Re-design Chanel

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JA N E T WA L L AC H

CH ANEL S E U E S TIL O E S UA V IDA

M A ND AR IM



Chanel - Seu Estilo e Sua Vida

AQUI ENTRA UMA PADRONAGEM

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JANET WALACH

CHANEL SEU ESTILO SUA VIDA

RIO DE JANEIRO EDITORA MANDARIM 2015


Título original: Chanel: her style and her life ©1998 by Janet Wallach Publicado sob acordo com Doubleday, uma divisão de Bantam Doubleday Dell Publishing Group, Inc. ©1999 by Siciliano S.A. (tradução) Todos os direitos reservados. Coordenação: Audrey Souza Aguiar Preparação: Sheila Fabre Diagramação: Gabriela Lacerda Capa: Gabriela Lacerda Revisão: Gabriela Lacerda Impressão e acabamento: Rio de Janeiro, Brasil

Dados internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Wallach, Janet Chanel, seu estilo e sua vida / Janet Wallach ; tradução Aulyde Soares - São Paulo : Mandarim, 1999 ISBN 85-354-0148-2 1. Chanel, Coco, 1883-1971 2. Desenhistas de moda - França - Biografia I. Título

99-3639

CDD-746.92092

Índice para catálogo Sistemático: 1. Desenhistas de moda : Biografia 2. Moda : Desenhistas : Biografia

746.92092 746.92092

2015 Proibida a reprodução total ou parcial. Os infratores serão processados na forma da lei. Direitos exclusivos para o Brasil cedidos à Siciliano S.A. Editora Mandarim Av. Raimundo Pereira de Magalhães, 3305 CEP 05145-200 - São Paulo - Brasil




SUMÁRIO Introdução

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Começo difícil

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Início precipitado com um herdeiro

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Escapadas com Capel

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Ligações teatrais

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Inspiração russa

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Imaginação poética

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Grandes amantes e jóias maravilhosas

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Deslumbramento do tailleur

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Namoros perigosos

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O número da sorte

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Fascinação eterna

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Créditos das fotografias e ilustrações Bibliografia Notas Índice remissivo

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Chanel - Seu Estilo e Sua Vida

INTRODUÇÃO

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oite de outono em Paris, 1970. As salas beges brilhavam com uma luminosidade especial no apartamento da rue Cambon, em cima do salão Chanel. As velas por toda parte refletiam sua luz nos lustres de cristal, nos grandes espelhos com moldura dourada, nas mesas chinesas laqueadas e nas caixas de prata com brasões aristocráticos. A lenha estalava na lareira, flores frescas enchiam o ar e pares de cervos de bronze mantinham-se como lacaios silenciosos. Duas convidadas para o jantar especial – em homenagem ao duque e à duquesa de Windsor – já tinham chegado. Diana Vreeland, que fora editora-chefe da Vogue, e Niki de Gunzburg, sua amiga e ex-editora de moda, tomavam drinques e conversavam com a anfitriã. Coco Chanel, pequena, magra, claramente no comando da situação, mantinha-se na pose que a tornara famosa: os ombros para trás, os quadris projetados para a frente, um pé na frente do outro, uma mão no bolso, a outra segurando o cigarro. Os olhos muito vivos e a boca larga e vermelha davam vida ao rosto de traços miúdos enquanto ela falava rapidamente, irradiando energia por todo o aposento. Quando o mordomo anunciou os convidados de honra, Mademoiselle Chanel, com um tailleur branco de seda abotoado de lado, caminhou apressadamente para a porta. Estendeu a mão para o duque, os olhos escuros fixos nos dele, e o convidou para entrar, sem olhar para mais ninguém. Conduzindo o ex-rei, passaram pelos biombos de Coromandel e entraram na sala de estar. Chanel sentou-se aconchegadamente ao lado dele no sofá de camurça cor de chocolate. Olhos nos olhos e quase murmurando, eles conversavam, somente os ocasionais acessos de riso interromperam o tom baixo de suas vozes. O encanto só foi quebrado quando um dos outros convidados lembrou a anfitriã que, afinal, tinham sido convidados para jantar. Depois de falar com o mordomo, Chanel 9


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levantou-se do sofá e separou-se do duque – mas só por um momento. À mesa, ele mais uma vez se sentava ao lado dela. Olhos nos olhos, retomaram a conversa íntima, como se não a tivessem interrompido. Os outros convidados observavam com respeitosa admiração. “Nunca em minha vida vitanta intensidade”, disse Diane Vreeland. “Evidentemente eles tiveram horas incrivelmente românticas juntos.”Coco Chanel tinha quase oitenta e cinco anos na noite em que recebeu o duque de Windsor para jantar, mas ainda era capaz de encantá-lo. Com sua energia hipnotizante, Chanel quase sempre fora o centro das atenções e quase nunca estivera sem uma companhia masculina. Milionária que se fez sozinha, fundadora do primeiro império da moda, ela capturara a atenção de milhões de mulheres no mundo todo e cativara dezenas de homens, entre eles alguns dos mais ricos, poderosos, talentosos e famosos da Europa. Chanel era intensa, determinada e impetuosamente independente. Celebrar Chanel e celebrar a vida no século XX, mas especialmente a maneira como ela viveu. Tudo o que fazia e dizia revelava seu estilo e seu bom gosto único e pessoal. Gostava de afirmar que era uma estilista de sucesso porque foi a primeira a viver a vida do século XX. Com ousado desdém pela sociedade tradicional, Chanel criou um mundo mágico que ainda hoje orienta nosso senso de estilo. Compreender seu sucesso é compreender sua força e seus objetivos. Nascida na pobreza e rejeitada pelo pai após a morte da mãe, ela desejava luxo, riqueza e independência. Tinha vocação para a moda - uma necessidade no seu tempo - e beneficiou-se disso. As roupas que criava para as outras pessoas eram as mesmas que criava para si, e seus modelos eram inspirados em tudo o que estava ao seu redor. Seu talento não se baseava no extravagante, mas no funcional. Seu dom era a habilidade para adaptar o que estivesse à sua volta: era o resultado que alcançava quando usava o suéter de um namorado para se aquecer ou quando se inspirava num chapéu de marinheiro e o adaptava ao seu próprio estilo. Qualquer coisa com que deparasse se tornava material para sua moda. Onde outros estilistas impunham, Chanel insinuava. Onde outros estilistas impingiam suas fantasias ou forçavam restrições, Chanel oferecia libertação, firme na convicção de que as mulheres podiam ser livres. Um paradigma da mulher moderna, ela queria independência e afeição, sucesso e 10


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segurança. Na verdade, o romance desempenhou um papel importante em sua vida, pois Chanel acreditava que a ausência do amor a fazia murchar. Precisava do apoio dos homens, e eles lhe deram isso e muito mais. Eles a introduziram na sociedade, ensinaram-lhe os segredos do mundo dos negócios e lhe ofereceram luxo. Deram-lhe inspiração, e ela contava com eles para receber amor. Chanel, porém, amava seu trabalho tanto quanto os homens. Ela certamente é lembrada por suas roupas - e poucos estilistas têm o nome vinculado a certos itens ou evocam imediatamente determinadas imagens da moda como ela: a bolsa Chanel, o sapato Chanel, o tailleur Chanel. Mas foi acima de tudo a atitude que ela oferecia às mulheres – ainda hoje desejada - que propiciou ao estilo Chanel atravessar quase um século.

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“O mais corajoso dos atos ainda é pensar com a própria cabeça.”


COMEÇO DIFÍCIL

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C

omo uma estudante zangada que rabisca o desenho que não ficou do jeito que esperava, Gabrielle Chanel destruiu as recordações de sua infância. Nasceu em Saumur, em agosto de 1883, mas passou seus primeiros anos na terra austera de Auvergne. Ela era rude como os fazendeiros da região: uma menina enérgica e colérica. “Eu sou a única cratera de Auvergne que ainda não foi extinta”, declarou Chanel aos setenta anos. Embora tenha tido de lutar arduamente para se livrar do passado. Era filha da pobreza e da infidelidade: a mãe, Jeanne, era frágil e doente, e o pai aventureiro, Albert, um vendedor ambulante do sul que comercializava suas mercadorias nos mercados. Albert sempre estava perambulando por outras cidades e com outras mulheres. Gabrielle adorava o pai de cabelos escuros e bigode e aguardava ansiosamente suas visitas esporádicas. A debilidade constante da mãe não permitia muitos momentos de felicidade em sua casa. Gabrielle tinha menos de doze anos quando a mãe morreu de tuberculose; poucas semanas depois os outros membros da família a rejeitaram. O pai a abandonou com as duas irmãs num orfanato em Aubazine. Ela nunca mais o viu. Sob os cuidados das freiras, Gabrielle sentia-se extremamente triste e carente, mas era infeliz demais para admitir isso. O orgulho era sua característica predominante e transparecia em seus olhos, na voz, nos gestos e nas ações. Sentia-se sozinha e irritada, rebelava-se contra tudo e todos. “Eu era uma criança revoltada”, confessou ela. No entanto, apegava-se à imagem do pai: um homem bonito, aventureiro, que falava inglês e adorava viajar. Ele foi o primeiro a chama-la de ”Coco”, Chanel contou mais tarde aos amigos. A opção de escolher entre ser freira ou continuar a estudar lhe foi permitida, e


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Chanel recusou-se a ingressar no noviciado. Então aos dezoito anos foi mandada, como um caso de caridade, para Notre Dame, um internato e convento em Moulins. A velha cidade, com sua catedral gótica e campanário, era muito mais atraente do que o orfanato. Mas a vida na escola era árdua. A disciplina era severa e a diferença entre ricos e pobres era muito acentuada. Proibida de se misturar com aquelas que pagavam, Chanel e as outras meninas indigentes moravam em alojamentos sem aquecimento, sentavam-se separadas nas classes, os alimentos e as roupas eram de qualidade inferior. Humilhada pela pobreza, estava sempre atenta ao modo como as pessoas viviam e com a aparência que tinham. Ela observava os tecidos macios das roupas das outras garotas, as grandes golas brancas e as gravatas de laço do uniforme dos meninos da escola próxima, os hábitos negros e as toucas brancas e engomadas das freiras. As salas espaçosas, os vitrais, as cruzes e os crucifixos a impressionavam. Ela aprendeu a costurar no internato, e seu primeiro emprego foi de balconista na Sainte-Marie, uma loja de lingerie e enxovais de Moulins. Logo arranjou um segundo emprego: nas horas livres trabalhava para um alfaiate, remendando as fardas dos oficiais da guarnição da cidade. No pouco tempo que lhe restava, ela visitava a família do pai, que morava perto. Ansiava por amor e aceitação, mas a amargura por ter sido abandonada a fazia sentir ao mesmo tempo raiva e afeição quando visitava seus parentes. Com as irmãs do pai, Julia e Adrienne, que era um pouco mais velha do que ela, Chanel praticava seu talento para a costura. Ela também aprendeu a montar e nem selava os cavalos quando cavalgava pelos campos. As casas dos parentes, porém, eram para ela um misto de angústia e de refúgio. Inúmeras vezes, e em várias versões, ela contou aos amigos sua primeira visita à casa de uma tia, onde chegou faminta - também de afeição. Era tarde, seu estômago estava vazio, e, depois de uma acolhida fria, serviram apenas ovos cozidos. A jovem Gabrielle recusou-se a comer, dizendo que detestava ovos - na verdade ela adorava ovos, mas estava muito magoada para demonstrar que precisava comer e aceitar a oferta. Nas refeições seguintes, Gabrielle teve de resistir às omeletes, aos suflês e pudins, e nem por um momento deixou que percebessem sua fragilidade. Num canto do sótão da casa de uma tia, Gabrielle encontrou outro tipo de alimen16


Chanel - Seu Estilo e Sua Vida

to. Escondidos no escuro, ela descobriu jornais com folhetins e devorou uma a uma as histórias românticas cujos heróis e heroínas deram forma às esperanças e aos sonhos da jovem Chanel. Acostumada às refeições modestas servidas nas casas das tias e no convento, os encontros durante o chá das cinco descritos nos folhetins despertaram seu desejo de estar a uma farta e elegante mesa ao estilo inglês, com bolos e sanduíches. Obrigada a se vestir de preto por tantos anos no orfanato e na escola, os figurinos fabulosos das histórias abriram seu apetite por roupas de cores vibrantes. Inspirada por um dos capítulos, desenhou um vestido de cores vivas para sua formatura: era de crepe da china cor de malva, adornado cuidadosamente com babados de veludo roxo. Então, com uma pose sofisticada, o corpo miúdo envolto no estilo extravagante do vestido, desceu a escada orgulhosamente e parou diante da tia, cuja expressão de espanto só podia ser comparada com o embaraço e a vergonha de Gabrielle. Mas a lição não foi em vão: linhas simples e cores sutis tornaram-se características de seus modelos. Coco Chanel em sua casa em Faubourg, St Honore, Paris, 1929

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“O dinheiro nunca significou muito para mim, mas a independência (conseguida com ele), muito.”


INÍCIO PRECIPITADO COM UM HERDEIRO 2



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epois de uma infância marcada pela pobreza, Chanel decidiu apagar essa lembrança com a riqueza, mas ela não estava pensando em casamento. Dinheiro para ela significava independência. Durante o dia, os sonhos a ajudavam a enfrentar a monotonia do emprego na loja; a noite, trabalhava num popular cabaré de Moulins. Os soldados que estavam na cidade, alguns deles jovens aristocratas, frequentavam os cafés-concerto, como eram chamados os clubes noturnos naquele tempo, onde podiam ouvir música, tomar cerveja e admirar os corpos bonitos das mulheres que lá trabalhavam. Eles não pagavam pelo entretenimento; as garotas recebiam para passar o chapéu de mesa em mesa. Com seu cabelo escuro, olhos brilhantes e corpo miúdo, Gabrielle subia ao palco e cantava as duas únicas músicas que sabia: Ko Ko Ri Ko e Qui qu’a vu Coco (Quem viu Coco), uma modinha sobre um cachorro perdido chamado Coco. O apelido pegou e os soldados barulhentos logo começaram a gritar: “Coco! Coco!” Embora sem as curvas voluptuosas das outras artistas, Gabrielle era extremamente habilidosa na arte da sedução. A pequena coquete falava baixinho, piscava sensualmente, olhava com desejo nos olhos dos iovens e logo era convidada para uma boa refeição ou recebia um presente por seus encantos. Mas como cantora sua carreira não se mostrava promissora: apesar das várias aulas, sua voz simplesmente não era boa o bastante. Ao que parecia, balconista ou costureira era tudo o que podia ser , até que conheceu Étienne Balsan. Oficial da cavalaria que ficara órfão recentemente e herdara a tecelagem da família, Balsan estava quase terminando o serviço militar quando convidou Chanel para ir a


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Royallieu, sua propriedade rural que ficava em Compiêgnes, não muito distante de Paris. Lá ele criava cavalos de raça e abrigava belas mulheres. Suas éguas estavam entre as mais velozes do país, corriam em Auteuil e Longchamp; suas mulheres estavam entre as mais disputadas e famosas da época, como Gabrielle Dorziat, a atriz, e Émilienne d’Alençon, talvez a cortesã mais conhecida da França. Um convite bom demais para ser recusado: Chanel agarrou a oportunidade de ser uma das cocotes de Balsan, uma grande chance de melhorar sua situação. Courtesan, horizontale, irre’guliêre, cocotte, não importa como fosse chamada, a idéia era de uma mulher sensual, extravagante e espirituosa que controlava a mente e o coração de homens poderosos. Para outros, eram um objeto degradado pelos homens, um brinquedo erótico cuja única finalidade era lhes dar prazer. Líderes ou subjugadas, heroínas românticas ou prostitutas impenitentes, não importa como as cortesãs eram consideradas, elas eram uma tradição francesa que se mantinha havia trezentos anos. Seu status era desejado pelas moças pobres que cresciam esperando um dia encontrar homens ricos para sustenta-las. Seus sonhos ultrapassavam a monotonia de um casamento entediado e da vida na classe operária. Como Gigi, a bela e divertida heroína do livro de Colette, elas aprendiam a agradar aos homens de todos os modos possíveis. As histórias das damas extravagantes se espalhavam rapidamente por toda a França. A vida social parisiense contava com o encanto das amantes e das cortesãs tanto quanto

Em vez dos ornamentos excessivos, Chanel usou uma grande pluma para decorar seu chapéu (Comoedia Illustré)

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Chanel - Seu Estilo e Sua Vida

Esquerda: Coco e Étienne Balsan, que criava cavalos de raça. Ao lado: Chanel gostou de Boy Capel mais do que qualquer outro de seus amantes

com a aristocracia e a burguesia. Se as duas últimas tinham posição e fortuna, as duas primeiras tinham classe , estilo, modos elegantes e muita inteligência. Elas eram celebridades da época, e jovens como Chanel observavam atentamente seus modos e suas roupas. Ignorando a classe média, as coquetes libertaram-se das mesquinhas regras sociais, entregando-se a um estilo com o qual as donas de casa sonhavam em viver e os maridos entediados, em compartilhar. Essas mulheres eram escondidas pelos amantes em grandes mansões e recebiam deles grandes somas de dinheiro; eles as cobriam de jóias e peles e a disputavam em duelos mortais. As roupas que elas usavam eram criadas pelos melhores costureiros; suas casas, ornamentadas com objetos de arte e antiguidades; suas festas, repletas de homens da mais alta esfera social; e, embora às vezes servissem de disfarce para homossexuais, mais frequentemente eram sinal de proeza sexual. Com suas roupas elegantes, de manhã as senhoras passeavam no Bois de Boulogne, desfilando em carruagens ou caminhando ao lado da elite. Durante a tarde visitavam as exposições artísticas, torciam nas corridas ou assistiam às partidas de pólo. Usando seus vestidos mais novos, nas noites de segunda-feira iam a ópera e nas de terça, ao teatro, uma vez ou outra jantavam no Maxim’s ou no Cafe de la Paix, divertindo seus amantes 23


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com as conversas inteligentes e, mais tarde, com interessantes desempenhos na cama. Para Chanel, as heroínas dos romances reviviam em Royallieu, aonde nobres e herdeiros como o barão de Foy ou Léon de Laborde, ou Jacques, o irmão de Balsan (que mais tarde se casou com a herdeira norte-americana Consuelo Vanderbilt), geralmente chegavam acompanhados de pelo menos uma jovem. Alegremente sedutoras, cuidadosamente vestidas, as demimondaines (assim chamadas por causa do título da peça de Alexandre Dumas) vestiam-se com camadas de babados e enfeites, os corpos exuberantes muito apertados nos espartilhos sob os vestidos de seda e cetim. Com decotes ousados, cintura muito fina e quadris generosos, seus corpos tinham a forma sensual da letra ‘esse’. Equilibravam com grande habilidade chapéus em forma de roda ou aqueles com abas viradas para cima repletos de penas extremamente longas, jóias, frutas ou flores. Essas mulheres belas e corpulentas contrastavam acentuadamente com Chanel, que tinha seios pequenos e corpo de garoto. No começo, ela estava encantada demais para fazer outra coisa além de assistir a tudo. E assim era o cenário: a opulenta casa em Royallieu com as cadeiras antigas entalhadas, cobertas com tapeçaria ou couro, objetos de prata que cintilavam nas mesas polidas e arranjos de flores que perfumavam as salas. A extravagância e a riqueza quase a deixaram sem fôlego. O palco e os atores eram complicados demais para sua compreensão. Ela competia com as cortesãs mais importantes da época, embora sua compleição infantil dificilmente pudesse rivalizar com aquelas formas avantajadas, sua situação financeira modesta jamais poderia chegar perto daquelas contas bancárias e seus modos simples não combinavam com o esplendor do ambiente. Mesmo assim, Chanel estava resolvida a não se deixar vencer. Suas respostas rápidas, que faziam com que ela mantivesse conversas inteligentes, e sua destreza na arte de montar tão bem quanto qualquer homem agradavam a Balsan seu amante gostava de cavalos quase tanto quanto de mulheres. E o mais importante, ela sabia se fazer notar, vestindo-se de forma diferente de todas as outras. Sabendo que seu corpo pequeno desapareceria sob a moda exagerada da época, Chanel exibia o pescoço comprido e o corpo esbelto ao usar as roupas simples que ela mesma fazia, além de pedir emprestado aos amigos camisas, gravatas, paletós e culotes. Mas o melhor eram os chapéus que ela criava e que chamavam a atenção. Em vez de esferas enormes e largas demais (que aumentavam quanto mais as mulheres tentavam 24


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disfarçar o tamanho dos quadris), e cheias de plumas, Chanel usava chapéus menores, com armação menos complexa, e os enfeitava, quando muito, apenas com um pequeno arranjo de flores ou plumas. As famosas cocotes ficaram impressionadas com a simplicidade de Chanel. A atriz Gabrielle Dorziat e a cantora de ópera Marthe Davelli encomendaram-lhe alguns modelos. Quando as fotos das duas usando os novos chapéus em cena apareceram nos jornais, Chanel começou a ficar conhecida. O periódico teatral Comoedia Ilustrée publicou fotos dela em 1910. Á medida que os outros estilistas adotavam seu estilo, Chanel ia se tornando uma importante estilista. Seus chapéus e acessórios eram mais do que complementos; criavam um estilo completo. No entanto, sua clientela naquele momento se limitava a Royallieu.

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“Uma mulher precisa de apenas duas coisas na vida: um vestido preto e um homem que a ame.�


ESCAPADAS COM CAPEL

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E

m 1912 Chanel conheceu Arthur “Boy’ Capel, que a deslumbrou com seu tipo moreno e perfil perfeito. “Ele era mais do que bonito, ele era magnífico”, lembrava Chanel, referindo-se aos olhos penetrantes, ao cabelo grosso e preto, ao bigode largo e ao perfil semelhante ao de Clark Gable. Sua origem britânica era incerta, mas sua habilidade para fazer dinheiro e amigos, bastante clara. Aos trinta anos, sua inteligência e astúcia nos negócios já lhe tinham rendido uma fortuna em transporte marítimo e carvão, enquanto seu carisma e talento para jogar pólo o levaram ao topo da lista social. Chanel o viu pela primeira vez em Pau, uma cidade elegante frequentada pelos amantes das corridas, e imediatamente se aproximou com todo o seu charme. Com a técnica coquete, fitou os olhos dele demoradamente, piscando, levou o colar aos lábios e deslizou o corpo para muito perto do dele. Logo Capel se tornou um visitante assíduo de Royallieu. Como Balsan, Capel tinha uma longa lista de amantes e imediatamente acrescentou à sua o nome de Chanel. Na verdade, durante algum tempo os dois homens e Chanel pareciam formar um ménage à trois. Porém, ao contrário de Balsan, Capel interessou-se pessoalmente por ela. Apreciava sua inteligência e sua curiosidade. Percebendo o interesse de Chanel, partilhava com ela seu fascínio pela numerologia, pelas religiões orientais e pelos livros. Quando cavalgavam juntos ela usava as roupas dele e, percebendo quanto parecia gostar delas, Capel insistiu em levá-la ao seu alfaiate para fazer um novo guarda-roupa. Quando Chanel dizia que não era bonita, ele a elogiava por sua originalidade. Em vez de desprezar seu interesse pela moda, julgando-o apenas uma maneira de passar o


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tempo, ele o reconheceu como a coisa mais importante para o futuro dela, encorajando suas ambições e estimulando-a a realizar seus sonhos. Capel deu a ela a confiança para seguir em frente. Ele era seu “pai, irmão e toda a sua família”, disse Chanel mais tarde, “a sorte grande da minha vida. Ele me formou, sabia como desenvolver o que eu tinha de diferente e único”. Chanel estava loucamente apaixonada por ele. Mas quando ela começou a insinuar a possibilidade de casamento, Capel não concordou. Amantes não eram aceitáveis como esposas, pelo menos não para os homens que mantinham amantes, e ele mantinha algumas. Mas ele estava disposto a ajudá-la nos negócios e, ao fazê-lo, tornou-se o alicerce do sucesso fenomenal de Chanel. Chegava a hora de Chanel vender seus Em 1913 a revista Femina fez uma ilustração de Chanel vendendo seus chapéus na loja da rue chapéus em Paris. Capel tinha um apartaGontaut-Biron, em Deauville mento na avenue Gabriel, onde podiam morar juntos, mas não havia espaço para que ela pudesse trabalhar. Com seu charme característico, ele convenceu o rival, Balsan, a ceder para Chanel seu apartamento, não muito distante do elegante Burberry’s, no Boulevard Malesherbes. Mais tarde Chanel se vangloriava de um modo bastante informal: “Consegui abrir uma butique sofisticada porque dois cavalheiros estavam como que disputando em leilão meu pequeno corpo ardente”. Apesar de satisfeita por estar em Paris em 1913, Chanel sentia-se apreensiva e pouco à vontade longe do mundo dos cavalos e das horizontales que conhecia. Na Place Vendôme ou na rue Royale carros com motoristas enfileiravam-se na frente das lojas, enquanto táxis e ônibus rodavam pelas ruas largas e sob o solo o metrô atravessava toda a cidade. Coristas elegantes e atrizes extravagantes sentavam-se às mesas dos cafés ao ar livre para 30


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tomar água Vichy, enquanto as mulheres mais imponentes e seus amantes tomavam martinis no Maxim’s. Todos cancelavam seus compromissos por telefone e trocavam histórias picantes da alta sociedade, comentando os quartos de vestir e os banheiros retratados na nova revista Femina. Toda a sociedade elegante ia ao Opéra e os filantropos davam bailes à fantasia. Patrocinadores do balé eram apresentados ao genial coreógrafo russo Serguei Diaghilev, cujos trajes e cenários orientais pareciam influenciar tudo, da música à moda. Os amantes do teatro maravilhavam-se com Sarah Bernhardt, os frequentadores de concertos embeveciam-se com a música de Darius Milhaud e as dissonâncias de Igor Stravinski, e os apreciadores de arte comentavam o talento do pintor cubista espanhol Pablo Picasso e do fovista francês Henri Matisse. Alguns falavam até sobre o voto feminino. Apavorada com a idéia de enfrentar a sociedade, Chanel não saia de casa - e o refinado Capel também não a levaria a lugar nenhum. Chanel não tinha as boas maneiras nem a cultura das cortesãs que desfilavam no Bois ou jantavam nos cafés elegantes. Eram essas mulheres que, com os vestidos de cintura alta e saia afunilada de Worth, Poiret e Paquin, determinavam o estilo e lançavam a moda. Certa vez, quando Capel a levou a um restaurante, Chanel comeu demais e partiu as barbatanas do espartilho. O amante teve de ajudá-la a fechar o vestido. Chanel jurou que nunca mais usaria espartilho. Ás vezes ela ia às corridas, frequentadas tanto por cortesãs quanto por condessas. O fato de estar na companhia Coco Chanel, na frente da primeira loja Chanel de Capel despertava grande interesse, e os chaem Deauville, 1913 31


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péus e os vestidos diferentes que ela usava provocavam inúmeros comentários. Palavras como ‘sobriedade’ e ‘severidade’ eram murmuradas por todos. Graças às fofocas e aos comentários, sua identidade foi descoberta. Qualquer amante de Boy Capel merecia um olhar mais atento, especialmente quando usava chapéus tão estranhos e parecia tão impertinente. Chanel trabalhava dia e noite e as demi-mondaines chegavam de manhã ao seu ateliê, supostamente mais por curiosidade do que para comprar. Tímida e medrosa a princípio, Chanel se escondia quando elas chegavam, mas depois de algum tempo aparecia para tecer comentários sobre os trajes muito elaborados que usavam e expressar sua desaprovação. “Como o cérebro pode funcionar dentro dessas coisas?” dizia com desdém enquanto olhava para os chapéus enormes. Apesar de seus modos rudes, seu sucesso com Capel evidentemente intrigava as mulheres. Embora o preço fosse alto, seu estilo despretensioso e jovem as atraía. Chanel confiava no próprio trabalho e, com a ajuda de uma mulher contratada por Capel para orienta-la na área comercial, logo conseguiu uma boa clientela e incentivava as amigas a recomendar sua loja para as conhecidas. Ás vezes atrizes e cantoras de ópera apareciam nas revistas usando suas criações. Depois de alguns anos, Chanel mudou sua loja para um espaço próprio, no primeiro andar da rue Cambon, e com ajuda financeira de Capel abriu outra, na cidade de veraneio de Deauville. Esse lugar elegante no canal inglês era o favorito de Capel e um centro de diversão para britânicos e franceses abastados. Na rue Gontaut-Biron, a mais movimentada da cidade, os convidados elegantes hospedavam-se no Normandy, o grande hotel que dava para a praia, e enquanto seus criados desfaziam suas malas Louis Vuitton, eles passeavam até a outra extremidade da praia na calçada de madeira. No cassino, construído pelo proprietário do Maxim’s, podiam ver os artistas mais conhecidos no teatro, no andar de cima, ou homens com cabelos esticados e mulheres bem penteadas dançando tango na pista do térreo. A maior atração, porém, eram as salas de jogo, onde, ao lado de marajás e sheiks, jogavam dados ou tentavam a sorte no bacará. Na avenida, lojas elegantes vendiam roupas caras aos ganhadores e outros visitantes elegantes. Henri de Rothschild passeava com suas elegantes roupas de flanela branca, a condessa Le Maroy chamava a atenção com seus vestidos de cores brilhantes e a mar32


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quesa de Noailles exibia seu chapéu enorme cheio de plumas. Em 1913, uma bonita jovem chamada Adrienne também desfilava, exibindo um chapéu simples e um sobretudo sem enfeites, ambos da butique de Gabrielle Chanel. Amiga íntima e na verdade a tia mais moça de Chanel, ela foi contratada para usar e promover suas roupas. A melhor publicidade, porém, era feita por Boy Capel. Com a jovem Chanel ao seu lado ele apostava nos próprios cavalos nas corridas; e com a animada torcida de Chanel, provava sua fama de melhor jogador de pólo no campo. Adorado pelos integrantes da alta sociedade, sua presença era sempre exigida em todas as festas e grandes eventos. Foi uma decepção enorme quando, certa noite, ele cancelou sua presença em um espetáculo de gala e mais tarde foi visto jantando sozinho com Chanel. Ver os dois juntos era um choque para as belas mulheres de Deauville. “Foi então que compreendi que Boy nos abandonou por sua causa” admitiu uma delas a Chanel. Historias sobre os dois espalharam-se rapidamente pela cidade e logo apareceram na imprensa. Para Chanel não poderia haver melhor publicidade do que ver seu nome e suas caricaturas nas colunas sociais. Quando o famoso cartunista Sem desenhou Capel segurando um taco de polo, uma caixa de chapéu e Chanel, seu sucesso foi reconhecido. E quando Sem fez uma série sobre moda sofisticada, atribuindo a Chanel o mérito de criar vestidos elegantes e inspiradores, ela estava a caminho da fama. O desconforto que Chanel sentia em Paris desapareceu em Deauville. Na Cidade a beira-mar, ela deliciava-se passeando ao ar livre, comia nos melhores restaurantes, vendia seus chapéus caros e até oferecia alguns acessórios as mulheres ricas. Quanto a temperatura, que as vezes era muito baixa, ela tentava se manter aquecida. Certo dia, para proteger-se do frio, ela fez o que sempre fizera e vestiu um suéter de Boy. Mas, em vez de vesti-lo pela cabeça, para não amassar a roupa que usava,

Para a mulher que trabalhava na I Guerra Mundial, o conjunto de Chanel com casaco estilo safári era prático e fácil de usar

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Chanel cortou a frente com uma tesoura, fez um acabamento com fita nas partes cortadas e acrescentou uma gola e um lago. Foi um sucesso assim que o vestiu. Sem ao menos saber o prego, outras mulheres quiseram um igual. Chanel vendeu dez quase de uma vez. “Minha fortuna teve como base aquele velho suéter”, observou ela secamente, “só porque eu sentia muito frio em Deauville”. A praticidade orientava seu estilo. O tecido feito a mão não tinha nada a ver com os bordados pesados ou os tafetás extravagantes, nem com os tecidos de lã populares na época. O jérsei de Chanel era maleável, macio e acompanhava seus movimentos, permitindo ao corpo a liberdade que ela amava. Não demorou para que Chanel começasse a usar o tecido para fazer outras pegas de roupa, especialmente conjuntos de saia e casaco. Mas o jérsei feito a mão era espesso demais para seu gosto, por Chanel tomou emprestada a ideia dos suéteres com isso procurou outra versão, mais fina e desenhos geométricos e a usou em suas criações de malha. Quando ela pegou um suéter de Capel e o mais leve. Seu pragmatismo a levou na cortou, o sucesso foi imediato. direção certa. A tecelagem de Rodier mostrou a ela alguns tecidos feitos a maquina, que esperava vender para a fabricação de roupa de baixo masculina, e, quando os viu, Chanel teve certeza de estar no caminho certo. O tecido bege fora um fracasso para Rodier, e sem dúvida Chanel achou que podia barganhar e pagar um bom preço. Disse que havia encontrado o que estava procurando e, para surpresa de Rodier, fez um pedido de mais material do que a tecelagem tinha em estoque. Quando o tecido chegou, Chanel o cortou em linhas simples, mantendo o estilo descontraído e sem muitos detalhes. Enquanto as saias dos outros estilistas eram compridas e estreitas, justas nos tornozelos, usadas com túnicas sobrepostas que iam até os joelhos, as de Chanel eram soltas e rodadas, além de mais curtas. Suas roupas sem excesso de tecido ou adornos, tão diferentes daquelas que pareciam impedir os movimentos, faziam com que as mulheres se sen34


Chanel - Seu Estilo e Sua Vida

tissem mais jovens e sensuais. Foram aceitas imediatamente. O momento não podia ser melhor: enquanto Chanel mudava a moda, os europeus mudavam seu estado de espírito.

O estilo simplificado de malha e as saias mais curtas criadas por Chanel em 1916 iniciaram a moda de roupa prática (Les Elégances Parisiennes)

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Um ano apenas depois de Chanel abrir sua loja, Deauville sofreu uma reviravolta. Com o começo da Primeira Guerra Mundial, em agosto de 1914, todos os homens foram convocados, e os aristocratas que desfrutavam as férias de repente fizeram as malas e voltaram para casa. O movimentado balneário era agora uma cidade-fantasma, com as casas vazias e as que davam para a praia trancadas. Porém, seguindo a sugestão de Boy Capel, Chanel manteve as portas da loja abertas. Capel era amigo do oficial francês Georges Clemenceau e do Primeiro-ministro britânico Lloyd George e, graças a seus bons relacionamentos, estava conseguindo contratos de quase exclusividade para o fornecimento de carvão. Sua fortuna crescia e ele tinha certeza de que muitos outros iam enriquecer com a guerra. O palpite astuto do homem de finanças fora certeiro. Uma multidão de especuladores do mundo todo logo invadiu Deauville: comerciantes de armas da Grécia, criadores de gado da Argentina, fabricantes de seda da China, cultivadores de frutas cítricas da Florida, todos se dirigiram ao famoso balneário. A medida que a guerra se aproximava das cidades, as famílias abastadas fugiam de suas casas, procurando a segurança de Deauville, levando poucos pertences. Precisando desesperadamente de roupas novas, as mulheres iam a loja de toldo branco escrito em preto que identificava a butique de Chanel. Era o (único lugar para comprar o que precisavam. Nem mesmo os pregos exorbitantes, de três a sete mil francos por um vestido (o equivalente, em média, a dois mil dólares hoje) as impedia de comprar. Com a Europa transformada em campo de batalha e os homens lutando no fronte, as mulheres passaram a desempenhar um papel ativo. Nem mesmo as mais ricas mantiveram o habito de mudar de roupa a toda hora. Em vez disso, elas decidiram se mobilizar, servindo como enfermeiras ou atendentes, trabalhando nos escritórios da Cruz Vermelha, reunindo comida para os que tinham fome, arranjando empregos para as mulheres pobres. Essa nova vida as obrigava a longas caminhadas, a andar de bicicleta ou de ônibus, então elas precisavam de roupas que permitissem liberdade de movimentos. Queriam um estilo simples e despojado, sem lagos ou barbatanas, que dispensasse o auxilio de criadas para se vestir. O estilo de Poiret e Paquin que realçava a linha do busto, os vestidos de cintura alta e as saias justas até o tornozelo limitavam a locomoção; as criações fluidas de Chanel eram mais adequadas. Suas roupa práticas e confortáveis condiziam melhor com a vida da época. 36


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Seus modelos eram tão procurados que em 1915 ela abriu outra loja, uma casa de alta-costura em Biarritz. Ficava perto da fronteira espanhola, no caminho dos que visitavam o palácio de verão do rei, a nobreza russa em férias e ricos aproveitadores da guerra da Espanha neutra. Nos dois lados do Atlântico Chanel era noticia. Nos Estados Unidos, a revista Harper’s Bazaar mostrava “um vestido chemisier encantador”, uma das peças da coleção de Biarritz, e a Vogue logo em seguida mostrou outras criações de Chanel. Um casaco estilo safari e uma saia de jérsei, pelerines enfeitadas com peles e casacos com bolsos grandes, tudo dando a impressão de liberdade e conforto. Na verdade, os Estados Unidos não só promoveram, mas também inspiraram seu estilo. Um vestido de cetim estilo caubói, com franjas de seda, foi destaque na Vogue. Chanel começava a se tornar um exemplo da nova mulher. Magra, quadris estreitos e quase sem seios, ela se desfez do espartilho, encurtou a saia, cortou o cabelo e bronzeou o rostinho jovem. Vivia abertamente com um homem que amava, sem ser casada, e tinha independência financeira como empresaria de sucesso. Chanel deixou as lojas sob a responsabilidade de outras pessoas e voltou para Paris, para se concentrar no andamento da sua empresa. Cada novo problema com que se deparava a conduzia a novas ideias. Como as mulheres não podiam mais usar o carro com motorista para fazer compras quando chovia, precisavam de capas para se proteger da Chuva. Chanel inventou um estilo de capa com revestimento emborrachado inspirada nas linhas dos casacos dos motoristas, com bolsos grandes e presilhas ajustáveis nos pulsos. Originais, nas cores azul e rosa, ou básicas em preto e branco, fizeram tanto sucesso que uma freguesa comprou três, uma de cada cor. E em pouco tempo as roupas de Chanel eram compradas por Clientes desde a América do Norte até a Argentina à Rússia. Com as oficinas repletas de trabalho, Chanel ganhou o suficiente para pagar Capel. Deixou o apartamento onde morava com ele e mudou-se para outro, só seu, no Quai de Tokyo. Mudou também a loja para alguns números acima, do 21 para o 31 da mesma rue Cambon. Era 1919, e, mais tarde, Chanel diria que “tinha acordado famosa”. Aos trinta e dois anos estava no topo do mundo. Chanel sempre soube que Capel era um homem volúvel. Embora isso não a agradasse, era um fato da vida que ela aceitava. Se ela não poderia tê-lo completamente, pelo 37


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menos o tinha na maior parte do tempo. Porém, quando os negócios e o trabalho dele na inteligência Britânica o forçaram a voltar para Londres, Capel promoveu uma mudança radical na própria vida. Não mais satisfeito com sua coleção de amantes, começou a procurar uma esposa. Quase no fim da guerra, o solteiro mais cobiçado da França anunciou sua decisão de se casar. Sua noiva era Diana Wyndham, filha de um lorde inglês. A rejeição de Capel deixou Chanel desconsolada. Os sinais, contudo, sempre estiveram evidentes: Capel era um homem em ascensão e Chanel não tinha a classe nem a fortuna para ajuda-lo. A não ser por algumas pequenas coisas, como um anel de ouro e topázio que ela guardou durante toda a vida, disse aos amigos que devolvera a ele todos os presentes que recebera. Tenha ou não devolvido, a verdade é que ela se sentiu traída; no entanto, não estava disposta a desistir dele, nem Capel queria cortar completamente os laços que os uniam. Mesmo casado e com uma filha, que nasceu menos de nove meses depois do casamento, em suas viagens a França Capel continuava a ver Chanel. E ela continuou encorajando esses encontros. Dois dias antes do Natal, em 1919, Capel se despediu na casa dela, perto de Paris, e partiu em seu carro esporte para passar as festas com a mulher, no sul da França. Mas na estrada para Cannes um pneu estourou e o motorista não conseguiu impedir que o carro batesse. O motorista ficou apenas ferido; Capel morreu. A noticia de sua morte foi devastadora. Primeiro, o desaparecimento do pai, depois a morte de Capel. Pela segunda vez Chanel perdia o homem mais importante em sua vida. No momento em que o sucesso financeiro estimulava sua alma, o abandono fazia seu coração sofrer. A tragédia da morte de Capel a deixou extremamente melancólica. Com o pai ela colhera o gosto do amor, 38


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mas Capel oferecera a ela um verdadeiro banquete, no qual Chanel experimentou o que era amar e ser amada. Fez com que ela tivesse acesso ao mundo mágico dos livros e ao mundo místico daws religiões orientais. Proporcionou-lhe o reconhecimento da própria força e a ensinou a confiar em si mesma. Ele sempre dizia a ela para não se esquecer de que era uma mulher. Ensinou-lhe noções fundamentais de comércio, finanças, e na ocasião de sua morte ela ganhava o bastante para ser auto-suficiente. Em seu testamento Capel provou quanto se importava com ela: deixou a maior parte de sua fortuna de setecentas mil libras (cerca de vinte milhões de dólares hoje) para a mulher e a filha, mas separou quarenta mil libras (mais de um milhão de dólares) para Gabrielle Chanel. Chanel jamais amou outro homem como amou Capel. Durante toda a sua vida referiu-se a ele como o único homem de quem realmente gostou. Onde quer que estivesse, e com quem fosse, quase sempre se referia à experiência que adquirira em sua vida com ele. Houve outros homens e outros romances, mas foi com Capel que aprendeu que paixão era muito menos importante do que o “calor, a ternura, a afeição, a compreensão”. Isolada e deprimida, ela se afastou dos amigos e dedicou todo o seu tempo e interesse ao trabalho.

Chanel, sempre prática, foi uma das primeiras a mostrar capas de chuva emborrachadas. Ela se inspirou nas capas dos motoristas.

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A Vogue mostrou, em 1919, o vestido de veludo preto com azeviche, uma elegante combinação. O preto se tornaria uma cor marcante.

Em 1916 a Vogue mostrou um vestido de tule preto de Chanel, enfeitado com pele e bordado com pequenas contas de madeira. Encantador vestido de Chanel, enfeitado com pele, mais curto e mais macio que os de seus rivais Patou e Paquin, em 1916.

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O vestido chemisier de jérsei com bolsos e enfeitado com botões era perfeito para a mulher que trabalhava.

Em 1916, o caubói norteamericano inspirou Chanel na criação do casaco de cetim preto com franja de seda, adornado com um lenço amarrado no pescoço.

Chanel gostava de bolsos profundos para pôr as mãos e fileiras de botões nas roupas que criava. Em 1916 ela adornou este casaco de veludo marrom com pele peruana.

O vestido frágil de renda chantily preta enfeitado com azeviche foi mostrado na Vogue em 1919.

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“Vista-se mal e notarão o vestido. Vista-se bem e notarão a mulher.”


LIGAÇÕES TEATRAIS

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e um modo ou de outro, o teatro sempre esteve presente na Vida de Coco. Desde os primeiros tempos em Moulins, onde fez o que pode para ser cantora, até os anos em Royallieu, onde pela primeira vez as artistas usaram seus chapéus, e sua amizade corn atrizes e seu sonho de se tornar uma estrela, Chanel procurava avidamente a companhia de atores e atrizes. Alguns anos antes, em Paris, ela pedira para conhecer Cécile Sorel, uma atriz sobre a qual todos os cronistas escreviam e cuja foto aparecia constantemente nas revistas e nos jomais. Sem dúvida com a esperança de ter Cécile Sorel como cliente, Chanel insistiu com Boy Capel, que conhecia todo mundo, para ser apresentada a ela. Na primavera de 1917, recebeu o convite para jantar com a extravagante estrela do teatro. No célebre apartamento da atriz, no Ouai Voltaire, o ambiente era apropriadamente teatral: tapetes de pele de leopardo espalhados pelo chão de mármore e cortinas de pele de leopardo nas janelas. Na sala, as paredes eram cobertas com painéis de madeira dourada, fileiras de livros com capa de couro enchiam as estantes, num canto estava um biombo de Coromandel e uma poltrona em forma de gôndola juntava-se a uma coleção de antiguidades. Nada disso impressionou Chanel. Com seu olho crítico e língua afiada, ela descreveu o apartamento para uma amiga: a prata nao tinha brilho, os móveis não eram polidos, “os lambris ásperos pareciam argamassa, a toalha de mesa dourada não era de ouro e estava muito suja”. Porém, admitiu que gostara da anfitriã, uma estrela das comédias de Molière, e que os outros convidados, como o escritor Jean Cocteau, o muralista José-Maria Sert e sua amante Misia Edwards, eram bastante interessantes. Se Cécile Sorel era uma figura importante no palco, Misia Edwards era a figura


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central na vida artística de Paris. De uma família aristocrática polonesa, lendária no mundo musical, era uma pianista talentosa, bem como anfitriã incansável, que recebia poetas, escritores, pintores e músicos. A essência da mulher da belle époque, sua personalidade forte servia de modelo para escritores e sua beleza de formas arredondadas fizeram dela a musa de alguns dos mais brilhantes artistas da época. Marcel Proust a usou como base para seu personagem a princesa Yourbeletieff em No caminho de Swann. Toulouse-Latrec, Renoir, Vuillard e Bonnard pediram que posasse para eles, e hoje os retratos que pintaram de Misia estão nos museus do mundo inteiro. Misia era famosa por seu charme e por seus vários romances. Quando estava casada com um primo rico, Thadée Natanson, tornou-se amante do magnata da imprensa Alfred Edwards. Mas, então casada com Edwards, apaixonou-se pelo artista espanhol José-Maria Sert e abandonou o marido. Foi um pouco antes de seu terceiro casamento, dessa vez com Sert, que Chanel a conheceu. Sentada à mesa de jantar em frente a Misia, nas cadeiras de tom vermelho-vivo que enchiam a sala, Chanel a atraiu com uma força quase mística. Embora muito quieta, aparentemente tímida e ainda pouco conhecida, o estilo evidente de Chanel e sua inteligência ágil despertaram a curiosidade da mulher mais velha. Durante todo o jantar Misia mal pôde tirar os olhos dela. E no fim, quando os convidados começavam a se despedir, Chanel pôs seu casaco de veludo vermelho de peles - que aparecera na Vogue - nos ombros de Misia. Essa foi uma noite decisiva na carreira de Chanel: Ganhou uma nova cliente, Cécil Sorel, e acabou criando os vestidos de jérsei que a atriz usou na peça L’Abbé Constantin; sua conquista mais importante, no entanto foi a sólida amizade com Misia que estava se iniciando. Cécile Sorel era uma das mais conhecidas atrizes da França. Foi em seu apartamento que Chanel conheceu Misia Sert.

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Extrovertida e influente, Misia adorava descobrir novos talentos e revelá-los ao mundo. Um de seus melhores amigos era o atraente russo Serguei Diaghilev, que introduziu a companhia Ballets Russes na França. Falar da vida alheia era a parte central dessa amizade, mas nenhum dos dois se limitava aos escândalos. O grande Diaghilev, com suas capas esvoaçantes e sua imaginação fértil, tinha uma profunda influência no mundo da dança, da música, dos cenários, dos figurinos de teatro e da moda. Misia se encarregou de seu maravilhoso grupo de artistas, oferecendo a eles apoio moral e financeiro. Na verdade, com sua curiosa personalidade ela reinava no pequeno grupo como sua relações públicas durante o dia e sua anfitriã à noite. E fazia questão de fazer com que o trabalho deles tivesse a atenção que merecia. Já percebendo talvez o gênio de Chanel, Misia resolveu cultivar aquela nova amizade. As duas tornaram-se companheiras inseparáveis. José-Maria impressionou-se com a fascinação de sua amante por outra mulher que parecia tão diferente dela. No dia seguinte ao jantar no apartamento de Cécile Sorel, Misia foi a rue Cambon para visitar Chanel em sua loja, e a estilista convidou Misia e José-Maria para jantar com ela e Boy Capel em seu apartamento naquela noite. Os meses foram se passando e, já que Capel começou a se demorar mais em suas visitas à Inglaterra, Chanel ficou com mais tempo disponível para estar com a nova amiga. Aos poucos ela começou a se afastar do mundo dos homens ricos e das corridas de cavalos, preferindo o mundo das artes. Logo depois da morte de Capel, porém, Chanel se isolou de todos. Mergulhou durante meses no desespero, até que Sert, na esperança de animá-la, convidou-a para sua viagem de núpcias com Misia. Seriam as primeiras férias de Chanel em muitos anos. Ela aceitou o convite e os três partiram para Veneza. O extravagante José-Maria - cujos trabalhos eram encomendados pelos Sasson, Rotschild e Phipp e cujos murais decoravam as paredes do Waldorf-Astoria e do Rockfeller Center em Nova York - foi seu guia na Itália. Com seu acentuado sotaque catalão ele falava da beleza dos prédios e com sua riqueza de informações dava vida aos quadros. A exuberante Misia fazia o papel de diretora. Juntos levaram Chanel de um museu a outro, de um restaurante a outro, o tempo todo dando verdadeiras aulas de arte e da arte de viver. Num dos bem-organizados jantares que os Sert ofereceram em sua honra, Chanel foi apresentada às pessoas mais importantes que Misia conseguiu encontrar por lá: o príncipe da Grécia, a condessa Volpi e outros, todos inteligentes, bem-vestidos e bem-relacio47


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nados. Certa noite, num café ao lado dos canais, os Sert encontraram Diaghilev, e este, notando a beleza de Chanel, queixou-se da falta de patrocinadores para reapresentar um de seus balés favoritos. Durante a estada em Veneza encontraram também o brilhante compositor Igor Stravinski. Lentamente, Chanel foi abandonando a depressão. De volta a Paris, Misia introduziu Chanel em seu círculo especial que incluía o patrono das artes, o conde Étienne de Beaumont, o dramaturgo Jean Cocteau, o pintor Pablo Picasso, o poeta Pierre Reverdy e, é claro, Diaghilev. Foi a generosidade de Chanel que mais o encantou. Lembrando-se de sua tristeza por não poder encenar um certo balé, ela resolveu ajudá-lo. Sem se anunciar, visitou Diaghilev no hotel e deu a ele um cheque para cobrir as despesas de A sagração da primavera. A única condição imposta por ela foi a de que ele não poderia revelar aos amigos quem o financiara. Diaghilev jamais esqueceu esse surpreendente gesto de magnanimidade de Chanel. Embora sua generosidade sem dúvida a tornasse ainda mais atraente, Chanel foi aceita quase imediatamente pelos artistas. No mundo estimulante em que viviam, o ar era carregado de criatividade e as idéias desafiavam a mente. A guerra desfizera as antigas noções de realidade, e as respostas artísticas do dadaísmo, surrealismo e cubismo podiam ser compreendidas por Chanel. Sua atitude minimalista em relação à moda que criava não estava muito longe das idéias da arte abstrata. Do mesmo modo como ela adorava estar com a avant-garde, eles adoravam sua companhia. Jamais questionaram suas referências, nunca se importaram em saber se vinha de familia aristocrática ou indigente. O que contava para eles era o talento, a mente ágil, a inteligência, e Chanel possuía essas três características. Mas se o mundo artístico era acessível, a sociedade extremamente fechada da França não o era. Misia agia como publicitária e amiga de Chanel, garantindo convites para todos os tipos de festas, mas os cobiçados bailes de máscaras estavam além de sua influência. Essas festas sofisticadas, dadas por aristocratas, cujos convidados eram o que havia de “melhor’ na sociedade, destinavam-se à elite; estilistas não faziam parte dessa classe. Eram eventos de grandes proporções: a decoração levava meses para ser preparada, assim como as fantasias extravagantes, a comida elaborada e até a entrada coreografada de cada convidado. Quando a condessa e o conde de Beaumont convidaram José-Maria Sert para criar a decoração de um de seus bailes de máscaras, chegaram a pedir algumas ideias a Chanel. 48


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Mas o nome dela não constou da lista de convidados. Para eles, uma estilista era apenas uma vendedora de roupas, uma comerciante, não alguém de seu nível. Na noite do grande baile, Misia se recusou a comparecer sem Chanel. As duas mulheres ficaram do lado de fora, observando os convidados, falando sobre cada um que chegava. Mas, enquanto Misia se divertia com a situação, Chanel não via graça no fato de ter sido ignorada. Um ou dois anos depois, porém, Chanel se tornou frequentadora de todos os bailes de máscaras, uma das primeiras estilistas de moda a ser aceita pela alta sociedade. Misia convidou Chanel para ir a sua casa noturna favorita, Le Boeuf sur le Toit, um bar pequeno e barulhento em Montparnasse, onde uma banda de negros tocava Mozart e jazz e os clientes bebiam e batiam nas mesas como se estivessem em seus clubes particulares. Por iniciativa de Jean Cocteau, o lugar tornou-se o ponto de encontro de Diaghilev, dos compositores Erik Satie e Darius Milhaud, do bailarino Serge Lifar, dos escritores Cocteau e Maurice Sachs e de aristocratas como o príncipe de Gales e o conde de Beaumont. Uma vez ou outra, o amante de Diaghilev, Niiinsky, também aparecia, bem como o poeta sombrio Reverdy e seu amigo íntimo, o pintor Pablo Picasso. Chanel sentiu-se atraída pelo viril artista espanhol, impressionada com seus olhos penetrantes e a força de sua presença. Sonhou ser sua amante, mas a tentativa foi em vão. Casado recentemente com Olga Koklova, uma das belas bailarinas de Diaghilev, Picasso estava muito envolvido com a mulher para dar atenção a Chanel. Mesmo assim, mais tarde ele se tornou um cliente assíduo quando sua mulher começou a fazer compras na loja de Chanel. E, eventualmente, quando a mulher estava fora da cidade e ele se sentia só, Chanel o atraía para seu apartamento. Ela jamais deixou de admirar Picasso. Referindo-se a ele como “um grande amigo”, Chanel venerava sua energia e determinação, visitava o estúdio dele com frequência e foi sua admiradora por vinte anos; e Picasso sempre a chamava de “a mulher mais sensata de toda a Europa”. Em vez do pintor espanhol foi o compositor russo Stravinski que, como disse Misia, “se apaixonou perdidamente por Chanel”. Quando se conheceram, ele já era famoso por suas obras O pássaro de fogo, Petrusíika e A sagração da primavera e notou imediatamente a beleza de Chanel e sua mente inquisitiva. Logo depois, ela generosamente emprestou a ele sua casa em Garches, onde ele foi morar com a mulher e os filhos. Embora tímido e introvertido, no outono de 1920 Stravinski via Chanel todos os dias, quando lhe dava aulas sobre música e falava sobre a vida na Rússia. Na verdade, ele a 49


estava cortejando. E a persistência do compositor venceu: Chanel sucumbiu a suas investidas. Quando ela lhe contou que temia que a esposa viesse a saber, Stravinski disse que ela já sabia. A quem mais além da própria mulher, explicou ele, seria possível confiar um segredo tão importante? Mas o caso entre eles durou pouco. No fim do romance, Stravinski deu a Chanel um par de abotoaduras e um precioso ícone russo, e, assim que ele voltou para a família (pelo menos por algum tempo), ela começou a sair com outro homem, agora com o crédito de ter transformado Stravinski de um exilado de guerra ingênuo em um homem do mundo.


2ª Edição Novembro de 2015 Impressão Tesouro Laser Miolo Offset 90g/m² Capa Couché Brilho 300g/m²


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oco Chanel tem uma sensualidade que desafia o tempo, uma naturalidade ainda desejável, um minimalismo que continua sendo a marca do bom gosto. Sua aparência era individual; sua perspectiva, universal. Ela fazia moda para a sua época, e ao mesmo tempo criava roupas não subjugadas ao tempo. A moda se transforma, mas o estilo permanece, dizia ela. Era feminina, sem ser exagerada; sedutora, sem ser obscena; moderada, mas jamais enfadonha. Encantadora, resistente, independente e segura, Chanel era, e ainda é, a perfeita personificação dos comportamentos e hábitos que compõem o que se chama estilo.

ISBN 85-354-0148-2


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