16 CIDADE
GAZETA DE PIRACICABA PIRACICABA, DOMINGO, 28 DE SETEMBRO DE 2014
Crime
Só restam cinzas Nos últimos dois meses, 189 incêndios foram registrados em Piracicaba, segundo Bombeiros Fotos: Christiano Diehl Neto
ELENI DESTRO Especial para a Gazeta
chuva chega aos poucos, mas os estragos da longa estiagem ainda vão deixar marcas por muito tempo. Entre elas está a destruição de matas, que devem demorar até 40 anos para se recuperar por causa de incêndios criminosos. Segundo o Corpo de Bombeiros, nos últimos dois meses foram registrados 189 incêndios em vegetação em Piracicaba, cerca de três por dia. No mesmo período de 2013 foram 87. Além dos danos ambientais, há também os danos financeiros, que são bancados pelos cidadãos. O comandante do 1º Subgrupamento de Bombeiros, que abrange Piracicaba, Limeira, São Pedro e Capivari, capitão Silmar da Silva Sendin, citou os maiores incêndios. Entre eles estão o que atingiu uma APP (Área de Preservação Permanente) no distrito de Tupi, em 20 de agosto, outro na Serra de São Pedro, em 27 de agosto, em Tanquinho, também em agosto, no Jardim Gilda, que durou três dias e o que atingiu a Reserva Jequitibá, em 12 de setembro, destruindo 20 hectares, na maioria de eucaliptos. Para combater o incêndio em Tupi, segundo o capitão, em uma área de 25 mil metros, foi preciso a ajuda do helicóptero Águia. Foram gastos 17.500 litros de água. Já no Jardim Gilda foram usados oito mil litros de água. “Para combater o fogo na Reserva Jequitibá foram deslocadas três viaturas com nove homens e gastos oito mil litros de água dos Bombeiros, além de carros-pipa de particulares, que nos ajudaram com 20 mil litros”, lembra o capitão Sendin. Só para se ter uma ideia do desperdício em plena crise hídrica, 22 mil litros de água abastecem uma família de quatro pessoas durante um mês. Fora os gastos financeiros, o capitão Sendin ainda fala dos riscos. “A nossa principal preocupação é que o fogo em vegetação atinja uma edificação”, afirma, dizendo que esse é um dos critérios levados em conta no atendimento das ocorrências. O capitão Sendin também lembra dos riscos que os homens do Corpo de Bombeiros correm, já no momento em que sobem na viatura e, principalmente, quando estão em uma mata em chamas à noite. “Os incêndios, quase todos, são provocados pelo homem para limpeza de terrenos e até por brincadeira. Quando identificamos o causador chamamos o Pelotão Ambiental”, conta o capitão.
“Animais menores, como répteis e anfíbios, também podem ter sofrido impacto”
A
DEMORA DE DÉCADAS Entre 30 e 40 anos é o tempo que leva para uma floresta de mata nativa, como é o caso da atingida em Tupi, retornar ao seu estágio maduro, após
Luccas Longo Biólogo sobre possíveis danos à fauna em consequência dos incêndios
O engenheiro agrônomo Ricardo Schmidt observa eucalipto queimado na Reserva Jequitibá: danos graves
SEM LAR
Fauna pode ter sido impactada Os danos na fauna são mais difíceis de serem dimensionados. A pedido da reportagem, o biólogo Luccas Longo fez uma lista sobre as possíveis espécies que habitam algumas das matas destruídas pelo fogo. “Aves, tatus, gambás, tamanduás, capivaras, porcos-do-mato e até onças podem utilizar esses ambientes como passagem e/ou para alimentação e reprodução”, conta Longo. “Animais menores, como répteis e anfíbios, também podem ter sofrido impacto”. Na primavera, que teve início na última segunda-feira, observa Longo, chega a fase de reprodução de muitas espécies de aves. “Elas estão namorando, montando ninhos e outras já alimentando os filhotes”, explica. Tempo para a recuperação completa de uma mata chega a 40 anos Antonio Trivelin
Águia auxilia no combate a fogo em Tupi: gastos
ser destruída por um incêndio. A informação é do engenheiro agrônomo Ricardo Sch-
Capitao Sendin
Grande área queimada no distrito de Tanquinho
midt, que informa que a recuperação pode ou não ter a interferência do homem. “É pos-
sível plantar mudas, que é a forma mais convencional, ou estimular o banco de semen-
tes”, observa Schmidt. “Se não houver a interferência do homem, se não sobrou algo, como uma mata ao lado, a probabilidade de recuperação é pequena. No caso do eucalipto, algumas espécies têm capacidade de recuperação”, afirma ele, que esteve na Reserva Jequitibá, após o incêndio do dia 12 de setembro, e na área queimada em Tupi. Além dos recursos econômicos que serão gastos, outro dano para a área queimada é que, com a retirada da vegetação, o solo exposto sofre erosões, principalmente com a chegada da chuva. “Isso promove uma degradação pósqueimada”, diz. “A nossa estrutura, tanto pública (Corpo de Bombeiros, Defesa Civil, etc.) como privada, é bastante frágil no combate a incêndios que venham a tomar grandes proporções”, preocupa-se Schmidt. CADEIA Segundo o advogado e mestre em Direito Ambiental e fundador da ONG (organização nãogovernamental) Instituto Aimara, Enéas Xavier de Oliveira Junior, a pena para quem causa incêndio em terrenos ou matas vai de três a seis anos de reclusão, além de ser aplicada multa. “A pena, inclusive, poderá aumentar em um terço quando o incêndio, por exemplo, atinge bens públicos, casas habitadas e obras de assistência social”, informa Oliveira Junior. Oliveira Júnior observa que quando ocorre, por exemplo, a supressão de vegetação ou de área de preservação permanente por meio da prática de incêndio, sem autorização dos órgãos competentes, o proprietário do imóvel é que tem a obrigação de recuperar o dano ambiental. “Mesmo que este não tenha responsabilidade sobre o evento da queimada, ou mesmo que tenha adquirido o imóvel posteriormente, a responsabilidade civil será sua”, afirma. Para recuperar estas áreas, o dono pode recorrer a programas do Poder Público de apoio técnico e de incentivo financeiro para o pequeno proprietário rural e da agricultura familiar, no que se refere à recuperação ambiental de áreas de preservação permanente e de reserva legal, ou mesmo de áreas degradadas. Oliveira Júnior lembra que a Prefeitura de Piracicaba fornece mudas gratuitamente no Viveiro Público.