Jornal Frente e Verso - Setembro 2018 #002

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CIDADE: Neste sentido, nosso Pla-

F RE N T E V E R SO

PU BL ICAÇÃO POL ÍTICO- CU LTU RA L , GA S TRONÔMICA E L ITERÁ RIA DE A RMAÇÃO DOS BÚ ZIOS

no Diretor, aprovado em maio de 2006, traz em seu Art.

107, a obrigatorie-

S E TEM B RO 2 01 8

dade de sua revisão, no prazo máximo de

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10 anos. - PG 04

ENTRE: O impacto da ilegalidade fica

no corpo e na subjetividade. Silencioso. Um corpo cheio de culpa, de vergonha,

& de medo. - PG 08

RESGATANDO PEIXES VOADORES PRETO NO BRANCO: Fomos re-

cebidos numa luminosa tarde de domingo por Renata Dechamps, símbolo da cidade, na sua casa-museu-armazém. Também por uma arredia gata que habita o telhado da casa: “Há anos eu dou comida para essa gata, cuido, trato, mas nunca fiz um carinho nela. Ela nunca deixou. É uma gata selvagem”. - PG 06


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EDIÇÃO 002 – ANO 01 – SETEMBRO 2018

EDITORIAL

traços & troços MATTIAS

Chargista

AQUI NÃO TEM PUBLISHER Esta publicação brinca de abrir os olhos e se mexer no berço. Aqui estamos, após o grande esforço para nascer, cumprindo o desígnio de uma terceira edição, de forma independente, em compromisso com a periodicidade à qual nos desafiamos. O Frente e Verso agradece aos que têm se envolvido na produção das suas páginas e, principalmente, aos que tem prestigiado a iniciativa reservando uma hora valiosa do seu dia para ler o que trazemos aqui. O retorno tem vindo das mensagens recebidas, das conversas esparsas com as pessoas aqui ou ali, da confiança lustrada pelos parceiros que distribuem as nossas páginas em diversos pontos da cidade.

A carne de uma publicação tem a rigidez dos seus propósitos. No nosso caso, o de ampliar as possibilidades do debate público em Búzios com textos de opinião e permitir um momento de desconexão crítica do carrossel das chamadas hard news. O jornalismo diário - que procura entender o seu papel em épocas de mensagens azuis visualizadas nos aplicativos e “histórias” sobreposicionadas na grama instantânea da rede – traz a promessa “garantida” da informação e pretere a formação na sua missão. Nós preferimos a deliciosa confusão entre as duas. Hora uma, hora outra. Recentemente a Folha de S. Paulo (sem dúvidas o maior e melhor jornal impresso do país) anunciou a morte de seu publisher e diretor de redação Otavio Frias Filho. Fontes ouvidas pelo Frente e Verso dizem que, na redação do matutino, na Barão de Limeira, o clima de perplexidade e apreensão era geral quando o óbito foi atestado. O conjunto dos jornalistas e dos outros profissionais que produzem o maior e melhor jornal do país não sabiam o que fazer quando uma pes-

soa deixou de estar presente. Tanto que ele morreu durante a tarde e a notícia só foi publicada às 5 da manhã do dia seguinte. A Folha travou sem Otavinho. A Folha travou sem um representante vivo dos Frias a lhe ditar a bússola do que deveria fazer. Bem, o que nós, atualmente a única publicação impressa de Búzios lançado em 2018 podemos dizer sobre o episódio? Prometemos desde já: Não teremos nunca a figura do publisher nem um sobrenome de família assinando o cabeçalho, mesmo se diminuirmos muito ou crescermos muito de tamanho. As convicções de algo tão importante como o jornalismo e o livre debate de ideias não podem ter pai ou coronel. O Frente e Verso é, de fato, perseguidor do livre pensamento, da pluralidade (quando antifascista) de proposições e divergências, da honestidade intelectual em busca de algo que nos faça melhores enquanto humanidade. Nesta edição, botamos na roda temas como a evasão escolar, a ocupação urbana dos espaços na contemporaneidade, uma entrevista com a atriz Renata Dechamps, uma coluna necessária e provocadora sobre o aborto e a vida das mulheres, um relato da nossa participação na FLIP em Paraty. Ainda estamos nos mexendo no berço e provavelmente não sabemos sempre quando acertamos ou sujamos as fraldas. Mas o que oferecemos a você, nas próximas páginas é o fruto do nosso legítimo esforço, dos nossos erros e acertos. Leia e nos conte o que achou!

EXPEDIENTE FRENTE E VERSO É UMA PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS. JORNALISTA RESPONSÁVEL: Artênius Daniel - Contra Regras (DRT/MG 08816JP) COLUNISTAS: Alexandre Santini, Bento Ribeiro Dantas, Gessiane Nazario, Gustavo Guterman, Hamber Cannabico Carvalho, Leandro Araújo, Léa Gonçalves, Luisa Barbosa, Manolo Molinari, Pedro Campolina, Sandro Peixoto, Sheila Saidon, Tiago Alves Ferreira, Tonio Carvalho. CHARGE: Mattias. REVISÃO: Maria Cristina Pimentel

Guanabara

AS ENTIDADES DA ALTERNATIVA LEANDRO ARAÚJO

Publicitário

Fato verídico acontecido. Um amigo (que chamarei de Rui para ocultar a identidade) guiava o carro do serviço pela Via Alternativa quando o veículo morreu na curva entre Ferradura e Geribá. Era superaquecimento do motor, um problema recorrente naquela viatura velha. O jeito era abrir o capô e esperar o motor esfriar.

PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO: Vinicius Lourenço Costa - Vico Design

Enquanto aguardava, Rui reparou num despacho sob o gramado da esquina. Rui já foi do babado e hoje está mais pra aleluia que pra saravá, mas soube reconhecer um trabalho bem arrumado: taça dourada, garrafão de sidra, maçãs, cordões de bijuterias, velas…

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO: Contra Regras Produção e Comunicação ENDEREÇO: Feira Livre Periurbana de Búzios, Praça da Ferradura, Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000 FALE COM A FRENTE E VERSO: frenteverso@contraregras.com.br

Um pouco depois, duas mochileiras argentinas andavam pela rua de terra (em Búzios, andar a pé parece ser uma atividade exclusiva de turistas)

TIRAGEM: 3.000 – Distribuição gratuita

e também se depararam com o despacho. Ficaram encantadas: “Mirá, que linda copa”, apontando para a taça de plástico tingida de ouro. “Por qué ponen estas cosas en la calle?” “No entiendo”. Perguntaram a Rui se as coisas eram dele. Ele negou. “Y se puede llevar?” Sem entender muito bem, contraiu os ombros: “Cês que sabem. Querem levar? Leva aí. Alá vontê.” As jovens deram conta do despacho inteiro. Vestiram os colares, limparam as maçãs com o pano da saia, abriram a sidra e encheram a taça dourada. Só sobraram as velas. Enquanto iam embora, saudaram Rui, que sorriu e acenou de volta. Uma delas falou: “Gracias, señor!”, no que o gaiato respondeu: “De nada, suas pombagira!”


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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS

Educação

EVASÃO ESCOLAR NO COLÉGIO SOLAR LUISA BARBOSA

Professora doutora de filosofia e sociologia do C. M. Paulo Freire e do C. E. João de Oliveira Botas

Não há quem visite o colégio de frente para o mar, dono de uma história memorável, ligada às primeiras turmas de alfabetização da vila de pescadores, que não se apaixone. Em 1998, também eu me apaixonei e prometi, com 14 anos de idade, que ali iria lecionar. O primeiro concurso que fiz na vida foi para o Colégio Estadual João de Oliveira Botas. Não para as Baixadas Litorâneas, mas para a cidade de Armação dos Búzios. Dois anos se passaram do concurso em 2012 à convocação em 2014. Eu tinha acabado de terminar uma temporada do doutorado-sanduíche, na Europa, e montava uma nova casa no estado de Minas Gerais. A carreira docente não era atrativa. Parte da família e colegas da universidade questionava a minha opção de, terminando o doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), assumir uma profissão tão desprestigiada. Afinal, o salário do professor na carga horária a qual me encontrava era (e ainda é) quase a metade da bolsa que recebia pela Capes.[i] Mas não me arrependi – nem nos momentos mais difíceis da gestão escolar – das minhas decisões. O Botas vale realmente a pena não só por sua história de escola polo, primeira biblioteca da região, centro de encontro e mobilizações pela emancipação da cidade, mas pelos valores que persegue e difunde. O Botas não recusa aluno em situação de risco. Não seleciona os alunos com os melhores índices no ensino municipal. Não fecha turnos

nem nega vagas. Não deixa estudante sem almoço de qualidade e faz milagre com o valor ínfimo destinado à merenda escolar (menos de R$ 1 por aluno!). Possui ainda uma equipe de educadores altamente qualificada, com a maior parte de seus profissionais concursados. Mas no dia 15 de agosto – após uma reportagem televisiva – a população da cidade de Armação dos Búzios se alarmou com um fato que já vinha sendo denunciado pelo Movimento Defenda a Educação de Búzios, desde o início de 2018, quando a prefeitura anunciou o fechamento de turmas e turnos do ensino médio: Búzios possui uma das maiores taxas de abandono escolar do país e a evasão não poderia ser vista como solução para o equilíbrio de contas. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais, divulgada em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem a maior taxa de evasão no ensino médio entre os países do Mercosul. Segundo a pesquisa, 1 em cada 10 alunos, entre 15 e 17 anos, abandona os estudos nessa etapa. Em Búzios, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) de 2017, dos jovens cursando o ensino médio, 25,5% desistiram de estudar. Dados apresentados pelo Ministério Público em 2016, numa ação movida contra o município, indicam ainda que 61% dos alunos, em idade escolar para o ensino médio, estão fora da escola.

No quesito distorção idade-série, os números também chocam: 31,5% dos jovens no Brasil estão atrasados. Destes 40,3% são do estado do Rio. Búzios – e toda a Baixada Litorânea – também nesses índices, segura a lanterna: 53,1% para a cidade que é seguida por Araruama 48,6%, Macaé 46,7%, e Arraial do Cabo 46,2%. As consequências da não inclusão destes jovens, como sabemos, são nefastas, com prejuízo econômico, social e principalmente humano. Mas o que faz o jovem da cidade desistir de estudar? Não há uma única resposta para essa pergunta, mas algumas causas podem ser apontadas. Elenco três: 1 - O potencial turístico da cidade e a oferta de emprego temporário, especialmente durante o período de alta estação, somado à urgente necessidade financeira na qual muitos jovens se encontram; 2 - A inexistência de uma universidade pública com oferta ampla de vagas e de cursos variados e a falta de perspectiva do jovem para o período posterior a sua formação;

3 - A dificuldade quanto ao transporte, já que a concessionária responsável não atende a demanda municipal. O fechamento de turmas e turnos a construção de uma visão estigmatizada do colégio, que canaliza todos os problemas da educação estadual de nível médio, por ser o único da cidade, certamente, não é a saída para este problema que é da cidade, por isso, de todos nós.

i. O salário de um professor no início de carreira é de R$ 1.200,00. A bolsa da Capes R$ 2.200,00. ii. Em fevereiro de 2017 o Governo Federal reajustou para R$ 0,30 o valor da merenda por aluno. Cabe aos estados a complementação financeira. Mais informações no site https://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/2017-02-08/merenda.html iii. O Instituto Federal Fluminense Campus Cabo Frio ofertou no ano de 2017, de acordo com informações da Secretaria da Instituição colhidas em 16/08/18, apenas 45 vagas pelo SISU e 75 pelo pelo vestibular para os cursos de Química, Física, Biologia, Hotelaria, Gastronomia.

O projeto Cidade Biblioteca é uma iniciativa sem fins lucrativos de promoção da cultura, da leitura e do acesso ao conhecimento em Búzios. Nosso sonho é que os livros estejam sempre ao alcance das mãos, seja na procura do ócio, na espera do café, do transporte público ou do pôr-do-sol. Os livros transformam o intelecto e a sensibilidade, fazem do mundo um lugar melhor. O Cidade Biblioteca promove ações como saraus, clubes de leitura, distribuição de livros pelos espaços públicos, bibliotecas itinerantes.

DOE SEU TEMPO. DOE SEU LIVRO @cidadebiblioteca cidadebiblioteca@gmail.com

SÁBADOS

SÁBADOS

1a QUARTA-FEIRA DO MÊS - 05/09

Feira Livre Periurbana de Búzio

Feira Livre Periurbana de Búzio

Praça Santos Dumont

11h às 12h

8h às 13h

19h às 21h


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EDIÇÃO 002 – ANO 01 – SETEMBRO 2018

CRÔNICA BUZIANA SANDRO PEIXOTO

Empresário e jornalista

OS BOTÕES DA BLUSA Ganhei de um amigo uma linda camisa da Richards. Vermelha com listras brancas - ou ao contrário, como queiram. O fato é que gosto muito da camisa por ela ter botões de pressão, fáceis de fechar e muito mais de abrir. São botões bonitos, com face de madrepérola, coisa chic. Coisa da Richards. O problema é que uma noite dessas, depois de mais um dia estafante de trabalho, fui tirar a camisa e puf, lá se foi um botão. Bem o do meio da barriga. E assim fiquei sem ter como usar a camisa de que tanto gosto. Um dia, fui até um armarinho comprar fronhas e perguntei se naquela loja havia como repor botões de pressão. Informaram que sim, mas teria que levar a camisa até ao local para devida perícia. Foi o que fiz: voltei à loja com a camisa e a pessoa que me atendeu disse que botões iguais não teriam. A solução seria trocar tudo, mas que ela não retiraria os botões que restavam por receio de danificar a roupa. Recomendou-me procurar uma profissional. Como sempre penso rápido, lembrei na hora que existe uma costureira perto de minha casa. Parti direto para lá. Ao chegar à loja da costureira, tive a ligeira impressão que, desta vez, havia feito a coisa certa. Aquele sim

CIDADE

era o ambiente ideal para salvar minha camisa. Tudo no lugar lembrava costura. Máquinas profissionais, botões, retalhos, agulhas e linhas enfeitavam o lugar. No meio de tudo, uma simpática senhora, com cara de quem sabia o que fazia, segurava uma roupa. Desejei-lhe boa tarde, contei toda a história e perguntei se ela, que era uma profissional, não poderia retirar os botões que restavam a recolocar outros. Eu achava que sim, pois como ela trabalha com costura, certamente poderia fazer um serviço tão simples. Trocar botões. Minha mãe é costureira. Faz isso de olhos fechados. A simpática senhora pegou a peça, analisou bem os detalhes e sentenciou: não tenho como retirar os botões e nem como recolocar outros. Aconselho ao senhor procurar alguém que os retire e depois pode trazer de volta para mim que faço casas e coloco botões comuns. A situação começava a complicar. A primeira pessoa teve medo de tentar consertar a camisa. A outra queria modificar a peça para facilitar sua vida. Não aceitei nenhuma das opções e fui até a Búzios Papelaria do meu amigo Ronald. Lá, comprei um pequeno alicate e durante o horário de expediente, enquanto atendia de-

PEDRO CAMPOLINA Arquiteto

A CIDADE E SUAS REGRAS O debate sobre a cidade deve ser constante e suas regras de ocupação devem sempre ser revisadas para estarem em sintonia com as transformações urbanas do território, da economia, da sociedade, e com os avanços conceituais no campo da arquitetura, do urbanismo, do meio ambiente e da cultura.

As leis urbanísticas são definidoras dos padrões de ocupação, sendo peças fundamentais da política urbana municipal e devem funcionar como ferramentas de orientação do crescimento da cidade, não por acaso, devem estar fortemente conectadas aos demais instrumentos responsáveis pela construção socialmente engajada das cidades. Neste sentido, nosso Plano Diretor, aprovado em maio de 2006, traz

zenas de pessoas retirei os botões um a um, sem causar nenhum dano à camisa. Tenho testemunhas...

retirou os botões, pois se rasgasse a camisa, não teria problema, afinal, o risco é dele, a camisa é dele.

Não estou aqui querendo criticar as pessoas envolvidas no caso. Cada um faz o que lhe dá na cabeça. Cada um sabe seu limite. Vai até onde quer. Até onde acha que pode. O que desejo com essas linhas é trazer à tona uma simples discussão: por que algumas pessoas não dão um passo à frente? Não tentam fazer algo além do óbvio? Acomodam-se com apenas um simples “não, não fazemos isso”. Dependêssemos de gente assim, estaríamos até hoje morando numa caverna e sem dominar o fogo. Sem nenhum dos confortos atuais e, claro, sem uma camisa de puro algodão da Richards. Gente! É preciso ir um pouco além. Sair do comodismo e do lugar comum. Se arriscar com segurança. Não aceitar as coisas como elas são. Alguém pode até dizer: ele só

Ledo engano. Fiz o que fiz com total responsabilidade. Antes de agir, analisei bem a peça. Olhei como os botões estavam presos. Descobri suas fragilidades, os pontos de fixação. Não tive medo de arriscar nada, pois nada arrisquei. É isso que falta a muita gente que, ao se encontrar frente a um problema, simplesmente o imagina grande demais, se apequena diante das coisas, por mais inanimadas que sejam e desiste.

em seu Art. 107, a obrigatoriedade de sua revisão, no prazo máximo de 10 anos, justamente para andar em compasso com as mudanças da vida na cidade. Porém já se passaram 12 anos e isso não ocorreu.

boa infraestrutura urbana tendam a ser pouco ocupados, gerando pequenos latifúndios urbanos.

Para que importantes diretrizes do nosso P.D. sejam atingidas, como “adoção de política habitacional que atenda, com moradias dignas, a demanda da população local de baixa renda e permita sua integração na malha urbana da Cidade”, ou “evitar espaços adensados inadequadamente em relação à infraestrutura e aos equipamentos urbanos e comunitários”, precisamos rever aspectos desta lei, que caminham em outro sentido, fazendo com que locais com

Para quem deseja saber, a camisa está na minha casa ainda sem os botões e já decidi: vou levá-la até Cabo Frio, onde acredito, encontrarei pessoas sem medo de pregar botões em camisas. E espero do fundo do coração não ter que escrever Os Botões da Blusa Parte II. Torçam por mim.

Tomo como exemplo, a área no centro da cidade que beira a Av. José Bento Ribeiro Dantas, no entorno da Prefeitura, definida como ZC10 (zona comercial com taxa de ocupação de 10%), proporcionando uma densidade excessivamente baixa em um local com boa infraestrutura, contrariando o sentido das diretrizes citadas anteriormente e do pensamento urbanístico contemporâneo que preza por maior aproveitamento de áreas como essa. Esse é apenas um exemplo, entre outros, da necessidade de rediscussão da regulamentação da ocupação de nossa cidade.


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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS

EU FINANCIO O

AGUARDE LANÇAMENTO DO FINANCIAMENTO COLETIVO Este espaço será dedicado ao nome das pessoas que mensalmente contribuem para que o Frente e Verso possa ser publicado e distribuído gratuitamente. www.catarse.me/jornal_frente_e_verso

Teatro

Zarzuela “A ÚNICA COISA QUE PODE RESOLVER MEUS

TONIO CARVALHO

PROBLEMAS É DANÇAR E CANTAR. MÚSICA É A BASE

Autor, ator e diretor teatral

DA FELICIDADE.”James Brown

UM BEM NECESSÁRIO ...e fundamental. Desde que o mundo é mundo, os homens buscavam e buscam comunicar-se. Dos refúgios em cavernas, através de grunhidos ou profundos silêncios, os homens ritualizavam seus temores, suas conquistas, seus desejos, sofisticando as práticas expressivas através de manifestações pictóricas, sonoras, etc. Ao longo da história, em seus territórios de origem – geralmente longínquos uns dos outros, as formas de comunicação reverenciavam as forças da natureza atribuindo-lhes poderes divinos. Portanto, guardadas as diferenças geográficas, as culturas específicas de cada comunidade, tribo, aldeia, agrupamento nômade ou sedentário, deixaram marcas profundas e definitivas à posteridade. Zeus, Atena, Tupã, Odin, Obatalá, Loki, Iemanjá, entre tantos, foram e ainda são, de uma forma ou de outra, reverenciados através de rituais próprios em seus redutos culturais. Os rituais dionisíacos na Grécia Antiga deram origem ao Teatro Ocidental. Através de suas manifestações de louvação à colheita das uvas, ao vinho e ao êxtase orgiástico, ainda hoje em dia (guardadas as devidas proporções, pois os tempos são outros!), em alguns processos teatrais, as energias de louvação e acesso à comunicação com os deuses é bastante comum. Mesmo quando apenas algumas práticas são cogitadas para a integração do grupo envolvido no mesmo processo de criação teatral. Mas não apenas aqueles rituais de origem dionisíacos são resgata-

dos nos processos teatrais atuais. Podemos citar exemplarmente os rituais que reverenciam os orixás da religiosidade afro-brasileira. Dessa forma, podemos inferir que o Teatro – apesar de todas as outras formas de comunicação e expressão com as quais convivemos, é o único lugar no qual podemos nos reconhecer e nos comunicar de forma direta através dos sentidos, da visão, do toque, da palavra. É a única forma expressiva de contato direto. Portanto, mais do que necessário, fundamental. Para nos reconhecermos como seres humanos sensíveis e dotados da necessidade do outro que nos impulsiona ao respeito pelas diferenças, pelos muitos outros universos que são os outros, combatendo, desse modo, as intolerâncias, as prepotências, as discriminações, etc. Consequentemente, combatendo o racismo, intransigências religiosas, machismos, homo e xenofobias. Claro: desde que o que esteja no palco, na arena ou no picadeiro leve ao público temas bem elaborados e esteticamente bem apresentados. Evoé! Axé! Amém! Saravá!

A 1ª quinzena de agosto chegou cheia de novidades, encontros e despedidas e muita diversão. Começamos com a DJ Mahara que se mudou de mala e cuia para outro país. A nossa pequena notável sempre se destacou nos cenários buziano e carioca, já tocou ao lado de grandes nomes da música eletrônica: Jame Jones, Alok, Sharan Jay, Loulou Players, Dash Dot, Mau Mau, Anderson Noise, Popof e Do Santos. Despediu-se em grande estilo na festa “La Resistencia Búzios” com grandes amigos DJs, incluindo Luis Rojas, meu parceiro das noites de vinil na Feira Periurbana. O destino de Mahara é o Chile e ela nos brinda com sua mais nova produção, disponível em todas as plataformas digitais: TRACK AVENIR - Mahara, KALÉN e Manuel Sanchez (original mix) gravadora Undergroove022 2018. Outro destaque ficou por conta do quarteto “Forró do Camurin” que incendiou os “arraiá” da cidade: Feira Periurbana, na Ferradura, Lagoa dos Ossos e Festival da Sardinha. A curiosidade fica por conta do som

LÉA GONÇALVES

Radialista, DJ e programadora musical

envolvente e contagiante de uma banda formada, basicamente, por estrangeiros: Agustina Britos, voz; Juan Manuel Bilat, sanfona; Nicola Cake, violão, e Robson Nascimento, na zabumba. A Escola de Música Tom Jobim, através de seus alunos, professores e ex-alunos também se apresentou no 3º Festival da Sardinha, e os destaques, vão para “Hey Jude” (Lennon e McCarteney) The Beatles, e a trilha sonora do filme Missão Impossível, de Lalo Schifrin. No dia 2 de setembro, a DJ Help comanda, na Praça da Ferradura, a 5ª parada diversidade, Freedom Búzios. Na próxima edição, vamos falar do trabalho do músico Rodrigo Codesso, de seu disco “13 lunas”, com participação de gênios da música brasileira e lançamento previsto para o final do ano. Pra quem não quer esperar, uma das faixas “Andar andei” já está disponível: https:// youtu.be/hMsspu21ais No dia 16/08, o mundo perdeu a rainha da soul music, Aretha Franklin, aos 76 anos. Ela nos deixou, mas sua voz sempre estará entre nós, em canções que marcaram sua trajetória e várias gerações: — I Never Loved a Man (The Way I loved You) , Respect, Think, I say a little prayer, Chains of fool e tantas outras. Até a próxima. Mande-nos uma mensagem, participe conosco: A coluna Zarzuela gostaria de saber quais são as dez músicas de todos os tempos? lea.leadj@gmail.com http://facebook.com/lea.leadj


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EDIÇÃO 002 – ANO 01 – SETEMBRO 2018

Preto no branco

O

Frente & Verso foi recebido numa luminosa tarde de domingo por Renata Dechamps, símbolo da ci-

dade, na sua casa-museu-armazém. Também por uma arredia gata que habita o telhado da casa: “Há anos eu dou comida para essa gata, cuido, trato, mas nunca fiz um carinho nela. Ela nunca deixou. É uma gata selvagem”. Renata é assim: não alimenta, cuida e acarinha pensando em receber algo em troca. Dá porque assim se sente bem. E assim também é a sua relação genuína com a cidade.

O que a trouxe para Búzios e por que escolheu esta cidade para viver? Eu realmente me apaixonei. Cheguei aqui em 30 de abril de 1964. Vim com o pai da Alexia, minha filha, para casa de Ramon Avellaneda, onde estava a maravilhosa Brigitte Bardot. Eu não cheguei a conhecê-la. Ela foi embora às 17h da tarde e eu cheguei às 20h da noite. A viagem era longa, na estrada de terra. E eu fui me apaixonando pela beleza, pela natureza e pela luz de Búzios. Eu me apaixonei pela luz dessa cidade. Desde então, estou aqui. Eu passei muito tempo no Rio, por conta da escola da Alexia. Mas sempre voltava. Aqui tinha pessoas lindas, livres. Homens que andavam de saia, artistas que trabalhavam com madeira... fazia-se muita arte, muita coisa bonita. E fazia-se também porque se tinha tempo. Tempo, cachaça, alegria e fumo (ri). Na década de 1970, Búzios viveu uma onda de grande liberdade no quesito comportamental, mesmo com o país vivendo uma ditadura civil-militar. De lá para cá, o que

mudou? Búzios é mais conservadora do que foi no passado? Vou te contar uma história pessoal. Eu atualmente reclamo muito do som alto em Búzios, mas no passado ganhei uma vitrola, o que era uma raridade, e com essa vitrola dá-lhe Chico Buarque, Donna Summer, Miles Davis... muita música! E alta! No dia seguinte, eu encontrei o vizinho da frente, Seu Luiz, que morava com a família, só pessoas boas, da terra, e perguntei: “Bom dia. Tudo bem, Seu Luiz?” E ele disse “Não. Porque você colocou um som muito alto”. Eu morri de vergonha e depois disso eu nunca mais coloquei som alto. A liberdade permitia que eu fizesse isso e não tivesse atenção para com o morador. Mas depois disso, nunca mais coloquei som alto, até hoje. Digo isso, respondendo a sua pergunta, para dizer que havia liberdade, mas havia respeito. Hoje, as pessoas que vêm para cá, não pensam mais no mar e no céu

azul, em viver tranquilas, em liberdade. As pessoas vinham e faziam topless.... nos anos 1970, em Búzios, isso era frequente. Hoje não tem mais, porque as pessoas pensam somente no vil metal. Antes, era tão difícil chegar aqui e você quando chegava pensava: é o lugar mais lindo do mundo! Hoje, não mais. Eu sou grata a Búzios. A Alexia também é apaixonada. Mas ela questiona muito as pessoas que vêm só usufruir. Não pode vir e só usufruir. Ou pode? A sua casa, na Rua das Pedras, é de certa forma um pedacinho da memória da cidade: o antigo armazém do Seu Antônio Alípio. Como vê a questão da recaracterização das casas e do espaço público e a preservação do patrimônio original da cidade? Eu vejo tanta coisa feia, descaracterizada, sem estudo, sem profissionalismo. Me choca muito as coisas feitas de qualquer maneira. A cal rosa e a cal azul claro eram privilégio de

antigamente, nem peço por isso. Mas pelo menos uma cal branca... Ah! Tem que ter. Não tinha ar-condicionado antigamente, mas tinha vento, tinha a beleza natural. Eu tenho a sorte de não ser dominada pelo vil metal. Aqui, eu convivo com os cupins. Aqui não é uma casa que a gente liga o ar-condicionado e pá. Aqui a gente luta muito contra os cupins. Mas eu, ainda assim, prefiro as árvores. Se eu fosse dominada pelo vil metal, aqui seria um shopping. Por outro lado, entendo muito bem que as pessoas querem mais conforto, uma piscina... mas é preciso ter o meio termo. Respeitar. A cidade poderia ter uma parte antiga e outra parte moderna, mas não de qualquer maneira. Nada moderno de qualquer maneira fica bonito. Não é uma questão de pobreza ou riqueza, porque tem casas tão pobres no caminho e de uma beleza tão grandiosa, uma casa pequena, um pé de mangueira... é preciso ter respeito por esse lugar. Muita gente


PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS

Manolo Molinari entrevistando Renata Dechamps em sua casa na Rua da Pedras

7 viu o Mick, que ia pagar a conta. O restaurante não era um padrão de higiene, mas a comida era deliciosa. Tinha também um lugar abandonado que havia sido um ambulatório e era habitado por uns três bêbados que batucavam muito. E nós fomos até lá. Eles batucaram, e ele cantou, cantou. E eles batucaram. Foi uma farra. Claro que nós não voltamos ao Rio de carro. Fomos de avião, tranquilos, bebendo cerveja. E ele atrasou um ou dois dias a partida. Foi para Nova York e eu fiquei numa tristeza...

critico é para ajudar. Nós precisamos ter carinho com a nossa choupana, o nosso caramanchão....

vinha aqui para fazer coisas boas, arte, o cinema do Mário... esse tempo passado tem coisas muito lindas. A cidade em que vivemos é uma joia rara que Deus deu. É uma falta de cultura, uma falta de respeito maltratar a cidade. A areia dessa praia (se refere à Praia do Canto) era dourada, por que não é mais? Tínhamos conchas, o argonauta, com vários tamanhos. Eram lindos. Nós, hoje, não temos mais nada na praia e nem pra ver num possível “Museu do Mar”. Alguma coisa aconteceu. O lugar precisa ter uma água limpa, árvores, sombra, um parque onde as pessoas possam se exercitar.... O Pedrinho Sayão, uma vez veio aqui em casa, furioso dizendo que ia vender a casa. E eu perguntei por que. Ele disse indignado: “O esgoto! Você não viu?”. Ele não perdoou e o perdemos. Ele hospedava o Richard Gere, Elsa Martinelli... Agora a casa está lá caindo. Ele não vem mais. E é uma pena porque pessoas maravilhosas passavam pela casa dele, uma casa sofisticada sem deixar de ser original. Ele não vem mais por conta do esgoto. Eu me preocupo em não fazer críticas, eu mesma tantas coisas errei, tantas coisas não sei, mas quando eu

Como foi a história da compra desta casa? Eu comprei esta casa em 20 minutos. Antes de comprar aqui, eu ia ver um terreno em Geribá. Já não pensava em ir embora. Eu tinha visto uma árvore muito bonita neste terreno e queria comprá-lo. Mas, antes, eu fui ao armazém do Sr. Alípio comprar velas porque tinha muito pouca luz, naquela época, e eu olhei o armazém e disse: “Que lindo!” Fiquei abestada. Tinham uns tonéis com querosene para as lamparinas, peixe, mortadela pendurada, tudo simples, mas lindo! Ele já queria vender porque estava muito velhinho, o filho era alcoólatra... ele vendia panos enrolados a peso e perguntou: “A Senhora quer ver a casa?”. Neste quintal tinha só um coqueiro e o mar. Um marzão. O que foi ver isso meu Deus?! O céu e o mar. E ele disse: “Estou vendendo”. Eu perguntei: “Quanto?”. Não foi muito barato, eu tenho impressão que foi cerca de 20 mil dólares, e era um preço para a época. Eu disse que ia almoçar e pensar. Eu conversei com a Nelise, uma mulher muito inteligente, casada com o pescador Luiz Coto e ela disse: “Se eu fosse a Senhora, não pensava duas vezes. Geribá é escuro, tem ondas grandes. A senhora tem uma filha só, o mar pode levar sua filha...”. Pronto! Decidi! Comprei! (ri) Um dos episódios mais interessantes da história da cidade e pouco conhecido a envolve diretamente: a vinda de Mick Jagger. Conte-nos essa história. Essa história quase não aconteceu. Já conhecia o Mick Jagger e o tinha visto em duas ou três ocasiões. Achava-o um cara sério, antipático, com aquele terno branco impecável. Ele estava hospedado na casa da Florinda Bulcão (a atriz Florinda Bolkan) lá na Joatinga, no Rio, e ela me ligava e perguntava se eu não podia levar o Mick Jagger na praia de Búzios... Eu me esquivava. Mas na verdade, nunca recusava um pedido de Florinda. Disse: “Vou pensar”. Aí eu pensei: ficar com esse cara no carro, horas no carro, ia dar um trabalho.... eu tentei de tudo pra cair fora. Mas aconteceu um acidente, um problema, a Florinda teve que viajar e acabei sendo meio que obrigada a trazer o Mick. O Cat Stevens vinha, mas ele era simples. A coisa era simples, a casa era

simples. O Mick, eu não conhecia e já o achava antipático. Mas não teve jeito. Ele então foi à minha casa no Leblon com uma enorme limusine, com uma filhinha chamada Jade, a babá, e o motorista do Copacabana (Palace). Só que a viagem a Búzios não demorou duas, três horas. Por causa da limusine demorou mais de sete horas. Mas o Mick... Ele não era aquele antipático que eu pensava. A gente passou a viagem curtindo, cantando, tomando cachaça e outras cositas mais... (ri). Chegou no fim da viagem e ele já estava ansioso e pediu para dirigir. O motorista ficou louco. Mas chegamos. Era março e já tinha gente aqui que sabia da vinda dele, nos esperando na porta. E o povo pedia para ele cantar diversas músicas... e ele disse: “Renata, eu não lembro mais a letra dessas músicas”. Eu respondia: “Nem eu!”. Mas as pessoas sabiam e cantavam. E ele cantava. Passamos a noite toda cantando com os jovens deitados no chão, na minha cama, na sala.... No dia seguinte, ele pulou corda, comeu arroz com feijão, e o tempo não estava bom. Teve uma pessoa que quase desmaiou quando ele abriu a porta da minha casa e disse: “Good morning!”. Veio alguém dos Ossos e o filmou pulando corda. E ele cantava, cantava... era generosíssimo, alegre. Encantou-se pelos jovens todos, viraram amigos e foram a um restaurante na praça. Os donos quando viram aqueles jovens chegando, falaram que o restaurante estava fechado. O dono, que era o Jacques, estava acostumado com a turma que não tinha dinheiro. Mas ele não

Detalhe da casa de Renata Dechamps

O que mais gostaria de contar pra gente? Aqui tinha muito peixe e eu ajudava a puxar a rede. Vinham carrões prateados de Niterói com baús para levar toneladas de peixe. Hoje, para comprar um peixe, a gente tem que olhar se tem urubu, e se tem peixe, e se tem pescador. Hoje é uma dificuldade. Mas eles não ligavam para os peixes voadores. Então, eu e as crianças pegávamos o peixe voador e jogávamos de volta no mar. Eu atrapalhava bastante, mas também ajudava. E os pescadores eram muito solidários. Eu ia à Argentina e trazia aquela toca de lã e eles ficavam gratos, trazia também cachaça... Tive uma loja que foi a primeira loja de Búzios. Aqui nesta casa (na Rua das Pedras). Era um armazém que tinha um pequeno canto. Nós chamávamos de loja, mas era um pequeno canto de um dos filhos do Sr. Antônio Alípio, que era um senhor muito lindo, uma pessoa muito linda. Eu namorava essa loja. E um amigo deu a ideia de fazermos uma lojinha. Fazíamos umas camisetas lá no bairro do Encantado, no Rio de Janeiro, e eles fizeram as camisas Búzios-Brazil, com Z, e nós, dissemos que não. Brasil tem que ser com s! A cidade começa a tomar um rumo que não é do bem. Esta cidade merece o bem porque tem a natureza mais linda do mundo. Aqui se faltar comida, vai ter sempre um peixe que o pescador vai dar. Eu ontem saí da missa, sentei num banco e fiquei observando a rua. E um senhor falou para mim: “Búzios é uma cidade abençoada, eu cheguei sem nada... e agora tenho tanta coisa...”. Búzios dá as coisas boas. O azul do céu, a lua, a natureza, o clima... por que não vamos ser agradecidos?


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EDIÇÃO 002 – ANO 01 – SETEMBRO 2018

Entre

SHEILA SAIDON

Psiquiatra e psicoterapeuta

POR QUE FALAR DE

ABORTO? Nas últimas semanas, fiquei muito envolvida, afetada e mobilizada com a força das mulheres e pibas argentinas na sua luta pela despenalização do aborto. Um movimento de mulheres que foi encorpando, se estendeu e multiplicou, criando redes de luta, de apoio, de afeto, de informação e cuidado. Mulheres reivindicando liberdade para decidir sobre seu corpo e uma lei que garanta o direito ao aborto legal, seguro e gratuito. Um movimento de corpos desejantes, em ação, agrupadas, encontradas, potentes. Uma onda verde me sacudiu. Escolhi falar sobre o aborto porque acredito que é o primeiro passo para

tirá-lo da clandestinidade. Não se trata, somente, de estar a favor ou contra. O aborto clandestino existe, é uma realidade que mata mulheres, a cada ano, em nosso país. Não só mata como as deixa sozinhas, expostas a serem julgadas, presas, sem nenhum tipo de acolhimento pelo sistema de saúde ou pela sociedade. O impacto da ilegalidade fica no corpo e na subjetividade. Silencioso. Um corpo cheio de culpa, de vergonha, de medo. Um corpo que se afasta cada vez mais daquilo que pode, no sentido do desejo. Onde não há uma lei que proteja as mulheres, elas ficam extremamente vulneráveis em momentos de grande fragilidade.

O que podemos fazer por aqui? A experiência no Uruguai é muito interessante. A despenalização do aborto faz parte de uma lei de saúde sexual e reprodutiva que inclui educação sexual para crianças e adolescentes nas escolas, um trabalho forte de prevenção e planejamento familiar, acolhimento e orientação para a mulher que decide abortar. O aborto é feito com comprimidos, em casa. Vamos abrir a discussão, criar um ente, ampliar espaços para falar sobre aborto e sexualidade; trabalhar na prevenção e fortalecer a educação sexual para crianças e adolescentes. Conversar, ouvir, oferecer conhecimento e informação,

criar vínculos de confiança, através dos quais, eles e elas possam tirar dúvidas e iniciar suas experiências sexuais com tranquilidade, tendo autonomia sobre seu corpo e suas escolhas.

Diálogos Quilombolas GESSIANE NAZARIO

QUILOMBOLA. MAS O QUE É ISSO AFINAL?

Quilombola da Rasa e doutoranda em Educação pela UFRJ

Continuaremos aqui a discorrer sobre o assunto que iniciamos, na última edição, que trata de questões fundamentais para se compreender a questão quilombola em nossa cidade e no Brasil. Como dito anteriormente, a identidade quilombola está relacionada a processos históricos aos quais esses grupos foram submetidos. Na Região dos Lagos, estão relacionados ao período ilegal do tráfico de escravos que usava a praia Rasa como local de desembarque clandestino e, após a abolição, onde as famílias, anteriormente escravizadas, passaram a morar nas terras da fazenda Campos Novos, pagando o dia com trabalho ao fazendeiro. Esse é o regime conhecido como arrendamento. Muitos quilombolas, aqui em Búzios, têm em suas memórias familiares algum/ alguma bisavó (ô) ou mesmo avós que arrendavam terras para alguns desses fazendeiros até serem expulsos, porque alguns fazendeiros queriam lotear essas terras para colocá-las no mercado.

Temos aqui um quadro de completa injustiça contra os descendentes de escravizados da antiga fazenda Campos Novos que nunca foi reparada. A partir da Constituição de 1988, essas pessoas foram reconhecidas juridicamente como quilombolas (no artigo 68). Foi a primeira vez na história que o Estado brasileiro incluiu os ex-escravizados na legislação. Isso se deu graças à mobilização desses indivíduos para terem reconhecido pela sociedade o direito à titulação de suas terras. Desta forma, o termo quilombola foi redefinido pelo movimento negro e quilombola para especificar e diferenciar a questão fundiária dessas comunidades negras rurais, então chamadas “terras de preto” que possuíam formas diferenciadas de ocupação da terra. O termo foi escolhido por melhor representar a resistência desses grupos às inúmeras investidas de grileiros, fazendeiros e latifundiários de expropriação de suas terras. Sendo assim, “Quilombola” é uma designação jurídica destinada a conferir direitos

territoriais a todas essas pessoas que possuem relação específica com o território e ancestralidade presumida na escravidão. Precisamos

entender essas lutas para não cairmos no equívoco de reproduzir ideias preconceituosas e injustas sobre os quilombolas de Búzios.


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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS

Política cultural

O RIO DE JANEIRO EM SEU

LABIRINTO O Rio de Janeiro sofre drasticamente as consequências da crise econômica, política e institucional do país. O governo do estado perdeu o controle das finanças, da gestão, da segurança pública. Estamos sob intervenção federal, uma vereadora carioca foi assassinada e a suspeita recai sobre grupos políticos associados a milícias. A crise econômica colocou milhares no desemprego, só a cidade do Rio perdeu, no último ano, 55 mil postos de trabalho, 3 vezes mais que a capital paulista no mesmo período. Na indústria naval, em Niterói e São Gonçalo, são 12 mil trabalhadores desempregados. Os índices de violência disparam e a juventude do nosso estado cresce sob a sombra da violência, medo e desesperança. Se o bairro de Jardim Catarina, em São Gonçalo, fosse um país, teria taxa de homicídio per capita mais alta que a da Síria. Mas a tragédia do Rio de Janeiro não é nova e, há muito, vem sendo construída e anunciada. Embora tenha experimentado na última década e meia um importante ciclo de crescimento e desenvolvimento, com as grandes oportunidades que se abriram em nível internacional, especialmente na indústria do petróleo, e o fortalecimento de uma política de estímulo e valorização do conteúdo nacional, os problemas do Rio de Janeiro são estruturais, e relacionados, em grande medida, com

a forma que o estado surge como unidade política e administrativa. Com a ida da capital do país para Brasília, a cidade do Rio perdeu de uma hora pra outra sua centralidade política e econômica na vida brasileira. O estado da Guanabara, já sem o status de Distrito Federal, passou a cobiçar a casa do vizinho do lado, o antigo estado do Rio, que tinha a sua capital em Niterói, e reunia todo o interior e região metropolitana do que hoje é o atual estado do Rio de Janeiro. Concentrando o filé mignon da elite brasileira, em seu território, e com o suporte do regime militar, a Guanabara avança sobre o antigo estado do Rio, em um processo que ficou conhecido como fusão, mas que dadas as consequências sociais e econômicas, poderia ser definido também como anexação. Apesar do novo estado que surgiu da fusão ser Rio de Janeiro, no nome, quem mandava nele e manda, até hoje, é a Guanabara. A fusão concentrou todas as vantagens na capital carioca e espalhou as desvantagens pelo resto do estado. Um acordo entre 2 partes onde só uma delas ganhou. Investimentos, infra-estrutura, serviços públicos, produção de conhecimento, indústria cultural, imprensa ficavam na Guanabara, enquanto os problemas iam se acumulando no interior. Sem planejamento, identificação

de potencialidades, diversificação da atividade econômica, incentivo à permanência nas áreas rurais e pequenas cidades, o interior passou a ostentar indicadores sociais e econômicos equivalentes às regiões pobres do sertão nordestino. A região metropolitana, por sua vez, sofreu com a explosão demográfica e o crescimento desordenado, improvisado e carente de infraestrutura. A correlação de forças políticas no estado seguiu também a mesma lógica. Enfraquecidas com a fusão, as oligarquias locais das diferentes regiões do estado construíram seus acordos bilaterais com a elite política concentrada na capital, e montou-se a rede de corrupção e clientelismo que vai de Chagas Freitas a Moreira Franco, de Cabral a Pezão, de Picciani a Eduardo Cunha, cuja expressão mais flagrante é o comando da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, controlada, há décadas, pela coalizão de interesses formada por estes e outros personagens e que ficou conhecida como o “partido da ALERJ”.

ALEXANDRE SANTINI

Dramaturgo e gestor do Teatro Popular Oscar Niemeyer de Niterói

estruturantes e estratégias de longo prazo. É necessário um novo modelo de desenvolvimento do estado, que rompa o ciclo vicioso da concentração dos investimentos e da arrecadação na capital do estado. Ao mesmo tempo, qualquer saída para o Rio não tem como estar descolada da questão nacional, na medida em que o incentivo aos setores estratégicos da economia, ciência e tecnologia, educação, cultura e muitos outros, dependem de uma ação em sinergia com um projeto de desenvolvimento autônomo e soberano para o país. Tudo isso estará em jogo nas próximas semanas, nas eleições gerais de 2018, a mais incerta e complexa desde a redemocratização do Brasil.

Enfrentar a crise atual do estado do Rio significa olhar para estes problemas históricos, exige soluções

Praça da Ferradura, Centro Armação dos Búzios Rio de Janeiro, Brasil SÁBADO DE 7H ÀS 15H Hortifrutigranjeiro, alimentação, DJ Léa, artesanato e livros QUINTA-FEIRA DE 19H ÀS 23H Alimentação, DJ Léa, música ao vivo e artesanato

@feiraperiurbanadebuzios


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EDIÇÃO 002 – ANO 01 – SETEMBRO 2018

Cinema

FLIP PARATY GRAND CINE BARDOT Quinta-feira às 21h Sexta-feira às 21h Sábado às 19h e 21h Domingo às 19h Valor: R$ 30,00 @grancinebardot.buzios CINE CLUB GRAND CINE BARDOT Sexta-feira 7 de setembro E LA NAVE VA, 1983, drama/cinema de arte, 2h12m. Sessão: 18h40m. 14 de setembro OITO E MEIO, 1963, drama/fantasia, 2h18m. Sessão: 18h40m. 21 de setembro A DOCE VIDA, 1960, drama/comédia dramática, 3h. Sessão: 18h. 28 de setembro NOITES DE CABIRIA, 1957, drama/ romance, 1h58m. Sessão: 19h. Valor: R$ 10,00 CINECLUBINHO CINE KIDS CASAS BRANCAS Domingo 02 de setembro TAINÁ, A ORIGEM, 2011, Rosane Svartman, aventura, 1h 28m. Sessão: 17h. 16 de setembro A VIAGEM DE CHIHIRO, 2001, Hayao Miyazaki, fantasia/mistério, 2h 5m. Sessão: 16h50. Valor: R$ 5,00

Travessa dos Pescadores, nº 88, Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000

LIVROS

TIAGO ALVES FERREIRA Produtor cultural

Irmãos - Uma história do PCC Autor: Gabriel Feltran Editora: Companhia das Letras Pág.: 320 Em Irmãos, o autor oferece uma interpretação alternativa àquelas que vêm ocupando o debate público brasileiro

Há dias passados, viajei. Uma viagem! Já estava achando que nunca mais e pintou, assim, sem aviso. Peguei a vaga de um amigo desistente e fui a Paraty, no lugar dele, com uma turma genial de conhecidos e desconhecidos multiétnicos e multietários. Uma van pegou-me em casa, de madrugada, e aparecemos no centro histórico, à noitinha, de uma quinta feira. A cidade estava fervilhante, lógico, eram tempos de FLIP. Já ouviram falar? A FLIP é a Festa Literária Internacional de Paraty que acontece todos os anos, desde 2003, e já tem uma dimensão importantíssima no calendário cultural brasileiro e da América do Sul. E o “internacional” não está no nome só de enfeite, pois é cheia de convidados de todos os lugares e todas as raças do mundo. Autores, poetas, editores, críticos, jornalistas e tudo o que rodeia o universo das letras, incluindo também a parte que compreende os negócios, leia-se contratos, publicações, traduções e comercialização, se concentram na pequena e belíssima cidade colonial de 1667, com suas ruas de pedra, algumas ocasionalmente invadidas pelo fluxo das marés – suas janelas, portas e varandas coloridas e suas encantadoras igrejas de modestas aspirações barrocas. São quatro dias em que a palavra escrita impera absoluta em todos os cantos da cidade. E a falada também, seja nas palestras, nos debates, nas apresentações e relatos, muitos deles a cargo dos próprios autores convidados. Todo ano tem uma homenagem a um autor/a brasileiro/a, vivo ou morto, e já passaram pelo pódio, entre outros, Chico Buarque, Gilberto Freyre, Clarice Lispector, Machado de Assis, Vinicius de Moraes e Lima Barreto. Esta edição foi a vez de Hilda Hilst, a escritora e poeta paulista e, ao mesmo tempo, teve uma temática em

e que buscam comparar o PCC com outras organizações criminosas como os comandos cariocas, as gangues prisionais americanas ou as máfias italianas, russas ou orientais. Para o autor, o modo de organização do PCC tem mais a ver com as irmandades secretas, funcionando como uma maçonaria do crime — uma rede de apoio mútuo, pautada por um conjunto de valores considerados justos, em que ninguém deve atravessar os negócios nem a honra do outro irmão. O livro apresenta um país em que o crime conquistou efetiva hegemonia política para partes significativas da população.

destaque que foram as mulheres e sua lutas pela igualdade. Também foram homenageados diversos países luso-falantes com uma ativa participação do Museu da Língua Portuguesa na defesa de nosso castigado idioma que, a cada dia, enriquecemos mais com expressões estrangeiras... sacou a questão brother? Quer dizer, é um programa múltiplo e duplamente interessante porque tem a beleza arquitetônica da cidade, de um lado, e a riqueza da cultura que rola solta no espaço do outro. Não quero me deter na descrição da cidade, bastando dizer que, há mais de cinquenta anos, ela foi tombada pelo IPHAN, e continua tão linda quanto foi. O que realmente me impressionou foi a pegada e a força cultural do evento, que não fica limitado à esfera literária. É música na rua, nos botecos e restaurantes, é arte e o artesanato local, é dança de raízes negras e índias que vai atrás dos atabaques e tamborins; são os produtos tradicionais como a cachaça, os espetáculos infantis nas praças ou em algumas “casas” (tem casa para tudo: casa da cultura, casa insubmissa das mulheres negras, casa livre, etc., no total mais de vinte), as apresentações e mesas de opinião com participação do público e até, achei o máximo, a aula a que assisti no Auditório da Matriz, dentro do programa Encontro com manuscritos notáveis, sobre livros-documentos únicos, produzidos na idade Média, projetada na telona, neste caso o célebre Livro das Horas da rainha Juana de Navarra. Luxo só!

MANOLO MOLINARI

Historiador Rosarino Buziano

banquete cultural com atividades de estímulo à leitura, brincadeiras populares e participação engajada em grupos de ação diversa. Alguns desses grupos até contribuíram com seu trabalho à reabertura do cinema de Paraty, fechado 45 anos atrás. E os livros, haja livros! São as grandes estrelas do evento. Tendas enormes cheias de adultos e crianças, sebos na rua, longuíssimas filas para pegar autógrafos. Enfim, lindo esse clima geral de interesse no crescimento espiritual rolando, até nas comidas ou nas mesinhas dos bares. Como indica a F do nome, uma verdadeira FESTA para não perder. Fico pensando em Búzios, minha tão querida cidade, indiferente a esse tipo de manifestações, com escolas que lutam para sobreviver, uma biblioteca pública pouco visitada, saraus na Praça Santos Dumont e um projeto de Cidade Biblioteca pouco aproveitados, cinemas às moscas. Vamos lá pessoal! A praia é uma delícia, concordo, mas também é possível e gostoso surfar nas ondas da leitura ou dar um mergulho no conhecimento! Que não seja mais de vez em quando!

Os convidados também não deixam nada a dever e descobri, com certa raiva por ter perdido, que anos atrás esteve Eric Hobsbawm, meu historiador favorito, morto em 2012. As crianças não ficam de fora desse

Ah! E antes de fechar, é bom levar em conta: apesar de a cidade antiga estar lotadérrima e cheia de animação, tipo Réveillon aqui, não se via nem uma garrafa, nem um copo plástico, nem um papel, nem uma guimba de cigarro no chão. E ninguém cobra taxa de visitante para fazer a limpeza! Será que estamos falando do mesmo litoral fluminense? Até a próxima.

O Capital para crianças

Para onde vão os sapatos

Autora: Liliana Fortuny Ilustrador: Joan R. Riera Editora: Boitempo Pág.: 32

Autor: Benedito Bergamo Design: Vinicius Lourenço Costa Pág.: 120

Em celebração ao bicentenário de Karl Marx em 2018, a Boitempo lança O capital para crianças, com o intuito de apresentar as ideias do filósofo alemão aos pequenos. O livro explica de forma acessível e divertida a obra mais importante do filósofo alemão e suas contribuições para a história, para a política e para a sociedade.

Surpreendente, entre as qualidades apresentadas em “Para onde vão os sapatos”, a capacidade de obter um máximo de resultado poético através de um mínimo. A originalidade destes poemas e prosas poéticas é inseparável do seu igualmente original processo de criação. O resultado a que se chega vem, por sua vez, expressar um terceiro nível de originalidade, através da relação com a cidade de São Paulo; e com a própria vida.


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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS

Cultura Canábica

SEGURA O TOURO PARA NÃO COMER A HORTA, POIS A PORTEIRA SE ABRIU

HAMBER CANNABICO CARVALHO Ativista da maconha medicinal

a do auto cultivo, como forma de garantir sua qualidade de vida. O direito fundamental à saúde foi a argumentação usada pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Francisco Falcão, relator do caso, para negar um recurso à União, em que ela argumentava que somente a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) poderia autorizar a importação de remédio de derivado da maconha. Na esteira dessa decisão, prolatada no início deste mês de agosto, inúmeras outras famílias e indivíduos, que usam a maconha como terapia alternativa, poderão se beneficiar e não ficar restritos às empresas estrangeiras elencadas pela ANVISA em suas normativas, o que poderá forçar, inclusive, a queda no preço

do único medicamento registrado por esta agência, o Mevatyl, que mal chegou às farmácias brasileiras, devido ao preço que é vendido, e cujo valor final chega a R$ 3.000,00. A demora da ANVISA em regulamentar o uso da maconha para fins medicinais, vem sendo atropelada pelas inúmeras decisões da justiça brasileira, tanto na importação desses medicamentos, quanto no cultivo da planta para produção de remédios artesanais. A ineficiência do estado brasileiro em promover o acesso da população a medicamentos mais baratos e eficientes, empurra para a ilegalidade inúmeras famílias que não vislumbram outra alternativa que não seja

Shopping Aldeia da Praia, Avenida José Bento Ribeiro Dantas, nº 5350, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000 Fone: (22) 98111-7510

Doenças que têm como sintomas espasmos e convulsões, dores intensas, enjoos decorrentes de quimioterapia, dependências de remédios para depressão, insônia, ansiedade e estresse são hoje largamente tratadas com compostos caseiros à base de maconha, fazendo ressurgir tanto nas grandes cidades, quanto nos recantos mais afastados, o uso da medicação natural, como forma de cura para amenizar as dores e o sofrimento. O congresso não legisla, a união não normatiza e a corte suprema não julga as matérias pertinentes ao uso da maconha. Fora dos gabinetes, a sociedade reage de per si, mirando suas necessidades, ou através das entidades representati-

ZANINE

vas de uma coletividade, provocando o conflito de prerrogativas entre os três poderes e criando um cenário de instabilidade para se estabelecer um marco regulatório para o uso da maconha medicinal e recreativa. Enquanto nos perdemos nos corredores infinitos e tortuosos da judicialização do uso da maconha para fins recreativos e medicinais, nossa pátria colonizadora recebeu no último bimestre o módico aporte em investimentos de 20 milhões de euros da empresa canadense Tilray, para a instalação de um complexo fabril para o cultivo, produção e exportação de maconha medicinal nas terras de Pero Vaz de Caminha. Que venham as caravelas com suas velas de cânhamo, pois nesta terra, em se plantando tudo dá.

Fernando Nascimento de 06 a 30 set.

FUNCIONAMENTO: SEGUNDA-FEIRA A SEXTA-FEIRA DE 9H ÀS 18H, SÁBADO, DOMINGO E FERIADO 11H ÀS 18H @nucleodedancaodiliacuiabano

Estrada da Usina (ao lado da Prefeitura), Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000 - Fone: (22) 2623-6502


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EDIÇÃO 002 – ANO 01 – SETEMBRO 2018

Roda Cultural do C.U.B. Coletivo Urbano Buziano Batalha do Quilombo DATA: 06 e 20 de setembro, quinta-feira

CircoLo Social

HORA: 18h às 22h LOCAL: Praça Velha da Rasa

Educar e transformar

@coletivourbanobuziano

Memória Buziana

Estrada da Usina Velha, nº 179, Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000 @SocialCircoLo

Gastronomia

SOBRE PEIXES A COZINHA E A E PÁSSAROS SOCIEDADE PARTE 2

GUSTAVO GUTERMAN

BENTO RIBEIRO DANTAS

Escritor

Terminamos a última coluna falando das gaivotas e voltaremos a elas. As simpáticas e bonitas gaivotas não conseguem mergulhar fundo como os atobás. Frequentam as praias atrás de peixinhos que se movem em águas rasas e perto da superfície. Também se alimentam de peixes mortos, que encontram nas areias. Os peixes voadores são lindos, o dorso azul brilhante se matiza no corpo prateado, as asas são translúcidas. Só frequentam Búzios no verão e com água do mar quente e límpida. Quando velejamos, ao nos aproximarmos de cardumes de peixes voadores, esses, provavelmente, confundem o deslocamento silencioso do veleiro com a aproximação dos seus predadores: dourados, xaréus, cavalas, olhos de boi e outros peixes grandes e velozes, que normalmente os perseguem. Como defesa, com um forte movimento de suas caudas, alçam voo para escapar. É um espetáculo fascinante: ver um pequeno cardume de peixes voadores, decolar em frente ao barco e, como um pequeno bando de pássaros metálicos, com suas asas estendidas e reluzindo ao sol, planar mais de 100 metros. Lembro-me bem de uma cena que presenciei na praia de Manguinhos: uma linda moça, com um grande e desengonçado filhote de labrador preto, encontrou duas gaivotas que disputavam, na areia, algum resto de pequeno “fruto do mar”. O cão correu atrás dos pássaros, que vo-

aram para a água, no que foram seguidos pelo labrador. Com um voo circular, elegante e sereno, as gaivotas voltaram ao seu almoço. A bela e atlética moça de biquíni, alegre, com saltos e gestos como se estivesse dançando, incentivava o cão a voltar a correr em sua inútil perseguição às gaivotas que, por sua vez, graciosas, repetiam o voo circular. A cena não podia ser mais poética: a moça, o cão e as gaivotas, no balé à beira mar, num dia de sol em Manguinhos.

As características dos hábitos da sociedade, durante períodos históricos, refletem, em muito, a contemporaneidade de suas escolhas. E nem sempre tais escolhas são as mais acertadas, principalmente quando pensamos nas consequências desses atos. Contudo, a modernidade trouxe dois grandes comportamentos sociais globais quase simultâneos (que formaram um dos maiores conflitos alimentares que vivemos nos dias atuais). O crescimento das cidades e o reencontro da sociedade ao ato de comer. No processo capitalista em que vive grande parte do planeta, a especulação imobiliária se transformou em uma ferramenta econômica poderosa e devastadora. Metros quadrados a peso de ouro começaram a determinar comportamentos sociais, pela falta de possibilidades. E casas começaram a ser empilhadas em prédios cada vez mais altos e os excessos de espaços, que determinavam as condições sociais de seus ocupantes, deram lugar a caixas de sapato, em “endereços nobres”. Outra característica clara é o afastamento e a ignorância de grande parte da população quanto à produção de alimentos, tornando crescente outro nicho econômico significativo - a indústria de alimentos. Paralelamente, a gastronomia profissional experimentava status de celebridade e os cozinheiros e cozinheiras que chefiavam suas brigadas deixaram a cozinha e foram apresentados a sociedade. Antes, somente eles e, agora, com muita luta, também elas. E a sociedade os abraçou. Não só os abraçou como queria ser como estes bruxos e

Professor do curso de Gastronomia do Instituto Federal Fluminense de Cabo Frio

bruxas. Então por não conseguirem modificar a planta daqueles arranha céus, a saída foi inventar a varanda gourmet e assim se aproximar daqueles chefes tão reverenciados. Mas tais varandas, para muitos, se tornavam somente uma relação social. A cozinha não havia conseguido sair da área de serviço (normalmente representada nos prédios de grandes metrópoles por um corredor único que se integra com um tanque e máquina de lavar roupas), então ainda é um ambiente de uma única pessoa que ali permanece durante longas horas, longe do restante da família. As perguntas que ficam são: será que saberemos encontrar o equilíbrio entre nossa cultura alimentar e os movimentos sociais do futuro? Mesmo sabendo que esses prezam por valores diferentes das identidades culturais que nos representam, indo em direção a um pseudo multiculturalismo, que se baseia exclusivamente em uma sociedade de consumo? E as novas possibilidades de representatividade da gastronomia profissional? Levarão em consideração a necessidade da proteção de uma cadeia produtiva, baseada em uma cultura alimentar? Ou viveremos essa síndrome de praça de alimentação de shopping, onde se encontra artificialmente representações caricatas das etnias mundiais, embaladas e prontas para viagem? Afinal de contas, abrir um restaurante (dito gastronômico) é somente um negócio ou deve possuir uma profunda representação sócio-cultural, baseada na cadeia produtiva que a representa?


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