TGI II Gabriel Botasso IAU.USP

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CIDADE E MEIO AMBIENTE

proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do Córrego do Mineirinho, São Carlos (SP)

GABRIEL BRAULIO BOTASSO

TRABALHO DE GRADUAÇÃO INTEGRADO II Instituto de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo - IAU.USP COMISSÃO DE ACOMPANHAMENTO PERMANENTE (CAP) Prof. Drª. Luciana Bongiovanni Martins Schenk Prof. Drª. Simone Helena Tanoue Vizioli

São Carlos 2018



FOLHA DE APROVAÇÃO

CIDADE E MEIO AMBIENTE proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do Córrego do Mineirinho, São Carlos (SP)

Trabalho de Graduação Integrado apresentado ao Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, USP – Campus de São Carlos. GABRIEL BRAULIO BOTASSO

BANCA EXAMINADORA

Prof. Drª. Luciana Bongiovanni Martins Schenk

Instituto de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo - IAU.USP

Prof. Drª. Simone Helena Tanoue Vizioli

Instituto de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo - IAU.USP

Professor convidado Aprovado em:

/07/2018



AGRADECIMENTOS Aos meus pais, que, independentemente das circunstâncias, fizeram o que foi possível para que eu conseguisse realizar meus sonhos (e não foram poucos, nem se esgotaram...). Aos meus professores, principalmente Luciana Schenk e Tomás Moreira, que me orientaram durante esta jornada (nada fácil) que foi o TGI. Vocês me ensinaram muito e souberam me divertir, me acalmar e me incentivar nas horas necessárias. Aos meus amigos, que, na verdade, são também minha família. Nós vivemos momentos muito felizes juntos e, mesmo nos mais difíceis, pudemos nos apoiar e seguir em frente. Você sabem despertar um sorriso no meu rosto.

UMA DEDICATÓRIA ESPECIAL A Simone Vizioli, minha orientadora para todas as ocasiões, inclusive para este TGI - quem imaginaria? Aqui ficam meus agradecimentos a você, que me acompanhou com empenho e paciência em três iniciações científicas, uma monitoria, um intercâmbio, este TGI, congressos... E a lista não acabou, porque ainda tem o mestrado a partir de agosto!



RESUMO Nota-se, atualmente, um claro panorama de preponderância do ideal de lucro e de reprodução do capital sobre a qualidade do desenho urbano, o qual enxerga a natureza como obstáculo a ser superado, desconsiderando seu potencial enquanto elemento de qualificação do espaço das cidades. Diante de tal contexto, este projeto propõe um estudo sobre a inserção de parâmetros ambientais no processo de desenho das cidades, um cenário em que estas passem a ser desenhadas também a partir de questões ambientais. Tal estudo espacializa seu desenho na cidade de São Carlos, a qual, historicamente, chancelou a invisibilidade da natureza no espaço urbano, ocupando áreas de várzea, tamponando seus cursos d’água e, como consequência disso, convivendo com as enchentes; ao mesmo tempo, é detentora de um enorme potencial paisagístico. Utilizando as bacias hidrográficas como unidades de planejamento e paisagem, foi escolhida a Bacia do Córrego do Mineirinho como área de intervenção, por se encontrar no vetor de expansão da cidade, ao Noroeste; por ainda conservar boa parte de sua área não ocupada; por representar, em um futuro próximo, uma área que será densamente habitada quando forem transferidos para o Campus 2 os alunos de graduação da USP São Carlos. Assim, a Bacia foi ocupada com um plano urbano que inclui: ruas desenhadas a partir do relevo, com baixa declividade, tendo o pedestre como protagonista; um sistema de espaços livres que se conecta com os bairros adjacentes e dispõe espaços de lazer à população; um sistema de mobilidade urbana com a caracterização de suas vias; a aplicação de elementos da infraestrutura verde. Palavras-chave: Desenho ambiental urbano. Sistema de espaços livres. Córrego do Mineirinho. Infraestrutura verde.



UM PERCURSO EM 3 MOMENTOS

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QUESTÕES A perda de laços territoriais e a invisibilidade da natureza nas cidades contemporâneas Em busca de uma visão sistêmica

UNIVERSO PROJETUAL E LEITURAS

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São Carlos: entre o potencial paisagístico e a visão do meio ambiente como um obstáculo

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Cartografias e leituras

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Recorte projetual: Bacia do córrego do Mineirinho

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AÇÕES PROJETUAIS Diretrizes gerais do projeto: bacias hidrográficas como unidades de planejamento e o desenho ambiental urbano

61 62

Sistemas e camadas do projeto

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Recorte projetual 1

74

Recorte projetual 2

84

Infraestrutura verde

104

REFERÊNCIAS

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“A abordagem da questão ambiental nas grandes cidades ainda é incipiente, embora ela venha merecendo um maior grau de preocupação por parte da sociedade. Os problemas ambientais continuam sendo tratados de modo estanque e fragmentado e as cidades continuam crescendo à revelia dos interesses da sociedade na construção de um ambiente saudável para se viver. Interesses econômicos particulares, ausência de planejamento e desconhecimento das potencialidades e limitações que operam a relação entre cidade e meio ambiente favorecem a degradação ambiental, como também a introdução de soluções simplistas que, atuando no varejo, efetivamente pouco colaboram na recuperação ou preservação de espaços satisfatórios para um equilíbrio duradouro entre urbanização e meio ambiente.” (SCHUTZER, 2012, p. 13).


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QUESTÕES


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

A PERDA DE LAÇOS TERRITORIAIS E A INVISIBILIDADE DA NATUREZA NAS CIDADES CONTEMPORÂNEAS

As cidades são constituídas por inúmeras camadas, as quais se sobrepõem e as diferentes sobreposições geram distintas experiências ao serem experenciadas; uma dessas camadas é o ambiente natural, base a partir da qual tudo se inicia e fonte de potenciais significativos para o aprimoramento da experiência urbana. Entretanto, nas últimas décadas, nota-se um claro desgaste/desequilíbrio na relação homem-natureza, havendo uma sobreposição massiva de ações antrópicas sobre as camadas naturais - o processo de produção dos espaços urbanos parece dar as costas ao seu potencial. A propósito, “Milton Santos (1992)1 nos diz que a história do homem é a de um progressivo afastamento da natureza, na medida em que, cada vez mais, há a criação de objetos que servem como intermediários nessa relação”. (SCHUTZER, 2012, p. 36)2. Essa passagem de Schutzer indica o surgimento de algo entre ambos, homem e natureza, o que ele descreve como objetos, sendo que esses objetos provavelmente seriam oriundos do advento da tecnologia e da industrialização, pautas que entraram em cena no período Moderno. A constituição da sociedade moderna trouxe consigo consideráveis mo14

Deve-se destacar que, na contramão do panorama crítico apontado neste capítulo, já podem ser verificadas propostas de projetos que incorporam as questões ambientais no desenho urbano, como o projeto desenvolvido para a Bacia do Córrego Santa Maria do Leme, em São Carlos, coordenado pela Prof. Drª. Luciana Schenk. Lentamente, o processo de produção das cidades contemporâneas parece estar se voltando a essa perspectiva ambientalista, o que este trabalho pretende fomentar. 1

SANTOS, Milton. 1992: a redescoberta da natureza. Revista Estudos Avançados, São Paulo, v. 6, n. 14, p. 95-106, jan-abr/1992. SCHUTZER, José Guilherme. Cidade e Meio Ambiente: a apropriação do relevo no desenho ambiental urbano. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo EDUSP, 2012. 2


capítulo

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A Conferência de Estocolmo é um marco para as tentativas de intervenção na relação homem-natureza, buscando conciliar o avanço econômico com a exploração/degradação dos recursos naturais. Também conhecida como Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano.

GONÇALVES, Fábio Mariz. O Desenho da Paisagem: a relação entre os padrões de urbanização e o suporte físico. Tese apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, FAUUSP. São Paulo, 1998. 4

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dificações quanto ao espaço geográfico e aos impactos no meio ambiente. Com a criação das indústrias, polos de trabalho foram desenhados nas cidades, o que se tornou elemento de atração de pessoas àquele ambiente. Diante de tal cenário, tem-se a concentração de trabalhadores, o aumento de moradias, o que transformou a realidade circundante sem os cuidados necessários ao seu entorno, gerando um descompasso entre os ambientes natural e construído. Mesmo que essas questões estivessem sendo notadas há um tempo considerável, Schutzer indica a Conferência de Estocolmo (1972)3 como o momento deflagrador em que, mundialmente, 113 países (entre eles, o Brasil) se reuniram para debater e apontar soluções acerca do conflito entre desenvolvimento econômico e degradação ambiental. A acumulação flexível, característica econômica notada a partir do pósguerra, por ter “[...] a necessidade crescente de encurtamento do tempo para a reprodução ampliada do capital tem obrigado o capitalismo a intervir nos tempos da natureza”. (SCHUTZER, 2012, p. 36). Basicamente, o tempo de giro dos bens produzidos é menor, de modo que se cria a necessidade de maior consumo, o que, por analogia direta, indica a maior exploração ambiental para tal produção. Segundo Gonçalves (1998)4, no Brasil, essas questões tomam maior expressão no século XX, nas décadas de 70, 80 e 90 quando se observa que a legislação, o mercado e os agentes privados, e mesmo o Estado, têm sido incapazes de conferir qualidades fundamentais à cidade produzida, por incompetência ou por desinteresse. O tecido urbano avançou de modo incisivo sobre o ambiente natural, modificando suas características e, inclusive, alterando seus processos biológicos. A conquista do cinza sobre o verde tem como motor o capitalismo, na forma de acumulação flexível, visando ao lucro, o que gerou um sem-número de construções, muitas vezes despropositadas socialmente, sobre áreas irregulares do ponto de vista ambiental. Sob a pretensa hipó15


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

tese de que os recursos ambientais são infinitos ou se renovam rapidamente, extensas áreas verdes foram arrasadas. As características de cada território são desconsideradas, resistindo este apenas como suporte para as intervenções.

Pode-se dizer que antigamente a cidade se relacionava com um sítio e dele escolhia seus melhores compartimentos para ocupar. Hoje, as grandes cidades ocupam todos os sítios de uma região. Ela ocupa e se relaciona com todo o território. Chega a se estender, portanto, sobre todos os compartimentos de relevo existentes. (SCHUTZER, 2012, p. 14).

Diante de tal panorama, o interesse em inserir pautas a respeito da questão ambiental vai aos poucos adquirindo forma nos projetos e intervenções urbanas, também como forma de encontrar respostas e mitigar a problemática instalada. Assim, um conjunto de ações com o objetivo de repensar a relação homem-natureza pode ser observado atualmente, o qual se estende também a diversos campos da Ciência, não apenas àqueles relacionados à cidade: Estudos ambientais são realizados atualmente em quase todas as

frentes do conhecimento e, apesar do caráter ainda embrionário das discussões no cotidiano acadêmico, técnico e social, já se reconhece um razoável acervo de reflexões sobre o tema. (SCHUTZER, 2012, p. 39).

AS CIDADES E AS ÁGUAS: UM (NÃO) DIÁLOGO À PARTE A ocupação desordenada que se consolidou nas últimas decadas tem 5 GORSKY, Maria Cecilia Barbieri. Rios um de seus embates mais significativos personificado na relação cidade-cursos e Cidades: ruptura e reconciliação. São d’água. Segundo Gorsky (2010)5, o afastamento das pessoas, das suas práticas Paulo: Editora SENAC, 2010. 16


capítulo

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DELIJAICOV, Alexandre. Alexandre Delijaicov conta como seria uma cidade estruturada pelos cursos dágua. Revista AU – Arquitetura e Urbanismo, edição 234, set/2013. Disponível em: <http:// www.au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/234/artigo296121-1.aspx>. Acesso em: 25/05/2017.

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cotidianas e recreativas em relação aos rios pode ser notado a partir do século passado. “No Brasil, a relação harmoniosa de encontro da população com o rio ocorreu, de modo geral, até a metade do século XX, quando então se ampliaram os conflitos entre desenvolvimento, sociedade e meio físico”. (GORSKY, 2010, p. 28). Alexandre Delijaicov (2013)6, arquiteto da Prefeitura de São Paulo e professor da FAU-USP, estabelece três momentos importantes na história entre as cidades e as águas, sendo que em dois deles, o saldo é negativo e demonstra um afastamento das pessoas em relação aos rios. Primeiramente, no período medieval, o rio é visto como um dispersor de contaminação, portanto evitado por todos. Os centros urbanos se expandiram de modo considerável e a infraestrutura sanitária não seguiu o mesmo ritmo, sendo o rio um alvo fácil para lançamento de dejetos e outros elementos, entre eles os que apresentavam risco à saúde pública. Um segundo momento, distinto dos outros, percebe a importância das águas na estruturação dos espaços urbanos, o que foi denominado de urbanismo sanitarista, expressão verificada nos séculos XVIII e XIX. Parques, bulevares, espaços de lazer e passeios são constituídos às suas margens, além de receberem medidas de embelezamento. Neiman (2010), ao discutir a problemática atual das águas urbanas, resgata essa dimensão das linhas de água como articuladoras dos espaços livres das cidades. “O rio precisa voltar a se incorporar na vida do paulistano e, para isso, a única alternativa é reconstituí-lo como espaço de lazer”. (NEIMAN apud GORSKY, 2010, p. 29). A problemática mencionada acima diz respeito justamente ao terceiro momento apontado por Delijaicov, o período atual. No decorrer do crescimento da industrialização há o desenvolvimento dos veículos autônomos, o que sacrificou o diálogo homem-águas urbanas. Esse diálogo era extremamente sólido nas populações nativas do Brasil, a água fazia parte de suas práticas cotidianas, o que se perdeu consideravelmente nos últimos tempos. 17


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

O automóvel sacramentou o problema dos rios, quando rodovias urbanas foram instaladas, mais uma vez, ao longo de suas margens. O mais grave de todos os problemas, quando falamos da relação entre cidades e rios, é a visão mercantilista do solo urbano. (DELIJAICOV, 2013, s/p).

Bartalini (2009)7, ao discorrer sobre a ocupação das várzeas dos rios em solo urbano, indica duas problemáticas principais: a primeira explica como a política habitacional brasileira, que não atende a todos, é denunciada pelas margens dos rios, ocupadas pelos desabrigados que, sem alternativas, se instalam nos espaços livres das cidades – é nos espaços públicos das cidades que as mazelas da sociedade se manifestam. Para evitar tais situações, o asfalto das grandes avenidas monofuncionais é lançado sobre o solo adjacente aos canais, impermeabilizando uma área que deveria ser alagável, de modo que nas épocas de cheias dos rios (que são processos absolutamente naturais) não aconteçam inundações – a visão inocente ainda caracterizada as águas urbanas como culpadas. “Teria sido possível revegetar as margens desocupadas, implantar parques lineares? Decidiu-se sempre pelo não, com o argumento de que as áreas verdes são alvos fáceis para novas invasões”. (BARTALINI, 2009, s/p). Assume-se o alagamento das várzeas e todos os problemas acarretados à população como consequências disso, a partir do momento em que a área de escoamento e absorção superficial das águas está ocupada por material impermeável. Quando há construções, a situação se torna mais desastrosa, já que estas podem ser destruídas. As águas transbordam e se espalham sobre todos os compartimentos urbanos, em busca de seu espaço livre, permeável, para que possa infiltrar no solo e recomeçar seu ciclo.

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BARTALINI, Vladimir. Os Córregos Ocultos e a Rede de Espaços Públicos Urbanos. Arquitextos, Vitruvius, São Paulo, ano 09, n. 106.01, mar. 2009. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/ revistas/read/arquitextos/09.106/64>. Acesso em: 15/05/2017. 7


capítulo

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A forma e o tamanho do leito natural de um rio refletem o tamanho e a frequência das inundações aos quais ele está sujeito, e duas vezes por ano, o rio preenche seu leito, transbordando para as margens; uma vez a cada dois anos, o rio transborda para a várzea até à altura do fluxo médio no seu leito. Quando residências e casas comerciais ocupam a várzea, não só correm o risco de destruição, mas também comprometem sua capacidade de conter as águas das cheias. 8

SPIRN, Anne Whiston. O Jardim de Granito: a natureza no desenho da cidade. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo - EDUSP, 1995.

(SPIRN, 1995, p. 148)8.

O desinteresse ou a “incapacidade” demonstrada pelos agentes que estruturam as cidades, sobretudo sua infraestrutura, seja pelas áreas livres, seja pelos cursos d’água, fica evidente na contemporaneidade. Esses espaços perdem cada vez mais força e por não se inserirem na lógica mercantilista do solo urbano em voga, vão desaparecendo ou se desqualificando enquanto potencial urbano, o que na verdade eles são: espaços potenciais. A potencialidade, consoante San9 SANCHES, Patrícia Mara. De Áreas De- ches (2011)9, está no fato de que esses espaços podem gradadas a Espaços Vegetados: potencialidades de áreas vazias abandonadas e subutilizadas como parte da infra-estrutura verde urbana. Dissertação apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, FAUUSP. São Paulo, 2011.

[...] cumprir funções infraestruturais, ou seja, ser componente de uma paisagem de alta performance, contribuindo para a criação ou ampliação da infraestrutura verde urbana. Quais áreas degradadas têm potencial para serem convertidas em áreas verdes? Quais são os critérios para avaliação deste potencial? Qual é o caráter vocacional destas futuras áreas verdes: ambiental ou social? (SANCHES, 2011, p. 07).

A população, diante do desprezo por parte do Poder Público, também não reconhece nos elementos da natureza bens fundamentais para a melhor estruturação das cidades. A paisagem e seus elementos constitutivos existem na cidade como elementos latentes (até quando?). O reconhecimento de que aquele espaço também é seu faz surgir o desejo da preservação - a sociedade atual não reconhece a natureza 19


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

como seu espaço de apropriação e pertencimento. A consciência por parte da população da dependência e da finitude dos recursos naturais, como a água, por exemplo, é um fator relevante de valoração e envolvimento no sentido da preservação, conservação ou recuperação, no caso, dos cursos d’água e dos mananciais de abastecimento urbano. (NEIMAN in GORSKY, 2010, p. 28).

EM BUSCA DE UMA VISÃO SISTÊMICA

O atual ‘mundo cheio de mundos’10 possui novas sensibilidades, sendo 10 ZAERA-POLO, Alejandro. Un Mundo que a questão ambiental se tornou um mundo à parte, apropriado pelas novas Lleno de Agujeros. El Croquis, Madrid, n. 88/89, p. 308-323, jan/1998. sensibilidades do lucro, da cidade como negócio, que o explora sem devolver nada em troca. O que a Arquitetura e o Urbanismo poderiam fazer por isso? É possível estabelecer um colóquio entre cidade e meio ambiente? Muito se discutiu sobre o tema, muito se debateu sobre como modificar os impactos das ações antrópicas sobre o meio ambiente; com tantos embates, a escolha feita foi mitigar os problemas socais, as contradições urbanas, políticas e econômicas às custas, sobretudo, do aumento dos problemas ambientais. Assim, surgem algumas perguntas: qual a relação verificada, hoje, entre cidade e meio ambiente? É possível resgatar a importância da natureza para a vida nas cidades (e para a vida das cidades)? Pode-se conciliar projeto urbano e meio ambiente 20


capítulo

No capítulo 7, “Controle e Recuperação das Águas”, Spirn relata o caso da cidade de Denver, no Colorado (EUA), a qual implantou um sistema de controle de suas águas após um grande desastre ocasionado por enchentes, em 1965. Assim, foi criado o Distrito de Drenagem Urbana e Controle das Enchentes (1969), sendo este responsável por controlar, em conjunto com os governos locais, a adoção de normas para a ocupação das várzeas dos rios e também para planejar a ocupação de suas bacias hidrográficas. Para tais ações, foi criado o Manual de Critérios de Drenagem das Águas Pluviais Urbanas, em 1969. 11

SANTOS, Emmanuel Antonio dos. Por que Planejar com a Paisagem. Pós. Revista do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAUUSP, São Paulo, Vol. 23, n. 40, p. 100-123, out/2003. 12

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sem que haja tamanho prejuízo aos recursos ambientais, como verificado atualmente? Projetos urbanos podem ser desenhados a partir da análise da paisagem, extraindo desta os seus potenciais? A história de nossas primeiras civilizações se deu à margem dos rios, utilizando-os para sua sobrevivência (como os egípcios e sua relação com o rio Nilo, por exemplo). Hoje, as cidades deram as costas aos seus recursos hídricos, sendo estes apenas produtos a serviço dos interesses comerciais – é possível propor uma reversão desse processo, tomando a água como elemento projetual? Este projeto mira e propõe um cenário futuro em que as cidades possam ser desenhadas incorporando questões ambientais neste processo – caracterização que, atualmente, é pouco posta em prática. As bacias hidrográficas, a morfologia dos terrenos, as áreas verdes devem ser elementos de projeto. As cidades necessitam de sistemas integrados e abrangentes na gestão de seus recursos naturais, como exemplifica Spirn (1995)11, no caso da água. Muito mais do que ações localizadas, propõe uma rede de intervenções e articulações que constituem um grande projeto combinando natureza e artifício. A efetiva e concreta incorporação dos elementos do meio natural ou com relativo grau de naturança, no processo de pensar o planejamento urbano e de promover a urbanização, pode efetivamente contribuir para a obtenção de um meio urbano mais equilibrado, mais justo, mais diversificado no uso dos recursos da natureza dos/nos

espaços, com paisagens mais integradas e integradoras e de maior qualidade de desenho dos espaços, especialmente aqueles de uso público. (SANTOS, 2003, p. 100) 12.

O desenho de todo esse processo começa pela interpretação dos compartimentos de relevo e das linhas de água, do entendimento do território sobre o qual se proporá algo – do relevo surgem as intenções projetuais. A todo mo21


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mento, há uma costura entre as questões locais, relativos a um sítio específico, e as questões regionais, ao território de modo mais abrangente. Assim, com um olhar que vai da micro à macro escala continuamente, desenham-se os sistemas de espaços livres, sistemas das águas, entre outros. Os espaços livres são elementos-chaves para o desenho urbano – os espaços livres são tão importantes quanto os espaços não livres. De certa forma, pode-se dizer que as pessoas também constituem um sistema, na medida em que o pedestre (e não os carros) são considerados prioridades na definição de medidas importantes da cidade, como as ruas, por exemplo. A arborização é pensada da mesma forma, seja nas praças, nos parques, nas calçadas, assim como a distribuição das águas, estabelecendo uma rede verde e azul que promove conexões entre todas as partes de uma cidade – conectar por meio dos espaços livres, conectar por meio das águas. As áreas verdes não exercem a função somente do embelezamento e da melhoria da qualidade visual e ambiental, elas se transformam em verdadeiros artefatos de engenharia e elementos de uma infraestrutura verde de alto desempenho. A arborização viária ganha força e escala ao conectar fragmentos de florestas urbanas e áreas verdes dispersas no tecido urbano. (AKINAGA, 2014, p. 12)13.

Como ativar e articular as demais camadas urbanas de modo a integrá-

-las a um projeto com enfoque ambiental? Destaca-se, portanto, a proposição de um diálogo mais equilibrado entre cidade e natureza. Ao propor um modelo de ocupação distinto do atual, que não considera o ambiente natural como elemento de projeto, este trabalho propõe uma reflexão que possa resgatar tal harmonia.

Para finalizar, o trabalho parte de um estudo sobre a inserção de parâ-

metros ambientais no desenho das cidades. A partir do diagnóstico a respeito da atual relação cidade-natureza, a Arquitetura e o Urbanismo foram escolhidos 22

AKINAGA, Patricia Harumi. Urbanismo ecológico, do princípio à ação: o caso de Itaquera, São Paulo, SP. São Paulo: tese apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2014. 13


capítulo

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como elementos mediadores, de modo a discutir a mitigação de tal problemática. A proposta metodológica para o primeiro e o segundo semestres é composta de: O aporte teórico mescla e preenche os interstícios entre cada etapa, cotejando informações de diferentes caráteres.

1º SEMESTRE (escala do território > 1:5000) LEITURA DO TERRITÓRIO + PRIMEIRAS PROPOSTAS - análise das cartografias do município, separadas e em sobreposição, de modo a iluminar questões latentes, pontos de tensão e pontenciais projetos; - reconhecimento das características físicas e sociais de cada bacia hidrográfica do município (bacia hidrográfica como unidade de planejamento e paisagem); - cruzamento de análises ambientais, paisagísticas e urbanísticas, definindo a área de intervenção; - primeiro plano geral de ocupação da área de intervenção e composição de sistemas urbanos entre cidade e projeto.

A separação em camadas acontece por uma questão metodológica, entretanto salienta-se que todas interagem e interferem umas nas outras. Os espaços livres englobam a infraestrutura verde, por exemplo, mas foram separados por uma questão de encadeamento de ideias.

2º SEMESTRE (escala 1:5000 > 1:1000 > 1:500) AÇÕES PROJETUAIS - aprofundamento do plano geral de ocupação para a área de intervenção e dos sistemas urbanos, a saber: i. Sistema de mobilidade e caracterização das vias; ii. Morfologia urbana; iii. Diretrizes gerais de densidade; iv. Usos do solo; v. Gabaritos. - escolha da área de recorte para detalhamento das camadas: vi. Sistema de espaços livres; vii. Infraestrutura verde. 23


“O modelo de ocupação urbana implementado ao longo dos anos em São Carlos desconsiderou as características físicas e ambientais [...]. A cidade que no plano original desenhou no vale, junto ao Córrego do Gregório, seu primeiro conjunto de praças, cresceu negando a significativa presença de corpos hídricos e nascentes em seu território, que foram se transformando em avenidas marginais e córregos canalizados. Além da excessiva impermeabilização das áreas centrais, as áreas periféricas foram assentadas sobre solos frágeis do ponto de vista geotécnico, e as grandes diferenças de declividades acentuavam ainda mais a segregação socioespacial.” (SCHENK; PERES, 2014, p. 03).


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UNIVERSO PROJETUAL E LEITURAS cรณrrego do gregรณrio em obras (1974)

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SÃO CARLOS: ENTRE O POTENCIAL PAISAGÍSTICO E A VISÃO DO MEIO AMBIENTE COMO UM OBSTÁCULO

Figura 01: localização do estado de São Paulo no contexto brasileiro. Fonte mapa-base: https://openclipart.org/ image/2400px/svg_to_png/226709/ Brazil_Blank_Map.png. Acesso em: 01/06/2017. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

De desenvolvimento associado à economia cafeeira, desde meados do século XIX, São Carlos foi reconhecida como município em 1880. Nesse período foi desenhada a ferrovia, com vistas à escoagem do grão, a base da economia, o que proporcionou a expansão da cidade sobre os solos da porção central do estado de São Paulo. Segundo o Censo do IBGE de 2015, o município possui uma população de aproximadamente 241 mil habitantes, estando esta majoritariamente concentrada na mancha urbana, de aproximadamente 6% da área total do município (ALVES, 200514; FAUSTINO et al, 201615). A formação do núcleo urbano aconteceu em 1857, a partir de terras doadas por cafeicultores, as quais se localizam no entorno do Córrego do Gregório (ALVES, 2005). A partir daí, desenhou-se o conhecido eixo norte-sul da cidade, composto por uma malha ortogonal quadriculada, com quadras de 90x90 metros, dispostas sem nenhum critério geomorfológico ou ambiental - uma malha quadrada foi sobreposta a um terreno com inclinações significativas, não havendo interferência do ambiente em seu desenho. No século XX, por conta da crise cafeeira de 1929, ocorre a transição 26

Figura 02: localização do município de São Carlos no Estado de São Paulo. Fonte mapa-base: https://sobicuda. files.wordpress.com/2011/06/mapa-sao-paulo-em-branco.jpg. Acesso em: 01/06/2017. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.


capítulo

Figura 03: município de São Carlos e sua mancha urbana (6% da área total). Fonte: PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, 2005, p. 08. Sem escala.

2 | universo projetual e leituras

para a indústria, havendo, consequentemente, um movimento migratório do campo para a cidade (êxodo rural) e um novo período de urbanização. Até 1940, deslocamentos eram feitos com facilidade, devido a um traçado urbano mais controlado e menor, o que foi acelerado a partir da década de 1950, com os chamados parcelamentos espontâneos. A mando da especulação, terras foram deixadas vagas; terrenos próximos à zona urbana foram parceladas - a cidade se construiu por aqueles que detinham o podem econômico (SCHENK; PERES, 201316). Assim, muitas morfologias foram justapostas, resultando em um traçado descontínuo (com clara intenção de regulação do território) e fragmentado, o que, inclusive, se mantém até hoje. Ferrovia, córregos, declives e aclives, limites naturais e artificiais não foram pensados em conjunto à expansão urbana. Houve enorme incentivo à expansão, por meio do poder público, o qual também passou a fomentar parcelamentos de baixa renda, por serem lucrativos, feitos em terras desvalorizadas, como o arco sul da cidade, com seus loteamentos assentados sobre solo arenoso e apontado como inadequado à moradia. A população também cresceu de forma significativa por conta da instalação das Universidades de São Paulo e de São Carlos (USP e UFSCar, respectivamente). Como reflexo da constituição da cidade ao longo do século XIX e XX, constata-se a produção de um tecido urbano disperso, com baixa densidade, fragmentado e pouco coeso, com invisibilidade aos atributos físicos e ambientais do território. Ainda que, a partir das mudanças na gestão pública no início dos anos 2000, tenha-se buscado alternativas inovadoras para ampliar a qualidade ambiental urbana, muitos instrumentos e propostas não foram implementados, de modo que a gestão se centrou no controle sobre a aprovação de projetos e parcelamentos e na definição do zoneamento urbano. (FAUSTINO et al, 2016, p. 06).

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Independentemente do período histórico abordado, fato é que não houve a incorporação dos processos naturais e das questões ambientais no desenho da cidade. As casas, desde essa época, já foram desenhadas dando suas costas aos corpos d’água, quase transformando-os em quintais. O processo de expansão chancelou a canalização e o tamponamento dos rios, um processo de “superação da natureza”, vista constantemente como um obstáculo ao desenvolvimento da cidade, capitaneado pelos interesses imobiliários e do capital. Entretanto, apesar da tentativa de torná-los invisíveis, sua presença é notada nos períodos de cheia, quando passam a ser os algozes urbanos, penalizados por algo que não tem culpa. O que se pode perceber ao observar a Carta da cidade de São Carlos é a constatação daquilo que se tornou lugar comum nas muitas cidades brasileiras submetidas ao processo de desenvolvimento em curso há décadas no país: os espaços contemplados pela Lei 6766, especialmente os relacionados às áreas de recreação como são chamadas nos documentos da municipalidade, ocupam áreas declivosas, ou tem dimensões, ou inserções urbanas, pouco aproveitáveis em relação a projetos de praças: faixas estreitas, bicos de quarteirões, rotatórias; exceção feita às ruas e avenidas, sistema privilegiado de espaços livres com foco no transporte viário. Em suma, parece ter sido o resto do parcelamento o que constituiu o sistema de espaços livres públicos desde a década de 70. (SCHENK; PERES,

ALVES, Elisânia Magalhães. Medidas Não-Estruturais na Prevenção de Enchentes em Bacias Urbanas: cenários para a Bacia do Gregório, São Carlos - SP. Dissertação apresentada à Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, EESC-USP. São Carlos, 2005. 14

FAUSTINO, Alexandre da Silva et al. Análise de Potencialidades dos Espaços Livres de São Carlos (SP) na Composição de um Sistema. XI Colóquio QUAPÁ-SEL, Salvador, ago/2016. Disponível em: http://quapa.fau.usp.br/wordpress/wp-content/uploads/2016/08/ AN%C3%81LISE-DE-POTENCIALIDADES-DOS-ESPA%C3%87OS-LIVRES-DE-S%C3%83O-CARLOS-SP-NA.pdf. Acesso em: 01/05/2017. 15

SCHENK, Luciana Bongiovanni Martins; PERES, Renata Bovo. Urbanização e Sistema de Espaços Livres na Cidade de São Carlos: processos históricos e alternativas contemporâneas na construção de um território. VIII Colóquio QUAPÁ-SEL, Rio de Janeiro, ago/2013. Disponível em: http://quapa.fau.usp.br/wordpress/ wp-content/uploads/2016/03/Urbaniza%C3%A7%C3%A3o-e-SEL-na-cidade-de-S%C3%A3o-Carlos.pdf. Acesso em: 01/05/2017. 16

2013, p. 08).

Atualmente, verifica-se a dificuldade em entender os espaços livres de São Carlos enquanto um sistema. Sua trama urbana apresenta áreas verdes e de recreio pouco qualificadas, em locais menos valorizados, podendo, inclusive, serem vistas como sobras do parcelamento urbano feito anteriormente. Segundo 28

Figura 04: canalizações e alagamentos dos cursos d’água na cidade de São Carlos. Fonte: BLOG ÁGUAS DA MEMÓRIA. Disponível em: https://aguasdamemoria.wordpress.com/. Acesso em: 02/06/2017.


capĂ­tulo

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Faustino et al (2016), uma etapa importante para a constituição de um Sistema de Espaços Livres (SEL) é a destinação de, no mínimo, 10% das áreas parceladas para espaços de lazer, compondo o Sistema de Recreio (SR) do município, podendo ser associadas a ele as áreas de preservação ambiental também. São Carlos apresenta em seu SR 499 terrenos públicos, num total de 2.860 km², os quais representam 4,98% da área urbana, variando de 70,5 m² a 71.159,6 m², sendo que a grande maioria apresenta valores intermediários.

Figura 05: distribuição e categorização dos espaços do Sistema de Recreio do município de São Carlos em 2014. Fonte: FAUSTINO et al, 2016, p. 08. Sem escala.

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capítulo

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Entende-se que o espaço público contemplado pelo que o Plano

Desarticulação entre potencialidades da paisagem e os projetos urbanos. Ausência de diretrizes para os espaços livres. Lei 6766: dispõe a quantidade de espaços livres, mas não suas características e qualidades - grande quantidade de espaços livres sem qualidade e em terrenos de pouco proveito (ideia de resto).

Diretor denomina Sistema de Recreio apresenta um potencial a ser explorado pelo município para planejar e propor um consistente Sistema de Espaços Livres. Esses espaços, se bem qualificados, promovendo diversidade de usos e funções, podem obter um significativo desempenho ambiental e social, e incrementar a resiliência urbana. A presença de uma densa rede hídrica na área urbana de São Carlos pode também potencializar a instalação de parques lineares e, assim, favorecer um sistema de espaços livres mais conectado e integrado. Esta rede hídrica pode estar atrelada às novas centralidades, localizadas em áreas identificadas pelo estudo como carentes de espaços verdejados. (FAUSTINO et al, 2016, p. 18).

O processo de elaboração e posterior revisão do Plano Diretor Municipal de São Carlos envolve um percurso muito maior do que descrito aqui, entretanto este capítulo pretende fazer um breve apanhado com enfoque na questão ambiental.

O RESGATE AMBIENTAL PROPOSTO PELO PLANO DIRETOR DE SÃO CARLOS (2005) E SUA REVISÃO (2011) A despeito das potencialidades projetuais com relação aos espaços livres de São Carlos, sobretudo nas figuras de seus ricos afloramentos hídricos e das áreas de vegetação remanescente, a ocupação dos compartimentos de relevo se fez desordenada e consolidou nas últimas décadas uma cidade construída por aqueles que detinham o poder e pelos interesses do capital. Nas terras altas, relegaram aos mais pobres o chão inabitável, arenoso, desligado da cidade restante, a cidade dos negócios. A expansão foi descontínua e fragmentada, ocupando também áreas inadequadas. Os espaços livres nunca estiveram em pauta no desenho da cidade, assim como os cursos d’água, canalizados e transformados em canteiros centrais para as grandes avenidas monofuncionalizadas. 31


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Na direção oposta a tais perspectivas, no começo da década de 2000 houve o início do processo de elaboração do Plano Diretor Municipal, o qual foi aprovado posteriormente, em 2005. Durante esse percurso, foram percebidos os impactos negativos advindos da alta especulação do solo que havia se instaurado décadas antes; os impactos ambientais desencadeados pela ocupação e impermeabilização desenfreada e sem planejamento também vieram à tona - fragilidades em diversos pontos de São Carlos foram identificadas (SCHENK; PERES, 2014)17. 17 SCHENK, Luciana Bongiovanni Martins; PERES, Renata Bovo. Agentes Produtores Como proceder diante desse diagnóstico urbano? e Espaços Livres na Forma Urbana de [...] na direção Norte havia a questão da transposição das Bacias Hidrográficas Tietê-Jacaré e Mogi-Guaçu, embora esta fosse a área de maior pressão especulativa e com demanda de expansão de condomínios fechados; na direção Leste, havia a presença das duas principais áreas de mananciais de abastecimento público da cidade; na direção Sul, havia um território com acentuados conflitos socioambientais, sofrendo pressões por novas ocupações de loteamentos populares e, por fim, a direção Oeste apresentava uma condição de relevo em topografia desfavorável. (SCHENK; PERES, 2014, p. 08).

Seguindo as pautas de legislação ambiental, Urbana e Rural, Saneamento e Preservação, Recuperação Ambiental do Município, estipulou as Diretrizes Gerais para o Ordenamento Territorial, as quais enfatizam a importância da proteção e recuperação de áreas de preservação ambiental. Isso seria garantido pelo Zoneamento e pelo Macrozoneamento. Entretanto, na disposição do zoneamento urbano, não foram as questões ambientais as prioridades. No caso do Macrozoneamento, pode-se dizer que sim, atentando-se à preservação dos mananciais, por exemplo. A questão ambiental, portanto, esteve presente na concepção de algumas diretrizes apresentadas, as quais “procuravam valorizar as funções so-

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São Carlos, SP. IX Colóquio QUAPÁ-SEL, Vitória, ago/2014. Disponível em: http:// quapa.fau.usp.br/wordpress/wp-content/ uploads/2016/03/Agentes-produtores-e-espa%C3%A7os-livres-na-forma-urbana-de-S%C3%A3o-Carlos-SP..pdf. Acesso em 01/05/2017.


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ciais da cidade e da propriedade, bem como a promoção de um modelo de ocupação do solo que considerasse aspectos ambientais no planejamento urbano”. (SCHENK; PERES, 2014, p. 04). Entretanto, como ressaltado pelas autoras, essas propostas acabaram sendo pouco implantadas, o que se torna uma questão importante, tendo em vista os agentes produtores das cidades contemporâneas. Assim, a tendência de segregação sociespacial no arco Sul, relegando aos mais pobres as piores terras, e a expansão pela camada mais abastada ao Noroeste, fechada em seus condomínios de alto padrão, acabou por se consolidar ainda mais nas últimas décadas - a cidade se enclausura em ilhas, ao mesmo tempo em que perde seus espaços de sociabilidade e seus vazios continuam ociosos: “os intramuros, bem tratados e os extramuros, comumente em abandono, e vazios”. (SCHENK; PERES, 2014, p. 13). INSTRUMENTOS O Zoneamento, via de regra, atenta-se mais ao meio urbano e sua expansão, identificando vulnerabilidades e qualidades para um melhor aproveitamento territorial (infraestrutura instalada, densidade, acessos); o Macrozoneamento detem-se às áreas de transição rural-urbano, garantindo que haja uma expansão mais equilibrada em termos ambientais; estabelece a integridade ambiental como prioridade. Também comparecem as Áreas de Especial Interesse Ambiental, focando-se nas regiões de fundo de vale, como as APPs. Entretanto, essas Áreas de Especial Interesse Ambiental não saíram do papel. A revisão do Plano Diretor Municipal de São Carlos foi proposta por um corpo técnico do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, IAU.USP São Carlos, em conjunto com a Prefeitura Municipal de São Carlos, em 2011.

PROPOSTAS DA REVISÃO DO PLANO DIRETOR (2011)

A revisão do Plano Diretor, de 2011, mira reforçar a importância da questão ambiental no processo de desenho das cidades, estabelecendo um significativo aprofundamento, por exemplo, ao propor a gestão das cidades utilizando as bacias hidrográficas como unidades de planejamento e paisagem e, de certa 33


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forma, dissolvendo mais os limites entre urbano e rural. Essa perspectiva, segundo os autores, garantiria a integração da região, ampliando assim a articulação entre políticas municipais e regionais. Produziu-se um macrozoneamento pautado pelo instrumento de zoneamento ambiental, que contemplava a totalidade do território, áreas urbanas e rurais num ordenamento que se alinhava às Diretrizes de Desenvolvimento Nacional e Regional, permitindo o detalhamento de aspectos que não foram considerados por ocasião da elaboração do Plano Diretor de 2005. Esse avanço em termos de metodologia revelava um olhar atento às prerrogativas contemporâneas de promoção de um desenvolvimento ambientalmente equilibrado articulado à região e território nacional. (SCHENK; FANTIN; PERES, 2015, p. 06)18.

Assim, foram constituídos eixos estratégicos, sendo que as principais diretrizes de interesse para o presentre trabalho estão destacadas abaixo: EIXO 1 i. garantir um território municipal ambientalmente equilibrado, com atividades [...] que conservem os atributos ambientais.

EIXO 2 i. garantir a expansão urbana contínua à área urbanizada com qualidade

ambiental, buscando uma cidade compacta e evitando a dispersão urbana; ii. superara a dicotomia entre urbano e rural, incorporando as especificidades das áreas de fronteira; iii. consolidação e estruturação dos eixos urbanos e regionais de comércio e serviços: 34

SCHENK, Luciana Bongiovanni Martins; FANTIN, Marcel; PERES, Renata Bovo. A Revisão do Plano Diretor da Cidade de São Carlos e as Novas Formas Urbanas em Curso. X Colóquio QUAPÁ-SEL, Brasília, jun/2015. Disponível em: http://quapa.fau.usp.br/wordpress/ wp-content/uploads/2015/11/A-revis%C3%A3o-do-Plano-Diretor-da-cidade-de-S%C3%A3o-Carlos-e-as-novas-formas-urbanas-em-curso.pdf. Acesso em: 01/05/2017. 18


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iii.d. estruturação e regulação dos eixos potenciais do fundo do Vale do Monjolinho, com comércios e serviços articulados a parques lineares. iv. ocupar os espaços ainda disponíveis no sentido de garantir qualidade para a área urbana e de um adensamento equilibrado em função da capacidade da infraestrutura instalada; v. romper a associação entre fragilidade ambiental e ocupação de baixa renda. vi. utilizar a hidrografia na composição de eixos urbanos. De leste a oeste, Córrego do Gregório; de norte a sul, Córrego do Monjolinho. EIXO 5 i. criação de Parques Florestais Municipais - Unidades de Conservação do Patrimônio Natural e Construído; ii. conformar, a título de projetos estratégicos, uma rede de parques lineares em fundos de vale urbanos - sistema de lazer e preservação ambiental. No que tange aos aspectos ambientais, vale ressaltar que o processo de elaboração do Plano Diretor Municipal, aprovado em 2005 (PMSC, 2005) evidenciou importantes elementos para a proteção ambiental em escala urbana e municipal. É possível perceber que no decorrer desses anos de sua aplicação avanços são visíveis, principalmente relacionados à “gestão do cotidiano”, ao disciplinamento do parcelamento do solo e o rompimento da lógica de descontrole sobre o uso e ocupação do solo. Entretanto, embora a “gestão do cotidiano” tenha de fato se incorporado e esteja evidente em grande parte da opinião dos segmentos que atuam na cidade, a gestão do uso e ocupação do solo de São Carlos ainda traz consigo lacunas e ambiguidades. (SCHENK; PERES, 2013, p. 11).

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CARTOGRAFIAS E LEITURAS: EXPANSÃO URBANA

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MORFOLOGIAS PERÍODO ATÉ 1950: em áreas de ocupação anterior a 1950, predominam as quadras de aproximadamente 90x90 metros, implantadas no sentido Norte-Sul, mostrando despreocupação com as questões topográficas, as quais não favorecem esse tipo de ocupação. Há a conformação, por conseguinte, de percursos muito íngrimes e mais movimentações de terra - não há acomodação à topografia. Evidências de um planejamento urbano que desconsidera o território sobre o qual está.

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MORFOLOGIAS PERÍODO PÓS-1950: em períodos de ocupação mais recentes, as quadras e lotes parecem procurar melhor adequação topográfica, ao girar sua disposição, que antes era no sentido Norte-Sul. Os lotes ficam com sua profundidade na direção contrária à inclinação do terreno. Observação: com lotes mais estreitos, alongados, parece haver um maior aproveitamento do solo, no sentido de mais lotes, a partir de uma estratégia do mercado imobiliário.

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Serão apresentadas nas páginas seguintes as cartografias elaboradas com o intuito de matizar paisagens dentro da paisagem de São Carlos, ativando um olhar sensível sobre o território como um todo, a fim de mobilizar dados bibliográficos anteriores, cartografias do município. Assim, alicerça um recorte de área de intervenção iluminado por uma leitura crítica acerca da cidade de São Carlos. DEMOGRAFIA (período de 1991 a 2000) centro: descréscimo populacional; periferias: chegam a ter acréscimo populacional de 80%; Aumento de moradias de baixo padrão nas periferias: exclusão social. Fonte: PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, 2005, p. 15-7. PERIFERIAS maiores densidades demográficas; maiores índices de precariedade educacional; maior demanda e menor oferta pelo sistema educacional. “A rentalização da terra acionado pelo mercado imobiliário provoca o parcelamento excessivo do solo, o que faz originar um elevado contingente de corte e aterros salpicados e pulverizados no espaço e no tempo.” (SCHUTZER, 2012, p. 73).


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“A ocupação urbana, ao se desenvolver sobre o território, assume características formais marcadas, muitas vezes, em razão das imposições que o sítio ou a natureza local colocam. À medida que a cidade cresce, ela pode encontrar novos obstáculos, que irão lhe imprimir novas feições em sua relação com o meio ambiente.” (SCHUTZER, 2012, p. 113). CRONOLOGIA POR DÉCADAS 1950: ampliação do traçado com rapidez. Grandes incentivos públicos. Inexistência de regras claras: ocupação física não planejada. Benefício à especulação imobiliária; 1960-1970: grandes universidades promovem mais crescimento. Ocupação de áreas frágeis; 1980: intensificação dos conflitos, vias marginais: vales cinzas, impermeabilizados; 1990: expansão de moradias nas periferias: investimento lucrativo - moradias baratas para quem precisa, em massa.

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AGRAVAMENTO DA DESIGUALDADE CIDADE ARACY E ANTENOR GARCIA tais loteamentos contrariam a diretriz de ocupação urbana, instalando-se em áreas com solos inadequados para assentamento humano. Ademais, localizam-se entre dois córregos (Água Quente e Água Fria), necessitando de controle com relação à sua expansão, não ultrapassando áreas de proteção ambiental. Também se desligam fisicamente do tecido principal da cidade, após uma falha geográfica, nitidamente um terreno ruim para os mais desfavorecidos.

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Figura 06: cartografia interpretativa da expansão urbana. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor a partir de cartografias da PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Sem escala.

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CARTOGRAFIAS E LEITURAS: RELEVO

Por meio da leitura do relevo, foi possível definir os principais corpos d’água de São Carlos, além da compreensão do funcionamento da rede de drenagem da cidade. Os rios foram obstáculos contornados com obras de impermeabilização do solo, o que naturalmente ocasionou problemas de drenagem; os corpos d’água foram obliterados com seu encurralamento entre avenidas monofuncionais - os problemas de transporte foram resolvidos a partir da construção de grandes avenidas e do esquecimento da natureza, assim constituindo os vales cinzas e os rios enclausurados. A partir de uma clara tentativa de regulação do território, o relevo e suas características pouco foram considerados durante o processo de desenho da cidade, assim como seus corpos d’água, os “acidentes geográficos a serem superados”. As ruas foram desenhadas abstratamente em malha ortogonal sem qualquer vínculo com o relevo - a grade ortogonal Norte-Sul resultou em ruas de grande declividade: o pedestre não foi uma prioridade.

CÓRREGOS OCULTOS 1 - SIMEÃO: nasce próximo à Praça Itália. O córrego está totalmente canalizado sob a Avenida Episcopal, com apenas um pequeno trecho aberto. Desemboca na região do Mercado Municipal. 2 - BIQUINHA: nasce nas proximidades do Teatro Municipal, desaguando no Gregório, assim como o Simeão. Também se encontra canalizado do início ao fim. O único indício de sua existência é o “Posto Biquinha”. 3 - SCHIMIDT: nasce no Jardim Macarengo, próximo à Rua Orlando Damiano. No TAC das Marginais (Termo de Ajustamento de Conduta), a Prefeitura se comprometeu a destamponá-lo, assim como a recuperar a vegetação do Tijuco Preto e conter o assoreamento e a erosão.

As leituras também comprovam a forte associação entre fragilidade ambiental e ocupação de baixa renda, panorama este que o Eixo III da Revisão do Plano Diretor (2011) busca romper. Também pela interpretação do relevo podem Fonte: BLOG ÁGUAS DA MEMÓRIA. ser identificados os córregos que foram ocultos a serviço do capitalismo. Disponível em: https://aguasdamemoria.wordpress.com/. Acesso em: 15/04/2017.

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“[...] o relevo fala pelo rio eclipsado, ressaltando a forma do seu vale.” (BARTALINI, 2009, s/p).

AVENIDA SÃO CARLOS: exemplo de invisibilidade do relevo e dos corpos d’água durante o desenho da cidade. Linha reta abstraída do relevo, com percursos que vão dos vales aos morros; ao todo possui um desnível de, aproximadamente, 60 metros, com trechos muito abruptos, como entre o Mercado Municipal e a Catedral, por exemplo.

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REGIÃO DO MERCADO MUNICIPAL mesmo ocultos, os córregos invisíveis podem ser localizados pela leitura do relevo. Essa região, pela confluência de corpos d’água existentes, deveria estar bem menos impermeabilizada. Desta forma, as enchentes e alagamentos são inevitáveis, não são acidentes da natureza. A canalização de seu leito aumenta a velocidade das águas e diminui sua absorção, o que certamente contribui para tal panorama - a sua várzea está invadida.

SEGREGAÇÃO: percebe-se que a população de mais alta renda ocupou os terrenos mais privilegiados da cidade, tais como o espigão da Rua Carlos Botelho, área de baixa fragilidade ambiental. Restou à população de menor renda ocupar os terrenos próximos às várzeas e áreas de maior fragilidade ambiental.

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Figura 07: cartografia interpretativa do relevo. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor a partir de cartografias da PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Sem escala.

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CARTOGRAFIAS E LEITURAS: ÁGUAS URBANAS, APPs INVADIDAS E ÁREAS DE ALAGAMENTO

A IDEIA DE SISTEMA: ideia de um conjunto articulado de áreas verdes que se apoie também na rede hídrica estrutural. Superar a ideia de que cursos d’água são obstáculos a serem transpostos. Impermeabilizar áreas de várzea (drenagem) é, obviamente, inconsequente e inadequado. Superar a ideia de que elementos da natureza são bens a serviço do capital. Procurar um desenho urbano integrado entre cidade e meio ambiente, o qual só pode trazer vantagens. A cidade não é um sonho resignado. ALGUMAS ESTRATÉGIAS: possibilidades de intervenções projetuais no sistema de drenagem urbana. i. recuperação de várzeas; espaços livres articulados aos córregos; ii. controle das enchentes; conservação e recuperação das águas; iii. estruturas de mitigação para as áreas já ocupadas; infraestrutura verde como processo de prevenção de enchentes (estruturas intermediárias entre o percurso da água; maior infiltração no solo); iv. manutenção de áreas arborizadas como solos de recarga. 40

“A várzea florestada, os canais de drenagem e os solos de recarga formam um sistema de espaços livres urbanos, um sitema de drenagem natural que representa uma economia substancial sobre o custo da construção de um sistema de drenagem convencional.” (SPIRN, 1995, p. 180).


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“A lógica do esquema é evidente. A natureza já providenciou uma solução de custo mínimo das futuras enchentes, na forma de extensas várzeas que moderem as variações extremas da correnteza.” (US ARMY CORPS OF ENGINEERS apud SPIRN, 1995, p. 172).

CIDADE PARA QUEM? Melhores condições de drenagem para a população mais abastada. Áreas periféricas com obras precárias ou incompletas.

OBRAS DE DRENAGEM URBANA: são o preço pago por desconsiderar os parâmetros ambientais externos ao processo de desenho das cidades. Evidentemente estão localizadas nos pontos críticos da cidade, como a rotatória do Cristo e o entorno do Mercado Municipal, espaços que tem as margens impermeabilizadas pelas avenidas monofuncionais, tamponamentos, invasões de áreas de proteção.

Áreas de Proteção Permanente (APPs) Áreas de Proteção Permanente invadidas Áreas de alagamento Estação de Tratamento de Esgoto, ETE Monjolinho (2008) Área de Proteção Ambiental Corumbataí Obras de drenagem previstas

Figura 08: cartografia interpretativa das águas urbanas. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor a partir de cartografias da PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Sem escala.

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CARTOGRAFIAS E LEITURAS: PEDOLOGIA E POTENCIAIS PAISAGÍSTICOS

POTENCIAL PAISAGÍSTICO i. cidade privilegiada em termos ambientais e paisagísticos; ii. recuperar áreas de proteção ambiental; iii. possibilidade de projeto nas bordas não finalizadas da cidade; iv. transição urbano rural: garantir a integridade ambiental. Ocupação diferenciada; v. conter a expansão no arco sul: solos inadequados para assentamento humano, segundo levantamento geotécnico; vi. expansão controlada sobre o arco leste (área de recarga de aquíferos > proteção e recuperação de manan- Figura 09: levantamento pedológico do município de São Carlos. Fonte: PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, 2005, p. 55. Sem ciais). escala. 42


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CARACTERIZAÇÃO GERAL i. solos frágeis, de alta permeabilidade; ii. zonas de latossolo vermelho-amarelo e areia quartzosa profunda (solos frágeis); iii. grande quantidade de afloramentos hídricos não caudalosos: necessidade de preservação e conservação; iv. formação geológica Sistema Aquífero Serra Geral (Formação Serra Geral); Sistema Aquífero Bauru (Formação Marília); v. altimetria com variação de 480 metros (520 metros a 1000 metros de altitude, com médias entre 700 metros e 900 metros); Fonte: ALVES, 2005, p. 75-6.

Figura 10: mapeamento geotécnico da cidade de São Carlos. Fonte: PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, 2005, p. 12. Sem escala.

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A cidade de São Carlos está situada no divisor de águas do estado de São Paulo, entre as bacias hidrográficas Mogi-Guaçu, ao Norte, e Tietê-Jacaré, ao sul (figuras 11 e 12), em meio a áreas de remanescentes florestais e de preservação, estabelendo, portanto, uma posição estratégica de conectividade ambiental, garantindo os fluxos biológicos (FAUSTINO et al, 2016). As bacias hidrográficas podem ser consideradas sob dois aspectos principais: como uma unidade físicogeográfica e como uma unidade de gestão e planejamento urbano. Enquanto unidade físico-geográfica tem-se no estado de São Paulo a Lei Estadual Nº 9.034, de 27 de dezembro de 1994, a qual divide o estado em 22 Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHIs), segundo suas principais bacias. A grosso modo, pode-se entender as bacias hidrográficas como unidades físicas e biogeofísicas com fronteiras delimitadas, que no caso seriam divisores de águas. Para Vilella e Mattos (1980), a bacia hidrográfica pode ser considerada como uma área fisiográfica drenada por um curso d’água (ou um sistema de cursos d’água) que converge(m) para um leito d’água. (CAMPANELLI, 2012)19. Nesse sentido, a ocupação humana sobre o território acaba por submeter as bacias hidrográficas a uma gama significativa de impactos ambientais decor44

Figura 11: Unidades Hidrográficas de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo (UGRHI) - destaque para o município de São Carlos, no divisor entre as UGRHI 9 e 13 (Mogi-Guaçu e Tietê/Jacaré, respectivamente). Fonte: INSTITUTO GEOGRÁFICO E CARTOGRÁFICO - IGC. Disponível em: http://www. igc.sp.gov.br/produtos/ugrhi.html. Acesso em 29/05/2017. Sem escala. Figura 12: município de São Carlos com sua mancha urbana destacada - a maior parte é inserida na UGRHI 13 (Tietê/ Jacaré). Além disso, observa-se, atualmente, o crescimento da cidade em direção à UGRHI 9. Fonte: PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, 2005, p. 52. Legendas: elaboradas pelo autor. Sem escala. Figura 13: bacias hidrográficas do município de São Carlos, a partir das UGRHI. Fonte: PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, 2005, p. 53. Legendas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

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CARTOGRAFIAS E LEITURAS: BACIAS HIDROGRÁFICAS


capítulo

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BACIA DAS GUABIROBAS

BACIA DO MOJI-GUAÇU BACIA DAS CABACEIRAS

ÉURÇAACUAGJ--IÊGTOEMIT

UGRHI 9 MOGI-GUAÇU

BACIA DAS ARARAS

SÃO CARLOS

BACIA DO CHIBARRO

UGRHI 13 TIETÊ/JACARÉ

BACIA DO QUILOMBO

figura 12 BACIA DO MONJOLINHO

BACIA DO JACARÉ-GUAÇU figura 11

BACIA DO PÂNTANO BACIA DO FEIJÃO

figura 13

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rentes de suas atividades, o que pode ser claramente verificado na cidade de São Carlos, por exemplo. As bacias da área central, como as do Córrego do Gregório e do Tijuco Preto, apresentam-se altamente impermeabilizadas, com suas áreas de várzea e alagamentos ocupadas por edificações e solo impermeável, impedindo, assim, que suas águas escoem para a terra e infiltre, recomeçando o seu ciclo. Mirando uma perspectiva mais abrangente, há uma estratégia de planejamento urbano e gestão das cidades embasado nas bacias hidrográficas, o que vem se tornando pauta cada vez mais presente no desenho das cidades. O planejamento com bacias começou com suas primeiras ideias entre as décadas de 1960 e 1970. Países como Portugal, por exemplo, fazem uso dessa estratégia. [...] sua definição como a unidade geográfica pertinente para atender aos objetivos da gestão integrada reconhece não apenas a dimensão ecológica, mas também dimensões sociais, culturais e políticas. Deste modo, a bacia é uma realidade física, mas também um conceito socialmente construído, podendo a ser um campo de ação política, de partilha de responsabilidades e de tomada de decisões. (SCHENK; PERES, 2013, p. 12). Assim, as bacias hidrográficas se tornam unidades integradoras da região, passam de elementos de pesquisa a elementos de desenho urbano. Como planejar com as bacias? Um dos intrumentos possíveis, como descrito anteriormente no caso do Plano Diretor Municipal de São Carlos e sua posterior revisão, seria o binômio macrozoneamento/zoneamento ambiental, estabelecendo zonas com atividades de uso e ocupação do solo delimitadas. Tal como Spirn (1995) discorre sobre o trabalho do Distrito de Drenagem Urbana e de Controle das Enchentes de Denver, no Colorado, é possível associar um método análogo, baseado em estudos que cubram uma bacia hidrográfica 46


capítulo

2 | universo projetual e leituras

Figura 14: bacias hidrográficas pertencentes à mancha urbana da cidade de São Carlos. Fonte mapa-base: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS, set/2009. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

inteira, em simbiose a um Plano Diretor Municipal que seja capaz de identificar onde os problemas de inundação acontecem, por exemplo, dispondo diretrizes nessa seara e recomendando medidas que sejam preventivas. Assim, é possível pensar e reservar áreas de incentivo à infiltração, percolação, filtragem e armazenamento, um sistema que reduz as possibilidades de enchentes, além de poder servir como sistema de espaços livres para recreio da população CARTOGRAFIA Ao lado, a cartografia elaborada pretendeu elencar as características econômicas, sociais e habitacionais das bacias da cidade de São Carlos, um percurso que lê o território como um todo e identifica, dentro deste, possibilidades de aproximação, dissenções e peculiaridades de tais bacias hidrográficas, visando a um recorte projetual. BACIAS HIDROGRÁFICAS DA ÁREA CENTRAL: MAIOR IMPERMEABILIZAÇÃO DO SOLO E PREDOMINÂNCIA DOS ALAGAMENTOS > mudança em seus usos predominantes, passando à crescente presença de comércios e serviços; > maior concentração da população de alta renda no triângulo formado pelo Mercado Municipal, Campus I da USP e Shopping e maior concentração de população idosa; > predominância de edificações de alto padrão entre os córregos do Gregório e do Tijuco Preto; > população de baixa renda deslocada das áreas com melhor infraestrutura, onde se consolidou a população mais abastada; > bacias mais impermeabilizadas e mais verticalizadas; > imóveis abandonados e demolições nas cotas mais altas; > estação ferroviária. 48

BACIAS HIDROGRÁFICAS DA REGIÃO NORTE > universidades; > condomínios fechados, bairros rurais. Região predominantemente residencial; > terminal rodoviário; > indústrias; > bons solos para expansão. BACIAS HIDROGRÁFICAS DA REGIÃO SUL > possivelmente a mais populosa (alta densidade demográfica); > bairros rurais, bairros de classe média e baixa, além dos populares, como o Cidade Aracy; > comércio local; > área industrial a sudeste. BACIAS HIDROGRÁFICAS DA REGIÃO LESTE > bairros residenciais de padrões variados, dos populares aos mais altos; > condomínios fechados; > comércios locais; > região de recarga de mananciais. BACIAS HIDROGRÁFICAS DA REGIÃO OESTE > em sua maioria, bairros de classe média, alguns de classe alta e condomínios fechados; > shopping; > comércio e serviços locais; > fábricas; > campus 2 da USP; > favela Gonzaga.


capítulo

2 | universo projetual e leituras

santa maria do leme

tijuco preto mineirinho monjolinho gregório

USO DO SOLO POR PREDOMINÂNCIA residencial comercial institucional áreas livres PADRÕES HABITACIONAIS popular padrão baixo padrão médio padrão alto

Figura 15: cartografia interpretativa das principais características das bacias hidrográficas da mancha urbana de São Carlos (destaque à Bacia Hidrográfica do córrego do MIneirinho). Interpretação do autor. Fonte mapa-base: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS, set/2009. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

LEITURAS DIRECIONADAS BACIA DO TIJUCO PRETO > alto grau de urbanização; > poucas áreas verdes; > inundações e impermeabilização excessiva; > tamponamentos; > marginais em fundos de vale; > leito natural modificado a serviço do homem; > zona de ocupação induzida. BACIAS ÁGUAS QUENTE E FRIA > predomínio de população de baixa renda; > esgoto lançado em suas margens (Cidade Aracy e Antenor Garcia); > assoreamento; > Água Quente: vossorocas (população usa para jogar entulhos); > irregularidades fundiárias; > sem infraestrutura adequada; > solos não recomendados para assentamento humano; > zona de ocupação restrita. BACIA DO MONJOLINHO > 275 km², incorporando São Carlos e Ibaté, principalmente; > marcada pela remoção de matas ciliares; > ocupação e destruição de várzeas; > processos erosivos; > assoreamento; > despejo de esgoto.

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BACIAS HIDROGRÁFICAS COMO UNIDADES DE PLANEJAMENTO URBANO ÂMBITO NACIONAL > Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9433/1997); > Política Agrícola (Lei 8171/1991); > Política Nacional de Saneamento Básico (Lei 11445/2007); > Lei 13944/2006 e APREM: Área de Proteção e Recuperação dos Mananciais do Município. ÂMBITO MUNICIPAL DÉCADA DE 1960 > projeto de Plano Diretor; > Código de Loteamentos para o município. DÉCADA DE 1970 > Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado; > Lei de Zoneamento. DÉCADA DE 2000 > Plano Diretor. DÉCADA DE 2010 > 2012: proposta de revisão do Plano Diretor; > 2016: revisão do Plano Diretor. ESTATUTO DA CIDADE, quarta diretriz crescimento urbano com proteção ambiental.


capítulo

BACIA SANTA MARIA DO LEME > menor grau de urbanização; > parte urbana/parte rural; > cana-de-açúcar e pastagens; > população mobilizada em prol de questões ambientais: recomposição das margens do Córrego Cambuí com espécies nativas; > Bosque Santa Marta: única reserva de Mata Atlântica original dentro do perímetro urbano; > solos de ótima qualidade para expansão urbana; > zona de ocupação induzida.

BACIA DO GREGÓRIO > alto grau de urbanização; > poucas áreas verdes; > impermeabilização excessiva; > marginais em fundos de vale; > inundações; > erosão próxima ao SESC;

2 | universo projetual e leituras

santa maria do leme monjolinho

mineirinho tijuco preto

gregório

água quente

> característica comercial; > praças; > espaços ociosos; > leito natural modificado a serviço do

homem; > zona de ocupação induzida.

Figura 16: bacias hidrográficas da mancha urbana de São Carlos. Fonte mapa-base: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS, set/2009. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

RECORTE PROJETUAL: BACIA CÓRREGO DO MINEIRINHO

DO

A ocupação da Bacia do Mineirinho começou nas décadas de 1960 e 1970, sendo que a expansão se deu, sobretudo, a partir da década de 1990, com a instalação de condomínios, interessados na boa qualidade dos solos da região. Quando comparada a outras bacias do município, trata-se de uma ocupação bastante recente, mantendo, por conta disso, boa parte de seu potencial de paisagem, ainda não degradado de forma agressiva, como em outras bacias de ocupação mais antiga (Gregório, Tijuco Preto). Por conta da descoberta da boa qualidade dos solos, tende a sofrer um processo de ocupação descontrolada, já que boa parte da atenção se volta para essa área na contemporaneidade. A ocupação atual já apresenta sintomas preocupantes, com vários condomínios que conformam ilhas isoladas, um total contraponto ao potencial de paisagem que a área apresenta (figura 17). Por apresentar ocupação em várias épocas, a malha viária possui certa descontinuidade. Trata-se de uma zona de ocupação induzida, isto é, que possui infraestrutura disponível, passível de adensamento demográfico e construtivo. Atualmente, é o vetor de expansão da cidade, justificando boa parte do interesse de condomínios fechados e empreendimentos imobiliários. 52


capítulo

2 | universo projetual e leituras

DADOS GERAIS > 4 km de entensão do Córrego do Mineirinho (1,8 km correndo dentro da USP - Campus 2); > Córrego do Mineirinho tributa no Córrego do Monjolinho (rotatória do Cristo Redentor); - aumento das águas superficiais; - diminuição da recarga do aquífero; - vale impermeabilizado. rod.

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Fonte: TARPANI, Raphael Ricardo Zepon. Análise Ambiental da Bacia Hidrográfica do Mineirinho Visando à Prevenção de Danos Ambientais e Econômicos. Monografia apresentada à Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, EESC-USP. São Carlos, 2008.

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> 20% de pastagens; > 15% de cana-de-açúcar; > 15% de solo exposto; > 10% de matas ciliares (vegetação ripária); > Bacia cresceu cerca de 80% em 10 anos; > lotes parecem ser muito impermeabilizados; > densidade populacional média: 100 hab/ha.

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DADOS DE 2008 > 40% de área urbanizada; maioria (~80%) na margem nordeste, com preodomínio residencial.

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cursos d’água limite da Bacia nascentes alagamentos áreas ocupadas áreas livres APPs existentes

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Figura 17: aspectos ambientais da Bacia do Mineirinho. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

PERCURSO HISTÓRICO DA OCUPAÇÃO DA BACIA DO MINEIRINHO O início da ocupação se dá com uma fazenda de 146 hectares, pertencente ao padre Romeu Tortorelli, a qual começou a ser parcelada em 1968 - à época, já era denominada de Jardim Santa Felícia. A princípio, foi idealizado como um bairro para a elite, com baixa densidade habitacional e grandes lotes de 300 m². Entretanto, não obteve o resultado esperado em termos de comercialização. Assim, houve nova divisão para barateamento das vendas, atingindo as classes mais baixas e as médias, o que se mantém até hoje, à exceção dos condomínios recentemente instalados. A partir daí, foram originados bairros como Santa Felícia, Santa Angelina, São Carlos II e III, por exemplo. Atualmente, a partir do surgimento dos condomínios nos anos 1990, o local concentra uma mescla de padrões habitacionais e também o novo campus da Universidade de São Paulo, o Campus 2 da USP, implantado em 2001, promovendo a mescla de diversos personagens (SCHENK, 2011), perspectiva pela qual este trabalho tem interesse.

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“Os bairros são áreas citadinas relativamente grandes, em que o observador pode penetrar mentalmente, e que tem alguns aspectos comuns. Podem estar organizados do ponto de vista interno e, ocasionalmente, podem servir de ponto de referência externo, quando alguém por eles passa ou os atravessa.” (LYNCH, 1960, p. 74).

Figura 18: imagem aérea do Jardim Santa Felícia em 1969 (à esquerda) e em 1979 (à direita). Fonte: arquivo SMHDU/PMSC apud SCHENK, 2011, p. 04.


capítulo

2 | universo projetual e leituras

1 Jardim Ipanema 2 Santa Angelina 3 Arnon de Melo 4 São Carlos III 5 Santa Felícia 6 Parque Iguatemi 7 Monsenhor Romeu Tortorelli 8 São Carlos II 9 São Carlos I 10 Planalto Paraíso 11 Jardim Alvorada 12 Swiss Park 13 Parque Faber I 14 Parque Faber II 15 Residencial Eldorado 16 Residencial Quebec 17 Residencial Montreal 18 Terra Nova Rodobens 19 Parque Fehr 20 Moradas São Carlos I Bairros possuem uso do solo predominantemente residencial, com pontos de comércio e serviços. OS BAIRROS Ironicamente, as terras que outrora não foram do interesse das classes mais abastadas hoje em dia estão entre as mais procuradas pelos condomínios de alto padrão, provavelmente por descobrirem seu potencial futuro e seus solos de boa qualidade. A cidade, aqui, reproduz novamente os interesses do capital. Corroborando tal perspectiva, a implantação dos bairros Cidade Aracy e Antenor Garcia podem ser citados como exemplos. Por que deslocar a população mais pobre para os piores solos, afastados do centro urbano? A resposta já foi dada. Assim, atualmente se configura como o principal vetor de expansão da cidade.

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1950-1970 1970-1990 1990-2002 2002-2012

Figura 19: bairros constituintes da Bacia do Mineirinho. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor a partir de cartografias da PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Sem escala.

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

Figura 20: imagem de satélite: mancha urbana da São Carlos em 2005. Fonte: GOOGLE EARTH PRO. Sem escala.

Posteriormente à inauguração do novo parcelamento Jardim Santa Felícia, a cidade se expandiu no sentido contrário, indo em direção às áreas de maior fragilidade ambiental, a sudeste. Ironicamente, o mercado imobiliário tem se voltado a essa área, antes renegada pelos mais ricos, a partir da consideração feita nos levantamentos geotécnicos sobre a ótima qualidade de seus solos para assentamento humano, havendo incentivo à ocupação dessa área, inclusive. Em 2005, já se percebe a presença dos condomínios de alto padrão na área, como os Jardins Montreal e Quebec, destacados na imagem (figura 20). Na imagem de 2009, o acelerado processo de ocupação da área por condomínios fechados apresenta um grande salto, já conectando os mais afastados ao restante da cidade.

2005 polígono da área de intervenção

2009 Figura 21: imagem de satélite: mancha urbana da São Carlos em 2009. Fonte: GOOGLE EARTH PRO. Sem escala.

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capítulo

3 | ações projetuais

Figura 22: imagem de satélite: mancha urbana da São Carlos em 2012. Fonte: GOOGLE EARTH PRO. Sem escala.

2012 2016

Em épocas mais recentes, o carimbo de condomínios fechados continua a marcar a Bacia do Mineirinho, “conectando” o tecido urbano à rodovia Washington Luís. Percebe-se a clara ausência de planos para os eixos viários e de um planejamento da expansão da cidade, que acabam por serem “espontâneos”. A presença do Campus 2 da Universidade de São Paulo parece seguir tal modelo, pelo menos no que diz respeito à “condominialização” do espaço urbano, na medida em que restringe seu perímetro por meio de portões e guaritas, até mesmo proibindo a entrada de crianças que porventura poderiam recrear-se em sua área interna. Qual o diálogo que a Universidade propõe estabelecer com a comunidade do entorno? Novos empreendimentos já foram aprovados (figura 24) e os espaços de dimensão pública cada vez mais se rarefazem.

Figura 23: imagem de satélite: mancha urbana da São Carlos em 2016. Fonte: GOOGLE EARTH PRO. Sem escala.

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

LATOSSOLOS melhores solos de São Carlos; relevo mais suave; boa drenagem. QUESTÕES como articular as diferentes morfologias, como linha férrea, quadras de diferentes temporalidades, cursos d’água? quais os melhores visuais? quais os potenciais da área? há áreas de fragilidade ambiental? a linha férrea é um limite?

PREPARAR A EXPANSÃO DA CIDADE A PARTIR DA INSERÇÃO DO CAMPUS UNIVERSITÁRIO NA BACIA

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atenção à fragilidade hidrológica da Bacia no que tange à sua impermeabilização. controlar os coeficientes de permeabilidade. çã

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APPs existentes cursos d’água condomínios fechados novos empreendimentos áreas com demanda por parcelamento nascentes Bacia do Mineirinho

Figura 25 (ao lado): imagem de satélite da Bacia do Córrego do Mineirinho em 2017. Fonte mapa-base: GOOGLE EARTH PRO. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

Figura 24: novos empreendimentos imobiliários na Bacia do córrego do Mineirinho. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor a partir de cartografias da PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Sem escala.

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capítulo

AS NASCENTES 1) NASCENTE SANTA ANGELINA > problemas com a falta de vegetação; > substituição da vegetação nativa por cultivos para uso doméstico, tais como milho e leguminosas.

1

2) NASCENTE FRANCISCO POSSA > alto grau de erosão; > esgoto ilegal; > problemas com descarte inadequado de resíduos (a Bacia possui famílias que complementam sua renda a partir da coleta de materiais recicláveis, filtrando o lixo depositado em áreas públicas).

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MONTANTE > bairros de caráter popular; > bairros de baixa/média renda; > malha desconexa; > como se ajustou à implantação da Universidade? > necessidade de complementar a infraestrutura.

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3) e 4) DUAS NASCENTES INTERNAS À USP - CAMPUS 2 > novo campus em 2001: quais os efeitos para as nascentes? Irão se manter preservadas?

2 | universo projetual e leituras

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JUSANTE > condomínios fechados de alto padrão; > infraestrutura qualificada; > região de alagamentos constantes (vale cinza que recebe as águas de 3 rios: como o Mineirinho contribui com esse cenário?).

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

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EQUIPAMENTOS URBANOS Nota-se pela cartografia que a região apresenta praticamente a mesma quantidade de equipamentos urbanos previstos e existentes, nas 3 categorias consideradas (saúde, educação e esportes/lazer). A maior carência diz respeito justamente à última categoria, a de recreação. Pelo fato de a região estar sofrendo um acelerado processo de urbanização, que tem como motor os condomínios fechados e a privatização dos espaços da cidade, o planejamento da expansão urbana deixa a desejar, ocorrendo fragmentação no tecido das vias, espaços livres exíguos e aumento da degradação ambiental. Crescer sem o planejamento do traçado urbano e o zoneamento ambiental acarretou, neste caso, uma somatória de morfologias e decisões individuais, que pouco conseguem funcionar bem em conjunto. Com tantos terrenos livres, por que construir condomínios fechados? Quando a riqueza da bacia entrará em pauta no seu processo de expansão? en

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Figura 26: equipamentos urbanos na Bacia do Mineirinho. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

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OS VAZIOS Ainda persistem espaços livres em grande número, potenciais à espera de algo. O mapa de equipamentos indica carência de espaços de lazer no bairro, constando apenas uma praça para esportes (as demais estão em construção, segundo cartografia da Prefeitura). Parques, praças qualificadas, ruas arborizadas fazem falta, assim como no restante da cidade, pobre em seu “sistema” de espaços livres.


capítulo

2 | universo projetual e leituras

CAMPUS 2 Como a implantação do Campus 2 da USP influencia na dinâmica do bairro? Como influenciará e transformará seus espaços? O bairro não parece estar preparado para uma transferência definitiva dos alunos de graduação para lá, o que possivelmente acontecerá em um futuro próximo.

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Figura 27: linhas de ônibus na Bacia do Mineirinho. Fonte: HINDI, Tiago de Mattos Chafik. 2017. Sem escala.

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“A efetiva e concreta incorporação dos elementos do meio natural ou com relativo grau de naturança, no processo de pensar o planejamento urbano e de promover a urbanização, pode efetivamente contribuir para a obtenção de um meio urbano mais equilibrado, mais justo, mais diversificado no uso dos recursos da natureza dos/nos espaços, com paisagens mais integradas e integradoras e de maior qualidade de desenho dos espaços, especialmente aqueles de uso público.” (SANTOS, 2003, p. 100).


3

AÇÕES PROJETUAIS 63


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

3.1

DIRETRIZES GERAIS DO PROJETO: BACIAS HIDROGRÁFICAS COMO UNIDADES DE PLANEJAMENTO E O DESENHO AMBIENTAL URBANO Projetar com o relevo, projetar com a vegetação, projetar com as águas. Desenho ambiental urbano. Visão de futuro de um município cuja urbanização ocorre em consonância com a conservação ambiental.

Figura 28: Visão aérea da área de intervenção [posição marcada no mapa da página ao lado]. Fonte: https://1. bp.blogspot.com/-zV3WgtOilDg/ WP5CD5V_q-I/AAAAAAAAH-o/hkcfdJAybv0-I8ijeWXcX2G3g478p6-JQCLcB/s1600/Garatea_2.png. Acesso em: 18/06/2018.

64


capítulo

3 | ações projetuais

ruas que acompanham o relevo privilégio ao pedestre / ciclista

campus 2 USP

preservar os complúvios (vales) como áreas de escoamento das águas, linhas de drenagem que promovem a infiltração e a recarga dos aquíferos.

1

cursos d’água

displúvios (espigões)

complúvios (vales)

ETAPA

perímetro USP

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ANÁLISE DO RELEVO

fotografia

Ocupação com desenho integrado entre cidade e natureza. Fim da grade ortogonal abstrata. 65


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

parque na cota mais alta potencial visual

dissolver o perímetro da USP incorporar à cidade

área de expansão da USP

DIRETRIZES

GERAIS

associar as diretrizes urbanas, as morfologias, o sistema de espaços livres e as demais intenções projetuais à condição topográfica local.

2 ETAPA

66

bordas comerciais ativar os espaços livres


capítulo

3 | ações projetuais

SISTEMA DE MOBILIDADE URBANA diálogo com as vias já existentes

SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES cidade + entorno + projeto

SISTEMAS E CONEXÕES estabelecer conexões com o entorno, solidificando sistemas com o restante da cidade. áreas livres, vias, equipamentos, por exemplo.

3 ETAPA

Sistema articulado com o restante da cidade: elementos são desenhados para funcionarem na escala urbana e na escala local. 67


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

3.2

SISTEMAS E CAMADAS DO PROJETO: SISTEMA DE MOBILIDADE URBANA VIAS PARA AUTOMÓVEIS

ampliação

Figura 29: hierarquia de vias na cidade de São Carlos. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011, com acréscimos do autor. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor a partir de cartografias da PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Sem escala.

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vias arteriais vias radiais vias perimetrais vias coletoras

ESCALA URBANA


capítulo

3 | ações projetuais

área de recorte 1

VIA RADIAL

VIA PERIMETRAL

VIA COLETORA

VIA LOCAL ESCALA LOCAL 69


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

SISTEMA DE MOBILIDADE URBANA ROTAS CICLÁVEIS

ampliação

Figura 30: rotas cicláveis na cidade de São Carlos. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011, com acréscimos do autor. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor a partir de cartografias da PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Sem escala.

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projeto do TGI existentes em execução em projeto (Prefeitura)

ESCALA URBANA


capítulo

3 | ações projetuais

área de recorte 1

CICLOVIAS desenhadas em associação com o sistema de espaços livres estabelece continuidade em relação ao desenho da Prefeitura incentivar o transporte coletivo/cicloviário e a educação ambiental ESCALA LOCAL 71


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

SISTEMA DE MOBILIDADE URBANA REDESENHO DAS CURVAS DE NÍVEL O redesenho das curvas foi feito com base nas inclinações máximas para cada via, oriundas da referência MASCARÓ, Juan Luis. Loteamentos Urbanos. Porto Alegre: Editora Masquatro, 2005. A imagem da maquete (próxima página) serve para cotejar o terreno anterior às modificações com o terreno redesenhado.

1 inclinação máxima: 4,7%, -6,6%

858m 848m 840m 832m 829m

2

Figura 31: Corte do terreno da área de intervenção. Fonte: elaborado pelo autor na plataforma Google Earth Pro, 2018. Sem escala.

3 862m

inclinação máxima: 10,1%, -13,1%

855m 848m 840m 829m Figura 32: Corte do terreno da área de intervenção. Fonte: elaborado pelo autor na plataforma Google Earth Pro, 2018. Sem escala.

72

4


capítulo

3 | ações projetuais

VIAS RADIAIS i<5% VIAS COLETORAS i<7% VIAS PERIMETRAIS i<5% VIAS LOCAIS i<15% VIAS CICLÁVEIS / PEDESTRES i<7%

03 73


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E MORFOLOGIA: RUAS ARBORIZADAS, PRAÇAS, PARQUES, AGRICULTURA URBANA

ampliação

Figura 33: sistema de espaços livres proposto para a cidade de São Carlos. Contou com a colaboração de Elisabet Fernández e Vinícius Praro, também discentes do IAU.USP. Fonte mapa-base: REVISÃO DO PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, jun/2011, com acréscimos do autor. Fonte sobreposições gráficas: elaboradas pelo autor. Sem escala.

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ruas arborizadas e drenantes praças parques de recreação parques de conservação agricultura urbana

ESCALA URBANA (PROPOSIÇÃO)


capítulo

3 | ações projetuais

AGRICULTURA URBANA

área de recorte 1

PARQUES DE CONSERVAÇÃO PRAÇAS

PARQUES DE RECREAÇÃO RUAS ARBORIZADAS equipamentos urbanos associação com os espaços livres

ESCALA LOCAL 75


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

3.3

MÁSCARAS: RECORTE PROJETUAL DENSIDADE 1

.por que? ÁREA COM GRANDE DIVERSIDADE DE ESPACIALIDADES PARQUE DE RECREAÇÃO AGRICULTURA URBANA ESCOLA + ESPAÇO LIVRE CENTROS COMERCIAIS BORDA COMERCIAL QUADRAS MISTAS QUADRAS RESIDENCIAIS CAMPUS 2 DA USP 76


capítulo

3 | ações projetuais

855 855

PARQUE DE RECREAÇÃO

850

BORDA COMERCIAL 860

AGRICULTURA URBANA QUADRAS MISTAS CAMPUS 2 DA USP QUADRAS RESIDENCIAIS

objetivos TRIDIMENSIONALIZAR O PROJETO DESENHAR A VOLUMETRIA DOS EDIFÍCIOS INSTRUMENTOS:

ESTUDO DE MORFOLOGIAS MÁSCARA DE GABARITO MÁSCARA DE DENSIDADE MÁSCARA DE USOS DO SOLO

855

850

ESCOLA + ESPAÇO LIVRE CENTROS COMERCIAIS 77


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do cĂłrrego do mineirinho, sĂŁo carlos (sp)

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capítulo

3 | ações projetuais

COMBINATÓRIA DE MORFOLOGIAS DE MODO A PRIVILEGIAR PERCURSOS PEATONAIS E CRIAR ESPAÇOS LIVRES ENTRE OS EDIFÍCIOS E AS QUADRAS

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

IMPLANTAÇÃO ESTRATÉGIAS DE COMPOSIÇÃO PERCURSOS QUE CHEGAM EM EDIFÍCAÇÕES QUEBRA DO ALINHAMENTO

localização na implantação

CAMINHOS ENTRE AS QUADRAS SOB OS PRÉDIOS MISTURA DE TIPOS, DE USOS, DE QUALIDADES DOS ESPAÇOS - INCENTIVO AO CONVÍVIO E ÀS EXPERIÊNCIAS DISTINTAS

INTRODUZIR A DIVERSIDADE DE USOS E DE PADRÕES HABITACIONAIS. TÉRREOS COMERCIAIS

FACHADAS ATIVAS 80


capítulo

curvas de nível a cada 1m edifícios espaços livres espaços livres verdejados loteamento para habitação arruamento escola

855

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diretrizes SURPRESA

3 | ações projetuais

AGRICULTURA URBANA

PARQUE DE RECREAÇÃO

VARIAÇÃO MISTURA

ABERTURA DAS QUADRAS DE ACORDO COM EXPERIÊNCIAS DISTINTAS AO LONGO DAS RUAS E DIFERENTES URBANIDADES QUE PUDESSEM SER CONVIDATIVAS

855

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vista da maquete

PARQUE DE CONSERVAÇÃO

>

MIOLOS DE QUADRA PÁTIOS COMERCIAIS PRAÇAS RUAS ARBORIZADAS AGRICULTURA URBANA PARQUES “ESQUINAS ABERTAS” LARGOS RUAS COM POMARES RUAS SÓ PARA PEDESTRES

81


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

IMPLANTAÇÃO DIAGRAMA DE PERCURSOS E ESPAÇOS LIVRES QUE ESTRUTURAM O PROJETO

>

vista da maquete

> 82

edifícios espaços livres loteamento para habitação espaço ativado por grande concentração de pessoas escola espaços intermediários de encontro de pessoas curvas de nível a cada 1m caminho com pomar na rua (escola-parque / escola-agricultura urbana principais percursos contemplação da paisagem


capítulo

3 | ações projetuais

BAIRRO COMO LUGAR DE CONVÍVIO

83


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

+ ALTO

DENSIDADES PRÓXIMO ÀS MAIORES VIAS edifícios mais altos desenham as calhas das ruas maiores

+ DENSO

PRÓXIMO ÀS MAIORES VIAS PRÓXIMO ÀS ÁREAS COMERCIAIS PRÓXIMO AOS ESPAÇOS LIVRES

são carlos: densidade média de

gabarito alto: 5-10 pavimentos gabarito médio: 3-4 pavimentos gabarito baixo: 1-2 pavimentos

84

CRITÉRIOS

CRITÉRIOS

GABARITOS

195 hab/ha (ibge, 2017)

densidade alta: 200 hab/ha densidade média: 100 hab/ha densidade baixa: 50 hab/ha


capítulo

3 | ações projetuais

855

CRITÉRIOS

USO DO SOLO 860

+ COMERCIAL

PRÓXIMO ÀS MAIORES VIAS PRÓXIMO AOS ESPAÇOS LIVRES atrair pessoas

misto: comercial no térreo + serviços misto: comercial no térreo + habitação habitação arruamento espaços verdes institucional público (escola)

855

850

85


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

3.4

RECORTE PROJETUAL 2

1 3

2

.por que? DENTRO DO RECORTE 1, ÁREA QUE CONTEMPLA O ENTRONCAMENTO DE 3 IMPORTANTES VIAS DO PROJETO 1RUA COLETORA LINDEIRA AO PARQUE DE RECREAÇÃO (22m) 2 RUA COLETORA COM CICLOVIA (25m) 3 RUA COLETORA COM SEGMENTO COMPARTILHADO(22m)

86


capítulo

3 | ações projetuais

CRUZAMENTOS DETALHADOS NA ESCALA 1:250 (PRÓXIMAS PÁGINAS) 1

COLETORA 1-COLETORA 2

2

COLETORA 1-LOCAL 2 3

COLETORA 2-COLETORA 2 4

COLETORA 2-LOCAL 2

I’

I

B’

7

6

J

K C

D’

4

C’

E’

H’

A’

A

E

H

5

F’

LOCAL 2-LOCAL 3

2

G

G’

3

F

LOCAL 2-LOCAL 2

objetivos

6

M M’

K’

J’

L

COLETORA 2-LOCAL 3

DETALHAR AS VIAS DO PROJETO CHEGAR AO DESENHO URBANO DOS ELEMENTOS:

1

D

7

B

L’

5

CALHA DE TODOS OS TIPOS DE RUAS DO RECORTE CRUZAMENTOS DOS TIPOS VARIADOS DE RUAS ENTRE SI

CARACTERIZAR ALGUMAS AMBIÊNCIAS POR MEIO DE PERSPECTIVAS INFRAESTRUTURA VERDE 87


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

CORTES E ENCONTROS DAS VIAS RUA COLETORA TIPO 1: com ciclovia (calha de 25 metros) AA’) desenho 1:100: calha padrão; BB’) desenho 1:150: exemplo de faixa de uso múltiplo.

Nas próximas páginas, serão apresentados os encontros das diferentes vias do projeto e dos cortes relativos a essas mesmas vias, caracterizando seus respectivos perfis. As páginas duplas à direita contém a calha básica de cada rua na escala 1:100 (são 4 tipos de ruas no recorte: coletora 1 (com ciclovia); coletora 2 (sem ciclovia); local 2 (sem ciclovia); local 3 (peatonal). Os 4 tipos de ruas apresentam pequenas variações em sua tipologia básica, de acordo com o local onde se encontram, sendo que estas variações são apresentadas na página simples à esquerda, em escala 1:150, como pode ser visto na página atual e na próxima.

Uma das faixas de circulação de veículos pode ser apropriada para usos diversos, gerando uma extensão para a calçada. nos próximos cortes serão apresentados alguns exemplos de tais usos, proporcionando diversas urbanidades. Os cortes menores (escala 1:150) seguem as mesmas dimensões dos maiores (escala 1:100), por isso não foram cotados.

comércio informal

88

ESCALA 1:150

CORTE BB’.RUA COLETORA TIPO 1 (25m), EXEMPLO DE FAIXA DE USO MÚLTIPLO


capítulo

3 | ações projetuais

t cole ora 1

CORTE AA’.RUA COLETORA TIPO 1 (25m), CALHA PADRÃO. ESCALA 1:100

6,0m

1,5m

3,5m

3,5m

2,5m

1,0m

3,0m

1,5m

2,5m 89



capítulo

3 | ações projetuais

t cole ora 1

RUA COLETORA 1

0,00

RUA

COLE

TORA

2

1

2

1 +0,15

3 4

5

CRUZAMENTO 1 RUA COLETORA 1 RUA COLETORA 2

1 FEITO COM FAIXA ELEVADA 2 INSTALAÇÃO DE BICICLETÁRIOS 3 ILUMINAÇÃO PÚBLICA 4 PILARETES DE SALVAGUARDA DO PEDESTRE 5 CICLOVIA

+0,15

1:250 91


área de estar Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

ESCALA 1:150

CORTE DD’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m) EXEMPLO DE FAIXA DE USO MÚLTIPLO

rua compartilhada - calçadão elevado

92

ESCALA 1:150

CORTE EE’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m) EXEMPLO DE RUA COMPARTILHADA


capítulo

2

RUA COLETORA TIPO 2: sem ciclovia (calha de 22 metros)

coletora

CC’) desenho 1:100: calha padrão; DD’) desenho 1:150: exemplo de faixa de uso múltiplo; EE’) desenho 1:150: rua compartilhada; FF’) desenho 1:150: exemplo de faixa de uso múltiplo; GG’) desenho 1:150: exemplo de calçada dupla (faixa de uso múltiplo ocupa toda a quadra, invertendo sua posição com o canteiro pluvial, de modo a alargar a calçada); HH’) desenho 1:150: exemplo de faixa de uso múltiplo; II’) desenho 1:150: exemplo de faixa de uso múltiplo.

CORTE CC’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m), CALHA PADRÃO. ESCALA 1:100

3 | ações projetuais

6,0m

1,5m

3,5m

3,5m

3,5m

1,5m

2,5m

93



3 | ações projetuais

coletora

2

capítulo

4

RUA

COLE

TORA

RUA L OCAL

2

2

2

3 1

+0,15

+0,15

4

0,00

CRUZAMENTO 4 RUA COLETORA 2 RUA LOCAL 2

1 RUA COMPARTILHADA FEITA COM FAIXA ELEVADA 2 INSTALAÇÃO DE BICICLETÁRIOS 3 ILUMINAÇÃO PÚBLICA 4 PILARETES DE SALVAGUARDA DO PEDESTRE

1:250 95


banca de jornal Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

96

ESCALA 1:150

CORTE FF’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m) EXEMPLO DE FAIXA DE USO MÚLTIPLO

ESCALA 1:150

CORTE GG’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m) EXEMPLO DE CALÇADA DUPLICADA

CORTE EXEMP


3 | ações projetuais

5

RUA COLE TORA 2

coletora

2

capítulo

3

2

+0,15

5

1

0,00

4 +0,15

RUA LOC

AL 3

CRUZAMENTO 5 RUA COLETORA 2 RUA LOCAL 3

1 FEITO COM FAIXA ELEVADA 2 INSTALAÇÃO DE BICICLETÁRIOS 3 CANTEIROS NA RUA PEATONAL 4 ILUMINAÇÃO PÚBLICA 5 PILARETES DE SALVAGUARDA DO PEDESTRE

EE’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m) PLO DE RUA COMPARTILHADA

1:250 97


food truck Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

ESCALA 1:150

CORTE HH’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m) EXEMPLO DE FAIXA DE USO MÚLTIPLO

ponto de ônibus

98

ESCALA 1:150

CORTE II’.RUA COLETORA TIPO 2 (22m) EXEMPLO DE FAIXA DE USO MÚLTIPLO


coletora

2

capítulo

3 | ações projetuais

3

0,00

PARQU

E

3

RUA CO LETORA

2

2

5

1 +0,15

RUA

COLE

TORA

2

4

CRUZAMENTO 3 RUA COLETORA 2 RUA COLETORA 2

1 FEITO COM FAIXA ELEVADA 2 INSTALAÇÃO DE BICICLETÁRIOS 3 EXTENSÃO DA CALÇADA PARA O PARQUE 4 ILUMINAÇÃO PÚBLICA 5 PILARETES DE SALVAGUARDA DO PEDESTRE

+0,15

1:250 99


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RUA LOCAL TIPO 2: sem ciclovia (calha de 14 metros)

JJ’) desenho 1:100: calha padrão; KK’) desenho 1:150: exemplo de faixa de uso múltiplo; LL’) desenho 1:150: exemplo de calçada dupla (faixa de uso múltiplo ocupa toda a quadra, invertendo sua posição com o canteiro pluvial, de modo a alargar a calçada).

3,0m 100

1,5m

2,5m

2,5m

1,5m

CORTE JJ’.RUA LOCAL TIPO 2 (14m), CALHA PADRÃO. ESCALA 1:100

3,0m


3 | ações projetuais

6

local 2

capítulo

3 +0,15

RUA LOC

AL 2

0,00

1

2 RUA LOCAL 2 RUA LOCAL 2

1 FEITO COM FAIXA DE PEDESTRE 2 CALÇADA COM REBAIXO PARA ACESSIBILIDADE 3 ILUMINAÇÃO PÚBLICA DEVIDO AO FATO DE SER UM CRUZAMENTO PEQUENO, NÃO FOI DESENHADO EM TRAVESSIA ELEVADA

RUA LOCAL 2

CRUZAMENTO 6

1:250 101


academia ao ar livre

Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

102

ESCALA 1:150

CORTE KK’.RUA LOCAL TIPO 2 (14m) EXEMPLO DE FAIXA DE USO MÚLTIPLO

ESCALA 1:150

CORTE LL’.RUA LOCAL TIPO 2 (14m) EXEMPLO DE CALÇADA DUPLICADA


3 | ações projetuais

2

RA 1 ETO L O C RUA

local 2

capítulo

2 +0,15

RUA LOC

AL 2

4

1 5

+0,15

3

CRUZAMENTO 2 RUA COLETORA 1 RUA LOCAL 2

1 FEITO COM FAIXA ELEVADA 2 INSTALAÇÃO DE BICICLETÁRIOS 3 ILUMINAÇÃO PÚBLICA 4 CICLOVIA 5 PILARETES DE SALVAGUARDA DO PEDESTRE

0,00

1:250 103


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

RUA LOCAL TIPO 2: peatonal (calha de 9 metros) MM’) desenho 1:100: calha padrão.

3,0m 104

1,0m 1,0m 1,0m

3,0m

CORTE MM’.RUA LOCAL TIPO 3 (9m), CALHA PADRÃO. ESCALA 1:100


capítulo

3 | ações projetuais

RUA LOCAL 3

local 2

7

0,00

3

1

RUA LOC

+0,15

AL 2

4 +0,15

2

CRUZAMENTO 7 RUA LOCAL 2 RUA LOCAL 3

1 FEITO COM FAIXA ELEVADA 2 CANTEIROS NA RUA PEATONAL 3 ILUMINAÇÃO PÚBLICA 4 PILARETES DE SALVAGUARDA DO PEDESTRE

1:250 105


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

INFRAESTRUTURA VERDE: RUAS DRENANTES COM CANTEIROS PLUVIAIS, BIOVALETAS E LAGOAS DE MITIGAÇÃO

A utilização da infraestrutura verde, trabalhada por Herzog (2010) e também detalhada por Bonzi (2015)19 e Cormier; Pellegrino (2008)20, acontece em associação com os sistemas de espaços livres, contribuindo de forma decisiva para mitigar (e até mesmo solucionar) problemas relacionados às águas urbanas (como enchentes), ao clima (aumento significativo das temperaturas) e à ecologia urbana, o que cria espaços públicos mais atrativos e incentiva as pessoas a se utilizarem deles, indo além de um mero instrumento urbano. A adoção desse tipo de estratégia permite a incorporação de diversas tipologias, da micro à macro escala, conservando os ecossistemas naturais e suas respectivas funções, tais como linhas de água, controle ambiental, manutenção e regulação climática, atividades ao ar livre, entre outras. As tipologias podem ser distribuídas dentro e ao redor das cidades, como: parques de conservação, parques de recreação, corredores verdes, espaços naturais preservados, bacias intermedIárias, jardins de chuva, lagoas pluviais, canteiros pluviais, biovaletas, tetos verdes, cisternas e grades verdes. Segundo Bonzi (2015), “[...] a proposta de zoneamento ambiental baseado nos processos naturais e na análise geomorfológica pode 106

BONZI, Ramón Stock. O Zoneamento Ambiental Geomorfológico como Método para Planejar a Infraestrutura Verde em Áreas Densamente Urbanizadas. Revista LABVERDE, São Paulo, n. 10, p. 104-132, ago/2015. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/revistalabverde/article/view/97564>. Acesso em: 16/09/2016. 19

CORMIER, Nathaniel; PELLEGRINO, Paulo Renato Mesquita. Infra-estrutura verde: uma estratégia paisagística para a água urbana. Revista Paisagem Ambiente, São Paulo, n. 25, p. 127-142, 2008. Disponível em: <http://www.revistas.usp. br/paam/article/view/105962/111750>. Acesso em: 16/09/2016. 20


capítulo

Figura 34: vista da rua Siskiyou em Portland, Oregon, com canteiro pluvial nas calçadas. Fonte: CORMIER; PELLEGRINO, 2008, p. 129.

3 | ações projetuais

embasar cientificamente a aplicação da Infraestrutura Verde” (BONZI, 2015, p. 104). Esses espaços que compõem a infraestrutura verde podem estar em meio a outros, como parques com lagoas pluviais, por exemplo; ruas com jardins e canteiros de chuva; parques com biovaletas. São tipologias paisagísticas que se mesclam a outras e se prestam a conformar um sistema de infraestruturas urbanas (Cormier; Pellegrino, 2008). Preserva-se, assim, a qualidade dos processos naturais, não dos objetos (árvores, água, praças), além de garantir a maior duração destes (já que a natureza não é infinita). A infraestrutura verde pode recolocar o espaço livre como um elemento fundamental para a vida das cidades, inclusive por trazer de volta as pessoas até eles, algo que atualmente se encolheu. Uma rua que utiliza um canteiro de chuva com infraestrutura drenante e, ao mesmo tempo, arboriza esse espaço, certamente proporciona um percurso mais atrativo e agradável às pessoas, promovendo, assim, uma melhora urbana em diversos aspectos.

107


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

RUAS DRENANTES COM CANTEIROS PLUVIAIS Apesar de não disporem, na grande maioria das vezes, de muito espaço para serem instalados, os canteiros pluviais são instrumentos eficientes para a drenagem urbana. Costumam ser instalados entre o leito carroçável e a calçada, juntos ao meio-fio, mas podem também estar adjacentes às construções, para receber as águas provenientes dos telhados. A adição de plantas arbustivas aumenta suas funções, sendo que estas contribuem na evapotranspiração e na remoção de poluentes. Também pode ser adicionado um estrato arbóreo, sombreando os passeios peatonais, o que torna as ruas mais agradáveis, mais caminháveis; por separar os carros das pessoas, pode-se dizer que os percursos se tornam mais seguros. Sua composição dispõe, basicamente, de solo com composto orgânico (com ou sem camada arbustiva acima), brita logo abaixo e um sistema de recolha de água subterrâneo, indo para as galerias (CORMIER; PELLEGRINO, 2008).

108

Figura 35: esquema de biovaleta. Fonte: CORMIER; PELLEGRINO, 2008, p. 132.

Figura 36: ruas com estruturas drenantes em São Francisco, Califórnia. Fonte: http://www.progress-project.eu/ wp-content/uploads/2017/02/sustainable-water-management.jpeg. Acesso em: 08/06/2017.


capítulo

3 | ações projetuais

BIOVALETAS As biovaletas são elementos da infraestrutura verde utilizadas, principalmente, em situações de terrenos com declividade acima da média, em que o fluxo de água é mais intenso. Esses caminhos escavados no terreno, lineares, são preenchidos com vegetação e cascalho, pedras, ou demais elementos que retardam o fluxo da água; concomitantemente, por diminuir o fluxo, aumentam a sua chance de infiltração no solo. Funcionam como caminhos, direcionando o fluxo da água para um próximo dispositivo verde, como um jardim de chuva, um canteiro pluvial ou uma lagoa de mitigação. Transversalmente (figura abaixo), podem ser instaladas muretas de concreto para irem, progressivamente, diminuindo o fluxo da água. Dentro do atual projeto, as biovaletas foram implantadas nas principais linhas de escoamento das águas, integrado ao SEL projetado, conduzindo as águas para as lagoas de mitigação (CORMIER; PELLEGRINO, 2008). Figura 37: biovaleta na Praça das Corujas, São Paulo. Fonte: http://200.144.182.150/aun/imagens/ biovaleta2.jpg. Acesso em: 08/06/2017. Figura 38: corte esquemático de uma biovaleta. Fonte: http://www.blogdasaude. com.br/wp-content/uploads/2009/05/ corte_esquematico_biovaleta.jpg. Acesso em: 08/06/2017.

109


Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

LAGOAS DE MITIGAÇÃO OU LAGOAS PLUVIAIS As lagoas de mitigação podem ser comparadas a um alagado planejado, recebendo as águas provenientes de drenagens naturais ou projetadas - uma bacia de retenção. Uma característica peculiar, é o fato de manterem parte de seu volume de água, de fato como uma lagoa; as demais estruturas de infraestrutura verde tem a função de permitir a infiltração. Assim, cumpre uma função paisagística, em que a lagoa serve como atrativo urbano, reunindo pessoas e valorizando o seu entorno. Devem ser instaladas em espaços de maior dimensão em relação às demais infraestruturas e também podem se associar a cursos d’água, recebendo as águas que extravasam em períodos de cheia. Neste mesmo cenário, podem ser implantadas em sequência, como pequenas bacias que contém as águas dos rios em etapas intermediárias e contribuem para diminuir as cheias em sua jusante, estratégia também adotada neste projeto (CORMIER; PELLEGRINO, 2008).

110

Figura 39: esquema de lagoa de mitigação. Fonte: CORMIER; PELLEGRINO, 2008, p. 132.

Figura 40: Singapore Watershed. Fonte: https://vimeo.com/55777334. Acesso em 08/06/2017.


capítulo

AGRICULTURA URBANA

3 | ações projetuais

INFRAESTRUTURA VERDE APLICADA AO PROJETO ESCALA DA PROPOSTA GERAL

TALVEGUES

PARQUE DE RECREAÇÃO

lagoas de mitigação biovaletas alocadas após as principais linhas de escoamento de água da área de intervenção

..

alocadas nas principais linhas de escoamento de água da área de intervenção

111


1 2 3 4

Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

CANTEIRO COM GRAMA

a água A água chega chega ao ao canteiro canteiropor através meio de um meio-fio drenante, após percorrer o leito carroçável carroçável; se se vier vier da dacalçada calçada,,escoa escoaaapartir partirdo dointertravado intertravadoe edaí , a, sobre odaímeio partir , sobre -fio,osendo meio-infiltrada fio, sendo no infiltrada solo, posteriormente no solo, posteriormente . .

PLACA DE CONCRETO PERMEÁVEL utilizada U tilizada nos nos percursos percursos sem sem grama grama ee nos

cruzamentos elevados., possui

megadrenos e aguenta permite trânsito trânsito até de caminhões. O o piso piso permite a passagem de

3 litros de água em 5 segundos.

ASFALTO PERMEÁVEL ASFALTO PERMEÁVEL utilizado nos leitos carroçáveis do projeto. após absorver as águas, inUtilizado

nos leitos carroçáveis do projeto, após absorver as águas, infiltradas em seus poros da camada superficial, estas são conduzidas a filtradas em seus poros da camada superficial, estas são conduzidas a galerias subterrâneas de coleta geral de água. galerias subterrâneas de coleta geral de água.

PISO INTERTRAVADO DE CONCRETO

Ppor or ser ser assentado assentado com com areia areia entre entre as as peças, o piso permite a passagem drenagem urbana urbana.. D diminui parcial da água e contribui para aa drenagem iminui, assim, a impermeabilização do solo.

MEIO-FIO DRENANTE meio-fio drenante

todas as ruas do projeto foram desenhadas com infraestrutura verde, na forma de canteiros pluviais que separam o fluxo de veículos do fluxo das pessoas; ao mesmo tempo, proporciona ruas mais agradáveis de caminhar

2

112

D D

INFRAESTRUTURA VERDE APLICADA AO PROJETO - ESCALA DO RECORTE

A: Fonte: https://www.pwdplanreview.org/manual/chapter-4/4.1-bioinfiltration-bioretention. Acesso em: 20/06/2018. B: Fonte: http://www.phillywatersheds.org/what_were_doing/gsdm. Acesso em: 20/06/2018.


capítulo

3 | ações projetuais

B dreno

C

A

3

4

C: Fonte: https://www.pwdplanreview.org/upload/img/RiserPipe-WRT.png. Acesso em: 20/06/2018. D: Fonte: http://www.disenoarquitectura.cl/kerbdrain-aco-solera-y-drenaje-en-una-sola-pieza-socodren/. Acesso em: 20/06/2018.

113



REFERÊNCIAS


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REFERÊNCIAS

AKINAGA, Patricia Harumi. Urbanismo ecológico, do princípio à ação: o caso de Itaquera, São Paulo, SP. São Paulo: tese apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2014. ALVES, Elisânia Magalhães. Medidas Não-Estruturais na Prevenção de Enchentes em Bacias Urbanas: cenários para a Bacia do Gregório, São Carlos SP. Dissertação apresentada à Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, EESC-USP. São Carlos, 2005. BARTALINI, Vladimir. Os Córregos Ocultos e a Rede de Espaços Públicos Urbanos. Arquitextos, Vitruvius, São Paulo, ano 09, n. 106.01, mar. 2009. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/09.106/64. Acesso em: 15/05/2017. BENINI, Rubens de Miranda; MENDIONDO, Eduardo Mario. Urbanização e Impactos no Ciclo Hidrológico na Bacia do Mineirinho. Revista Floresta e Meio Ambiente, Seropédica, v. 22, n. 2, p. 211-222, abr-jun/2015. Disponível em: www.scielo.br/pdf/floram/v22n2/2179-8087-floram-22-2-211.pdf. Acesso em: 01/05/2017.

116

imagem da capa: <https://www.pinterest.pt/ pin/352477108313107189/>. Acesso em: 03/06/2017. imagem capítulo 1: <http://atlasofplaces.com/Flooding-Mechanisms-Bra-Driva-Ribot>. Acesso em: 03/06/2017. imagem capítulo 2: https:// aguasdamemoria.wordpress. com/2011/06/28/obras-no-corrego-gregorio/. Acesso em: 03/06/2017. imagem capítulo 3: arquivo pessoal.


referências

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Cidade e meio ambiente: proposta de desenho ambiental urbano para a bacia do córrego do mineirinho, são carlos (sp)

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