Darwin Day UFMG 2018
Livreto do evento
Darwin Darwin UFMG 2018
Fabrício R. Santos (org.)
Centro de Coleções Taxonômicas Universidade Federal de Minas Gerais Belo Horizonte, MG, Brasil
Edição do Autor Autor/organizador: Fabrício R. Santos Centro de Coleções Taxonômicas Instituto de Ciências Biológicas Universidade Federal de Minas Gerais 1ª edição, maio de 2018 Editado no Brasil / Edited in Brazil Organizado por Darwin Day UFMG Ilustrações de Francisco Prosdocimi, com exceção da caricatura de F. Prosdocimi que é de Fabricio R. Santos
Preâmbulo O Darwin Day UFMG 2018 ocorreu no Auditório Nobre do CAD-1 da UFMG no dia 11 de maio de 2018. Foi coordenado pelo Centro de Coleções Taxonômicas (CCTUFMG) do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais e pelos professores Fabrício R. Santos (UFMG) e Sávio Torres de Farias (UFPB), contando com o apoio da Sociedade Brasileira de Genética, do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares da UFMG e dos programas de pós-graduação em Genética, Zoologia, Microbiologia e Ecologia da UFMG. O Darwin Day tem o objetivo celebrar a Teoria da Evolução que foi inicialmente divulgada com o livro de Charles Darwin em 1859 e tem a finalidade de promover a reflexão sobre temas de vanguarda do conhecimento científico das várias disciplinas das Ciências Biológicas, tendo a Evolução como eixo integrador. Nesta edição, discutimos vários aspectos da Teoria da Evolução como origem da vida, reflexões filosóficas sobre a biologia evolutiva e a seleção natural, a nomenclatura dos genes, o contexto da espécie humana, bioinformática evolutiva, vírus e mecanismos moleculares diversos envolvidos com a evolução dos seres vivos. https://labs.icb.ufmg.br/lbem/darwinday 2
Sumário
A edição de 2018 do Darwin Day UFMG
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Romeu C. Guimarães Fechando o cerco no entendimento do código genético
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Rogério P. Martins Biologia evolutiva: Mudança de paradigma ou programa de pesquisa? 11 Fabricio R. Santos A espécie humana e a teoria da Evolução
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Sávio Torres de Farias Eco-Evo-Devo: um novo desafio para a síntese evolutiva?
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Francisco P. Lobo Coevolução molecular no sistema vírus-hospedeiro
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Jônatas Abrahão Virus gigantes de DNA: Expandindo os limites da virosfera 19 Francisco Prosdocimi Teleologia e nomenclatura gênica: uma nova proposta
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Gustavo Kuhn O impulso molecular na evolução dos seres vivos
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Agradecimentos
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A edição de 2018 do Darwin Day UFMG
Fabrício R. Santos, Maria Bernadete Lovato e Ricardo Solar Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte MG Brasil,
As inscrições ao evento chegaram a um total aproximado de 620 participantes, incluindo, além da UFMG (maioria), outras 11 instituições de ensino e pesquisa de Minas Gerais, para uma plateia composta por alunos de ensino médio, graduação e pós-graduação, além de pósdoutores, pesquisadores e professores. O evento contou com uma breve abertura pelos organizadores Fabrício R. Santos e Sávio T. Farias, seguida pela apresentação do vídeo do portal Symphony of Science, The Unbroken Thread, com importantes divulgadores da Ciência e da Evolução: Carl Seagan, David Attenborough e Jane Goodall. Na sessão da manhã foram discutidos vários aspectos teóricos e filosóficos sobre origem da vida, da vanguarda científica da Seleção Natural e Biologia Evolutiva, o homem na Teoria Evolutiva e a incorporação de novas ideias da Ecologia e Desenvolvimento ao estado do conhecimento atual sobre Evolução Biológica. O prof. 4
Romeu Guimarães abriu o evento discutindo as origens do código genético que atualmente é considerado como equivalente a entender a própria origem da vida. Em seguida, o prof. Rogério P. Martins discutiu aspectos filosóficos e teóricos sobre a Biologia Evolutiva moderna, o conceito de Seleção Natural e outros conceitos usados por diferentes disciplinas biológicas, cientistas de outras áreas e filósofos. O prof. Fabrício R. Santos apresentou a espécie humana no contexto evolutivo, assim como os vários mitos e equívocos que permeiam a sociedade e academia. No final da manhã, o prof. Sávio T. Farias apresentou a incorporação de várias ideias ecológicas e do desenvolvimento para a explicação da formação dos fenótipos, de grandes implicações para compreender a Teoria Evolutiva. Esta sessão contou com a mediação da profa. Bernadete Lovato que ao final levantou várias questões sobre a importância da epigenética e da plasticidade fenotípica para a compreensão de alguns fenômenos de grande relevância para a Biologia Evolutiva. Na sessão da tarde, as apresentações focaram nos aspectos moleculares da Biologia Evolutiva. O prof. Francisco Lobo tratou das análises de bioinformática e da predição de sistema coadaptados entre vírus e seus hospedeiros, mostrando como o conhecimento acumulado pode nos ajudar a prever sistemas altamente intrincados. O prof. Jônatas Abrahão tratou do fascinante mundo dos vírus gigantes, que foram recentemente descritos e do contexto evolutivo que cerca estes organismos. O prof. Francisco Prosdocimi nos apresentou os problemas relacionados à nomenclatura teleológica 5
dos genes e a sua proposta de um sistema de nomenclatura gênica baseada na sua própria evolução. Por fim, o prof. Gustavo Kuhn falou sobre o mecanismo do impulso molecular e da importância deste na dinâmica de evolução genômica, abrindo novas abordagens para os processos por trás dos padrões evolutivos. No final desta sessão, o prof. Ricardo Solar levantou várias questões sobre diversos processos coevolutivos e chamou a atenção para estudos recentes que mostram que a aceitação da Biologia Evolutiva é muito menor nos EUA do que na Europa e no Japão, principalmente por causa do fundamentalismo difundido na sociedade e politização da Ciência nos EUA. Todavia, independente da visão religiosa e política, o conhecimento da natureza científica da Evolução dentro das Ciências Biológicas está diretamente relacionado à probabilidade de aceitação da teoria como explicação para a diversidade de vida na Terra. Em meio a este intenso debate, uma ideia consenso resultada desta discussão foi a necessidade de promover a “alfabetização” científica da sociedade, demonstrando o vínculo entre a produção do conhecimento da ciência básica na biologia evolutiva e a geração de produtos e processos biotecnológicos, aplicações na saúde, medicina, agricultura etc.
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Uma maneira de apresentar na academia mais claramente a Teoria da Evolução dentro das Ciências Biológicas é ministrar as disciplinas biológicas com as explicações científicas causais da natureza dos fenômenos. Por exemplo, disciplinas como embriologia e fisiologia são frequentemente ministradas sem o contexto evolutivo, o qual traria a explicação causal para o compartilhamento de vários processos de desenvolvimento e de sistemas fisiológicos entre organismos de diferentes táxons, todos herdados a partir de seus ancestrais comuns com algumas modificações. Outra maneira é a divulgação científica, promovendo rotineiramente eventos como o Darwin Day para a discussão multidisciplinar sobre os avanços das Ciências Biológicas e desdobramentos para a compreensão dos fenômenos a partir de suas causas evolutivas.
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Origens do código genético Professor Dr. Romeu Cardoso Guimarães romeucardosoguimaraes@gmail.com Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte MG
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Pode-se identificar as origens do código genético (de monômeros, ‘letras’) com as do processo vital se for considerado o critério do surgimento da especificidade das sequências dos biopolímeros informacionais (ácidos nucléicos e proteínas), que são sequências (‘textos’) especificadas ou organizadas. A dúvida reside em que a formação do código exige algum tipo de sistema geoquímico protometabólico preexistente, assim estabelecendo mais um contínuo do que um corte demarcador. O modelo autorreferente para a formação do código indica que dois prototRNAs, carregando aminoácidos, teriam sítios de acoplamento por complementariedade [protoanticodons], formando dímeros. Os dímeros propiciam aproximação das pontas que carregam os aminoácidos, facilitando a reação de transferase, formando ligações peptídicas, assim funcionando como protorribossomos. Esta estrutura, composta de monômeros, funciona sem identidades ou direcionalidades definidas (autorreferência 1): os anticódons são, ao mesmo tempo, códons um para o outro; a reação de transferase é bi- ou adirecional, um proto-tRNA podendo carregar um aminoacil ou um peptidil, indiferentemente. Os estados dos monômeros são, portanto, indefinidos, superpostos ou coerentes – situações chamadas de singularidades, na terminologia da mecânica quântica e da cosmologia. A aquisição de identidade de ‘código de letras’ ocorre por ligação do produto – peptídeo, que é uma protoaminoacil-tRNA sintetase – ao produtor, que é um ou ambos membros do dímero (descoerência por autorreferência 2). A estabilização evolutiva da ligação é processo complexo de geração da especificidade ou organização da sequência da aminoacil-tRNA sintetase. O propulsor do processo é parte do fluxo evolutivo universal de interações com consumpção / amortecimento de energias livres que estavam expostas no sistema geoquímico – a aquisição de especificidade é facilitadora da consumpção de matéria (massa + energia).
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Biologia evolutiva: Mudança de paradigma ou programa de pesquisa? Professor Dr. Rogério Parentoni Martins rpmartins917@gmail.com Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte MG
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A biologia evolutiva trata do conhecimento (por que os seres vivos são o que observamos?) e a filosofia da biologia evolutiva (o conhecimento evolutivo é verdadeiro?). Interessa à biologia evolutiva saber por que os seres vivos são do modo que os observamos. À filosofia da biologia interessa saber os critérios que justificariam a veracidade do conhecimento evolutivo. Há vários critérios para justificar o conhecimento científico; na biologia a reprodutibilidade é o corriqueiro: os resultados obtidos devem ser reproduzidos por pesquisadores independentes. Dois modelos históricos-filosóficos descrevem a estrutura e funcionamento da biologia evolutiva. Thomas Kuhn propõe o conceito ciência normal ou paradigmática que funcionaria de acordo com teorias e hipóteses aceitas pelos biólogos evolutivos. O paradigma só seria substituído quando as teorias e hipóteses não mais se sustentarem como fundamentos do conhecimento evolutivo. Imre Lakatos propõe a biologia evolutiva constituída por um núcleo "duro" (irrefutável) ao redor do qual, "giram" hipóteses e teorias auxiliares modificáveis ou substituíveis. A estrutura da biologia evolutiva pode ser caracterizada por meio de paradigma ou "núcleo duro". No entanto, parece que as teorias de evolução em si e a descendência com modificação integram o núcleo irrefutável; seleção natural, microevolução, macroevolução e especiação seriam auxiliares, portanto se ajustariam ao modelo de ciência Lakatosiano. Não obstante, essa é matéria de controvérsia entre os biólogos evolutivos preocupados com a justificação do conteúdo de verdade da biologia evolutiva. Estes rejeitam que a 'icônica' seleção natural seja teoria auxiliar, porque a consideram como explicação das modificações fenotípicas, microevolução, macroevolução e especiação.
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A espécie humana e a Teoria da Evolução Professor Dr. Fabrício Rodrigues dos Santos fsantos.ufmg@gmail.com Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte MG
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Entre todos os assuntos discutidos na Teoria da Evolução, aqueles relacionados à nossa espécie são os que desencadeiam os debates mais calorosos e carregados de mitos e equívocos. A própria inclusão da espécie humana como uma a mais na biodiversidade terrestre dentro da ordem dos Primatas é criticamente negada por parte da sociedade que, mesmo considerando a ciência como explicação do mundo físico, sendo que alguns aceitam a Evolução para explicação da vida na Terra, não aceitam a mesma explicação de origem para o Homo sapiens. No entanto, temos muito mais evidências paleontológicas sobre o passado da linhagem humana nestes últimos 6 milhões de anos do que para todas as outras espécies de Primatas. Nossa linhagem é a única de organismos bípedes entre os mamíferos, uma característica que compartilhamos com nossos parentes fósseis (hominíneos) até pelo menos 5 milhões de anos atrás. Esta relação com os fósseis “hominíneos” se mostra cada vez mais estreita, pois a genômica de humanos e parentes como os Neandertais indicou que estes trocaram genes ao redor de 100 mil anos atrás, de algumas características de importância adaptativa para populações humanas. A genética evolutiva também permitiu elucidar o tempo e alguns trajetos das populações humanas que ocuparam todos os continentes nos últimos 60 mil anos, a partir de populações africanas de 200 mil anos atrás. No último capítulo da odisseia humana, o continente americano foi colonizado por pioneiros dedicados à caça e coleta numa viagem por terra e pela costa a partir da Sibéria, passando pela Beríngia e em seguida, ao longo de poucos milênios, chegaram até a Terra do Fogo e outras partes da América do Sul.
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Eco-Evo-Devo: Um desafio a síntese evolutiva? Professor Dr. Sávio Torres de Farias stfarias@yahoo.com.br Departamento de Biologia Molecular, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB
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A junção das proposições feitas por Charles Darwin e Gregor Mendel na primeira metade do século XX provocou uma revolução na biologia moderna e até hoje é o grande eixo unificador de toda a biologia. A ideia central a Síntese evolutiva moderna é que o processo evolutivo se dar por mudanças na frequência alélica por forças como seleção natural, deriva, migração etc. Essa Teoria vem passando por provas desde de sua proposição e até o momento ninguém conseguiu refutar seus preceitos. Com o advento da biologia molecular uma nova camada de compreensão do sistema biológico se descortinou e novas disciplinas emergiram, junto com essas novas áreas, novos desafios vem sendo postos a compreensão do processo evolutivo. A Eco-Evo-Devo (Ecologia-DesenvolvimentoEvolução) vem sendo vista como a área integrativa do conhecimento que pode introduzir novos conceitos e mecanismos evolutivos a síntese moderna e nos últimos anos tem-se proposto que a síntese moderna passe por uma revisão e que uma síntese expandida seria necessária. Nessa conversa vamos discutir se os processos evolutivos propostos pela EcoEvo-Devo representam uma novidade na compreensão do processo evolutivo ou apenas uma reinterpretação dos mecanismos propostos na síntese moderna. O principal eixo da discussão serão as novas camadas de regulação gênica, assim como, o conceito de gene que passa por uma crise em virtude do aumento na compreensão da estrutura do genoma. Neste contexto, será que podem ocorrer mudanças evolutivas com mudanças no padrão de expressão gênica, porém, sem a mudança na frequência alélica? Esta será a pergunta que guiará toda a discussão. Evidentemente, não esperamos ter uma resposta pronta, mas é importante, como em toda teoria cientifica, reavaliarmos a todo momento o paradigma, seja para refutar, complementar ou reafirmar.
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Coevolução molecular no sistema vírus-hospedeiro Professor Dr. Francisco Pereira Lobo franciscolobo@gmail.com Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte MG
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Um bom modelo científico deve ser simples, capaz de explicar eventos passados e de predizer eventos futuros, dentro das limitações intrínsecas ao próprio modelo. A teoria da evolução biológica, enquanto modelo científico, apresenta todas as propriedades descritas acima. Uma prova nesse sentido é a predição da existência da mariposa Xanthopan morganii anos antes de sua descoberta, razão pela qual ela é conhecida como "mariposa de Darwin". Ao analisar a morfologia da orquídea Angraecum sesquipedale, a qual possui um nectário particularmente longo, Darwin previu a existência de um polinizador, então desconhecido, que possuísse um aparelho bucal também longo o suficiente para polinizar a orquídea, o qual se descobriu posteriormente ser a mariposa Xanthopan morganii. A relação ecológica entre vírus e seus hospedeiros é um processo coevolutivo contínuo envolvendo o sistema imune hospedeiro e mecanismos de escape virais. A família Flaviviridae é composta de vírus que infectam hospedeiros vertebrados e/ou invertebrados. Esses grupos de hospedeiros são formas de vida distintas separadas por considerável tempo evolutivo, de maneira que mecanismos antivirais linhagemespecíficos possivelmente evoluíram em resposta à infecção viral. Ao estudarmos algumas das propriedades genômicas em Flaviviridae e seus hospedeiros, constatamos que tantos os genomas virais quantos os RNA mensageiros dos hospedeiros apresentam convergência molecular (super-/subrepresentação de uso dos mesmos motivos). Esse achado nos levou a propor a existência de um mecanismo imune, então desconhecido, capaz de produzir tal padrão evolutivo. Tal mecanismo imune foi descoberto quase dez anos depois de nosso achado, em mais uma prova do poder preditivo da teoria evolutiva.
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Virus gigantes de DNA: Expandindo os limites da virosfera Professor Dr. Jônatas Abrahão jonatas.abrahao@gmail.com Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte MG
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Os vírus são conhecidos como entidades biológicas de extrema simplicidade estrutural e genômica. A maioria das espécies virais conhecidas está associada aos seres humanos, direta ou indiretamente, causando doenças e prejuízos econômicos. No entanto, nas últimas duas décadas, o campo da virologia ambiental vem ganhando força e destaque, trazendo grandes achados que ultrapassam as barreiras da virologia tradicional (e antropocêntrica). Neste contexto, os vírus gigantes de DNA, descobertos em 2003, surpreenderam a comunidade cientifica pela sua grande complexidade estrutural e genômica. Estes vírus apresentam partículas e genomas maiores que algumas bactérias e fungos, quebrando paradigmas até então inabaláveis, como os propostos por Lwoff na década de 1950. Vários genes, até então encontrados somente em organismos celulares, foram descobertos em profusão nos genomas dos vírus gigantes. Tal fato permitiu a elaboração de arvores filogenéticas que contemplassem vírus e organismos celulares ao mesmo tempo, suscitando questões polêmicas, como a existência ou não do 4° Domínio da Vida, formado pelos vírus grandes e gigantes de DNA. A descoberta de novos e ainda mais fascinantes vírus gigantes de amebas, como os Pandoravírus e Tupanvírus, demonstrou que os limites da virosfera são imprevisíveis. Quão gigante uma partícula viral pode ser? O que um genoma viral é capaz de codificar? Qual o real papel da virosfera no contexto da biosfera? e... afinal, os vírus podem nos ajudar a redefinir a frágil e controversa definição de “vida”? São questões que exigirão maturidade e interlocução entre as diferentes áreas da Biologia.
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Teleologia e nomenclatura gênica: uma nova proposta Professor Dr. Francisco Prosdocimi fprosdocimi@gmail.com Instituto de Bioquímica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ
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Teleologia é a ideia filosófica de que a ordem observada no mundo natural acontece em razão de uma causa específica, normalmente entendida como a vontade divina. Para Darwin e a biologia evolutiva moderna, entretanto, os organismos vivos não existem devido a qualquer tipo de causa transcendental e a evolução acontece na medida em que organismos que já nasceram diferentes são selecionados pelo meio ambiente. Dessa forma, o pensamento darwiniano é antiteleológico por excelência. O pensamento teleológico, porém, permanece forte no pensamento biológico contemporâneo. A comissão internacional que define as regras para a nomenclatura de genes (HUGO) sugere que o nome de um gene deve ser dado de acordo com sua principal função. Entretanto, um gene pode desempenhar inúmeros papéis biológicos de forma que nomear um gene de acordo com uma função tida como principal é um ato reducionista e dá a falsa impressão (teleológica) de que este gene teria surgido “para” desenvolver tal função. Por isso, os genes deveriam ter nomes próprios ou ser nomeados seguindo padrões binomiais. Além disso, os genes deveriam ser classificados sistematicamente em grandes clados de acordo com sua relação de ancestralidade comum. Sabemos que os humanos são parentes mais próximos dos camundongos do que dos insetos, porém ainda não sabemos se o gene da insulina é um parente mais próximo do gene de DNA polimerase ou do gene da hexoquinase, por exemplo. Por isso, estudos aprofundados devem ser realizados para que possamos compreender a ancestralidade comum entre os genes de forma a classifica-los em grandes grupos acima das famílias. Atualmente, estamos realizando experimentos-piloto nos quais produzimos sequências ancestrais para tentarmos agrupar os genes do último ancestral comum universal (LUCA) em clados mais abrangentes. Esperamos assim podermos dar um pontapé inicial para essa classificação.
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O impulso molecular na evolução dos seres vivos Professor Dr. Gustavo Kuhn guto.cs.kuhn@gmail.com Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte MG Brasil,
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De acordo com a Teoria da Evolução sabe-se que uma nova mutação em um gene, inicialmente em um indivíduo, pode se tornar presente (fixa) em todos os indivíduos da população ao longo das gerações, através de dois processos: seleção natural (variantes vantajosas) ou deriva genética (variantes neutras). O impulso molecular pode ser considerado um terceiro processo evolutivo, quando variações genéticas podem chegar à fixação através de mecanismos moleculares e, em alguns casos, independentemente de seleção natural e/ou deriva genética. Este tipo de fenômeno pode ser melhor observado em famílias não-gênicas de DNAs repetitivos, como elementos transponíveis e DNAs satélites. Dois exemplos clássicos de impulso molecular foram apresentados: i) o caso do elemento P, transposon que invadiu o genoma da espécie cosmopolita Drosophila melanogaster há menos de 70 anos, a partir de apenas uma cópia, e que atualmente está presente em todos os indivíduos da espécie em um número de 50-100 cópias, e ii) o caso dos DNAs satélites centroméricos, onde milhares de cópias em tandem distribuídas em vários cromossomos compartilham o mesmo conjunto de variantes espéciesespecíficas, que são impossíveis de serem explicadas por eventos independentes de mutação. Em ambos os casos, é possível demonstrar que mecanismos moleculares que envolvem transposição e trocas genéticas entre cromossomos homólogos e não-homólogos são suficientes para explicar os padrões de evolução observados. Finalmente, foram apresentados exemplos de como o impulso molecular pode afetar a evolução dos seres vivos, seja através da geração de variantes que eventualmente podem se tornar adaptativas ou na geração de conflitos genômicos internos que podem resultar em incompatibilidades genéticas entre espécies.
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Agradecimentos Este evento contou com a presença palestrantes e debatedores da UFMG, UFPB e UFRJ, com a organização institucional do Centro de Coleções Taxonômicas da UFMG, aos quais somos muito gratos por tornar esta edição do Darwin Day uma realidade no campus da UFMG em Belo Horizonte, MG. A execução do evento contou com o apoio logístico e institucional da UFMG através do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (IEAT), do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e dos programas e pós-graduação em Genética, Zoologia, Microbiologia e Ecologia Conservação e Manejo da Vida Silvestre. Agradecemos também a Editora PROEX da UFMG pela institucionalização do evento no sistema de extensão universitária e por facilitar a publicação deste livreto. Agradecemos também o apoio da Sociedade Brasileira de Genética, representada aqui em Minas Gerais pela sua coordenação regional sudeste. Por fim, agradecemos a todos os participantes discentes, docentes, curiosos e pesquisadores que estiveram no Darwin Day, enriquecendo a discussão e promovendo o intercâmbio do conhecimento científico. os organizadores do Darwin Darwin UFMG 2018
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