpo, mais ou menos à razão de 1/comprimento; animais menores são proporcionalmente mais fortes. Essa verdade geométrica explica por que uma formiga levanta 50 vezes seu próprio peso, enquanto você mal pode carregar a sacola de compras escada acima. Quanto ao homem que encolheu, coitada da pobre aranha!

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Gentinha e Galileu Ao entender um pouco de alometria, você pode entender alguns dos problemas propostos num outro clássico sobre seres pequenos. Em Delírio de um Sábio (1940), um cientista maluco se muda para uma ilha deserta para aperfeiçoar sua arma secreta, um dispositivo que emite raios atômicos (cinco anos antes da bomba!) e encolhe qualquer coisa que atinja. A certa altura, intrusos perturbam a solidão do doutor, e ele os encolhe; o resto do filme mostra as lutas entre o doutor gigante e seus visitantes miniaturizados. Em boa parte do filme, os liliputianos se esforçam para escalar os móveis e para descer logo em seguida. Quanto a descer, não precisariam gastar tanto tempo e esforço para guardar pedaços de barbante, que usaram como cordas — poderiam pular. Quando um objeto cai, acelera até que a

Por conta do tamanho reduzido, as pessoinhas no filme Delírio de um Sábio poderiam pular das cadeiras e das mesas sem se preocupar com ferimentos. Conforme um objeto fica menor, a força da gravidade decresce mais rapidamente que o atrito com o ar, e por isso a velocidade terminal fica muito mais baixa.

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força de arrasto [gerada pelo atrito com o ar] se iguala à força da gravidade sobre a massa do corpo; a partir daí, a velocidade permanece constante. Essa velocidade é conhecida como “velocidade terminal”; para um homem adulto, é mais ou menos 193 quilômetros por hora, e é de fato terminal. Contudo, a força de arrasto gerada por um objeto é proporcional à área de seu corte transversal, enquanto a força da gravidade é proporcional à massa (e, portanto, se a densidade for a mesma, proporcional ao volume). Conforme um objeto encolhe, a força da gravidade diminui mais rapidamente que a força de arrasto, e assim a velocidade terminal diminui. Como diz a velha piada de humor negro: não é a queda que machuca, mas a parada repentina no final. Um objeto em queda acumula energia cinética (Ek = [1/2]mv2, em que Ek é energia cinética, m é massa e v é a velocidade); para que o objeto pare, tal energia tem de ser dissipada. É quando ser pequeno é bom. Objetos pequenos caem mais devagar e, por causa da massa vezes velocidade ao quadrado na fórmula da energia cinética, eles acumulam menos energia para dissipar no impacto, e isso significa menos estragos. (Aos que se lembram de Galileu jogando bolas da torre de Pisa, talvez este parágrafo pareça errado. Galileu usou bolas de ferro, nas quais a força de arrasto é baixa, e a queda não era longa o bastante para que as bolas atingissem a velocidade terminal.) Na verdade, animais muito pequenos não se machucam em nenhum tipo de queda, por mais longa que seja. Um macaco é muito grande, um esquilo está no limite da segurança, um camundongo está a salvo. Os intrusos no Delírio de um Sábio, se soubessem que são pequenos demais para se machucar, poderiam pular da mesa gritando “Gerôôônimooo!”


Rachel bombardeada por moléculas A síntese desses filmes sobre gente diminuta talvez seja Viagem Fantástica (1966). Um cientista famoso, vital para a defesa dos Estados Unidos, entra em coma por causa de um coágulo inoperável numa das veias do cérebro. Por sorte, uma agência secreta do governo acabou de criar uma máquina de miniaturizar objetos. A agência miniaturiza um submarino com cinco tripulantes, de modo que só podem ser vistos ao microscópio, e injeta o submarino na corrente sanguínea do cientista; a missão dos tripulantes é achar o coágulo e destruí-lo. Sem uma cópia de Grey’s Anatomy, eles passam por mais aventuras do que deveriam. Dependendo da cena do filme, a dimensão dos hemonautas varia de virótica a bacteriana, e daí surgem vários problemas. Primeiro, como eles veem? Os tripulantes passam um tempo a admirar a paisagem conforme percorrem as avenidas arteriais, mas, mesmo no tamanho de uma bactéria, seus globos oculares seriam muito menores que o comprimento de onda da luz visível. Até radiação ultravioleta teria comprimento de onda longo demais para ser útil. Talvez eles usem raios X, mas, se for assim, seu hospedeiro tem mais com que se preocupar do que um coágulo no cérebro. Numa das cenas, Rachel Welch flutua num vaso capilar, e controla o submarino remotamente usando um painel amarrado à cintura. Você talvez lembre que as moléculas se movimentam constantemente, empurradas com vigor por energia térmica. Trilhões de moléculas colidem com sua pele a cada segundo, e todas essas colisões tendem a uma média que chamamos, em dimensões macroscópicas, de pressão. Conforme o objeto diminui, esse bombardeio aleatório também tende a uma média ao longo do tempo, mas, num instante qualquer, as moléculas podem colidir mais de um lado que de outro, e empurrar o objeto para um lado. Esse zigue-zague, descrito pelo botânico escocês Robert Brown em 1827, é conhe-

Sujeito às forças dos movimentos brownianos, o grupo da Viagem Fantástica não teria como flutuar placidamente dentro da corrente sanguínea do cientista. Rachel Welch, bombardeada por moléculas, não poderia operar o painel preso à sua cintura.

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cido como “movimento browniano”; os grãos de pólen que Brown observava pelo microscópio dançavam aleatoriamente na água. Os hemonautas da Viagem Fantástica, dez vezes menores que um grão de pólen, viveriam os mesmos solavancos aleatórios e constantes, como se viajassem num trem sobre trilhos tortos. Rachel Welch teria sorte se conseguisse manter as mãos perto do painel de controle, e mais sorte ainda se de fato conseguisse acionar os controles.

Dividir as moléculas? Outros produtores brincaram com o tema “gente minúscula num mundo comum”, inclusive A Incrível Mulher que Encolheu (1981) e Querida, Encolhi as Crianças (1989). Nenhum deles, contudo, mostrou o que acontece com a massa de um objeto quando ele encolhe. Posso imaginar dois jeitos de encolher algo. Num deles, removo moléculas, e talvez reduza o volume à metade a cada remoção. Moléculas, contudo, são unidades inteiras, e cedo ou tarde eu precisaria remover meia molécula, o que não seria possível. (Em especial no caso de seres vivos: cada célula do corpo contém duas cópias do código genético, uma em cada fita do DNA, e o código só funciona com as duas fitas.) No outro jeito de encolher algo, eu poderia reduzir a distância entre o núcleo de cada átomo e a nuvem de elétrons à volta do núcleo, pois um átomo é quase todo feito de espaço vazio. Só um físico saberia dizer como isso modificaria as propriedades físicas e químicas de cada átomo ou molécula, mas, como resultado, eu obteria um objeto menor, com a mesma massa de antes. Ora, se o volume diminui, mas não a massa, então a densidade aumenta — assim como a força gravitacional e a temperatura. Nesses filmes, a redução nunca é grande demais, então ninguém precisa se preocupar com um buraco negro em miniatura, mas um objeto do tamanho de uma bactéria com a massa de um submarino, como na Viagem Fantástica, passaria pela mesa, pelo chão e pela crosta terrestre como uma faca quente passa pela manteiga.

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O outro lado desse espectro é quando o comum vira gigante. Esse é o filme de monstro típico, e é o que nos vem à mente quando pensamos em filmes do gênero. O padrão é King Kong. Kong Houve vários filmes de Kong, mas os melhores são o original de 1933, com Fay Wray, o filme de 1976, com Jeff Bridges e Jessica Lange, e um clone de 1949 intitulado Mighty Joe Young (cujos efeitos especiais, assinados por Ray Harryhausen, são ótimos). Ainda assim, todos os produtores subestimaram a fragilidade de animais grandes. Como John Haldane [1892-1964] escreveu uma vez num artigo científico: “Você pode jogar um camundongo no poço de uma mina, que ele vai cair os 900 metros, bater no chão, ficar zonzo e sair andando. Um rato vai morrer, um homem vai se quebrar em pedaços, e um cavalo vai espirrar para todos os lados.” Haldane estava sendo literal. Nossos antepassados conheciam esses fatos, e usavam esse aspecto da alometria de modo horrendo. Durante os cercos medievais, eles pegavam a carcaça de um cavalo, a deixavam apodrecer por uns dias ao sol, e depois a catapultavam para dentro dos muros da cidade sitiada. Com o impacto, a carcaça literalmente espirrava para todos os lados, e contagiava boa parte da cidade. Os animais realmente grandes já estão todos extintos, mas ainda podemos pensar sobre esse problema quando vemos elefantes e rinocerontes. Traga à memória a última vez que foi ao zoológico. Havia uma cerca em volta do terreno dos elefantes, mas pare e pense: a cerca não está lá para manter cada


Um macaco grande como Kong jamais seria tão rápido e ágil como foi retratado em todos os filmes. Se Kong fosse apenas cinco vezes maior que um gorila comum, a área da seção transversal de seus ossos aumentaria 25 vezes, mas a massa do corpo (que depende do volume) aumentaria 125 vezes, e poria cada osso sob extrema pressão.

Aspecto da seção transversal de um gengibre

elefante preso — tudo o que um deles tem de fazer é se encostar nela para derrubá-la. A cerca está lá para manter você do lado de fora. O que realmente mantém os elefantes no lugar deles é o fosso seco à volta do cativeiro; um tombo de dois metros de altura quebraria vários ossos das pernas, e os elefantes sabem disso muito bem. Uma das principais falhas em todos os filmes de Kong é que os macacos gigantes são muito ativos, pulando e rolando pelo solo como se fossem macaquinhos protegidos por seu tamanho diminuto. Da próxima vez, lembre-se dos elefantes, e veja tais palhaçadas com um pouco mais de ceticismo. Produtores de filmes de Kong deixaram de lidar com um segundo problema, mais sutil. A carga que um osso pode aguentar é proporcional à área do corte transversal. Dizendo isso de outra forma: um osso aguenta certa pressão máxima, ou certa força máxima por unidade de área [por exemplo, centímetros ao quadrado]; na verdade, isso vale para qualquer material. A carga que um osso deve suportar é proporcional à massa do animal. Se o animal aumenta de tamanho, mas mantém o formato, a carga sobre os ossos aumenta conforme o volume aumenta (comprimento ao cubo), mas a capacidade máxima de carga

dos ossos aumenta conforme a área do corte transversal dos ossos (comprimento ao quadrado) aumenta. No fim das contas, os ossos do animal quebram sob o peso do próprio corpo. Para contornar esse problema, a natureza altera a forma dos ossos conforme um animal aumenta de tamanho, de modo que a área da seção transversal dos ossos acompanha o aumento da massa (volume) do animal. Biólogos veem essa tendência em todo lugar — em comparação com animais menores, os animais maiores têm ossos proporcionalmente mais robustos e grossos. Basta comparar o esqueleto de um gato doméstico com o de um leão, ou o esqueleto de um veado com o de um alce. Essa tendência e uma boa explicação já apareceram em Duas Novas Ciências, que Galileu publicou em 1638.

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Meu colega Andrew Biewener, que hoje dá aulas na Universidade de Harvard, reviu essa questão e obteve resultados surpreendentes. No caso dos ossos de mamíferos, as mudanças de tamanho provocaram mudanças de formato, mas, no caso dos ossos, as mudanças de formato não foram suficientes para compensar o aumento de carga. Visto que todo osso tem mais ou menos a mesma tensão de ruptura, então a natureza tem testado os limites do esqueleto dos mamíferos maiores. Biewener mediu até que ponto os ossos de um animal se deformam quando ele anda ou corre, e viu que o fator de segurança (a razão entre a tensão de ruptura e a carga normal de trabalho) varia de três a cinco. Cada animal desses é resultado de um projeto muito arriscado — na maioria das obras humanas, o fator de segurança fica entre dez e várias centenas. Biewener mediu de camundongos a elefantes, e viu que o fator de segurança se mantém mais ou menos constante para todos os animais, embora o maior animal de sua lista seja 25.000 vezes maior que o menor. A natureza conseguiu isso ao ajustar o formato dos ossos, tal como sugeriu Galileu, e ao ajustar o comportamento de cada animal, especialmente sua postura, para garantir que a carga seja bem distribuída ao longo de ossos esticados, para assim reduzir a flexão dos ossos.

300 250

Pico de carga sobre os ossos (MPa)

Neste diagrama, Andrew Biewener mostra, na linha preta cheia, a força sobre os ossos de um esquilo caso ele crescesse até ter 20 quilogramas: seus ossos se quebrariam nos primeiros passos.

Biewener resumiu suas descobertas no gráfico abaixo. No eixo horizontal, ele marcou a massa do corpo, variando de um décimo de quilograma à esquerda a cerca de 5.000 quilogramas à direta. No eixo vertical, marcou a carga sobre os ossos, medido em força por unidade de área. [Uma unidade comum de pressão é o pascal, que é 1 newton por metro quadrado.] Note que a força dos ossos não varia de um mamífero para outro; em todos eles, o osso quebra quando a carga sobre ele ultrapassa os 200 megapascals (200 MPa) — Biewener pintou de azul essa área no gráfico. Suponha um animal do tamanho de um esquilo (com massa corporal de mais ou menos 0,1 quilograma). Biewener mediu a carga sobre os ossos durante a locomoção de rotina: cerca de 50 MPa. E se esse animal ficasse maior, seja por meio de evolução natural, seja porque comeu tomates radioativos? Se os ossos simplesmente crescessem sem nenhuma mudança no formato, a carga sobre os ossos seguiria a curva sólida à esquerda: ela aumentaria conforme aumentasse o volume do corpo (em metros cúbicos). Entre 10 quilogramas e 20 quilogramas, a curva sólida atingiria a região azulada. Como consequência, com uns 20 kg de massa, um roedor hipertrofiado não pode se mover — até mesmo a locomo-

Previsto pela geometria

200

Força dos ossos

150

Rato canguru (pulo)

100

Esquilo Rato

50

Cavalo (pulo)

Cachorro (pulo)

Búfalo Elefante

Cão da pradaria Cabra Esquilo da terra

0 0.1 Massa corporal (kg)

1.0

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10

100

1000


ção de rotina produziria carga suficiente para quebrar seus ossos. É evidente que existem mamíferos com mais de 20 quilogramas — você e eu, para citar só dois. De fato, quando os cientistas medem a carga de trabalho nos ossos, contam uma história muito diferente. As barras do gráfico mostram a carga comum sobre os ossos de diversos animais, de ratos a elefantes. Cientistas obtiveram as barras vermelhas por meios indiretos, ao medir a força que os animais aplicam no solo quando pisam; e obtiveram as barras amarelas ao instalar aparelhos de medição nos ossos mais longos. Como é evidente, a carga sobre os ossos não cresce em proporção com a massa do corpo. Ao contrário, ela parece ser independente do tamanho do corpo, variando em todos os mamíferos de um quarto a um terço da carga máxima de 200 MPa. Em certo sentido, o que vemos é um “princípio de engenharia” da natureza para esqueletos comuns: todos os mamíferos evoluíram para ter um fator de segurança entre três e cinco. Como mencionei antes, eles conseguem isso ao mudar a postura. Pequenos mamíferos correm com os membros dobrados; grandes mamíferos correm com os membros esticados. Se você alguma vez viu um filme em câmera lenta de um cavalo correndo, talvez tenha notado que a perna do cavalo está perfeitamente esticada quando toca o solo, e permanece esticada enquanto suporta o peso dele. Esse comportamento é ainda mais evidente em elefantes. De volta ao King Kong. Depois de al-

Em Duas Novas Ciências, Galileu Galilei demonstrou que, se o osso de um animal fica duas vezes mais comprido, a área da seção transversal teria de aumentar mais que o dobro para aguentar a massa do animal. Sendo assim, para que o animal pudesse se mover, seus ossos deveriam mudar de formato.

gumas medições feitas com fotogramas do filme de 1933, concluí que Kong tem uns 7 metros de altura no começo do filme, mas, quando escala o prédio Empire State, aumentou de tamanho mais ou menos 50%. Com 7 metros de altura, Kong está quatro vezes ou cinco vezes maior que um gorila comum, desses que vemos em zoológicos. Um aumento de cinco vezes na altura implica um aumento de 25 vezes na área da seção transversal dos ossos e um aumento de 125 vezes na massa corporal; a tensão sobre os ossos de Kong, portanto, deve ser cinco vezes maior que a tensão sobre os ossos de um gorila comum. Lembre-se, con-

Um princípio da natureza: mamíferos grandes, como este elefante, mantêm a perna de apoio bem reta, para que ela possa suportar sua massa (ou peso) sem sobrecarregar os ossos da perna.

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O incrível homem colossal não só violou todas as leis de tráfego terrestre e aéreo, como também violou o fator de segurança de seu esqueleto.

tudo, que um fator de segurança de cinco é extremo para mamíferos; o tamanho excessivo do corpo de Kong deveria exaurir o fator de segurança. É verdade que Kong se mantém um pouco mais vertical que um gorila comum, então talvez ele ganhe de volta um pouquinho de fator de segurança, mas é claro que ele está forçando a barra. Será por isso que tem o pavio tão curto e está sempre rugindo e quebrando coisas? Não só ele corre o risco de quebrar as pernas como, sem dúvida, seus pés doem. Os produtores de King Kong abusaram dos limites de sua resistência óssea, mas outros produtores abusaram muito mais. Em O Fan-

tástico Homem Colossal (1957), um homem de 30 metros de altura ameaça o povo de Las Vegas. Com base em seu tamanho, deveríamos presumir que seu primeiro passo seria o último, mas ele não só sobrevive à queda de cima da barragem Boulder como reaparece numa continuação, A Guerra do Bruto Colossal (1958). A protagonista de O Ataque da Mulher de 15 Metros (1958) tem apenas a metade do tamanho do fantástico homem colossal, mas ela também abusa do fator de segurança de seu esqueleto para além de limites razoáveis.

Por formação, sou zoólogo especializado em invertebrados, e em quase todos os meus trabalhos científicos me concentrei na biomecânica de invertebrados marinhos. Assim, constato com grande alegria que Hollywood não se esquece de nossos parentes viscosos. O meu favorito, pela qualidade dos efeitos especiais, é O Monstro do Mar Revolto (1955), em que um polvo gigante das profundezas do mar, depois de comer peixes contaminados num teste de bomba atômica, invade águas mais rasas em busca de almoço. Depois de petiscar um par de navios cargueiros, o monstro descobre São Francisco, e então adiciona à dieta alguns carros de polícia, uns vagões de trem e a torre do relógio no prédio Ferry. Na cena mais famosa (e visualmente impressionante), o polvo vai até a baía de São Francisco, enrosca seus tentáculos ao redor da ponte Golden Gate, e puxa a ponte para dentro do mar. Esse momento significa a ruína da criatura, embora os produtores parecem ter ignorado isso. Depois desse ponto, a criatura se

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Sem uma massa de água à sua volta, para compensar os efeitos da pressão dos líquidos dentro de seus tentáculos, o polvo gigante sofreria uma hemorragia fatal.

torna estranhamente passiva, especialmente à luz da violência anterior. O polvo agarra um submarino de guerra, mas apenas o segura, sem tentar esmagá-lo ou mordê-lo. Ele ignora um mergulhador que nada bem à frente de seus olhos, mesmo quando o mergulhador atira um arpão no seu cérebro (o que faria pouco efeito, mesmo que tivesse realmente penetrado sua caixa craniana cartilaginosa). Por fim, o monstro é destruído com explosivos e o filme acaba. O que aconteceu na Golden Gate para que a criatura mudasse tanto de comportamento? Eu acho que a resposta é bem simples. Sempre que você tem uma coluna vertical de água, há pressão no pé dessa coluna; a água produz uma atmosfera de pressão a cada 10 metros de coluna d’água vertical. Nosso polvo gigante, como qualquer outro animal macroscópico, tem um sistema circulatório que se estende por todo o seu corpo — em essência, são tubos cheios de água. Se o polvo estendesse seus tentáculos na vertical enquanto estivesse submerso, nada aconteceria; a pressão na base dos tubos dentro dos tentáculos aumentaria, mas ela combinaria com a pressão da água à volta do polvo (que também pode ser vista como uma coluna d’água). No entanto, antes de puxar a ponte para baixo, o monstro estende seus tentáculos até metade da altura das torres de suporte. A parte superior das torres está a 153 metros de altura acima da pista, que está a 67 metros

acima do nível da água. Com uma atmosfera a cada 10 metros e uma elevação de 143 metros, isso é pressão de mais ou menos 14 atmosferas (1,441 MPa ou 15 quilogramas-força por centímetro quadrado). Pela primeira vez na vida do polvo gigante, não havia água à sua volta para compensar o aumento da pressão interna, e a carga total dessa pressão distenderia suas artérias. As evidências sugerem um pobre cefalópode que sofreu uma hemorragia cerebral súbita e maciça em razão da pressão bem no momento em que ele rompe a ponte Golden Gate. A passividade posterior do polvo gigante então faz sentido — suas faculdades mentais sumiram e as únicas reações que teve foram em razão de reflexos condicionados: agarrou o submarino em razão de estímulos táteis e se retraiu quando foi atingido pelo arpão do mergulhador. Isso tira o caráter heroico dos homens nas cenas finais do filme, não é mesmo? Problemas semelhantes, mas menos graves, afligem as girafas, que precisam de pele muito esticada sobre as pernas (uma versão viva de meia-calça de pressão) para evitar edemas (fluido dos capilares empurrado contra os tecidos por causa da alta pressão). As coisas devem ter sido ainda piores para saurópodes de grande porte como o brontossauro ou o braquiossauro. De fato, alguns especialistas acham que eles seriam incapazes de levantar a cabeça duma vez sem desmaiar;

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é difícil acreditar que seu coração era forte o suficiente para bombear sangue depressa para tão alto. Os pobres dinossauros não poderiam ter evitado o problema que o polvo evitou boa parte do filme — mantendo [os dinossauros] o corpo submerso. Um saurópode submerso, apenas com a cabeça fora d’água, não teria nenhum problema com edemas nas pernas ou com baixa pressão na cabeça, mas, caso seus pulmões estivessem a mais de 3 metros de profundidade, duvido que o animal pudesse respirar; ele não teria força para inflar os pulmões. Tem havido poucos moluscos no papel principal de filmes de monstro, mas o que tem havido é suficiente para fazer um zoólogo especializado chorar de emoção, especialmente porque os moluscos são o segundo filo mais diversificado do planeta. (Artrópodes ficam em primeiro lugar; cordados, o grupo do qual todos os vertebrados fazem parte, ficam num distante terceiro lugar.) Em geral, os funcionários de Hollywood se concentram em artrópodes. Neste caso, pelo menos, há uma boa linhagem de diversidade representada com crustáceos gigantes (Ataque dos Caranguejos Gigantes, 1957), quelicerados (Tarântula, 1955; O Escorpião Negro, 1957; A Maldição da Aranha, 1958) e um monte de insetos, indo de moscas a louva-a-deus gigantes. Vamos nos concentrar num dos meus filmes favoritos sobre insetos gigantes.

Tóquio destruída pela lagarta Você não poderia começar melhor do que com Mothra, A Deusa Selvagem (1962). Um apresentador de shows sequestra duas mulheres de 15 centímetros de altura numa ilha do Pacífico, e planeja ficar rico ao exibi-las. Esse ato covarde faz com que, de um ovo gigante, saia uma lagarta gigante, que nada pelo Pacífico, devorando tudo o que vê pela

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frente, e crescendo cada vez mais. Depois de chegar ao Japão e de destruir boa parte de Tóquio, a lagarta escala uma torre de rádio, tece um casulo, e uns dias mais tarde emerge como uma mariposa com a envergadura de dois Boeings 747. O vento provocado pelas asas conclui a destruição de Tóquio: prédios são soprados ao chão, carros voam pelo ar. As autoridades admitem a derrota, e levam as duas mulheres minúsculas ao aeroporto, onde a mariposa gigante pousa; depois que as duas mulheres sobem a bordo, o monstro voa sobre o Pacífico, e nunca mais é visto. As lagartas são animais peculiares. Ao contrário de insetos adultos, que têm um esqueleto externo rígido, lagartas têm uma pele flexível e se mantêm em posição por meio de um esqueleto hidrostático — um volume de fluido incompressível, que transmite pelo corpo as forças e pressões geradas


por contração muscular. Em essência, elas são tubos d’água animados, com o fluido incompressível (que é seu sangue, e que enche todas as cavidades do corpo) rodeado por uma pele resistente a tensão. Como o polvo gigante de O Monstro do Mar Revolto,, o corpo da lagarta vai produzir tensões extremas conforme ela escala a torre de rádio. Além do mais, a tensão de tração num cilindro pressurizado (um modelo razoável para uma lagarta gigante) é diretamente proporcional ao raio do cilindro, e uma vez que a lagarta tem raio de 9 metros, a carga contra a pele será extrema. A pele de Mothra deve ser reforçada com algo cuja resistência à carga de tração seja melhor que a do aço. Ampliar um inseto para tal tamanho gera problemas interessantes, que não surgem na ampliação de grandes vertebrados. Considere o sistema respiratório. Os insetos têm um sistema respiratório muito eficiente, cujo projeto básico é muito diferente do nosso sistema. Em vez de inspirar, extrair o oxigênio nos pulmões e transportá-lo no sangue, como fazemos, os insetos têm uma malha de canais chamados de traqueia; a malha se estende pelo corpo todo, e cada canal se abre para a atmosfera numa das pontas. Insetos maiores podem ativamente ventilar as partes mais exteriores dessa malha de tubos, mas as partes interiores não são ventiladas; em vez disso, o oxigênio se propaga sozinho pelos canais. É um sistema extremamente eficiente: o transporte de gases da respiração sai de graça, visto que o aumento da demanda por oxigênio em qualquer local automaticamente aumenta a taxa local de abastecimento de oxigênio, aumentando o gradiente de concentração de oxigênio, e o sistema pode ser facilmente modificado para abastecer de oxigênio determinadas regiões do corpo. (Por exemplo, nos músculos usados no voo, onde a necessidade de oxigênio é extrema, a ponta das traqueias penetra a membrana das células, e entrega oxigênio direto para a mitocôndria no citoplasma da célula do músculo.)

Lagartas usam um esqueleto hidrostático flexível para suportar a própria massa e se locomover — elas são, em essência, tubos flexíveis cheios de líquido incompressível.

No entanto, porque o sistema funciona com base em difusão, ele tem limitações. A taxa de entrega de oxigênio é diretamente proporcional ao grau de concentração ao longo do canal, inversamente proporcional ao comprimento do canal, e diretamente proporcional à área da seção transversal do canal. Contudo, a demanda por oxigênio será proporcional à massa do animal — isto é, ao volume. À medida que um inseto aumenta de tamanho, a demanda por oxigênio vai crescer em proporção a comprimento elevado ao cubo, mas a taxa de fornecimento vai crescer em proporção a comprimento elevado ao quadrado. Você pode diminuir a demanda fazendo o inseto levar uma vida mais calma, mas essa não é uma opção se você pretende ver Mothra levantando voo — voar é algo que consome muita energia, seja em máquinas seja em animais.

Os saurópodes, como o brontossauro deste desenho, poderiam se alimentar das folhas no topo das árvores? Muitos cientistas acham que seu coração era pequeno demais para empurrar o sangue para tão alto. Talvez eles vivessem de cabeça baixa, ou talvez vivessem dentro de lagoas ou de lamaçais.

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O resultado disso tudo é que Mothra terá de adicionar muitas traqueias para manter um suprimento adequado de oxigênio. Claro: quanto mais seu volume é feito de canais traqueais, menos biomassa precisa de oxigênio, mas isso implica que, embora Mothra seja pesada (porque é grande), sua densidade será muito baixa — mais ou menos a mesma densidade de um chumaço de algodão. Essa compreensão sobre a fisiologia de Mothra elimina dois outros problemas. Usar o esqueleto no exterior dá várias vantagens (como veremos em breve), mas insetos grandes estão propensos a um tipo de falha conhecida como flambagem [encurvadura encurvadura a que estão sujeitas peças de uma estrutura, tais como colunas e pilares, que trabalham por compres]. Se Mothra fosse apenas uma mariposa são]. aumentada, suas pernas teriam entrado em colapso quando aterrissou no aeroporto. Em segundo lugar, a proporção das asas de Mothra em relação ao corpo é a mesma das mariposas comuns, que vivem trombando com as lâmpadas fora de casa. A capacidade de levantar voo é proporcional à área das asas — então, se a massa cresceu acompanhando o volume, Mothra teria de ir a pé para casa. Se Mothra pudesse decolar, produziria uma corrente descendente de ar significativa, mas não suficiente para derrubar prédios; a baixa densidade desse fluxo de ar, contudo, significa que ela estaria à mercê dos ventos. Espero que aquelas duas moças de 15 centímetros tenham chegado a salvo em casa. Uma mariposa gigante não poderia manter os mesmos tamanhos relativos de uma mariposa comum e ainda assim voar: o poder de levantar voo depende da área das asas (L2), mas a massa a levantar do chão depende do volume do corpo (L3). A mariposa gigante também precisaria de muito oxigênio, e então teria de ter um sistema respiratório mais denso, o que reduziria a densidade do corpo e deixaria a mariposa gigante à mercê dos ventos.

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Outro filme de insetos gigantes é digno de nota. O Mundo em Perigo (1954) abre com uma cena no Novo México, onde um trailer foi rasgado ao meio por algo desconhecido, e o único sobrevivente é uma menina de seis anos de idade, tão traumatizada que não consegue dar nenhuma pista do que aconteceu. Logo descobrimos que o trailer foi atacado por formigas, mas não do tipo das que costumam nos visitar num piquenique. São formigas de 3 metros e 70 centímetros de altura, tornadas gigantes pelos efeitos da radiação dos testes atômicos ocorridos em Alamogordo em 1947. Essas superformigas deveriam ter vários problemas, embora nem elas nem os humanos pareçam notá-los. Primeiro, vou começar com as fragilidades de um inseto do tamanho de um elefante pequeno. Os insetos gigantes parecem invulveráveis, em parte porque os artrópodes usam o esqueleto do lado de fora, como se fosse uma armadura, mas eu diria que na verdade os militares estão usando as armas erradas e mirando os alvos errados. Os insetos têm um sistema nervoso muito mais distribuído que os vertebrados, de modo que a cabeça é um péssimo alvo. Da mesma forma, o corpo. Por conta de seu sistema respiratório tão eficiente, as necessidades de circulação são muito menores nos insetos do que nos vertebrados; os insetos se viram com um sistema circulatório de baixa pressão. Um buraco no exoesqueleto, mesmo um buraco provocado por bala de calibre 30, vai sangrar pouco, e vai se fechar rapidamente, pois o sangue dos insetos tem ótimos mecanismos


O exoesqueleto de uma formiga gigante a protegeria de balas, até mesmo das balas de metralhadoras calibre 30. Mas a estrutura das pernas ficaria vulnerável a um mero tijolo. Uma dobrinha na parede da perna faria a perna inteira se dobrar, e aumentaria a carga sobre as pernas remanescentes.

de coagulação. O coração deles fica nas costas, de modo que também é um alvo chato de acertar. Então de que modo eles são vulneráveis? O segredo está no exoesqueleto. Tubos ocos são estruturas mecânicas muito eficientes, especialmente para resistir à flexão, que é a pior forma de sobrecarregar uma estrutura. (Duvida de mim? Tente quebrar um palito de dentes. É fácil. Agora pegue um palito de dentes intacto, segure com os dedos cada um dos lados, e puxe o palito ao longo do comprimento [afastando uma mão da outra enquanto segura as pontas do palito]. Quebrar um palito assim é difícil. Agora pegue outro palito de dentes, segure cada ponta com o polegar e o indicador de uma das mãos, e tente quebrar o palito empurrando uma dupla de dedos na direção da outra, mas mantendo o palito bem reto. Difícil também.) Você pode melhorar a resistência à flexão se distribuir o material longe do centro da coluna, e por isso tubos são muito eficientes, mas tubos de paredes finas têm uma fragilidade peculiar. Pegue um canudinho de refrigerante e empurre as extremidades uma contra a outra. No começo, o canudo vai se flexionar numa curva suave, mas de repente ele vai voar das duas mãos. Se você recuperar o canudo, verá que ele tem uma dobrinha no material, e se você tentar dobrá-lo de novo, verá

que ele perdeu a capacidade de resistir à carga de flexão. Essa falha tem nome (flambagem local) e é peculiar a estruturas com paredes finas. Agora, se as formigas são versões maiores de uma formiga comum, o comprimento, o diâmetro e a espessura do exoesqueleto das pernas vão aumentar pelo mesmo fator linear, mas sua massa, mais uma vez, vai aumentar por esse fator linear elevado ao cubo. Esses insetos gigantes estão claramente abusando da resistência à flambagem de suas pernas. Note que a flambagem local é sempre uma dobra para o interior do tubo, de modo que um ataque bem focado vindo do exterior tende a provocar uma flambagem local. Eis o truque para derrotar uma formiga gigante. Você não precisa de um rifle, mas de uma pilha de tijolos, de um braço bem forte e de boa pontaria. Um tijolo bem arremessado vai atingir uma perna, provocar uma flambagem local e aumentar a carga sobre as pernas restantes. Mais dois tijolos e todas as pernas de um lado estarão inúteis, e tudo o que a formiga poderá fazer é se arrastar em círculos. Mais três tijolos e ela estará imobilizada. Há outro problema mecânico que esses insetos gigantes devem enfrentar, e esse é mais interessante, porque tem implicações biomecânicas e financeiras. Todos os animais com esqueleto rígido enfrentam o problema de transmitir força entre os elementos do es-

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Nos artrópodes, articulações cilíndricas, como aquelas entre o “polegar” e a “mão” de uma lagosta, conectam os elementos do exoesqueleto, e suportam grande carga de trabalho.

queleto. Visto que os limites entre tais elementos são em geral os locais em que ocorre movimento (isto é, são as articulações), tais limites precisam aguentar as forças às quais os elementos do esqueleto estão submetidos e precisam fazer isso com baixa fricção. Em termos menos formais, uma articulação não pode sucumbir à carga, mas deve transmitir a carga aos outros elementos enquanto permanece livre para girar. Aqui os vertebrados têm uma vantagem real sobre os artrópodes. Porque nosso esqueleto é interno, as extremidades dos ossos podem se articular sobre superfícies maiores e mais arredondadas — pense na articulação entre o fêmur e o quadril. A área maior da superfície ajuda a manter baixo o estresse mecânico, e a articulação pode ser lubrificada porque está rodeada de tecidos vivos. Nos artrópodes, com o esqueleto no lado de fora, extremidades grandes e arredondadas estão fora de questão. O melhor que um artrópode poderia fazer seria manter um tubo de seu exoesqueleto pressionado contra outro tubo; imagine duas xícaras de chá, juntadas borda contra borda. Mesmo isso não funcionaria direito, pois qualquer movimento nessa articulação implicaria dois tubos em contato um com o outro por meio de um único ponto, o que geraria carga muito elevada nesse ponto, e seria mecanicamente instável. Em vez disso, artrópodes juntam um elemento de seu exoesqueleto ao outro (pelo menos nas pernas) por meio de articulações cilíndricas. Imagine, na extremidade de um elemento, um par de pequenas protuberâncias

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cilíndricas com ângulo de 180º entre elas; e, na extremidade do outro elemento, um par de depressões para encaixar no par de cilindros. Essas articulações têm área muito pequena, comparada com os outros elementos do exoesqueleto, então a carga que devem suportar é grande. Para maximizar a força e a dureza dessas articulações, os artrópodes modificam os elementos do exoesqueleto, misturando bem quitina e proteínas. Se você tem algum problema ao visualizar essas articulações, da próxima vez que for a um restaurante, peça uma lagosta. Você verá uma articulação assim entre o “polegar” e a “mão” da garra maior, e entre todos os elementos das pernas. Segundo a estimativa de um cientista, durante a locomoção do dia a dia, as juntas de um mamífero têm de aguentar forças 100 vezes maiores que o peso do animal. (Nos humanos, durante uma corrida, as forças sobre os joelhos podem chegar a 15 vezes o peso do corpo.) Artrópodes, embora tenham mais pernas que os mamíferos, submetem suas articulações a forças até 3.000 vezes maiores que o peso de seu corpo. Visto que as áreas de contato são menores nos artrópodes, o pico de carga deve ser muito maior. Então chegamos agora ao cerne da questão. Conforme você aumenta uma formiga, a massa do corpo aumenta mais depressa que a área das superfícies nas articulações; de fato, a carga nas articulações vai aumentar em proporção a algum comprimento elevado ao cubo. Esses insetos gigantes têm um problema, e só consigo imaginar uma solução. As juntas devem ser feitas de algum material duríssimo (para minimizar o desgaste), com boas propriedades mecânicas, e só existe um material assim — diamante. Você está zombando de mim? Um diamante é apenas carbono, e seres vivos têm muita experiência na manipulação de carbono. Então por que os personagens d’O Mundo em Perigo não notam nenhum diamante nas formigas gigantes? Porque eles as derrotam usando um lança-chamas para queimar o ninho. Como eu disse, diamante é uma forma de carbono, e como as outras formas mais comuns de carbono, queima muito bem. As evidências viraram fumaça.


Às vezes, produtores de filmes de monstro e de ficção científica dão sinais de precisão; entre os melhores exemplos, recomendo dois filmes clássicos de Steven Spielberg: Jurassic Park | Parque dos Dinossauros (1984) e E.T. | O Extraterrestre (1982). Embora diferentes no tema e no tom, os dois contêm ideias notáveis sobre biologia. Quando Jurassic Park foi lançado, fui ver o filme com um colega paleontólogo, minha mulher e a mulher dele. Enquanto o resto da plateia gritava e se encolhia, meu colega e eu sussurrávamos comentários um para o outro: “Legal! Os padrões clássicos de um predador grande!”, “Olhe aquilo! Eles imitaram a cinemática bípede muito bem!” As pessoas nas poltronas adjacentes ficaram descontentes conosco, mas as sequências com o Tyrannosaurus e com o Gallimimus são de tirar o fôlego. Se você quiser ver como provavelmente os dinossauros se moviam e se comportavam, veja esse filme; Spielberg contratou vários paleontólogos e biólogos como consultores, e os ouviu. Tenho duas pequenas reclamações sobre esse filme. Primeiro, o título, mas suponho que Spielberg foi obrigado a usar o título que Michael Crichton pôs no romance. Exceto pelo Brachiosaurus, todos os dinossauros no parque jurássico viveram no cretáceo — mas o que são 100 milhões de anos entre amigos? Minha segunda reclamação tem mais substância, e diz respeito à postura do Tyrannosaurus. Na maior parte do século 20, o homem representou o tiranossauro com o corpo na vertical, meio agachado sobre as pernas

traseiras — o tiranossauro do desenho animado Fantasia (1940) é um bom exemplo dessa visão “clássica”, que segue o exemplo da nossa própria postura bípede. Depois de considerar com maior cuidado a biomecânica dos grandes carnossauros (a posição do centro de gravidade, a presença generalizada de tendões calcificados na espinha dorsal, a cauda enorme), nos anos 1980 o homem chegou a uma visão radicalmente diferente da mecânica desses animais — uma em que o corpo e a cauda ficam na horizontal e se equilibram mais ou menos rigidamente sobre as patas traseiras. À primeira vista, essa reconstrução choca, um pouco como se fosse uma gangorra ambulante; mas um pouco de reflexão deve convencê-lo de que essa postura é mais estável que a nossa postura (nós que precariamente nos equilibramos sobre duas pernas traseiras), embora menos manobrável em esquinas (como o cientista David Carrier demonstrou). A eficiência dessa postura está na cara, tanto é que, no filme, quando vemos o T. rex em movimento, tudo nos parece bem natural. Como já mencionei, Andrew Biewener fez carreira de estudar a biomecânica dos vertebrados quando se locomovem, particularmente os efeitos provocados pela mudança do tamanho no método de locomoção e no comportamento. Entre suas principais con-

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Hoje, os cientistas acham que o tiranossauro andava paralelo ao chão, e mantinha a perna de apoio bem esticada — e não dobrada, como está neste desenho.


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clusões, está que, para evitar a fratura de seus próprios ossos, animais muito grandes devem manter a perna reta, com todos os ossos em linha, quando ela suporta o peso do animal. É aqui que Spielberg comete um erro. Veja a cena final no átrio do hotel, onde o Tyrannosaurus e os Velociraptors acertam contas. Você verá que o tiranossauro mantém os joelhos dobrados, e a porção superior da perna (a coxa) está sempre a 30 graus com a linha definida pela porção inferior da perna — é mais como a postura de uma ave grande. Depois de tudo o que vimos, nos parece mais provável que um animal daquele tamanho deve ter mantido a porção superior e inferior da perna em linha quando apoiava seu peso sobre ela; isso teria dado ao T. rex de Jurassic Park uns 60 centímetros a mais de altura, e, se você consegue visualizar a cena, teria deixado o bicho mais intimidante.

O alien que manipula emoções

Com sua cabeça grande para o corpo, olhos grandes para a cabeça, focinho pequeno para a cabeça e membros curtos para o corpo, ET imita a aparência básica de crianças e de filhotes, e nos faz suspirar: “Que bonitinho!”

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Em outro blockbuster, E.T., Spielberg apresenta um tipo diferente de sofisticação. (Tudo bem, E.T. não é um filme de monstro, mas continue lendo — o ponto é interessante.) A primeira vez que a plateia dá uma boa olhada no ET, pude ouvir um suspiro por todo o cinema: “Que bonitinho!” Nós realmente achamos o ET bonitinho, mas por quê? Há uns poucos anos, Stephen J. Gould [1941-2002; paleontólogo americano] escreveu um artigo para a revista Natural History sobre a evolução do Mickey Mouse. Gould observou que, conforme o tempo passava, Mickey ficava mais jovem. Todos os mamíferos passam por várias mudanças conforme crescem e amadurecem. Os membros crescem mais em comparação com o tronco, o corpo cresce mais em comparação com a cabeça, a cabeça cresce mais em comparação com os olhos, e a parte inferior da face (o “focinho”) cresce mais em comparação com o resto da face e a cabeça. Essas mudanças são comuns e ocorrem do mesmo jeito em todos os mamíferos. Mamíferos jovens, portanto, são imediatamente reconhecidos como tal: têm olhos grandes para o tamanho da cabeça, focinho pequeno, cabeça grande para o tamanho do


THE WALT DISNEY FAMILY MUSEUM

corpo e corpo grande para o tamanho dos membros. Essas características são particularmente evidentes nos filhotes da nossa própria espécie, e estamos pré-programados para reagir a eles com comportamentos de cuidado. É por isso que achamos cachorrinhos e gatinhos “tão bonitinhos” — seu corpo tem as proporções que fazem nosso cérebro disparar a mensagem “Olha só: um bebê!” E é por isso que também achamos os esquilos tão bonitinhos (eles que são basicamente ratos de árvores): mesmo os adultos têm olhos desproporcionalmente grandes para a cabeça, e focinho curto. Desde que Mickey Mouse apareceu pela primeira vez, em 1928, até seus dias de glória no Clube do Mickey, sua cabeça e seus olhos ficaram maiores e seu focinho proporcionalmente menor; ele rejuvenesceu, o que provavelmente melhorou os negócios. Esse é o segredo do ET para comover corações. Ele tem um rosto bem reto e com olhos grandes, a cabeça é grande para o corpo, e seus membros são ridiculamente pequenos para o corpo — as proporções de seu corpo são versões exageradas das proporções nas crianças. Como gatinhos e esquilos, ET apela para a pré-programação do nosso cérebro para obter proteção e cuidados, e é rara a pessoa que consegue resistir ao apelo. O segredo do charme de ET parece óbvio, mas de fato não é. Como contraponto ao filme E.T., considere o filme King Kong Vive (1986), uma continuação do filme de 1976. A história do filme é que King Kong sobrevive à queda do World Trade Center (impossível), ganha um coração artificial do tamanho de um Fusca e recupera a saúde e a imponência. Kong conhece uma versão feminina de si mesmo, capturada em algum lugar do Pacífico, eles se apaixonam, uma coisa leva à outra, e logo a dona Kong está grávida. A cena em que Kong júnior nasce é fascinante, mas não pelo que acontece na tela. Claramente os diretores esperavam que a plateia simpatizasse com o bebê Kong, mas me lembro perfeitamente que as pessoas à minha volta ficaram não encantadas, mas confusas. A explicação é simples. Na tela, o tamanho

Ao longo dos anos, a Disney fez o ratinho Mickey rejuvenescer: ele ficou com olhos maiores para o tamanho da cabeça, cabeça maior para o tamanho do corpo, focinho menor para o tamanho da cabeça e membros menores para o tamanho do corpo.

relativo do papai, da mamãe e do bebê estava correto, mas o cérebro pré-programado dos membros da plateia sabia, pelas proporções do corpo, que aquilo não era um recém-nascido, por mais que o roteiro assim o dissesse, e sim um homem com roupa de gorila. Não nos enganam assim tão fácil.

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DESAFIO

Geometria | Trigonometria | Teoria dos números

Dois triângulos exclusivos entre tantos Com umas contas bem simples, o leitor passará a olhar para dois triângulos com maior admiração — são únicos em todos os sentidos da palavra único O desafio [1] Existe um triângulo retângulo cujos lados sejam três números inteiros e consecutivos? [2] Existe um triângulo retângulo cujos lados sejam três números pares sucessivos? [3] Existe um triângulo retângulo cujos lados sejam três números ímpares sucessivos?

Resolução Como primeiro passo, a leitora (vamos chamá-la de Teodora) desenha um esboço, como parte do processo de entender o problema. Ela nota que três números inteiros e consecutivos terão o formato n, n + 1 e n + 2, sendo n um número inteiro positivo.

n n+1 n+2

n

n+1 n+2 2n 2n 2 (n + 1n) 2 (n + 2n) + 1 2 (n + 1) (2n + 1)n + 2 2 (n + 2) (2 [n + 12]n+ 1()2n + 1) (2 [n + 2](n++1()12)[n + 1] + 1)

Feito isso, Teodora recorre ao teorema de Pitágoras (o quadrado na hipotenusa é igual à soma do quadrado nos catetos) para transformar o problema numa equação.

(n + 2) 2 = n2 + (n + 1) 2 ` n 2 - 2n - 3 = 0 Com a fórmula da equação quadrática (ou fórmula de Bhaskara), Teodora acha as duas raízes: ou n = −1 ou n = 3. Como neste caso números negativos não fazem sentido, ela escolhe n = 3, e se encanta com a descoberta: de todos os infinitos triângulos retângulos, existe apenas um único deles cujos lados são três números inteiros e consecutivos, pois,

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Resolução (continuação) se existisse mais de um, a equação acima teria duas raízes inteiras positivas.

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9 E quanto ao triângulo retângulo cujos lados sejam três números n pares sucessivos? Teodora escreve num papel uma definição útil n n+ 1 sendo n um número (2n, inteiro positivo), e percebe de número par (2 +1 que está procurando de lados iguais a 22n, n + 2 um triângulonretângulo 2(n + 2). 2(nn + 1) e 2( + n 2 2n

A última linha das equações anteriores é verdadeira para qualquer valor de x. Ela não prova que todo triângulo retângulo com três lados pares é uma versão ampliada do triângulo 3-45, mas prova que o triângulo 3-4-5, multiplicado por qualquer número que seja (par, ímpar, racional, irracional), resultará num triângulo retângulo semelhante ao triângulo 3-4-5. (Euclides provou que todo n triângulo retângulo com três lados pares tem um dos lados divisível por 3, um dos lados divisível por 4 e um n n+1 dos lados divisível por 5, mas sua prova é longa demais para n+1 n+2 estas duas páginas.) + 2 sucessivos? n+ 1 com três númerosn ímpares ntriângulo E quanto ao 2 Teodora usa duas defi nições distintas de número 2 n + + 2 n (n 2 1) n + 1 ímpar ([2n + 1], com n inteiro, e [2n − 1], com n inteiro positivo) e vê aonde pode 2 n+ 2n(n + 2) n (+ 2 1) chegar com o teorema de Pitágoras.

(2(n + 1) n 2 2n(n + 2) (2(n + 1) (2(n[n++21)] + n1)+ 1 2 2 (2(n[n++21)] + 1) + + + (2n[n 12) ] n1)+ 2 2 (2n[n-+11) ] + 21n) (2n[n++12) ] + 1) +21) + 1 (2n[n-+11) ] + 1) (2 [n + 12] (n ) (2n[n-+12) ] -21()n + 2) (2 [n + 12] + 1) + ( 2 [ n 2 ] + (2 [n 1] (12)n + 1) n - 1) - 1) (2 [n + 2] -(12)[n + 1] (+2 [1n) + 1] - 1) 2 [1n) + 2] - 1) (2 [n + 2] (+ (2n - 1) (2 [n + 1] - 1) Desenvolvendo a álgebra do triângulo de cima, Teodora chega a: (2 [n + 2] - 1)

2n 2 (n + 1) n 2 (n + 2) n + 1 2 (n + 1) (2n + 1) n + 2 2 (n + 2) (2 [n + 1] +2n1) (2n + 1) (2 [n + 2] +2 1(n) + (12)[n + 1] + 1) De novo Teodora põe o teorema de Pitágoras em ação. (2n - 1) 2 (n + (22)[n + 2] + 1) 2 2 6(1n2)+ 1 @1h2)+ ^2nh2 ` n(^2 6[n + 12]@h-(= 21n)^+ 2 12 -(2 (42n[n-+82n]1[)n=+(021][n++1)1] - 1) (2 [n + 2] - 1)

(2 [ou n+ ]+ 1)significa que o triângulo As duas raízes são n = −1 n =23. Isso retângulo com três lados pares é o triângulo 6-8-10, (2n -sucessivos 1) e apenas ele. Depois de olhar bem as equações acima, contudo, + (2 [n 1] 1) Teodora percebe que a equação do triângulo com lados pares (2 [n + 2] - 1) é a mesma equação do triângulo com três números inteiros e consecutivos, mas multiplicada por 4. Será então que todo triângulo retângulo com lados pares é semelhante ao triângulo 6-8-10 (que por sua vez é semelhante ao triângulo 3-4-5)? Para estudar essa hipótese, Teodora verifica o que aconteceria se ampliasse o triângulo 3-4-5 por um fator x qualquer. (5x) 2 = (3x) 2 + (4x) 2 25x2 = 9x2 + 16x2 25x2 - 9x2 - 16x2 = 0 ` x2 (25 - 9 - 16) = 0

4n2 - 4n - 15 = 0 E, com a álgebra do triângulo de baixo, ela chega a:

4n2 - 12n - 7 = 0 Nenhuma das duas equações tem solução inteira. No caso do triângulo mais acima, as raízes são (−3/2) e (5/2); no caso do triângulo mais abaixo, elas são (7/2) e (−1/2). Isso significa algo bem simples: não existe nenhum triângulo retângulo cujos lados sejam três números ímpares sucessivos, pois, se existisse, uma das duas equações acima teria uma raiz inteira positiva. Na verdade, como Euclides também demonstrou, não existe nenhum triângulo retângulo com três lados ímpares, sucessivos ou não.

Resumo Existe um único triângulo retângulo cujos lados sejam três números inteiros e consecutivos (3-4-5), um único triângulo retângulo cujos lados sejam três números pares sucessivos (6-8-10) e nenhum triângulo retângulo cujos lados sejam três números ímpares sucessivos — aliás, não existe nenhum triângulo retângulo com três lados ímpares.

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ArtE-mÁtICA

Biologia | Robótica | Artes plásticas | Cultura portuguesa

TEMOS ALMA ESTOCÁSTICA?

O que aconteceria se uma máquina fosse programada com algoritmos usados para explicar seres vivos? Ela pareceria um autômato sem alma. E o que aconteceria se tais algoritmos fossem temperados com o acaso? Ela nos pareceria estranhamente humana 62


Reportagem: Renato Mendes

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m qualquer museu de arte moderna, o visitante não estranharia quando visse o quadro à esquerda numa das paredes. O quadro parece ter sido pintado por uma pessoa inteligente, pois as aglomerações de azul traem os desejos de alguém que decidiu pintar mais azul do que laranja, amarelo ou verde. O quadro parece ter sido pintado por alguém criativo, pois é feito de linhas retas, que em vários lugares dão a impressão de curvas. O quadro, enfim, parece ter sido pintado por um artista. Foi pintado em 2007, mas por um robô. Desde quando um quadro pintado por um robô é arte? Para que exista arte, deve existir também alma — e não é verdade que robôs são desalmados? Leonel Moura, um artista português responsável por vários modelos de robôs pintores e escultores, já respondeu a essa pergunta muitas vezes. Ele começa relembrando o teste de Turing, proposto por Alan Turing em 1950: um cientista coloca, na sala 1, um computador e a pessoa A. Numa outra sala, a sala 2, o cientista coloca a pessoa B. A pessoa B mandará bilhetes para a sala 1, e tais bilhetes serão respondidos, por escrito, ou pelo computador ou pela pessoa A; a escolha de quem responde será aleatória, por meio de sorteio. Se depois de vários bilhetes a pessoa B não souber dizer quem é a pessoa A e quem é o computador, então a pessoa B está diante de inteligência artificial. “No final dos anos 1990”, diz Leonel, “eu pensei: se é assim, por que não dizemos o mesmo da criatividade? Se uma máquina fizer uma coisa que, se fosse feita por uma pessoa, diríamos que essa pessoa é criativa, então a máquina é criativa. Podemos ir além: se uma máquina fizer uma coisa que, se fosse feita por uma pessoa, diríamos que é arte, então essa máquina é um artista.” Nenhum dos robôs de Leonel foi projetado para imitar o estilo de algum artista, ou para copiar obras de arte. Seus robôs tomam decisões por conta própria.

O robô RAP está exposto no Museu de História Natural de Nova York, entre fósseis de tiranossauros e besouros asiáticos

Emergência e estigmergia Leonel mantém seu ateliê num lugar chamado LX Factory, uma antiga fábrica de tecidos que hoje está lotada de ateliês, escritórios, restaurantes e livrarias. É um artista diurno: chega cedo ao ateliê e vai cedo para a cama. Gosta de ler sobre ciência; o

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ArtE-mÁtICA

Este quadro foi pintado por um uma versão de 2008 do RAP, ou robotic action painter

Leonel Moura, artista português, afirma ter um único vício: charutos cubanos

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livro mais recente, por exemplo, se chamava (em tradução) Filosofia & Simulação: A Emergência da Razão Sintética. Mas ele não programa os robôs. Toda a programação é feita por uma equipe de engenheiros do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e das Empresas (ISCTE); para conversar com os engenheiros e tomar decisões, Leonel estudou coisas como algoritmos computacionais e diagramas de Voronoi. Mas, principalmente, estudou duas ideias essenciais para quem analisa sistemas complexos, inclusive ecossistemas: a ideia de emergência e a de estigmergia. Imagine um caminhão basculante carregado de bolinhas de gude. O motorista levanta a caçamba e as bolinhas começam a escorrer para o chão. Por boa parte do tempo, as bolinhas se chocam umas contra as outras, mas escorrem de modo comportado. De repente, uma bolinha bate de um jeito especial em outra, que bate em outra, que bate em outra, e como resultado uma dessas bolinhas ou umas poucas delas voam longe, como se tivessem sido ejetadas ou como se pulassem por conta própria. “Esse de repente tem a ver com as propriedades emergentes desse sistema, e é isso a que chamamos de emergência.” O meteorologista lida o tempo todo com a emergência: ele sabe que a chance de tempestade para os próximos dias é alta, mas ele não pode prever com exatidão quando a tempestade vai emergir de um sistema bem comportado. “Os meus robôs funcionam assim”, diz Leonel. Cardumes de peixes funcionam assim também. Cada peixe está a olhar para seus vizinhos, e só isso. No entanto, para quem olha o cardume de longe, às vezes parece que o cardume tomou uma decisão (virar à direita ou à esquerda, virar para baixo ou para cima) como se fosse um organismo único, controlado de um ponto central. Um comportamento distinto, que reconhecemos como inteligente, emergiu de um sistema aleatório. O caso da estigmergia se parece com o da emergência; a palavra foi proposta por um cientista francês especializado em formigas. Cada formiga deixa uma mensagem química para as outras. Talvez essa mensagem seja lida um instante depois que foi deixada, talvez seja lida no dia seguinte. Na estigmergia, diz Leonel, vem um agente, deixa uma marca e vai embora; depois vem outro agente, decodifica a marca e reage a ela. Comparadas com os peixes num cardume,


as formigas tomam decisões de acordo com uma interação indireta e duradoura. “Meus robôs são sensíveis à cor. Eles reagem às cores que vão surgindo na tela, e talvez essa cor tenha sido pintada uma hora antes. Portanto eles interagem com o que foi feito muito antes, por ele próprio ou por outro robô, pois meus primeiros robôs também funcionavam em bandos.” Leonel juntou a ideia de emergência, misturou com a de estigmergia e juntou uma pitada de aleatório. Cada robô toma decisões, mas, às vezes, ao topar com uma linha ou uma cor, o robô sorteia o próximo passo. Talvez o sorteio lhe diga para pôr mais da mesma cor, ou para pôr outra cor por cima, ou para fazer um risco, ou para se mudar para outro canto da tela. “Embora isso seja uma roleta”, diz Leonel, “essa roleta faz com que a tendência para pintar seja maior em determinados momentos, e em outros momentos seja maior a tendência para não pintar.” Leonel não ficou famoso porque usou elementos de sistemas dinâmicos para programar seus robôs, mas porque soube reconhecer que esse comportamento aleatório também é humano. “Os seres vivos são assim. Nós somos assim. Temos uma tendência para fazer determinada coisa, mas não a fazemos, porque naquele momento não nos apetece. Há aqui uma inconstância — não somos digitais. Esses algoritmos simulam a vida.”

Ciência pela arte Leonel diz que está fazendo um novo tipo de arte, um tipo que incomoda até mesmo artistas. “Normalmente, um artista quer controlar o processo. Mas estou falando aqui de perder o controle, e mesmo assim produzir alguma coisa. Eu sei como meus robôs geram as coisas, como à partida eles começam, mas nunca sei no que aquilo tudo vai dar.” Quando se explica, às vezes Leonel diz que procura entender como a humanidade, por processos aleatórios (ele usa uma expressão mais técnica: processos estocásticos), topa sem querer com a verdade. Em geral, o homem associa essa busca estocástica pela verdade à arte, mas a ciência também tem um componente estocástico importante. Contudo, Leonel avisa: “Este meu trabalho tem ciência, mas não é ciência. Eu não quero fazer ciência, quero fazer arte.” Um dia, diz Leonel, vão olhar para trás e dizer que, a partir do ano 2 mil e tal, a humanidade passou a escolher se queria fazer arte sem robôs ou com robôs.

Um robô pode traçar um risco, pintar uma área, escrever uma letra ou até mesmo uma palavra. Neste caso, o robô escolheu mais letras, mas o processo de escolha é bastante aleatório

Imagine um conjunto de pontos num plano, sendo que alguns desses pontos são especiais. Talvez os pontos comuns sejam casas, e os pontos especiais sejam pizzarias. Talvez os pontos comuns sejam pés de laranja, e os pontos especiais sejam recipientes onde os agricultores depositam as laranjas recém-colhidas. Como marcar quais pontos estão mais próximos de um ponto especial que de todos os outros pontos especiais? Essa é a definição do que vemos num diagrama de Voronoi: dado um conjunto S de n pontos no plano, e dado um subconjunto de S feito de pontos p (os pontos especiais), o diagrama mostra qual é a região V(p1) dos pontos de S que estão mais próximos de p1 do que de qualquer outro ponto p em S. O diagrama foi inventado pelo matemático russo Georgi Feodosevich Voronoi (1868-1908). Na ilustração de exemplo, os vértices de cada polígono são os pontos que estão a igual distância de pelo menos três pontos especiais (marcados com um pontinho preto), e as arestas de cada polígono são o conjunto de pontos que estão a igual distância de dois pontos especiais. Na literatura mais técnica, esses pontos especiais são às vezes chamados de pontos geradores.

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MYSID (SVG), CYP (ORIGINAL), WIKIPEDIA

DIAGRAMAS DE VORONOI


Banana Frankenstein

— Sabe o que você obtém quando cruza um elefante com uma banana? — Sei: |elefante| × |banana| × sen(θ) sen (θ). (θ) sen(θ).

Adaptação

Um professor dá aulas de trigonometria para uma classe de fazendeiros: — Considerem a equação suíno de teta e cossuíno de teta igual a um!

Filosofias

— Qual é a diferença entre um matemático e um filósofo? — O matemático só precisa de papel, lápis e uma lata de lixo. O filósofo se vira sem a lata de lixo.

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