A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL AINDA NÃO É AQUELA PROPOSTA PELA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), SENDO NOTÁVEL A DESIGUALDADE NO ATENDIMENTO ENTRE TURMAS, INCLUSIVE DENTRO DE UM MESMO MUNICÍPIO. A AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DAS CRECHES E PRÉ-ESCOLAS BRASILEIRAS É O TEMA DESTE ESTUDO, UMA PARCERIA DA FUNDAÇÃO MARIA CECILIA SOUTO VIDIGAL COM O LABORATÓRIO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM ECONOMIA SOCIAL (LEPES) DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, COM APOIO DA FUNDAÇÃO ITAÚ SOCIAL E DO MOVIMENTO BEM MAIOR. OS RESULTADOS AQUI APRESENTADOS PERMITEM RECOMENDAR ALGUNS CAMINHOS PARA AVANÇAR NA OFERTA DE UMA EDUCAÇÃO INFANTIL QUE CONTRIBUA POSITIVAMENTE COM O DESENVOLVIMENTO PLENO DAS CRIANÇAS DE 0 A 6 ANOS DE IDADE.
A avaliação da qualidade
Onde foi feita
Boa Vista
Porto Velho
Campo Grande
Turmas visitadas
Fortaleza Sobral Recife
Goiânia
Suzano
Como foi feita
Pesquisadores coletaram dados sobre***:
Insumos
Infraestrutura
Gestão escolar
Belo Horizonte Rio de Janeiro
Joinville
Porto Alegre
Qualificação dos profissionais
Condições de trabalho
3.467
Creche:
1.683
Pré-escola:
1.784
Processos
Observação das oportunidades de aprendizagens, interações, planejamento das atividades, organização da rotina, materiais, espaços e etc.
*** Pesquisadores treinados seguiram um roteiro de observação, um roteiro de entrevista com o professor da turma e um roteiro de entrevista com o diretor da unidade educacional
O instrumento para medir a qualidade
A Escala de Avaliação de Ambientes de Aprendizagens dedicados à Primeira Infância (EAPI) tem seis dimensões****
Prédio, móveis, espaços externos, materiais disponíveis para as crianças.
É a dimensão central. Avalia se há planejamento e como é feito, se há registro das aprendizagens e do desenvolvimento das crianças, como são organizados o tempo, os espaços e os materiais para as atividades. Também são avaliadas as oportunidades de aprendizagens, o acolhimento e gestão de conflitos, os momentos de cuidado com as crianças.
São analisadas as condições de trabalho, a formação e a motivação dos professores, como é o espaço coletivo, o projeto político pedagógico, o apoio à equipe, a gestão de recursos.
****foram analisadas nestes resultados apenas as dimensões de infraestrutura; equipe e gestão; currículo, interações e práticas pedagógicas.
Como se chega à pontuação
As respostas de cada item são pontuadas de 0 (pior cenário) a 3 (melhor cenário). Os itens são então agrupados em índices agregados para cada dimensão. Ao final, chega-se a um sinal de 5 cores
Os resultados
Distribuição das pontuações das turmas, nas três primeiras dimensões
Infraestrutura:
Equipe e gestão:
Esta dimensão apresenta os melhores resultados – algo esperado, pois por muito tempo a questão da educação infantil foi pautada apenas pelo debate das condições de oferta. Ela, por si só, não garante a qualidade do atendimento, mas o estudo identificou que a infraestrutura tem impacto positivo nas práticas pedagógicas.
Currículo, interações e práticas pedagógicas:
Mesmo no contexto da pandemia, a pontuação no conjunto de itens sobre “motivação e engajamento de professores e diretores” foi de 2,66, ótima, o que indica um caminho fértil para trabalhar com as equipes na melhora da implementação da BNCC.
Nesta dimensão estão os piores resultados: menos de um terço das turmas na faixa bom/ótimo e mais de 10% na faixa do inaceitável. Isso demonstra a necessidade de debater como os eixos estruturantes da BNCC (interações e brincadeira) estão sendo implementados.
Alguns destaques
1 DESIGUALDADE NO ATENDIMENTO Pontuações na dimensão “currículo, interações e práticas pedagógicas”
0,213 Mínima
2,923 Máxima
A disparidade de atendimento ocorre entre municípios e dentro do mesmo município.
2 LEITURA DE LIVROS (Ocorrência nas turmas)
55% 5% 13%
27%
Não ocorre
Ocorre sem estratégia qualificada
Ocorre com uma estratégia qualificada
Ocorre com duas ou mais estratégias qualificadas
(É considerado se o professor apresenta o livro para as crianças, buscando criar curiosidade, se envolve as crianças por meio de comentários e perguntas abertas e abre espaço para suas expressões, se retoma conhecimentos de outras histórias ou temas afins e conecta a história lida com experiências do cotidiano relevantes para as crianças.)
3 MOMENTOS DE BRINCADEIRA LIVRE
(Ocorrência nas turmas)
42%
Não ocorre
5 LAVAGEM DAS MÃOS
Em 29%
das turmas ela não foi observada, foi feita de forma inadequada ou com interações negativas
(De acordo com a BNCC, os cuidados devem ser revestidos de intencionalidade pedagógica, ou seja, usados como oportunidade de aprendizagem – ainda mais em meio a uma pandemia.)
6 PRÁTICAS DE ACOLHIMENTO
Os atendimentos às necessidades afetivas das crianças ocorrem no nível máximo de qualidade em 1/3 das turmas
(O professor é atencioso, demonstra empatia e incentiva a criança a expressar seus sentimentos por meio de perguntas abertas)
7 GESTÃO DE CONFLITOS
Em mais da metade das turmas, ela ocorre com qualidade no nível máximo
(O professor está atento, permite que as crianças negociem e/ou retoma combinados)
Variáveis relacionadas à qualidade
A análise dos resultados mostra que a qualidade na dimensão “currículo, interações e práticas pedagógicas” é influenciada positivamente por:
Menos crianças na turma
Professor que demonstra afinidade com a faixa etária
Professor que utiliza documentos curriculares oficiais no planejamento de atividades
Boa pontuação na dimensão infraestrutura
Diretor ser escolhido via concurso público
Serem realizadas reuniões com familiares
A gestão organizar momentos coletivos para reflexão e planejamento
Algumas recomendações:
Elaborar estratégias para que a infraestrutura proporcione a ampliação das aprendizagens das crianças
22% Ocorre de forma satisfatória
(Em menos de um quarto das turmas atinge-se o objetivo de que as crianças tenham aprendizagens ampliadas ao tomar decisões, explorando seus próprios interesses de forma independente. Em mais de um terço das turmas, quando estes momentos ocorrem, as crianças têm um direcionamento das suas escolhas e o professor não auxilia ou amplia as aprendizagens.)
4 USO DE MATERIAIS
As crianças não têm livre acesso aos materiais pedagógicos. Nos melhores cenários, são utilizados apenas por intermédio do professor. Nos piores cenários, não são utilizados ou estão ausentes.
8
INTERAÇÕES NEGATIVAS
Apesar de bons níveis de acolhimento e gestão de conflitos, ainda ocorrem ameaças, humilhações, gritos e até interações físicas negativas, o que fere o preconizado pela BNCC e viola direitos das crianças
Interações verbais negativas 10,8%
das turmas
Interações negativas relacionadas ao gênero 2,2%
Interações físicas negativas 2,9%
Interações negativas relacionadas a grupos étnicos ou segmentos sociais 0,5%
Estabelecer a gestão democrática em todos os âmbitos da rede de educação Planejar experiências diversificadas e lúdicas em que as crianças sejam protagonistas do aprendizado
Buscar que em toda atividade haja intencionalidade pedagógica
Investir em momentos como ampliação de movimentos, leitura de histórias e brincar livre
Mapear possíveis fontes de desigualdade de atendimento e usar boas práticas da própria rede para superá-la
Estabelecer uma cultura permanente de acompanhamento da qualidade da educação infantil